Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
29207/15.4YIPRT.L1-6
Relator: TERESA PARDAL
Descritores: PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ELECTRÓNICOS
CLÁUSULA PENAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/08/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: –A questão de saber se a cláusula penal pode ou não ser reclamada no processo de injunção reconduz-se à excepção de erro na forma do processo, que só pode ser conhecido oficiosamente até à sentença, pelo que, sendo invocada pela primeira vez em sede de recurso, não pode a Relação conhecer desta questão nova.
–Num contrato de prestação de serviços electrónicos, não estando em causa o fornecimento e desbloqueamento de equipamentos, não é aplicável o DL 56/2010 de 1/6, mas sim o artigo 48º da Lei 5/2004 de 10/2 (na redacção da Lei 51/2011 de 13/9, face à data dos factos).
–Não sendo aplicável o regime das cláusulas contratuais gerais, nem o DL 56/2010, nem a redacção actual da Lei 5/2004 (introduzida pela Lei 15/2016 de 17/6), a cláusula penal que, perante a cessação antecipada do contrato por iniciativa do assinante, fixa uma indemnização correspondente às prestações vincendas até ao termo do contrato não é nula, mas deve ser reduzida equitativamente ao abrigo do artigo 812º do CC, por ser excessivamente onerosa para o assinante, o que foi expressamente invocado por este.

(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial: Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


RELATÓRIO:


N…, SA (anteriormente designada O…, SA) apresentou contra C…, Lda injunção para pagamento do valor de facturas relativas a contrato de prestação de bens e serviços de telecomunicações, no montante de 4 682,96 euros, acrescida de juros de mora de 95,64 já vencidos, bem como os vincendos e da quantia de 300,00 euros, a qual, face à oposição apresentada, foi distribuída como acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias.

Na sua oposição, a ré alegou que estão apenas em dívida os valores de 381,27 euros, 396,05 euros e 80,04 euros, não sendo devidos os restantes valores reclamados, nomeadamente o valor de 3 825,00 euros a título de indemnização pela cessão do contrato durante o período de fidelização, pois o contrato foi rescindido pela requerida em Outubro de 2014, depois do prazo de 18 meses de fidelização acordado em 22 de Fevereiro de 2013 e que vigorou até Agosto de 2014, não vigorando qualquer prolongamento, como foi lhe foi comunicado pela requerente; mesmo que o contrato tivesse sido rescindido dentro do período de fidelização, não seria devida indemnização nos termos do DL 56/2010 de 1/6, pois não foi demonstrado que a requerente tivesse vendido à requerida equipamento com preços especiais, condição prevista neste diploma legal; mesmo que assim não se entendesse, sempre se teria de entender que a requerida resolveu o contrato por justa causa, em virtude de a requerente lhe ter cobrado mensalidade superior à que havia sido acordada, sem que houvesse alteração nos serviços prestados.   

Concluiu pedindo a procedência da oposição e a absolvição do pedido. 

Na sequência de convite que lhe foi feito, veio a autora apresentar petição inicial aperfeiçoada, discriminando os acordos celebrados entre as partes, os respectivos aditamentos e períodos de permanência convencionados e alegando que foi estipulado que, em caso de incumprimento do período de permanência, seria devido pela requerida, a título de cláusula penal, um valor de indemnização correspondente à soma das mensalidades devidas desde o incumprimento até ao final do referido período, encontrando-se em dívida os valores reclamados, entre os quais a indemnização pela cláusula penal resultante de a requerida ter pedido a desactivação do pedido cerca de 10 meses antes do final do período de permanência.

Concluiu pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia peticionada.

Notificada a ré, veio esta tomar posição sobre a PI aperfeiçoada, mantendo o alegado na oposição e impugnando as alterações aos períodos de permanência alegados na petição inicial aperfeiçoada, bem como os documentos juntos com este articulado, alegando ainda que a cláusula penal é desproporcionada.

