Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2516/19.6T8CSC.L1-6
Relator: ANTÓNIO SANTOS
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
PEDIDO ILÍQUIDO
CONDENAÇÃO ULTRA PETITUM
DANO BIOLÓGICO
QUANTUM INDEMNIZATÓRIO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/13/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: 1.Formulado um pedido genérico em Acão de indemnização decorrente de acidente de viação e por a demandante/lesada não dispor de todos os elementos que lhe permitam determinar as consequências daquele, vedado está ao tribunal proceder a sponte sua a uma condenação líquida, desde logo porque desconhecer o tecto do pedido que o Autor deduziria se formulasse pedido concreto.
2.- O pedido ilíquido, se não liquidado no decurso do processo e em momento prévio à sentença, obriga a que a condenação em indemnização líquida consubstancie a comissão da nulidade da alínea e), do nº1, do artigo 615º CPC.
3. -  É justo atribuir uma indemnização de €350.000,00 por danos não patrimoniais a lesada que, com 40 anos de idade, e por força de acidente de motociclo no qual se fazia transportar, ficou com diversas e muito graves lesões e sequelas das mesmas, de entre as quais se salienta : ter ficado paraplégica, e dependente para se deslocar em cadeira de rodas ,  necessitando de ajuda de 3.ª pessoa ; Desloca-se autonomamente em cadeira de rodas manual, com dificuldade no piso irregular; não consegue manter-se de pé autonomamente; Manipulação e preensão: limitada no acesso aos objetos que se encontram em locais mais elevados; Controlo de esfíncteres: perdas urinárias quase diárias, agravadas nos acessos de asma, quando tosse ou espirra, usando penso permanentemente; raramente, tem incontinência para fezes moles; por vezes tem perdas de pequenos fragmentos fecais; necessita de manobras manuais para evacuação; Sexualidade e procriação: diminuição acentuada do prazer que retira das relações sexuais, por alterações da sensibilidade a nível genital, por quase impossibilidade de alcançar o orgasmo e devido a perdas urinárias durante o ato sexual; -  quantum doloris, fixável no grau 7 numa escala de 7 graus de gravidade crescente ; défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, fixável em 78 pontos, considerando o valor global da perda funcional decorrente das sequelas e o facto de estas afetarem a examinada em termos de autonomia e independência, tornando-a dependente de ajudas técnicas e de terceira pessoa ; paraplegia com compromisso sensitivo-motor e dos esfíncteres, bem como disfunção sexual (enquadrável em Na 0111, com desvalorização arbitrada de 75 pontos);
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de LISBOA
1. - Relatório                         
A, residente na …, intentou acção declarativa, sob a forma comum, contra,
A) VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. com sede na …, e
B) AÇOREANA SEGUROS, S.A., com sede no …, actualmente,GENERALI SEGUROS, S.A., deduzindo o seguinte PEDIDO:
Uma vez julgada a acção procedente, por provada, seja proferida sentença que,
a) Condene as Rés a pagarem à Autora indemnização no valor de €350.000,00;
b) Condene as Rés a pagarem à Autora o valor que ela tiver de gastar com terapias, que presentemente se estima em €381.570,00,
c) Condene a Ré a pagar à Autora o valor correspondente aos vencimentos que ela deixar de auferir e, que presentemente se estima em €385.000,00;
d) Condene as Rés a ressarcirem à Autora de todos os danos que, sendo causa direta e necessária do acidente dos autos, se venham a manifestar no futuro,
e) Condene as Rés no pagamento de juros de mora a calcular desde a data da citação até ao efetivo e integral pagamento,
f) Condene as Rés no pagamento das custas e demais encargos do presente processo.
1.1. - Para tanto, alegou a autora, em síntese, que:
- No dia 18-08-2016, quando se fazia transportar no motociclo de matrícula ??-??-ZV, e segurado na 2ª Ré, foi vítima de um acidente de viação;
- No Acidente referido foram intervenientes, para além do motociclo, também o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ??-??-IQ, segurado na 1.ª ré;
- O acidente ocorreu na Avenida Marginal, circulando todos os intervenientes no sentido Cascais/Lisboa, mais exactamente quando o motociclo circulava na via da esquerda das duas vias existentes no mesmo sentido;
- Acontece que circulando o IQ na semi-faixa de rodagem da direita, repentinamente e sem que nada o fizesse prever, mudou de direcção passando a ocupar a via da esquerda para aceder a um parque de estacionamento de terra batida que se encontrava mais à direita da via, pretendendo aí entrar, mas ocupando nessa manobra as duas vias;
- Dada a súbita e imprevista trajectória do IQ, o motociclo efectuou uma imediata travagem de emergência, mas não conseguiu evitar o embate no veículo, nele embatendo na respectiva parte traseira esquerda e acabando ambos os ocupantes do motociclo por serem projectados;
- Em consequência do acidente, a autora ficou gravemente ferida, tendo sido assistida de urgência e permanecido internada em hospital, seguindo-se internamento no Centro de Reabilitação de Alcoitão e nas respectivas residências assistidas, tendo resultado do acidente diversas lesões;
- Apesar de tratada, e após cura clínica, ficou, todavia, a autora a padecer de sequelas graves, permanentes e limitativas, o que tudo lhe confere o direito a ser indemnizada, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.
1.2. - Após citação, contestaram ambas as Rés Seguradora.
- Assim, a Ré  VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., na contestação apresentada, deduziu no essencial defesa por impugnação motivada [ apresentando uma diferente versão do acidente, dele resultando a culpa exclusiva do condutor do motociclo ZV, sem qualquer intervenção do IQ, e vindo a embater na traseira deste último ; impugnando a ocorrência dos danos e, bem assim, invocando o exagero dos valores indemnizatórios reclamados ] e pugnando no sentido de ser a acção julgada improcedente, por não provada e a R. absolvida do pedido, tudo com as legais consequências;
- Já a Ré à data Seguradoras Unidas, SA, na contestação apresentada, deduziu também no essencial defesa por impugnação motivada [impugnando a ocorrência dos danos e, bem assim, invocando o exagero dos valores indemnizatórios reclamados] e pugnando no sentido de ser a acção julgada improcedente, por não provada e a R. absolvida do pedido, tudo com as legais consequências. Mais requereu a mesma Ré a Intervenção Principal Provocada de Liberty Seguros, SA, e para com referência à sinistrada, ora A., A, vir deduzir, [como seguradora de acidentes de trabalho] querendo, no prazo o seu pedido, seguindo-se os demais termos até final.
1.3. – Em articulado de 22/11/2019 (refª 34104378), vem a autora – com base em factualidade alegada – modificar o pedido, passando a PETICIONAR a condenação das rés a pagarem-lhe:
a) o valor mínimo de €350.000,00 por danos não patrimoniais, corporal e estético;
b) o valor relativo a quantias suportadas e a suportar a título de terapias (nomeadamente, fisioterapia, à razão de €38,00 ou €42,00 por sessão; talassoterapia, à razão de €350,00 por ciclo de 10 sessões; psicoterapia, à razão de €70,00 por sessão), deduzidas do valor da assistência médica do mesmo tipo, que tenha sido e venha a ser proporcionada pela seguradora de acidentes de trabalho, de acordo com a decisão a proferir no processo n.º 2637/17.0T8CSC;
c) o valor relativo à perda da capacidade para o trabalho habitual e outras atividades profissionais e económicas, a título de danos patrimoniais futuros, indemnização essa deduzida das quantias pagas e a pagar pela seguradora de acidentes de trabalho, a título de indemnização por Incapacidade Temporária Absoluta, de pensão provisória e definitiva por Incapacidade Permanente Parcial e por Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual, de acordo com a decisão a proferir no processo n.º 2637/17.0T8CSC;
d) a quantia de €50.921,43, a título de danos patrimoniais;
e) as quantias devidas por todos os danos que, sendo causa directa e necessária do acidente, se venham a manifestar no futuro e que não sejam objeto de reparação pela seguradora de acidentes de trabalho.
1.4. – Admitida a intervenção provocada da seguradora de acidentes de trabalho Liberty Seguros, S.A., veio a mesma, após citação, apresentar articulado [nele peticionando a condenação da 2.ª ré no pagamento do valor de €216.146,18, por si já suportado, acrescido das quantias que vierem a ser liquidadas ao abrigo da cobertura de acidentes de trabalho, bem como nos juros de mora à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento], sendo que, a respectiva instância incidental veio a ser  julgada extinta por falta de constituição de mandatário no seguimento da renúncia apresentada.
1.5.- Dispensada a realização de audiência prévia , foi proferido despacho saneador [dele constando o seguinte despacho “  Fixo à acção o valor de €450.921,43 (cfr. art.º 306.º, n.º 2, do CPC e requerimento de modificação do pedido de 22-11-2019)] , com identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova, sem que tenham sido apresentadas reclamações e,  designada a audiência de discussão e julgamento , à mesma se procedeu (iniciada a 16/9/2022 e concluída a 24/10/2022),  e , conclusos os autos para o efeito, proferiu o tribunal a quo a competente SENTENÇA, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor:
(…)
IV. Decisão
Pelo exposto, julgo a presente acção intentada por A contra VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. e GENERALI SEGUROS, S.A. parcialmente procedente e, consequentemente, condeno as rés, na proporção de 70% pela 1.ª ré e de 30% pela 2.ª ré, a pagar à autora:
a) os montantes relativos a danos patrimoniais respeitantes às despesas relativas a dependências permanentes e ajudas (i.e., ajudas técnicas, tratamentos médicos e regulares e ajuda de terceira pessoa) de que a autora necessita e necessitará no futuro – nos termos que constam do capítulo (i) da fundamentação de direito da presente sentença, com referência ao relatório médico-legal referido no facto provado n.º 38 – bem como a despesa necessária à aquisição de uma cadeira de rodas eléctrica com mecanismo elevatório, e bem assim, por eventuais perdas salariais, desde que tais montantes não se mostrem assegurados pela seguradora infortunística laboral Liberty Seguros, S.A., no âmbito do processo n.º 2637/17.0T8CSC do Juízo do Trabalho de Cascais – Juiz 2.
b) o montante de €350.000,00 a título de danos não patrimoniais, já actualizado à data da presente sentença;
c) o montante de €175.000,00 a título de dano biológico já actualizado à data da presente sentença.
Custas pela autora e pela ré na proporção do respectivo decaimento, dispensando-se as partes do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
Notifique e registe.
Cascais, 20/1/2023”
1.6. – Notificada da Sentença indicada em 1.5., e com a mesma inconformada, veio a Ré Generali Seguros S.A, da mesma apelar, apresentando a recorrente na respectiva peça recursória as seguintes conclusões:
1 - A douta sentença arbitrou a título de dano não patrimonial, a quantia de 350.000 euros que no modesto entender da ora recorrente pecou por excesso, não atendendo aos reais critérios de justiça e ponderação para onde se dirige este princípio.
2 - Não querendo a recorrente colocar em causa a gravidade da situação de facto vivida pela A., entende a recorrente que dos factos provados em sede de julgamento, perícia do INML e demais documentação junta aos autos, o valor indemnizatório a atribuir á A. a título de danos não patrimoniais não deverá ultrapassar o valor de 200.000,00€.
3 - É indubitável que a A. sofreu dano grave e irreversível, com dificuldade de movimentação e consequentemente afetação da sua vida diária, mas o valor arbitrado mostra-se exagerado e totalmente desconforme com os critérios de equidade.
4 – Violou a douta sentença o disposto no artigo 496º do Cód. Civil.
Nestes termos e nos de mais de direito aplicável deve ser a douta sentença revogada, nos termos e pelos fundamentos supra expostos e substituída para que respeite a correta aplicação dos normativos que subsumem a essência fáctica do caso dos autos, fazendo-se assim, a Sã e Costumada J U S T I Ç A !
1.7. – Outrossim a Ré VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., insatisfeita com a sentença indicada em 1.5., da mesma discordando, veio daquela Apelar, apresentando a recorrente na respectiva peça recursória as seguintes conclusões:
1- A autora apresentou articulado avulso de “Passou, assim, a formular o pedido de condenação das rés a pagarem a) o valor mínimo de €350.000,00 por danos não patrimoniais, corporal e estético;
b) o valor relativo a quantias suportadas e a suportar a título de terapias (nomeadamente, fisioterapia, à razão de €38,00 ou €42,00 por sessão; talassoterapia, à razão de 350,00€ por ciclo de 10 sessões; psicoterapia, à razão de 70,00€) deduzidas do valor da assistência médica do mesmo tipo, que tenha sido e venha a ser proporcionada pela seguradora de acidentes de trabalho, de acordo com a decisão a proferir no processo 2637/17.0T8CSC;
c) o valor relativo à perda da capacidade para o trabalho habitual e outras atividades profissionais e económicas, a título de danos patrimoniais futuros, indemnização essa deduzida das quantias pagas e a pagar pela seguradora de acidentes de trabalho, a título de indemnização por Incapacidade Temporária Absoluta, de pensão provisória e definitiva por Incapacidade Permanente Parcial e por Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual, de acordo com a decisão a proferir no processo n.º 2637/17.0T8CSC;
d) a quantia de €50.921,43, a título de danos patrimoniais;
e) as quantias devidas por todos os danos que, sendo causa direta e necessária do acidente, se venham a manifestar no futuro e que não sejam objeto de reparação pelo acidente de trabalho.
2- A A. reduziu o seu pedido tendo no articulado correspondente atribuído à acção (indevidamente, diga-se), o valor de 450.921,43€;
3- Em sede de despacho saneador ficou consignado: “Valor da causa: Fixo à acção o valor de 450.921,43€. (cfr. art.º 306º, nº 2, do CPC e requerimento de modificação do pedido de 22 de 2019)”.
4- Em rigor liquidou o pedido em 400.921,43€ (conforme adição da alínea a) e d) do pedido) e não de 450.921,43€, sendo os estantes pedidos remetidos para liquidação futura, tal como, aliás, constam da douta Sentença (vd alínea a) da decisão):
a) os montantes relativos a danos patrimoniais permanentes e ajudas (i.e., ajudas técnicas, tratamentos médicos e regulares e ajuda de terceira pessoa) de que a autora necessita e necessitará no futuro da fundamentação de direito da presente sentença, com referência ao relatório médico legal referido no facto provado n.º 38 eléctrica com mecanismo elevatório, e bem assim, por eventuais perdas salário montantes não se mostrem assegurados pela seguradora infortunística laboral Liberty Seguros, S.A., no âmbito do processo n.º 2637/17.0T8CSC do Juízo do Trabalho de Cascais ;
5- Quer o valor do pedido da A. sejam os 450.921,43€ fixados em sede de despacho saneador, quer sejam os 400.921,43€ que resultam do requerimento de redução do pedido, o certo é que a douta sentença fixa uma condenação total líquida de 525.000,00€, superior em 125.000,00€ ou 75.000,00€ ao valor do pedido fixado à acção em sede de saneador.
6- A condenação nos 175.000,00€ (alínea c) da Decisão), não tem qualquer expressão no pedido formulado pela A. e, mesmo pretender enquadrá-lo na alínea c) do requerido em 22-11-2019, resulta, necessariamente contradição com a condenação das RR. em:
.. eventuais perdas salariais, desde que tais montantes não se mostrem assegurados pela seguradora infortunística laboral Liberty Seguros, S.A, no âmbito do Processo nº 2637/17.0T8CSC do Juízo do Trabalho de Cascais, Juiz 2;
7- A condenação excede o valor do pedido, pois não só condena as RR em parcelas não peticionadas pela AA., como ao fazê-lo, excede manifestamente o valor do pedido formulado nos autos.
8- Ao fazê-lo, a douta Sentença tem de considerar nula, porquanto violou o disposto na alínea e) do nº 1 do art.º 615 do CPC.
9 – Todavia a análise dos meios de prova, designadamente, o auto elaborado pelas autoridades policiais e a prova testemunhal, salvo respeitosa discordância, não permitem concluir no sentido de dar como provados os factos 13; 14; 15 e 18 do elenco dos provados.
10 - Os testemunhos prestados por JB e FB confirmam o que resulta no Auto de Participação de Acidente de Viação qual plasma de forma bem evidente que o local do embate entre os veículos se situou na hemi-faixa da direita acerca de 1.70m da berma direita atento o sentido de marcha de ambos os veículos;
Consequentemente,
11 – O Facto nº 13 deve ter a seguinte redacção: “Para tanto, abrandou a marcha, e iniciou a respectiva manobra de mudança de direcção para a direita, acionando o sinal de pisca para a direita”.
