Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
15998/18.4T8LSB.L1-1
Relator: PEDRO BRIGHTON
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO
TRIBUNAL EUROPEU DOS DIREITOS DO HOMEM
CONSELHO DA EUROPA
COMPETÊNCIA INTERNACIONAL
IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO
DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/02/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I- A imunidade de jurisdição das Organizações Internacionais está, normalmente, prevista nos seus tratados constitutivos, nas convenções multilaterais e nos acordos bilaterais. 
II- Inexiste norma expressa que consagra a imunidade de jurisdição do Conselho da Europa.
III-  O Conselho da Europa não assume a figura de um Estado (possuindo, antes, uma composição essencialmente inter-estatal), pelo que as regras a estes aplicáveis não são válidas para aquele.
IV- Assim, para apurar a imunidade de jurisdição do Conselho da Europa, há que lançar mão dos princípios gerais de Direito Internacional Público sobre a imunidade de jurisdição das Organizações Internacionais.
V- De acordo com tais princípios, as Organizações Internacionais gozam de imunidade de jurisdição absoluta, inexistindo motivos para dar ao Conselho da Europa um tratamento mais desfavorável do que aquele que é dado às restantes Organizações Internacionais.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA :

I – Relatório
1-  C…. e esposa M ….., L…. e esposa ME….. vieram ao abrigo do disposto (entre outros) dos artºs. 22º da Constituição da República Portuguesa, 1º nºs. 1 e 3, 3º, 8º nº 2, 9º nº 1, 12º e 13º nº 1 (por analogia), do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei 67/2007 de 31/12, 32º nº 1, 59º, 62º al. c), 64º e 81º nº 2 do Código de Processo Civil, 483º nº 1 e 496º nº 1 do Código Civil e 117º nº 1 al. a) da Lei da Organização do Sistema Judiciário, Lei 62/2013 de 26/8, intentar acção declarativa de condenação, com a forma de processo comum contra o Conselho da Europa, com Delegação em Portugal, denominada “Centro Norte-Sul”, pedindo a condenação do R. a indemnizar o casal C… e M… por danos patrimoniais, em consequência da decisão que declarou inadmissível a queixa apresentada pelos supra-referidos A.A. no Processo nº 12180/17 e consequentemente, impediu o reconhecimento pelo TEDH da violação pelo Estado Português do direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, por um Tribunal imparcial, consagrado no artº 6º nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e da “violação do direito a um recurso efectivo”, consagrado no artº 13º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, na quantia de 624.226,66 €, acrescida dos respectivos juros legais contados desde a citação para a presente acção, que corresponde aos prejuízos patrimoniais sofridos por aquele casal.
Por notórios danos morais, em consequência da decisão que declarou inadmissível a queixa apresentada pelos supra-referidos A.A. no Processo nº 12180/17 e, consequentemente, não reconheceu a violação pelo Estado Português do direito a que a causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável, consagrado no artº 6º nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, na quantia de 10.000 € (5.000 € por cada membro do casal).
Por notórios danos morais em consequência da omissão de notificação aos A.A. da decisão judicial proferida pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem no Processo nº 12180/17 e da não fundamentação de tal decisão, designadamente pela falta de indicação dos requisitos de admissibilidade exigidos pelos artºs. 34º e 35º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem que o TEDH considerou não se encontrarem preenchidos, devendo o montante indemnizatório ser calculado segundo o prudente arbítrio do Tribunal e por apego a critérios de equidade, sugerindo-se que não seja inferior a 5.000 € (ou seja, 2.500 € por pessoa).
A título de danos patrimoniais por despesas normais inerentes à interposição e acompanhamento de acção no TEDH por advogado constituído para representação dos A.A., despesas essas que são tradicionalmente levadas em consideração por aquele Tribunal Europeu, na quantia de 2.000 € (ou seja, 1.000 € por cada A.), acrescida dos respectivos juros legais contados desde a citação para a presente acção, tudo pela quantia total de 641.226,66 €, quantia esta acrescida dos respectivos juros legais contados desde a citação para a presente acção.
Peticionaram ainda a condenação do Conselho da Europa a indemnizar o casal L…e ME… por danos patrimoniais em consequência da decisão que declarou inadmissível a queixa apresentada pelos supra-referidos A.A. no Processo nº 12180/17 e consequentemente não reconheceu a violação pelo Estado Português do direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, por um tribunal imparcial, consagrado no artº 6º nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e da “violação do direito a um recurso efectivo”, consagrado no artº 13º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, na quantia de 974.244,46 €, acrescida dos respectivos juros legais contados desde a citação para a presente acção, que corresponde aos prejuízos patrimoniais sofridos por aquele casal.
Por notórios danos morais em consequência da decisão que declarou inadmissível a queixa apresentada pelos supra-referidos A.A. no Processo nº 12180/17 e, consequentemente, não reconheceu a violação pelo Estado Português do direito a que a causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável, consagrado no artº 6º nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem na quantia de 10.000 € (5.000 € por cada membro do casal).
Por notórios danos morais em consequência da omissão de notificação aos A.A. da decisão judicial proferida pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem no Processo nº 12180/17 e da não fundamentação de tal decisão, designadamente pela falta de indicação dos requisitos de admissibilidade exigidos pelos artºs. 34º e 35º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem que o TEDH considerou não se encontrarem preenchidos, devendo o montante indemnizatório ser calculado segundo o prudente arbítrio do Tribunal e por apego a critérios de equidade, sugerindo-se que não seja inferior a 5.000 € (ou seja, 2.500 € por pessoa).
A título de danos patrimoniais por despesas normais inerentes à interposição e acompanhamento de acção no TEDH por advogado constituído para representação dos A.A., despesas essas que são tradicionalmente levadas em consideração por aquele Tribunal Europeu, na quantia de 2.000 € (ou seja, 1.000 € por cada A.), acrescida dos respectivos juros legais contados desde a citação para a presente acção, pela quantia global de 991.244,46 €, quantia esta acrescida dos respectivos juros legais contados desde a citação para a presente acção.
Por último, peticionaram os A.A. que, caso assim não se entenda, deverá condenar-se o Conselho da Europa a indemnizar os A.A. pelo prejuízo que vier a ser apurado no presente processo, caso tal prejuízo não se identifique com o acima indicado como tendo sido sofrido por cada um dos dois casais.
Se ainda assim não se entender deverá condenar-se o Conselho da Europa a, através do seu órgão Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, promover o “desarquivamento da petição” apresentada pelos A.A. no Processo nº 12180/17 e a dar “seguimento à apreciação da petição”, em conformidade com o previsto no artº 37º nºs. 1 e 2 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, tendo em consideração que o respeito pelos Direitos do Homem garantidos naquela Convenção assim o exige.
2-  Seguindo os autos o seu curso normal, veio a ser proferido despacho saneador que julgou procedente a excepção dilatória de imunidade de jurisdição relativamente ao R., constando da sua parcela decisória :
“Pelo exposto, e ao abrigo das disposições legais citadas, julgo procedente a excepção dilatória de imunidade de jurisdição e absolvo o Réu Conselho da Europa da instância.
