Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2557/10.9TBVFX.L1-6
Relator: TOMÉ ALMEIDA RAMIÃO
Descritores: ATRIBUIÇÃO DA CASA DE MORADA DE FAMÍLIA
PRESSUPOSTOS
PODERES DO TRIBUNAL
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/31/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: 1. O incidente de atribuição da casa de morada de família previsto no n.º7, do art.º 1407.º, do C. P. Civil, não está sujeita a critérios de legalidade estrita, mas a critérios de conveniência e oportunidade, podendo o tribunal investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes, devendo observar-se as regras processuais previstas nos art.ºs 302.º a 304.º e 1409.º a 1411.º do C. P. Civil.
2. Compete às partes requerer, com o requerimento em que formularam o pedido, a gravação dos depoimentos das testemunhas inquiridas, nos precisos termos do art.º 304.º/3 do C. P. Civil.
3. Na fundamentação da decisão da matéria de facto deve o juiz indicar os fundamentos que foram decisivos para a sua convição, indicando os concretos meios de prova e declarar porque razão, sem perda da liberdade de julgamento garantida pela manutenção do princípio da livre apreciação das provas (art.º 655.º), deu mais credibilidade a uns depoimentos e não a outros.
4. Impondo a lei que o juiz proceda a uma análise crítica das provas produzidas e que especifique os fundamentos que foram decisivos para a formação da sua convicção, não basta a indicação genérica dos meios de prova (no caso, testemunhal e documental), sem qualquer referência às razões de ciência invocadas pelas testemunhas ou sem qualquer explicitação dos reais motivos que levaram o tribunal a atribuir credibilidade a uns depoimentos e não a outros.
5. Na ausência de lei expressa sobre os critérios a observar na fixação do regime provisório, justifica-se a aplicação daqueles que estão definidos para o regime definitivo, isto é, os critérios orientadores no art.º 1793.º do C. Civil, no caso de a casa pertencer a ambos os cônjuges ou a um deles, ou do art.º 1105.º, do mesmo código, tratando-se de casa arrendada.
6. O critério da «necessidade de um dos cônjuges» só poderá ser densificado se aferido em função dos concretos rendimentos e encargos de ambos os cônjuges, de modo a ajuizar qual deles se encontra numa situação mais desfavorável, isto é, qual deles tem maior premência da necessidade da casa.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: I. Relatório.

V, casado, residente na Estrada (…), ..., instaurou ação de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges contra sua esposa C, residente no mesmo local, pedindo a dissolução do seu casamento.
A Ré, na contestação, deduziu pedido reconvencional, pedindo igualmente que seja decretado o divórcio e peticionou que lhe seja atribuída a casa de morada de família até à partilha, alegando que, e em síntese, a casa onde habita é propriedade do casal, o Autor apenas a habita esporadicamente, é visto na companhia de uma mulher grávida e está impedido de frequentar a casa por lhe ter sido aplicada medida de coação de afastamento da casa de morada de família, não tem para onde ir e pretende ficar a residir na casa até à partilha, não tendo rendimentos fixos.
Respondeu o Autor, alegando que só deixou de residir na casa desde 18/10/2010 na sequência de medida de coação que lhe foi aplicada em processo crime, pelo que teve que ir viver para casa de seus pais, onde vive com uma companheira, em união de fato, a qual está grávida, o que revela a necessidade de viver na casa de morada de família e tem vontade de aí voltar, concluindo pedindo que lhe seja a ele atribuída a casa de morada de família, nos termos do art.º 1407.º/7 do C. P. Civil.
Produzida a prova indicada, foi, por despacho proferido em 28 de fevereiro de 2012, e ao abrigo do disposto no art.º 1407.º/7 do C. P. Civil, decidido atribuir provisoriamente e até ao trânsito em julgado do processo de divórcio a casa de morada de família à requerida C.

Desta decisão veio o Autor interpor o presente recurso, apresentando as seguintes conclusões:
I – Casal sem filhos, recorrente e recorrida, com o casamento, estabeleceram morada (…), ....
II – E fizeram-no em prédio que é propriedade apenas do marido, recorrente.
III – A matéria de facto aceite pelo despacho recorrido estabelece que recorrente e recorrida têm o mesmo ou equivalente estatuto socioeconómico, de autonomia de rendimentos, iniciativa e mobilidade societal.
IV – Foi com base nesta equivalência que o despacho recorrido atribuiu provisoriamente a morada, naquela casa, à recorrida, por motivo de mera continuidade.
V – Este motivo, contudo, não confere com um proporcionado recuo do direito fundamental de propriedade, em direção a uma convergência prática com outro direito fundamental que seja da recorrida.
VI – É que, tratando-se de um casal sem filhos, pode inclusivamente defender-se que, em concreto, nem sequer está preenchido o conceito de casa de morada de família, enquanto as proteções constitucionais familiares, invocadas e reconhecidas à recorrida, correspondem, neste caso, a meras proteções fracas (no sentido de não necessitarem de providencias de defesa, emergentes), no confronto com a proteção forte da propriedade que, como direito de base social, mantém uma eficiência abstrata, indemne ao recuo proposto no despacho recorrido.
