Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
8945/13.1TDLSB.L1-9
Relator: MARIA DO CARMO FERREIRA
Descritores: ARQUIVAMENTO DOS AUTOS
ACUSAÇÃO PARTICULAR
ABERTURA DE INSTRUÇÃO
DESPACHO DE PRONÚNCIA
FACTOS RELEVANTES
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/14/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIMENTO DO RECRSO DO ASSISTENTE
Sumário: I - Os actos decisórios são sempre fundamentados devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão.

II - Um despacho de não pronúncia terá de observar o mesmo rigor da fundamentação do despacho de pronúncia. A lei não faz qualquer distinção, e, como decorre do disposto no artº 308º, nº 2 do CPP que: “É correspondentemente aplicável ao despacho referido no número anterior (que se reporta expressamente ao despacho de pronúncia e não pronúncia), o disposto nos nºs. 2, 3 e 4 do artº 283º, sem prejuízo do disposto na segunda parte do nº1 do artigo anterior”, sendo ainda uma decisão sobre o mérito da causa, o Tribunal de recurso só poderá apreciá-la se conhecer os factos que permitiram ao Tribunal acatar aquela decisão e não outra.

III - O disposto no nº 3 do artigo 283 do C.P.P. que comina a nulidade para o despacho de acusação que não contenha “a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança.”, aplicável por força do nº. 2 do artigo 308.º do C.P.P. será esta a consequência da inobservância ou omissão dos factos concretos que possibilitaram ao tribunal concluir pela insuficiência ou suficiência da prova indiciária.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:                     Acordam, em conferência, na 9ª. Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa.

I. RELATÓRIO.

No âmbito do processo supra identificado da 1ª. Sec. Criminal-J6 da Instrução Central da Comarca de Lisboa, o Mº.Pº. decidiu-se pelo arquivamento dos autos de inquérito quanto aos crimes p.p. pelos artigos 360 e 365 do C.P. denunciados pelo Assistente R... contra a arguida S.... Ordenou-se também naquele despacho de arquivamento, a notificação do assistente para querendo, deduzir acusação quanto ao crime de natureza particular, previsto no artigo 180 do C.P., contra a arguida, exarando desde logo o Mº.Pº., que não acompanharia a eventual acusação que viesse a ser deduzida em relação aos factos investigados.

O assistente deduziu então acusação particular contra a arguida, imputando-lhe a prática do crime de difamação p.p. pelo artigo 180-1 do C.P., nas páginas 787 a 818 destes autos.

A arguida requereu a abertura da Instrução relativamente aos factos da acusação particular, nas fls. 992 a 1025 dos autos.

O assistente requereu a abertura da instrução relativamente aos factos objecto do arquivamento do Mº.Pº., nas folhas 884 a 923 dos autos.

O despacho exarado a folhas 1094 dos autos admitiu e declarou a abertura da instrução. Deste despacho foi interposto recurso pela arguida, a fls. 1184.([1])

Realizada a Instrução, foi proferida a decisão Instrutória, constante de fls. 1223 a 1236 dos autos, da qual consta a final:

(transcreve-se)

Face ao exposto e nos termos do disposto nos artºs. 307° e 308° CPP, decido não pronunciar a arguida S... pela prática de um crime de denúncia caluniosa previsto e punido pelo artº. 365° CP, de um crime de falsidade de testemunho agravado previsto e punido pelos artºs. 360° n°.1 e 361° n°.1 b) CP e de um crime de difamação previsto e punido pelo artº. 180° n°.1 CP.

Desta decisão o assistente interpôs recurso, cujas motivações e conclusões constam de fls. 1286 a 1375 dos autos.

Por serem as conclusões que definem o objecto do recurso,([2]) transcrevem-se as mesmas:

1) O Despacho de Não Pronúncia ao omitir os factos suficientemente indiciados e os não suficientemente indiciados e a apreciação critica sobre a prova carreada para os autos está ferido de nulidade, devendo esta ser declarada por esse Venerando Tribunal.

2) A não se entender assim, então haverá que ser proferido despacho de pronuncia contra a arguida pois resulta dos autos prova indiciária mais do que suficiente da prática pela arguida dos crimes pelos quais foi acusada em sede de acusação particular e em sede de RAI, estando reunidos todos os pressupostos de que depende a aplicação à mesma das penas correspondentes.

3) Foram violados os artigos 6º, 20º e 205º nº 1 da CRP e artigos 97º nº 5 e 308º do CPP.

Nestes termos deverá o presente recurso obter provimento com todas as consequências legais.

O Mº.Pº. respondeu ao recurso, nas folhas 1394 a 1398, concluindo como vai transcrito:

1- Não existem nos autos indícios suficientes que permitam imputar à arguida S..., a prática dos crimes de falsidade de testemunho, p. e p. pelo artº 360º, e de denúncia caluniosa, p. e p. pelo art° 365º, ambos do Código Penal,

2-Analisada a prova produzida, verifica-se que, caso fosse sujeita a julgamento, existiria uma séria probabilidade de não lhe ser aplicada qualquer pena, ou seja, de a mesma vir a ser absolvida.

3-Consequentemente, correcta foi a decisão da M. tª Juiz do Tribunal de Instrução Criminal ao proferir o despacho de não pronuncia.

Razão pela qual, deve ser mantido na íntegra o despacho recorrido, assim se fazendo Justiça.

Nas folhas 1382 a 1393, a arguida respondeu ao recurso, concluindo que improcedendo a argumentação da motivação do recurso, deve o mesmo ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão de não pronúncia.

Neste Tribunal, o Ex.mº. Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos e ali aderiu à resposta do Mº.Pº na 1º.Instância.

Corridos os vistos, em conferência, cumpre decidir.

II. MOTIVAÇÃO.

Cumpre agora apreciar os dois recursos:

I.  O da arguida sobre o despacho de recebimento do requerimento para abertura da instrução requerida pelo Assistente.

II.  O do assistente, interposto da decisão de não pronúncia da arguida.

Começaremos pelo que foi interposto pela arguida, relativamente ao despacho que admitiu o requerimento de abertura da Instrução do assistente.

Nas motivações que foram juntas pela arguida/recorrente, de fls. 1184 a 1214 dos autos, concluiu-se:

(transcreve-se)

1ª. Vem o presente recurso interposto do despacho de fls. 1094 dos autos, que admitiu o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente R..., impugnando o despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público quanto aos crimes de falsidade de testemunho e de denúncia caluniosa.

2ª. Resulta do artigo 287.º n.º 2 do CPP que, contrariamente ao que sucede relativamente aos requerimentos de abertura de instrução apresentados por arguidos, em casos de despacho de arquivamento do inquérito proferido pelo Ministério Público, os requerimentos de abertura de instrução apresentados por assistentes não podem limitar-se à mera impugnação do despacho de arquivamento.

3ª. E bem se compreende que assim seja, pois o requerimento de abertura de instrução apresentado por assistente, na sequência de despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público, não tem a antecedê-lo uma acusação que tenha fixado o objeto do processo e delimite o âmbito da eventual pronúncia.

