Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
8318/18.0T8ALM.L1-2
Relator: NELSON BORGES CARNEIRO
Descritores: MATÉRIA DE FACTO
CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
DENÚNCIA DO CONTRATO
REMUNERAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/22/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – A impugnação da decisão de facto, feita perante a Relação, não se destina a que este tribunal reaprecie global e genericamente a prova valorada em 1.ª instância, razão pela qual, se impõe ao recorrente um especial ónus de alegação, no que respeita à delimitação do objeto do recurso e à respetiva fundamentação.
II – Não observa tal ónus o apelante que não identifica os pontos de facto que considera mal julgados, nem especificando os concretos meios de prova que impunham decisão diversa da recorrida.
III – Mediação é o contrato pelo qual uma parte (o mediador) se vincula para com a outra (o comitente ou solicitante) a, de modo independente e mediante retribuição, preparar e estabelecer uma relação de negociação entre este último e terceiros (os solicitados) com vista à eventual conclusão definitiva de negócio jurídico.     
IV – Não é de conceder uma presunção de facto quanto à verificação de nexo de causalidade entre a atividade da mediadora imobiliária, contratada em regime de exclusividade, e uma venda efetuada cerca de dez meses depois de denunciado o contrato de mediação, sendo essa denúncia efetivada nos termos contratualmente previstos.
V – Tal não exclui, porém, a verificação, no confronto da factualidade apurada, desse nexo de causalidade, fundamentando o direito à comissão acordada.
VI – O instituto da pós-eficácia das obrigações ou culpa post pactum finitum corresponde a um dever lateral de conduta de lealdade, no sentido de que a boa-fé exige, segundo as circunstâncias, que os contratantes, depois do fim da relação contratual, omitam toda conduta mediante a qual a outra parte se veria despojada ou essencialmente reduzida das vantagens oferecidas pelo contrato.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes da 2ª secção (cível) do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. RELATÓRIO
PRESTÍGIO NO INTERIOR, SOCIEDADE DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA, LDA, intentou ação declarativa de condenação sob a forma sumária contra FA…, MR…,  HA… e,  MJ… pedindo a condenação destes a pagarem as quantias de € 4750,00 (valor da comissão em dívida), acrescido de € 1092,50 (IVA, a suportar pela Autora), no total de € 5842,50, acrescidos dos juros de mora comerciais que, às taxas máximas aplicáveis sobre ela se vencerem desde a citação até integral reembolso e sempre nas custas legais.
Foi proferida sentença que condenou os réus a pagarem à autora a quantia de € 5842,50 (cinco mil oitocentos e quarenta e dois euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa de juro comercial sucessivamente em vigor, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.
Inconformados, vieram os réus apelar da sentença, tendo extraído das alegações[1],[2] que apresentaram as seguintes
CONCLUSÕES[3]:
1) Os Recorrentes não se podem conformar com a douta sentença, nem quanto aos seus fundamentos, nem quanto à análise da prova produzida em audiência de julgamento.   
2) Na presente ação a Autora e Recorrida apresentou um pedido em que pretendia que os Recorrentes fossem condenados a pagar a quantia de € 4.750,00, a título de valor de comissão, acrescido de € 1092,50 correspondente ao respetivo IVA, acrescidos dos juros de mora comerciais às taxas máximas aplicáveis, desde a citação até integral pagamento.
3) O Tribunal a quo veio a condenar os Recorrentes no pedido, o que desde logo não se entende como possível, e muito menos fundamentado de acordo com a realidade factual.
4) Por douto Despacho Saneador foi conferido como objeto do litígio o eventual incumprimento do contrato de mediação imobiliária, sendo que é de afirmar-se desde já de que o Tribunal a quo, a final, apenas se pronuncia sobre o que entende ser o incumprimento por parte dos Recorrentes, nada dizendo sobre o conteúdo do contrato de mediação imobiliária, e também o respetivo cumprimento por parte da Recorrida.
5) O Tribunal a quo, no seu douto julgamento, concluiu por uma decisão que, ou é mera presunção, ou se afasta da realidade, nem mesmo respeitando a cronologia dos factos.