VII – Logo, o despacho recorrido, ao atribuir a casa dita de morada de família à recorrida, infringiu o disposto nos art.ºs 18.º/3-62.º/1 CRP e, no seguimento, o art.º 1407.º/7 CPC.
VIII – Deve, portanto, ser revogado e substituído por outro, precisamente em sentido contrário.
IX – Uma interpretação do art.º 1407.º/7 CPC, no sentido de possibilitar, contra o direito fundamental de propriedade e seus corolários, a atribuição da casa, propriedade do marido, à mulher desavinda sem filhos e inserida social e economicamente no mesmo nível que o divorciando, torna a norma que daquela disposição legal se extrai contrária à Constituição, justamente por se opor à prevalência do direito fundamental conferido no art.º 62.º/1 CRP: fica a alegação para efeitos de prevenir recurso de (in)constitucionalidade.
X – Em todo o caso, encarada como questão prévia, foi cometida a nulidade de processo de que o despacho recorrido depende necessariamente, de não ter sido documentada a prova por depoimentos que serviu aos motivos da decisão.
XI – Nulidade que o recorrente ancora no perfil oficioso do incidente ou, se quisermos, da decisão cautelar culminada no despacho recorrido, a qual, por assim ser de ofício, exclui a aplicabilidade intercalar das regras processuais (art.º 304.º/3 ou art.º 384.º/3 CPC) de exigência de requerimento de parte para a gravação das inquirições e impõe a hegemonia do primeiro segmento do art.º 205.º/1 CRP, associado ao corolário principal e constitucional dele decorrente de uma motivação judicial sustentável.
XII – Declarada, porém, esta nulidade, a decisão de 1.ª Instância deverá ser no sentido da repetição, agora documentados, dos depoimentos oferecidos ao despacho recorrido.
XIII – Entretanto, um entendimento dos art.ºs 304.º/3 e 384.º/3 CPC como de aplicação ao caso, torna a norma negativa que se extrai do segmento regulatório processual em causa contrária, pois, ao art.º 205.º/1 CRP, inconstitucionalidade que se arguiu para efeitos de recurso, também.
XIV – Sem conceder, o recorrente argui, ainda assim, a nulidade do despacho recorrido por carência de fundamentação, porque neste domínio não apresenta, no âmbito e alcance da fixação da matéria de factos provada e não provada, um discurso ancorado em pontos que sejam retirados dos documentos e dos depoimentos citados, sem especificação de nenhum, e que conduzam ou pudessem conduzir-se num raciocínio lógico e demonstrativo do processo mental do que foi julgado assente.
XV – Um entendimento normativo que descanse na mera indicação dos meios de prova, sem crítica de qualquer conteúdo especificado recolhido, a afirmação do cumprimento da exigência constitucional do art.º 205.º/1 CRP, torna a norma retirada do art.º 158.º/1 CPC contrária ao ordenamento fundador: segue a conclusão para efeitos de recurso para o Tribunal Constitucional.

A Ré não contra-alegou.

O recurso foi admitido como sendo de apelação, a subir em separado, imediatamente e com efeito devolutivo (fls. 816).
Colhidos os vistos, e nada obstando ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.

II – Âmbito do Recurso.
Perante o teor das conclusões formuladas pelo recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso - arts. 660º, nº2, 661º, 672º, 684º, nº3, 685º-A, nº1, todos do C. P. Civil, constata-se que as questões a resolver são as seguintes:
a) Nulidade processual decorrente da não documentação da prova produzida;
b) Nulidade da decisão por falta de fundamentação da matéria de facto.
c) Direito à atribuição da casa de morada de família.

IIIFundamentação.
1. Matéria de facto.
A decisão recorrida considerou a seguinte factualidade:
1. V e C habitaram, até maio de 2009, a moradia sita na Estrada (…), ....
2. V e C contraíram casamento em 18 de novembro de 2007 sem convenção antenupcial.
3. Requerente e Requerida não partilham, desde a data mencionado em 1., leito, mesa e habitação.
4. O Requerente habita com os seus pais, na casa destes, aí pernoitando e fazendo refeições.
5. Com o Requerente habitam ainda a casa referida no número anterior, a sua companheira e a filha de ambos.
6. A habitação dos pais do Requerente tem três quartos, duas casas de banho, uma sala e uma cozinha.
7. A Requerida habita a casa mencionada e descrita em 1, aí pernoitando e aí tomando as suas refeições.
8. Nenhuma das partes dispõe de qualquer outra habitação própria ou arrendada.
9. O requerente exerce a atividade profissional de técnico agrícola.
10. A Requerida exerce a sua atividade profissional na R....

Nos termos do art.º 659.º/3 aplicável ex vi art.º 713.º/2 do C. P. Civil, acrescenta-se a seguinte factualidade:
11. Por despacho proferido em 18/10/2010, pelo Juiz de Instrução, no âmbito do processo 136/10/0GBBNV, do 1.º juízo criminal do Tribunal de Vila Franca de Xira, foi o apelante sujeito à medida de coação de não permanecer na residência onde habita a vítima C e de não contatar com esta por qualquer meio ( fls. 258 a 271).