Procedeu-se a julgamento, findo o qual foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar à autora a quantia de 4 682,96 euros e os juros de mora peticionados, absolvendo-a do pedido de pagamento de 300,00 euros.
                                                           
Inconformada, a ré interpôs recurso e alegou, formulando a conclusões com os seguintes argumentos:

 –O facto provado no ponto 7 deve ser alterado para “a autora cancelou os contratos em 8/10/2014 a pedido da ré”, como resulta da posição de ambas as partes nos respectivos articulados.
  –A alínea v) do ponto 2 dos factos deve ser julgada não provada, porque, do documento apresentado pela autora para a respectiva prova, impugnado pela apelante, não se pode extrair este facto.
 –O procedimento de injunção não é o adequado para pedir o pagamento da cláusula penal associada à cessação antecipada do contrato, destinando-se apenas à cobrança das obrigações pecuniárias directamente emergentes dos contratos.
 –Ao conhecer do pedido de pagamento da cláusula penal, a sentença recorrida violou os artigos 37º nº1 e 555º nº1 do CPC. 
 –De qualquer forma, não é devida a indemnização por cessação antecipada do contrato, pois a autora apelada não alega que procedeu à venda ou fornecimento de equipamentos em condições vantajosas para a requerida apelante, pressuposto legal para poder exigir o pagamento da indemnização, não podendo, assim, reclamar a quantia de 3 825,00 euros, por tal lhe estar vedado pelo artigo 2º nº2 e 3 do DL 56/2010 de 1/6, ainda que a cessação do contrato ocorra dentro do período de fidelização.
 –Não sendo relacionada com equipamentos entregues à requerida em condições vantajosas, a cláusula penal é nula, nos termos do artigo 8º do DL 56/2010.
 –A sentença recorrida violou os artigos 2º nº2 e 3 e 8º do DL 56/2010.
 –Por outro lado, a cláusula penal é desproporcionada e, consequentemente, nula, porque o contrato vigora desde 2008, tendo vindo a ser prolongado, o que já deu oportunidade à autora para recuperar o investimento inicial.
 –Deve proceder o presente recurso, com a alteração da decisão da matéria de facto nos termos expostos e, fazendo a acertada aplicação do direito, com a absolvição da requerente da instância ou do pedido, no que se refere à quantia de 3 825,00 euros reclamada a título de cláusula penal.  
                                                          
A recorrida contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso.
                                                           
As questões a decidir são:
I)–Impugnação da matéria de facto.
II)–Erro na forma do processo quanto ao pedido de pagamento da cláusula penal.
III)–Nulidade da cláusula penal por violação do regime do DL 56/2010 de 1/6.
IV)–Nulidade da cláusula penal por desproporcionalidade. 
                                                            
FACTOS.

A 1ª instância considerou os seguintes factos provados e não provados:
Provados.
1.–A autora é uma sociedade comercial que se dedica à prestação de serviços de comunicações electrónicas.

2.–Entre a autora e a ré foram celebrados os contratos/aditamentos:
i.-Em 21.11.2008, um contrato de prestação de bens e serviços de telecomunicações, mormente para activação de serviço de voz fixa em acesso indirecto básico e Adsl 8Mbps, a que foi atribuído o número 1.26504063_1 – conforme documento junto a fls. 62 a 83 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;
ii.-Em 06.03.2012, um aditamento para alteração das condições contratuais: manutenção do serviço de voz fixa cobre e adição de um plano individual, 1 Kanguru 3.6 ilimitado e 1 linha voz mais internet na hora – conforme documento junto a fls. 84 a 88 e 177 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;
iii.-Em 06.03.2012, um aditamento para alteração das condições contratuais: para troca de pontos por desconto de 3€ – conforme documento junto a fls. 176 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;
iv.-Em 22.02.2013, um aditamento para alteração das condições contratuais para passar a dispor de Rede com 7 cartões, 1 Kanguru 50Mb, 1 linha voz mais internet na hora, 1 adsl 5Mbps e serviço de voz fixa cobre – conforme documento junto a fls. 93/96 e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;
v.-Em 15.03.2013, um aditamento para troca de pontos por desconto em factura durante 20 meses – conforme documento junto a fls. 97/98 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;
vi.-Em 21.05.2013, um aditamento para adição de complemento de roaming Brasil – conforme documento junto a fls. 99/100 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;
vii.-Em 25.11.2013, um aditamento para adição do serviço Connect M2M All in one – conforme documento junto a fls. 101 a 105 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;
viii.-Em 07/02/2014 foi celebrado um contrato para adição de quatro acessos de 1Gb e três acessos "normais" – conforme documento junto a fls. 106 a 109 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;

3.–Os acordos celebrados previam um período permanência nos seguintes termos:
i.-o contrato de 21.11.2008 previa um período de permanência de 24 meses;
ii.-o aditamento de 06.03.2012, in casu o segundo, não previa qualquer acréscimo de permanência;
iii.-o aditamento de 22.02.2013, previa um período de permanência de 18 meses;
iv.-o aditamento de 15.03.2013, previa um aumento de 12 meses na permanência;
v.-o aditamento de 21.05.2013 não previa qualquer acréscimo na permanência;
vi.-o aditamento de 25.11.2013, previa um período de permanência de 21 meses;
vii.-o contrato de 07.02.2014 não previa qualquer acréscimo na permanência.

