Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1396/16.8BELSB.L1-7
Relator: CONCEIÇÃO SAAVEDRA
Descritores: CERTIFICADOS DE AFORRO
PRESCRIÇÃO
PRAZO
REGISTO CENTRAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/20/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I- O IGCP atua em representação do Estado na gestão dos certificados de aforro e no controle dos prazos de prescrição aos mesmos respeitantes, assistindo-lhe, por isso, o direito de se opor à transmissão ou reembolso respetivo com fundamento na prescrição;
II- Em 2008, foi criado o registo central de certificados de aforro, gerido pelo IGCP, que tem por finalidade possibilitar a obtenção de informação sobre a existência de certificados de aforro e sobre a identificação do respetivo titular;
III- Com a criação desse registo central de certificados de aforro que permite, além do mais, aos herdeiros de pessoa falecida saber se esta era subscritora dos títulos e dos respetivos saldos, ficaram tais herdeiros em condições de exercer o seu direito face aos mesmos, nos termos e para os efeitos do art. 306, nº 1, do C.C.;
Tendo o aforrista falecido antes de 2008, o prazo de prescrição de 10 anos a que se refere o art. 7 do DL nº 172-B/86, de 30.6, deve contar-se da data da criação do referido registo central de certificados de aforro.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I- Relatório:
MF…, SF… e EF…, vieram propor contra a AG… - IGCP, E.P.E., junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, ação de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias (art. 109 e ss. do CPTA), pedindo a condenação do R. a reconhecer, sem qualquer reserva, o direito de propriedade plena das AA. sobre os certificados de aforro que pertenciam a MC…, falecida em 12.11.2004, devendo o R. ser intimado a não proferir qualquer ato, adotar qualquer conduta ou operação material que impeça, impossibilite e/ou não permita o normal exercício do direito de propriedade plena sobre os sobreditos certificados de aforro, e, em consequência, seja o R. condenado a transmitir ou a pagar às AA. os valores constantes desses certificados de aforro, acrescidos da respetiva remuneração até integral pagamento. Invocam, para tanto e em síntese, que são filhas e únicas herdeiras da referida MC…, falecida a 12.11.2004, mas apenas em 15.1.2014, na sequência de carta que lhes foi remetida pelo R., souberam que aquela era titular de uma conta aforro junto do R. e dona dos certificados de aforro da Série B ali existentes. Tendo reclamado o reembolso do valor respetivo, o R. veio a recusar tal pedido com fundamento na prescrição, por terem decorrido mais de dez anos sobre a data do óbito da indicada MC…. Dizem as AA. que a prescrição não ocorreu em virtude do seu direito ter sido reconhecido pelo R., por ter sido exprimida pelas AA. a intenção de exercer o direito, por não terem decorrido os 10 anos de prescrição e por renúncia tácita do R. à mesma.  
Na contestação, e para além de outras exceções invocadas, defende o R. a prescrição do direito das AA. uma vez que o referido prazo é de dez anos contados da morte do aforrista, nos termos do art. 7 do DL nº 172-B/86, de 30.6, na alteração introduzida pelo DL nº 122/2002, de 4.5, e que o referido prazo não se suspendeu, nem interrompeu, por qualquer forma.
As AA. responderam.
Proferida sentença no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que julgou improcedente a exceção de prescrição e condenou o R. ao reembolso, interpôs este recurso. Por acórdão de 2.3.2017 do Tribunal Central Administrativo Sul, foi a referida sentença revogada, declarada a incompetência material dos Tribunais Administrativos e, em consequência, absolvido o R. da instância.
Rejeitada a revista para o Supremo Tribunal Administrativo, foram os autos remetidos para o Juízo Local Cível de Lisboa.
Realizada audiência prévia, foi proferido despacho saneador que conferiu a validade formal da instância, identificou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova, fixando ainda o valor da causa em € 29.790,35.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi, em 14.12.2017, proferida sentença nos seguintes termos: “(...) julgo a acção totalmente procedente, por provada, e consequentemente condeno o Réu a reconhecer o direito de propriedade das autoras, enquanto herdeiras da herança aberta por óbito de MC…, sobre os certificados de aforro identificados no Relatório e a pagar-lhes o correspondente valor de € 29.790,35€ (vinte e nove mil setecentos e noventa euros e trinta e cinco cêntimos), acrescido dos juros de mora vencidos desde a citação e vincendos até integral pagamento, à taxa legal. 
Custas a cargo do R (art.º 527.º/1/2 do C.P.C.).”