12. Por Acórdão proferido em 23/11/2011, pela 3.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, foi mantida a decisão proferida na 1.ª instância que condenou o apelante, no âmbito do processo 198/09.2GBBNV.L1, como autor material de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo art.º 152.º/1, al. a) do C. Penal, na pena de um ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano, sujeita a regime de prova (fls. 463 a 486).

2. O Direito.
2.1. Nulidade processual decorrente da não documentação da prova testemunhal.
Sustenta o apelante, como questão prévia, ter sido cometida a nulidade de processo de que o despacho recorrido depende necessariamente, de não ter sido documentada a prova por depoimentos que serviu aos motivos da decisão, não sendo exigível requerimento da parte para a gravação das inquirições, nos termos dos art.ºs 304.º/3 ou art.º 384.º/3 CPC, face ao perfil oficioso do incidente.
Pretende que seja declarada esta nulidade, pelo que a decisão de 1.ª Instância deverá ser no sentido da repetição, agora documentados, dos depoimentos oferecidos ao despacho recorrido.
Vejamos se lhe assiste razão.
No caso concreto, foram arroladas testemunhas pelas partes, quanto ao incidente, e após a respetiva instrução, com inquirição das testemunhas indicadas, cujos depoimentos não foram gravados ou registados em ata, foi proferida a decisão.
No âmbito do processo de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges, estabelece o nº 7 do artigo 1407.º do C. P. Civil que “Em qualquer altura do processo, o juiz, por iniciativa própria ou a requerimento de alguma das partes, e se o considerar conveniente, poderá fixar um regime provisório (...) quanto à utilização da casa demorada da família; para tanto poderá o juiz, previamente, ordenar a realização das diligências que considerar necessárias”.
E prescreve o seu n.º2 que “Estando presentes ambas as partes e não sendo possível a sua conciliação, e não tendo resultado a tentativa do juiz no sentido de obter o acordo dos cônjuges para o divórcio ou a separação por mútuo consentimento, procurará o juiz obter o acordo dos cônjuges quanto (…) à utilização da casa de morada de família durante o período de pendência do processo, se for caso disso.
Assim, e mesmo que não consiga o consenso nessa questão, nada impede que o juiz, nessa altura ou em qualquer outra fase do processo, por sua iniciativa, ou por requerimento de uma das partes, e desde que o considere conveniente, fixe um regime provisório quanto à utilização da casa de morada de família, podendo, previamente, ordenar a realização das diligências que considere necessárias.
Trata-se, pois, de um regime meramente provisório (como decorre expressamente da parte final do n.º2 do art.º 1407.º), vigorando apenas durante a pendência do processo de divórcio, sendo que a sua atribuição definitiva só poderá suceder após o trânsito em julgado da decisão que decrete o divórcio, ao abrigo do regime previsto no art.º 1413.º do C. P. Civil.
A fixação do regime provisório ao abrigo dessa disposição legal configura um verdadeiro incidente, com processo especialíssimo, norteado por critérios de conveniência e assume natureza de providência cautelar específica ou especialíssima, no dizer dos Acs. do STJ, de 5/11/97, BMJ 471.º-298 e de 20/10/2005, www.dgsi.pt/jstj, destinadando-se a vigorar na pendência da ação de divórcio ([1]).
Portanto são questões diferentes: a da atribuição provisória da casa de morada de família durante o período da pendência do processo de divórcio (art. 1407.º, nºs 2 e 7, do C. P. Civil) e a atribuição depois do divórcio, esta regulada no art. 1793.º, do C. Civil, caso se trate de casa própria de um ou de ambos os cônjuges, e o art.º 1105.º/2 do C. Civil, tratando-se de casa arrendada.
Neste particular, o regime fixado tem natureza provisória, vigorando apenas durante a pendência da ação de divórcio, pelo que transitada em julgado a decisão que decretou, ou negou, o divórcio, caduca essa providência, devendo então lançar-se mão dos meios processuais adequados para a resolução definitiva dessa questão.
E tem sido unânime o entendimento de que a decisão a proferir sobre essa questão não está sujeita a critérios de legalidade estrita, mas a critérios de conveniência e oportunidade, observando-se as regras processuais previstas nos art.ºs  302.º a 304.º e 1409.º a 1411.º do C. P. Civil, podendo o tribunal investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes, só sendo admissíveis as provas que o juiz considere necessárias ([2]) .
