Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
32/18.2T8LRS-B.L2-6
Relator: JORGE ALMEIDA ESTEVES
Descritores: AUGI
TÍTULO EXECUTIVO
CÓPIA CERTIFICADA
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
DELIBERAÇÕES DE NATUREZA SANCIONATÓRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/07/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I- O art.º 10º/5, da Lei nº 91/95, de 2 de setembro - que é o regime legal do “processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal”, referidas genericamente pela sigla AUGI - atribui a natureza de título executivo à “fotocópia certificada da ata que contém a deliberação da assembleia que determine o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão”.
II- A Lei nº 91/95, originalmente, não continha tal norma; tal só veio a acontecer por via da Lei n.º 165/99, de 14 de setembro, que veio consagrar no art.º 10º um nº 5 com a seguintes redação: “A pública-forma da acta que contém a deliberação da assembleia que determine o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão constitui título executivo”; a atual versão resultou da redação dada pela Lei n.º 64/2003, de 23 de agosto.
III – A regra geral relativa à aplicação da lei no tempo é a que consta do art.º 12º/1 do CCivil, segundo a qual a lei só dispõe para o futuro; a atribuição a um documento da natureza de título executivo está intrinsecamente ligado ao ato que consubstancia a obrigação, pelo que só pode valer para o futuro, não se podendo aplicar a exceção do nº 2 do art.º 12º do CCivil, pois não se abstrai do facto que lhe deu origem.
IV- Atendendo a que a lei que atribuiu a natureza de título executivo à ata que contém a deliberação da assembleia de proprietários e comproprietários das AUGIs que determine o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão, só dispõe para o futuro, apenas as comparticipações que tenham sido deliberadas após a entrada em vigor dessa lei é que podem ser de imediato exigidas por via executiva.
V- Para as deliberações das mesmas assembleias que não se reportem a despesas de reconversão, nomeadamente as que assumam natureza sancionatória, as respetivas atas não constituem título executivo.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes Desembargadores que compõem este Coletivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO
Embargante-executado
AL
Embargado-exequente
Administração Conjunta do BBM
Em 03.01.2018, a Administração Conjunta do BBM instaurou execução para pagamento de quantia certa contra AL.
Alegou que o BBM é um bairro de génese ilegal, que se encontra em fase de reconversão e legalização, e que o dever de reconversão implica, para os “proprietários dos lotes” a obrigação de comparticipar nas despesas de reconversão aprovadas em assembleia geral, e que o executado não pagou diversas quotizações.
Apresenta como títulos executivos os seguintes documentos:
a) Ata nº 1 da assembleia geral da Associação de Proprietários e Moradores do BBM, de 15-09-2013, na qual consta que “EM (…) é devedora da quantia de €5.866,86 (…)” a título de “contribuições aprovadas”.
b) Ata nº 2 da assembleia geral da Associação de Proprietários e Moradores do BBM, de 27-10-2013;
c) Ata nº 7 da assembleia geral da Administração Conjunta do BBM, de 12-07-2015, na qual consta que foi deliberada a “fixação de uma quota extraordinária, no valor de €500,00 (quinhentos) euros, devida e a ser paga pelos lotes/proprietários que sejam objecto de acção executiva”;
d) Ata nº 8 da assembleia geral da Administração Conjunta do BBM, de 22-05-2016, na qual consta ter sido deliberada a “Ratificação de todas as deliberações efetuadas em assembleias-gerais da Associação de Proprietários e Moradores do BBM, que as mesmas sejam consideradas válidas e aceites no processo de reconversão em curso (AUGI), relativas e necessárias à execução das obras de urbanização e outras despesas” bem como a “Ratificação de todas as deliberações relativas a fixação de quotizações, encargos e penalizações com essas mesmas quotizações, devidas pelos proprietários de lotes que não efetuaram os devidos pagamentos atempadamente, sendo que os valores em dívida, devidos pelos proprietários e comproprietários, serão cobrados pela Comissão de Administração, ao abrigo da lei atual, Lei 91/95 de 2/09, republicada pela Lei 70/2015, de 16/07, e mais exatamente as seguintes deliberações:
(…) Projetos Dezembro de 1983 - 199,52€
(…) Solicitador até ao Alvará 2015 - 200,00€
(…) Telas finais até ao Alvará 2015 - 325,00€”.
No mesmo requerimento executivo, a exequente indica como montante da quantia exequenda o de €11.594,69, sendo:
1. €5.866,80 relativo a “comparticipações em dívida”;
2. €4.406,53 a título de juros de mora sobre tais comparticipações, contados até 19/12/2017;
3. €500,00 a título de “quota deliberada na assembleia geral relativa a 12/06/2015”;
4. €50,52 a título de juros de mora sobre a quota referida em 3.;
5. €725,00, a título de “quotas deliberadas na assembleia geral realizada no dia 22/05/2016”;
6. €45,84 a título de juros de mora sobre a quota referida em 5.
O embargante deduziu, por apenso aos autos de execução que correm termos sob o nº 32/18.2T8LRS, oposição à execução, invocando os seguintes fundamentos:
- Ilegitimidade passiva[1]
- Inexequibilidade da ata 1, “porque não foi deliberado no âmbito da entidade com competência para o efeito, ou seja, a própria AUGI, pessoa coletiva distinta e autónoma, com personalidade jurídica própria e distinta face à Associação de Proprietários e Moradores do BBM”; e também porque é “um mero documento particular, que não está abrangido pelo disposto no artigo 6º do Decreto-Lei nº 268/94, não constituindo, assim, tais atas títulos executivos legalmente válidos”
- Prescrição dos juros de mora
- Incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação, contendo as contas da ata 8 erros de soma aritmética
- Legalidade da penhora.
O exequente apresentou contestação, onde concluiu pela improcedência dos embargos.
Realizada a audiência prévia, foram os embargos julgados procedentes por via da procedência da exceção de ilegitimidade. Em sede recursiva, por acórdão de 21.01.2020, foi tal decisão revogada, julgando-se improcedente a exceção de ilegitimidade, determinando-se o prosseguimento dos autos.
Foi novamente realizada a audiência prévia, na qual foi proferido o despacho saneador tabelar a julgar verificados os pressupostos processuais.
Foi enunciado o objeto do litígio tendo sido dispensada a enunciação dos temas da prova.
Realizou-se a audiência final.
Foi proferida sentença que culminou com o seguinte segmento decisório:
Pelo exposto, atentas as disposições legais citadas e as considerações expendidas, julgo parcialmente procedentes os presentes embargos e, consequentemente:
a) Declaro a prescrição de todas as quantias de capital e juros peticionadas anteriores a 02/01/1998; declaro a prescrição dos juros anteriores a 02/01/2013
b) Determino a prossecução da execução, com a redução da quantia à soma das seguintes parcelas:
 Valor do orçamento obras vencido em 1998, no montante de €3.967,54, acrescido de juros de mora respetivos a calcular a partir de 02/01/2013
 Valor das quotas deliberadas na assembleia geral realizada no dia 22/05/2016, no valor de €725,00 acrescido de juros à taxa legal peticionados
c) Absolvo o exequente do pedido de condenação como litigante de má-fé.
d) Condeno o embargante como litigante de má-fé em 3 UC`s de multa”.
*
Inconformados com o decidido, apelaram ambas as partes.
O embargante apresentou alegações e as seguintes conclusões:
a) Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou parcialmente procedente a oposição por embargos e não a procedência total com defende o recorrente, bem como da decisão que o condenou como litigante de má-fé e absolveu a recorrida e sua mandatária deste pedido.
b) Começando pela questão da legitimidade, como se impõe, o tribunal a quo, entendeu que se tratava de questão já decidida pelo acórdão da RL proferido nestes autos.
c) Discordando, sempre se dirá que o acórdão da RL, proferido nestes autos, apenas apreciou a questão da legitimidade processual e não a legitimidade material, tendo decidido que naquela altura não havia sido feita prova de que na data da instauração da execução o recorrente não era o proprietário.
d) Sabido é que uma e outra são realidades distintas e são conhecidas em momentos distintos, sendo a primeira passível de ser, como foi, conhecida no saneador ao passo que a segunda é, em regra, na sentença.
e) O título que serve à execução é, necessariamente, compósito, pois forma-se: (i) com a cópia certificada da acta da assembleia que deliberou as despesas e respetiva comparticipação devida por cada comproprietário; e (ii) com a certidão do registo predial que comprove a qualidade de comproprietário do executado.
f) A recorrida juntou uma notoriamente falsa e insuficiente acta, como mais adiante vamos demonstrar e juntou cópia da certidão do registo predial, cuja inscrição constitui uma presunção iuris tantum e, assim sendo, pode ser arredada por outros meios de prova.
g) O requerimento executivo foi remetido ao tribunal, via CITIUS às 14H03 do dia 27.12.2017, portanto, em plenas férias judiciais e foi levado à distribuição, após estas, no dia 04.01.2018, tendo sido atribuído o número 32/2018.2T8LRS.
h) O recorrente na sua oposição alegou e documentou (escritura + certidão do registo predial), ou seja, provou que no dia 26.12.2017, havia vendido o lote (em avos) e que, portanto, não ocupava mais qualquer posição na relação jurídica material controvertida e, como tal, se estava perante uma questão de ilegitimidade material e não meramente processual.
i) Ademais, a legitimidade substantiva do executado não se afere de acordo com a relação traçada pelo exequente, mas sim da circunstância de ele figurar ou não no título como devedor.
j) A obrigação de comparticipar nos custos de reconversão, nos termos do artigo 3.º/4 da Lei 91/95 de 02.09, recai sobre os titulares dos prédios abrangidos pela AUGI.
k) O recorrente não figura como devedor no título, pois ainda antes da remessa ao tribunal do requerimento executivo, não era mais o titular do prédio, sendo que a presunção do registo, exibido pela cópia da certidão carreada pela recorrida e emitida a 21.12.2017, cede perante a evidência de que, ainda antes da propositura da execução, havia, por contrato de compra e venda, celebrado por escritura pública, transmitido a propriedade, logo não sendo mais titular.
l) O juízo feito no acórdão de 21.01.2020 (que o recorrente não fez prova de ter transmitido tal direito em momento anterior) se referiu ao despacho saneador-sentença que apreciou a legitimidade ad processum e não ad causam, não se impondo assim como caso julgado material.
m) Ainda que deste modo se não entenda, sempre esta decisão estaria sujeita à cláusula rebus sic stantibus, posto que assente numa falta de prova de ter o executado transmitido a propriedade antes do requerimento executivo dar entrada em juízo e, uma vez feita essa prova, como foi, caduca supervenientemente (Ac. Pleno do STA de 01.02.1963) face à junção que então foi feita da escritura pública de compra e venda e respetivo registo.
