Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
28760/13.1T2SNT-A.L1-8
Relator: MARIA DO CÉU SILVA
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
TRANSACÇÃO
PRAZO
INICIO DA CONTAGEM
CONTRADITÓRIO
FACTOS CONHECIDOS PELO EXERCÍCIO DE FUNÇÕES
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/18/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: 1 - Do art. 5º nº 2 do C.P.C. não resulta a necessidade de fazer cumprir o princípio do contraditório para os factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.
2 - Tendo o recorrente invocado, como fundamento para a interposição do recurso de revisão, a alínea d) do art. 696º do C.P.C., o prazo de 60 dias para a interposição do recurso conta-se desde o conhecimento do vício que serve de fundamento à nulidade ou anulabilidade da transação homologada pela sentença objeto do recurso.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa

No presente recurso de revisão interposto por A por apenso à ação de divisão de coisa comum que moveu contra B, o recorrente interpôs recurso da decisão pela qual foi julgado o recurso de revisão intempestivo e, em consequência, foi a R. absolvida do mesmo.
Na alegação de recurso, o recorrente pediu que seja revogada a decisão recorrida e ordenado o prosseguimento dos autos, tendo formulado as seguintes conclusões:
«1.ª A lide assenta num recurso de revisão de sentença, de um processo conduzido sem o devido conhecimento da sua tramitação por parte do recorrente, estando agora em crise a extemporaneidade do requerimento de recurso de revisão.
2.ª Por relação com a sentença do processo em recurso em recurso de revisão, a sentença recorrida considerou provado na alínea f) dos factos provados, segundo a qual «A sentença mencionada supra foi notificada ao Ilustre Patrono do Recorrente em 18 de Julho de 2016», data em que o recorrente tomou por aquele intermédio teria tido conhecimento da mesma, logo, hodiernamente encontra-se decorrido o período de sessenta dias para a sua revisão.
3.ª Sucede que o indicado facto não foi alegado e por conseguinte discutido nos autos, nem sobre o mesmo o recorrente foi convidado a pronunciar-se.
4.ª E tendo ademais a douta decisão recorrida assentado essencialmente nessa circunstância de facto, não alegada e não discutida pelas partes, a sentença recorrida constitui uma decisão surpresa, violadora do art.º 3.º n.º 3 do CPC, enferma de vício por ausência de contraditório e, por influir de modo patente na decisão da causa, é nula, o que expressamente se invoca de harmonia e com os efeitos regulados no art.º 195.º do mesmo compêndio processual.
5.ª Sobressai da redação daquela al. f) e, corretamente, que o recorrente nunca foi notificado da sentença do processo em revisão.
6.ª O art.º 249.º n.º 5 do CPC determina que “As decisões finais são sempre notificadas desde que a residência ou sede da parte seja conhecida no processo.”
7.ª Redação instituída pelo art.º 255.º n.º 4 do Dec. Lei 329-A/1995 de 12/12, que alterou a norma do regime do CPC anterior, regulada no Dec. Lei 242/85 de 09.07, que no seu art.º 255.º, dispunha, “Se a parte não tiver constituído mandatário, as notificações ser-lhe--ão feitas nos termos estabelecidos para as notificações aos mandatários.”
8.ª A nova redação, hoje ainda cogente, teve precisamente por escopo, deixar de distinguir a parte que constituiu ou não mandatário.
9.ª Em qualquer dos casos, a parte tem de ser notificada pessoalmente das decisões finais, conquanto tenha morada identificada e conhecida nos autos, como era o caso.
10.ª Ao recorrente assistia por direito, por imperativo legal e acertada leitura do art.º 249.º n.º 5 do CPC, a ser notificado da decisão final no âmbito da ação em recurso de revisão, o que não aconteceu, impedindo-se deste modo o cômputo inicial do prazo de sessenta dias para o recurso de revisão.
11.ª Acresce que o recorrente não constituíra mandatário, sendo representado por defensora oficiosa.
12.ª O patrocínio oficioso não se confunde com o contrato de mandato e a representação por mandatário, porquanto o representado/patrocinado, não intervém na escolha, limita-se a ser informado da nomeação, não se estabelecendo uma relação pessoal e estruturada de confiança e de garantias.
13.ª Desta feita, a decisão final da ação em recurso de revisão, com razões reforçadas, tinha sempre de ser-lhe notificada, atendendo à não constituição de mandatário e nos termos do art.º 249.º n.º 5 do CPC.