Trata-se de um poder discricionário atribuído ao juiz quanto à sua eventual iniciativa, já não quando lhe for requerido pelas partes, devendo no incidente seguir-se a orientação equitativa dos processos de jurisdição voluntária.
Assim, competia às partes requerer, com o requerimento em que formularam o pedido de atribuição da casa de morada de família, a gravação dos depoimentos das testemunhas inquiridas, nos precisos termos do art.º 304.º/3 do C. P. Civil.
E a verdade é que nem o apelante, nem a apelada, solicitaram essa gravação, como se pode ver dos seus articulados de fls. 55 e 56 (quanto à Ré) e de fls. 80 a 82 ( no que respeita ao Autor).
E igualmente o não requereram no início dessas inquirições, como se constata da ata de fls. 508.
Donde, se o apelante entendia que o tribunal decidiu, ex officio, do incidente, o que afasta as regras processuais referidas, em particular o momento processual para requerer essa gravação (art.º 304.º/3 do C. P. Civil), então deveria ter requerido a gravação dos depoimentos no início (antes) da inquirição das testemunhas.
Decorrentemente, e porque não se tratou de decisão por iniciativa do juiz, mas porque lhe foi peticionado pela Ré e Autor, e não tendo as partes requerido a gravação desses depoimentos, é manifesta a falta de razão do apelante.
Mas ainda que assim não fosse, isto é, a ser cometida tal nulidade processual, e não estando ela coberta por despacho judicial, a verdade é que “contra as nulidades reclama-se e dos despachos recorre-se”, como ensina A. dos Reis, Comentário C. P. Civil, 2.º, pág. 507, tendo presente o disposto no art.º 201.º e 205.º do C. P. Civil.
Dai não poder tal “nulidade” processual ser invocada no presente recurso, mas apenas as eventuais nulidades da decisão (art.º 668.º do C. P. Civil).
Improcede, pois, este fundamento.

2.2. Nulidade da decisão por falta de fundamentação da matéria de facto.
Defende o apelante a “nulidade do despacho recorrido por carência de fundamentação, porque neste domínio não apresenta, no âmbito e alcance da fixação da matéria de facto provada e não provada, um discurso ancorado em pontos que sejam retirados dos documentos e dos depoimentos citados, sem especificação de nenhum, e que conduzam ou pudessem conduzir-se num raciocínio lógico e demonstrativo do processo mental do que foi julgado assente”.
Imputa, pois, a invocada nulidade, por não terem sido devidamente esclarecidas as razões que levaram a 1.ª instância a alicerçar a sua convicção na matéria de facto.
Vejamos, pois, se lhe assiste razão.
Previamente, convém esclarecer não estar em causa a nulidade da sentença, nos termos do art.º 668º, n.º 1, alínea b), do C. P. Civil, ao prescrever que a sentença é nula quandonão especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”, sendo unânime o entendimento de que a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, mas apenas a falta absoluta de fundamentação, ocorrendo este vício quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido, mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão, violando o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art. 208º, n.º 1, C. R. P. e art. 158º, n.º 1, do C. P. Civil) ( [3]).
E o dever de fundamentação da sentença não se confunde com o dever de motivação da decisão quanto à matéria de facto, referida no art.º 653.º/2 do C. P. Civil, e cuja inobservância é posta em causa pelo recorrente.
De acordo com esta disposição legal, em sede de julgamento de matéria de facto, trata-se de proceder à análise crítica das provas, esclarecendo – por especificação – os fundamentos decisivos para a convicção do julgador.
Com efeito, estabelece o n.º2, do art.º 652.º, do C. P. Civil, que o tribunal declarará quais os factos que julga provados e quais os que não julga provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convição do julgador.
Como realça o Prof. Antunes Varela, in “Manual de Processo Civil”, 2.ª Edição, pág. 653-655), “além do mínimo traduzido na menção especificada (relativamente a cada facto provado) dos meios concretos de prova geradores da convicção do julgador, deve este ainda para plena consecução do fim almejado pela lei referir, na medida do possível, as razões de credibilidade ou da força decisiva reconhecida a esses meios de prova”. E acrescenta que os objetivos da motivação requerem “ a identificação precisa dos meios probatórios concretos em que se alicerçou a convicção do julgador”, e alerta para a necessidade da “menção das razões justificativas da opção feita pelo julgador entre os meios probatórios de sinal oposto relativos ao mesmo facto”.
Neste sentido se escreveu no Acórdão do S. T. J. de 10/07/2008, Proc. n.º 08A2179, “(…dir-se-á que da motivação deve constar o elenco da prova geradora da resposta acompanhado de uma sucinta explicação justificativa da sua aceitação, não tendo de, como explicação, se verterem motivos psicológicos causais da convicção alcançada por se situarem na intimidade de processo insindicável por natureza) mais não havendo que explicar às partes”.
E refere igualmente Lebre de Freitas que a “fundamentação exerce, pois, a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior na transparência da justiça inerente ao ato jurisdicional” – A Ação Declarativa Comum, pág. 281.