Inconformado, interpôs recurso o R., culminando as alegações por si apresentadas com as seguintes conclusões que se transcrevem:
 “
I. A Apelante fez prova no processo de que o prazo prescricional de 10 anos relativo aos certificados de aforro em causa, que se iniciou com a ocorrência do óbito da aforrista em 12.11.2004, decorreu sem que as herdeiras tivessem apresentado motivo suspensivo ou interrompido o prazo de prescrição, nos termos da lei civil;
II. A Apelante fez prova de que as AA apenas entregaram a sua pretensão aos certificados, assim como todos os quatro documentos necessários à sua habilitação enquanto herdeiras, em 22.01.2016;
III. A Apelante fez referência às diversas normas que lhe conferem atribuições e competências legais para verificar e controlar os prazos de prescrição relativos aos certificados de aforro (sem possibilidade de renúncia por parte do IGCP a tal prazo prescricional), bem como para gerir estes títulos representativos da dívida pública direta do Estado e, ainda, para gerir o FRDP;
IV. A Apelante fundamentou que possui personalidade judiciária, capacidade judiciária e os seus estatutos lhe atribuem competência para se representar em tribunal, de modo a ser parte num litígio, no qual tem todo interesse direto em contraditar e se defender.
V. O IGCP fez todas as diligências que lhe competiam (e ainda mais do que lhe competia) para com tempo suficiente alertar os eventuais herdeiros da falecida aforrista de que existiam títulos de dívida pública a prescrever dali a 10 meses e, bem assim, informou sobre todos os documentos a apresentar pelas herdeiras de modo a poderem exercer os seus direitos, se assim entendessem;
VI. Se houve falhas ao longo de todo este processo não foram cometidas pelo IGCP, pelo que não é justo que sofra a condenação neste litígio;
VII. Embora seja compreensível que o desfecho da prescrição dos títulos de dívida pública titulados pela sua progenitora seja dececionante para as herdeiras, tal situação não se ficou a dever à conduta do IGCP mas antes aos diversos comportamentos, no mínimo, negligentes tidos pelas AA;
VIII. No presente caso, não podemos esquecer o disposto no art.º 6.º do CC, quando se determina que: “A ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas.”
IX. Em face dos motivos expostos, e outros que certamente esse Doutro Tribunal suprirá, a decisão ora recorrida deve ser revertida no sentido de se considerar que a Apelante fez prova do facto extintivo da prescrição.”
Pede a procedência do recurso e a improcedência da ação, decretando-se a prescrição dos certificados de aforro em apreço.
Em contra-alegações, sustentaram as AA. o acerto do julgado.
O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito suspensivo condicionado à prestação de caução. Veio a ser julgada validamente prestada a caução pelo R. no Apenso respetivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

                                                  ***
II- Fundamentação de facto:
A decisão da 1ª instância fixou como provada a seguinte factualidade:

Da Petição:
A) No dia 12.11.2004, faleceu MC…, no estado de viúva de AO….
B) As autoras foram habilitadas como únicas herdeiras de MC….
C) À data do óbito MC… era titular de certificados de aforro da Série B, com data de subscrição de 03.03.1997, correspondentes à subscrição n.º …-…, num total de 6537 unidades no valor total de € 29.790,35 (vinte e nove mil setecentos e noventa euros e trinta e cinco cêntimos) (à data da entrada em juízo da douta Petição nos Tribunais Administrativos); 
D) As AA desconheciam a existência de tais certificados de aforro, tendo tomado conhecimento da sua existência em data não concretamente apurada mas posterior a 15.01.2014;
E) A 1.ª A, cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de MC…, não mencionou os certificados de aforro objecto dos autos na relação de bens apresentada nos Serviços de Finanças, em 20.01.2005, para efeitos de participação do óbito;
F) O Réu enviou para a morada registada no sistema, a carta, junta como documento nº 3, dirigida aos herdeiros da falecida aforrista alertando para o prazo de que prescrição que iria ocorrer no dia 12.11.2004 e quais os procedimentos que deveriam ser desencadeados, para que os herdeiros reclamassem os seus direitos sobre os certificados de aforro.
G) Depois de tomarem conhecimento da carta aludida em F), as AA procuraram em casa da falecida mãe os certificados de aforro mas não os encontraram;
H) Em Agosto de 2014, 1.ª A foi sujeita a cirurgia para remoção de carcinoma;
I) Só após essa cirurgia a 1.ª A se sentiu capaz para tratar junto do R do pedido de reclamação de certificados de aforro; 
J) No dia 31.10.2014, a A telefonou para os serviços da Ré, perguntando o que tinha de fazer para requerer a transmissão dos certificados de aforro; 
K) Nesse dia, a A dirigiu-se ao balcão dos CTT do Centro Comercial Colombo, em Lisboa, dando conta oralmente da vontade de conseguir a transmissão dos certificados de aforro a favor das herdeiras; 
L) O Réu tem um contrato de prestação de serviços com os CTT, que permite receber determinados pedidos dirigidos ao IGPC EPE nos balcões dos CTT. Alguns dos pedidos podem ser respondidos de imediato. No entanto, é seu entendimento nestes autos que para outros assuntos, como o processo de Habilitação de Herdeiros e o respectivo requerimento deverá ser efectuado junto do IGCP EPE.