n) Existe um erro no pressuposto daquele acórdão, ainda assim irrelevante, pois parte da ideia de que o requerimento executivo terá dado entrada em juízo no dia 27.12.2017, quando é certo que durante as férias judiciais não se praticam atos (art.º 137.º/1 do CPC) e, portanto, o ato tem-se por praticado no referido dia 04.01.2018.
o) Mais a mais, o que releva, para aferição da legitimidade substantiva, é a citação do executado (22.01.2018) e não a mera remessa do requerimento inicial ao tribunal em férias.
p) Valendo, mutatis mutandi, a jurisprudência segundo a qual o retardamento do acto idóneo a interromper os efeitos da transmissão da propriedade (ilegitimidade substantiva) se deveu ao facto da exequente ter obnubilado as normas procedimentais ou adjetivas no caso aplicáveis, «radicando nessa infração objetiva – e só nela – a preclusão do direito de executar o recorrente.
q) Releva, ainda, nesta questão da ilegitimidade material do recorrente, o facto das alegadas dívidas elencadas no requerimento executivo e na falsa acta dada à execução se reportarem a valores alegadamente devidos (quotas, joias, compra de lotes de terreno, obras no bairro) a uma Associação de Moradores da qual o recorrente nunca fez parte, com ela nada contratou e, por conseguinte, nenhuma obrigação legal ou contratual passível de execução assumiu.
r) Aqui chegados, a manifesta falta ou insuficiência do título é questão de conhecimento oficioso, assim como o são as repercussões de tal falta nos actos de penhora entretanto praticados na execução.” – Ac. da RG de 25.11.2021
s) Lendo a acta apresentada como título executivo, facilmente se percebe que não é uma ata que documente a deliberação de constituição da obrigação de pagamento de contribuição por parte do recorrente, mas, tão-somente, uma ata que liquida as quantias alegadamente devidas pelos anteriores proprietários a título de dívidas a uma associação.
t) Ou seja, é uma ata que contém um mero exercício de contabilidade, pois apenas quantifica o montante que alegadamente estará em dívida relativamente às mencionadas despesas, pelo que tal ata não é dotada dos necessários requisitos de exequibilidade extrínseca que legitimem a propositura da ação executiva, relativamente às alegadas despesas.
u) Tem de ter havido deliberações, para nascerem obrigações de comparticipação (art.º 3.º/3 e 10.º/5 da Lei 91/95 de 02.09) e essas deliberações haverão de estar documentadas por actas elaboradas a seu devido tempo e não marteladas ou feitas anos depois.
v) Tanto quando é certo de que não existe memória alguma de ter havido qualquer deliberação da AUGI e, certo ainda é que qualquer deliberação para valer como obrigação tem de ser posterior ao início da vigência da Lei 91/95 de 02.09.
w) A ata referida no artigo 10.º/5 da Lei 91/95 de 02.09 só vale como título executivo para as deliberações que após a vigência do referido diploma determinem o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão - necessariamente futuras em relação à lei e à data de aprovação.
x) Não contendo a acta apresentada como título executivo qualquer deliberação da assembleia dos proprietários da AUGI concretizando as comparticipações do lote pertencente aos executados é manifesta a insuficiência desse título, impondo-se a extinção da execução.” – Ac. da RL de 09.07.2015.
y) Não se lê, não se vê, não se compreende na citada Lei 91/95 de 02.09 que a assembleia da AUGI possa ratificar actos de outras entidades, pessoas coletivas ou singulares, nem que a ata possa valer como título executivo para cobrança de dívidas antigas eventualmente devidas a essas outras entidades.
z) Ora, a acta dada à execução refere alegadas dívidas de quotização a uma associação da qual o recorrente nunca fez parte nem de nada dela beneficiou, como refere despesas de obras de tempos em que nem sequer era proprietário, alegadamente realizadas ou executadas muito antes ainda de haver a citada lei 91/95 de 02.09.
aa) A ter existida alguma associação de moradores, antes da data da entrada em vigor da referida Lei 91/95 de 02.09, a adesão à mesma e o dever de quinhoar para os seus fins era um ato voluntário e não imposto por lei, pelo que não se afigura conforme ao Estado de Direito a ideia de que se pode ao abrigo de uma lei muito posterior vir exigir pagamentos para uma associação da qual não se fazia parte.
ab) Nem tampouco se se sabe em que é que esse dinheiro foi gasto e em benefício de quem, se é que o foi, pois certo é que nestes 30 anos o bairro permanece o mesmo, como de resto, é declarado pelo representante da Câmara Municipal de Loures.
ac) Não foi junto, nem referido, nem consta da ata qualquer referência a um qualquer orçamento provisional de custos com a reconversão e respetivas despesas, elaborado com base em custos previsíveis, nem a fórmula que foi adotada para repartição dos custos de reconversão, por forma a chegar ao “valor de estimativa” que consta da referida “lista”, ou “valor estimado” como consta da deliberação.
ad) Ainda relevante são os vícios extrínsecos do título, como a inexistência quer de fato quer de direito de qualquer deliberação que legitime a presente execução, começando pela questão da deliberação que aprovou a relação de supostas dívidas não constar da convocatória.
ae) A deliberação sobre assuntos não incluídos na ordem de trabalhos, deve ter-se por inexistente ou ineficaz em relação a comproprietários ausentes, pois sabido é que a eficácia pressupõe a validade do negócio jurídico, mas não apenas a validade; exige, também, a idoneidade funcional inerente à autonomia privada.
af) Vendo a convocatória enviada e publicada pela Junta de Freguesia de Loures, datada de 04.05.2016 (requerimento junto na audiência de julgamento) não consta qualquer ponto que refira a aprovação da relação de dívidas à AUGI muito menos à dita associação.
ag) Numa outra perspetiva, não é descabido concluir que, ao deliberar sobre assuntos não incluídos na ordem de trabalho, aquela assembleia em concreto deliberou sobre assuntos para os quais não detinha competência, e, dessarte, as deliberações são inexistentes ou ineficazes em relação a quem nelas não participou ou até mesmo ergo omnes.
ah) Por outro lado, ao invés do que parece ser entendimento da decisão recorrida, não é o fato da cópia da ata estar “eivada” com carimbos e assinatura do atestador de que está conforme o original que lhe confere força executiva, pois, a lei não dispensa a conformidade de tais actas à Lei 91/95 de 02.09 que estabelece os requisitos necessários à configuração de qualquer título como condição suficiente da acção executiva.
ai) Para o tribunal a quo a exequibilidade do título (acta de 22.05.2016) dado à execução nestes autos, radica na aprovação do ponto prévio à ordem de trabalhos, na sequência do qual foi aditado um novo ponto “1.º - Ratificação de todas as deliberações efetuadas em assembleias-gerais da Associação de Proprietários e Moradores do BBM, que as mesmas sejam consideradas válidas e aceites no processo de reconversão em curso AUGI, relativas e necessárias à execução das obras de urbanização e outras despesas.”, o que s. d. r. não tem suporte em lei alguma deste país nem, muito menos, na invocada figura da ratificação.
aj) Ademais, facilmente se percebe que se até ao dia 22.05.2016, as actas da AUGI haviam sido lavradas no livro de atas da dita associação - que convenientemente despareceu – a acta agora apresentada é falsa porque se apresenta como tendo sido lavrada no livro de actas da AUGI no dia 18.04.2010 quando, a ter existido tal deliberação, haveria de ter sido lavrada no livro de actas na associação.
ak) Note-se ainda que quer uma quer a outra ata não se apresenta numerada de forma cronologicamente válidas, pois o número de páginas é sempre do um para a frente o que demonstra que as mesmas não foram extraídas de um livro devidamente legalizado, mas, sim, foram criadas avulso conforme as necessidades do desiderato.
al) Qualquer pessoa que perceba o que lê imediatamente se interroga, se “... e de todo não se conhece a conta corrente de cada um dos proprietários...”, como é que e com que base vieram a seguir uma lista de supostas dívidas de comproprietários escolhidos a dedo?
am) Como é que sabem os comproprietários e o recorrente que a anterior comproprietária não pagou as quantias que dizem estar em dívida para com a associação e não para com a AUGI?
an) De todo o modo, uma conclusão que se retira daqueles trechos da ata dada à execução é a que até ao dia 22.05.2016 os anteriores administradores eram os desconhecidos senhores JP e CL, sendo, pois falso, assim como falsa é a ata apresentada, que o senhor AL tivesse sido nomeado administrador no dia 18.04.2010.
ao) E também se percebe ainda mais a falsidade da referida ata da “assembleia” de 18.04.2010, quando se pondera que se no dia 22.05.2016 a anterior administração não havia entregue a documentação, e não havendo notícia de que o tivesse feito no entretanto, como é que surge agora tal ata?
ap) A norma constante no artigo 10.º/5 da Lei 91/95 de 02.09, na interpretação que o tribunal a quo fez, é inconstitucional, por violar o artigo 202.º/1 e 2 da Constituição (princípios de reserva de jurisdição e reserva de juiz), pois atribuiu à aprovação de uma relação de dívidas, por privados despidos de jurisdição, um valor e força coerciva equivalente à de uma sentença.
aq) Acresce que não se lê, não se vê, não se compreende na Lei 91/95 de 02.09 que a assembleia da AUGI possa ratificar atos de outras entidades, pessoas coletivas ou singulares, nem que a ata possa valer como título executivo para cobrança de dívidas antigas devidas a outras entidades, nem tal ideia tem respaldo no artigo 55.º/2 da Lei 91/95 de 02.09.
ar) O Supremo Tribunal de Justiça no seu acórdão de 27.09.2018, estabeleceu ser imperativo observar e respeitar a separação jurídica e patrimonial entre a AUGI e a pretérita associação que havia cobrado quota para um fim coincidente com o da AUGI, declarando a nulidade da deliberação desta que, sem o voto unânime de todos, decide dispor dos bens de uma a favor de outra, valendo aqui, embora em sentido inverso, os respetivos fundamentos normativos.
as) Do mesmo modo que ali não é licita rectius é nula a deliberação da AUGI que decide “devolver” àquela determinada quantia para aplicação em fins sociais e criativos não é lícita a cobrança pela AUGI de verbas que eventualmente sejam devidas à pretérita associação.
at) É inconstitucional, por violar o artigo 18.º n.º 3 da Constituição, a norma extraída do artigo 10.º/5 da Lei 91/95 de 02.09, na interpretação de que a cópia certificada da ata vale como título executivo para cobrança de dívidas a uma associação de proprietários e anteriores à publicação da referida lei, da qual o executado não era associado nem com ela se vinculou a contribuir para qualquer ação ou obra, ainda que o escopo da associação coincida teleologicamente com a da AUGI.
au) Podendo o executado exigir esse documento (o original do título), se o mesmo não for apresentado pela exequente a "fotocópia certificada" não pode constituir título executivo.
