Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
315/24.2YRLSB-8
Relator: CARLA CRISTINA FIGUEIRA MATOS
Descritores: SENTENÇA ESTRANGEIRA DE ADOPÇÃO
INDEFERIMENTO LIMINAR
PARTES REQUERENTES
FILHO MENOR
INCERTO COMO PARTE REQUERIDA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/18/2024
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: REVISÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
Decisão: INDEFERIMENTO LIMINAR
Sumário: I. Apenas podem ser partes no processo de revisão de sentença estrangeira relativa a direitos privados as partes que figurarem como tal nessa decisão objeto de revisão.
II. Podem tais partes (que figuram na sentença a rever) propor em conjunto o processo de revisão de sentença estrangeira, caso em que não existem requeridos, ou pode apenas uma delas intentar o processo, caso em que têm que constar como requeridos todas as demais.
III. No caso específico da revisão de sentença de adoção a revisão deve ser pedida conjuntamente pelos pais adotivos e pelo filho; sem necessidade de o pedido ser dirigido contra alguém.
IV. Sendo o filho menor, a incapacidade judiciária associada a essa situação terá que ser necessariamente suprida através do instituto da representação. Mas terá sempre que ser demandado (caso não seja requerente).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO:
A e B, melhor identificados nos autos, vieram propor Acão Especial de Revisão de Sentença Estrangeira de Adoção Plena, figurando no formulário eletrónico que anexa a p.i. como parte requerida “incerto”.
Alegam para tanto, em síntese, serem cidadãos portugueses, cuja união de facto foi legalmente reconhecida e revista por sentença proferida por este Tribunal da Relação de Lisboa; que no dia …, o Tribunal … proferiu uma sentença que decidiu a adoção, por parte dos ora Requerentes, do menor C, melhor identificado nos autos, a qual já foi também revista por sentença proferida por este Tribunal da Relação de Lisboa, sendo o menor detentor de nacionalidade portuguesa; que por sentença proferida no dia …, o Tribunal … decretou a adoção por parte dos ora requerentes do menor D, melhor identificado nos autos; os requerentes pretendem que a referida sentença de … venha a ser reconhecida em Portugal, uma vez cumpre os requisitos consagrados no art.º 980.º do CPC, sendo que, ao ver reconhecida a adoção no sistema jurídico português (e, em particular, ao nível do Registo Civil), abre-se a possibilidade de se ponderar, por parte dos Requerentes, numa fase posterior e de acordo com os respetivos pressupostos legais, a realização do pedido de cidadania portuguesa para o filho D, nos termos da Lei da Nacionalidade.
Concluem, peticionando que a sentença de adoção proferida pelo Tribunal … seja revista e confirmada, seguindo-se os ulteriores termos processuais.
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Em 30.01.2024 foi proferido despacho de indeferimento liminar com o seguinte teor:
“A e B, melhor identificados nos autos, vieram propor Acão Especial de Revisão de Sentença Estrangeira de Adoção Plena contra “incertos” (Cf formulário eletrónico que anexa a petição inicial – art 7º nºs 1 e 2 da Portaria 280/2013 de 29/08).
O processo de revisão de sentença estrangeira não implica qualquer reexame do mérito da causa onde foi proferida tal sentença, visando apenas sindicar determinados requisitos formais previstos nas alíneas do artº. 980º do CPC, de forma a que tal sentença possa produzir efeitos na ordem jurídica portuguesa (cf art 978 nº1 do CPC).
E, tal como se refere no Acórdão do TRG de 08.11.2018 proferido no Proc. 84/18.5YRGMR (disponível in www.dgsi.pt), “apenas podem ser partes no processo de revisão de sentença estrangeira relativa a direitos privados as partes que figurarem como tal nessa decisão objeto de revisão”.
Podem tais partes (que figuram na sentença a rever) propor em conjunto o processo de revisão de sentença estrangeira, caso em que não existem requeridos, ou pode apenas uma delas intentar o processo, caso em que têm que constar como requeridos todas as demais.
Sobre o caso específico da revisão de sentença de adoção, foi em 04.10.2011 proferida pelo TRL no proc. 529/11.5YRLSB-1 decisão singular (disponível in www.dgsi.pt), onde, entre o mais, se consignou que:
“Neste processo está em causa uma sentença que decreta a adopção sem que se vislumbre qualquer outra finalidade da atribuição de eficácia a tal sentença que não a de mero reconhecimento em Portugal do estado de pais e filho resultante daquela adopção.