Segundo Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2.ª Edição, pág. 348, “ o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica, e da experiência, se possa controlar razoabilidade daquela convição sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convição do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente”.
A este propósito escreve Lopes do Rego, “Comentários ao Código de Processo Civil”, pág. 434: “Opta-se claramente por uma maior exigência do dever de motivação da decisão proferida acerca da matéria de facto - relativamente ao que a jurisprudência dominante vinha entendendo, na redação do preceito anterior à reforma - não bastando a simples indicação dos concretos meios de prova que o julgador teve em conta para formar a sua convicção: a fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, provada e não provada, deverá fazer-se por indicação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do juiz, o que compreenderá não só a especificação dos concretos meios de prova, mas também a enunciação das razões ou motivos substanciais por que eles relevaram ou obtiveram credibilidade no espírito do julgador - só assim se realizando verdadeiramente uma "análise crítica das provas".
Tal circunstância determinou a alteração do preceituado no n.º 5 do art. 712.º do CPC, podendo ter lugar a remessa do processo à 1.ª instância para fundamentação da decisão proferida sobre a matéria de facto sempre que ela se não mostre "devidamente fundamentada” (e não apenas quando omita a menção dos concretos meios de prova que a suportaram) ([4]).
Assim, no que respeita á fundamentação da decisão da matéria de facto, deve o tribunal indicar os fundamentos que foram decisivos para a convição do juiz, indicando os concretos meios de prova e declarar porque razão, sem perda da liberdade de julgamento garantida pela manutenção do princípio da livre apreciação das provas (art.º 655.º), deu mais credibilidade a uns depoimentos e não a outros.
Sobre esta questão o senhor juiz justificou a sua convição apenas na indicação genérica da prova produzida, não identificando os concretos meios de prova e não enunciando as razões ou motivos substanciais por que eles relevaram ou obtiveram credibilidade no espírito do julgador.
Na verdade, consta apenas da decisão, sob a epígrafe “ Motivação da matéria de facto”, o seguinte:
Baseou-se em toda a prova documental junta nos autos, maxime na no assento de nascimento de fls. 17 dos autos.
Teve ainda em conta toda a prova testemunhal produzida em julgamento e de onde se extraiu, sumariamente, que é a requerida que, neste momento se encontra a residir na casa referida…, mais resultando que nenhuma das partes tem outra casa própria onde possa residir, não obstante o requerente se encontrar a residir em casa de familiares.
Foi ainda com base em toda a prova testemunhal que sumariamente se deu como provada a descrição da habitação da casa onde o requerente ora habita e das atividades profissionais de ambas as partes.
Não obstante as testemunhas do requerente alegarem que a requerida não reside na habitação…, tendo inclusive junto fotografias aos autos, tal facto não se verifica, pois todas as testemunhas arroladas pela requerente afirmaram, de forma credível, que C pernoita e faz refeições nessa habitação…”
Ora, impondo a lei (art.ºs 304.º/5, 653.º/2, 1409.º a 1411.º do C. P. Civil) que o juiz proceda a uma análise critica das provas produzidas e que especifique os fundamentos que foram decisivos para a formação da sua convição, temos por assente não bastar apenas a indicação genérica dos meios de prova (no caso, testemunhal e documental), sem qualquer referência às razões de ciência invocadas pelas testemunhas ou sem qualquer explicitação dos reais motivos que levaram o tribunal a atribuir credibilidade a uns depoimentos e não a outros.
Cremos, pois, não estar minimamente cumprida a exigência legal de motivação, tendo em conta os factos apurados e descritos da decisão recorrida, sendo omissa quanto aos concretos meios de prova, não sendo suficiente dizer-se “ tendo em conta toda a prova testemunhal produzida”, bem como “toda a prova documental junta nos autos”, não se explicitando as razões de ciência e de credibilidade das concretas testemunhas.
E essa exigência impunha-se com particular acuidade, já que os depoimentos das testemunhas não foram gravados ou registados, pelo do processo não constam todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto, o que inviabiliza a sua reapreciação, ao abrigo do disposto no art.º 712.º/1, al. a) do C. P. Civil.
Para a resolução desta questão a lei permite a devolução dos autos ao Tribunal a quo para que dê cumprimento ao estabelecido no art.º 712.º/5 do C. P. Civil, que, no caso concreto, atenta a falta de gravação ou registo dos depoimentos, terá de implicar a repetição da prova testemunhal.
2.2.1. Acresce que sempre o processo haveria de baixar à 1.ª instância, para ampliação da matéria de facto, nos termos do n.º4 do citado art.º 712.º, por não constarem do processo todos os elementos probatórios previstos nos termos da alínea a) do seu n.º1.