4.–A autora emitiu as facturas:
ix.-nº 0206824210914, em 5.09.2014, com vencimento a 25.09.2014, com o valor de 396,05€, a título de mensalidade – conforme documento junto a fls. 110/123 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
x.-nº 0207484151014, em 7.11.2014, com vencimento a 27.11.2014, com o valor de 381,27€, a título de mensalidade – conforme documento junto a fls. 126/137 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
xi.-nº 0208469321114, em 7.11.2014, com vencimento a 27.11.2014, com o valor de 3.905,64€, a título de mensalidade e a título de indemnização incumprimento contrato – conforme documento junto a fls. 138/145 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.

5.–A 8.10.2014, a autora enviou à ré, carta a confirmar o pedido de cancelamento dos contratos - conforme documento junto a fls. 148 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
6.–A ré não procedeu ao pagamento das facturas.
7.–A autora cancelou os contratos a 8.10.2014.

Não provados.
a.-O aditamento de 06.03.2012, previa um aumento de 24 meses de permanência.
                                                           
ENQUADRAMENTO JURÍDICO.
I)– Impugnação da matéria de facto.
A apelante pretende que seja alterado o ponto 7 dos factos e ainda que a alínea v) do ponto 2 seja julgada não provada.
É a seguinte a redacção dos referidos pontos:
Ponto 7 - A autora cancelou os contratos a 8.10.2014.
Ponto 2 v) - Em 15.03.2013, um aditamento para troca de pontos por desconto em factura durante 20 meses – conforme documento junto a fls. 97/98 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
Quanto ao ponto 7, defende a apelante que deve ficar consignado que o cancelamento do contrato foi feito a seu pedido.
Mas esse facto já está provado no ponto 5 dos factos, onde consta que a autora enviou à ré a carta de fls 148 confirmando o pedido de cancelamento do contrato, lendo-se nessa carta a frase “confirmamos a recepção do seu pedido de desactivação (…)”.
Não há, assim, qualquer necessidade de alterar o ponto 7 dos factos provados.
Quanto à alínea v) do ponto 2, alega a apelante que impugnou o documento de fls 97/98 em que se funda a prova do referido facto e que o documento que assinou foi preenchido pela autora após a sua assinatura.
Contudo, embora impugnado, o documento é apreciado livremente pelo tribunal, não havendo prova nos autos de que o mesmo foi adulterado (nem a apelante a indica) e tendo a testemunha CS…, que trabalha para a autora, confirmado os aditamentos acordados, pelo que se deve manter o ponto 2, alínea v).
Improcede, pois a impugnação da matéria de facto.
                                                        
II)–Erro na forma de processo quanto ao pedido de pagamento da cláusula penal.
Nas suas alegações de recurso, a apelante vem arguir a cumulação ilegal de pedidos, nos termos dos artigos 37º e 555º do CPC, alegando que o procedimento de injunção se destina apenas à cobrança do valor das prestações do contrato devidas e não pagas, o que não inclui a cláusula penal, cujo valor não poderá ser pedido no presente processo.
A questão de saber se a cláusula penal pode ser reclamada no procedimento de injunção e, consequentemente, na acção judicial subsequente, tem sido discutida e alvo de tratamento jurisprudencial, mas, nos presentes autos, tal questão nunca foi invocada nos articulados, nem foi objecto de pronúncia pela 1ª instância, tratando-se de uma questão nova, arguida no presente recurso pela primeira vez.
Servindo os recursos para apreciar, confirmando ou revogando, as decisões da 1ª instância, não lhe compete decidir questões novas, não tratadas na 1ª instância, excepto se forem de conhecimento oficioso.
A invocada cumulação ilegal de recursos reconduz-se a um erro na forma do processo, defendendo a apelante, no caso concreto, a existência de erro na forma do processo relativamente ao pedido de condenação no pagamento da cláusula penal.
O erro na forma do processo, previsto no artigo 193º do CPC pode ser conhecido oficiosamente no despacho saneador, ou, se não houver despacho saneador, até à sentença final, nos termos do artigo 199º do mesmo código.
Deste modo, não tendo esta nulidade sido invocada antes da sentença, nem tendo sido apreciada até à sentença, está agora vedado o seu conhecimento pelo presente Tribunal, improcedendo, nesta parte, as alegações de recurso.   
                                                           