O facto 14 deve ser dado como não provado.
O facto 15 deve ter a seguinte redacção: “Ao aperceber-se da manobra do veículo automóvel, o condutor do motociclo iniciou a travagem de emergência, tendo accionado o travão traseiro, vindo o veículo a entrar em slide lateral mas, apesar de ter travado não conseguiu evitar o embate entre os dois veículos”.
O facto 18 deve ter a seguinte redacção: O local provável do embate deu-se na via da direita, acerca de 1.70m da berma direita atento o sentido de marcha de ambos os veículos.
12 –  O rasto de travagem do motociclo, que entra em slide, mantendo uma trajectória desgovernada, demonstra que foi a sua velocidade excessiva , a causa do embate na traseira do veículo ligeiro, como aliás decorre do Facto 16 do elenco dos provados que refere: Antes do embate o motociclo circulava a velocidade superior a 70Km/hora, tendo, no momento imediatamente antes do embate, a velocidade sido inferior ao limite legal devido ao prévio accionamento do travão.
13- O que foi causal do acidente, não foi a circulação do veículo segurado na R. nas condições em que o fazia na altura do sinistro já que não é possível detectar no seu comportamento estradal qualquer violação de norma ou do dever de cuidado exigível.
14- O que foi causal do acidente, foi a circulação do motociclo em excesso de velocidade, com travagem que determina a sua entrada em slide lateral (facto 15), que implica não ter o seu condutor o domínio do veículo, a partir daquele momento, culminando com a colisão na traseira do veículo ligeiro.
15- O condutor do motociclo violou o disposto nos art.ºs 24º nº 1, 27º e 28º nº 1 alínea b) do Código da Estrada.
16- A causa única e exclusiva do acidente resulta do facto do condutor do motociclo conduzir em excesso de velocidade e não ter conseguido parar o seu veículo no espaço livre e visível que se encontrava à sua frente.
17- Desta forma, ao decidir como o fez, a douta sentença fez uma errada interpretação das normas legais, designadamente, do disposto nos  art.ºs 24º nº 1, 27º e 28º nº 1 alínea b) do C.E., impondo-se que a douta sentença seja revogada na parte que imputa 70% de responsabilidade pela ocorrência do sinistro ao condutor do veículo ??-??-IQ e, substituída por outra que declare que  o condutor do motociclo ??-??-ZV foi o único e exclusivo culpado do acidente.
18- O Tribunal a quo decidiu fixar o valor dos danos não patrimoniais em 350.000,00€.
19- É entendimento da ora Recorrente que a indemnização fixada pelo Tribunal "se mostra verdadeiramente excessiva em face da matéria provada, e das lesões sobrevindas ao A., pugna-se para que este valor seja reduzido, alterando superior aos 200.000,00€.
20 - Entende, a ora Recorrente fazer referência aos princípios da equidade, proporcionalidade e igualdade o que aponta para uma tendencial uniformização de parâmetros de fixação judicial das indemnizações, sem prejuízo da necessidade de ponderar as exigências do princípio da igualdade, o que aponta para uma do tendencial uniformização de parâmetros de fixação judicial das indemnizações, sem prejuízo da consideração das circunstâncias do caso concreto.
21 - Neste mesmo sentido, o próprio Tribunal a quo aduz o Acórdão do STJ de 23-10-2018 na Revista 902/14.7TBVCT.G1.S1, o qual para um lesado de 54 anos de idade e um défice funcional permanente de 72 pontos fixou a indemnização a título de danos não patrimoniais em 150.000,00€.
22- Ao decidir como o fez, o Tribunal a quo violou o disposto nos art.ºs 8º nº 3, 496º e 563º do C.C.
Pelo exposto deve:
a) Declarar-se nula a Sentença por violação do disposto na alínea e) do nº 1 do art.º 615º do C.P.C. (condenação em quantidade superior ao pedido.
Caso assim não se entenda,
b) Deve a douta Sentença ser revogada e substituída por outra que absolva o condutor do veículo ??-??-IQ, e declare a exclusiva responsa do motociclo ??-??-ZV.
c) Alterar-se a condenação referente aos danos não patrimoniais para quantia não superior a 200.000,00€.
COMO É DE DIREITO E INTEIRA JUSTIÇA
1.8. – A autora A, e com referência à apelação indicada em 1.6., veio apresentar contra-alegações, impetrando a confirmação do julgado, ou seja, reclamando que deve ser negado provimento ao recurso interposto pelo Recorrente, por improcedente in totum, sendo que assim se decidindo SERÁ feita JUSTIÇA!
1.9. – Por último, a Ré Generali Seguros S.A, veio apresentar contra-alegações dirigidas à apelação da co-Ré seguradora, reclamando que no que concerne às causas do acidente deve ser confirmada a sentença recorrida, ou seja, não existe qualquer dúvida de que a causa do sinistro foi a invasão da hemi-faixa esquerda feita pelo veículo seguro na recorrente, logo, na referida parte deve manter-se na integra a sentença recorrida.
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Thema decidendum
Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ] das alegações dos recorrentes (cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a decidir resumem-se às seguintes:
A) Na apelação da Ré VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.
Primo    - Aferir se a douta Sentença tem de considerar nula, porquanto violou o disposto na alínea e) do nº 1 do art.º 615 do CPC;
Secundo - Aferir se importa introduzir alterações na decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, maxime em relação aos pontos de facto nºs 13; 14; 15 e 18, todos eles do elenco dos factos provados.
Tertio - Aferir se, em face da factualidade provada, importa concluir que para a ocorrência do acidente contribuiu exclusivamente o condutor do motociclo ??-??-ZV, sendo, portanto, o condutor do veículo ??-??-IQ totalmente ilibado de qualquer responsabilidade;
Quartus   - Aferir se importa alterar a sentença recorrida quanto ao montante atribuído à autora a título de danos não patrimoniais, reduzindo-se a indemnização atribuída para uma quantia não superior a 200.000,00€.
B) Na apelação da Ré GENERALI SEGUROS, S.A.
Primo - Aferir se importa alterar a sentença recorrida quanto ao montante atribuído à autora a título de danos não patrimoniais, reduzindo-se a indemnização atribuída para uma quantia não superior a 200.000,00€.
*
2. - Motivação de Facto.
Mostra-se fixada - em sede de sentença - pelo tribunal a quo a seguinte factualidade:
A) PROVADA.
2.1. - No dia 18-08-2016, às 09:15 horas, na Avenida Marginal, ao km 7,1, em Paço de Arcos, concelho de Oeiras, no sentido Cascais/Lisboa, ocorreu um acidente de viação.
2.2. - Foram intervenientes no acidente o motociclo de marca Kawasaki, modelo ZR750, de matrícula ??-??-ZV, propriedade e conduzido por JS e o veículo automóvel ligeiro de passageiros de marca Ford, modelo Fiesta, de matrícula ??-??-IQ, propriedade de BB e conduzido por JB.
2.3. -Na altura do acidente, a autora A, à data companheira do condutor do motociclo, viajava gratuitamente como passageira na parte de trás do motociclo.
2.4. - A responsabilidade civil emergente da circulação do veículo automóvel encontrava-se transferida para a 1.ª ré Via Directa – Companhia de Seguros, S.A. através de contrato de seguro do ramo automóvel titulado pela apólice n.º 940086016.
2.5. - A responsabilidade civil emergente da circulação do motociclo encontrava-se transferida para a 2.ª ré, então, Açoreana Seguros, S.A. através de contrato de seguro do Ramo automóvel titulado pela apólice n.º 90.01893748.
2.6. - No local do acidente a faixa de rodagem é composta por quatro vias, duas em cada sentido, sem separador central, tendo a faixa de rodagem 12 metros de largura e é ladeada por passeio de ambos os lados.
2.7. -A sinalização existente no local é constituída pelas seguintes marcas rodoviárias:
- Marca M1: duas linhas contínuas adjacentes a separar os dois sentidos de trânsito;
- Marca M2: linha descontínua a separar as duas vias de trânsito do mesmo sentido.
2.8. - O limite de velocidade no local é de 70 Km/hora.
2.9. - A estrada, no sentido Cascais/Lisboa, corresponde a uma recta com boa visibilidade, antecedida de uma curva ligeira para a esquerda, existindo, na altura, junto à via da direita, a possibilidade de acesso a um espaço usado para estacionamento da praia das Fontainhas, em terra batida, a que se acede mediante transposição do passeio em calçada portuguesa e brita que nesse segmento se encontrava rebaixado.
2.10. -O tempo estava bom, o asfalto estava em regular estado de conservação, encontrava-se seco e limpo e as condições de visibilidade eram boas e suficientes para a percepção da via e dos elementos circundantes, permitindo aos condutores a visão dos obstáculos que pudessem surgir, ainda que, à data, existissem árvores e vegetação do lado direito da via, o que actualmente já não sucede por ter havido o corte desses elementos e sido, inclusive, encerrado o acesso ao parque de estacionamento.
2.11. -Momentos antes do acidente ambos os veículos circulavam no sentido Cascais/Lisboa, encontrando-se o veículo automóvel a circular na via da direita e o motociclo, mais atrás, a circular na via da esquerda, sem que na altura houvesse trânsito.
2.12. - A determinada altura, o condutor do veículo automóvel decide aceder ao parque de estacionamento situado à direita do sentido em que ambos os veículos circulavam.
2.13. - Para tanto, abrandou a marcha, e iniciou a respectiva manobra de mudança de direcção para a direita, acionando o sinal de pisca para a direita, mas desviando, contudo, previamente o seu veículo para a esquerda, por forma a abrir a curva para a direita e assim aceder de frente para o parque.
2.14. - Ao executar essa manobra, o condutor do veículo automóvel alargou o ângulo da curva de entrada no estacionamento e ocupou parcialmente a via da esquerda, surpreendendo o condutor do motociclo com essa manobra.
2.15. -Ao aperceber-se da manobra do veículo automóvel, o condutor do motociclo iniciou a travagem de emergência, tendo accionado o travão traseiro, vindo o veículo a entrar em slide lateral mas, por o veículo automóvel se encontrar atravessado e a ocupar, pelo menos parcialmente, com a sua traseira, a via da esquerda, apesar de ter travado não conseguiu evitar o embate entre os dois veículos.
2.16. - Antes de embate o motociclo circulava a velocidade superior a 70 km/hora, tendo, no momento imediatamente antes do embate, a velocidade sido inferior ao limite legal devido ao prévio acionamento do travão.
2.17. - O embate dos veículos deu-se entre a parte lateral direita do motociclo que foi embater na parte traseira do veículo automóvel com preponderância para a zona esquerda.
2.18. - O local provável do embate deu-se na via da esquerda mais próximo do eixo das duas vias de trânsito.
2.19. - Em consequência do embate, o condutor do motociclo e a autora foram projectados e caíram no chão, tendo a autora ficado gravemente ferida e tido de ser socorrida de urgência.
2.20. - A autora, após o acidente, sofreu perda de conhecimento imediata, tendo recuperado a consciência ainda no local.
2.21. - Encontrava-se consciente quando foi assistida no local pelos Bombeiros que a transportaram de ambulância para os serviços de urgência do Hospital de São Francisco Xavier.
2.22. - Durante o transporte sofreu paragem cardiorrespiratória, com recuperação após realização de manobras de reanimação.
2.23. - Nos serviços de urgência do Hospital de São Francisco Xavier foram-lhe diagnosticadas fratura (em três pontos) da mandíbula, fratura-luxação do ombro esquerdo, fratura de C7 (não descoaptada) e de D12, com atingimento medular.
2.24. - Foi operada no mesmo dia às fraturas da mandíbula (pela Cirurgia Maxilo-Facial), e da coluna dorsal (pela Neurocirurgia).
2.25. - Permaneceu internada, consciente, vindo a ser operada ao ombro cerca de 15 dias depois.
2.26. - Todas estas cirurgias envolveram a colocação de material de osteossíntese, que ainda mantém.
2.27. - Além das feridas cirúrgicas, partiu um dente (21), posteriormente tratado com colocação de faceta.
2.28. - Foi transferida para o Hospital Egas Moniz decorridas cerca de duas semanas após o acidente, permanecendo neste serviço de saúde durante cerca de um mês, até 04-10-2016.
2.29. - Foi transferida para o Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, onde manteve tratamentos multidisciplinares de reabilitação, que se prolongaram durante cerca de 9 meses.
2.30. - Durante a permanência em Alcoitão foi observada em algumas consultas de Ortopedia e Ortodontia e necessitou de realizar terapia da fala e de utilizar aparelho para melhoria da oclusão bucal.
2.31. - Após a data da alta hospitalar permaneceu no domicílio, por ter ficado paraplégica, ficou dependente para se deslocar em cadeira de rodas e necessita de ajuda de 3.ª pessoa.
2.32. - A autora teve necessidade de proceder à adaptação da casa do companheiro onde, na altura, morava, nomeadamente, de proceder a obras e adaptações no acesso à entrada de casa, no alargamento de portas, na casa de banho, tendo ainda procedido à adaptação de um veículo automóvel.
2.33. - Subsequentemente a ter tido alta hospitalar, a autora foi ainda acompanhada:
- em consulta de Neurocirurgia, tendo realizado 58 sessões em câmara hiperbárica no Hospital Militar, devido à dor e à “situação vesical”, com melhoria relativa;
- em consultas de Urologia e medicada por perdas urinárias;
- em consultas de fisioterapia;
- realizou sessões de acupuntura, nomeadamente com electroestimulação;
- foi observada em consulta da dor no Centro Clínico do SAMS, tendo sido medicada;
- manteve tratamentos regulares de fisioterapia (incluindo talassoterapia);
- consultas de psiquiatria e sessões de psicoterapia.
2.34. - A autora, devido às sequelas do acidente, necessita de produtos consumíveis relacionados com essas sequelas e tratamentos, nomeadamente de pensos de incontinência, resguardos de cadeira, toalhitas e álcool sanitário.
2.35. - A autora necessita igualmente de tomar medicação, tendo de ser medicada com: pregabalina, baclofeno, mirabegron e duloxetina e, em situações de urgência, toma tramadol+paracetamol.
2.36. - Realizada perícia médico-legal, resulta do respectivo relatório, com referência à data das conclusões de 22-07-2021, que a autora apresentava queixas:
i) a nível funcional, compreendendo este nível as alterações das capacidades físicas ou mentais:
- Postura, deslocamentos e transferências: dificuldade na transferência do sofá para a cadeira, beneficiando de ajuda para o fazer. Autónoma nas restantes transferências.
Desloca-se autonomamente em cadeira de rodas manual, com dificuldade no piso irregular; não consegue manter-se de pé autonomamente;
- Manipulação e preensão: limitada no acesso aos objetos que se encontram em locais mais elevados;
- Controlo de esfíncteres: perdas urinárias quase diárias, agravadas nos acessos de asma, quando tosse ou espirra, usando penso permanentemente; raramente, tem incontinência para fezes moles; por vezes tem perdas de pequenos fragmentos fecais; necessita de manobras manuais para evacuação;
- Sexualidade e procriação: diminuição acentuada do prazer que retira das relações sexuais, por alterações da sensibilidade a nível genital, por quase impossibilidade de alcançar o orgasmo e devido a perdas urinárias durante o ato sexual;
- Fenómenos dolorosos: sensação de “queimadura nas pernas”; na região lombar:
- Outras queixas a nível funcional: embora mantenha sensibilidade nos membros inferiores, refere alterações da mesma, com zonas que sente “encortiçadas”
ii) A nível situacional, compreendendo este nível a dificuldade ou impossibilidade de uma pessoa efetuar certos gestos necessários à sua participação na vida em sociedade, em consequência das sequelas orgânicas e funcionais e de fatores pessoais e do meio:
- actos da vida diária:
- faz tudo sentada; conduz automóvel adaptado; necessita de ajuda de terceira pessoa diária no período diurno (8h/dia, todos os dias) para limpezas domésticas, preparação de refeições, preparação da roupa, vestir e despir algumas peças de roupa, despejar o lixo, passear os cães, bem como para se deslocar na cadeira de rodas em locais que não estão adaptados; autónoma na higiene pessoal e utilização da sanita; mastiga e deglute sem dificuldade alimentos mais consistentes;
- vida afetiva, social e familiar:
- diminuição das oportunidades de interação social, devido às limitações na mobilidade; deixou de frequentar a praia e atividades aquáticas associadas durante o verão; diariamente andava de bicicleta, de skate, fazia caminhadas e jogava à bola com o filho; aos fins de semana praticava motocross. Deixou de conseguir praticar qualquer uma destas atividades lúdicas, bem como de se dedicar ao voluntariado com animais.