4ª. Assim, o requerimento de abertura de instrução do assistente terá de conter uma acusação em sentido material, descrevendo os factos e indicando as disposições legais que fundamentem a aplicação à arguida de uma pena ou de uma medida de segurança.

5ª. É o que inquestionavelmente se extrai da parte final do supra citado n.º 2 do artigo 287º, onde, depois de se indicarem os requisitos gerais dos requerimentos de abertura da instrução, se determina a aplicação, ao requerimento do assistente, do disposto no artigo 283º n.º 3 alíneas b) e c) do CPP, ou seja, as exigências que, sob pena de nulidade, a acusação terá de satisfazer: “a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada” e “a indicação das disposições legais aplicáveis”.

6ª. É este o sentido da jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores desde há largos anos.

7ª. A ratio da parte final do n.º 2 do artigo 287º do CPP prende-se com o princípio da vinculação temática, uma vez que, tendo o Ministério Público proferido despacho de arquivamento quanto aos crimes de falsidade de testemunho e de denúncia caluniosa, o objeto do processo quanto a estes crimes só poderia ser fixado pelo requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente.

8ª. O requerimento de abertura da instrução apresentado pelo assistente quanto aos crimes de falsidade de testemunho e de denúncia caluniosa deveria fixar também o objeto da instrução, traçando os limites dentro dos quais se haveria de desenvolver a atividade de cognição do Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal e determinando que a decisão instrutória (maxime, de pronúncia) só pudesse recair sobre os factos que foram objeto da acusação material que deveria estar contida no requerimento de abertura de instrução.

9ª. Na ausência de acusação do Ministério Público, a acusação material deduzida pelo assistente quanto aos crimes de falsidade de testemunho e de denúncia caluniosa, em sede de requerimento de abertura de instrução, é pois o que delimita o objeto de processo (no que a estes crimes concerne, evidentemente sem prejuízo da acusação particular deduzida por crime de difamação), como decorrência dos princípios do acusatório e da vinculação temática, garantias fundamentais de uma defesa efetiva da arguida, e ambos princípios constitucionalmente consagrados.

10ª. Além disso, o requerimento de abertura de instrução deduzido por assistente, subsequente a um despacho de arquivamento, também está balizado pela estrutura acusatória do processo.

11ª. As fases subsequentes do processo – fase de instrução, quando a exista, e fase de julgamento – estão dependentes – e estão balizadas – pela necessária e prévia existência da fase de inquérito, à qual estão intrinsecamente ligadas, pois, como é sabido, no momento da dedução da acusação (pelo Ministério Público ou, inexistindo esta, pelo assistente em sede de requerimento de abertura de instrução), estabiliza-se o objeto do processo, conferindo-lhe assim uma estaticidade ou cristalização, que se consubstancia numa vinculação temática quanto aos poderes cognitivos do Juiz.

12ª. Efetivamente, por força do princípio da vinculação temática, o objeto do processo fixa-se numa acusação concreta, não podendo ser proferida nem decisão instrutória de pronúncia, nem decisão condenatória senão relativamente a factos constantes dessa mesma acusação, como resulta dos artigos 1º alínea f), 303º e 359º, todos do CPP.

13ª. Assim, nas fases subsequentes do processo, o Juiz apreciará os factos previamente fixados num concreto libelo acusatório (para além dos factos que, perante estes, foram invocados pela defesa), assim se respeitando, formal e materialmente, a estrutura acusatória do processo, bem como o princípio da vinculação temática que estrutura o processo penal português.

14ª. Com efeito, as limitações decorrentes dos princípios do acusatório e da vinculação temática garantem igualmente a inexistência de incertezas quanto ao objeto da defesa da arguida, ou seja, tais limitações são intrinsecamente conexas com o núcleo das garantias da defesa, impedindo a condenação desta por factos diversos dos constantes da acusação ou da pronúncia, se a houver (sem prejuízo do regime consagrado nos artigos 358º ou 359º, ambos do CPP).

15ª. Em suma, uma instrução que não pudesse legalmente conduzir à pronúncia da arguida seria uma instrução inútil e, como tal, proibida por lei, nos termos do artigo 137º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 4º do CPP.

16ª. Assim, tendo o assistente requerido a abertura de instrução sem a indicação e enunciação de factos concretos imputados à arguida que consubstanciem todos os elementos típicos dos crimes de falsidade de testemunho e de denúncia caluniosa imputados, nos termos de uma acusação em sentido material, a instrução era a todos os títulos inadmissível, por falta de objeto, e portanto, nos termos do artigo 287º n.º 3 do CPP, devia o Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal ter rejeitado o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente.

17ª. Nesse sentido se tem sucessivamente pronunciado, de forma unânime, a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores.

18ª. Por último, ainda se dirá que, se a lei processual penal diz qual é a consequência de falta de narração dos factos no requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente, não tem sentido que haja aqui lugar para a figura do convite ao requerente para apresentar novo requerimento com os factos em falta.

19ª. Nesse sentido expresso fixou jurisprudência o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão n.º 7/2005 (in www.dgsi.pt): “Não há lugar a convite ao assistente para aperfeiçoar o requerimento de abertura de instrução, apresentado nos termos do artigo 287.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, quando for omisso relativamente à narração sintética dos factos que fundamentam a aplicação de uma pena ao arguido”.

20ª. Nos termos acima expostos, o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente R... fixou definitivamente a factualidade imputada à arguida que foi (por ele) qualificada como crimes de falsidade de testemunho e de denúncia caluniosa.

21ª. Só que devia o Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal tê-lo rejeitado, por inadmissibilidade legal, por tal ter sido feito deficientemente, como se passa a demonstrar.

22ª. Efetivamente, impunha-se ao Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal ter aferido se o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente R..., obedecendo às exigências legais que determinam a sua admissibilidade, continha essa imputação concreta de factos, que integrassem necessariamente todos os factos concretos que permitissem uma subsunção nos elementos objetivos e nos elementos subjetivos dos tipos penais imputados à arguida.

23ª. E, ao fazê-lo, deveria ter concluído que tal requerimento de abertura de instrução não obedecia às exigências legais decorrentes dos artigos 286º nº 1 e 287º nº 2 do CPP, sendo pois inevitável a sua rejeição.

24ª. Com efeito, para não ser rejeitado, o requerimento de abertura de instrução apresentado teria de conter a alegação de todos os factos necessários a suportar a pronúncia da arguida S... pela prática dos crimes de falsidade de testemunho e de denúncia caluniosa, nos termos requeridos, por forma a que, caso o Tribunal concluísse que os autos continham indícios suficientes desses factos, pudesse proferir despacho de pronúncia nos exatos termos daquele requerimento, sendo certo que está vedado ao Tribunal proceder a alterações substanciais de factos (V. arts. 303º e 309º nº 1 do CPP) ou aperfeiçoar os já alegados no requerimento de abertura de instrução do assistente R....

25ª. É manifesto que, quanto aos crimes de falsidade de testemunho e de denúncia caluniosa, o requerimento de abertura de instrução omite a narração de todos os factos concretos que permitiriam uma subsunção nos tipos penais imputados, o que impossibilitava ab initio – independentemente do que visse a suceder em instrução – a prolação de uma decisão de pronúncia, porquanto tal implicaria necessariamente uma alteração substancial de factos, ou seja, uma alteração ilegal e inadmissível do objeto do processo.