III)–Nulidade da cláusula penal por violação do regime do DL 56/2010 de 1/6.
Conforme resulta dos factos provados, a autora e a ré celebraram um contrato de prestação de serviços previsto nos artigos 1154º e seguintes do CC, onde foi acordado que a autora prestaria à ré serviços de telecomunicações, mediante o pagamento pela ré de contrapartida mensal, o qual por várias vezes foi alterado e aditado por acordo das partes.
O contrato cessou no dia 8 de Outubro de 2014, a pedido da ré, numa altura em que a mensalidade era de 382,56 euros (ponto 4 dos factos e facturas aí mencionadas) e em que, por acordo de 21 de Novembro de 2013, vigorava um aumento de 21 meses na obrigação de permanência do contrato, que findaria em Agosto de 2015 (ponto 3 dos factos).
Para além do valor reclamado de prestações não pagas, relativas aos meses de Agosto, Setembro e Outubro de 2014 (facturas referidas no ponto 4, de fls 110 e seguintes, de fls 126 e seguintes e de fls 138 e seguintes), que a ré não discute, a autora reclama o valor de 3 825,60 euros, correspondente a indemnização por cessação antecipada do contrato (factura de fls 138 e seguintes), montante que a ré já não aceita.
No contrato inicial, celebrado a 21 de Novembro de 2008, foi estipulado que, no caso de cessação antecipada do contrato, relativamente ao período de permanência, por iniciativa da ré, esta ficaria obrigada a pagar indemnização correspondente às mensalidades devidas até ao fim fixado para o contrato (ponto 2, alínea i) dos factos e documento aí mencionado de fls 62 e seguintes, nomeadamente fls 67).
Alega a ré que esta cláusula é nula por violação dos artigos 2º nº2 e 3 e 8º do DL 56/2010 de 1/6.
O DL 56/2010 de 1/6 veio estabelecer limites à cobrança de quantias pela prestação do serviço de desbloqueamento de equipamentos destinados a serviços de comunicações electrónicas, bem como pela rescisão do contrato durante o período de fidelização, estabelecendo, no seu artigo 2º nº1, a proibição de cobrança de qualquer contrapartida pela prestação do serviço de desbloqueamento destes equipamentos findo o período de fidelização e estabelecendo, no seu nº2, que, durante o período de fidelização, pela resolução do contrato, a cobrança pelo desbloqueamento dos equipamentos não pode ultrapassar os limites definidos na suas alíneas, estabelecendo ainda, no seu nº3, a proibição de cobrança de qualquer contrapartida, para além das fixadas no número anterior a título indemnizatório pela resolução do contrato durante o período de fidelização.
Por seu lado, o artigo 8º deste decreto-lei comina com nulidade qualquer convenção que contrariar o disposto nesse diploma.
Ora, como alega a apelada nas suas contra-alegações, o DL 56/2010 de 1/6 não é aplicável ao caso dos autos, por não se verificar o seu pressuposto, ou seja, a existência de prestação de serviços de desbloqueamento de equipamentos.
Mas o facto de não existirem estes equipamentos não obsta a que sejam convencionadas cláusulas destinadas a indemnizar a operadora no caso de cessação do contrato antes do termo acordado.
Simplesmente, quando a situação não integra o âmbito de aplicação do DL 56/2010, tais cláusulas contratuais estão reguladas na legislação geral sobre comunicações electrónicas, contida na Lei 5/2004 de 10/2 (estabelece o regime jurídico aplicável às redes e serviços de comunicações electrónicas e aos recursos e serviços conexos), mais precisamente no seu artigo 48º, sob a epígrafe de “contratos” – neste sentido, acórdão da RP de 13/05/204, p. 203179712, em www.dgsi.pt, proferido no âmbito da vigência da redacção do artigo 48º introduzida pela Lei 51/2011 de 13/9.
Na verdade, a Lei 5/2004 já sofreu diversas alterações e o artigo 48º, que nos interessa, tem actualmente a redacção da Lei 15/2016 de 17/6, que não é aplicável aos factos em apreço, datados de 2014, aplicando-se a redacção anterior, introduzida pela Lei 51/2011 de 13/9.

Este artigo 48º prevê então, no seu nº2 e na redacção da Lei 51/2011, que: “A informação relativa à duração dos contratos deve incluir indicação de períodos contratuais mínimos associados, designadamente, à oferta de condições promocionais, à subsidiação do custo de equipamentos terminais ou ao pagamento de encargos decorrentes da portabilidade de números e outros identificadores, bem como indicar eventuais encargos decorrentes da cessação antecipada do contrato por iniciativa do assinante, nomeadamente em consequência da recuperação de custos associados à subsidiação de equipamentos terminais”.