2.37. - Resulta da discussão constante do relatório médico-legal corresponderem as lesões sofridas pela autora e respectivos tratamentos mais relevantes efectuados, em relação aos quais é admitida a existência de nexo de causalidade:
- Traumatismo da cabeça com perda de conhecimento e amnésia para o sucedido;
- Tomografia computorizada crânio-encefálica sem lesões traumáticas agudas;
- Fratura tripla mandibular (sínfise e subcondiliana alta bilateral) - submetida sob anestesia geral a redução e osteossíntese com duas placas e parafusos no foco fraturário sinfisário e submetida também a imobilização maxilo-mandibular, que retirou após cerca de 6 semanas;
- Fratura-luxação do úmero proximal esquerdo (troquiter), sem roturas da coifa;
- Submetida a redução e osteossíntese com parafusos;
-   Fratura de C7 não descoaptada e estável;
-   Fratura de D10;
- Fratura de D12 com retropulsão de fragmento do muro posterior no canal e estenose canalar
- Submetida de urgência a laminectomia D11-L1 e fixação transpedicular D10-D11 e L1-L2 com duas barras e cross-links;
- Traumatismo da face com colocação de faceta no dente 21, traumatismo do mento e do joelho esquerdo, com feridas suturadas;
- Tratamento multidisplinar em reabilitação, incluindo urológica com recurso a oxigenoterapia hiperbárica, e Psiquiatria/Psicologia.
2.38. - Resulta ainda, da discussão e das conclusões médico-legais resultantes da perícia, com maior relevo que:
- a data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 04-02-2019, data da alta dos serviços clínicos da seguradora de acidentes de trabalho;
- o défice funcional temporário total, se terá situado entre 18-08-2016 e 30-06-2017, sendo assim fixável num período de 317 dias, aos quais deverão ser acrescentados 24 dias, necessários para eventual remoção de material de osteossíntese, caso tal se venha a afigurar necessário no futuro;
- o défice funcional temporário parcial, se terá situado entre 01-07-2017 e 04-02-2019, sendo assim fixável num período de 584 dias, correspondente ao restante período decorrido até à consolidação funcional e situacional das lesões, aos quais deverão ser acrescentados 24 dias, necessários para recuperação funcional após eventual remoção de material de osteossíntese;
- a repercussão temporária na actividade profissional total, fixável num período total de 901 dias, tendo em conta o tipo de lesões sofridas, o tipo de tratamentos efetuados e a informação clínica facultada, aos quais deverão ser acrescentados 48 dias, necessários para recuperação funcional após eventual remoção futura de material de osteossíntese.
- o quantum doloris, fixável no grau 7 numa escala de 7 graus de gravidade crescente, tendo em conta o tipo de traumatismo, as lesões resultantes, os tratamentos efectuados, o longo período de recuperação funcional e o sofrimento psíquico certamente vivenciado pela examinanda;
- o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, fixável em 78 pontos, considerando o valor global da perda funcional decorrente das sequelas e o facto de estas afetarem a examinada em termos de autonomia e independência, tornando-a dependente de ajudas técnicas e de terceira pessoa, e serem causa de sofrimento físico, limitando-a em termos funcionais, tendo em consideração os seguintes danos permanentes – sequelas – com repercussão funcional:
a) paraplegia com compromisso sensitivo-motor e dos esfíncteres, bem como disfunção sexual (enquadrável em Na0111, com desvalorização arbitrada de 75 pontos);
b) Perturbação Depressiva Major (enquadrável em Nb0903, com desvalorização arbitrada de 2,5 pontos);
c) ombro esquerdo doloroso (enquadrável em Mf1202, com desvalorização arbitrada de 0,45 pontos);
- a repercussão permanente na actividade profissional, correspondente ao rebate das sequelas no exercício da actividade profissional habitual, no caso as sequelas são impeditivas do exercício da atividade profissional referente ao posto de trabalho ocupado à data do acidente, com as características referidas pela examinada neste exame pericial, sendo, no entanto, compatíveis com outros postos de trabalho da mesma área de preparação técnico profissional que possam ser exercidos em sedestação;
- dano estético permanente, é fixável no grau 6, numa escala de 7 graus de gravidade crescente;
- repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer, é fixável no grau 7, numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- repercussão permanente na atividade sexual, é fixável no grau 6, numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- dependências permanentes e ajudas:
a) ajudas técnicas:
- colocação de apoios laterais de sanita próprios para utilizadores de cadeira de rodas;
- revisão/substituição regular dos produtos de apoio em atual utilização, nomeadamente a cadeira de rodas e os mecanismos do veículo automóvel adaptado;
- manutenção, sempre que necessário, das adaptações do domicílio já efetuadas, incluindo o acesso à entrada de casa, alargamento de portas e estruturas da casa de banho;
- consumíveis: pensos/fraldas de incontinência, resguardos de cadeira, toalhitas e álcool sanitário.
- não sendo uma dependência permanente, no estrito sentido do termo, considera-se que a examinada beneficiaria da utilização de cadeira de rodas elétrica com mecanismo elevatório;
b) tratamentos médicos regulares:
- tratamentos de fisioterapia, em regime de ambulatório, com apoio de Médico Fisiatra, com carácter trianual (mínimo de 15 sessões por cada 3 blocos anuais) ou sempre que se verifique agravamento do ponto de vista funcional;
- seguimento em consulta de Psiquiatria, prevendo-se que numa fase inicial (na fase aguda), será necessário ser avaliada com uma periodicidade de 4 a 6 semanas entre consultas; numa fase subsequente (fase de continuação e de manutenção) a Periodicidade poderá ser ampliada na ordem de alguns meses. Todavia, o intervalo temporal entre consultas não é rígido, podendo existir necessidades resultantes das especificidades episódicas apresentadas;
- tratamentos de psicoterapia, cuja periodicidade dependerá não só da corrente psicoterapêutica como também da evolução do quadro clínico ao longo do processo;
-  consulta semestral de Medicina Física e de Reabilitação;
- consultas anuais de Ortopedia e Urologia; medicação conforme prescrita nas consultas atrás referidas
b) ajuda de terceira pessoa:
- ajuda de 3ª pessoa de 8h/diárias, não técnica, de complemento e substituição na realização de atividades básicas e instrumentais de vida diária.
2.39. - A autora, na altura do acidente, tinha 40 anos de idade, tendo nascido no dia 03-08-1976.
2.40. - Vivia em união de facto com um companheiro e tinha um filho de 9 anos de idade que se encontrava a viver consigo e que, no seguimento do acidente, teve de passar a viver com o pai.
2.41. - Trabalhava como administrativa na Parvalorem, S.A., auferindo mensalmente cerca de €1.200,00 no conjunto de abonos, o que perfazia o rendimento líquido mensal de cerca de €930,00.
2.42. - A autora encontrava-se abrangida pelo acordo de trabalho colectivo de trabalho do sector bancário, auferindo à data do acidente a respectiva remuneração e demais subsídios de acordo com o nível 6 da respectiva tabela salarial, tendo expectactiva de progredir na carreira e de poder chegar ao nível 9, tendo, entretanto, cessado a sua relação laboral com a sua entidade empregadora.
2.43. - O acidente de viação em causa nos autos foi igualmente considerado acidente de trabalho, sendo a seguradora infortunística laboral a Liberty Seguros, S.A..
2.44. - No âmbito do processo de acidente de viação que correu termos sob o n.º 2637/17.0T8CSC do Juízo do Trabalho de Cascais – Juiz 2, foi proferida sentença em 23-01-2020, complementada por decisão de 04-02-2020, a fixar o grau de incapacidade parcial permanente parcial para o trabalho da autora em 100% com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, e a condenar a seguradora a pagar à autora:
- a pensão anual e vitalícia de €12.051,75, devida desde 05-02-2019, acrescida de juros de mora até efectivo pagamento;
- o subsídio de elevada incapacidade no montante de €5.533,68 devido desde 05-02-2019, acrescida de juros de mora até efectivo pagamento;
- a quantia de €10,00, a titulo de reembolso de despesas em transportes;
- no pagamento da prestação suplementar para assistência a terceira pessoa (8 horas diárias, todos os dias da semana), mensal e vitalícia no montante de €479,34, devida desde 05-02-2019;
- no pagamento do custo de readaptação da viatura no valor máximo de €2.500,00.
2.45.- A seguradora de acidentes de trabalho, no âmbito da transferência da responsabilidade da entidade patronal da autora, suportou, nomeadamente, as despesas com consultas, exames e tratamentos da autora, bem como as obras de adaptação e demais encargos a que a autora teve de proceder na adaptação da sua habitação e no veículo, e ainda as indemnizações devidas por incapacidade até à data da alta aí fixada correspondente a 04-02-2019.
2.46.- Foi emitido em nome da autora pela Junta Médica um Atestado Médico de Incapacidade Multiusos, datado de 26-04-2017, com atribuição de um grau de incapacidade, em termos de deficiência, de 80%.
2.47.- A autora, antes do acidente, era uma mulher alegre, e cheia de vida, independente, que vivia com o filho do ordenado que auferia e gostava de viajar, ir à praia, de passear, estar com a família e com os amigos.
2.48.- Era uma mãe dedicada e que fazia a felicidade dos que com ela conviviam, gostava de se divertir e gozava de boa saúde.
2.49.- Após o acidente a vida da autora mudou completamente, tendo ficado paraplégica e dependente de 3.ª pessoa, e enfrenta diariamente inúmeras dificuldades e obstáculos que tornam muito difícil e desgastante a simples actividade de viver.
2.50.- A autora deixou de poder realizar actividades como caminhar, fazer desporto, sem ser adaptado, ir a determinados espetáculos culturais, restaurantes, e outros, quando não existem acessos para cadeira de rodas.
2.51.- A autora tem de dispor de muito equipamento e ajuda de terceiros para conseguir minimizar as dificuldades quando se desloca.
2.52.- A autora não consegue passar uma noite de descanso sem interrupções devido às dores que são constantes e intensas.
2.53.- A relação da autora com o companheiro conheceu um progressivo desgaste, tendo recentemente terminado a relação e passado a autora a viver noutra casa, embora ainda mantenham contacto.
2.54.- Devido às dificuldades diárias e permanentes que tem de enfrentar, sente-se mal, e quase sem vontade de viver, sentindo sempre uma grande angústia e uma dor permanente e muitas vezes revolta e mesmo humilhação.
2.55.- Para fazer muitas coisas, mesmo que pequenas, necessita da ajuda de terceiros, como seja do ex-companheiro, do filho ou de terceiros.
2.56.- A autora com vista à obtenção de maior autonomia e independência na sua vida diária beneficiaria com aquisição de uma cadeira de rodas eléctrica com verticalização, orçamentada em €28.157,84.
2.57.- Tal equipamento melhoria a funcionalidade da autora, permitindo-lhe fazer a posição de pé dentro de casa, de forma a conseguir aceder a armários, eletrodomésticos, etc., bem como “fazer carga”.
2.58.- A autora, por recomendação médica, com o objetivo de obter uma melhoria funcional motora da musculatura dos glúteos bilateralmente, efetuou diversos tratamentos de electroestimulação por acupuntura, entre setembro de 2017 e janeiro de 2019, com o custo global de €615,00, que não foram suportados pela seguradora de acidentes de trabalho.
2.59.- Entre outras limitações decorrentes das sequelas causadas pelo acidente, a autora, na sua vida quotidiana, continua a sofrer de privação e perturbações do sono, a necessitar de ajudas de terceiros para execução de tarefas quotidianas e domésticas como vestir-se, preparar refeições, cuidar da casa, etc. e tem limitações na deslocação a casa de familiares e amigos que não têm acessibilidades para cadeiras de rodas.
2.60.- Encontra-se impossibilitada ou, pelo menos tem dificuldades, em acompanhar as actividades do seu filho, tendo sentido grande tristeza pelo tempo prolongado de internamento em que não pode estar com este, e que implicou que ficasse à guarda do pai.
2.61.- Por ter de se deslocar em cadeira de rodas enfrenta as limitações inerentes a essa situação, tendo de montar e desmontar várias vezes ao dia a cadeira e de se confrontar com barreiras arquitetónicas (na via pública, nos estacionamentos, nos cafés, nos restaurantes, nos centros comerciais, nos museus e monumentos, etc.), o que a limita no acesso a espaços públicos, como em ir ao cinema e a salas de espetáculos.
2.62.- A autora sente o estigma e o resultado de atitudes discriminatórias no acesso a diversos espaços, tendo necessidade de programar com antecedência e detalhe todos os actos da sua vida.
2.63. - A autora ficou impossibilitada de prosseguir com o voluntariado com animais de rua e atividades desportivas e de lazer (praia, padel, bicicleta, body board, condução de carros e motas) que realizava antes do acidente, tendo, contudo, encontrado formas alternativas mas mais limitativas de desenvolver o voluntariado que fazia ou através do recurso a formas de desporto adaptado.
B) NÃO PROVADA
2.64. – (A) O condutor do motociclo circulava na via da esquerda a uma velocidade moderada e dentro dos limites legais.
2.65. – (B) A manobra do condutor do veículo automóvel foi realizada sem que nada o fizesse prever.
2.66. – (C) No local a faixa de rodagem tem um separador central em pilaretes rodoviários plásticos.
2.67. – (D) O condutor do motociclo circulava desatento e imprimindo ao seu veículo uma velocidade superior a 100Km/hora.
2.68. – (E) Ao chegar ao local onde se acede ao parque de estacionamento, o condutor do veículo automóvel certificou-se que nenhum veículo circulava na sua rectaguarda.
2.69. – (F) No momento do embate o veículo automóvel já se encontrava com as duas rodas da frente em cima do passeio, tendo sido projectado para a frente e provocado meio peão.
2.70. – (G) O embate ocorreu na via da direita, junto à entrada para o parque de estacionamento da praia, a cerca de 1,70m da berma direita atento o sentido de marcha dos veículos.
2.71. – (H) A autora deixou de ser feliz maritalmente com o companheiro e não mais conseguiu ter relações sexuais com ele.
2.72. – (G) Antes do acidente a autora, estava em idade fértil, e ponderava com o companheiro uma gravidez para aumentar a família.
2.73. – (I) A autora tem crises de choro, irritabilidade e desespero constantes.
2.74. – (K) A autora terá de suportar despesas com a manutenção da plataforma elevatória paga pela seguradora de acidentes de trabalho, no valor de €85,00 + IVA, e com a substituição de peças cobrada à parte, de €120,00 x 35 anos, ou seja, €4.200,00.
2.75. – (L) A autora terá de suportar o custo de obras na casa de S. João do Estoril, com afagamento e assentamento de chão e rodapés do hall, sala e quartos; adequação de móvel de bancada de cozinha; desmontagem e montagem de base de duche; nivelamento e afagamento de pavimento em pedra na garagem, no custo previsível de €3.889,26.
2.76. – (M) A autora teve de adquirir materiais a aplicar nas obras realizadas, tais como revestimentos e pavimentos, portas e vidros, canalizações, etc., assim como mobiliário e equipamentos diversos, por força de remodelação da sua residência, designadamente roupeiro, lavatórios e móvel de casa-de-banho, base de duche, banheira e loiças sanitárias, num custo global de €6.830,05.
2.77. – (N) Actualmente, a casa de banho da residência da autora carece ainda da instalação de equipamento próprio para pessoas de mobilidade reduzida, designadamente duas barras/apoios laterais, o que importará um custo previsível de €1.059,28.
*
3.- Se a douta Sentença tem de se considerar nula, porquanto violou o disposto na alínea e) do nº 1 do art.º 615 do CPC.