26ª. Demonstremo-lo, com referência a cada um dos dois crimes pelos quais o assistente R... pretendia a pronúncia da arguida S....

27ª. Para que não houvesse rejeição do requerimento de abertura de instrução do assistente R..., era necessário que os concretos factos nele vertidos suportassem a imputação da prática, pela arguida S..., de um crime de falsidade de testemunho, p.p. pelo artigo 360º n.º 1 do CP.
28ª. Como expressamente resulta da sua leitura, o tipo objetivo consagrado no n.º 1 do artigo 360º do CP tem como elemento essencial a prestação de um depoimento falso.

29ª. Assim, impunha-se incluir, no requerimento de abertura de instrução apresentado, a afirmação/alegação de que a arguida S... prestara um depoimento falso.

30ª. Constata-se porém que os factos com base nos quais se pretende afirmar a existência de um depoimento falso estão formulados apenas de forma subjetiva (cfr. pontos 35, 61 e 208 do capítulo C – «Objecto da Instrução»), ou seja, aludindo apenas ao (pretenso) conhecimento pela arguida da falsidade do seu depoimento, reportando-se, por isso, apenas à tipicidade subjetiva do crime em causa (maxime, ao elemento intelectual do dolo). Mas sem que em lugar algum se tenha afirmado/alegado que ocorreu um depoimento falso por parte da arguida S....

31ª. Ora, estando em causa uma imputação penal, os factos incriminatórios não podem ser interpretados corretiva e extensivamente, pois os princípios do Direito Penal impõem a rejeição de quaisquer interpretações corretivas (em prejuízo da arguida) que extravasem a interpretação declarativa, por tais interpretações serem violadoras dos direitos fundamentais da arguida.

32ª. Assim, em função do que literalmente está escrito no requerimento de abertura de instrução apresentado, é incontornável que não se afirmam factos objetivos que consubstanciem a ocorrência de um depoimento, prestado pela arguida, cujo conteúdo fosse falso.

33ª. Basta pensar na hipótese factual (permitida pela narração contida no requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente) de a arguida estar subjetivamente convencida de que o depoimento que prestara era falso mas este objetivamente não o ser (o que se reconduziria a uma tentativa impossível de falsidade de testemunho, nos termos do artigo 23º n.º 3 do CP, impunível nos termos das disposições conjugadas do n.º 1 deste preceito e do n.º 1 do artigo 360º do mesmo diploma), para se ver como a imputação subjetiva da consciência da falsidade não implica necessariamente a imputação objetiva da prática de um depoimento falso.

34ª. De igual modo, não obstante se imputar o crime na forma agravada prevista no artigo 361º n.º 1 alínea b) do CP, não é afirmado que do alegado falso testemunho tenha resultado demissão de lugar, perda de posição profissional ou destruição das relações familiares ou sociais do assistente mas tão só que “Pretendeu a arguida causar ao assistente punição disciplinar que tinha em vista a demissão de lugar e a perda da sua posição profissional e a destruição das suas relações sociais” (cfr. ponto 212 do capítulo C – «Objecto da Instrução»).     

35ª. Por outro lado, embora a qualificação jurídica dos factos abarque o n.º 3 do artigo 360º do CP, é pura e simplesmente omitida a alegação de que a arguida fora advertida das consequências penais a que se expunha.


36ª. Assim, o requerimento de abertura de instrução apresentado não alega ou narra factos que consubstanciem (necessariamente todos) os elementos típicos do imputado crime de falsidade de testemunho, p.p. pelos artigos 360º nº. 1 e 3 e 361º n.º 1 alínea b) do CP, o que impossibilita ab initio – independentemente do que visse a suceder em instrução – a prolação de uma decisão de pronúncia, porquanto tal implicaria uma alteração ilegal e inadmissível do objeto do processo.

37ª. A falta de imputação de factualidade suscetível de preencher os elementos objetivo e subjetivo do tipo previsto no artigo 365º nºs 1 e 2 do Código Penal é igualmente inquestionável, perante os pontos 34, 205, 210 e 212 do capítulo C do requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente R....

38ª. Desde logo por não ser alegada – e bem, dada a sua inexistência – qualquer denúncia através de falsa imputação de falta disciplinar.

39ª. E também não é alegado o conhecimento e vontade da arguida quanto a todos os elementos do tipo objetivo. O que é desde logo evidente quanto ao elemento subjetivo especial deste tipo penal – a intenção de que contra o assistente se instaurasse procedimento (necessariamente) disciplinar (intenção essa que aliás seria absurda para quem está a prestar depoimento como testemunha em inquérito disciplinar já em curso!).

40ª. Decorre do exposto que o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente R... não contém todos os elementos típicos objetivos e subjetivos dos dois crimes que pretendia imputar à arguida S..., pelo que a mera hipótese de prolação de uma decisão de pronúncia implicaria que previamente o Tribunal viesse aditar os factos não imputados pelo assistente que correspondessem a todos os elementos típicos, objetivos e subjetivos, dos dois crimes em causa e que não constam do requerimento de abertura de instrução, para seguidamente poder concluir pela indiciação dos crimes imputados.

41ª. Estar-se-ia, ao fazer-se esse hipotético aditamento corretivo de factos, em presença de uma manifesta alteração substancial dos factos.

42ª. Sempre estaria legalmente vedado ao Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal fazer a enumeração e descrição dos factos que poderiam indiciar o cometimento dos dois crimes imputados pelo assistente R... à arguida S..., porque isso colidiria com o princípio da vinculação temática e geraria uma alteração substancial de factos inadmissível e uma pronúncia nula.

43ª. Em suma, o não acatamento pelo assistente desta exigência é insuprível. Na verdade, não estando delimitado, no requerimento de abertura da instrução, o indispensável conteúdo fáctico, não só se torna inexequível a instrução, já que o Juiz de Instrução Criminal fica sem saber quais os factos que o assistente quer ver julgados indiciados (e também a arguida fica sem o saber, com todas as consequências que isso acarretaria para a postergação dos seus direitos de defesa), como também, a prosseguir-se a instrução, qualquer despacho de pronúncia que se proferisse na sua sequência sempre seria nulo, nos termos do artigo 309º n.º 1 do CPP.

44ª. Nesse sentido expresso se tem pronunciado, de forma uniforme, a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores.

45ª. Por todo o exposto, deveria ter sido rejeitado o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente R..., por inadmissibilidade legal da instrução requerida, ao abrigo do disposto no artigo 287º n.º 3 do CPP, impondo-se a revogação do despacho que o admitiu.
46ª. O Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 283º n.º 3 alíneas b) e c) e 287º n.º 2 e n.º 3, todos do CPP.
47ª. O Tribunal a quo interpretou e aplicou as normas violadas, entendendo que não se impunha a rejeição do requerimento do requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente, por inadmissibilidade legal da instrução requerida, não obstante não serem alegados todos os factos concretos que permitissem uma subsunção nos elementos objetivos e nos elementos subjetivos dos tipos penais imputados à arguida.
48ª. O Tribunal a quo deveria ter interpretado e aplicado as normas jurídicas em causa concluindo no sentido de, por não terem sido alegados todos os factos concretos que permitissem uma subsunção nos elementos objetivos e nos elementos subjetivos dos tipos penais imputados à arguida, se impor a rejeição do requerimento do requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente, por inadmissibilidade legal da instrução requerida.