Na realidade, e como se deixou dito no ponto 2.1, a atribuição provisória da casa de morada de família durante o período da pendência do processo de divórcio (art. 1407.º, nºs 2 e 7, do C. P. Civil) não se confunde com a sua atribuição depois do divórcio e regulada no art. 1793.º, do C. Civil, caso se trate de casa própria de um ou de ambos os cônjuges, ou o art.º 1105.º, n.º2, do C. Civil, no caso de a casa ser arrendada.
Como refere Nuno Salter Cid, in “A Proteção da Casa de Morada de Família no Direito Português,  pág. 287) “ A lei que uma vez mais parece partir da ideia de que a casa de morada de família é um imóvel, prevê, em qualquer caso, três hipóteses: a de a casa ser bem próprio de um dos cônjuges ou bem comum do casal (art. 1793 e 2103-A, CC) e a de a casa ser objeto de arrendamento urbano para habitação (art. 84 e 85 RAU)”.
Ora, a decisão provisória a proferir no incidente, previsto no n.º7 do citado art.º 1407 do C. P. Civil, não está sujeita a critérios de legalidade estrita, mas a critérios de conveniência e oportunidade, estando sujeita ao regime dos art.ºs 1409.º a 1411.º do C. P. Civil, pelo que o tribunal pode investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes e respeitando o princípio do contraditório.
E prescreve o n.º1 do art.º 1793.º do C. Civil que “pode o tribunal dar de arrendamento a qualquer dos cônjuges, a seu pedido, a casa de morada da família, quer esta seja comum quer própria do outro, considerando, nomeadamente, as necessidades de cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos do casal”.
E adianta o seu n.º2: “O arrendamento previsto no número anterior fica sujeito às regras do arrendamento para habitação, mas o tribunal pode definir as condições do contrato, ouvidos os cônjuges, e fazer caducar o arrendamento, a requerimento do senhorio, quando circunstâncias supervenientes o justifiquem”.
Consequentemente, o tribunal pode atribuir, a título de arrendamento, a casa de morada de família, segundo um regime próprio, quer ela seja bem comum do casal ou própria do outro cônjuge.
Como ensinam Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, Curso de Direito da Família, Vol. I, 3.ª Edição, pág. 720, esta solução foi introduzida no Código Civil pela Reforma de 1977, inserindo-se na proteção da casa de morada de família, e foi inspirada no direito francês.
E acrescenta: “Permitindo ao tribunal “expropriar” sem indemnização o uso da casa ao cônjuge a quem é imposto o arrendamento, o art.º 1793.º poderia julgar-se ferido de inconstitucionalidade; mas a lei terá sacrificado o direito de propriedade, constitucionalmente protegido (art.º 62.º da C. R. P.), ao interesse da família, igualmente objeto de proteção constitucional (art.º67.º da C. R. P).
Ora, não diz a lei que critérios devem orientar o juiz na fixação deste regime provisório, justificando-se, por isso, a aplicação dos critérios definidos para o regime definitivo, ou seja, os fixados no art.º 1793.º, no caso da casa pertencer a ambos os cônjuges ou a um deles, ou no art.º 1105.º, ambos do C. Civil, tratando-se de casa arrendada, pese embora “não deve ser desconsiderado o facto de se tratar de decisão provisória, que só valerá no período da pendência do processo” (cfr. Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, ob. cit. pág. 705).
Portanto, na atribuição provisória do uso da casa de morada de família deverá considerar-se “ as necessidades dos cônjuges” e o “interesse dos filhos”, entre outros fatores ou razões atendíveis, visto não serem taxativos os critérios aí elencados, atenta a expressão usada «nomeadamente» - art.º 1793.º/1 do C. Civil.
Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, ob. cit., pág.726, propondo-se encontrar, neste domínio um critério geral, referem, entre outras coisas, o seguinte:
«O objetivo da lei, ... não é o de castigar o culpado ou premiar o inocente, como não é o de manter na casa de morada de família, em qualquer caso, o cônjuge ou ex-cônjuge que aí tenha permanecido após a separação de facto, mas o de proteger o cônjuge ou ex-cônjuge que mais seria atingido pelo divórcio ou pela separação quanto à estabilidade da habitação familiar, cônjuge ou ex-cônjuge ao qual, porventura, os filhos tivessem ficado confiados. A necessidade da casa (ou a premência, como vem a dizer a jurisprudência; melhor se diria; a premência da necessidade) parece-nos ser, assim, o fator principal a atender (...)

Na avaliação da premência da necessidade da casa deve o tribunal ter em conta, em primeiro lugar, justamente estes dois elementos ... Trata-se, quanto à situação patrimonial dos cônjuges ou ex-cônjuges, de saber quais são os rendimentos e proventos de um e outro, uma vez decretado o divórcio ou a separação judicial de pessoas e bens, assim como os respetivos encargos; no que se refere ao “interesse dos filhos” há que saber a qual dos cônjuges ou ex-cônjuges ficou a pertencer a guarda dos filhos menores ... e se é do interesse dos filhos viverem na casa que foi do casal com o progenitor a quem foram confiados. Mas o juízo sobre a necessidade ou premência da necessidade da casa não depende apenas destes dois elementos. Haverá que considerar ainda as demais “razões atendíveis”: a idade e o estado de saúde dos cônjuges ou ex-cônjuges, a localização da casa relativamente ao local de trabalho de um e de outro, o facto de algum deles dispor eventualmente de outra casa em que possa estabelecer a sua residência etc.