Custas pelos AA. – artº 527º nºs 1 e 2 do CPC.
Nos termos das disposições conjugadas dos artºs 297º nº 1 e nº 2, 299º nº1 e 306º nºs 1 e 2, fixo à causa o valor de €1.632.471,12 (€641.226,66 + €991.244,46).
Registe e Notifique”.
3-  De tal decisão interpuseram os A.A. recurso e, na sua alegação, apresentaram as seguintes conclusões:
“1ª Questão : Consiste em saber se o Conselho da Europa goza ou não em Portugal de “imunidade de jurisdição” com o sentido adoptado pela douta sentença recorrida, isto é, o de os Tribunais de um Estado membro contratante, in casu Portugal, não poderem “julgar a actuação do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos”, enquanto órgão do Conselho da Europa.
1ª- O artigo 40º do Estatuto do Conselho da Europa não consagra que este Conselho goza de imunidade de jurisdição “nos territórios dos Membros”, mas sim que tal Conselho goza em Portugal das “imunidades e privilégios necessários ao exercício das suas funções” (alínea a)), remetendo a alínea b) daquele artigo para um acordo que defina “os privilégios e imunidades reconhecidos nos seus territórios”.
2ª- A “imunidade de jurisdição” do Conselho da Europa em Portugal foi consagrada pelo artigo 3º do “Acordo Geral sobre os Privilégios e Imunidades do Conselho da Europa”, aprovado pelo Decreto 41/82 de 7.04, mas não com o sentido que lhe foi atribuído pela douta sentença recorrida.
3ª- Uma vez que o supra-referido Acordo Geral vem dar cumprimento ao artigo 40º do Estatuto do Conselho da Europa, ter-se-á de concluir que a imunidade de jurisdição de que goza em Portugal o Conselho da Europa é tão só a que é necessária “ao exercício das suas funções”, podendo pois os tribunais portugueses “julgar a actuação” do TEDH, sem que haja violação do art. 8º da Constituição, ao contrário pois do sustentado na pág. 6 da douta sentença recorrida e sem que seja posto em causa o disposto no artigo 1º desse mesmo Acordo, ou seja, que “o Conselho da Europa goza de personalidade jurídica” e “tem capacidade … para ser parte em juízo” em Portugal, podendo por isso demandar ou ser demandado judicialmente em Portugal.
4ª- A presente acção em nada afectou, nem é susceptível de afectar, o exercício das funções do Conselho da Europa, bem pelo contrário, a condenação do réu poderá até ter um considerável efeito pedagógico no sentido de o seu órgão Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, corrigir o procedimento anómalo e anti-judicial, que adoptou no caso em apreço e a que se alude nos arts. 9º alínea a) e 64º das presente alegações e de a sua representação em Portugal, “Centro Europeu para a Interdependência e Solidariedade Globais (Centro Norte-Sul)”, não voltar a recusar correspondência dirigida ao “Conselho da Europa , Delegação Em Portugal” , como fez no dia 8.10.2018 ao ter recusado a carta de citação que lhe foi enviada (vid devolução de 10.10.2018 do “Registo com AR” nr. RE261048991PT, que consta dos autos).
5ª- Do artigo 21º do supra-referido Acordo Geral resulta a contrario que “qualquer litígio entre o Conselho e particulares” que não seja relativo a “matéria de fornecimentos, trabalhos ou compras imobiliárias efectuados por conta do Conselho” pode ser dirimido nos tribunais portugueses, uma vez que apenas “fica sujeito a arbitragem administrativa” o litígio relativa à matéria supra-descrita e a que alude tal artigo.
6ª- A douta sentença recorrida para além de violar a norma que integra o artigo 1º do supra-referido Acordo Geral, quanto à parte que determina que o Conselho da Europa “tem capacidade… para ser parte em juízo”, em Portugal, ao ter considerado verificada a excepção dilatória de imunidade de jurisdição relativamente àquele Conselho, viola ainda, salvo o devido respeito, a norma que integra o nr. 1 do art. 20º da Constituição da República Portuguesa que consagra o acesso ao direito (direito de acção) e o direito à tutela jurisdicional efectiva por ter sido, indevidamente, absolvido o réu da instância e não ter sido proferida decisão de mérito.
7ª- A douta sentença recorrida violou também, salvo o devido respeito, a norma que integra o artigo 3º do “Acordo Geral sobre os Privilégios e Imunidades do Conselho da Europa”, aprovado pelo Decreto 41/82 de 7.04 ao ter considerado que o Conselho da Europa goza em Portugal de imunidade de jurisdição no sentido de não poderem os tribunais portugueses julgar a actuação do seu órgão, Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, porquanto tal imunidade é apenas e tão só a necessária para o exercício das funções do Conselho da Europa, como resulta da alínea a) do art. 40º do Estatuto do Conselho da Europa, o que não inviabiliza, como é óbvio, a possibilidade de aquele Conselho demandar e ser demandado judicialmente em Portugal.
8ª- O Conselho da Europa não goza pois em Portugal de imunidade de jurisdição com o sentido que foi dado à expressão pela douta sentença recorrida.
2ª Questão : Consiste em saber se é ou não aplicável ao Conselho da Europa em Portugal o regime previsto na lei 67/2007 de 31.12 e se o Juízo Central Cível do Tribunal da Comarca de Lisboa é ou não competente para o julgamento do caso sub judice .
9ª- Ao contrário do sustentado na pág. 7 da douta sentença recorrida, aplica-se ao Conselho da Europa e a todas as demais pessoas colectivas de direito público sediadas em Portugal ou em País estrangeiro, mas com sucursal, agência, filial, delegação ou representação em Portugal, o regime “da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas”, consagrado pela Lei 67/2007 de 31.12, como resulta de forma inequívoca do disposto no art. 1º daquela Lei e do disposto na 2ª parte do nr. 2 do art. 81º do Código de Processo Civil.
10ª- Não se divisa pois qualquer razão para que não seja aplicável ao réu Conselho da Europa, enquanto pessoa colectiva internacional de direito público, com representação em Portugal denominada “Centro Europeu para a Interdependência e Solidariedade Globais Centro Norte-Sul) do Conselho da Europa”, devidamente registada no ficheiro central de pessoas colectivas (conforme resulta da “Informação de Base de Dados” que foi, de oficio, junta aos autos em 11.10.2018 e da página 2 do despacho de 13.12.2018), o regime jurídico previsto na Lei 67/2007 de 31.12 da “responsabilidade civil extracontratual do Estado e das demais pessoas colectivas de direito público”.
11ª- Ao contrário do sustentado na pág. 7 da douta sentença recorrida, o Estado Português exerce, em Portugal, soberania (jurisdicional) “sobre o Conselho da Europa” e sobre todas as demais pessoas colectivas de direito público sediadas no estrangeiro, mas que tenham sucursal, agência, filial, delegação ou representação em Portugal.