av) E sendo apresentado pode o executado suscitar a sua falsidade, porquanto nos termos do art.º 816.º do Cód. Proc. Civil a oposição à execução pode ter por fundamento esse vício do título executivo, como qualquer outro que seja lícito invocar em acção declarativa (v. art.ºs 816° e 814° alínea b) Cód. Proc. Civil).” – Ac. da RE de 25.06.2009
aw) Como se alcança da ata da audiência prévia de 23.06.2021, assim como no requerimento do dia 16.06.2022, referência 39184148, o executado requereu a junção do original da acta cuja cópia “certificada” foi dada para valer como t´tulo, tendo o tribunal a quo relegado para ulterior momento a decisão sobre o requerimento.
ax) E na própria sentença, decidiu que “...mantenho a posição já anteriormente expressa nos autos, indeferindo-se o pedido de apresentação do livro de atas original.”
ay) Desde logo, esta nova decisão contraria o anterior despacho de 23.06.2021, pois o tribunal a quo deixara em aberto a possibilidade de ordenar a junção do original da acta (título executivo de crédito) no decurso do processo.
az) Uma execução não só não pode ser admitida como não deve prosseguir quando a genuidade do título é posta em causa, sendo dever do tribunal providenciar, ex officio e a todo tempo, pela apresentação do original logo que se suscite a mais pequena dúvida, não se aplicando aqui as regras dos artigos 444.º e 446.º do Cód. Proc. Civil, mas, sim, a regra do artigo 724.º/5, conjugado com o artigo 450.º/2 do mesmo código.
ba) Lendo a acta que foi enviada para a Junta de Freguesia vemos que em lado algum foi deliberado aprovar eventuais dividas de proprietários e/ou comproprietários, e, assim sendo, impõe-se concluir que o que não existe no mundo dos factos, não existe – não pode existir - no processo, sob pena de a decisão assentar numa falsa realidade o que contraria a ideia de Justiça e de Direito.
bb) Para serem exigíveis, as deliberações (todas e cada uma) que aprovem o orçamento provisional das obras de urbanização (ou de qualquer outra despesa) e dos métodos e fórmulas de cálculo, a definição do prazo para a entrega das comparticipações, com elaboração e aprovação do mapa donde se alcance a comparticipação devida por cada lote, têm de constar em ata devidamente lavrada, sendo suficiente a cópia certificada da referida, ponto é que esta exista e a reunião se tenha verificado.
bc) O tribunal a quo cimenta a existência do título nos dizeres de que “Para a conclusão do processo de reconversão e suporte dos encargos inerentes, foram em assembleia geral, ainda em sede de Associação, deliberadas quotas de comparticipação para cada um dos lotes de terreno que compõem a AUGI, as quais devem ser consideradas provisões e adiantamentos até às contas finais, quotizações essas que não sendo atempadamente pagas, vencem juros contados à taxa legal nos termos do artigo 16º - C da supra citada lei.”
bd) Resulta cristalino que a recorrida não pretende cobrar por via desta execução valores de comparticipação para cada um dos lotes conforme deliberado em assembleia de proprietários ou comproprietários, como legalmente é exigido nos artigos 8.º/1 e 2 al. a), 9.º/1, 10.º/1 e 2 als. d) e f) e g) da Lei 91/95 de 02.09, mas ao invés cobrar aquilo que a lei não lhe consente.
be) Se dúvidas houvesse quanto à manifesta falta de título para esta execução, o n.º 3 do referido artigo 10.º da lei 91/95 de 02.09 afasta-as, ao dispor que “As competências da assembleia de proprietários e comproprietários são indelegáveis”, significando, pois, que só as comparticipações deliberadas em sede de assembleia de proprietários e comproprietários da AUGI é que são passíveis de serem executadas.
bf) Também uma outra conclusão se impõe é a de que a assembleia de proprietários e comproprietários da AUGI nunca deliberou sobre o que expressamente determina a citada alínea f) do artigo 10.º da Lei 91/95 de 02.09 que consiste em “Aprovar os mapas (nunca ninguém os viu, nem existem) e os respetivos métodos e fórmulas de cálculo e as datas para a entrega das comparticipações referidos na alínea c) do n.º 1 do artigo 15.º” – terá sido a desconhecida associação a usurpar tais competências, de acordo com a tese constante no requerimento executivo.
bg) A sentença recorrida não diz, nem se alcança de alguma acta da AUGI (seguramente que a ata dada à execução não serve este propósito) e eventuais anexos é que correlativa prestação originou a dívida, i. e., que trabalhos ou serviços foram realizados em prol da AUGI e naturalmente dentro do seu escopo – legalização de uma área urbana de génese ilegal.
bh) E continua sem dizer, nem resulta da ata quando é que – e se foram – realizados trabalhos e/ou serviços, previamente aprovados pela Câmara Municipal de Loures e necessariamente pelos proprietários e comproprietários - reunidos numa assembleia da AUGI (regularmente convocada) e não de uma associação de bons ou maus vizinhos -, que constituam o proprietário na obrigação de comparticipar nos seus custos.
bi) Parece-nos claro que a obrigação resultante da responsabilidade com os encargos da operação de reconversão só surge após a entrada em vigor da Lei 91/95 de 02 de setembro que, salvo erro manifesto, não dispões de nenhum vacatio legis, pelo que produziu efeitos a partir de 07.09.1995, em conformidade com o artigo 2.º/1 da Lei 6/83 de 29.07 e artigo 5.º/2 in fine do Código Civil.
bj) Mas – espante-se – vem identificada na acta dada a execução uma ininteligível relação de supostas dívidas bastante anteriores à já de si longínqua data de 07.09.1995. Assim,
bk) Do rudimentar quadro constante na página 38 do ficheiro informático, que consubstancia o requerimento executivo, fica-se, desde logo, sem norte, i. e., sem saber a que dizem respeito os valores ali inscritos se se trata de uma dívida de um determinado proprietário ou comproprietário e. g., o executado, se se trata da dívida global e neste caso a respetiva quota-parte a cada responsável.
bl) Mesmo assim, é possível descortinar que nenhuma das quantias ali referidas tem fundamento legal para se imputar como responsabilidade de quem quer que seja, e, desde logo, é referido “quotas da associação” referentes aos anos de 1979, 1980, 1981, no valor de 2000$00, cada ano (com o contravalor de 9,98€ cada)
bm) O executado nunca pertenceu a nenhuma associação, nunca quis, desconhece a sua existência e é bom de relembrar que a adesão e renúncia a uma associação é um ato livre e inopinado insuscetível de conferir indemnização à associação seja a que título for.
bn) Consta como dívida (de quem e com que prova da sua exigibilidade?) "quotas da associação" dos meses de dezembro de 1980, 1989, 1990, 1993, 1994, 1996, 1997 e 1998, "jóia da associação" do mês de dezembro de 1982, 'levantamento topográfico" do mês de dezembro de "projetos" do mês de dezembro de 1983, "compra de dois lotes" do mês de dezembro de 1984, "eletrificação do bairro" do mês de dezembro de 1988, "orçamento para obras" do ano de 1998, "solicitador até ao alvará" do ano de 2015 e "telas finais até ao alvará" do ano de 2015, além da já referida quota extraordinária aprovada em assembleia realizada no dia 12 de julho de 2015.
bo) Ao caso sub judice não tem aplicação o disposto no artigo 55.º/2 da Lei 91/95, quer porque, por um lado, à data da publicação desta lei não havia no caso sub judice sido iniciado processo administrativo algum e, por outro lado, em momento nenhum os comproprietários mandataram a associação para os representar junto de quem quer que seja a que acresce que a norma se dirige ao loteador (pato bravo) e não a associações.
bp) Não interfere em caso algum com as disposições imperativas da lei quer quanto a encargos quer quanto a títulos, não autorizando a lei que a comissão de administração cobre quantias que não foram aprovadas em sede de AUGI e, muito menos, a benefício de pretéritas associações, bastando, para assim concluir, ler o número 1 do citado artigo 55.º da Lei 91/95 de 02.09, para logo se perceber que o número dois está restringido àquelas situações de existência de um processo administrativo e de uma entidade que venha promovendo a reconversão do prédio.
bq) E sempre o mandato referido no citado artigo 55.º/2 da Lei 91/95 de 02.09, para praticar os actos previstos na lei, opera ex nunc e não ex tunc. É - ou deve ser - assim num Estado de Direito o que até está plasmado no artigo 10.º/3 e 4 da Lei 91/95 de 02.09
br) Analisada ainda a truncada lista de presença na dita assembleia, vemos que o senhor presidente da comissão administrativa, senhor AL, assina em nome da associação pelos lotes 3, 9, 11, 29, 34, 55, 70, 73 e 93, quando é certo que a mesma não é comproprietária de tais lotes.
bs) Na falta de quórum, o senhor AL intitulou-se representante de uma entidade que não é proprietária dos lotes mencionados, relembrando que o mesmo é presidente da mesa da assembleia, é presidente da comissão, é presidente da associação (quem disse e onde está a nomeação) e o certo é que corre o boato de que os poucos que constam com tendo marcado presença na reunião não estiveram de fato e não assinaram a dita lista.
bt) Ao contrário do que decidiu o tribunal a quo, não existe qualquer conta-corrente em sentido técnico-jurídico ou contabilístico, havendo uma relação de valores cuja exigibilidade está por demonstrar e este não é o processo adequado.
bu) Estão incorretamente julgados:
1. O facto constante na alínea B) porquanto as deliberações da associação não são deliberações da AUGI e, como tal, são irrelevantes.
2. O facto constante na alínea C), porquanto o tribunal a quo delimitou que o único documento a considerar para os presentes embargos é a ata n.º 8 da AUGI, pelo que não pode ser valorado o documento que não foi sujeito a discussão, além de que tal documento declara que uns indivíduos, desconhecidos do recorrente, elaboraram uma suposta relação de dívidas de determinadas pessoas a uma associação da qual não são associados, com ela não estabeleceram qualquer contrato, não a mandataram para nada, pelo que não tem qualquer relevância jurídica para o thema decidenduum.
3. O facto constante na alínea D) porquanto se é certo que no folheto que a mandatária da exequente diz se tratar de uma acta da associação consta tal quadro não significa que seja verdade que sejam devidas qualquer daquelas quantias ali mencionadas, além de que qualquer pessoa que compreenda o que lê percebe que não se trata de um orçamento previsional para obras, nem muito menos, um cálculo de comparticipação. Fundamentou o tribunal a quo: “Alínea D dos factos provados – cópia da “conta corrente” junta com a contestação aos embargos, documento não impugnada”.
4. Ora, não existe conta-corrente alguma entre a recorrida e o recorrente, podendo, quando muito, haver uma relação de dívidas, escrita pela própria parte e, como tal, não tem valor probatório algum, posto que é milenar o princípio de que scriptura privata fidem non facit adversus tertium ou scriptura privata pro scribente nihil probat.