NESTES TERMOS, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, REVOGANDO-SE O DESPACHO RECORRIDO E DETERMINANDO-SE A SUA SUBSTITUIÇÃO POR OUTRO QUE REJEITE, POR INADMISSIBILIDADE LEGAL, O REQUERIMENTO DE ABERTURA DE INSTRUÇÃO APRESENTADO PELO ASSISTENTE, ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA!

          O Mº.Pº. respondeu ao recurso, de fls. 1246 a 1250, concluindo que o Requerimento de Abertura de Instrução não violou as disposições legais aplicáveis, nomeadamente o disposto no artigo 287-3 do C.P.P., pelo que o despacho que o admitiu se deve manter.

***

Vejamos então se o requerimento de abertura de instrução que apresentou o assistente satisfaz ou não, as exigências contidas no artigo 283º/3 alíneas b) e c), aplicável ao caso, por força do artigo 287º/2, ambos do C. P. Penal

Preceitua o normativo legal, sob o título “requerimento para abertura da instrução”- (287-2 do C.P.P.) que: O requerimento não está sujeito a formalidades especiais, mas deve conter, em súmula, as razões de facto e de direito de discordância relativamente à acusação ou não acusação, bem como, sempre que disso for caso, a indicação dos catos de instrução que o requerente pretende que o juiz leve a cabo, dos meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito e dos factos que, através de uns e outros, se espera provar, sendo ainda aplicável ao requerimento do assistente o disposto no artigo 283.º,n.º 3, alíneas b) e c).

Por sua vez, as alíneas b) e c) do artigo 283.º do mesmo diploma dispõem que:

A acusação contém, sob pena de nulidade:

a) As indicações tendentes à identificação do arguido;

b) A narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada;

c) A indicação das disposições legais aplicáveis;

d) O rol com o máximo de 20 testemunhas, com a respetiva identificação, discriminando-se as que só devam depor sobre os aspetos referidos no n.º 2 do artigo 128.º, as quais não podem exceder o número de cinco;

e) A indicação dos peritos e consultores técnicos a serem ouvidos em julgamento, com a respetiva identificação;

f) A indicação de outras provas a produzir ou a requerer;

g) A data e assinatura.

É o artigo 286º, nº 1 do Cód. Proc. Penal, que nos diz qual o objeto e finalidade da instrução- a instrução destina-se à comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito, em ordem a submeter ou não a causa a julgamento, importando assim apurar se há indícios suficientes de ter sido cometido, pelo arguido, o crime participado, bastando-se com a suficiência e a possibilidade razoável, em juízo de prognose, de, por força deles, ao arguido vir a ser aplicada, em julgamento, uma pena ou medida de segurança. Em regra, o arguido pretenderá afastar a acusação e o assistente levar a julgamento o arguido, por factos que o Mº.Pº não considerou e, por isso afastou a acusação.

              É, assim essencial, porque exigido pelo art. 287º, nº 2 do C.P.P. que tal requerimento contenha a descrição clara, ordenada, à semelhança do que é exigido para a acusação, seja pública, seja particular, de todos os factos suscetíveis de responsabilizar criminalmente algum arguido- ou seja, a factualidade resultante da atividade ou comportamento do arguido que preencha todos os requisitos objetivos e subjetivos do tipo legal denunciado.[3]

É que o requerimento para abertura de instrução apresentado em caso de arquivamento pelo Ministério Público, equivalerá em tudo a uma acusação, condicionando e limitando, nos mesmos termos que a acusação formal, seja pública, seja particular, a atividade de investigação do juiz e a própria decisão final, instrutória. É que, tal como acontece na acusação, também, no caso, o requerimento de abertura da instrução tem em vista delimitar o thema probandum da atividade desta fase processual. Aliás, a exigência feita ao assistente na elaboração do requerimento para abertura de instrução é a mesma que é feita ao Ministério Público no momento em que acusa. E, é essa perspetiva que se realça no artigo 303º do C.P.P. quando se reporta o caso da alteração substancial dos factos descritos nesse requerimento, sob pena de nulidade, como claramente resulta do disposto no art. 309º, nº 1 do C.P.P. Não poderiam considerar-se em hipotético despacho de pronúncia factos que eventualmente resultassem da instrução e que não tivessem sido alegados no requerimento para abertura de instrução apresentado, pois tal implicaria uma alteração substancial que viciaria de nulidade a decisão instrutória, nos termos do art. 309º do C.P.P.[4]

             Importa ainda salientar que a instrução, nos termos em que a lei vigente a regula, tem natureza judicial e não de atividade investigatória, destinando-se à comprovação judicial da decisão tomada pelo Ministério Público de deduzir, ou não, acusação (art. 286º, nº 1 do Cód. Proc. Penal) e não a constituir um complemento da investigação prévia à fase de julgamento, como já aconteceu no passado e que parece resultar do requerido pela assistente, no caso.

Para além de inviabilizar a possibilidade de realização da instrução (art. 309º do Cód. Proc. Penal), a deficiência de conteúdo (e não de mera forma) do requerimento apresentado implica a nulidade desse mesmo requerimento, a qual vem prevista no art. 283º, nº 3 do C.P.Penal, para que remete o art. 287º, nº 2 (por não conter a narração de factos que fundamentem a aplicação a um concreto arguido de uma pena ou medida de segurança, como o impõe o art. 283, nº 3, als. b) e c) do Cód. Proc. Penal). Ou seja, tem de descrever toda a factualidade típica, objetiva e subjetiva, do crime imputado ao agente, que também deve estar devidamente identificado, isto é: apenas a apresentação de um requerimento do qual constem a enunciação dos factos, o tempo, o lugar, o modo como os agentes procederam para realizar o processo executório ilícito, permitirá ao Tribunal individualizar e suscitar confrontos pontuais donde possa inferir-se uma conclusão diversa da factualidade descrita e que permita ao juiz de instrução operar a reunião necessária dos requisitos legais exigidos na norma citada.

             Ora, no caso concreto, em apreciação, verifica-se, de fls. 884 a 923 uma extensa peça processual. Essa peça foi dividida em pontos temáticos como sejam:

Questão prévia; Razões de facto e de direito relativas à discordância quanto ao despacho de arquivamento; Objecto da Instrução. Neste último ponto, o requerente descreve a factualidade que, no seu entendimento deverá integrar a pronúncia (pontos 1 a 213) dos crimes de falsidade de testemunho agravado p.p. pelos artigos 360-1 e 3, 361-1 b) do C.P.P. e do crime de denúncia caluniosa p.p. pelo artigo 365-1 e 2 do C.P. (disposições legais mencionadas no texto do requerimento).