M) A funcionária do R transmitiu à 1.ª A que tinha que preencher um formulário denominado “Pedido de Certidão dos Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro detidos pelo Aforrista falecido”, que a 1.ª A nesse dia preencheu e entregou nos Correios; informou ainda a 1.ªA que tinha que declarar os certificados de aforro nas Finanças, para efeitos de liquidação de imposto de selo;
N) Para obtenção da certidão, a 1.ª A pagou de imediato nos Correios, enquanto representante do IGCP, a quantia de 10€, acrescida de 1,48€;
O) Em 18.11.2014, o Réu remeteu à 1.ª A carta, mediante a qual lhe transmitiu o seguinte:
 “ (…) 
N.º Ent. 30586
(…)
Reportando-nos ao pedido de V.ª Exa. Datado de 31 do mês findo, rececionado nesta Instituição em 5 do corrente, cumpre-nos informar que para que lhe seja enviada uma declaração com o valor existente à data do óbito em nome de MC…, titular da conta aforro n.º …, torna-se necessário remeter-nos o original ou fotocópia certificada do assento de óbito ou da escritura de habilitação de herdeiros, bem como elementos de identificação da mesma. 
Na resposta agradecemos indicação da nossa referência.”
P) Posteriormente, o R, IGCP, emitiu e entregou à A um documento escrito denominado “DECLARAÇÃO”, com data de 18.11.2014, onde consta a identificação e descriminação dos Certificados de Aforro que existiam em nome da falecida, indicando o valor de 21.798,02€, à data do óbito; 
Q) No dia 23.12.2014, a 1.ª A entregou nos Serviços de Finanças n.º …, requerimento de liquidação adicional de bens, relativo aos Certificados de Aforro, juntando a Declaração do IGCP de 18.11.2014; 
R) Em Março de 2015, a 1.ª A deslocou-se ao IGCP, com documentação para continuar a instrução do processo de reembolso
S) No entanto, a 1.ª A não entregou nenhum documento, porque faltava a relação de bens das Finanças, com a indicação ou relacionamento dos certificados de aforro; nessa altura, foi-lhe entregue um Extracto dos Certificados de Aforro, com valor destes à data de 24.03.2015, continuando como titular daqueles a mãe das AA;
T) No dia 09.04.2015, o Serviço de Finanças Lisboa … entregou à 1.ª A o Modelo 1 do Imposto de selo, com a Relação de Bens, onde já estão incluídos os Certificados de Aforro, como verba n.º 2 e a Liquidação de isenção; 
U) No dia 22.01.2016, a 1.ª A entregou no IGCP requerimento de Habilitação de Herdeiros (modelo 706), instruído com “escritura de habilitação de herdeiros”, “participação da relação de bens onde deverão estar incluídos todos os certificados de Aforro (…)”, cópia de “documentos de identificação civil” e contribuinte; “NIB” e uma carta dirigida à Sr.ª Presidente do IGCP”
V) Em 15.02.2016, o IGCP enviou à 1.ª A uma carta, pela qual declarou o seguinte: 
“(…)
N.º ENT: 3088
Assunto: Certificados de Aforro – Série B* Prescrição
Reportando-nos ao pedido de V. Exa. E restantes herdeiros, rececionado nesta Instituição em 22 do mês findo, através do qual solicitou o reembolso dos certificados de aforro, em nome da Senhora MC…, cumpre-nos informar que, ao abrigo do art.º 12.º do decreto-lei n.º 122/2002, de 4 de maio, qualquer montante existente em nome da falecida foi considerado prescrito a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública por não ter sido reclamado, pelos herdeiros, dentro do prazo legalmente estipulado para o efeito – dez anos a contar da data do óbito do titular.”
X) Em 23.03.2016 as AA remeteram carta ao IGCP, mediante a qual reiteraram a sua posição, o que não foi atendido, conforme resposta daquela Instituição de 01.04.2016; 

Da Contestação:
Z) O “Pedido de certidão dos certificados de Aforro e Certificados do Tesouro detidos pelo Aforrista falecido” foi entregue no balcão dos CTT do Centro Comercial Colombo - cf. carimbo aposto no doc. 3, tendo dado entrada no IGCP em 05/11/2014;
AA) Em 2 de Fevereiro de 2012, o R. e o Instituto de Registos e Notariado (adiante IRN) celebraram um protocolo visando o cruzamento dos dados dos clientes aforristas existentes na plataforma informática interna de CA do R. e a base de dados de óbitos dos cidadãos do IRN
AB) Após o cruzamento dos dados das duas plataformas, o IGCP tomou conhecimento em 10/05/2012 que a Sr.ª MC… havia falecido em 12/11/2004.
AC) Na posse de informação de decesso da titular aforrista, o R. imobilizou a conta aforro em 10.05.2012.
AD) Até ao cancelamento do envio de extractos em 2012, foram remetidos para a morada constante como sendo a da titular da conta aforro, Sr.ª MC…
AE) A única morada afecta à conta aforro n.º … que o R. dispunha era a seguinte: “Travessa …, n.º … – …º, …-… Lisboa”

Outros factos que resultaram provados na sequência do julgamento: 
- O valor dos certificados de aforro, à data de 21.01.2016, era de € 29.790.35€ (vinte e nove mil setecentos e noventa euros e trinta e cinco cêntimos)
- A 1.ª A deslocou-se ao IGCP, com documentação para continuar a instrução do processo de reembolso pelo menos em 26.11.2014, 21.01.2016 e 28.01.2015
- No IGCP a senhora funcionária encarregue de receber o modelo 706 tem por prática recusar dar entrada desse modelo até que este se mostre acompanhado pela documentação referida numa circular interna.