Pretende-se, assim, o mero reconhecimento da situação definida na sentença revidenda, sem que se pretenda fazer valer contra quem quer que seja em concreto.
Daí que se nos afigure dever a acção ser proposta pelos directamente afectados no seu estado pela sentença: aqueles que em face dela ficam relacionados familiarmente como pais de um determinado filho. E tanto o poderão fazer em conjunto (por haver coincidência de interesses, como é natural que ocorra as mais das vezes), caso em que não se pretende fazer valer a sentença contra ninguém em concreto; como o poderá fazer qualquer deles individualmente (quiçá por só a ele interessar a produção de efeitos no território nacional), caso em que, para além do simples reconhecimento da situação se pretende, igualmente, a imposição desses efeitos aos demais interessados, pelo que a pretensão haverá de ser deduzida contra eles.”
E que: “Temos pois que no caso dos autos a revisão deve ser pedida conjuntamente pelos pais adoptivos e pelo filho; e sem necessidade de o pedido ser dirigido contra alguém.”
No caso dos presentes autos, o processo de revisão da sentença de adoção é intentado apenas pelos adotantes, sem intervenção do filho, o qual não figura como requerente nem como requerido.
Por outro lado, quem figura como requerido é “incerto”, o qual não é parte na sentença de adoção, e consequentemente não deve ser parte no processo de revisão respetiva.
Em suma, quem foi ora demandado é parte ilegítima (incerto) e não intervém no processo a parte legitima (filho).
A ilegitimidade constitui exceção dilatória de conhecimento oficioso que implica a absolvição da instância, ou o indeferimento liminar quando a petição seja apresentada a despacho liminar (arts 577 al e), 578, 278 nº1 al d), e 590 nº1 do CPC todos aplicáveis ex vi do art 549º, nº 1 do CPC).
Por todo o exposto, e ao abrigo do disposto no art.º 590º, nº 1, ex vi art.º 549º, nº 1, do CPC, decide-se indeferir liminarmente a petição inicial de ação de revisão de sentença estrangeira.
Fixo o valor da causa no indicado na petição inicial (cfr. art.º 306º, do CPC).
Custas da ação a suportar pelos requerentes, nos termos do disposto no art.º 527º, nºs 1 e 2, do NCPC.
Notifique. “
*
Inconformados, vieram os requerentes apresentar a 06.02.2024 requerimento, nos termos do n.º 3 do artigo 652.º do Código de Processo Civil, com pedido de sujeição a Acórdão da matéria sobre a qual a incidiu a decisão singular.
Para tanto apresentaram os seguintes fundamentos:
“- Entendeu o doutro Despacho, que respeitamos, que se encontra verificada uma
exceção dilatória de ilegitimidade das partes.
- Em termos sumários, o Tribunal foi do entendimento que, no presente processo, “quem figura como requerido é “incerto”, o qual não é parte na sentença de adoção, e consequentemente não deve ser parte no processo de revisão respetiva”, pelo que “quem foi ora demandado é parte ilegítima (incerto) e não intervém no processo a parte legitima (filho)”.
- Salvo o devido respeito, que é muito, discorda-se do entendimento da Exma. Senhora Juiz Desembargadora, pois os Requerentes consideram que é fundamental proceder a um conjunto de esclarecimentos relativamente ao modo como a ação foi processualmente configurada.
- Analisando a petição inicial, verifica-se que existem apenas dois Requerentes, a saber: (i) A e (ii)B. Ou seja, não existem demandados incertos no âmbito do presente processo de revisão de sentença estrangeira.
- Em relação ao facto de o sistema informático Citius ter configurado, na parte respeitante ao “demandado”, como sendo “incerto”, tal circunstância não é da responsabilidade dos Requerentes ou do seu Mandatário, ora signatário.
- Isto é, o não preenchimento da parte relativa ao “Requerido”, independentemente do modo como é concretizado, conduz a que o Citius identifique o “Requerido” como “incerto”.
- Ora, independentemente dos constrangimentos informáticos originados aquando da preparação e envio da petição inicial, através do sistema informático Citius, importa ter em consideração que a mencionada peça processual apenas faz expressa menção da existência de dois Requerentes.
- É importante reforçar que a petição inicial não configurou, do ponto de vista da legitimidade passiva, qualquer “Requerido”, na medida em que o objetivo jurídico- processual da mencionada petição inicial é estritamente o de proceder à revisão da sentença da adoção para o ordenamento jurídico português.