É certo que o texto do requerimento não apresenta a “clássica” estrutura a que nos habituou o Mº.Pº, mas os factos concretos, relatados estão em consonância com os requisitos objectivos e subjectivos dos tipos legais dos ilícitos imputados. Alguns desenvolvimentos conclusivos e de direito “entremeiam” a descrição, mas tal deve-se à necessidade que o requerente sentiu para fundamentar desde logo a sua perspectiva. Ou seja, não se vislumbram as omissões da matéria concreta que são invocadas pela arguida. Assim se concluindo, nenhum reparo se assaca ao despacho que ordenou a abertura da instrução com base no requerimento do assistente, improcedendo o recurso da arguida nesta matéria.

***

Vejamos agora o recurso da decisão instrutória interposto pelo assistente.

Antes de mais vamos transcrever a decisão objecto do recurso, a fim de melhor se aquilatar das questões colocadas pelo recorrente.

     “ O Tribunal é competente.

                                                               *

        A arguida, alega no requerimento de abertura de instrução que, embora por diversas vezes se afirme na acusação que a arguida sabia que a sua conduta corresponderia à factualidade típica, em passagem alguma da acusação particular é afirmado que a arguida tinha vontade ou queria ou aceitou como necessária ou se conformou com tal factualidade pelo que é insusceptível de alicerçar uma imputação de dolo e menos, ainda, uma concretização de um certo grau de dolo.

         Mais alega que, nos termos em que está formulada, a acusação particular não permite sequer sustentar uma imputação dolosa da conduta da arguida, sendo certo que o tipo penal imputado é necessariamente doloso.

    Alega que a omissão de alegação de todos os factos que fundamentam a aplicação à arguida de uma pena inquina a acusação que está ferida de nulidade, nos termos dos artºs 118º nº.1, 120º nº.3 c), 283º nº.3 b) e 285º nº.3 todos CPP.

         Não tem razão a arguida, uma vez que a acusação particular contém todos os elementos objetivos e subjetivos que consubstanciam a prática do crime de difamação. Veja-se o ponto 165 da acusação onde consta que a arguida agiu livre, voluntária e conscientemente nos seus propósitos de imputar ao assistente factos ofensivos da sua honra….

      Assim, não se declara a nulidade da acusação particular.

*

         Não existem outras nulidades, exceções ou questões prévias a conhecer.

*

    Cumpre, agora, proferir decisão instrutória que será de pronúncia ou de não pronúncia, conforme o juízo que se faça sobre a suficiência ou insuficiência dos indícios de verificação dos pressupostos de que depende a aplicação à arguida de uma pena.

         A finalidade e âmbito da instrução, definida no artº. 286º nº.1 do CPP, consiste em deslocar a investigação sob a égide e direção de um juiz, para obter “a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito, em ordem a submeter ou não a causa a julgamento”.

         Finda a instrução, a decisão de pronunciar tem na sua génese, um juízo sobre os elementos colhidos nos autos, sobre o conjunto da prova indiciária. Resume-se ao conjunto de indícios dos quais possa resultar uma possibilidade razoável de à arguida vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena.  

Não se exige, por conseguinte, o juízo de certeza do julgamento, subjacente à condenação, mas antes um juízo de probabilidade séria e razoável, de modo a que os factos indiciários sejam suficientes e bastantes por forma a que formem um todo persuasivo de culpabilidade da arguida impondo um juízo de probabilidade da sua condenação.        

**

        O assistente acusa a arguida da prática de um crime de difamação previsto e punido pelo artº. 180º nº.1 CP.

         Na acusação particular está, apenas, em causa o depoimento que a arguida prestou, como testemunha, no âmbito dos autos de inquérito nº. 25/2012 que correu termos nos Serviços de Inspeção do Conselho Superior da Magistratura e que integrou o processo disciplinar 2013-192/PD instaurado contra o assistente.

        O assistente entende que os depoimentos prestados pela ora arguida em 11/12/2012, 18/12/2012, 4/1/2013, 11/1/2013, 31/1/2013 no âmbito daquele inquérito, bem como os e-mails enviados em 8/2/2013, 10/2/2013, 11/2/2013, 13/2/2013 pela arguida ao Sr. Inspetor Judicial nesse inquérito, não correspondem à verdade, nomeadamente quando a arguida alude à questão da seleção de uma pessoa para o cargo de director da Aldeia de Bicesse, à contratação da Srª. C..., esposa do Dr. J…, á pretensão em o assistente gerir a frota automóvel da Associação, entre outras questões.

        O assistente acusa a arguida de ter perfeito conhecimento que as declarações por si prestadas eram falsas e que o seu propósito foi atentar contra a dignidade, a honra, a seriedade, a imparcialidade e a isenção do assistente.

*

        No requerimento de abertura de instrução, o assistente pretende, ainda, a pronúncia da arguida pela prática de um crime de denúncia caluniosa previsto e punido pelo artº. 365º nºs 1 e 2 CP e de um crime de falsidade de testemunho agravado previsto e punido pelos artºs. 360º nº.1 e 361º nº.1 b) CP .

         E com base na mesma matéria de facto, o assistente alega que, atento ao teor dos depoimentos prestados pela arguida e o teor do e-mails que enviou ao Sr. Inspetor Judicial, no âmbito do citado processo disciplinar, a arguida pretendeu apresentar o assistente como pessoa sem princípios com interesses próprios e sedenta de poder sabendo que o teor dos seus depoimentos não correspondiam à verdade fazendo falsas afirmações.

        O assistente alega que sofreu e sofre moralmente com a conduta da arguida tendo esta perfeito conhecimento que o seu depoimento no âmbito do inquérito disciplinar movido pelo CSM atentavam contra a sua dignidade, sua honra, seriedade e imparcialidade e tendo prestado juramento legal estava obrigada ao dever de falar a verdade denunciando comportamentos e atitudes do assistente que não correspondiam à verdade e sabendo que eram falsos não se coibiu de os transmitir formalmente ao processo disciplinar. 

 *

         Por sua vez, não se conformando com a acusação particular que lhe imputa a prática de um crime de difamação, no requerimento de abertura de instrução, a arguida alega que as imputações que lhe são atribuídas ou não correspondem a afirmações feitas por si ou estão truncadas ou descontextualizadas.

         Alega que o assistente acusa a arguida de ao prestar declarações o fez “de modo a fazer crer que o assistente era uma pessoa sem princípios, com interesses próprios, sedenta de poder e de controlo absoluto sobre a Associação, desonesta, sem escrúpulos, prepotente, criminoso, manipulador, com interesses ocultos, falsificador e tudo o mais que a sua imaginação lhe permitiu levar a cabo” quando tais palavras nunca foram proferidas pela arguida conforme os autos de declarações de fls. 105 a 119.

         Mais alega que no artº 84º da acusação, o assistente acusa a arguida de enviar um mail ao Exmo. Senhor Inspetor Judicial onde acusa o denunciante de: a) não acatamento das deliberações tomadas; b) ações praticadas contrariando as deliberações; c) decisões pessoais implementadas sem deliberação do órgão…..