- Consta da página do IGCP a seguinte informação:
“(…) 
Os herdeiros deverão deduzir os seus direitos aos certificados de que o falecido ainda é titular, devendo instruir um processo de habilitação, tendo em conta os documentos necessários, abaixo nomeados, assim como a legislação em vigor. Todos os documentos apresentados deverão ser originais ou cópias autenticadas:
1) Preenchimento do impresso/requerimento Modelo 706 - IGCP, E.P.E, disponível também nas lojas dos CTT ou na página do IGCP, E.P.E. (formulários);
O requerimento em questão deverá ser preenchido e assinado por todos os herdeiros, ou por quem os represente, devendo as assinaturas ser reconhecidas por uma das entidades legalmente habilitadas para o efeito, a saber – conservadores, notários, advogados ou solicitadores. Em alternativa poderá este requerimento ser assinado presencialmente numa loja dos CTT ou no IGCP, E.P.E.;
2) Escritura notarial de habilitação de herdeiros do falecido ou procedimento simplificado de habilitação de herdeiros e registos;
3) Comprovativo de participação de transmissões gratuitas (modelo 1) - Imposto de Selo à Autoridade Tributária e Aduaneira, na qual constem os certificados à data do falecimento; 4) Indicação dos dados do cartão do cidadão ou bilhete de identidade e cartão de contribuinte do falecido;
5) Indicação dos dados dos cartões de cidadão ou bilhetes de identidade e cartões de contribuinte de todos os herdeiros;
6) Certificado(s) de aforro a que se habilita(m). No caso de não estar(em) na posse desses certificados, deverá(ão) apresentar a necessária justificação no impresso Modelo 706;
7) Em caso de averbamento e para novos clientes, ou para inclusão de IBAN em contas aforro já existentes, deverá ser preenchido o impresso Modelo 701 – IGCP, E.P.E. disponível também nas lojas dos CTT ou na página do IGCP, E.P.E. (formulários), em nome de cada herdeiro, assinado presencialmente pelo respetivo titular ou com assinatura reconhecida conforme acima indicado ou validada por loja dos CTT, juntando os respetivos comprovativos de morada e IBAN;
8) Documento(s) do(s) banco(s) com o IBAN (número internacional de conta bancária) da conta(s) à ordem, no caso de pretenderem o resgate do(s) certificado(s);
9) Caso algum herdeiro se faça representar por procurador, deverá ser remetida  indicação dos dados do cartão de cidadão ou do bilhete de identidade do procurador e procuração devidamente autenticada com poderes específicos para o ato. No caso de o procurador ser advogado deverá ser remetida fotocópia da cédula profissional deste;
10) Testamento, caso exista;
11) Escritura de partilha, caso exista, sendo apenas necessária a intervenção dos herdeiros a quem foram atribuídos os certificados;
12) Certidão judicial, caso exista, acompanhada das competentes peças do processo de inventário – auto de declaração de cabeça de casal, relação de bens, ata de conferência de interessados, mapa de partilha, conclusão ou similares, quando a partilha seja feita por via judicial, sendo apenas necessária a intervenção dos herdeiros a quem foram atribuídos os certificados;
13) No caso de um dos herdeiros ser menor, interdito ou inabilitado;
a) Escritura notarial de partilha precedida de autorização judicial (cf. art.º 1889, n.º 1 do
CC) ou;
b) Certidão extraída do processo de inventário judicial, conforme referido no ponto 12) ou;
c) Assinatura pelos representantes legais da declaração Modelo 711, em caso da existência de um só herdeiro menor, interdito ou inabilitado e em que o total lhe seja atribuído, que pode ser obtida numa loja dos CTT ou na página do IGCP, E.P.E. (formulários), que ateste que não foi realizada partilha extrajudicial sem precedência de autorização judicial, que a herança/legado não tem encargos e que se concorda com o averbamento e a imobilização dos certificados até à cessação de incapacidade do representado.
Os Certificados de Aforro estão sujeitos a imposto de selo. Os herdeiros legitimários beneficiam, todavia, de isenção de tal imposto. (…)” 
(https://www.igcp.pt/pt/menu-lateral/certificados-de-aforro/habilitacao-de-herdeiros/
***
III- Fundamentação de Direito:
Como é sabido, são as conclusões que delimitam o âmbito do recurso. Por outro lado, não deve o tribunal de recurso conhecer de questões que não tenham sido suscitadas no tribunal recorrido e de que, por isso, este não cuidou nem tinha que cuidar, a não ser que sejam de conhecimento oficioso.
De acordo com as conclusões do apelante, em causa estará decidir se prescreveu o direito das AA. à entrega ou reembolso do valor dos certificados de aforro pertencentes a sua mãe à data do respetivo óbito e se o R. tinha legitimidade para invocar tal exceção.