5. O facto constante na alínea E), está errado porque em Portugal, como Estado de Direito sujeito ao rule of law, os particulares não usurpam a função pública jurisdicional e, assim a acta, que aprova supostas dívidas não é título executivo como se de uma sentença se tratasse e a cobrança judicial de tais valores (a haver fundamento) tem de se iniciar com o processo declarativo, não valendo, portanto, como título executivo, como é de Direito.
6. O facto constante na alínea F) está incorretamente julgado, porquanto da acta que faz fé pública, por ter sido remetida e publicada pela Junta de Freguesia de Loures não consta qualquer deliberação a aprovar tais despesas que outrossim não constava de qualquer ponto da ordem de trabalhos.
7. O facto constante na alínea G) está incorretamente julgado, na medida em que a introdução à má fila de um novo ponto da ordem de trabalhos, é um ato nulo, ineficaz ou inexistente, inquinando a respetiva deliberação, com o mesmo vício, porque viola lei imperativa, viola os princípios mais elementares do direito em sociedade, nomeadamente, os deveres de lealdade, confiança, segurança e certeza jurídica.
8. O facto constante na alínea G), segunda parte, está incorretamente julgado, porquanto lei alguma, em especial a Lei 91/95 de 02.09, prevê a possibilidade da assembleia da AUGI reunida (se reuniu) à socapa ratificar anteriores deliberações de qualquer associação.
9. Ainda quanto a este fato, o recorrente, assim como o anterior proprietário, não se obrigou nos anos de 1979, 1980, 1981, 1982, 1983, 1986, 1987, 1988 a pagar a joia (?) e quotas para qualquer associação que nem sabiam existir; levantamento topográfico e projetos em 1983; compra de 2 lotes para a associação em 1984; eletrificação do bairro em 1988; e orçamento para obras (quais e de que valor?) em 1988.
10. No quer concerne à alegada despesa em 2015 com o solicitador até ao alvará (que significa?) e telas finais até ao alvará nos valores de 200,00€ e 325,00€, respetivamente, certo é que se tratou de uma alegada deliberação da associação impossível de ser ratificada pela AUGI, muito menos para valer como título executivo, sendo certo que, ainda assim, a ratificação de despesas aprovadas na associação não constitui fundamento ou substrato de qualquer obrigação que confira executividade à respetiva acta.
11. No que se refere parágrafo onde se diz que foi aprovado, por maioria, a fixação de uma quota de comparticipação para o ano de 2016, devida por cada um dos lotes, no valor de €200,00, dividida em dois pagamentos de €100,00 cada, verdade é que mutatis mutandi da acta que faz fé pública, por ter sido remetida e publicada pela Junta de Freguesia de Loures não consta qualquer deliberação a aprovar tais despesas que outrossim não constava de qualquer ponto da ordem de trabalhos.
12. O facto constante na alínea H), porquanto o tribunal da Relação conheceu da legitimidade processual e não da ad causam, não constituindo, portanto, caso julgado que obste ao conhecimento da legitimidade material.
13. O facto constante na alínea I) está incorretamente jugado, porquanto os lotes de terreno não se constituem devedores, não tendo o recorrente ou qualquer dos anteriores proprietários qualquer obrigação legal ou contratual de pagarem à associação ou a quem quer que sejam as quantias ali mencionadas e pelas causas também ali descritas.
14. O facto constante na alínea I) está incorretamente jugado, porquanto se podemos dar por certo que as atas (em bom rigor, as deliberações) que acompanham o requerimento executivo, identificadas em C, E e F, não foram impugnadas, não é menos certo que o tribunal a quo delimitou a questão alegando que só a acta 8 relevava para a formação do título, além de que as deliberações ou actas identificadas nas alíneas c) e E), foram (se foram) tomadas na associação e não na AUGI.
bv) Aqui chegados, “Não se pode confundir litigância de má-fé com lide meramente temerária ou ousada, com pretensão de dedução na defesa convicta e séria de uma posição, sem, contudo, a lograr convencer.” – Ac. da RG de 05.12.2019.
bw) Os requerimentos a juntar documentos pretendendo demonstrar aquilo que o cidadão comum imediatamente percebe de que o documento dado à execução para valer como título não corresponde à realidade, sendo, portanto, falso, havendo, aliás, a circular várias versões da acta, consoante o processo, não integram qualquer conceito de má-fé nem entorpecem o regular andamento do processo.
bx) O recorrente nunca quis obstar que o tribunal decidisse em tempo razoável – como o devia ser toda a justiça ... – pretendendo, ao invés, que não decidisse de forma leviana, i. e., precipitada com base em documentos desconformes com a realidade do que se passou, ou seja, postergando a dita e cada vez mais escassa verdade material.
by) Pode não ter sido convincente para o tribunal a quo, mas não significa que tenha agido de má-fé, pois se existe alguém interessado de que se faça verdadeira justiça – em tempos sombrios quanto à confiança institucional - é o recorrente que se vê a braços com uma execução, penhora e caução sem que ainda hoje perceba – como cidadão comum – qual a lei que legitima tais atropelos ao Direito.
bz) Quando muito, podia ser caso de aplicação do disposto no artigo 531.º do CPC, mas nunca a condenação por litigância de má-fé.
Ao invés,
ca) A exequente e sua mandatária sabiam – e sabem – que os valores dados à execução não só não são exatos como não têm como documentar a sua putativa existência e, assim, agiram de mala fide jogando o barro à parede a ver se cola.
cb) Usam e abusam ou são useiros e vezeiros no uso de actas e documentos truncados de tal modo que existem várias e diferentes versões da acta 8 (é crime de falsificação) consoante as necessidades e oportunidades.
cc) Sabiam ainda que as quantias que relacionaram com estando em dívida, a, alguma vez, terem existido, estavam prescritas, por, quanto mais não fosse ter decorrido o prazo de prescrição ordinária de 20 anos.
cd) Sabiam que as atas de uma AUGI para valer como título executivo tem de ser necessariamente pretérita à necessidade e conter a aprovação do montante global da verba para a execução das obras ou serviços inerentes a estas e a concretização de quanto cabe ao titular inscrito de cada fração em função da quota que dispõe e que o cálculo não se faz por unidade (grosso modo, um lote com 50 metros não vai pagar o mesmo que um de 500 metros!).
ce) Sabiam que as atas 1 e 2 da associação, datadas de 15.09.2013 e 27.10.2013, que instruíram a presente execução dizem respeito a uma entidade estranha à lei 91/95 de 02 de setembro (logo, arredia ao executado, assim como a qualquer seu não associado) e em relação à qual a lei não confere força executiva pelo que a sua junção ao alegado título mais não foi do que um logro ao tribunal.
cf) Sabiam que o executado não é - nunca foi -, associado ou membro daquela associação, com ela não contratou ou pactuou o quer que seja, e, logo, é parte ilegítima para lhe serem exigidas dívidas alegadamente contraídas até muitos anos antes de ser proprietário.
cg) A presente execução causou – e continua causando – graves prejuízos ao executado, bastando ponderar que, em violação do princípio da proporcionalidade, o senhor agente de execução penhorou não o prédio onerado com o ónus propter rem nem sequer bens de valor mais facilmente realizáveis, mas de entre vários prédios um dos que tinham maior valor.
ch) Foi o executado obrigado a prestar caução quando é por demais evidente que nada deve à exequente ou a quem quer que seja.
ci) Atendendo à intensidade do dolo empregue, aos prejuízos materiais, morais e reputacionais causados ao executado pela conduta dos responsáveis AL e sua mandatária, Dra. FA, devem estes condenados em multa condigna e indemnização a favor do executado em valor não inferior a 5.000,00€.
cj) Por todo o exposto a decisão recorrida, violou o disposto nos artigos:
- 3.º/3 e 4, 8.º/6, 10.º/2, al. f), 5, 15.º/1 al. c), 55.º/2, da Lei 91/95 de 02.09;
- 2.º, 137.º/1, 260.º, 703.º/1 al. d), 713.º, 729.º, als. a), b) e e) do Cód. Proc. Civil; e
- 7.º do Cód. Registo Predial
- 12.º, 280.º/1, 1432.º/4 e 1433.º (estes por analogia) do Cód. Civil
ck) A decisão recorrida não devia ter aplicado:
- Os artigos 444.º e 446.º do Cód. Proc. Civil
cl) A decisão recorrida devia ter aplicado:
-A regra do artigo 724.º/5, conjugado com o artigo 450.º/2 do Cód. Proc. Civil.
- A regra constante do artigo 1407.º/1 e 2 do Cód. Civil.
cm) Devendo estas normas serem interpretadas e aplicadas no sentido expresso nas conclusões deste recurso.
Nestes termos e nos melhores de Direito, E sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, Venerandos Juízes Desembargadores, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, consequentemente revogada a decisão recorrida que julgue procedente a oposição mediante embargos deduzida, ordenando-se a extinção da execução, condenando-se ainda a Exequente e sua mandatária em e indemnização condigna.
*
A exequente-embargada apresentou alegações e as seguintes conclusões:

1- A Exequente/Recorrente discorda da douta Sentença nos item’s acima indicados e pelos fundamentos de facto e de direito supra transcritos, por entender que naquela parte a Sentença viola normas que a condena à nulidade, requerendo-se a sua revogação nessa parte e por outro lado a sua alteração nos termos requeridos, designadamente quanto condenação à indemnização por litigante de má fé do executado/embargante.
2- Quanto ao mais, a Sentença deverá manter-se inalterada.
3- Entende o exequente/Recorrente que a Sentença padece de nulidade por conhecer de questão que não podia tomar conhecimento, nos termos do art.º 615º, nº 1, al. d) e e) do CPC – QUANTO À PRESCRIÇÃO DA DIVIDA/CAPITAL.
4- O Executado/Embargante, representado por advogado, ciente dos termos técnicos jurídicos, nos seus Embargos, não invocou a Prescrição da Divida/Capital! Apenas dos juros! E foi explícito na sua pretensão.
5- Tanto é, que na Sentença, o Tribunal “a quo”, selecciona as seguintes questões a decidir “I. Regularidade do mandato; II. Invalidade da ata de condomínio; III. Prescrição dos juros; IV. Liquidação da obrigação; V. Litigância de má fé”.
6- Quando aprecia – Prescrição da divida/capital - questão da qual não podia tomar conhecimento, por não ter sido invocada, o Tribunal condena a Sentença à nulidade. Pois, o Tribunal “a quo” jamais poderia concluir nos seguintes termos: “Invocou o embargante a prescrição (dos juros), o que é suficiente para o tribunal poder conhecer da excepção, sem os limites apontados pelo exequente – ou seja, entendemos poder apreciar a prescrição de todas as quantias peticionadas (capital e juros)”.
7- O Executado, ao não invocar a prescrição do capital, confessou a divida/capital, o que descansou o exequente, na sua contestação aos embargos, de se preocupar em contraditar e apresentar causas de suspensão/interrupção da prescrição anterior à propositura da acção executiva (e que existem!). O Exequente não ia defender-se de algo, ou contraditar algo, que não foi invocado pelo Executado, logo, ao Tribunal, está vedado decidir sobre questão que não foi sequer invocada pelas partes.