O AUTOR, posteriormente à apresentação da petição inicial, veio em articulado de 22/11/2019 (refª 34104378), modificar o pedido, passando a PETICIONAR a condenação das rés a pagarem-lhe:
a) O valor mínimo de €350.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, corporal e estético;
b) o valor relativo a quantias suportadas e a suportar a título de terapias (nomeadamente, fisioterapia, à razão de €38,00 ou €42,00 por sessão; talassoterapia, à razão de €350,00 por ciclo de 10 sessões; psicoterapia, à razão de €70,00 por sessão), deduzidas do valor da assistência médica do mesmo tipo, que tenha sido e venha a ser proporcionada pela seguradora de acidentes de trabalho, de acordo com a decisão a proferir no processo n.º 2637/17.0T8CSC;
c) O valor relativo à indemnização devida pela perda da capacidade para o trabalho habitual e outras atividades profissionais e económicas, a título de danos patrimoniais futuros, indemnização essa deduzida das quantias pagas e a pagar pela seguradora de acidentes de trabalho, a título de indemnização por Incapacidade Temporária Absoluta, de pensão provisória e definitiva por Incapacidade Permanente Parcial e por Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual, de acordo com a decisão a proferir no processo n.º 2637/17.0T8CSC;
d) A quantia de €50.921,43, a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos;
e) as quantias devidas por todos os danos que, sendo causa directa e necessária do acidente, se venham a manifestar no futuro e que não sejam objeto de reparação pela seguradora de acidentes de trabalho.
Discutida a causa e proferida SENTENÇA, do respectivo excerto DECISÓRIO consta o seguinte:
“Pelo exposto, julgo a presente acção intentada por A contra VIA DIRETA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. e GENERALI SEGUROS, S.A. parcialmente procedente e, consequentemente, condeno as rés, na proporção de 70% pela 1.ª ré e de 30% pela 2.ª ré, a pagar à autora:
a) os montantes relativos a danos patrimoniais respeitantes às despesas relativas a dependências permanentes e ajudas (i.e., ajudas técnicas, tratamentos médicos e regulares e ajuda de terceira pessoa) de que a autora necessita e necessitará no futuro – nos termos que constam do capítulo (i) da fundamentação de direito da presente sentença, com referência ao relatório médico-legal referido no facto provado n.º 38 – bem como a despesa necessária à aquisição de uma cadeira de rodas eléctrica com mecanismo elevatório, e bem assim, por eventuais perdas salariais, desde que tais montantes não se mostrem assegurados pela seguradora infortunística laboral Liberty Seguros, S.A., no âmbito do processo n.º 2637/17.0T8CSC do Juízo do Trabalho de Cascais – Juiz 2.
b) o montante de €350.000,00 a título de danos não patrimoniais, já actualizado à data da presente sentença;
c) o montante de €175.000,00 a título de dano biológico já actualizado à data da presente sentença.”
Confrontada com a sentença pelo Primeiro Grau proferida, vem a recorrente VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. invocar que padece a referida decisão do vício de NULIDADE com fundamento em condenação “em quantidade superior ao pedido”.
Para tanto, e no essencial, considera a apelante que tendo a autora liquidado o pedido no valor de 400.921,43€, certo é que a douta sentença fixa uma condenação total líquida de 525.000,00€, superior em 125.000,00€ ou 75.000,00€ ao valor do pedido, consoante se assuma o valor efectivamente  pedido ou o valor fixado à acção em sede de saneador.
Mais aduz a apelante – a reforçar o seu entendimento – que “a condenação nos 175.000,00€ (alínea c) da Decisão), não tem qualquer expressão no pedido formulado por A. e, mesmo pretender enquadrá-lo na alínea c) do requerido em 22-11-2019, resulta necessariamente contradição com a condenação das RR. em: “… eventuais perdas salariais, desde que tais montantes não se mostrem assegurados pela seguradora infortunística laboral Liberty Seguros, S.A., no âmbito do processo n.º 2637/17.0T8CSC do Juízo do Trabalho de Cascais – Juiz 2.”.
Em suma, entende a Recorrente Seguradora que é assim a sentença nula, pois violou o artigo 615.º, n.º 1 do CPC.
Pronunciando-se sobre o vício da sentença referido, veio o Emº Juiz a quo  (em sede de despacho de admissão da apelação) explicar que se entende “ não ter a condenação excedido o valor total do pedido formulado, sem que o valor fixado à acção aquando da prolação do despacho saneador o contrarie ,por este, nos termos do art.º 299.º, n.º 4, do CPC, não incluir a sua correcção nos casos de liquidação ulterior ou quando a utilidade económica do pedido se defina no decurso dos autos, nomeadamente, por efeito do disposto no art.º 569.º do CC ”.
Mais “justifica” o Exmº Juiz a quo que “(…) uma vez que esta componente do pedido – que abrangia a dimensão patrimonial decorrente da perda da capacidade de ganho, com dedução das quantias devidas liquidadas no âmbito do acidente de trabalho, mas incluindo a ampliação relativa ao dano biológico – não se encontrava liquidada ou concretizada num valor certo, entende-se que a atribuição da indemnização globalmente fixada não violou os limites do pedido, conforme foi sucessivamente deduzido no decurso dos autos.
Em rigor, tudo indica que entende o Exmº Juiz a quo que em sede de em sede de pedido permitido era substituir-se à parte.
Apreciando
Para começar, recorda-se que o vício assacado à sentença recorrida -  e integrando o mesmo a previsão da alínea e), primeira parte, do nº 1, do art.º 615º, do CPC  - (1), mostra-se em consonância com a norma do n.º 1 , do art.º 609º, do mesmo diploma legal, a qual reza que “A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir”.
Tal equivale a dizer que, em sede de sentença, e em consonância com o princípio do dispositivo, consagrado nos art.ºs e do CPC [rezando o nº 1, do primeiro, que “ O tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a acção pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição”  e, o nº1, do segundo, que “ Às partes cabe alegar os factos que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas”, só podendo o juiz fundar a decisão nesses factos que tenham sido alegados pelas partes, ainda que sem prejuízo outrossim da consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução da causa (nº 2, alínea a)], “obrigadoestá o juiz  a circunscrever-se/conter-se dentro dos limites do objecto do litígio definido, em exclusivo ,pelas partes.
Ou seja, sendo o objecto do litígio definido  pelas partes através da dedução das suas pretensões e da correlativa alegação dos factos que integram a causa de pedir ou que sirvam de fundamento a eventuais excepções, em sede de decisão/sentença está o juiz obrigado a mover-se dentro dos respectivos limites [devendo existir perfeita identidade/coincidência entre a causa petendi e a causa judicandi (2)] sendo que, a não existir uma exacta coincidência entre a decisão e os apontados limites, tal conduz inevitavelmente ao excesso de pronúncia , determinando ele o vício de nulidade da sentença.
Sobre a matéria, e da forma bastante sapiente que todos lhe reconheciam e invejavam, há muito que ensinava MANUEL de ANDRADE (3) que “As partes dispõem do processo, como da relação jurídica material. O processo é coisa ou negócio das partes”, e,consequentemente, "o processo só se inicia sob o impulso da parte, mediante o respectivo pedido", e não sob o impulso do próprio juiz : nemo judex sine actore ; ne judex procedat ex-officio, a isto se chama, por vezes , o princípio do pedido”.
Mais dissertava MANUEL de ANDRADE que, “as partes é que – através do pedido e da defesa - circunscrevem o thema decidendum. O juiz não tem de saber se, porventura, à situação das partes conviria melhor outra providência que não a solicitada, ou se esta poderia fundar-se noutra causa petendi. É a doutrina da máxima: ne eat judex utra vel extra petita partium”, e relativamente á qual alguns (Calamandrei) falam aqui de correspondência entre o requerido e o pronunciado(4).
Também sobre a questão ANTUNES VARELA, MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO e NORA (5) são claros e incisivos, ensinando que cabe ao autor ao propor a acção formular a pretensão de tutela jurisdicional que visa obter, sendo que, a formulação do pedido reveste a maior importância, porque o juiz não pode condenar em quantidade  superior ou em objecto diverso do que se pedir - “ ne eat iudex ultra vel extra petita partium” -, ou seja,  e como corolário do principio do dispositivo,  e  quanto ao seu conteúdo, está a sentença balizada pelos limites definidos pela pretensão formulada na acção, qual “núcleo irredutível do aludido princípio  e cuja violação ( a não coincidência da decisão com os petita partium ) determina a nulidade da sentença .
Em suma, pacifico é,  como o  afirma PAULA COSTA e SILVA (6) , que “o acto ( postulativo ) tem não só uma eficácia vinculante para o tribunal, como também uma função delimitadora da actuação do tribunal", sendo o princípio do pedido que "determina que o tribunal se encontra vinculado, no momento do proferimento da decisão, ao decretamento das consequências que o autor do acto postulativo lhe requerera. Não pode decidir-se por um maius, nem por um aliud ”.
Concluindo (7), temos assim que “a nulidade por condenação além do pedido e em objecto diverso do pedido, e ainda por exceder o âmbito da pronúncia, prevista no art.º 615º, nº 1, alínea e), do CPC, a verificar-se, resultará do desrespeito pelo princípio do nº 1, do art.º 609º, do CPC, segundo o qual a sentença não pode exceder os limites quantitativos e qualitativos do pedido”.
Por último, e porque igualmente pertinente para a resolução da questão ora em análise, recorda-se que é permitido ao demandante formular pedidos genéricos, maxime “Quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569.º do Código Civil”, caso em que “o pedido é concretizado através de liquidação, nos termos do disposto no artigo 358.º ”- cfrº art.º  356.º, nº  1, alínea b) e nº 2, do CPC .
Nos casos referidos por último, e sobremaneira em ações de responsabilidade civil – como o é a presente -, o valor do processo indicado pelo autor ou fixado pelo juiz tem cariz provisório, podendo ser modificado em função de novos elementos que venham a ser adquiridos. (8)
Mas, mesmo nas referidas situações – de pedido genérico - , dispensada não está a parte de indicar o respectivo valor, o qual obviamente passa a estar sujeito a revisão em função das vicissitudes posteriores, designadamente da liquidação que venha a ocorrer antes da audiência de julgamento ou na sentença final, nos termos do art. 299º, nº 4, do CPC  (9), OU SEJA, mesmo em face do disposto no artigo 569º do Código Civil [o qual reza que “Quem exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exacta em que avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o impede, no decurso da acção, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos”], desobrigada não está a parte de atribuir um concreto valor à sua pretensão indemnizatória, de acordo com os critérios do artigo 297º do CPC. (10)
Dito de uma outra forma, se é certo que quem exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exacta em que avalia os danos, tal não confere à parte da correspondente acção de indemnização o direito de não indicar qual o seu valor, antes “o que se permite é que essa indicação seja feita sem carácter definitivo, que ela possa ser corrigida se o valor dos danos apurados pelo Tribunal assim o exigir (...)”. (11)
Neste conspecto, recorda-se por último que é o próprio nº 2, do artº 556º, do CPC, que informa que “Nos casos das alíneas a) e b) do número anterior, o pedido é concretizado através de liquidação, nos termos do disposto no artigo 358.º ….”.
Aqui chegados, e confrontado o excerto decisório da Sentença apelada com o pedido pela autora formulado já no decorrer da acção, pacífico nos parece que designadamente no âmbito da fixação do montante de €350.000,00 a título de danos não patrimoniais, não se verifica de todo qualquer vicissitude enquadrável na primeira parte do alínea e), do nº 1, do art.º 615º, do CPC.
Na verdade, no referido segmento decisório o montante fixado corresponde exactamente ao montante “mínimo” peticionado, não existindo assim qualquer condenação ULTRA PETITUM.
De resto, ainda que assim não fosse, certo é que como vem sendo sufragado de modo consensual pela jurisprudência, nomeadamente pelo STJ “ Os limites da condenação contidos no artigo 661.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (actual artº 609º), têm de ser entendidos como referidos ao valor do pedido global e não às parcelas em que aquele valor se desdobra, sendo esta a orientação assumida como válida na solução de casos em que o efeito jurídico pretendido se apresenta como indemnização decorrente de um único facto ilícito, traduzindo-se o total do pedido na soma dos valores de várias parcelas, que correspondem, cada uma delas, a certa espécie ou classe de danos, componentes ou integrantes do direito cuja tutela é jurisdicionalmente solicitada ”. (12)
Incidindo de seguida a nossa atenção sobre pedido do AUTOR deduzido a 22/11/2019 (refª 34104378), e na parte referente à respectiva alínea c)  [O valor relativo à indemnização devida pela perda da capacidade para o trabalho habitual e outras atividades profissionais e económicas, a título de danos patrimoniais futuros, indemnização essa deduzida das quantias pagas e a pagar pela seguradora de acidentes de trabalho, a título de indemnização por Incapacidade Temporária Absoluta, de pensão provisória e definitiva por Incapacidade Permanente Parcial e por Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual, de acordo com a decisão a proferir no processo n.º 2637/17.0T8CSC], pacífico nos parece que integra o mesmo a previsão do art.º 556º, do CPC, ou seja, de pedido genérico se trata.
Ao referido segmento do pedido formulado na ação, claro é também que não atribuiu o autor um qualquer valor, como inquestionável é outrossim que não diligenciou o mesmo autor pela sua liquidação [ nos termos do disposto no artigo 358.º….”], mas , ainda assim, não se coibiu o Exmº Julgador de o liquidar sponte sua na sentença recorrida, condenando as RR no pagamento de uma indemnização no montante exacto de €175.000,00 [montante atribuído à autora a título de indemnização pelo dano biológico sofrido].
Ou seja, não obstante quanto ao dano biológico sofrido ter a autora formulado um pedido genérico, vem ele a ser objecto de “concretização/liquidação” pelo tribunal a quo em sede de acção declarativa, e isto apesar de não ter a parte/autora diligenciado na mesma acção pela respectiva liquidação.
Quid júris?
Adiantando desde já o nosso veredicto, e em face de tudo o acima exposto a propósito do princípio do pedido, inevitável é concluir-se, como bem avisa a Ré/seguradora, que padece a sentença recorrida do vício de NULIDADE – subsumível na alínea e),primeira parte, do nº 1, do CPC  – quanto ao segmento decisório de condenação das RR no pagamento de uma indemnização no montante de €175.000,00 [ montante atribuído à autora  a título de indemnização pelo dano biológico sofrido ].
A amparar o entendimento acabado  de declarar, nada como remeter para os ensinamentos de MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA (13), o qual, precisamente a propósito da questão [a qual em rigor consiste em saber se tendo uma parte formulado um pedido genérico, é possível ao tribunal da acção declarativa aplicar, para liquidação da obrigação de indemnizar, o disposto no art.º 566.º, n.º 3, CC ,proferindo  uma condenação numa quantia líquida ] ora em análise, discorreu do seguinte modo:
“(…)
4. Se o autor formular um pedido genérico no âmbito de uma acção de responsabilidade civil, pode perguntar-se se o tribunal da acção declarativa, fazendo uso do disposto no art.º 566.º, n.º 3, CC, pode vir a condenar o réu numa quantia líquida (ou, mais em concreto, na quantia que o tribunal apure segundo um critério de equidade). A resposta parecer ter de ser negativa pelas seguintes razões:
– O art.º 566.º, n.º 3, CC destina-se a resolver um non liquet sobre o montante da indemnização em dinheiro, não a permitir uma disparidade entre o pedido genérico do autor e a condenação líquida pelo tribunal; é, aliás, esta a diferença entre o art.º 566.º, n.º 3, CC e o art.º 609.º, n.º 2, CPC;
– Quando o autor formula um pedido genérico numa acção de responsabilidade civil, não tem o ónus de alegar os factos que permitam a quantificação dos danos e da correspondente indemnização: é o que resulta do disposto no art.º 569.º CC; logo, não é sequer possível que na acção pendente se verifique um non liquet sobre o montante da indemnização, pois que este montante não constitui objecto da causa e, por isso, não pode vir a tornar-se tema da prova;
– Por fim, a aplicação do disposto no art.º 566.º, n.º 3, CC e a determinação do montante da indemnização segundo um critério de equidade pelo tribunal da acção traduzir-se-iam numa penalização do autor, dado que esta parte ficaria impossibilitada de, numa liquidação posterior, demonstrar, com base em factos não alegados na acção, o real montante dos danos e a quantia exacta da correspondente indemnização”.