- Salvo o devido respeito por entendimento adverso, os Requerentes não podem ser prejudicados pela forma como o sistema informático Citius foi concebido, designadamente quanto aos seus automatismos.
- Feito este esclarecimento quanto ao modo como a petição foi submetida através do Citius, é importante reforçar que em outros processos de revisão de sentenças estrangeiras, que correram os seus termos no Tribunal da Relação de Lisboa, o próprio sistema informático preencheu, na parte respeitante ao “demandado”, como sendo “incerto”.
- A título de exemplo, poder-se-á fazer alusão ao processo n.º …, no qual os mesmos Requerentes (A e B) intentaram uma ação de revisão de uma sentença estrangeira proferida no dia …, pelo Tribunal …, relativamente à adoção, por parte dos ora Requerentes, do menor C, nascido no dia … e registado em….
- A referida ação judicial foi intentada no dia … e, conforme se poderá constatar no documento emitido pelo sistema informático Citius, a parte referente ao “Requerido” encontra-se preenchida como “Incerto” – cfr. Doc. 1 que se junta e se dá por integralmente reproduzido.
- Do mesmo modo, no âmbito do processo n.º …, que correu os seus termos no Tribunal da Relação de Lisboa, os mesmos Requerentes (A e B) viram a sua união de facto ser reconhecida no ordenamento jurídico português e, mais uma vez, conforme se poderá constatar no documento emitido pelo sistema informático Citius, a parte referente ao “Requerido” encontra-se preenchida como “Incerto” – cfr. Doc. 2 que se junta e se dá por integralmente reproduzido.
- Conforme explicitado supra, por decisão tomada no âmbito do processo n.º …, foi julgada procedente a pretensão dos Requerentes e, em consequência, concedida a revisão pedida, confirmando a sentença proferida pelo Tribunal …, segundo a qual foi determinada a adoção, por parte dos ora Requerentes, do menor C.
- No âmbito do referido processo n.º …, consta da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa (cfr. Doc. 3) o seguinte:
“O tribunal é o competente em razão da matéria, da nacionalidade e da hierarquia.
O processo é o próprio, e não enferma de outras nulidades que o invalidem na sua totalidade.
As partes dispõem de personalidade e de capacidade judiciárias, são legítimas e mostram-se patrocinadas.
Inexistem outras excepções dilatórias, nulidades parciais ou quaisquer questões prévias ou incidentais que obstem ao conhecimento de mérito e de que cumpra conhecer.” (sublinhados e negritos nossos)
- Salvo o devido respeito, que é muito, no presente processo de revisão de sentença estrangeira estamos perante as mesmas partes processuais cujo fim processual é igualmente a confirmação de uma sentença de adoção decretada por um Tribunal ….
- À luz do princípio da igualdade, e salvo o devido respeito por opinião adversa, estando perante duas situações que são fatual e materialmente iguais, os Requerentes são do entendimento que o processo deverá prosseguir os seus termos e que seja facultado o exame do processo ao Ministério Público.
- Caso não seja esse o entendimento sufragado pelo douto Tribunal, requer-se, muito respeitosamente, a V. Exa., em cumprimento do princípio da gestão processual (cfr. art.º 6.º, n.º 2 do CPC), que os Requerentes sejam notificados a suprir eventuais deficiências ou providenciar pelo aperfeiçoamento da petição inicial, de modo a promover o normal desenvolvimento da lide.
Nestes termos, e nos demais de Direito, deve a presente reclamação ser julgada procedente, com as legais consequências.”
Notificado de tal requerimento, o MP nada disse.
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Nos termos previstos no art. 652 nº3 do CPC, a parte que se considere prejudicada por qualquer decisão do relator pode requerer que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão.
Deduzida a reclamação para a conferencia, o coletivo de juízes reaprecia as questões que foram objeto da decisão singular do Relator, sem qualquer vinculação ao anteriormente decidido.
Colhidos os vistos, cumpre, então, decidir em conferência.
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II – QUESTÕES A DECIDIR:
A legitimidade das partes em processo de revisão de sentença estrangeira de adoção.
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III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
Os Factos assentes com relevância para a causa são os que constam do relatório supra.
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IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:
A decisão reclamada indeferiu liminarmente a petição inicial por ilegitimidade das partes, considerando que, por um lado, a presente ação especial de revisão foi deduzida contra quem não foi parte na sentença de adoção (“incerto”), e por outro lado, nela não intervém, como parte, o adotado.