8- Resulta do preceituado no art.º 573º CPC e do chamado princípio da preclusão processual que, toda a defesa deve ser deduzida na contestação, ou no presente caso nos Embargos de Executado, sob pena de o Réu/Executado ver precludido o seu direito ou a possibilidade de o voltar a fazer.
9- Perfilhamos a posição expendida no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, Proc. 642/04, sobre o Principio da Preclusão Processual, disponível para consulta em www.dgsi.pt, a prescrição de direitos não é de conhecimento oficioso, sendo necessário, para que o tribunal dela conheça, a sua invocação pela parte que dela beneficia – art.º 303º do CC e 579º do CPC.
10- O Tribunal “a quo” ao conhecer desta questão, está a violar as normas contidas no art.º 303º do CC, 573º e 579º do CPC. A Exequente/Recorrente considera que a douta Sentença, extrapolando as questões que lhe foram colocadas à apreciação, viola as normas vindas de citar, conjugadas com as disposições legais ínsitas na Lei 91/95 de 2 de Setembro, é nula e deverá ser revogada (art.º 615º, nº 1, al. d) e e) do CPC.
11- Por consequência, deve o Executado ser condenado a pagar a totalidade do capital reclamado pelo Exequente.
12- Verifica-se na Sentença recorrida, inexistência de decisão sobre a quota extraordinária de 500.00 euros, o que configura nulidade por questão de devia apreciar e não apreciou (art.º 615º, nº 1, al. d) 1ª parte do CPC.
13- O exequente no RE e na sua contestação, sob o item de “Questão Prévia” disse o seguinte:
“1º
Administração Conjunta do BBM instaurou, em 27 de Dezembro de 2017, pelas 14:03:17 execução contra o Executado identificado em formulário de Requerimento Executivo, para pagamento da quantia, liquidada de € 11 594.69 (onze mil quinhentos e noventa e quatro euros e sessenta e nove euros).

A referida quantia diz respeito às comparticipações em despesas de conversão em dívida e da responsabilidade do executado conforme infra se descrevem:
DATA VENCIMENTO ---------- CAUSA ----------- MONTANTE
- Desde Dez. 1980 – Quotas da Associação – 282.32 euros;
- Desde Dez. 1982 – Joia da Associação – 12.47 euros;
- Desde Dez. 1983 – Projectos – 199.52 euros;
- Desde Dez. 1984 – Compra de dois lotes – 74.82 euros;
- Desde Dez. 1985 – Levantamento topográfico – 199.52 euros;
- Desde Dez. 1988 - Electricidade do bairro – 1.130.61 euros;
- Desde Nov. 1998 – Orçamento para obras – 3.967.54 euros;
- Desde Julho 2015 – Quota extraordinária – 500.00 euros
- Desde 2015 – Solicitador até ao Alvará – 200.00 euros;
- Desde 2015 – Telas finais até ao Alvará – 325.00 euros;
- Desde 2016 – Projecto da linha de água – 200.00 euros.
TOTAL DA DIVIDA: 7 091.80 euros (sete mil e noventa e um euros e oitenta cêntimos).

Os referidos montantes em dívida são o retrato da conta corrente do proprietário/Executado que se junta em anexo a esta resposta que se dá aqui por integralmente reproduzido.
(…)
10º
Em relação às supra referidas quantias reclamam-se juros contabilizados desde Dezembro de 1998 sobre o montante de 5.866,80 euros, no total de 4.406,53 euros; sobre o montante de 500.00 euros (deliberado na acta 7), os juros contabilizados desde Agosto de 2015 no total de 50.52 euros; sobre o montante de 200.00 (solicitador) + 325.00 (telas finais) + 200.00 euros (projecto híbrido), num total de 725 euros, os juros contabilizam-se desde Junho de 2016, num total de 45.84 euros.
11º
Pelo que, à quantia em dívida de 7.091.80 euros (sete mil e noventa e um euros e oitenta cêntimos), acresce o montante em juros que totalizam 4.502.89 euros (quatro mil quinhentos e dois euros e oitenta e nove cêntimos).
12º
E assim deve o Executado o TOTAL de 11.594.69 euros (onze mil quinhentos e noventa e quatro euros e sessenta e nove cêntimos).
(…)”
14- Verifica-se a inexistência de decisão sobre a quota extraordinária “- Desde Julho 2015 – Quota extraordinária – 500.00 euros” (ata 7).
15- Por configurar nulidade, requer-se a revogação da douta Sentença nesta parte, devendo o executado ser condenado pelo seu pagamento, acrescidos os juros legais.
16- Entende o exequente/Recorrente que resulta da Sentença recorrida, a violação do dever de fundamentação, da Lei 91/95 de 2 de Setembro, art.º 16º C, e da Jurisprudência, quanto ao decidido sobre a prescrição dos juros.
17- Da decisão resulta: “(…); mais declaro a prescrição dos juros anteriores a 02/01/2013. “
18- A Sentença viola o dever de fundamentação, porquanto não fundamenta de facto e de direito, como alcança a prescrição dos juros anteriores a 02.01.2013. Reduz a sua decisão à seguinte frase, “Relativamente aos juros, o prazo legal é sempre de 5 anos, pelo que, tendo igualmente por referência a data de 02.01.2018, estão prescritos os juros anteriores a 02.01.2013.”. O que não se aceita!
19- Nos termos do disposto no art.º 16º-C, nº 1 da referida lei “As comparticipações nos encargos da reconversão são consideradas provisões ou adiantamentos até à aprovação das contas finais da administração conjunta”. A este respeito, refere AJR (Advogado) em “Loteamentos Ilegais – Áreas Urbanas de Génese Ilegal – AUGI. 4ª edição – 2010” na Anotação IV ao artigo citado, diz: “Este artigo deve ser objecto de uma interpretação extensiva, para que todos os encargos da reconversão possam ser cobrados pelas comissões de administração. O alcance da medida deve aplicar-se também aos encargos suportados antes da vigência da lei 91/95, visto que existem AUGI que têm vindo a promover a sua reconversão desde o inicio da década de oitenta, anteriormente através de associações de moradores, de proprietários/comproprietários, tendo realizado despesas avultadas em projectos de urbanização e obras de infra-estruturas, a que nem todos os titulares aderiram voluntariamente, pelo que agora há que cobrar a quota parte aos faltosos, nem que seja por forma coerciva pois, de outro modo, seriam premiados aqueles que nunca colaboraram. Assim, as deliberações das assembleias das associações que lideraram os processos antes da vigência da actual lei devem vincular do mesmo modo os faltosos”.
20- O Executado/Embargante está em falta com os pagamentos das comparticipações nos encargos da reconversão como reconheceu, ao não contestar a divida.
21- Estas despesas previstas destinam-se a fazer face à instalação e melhoramento das infra-estruturas projectadas, bem como à construção de equipamentos colectivos, e outras, designadamente melhoramentos que se apresentem necessários, e deverão ser comparticipadas pelos proprietários ou possuidores das parcelas a constituir em lotes. São estas comparticipações nos encargos da reconversão, a efectuar pelos titulares dos prédios no decurso do respectivo dever de comparticipar nas despesas de reconversão, que são consideradas provisões ou adiantamentos até à aprovação das contas finais da administração conjunta, de acordo com o nº1 do art.º 16º-C da Lei 91/95 supra citado. Estas comparticipações são havidas como provisões ou adiantamentos até à aprovação das contas finais de reconversão e o cálculo efectivo do montante da comparticipação só estaria concluído a final, não tendo início o prazo prescricional de uma obrigação cujo vencimento final não ocorreu, nem as entregas mensais e/ou regulares para as despesas de administração da AUGI primitivamente fixadas pela Assembleia revestem natureza de obrigações periódicas, fazem parte da obrigação global de comparticipação que só se considera vencida a final.
22- As comparticipações nas despesas de reconversão vencem juros nos termos do disposto no art.º 16º-C, nº 2 da Lei da AUGI, que dada a natureza da prestação, não opera o prazo de prescrição quinquenal, pelo que são devidos. Entende-se que existe violação do art.º 607º, nº 4 e 5, do CPC, cuja consequência configura nulidade da Sentença nos termos do art.º 615º, nº 1, al. b) ambos do CPC.
23- Porquanto, a Exequente/Recorrente intentou outras execuções onde demandou outros proprietários relapsos. O aqui executado, proprietário do lote id. no RE (106), e enquanto titular da empresa “PM”, proprietária do lote 89 inserido no mesmo Bairro, foi executada por não pagar as comparticipações em divida. Tendo sido condenada, no âmbito do Processo nº 7334/16.0T8LRS-A, processo às mãos do Juízo 3 de execução do Tribunal da Comarca de Lisboa Norte, tendo sido decidido o seguinte:
“Em suma, e a nosso ver, assiste à exequente o direito de exigir da executada o pagamento das comparticipações referentes a “orçamento para obras”, “solicitador até ao alvará” e “telas finais até ao alvará”, no montante total de €7.752,84 (sete mil setecentos e cinquenta e dois euros e oitenta e quatro cêntimos), a que acrescem os juros de mora, até integral pagamento, os quais, na falta de outros elementos mais elucidativos, devem ser contabilizados desde 1 de janeiro de 1999 sobre o valor referente ao “orçamento para obras” (€7.227,84 – sete mil duzentos e vinte e sete euros e oitenta e quatro cêntimos) e desde 1 de janeiro de 2016 sobre o valor das restantes comparticipações (€525,00 – quinhentos e vinte e cinco euros).” Decisão que veio a ser confirmada, pelo Tribunal da Relação de Lisboa, 2ª Secção, Acórdão que foi junto aos autos e se requer o mesmo entendimento nos presentes autos.
24- Seja o prazo ordinário de 20 anos, a operar na contabilização dos juros sobre a divida reclamada anterior ao decidido em Assembleia do dia 15 de Julho de 2015 (ata 7).
25- Unicamente a respeito dos JUROS, perfilhamos o decidido pelo Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido no âmbito do Proc. nº 10839/14.4T2SNT-C.L1-7, disponível em www.dgsi.pt.
26- Pelo exposto, não se aceita que a Sentença recorrida, decida aplicando o prazo de 5 anos, sobre a prescrição dos juros, porque contra a lei e jurisprudência, deverá ser por isso de aplicar o prazo de 20 anos à prescrição dos juros. Consequentemente, requer-se a revogação da douta Sentença, também nesta parte em que decidiu erradamente pela prescrição quinquenal dos juros, em violação da lei 91/95, no seu art.º 16º C, bem como contrariamente à jurisprudência citada.
27- Sobre a Litigância de má fé do executado e da INDEMNIZAÇÃO que não foi arbitrada.