14.ª Por diferente entendimento e desfecho, a douta sentença recorrida, fez errada aplicação do art.º 247.º do CPC, descurou e violou o regime consagrado no art.º 249.º, n.º 5 do CPC, que determinava o dever de notificar pessoalmente a parte, no caso o recorrente, da sentença proferida no âmbito do processo objeto do recurso de revisão.»
A recorrida respondeu à alegação do recorrente, tendo formulado as seguintes conclusões:
«1. Nos presentes autos de recurso de revisão, o Recorrente vem apelar da douta sentença que julgou o “recurso intempestivo e absolveu a recorrida do mesmo”.
2. O Apelante insurge-se contra o facto de a matéria constante da alínea f) dos factos provados – “A sentença mencionada supra foi notificada ao ilustre Patrono do Recorrente em 18 de Julho de 2016” – não ter sido alegada.
3. Porém, a data em que o Patrono do Recorrente foi notificado da sentença consta dos autos a fls., não carecendo, por isso, de ser alegada (cfr. arts. 514º, nº. 2 e 515º do CPC), podendo o Tribunal conhecer de tal facto e de tomar em consideração a respectiva prova.
4. A questão da caducidade da acção por força do disposto no nº. 2 do artigo 697.º do CPC é, neste caso, de conhecimento oficioso, pelo que, o Mº. Juiz a quo poderia sempre conhecer da questão da caducidade do direito de acção, independentemente da invocação de tal excepção pela Recorrida.
5. No entanto, a referida excepção da caducidade foi suscitada pela Recorrida, na sua resposta ao requerimento de interposição da Revista, tendo o Recorrente sido convidado a pronunciar-se sobre a mesma, o que fez.
6. Logo, a excepção da intempestividade do recurso de Revisão foi debatida entre as partes.
7. Por outro lado, é certo que a douta sentença que homologou a transacção foi notificada ao Patrono do Recorrente em 18.07.2016, no entanto, o fundamento do recurso de Revisão é a alegada “… nulidade ou anulabilidade de… transação em que a decisão se fundou” (cfr. artigo 696º, al. d) do CPC) e desse facto – a transacção - tiveram conhecimento quer o Recorrente quer o seu Patrono no dia 23.05.2016.
8. Portanto, muito mais de 60 dias antes da propositura do recurso de revisão.
9. Sendo certo que, está provado nos autos que o requerimento transacional - apresentado nos autos em 25.05.2016 - foi efectivamente assinado pelo Recorrente.
10. Como ficou dito, da notificação da sentença homologatória da transacção não decorre qualquer efeito com relevância para a propositura do recurso de revisão.
11. O facto que releva e constitui fundamento da revisão é a alegada “nulidade ou anulabilidade da transacção” e tal vício, a existir, resultaria da própria transacção e não da sentença que a homologou.
12. É entendimento da jurisprudência dominante, e foi expressamente assumido na douta sentença recorrida, a equiparação do mandatário judicial stricto sensu ao patrono nomeado.
13. Durante a tramitação da acção de divisão de coisa comum, o Patrono do Recorrente manteve um contacto pessoal e directo com o mesmo, quer através dos articulados e requerimentos que subscreveu, quer pela presença nas diligências que ocorreram.
14. Contacto que era mais do que suficiente para assegurar a comunicação pelo Patrono ao Recorrente das notificações que ia recebendo.
15. Face ao exposto, a douta sentença recorrida não merece qualquer reparo, pois aplicou correctamente a lei aos factos provados, devendo, por isso, ser integralmente mantida.»
São as seguintes as questões a decidir:
- da nulidade da decisão recorrida; e
- da tempestividade do recurso de revisão.
*
Na decisão recorrida, foram dados como provados os seguintes factos:
«A. No mês de dezembro do ano 2013, o recorrente com benefício do apoio judiciário e representado por patrono oficioso, propôs contra a recorrida uma ação de divisão de coisa comum que correu termos nos autos principais acima identificados.
B. A lide teve por objeto a fração individualizada pela letra D, correspondente ao terceiro andar recuado, com terraço para a frente, sito na Rua…, descrito na Conservatória do Registo Predial de Agualva-Cacém sob o número… e inscrito na matriz predial urbana sob o art.º… e com o valor matricial de € 42.740,00.
C. Adquirida em conjunto pelas partes, com recurso a empréstimo bancário em nome de ambos.
D. Por requerimento de 12.12.2013 sob o documento número 6, juntou nos autos uma declaração notarialmente reconhecida justamente contendo essa sua especifica vontade, alhear-se de todos os direitos e obrigações que nesses termos transitariam com o imóvel para a requerida.