12ª- O juízo Central Cível do Tribunal da Comarca de Lisboa é também competente em razão do território para julgar a presente acção atento o disposto na 2ª parte do nr. 2 do art. 81º do Código de Processo Civil que estipula que “a acção contra pessoas colectivas ou sociedades estrangeiras que tenham sucursal, agência, filial, delegação ou representação em Portugal pode ser proposta no tribunal da sede destas, ainda que seja pedida a citação da administração principal”.
13ª- Por força do disposto no nr. 2 do art. 7º do Regulamento(UE) nr. 1215/2012 de 12.12, « as pessoas domiciliadas num Estado-Membro podem ser demandadas noutro Estado-Membro: 2) Em matéria extracontratual, perante o tribunal do lugar onde ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso”, não distinguindo entre pessoas singulares e colectivas, devendo entender-se no caso sub judice por “lugar onde ocorreu… o facto danoso” aquele em que se produziu o efeito lesivo (Torre de Moncorvo, localidade onde os autores/recorrentes residem e têm o “centro dos seus interesses”) e não o lugar em que foi proferida a decisão judicial danosa.
14ª- O supra-referido Regulamento(UE) nr. 1215/2012 de 12.12, aplica-se “em matéria civil e comercial, independentemente da natureza da jurisdição”, como resulta do nr. 1 do seu art. 1º.
15ª- O ponto (26) do preâmbulo do Regulamento(UE) nr. 1215/2012 de 12.12, “relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial”, dispõe que “a confiança mútua na administração da justiça na União justifica o princípio de que as decisões proferidas num Estado-Membro sejam reconhecidas em todos os outros Estados-Membros sem necessidade de qualquer procedimento específico. … Assim, as decisões proferidas pelos tribunais dos Estados-Membros devem ser tratadas como se se tratasse de decisões proferidas no Estado-Membro requerido”.
16ª- Por sua vez o ponto (38) do preâmbulo do Regulamento(UE) nr. 1215/2012 de 12.12, determina que “o presente regulamento respeita os direitos fundamentais e observa os princípios consagrados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, sobretudo o direito à acção e a um tribunal imparcial, previsto no artigo 47º da Carta.
17ª- Por força do disposto no artigo 59º do Código de Processo Civil “os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62º e 63º”, como acontece no caso sub judice em que se verifica para os autores dificuldade apreciável na propositura da acção no estrangeiro, existindo entre o objecto do litígio e a ordem jurídica portuguesa um elemento ponderoso de conexão, pessoal e real, como resulta do alegado nos artigos 51º a 55º da presente alegação de recurso que remete para o alegado pelos autores na petição inicial.
18ª- A responsabilidade por erro judiciário, consagrada no artigo 13º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei 67/2007 de 31.12, aplica-se ao Estado Português e, por analogia, ao Conselho da Europa enquanto Entidade Pública Europeia, ou seja, enquanto pessoa colectiva internacional de direito público, que é integrada por um órgão jurisdicional, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
3ª Questão : Os objectivos do Conselho da Europa
19ª- Os objectivos do Conselho da Europa não são os indicados na pág. 4 da douta sentença recorrida, mas sim o que vem enunciado no artigo 1º do Estatuto do Conselho da Europa.
-Indicação das normas jurídicas que se considera terem sido violadas pela douta Sentença recorrida e que constituem fundamento jurídico da decisão recorrida, em cumprimento do disposto nas alíneas a) e b) do nr. 2 do artigo 639º do CPC.
20ª- Em cumprimento do disposto nas alíneas a) e b) do nr. 2 do artigo art. 639º do CPC e porque o presente recurso versa sobre matéria de direito, indicam-se as normas jurídicas que se considera terem sido violadas pela douta sentença recorrida e que constituem fundamento jurídico da decisão recorrida, indicando-se o sentido com que, no entender dos recorrentes, tais normas deviam ter sido interpretadas e aplicadas :
a) artigo 1º alínea a) do Estatuto do Conselho da Europa, ao ter-se considerado serem objectivos daquele Conselho “a defesa dos direitos humanos, o desenvolvimento democrático e a estabilidade político-social da Europa” (pág. 4 da douta sentença recorrida), sem qualquer correspondência pois com o que vem definido como objectivo do Conselho da Europa na alínea a) daquele artigo 1º, sendo este o sentido único possível para a interpretação e aplicação de tal norma ;
b) artigo 40º do Estatuto do Conselho da Europa ao ter concluído que, não podem os Tribunais de um Estado Membro Contratante, neste caso Portugal, julgar a actuação do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, sob pena de violação do art.º 8º da CRP (penúltimo parágrafo da pág. 6 da douta sentença recorrida), porquanto os privilégios e imunidades previstos no supra-referido artigo são apenas e tão só os “necessários ao exercício das suas funções”, o que não inviabiliza a possibilidade de o Conselho da Europa poder ser demandado judicialmente em Portugal, em conformidade com o disposto no artigo 1º do “Acordo Geral sobre os Privilégios e Imunidades do Conselho da Europa”, aprovado pelo Decreto 41/82 de 7.04, pelo que deveria ter sido este o sentido com que tal norma deveria ter sido interpretada e aplicada.
c) artigo 1º da Lei 67/2007 de 31.12 , ao ter concluído que “sempre estaria excluída a sua aplicabilidade ao Conselho da Europa” pelas razões indicadas na pág. 7 da douta sentença recorrida, porquanto de tal norma resulta precisamente o contrário, ou seja, que a responsabilidade civil extracontratual do Estado e das demais pessoas colectivas de direito público (como é o caso do Conselho da Europa) por danos resultantes do exercício da função jurisdicional se rege pelo disposto naquela Lei, pelo que tal norma deveria ter sido interpretada no sentido da sua aplicabilidade ao réu Conselho da Europa e a todas as demais pessoas colectivas de direito público sediadas em Portugal ou sediadas em País estrangeiro, mas com sucursal, agência, filial, delegação ou representação em Portugal.
d) artigo 8º da Constituição ao ter-se sustentado na pág. 6 da douta sentença recorrida que “não podem os Tribunais de um Estado Membro Contratante, neste caso Portugal, julgar a actuação do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, sob pena de violação do artº 8º da CRP”, em virtude de o Conselho da Europa e os juízes do TEDH beneficiarem “dos privilégios e imunidades previstos no artigo 40º do Estatuto do Conselho da Europa”, porquanto se fez uma interpretação errada de tal norma ao não ter sido levado em consideração que os privilégios e imunidades nela previstos e de que goza aquele Conselho são apenas os “necessários ao exercício das suas funções”, que, por conseguinte, não inviabilizam a possibilidade de o Conselho da Europa demandar ou ser demandado em Portugal, não se verificando pois em tal caso violação de qualquer das normas que integram o supra-referido artigo da Constituição.
-Indicação das normas jurídicas que se considera terem sido violadas pela douta Sentença recorrida e que não constituem fundamento jurídico da decisão recorrida, em cumprimento do disposto na alínea a) do nr. 2 do artigo 639º do CPC.