Em suma,
“Correspondendo ao pedido genérico formulado pelo autor, o tribunal vai proferir uma condenação genérica. A correspondência entre o pedido (pelo autor) e o decidido (pelo tribunal) que se verifica neste caso dispensa a aplicação do disposto no art.º 609.º, n.º 2, CPC, dado que este preceito destina-se a permitir que, tendo o autor formulado um pedido líquido, o tribunal venha a proferir uma condenação genérica. Em termos mais sintéticos: o art.º 609.º, n.º 2, CPC é indispensável para evitar uma nulidade da decisão por falta de correspondência entre o pedido e o decidido (cf. art.º 615.º, n.º 1, al. e), CPC), pelo que nunca é aplicável quando o autor tenha formulado inicialmente um pedido genérico”.
O entendimento doutrinal acabado de explicitar [decorrente do princípio do dispositivo, o qual não autoriza o julgador a substituir-se à parte na caracterização e quantificação do prejuízo] de resto, foi já pelo STJ sufragado em douto Acórdão de 19/12/2006 (14), nele se concluindo que:
- Formulado um pedido genérico por a demandante entender que o "quantum" indemnizatório deve ser relegado para execução de sentença, o tribunal não pode proceder a uma condenação líquida, até por desconhecer o tecto do pedido que o Autor deduziria se formulasse pedido concreto.
- A condenação ilíquida, se não pedida, pode surgir "ex officio", mas não é possível a situação inversa, sob pena de comissão da nulidade da alínea e) do artigo 668º CPC.
E, mais recentemente, mas agora em Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, e de 23/9/2019 (15) voltou ele – o aludido entendimento – a ser seguido/perfilhado, concluindo-se então que:
II - Se o Autor deduzir um pedido genérico, a coberto do preceituado artigo 556.º, n.º 1, al. b) do CPCivil, e não procedendo à sua liquidação no decurso da acção declarativa em momento prévio à sentença, o tribunal não pode proceder a uma condenação líquida, até por desconhecer o limite do pedido que o Autor deduziria se formulasse pedido concreto.
II - Terá, nesse caso, de remeter para posterior liquidação o valor de tal pedido, a efectuar nos termos do artigo 358.º, n.º 2, do CPCivil.
III - Portanto, a condenação ilíquida, se não pedida, pode surgir “ex officio”, mas não é possível a situação inversa, sob pena de comissão da nulidade da alínea e) do nº 1 do artigo 615.º do CPCivil.
No essencial, em face e por imposição de principio fundamental do nosso direito adjectivo [o princípio dispositivo, o qual traduz-se, na liberdade das partes de decisão sobre a propositura da ação, sobre os exatos limites do seu objeto (tanto quanto à causa de pedir e pedidos, como quanto às exceções peremptórias) e sobre o termo do processo (na medida em que podem transacionar, ou seja, é um princípio que estabelece os limites de decisão do juiz - aquilo que, dentro do âmbito de disponibilidade das partes, estas lhe pediram que decidisse. Só dentro desta limitação se admite a decisão (16)] e, não obstante - em face dos danos alegados e provados – dispor o Julgador dos elementos de facto necessários para liquidar o dano Biológico, a verdade é que não o pode/deve fazer, porque não existe um pedido concreto/liquidado pela parte e, consequentemente, não sabe o tribunal qual o seu limite para condenar , desconhecendo se está a respeitar ou não o princípio do pedido. (17)
Aqui chegados, e perante tudo o acabado de expor [cuja aceitabilidade e apropriação revelam-se inatacáveis] temos por adequado subscrever sem hesitações o excerto do acórdão do Tribunal da Relação do Porto acima identificado, e no qual se discorreu do seguinte modo:
“ (…)
Se o juiz pode-deve-remeter “ex officio” para fase ulterior a liquidação, quando lhe foi pedida condenação em quantia certa, não pode fazer o contrário, isto é, liquidar oficiosamente um “quantum” que a parte entendeu dever ser diferido para a fase de ulterior de liquidação.
Assim é manifesto que ao condenar a Ré nos termos em que o fez o tribunal condenou em quantidade superior e em objecto diverso do que foi pedido, pelo que violou claramente o disposto no n.º 1 do artigo 609.º do CPC, de onde resulta que a sentença é, nessa parte, nula, atento o disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. e) do CPC.
Em face disso, impõe-se anular a decisão respeitante à condenação da Ré no pagamento das quantias descriminadas nas alíneas b) a l) da sua parte dispositiva, havendo em sua substituição que relegar a respectiva indemnização para liquidação em incidente de liquidação posterior ou subsequente à condenação, nos termos do artigo 358.º, n.º 2, do CPCivil.”
Tudo visto e ponderado, e procedendo, assim, as conclusões recursórias nºs  1º a 8º e da Ré VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., impõe-se portanto reconhecer que padece a sentença recorrida do vício de NULIDADE da alínea e), do nº1, do art.º 615º, do CPC, e na parte em que condena as RR a pagar à autora o montante de €175.000,00 a título de dano biológico já actualizado à data da sentença.
***
4Da impugnação – pela Ré VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. – da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo e relativa à matéria de facto.
No âmbito das alegações (stricto sensu) recursórias da apelante VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A, diz a mesma discordar do julgamento pelo Primeiro Grau efectiado em relação aos pontos de facto nºs 2.13, 2.14, 2.15 e 2.18, considerando que mereciam todos eles terem sido julgados “Não Provados”, ou, ao menos alterada a sua redacção.
Para tanto, justifica a apelante que do auto elaborado pela Polícia e da prova testemunhal [JB e FB e cujas passagens e timings da gravação indica] produzida, diversa teria que ter sido a convicção do Julgador e o julgamento dirigido para os acime indicados pontos de facto.
Já em sede de conclusões, volta a apelante VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A, a manifestar a sua discordância relativamente ao julgamento de concretos pontos de facto, os quais indica, especificando outrossim quais as diferentes respostas que aqueles merecem.
 Em suma, perante o acabado de expor, pacifico nos parece que a apelante nas suas alegações recursórias revela a sua discordância no tocante ao julgamento de facto do primeiro Grau, fazendo-o com observância do disposto nas alíneas a) a c), do nº 1, e nº 2, alínea a), do art.º 640º, do CPC , logo, nada obsta a que aprecie este tribunal de recurso do “mérito da efectiva impugnação pela recorrente da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, sendo que, quando invocada uma contradição entre pontos de facto.
  Vejamos, pois, se obrigam os meios de prova pela apelante invocados que enverede este Tribunal de recurso por uma diversa convicção e consequente julgamento de facto diferenciado em relação aos pontos de facto impugnados.
Os pontos de facto impugnados “dizem”, actualmente, o seguinte:
2.13. - Para tanto, abrandou a marcha, e iniciou a respectiva manobra de mudança de direcção para a direita, acionando o sinal de pisca para a direita, mas desviando, contudo, previamente o seu veículo para a esquerda, por forma a abrir a curva para a direita e assim aceder de frente para o parque.
2.14. - Ao executar essa manobra, o condutor do veículo automóvel alargou o ângulo da curva de entrada no estacionamento e ocupou parcialmente a via da esquerda, surpreendendo o condutor do motociclo com essa manobra.
2.15. - Ao aperceber-se da manobra do veículo automóvel, o condutor do motociclo iniciou a travagem de emergência, tendo accionado o travão traseiro, vindo o veículo a entrar em slide lateral mas, por o veículo automóvel se encontrar atravessado e a ocupar, pelo menos parcialmente, com a sua traseira, a via da esquerda, apesar de ter travado não conseguiu evitar o embate entre os dois veículos.
2.18. - O local provável do embate deu-se na via da esquerda mais próximo do eixo das duas vias de trânsito.
Mas, relativamente aos mesmos, reclama a apelante que devem passar a “dizer” o seguinte:
O Facto nº 2.13: “Para tanto, abrandou a marcha, e iniciou a respectiva manobra de mudança de direcção para a direita, acionando o sinal de pisca para a direita”.
O facto 2.14: deve ser dado como não provado.
O facto 2.15:Ao aperceber-se da manobra do veículo automóvel, o condutor do motociclo iniciou a travagem de emergência, tendo accionado o travão traseiro, vindo o veículo a entrar em slide lateral, mas, apesar de ter travado não conseguiu evitar o embate entre os dois veículos”.
O facto 18:O local provável do embate deu-se na via da direita, acerca de 1.70m da berma direita atento o sentido de marcha de ambos os veículos”.
VEJAMOS.
Antes de mais, e com relevância para o julgamento da impugnação da apelante direccionada para os pontos de facto supra indicados – todos eles relacionados com a dinâmica do acidente nos exactos instantes anteriores à sua ocorrência - pertinente é atentar à fundamentação constante da sentença e em sede de cumprimento pelo Primeiro Grau do disposto no art.º 607º, nº 4, do CPC.
Ora, da referida fundamentação retira-se, em parte, as seguintes passagens pertinentes [com relevo na parte transcrita a negrito]:
“ (…)
No que se refere à prova testemunhal do acidente foi a mesma contraditória no que se refere à imputação e às causas para o sucedido, tendo sido ouvido, por um lado, como testemunha JS, condutor do motociclo e à data companheiro da autora, e, por outro, JB, condutor do veículo automóvel, e FB, mulher deste, que ocupava o lugar ao lado do condutor do veículo automóvel, tendo as testemunhas em causa apresentado versões distintas, essencialmente, a respeito do condutor do veículo automóvel ter “alargado” a curva e ocupado a via da esquerda para aceder ao parque de estacionamento situado à sua direita. Com interesse foi, ainda, ouvido como testemunha AC, agente da PSP, que não presenciou o acidente mas que elaborou a participação do acidente e o respectivo croqui com base na informação que recolheu na altura e que esclareceu as circunstâncias em que tal sucedeu.
No que se refere à prova documental, teve o tribunal em consideração a mencionada participação de acidente e respectivo croqui juntos com a p.i., o relatório técnico sobre o acidente da autoria do Prof. JD do Instituto de Engenharia Mecânica do Instituto Superior Técnico (IEMIST), no seguimento de pedido feito pelo Ministério Público no âmbito do processo de inquérito que se seguiu ao acidente (proc. n.º 121/16.8PTOER do DIAP de Oeiras, que findou com o arquivamento em relação ao condutor do motociclo e com a dedução de acusação contra o condutor do veículo automóvel), o relatório técnico da autoria da GEP Peritagens, realizado a pedido da 1.ª ré, bem como as fotografias do local extraídas do site do Google e exibidas às testemunhas no decurso da audiência de julgamento.
(…)
Nesse sentido, deu o tribunal como provado e incluiu na matéria de facto, as referências ao local do acidente, nomeadamente, as circunstâncias da via e respectiva visibilidade, as características dos veículos e as respectivas zonas embatidas, sendo certo que relativamente à dinâmica do acidente e movimento dos corpos, foram valoradas as conclusões das simulações computacionais descritas no mencionado relatório e que esclareceram, nomeadamente, que apenas as que situavam o local do embate na via da esquerda eram compatíveis com os elementos objectivos recolhidos. A este respeito, e com especial relevância, foi afastado pelo relatório que a indicação constante do croqui a respeito do rasto de travagem e sua localização pudesse corresponder ao que consta da participação de acidente.
(…)
Ora, não sendo tais elementos comprováveis pelas reservas que nos mereceram e por estarem em contradição com as conclusões do relatório técnico do IEMIST, o qual parte de elementos mais seguros e fiáveis, como a posição em que o motociclo ficou imobilizado e o local em que os corpos ficaram imobilizados, e que se mostram comprováveis pela análise da participação do acidente e pelas fotografias tiradas na altura (v.g. posição de imobilização do motociclo que consta das figuras 27 e 28), deu o tribunal prevalência a este meio de prova, assentando, pois, essencialmente a sua convicção no que resulta da análise feita por este relatório.
(…)
De referir que, conforme resulta da leitura do relatório e foi esclarecido na inquirição do Prof. JD, foram feitas diversas simulações computacionais, as quais vêm resumidas na tabela n.º 6 (cfr. pág. 57 do relatório), sendo, na valoração aí feita pelo técnico, entendida como credíveis as simulações com uma margem de incerteza inferior a 5%, pelo que, com referência a alguma coerência com as posições de imobilização estimadas, apenas as três últimas simulações deverão ser consideradas. Ora, estas simulações, com referência às figuras antecedentes constantes do relatório com os n.ºs 62, 65 e 68, colocam o veículo automóvel a ocupar, pelo menos, em parte, a via da esquerda por forma a alargar o ângulo da curva antes de virar para a direita, assinalando o ponto de impacto como tendo ocorrido na via em que se encontrava a circular o motociclo, pelo que, com base nestas explicações, deu o tribunal como provada a matéria do acidente nos termos em que o fez no que se refere a estes elementos.
Já no que se refere a outras circunstâncias relevantes do acidente, nomeadamente, o elemento surpresa ou a velocidade a que seguia a motociclo, valorou, novamente o tribunal, o conjunto dos meios de prova produzidos de acordo com as regras de experiências e a livre convicção que foi possível formal, essencialmente, a partir dos dados objectivos trazidos aos autos.
(…)
Uma última referência a respeito da prova produzida relativamente à dinâmica do acidente para realçar a circunstância do tribunal ter ficado convencido que o condutor do veículo automóvel, ou mesmo a testemunha, sua mulher, ocupante do mesmo veículo, não se terão apercebido da presença do motociclo a circular mais atrás na via da esquerda, não tendo os depoimentos que prestaram sido valorados em grande medida pelo tribunal por não terem merecido credibilidade. De resto, a testemunha JB, encontrava-se, sensivelmente no mesmo período em que decorreu este julgamento, a ser julgado no âmbito do processo crime pelos mesmos factos, o que não favoreceu a sua isenção, ainda que no presente processo apenas se discuta a matéria cível do acidente e não seja parte.
Nesse sentido, foi desconsiderada, nomeadamente, a versão que estas testemunhas apresentaram para a ocorrência do acidente, denotando o relato que fizeram ter sido, possivelmente, ensaiado pelo uso que fizeram das mesmas expressões, em especial quanto a terem negado que, com a realização da manobra de mudança de direcção para a direita, tenha o veículo automóvel ocupado a via da esquerda.
Com efeito, não se mostrou credível nem compatível com a demais prova produzida, a justificação dada para afastar que tivesse sido feita essa manobra por tal entrada do carro de frente no acesso ao parque poder estragar o veículo devido à existência de passeio, desde logo, por se ter provado que o passeio, naquele local, faz um desnível e é rebaixado. Permitiria, assim, o passeio, que os veículos entrassem de frente para o parque, sendo, aliás, essa a manobra mais natural ou habitual que os condutores que pretendem aceder aquele parque se socorrem, até por, de seguida, o caminho em terra batida descrever uma curva para a direita, sendo assim mais fácil ou conveniente, alargar o ângulo da curva, mesmo ocupando a via contrária, como se acredita que terá sido o caso da conduta do condutor do veículo automóvel.
(…)”.
Conhecida a ratio da convicção do tribunal a quo e que subjaz ao julgamento da factualidade provada e pela apelante impugnada, a primeira conclusão que de imediato importa aqui e agora extrair é a de que no essencial fundamenta a Ré/impugnante as alterações reclamadas – e a introduzir na decisão de facto – precisamente em meios probatórios que prima facie foram pelo Julgador desconsiderados [o auto elaborado pela Polícia  - considerando a apelante tratar-se do único documento fidedigno junto aos autos - e os depoimentos testemunhais de JB e de FB, respectivamente o condutor do veículo e a esposa, e que com o mesmo circulava].
E, já a segunda conclusão a retirar é a de que, efectivamente, analisados/ouvidos ambos os depoimentos testemunhais referido, mostram-se os dois na  realidade perfeitamente alinhados com uma versão que revela que o JB , no âmbito da manobra que efectuou para  aceder ao parque de estacionamento situado à direita do sentido em que o seu veículo circulava, agiu com todo o cuidado e respeito pelas regras estradais, sinalizando atempadamente a manobra e não ocupando qualquer espaço da semi-faixa de rodagem do lado esquerdo (aquela por onde circularia o motociclo).
Já a Participação do Acidente elaborada pela PSP, decorre outrossim a “confirmação” da versão do acidente apresentada pelo condutor do veículo e sua mulher, tendo designadamente docroqui que daquela faz parte o participante indicado/situado o local provável da embate inicial ( entre o motociclo e a traseira do veículo - dentro da semi-faixa da direita da dupla faixa de rodagem da marginal e atendo o sentido Cascais-Lisboa.
Não obstante a prova acabada de expor, certo é que mostra-se a mesma contrariada pelo testemunho do condutor do motociclo e, sobretudo, pelas conclusões a que chega o pormenorizado, exaustivo e profundamente fundamentado Relatório elaborado pelo IDMEC – Instituto de Engenharia Mecânica do Instituto Superior Técnico [a solicitação do MP e no âmbito processo crime que corre termos sob o n.º 121/16.8PTOER no Tribunal da Comarca de Lisboa Oeste] junto aos autos.
Dir-se-á que, confrontado o aludido relatório do IDMEC com o conteúdo do croqui que integra a Participação do Acidente elaborada pela PSP, logo se explica por que motivo se inclinou [em sede de formação da convicção] o Julgador pelo primeiro em detrimento do segundo, não olvidando ainda que na referida Participação do Acidente descobre-se a seguinte e paradigmática explicação quanto aos elementos em que a mesma se baseia : “ Elaboro a presente descrição de acidente em harmonia com a posição final após embate dos veículos intervenientes, a versão do condutor do veículo nº2 e pelo que constatei no local” (sic).
De resto, tendo o participante da PSP descrito na participação que [ prima facie com base apenas na versão do condutor do veículo n.º 2] que antes do embate “ ambos os veículos circulavam na referida artéria na via da direita e no sentido Oeste/Este, o veículo nº1 circulava à retaguarda do veículo nº 2, conforme croqui de acidente de viação que se anexa ”, certo é que da versão junta com a participação e assinada pelo condutor do veículo apenas consta “ Pelas 9,15 horas, e na Rua Avª Marginal e na zona das Fontaínhas, virei à direita para ir para a praia e fui embatido na traseira pela Mota ”.
E, já em audiência, refere mesmo o condutor do veículo que, ao pretender virar para a direita, fez o pisca, olhou para o espelho retrovisor e “não vejo rigorosamente ninguém atrás de mim”.
Ou seja, perante o acabado de expor, o que decorre com segurança é que a versão do condutor do veículo e sua esposa mostra-se contrariada pela versão do condutor do motociclo, isto por um lado e, por outro, o conteúdo da Participação da PSP não merece confiança/crédito atendível maxime em confronto com as conclusões do Relatório elaborado pelo IDMEC – Instituto de Engenharia Mecânica do Instituto Superior Técnico, deste último resultando uma versão diversa em sede de dinâmica do acidente, designadamente quer no tocante à  faixa de rodagem em que circulavam a mota e veículo momentos antes do embate, quer sobretudo quanto ao local provável em que o em base se veio a dar.
Neste conspecto, recorda-se que as conclusões do Relatório elaborado pelo IDMEC – Instituto de Engenharia Mecânica do Instituto Superior Técnico, apontam para uma versão diversa (da do condutor do veículo) e em sede de dinâmica do acidente, designadamente quer no tocante à faixa de rodagem em que circulavam a mota e o veículo momentos antes do embate, quer sobretudo quanto ao local provável em que o embate se veio a dar.
É assim que, do aludido Relatório do IDMEC consta, expressis verbis, que:
Da análise de todos os documentos disponibilizados da reconstituição computacional do acidente, conclui-se que:
1. O motociclo circulava no momento do impacto principal a uma velocidade entre 60 Km/h e 68 Km/h. O condutor informa que travou. Assim a velocidade de circulação será superior à velocidade de impacto, não sendo no entanto possível quantifica-la pois não é conhecido o ponto/instante em que essa travagem foi iniciada;
2. O veículo ligeiro circulava no momento do impacto principal a uma velocidade entre 14 Km/h e 20 Km/h;
3. O ponto de impacto teve de ser na via de trânsito da esquerda tendo em conta o sentido de circulação dos veículos (Cascais-Lisboa). Ou seja, devido às características do acesso à praia no local do acidente, o veículo automóvel invadiu a via da esquerda, onde circulava o motociclo.
E, ainda do mesmo relatório consta também, a dado passo que:
“Através dos resultados obtidos nas simulações computacionais da etapa 1 e da etapa 2 pode-se constatar que o ponto de impacto teve de ser na via de trânsito da esquerda tendo em conta o sentido de circulação dos veículos (Cascais-Lisboa). Segundo as declarações do condutor e da passageira do motociclo foi nesta via de trânsito que ocorreu o impacto e assim as simulações computacionais corroboram esta hipótese.”
Aqui chegados, não se olvida que consensual e pacífico é que no âmbito da aferição da pertinência de se introduzirem alterações na decisão de facto proferida pelo tribunal de primeira instância, cabe inclusive ao tribunal de recurso formar a sua própria convicção (18), o que deve fazer outrossim no gozo pleno do princípio da livre apreciação da prova (cfr. art.º 607º, nº 5, do CPC).
Porém, pertinente é também não olvidar que nesta matéria não incumbe de todo ao tribunal de segunda instância realizar um segundo ou um novo julgamento, sendo antes a sua competência residual [porque os respectivos poderes circunscrevem-se à reapreciação de concretos meios probatórios relativamente a determinados pontos de facto impugnados (19), e porque a impugnação da decisão de facto do tribunal a quo não transforma "o tribunal de segunda instância em tribunal de substituição total e pleno, anulando, de forma plena e absoluta, o julgamento que foi realizado por um tribunal a quem cabe, em primeira e decisiva linha, fazer uma aproximação, imediata e próxima, das provas que lhe são presentes"], cabendo-lhe tão só  “proceder ao julgamento da decisão de facto por forma a corrigir erros de julgamento patentes nos tribunais de 1.ª instância, mas dentro de limites que não podem exacerbar ou expandir-se para além do que a lei comina.” (20)
Consequentemente, aquando da formação da convicção pelo ad quem, importante é não esquecer que, se é certo que o princípio da imediação não pode constituir obstáculo à efectivação do recurso da matéria de facto, a pretexto de, na respectiva decisão, intervirem elementos não racionalmente explicáveis (21), a verdade é que [o que ninguém ousa questionar] muito do apreendido pelo Julgador da primeira instância nunca chega - porque não é gravado ou registado - ao ad quem, sempre existindo inúmeros factores difíceis de concretizar ou verbalizar e que são importantes e decisivos em sede de formação da convicção , e , compreensivelmente , no âmbito do julgamento da impugnação da decisão de facto, espera-se que  a Relação evite a introdução de alterações quando não lhe seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência efectiva de um erro do tribunal a quo no âmbito da apreciação da prova no tocante aos concretos pontos de facto impugnados. (22)
Por último, e com relevância outrossim para o julgamento do mérito da impugnação da decisão de facto, conveniente é ter sempre presente que o grau de exigência ou standard de prova necessário para que concreta factualidade seja aceite pelo julgador como sendo verdadeira, não é sempre necessariamente o mesmo [v.g. é compreensivelmente mais elevado no processo penal que no processo civil], antes deve ele variar segundo a matéria concreta que esteja em litígio e em apreciação, designadamente em função dos bens ou direitos que se encontram em jogo, e em função a importância e necessidade de se obter uma decisão célere. (23)
Dir-se-á que, no essencial, pertinente é que o standard de prova deva ser mais exigente quanto maior for a improbabilidade do evento alegado (24), e , por outra banda, quando na presença de factos constitutivos do direito alegado cuja prova é por regra difícilde obter, não deve o julgador – no âmbito da sua valoração/apreciação - utilizar um grau de exigência ao nível da generalidade dos demais casos, antes deve ajustar o standard de prova para um nível de exigência mais leve/baixo, maxime lançando então mão das regras da experiência (25), sendo que – importa não olvidar - é precisamente nas “acções de responsabilidade civil decorrente de acidentes de viação em que a valoração razoável dos meios de prova produzidos e o uso de presunções judiciais mais se justifica ”. (26)
E, por falar em presunções, recorda-se que uma delas diz respeito precisamente à manobra de mudança de direcção para a direita e/ou de estacionamento em lugar existente ( Estacionamento em perpendicular ) à direita, a qual , não raro , porque exige uma manobra de 90 graus para entrar em espaço, pode desencadear ou provocar a tentação de ocupar parte da faixa de rodagem de sentido contrário, como meio de alargar o ângulo de viragem, facilitando assim a manobra.
Tudo visto e ponderado, tendo-se reapreciado os meios de prova pela Ré seguradora/apelante invocados, bem como outros que nos autos foram produzidos e, chegado o momento de aferir se perante aqueles importa enveredar por uma diversa convicção da formada pelo Primeiro Grau no que à dinâmica do acidente concerne, a resposta só pode ser NEGATIVA.
Na verdade, perante a apreciação conjunta da referida prova, é nossa convicção que razoável não é concluir-se que enveredou o tribunal a quo por uma convicção errada, para tanto tendo valorado e apreciado a prova de uma forma incorrecta, e ao arrepio das regras da experiência que no caso se justificavam aplicar.
Consequentemente, e porque como o dissemos supra, no âmbito do julgamento da impugnação da decisão de facto, espera-se que  a Relação evite a introdução de alterações quando não lhe seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência efectiva de um erro do tribunal a quo no âmbito da apreciação da prova no tocante aos concretos pontos de facto impugnados, então inevitável é a improcedência da impugnação da decisão de facto deduzida pela apelante VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.
Por tudo o exposto, deve, portanto, a decisão de facto proferida pelo Primeiro Grau permanecer intocada, sendo com base nela que importará doravante apreciar do “mérito” das restantes questões recursórias.
*
5. - Se, em face da factualidade provada, importa concluir que para a ocorrência do acidente contribuiu exclusivamente o condutor do motociclo ??-??-ZV, sendo, portanto, o condutor do veículo ??-??-IQ totalmente ilibado de qualquer responsabilidade.
A presente questão, recorda-se, foi pela Ré apelante VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., suscitada, sendo que, em sede de repartição de culpas para a ocorrência do sinistro, veio o Tribunal a quo a considerar/decidir que “…. no caso presente, verifica-se que cada um dos condutores dos veículos intervenientes no acidente de viação violaram disposições estradais integradoras da prática de um facto ilícito, porquanto, ficou demonstrado que ambos infringiram, pela forma como exerceram a condução, os deveres gerais de cuidado decorrentes da condução, no caso, do condutor do veículo automóvel, em particular os que se referem à circulação pela via da direita e à realização da manobra perigosa que estava a executar de mudança de direcção para a direita, uma vez que não usou de todo o cuidado a que estava obrigado e de que era capaz por forma da sua realização não resultasse perigo ou embaraço para o trânsito, como veio a ocorrer, enquanto o condutor do motociclo não adequou a velocidade a que circulava ao limite legal fixado para o local, nem conseguiu imobilizar atempadamente o seu veículo por forma a evitar o embate em causa nos autos.
E mais adiante, no tocante à medida da contribuição de cada um dos condutores para o acidente, considerou/decidiu o tribunal a quo que “ ponderando a relevância e o maior contributo que a invasão da via da esquerda por parte do condutor do veículo automóvel significou para o acidente ter ocorrido, mas não esquecendo que tal também poderia ter sido, se não evitado, pelo menos atenuado quanto aos danos que sobrevieram, no caso do condutor do motociclo ter adequado a velocidade a que circulava ao limite legal estabelecido e às circunstâncias concretas da condução, entende-se fixar a proporção da repartição de responsabilidade em 70% para o condutor do veículo automóvel e 30 % para o condutor do motociclo ”.
Ora, para justificar  a alteração do julgado e de forma a que em sede de responsabilidade para a ocorrência do acidente a mesma coubesse exclusivamente ao condutor  do motociclo ??-??-ZV, relembra-se que impugnou a recorrente VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A , a decisão de facto proferida pelo Primeiro Grau, e de modo a que a factualidade provada [em 2.13, 2.14 e 2.18] fosse considerada não provada, designadamente no que concerne “à ocupação” – pelo veículo automóvel - parcial da via da esquerdae ao local do embate(ocorrido na via da esquerda mais próximo do eixo das duas vias de trânsito).
Não obstante, e como vimos no item 4. do presente acórdão, considerou-se não existirem motivos pertinentes e relevantes que justificassem a formação de uma diversa convicção tendo por objecto os pontos de facto impugnados ,  e  , consequentemente, que nada obrigava e impunha (cfr. nº 1, do art.º 662º, do CPC) a modificação das respostas que foram dadas pela primeira instância aos referidos e concretos pontos de facto.
Destarte, e não olvidando o disposto no artº 608º, nº 2, do CPC, ex vi do nº 2, do art.º 663º, do mesmo diploma legal, não se nos impondo [porque fora do objecto da apelação de VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A] tecer quaisquer considerações atinentes à bondade e acerto da decisão da primeira instância no âmbito da subsunção dos factos às normas legais correspondentes, maxime em sede fixação da proporção da repartição de responsabilidade em 70% para o condutor do veículo automóvel e 30 % para o condutor do motociclo”, inevitável é a improcedência da apelação de VIA DIRECTA-COMPANHIA DE SEGUROS, S.A no que concerne à reclamada improcedência da acção quanto ao pedido da autora dirigido à referida apelante .
De qualquer forma,  sempre se acrescenta (27) que, na referida matéria temos por adequada, justa e devidamente ponderada a referida repartição de “culpas”, subscrevendo nós o entendimento da primeira instância no sentido de que “ … as circunstâncias em que foi exercida a condução por parte do condutor do veículo automóvel, em termos de responsabilidade e de causalidade para o evento, foram mais relevantes e determinaram em maior medida o embate, do que o facto do condutor do motociclo se encontrar a circular em excesso de velocidade e não ter conseguido evitar o embate na traseira do veículo automóvel”, ou seja, “ …. que o facto do condutor do motociclo se encontrar a circular na via da esquerda e a velocidade superior ao limite legal, só por si, não determinaria a ocorrência do acidente pois daí não resultaria em si a previsibilidade ou possibilidade do acidente, o qual se deveu em maior medida a ter o condutor do automóvel invadido a via da esquerda, fazendo uma manobra ilegal e desnecessária que causou uma perturbação na circulação normal, que, de outro modo, mesmo vindo o motociclo em excesso de velocidade não explicaria o embate, o qual se deu, inclusive, próximo do eixo da via mas ainda na via da esquerda, o que revela o maior contributo dessa manobra para o sinistro.
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6. - Se importa alterar a sentença recorrida quanto ao montante atribuído à autora a título de danos não patrimoniais, reduzindo-se a indemnização atribuída para uma quantia não superior a 200.000,00€.
Ambas as Rés seguradoras discordam desde segmento decisório, considerando no essencial que, apesar de GRAVES as consequências do acidente para a autora, em termos físicos e morais, mostra-se ainda assim o montante indemnizatório fixado pelo Primeiro Grau claramente exagerado, estando ele em total dessintonia com ao padrões jurisprudenciais mais recentes.
Alinham assim ambas as recorrentes pelo entendimento de que, uma indemnização em montante não superior a 200.000,00€ seria perfeitamente ajustada para ressarcia a autora do DANO NÃO PATRIMONIAL sofrido.
Vejamos, pois, se nesta matéria se justifica alterar o julgado.
Ora, decorre dos art.ºs 494º e 496º, nº 3, ambos do CC, que o montante da indemnização direccionada para o ressarcimento dos danos não patrimoniais será sempre calculado segundo critérios de equidade (que nada tem que ver com arbitrariedade), e atendendo designadamente ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e a do lesado, e ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida.
Como bem refere o STJ no seu douto Ac. de 7/7/2009 (28), a equidade é um termo de procedência latina (aequitas) com o significado etimológico e corrente de “igualdade”, “proporção”, “justiça”, “conveniência”, “moderação” e indulgência , e é utilizado na linguagem da ética e das ciências jurídicas sobretudo para designar a adequação das leis humanas e do direito às necessidades sociais e às circunstâncias das situações singulares (a equidade é, por assim dizer, a “justiça do caso concreto”) .
No âmbito ressarcitório dos danos não patrimoniais, essencial outrossim não olvidar é que, “(…) a indemnização (…) não reveste natureza exclusivamente ressarcitória, mas também cariz punitivo, assumindo-se como uma pena privada, estabelecida no interesse da vítima, por forma a desagravá-la do comportamento do lesante.” (29)
É que, como decidiu já o Supremo Tribunal de Justiça (30)“(...) No caso dos danos não patrimoniais, a indemnização reveste uma natureza acentuadamente mista, pois “visa reparar, de algum modo, mais que indemnizar os danos sofridos pela pessoa lesada”, não lhe sendo, porém, estranha a “ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente”.
Seja como for, e tal como vem sendo igualmente entendido pelos nossos tribunais superiores, e com vista ao cumprimento do disposto no art.º 496º, do CC, o que importa é que a indemnização seja fixada em montante que contribua para alcançar uma efectiva possibilidade compensatória, sendo portanto significativa, isto por um lado, mas, por outro, deve igualmente o respectivo quantum mostrar-se justificado e equilibrado, não podendo de todo contribuir para  um enriquecimento abusivo e imoral do lesado.(31)
Isto dito, e no âmbito de factualidade relevante (aquela que impressiona/sensibiliza qualquer comum cidadão, tratando-se de uma pessoa que à data do acidente, tinha 40 anos de idade, tendo nascido no dia 03-08-1976) com pertinência para a fixação do Dano Moral, diz-nos a factualidade provada, que:
(…)
2.29. – A autora foi transferida para o Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, onde manteve tratamentos multidisciplinares de reabilitação, que se prolongaram durante cerca de 9 meses.
2.31. - Após a data da alta hospitalar permaneceu no domicílio, por ter ficado paraplégica, ficou dependente para se deslocar em cadeira de rodas e necessita de ajuda de 3.ª pessoa.
2.34. - A autora, devido às sequelas do acidente, necessita de produtos consumíveis relacionados com essas sequelas e tratamentos, nomeadamente de pensos de incontinência, resguardos de cadeira, toalhitas e álcool sanitário.
2.35. - A autora necessita igualmente de tomar medicação, tendo de ser medicada com: pregabalina, baclofeno, mirabegron e duloxetina e, em situações de urgência, toma tramadol+paracetamol.
2.36. - Realizada perícia médico-legal, resulta do respectivo relatório, com referência à data das conclusões de 22-07-2021, que a autora apresentava queixas:
i) a nível funcional, compreendendo este nível as alterações das capacidades físicas ou mentais:
- Postura, deslocamentos e transferências: dificuldade na transferência do sofá para a cadeira, beneficiando de ajuda para o fazer. Autónoma nas restantes transferências.
Desloca-se autonomamente em cadeira de rodas manual, com dificuldade no piso irregular; não consegue manter-se de pé autonomamente;
- Manipulação e preensão: limitada no acesso aos objetos que se encontram em locais mais elevados;
- Controlo de esfíncteres: perdas urinárias quase diárias, agravadas nos acessos de asma, quando tosse ou espirra, usando penso permanentemente; raramente, tem incontinência para fezes moles; por vezes tem perdas de pequenos fragmentos fecais; necessita de manobras manuais para evacuação;
- Sexualidade e procriação: diminuição acentuada do prazer que retira das relações sexuais, por alterações da sensibilidade a nível genital, por quase impossibilidade de alcançar o orgasmo e devido a perdas urinárias durante o ato sexual;
- Fenómenos dolorosos: sensação de “queimadura nas pernas”; na região lombar:
- Outras queixas a nível funcional: embora mantenha sensibilidade nos membros inferiores, refere alterações da mesma, com zonas que sente “encortiçadas”
ii) A nível situacional, compreendendo este nível a dificuldade ou impossibilidade de uma pessoa efetuar certos gestos necessários à sua participação na vida em sociedade, em consequência das sequelas orgânicas e funcionais e de fatores pessoais e do meio:
- actos da vida diária:
- faz tudo sentada; conduz automóvel adaptado; necessita de ajuda de terceira pessoa diária no período diurno (8h/dia, todos os dias) para limpezas domésticas, preparação de refeições, preparação da roupa, vestir e despir algumas peças de roupa, despejar o lixo, passear os cães, bem como para se deslocar na cadeira de rodas em locais que não estão adaptados; autónoma na higiene pessoal e utilização da sanita; mastiga e deglute sem dificuldade alimentos mais consistentes;
- vida afetiva, social e familiar:
- diminuição das oportunidades de interação social, devido às limitações na mobilidade; deixou de frequentar a praia e atividades aquáticas associadas durante o verão; diariamente andava de bicicleta, de skate, fazia caminhadas e jogava à bola com o filho; aos fins de semana praticava motocross. Deixou de conseguir praticar qualquer uma destas atividades lúdicas, bem como de se dedicar ao voluntariado com animais.
2.38. - Resulta ainda, da discussão e das conclusões médico-legais resultantes da perícia, com maior relevo que:
- a data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 04-02-2019, data da alta dos serviços clínicos da seguradora de acidentes de trabalho;
- o défice funcional temporário total, se terá situado entre 18-08-2016 e 30-06-2017, sendo assim fixável num período de 317 dias, aos quais deverão ser acrescentados 24 dias, necessários para eventual remoção de material de osteossíntese, caso tal se venha a afigurar necessário no futuro;
- o défice funcional temporário parcial, se terá situado entre 01-07-2017 e 04-02-2019, sendo assim fixável num período de 584 dias, correspondente ao restante período decorrido até à consolidação funcional e situacional das lesões, aos quais deverão ser acrescentados 24 dias, necessários para recuperação funcional após eventual remoção de material de osteossíntese;
- a repercussão temporária na actividade profissional total, fixável num período total de 901 dias, tendo em conta o tipo de lesões sofridas, o tipo de tratamentos efetuados e a informação clínica facultada, aos quais deverão ser acrescentados 48 dias, necessários para recuperação funcional após eventual remoção futura de material de osteossíntese.
- o quantum doloris, fixável no grau 7 numa escala de 7 graus de gravidade crescente, tendo em conta o tipo de traumatismo, as lesões resultantes, os tratamentos efectuados, o longo período de recuperação funcional e o sofrimento psíquico certamente vivenciado pela examinanda;
- o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, fixável em 78 pontos, considerando o valor global da perda funcional decorrente das sequelas e o facto de estas afetarem a examinada em termos de autonomia e independência, tornando-a dependente de ajudas técnicas e de terceira pessoa, e serem causa de sofrimento físico, limitando-a em termos funcionais, tendo em consideração os seguintes danos permanentes – sequelas – com repercussão funcional:
a) paraplegia com compromisso sensitivo-motor e dos esfíncteres, bem como disfunção sexual (enquadrável em Na 0111, com desvalorização arbitrada de 75 pontos);
(...)
- dano estético permanente, é fixável no grau 6, numa escala de 7 graus de gravidade crescente;
- repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer, é fixável no grau 7, numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- repercussão permanente na atividade sexual, é fixável no grau 6, numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- dependências permanentes e ajudas:
(…)
b) ajuda de terceira pessoa:
- ajuda de 3ª pessoa de 8h/diárias, não técnica, de complemento e substituição na realização de atividades básicas e instrumentais de vida diária.
(…)
2.40. - Vivia em união de facto com um companheiro e tinha um filho de 9 anos de idade que se encontrava a viver consigo e que, no seguimento do acidente, teve de passar a viver com o pai.
2.47.- A autora, antes do acidente, era uma mulher alegre, e cheia de vida, independente, que vivia com o filho do ordenado que auferia e gostava de viajar, ir à praia, de passear, estar com a família e com os amigos.
2.48.- Era uma mãe dedicada e que fazia a felicidade dos que com ela conviviam, gostava de se divertir e gozava de boa saúde.
2.49.- Após o acidente a vida da autora mudou completamente, tendo ficado paraplégica e dependente de 3.ª pessoa, e enfrenta diariamente inúmeras dificuldades e obstáculos que tornam muito difícil e desgastante a simples actividade de viver.
2.50.- A autora deixou de poder realizar actividades como caminhar, fazer desporto, sem ser adaptado, ir a determinados espetáculos culturais, restaurantes, e outros, quando não existem acessos para cadeira de rodas.
2.51.- A autora tem de dispor de muito equipamento e ajuda de terceiros para conseguir minimizar as dificuldades quando se desloca.
2.52.- A autora não consegue passar uma noite de descanso sem interrupções devido às dores que são constantes e intensas.
2.53.- A relação da autora com o companheiro conheceu um progressivo desgaste, tendo recentemente terminado a relação e passado a autora a viver noutra casa, embora ainda mantenham contacto.
2.54.- Devido às dificuldades diárias e permanentes que tem de enfrentar, sente-se mal, e quase sem vontade de viver, sentindo sempre uma grande angústia e uma dor permanente e muitas vezes revolta e mesmo humilhação.
2.55.- Para fazer muitas coisas, mesmo que pequenas, necessita da ajuda de terceiros, como seja do ex-companheiro, do filho ou de terceiros.
(…)
2.62.- A autora sente o estigma e o resultado de atitudes discriminatórias no acesso a diversos espaços, tendo necessidade de programar com antecedência e detalhe todos os actos da sua vida.
2.63. - A autora ficou impossibilitada de prosseguir com o voluntariado com animais de rua e atividades desportivas e de lazer (praia, padel, bicicleta, body board, condução de carros e motas) que realizava antes do acidente, tendo, contudo, encontrado formas alternativas mas mais limitativas de desenvolver o voluntariado que fazia ou através do recurso a formas de desporto adaptado.”
Conhecida portanto e no essencial a factualidade provada com interesse para a questão ora em debate [ resultando da aludida factualidade e com segurança estarmos na presença de manifestos e SIGNIFICATIVOS danos morais que pela sua indiscutível, GRAVIDADE, merecem claramente a tutela do direito, cfr. nº 1 do artigo 496º do Código Civil ] , e na linha do acima já exposto a propósito da necessidade de existir alguma uniformização e tratamento análogo dos tribunais no âmbito das decisões a proferir em sede de arbitramento de indemnizações a lesados/sinistrados de acidentes de viação, importa de seguida recordar algumas das Decisões - que sobre o thema decidendum se pronunciaram  já - dos Tribunais Superiores mais recentes, sendo que, como de resto é consabido, é precisamente no âmbito da fixação da indemnização por danos morais que mais se justifica o recurso a padrões jurisprudencialmente definidos a ponto de se alcançar uma sempre desejada uniformização de critérios.
Ora, a propósito da referida matéria, vemos que [por ordem de antiguidade]:
I - Em Acórdão do STJ de 2/3/2011 (32) [referente a acidente de viação de 6/12/2000], veio a CONCLUIR-SE que:
É justo atribuir uma indemnização de €400.000 por danos morais à lesada que, com 19 anos de idade, por força do embate de uma árvore na viatura onde seguia, ficou com diversas e muito graves lesões, de entre as quais se salienta a fractura de vértebras, com instalação irreversível de tetraplegia, sofrendo de diminuição acentuada da função respiratória e de incapacidade funcional permanente de 95%, com incapacidade total e permanente para o trabalho; a partir da data do sinistro e durante cerca de um ano, foi alimentada através de um tubo gástrico introduzido pelas narinas e, na sequência de gastrotomia a que teve de ser submetida em resultado de uma fístula esofágica alta que sobreveio a uma intervenção cirúrgica, alimentada através de uma sonda introduzida no corte cirúrgico, na zona do estômago; foi submetida a várias intervenções cirúrgicas e ficou com múltiplas e extensas cicatrizes deformantes; as lesões sofridas, os seus tratamentos e suas sequelas provocaram dores lancinantes; desloca-se em cadeira de rodas e necessita de assistência permanente de pessoa nos actos da vida diária, sendo que, para certos actos (tais como, tomar banho e defecar) carece da ajuda de mais uma pessoa; perdeu todos os movimentos e sensibilidade do pescoço para baixo (com excepção dos ombros), designadamente nos órgãos sexuais, nos esfíncteres, no ânus, no recto, nos intestinos, no estômago, no aparelho urinário, no respiratório e nos membros inferiores e superiores; corre o risco sério de vir a sofrer graves lesões renais; tem a sua expectativa de vida encurtada; não pode ter relações sexuais, nem prazer sexual, nem procriar; vive em permanente estado de amargura, desespero e angústia, inconformada com a sua situação e perdeu a vontade de viver e muitas vezes tem pedido que lhe ponham termo à vida;
II – Em Acórdão do STJ de 25/11/2009 (33) [referente a acidente de viação ocorrido no dia 22 de Dezembro de 2003], veio a CONCLUIR-SE que:
- O menor ( com 8 anos à data do ciente ) ficou paraplégico, sem sensibilidade abaixo da linha intermamilar, fazendo infecções urinárias, respiratórias e dermatológicas e úlcera na região occipital, sendo ventilado durante 15 dias; - em consequência do acidente ficou internado mais de 8 meses ; - foi submetido a várias intervenções cirúrgicas, com anestesias gerais e sequente sujeição a programas de reabilitação física; - a incapacidade temporária geral total foi de 765 dias, o que significa que durante os anos completos de 2004 e 2005, esteve impedido de realizar com razoável autonomia as actividades da vida diária, familiar e social, sendo do mesmo período a incapacidade temporária para a actividade ocupacional habitual de estudante; - efectuou 197 deslocações ao Centro de Medicina de Reabilitação entre a data da alta deste e a data da propositura da acção cível enxertada, tendo efectuado outras 82 deslocações ao Hospital no mesmo período; - foi submetido a tratamentos de acupunctura;- padece de quantum doloris de grau 6, numa escala de 7, de dano estético de 5, numa escala de 7 graus; - padece de ausência de controle de esfíncteres, obrigando a uso de fraldas e de bebegel, tendo a necessidade de fazer algaliação de 3 em 3 h, constituindo uma situação irreversível; - tem necessidade de ter vigilância do foro urológico, tomando diariamente dois comprimidos para o funcionamento da bexiga; - ficou na dependência de ajudas técnicas ( cadeira de rodas, ortóteses e botas ortopédicas), médicas fisiátricas e medicamentosas, bem como do apoio de terceira pessoa; - tem a perspectiva de viver numa cadeira de rodas até ao fim dos seus dias ; - necessita de fisioterapia e hidroterapia para não agravar o seu estado;- acresce a perda do avô, com quem seguia no veículo embatido, estando encarcerado cerca de 40 m. ao lado do mesmo, já morto, só dele conseguindo falar e chorar a sua morte mais de dois meses transcorridos sobre o acidente, afigura-se adequado fixar a indemnização por danos não patrimoniais em €250.000,00.
III - Em Acórdão do STJ de 10/9/2019 (34) [referente a acidente de viação, veio a CONCLUIR-SE que:
- Tendo o autor, que à data do acidente de viação tinha sete anos de idade, ficado definitivamente incapaz para o exercício de qualquer profissão e dependente de ajudas de terceiros na execução das atividades da vida diária, é adequada a fixação em €450 000,00 a indemnização do correspondente dano patrimonial.
- Tendo o mesmo autor sofrido graves danos físicos e psíquicos e ficado afetado de uma IPG de 90 pontos, é adequado estabelecer em €250.000,00 a valoração do correspondente dano não patrimonial.