Quando possa concluir-se, em face destes elementos, que a necessidade ou a premência da necessidade de um dos cônjuges é consideravelmente superior à do outro, julgamos que o tribunal deve atribuir o direito ... àquele que mais precise dela... Só quando as necessidades de ambos os cônjuges ou ex-cônjuges forem iguais ou sensivelmente iguais haverá lugar para considerar a “culpa” que possa ser ou tenha efetivamente sido imputada a um ou outro na sentença de divórcio ...»
E quanto à fixação do valor da renda, “atendendo aos fatores referidos, não deve andar “muito longe do valor da renda condicionada” (cfr. Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, ob. cit. pág. 721).
Assim, o cônjuge interessado a quem a casa é atribuída passa a ser arrendatário, passando a pagar o montante da renda ao seu cônjuge, se se estiver perante casa própria deste, ou metade da renda, se estivermos perante casa que é bem comum do casal.
E tal regime é aplicável mesmo quando a sua atribuição tem natureza provisória, ao abrigo do citado n.º 7, do art.º 1407.º , do C. P. Civil.
Como se entendeu no Acórdão do S. T. J., de 26/4/2012, Proc. n.º 33/08.9TMBRG.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt, “(… crê-se ter cabimento que aquele que da sua “quota-parte” não usufrui, tenha também direito a um gozo indireto, que consistirá em perceber, tal como se locação houvesse, compensação pelo valor do uso de tal “quota-parte”. E acrescenta, “não havendo, de qualquer modo, que fixar a compensação devida pelos valores do mercado, desconsiderando a situação económica do cônjuge que da casa mais necessitar. Assim inviabilizando os objetivos da lei”.
Aliás, não faria qualquer sentido que sendo esse manifestamente o regime legal para a atribuição definitiva da casa de morada de família, no âmbito do processo regulado no art.º 1413.º do C. P. Civil, não houvesse lugar a qualquer compensação para o regime provisório, ao abrigo do incidente previsto no n.º 7, do art.º 1407.º, do mesmo código, sendo certo que essa provisoriedade pode até prolongar-se por longos períodos.
E dois são os critérios essenciais para a atribuição da casa de morada de família: as necessidades da casa por um dos cônjuges;  e o interesse dos filhos. Depois, haverá que recorrer a outros citérios, em caso de dúvida ou em situação de igualdade entre os cônjuges.
Ora, no caso concreto, na decisão recorrida considerou-se:
Estamos perante uma decisão provisória, distinta porém do regime das providências cautelares, em que se pretende assegurar o destino a dar à casa de morada de família até ao trânsito em julgado da decisão final, sendo, portanto, uma decisão com efeitos meramente intra processuais, sem qualquer alcance fora do  âmbito dos presentes autos.

Concretizando e atenta a factualidade sumariamente elencada como provada, releva desde logo o facto de não existirem filhos comuns do casal. Se é certo que resultou provado que o requerente tem uma filha menor, e decisão alguma do Tribunal colocará em causa a educação e o crescimento da menor (independentemente da sua filiação), o facto de as partes não terem filhos comuns implica uma maior valoração de outros critérios para tomada da decisão.
Destarte, entende o Tribunal que as partes se encontram numa situação patrimonial semelhante, dado que não resultou indiciado que qualquer um possua outra habitação própria onde possa residir em permanência, não obstante o Requerente estar a residir, de momento, em casa de familiares.
A nível profissional, atenta a factualidade supra descrita, entende o Tribunal que não resulta assente qualquer desequilíbrio entre os cônjuges que possa, sem mais, implicar, por motivos de carência económica, a necessidade perene de utilização da casa de morada de família.
Neste cenário, de paridade a nível de condições sociais e económicas, entende o Tribunal que face à jaez provisória e limitada da presente decisão, alterar o atual estado de coisas não se justifica nem tem cabimento fáctico ou legal. Com efeito, nenhum dos cônjuges apresenta qualquer necessidade especial de sustento económico, nem nenhum dos cônjuges apresenta carências que, por si, justifiquem a atribuição nestes autos, da casa de morada de família”.
Assim, a 1.ª instância considerou que a nível profissional não resulta qualquer desequilíbrio entre os cônjuges que por motivos de carência económica justifiquem a necessidade perene de utilização da casa de morada de família.
E finaliza : “Neste cenário, de paridade a nível de condições sociais e económicas, entende o Tribunal que face à jaez provisória e limitada da presente decisão, alterar o atual estado de coisas não se justifica nem tem cabimento fáctico ou legal. Com efeito, nenhum dos cônjuges apresenta qualquer necessidade especial de sustento económico, nem nenhum dos cônjuges apresenta carências que, por si, justifiquem a atribuição nestes autos, da casa de morada de família”.