             No entanto, a arguida alega que na realidade o que consta da aludida mensagem de correio eletrónico é diferente, é que(…)o modo de operar deste Conselho Diretivo era algo peculiar, no que concerne à “formação das deliberações”, ainda que o meu colega vogal…, o vice presidente… e eu própria tenhamos tentado imprimir um certa disciplina na formação das deliberações que competiam ao Conselho Diretivo, essas tentativas eram relativamente ineficazes, o que levou a uma gestão sem esmero com ocorrências com os seguintes enquadramentos: a)não acatamento das deliberações tomada; b)acções praticadas contrariando as deliberações; c) decisões pessoais implementadas sem deliberação do órgão…..

         Mais alega que, no que diz respeito às mensagens de correio electrónico endereçadas ao Senhor Juiz Desembargador Inspetor Judicial, foi expressamente notificada pelo Senhor Inspetor Judicial para, na qualidade de ex-vogal do CD das Aldeias SOS, “complementar os elementos já fornecidos a estes autos com outros de que ainda disponha” e foi o Sr. Inspetor que lhe deu os seus endereços de e-mail e lhe disse para lhe reencaminhar para tais endereços os e-mails a que a arguida lhe fez referência e em que ele lhe disse ter interesse.

         A arguida alega, também, que vem acusada de falsear os factos que conhecia e que não podia ignorar. No entanto, alega que discordar urbanamente de alguém não é desrespeitar esse alguém, sendo que o assistente sente-se melindrado com a crítica e a discordância.

         Alega que, a título de exemplo, no e-mail enviado pela arguida no dia 10/2/2013 com o assunto: “deliberações tomadas sem reunião validamente” onde dava conta que o assistente deu ordem de venda de ações ao Dr. M... sem deliberação do CD, o que a arguida quis afirmar  é que “outro exemplo da falta de deliberação foi a ordem de venda das ações que o Dr. R... deu ao Sr. M...”, em que a reunião não foi convocada e não é conhecida a respectiva ata. A arguida alega que considerou ser criticável ter-se permitido fazer uma alienação de património sem estar devidamente sustentada por uma deliberação regularmente tomada que, nem sequer, veio mais tarde a ser formalizada por via de ratificação ou outra forma de modo a que ficasse consignando em ata.

           *

           Comete o crime de denúncia caluniosa previsto e punido pelo artº. 365º CP quem, por qualquer meio, perante autoridade ou publicamente, com a consciência da falsidade da imputação, denunciar ou lançar sobre determinada pessoa a suspeita da prática de crime, com intenção de que contra ela se instaure procedimento.

  Tem sido entendido pela jurisprudência mais recente (Ac. Relação da Lisboa de 15.1.2003, in www.dgsi,pt-Ac da Relação de Lisboa) que no crime de denúncia caluniosa o bem protegido não é só a boa realização da justiça, mas também, e principalmente a honra e bom nome do visado pela denúncia.

         A denúncia caluniosa exige a espontaneidade da imputação e existe quando existe a consciência da falsidade da imputação, ou seja, daquilo que se alega e pretende provar. A denunciação deve ser objetivamente e subjetivamente falsa, isto é, deve estar em contradição com a verdade dos factos e o denunciante deve estar plenamente ciente de tal contradição.

        A intenção do legislador foi somente punir as condutas praticadas com dolo direto, quando haja consciência da falsidade da imputação e seja intenção do denunciante que se instaure procedimento.

         O facto de alguém apresentar queixa-crime contra outrem ou simplesmente apresentar participação para processo disciplinar junto da Ordem Profissional respetiva, não significa por si só que o esteja a fazer, apenas, com intenção de prejudicar aquela pessoa.

          O que é o caso nos presentes autos, uma vez que a arguida tendo sido chamada a depor, apenas, esclareceu o que se teria passado fazendo críticas sobre a maneira como o assistente geriu a Associação não se vislumbrando qualquer intenção em o prejudicar.

         *

        O assistente entendeu, ainda, que a factualidade apurada integra a prática pela arguida de um crime de falsidade de testemunho previsto e punido pelo artº. 360º nºs. 1 e 3 CP.

Dispõe o nº. 1 do citado preceito legal que quem, como testemunha, perito, técnico, tradutor ou intérprete perante Tribunal ou funcionário competente para receber como meio de prova, depoimento, relatório, informação ou tradução, prestar depoimento, apresentar relatório, der informações ou fizer traduções falsos, é punido (…).

Por sua vez, o nº.3 do mesmo preceito legal refere que se o facto referido no nº. 1 for praticado depois de o agente ter prestado juramento e ter sido advertido das consequências penais a que se expõe, a pena é de (…)

       A questão é saber se a arguida prestou falso depoimento, entendendo o Tribunal que os indícios são, na verdade, muito ténues.

        Ora, a declaração é falsa quando não corresponde à verdade e neste caso a ora arguida nestes autos, e enquanto testemunha nos autos de processo disciplinar não deixou de faltar à verdade, tendo em conta que estava convencida de que estava a dizer a verdade.

        Não há, pois, indícios de que a arguida tenha querido obstruir a realização da justiça.   

*

           Dispõe o nº.1 do artº. 180º CP que quem, dirigindo-se a terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração, ou reproduzir uma tal imputação ou juízo, é punido (…).

            O elemento distintivo entre a difamação e a injúria consiste na imputação de factos concretos e determinados que sejam ofensivos da honra e consideração do ofendido perante terceiros e sem a presença do ofendido, no caso da difamação, ou a mesma conduta perante o ofendido, no caso da injúria. 

         Estamos perante crime de perigo abstrato o que significa que ocorre com a adopção, pelo agente, de um comportamento objectivamente idóneo a causar a ofensa à honra e consideração de um sujeito, independentemente da concreta causação desse perigo ou da efectiva produção do dano.

        O tipo objetivo de ilícito pode ser perpetrado mediante a imputação de factos, mesmo sob a forma de suspeita ou a formulação de um juízo, ofensivos da honra e consideração de outrem. A pedra de toque na distinção entre aqueles conceitos está em que na imputação de um facto há ausência de valoração e mera constatação de uma realidade, ao contrário da formulação de um juízo.

         O carácter ofensivo da imputação ou do juízo avalia-se, entre outros critérios, a partir das condições ambientais, particularidades da linguagem utilizada no meio, classe social e cultural, grau de educação e instrução, formas de relacionamento, formação moral e laços de parentesco ou doutro género do ofendido e do agente(Ac RP de 30/11/1988, in CJ V, 121), isto é, utiliza-se um critério baseado na impressão que as expressões em causa produziram no homem médio, do meio sócio-económico e cultural em questão, que estivesse na posição do destinatário médio e do visado.

        Quanto ao elemento subjetivo exige-se que o agente represente e queira o comportamento por si adoptado, com consciência da ilicitude dessa conduta, ou seja, que o agente actue voluntariamente, com consciência de que o seu comportamento ofende ou pode ofender a honra e consideração alheia e de que tal é proibido por lei(Ac. RP, de 3/2/1988 in CJ, I, 232; Ac. RP de 18/5/1988, in CJ, III, 180 e Ac. RP de 30/11/1988, in CJ,V, 221)não se tornando necessário que o agente actue com o propósito de ofender(Figueiredo Dias, in RLJ, 116º, 133 e 134; Maia Gonçalves, Código Penal Anotado-8º ed., pg.657).   