E. Naquela ação ou nos autos principais, proferido despacho que atestou a contitularidade do bem e a sua não divisibilidade, prosseguiu a matéria para conferência de interessados, agendada para o dia 15.04.2015.
F. Data em que a patrona do ali recorrente se fez representar por via de substabelecimento noutra ilustre advogada.
G. Nesta diligência, a única em que o recorrente esteve presente as partes manifestaram a possibilidade de ajustarem um acordo, mas, pela necessidade de intervenção concordante do banco credor, no sentido de desonerar o recorrente, requereram a suspensão da lide.
H. O requerimento foi deferido, com a menção da necessidade de notificação e intervenção do banco credor hipotecário.
I. E ficou determinada data para a sua continuação em 07.05.2015.
J. Em 04.05.2015, os patronos das partes e a mandatária do banco credor requereram conjuntamente uma nova suspensão da instância com fundamento na necessidade de o credor hipotecário avaliar o acordo.
K. Em 16.10.2015, foi junto novo requerimento dos patronos das partes e da mandatária do banco com igual teor, sempre a remeterem para a avaliação do credor hipotecário.
L. Em 24.03.2016, novo requerimento dos patronos das partes e da mandatária do banco, agora no sentido de informarem que a avaliação foi feita e aprovada pelo banco credor.
M. Mostra-se seguidamente atravessado no processo um requerimento com data de 25.05.2016.
N. Naquele o banco ou a sua mandatária não intervém, quando nos requerimentos antecedentes subscreveram acordos conjuntos e em especial no requerimento de 24.03.2016 em que indicavam uma avaliação e aprovação do banco.
O. Adjudicando àquela “Requerida” que seria então o ora recorrente, a propriedade plena do bem.
P. Atribuindo ao “Requerente” que será a aqui recorrida, a declaração de prescindir de qualquer tornas.
Q. Sem nada se dizer quanto a custas.
R. O recorrente manteve-se responsável pelo empréstimo.
Mais se provou que:
S. Por sentença proferida em 23 de Maio de 2016 consta “Atenta a natureza e objeto da transação, bem como a qualidade das partes, homologo por sentença a transação que antecede, adjudicando à requerida B o imóvel objeto dos presentes autos.
Custas a meias e em partes iguais, cfr. art. 537º, n.º 2 do C.P.C., sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido às partes.
Registe e notifique”.
T. A sentença mencionada supra foi notificada ao Ilustre Patrono do Recorrente em 18 de Julho de 2016.
U. O presente recurso de revisão deu entrada em juízo em 24 de Junho de 2021.»
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O recorrente arguiu a nulidade da decisão recorrida, invocando o art. 195º do C.P.C.
Nos termos do nº 1 do citado artigo, “a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa”.
“É postulado tradicional, que o próprio Supremo tem várias vezes proclamado: dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se (…). A reclamação por nulidade tem cabimento quando as partes ou os funcionários judiciais praticam ou omitem actos que a lei não admite ou prescreve; mas se a nulidade é consequência de decisão judicial, se é o tribunal que profere despacho ou acórdão com infracção de disposição de lei, a parte prejudicada não deve reagir mediante reclamação por nulidade, mas mediante interposição de recurso. É que, na hipótese, a nulidade está coberta por uma decisão judicial e o que importa é impugnar a decisão contrária à lei; ora as decisões impugnam-se por meio de recursos (…) e não por meio de arguição de nulidade de processo” (Alberto dos Reis, Código Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 424)
“O objecto do recurso é sempre uma decisão impugnada. Portanto, ou há vícios da própria decisão recorrida - hipótese em que o recurso é procedente - ou não há vícios da decisão impugnada - situação em que o recurso é improcedente. O tribunal de recurso não pode conhecer isoladamente de nulidades processuais, mas apenas de decisões que dispensam actos obrigatórios ou que impõem a realização de actos proibidos e das consequências noutras decisões da eventual ilegalidade da dispensa ou da realização do acto.