Na sentença recorrida julgou-se não verificada a exceção de prescrição e condenou-se o R. nos termos sobreditos, resumindo-se o argumentativo final nos seguintes termos: “(…)
1. Nos termos do artigo 1.º do DL n.º 200/2012, de 27 de Agosto, o IGCP é equiparado a instituição de crédito, nomeadamente para a actividade de tesouraria; 
2. O IGCP invoca a prescrição do direito ao reembolso dos certificados de aforro, com fundamento no facto de a 1.ª A ter dado entrada do modelo 706, juntamente com os documentos a que aludia a Instrução n.º 3/2013, do IGCP apenas em 22.01.2016;
3. Os Regulamentos internos não têm eficácia normativa, pelo que a sua existência não vincula nem os particulares, nem os Tribunais; 
4. Em matéria de prescrição da dívida pública, a Lei n.º 7/98, de 3 de Fevereiro, que regula o regime geral da emissão e gestão da dívida pública directa do Estado, estabelece, no n.º 3 do seu artigo 13.º, que são aplicáveis as regras quanto à suspensão ou interrupção da prescrição previstas na lei civil; 
5. Tendo a 1.ª A apresentado Pedido de Certidão dos Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro detidos pelo Aforrista falecida em 31.10.2014, manifestou de forma inequívoca a intenção de exercer o seu direito; 
6. Tendo o IGCP emitido em 18.11.2014, Declaração mediante a qual reconhece a existência de certificados de aforro, à data do óbito, na sequência de tal pedido, sempre se teria que concluir haver sido reconhecido, pela entidade responsável pelo processamento do pagamento o direito ao reembolso, o que sempre teria efeitos interruptivos da prescrição, para os efeitos do artigo 325.º do Código Civil; 
7. O IGCP não tem legitimidade para arguir a prescrição da dívida pública a favor do Fundo de Regularização de Pensões, na medida em que não representa o Estado, sendo certo que este é representado nos Tribunais pelo Ministério Público; 
8. Encontrando-se a conta aforrista “imobilizada por óbito em 10.05.2012”, conforme exame do documento 5, junto pelo IGCP, o R também não demonstra o facto que integra a matéria de excepção, que consistiria na transmissão do valor titulado pelos certificados para o Fundo de Regularização da Dívida Pública;
9. Deve, pois, ser reconhecido o direito ao reembolso da quantia titulada pelos referidos certificados de aforro, identificados nos autos.
(…).”
Sustenta no recurso o apelante, em súmula, que, contra o que se entende na sentença, lhe assiste legitimidade para arguir a prescrição uma vez que a lei lhe confere atribuições e competências suficientes para intervir na gestão na dívida pública direta do Estado, designadamente no que respeita aos certificados de aforro e especificamente na verificação e controlo dos prazos de prescrição daqueles títulos. Mais refere que o prazo de prescrição de 10 anos decorreu sem que as AA. tivessem apresentado motivo de suspensão ou interrupção do prazo, nos termos da lei civil, apenas entregando a sua pretensão aos certificados em 22.1.2016.
Em contra-alegações, as apeladas, não estando embora de acordo quanto ao início da contagem do prazo de prescrição (que situam aquando do conhecimento da existência dos certificados de aforro), pedem a manutenção do decidido.
Analisando.
Afirmou-se na sentença, designadamente: “(…) muito embora a gestão da dívida, nomeadamente em matéria de tesouraria, incumba ao R, Instituto de Gestão de Crédito Público, o seu devedor e, simultaneamente, hipotético beneficiário da transmissão dos valores titulados pelos certificados de aforro é o Estado.  
Ora, nem o Instituto representa o Estado, nem o Estado excepcionou qualquer prescrição nos presentes autos a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública, pelo que o R - enquanto mero gestor da dívida - nunca teria legitimidade para excepcionar a sua prescrição, desde logo, por não ser o titular do direito de crédito. 
Nos termos expostos, e independentemente de, sob uma perspectiva factual, as AA terem demonstrado haverem reclamado o seu direito junto do IGCP antes do decurso do prazo a que alude o artigo 7.º do Decreto-Lei nº 172-B/86, de 30 de Junho, é certo que não sendo o IGCP o devedor não tem legitimidade para arguir a prescrição, limitando-se os seus poderes à efectivação das operações de reembolso. (…).” 
Com o devido respeito, não subscrevemos tal entendimento.
Conforme salienta o apelante/R., o IGCP, E.P.E., é uma pessoa coletiva de direito público com natureza empresarial, dotada de autonomia administrativa e financeira, e património próprio, sujeita à tutela e superintendência do membro do Governo responsável pela área das finanças e equiparada a instituição de crédito, nomeadamente para a atividade de tesouraria, não estando, todavia, sujeita à supervisão do Banco de Portugal (art. 1º do DL nº 200/2012, de 27.8, que aprova os Estatutos do IGCP, E.P.E.).