Porém, não se pode afirmar existir paridade ao nível  de condições sociais e económicas, porque os factos apurados seguramente o não permitem, ignorando-se, como se ignoram, quais os concretos proventos do Autor e da Ré, bem como os seus encargos pessoais e familiares, ou seja, não está demonstrada a verdadeira situação económica e social das partes que suporte essa afirmação.
E o critério da «necessidade de um dos cônjuges» só poderá ser densificado se aferido em função dos rendimentos e encargos de ambos, para se poder concluir que a Ré se encontra numa situação bem mais desfavorável que o Autor, ou seja, de modo a detetar qual deles tem maior premência da necessidade da casa, e sendo certo que ambos os cônjuges ( Autor e Ré) formularam o pedido de atribuição da casa de morada de família, bem como da eventual compensação a fixar e respetivo valor.
E compete ao cônjuge que pretende que lhe seja atribuída a casa de morada de família alegar e provar que necessita mais que o outro da referida casa sendo que a necessidade da habitação é uma necessidade atual e concreta (e não eventual ou futura), a apurar segundo a apreciação global das circunstâncias particulares de cada caso – cfr. Ac. desta Relação de 24/6/2010, Proc. n.º 461/09.2TBAMD.L1-6, www.dgsi.pt.
Por outro lado, ignora-se igualmente a quem pertence a casa de morada de família, nomeadamente se é bem comum ou pertença apenas de um deles, ou se é arrendada, elemento factual relevante a para a decisão a proferir, tendo presente o regime jurídico aplicável (art.º 1793.º ou 1105.º, respetivamente do C. Civil), invocando o apelante lhe pertencer na totalidade e referenciando um documento que o comprova, mas que não foi junto no presente  recurso, e alegando a Ré tratar-se de um bem comum.
Em resumo, haverá que ampliar a matéria de facto de modo a apurar-se a concreta situação económica e social do Autor e da Ré – seus rendimentos, encargos pessoais e familiares -, bem como da titularidade  da casa de morada de família, elementos que o tribunal pode ( e deve) obter, realizando as diligencias necessárias e adequadas para o efeito.
Pelo exposto, e face ao que se dispõe nos n.ºs 4 e 5 do art.º 712.º do C. P. Civil, importa anular o julgamento para que seja repetida a prova testemunhal produzida, e cumprida a exigência legal de fundamentação nos sobreditos termos, devendo ainda ampliar-se a matéria de facto, apurando-se a supra identificada factualidade (situação económica e social do Autor e da Ré – seus rendimentos, encargos pessoais e familiares -, bem como da titularidade da casa de morada de família), devendo o Mm.º Juiz a quo realizar as diligências oficiosas que entenda conveniente para o efeito, designadamente convidando as partes a juntarem documentos que entenda necessários.
Fica, assim, prejudicada a resposta à terceira questão colocada.
Considerando o disposto no art.º 446.º n.º 1 e 2, do C. P. Civil, a responsabilidade pelas custas recai sobre a recorrida, atento o decaimento.
(…)
IV. Decisão.
Em consequência, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação e anular o julgamento, devendo ser repetida a prova testemunhal e ampliada a matéria de facto nos termos referidos.
Custas da apelação pela recorrida.

Lisboa, 2013/01/31

Tomé Ramião
Vítor Amaral
Fernanda Isabel Pereira
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([1]) No mesmo sentido o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15/9/2001, Col. Jur. T-V, pág. 90; Acórdão do S. T. J. de 26/04/2012, Proc. n.º 33/08.9TMBRG.G1.S1, in www.dgsi.pt; e Tomé d’Almeida Ramião, Divórcio e Questões Conexas, Regime Jurídico Atual, 3.ª edição, Quid Júris, pág. 84.
([2]) Neste sentido, entre outros, Acs. do T. Rel. de Lisboa, de 29/9/1996, Col. Jur. IV, 144, e de 10/7/1997, Col. Jur. IV, 87; Ac. T. Rel. Porto, 28/6/1999, Col. Jur. III, 222; e Acórdão do S. T. J. de 26/04/2012, Proc. n.º 33/08.9TMBRG.G1.S1; e Tomé d’Almeida Ramião, ibidem.
([3]) Como ensina Teixeira de Sousa, in “Estudos sobre o Processo Civil”, pág. 221: “o dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível”.
Também Lebre de Freitas, in C. P. Civil, pág. 297, sublinha que  “há nulidade quando falte em absoluto indicação dos fundamentos de facto da decisão ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão, não a constituindo a mera deficiência de fundamentação”.
([4]) No mesmo sentido Abrantes Geraldes, “Recursos em Processo Civil”, Novo Regime, 3.ª Edição, págs 236-328).