É, aliás, porque o objecto do recurso é sempre a decisão impugnada e porque o tribunal ad quem só pode conhecer desse objecto que se deve entender que uma decisão-surpresa é nula por excesso de pronúncia. A opção é a seguinte: ou se entende que a decisão-surpresa é nula - isto é, padece de um vício que se integra no objecto do recurso e de que o tribunal ad quem pode conhecer - ou se entende que não há uma nulidade da decisão, mas apenas uma nulidade processual - situação em que o tribunal ad quem de nada pode conhecer, porque, então, tudo o que conheça extravasa do objecto do recurso.” - Miguel Teixeira de Sousa, Blog do IPPC, 28/01/2019, Jurisprudência 2018 (163) acessível em https://blogippc.blogspot.com/2019/01/jurisprudencia-2018-163.html
O não ser proporcionada à parte a oportunidade de exercer o contraditório constitui uma nulidade processual que se comunica ao despacho recorrido, implicando a nulidade deste por excesso de pronúncia, nos termos do art. 615º nº 1 al. d) do CPC., dado que o tribunal recorrido se pronunciou sobre questão de que não podia conhecer antes de garantido o contraditório (www.dgsi.pt Acórdão do STJ proferido a 23 de junho de 2016, processo 1937/15.8T8BCL.S1).
Nos termos do art. 3º nº 3 do C.P.C., “o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.”
“O respeito pelo princípio do contraditório é postulado pelo direito a um processo equitativo, previsto no nº 4 do artigo 20º da CRP. Este princípio é hoje entendido como a garantia dada à parte, de participação efetiva na evolução da instância, tendo a possibilidade de influenciar todas as decisões e desenvolvimentos processuais com repercussões sobre o objeto da causa” (Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Os Artigos da Reforma, Volume I, anotação ao art. 3º).
“… a regra do contraditório deixa de estar exclusivamente associada ao direito de defesa, no sentido negativo de oposição à actuação processual da contraparte, para passar a significar um direito de participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo litígio, mediante a possibilidade de influírem em todos os elementos que se encontrem em ligação com o objecto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão” (Acórdão do Tribunal Constitucional 19/2010).
“A audição excepcional e complementar das partes, fora dos momentos processuais normalmente idóneos para produzir alegações de direito, só deverá ter lugar quando se trate de apreciar questões jurídicas susceptíveis de se repercutirem, de forma relevante e inovatória, no conteúdo da decisão e quando não for exigível que a parte interessada a houvesse perspectivado durante o processo, tomando oportunamente posição sobre ela” (Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. 1, 2ª edição, pág. 33).
Nas conclusões recursivas, pode ler-se:
“a sentença recorrida considerou provado na alínea f) dos factos provados, segundo a qual «A sentença mencionada supra foi notificada ao Ilustre Patrono do Recorrente em 18 de Julho de 2016»…
Sucede que o indicado facto não foi alegado e por conseguinte discutido nos autos, nem sobre o mesmo o recorrente foi convidado a pronunciar-se.”
Resulta do disposto no art. 412º nº 2 do C.P.C. que “não carecem de alegação os factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções”.
O art. 5º nº 2 do C.P.C. dispõe o seguinte:
“Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz:
a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa;
b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar;
c) Os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.”
Deste artigo não resulta a necessidade de fazer cumprir o princípio do contraditório para os factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.
Acresce dizer que, quando foi dada ao recorrente a possibilidade de se pronunciar sobre a questão da intempestividade do recurso de revisão suscitada pela recorrida, ele podia ter perspetivado que seriam considerados os factos com interesse para a decisão daquela questão que resultassem dos autos principais.
Se o tribunal recorrido considerou factos sem interesse para a decisão da questão da intempestividade do recurso de revisão porque interpretou e aplicou erradamente a lei, haverá erro de julgamento e não nulidade da decisão.
Assim, improcede a arguição da nulidade da decisão recorrida.
*
Como fundamento para a interposição do recurso de revisão, o recorrente invocou a alínea d) do art. 696º do C.P.C., segundo a qual “a decisão transitada em julgado… pode ser objeto de revisão quando se verifique nulidade ou anulabilidade de confissão, desistência ou transação em que a decisão se fundou”.
O art. 697º nº 2 do C.P.C. dispõe o seguinte:
“O recurso não pode ser interposto se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão, salvo se respeitar a direitos de personalidade, e o prazo para a interposição é de 60 dias, contados:
a) No caso da alínea a) do artigo 696.º, do trânsito em julgado da sentença em que se funda a revisão;
b) No caso das alíneas f) e h) do artigo 696.º, desde que a decisão em que se funda a revisão se tornou definitiva ou transitou em julgado;
c) Nos outros casos, desde que o recorrente obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão.”