         A honra é um bem jurídico complexo que inclui quer o valor pessoal ou interior de cada indivíduo, radicado na sua dignidade, quer a própria reputação ou consideração exterior(Comentário Conimbricense do C.Penal, Tomo I, 1999, pg. 607), enquanto que a consideração é o património do bom nome, de critério, de confiança que cada um pode ter adquirido ao longo da sua vida, sendo como que o aspeto exterior da honra, já que provém do juízo em que somos tidos pelos outros(Simas Santos-Leal Henriques, Código Penal Anotado, 2º vol., pg., 317).

            Há que verificar se as expressões mencionadas e imputadas se encontram abrangidas pela cláusula de exclusão prevista no artº. 180º nº.2 CP .

        Refere este preceito legal que a conduta não é punível quando:

         a)a imputação for feita para realizar interesses legítimos; e

       b)o agente provar a verdade da mesma imputação ou tiver tido fundamento sério para, em boa fé, a reputar verdadeira.          

        Em relação à primeira permissa visa excluir a ilicitude da conduta do agente quando a imputação por si formulada, apesar de ser susceptível de ferir a honra e a consideração do visado, o for na realização de um interesse legítimo no sentido de “interesses públicos legítimos e ainda interesses privados juridicamente protegidos, o mesmo é dizer todos os interesses privados que possam ser objecto de legítima defesa, no primeiro caso se houver uma relação de proximidade entre o agente e o interesse por ele realizado e no segundo se o agente ou alguém muito próximo dele forem o próprio titular do interesse”.

        O que o legislador quis com a previsão desta justa causa de exclusão da ilicitude do crime de difamação foi prever um princípio de ponderação de interesses, pois, em certos casos quando está em causa um motivo relevante, sério e determinado pela utilidade geral do fim que visa prosseguir, a imputação feita pelo agente, apesar de ser susceptível de ofender a honra e a consideração do visado, não é punível, desde que cumulativamente, se faça prova da verdade da imputação, na parte em que colide com o direito à honra ou que a mesma seja tida, de boa fé, como verdadeira pelo agente.

        A arguida ao prestar declarações perante o Sr. Inspetor Judicial estava convicta da veracidade dos factos o que exclui a sua responsabilidade.

           Dos elementos constantes dos autos verifica-se que a arguida, apenas, relatou factos relativos à atuação do Conselho Diretivo das Aldeias SOS e nunca, em momento algum, utilizou expressões que pudessem ofender a honra e o bom nome do assistente.

          Tal como a arguida declarou no auto de interrogatório de fls. 251, o que se verifica é que existiam discordâncias a nível de procedimentos, rigor e transparência entre ela e alguns membros do CD entre eles o assistente, presidente do CD, e considerando que os critérios de rigor e transparência não estavam a ser cumpridos, a arguida pediu a sua demissão em 1/2/2012.  

         Na verdade, a arguida ao juntar vária documentação ao processo disciplinar, após notificada para o fazer, deu conhecimento da sua posição quanto a situações que em seu entender considerava menos claras e que terão provocado desentendimento entre ela e o assistente, como por exemplo, o não cumprimento de procedimentos, tomada de decisões sem prévia discussão nos órgãos competentes, atas sem os suportes documentais, entre outras.

        Conforme, ainda, o auto de interrogatório de fls. 251, a arguida declarou que agiu com o sentido do cumprimento do dever perante a Associação e de colabora com o CSM como lhe foi solicitado. Mais declarou que tomou uma posição crítica quanto a procedimentos havidos e que não tinha como corretos em face dos códigos de boas práticas a nível internacional das Aldeias SOS e não quanto às pessoas em si.

      Do teor da documentação retira-se que a arguida quis demostrar as discordâncias relativamente a questões que tinham procedimentos de rigor na sua formalização a documentação em atas a falta de concursos ou a falta de discussão prévia nos órgãos competentes.

       Veja-se o relatório final proferido no processo disciplinar nº. 2013-192/D onde se conclui ter existido por parte do ora assistente, ali arguido, “violação dos deveres próprios e exigíveis às funções de juiz, violações que alegadamente colocaram em crise o prestígio da magistratura”.

         Não existem, assim, indícios de que as afirmações da arguida não sejam verdadeiras.

*

     Como ensina o Prof. Figueiredo Dias - in Direito Procesual Penal, vol I, pág. 133 -  “os indícios só são suficientes e a prova bastante, quando já em face deles seja de considerar altamente provável a futura condenação do acusado ou quando esta seja mais provável que a absolvição”.

          Não se basta a lei com um mero juízo subjetivo, mas antes exige um juízo objetivo fundamentado nas provas dos autos. Da análise destas provas há-de resultar a convição da forte probabilidade de que a arguida seja responsável pelos factos constitutivos do crime,

         Ora, do caso em análise, apreciando a prova produzida e pelas razões expostas não se pode concluir pela existência de tal probabilidade. 

*

       Face ao exposto e nos termos do disposto nos artºs. 307º e 308º CPP, decido não pronunciar a arguida S... pela prática de um crime de denúncia caluniosa previsto e punido pelo artº. 365º CP, de um crime de falsidade de testemunho agravado previsto e punido pelos artºs. 360º nº.1 e 361º nº.1 b) CP e de um crime de difamação previsto e punido pelo artº. 180º nº.1 CP.

        Custas a cargo do assistente fixando-se a taxa de justiça em 2UC - artºs. 515º nº.1 a) CPP e 7º nº.4 RCP.  

        Notifique.”          

Conhecendo da  primeira questão invocada-  nulidade da decisão Instrutória, por omissão dos factos não suficientemente indiciados e suficientemente indiciados.

Nos termos do nº 5 do artº 97º do C.P.P., “os actos decisórios são sempre fundamentados devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão”. Ou seja, exige-se assim o assegurar da fundamentação do juízo decisório e o permitir aos interessados ou destinatários não só o conhecimento das razões de facto e de direito por que foi tomada aquela decisão como, por outro lado, a permitir a sua sindicância através da possibilidade do exercício do direito ao recurso.

Por aplicação do disposto no artigo 308 e 307-1 do C.P.P. a fundamentação pode mesmo ser efectuada por remissão para a acusação ou para o requerimento de abertura da instrução.

Poderá colocar-se a questão de saber se um despacho de não pronúncia terá de observar o mesmo rigor da fundamentação do despacho de pronúncia. Cremos que sim. A lei não faz qualquer distinção, e, como decorre do disposto no artº 308º, nº 2 do CPP que: “É correspondentemente aplicável ao despacho referido no número anterior (que se reporta expressamente ao despacho de pronúncia e não pronúncia), o disposto nos nºs. 2, 3 e 4 do artº 283º, sem prejuízo do disposto na segunda parte do nº1 do artigo anterior”, sendo ainda uma decisão sobre o mérito da causa, o Tribunal de recurso só poderá apreciá-la se conhecer os factos que permitiram ao Tribunal acatar aquela decisão e não outra.