21ª- Em cumprimento do disposto na alínea a) do nr. 2 do artigo art. 639º do CPC e porque o presente recurso versa sobre matéria de direito, indicam-se as demais normas jurídicas que se considera terem sido violadas pela douta sentença recorrida e que não constituem fundamento jurídico da decisão recorrida :
a) Artigo 1º do “Acordo Geral sobre os Privilégios e Imunidades do Conselho da Europa”, aprovado pelo Decreto 41/82 de 7.04, quanto às partes em que determina que o Conselho da Europa “goza de personalidade jurídica” e “tem capacidade… para ser parte em juízo” em Portugal, ao ter considerado que o Conselho da Europa goza em Portugal de imunidade de jurisdição no sentido de não poderem os tribunais portugueses julgar a actuação do seu órgão, Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (pág. 6 da douta sentença recorrida).
b) Artigo 3º do “Acordo Geral sobre os Privilégios e Imunidades do Conselho da Europa”, aprovado pelo Decreto 41/82 de 7.04 ao ter considerado que o Conselho da Europa goza em Portugal de imunidade de jurisdição no sentido de não poderem os tribunais portugueses julgar a actuação do seu órgão, Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (pág. 6 da douta sentença recorrida), porquanto a interpretação correta do conceito de “imunidade de jurisdição” é a que leva em consideração o disposto na alínea a) do artigo 40º do Estatuto do Conselho da Europa e que o artigo 3º do supra-referido Acordo vem aplicar, ou seja, a de que a imunidade de jurisdição de que goza em Portugal aquele Conselho é apenas e tão só a “necessária ao exercício das suas funções”, o que não inviabiliza, como é óbvio, a possibilidade de o Conselho da Europa demandar e ser demandado judicialmente em Portugal.
c) Artigo 20º 1 da Constituição da República Portuguesa que consagra o acesso ao direito (direito de acção) e o direito à tutela jurisdicional efectiva, ao ter considerado verificada a excepção dilatória de imunidade de jurisdição, com a consequente absolvição do réu da instância, o que determinou que não tivesse sido proferida decisão sobre o mérito da causa.
d) Artigo 81º do Código de Processo Civil, ao não ter levado em linha de conta o disposto na 2ª parte do seu nr. 2 em que se determina que “a acção contra pessoas colectivas ou sociedades estrangeiras que tenham sucursal, agência, filial, delegação ou representação em Portugal pode ser proposta no tribunal da sede destas, ainda que seja pedida a citação da administração principal”.
e) Artigo 7º nr. 2 do Regulamento(UE) nr. 1215/2012 de 12.12 , segundo o qual “as pessoas domiciliadas num Estado-Membro podem ser demandadas noutro Estado-Membro: 2)Em matéria extracontratual, perante o tribunal do lugar onde ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso”, não sendo estabelecida qualquer distinção entre pessoas singulares e colectivas, ao ter concluído pela verificação da excepção da imunidade de jurisdição do Conselho da Europa em Portugal, em vez de ter reconhecido que a pessoa colectiva internacional Conselho da Europa pode ser demandada judicialmente em Portugal .
f) Artigos 59º e 62º c) do Código de Processo Civil ao ter concluído pela incompetência absoluta do tribunal a quo para julgar a presente causa, porquanto das supra-referidas normas e dos factos alegados na petição inicial resulta que o Juízo Central Cível do Tribunal da Comarca de Lisboa é internacionalmente competente para a apreciação e julgamento do caso sub judice.
g) Artigo 13º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei 67/2007 de 31.12, que consagra a “responsabilidade por erro judiciário “, ao ter considerado que não se aplica ao réu Conselho da Europa tal regime e que tal pessoa colectiva internacional “não é equiparável, nem por analogia, ao Estado Português, nem às demais pessoas colectivas de direito público português” ( pág. 7 da douta sentença recorrida ).
-Indicação das normas que deveriam ter sido (e não foram) aplicadas pelo Tribunal a quo, em cumprimento do disposto na alínea c) do nr. 2 do artigo 639º do CPC.
22ª- Em cumprimento do disposto na alínea c) do nr. 2 do artigo art. 639º do CPC e porque o presente recurso versa sobre matéria de direito, indicam-se as normas que deveriam ter sido (e não foram) aplicadas pelo tribunal a quo :
a) Artigo 1º do “Acordo Geral sobre os Privilégios e Imunidades do Conselho da Europa”, aprovado pelo Decreto 41/82 de 7.04 que teria permitido ao Tribunal a quo concluir que o Conselho da Europa “goza de personalidade jurídica” e “tem capacidade … para ser parte em juízo” em Portugal e consequentemente que a imunidade de jurisdição de que o Conselho da Europa goza em Portugal não põe em causa a capacidade daquele Conselho para ser parte em juízo, ou seja para demandar ou ser demandado judicialmente em Portugal.
b) Artigo 3º do “Acordo Geral sobre os Privilégios e Imunidades do Conselho da Europa”, aprovado pelo Decreto 41/82 de 7.04, que aplica o disposto na alínea a) do art. 40º do Estatuto do Conselho da Europa e que sendo devidamente interpretado, conduz à conclusão de que a imunidade de jurisdição de que o Conselho da Europa goza em Portugal é apenas a necessária “ao exercício das suas funções”, o que, como é óbvio, não é impeditivo de tal Conselho ser demandado judicialmente em Portugal, uma vez que “ser parte em juízo” não constitui qualquer entrave ao exercício das funções do Conselho da Europa.
c) Artigo 81º do Código de Processo Civil, que, se tivesse sido aplicado quanto ao disposto na 2ª parte do nr. 2 teria conduzido a uma conclusão contrária à alcançada pelo tribunal a quo , uma vez que “a acção contra pessoas colectivas ou sociedades estrangeiras que tenham sucursal, agência, filial, delegação ou representação em Portugal pode ser proposta no tribunal da sede destas, ainda que seja pedida a citação da administração principal”, como aconteceu no caso sub judice.
d) Artigo 7º nr. 2 do Regulamento(UE) nr. 1215/2012 de 12.12 , segundo o qual “as pessoas domiciliadas num Estado-Membro podem ser demandadas noutro Estado-Membro: 2)Em matéria extracontratual, perante o tribunal do lugar onde ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso”, o que, a ser levado em consideração, teria permitido ao tribunal a quo concluir que a pessoa colectiva internacional Conselho da Europa pode ser demandada judicialmente em Portugal.
e) Artigos 59º e 62º c) do Código de Processo Civil que teriam permitido ao tribunal recorrido concluir, com base também no alegado na petição inicial, que o Juízo Central Cível do Tribunal da Comarca de Lisboa é internacionalmente competente para a apreciação e julgamento do caso sub judice.