28- Na douta Sentença recorrida, foi o executado condenado por litigante de má fé, fixando-se em 3 UC’s a multa (artigo 27º, nº 1 do Regulamento das Custas Processuais), decisão com a qual se concorda. Porém, através de requerimento refª 11683126, que se dá aqui por integralmente reproduzido, foi requerida também indemnização contra o executado, o Tribunal “a quo” decidiu da mesma absolver o executado, decisão com a qual se discorda.
29- Ao longo do processo foi por demais evidente, o comportamento doloso e culposo do executado, consciente que o seu lote se insere numa AUGI, com despesas de reconversão fixadas por Assembleia Colegial de Proprietários, sem as querer pagar. Tanto assim é, que não junta nos seus embargos qualquer comprovativo de que as tenha pago.
30- Por outro lado, é apanágio do executado, de forma consciente, alterar a titularidade dos lotes, para se imiscuir à obrigação de pagar. Causando, com isso graves prejuízos à exequente, representante de 105 proprietários, estes sim verdadeiramente prejudicados, pois o atraso nas infra-estruturas necessárias a criar condições mínimas de habitabilidade, nunca este executado as quis pagar, nem a título pessoal, enquanto proprietário do lote 106, nem enquanto representante da empresa “PM”, titular do lote 89, neste último, com base no mesmo titulo executivo, sendo condenado ao pagamento, decisão que está transitada em julgado.
31- Da apresentação dos seus embargos, o executado, consciente que deve, sem querer pagar, bem como em requerimentos ulteriores cruzados aos autos, os seus pedidos de litigância de má fé, contra o exequente e sua Mandatária, infundados e não provados, porque descabidos, são tantos e de diferentes montantes, que só por si, perdem toda a credibilidade. Designadamente, em requerimentos ditados nas atas das audiências, é notório, a falta de razão e de respeito, quer pelo Presidente da Exequente e sua Mandatária, sendo o seu conteúdo difamatório, vide Acta do Julgamento datada de 25.11.2021, pelas 10 horas, refª 150668047, ao qual o exequente deu cabal resposta em requerimento ref. 11683929; contra o executado/embargante, vide Acta do Julgamento datada de 21.04.2022, refª 152469532; Continuou, o seu comportamento doloso e intencional, com o requerimento que ditou para a Acta de Julgamento de 25.05.2022, pelas 14 horas, ao qual deu o exequente cabal resposta por requerimento refª 12430742.
32- Todo o comportamento do executado, provocou demora no processo, trabalho de resposta ao qual o exequente não pôde deixar de levar a efeito e suportar os honorários de advogado, obrigando o exequente a suportar taxas de justiça e outros custos de processo, sobretudo, os danos causados aos outros proprietários, representados pela exequente, que sempre pagaram, a tempo e horas,
33- Porquanto, o executado, tem beneficiado das obras e infoestruturas que os outros proprietários pagaram, continuando este a não pretender pagar a parte que o obriga, das deliberações das Assembleias de Proprietários) num total de 105 proprietários e que resultam da aplicação da Lei 91/95, causando a todos graves e avultados prejuízos, pois pela falta de dinheiro vêem-se impedidos de ver avançar com o loteamento.
34- Por tudo quanto supra exposto, a Sentença recorrida, ao não dar procedência ao pedido de indemnização a arbitrar a favor dos proprietários, representados pela exequente, por litigante de má fé contra o executado/embargante, no valor de 15.000.00 euros, deve ser revogada e ser o Executado condenado, para além da multa arbitrada em 3 UC’S, por litigante de má fé, nos termos do disposto no art.º 543º, nº 1 do CPC, condenado ao pedido de litigante de má fé, em indemnização a favor dos proprietários representados pela exequente, no valor de 15.000.00 euros, requeridos em requerimento refª 11683926, que se dá por integralmente reproduzido ou em indemnização que este Douto Tribunal da Relação, considere mais adequado ao comportamento do executado.
35- O presente recurso ao merecer procedência, necessariamente, deverá ter implicação na responsabilização por custas processuais, recorrendo-se da repartição levada a efeito pelo Tribunal “a quo”, “Custas pelo embargante e exequente na proporção de 2/3 -1/3, respectivamente”, deve ser o executado responsabilizado pela totalidade das custas.
36- O que se requer!
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O executado-embargante apresentou contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso do exequente-embargado.
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O tribunal a quo pronunciou-se sobre as nulidades invocadas pelo exequente-embargado da seguinte forma:
Da invocada nulidade da sentença
Dispõe o artigo 615º do Código de Processo Civil que é nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
Pretende a exequente que a sentença é nula por, relativamente à prescrição, o juiz ter conhecido de questões de que não podia tomar conhecimento.
Na sentença proferida nos autos foi expressamente tomada uma posição relativamente aos juros, nomeadamente nas páginas 16 e 17 da mesma (onde se pode ler, na página 16, “O tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público”, e, na página 17, “Invocou o embargante a prescrição, o que é suficiente para o tribunal poder conhecer da exceção, sem os limites apontados pelo exequente – ou seja, entendemos poder apreciar a prescrição de todas as quantias peticionadas (capital e juros) (artigo 303º do Código Civil)”). Afigura-se-nos não existir nulidade, antes discordância da posição adotada.
E pretende igualmente a exequente verificar-se nulidade da sentença por não ter o juiz apreciado a questão relativa à quota extraordinária.
Em relação à quota extraordinária, foi igualmente apreciada a questão, nomeadamente nas páginas 15 e 16 da sentença (onde se pode ler, na página 15, “A validade das atas é questão de conhecimento oficioso. As atas que cumpre verificar se cumprem os requisitos são: Ata 7 – deliberou-se a fixação de uma quota extraordinária, no valor de €500,00, devida e a ser paga pelos lotes/proprietários que sejam objeto de ação executiva – não constitui a ata título executivo porque não contém a(s) deliberação(ões) da assembleia que determine(m) o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão”; e na página 16, “A ata 7 não constitui título executivo ao abrigo da Lei 91/95, pelo que, e não obstante tratar-se de uma deliberação válida, não pode ser nestes autos requerida a quantia correspondente (impunha-se que o exequente se tivesse munido, quanto a tal deliberação, de título válido para o efeito”), pelo que igualmente entendemos que a questão será de discordância da posição adotada, e não de nulidade.
O que resulta das alegações de recurso é que a exequente não concorda com a fundamentação do tribunal.
Termos em que, salvo melhor opinião, não ocorre nulidade da sentença”.
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FUNDAMENTAÇÃO

Colhidos os vistos cumpre decidir.

Objeto do Recurso

O objeto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (art.º 635º nº 2 do CPC), pelas conclusões (art.ºs 635º nº 4, 639º nº 1 e 640º do CPC), pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (art.º 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (art.º 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida.
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Questão prévia
Em face das conclusões apresentadas pelo embargante constata-se que o mesmo veio neste recurso de apelação suscitar novamente a questão da legitimidade e também uma série de outras questões que, não tendo sido alegadas no requerimento de oposição e que, por isso, não faziam parte do objeto do processo, tratam-se de questões invocadas ex novo.
Quanto à questão da legitimidade, trata-se exatamente da mesma questão que já foi definitivamente resolvida pelo acórdão desta Relação que revogou a decisão que havia considerado o executado parte ilegítima. Desse acórdão consta o seguinte:
É precisamente por isso que o art.º 3º, nº 4 da LAUGI atribui a responsabilidade pelo pagamento das contribuições a quem seja proprietário ou comproprietário de prédio(s) integrado(s) na AUGI, sem prejuízo do direito de regresso sobre aqueles de quem hajam adquirido.
Assim sendo, concluímos que estas obrigações têm natureza propter rem, e que se transmitem com a titularidade do direito real respetivo.
Não obstante, a legitimidade processual para os termos da ação executiva deve aferir-se à data da propositura da execução.
Assim, quando o título executivo for a ata da assembleia de proprietários ou comproprietários de uma AUGI que determine o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão, nos termos do art.º 10º, nº 5 da LAUGI, será parte legítima na qualidade de executado quem, à data da propositura da ação executiva, ou seja, no momento em que o requerimento executivo der entrada no tribunal, detiver a referida qualidade de proprietário ou comproprietário - cfr. acs. RE 22-11-2018 (Tomé Ramião), p. 1076/13.6TBSTB-B.E1; e RL 24-04-2019 (Gabriela Cunha Rodrigues), p. 7334/16.0T8LRS-A.L1.
No caso dos autos, resulta da factualidade provada que no momento em que a presente execução foi proposta, a quota de 321/14680 a que se reportam os títulos executivos se achava inscrita a favor do executado, através da ap. 3536 de 2014/09/25.
Por outro lado, consta da mesma inscrição que o executado adquiriu esta quota por doação que lhe foi feita por EM.
Assim sendo, o executado sucedeu a esta na obrigação de pagar as contribuições documentadas na ata nº 1, dada à execução, onde consta que a referida senhora “EM (…) é devedora da quantia de €5.866,86 (…)” a título de “contribuições aprovadas”.
É certo que também resulta da matéria de facto provada que a aquisição da mesma quota a favor da sociedade S – CONSTRUÇÕES IMOBILIÁRIAS, Lda, mas tal registo foi efetuado cerca de duas horas depois da entrada do requerimento executivo no Tribunal.
Ora, como o executado e ora embargante não alegou nem provou em que data vendeu a referida quota à mencionada sociedade, limitando-se a invocar a presunção decorrente do registo (art.º 7º do Código de Registo Predial), forçoso é considerar que não resultou demonstrado que à data da propositura da execução embargada esta sociedade já era comproprietária do imóvel dos autos.
Nesta conformidade, conclui este Tribunal que o executado é parte legítima na execução embargada, cumprindo por isso revogar a decisão recorrida”.
Como resulta do teor das conclusões acima transcritas, o recorrente-embargante veio novamente invocar a questão da transmissão do direito, achando que ao dar-lhe o nome de “legitimidade ad causam” lhe altera a natureza. Cotejando as conclusões do recorrente-embargante com o decidido no acórdão acima referido facilmente se constata que a questão era - e continua a ser nos termos da alegação do recorrente – se este podia ou não ser demandado atendendo à transmissão que fez do direito. A decisão da Relação foi no sentido afirmativo.
Assim, nos termos do art.º 620º do CPC, existe caso julgado formal quanto à referida questão de legitimidade.
Quanto às questões suscitadas nas alegações e relativas às invalidades e falsidades da ata, tratam-se de questões novas que não são de conhecimento oficioso e que o recorrente veio só agora, em sede de recurso, suscitar.
O recurso exige uma prévia decisão desfavorável, incidente sobre uma pretensão colocada pelo recorrente perante o Tribunal recorrido. Só se recorre de uma decisão que analisou uma questão colocada pela parte e a decidiu em sentido contrário ao pretendido.
Como refere Abrantes Geraldes[2], “a natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objecto, decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o Tribunal ad quem com questões novas”.
A única exceção a esta regra reporta-se às questões de conhecimento oficioso, das quais o Tribunal tem a obrigação de conhecer, mesmo que não sejam invocadas pelas partes.