Os requerentes discordam de tal decisão, referindo que na petição inicial, verifica-se existirem apenas dois Requerentes, a saber: (i) A e (ii) B, não existindo demandados incertos. Todavia, o não preenchimento da parte relativa ao “Requerido”, independentemente do modo como é concretizado, conduz a que o Citius identifique o “Requerido” como “incerto”.
E referem ainda que em outros processos de revisão de sentenças estrangeiras que correram os seus termos no Tribunal da Relação de Lisboa, o próprio sistema informático preencheu, na parte respeitante ao “demandado”, como sendo “incerto”, do que são exemplo os identificados processos de revisão de sentença que reconheceu a união de facto dos requerentes e de revisão da sentença de adoção do outro filho dos requentes. Neste último a sentença considerou as partes legitimas, pelo que se estando perante as mesmas partes processuais e mesmo fim processual (a confirmação de uma sentença de adoção decretada por um Tribunal …), à luz do princípio da igualdade, os Requerentes são do entendimento que o processo deverá prosseguir os seus termos e que seja facultado o exame do processo ao Ministério Público.
Cumpre apreciar.
O processo de revisão de sentença estrangeira não implica qualquer reexame do mérito da causa onde foi proferida tal sentença, visando apenas sindicar determinados requisitos formais previstos nas alíneas do artº. 980º do CPC, de forma a que referida sentença possa produzir efeitos na ordem jurídica portuguesa (cf art 978 nº1 do CPC).
E, tal como se refere no Acórdão do TRG de 08.11.2018 proferido no Proc. 84/18.5YRGMR (disponível in www.dgsi.pt), “apenas podem ser partes no processo de revisão de sentença estrangeira relativa a direitos privados as partes que figurarem como tal nessa decisão objeto de revisão”.
Podem tais partes (que figuram na sentença a rever) propor em conjunto o processo de revisão de sentença estrangeira, caso em que não existem requeridos, ou pode apenas uma delas intentar o processo, caso em que têm que constar como requeridos todas as demais.
Sobre o caso específico da revisão de sentença de adoção, foi em 04.10.2011 proferida pelo TRL no proc. 529/11.5YRLSB-1 decisão singular (disponível in www.dgsi.pt), onde, entre o mais, se consignou que:
“Neste processo está em causa uma sentença que decreta a adopção sem que se vislumbre qualquer outra finalidade da atribuição de eficácia a tal sentença que não a de mero reconhecimento em Portugal do estado de pais e filho resultante daquela adopção.
Pretende-se, assim, o mero reconhecimento da situação definida na sentença revidenda, sem que se pretenda fazer valer contra quem quer que seja em concreto.
Daí que se nos afigure dever a acção ser proposta pelos directamente afectados no seu estado pela sentença: aqueles que em face dela ficam relacionados familiarmente como pais de um determinado filho. E tanto o poderão fazer em conjunto (por haver coincidência de interesses, como é natural que ocorra as mais das vezes), caso em que não se pretende fazer valer a sentença contra ninguém em concreto; como o poderá fazer qualquer deles individualmente (quiçá por só a ele interessar a produção de efeitos no território nacional), caso em que, para além do simples reconhecimento da situação se pretende, igualmente, a imposição desses efeitos aos demais interessados, pelo que a pretensão haverá de ser deduzida contra eles.”
E que: “Temos pois que no caso dos autos a revisão deve ser pedida conjuntamente pelos pais adoptivos e pelo filho; e sem necessidade de o pedido ser dirigido contra alguém.”
No caso dos presentes autos, o processo de revisão da sentença de adoção é intentado apenas pelos adotantes, sem intervenção do filho, o qual não figura como requerente nem como requerido.
Por outro lado, no formulário que anexa a p.i. consta na indicação da parte requerida “incerto”.
Referem os requerentes que tal indicação, como parte requerida, de “incerto” resulta de na p.i. não existirem demandados incertos, sendo que o não preenchimento da parte relativa ao “Requerido”, independentemente do modo como é concretizado, conduz a que o Citius identifique o “Requerido” como “incerto”.
Ora, se essa indicação resulta ou não do facto de não ter sido preenchida pelos requerentes a identificação da parte requerida e consequentemente o Citius identificar tal parte como “incertos” é questão que verdadeiramente não é suscetível de determinar decisão diversa da decisão singular proferida.
É que continua a estar em falta no presente processo a intervenção de quem foi adotado pelos requerentes através da sentença cuja revisão se pretende.