Por sua vez, o IGCP, E.P.E., tem por missão gerir, de forma integrada, a tesouraria, o financiamento e a dívida pública direta do Estado, competindo-lhe, além do mais, velar pela aplicação das leis e seu cumprimento, em tudo o que se referir à constituição da dívida pública direta e respetiva gestão, bem como acompanhar as operações de dívida pública direta e executar toda a tramitação inerente ao respetivo processamento (arts. 5 e 6, nº 1, als. n) e o), do mesmo DL nº 200/2012).
Compete-lhe, ainda, no exercício das suas atribuições, negociar, em nome do Estado e em obediência às orientações do membro do Governo responsável pela área das finanças, os empréstimos e as operações financeiras de gestão da dívida pública direta do Estado, incluindo a dívida das entidades do setor público empresarial cujo financiamento seja assegurado pelo Orçamento do Estado, e contratar, por qualquer das formas admitidas na lei para o efeito, esses empréstimos e operações, bem como intervir no mercado da dívida pública, designadamente, comprando e ou vendendo títulos, à vista ou a prazo, por conta do Estado ou de fundos sob a sua gestão, quando tal se afigure conveniente para a prossecução dos objetivos de gestão da dívida pública direta do Estado (art. 7, nº 1, als. a) e o), do referido DL nº 200/2012).
O IGCP, E.P.E., age, no âmbito das suas atribuições de negociação, contratação e emissão de empréstimos, em nome e representação do Estado, sendo que os certificados de aforro constituem uma das formas que a dívida pública poderá assumir (cfr. arts. 4, 5 e 11 da Lei nº 7/98, de 3.2, que estabelece o regime geral de emissão e gestão da dívida pública).
Finalmente, de acordo com o art. 10, nº 3, do DL nº 122/2002, de 4.5, na redação conferida pelo DL nº 47/2008, de 13.3, o IGCP deve organizar os procedimentos adequados a controlar a titularidade dos certificados de aforro e os prazos de prescrição da transmissão da totalidade das unidades que os constituem, ou do respetivo reembolso em caso de morte do titular, nos termos da lei.
A “série B” de certificados de aforro cuja emissão foi autorizada pelo DL nº 172-B/86, de 30.6, é administrada pela Junta do Crédito Público (art. 1º do respetivo Diploma), atual IGCP, E.P.E..
Decorre, a nosso ver, das normas enunciadas, e contra o que se entendeu em 1ª instância, que o IGCP atua em representação do Estado na gestão dos certificados de aforro e no controle dos prazos de prescrição aos mesmos respeitantes, assistindo-lhe, por conseguinte e designadamente, o direito de se opor à transmissão ou reembolso respetivo com esse fundamento.
De resto, mal se compreenderia que, tendo-lhe sido reconhecida legitimidade processual para a presente causa – e não se impondo que o Estado, representado pelo Ministério Público, fosse também chamado a intervir na ação – lhe viesse a ser vedado o direito de apresentar defesa, excecionando a prescrição.
Donde, em coerência com a legitimidade passiva de que goza, podia o R. IGCP invocar, como fez, a prescrição.
Assiste, neste ponto, inteira razão ao apelante.
Aqui chegados, cumpre analisar da verificação ou não da prescrição.
A prescrição tem como fonte o decurso de um prazo, e não qualquer declaração negocial. Traduz-se na extinção de direitos subjetivos em consequência do seu não exercício durante certo lapso de tempo, sendo que, decorrido este, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito (art. 304, nº 1, do C.C.).
Tem a prescrição por “fundamento específico a recusa de protecção a um comportamento contrário ao direito, a negligência do titular, e ainda a necessidade de obviar, em face do decurso do tempo, à dificuldade de prova por parte do sujeito passivo da relação jurídica (…).”([1])
Ou, como nos explica Manuel de Andrade: “(…) o fundamento específico da prescrição reside na negligência do titular do direito em exercitá-lo durante o período de tempo indicado na lei. Negligência que faz presumir ter ele querido renunciar ao direito, ou pelo menos o torna (o titular) indigno de protecção jurídica (dormientibus non succurrit ius).”([2])
É justamente em redor deste fundamento que a lei organiza e modela a disciplina da prescrição, segundo o mesmo autor.
Quanto ao início do prazo, dispõe o art. 306 do C.C. que; “1. O prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido; se, porém, o beneficiário da prescrição só estiver obrigado a cumprir decorrido certo tempo sobre a interpelação, só findo esse tempo se inicia o prazo da prescrição. 2. A prescrição de direitos sujeitos a condição suspensiva ou termo inicial só começa depois de a condição se verificar ou o termo se vencer. 3. Se for estipulado que o devedor cumprirá quando puder, ou o prazo for deixado ao arbítrio do devedor, a prescrição só começa a correr depois da morte dele. 4. Se a dívida for ilíquida, a prescrição começa a correr desde que ao credor seja lícito promover a liquidação; promovida a liquidação, a prescrição do resultado líquido começa a correr desde que seja feito o seu apuramento por acordo ou sentença passada em julgado.”
O princípio será, por isso, o de que o prazo só começa a correr quando o direito puder ser exercido.