“… como decorre da leitura de tal preceito legal, estabelece-se um primeiro prazo limite de 5 anos, contado da data em que transitou em julgado a sentença revidenda, que não pode, em caso algum, ser excedido - salvo tratando-se de matéria que diga respeito a direitos de personalidade -, funcionando depois dentro desse prazo um outro, mais curto, de 60 dias, cujo início de contagem, para a interposição do recurso, depende do fundamento invocado para a revisão da sentença.
Muito embora a lei não o diga expressamente, constitui entendimento pacífico que estamos perante prazos de caducidade, que são de conhecimento oficioso, o que, decorre, por um lado, da natureza indisponível do direito que se pretende exercitar e, por outro, do facto de o artº. 699, nº. 1, do CPC determinar a aplicação do artº. 641º, que incumbe ao juiz apreciar a oportunidade do requerimento de interposição do recurso” (www.dgsi.pt Acórdão do STJ proferido a 14 de julho de 2022, no processo 602/15.0T8AGH.L1-A.S1).
Na fundamentação da decisão recorrida, pode ler-se:
“do que resulta da matéria de facto considerada como provada é que o Recorrente foi notificado, através do seu Ilustre Patrono, no dia 18 de Julho de 2016.
Neste caso, há que salientar que, de acordo com o art. 247.º n.º 1 do Código de Processo Civil as notificações às partes em processos pendentes são feitas na pessoa dos seus mandatários judiciais.
Ou, por outras palavras, o legislador entendeu que a notificação da sentença feita na pessoa do Ilustre Patrono do aqui recorrente é bastante para que a mesma transite em julgado.
Aliás, o próprio recorrente entende que tal decisão transitou em julgado pois, caso contrário não teria interposto um recurso de revisão nos termos do art. 696.º e ss. do Código de Processo Civil.
Assumindo esta premissa, há que reter que o mandato judicial (ou forense) é um contrato de mandato atípico sujeito às regras dos arts. 1157.º do Código Civil e 93.º e ss. do Estatuto da Ordem dos Advogados, para cumprimento do patrocínio judiciário que é de interesse e ordem públicos, sendo como regra um mandato com representação e cujos direitos e obrigações são também aplicáveis aos patronos nomeados.
Entendemos assim que o recorrente tomou conhecimento do teor da sentença homologatória da transação efectuada, e aqui posta em crise, aquando da notificação realizada junto do seu Patrono nomeado, ou seja, em 18 de Julho de 2016, pelo que procede assim a excepção invocada pela recorrida uma vez que decorreram mais de sessenta dias desde essa data e a data em que o presente recurso deu entrada em juízo.”
Só pode ser objeto de revisão decisão transitada em julgado, pelo que defender o recorrente que deveria ter sido notificado pessoalmente da decisão final proferida na ação de divisão de coisa comum é contrário à interposição pelo mesmo do recurso de revisão.
O tribunal recorrido defendeu que o prazo de 60 dias para a interposição do recurso de revisão começou a contar da data da notificação da sentença homologatória.
Contudo, o facto que serve de base à revisão não é a sentença homologatória da transação, como defendido pelo tribunal recorrido, nem é a transação, como afirmado pela recorrida.
O facto que serve de base à revisão é o vício que serve de fundamento à nulidade ou anulabilidade da transação homologada pela sentença objeto do recurso de revisão. É desde o conhecimento de tal vício que o prazo de 60 dias para a interposição do recurso de revisão começa a contar.
O recorrente, no artigo 53º do requerimento de interposição do recurso de revisão, alegou que teve conhecimento do vício em maio de 2021.
Conforme resulta do art. 343º nº 2 do C.C., “nas ações que devam ser propostas dentro de certo prazo a contar da data em que o autor teve conhecimento de determinado facto, cabe ao réu a prova de o prazo ter já decorrido, salvo se outra for a solução especialmente consignada na lei”.
Apesar da recorrida negar a existência do vício invocado pelo recorrente, alegou, na resposta, que, “na acção de divisão de coisa comum, ambas as Partes produziram as respectivas declarações na convicção de que o Banco mutuante cumpriria a obrigação que assumira de desvincular o ali Requerente do mútuo”; e que “a Recorrida, até ser notificada para os termos do presente recurso, estava convencida que o Montepio tinha desvinculado o Recorrente”.
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Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente a apelação, revogando a decisão recorrida e julgando improcedente a exceção da caducidade do recurso de revisão.
Custas pela recorrida.

Lisboa, 18 de abril de 2024
Maria do Céu Silva
Carla Mendes
Carla Matos