Sendo menor, a incapacidade judiciária associada a essa situação terá que ser necessariamente suprida através do instituto da representação. Mas terá sempre que ser demandado (caso não seja requerente).
Ou seja, caberia aos requerentes indicar como parte requerida o filho (sem prejuízo da necessária representação) e não o fizeram.
E, portanto, não é demandada no processo a parte que seria legítima (o filho), o que gera uma situação de ilegitimidade.
Considerando o já exposto quanto à insuficiência, para efeitos de possível reversão da decisão singular proferida por este Tribunal, da alegação de que não foram os requerentes a preencher a identificação da parte requerida e sim o Citius identificar tal parte como “incerto”, perde também acuidade a alegação relativa a situações semelhantes ocorridas em outros processos.
De todo o modo, o facto de em processo de revisão análogo (em que eram também requerentes os ora requerentes, mas referente a outro filho) constar no formulário que anexa a p.i. como parte requerida “incertos” e na respetiva sentença terem sido consideradas legitimas as partes, conforme ora referem os requerentes, não releva para a aferição da legitimidade no presente processo, porquanto tal sentença não forma caso julgado formal ou material que possa ser invocado nos presentes autos.
Por outro lado, não está em causa o princípio da igualdade, porquanto se tratam de diferentes processos judiciais (respeitantes à revisão de diferentes sentenças estrangeiras), e os tribunais são independentes, apenas estando sujeitos à lei (cf. 203º da CRP).
A ilegitimidade constitui exceção dilatória de conhecimento oficioso que implica a absolvição da instância, ou o indeferimento liminar quando a petição seja apresentada a despacho liminar (arts 577 al e), 578, 278 nº1 al d), e 590 nº1 do CPC todos aplicáveis ex vi do art 549º, nº 1 do CPC). Não se trata de mera irregularidade suscetível de sanação após despacho de aperfeiçoamento, mas antes de exceção dilatória cuja consequência legal é o indeferimento liminar.
É, pois, de manter o indeferimento liminar.
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IV. DECISÃO:
Pelos fundamentos expostos, acordam as Juízas desta 8ª Seção do Tribunal da Relação de Lisboa em indeferir liminarmente a petição inicial.
Custas pelos requerentes.
Notifique.
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Carla Matos
Maria Carlos Calheiros
Maria do Céu Silva – com voto de vencido em anexo
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Proc. nº 315/24.2YRLSB
Voto de vencido
Quanto à desconformidade entre o conteúdo do formulário e o conteúdo da petição inicial, a mesma podia ser corrigida ao abrigo do art. 7º nº 3 da Portaria 280/2013, de 26 de agosto. Curiosamente, apesar de constar do formulário “incerto” como requerido, tal já não consta do citius.
“No que respeita à legitimidade passiva a observar na acção de revisão de sentença estrangeira, nada se encontra legislativamente consagrado, quanto à intervenção, na mesma, de pessoas distintas e diversas daquelas que tenham sido parte na sentença revidenda” (www.pgdlisboa.pt Sumário do Acórdão do STJ proferido a 26 de maio de 2009, na revista 204/09.0YFLSB).
“… apenas podem ser partes na revisão duma sentença estrangeira relativa a direitos privados as partes que figurarem nessa mesma acção” (www.dgsi.pt Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido a 13 de novembro de 2012, no processo 89/12.0YRCBR).
“… parece não suscitar dúvida de que não podem ser partes (Autor ou Réu) no processo revisão de sentença estrangeira relativa a direitos privados quem não figure como tal na decisão objecto de revisão” (www.dgsi.pt Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido a 9 de dezembro de 2015, no processo 347/15.1YRLSB.L1-7).
“Destinando-se, pois, esta acção a verificar se a sentença estrangeira se encontra em condições de produzir os seus efeitos, como acto jurisdicional, em Portugal, impõe-se necessariamente que ocorra identidade entre as partes que figuram como tal na sentença revidenda e na acção de revisão” (www.dgsi.pt Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães proferido a 8 de novembro de 2018, no processo 84/18.5YRGMR).
Da decisão a rever junta com a petição inicial constam A e B como requerentes. O nome da criança – D - consta da decisão a rever, mas não como parte.
Na petição inicial, os requerentes alegam que D nasceu no dia…, ou seja, continua a ser criança, pelo que, sendo a sua situação idêntica, não tem de figurar como parte na ação de revisão de sentença estrangeira tal como não figurou no processo de adoção.
Pelo exposto, não manteria a decisão objeto de reclamação para a conferência.
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Maria do Céu Silva