Este entendimento é jurisprudência unânime. Como se refere no ac. STJ de 07.07.2016[3], “Efetivamente, e como é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na Jurisprudência, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação”. No mesmo sentido, ac. STJ de 17.11.2016 (proc.º nº 861/13.3TTVIS.C1.S2), ac. Relação de Coimbra de 14.01.2014 (proc.º nº 154/12.3TBMGR.C1) e ac. Relação do Porto de 16.10.2017 (proc.º nº 379/16.2T8PVZ.P1)[4].
Sendo questões novas que não são de conhecimento oficioso, não pode o Tribunal superior apreciar das mesmas.
Assim, este Tribunal ad quem não irá conhecer das acima referidas questões, por impossibilidade legal.
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Em face das conclusões do embargante-recorrente e tendo em conta as restrições acima mencionadas, as questões a apreciar são as seguintes:
- a inexequibilidade do título executivo (ata);
- condenação do recorrente por litigância de má-fé;
- condenação da embargada-recorrente como litigante de má-fé.
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Em face das conclusões apresentadas pela embargada-recorrente, as questões a apreciar são as seguintes:
- nulidade da sentença por conhecer de questão que não podia tomar conhecimento, nos termos do art.º 615º, nº 1, al. d) e e) do CPC – quanto à prescrição da dívida de capital;
- nulidade da sentença, nos termos do art.º 615º, nº 1, al. d) 1ª parte do CPC, por inexistência de decisão sobre a quota extraordinária de 500 euros;
- prescrição dos juros de mora;
- condenação do embargante em indemnização à embargada por litigância de má-fé.

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Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
A. O BBM, sito no BBM, da freguesia e concelho de Loures, é um bairro de génese ilegal e que se encontra em fase de reconversão e legalização, sendo representado pela Administração Conjunta do BBM
B. Em assembleia geral, ainda em sede de Associação, foram deliberadas quotas de comparticipação para cada um dos lotes de terreno que compõem a AUGI.
C. Em 15/09/2013 reuniu em assembleia geral ordinária a Associação de Proprietários e Moradores do BBM, na qual foi apresentada a 1ª lista de proprietários que devem à Associação contribuições aprovadas, anexa à ata, nomeadamente: d) proprietário do lote 106 – EM, a qual é devedora da quantia de €5.866,86.
D. A quantia referida em C de € 5.866,86 corresponde a:
Designação      Data pagamento        Valores em $      Valores em €
Quotas da associação  Dezembro 1980     56.600$00         €282,32
Joia associação        Dezembro 1982       2.500$00        €12,47
Projetos            Dezembro 1983      40.000$00        €199,52
Compra 2 lotes   Dezembro 1984       15.000$00         €74,82
Levantamento topográfico  Dezembro 1985    40.000$00  €199,52
Eletricidade (postes) Dezembro 1988    226.667$00      €1.130,61
Orçamento obras        1998                        795.422$00    €3.967,54
                                                      1.176.189$00    €5.866,81
E. Na mesma assembleia de 15/09/2013, foi aprovada, por unanimidade, a lista de devedores apresentada, e aprovada a cobrança judicial das dívidas dos proprietários faltosos.
F. Em 12/07/2015 reuniram em assembleia geral os proprietários e comproprietários dos prédios integrados no BBM, tendo sido aprovada por unanimidade a fixação de uma quota extraordinária, no valor de €500,00, devida e a ser paga pelos lotes/proprietários que sejam objeto de ação executiva.
G. Em 22/05/2016 reuniram em assembleia geral os proprietários e comproprietários dos prédios integrados no BBM na qual:
 Foi aprovado, por unanimidade, admitir a introdução de um novo ponto na ordem de trabalhos, que passou a ser o ponto 1 (ratificação de todas as deliberações efetuadas em assembleias-gerais da Associação de Proprietários e Moradores do BBM, que as mesmas sejam consideradas válidas e aceites no processo de reconversão em curso, relativas e necessárias à execução das obras de urbanização e outras despesas)
 Foi aprovado, por unanimidade, ratificar de todas as deliberações efetuadas em assembleias-gerais da Associação de Proprietários e Moradores do BBM, no âmbito do processo de reconversão, validando-as ao abrigo da Lei 91/95, como praticadas pela Administração Conjunta da AUGI do BBM e, designadamente, das seguintes deliberações:


a) O valor desta quota, para cada um dos lotes, corresponde ao resultado da seguinte fórmula: (área do lote x custo por m2) + (coef. do fogo x custo por fogo). O valor do orçamento para as obras de urbanização foi de 92.964.807$00 (€ 463.706,50), acrescido do valor de 7.035.193$00 (€ 35.091,40), destinados a despesas com a fiscalização da obra e obras a executar pelos Serviços Municipalizados
 Foi aprovado, por maioria, a fixação de uma quota de comparticipação para o ano de 2016, devida por cada um dos lotes, no valor de € 200,00, dividida em dois pagamentos de € 100,00 cada, com vencimento em 30 de julho e 31 de dezembro, para fazer face à despesa com o projeto hídrico e honrar demais compromissos com a equipa técnica.
H. Por Acórdão proferido nestes autos pelo Tribunal da Relação de Lisboa o embargante foi julgado parte legítima.
I. Estão em dívida, relativamente ao lote 106, as seguintes quantias correspondentes a: quotas da associação vencidas em dezembro de 1980, joia da associação vencida em dezembro de 1982, projetos e levantamento topográfico ambos vencidos em dezembro de 1983, compra de 2 lotes vencido em dezembro de 1984, eletricidade (postes), vencido em dezembro de 1988, orçamento obras vencido em 1998, juros de mora respetivos, quota deliberada na assembleia geral relativa a 12/06/2015, no valor de € 500,00 acrescido de juros à taxa legal; quotas deliberadas na assembleia geral realizada no dia 22/05/2016, no valor de € 725,00 acrescido de juros à taxa legal.
J. As atas que acompanham o requerimento executivo, identificadas em C, E e F, não foram impugnadas.
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Fundamentação Jurídica
Questão prévia da ordem de conhecimento das questões
Nos termos do art.º 608º/2, ex vi art.º 663º/2, do CPC, o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Temos aqui consagrado o princípio da economia processual. Se existe uma questão que resolve outras questões suscitadas pelas partes e de que o tribunal deva tomar conhecimento, deve essa questão ser apreciada de imediato, não sendo necessário apreciar das que ficaram prejudicadas por via dessa apreciação. É claro que a prejudicialidade tem como pressuposto prévio a concreta decisão que vier a ser proferida. Por exemplo, no caso, a nulidade da decisão por ter conhecido da questão da prescrição da dívida de capital, exatamente por se tratar de uma questão de nulidade, deveria, em princípio, ser apreciada antes das outras questões, nomeadamente da questão da exequibilidade do título. Acontece, porém, que há casos em que tal regra se inverte, como nos parece ser o caso no presente recurso. Isto porque, caso proceda a questão da inexequibilidade do título executivo, total ou parcial, a questão da dívida de capital fica desde logo resolvida, assim como também ficam resolvidas as outras questões, como a prescrição dos juros de mora, restando apenas a da nulidade da sentença, nos termos do art.º 615º, nº 1, al. d) 1ª parte do CPC, por inexistência de decisão sobre a quota extraordinária de 500.00 euros e as questões relativas à litigância de má-fé.
Assim, entendemos que a primeira questão a apreciar é a de apurar se a ata nº 8, que é o título executivo que se considerou na sentença ser o único válido – questão que não foi colocada em crise em nenhum dos recursos – assume ou não as características legais para ser considerado como tal.
A norma fundamental a ter em conta para apreciar da questão é o art.º 10º/5, da Lei nº 91/95, de 2 de Setembro (que é o regime legal do “processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal”, referidas genericamente pela sigla AUGI). Esse preceito atribui a natureza de título executivo à “fotocópia certificada da ata que contém a deliberação da assembleia que determine o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão”.
A Lei nº 91/95, originalmente, não continha essa norma que atribuía a natureza de título executivo às atas das assembleias de proprietários e comproprietários das AUGIs.  Tal só veio a acontecer por via da Lei n.º 165/99, de 14 de setembro, que veio consagrar no art.º 10º um nº 5 com a seguinte redação: “A pública-forma da acta que contém a deliberação da assembleia que determine o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão constitui título executivo”. A atual versão resultou da redação dada pela Lei n.º 64/2003, de 23 de agosto. A Lei nº 91/95 teve mais 4 alterações que não afetaram o disposto no art.º 10º/5. Temos, pois, que as atas que contêm as deliberações da assembleia de proprietários e comproprietários das AUGIs que determinem o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão só assumiram a natureza de título executivo a partir do regime implementado em setembro de 1999.
Ora, nos termos do art.º 12º/1 do CCivil, a lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroativa, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
E, de acordo no o estabelecido no nº 2 do mesmo preceito, quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser diretamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.
Atribuir a um documento a natureza de título executivo permite ao credor, pela mera forma do ato, avançar de imediato para a ação executiva contra o devedor sem necessidade de, previamente, como acontece com a generalidade das obrigações, ter de obter uma sentença condenatória por via de uma ação declarativa. Daí que tal desiderato esteja intrinsecamente ligado ao facto que atribuiu a natureza de título executivo ao documento que consubstancia a obrigação. Trata-se, sem dúvida, de algo que, nos termos do art.º 12º/1 do CCivil, só pode valer para o futuro, não se podendo sequer questionar a aplicação da exceção do nº 2 pois não se abstrai do facto que lhe deu origem.
Olhando agora para o caso concreto, temos que a exequente pretende, por via da ata nº 8, cobrar determinadas quantias que foram aprovadas originalmente por via de deliberações que ocorreram entre dezembro de 1979 a dezembro de 1998 e no âmbito de uma associação que não era uma AUGI (daí que, e bem, a decisão recorrida tenha considerado que as atas de tais deliberações não constituíam título executivo). Essa ata é datada de 22.05.2016, mas dela resulta expressamente que as obrigações se constituíram por força das deliberações que foram tomadas naqueles anos e, ademais, pretende-se que os efeitos da pretensa “novação”, por via das deliberações da ata nº 8, se reportem aos anos a que foram aprovadas, de tal forma que a exequente-embargada liquidou os juros de mora em função da data em que ocorreu a deliberação original.