Exige-se, pois, que conste no contrato de prestação de serviços electrónicos a informação relativa à duração dos contratos, permitindo-se a fixação de limites mínimos de duração, justificados por benefícios concedidos ao assinante, como os promocionais, com a fixação da eventual sanção decorrente da cessação antecipada do contrato pelo assinante, como consequência da recuperação dos custos resultantes desses benefícios que lhe foram concedidos.

Assim, diferentemente do que sucede na redacção actual do artigo 48º, introduzida pela Lei 15/2016, que, no seu nº12, proíbe que a sanção pela cessação antecipada do contrato corresponda automaticamente à soma do valor das prestações vincendas à data da cessação, na redacção aplicável à data dos factos tal proibição não existia, exigindo-se apenas a fixação de eventual sanção, considerada uma consequência dos encargos decorrentes de benefícios atribuídos ao assinante.

No presente caso estando em vigor, à data da cessação do contrato por iniciativa da ré, um período de fidelização que só terminaria dez meses depois e que fora estabelecido em consequência da introdução de benefícios no tarifário (ponto 2, alínea vii) dos factos e documento aí mencionado, de fls 101, onde consta uma redução no tarifário), nada obstava à fixação de uma sanção contratual para a cessação antecipada do contrato, ao abrigo do artigo 48º da Lei 5/2004 e, face à redacção aplicável, introduzida pela Lei 51/2011, não é proibida, não sendo nula a cláusula em apreço com a sanção contratual correspondente às prestações vincendas até ao termo estipulado.        
                                                           
IV)–Nulidade da cláusula penal por desproporcionalidade
Alega também a apelante que a cláusula que contém a sanção contratual é nula, por ser desproporcionada.
Conforme se verifica dos vários aditamentos feitos ao contrato, mediante acordo das partes e que indiciam que as respectivas cláusulas foram objecto de negociação autónoma, não há fundamento para aplicação do regime geral das cláusulas contratuais gerais previsto no DL 446/85 de 25/10, pelo que haverá que apreciar a questão à luz do artigo 48º da Lei 5/2004 na redacção aplicável e dos artigos 810º a 812º do CC.
Assim, a cláusula em apreço, constituindo a fixação contratual do montante da indemnização por incumprimento, é uma cláusula penal prevista no artigo 810º do CC.
Como atrás se referiu, não sendo aplicável o regime do DL 446/85, nem a redacção actual da Lei 5/2004, a cláusula não é nula.
Estabelece, porém, o nº5 do artigo 48º da referida lei (na redacção da aplicável, da Lei 51/2011): “sem prejuízo da existência de períodos contratuais mínimos, nos termos do número anterior, as empresas não devem estabelecer condições contratuais desproporcionadas ou procedimentos de resolução dos contratos excessivamente onerosos e desincentivadores da mudança de prestação de serviço por parte do assinante”.

E, tendo a ré invocado expressamente essa desproporcionalidade, estatui o artigo 812º nº1 do CC que a cláusula penal pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva.

Recorrendo à equidade, haverá que atender, por um lado, ao período que ainda faltava para o termo do contrato e, por outro lado, que, apesar de o período de permanência que foi incumprido pela ré resultar de benefícios concedidos pela autora, esta não demonstrou qual medida em que a cessação antecipada do contrato a impede de recuperar os custos desses benefícios, sendo do senso comum que, com o recebimento da totalidade das prestações vincendas, a autora vai receber mais do que o reembolso desses custos, o que na prática contraria o regime do artigo 48º, pelo que, tudo visto, se conclui que é manifestamente excessivo o montante reclamado, devendo ser reduzido para metade, ou seja, para o valor de 1 912,00 euros (sem prejuízo do IVA que for devido).

Procedem, pois, parcialmente, as alegações de recurso.    
                                                           
DECISÃO:
Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a apelação e, consequentemente, fixa-se em 1 912,00 (mil novecentos e doze euros) o valor da cláusula penal devida pela ré à autora, alterando-se, nessa parte, a sentença recorrida, que se mantém no restante.
                                                            
Custas na 1ª instância na proporção do vencimento e na apelação na proporção de metade.  

  
                                                          
Lisboa, 2017-06-08


                                                                  
Maria Teresa Pardal                                                  
Carlos Marinho                                                            
Anabela Calafate             
Decisão Texto Integral: