Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CARLA MENDES | ||
Descritores: | COMPENSAÇÃO OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/07/2015 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | - A compensação enquanto facto extintivo da obrigação pode ser invocada pelo executado na oposição/embargos à execução. - Para que tal suceda necessário é que o contra-crédito invocado esteja reconhecido judicialmente. - O reconhecimento do contra-crédito invocado não pode ter lugar em sede de embargos/oposição ao requerimento de injunção ao qual foi aposta a fórmula executória. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO: H... deduziu oposição ao requerimento de injunção a que foi aposta a fórmula executória, sustentando a existência de um contra crédito sobre o exequente resultante de incumprimento contratual (contrato de arrendamento) nomeadamente, 50% do valor das rendas (mora) - € 4.650,00 acrescidos dos juros respectivos, não pagamento das facturas relativas à água no montante de € 253,52, arranjo do motor da piscina no valor de € 279,56, o que perfaz € 5.183,08 acrescido dos juros de mora no montante de € 2.941,80, com vista a obter a compensação de créditos, ex vi arts. 729 h) e 857/1 CPC. Foi proferida decisão que indeferiu liminarmente os embargos de executado (oposição à execução) com fundamento de que “os alegados créditos decorrentes da falta de pagamento de facturas ou de avarias a questão não se mostra decisiva sendo que a indemnização por incumprimento contratual exorbita completamente o âmbito de uma defesa por impugnação ou excepção, envolvendo a apreciação de um juízo de imputação de culpa contratual e respectiva condenação só admissíveis em reconvenção, figura não admissível em sede de oposição à execução” – fls. 53. Inconformado apelou o opoente, alegando e formulando as conclusões que se transcrevem: 1ª. O disposto no art. 266/2 c), referente à admissibilidade da reconvenção, ao autonomizar a compensação como fundamento da reconvenção reconhece a dedução da mesma no âmbito de embargos de executado. 2ª. A excepção da compensação é sempre permitida, seja como objecção, seja como excepção propriamente dita. 3ª. O executado deduziu a excepção da compensação nos termos do art. 729 g). 4ª. Apenas pediu a compensação de créditos fundamentada nos contra créditos que detém sobre o exequente, nos termos do art. 729 g), ex vi art. 857/1 CPC, até ao limite da quantia exequenda. 5ª. Assim sendo, a sentença do tribunal a quo viola a norma contida na 1ª parte do art. 266/2 c), ao considerar o contra crédito do executado como matéria de reconvenção “inadmissível no processo executivo e declarativo que a ele funcionalmente se subordinam” e “exorbita completamente o âmbito de uma defesa por impugnação ou excepção”. 6ª. Neste sentido o Ac. STJ de 26/4/2012 evidencia que “ A compensação reveste indiscutível natureza de reconvenção (e, então será inadmissível na acção executiva) quando o réu pretenda fazer valer contra o autor um crédito superior ao deste e na parte em que se verifica o excesso”. 7ª. No caso concreto, é admissível a injunção, pois estamos perante um requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações, a que se refere o nº 1 do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo DL 32/2003 de 17/2”. 8ª. Assim, deve a sentença ser revogada e decidir-se conforme o explanado. Não foram deduzidas contra-alegações. Dispensados os vistos, cabe decidir. Atentas as conclusões do apelante que delimitam como é regra o objecto do recurso – arts. 639 e 640 CPC – a questão a decidir consiste em saber se, em sede de oposição à execução, resultante de injunção à qual foi aposta fórmula executória, é ou não admissível a dedução da compensação (créditos) enquanto excepção peremptória e/ou reconvenção. Vejamos: A acção executiva visa, como se sabe, a reparação material coactiva do direito do exequente (art. 10/4 CPC), tendo de ser fundada num dos títulos enumerados no art. 703 do CPC, através do qual se determinam o fim e os limites da acção executiva (art. 10/5). O título executivo determina o tipo de acção, o seu objecto, definindo a legitimidade activa e passiva das partes (art. 53 CPC) – cfr. Lopes Cardoso, Manual da Acção Executiva, 3º ed.-116, Lebre de Freitas, Acção Executiva à luz do Cód. Revisto, 2ª ed.-31, Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 1999 -37. No caso sub-judice, o título executivo apresentado no processo executivo consiste no requerimento de injunção ao qual foi aposto a fórmula executória (arts. 703/1 d) CPC e arts. 7 e 14 DL 269/98 de 1/9 e DL 32/2003 de 17/2 que transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva nº 2000/35CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 29/6, estabelecendo um regime especial relativo a atrasos de pagamento em transacções comerciais, alargou a aplicação do procedimento de injunção às obrigações nele previstas, ou seja, obrigações emergentes de transacções comerciais). A injunção é a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o art. 1º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo DL 32/2003 de 17/2 – cfr. art. 7 do anexo ao DL 269/98 de 1/9. A Doutrina e a Jurisprudência defendem que o requerimento executivo no qual foi aposto a fórmula executória, não é equiparável a uma sentença condenatória, mas sim, um título executivo criado por lei e, como tal, o executado pode deduzir oposição à execução e à penhora, ex vi art. 728 CPC (art. 813 LV), com os fundamentos constantes no art. 731 CPC (art. 816 LV) – cfr. entre outros, Acs. RL de 6/7/2009, relator Tomé Gomes, de 28/3/2013, relatora Maria da Graça Araújo, in www.dgsi.pt., Lebre de Freitas, in Acção Executiva – Depois da Reforma. 4ª ed., Coimbra, 2004 – 64 e 182, Amâncio Ferreira, in Curso de Processo de Execução, 6ª ed., Coimbra, 2004 – 39 -46 e 152/153, -16, Miguel Teixeira de Sousa, in A Reforma da Acção Executiva, Lisboa, 2004 – 69, Salvador da Costa, in A Injunção e as Conexas Acção e Execução, 2º ed., Coimbra, 2002 -172, Remédio Marques in Curso de processo executivo Comum à Face do Código Revisto, Porto, 1998 – 79/80. Não obstante o estipulado no art. 857 CPC (Lei 41/2013 de 26/6), sob a epígrafe “Fundamentos de oposição à execução baseada em requerimento de injunção” ao qual foi aposto fórmula executória, entendemos que a argumentação extractada supra não é beliscada. Um dos fundamentos de oposição à execução de que o executado pode lançar mão, através de embargos (art. 732 CPC), consiste na existência de um contra-crédito sobre o exequente, com vista à obtenção da compensação de créditos – cfr. art. 729/1 g) CPC. Daqui se extrai que a oposição à execução pode ser fundada num facto extintivo da obrigação, como seja a compensação. Há lugar à compensação quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor, verificados que sejam certos requisitos: ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou dilatória, de direito material e terem as duas obrigações por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade – cfr. art. 847/1 a) e b) CC. “A compensação baseia-se na conveniência de evitar pagamentos recíprocos quando o devedor tem, por sua vez, um crédito contra o seu credor. E funda-se ainda em julgar equitativo que se não obrigue a cumprir aquele que é, ao mesmo tempo, credor do seu credor, visto que o seu crédito ficaria sujeito ao risco de não ser integralmente satisfeito, se entretanto se desse insolvência da outra parte” – cfr.Ac. STJ de 14/3/2013, relator Granja da Fonseca, in www.dgsi.pt. Assim, através da compensação o devedor livra-se da obrigação, por extinção simultânea do crédito equivalente de que disponha contra o seu credor. A declaração de compensação é um negócio jurídico unilateral, podendo denominar-se negócio potestativo porque, através dela, é exercido o direito potestativo do declarante. Consequentemente, traduzindo-se a compensação num direito potestativo extintivo que tanto pode ser exercido por via extrajudicial ou judicial, por via de acção ou de defesa por excepção, ou por reconvenção, conforme a situação. Logo, a compensação pode ser exercida, em sede de oposição à execução, como facto extintivo da obrigação exequenda e não já de reconvenção, pois esta não é admissível em processo executivo – cfr. Lebre de Freitas, in A Acção Executiva (Depois da Reforma), 4ª ed. – 178/179 e Ac. STJ de 26/4/2012, relatora Maria dos Prazeres Beleza, in www.dgsi.pt. No entanto, tal como supra referido, um dos requisitos da compensação é que o crédito invocado para a compensação seja exigível em juízo e não inutilizado por excepções, ou seja, o crédito daquele que declarar/invocar a compensação não pode ser controvertido, tem de existir de facto, estar judicialmente reconhecido. “Permitir que o executado utilize os embargos para através deles, ver reconhecido o seu contra-crédito, seria abrir caminho para entorpecer ou até inviabilizar a sua actividade de cobrança rápida e eficaz de créditos, como é a específica finalidade da execução para pagamento de quantia certa” – cfr. Ac. STJ proferido, em 27/11/2003 no recurso 7520/03, e Ac. STJ de 14/12/2006, relator João Camilo, in www.dgsi.pt. In casu, o apelante na oposição à execução sustentou ser titular de um contra-crédito sobre o exequente concluindo pela compensação dos créditos e extinção da execução. Fundamentou o contra-crédito invocado em incumprimento contratual relativo a um contrato de arrendamento, traduzido em € 4.650,00 correspondente a 50% do valor das rendas (mora), não pagamento das facturas de água e arranjo do motor da piscina. Ora, face ao extractado supra, está bem de ver que o contra – crédito invocado para a obtenção da compensação não está judicialmente reconhecido, é controvertido. Na verdade, o contra-crédito está relacionado com o alegado incumprimento contratual, subjacente a um contrato de arrendamento. Ora, a apreciação desta matéria (reconhecimento do contra-crédito resultante de incumprimento contratual), deve ter lugar em sede de acção declarativa e não em sede de acção executiva. Assim, tal como exposto, a utilização da compensação em processo de embargos/oposição à execução tem que ter como fundamento um contra-crédito do executado já reconhecido judicialmente, não sendo, de todo, admissível que o reconhecimento judicial do contra-crédito tenha lugar nos autos de embargos/oposição à execução. Destarte, soçobra a pretensão do apelante. Em suma: 1 - A compensação enquanto facto extintivo da obrigação pode ser invocada pelo executado na oposição/embargos à execução. 2 – Para que tal suceda necessário é que o contra-crédito invocado esteja reconhecido judicialmente. 3 – O reconhecimento do contra-crédito invocado não pode ter lugar em sede de embargos/oposição ao requerimento de injunção ao qual foi aposta a fórmula executória. Pelo exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e, consequentemente, confirma-se a decisão. Lisboa, 7/5/2015 Carla Mendes Octávia Viegas Rui da Ponte Gomes |