De acordo com o art. 323 do mesmo C.C.: “1. A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente. 2. Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias. 3. (…). 4. (…).”
Como nos explicam Pires de Lima e Antunes Varela, em anotação a este artigo 323 do C.C.([3]): “Decorre claramente deste preceito que não basta o exercício extrajudicial do direito para interromper a prescrição: é necessária a prática de actos judiciais que, directa ou indirectamente, dêem a conhecer ao devedor a intenção de o credor exercer a sua pretensão. (…).”
A prescrição pode ainda ser interrompida pelo reconhecimento do direito, efetuado perante o respetivo titular por aquele contra quem o direito pode ser exercido, mas o reconhecimento tácito só é relevante quando resulte de factos que inequivocamente o exprimam (art. 325 do C.C.). Ou seja, não releva o reconhecimento do devedor perante um terceiro ou que, sendo tácito, não se baseie em facto que o traduza de forma inequívoca.
A interrupção, por sua vez, inutiliza para a prescrição todo o tempo antes decorrido, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo e ficando a nova prescrição sujeita ao primitivo prazo (artigo 326 do C.C.).
Importa igualmente recordar que: “O tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público” (art. 303 do C.C.).
No caso, o R. veio invocar a prescrição do direito das AA. por se mostrar decorrido o prazo de dez anos desde a morte da aforrista a quem sucederam, nos termos do art. 7 do DL nº 172-B/86, de 30.6.
Nenhuma dúvida há de que, nos termos do art. 2133, nº 1, al. a), do C.C., as AA. são as únicas e universais herdeiras de sua mãe, MC…, falecida em 12.11.2004, que era titular dos certificados de aforro aqui em discussão (pontos A) a C) supra da matéria assente).
De resto, a respetiva escritura de habilitação teve lugar em 12.4.2005 (fls. 24/25), traduzindo-se numa clara aceitação da herança (art. 2059 do C.C.).
Os certificados de aforro são um instrumento financeiro criado pelo artigo 14 do DL nº 43453, de 30.12.1960, como nominativos, amortizáveis, só transmissíveis por morte e “assentados” apenas a favor de pessoas singulares.
Tal Diploma foi alterado pelo DL nº 122/2002, de 4.5, e pelo DL nº 47/2008, de 13.3.
Dispõe o art. 7 do DL nº 172-B/86, de 30.6, com as alterações introduzidas pelo DL nº 122/2002, de 4.5, e pelo DL nº 47/2008, de 13.3, que: “1 - Por morte do titular de um certificado de aforro, podem os herdeiros requerer, dentro do prazo de 10 anos:
a) A transmissão da totalidade das unidades que o constituem; ou
b) O respectivo reembolso, pelo valor que o certificado tenha à data em que o reembolso seja autorizado.
2- Findo o prazo a que se refere o número anterior, consideram-se prescritos a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública os valores de reembolso dos respectivos certificados, sendo, no entanto, aplicáveis as demais disposições em vigor relativas à prescrição.”
Em consonância com este preceito, e de acordo com o DL 122/2002, os artigos 18 e 19 do Decreto nº 43454, passaram a ter a seguinte redação:
“No caso de falecimento do titular de um certificado de aforro, poderá requerer-se, dentro do prazo de 10 anos, a transmissão deste a favor dos herdeiros ou a respectiva amortização pelo valor que o certificado tiver à data em que a mesma se efectuar.” (art. 18)
“Findo o prazo de 10 anos a que se refere o artigo anterior, consideram-se prescritos a favor do Fundo de Regularização da Dívida Pública os valores representados nos respectivos certificados, sendo, no entanto, aplicáveis ao caso as demais disposições em vigor relativas à prescrição.” (art. 19)
A primeira questão que se coloca respeita à forma de contagem do prazo de prescrição de dez anos previsto no art. 7 do DL nº 172-B/86. Isto é, cumpre saber se tal prazo deve contar-se da data do óbito do titular dos certificados de aforro ou do momento em que os respetivos herdeiros têm conhecimento da existência dos certificados de aforro.
Salienta-se que a remissão feita no nº 2 do art. do DL nº 172-B/86 para as demais disposições em vigor relativas à prescrição não pode deixar de entender-se como relativa às causas de suspensão e de interrupção da prescrição previstas na lei geral, bem como ao início do prazo previsto no artigo 306 do C.C..
Nesta ponderação releva o aditamento do art. 9-A ao DL nº 122/2002, introduzida pelo DL nº 47/2008, que criou o registo central de certificados de aforro, nos seguintes termos: “1 - É criado o registo central de certificados de aforro, com a natureza de registo electrónico, que tem por finalidade possibilitar a obtenção de informação sobre a existência de certificados de aforro e sobre a identificação do respectivo titular. 2- O IGCP é a entidade responsável pela criação, manutenção e actualização do registo central. 3- (…). 4- Sem prejuízo do direito de acesso pelo titular do certificado de aforro, o acesso por terceiro ao registo central só pode efectuar-se através de pedido devidamente fundamentado e documentado, em caso de morte ou de declaração de morte presumida do referido titular, comprovada mediante apresentação da correspondente certidão de óbito. 5 - A informação sobre o titular só pode ser dada ao próprio, aos respectivos herdeiros, de acordo com o disposto no número anterior, ou aos seus representantes legais tratando-se de menores ou de outras pessoas incapazes nos termos da lei. 6 – (…).”
Constata-se, assim, que (só) em 2008 foi criado o registo central de certificados de aforro, gerido pelo IGCP, que permite aos interessados obter o conhecimento do saldo das suas contas e aos herdeiros de pessoa falecida saber se esta era subscritora dos títulos e dos respetivos saldos.
Conforme se afirmou no Parecer da da Procuradoria-Geral da República nº 20/2010, de 14.4.2011: “(…) Com a instituição do registo central de certificados de aforro, parece-nos manifestamente inviável a alegação do desconhecimento, pelos herdeiros, da existência de certificados de que era titular o de cujus. A lei faculta-lhes, presentemente, um meio muito simples e eficaz para a obtenção de tal informação, a qual, para mais, pode ser obtida num prazo mais que razoável, de dez anos. Só por manifesto desinteresse ou negligência permanecerão os herdeiros do aforrista na ignorância desta parte do acervo da sua herança. (…).”
No caso comprovou-se que as AA. desconheciam a existência dos certificados de aforro titulados por sua mãe e que tomaram conhecimento dessa existência em data não concretamente apurada mas posterior a 15.1.2014, não tendo, aliás, os referidos certificados de aforro sido mencionados na relação de bens apresentada nos Serviços de Finanças, em 20.1.2005, para efeitos de participação do óbito (pontos D) e E) supra).
À data do óbito (2004) não existia, como vimos, o referido registo central de certificados de aforro que permitisse às AA. tomar conhecimento dessa existência. Ou seja, até à criação desse registo central em Março 2008, as AA. não tinham forma, objetiva e universal, de aceder à existência dos títulos de que era titular sua mãe junto do IGPC.
Deste modo, afigura-se razoável entender que, pelo menos até então, não lhes era exigível que tivessem esse conhecimento e que, não o tendo de facto (conforme se apurou), estiveram impedidas de exercer o seu direito, não podendo, consequentemente, iniciar-se o prazo de prescrição antes dessa data, nos termos do art. 306, nº 1, do C.C.([4]).
Conforme se concluiu no Ac. do STA de 1.10.2015, citado em rodapé: “(…) o facto «morte do subscritor», só por si, não interfere na exigibilidade de certificados de aforro pertencentes ao de cujus e cuja existência os herdeiros desconheciam nem tinham possibilidade de conhecer.”
Igualmente nos parece legítimo sustentar, como no Ac. desta Relação de 24.4.2018 também citado em rodapé, que, mesmo admitindo que desde que passou a existir um registo central de certificados de aforro (em Março de 2008) o prazo de prescrição se deverá contar do óbito do aforrista – dado que os seus herdeiros passaram a poder tomar conhecimento efetivo da existência dos títulos, ficando em condições de exercer o seu direito face aos mesmos, nos termos do art. 306, nº 1, do C.C. – tal entendimento só valerá para os casos em que o aforrista faleceu já depois de 2008, correndo a partir desta data (e não a contar da data do óbito do aforrista) o aludido prazo prescricional de 10 anos nos casos em que o aforrista faleceu antes de 2008.
O que significa que, na situação em análise, a partir de Março de 2008 que estava na disponibilidade das AA. obter informação sobre a titularidade de certificados de aforro por parte de sua mãe já falecida, sendo este o facto a ter em conta no início da contagem do prazo de prescrição.
Ora, entre Março de 2008 e 22.1.2016, data em que a 1ª A. apresentou junto do IGCP o concreto pedido de resgate/reembolso dos aludidos certificados de aforro devidamente instruído (ponto U) supra), não decorreu o prazo de 10 anos referido no art. 7 do DL nº 172-B/86.
Por conseguinte, o direito das AA. não se extinguiu, por prescrição.
É de manter, assim, ainda que com fundamento diverso, a sentença recorrida, improcedendo o recurso.

                            ***
IV- Decisão:
Termos em que e face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e manter a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.
Notifique.
                                                       ***
                                                                                                              Lisboa, 20.12.2018

Maria da Conceição Saavedra
Cristina Coelho
Luís Filipe Pires de Sousa

[1] Aníbal de Castro, “A Caducidade”, 1984, 3ª ed., pág. 29.
[2] “Teoria Geral da Relação Jurídica”, vol. II, 1972, págs. 445/446.
[3] “Código Civil Anotado”, vol. I, 4ª ed., pág. 290.
[4] Neste sentido, cfr. os Acs. da RL de 14.9.2017, Proc. 16519/15.6T8LSB.L1-6, e de 24.4.2018, Proc. 25635/15.3T8LSB.L1-1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt. Ver, ainda, o Ac. do STA de 1.10.2015, Proc. 619/15-11, DR de 12.10.2016, Apêndice, págs. 1683/1692.