f) Artigo 13º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei 67/2007 de 31.12, que teria permitido ao tribunal a quo concluir pela “responsabilidade por erro judiciário” do Conselho da Europa, enquanto pessoa colectiva internacional de direito público, que é integrada por um órgão jurisdicional, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
Nestes termos e nos melhores de Direito, no pressuposto do douto e proficiente suprimento de V. Ex.as, deve o presente recurso ser julgado procedente, considerando-se que não se verifica a existência da pretensa excepção dilatória de imunidade de jurisdição nem de qualquer outra excepção dilatória, susceptível de determinar a absolvição do réu da instância e que se aplica ao réu Conselho da Europa, enquanto pessoa colectiva internacional de direito público, o regime previsto na Lei 67/2007 de 31.12 de responsabilidade civil extracontratual do Estado e das demais pessoas colectivas de direito público, designadamente a responsabilidade por erro judiciário, consagrada pelo art. 13º da Lei 67/2007, proferindo-se acórdão condenatório do réu nos termos pedidos na petição inicial, tendo em consideração a não contestação de tal petição, o disposto no nr. 2 do artº 574º, no nr. 4 do artº 607º e no nr. 2 do art. 665º do CPC e ainda o facto de o tribunal recorrido ter deixado de conhecer das diversas questões suscitadas na petição inicial, por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, nada obstando à sua apreciação e decisão pelo Tribunal ad quem no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, uma vez que dispõe de todos os elementos necessários para o efeito, ou, se assim se não entender, determinando que o processo baixe ao Tribunal da primeira instância para que seja proferida decisão sobre o mérito da causa”.
4-  Não foram apresentadas contra-alegações.
*  *  *
II – Fundamentação
a)  Como resulta do disposto nos artºs. 635º nº 4 e 639º nº 1 do Código de Processo Civil, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, as conclusões da alegação do recorrente servem para colocar as questões que devem ser conhecidas no recurso e assim delimitam o seu âmbito.
Assim, perante as conclusões da alegação dos recorrentes a única questão em recurso consiste em determinar se está verificada “in casu” a excepção dilatória de imunidade de jurisdição, geradora da incompetência absoluta (em razão da nacionalidade) dos Tribunais portugueses.
b)  Vejamos :
A competência dos tribunais, em geral, é a medida de jurisdição atribuída aos diversos tribunais, ou seja, o modo como, entre si, fraccionam e repartem o poder jurisdicional que, tomado, em bloco, pertence ao conjunto dos Tribunais (cf. Manuel de Andrade in “Noções elementares de Processo Civil”, 1979, pgs. 88 e 89).
Os tribunais portugueses só podem conhecer de litígio emergente de uma relação transnacional quando forem internacionalmente competentes.
“A competência internacional designa a fracção do poder jurisdicional atribuída aos tribunais portugueses no seu conjunto, em face dos tribunais estrangeiros, para julgar as acções que tenham algum elemento de conexão com ordens jurídicas estrangeiras” (cf. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in “Manual de Processo Civil’, 2ª ed., pg. 198).
A violação das regras de competência internacional constitui uma excepção dilatória de conhecimento oficioso (incompetência absoluta) (artºs. 96º al. a), 97º nº 1 e 577º al. a) do Código de Processo Civil), que obsta que o Tribunal conheça do mérito da causa.
No caso em apreço, importa verificar se o Conselho da Europa pode ser demandado nos Tribunais portugueses, ou, como bem assinalam os recorrentes nas suas alegações, “importa apurar, pura e simplesmente, se o Conselho da Europa goza ou não, em Portugal, de imunidade de jurisdição e, em caso afirmativo, em que termos, ou se, pelo contrário “tem capacidade … para ser parte em juízo” em Portugal, ou seja, para poder demandar ou ser demandado judicialmente em Portugal”.
c)  Não subsistem dúvidas de que o recorrido Conselho da Europa é uma Organização Internacional.
Como refere Juliana de Souza Corrêa (in estudo “A autonomia das Nações Unidas à luz de suas imunidades e privilégios :  o caso emblemático dos Estados Unidos”, consultado na “internet” em https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/134725/Monografia%20da%20Juliana%20de%20Souza.pdf?sequence=1), “os Estados instituíram as organizações internacionais (OIs) para atender a diversas necessidades e interesses que afectaram a comunidade internacional.  Contudo, as OIs não surgiram como resultado de um planeamento racional e preconcebido. A multiplicação em número e em amplitude funcional e operativa de tais entidades deu-se em virtude das novas demandas da sociedade internacional, principalmente com o findar da Segunda Guerra Mundial, momento em que as instituições mal podiam ser comparadas, em importância e estrutura, às precursoras instituições e uniões administrativas do final do século XIX”.
Esse desenvolvimento das Organizações Internacionais levou a que ocorresse uma mudança dos processos decisórios relativos a uma ampla gama de matérias, antes exclusivamente governamentais, de entidades nacionais para Organizações Internacionais, fazendo com que estas tenham passado a ter uma actuação destacada, ao lado do tradicional Estado-Nação.
Assim, as “associações voluntárias de Estados”, estabelecidas por acordo internacional, são, hoje em dia, dotadas de órgãos permanentes, próprios e independentes, encarregados de gerir interesses colectivos e capazes de expressar vontade juridicamente distinta da de seus membros.
Significa isto que tais Organizações Internacionais possuem uma composição essencialmente inter-estatal e uma base jurídica convencional da qual as mesmas emergem como sujeitos de Direito derivado, uma vez que existem a partir de um acto jurídico anterior.  Geralmente esse acto jurídico criador tem a forma de um tratado multilateral negociado entre os Estados membros.
Geralmente, essa “carta constitutiva” das Organizações Internacionais contém um artigo específico que lhe confere capacidade jurídica para exercer as suas funções e alcançar os seus objectivos sobre o território dos Estados-membros. Deste modo, as Organizações Internacionais adquirem relativa autonomia em relação aos Estados-membros, e elaboram políticas e projectos próprios, além de poderem ter personalidade jurídica, de acordo com o Direito Internacional Público.
Fernanda Araújo Kallás e Caetano salienta (in estudo “A imunidade de jurisdição das organizações internacionais face ao direito de acesso à justiça”, consultado na “internet” em http://www.corteidh.or.cr/tablas/r17468.pdf) :
“O exercício da jurisdição figura dentre os direitos básicos do Estado.  Tem por pressuposto que todas as pessoas e bens situados no território estatal se encontrem submetidos às leis e tribunais do Estado.  Todavia, esse direito sofre limitações quando os Estados decidem viver em comunidade.  Assim, as relações inter-estatais, como qualquer outro tipo de interacção, requerem concessões e esforços.  Uma dessas concessões diz respeito ao direito das imunidades.  Elas são, desse ponto de vista, conjectura fundamental da manutenção das relações diplomáticas e da própria coexistência da comunidade internacional”.
“Conforme a máxima “par in parem non habet judicium”, as pessoas jurídicas internacionais de igual posição não podem exercer jurisdição umas sobre as outras, ou seja, nenhum Estado soberano pode ser submetido à condição de parte perante o foro doméstico de outro Estado contra a sua vontade.  Assim, ao impedir que os tribunais internos de um país julguem acções concernentes à soberania de um ente público externo, garante-se a não ingerência nos assuntos internos dos Estados estrangeiros.  Dessa forma, a imunidade de jurisdição constitui, ao mesmo tempo, uma protecção à soberania de um Estado, que se vê protegido da possibilidade de ser subordinado a outra jurisdição que não a sua própria e uma limitação à soberania de outro, que se encontra impossibilitado de exercer jurisdição plena em seu território”.