Atento o facto de a lei só dispor para o futuro, só as comparticipações que se tenham constituído após a entrada em vigor da lei que atribuiu a natureza de título executivo às deliberações das assembleias de proprietários e comproprietários de AUGIs é que podem ser exigidas por via executiva. A deliberação em causa pretende, de forma aliás completamente assumida, transformar deliberações constantes de atas que não assumiam a natureza de título executivo, em deliberações imediatamente exequíveis ao abrigo da Lei nº 91/95, de tal forma que na deliberação até se menciona expressamente esse objetivo. Obviamente que é inócua a deliberação que fixa os efeitos jurídicos da ata quanto às deliberações que pretende ratificar unicamente para as incluir no âmbito do regime da Lei 91/95. Não é pelo facto de se ter deliberado ratificar as deliberações efetuadas em assembleias-gerais da Associação de Proprietários e Moradores do BBM, no âmbito do processo de reconversão, validando-as ao abrigo da Lei 91/95, como praticadas pela Administração Conjunta da AUGI do BBM, que esse efeito jurídico efetivamente se verifica, em especial quanto às deliberações tomadas em data anterior a 1999, altura em que as atas, mesmo das AUGIs, não tinham a natureza de título executivo. Note-se que esta questão da aplicação da lei no tempo é uma questão que obviamente se impunha apreciar, independentemente da alteração de 1999 à lei nº 91/95, quanto às comparticipações aprovadas antes da entrada em vigor deste último diploma.
Deste modo, temos que para as obrigações exequendas que se constituíram entre 1979 e 1998 a ata nº 8 não constitui, efetivamente, título executivo pois que, à data em que elas foram aprovadas e, decorrentemente, passaram a ser vinculativas, só podiam ser exigidas por via declarativa e não por via executiva.
No entanto, tal ata contém ainda outras deliberações, nomeadamente as seguintes:
- solicitador até ao alvará (2015): 200€;
- telas finais até ao alvará (2015): 325€;
- projeto hídrico (2016): 200€.
Para estas obrigações, essa ata constitui título executivo, pois, nessa parte, determina o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão. O pagamento ao solicitador, as telas finais e o projeto hídrico constituem, sem dúvida, despesas necessárias à reconversão da AUGI. E, atentas as datas, reportam-se a períodos temporais em que as atas já tinha o caráter de título executivo.
A Relação de Lisboa, no ac. de 07.11.2019[5], já decidiu neste sentido, assim sumariado:
“– Estando em causa uma reconversão urbanística de área urbana de génese ilegal (AUGI), o artigo 3.º n.ºs 3 e 4, da Lei nº. 91/95, de 02/09, estabelece que o dever de reconversão inclui ainda o dever de comparticipar nas despesas de reconversão, nos termos fixados na lei, e que os encargos com a operação de reconversão impendem sobre os titulares dos prédios abrangidos pela AUGI;
– decorre do nº. 5, do art.º 10º, do mesmo diploma, que a qualidade de título executivo decorre unicamente da acta da assembleia de proprietários ou comproprietários conter ou preencher os requisitos ali enunciados, ou seja, deve a mesma conter a deliberação da assembleia de proprietários ou comproprietários, que determine o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão ;
– desta forma, a obrigação torna-se exigível com a simples tomada ou aprovação da deliberação que fixe as comparticipações nas despesas de reconversão e o respectivo prazo de pagamento, sendo que é este elemento que determina, por seu turno, o momento de vencimento da obrigação”.
Assim, quanto à questão da exequibilidade do título, temos que o recurso do recorrente-embargante procede, com a exceção relativa à quantia total de 725€, pois quanto a esse montante a ata reúne os requisitos para ser considerada título executivo.
Deste modo e em face do ora decidido, todas as demais questões ficam prejudicadas, à exceção da questão da nulidade da decisão quanto à quantia de 500€, aprovada pela ata de 12.07.2015, e as questões da má-fé processual suscitadas por ambos os recorrentes.
Vejamos então a questão da nulidade por omissão de pronúncia quanto à referida quantia de 500€. Desde já se adianta que essa nulidade não se verifica de todo, como aliás resulta do despacho que foi proferido pelo tribunal a quo.
Quanto a este aspeto, na sentença afirmou-se o seguinte:
Ata 7 – deliberou-se a fixação de uma quota extraordinária, no valor de €500,00, devida e a ser paga pelos lotes/proprietários que sejam objeto de ação executiva – não constitui a ata título executivo porque não contém a(s) deliberação(ões) da assembleia que determine(m) o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão”.
A fundamentação pode ter sido sucinta, mas disse tudo o que era necessário dizer e que, esquematicamente e usando o raciocínio silogístico, é o seguinte:
- premissa maior: só as atas que contenham deliberações da assembleia que determinem o pagamento de comparticipação nas despesas de reconversão é que constituem título executivo;
- premissa menor: a deliberação em causa - quota extraordinária, no valor de €500,00, devida e a ser paga pelos lotes/proprietários que sejam objeto de ação executiva – constitui uma obrigação de natureza sancionatória;
- conclusão: não se tratando de despesas de reconversão, a ata que a contém não assume a natureza de título executivo quanto a essa quantia.
Não ocorre, portanto, nulidade absolutamente alguma decorrente de omissão de pronúncia e, para além do mais, a questão foi corretamente resolvida.
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Restam agora as questões relativas à litigância de má-fé.
Comecemos pela decisão que condenou o recorrente-embargante na multa de 3 UCs como litigante de má-fé. Para fundamentar tal decisão, a sentença, depois de referir genericamente o regime legal da litigância de má-fé, disse o seguinte:
É censurável a atuação processual do embargante, que, desde a audiência prévia, formula diferentes pedidos sempre com o fito de que o tribunal decidisse de imediato as questões, quando o tribunal, no âmbito da gestão processual que lhe compete, entendeu que os autos careciam da produção de prova, e invocando questões que em tempo não suscitou. A atuação foi propositada, enquadrando-se na negligência grave (pelo menos), tendo entorpecido a ação da justiça, e protelando a decisão final (que tanto queria que já estivesse decidida)”.
Verifica-se que a decisão baseou-se exclusivamente na conduta processual do embargante, enquadrando-se na al. d) do art.º 542º/2 do CPC. Estamos, portanto, no âmbito da chamada má-fé instrumental, prevista nas als. c) e d), contraposta à má-fé substancial, prevista nas als. a) e b).
No entanto, como se constata, a decisão não mencionou as condutas processuais a que, em concreto, se estava a referir e que tiveram o efeito de entorpecer a ação da justiça e protelar a decisão final.
Compulsados os autos temos que a audiência prévia teve lugar em 23.06.2021. A audiência final foi inicialmente designada para 25.11.2021, tendo nesse dia sido adiada para 28.03.2022, data em que se iniciou. Teve várias sessões, tendo o embargante suscitado no decurso da mesma várias questões relativas às atas apresentadas pela exequente. A audiência final terminou no dia 25.05.2022, cerca de dois meses após o seu início. Independentemente das questões que foram suscitadas, verifica-se que não ocorreu qualquer demora na tramitação, muito menos decorrente de tais questões, não se vislumbrando qualquer intenção no sentido de o embargante querer protelar a decisão final, mas apenas a de querer exercer direitos processuais relativamente aos documentos apresentados pela exequente. A pertinência ou impertinência de tais requerimentos poderia ter cabimento a nível de eventuais custas incidentais, mas não nos parece poder relevar para efeitos de má-fé processual. A isto há a acrescentar que, como se constata do que supra se decidiu quanto ao título executivo, o embargante teve ganho de causa quase integral, superior a 90% em relação à quantia exequenda, o que significa que, substancialmente, assistia-lhe razão na oposição que deduziu contra a execução e mais concretamente contra o título executivo.
Deste modo, face ao exposto, não se verifica qualquer situação prevista na al. d) do art.º 542º/2 do CPC, pelo que também nesta parte o recurso do embargante procede, devendo a decisão que o condenou como litigante de má-fé ser revogada.
Desta procedência decorre, consequentemente, a improcedência do recurso da embargada quanto à pretendida indemnização pela litigância de má-fé.
Resta por último apreciar do recurso do embargante quanto à não condenação da embargada como litigante de má-fé, pretendendo por via deste recurso obter tal condenação.
Os fundamentos em que alicerça esta sua pretensão recursiva constam das als. ca) a ch) das conclusões, baseando-se, como resulta do invocado, nas questões de mérito que foi suscitando ao longo do processo. Acontece, porém, que não lhe assiste qualquer razão. Tudo o que invoca resultava desde logo do alegado pela exequente, que nada escondeu e que, ao exercer o direito em causa, não ultrapassou quaisquer limites, nem sequer os da lide temerária. Veio exercer direitos que entendia assistir-lhe, não sendo uma evidência que não tenha esses direitos e, ademais, do ora decidido não resulta que efetivamente não os tenha. Resulta apenas que não os pode vir exercer por via executiva. Mas poderá fazê-lo por via declarativa.
Assim, sem necessidade de mais considerandos, o recurso do embargante, nesta parte, improcede integralmente.
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Das custas
Relativamente à responsabilidade pelas custas, temos quanto à recorrente-embargada que a mesma decaiu integralmente quanto a tudo o que suscitou no recurso.
Relativamente ao recorrente-embargante, e especificamente quanto ao objeto da execução, teve integral vencimento à exceção da quantia de 725€, acrescida dos respetivos juros de mora. Mais teve vencimento quanto à revogação da decisão que o condenou como litigante de má-fé. Decaiu na questão da condenação da recorrente-embargada como litigante de má-fé.
Deste modo, nos termos do art.º 527º/1 e 2 do CPC, as custas do recurso do recorrente-embargante ficam a cargo de ambas as partes na proporção de 10% para o recorrente e 90% para a recorrida. As custas do recurso da recorrente-embargada ficam integralmente a seu cargo. Na primeira instância as custas ficam a cargo de ambas as partes na proporção de 10% para o embargante e 90% para a embargada.

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DECISÃO
Face ao exposto, acordam os Juízes Desembargadores que compõem este coletivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa no seguinte:
a) em julgar o recurso da recorrente “ADMINISTRAÇÃO CONJUNTA DO BBM” integralmente improcedente;
b)  em julgar o recurso do recorrente AL parcialmente procedente e, em consequência, revogam a decisão recorrida à exceção da parte em que determinou a prossecução da execução, com a redução da quantia exequenda ao valor das quotas deliberadas na assembleia geral realizada no dia 22/05/2016, no valor de €725,00 acrescido de juros à taxa legal peticionados.
Custas do recurso do recorrente-embargante a cargo de ambas as partes na proporção de 10% para o recorrente e 90% para a recorrida.
Custas do recurso da recorrente-embargada integralmente a seu cargo.
Custas na primeira instância a cargo de ambas as partes na proporção de 10% para o embargante e 90% para a embargada.

TRLx, 07mar2024
Jorge Almeida Esteves
Teresa Soares
Octávia Viegas
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[1] Questão já apreciada por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa no sentido de o embargante ser parte legítima na execução.
[2] In Recursos em Processo Civil, Almedina, 4ª ed., 2017, pág. 109.
[3] Proferido no processo nº 156/12.0TTCSC.L1.S1, in www.dgsi.pt.
[4] Todos em www.dgsi.pt.
[5] Proferido no procº nº 16906/16.2T8SNT-A.L1-2, in www.dgsi.pt.