IV - Em Acórdão do STJ de 06-04-2021 (35) [referente a acidente de viação ocorrido a 14.07.2013], veio a CONCLUIR-SE que tendo o autor, à data do acidente de viação, seis anos de idade, e sofrido em consequência do acidente:
- contusão medular, que se estendeu desde o nível da plataforma inferior de D10 à plataforma inferior de D11 predominantemente edematosa, incluindo diminutos vestígios hemáticos, com expansão associada;
- Regressou a casa a precisar de ajuda permanente de terceira pessoa e com indicação de carecer de efectuar fisioterapia diariamente, tendo efectuado as sessões de fisioterapia prescritas no CH...;
- No ano seguinte, voltou a ser internado, desta vez no Hospital ..., durante cerca de três meses, para preparação e colocação de próteses e ortóteses;
- Teve alta, com a com a seguinte orientação: manter algaliações intermitentes; repetir EUD, ecografia renovesical e estudo analítico, com função renal, anualmente; medicar as infecções urinárias apenas se houver sintomatologia associada ( febre, alteração de odor, piúria ); manter tratamento fisiátrico na área da residência, em regime de ambulatório, com o objectivo de manutenção de balanço articular e potenciar a capacidade de marcha;
- Com aparelho de ortótese e canadianas, consegue permanecer na posição de pé e consegue deslocar-se em plano horizontal, mas não consegue levantar-se do chão, nem passar da posição sentada à posição de pé;
- Apresenta marcha claudicante e necessidade permanente de ajudas técnicas para poder locomover-se (aparelho de ortótese, estes a substituir regularmente enquanto se mantiver o crescimento e a rectificar ulteriormente e cadeira de rodas ), o que lhe determina um prejuízo estético avaliável em 5 graus, numa escala de sete de gravidade crescente;
- Apresenta hipoestesias nos membros inferiores;
- Mantém bexiga neurogénica, com necessidade de algaliação e dificuldade em controlar as fezes, com o que necessita de usar fraldas e cremes tópicos e de usar sondas vesicais;
-  Está impedido de ter relações sexuais completas ou de procriar;
- Necessita de ajuda de terceira pessoa para fazer parte da sua higiene pessoal, vestir-se e despir-se, deitar-se e levantar-se da cama, apanhar um objecto do chão, subir ou descer uma escada ou uma rampa. Necessita de ajuda para se deslocar à casa de banho;
- As lesões sofridas, apesar dos tratamentos efectuados e a efectuar, são causa directa de situação clínica de paraparésia bilateral, com movimento activo possível, que permite vencer a força da gravidade e de bexiga neurogénea, que lhe determinam um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 50 pontos;
- Não consegue saltar, saltitar; correr, jogar futebol, nadar, dançar, etc., com o que vê dificultada a participação em actividades próprias dos seus pares, o que lhe determina uma repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer avaliável no grau 07 de uma escala de 7 de gravidade crescente;
- Necessita e necessitará de medicação regular, a saber, antiespasmódicos, sondas vesicais, fraldas e medicação/cremes tópicos associados; ainda de consultas regulares de fisiatria e de ciclos de fisioterapia, ao menos 60 sessões anuais até aos 18 anos e 15 sessões após; bem assim de consultas regulares de urologia;
- Sofreu um défice funcional temporário toral de 694 dias;
- Apresenta um quantum doloris no grau 5 de uma escala de 7 de gravidade crescente, sendo que a mais das dores próprias das lesões, sofreu com os muitos e diversos tratamentos e exames a que foi sujeito;
é adequado confirmar a decisão de estabelecer em €200.000,00 a valoração do correspondente dano não patrimonial.
V - Em Acórdão do STJ de 21/6/2022 (36) [referente a acidente de viação ocorrido 22 de Outubro de 2016], veio a CONCLUIR-SE que:
- Se justificava uma indemnização por danos morais no montante de 500.000,00€ devida a sinistrado com 26 anos de idade á dta do acidente que sofreu de entre outros os seguintes danos/sofrimentos físicos: a). pescoço: cicatriz linear, não recente, de aspecto cirúrgico, de seis centímetros na anterolateral direita; b). ráquis: paraplegia com diparésia braquial abaixo de C-6, com níveis funcionais acima desse nível e sem controlo de esfíncteres; c). abdómen: cicatriz não recente, de aspecto cirúrgico, de seis por dois centímetros, ao nível da crista ilíaca direita; d). membros superiores direito e esquerdo: plegia abaixo de C-6; e). membros inferiores direito e esquerdo: plegia ; quadro de paraplegia com diparésia braquial abaixo de C-6, que é também designado, na nomenclatura utilizada pela Fisiatria, como de tetraplegia ASIA B, abaixo de C-6., conferindo-lhe um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica compreendido entre 88 a 90 pontos; desloca-se atualmente em cadeira de rodas, ficando ainda a padecer de bexiga neurogénica, com necessidade esvaziamento de urina, de 4 em 4 horas, utilizando cateteres urinários estéreis lubrificados com saco acoplado e perdas de urina, o que lhe provoca reiteradas infeções urinárias ; passou a necessitar de ajuda de terceira, pessoa para as atividades da vida diária, durante, pelo menos, 4 (quatro) horas por dia, pois que não se consegue lavar na metade inferior do corpo, nomeadamente na zona do períneo e na parte de baixo das pernas, sem ajuda de terceira pessoa, nem conseguindo ainda abotoar-se, calçar as meias ou sapatos sem esse apoio, bem como preparar as suas refeições, cortar os alimentos e fazer a lide doméstica; ficou com dificuldades de ereção, o que se repercute negativamente na sua atividade sexual fixável num grau 5, numa escala crescente de 1 a 7; Ficou ainda o Autor com um dano estético no seu corpo fixável num grau 6, numa escala crescente de 1 a 7; - Devido a tal quadro clínico em que ficou, em termos de sequelas, o A. sentiu-se frustrado nas suas expectativas futuras, nomeadamente ao nível social, laboral, sexual e de constituição de família e de entretenimento físico; - Sentindo-se profundamente desgostoso com a sua situação, o que lhe despoletou, pelo menos, uma crise de ansiedade, bem como estados de tristeza, apreensão, raiva, vergonha e medo no seu dia a dia e quanto ao seu futuro; - Em consequência das lesões sofridas como acidente e dos subsequentes tratamentos, o Autor sofreu dores de grau 7, numa escala crescente de 1 a 7.
Aqui chegados, analisados os 5 Acórdãos que antecedem, duas conclusões se impõem retirar de imediato:
A primeira, é a de que no Acórdão [o IV] em que a indemnização fixada a titulo de dano não patrimonial e que corresponde ao valor que as Rés consideram ser o JUSTO para o nosso caso,  as lesões e sequelas físicas de que ficou a padecer o sinistrado , apesar de GRAVES, ficam muito aquém (felizmente)  das lesões e sequelas físicas de que ficou a padecer a sinistrada/AUTORA e apelada.
A segunda, é a de que  nos Acórdãos [o I e o V ] em as lesões e sequelas físicas de que ficou a padecer o sinistrado se “aproximam” da lesões e sequelas físicas de que ficou a padecer sinistrada/AUTORA , o valor indemnizatório atribuído pelos danos Não Patrimoniais é substancialmente superior ao valor indemnizatório atribuído pelo tribunal a quo (de 350.000,00€) na sentença recorrida.
E, perante as duas premissas/conclusões acabadas de aduzir, inevitavelmente uma terceira aqui e agora se impõe também extrair: a de que o valor indemnizatório fixado pelo Primeiro Grau mostra estar em consonância com os padrões seguidos pela jurisprudência actualista STJ  no âmbito do ressarcimento dos danos morais , ou seja, o JULGAMENTO  do tribuna a quo mostra ser adequado, equitativo e justo , não sendo de todo exagerado e desconforme com os padrões seguido pela jurisprudência do STJ.
Destarte, porque em sede de quantificação dos danos não patrimoniais deve o julgador procurar encontrar o valor que repute justo no quadro da equidade e tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, e , concomitantemente, atender às decisões jurisprudenciais mais ou menos semelhantes, tudo no desiderato de alcançar a coerência e uniformidade – para assim se o desígnio da segurança e igualdade na realização da justiça equitativa – a que apela o legislador no art.º 8º, nº 3, do CC, inevitável é manter-se, nesta parte, o acórdão recorrido.
Em conclusão, improcedem as apelações de ambas as RR, quanto à reclamada diminuição do valor indemnizatório fixado pelo tribunal a quo em sede de ressarcimento dos DANOS NÃO PATRIMONIAIS.
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7. - Sumariando (cfr. nº 7, do artº, do CP).
7.1.Formulado um pedido genérico em Acão de indemnização decorrente de acidente de viação e por a demandante/lesada não dispor de todos os elementos que lhe permitam determinar as consequências daquele, vedado está ao tribunal proceder a sponte sua a uma condenação líquida, desde logo porque desconhecer o tecto do pedido que o Autor deduziria se formulasse pedido concreto.
7.3.- O pedido ilíquido, se não liquidado no decurso do processo e em momento prévio à sentença, obriga a que a condenação em indemnização líquida consubstancie a comissão da nulidade da alínea e), do nº1, do  artigo 615º CPC.
7.3. -  É justo atribuir uma indemnização de €350.000,00 por danos não patrimoniais a lesada que, com 40 anos de idade, e por força de acidente de motociclo no qual se fazia transportar, ficou com diversas e muito graves lesões e sequelas das mesmas, de entre as quais se salienta : ter ficado paraplégica, e dependente para se deslocar em cadeira de rodas ,  necessitando de ajuda de 3.ª pessoa ; Desloca-se autonomamente em cadeira de rodas manual, com dificuldade no piso irregular; não consegue manter-se de pé autonomamente; Manipulação e preensão: limitada no acesso aos objetos que se encontram em locais mais elevados; Controlo de esfíncteres: perdas urinárias quase diárias, agravadas nos acessos de asma, quando tosse ou espirra, usando penso permanentemente; raramente, tem incontinência para fezes moles; por vezes tem perdas de pequenos fragmentos fecais; necessita de manobras manuais para evacuação; Sexualidade e procriação: diminuição acentuada do prazer que retira das relações sexuais, por alterações da sensibilidade a nível genital, por quase impossibilidade de alcançar o orgasmo e devido a perdas urinárias durante o ato sexual; -  quantum doloris, fixável no grau 7 numa escala de 7 graus de gravidade crescente ; défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, fixável em 78 pontos, considerando o valor global da perda funcional decorrente das sequelas e o facto de estas afetarem a examinada em termos de autonomia e independência, tornando-a dependente de ajudas técnicas e de terceira pessoa ; paraplegia com compromisso sensitivo-motor e dos esfíncteres, bem como disfunção sexual (enquadrável em Na 0111, com desvalorização arbitrada de 75 pontos);
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8. - Decisão.
Termos em que, acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de LISBOA, em:
A) julgando a apelação de VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., parcialmente procedente.
8.1.- Declara-se a NULIDADE da sentença recorrida na parte em que condenou as RR no pagamento à autora do montante de €175.000,00 a título de dano biológico, actualizado à data da presente sentença;
8.2.- Em substituição da decisão referida em 8.1., vão as RR [ na proporção fixada na sentença recorrida] condenadas a pagar à Autora a quantia devita a título de indemnização relativa ao dano biológico sofrido, a liquidar no respectivo incidente subsequente à presente condenação, nos termos dos artigos 358.º, nº 2 e ss. e 609.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Civil ;
8.3. – Confirma-se a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré no pagamento à autora do montante de €350.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais pela autora sofridos;
B) julgando a apelação de Generali Seguros S.A., totalmente improcedente.
8.4.- Confirma-se a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré no pagamento à autora do montante de €350.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais pela autora sofridos;
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As custas nas apelações são a suportar:
i) Na apelação de VIA DIRECTA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.: pela apelante e apelada e na proporção, respectivamente, de 36% e de 64% (cfr. art.ºs 527º, nºs 1 e 2, do Cód. de Proc. Civil);
ii) Na apelação de GENERALI SEGUROS, S.A.: pela apelante (cfr. art.º 527º, nºs 1 e 2, do Cód. de Proc. Civil);
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(1) Dispõe ele, na alínea e), do nº 1, que é nula a sentença quando O Juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido”.
(2) Cfr. José Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado 3º Vol., pág. 353.
(3) In Noções Elementares de Processo Civil, 1979, Coimbra Editora, págs. 373 e segs..
(4) Ibidem, pág. 374.
(5) In Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, págs. 232 e segs. e 657.
(6) In Acto e Processo, O Dogma da Irrelevância da Vontade na Interpretação e nos Vícios do Acto Postulativo, Coimbra Editora, 2003, págs. 263 e 583.
(7) Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8-2-2018, proferido no processo nº 633/15.0T8VCT.G1.S1 e in www.dgsi.pt.
(8) Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 7-3-2019, proferido no PROCESSO nº 21112/16.3T8LSB-A.L1.S1 e in www.dgsi.pt.
(9) Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 7-3-2019, proferido no PROCESSO nº 21112/16.3T8LSB-A.L1.S1 e in www.dgsi.pt.
(10) Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 12-10-2021, proferido no PROCESSO nº 147/20.7T8CTB.C1 e in www.dgsi.pt.
(11) Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04.02.93, por sua vez proferido no Ac. do Tribunal da Relação do Porto e de 23/9/2019 (Processo nº 68/17.0T8AVR.P1) e in www.dgsi.pt.
(12) Cfr. v.g. os Acs. do STJ de 25.03.2010 [proferido no processo nº 1052/05.2TTMTS.S1] e de 26.02.2020 [proferido no processo nº 212/13.7GBPBL.C1.S1] ; o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11/4/2019 [proferido no processo nº 24733/17.3T8PRT.P1] ; o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 6/2/2020 [proferido no processo nº 6664/17.9T8GMR.G1] ;  o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 5/5/2021 [proferido no processo nº 345/18.3JALRA.C1], e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22/2/2022 [proferido no processo nº 275/20.9T8TVD.L1-7], todos eles em www.dgsi.pt.
 (13) Em Pedido genérico, condenação genérica e liquidação da prestação, Blog do IPPC, 20/03/2015 e acessível em  https://blogippc.blogspot.com/2015/03/pedido-generico-condenacao-generica-e.html.
(14) Acórdão proferido no processo nº 06A4115], sendo Relator SEBASTIÃO PÓVOAS e acessível em www.dgsi.pt.
(15) Acórdão proferido no processo nº 68/17.0T8AVR.P1, e acessível em www.dgsi.pt.
(16) Cfr. JOSÉ LEBRE de FREITAS, em introdução ao Processo Civil, 2.ª ed., Coimbra Editora, pág. 136.
 (17) Neste sentido se decidiu também no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora e de 13/03/2014 [ proferido no processo nº 175/05.2TBPSR.E1], no Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra e de 16/12/2015 [ proferido no processo nº 162/12.4TBMDA.C1 ] e no Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães e de 21.01.2016  [  proferido no processo nº 2514/11.8TJVNF.G1], todos eles acessíveis em www.dgsi.pt.
(18) Cfr. De entre muitos outros os Acs. do STJ de 2/12/2013, Proc. Nº 1420/06.2TVLSB.L1.S1, e de 24/1/2012, Proc. nº 1156/2002.L1.S1, ambos in www.dgsi.pt.
(19) Cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, in Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2010, 3ª Edição, pág. 309.
(20) Cfr. Ac. do STJ de 1/7/2014, Proc. nº 1825/09.7TBSTS.P1.S1, in www.dgsi.pt.
(21) Cfr. Ac. do STJ de 8/6/2011, Proc. nº 350/98.4TAOLH.S1, in www.dgsi.pt.
(22) Cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, ibidem, pág. 318.
(23)  Cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, in Prova Por Presunção no Direito Civil, 2012, Almedina, pág. 148.
(24)  Luís Filipe Pires de Sousa, ibidem, pág. 149.
(25)  Cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, ibidem, pág. 224.
(26) CFr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 15/5/2001, em ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, ibidem, pág. 593.
(27) Apenas porque devem também os juízes preocuparem-se com o carácter pedagógico e a função didáctica das suas decisões, explicando-as aos seus destinatários, cabendo designadamente ao ad quem convencer recorrentes e recorridos das razões que tornam justificadas e aceitáveis a decisão recorrida, o que tudo contribui para reforçar a confiança dos cidadãos no Poder Judiciário, expressando dimensão da segurança jurídica, qual subprincípio concretizador do Estado de Direito -  Cfr. José Joaquim Gomes Canotilho, in Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. Edª. Coimbra: Almedina, 2003. pág.257.
 (28) In Proc. nº 704/09.9TBNF.S1, sendo Relator o Cons. FONSECA RAMOS e in www.dgsi.pt.
(29) Cfr. Cfr. Luís Menezes Leitão, in Direito das Obrigações, Volume I, Almedina, pág. 298.
(30)  No Ac. de 30.10.96, e disponível in BMJ nº 460, pág. 444.
(31)  Cfr., de entre muitos outros, o acórdão do S.T.J. de 29.1.2008, proferido no Proc. 07A4492, in www.dgsi.pt.
(32) Proferido no processo nº 1639/03.8 TBBNV.L1, sendo Relator NUNO CAMEIRA, e in www.dgsi.pt.
(33) Proferido na Revista n.º 397/03.0GEBNV.S1, sendo Relator RAÚL BORGES, e in www.dgsi.pt.
(34) Proferido na Revista n.º 5699/11.0TBMAI.P1.S1 - 6.ª Secção sendo Relator JOSÉ RAINHO e em Sumários de Acórdãos das Secções Cíveis do STJ.
(35) Proferido no processo nº 2908/18.8T8PNF.P1.S1, sendo Relatora  FÁTIMA GOMES, e in www.dgsi.pt.
(36) Proferido no processo nº 1633/18.4T8GMR.G1.S1, sendo Relator  ISAÍAS PÁDUA, e in www.dgsi.pt.
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LISBOA, 13/7/2023
António Manuel Fernandes dos Santos
Maria de Deus Correia
Gabriela de Fátima Marques