“A lógica de garantia das imunidades foi estendida aos outros sujeitos incontestáveis do direito internacional público, quais sejam, as organizações internacionais.  Tais entidades, formadas pela reunião de Estados soberanos, possuem titularidade de direitos e deveres internacionais.  Contudo, no caso das organizações internacionais, não há que se falar no elemento soberania.  A justificativa para a concessão do privilégio é a necessidade de independência da organização internacional para a realização das funções previstas no seu tratado constitutivo, visando afastar a ingerência dos governos por meio da aplicação de seu direito interno”.
“Ao contrário das imunidades dos Estados estrangeiros, que são uma construção costumeira, os privilégios e imunidades das organizações internacionais estão, normalmente, previstos em três tipos de tratados :  os tratados constitutivos, as convenções multilaterais e os acordos bilaterais de sede.  Na maior parte dos casos, tais instrumentos dispõem sobre a imunidade das organizações internacionais em termos absolutos”.
d)  Ora, o Conselho da Europa é uma Organização Internacional, fundada em 5/5/1949.  Os seus propósitos são a defesa dos Direitos Humanos, o desenvolvimento democrático e a estabilidade político-social na Europa (cf. Preâmbulo e artº 1º do Estatuto do Conselho da Europa).
No caso desta Organização Internacional (à qual Portugal aderiu pela Lei 9/76 de 31/12, que aprovou o Tratado de Adesão de Portugal à mesma), dispõe o artº 40º al. a) do seu Estatuto que “O Conselho da Europa, os representantes dos Membros e o Secretariado gozam, nos territórios dos Membros, das imunidades e privilégios necessários ao exercício das suas funções.  Em virtude dessas imunidades, os representantes à Assembleia Consultiva não podem, nomeadamente, ser detidos nem acusados nos territórios de qualquer dos Membros por motivo das suas opiniões ou dos votos emitidos durante os debates da Assembleia, dos seus comités ou comissões”.
E a al. b) desse normativo preceitua que “os Membros comprometem-se a concluir logo que possível um acordo com vista a dar execução ao disposto na alínea a).  Para este efeito, o Comité de Ministros recomendará ao Governo de cada Membro a conclusão de um acordo definindo os privilégios e imunidades reconhecidos nos seus territórios.  Será ainda concluído um acordo especial com a República Francesa que definirá os privilégios e imunidades de que gozará o Conselho na sua sede”.
Esse acordo, mencionado na al. b), veio a ser concretizado no Acordo Geral sobre os Privilégios e Imunidades do Conselho da Europa (aprovado em Portugal pelo Decreto nº 41/82, de 7/4) que estipula no seu artº 1º que “o Conselho da Europa goza de personalidade jurídica.  Tem capacidade para contratar, adquirir e alienar bens móveis e imóveis e para ser parte em juízo”.
O artº 16º desse mesmo Acordo Geral refere que “o Secretário-Geral e o Secretário-Geral-Adjunto gozam, conjuntamente com os seus cônjuges e filhos menores, dos privilégios, imunidades, isenções e facilidades reconhecidos pelo direito internacional aos enviados diplomáticos”.
E o artº 18º do Acordo Geral dispõe que “os agentes do Conselho da Europa :  a) Gozam de imunidade de jurisdição relativamente aos actos, incluindo palavras e escritos, por eles praticados na sua qualidade oficial e nos limites das suas atribuições ;  b) Estão isentos de qualquer imposto sobre as remunerações e emolumentos pagos pelo Conselho da Europa ;  c) Não estão sujeitos, tal como os seus cônjuges e membros da família que se encontrem a seu cargo, às disposições que limitam a imigração e às formalidades de registo de estrangeiros ;  d) Gozam, no que respeita a facilidades de câmbio, dos mesmos privilégios que os funcionários de categoria equivalente pertencentes a missões diplomáticas acreditadas junto do governo interessado ;  e) Gozam, assim como os seus cônjuges e membros da família que se encontrem a seu cargo, das mesmas facilidades de repatriamento que os enviados diplomáticos em período de crise internacional ;  f) Têm o direito de importar, livres de direitos, o seu mobiliário e outros bens de carácter pessoal, na altura da primeira entrada em funções no país interessado, e de reexportá-los nas mesmas condições para o país do seu domicílio quando cessarem funções”.
e)  É certo que, nem do Estatuto do Conselho da Europa, nem do Acordo Geral sobre os Privilégios e Imunidades do Conselho da Europa resulta expressamente que o Conselho da Europa, enquanto tal, goza de imunidade de jurisdição.
Por outro lado, “no ordenamento jurídico português, não existe norma que regule a questão da imunidade jurisdicional dos Estados estrangeiros perante os Tribunais portugueses, problemática que tem de ser apreciada à luz das normas e dos princípios de direito internacional geral ou comum, que, segundo o nº 1 do artigo 8º da Constituição da República Portuguesa, “fazem parte integrante do direito português” (cf. Acórdão do S.T.J. de 4/6/2014, consultado na “internet” em www.dgsi.pt).
Desde logo, há que salientar que o Conselho da Europa não é um órgão governamental de qualquer Estado soberano, nem tem quaisquer funções legislativas ou executivas (na União Europeia as competências no controle e em alterações na legislação são divididas entre o Parlamento e o Conselho da União Europeia, enquanto as tarefas executivas são levadas a cabo pela Comissão Europeia).
Deste modo, não há que aplicar “in casu” a “teoria relativa da imunidade de jurisdição do Estado”, segundo a qual “dela se consideram actualmente excluídos os actos de gestão (respeitantes a actos e contratos privados), apenas sendo considerados actos de imunidade de jurisdição dos estados os praticados sob a denominação de actos de império” (cf. Acórdão da Relação de Coimbra de 10/5/2016, consultado na “internet” em www.dgsi.pt).
Deste modo, a questão em apreço deverá ser resolvida mediante interpretação dos princípios gerais de Direito Internacional Público sobre a imunidade das Organizações Internacionais.
Ora, no Processo “Associação de Mães da Sbrebrenica e outros v. Estado da Holanda e Nações Unidas” (“Mothers of Sbrebrenica Association et al v. The State of the Netherlands and the United Nations”), que correu termos no Supremo Tribunal dos Países Baixos, e cuja decisão pode ser consultada na “internet” na Base de Dados do CAHDI (Committee of Legal Adviser on Public International Law), em http://www.cahdidatabases.coe.int/Contribution/Details/347, decidiu-se, a propósito da ONU e da imunidade desta organização (tradução do relator do presente Acórdão) :
“(…) a questão é se, como a Associação et al. argumentam, o direito de acesso a um Tribunal independente consagrado no artigo 6º da CEDH e no artigo 14º do PIDCP prevalece sobre essa imunidade.  Com base nos critérios estabelecidos pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) em Beer e Regan v. Alemanha e Waite e Kennedy v. Alemanha, o Tribunal de apelação examinou a questão de saber se a invocação da imunidade da ONU é compatível com o artigo 6º da CEDH.  Nesse contexto, a primeira coisa que pode ser estabelecida é que a imunidade sirva um objectivo legítimo, ou seja, garantir o bom funcionamento das Organizações Internacionais.  Em resposta à questão de saber se, neste caso, a imunidade é proporcional ao objectivo a ser cumprido, deve-se notar desde o início que a ONU ocupa uma posição especial entre organizações internacionais”.