Seguimos assim o entendimento doutrinário do Conselheiro Maia Costa, em comentário ao artº 308º do Código de Processo Penal, p. 1024, “O despacho de não pronúncia por insuficiência de indícios deverá fixar expressamente quais os factos considerados não suficientemente indiciados. É que sobre tais factos forma-se caso julgado, em termos de ser inadmissível a reabertura do processo face á eventual descoberta de novos factos ou meios de prova, ao contrário do que acontece com o inquérito arquivado, que pode ser reaberto se forem descobertos factos novos (artº 279º, nº1). Esses elementos novos só poderão ser considerados por meio de recurso de revisão”.

Também para Paulo Pinto de Albuquerque (“Comentário do Código de Processo Penal”,  pág. 769), “A narração dos factos que não estão suficientemente indiciados no despacho de pronúncia é fundamental, porque é sobre esses factos que incide o efeito de caso julgado. A delimitação objectiva e subjectiva rigorosa dos factos no despacho de não pronúncia constitui (...) a garantia última da segurança jurídica do arguido”.

Assim se entendendo, e, atento o disposto no nº 3 do artigo 283 do C.P.P. que comina a nulidade para o despacho de acusação que não contenha “a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança.”, aplicável por força do nº. 2 do artigo 308 do C.P.P. será esta a consequência da inobservância ou omissão dos factos concretos que possibilitaram ao tribunal concluir pela insuficiência ou suficiência da prova indiciária.

Depois, atendendo ao princípio da subsidiariedade da nulidade sanável, e, não fazendo esta nulidade parte do elenco de nulidades descritas nas alíneas a) a f) do artº 119º do CPP, e estando em causa despacho de não pronúncia, entende-se que só poderá tratar-se de nulidade sanável e dependente de arguição.

Sobre esta questão seguimos de perto o expresso no acórdão da Rel.do Porto, de 07.07.2010 (Des. Jorge Gonçalves):

“Ainda assim, admitimos que, quando referida a uma acusação ou ao despacho de pronúncia, tal nulidade – por omissão dos factos imputados ao arguido, pelos quais deverá responder em julgamento - seja considerada insanável, tendo em vista a lógica do sistema.

Realmente, se a falta de narração dos factos na acusação pode ser conhecida oficiosamente, levando à rejeição desta como manifestamente infundada [artigo 311.º, n.º3, alínea b)], não faria sentido que a falta de factos no despacho de pronúncia não pudesse ser objecto do mesmo tipo de conhecimento em sede de recurso.
Por outras palavras: os casos referidos no n.º 3 do artigo 311.º que se contêm nas previsões das alíneas do n.º 3 do artigo 283.º reconduzem-se a uma forma de nulidade “sui generis”, insanável e de conhecimento oficioso.

Os demais casos do n.º3 do artigo 283.º, não subsumíveis à previsão da acusação manifestamente infundada, reconduzem-se ao regime geral das nulidades sanáveis e dependentes de arguição.

Daí que, tratando-se, no caso, não de um despacho de pronúncia, mas antes de um despacho de não pronúncia, a falta de fundamentação (e omissão de pronúncia) se traduza numa nulidade que é sanável e dependente de arguição”.

Ora, no entendimento que vimos a expressar e, no que ao caso concreto respeita, fácil é concluir que não obstante a rigorosa e bem fundada posição da decisão, ela não contem (nem por remissão ao requerimento de abertura da instrução) ao factos que, concretamente foram considerados como indiciados e não indiciados, de modo a permitir a este Tribunal de recurso fazer a correcta sindicância no sentido da confirmação ou não da decisão recorrida.([5])

Nos autos, das folhas 1271 a 1281 verificamos que a nulidade em referência foi invocada pelo assistente  e conhecida no despacho judicial que sustentou a decisão e recebeu o recurso (cfr. fls. 1376 e 1377), verificando-se assim a regularidade da sua arguição, o que permite a este Tribunal o seu conhecimento.

Assim se concluindo, declara-se a nulidade da decisão, que deverá ser substituída por outra da qual constem os factos concretos, enumerando os indiciados e os não indiciados, ainda que por referência ao requerimento de abertura da instrução.


II-DECISÃO.


Nestes termos, acordam os Juízes da 9ª Secção Criminal desta Relação de Lisboa em:

A) considerar improcedente o recurso da arguida.

B) procedente o recurso do assistente e, consequentemente, declarar a nulidade da decisão instrutória recorrida, que deve ser substituída por outra onde se fixe a matéria factual indiciada e não indiciada por referência ao requerimento de abertura da instrução.

C) Não conhecer das demais questões suscitadas no recurso do assistente, por se mostrarem prejudicadas.


Fixo em 3Ucs. a taxa de justiça devida pela arguida.

(Acórdão elaborado e integralmente revisto pela relatora – artº 94º, nº 2 do C.P.Penal)


Lisboa, 14/04/2016

                                                                       

Maria do Carmo Ferreira

Cristina Branco

_______________________________________________________

[1] Neste recurso admitido a fls. 1216 viria a ser alterado o regime de subida, fixando-se o regime de subida conjunto com o do recurso entretanto também interposto pelo Assistente, da decisão instrutória (fls. 1408).

[2] É jurisprudência constante e pacífica (acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 24.03.1999, CJ VII-I-247 e de 20-12-2006, em www.dgsi.pt) que o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação (art.s 403º e 412º do Código de Processo Penal), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art. 410º nº 2 do Código de Processo Penal e Ac. do Plenário das secções criminais do STJ de 19.10.95, publicado no DR Iª série-A, de 28.12.95).

[3] Ac.R.Coimbra de 23/1/2008, relatado pelo Sr.Desembargador Gabriel Catarino: “ Não se encontrando individualizados e arrumados os factos pela ordem e alinhamento que possibilitem esse exercício de joeiramento não será possível ao juiz cumprir este desígnio normativo. Impõe-se, pois, em nosso juízo, que o requerimento para abertura da instrução contenha um alinhamento factual susceptível de sobre ele poder ser produzida prova.”

[4] Ac.R.Lx de 10/1/2007:Intimamente conectada com esta exigência está o regime de nulidades inserto no artigo 309.º, n.º 1 do CPP ao taxar de nula a decisão instrutória “na parte em que pronunciar o arguido por factos que constituam uma alteração substancial dos descritos na acusação do Ministério Público ou do assistente ou no requerimento para abertura da instrução”. Parece-nos que mais uma vez o legislador quis conferir ao requerimento para abertura da instrução uma feição e estrutura similar ao de um requerimento em que o Ministério Público ou o assistente requerem ao tribunal a introdução de um feito que eles reputam de revestir natureza criminosa ou que contem os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança”.

[5] No mesmo entendimento, a título exemplificativo citamos o Ac.R.P. de 17/2/2010 e de 16/9/2015, da R.E. de 17/6/2014, da R.G. de 4/5/2015, da R.C. de 13/11/2013 e da R.Lx de 7/5/2013- em dgsi.pt