“A base para a imunidade da ONU (distingue-se da imunidade concedida à funcionários e especialistas que realizam missões para a ONU) é o artigo 105º da Carta e artigo II, § 2 da Convenção.  O Tribunal de recurso estava correto ao interpretar esta última disposição – que é uma concretização do parágrafo 1 do artigo 105º – à luz da artigo 31º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, para significar que a ONU desfruta de imunidade de jurisdição de maior alcance, no sentido de que a ONU não pode ser convocada para comparecer perante qualquer Tribunal nacional nos países que são parte no Convenção”.
“Tanto a base, quanto o escopo dessa imunidade, que visa garantir que a imunidade da ONU pode funcionar de forma completamente independente e, portanto, serve um propósito legítimo, portanto, diferente daquele subjacente à imunidade de jurisdição de que gozam os Estados estrangeiros.  Conforme declarado na secção 13ª da Lei de Disposições Legislativas Gerais, o segundo, deriva do Direito Internacional (“parem parem non habet imperium”), e aplica-se exclusivamente a actos de um Estado estrangeiro realizados com capacidade governamental (“acta iure imperii”)”.
“Conforme declarado em 4.1.1, o Tribunal de apelação concluiu, com base nos critérios estabelecidos pelo TEDH em Beer e Regan /Alemanha (TEDH de 18 de Fevereiro de 1999, nº 28934/95) e Waite e Kennedy contra Alemanha (TEDH em 18 de Fevereiro de 1999, nº 26083/94), que a invocação da imunidade da ONU é compatível com o direito de acesso aos Tribunais consagrado no artigo 6º da CEDH e no artigo 14º do PIDCP.  No processo de cassação, o Estado não contesta o argumento de que esse Direito de imunidade – que não é um direito absoluto – também constitui uma regra do direito internacional consuetudinário”.
“Ambos os casos acima citados envolveram processos perante os Tribunais alemães contra a “Agência Espacial Europeia” (ESA), na qual os requerentes queriam que o Tribunal estabelecesse que eles eram funcionários da ESA, de acordo com a lei alemã.  A ESA, é uma organização internacional que goza de imunidade de jurisdição nos termos do artigo XV, §2 da Convenção para criação de uma Agência Espacial Europeia de 30 de Maio de 1975, em conjunto como  Anexo I da mesma Convenção (Série 123 do Tratado Holandês).  O Tribunal alemão aceitou esse fundamento.  O TEDH considerou que isso não constituía uma violação do artigo 6º ECHR”.
E mais adiante :
“No presente caso, o capítulo VII permitiu ao CSNU adoptar medidas coercivas em reacção a um conflito identificado e considerado um ameaça à paz, a saber, a Resolução do CSNU 1244 que instituiu a UNMIK e a KFOR.  Uma vez que as operações estabelecidas pelas resoluções do CSNU no capítulo VII da Carta da ONU são fundamentais para a missão da ONU de garantir a paz e a segurança internacionais e, como eles contam com sua eficácia no apoio Estados membros, a Convenção não pode ser interpretada no sentido de sujeitar os actos e omissões das partes contratantes cobertos pela Resolução do CSNU (…) ao escrutínio dos Tribunais. Fazê-lo, seria interferir no cumprimento da principal missão da ONU onde se inclui, conforme argumentado pelas partes, a condução eficaz das suas operações”.
“Seria também o mesmo que impor condições à implementação de uma Resolução do CSNU que não estava prevista no texto da própria Resolução”.
Mais à frente :
“E no parágrafo 149, o TEDH sustenta que, desde as operações estabelecidas pelo CSNU que as resoluções do Capítulo VII da Carta das Nações Unidas são fundamentais para a missão da ONU para garantir a paz e a segurança internacionais, pelo que a Convenção não pode ser interpretada de maneira a sujeitar os actos e omissões das Partes Contratantes, que sejam cobertas pelas resoluções do CSNU e ocorrem antes ou no decurso de tais missões, ao controlo do Tribunal”.
Mais adiante :
“Essa imunidade é absoluta.  Além disso, respeitá-la está entre as obrigações dos Estados membros da ONU que, como o TEDH levou em consideração em Behrami, Behrami e Saramati, nos termos do artigo 103º da Carta da ONU, prevalece sobre as obrigações conflituantes de outro Tratado Internacional”.
E quase a concluir :
“Embora a imunidade da ONU deva ser diferenciada da imunidade do Estado, a diferença não é suficiente para justificar uma decisão sobre a relação entre a primeira e o direito de acesso aos Tribunais, de uma maneira diferente da decisão do TIJ sobre a relação entre a imunidade do Estado e o direito de acesso aos Tribunais.  A ONU goza de imunidade, independentemente da extrema seriedade das acusações contra as quais a Association et al. baseia suas reivindicações”.
f)  Do que acima fica exposto, e a propósito da imunidade de jurisdição do Conselho da Europa podemos extrair as seguintes conclusões :
-A imunidade de jurisdição das Organizações Internacionais está, normalmente, prevista nos seus tratados constitutivos, nas convenções multilaterais e nos acordos bilaterais. 
-Inexiste norma expressa que consagra a imunidade de jurisdição do Conselho da Europa.
-O Conselho da Europa não assume a figura de um Estado (possuindo, antes, uma composição essencialmente inter-estatal), pelo que as regras a estes aplicáveis não são válidas para aquele.
-Assim, para apurar a imunidade de jurisdição do Conselho da Europa, há que lançar mão dos princípios gerais de Direito Internacional Público sobre a imunidade de jurisdição das Organizações Internacionais.
-De acordo com tais princípios, as Organizações Internacionais gozam de imunidade de jurisdição absoluta, inexistindo motivos para dar ao Conselho da Europa um tratamento mais desfavorável do que aquele que é dado às restantes Organizações Internacionais.
g)  Deste modo, teremos de concluir que bem andou o Tribunal “a quo” ao decidir que o Conselho da Europa goza de imunidade de jurisdição, não podendo os Tribunais de um Estado membro contratante (neste caso Portugal) julgar a actuação do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos no exercício das suas funções, enquanto órgão do Conselho da Europa.
h)  Defendem ainda os recorrentes que se aplica ao Conselho da Europa (e a todas as demais pessoas colectivas de Direito Público sediadas em Portugal ou em país estrangeiro, mas com sucursal, agência, filial, delegação ou representação em Portugal), o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, consagrado na Lei 67/2007 de 31/12.
Ora, o artº 1º nº 1 de tal diploma dispõe que “a responsabilidade civil extracontratual do Estado e das demais pessoas colectivas de direito público por danos resultantes do exercício da função legislativa, jurisdicional e administrativa rege-se pelo disposto na presente lei, em tudo o que não esteja previsto em lei especial”.  E acrescenta o nº 2 que “para os efeitos do disposto no número anterior, correspondem ao exercício da função administrativa as acções e omissões adoptadas no exercício de prerrogativas de poder público ou reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo”.  O nº 3, por sua vez, estipula que, “sem prejuízo do disposto em lei especial, a presente lei regula também a responsabilidade civil dos titulares de órgãos, funcionários e agentes públicos por danos decorrentes de acções ou omissões adoptadas no exercício das funções administrativa e jurisdicional e por causa desse exercício”.  O nº 4 adianta que “as disposições da presente lei são ainda aplicáveis à responsabilidade civil dos demais trabalhadores ao serviço das entidades abrangidas, considerando-se extensivas a estes as referências feitas aos titulares de órgãos, funcionários e agentes”.  E conclui o nº 5 que “as disposições que, na presente lei, regulam a responsabilidade das pessoas colectivas de direito público, bem como dos titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes, por danos decorrentes do exercício da função administrativa, são também aplicáveis à responsabilidade civil de pessoas colectivas de direito privado e respectivos trabalhadores, titulares de órgãos sociais, representantes legais ou auxiliares, por acções ou omissões que adoptem no exercício de prerrogativas de poder público ou que sejam reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo”.
Ou seja, o âmbito subjectivo deste diploma abrange o Estado e demais pessoas colectivas de direito público por danos resultantes do exercício da função legislativa, jurisdicional e administrativa ;  os titulares de órgãos, funcionários e agentes públicos por danos decorrentes de acções ou omissões adoptadas no exercício das funções administrativa e jurisdicional e por causa desse exercício ;  os demais trabalhadores ao serviço das entidades abrangidas, considerando-se extensivas a estes as referências feitas aos titulares de órgãos, funcionários e agentes ;  pessoas colectivas de direito privado e respectivos trabalhadores, titulares de órgãos sociais, representantes legais ou auxiliares, por acções ou omissões que adoptem no exercício de prerrogativas de poder público ou que sejam reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo.
Não vemos como enquadrar aí, mesmo por analogia, o Conselho da Europa, tal como acima o definimos.  Com efeito, afigura-se-nos que estamos perante uma lei nacional, dirigida ao Estado português, seus órgãos e trabalhadores e ainda pessoas colectivas de direito privado (e seus trabalhadores), estas sim nacionais ou internacionais, que actuem no exercício de um poder público.
O Conselho da Europa não é, como já vimos, um Estado ou uma pessoa colectiva a ele equiparado.  Muito menos é uma pessoa colectiva de direito privado.
E, acima de tudo, goza de imunidade de jurisdição.
Pelo que não vemos que, neste ponto, assista razão aos apelantes.
i)  Por fim, afirmam os recorrentes que, por força do disposto no artº 59º do Código de Processo Civil “os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62º e 63º”, como, defendem eles “acontece no caso sub judice em que se verifica para os autores dificuldade apreciável na propositura da acção no estrangeiro, existindo entre o objecto do litígio e a ordem jurídica portuguesa um elemento ponderoso de conexão, pessoal e real”.
Referem os recorrentes que “são modestos agricultores que vivem em Torre de Moncorvo e dependem da agricultura para a sua subsistência”.  “Nada sabem de Direito francês, não estando pois minimamente habilitados a litigar num Tribunal de França, país onde está sediado o Conselho da Europa”.  “Acresce que o autor C… tem 64 anos de idade, sua esposa M… 62 anos, L.. 91 anos e sua esposa ME…83 anos (…), o que significa que já não estão em idade de andar “em aventuras” por essa Europa fora”.  “Nenhum dos autores está também em condições de poder suportar despesas de advocacia acrescidas e os custos judiciais inerentes a uma acção judicial em França, o que implicaria também avultadas despesas de deslocação para o advogado e eventuais testemunhas”.
Ora, dispõe o artº 59º do Código de Processo Civil que, “sem prejuízo do que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62º e 63º ou quando as partes lhes tenham atribuído competência nos termos do artigo 94º”.
Por seu turno, o artº 62º al. c) do Código de Processo Civil (que é aquele que pode relevar no caso “sub judice”) estipula que “os tribunais portugueses são internacionalmente competentes :  (…) c) Quando o direito invocado não possa tornar-se efectivo senão por meio de acção proposta em território português ou se verifique para o autor dificuldade apreciável na propositura da acção no estrangeiro, desde que entre o objecto do litígio e a ordem jurídica portuguesa haja um elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real”.
Consagra este normativo, o critério ou princípio da necessidade que constitui caso excepcional e subsidiário de alargamento da competência dos tribunais portugueses, visando evitar que o direito a exercitar fique desprovido de garantia judiciária, ou seja, que ocorra uma situação objectiva de denegação de justiça, incluindo a impossibilidade absoluta e relativa, que tanto podem ser jurídica ou prática ou a dificuldade em tornar efectivo o direito por meio de acção instaurada em tribunal estrangeiro (cf. Castro Mendes, in “Apontamentos das suas Lições de Direito Processual Civil”, redigidos por Armindo Ribeiro Mendes, Vol. I, , pgs. 269 e 270, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. I, 3ª ed., pg. 133, e José Alberto dos Reis, in “Comentário ao Código de Processo Civil”, Volume 1º, pgs. 139 e 144).
Ora, não se pode deixar de reconhecer que existirão algumas dificuldades, em especial dos apelantes L… e ME… (dada a sua idade), em acompanharem o desenvolvimento do processo que venham a interpor no Tribunal competente.  Além disso, a sua situação económica não é propriamente desafogada (daí gozarem do benefício do apoio judiciário).
Mas, ainda assim, estão representados por Mandatário Judicial que, certamente, não deixará de exercer no local próprio o direito de acção, não se podendo concluir que se está perante uma eventual situação de denegação de Justiça.
Ou seja, não vemos que assista razão aos apelantes para lançarem mão da “válvula de escape” do artº 62º al. c) do Código de Processo Civil.
j)  Entendemos, pois, tal como o Tribunal “a quo”, que o Conselho da Europa goza de imunidade de jurisdição, a qual constitui uma excepção dilatória que gera a incompetência absoluta dos Tribunais nacionais, e implica a absolvição daquele da instância (artºs. 96º al. a) 99º nº 1, 576º nº 2 e 577º al. a) do Código de Processo Civil).
k)  Há, pois, que manter nos seus precisos termos a decisão sob recurso, improcedendo o mesmo.
l)  Sumário  (supra transcrito)
*  *  *
III – Decisão
Pelo exposto acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso confirmando na íntegra a decisão recorrida.
Custas :  Pelos recorrentes (artº 527º do Código do Processo Civil).
Processado em computador e revisto pelo relator

Lisboa, 2 de Junho de 2020
Pedro Brighton
Teresa Sousa Henriques
Isabel Fonseca