6) Foi celebrado um contrato de mediação imobiliária com a sociedade Gaia e Fino – Sociedade de Mediação Imobiliária Lda. que posteriormente deu lugar à Autora e Recorrida, mas não existe no autos qualquer prova de pertença a grupo Remax, quando afinal todos os contactos têm endereço Remax, e possível cartaz publicitário colocado no imóvel objeto do contrato é Remax e não da Autora e Recorrida, o que tem enorme significado face ao invocado, e defendido pelo Tribunal na sua douta sentença de que se recorre e não mera questão de somenos.
7) O valor contratualizado entre as partes no contrato de mediação imobiliária, na data de 22 de dezembro de 2014, para a venda do imóvel propriedade dos Recorrentes, foi de € 150 000,00.
8) Durante mais de dois anos e meio nada foi feito, não sendo feita prova do contrário, quer em termos de propaganda no site da Autora, ou colocação em loja, ou publicitado de outra forma (facto 23).
9) Foi a Remax, e não a Autora e Recorrente, que anunciou on-line o imóvel por € 124 000,00, sem que alguma coisa fosse alterada no contrato de mediação, ou até mesmo comunicado aos vendedores, aqui recorrentes.
10) Nada foi comunicado, e os Recorrentes contactaram então o novo colaborador da Recorrida (JB…) que pretendiam rescindir o contrato, o que teria lugar quando no seu prazo para o efeito, já que antes não foi manifestada qualquer abertura, e era um contrato de exclusividade.
11) Não se pode entender que o Tribunal a quo não tenha tomado a devida nota, e com as consequências daí derivadas, de que tudo aparece como Remax, quando a Remax não é parte nos autos, nem se faz prova da sua relação com a Autora e Recorrida.
12) O Tribunal a quo tenta fazer uma ligação entre a rescisão do contrato de mediação e a não aceitação de uma proposta apresentada à pressa em 26 de abril de 2017, por PV…, questionando mais do que uma vez se foi mera coincidência, e parecendo querer substituir-se à parte (Recorrida) que teria de provar a relação causal entre a sua atividade (comprovadamente nada durante dois anos e meio) e os negócios que se seguiram à rescisão do contrato de mediação imobiliária.
13) O Tribunal a quo quer, substituindo-se à parte, fazer prova de que PV… celebrou escritura de compra e venda, um ano depois, em Abril de 2018, devido à atividade de mediação da Recorrida, que afinal não provou existir, nem mesmo a de procurar potenciais clientes (facto 23), e mais esquece que pelo meio há um contrato promessa de compra e venda celebrado com terceiro (MS…) na data de 1 de Julho de 2017, e o arrendamento do local para as eleições autárquicas, conforme Declarações de Parte, e que o Tribunal a quo nem faz menção.
14) Havia que fazer uma prova para uma tese, ainda que substituindo-se à parte que tinha a obrigação de fazer essa devida prova, e por isso o contrato promessa de compra e venda com MS… iria ser difícil de explicar em sede de fundamentação para uma  tese  de  eficácia  pós-contratual  das  obrigações,  algo  que  os  depoimentos contrapõem, os factos dificilmente aceitam, e os Recorrentes não podem ter por admissível, tendo em conta o que aconteceu no caso concreto.                                        
15) O Tribunal a quo não toma em devida nota, na sua douta fundamentação, e defesa da sua tese de eficácia pós-contratual, inaceitável no caso concreto, eventualmente porque afasta o contrato promessa de compra e venda entre os Recorrentes e MJo…, com data de 1 de julho de 2017, e se ocorre ter sido por conveniência, que nem em mera possibilidade, tanto mais que há um arrendamento interligado, foi recibo sinal, e nunca foi impugnado nem colocado em causa esse negócio.
16) Ainda assim o Tribunal a quo, para que vingue a sua tese de eficácia pós-contratual das obrigações (imaginativas no caso concreto, salvo o devido respeito), faz apelo, erradamente, a outros princípios como sejam os da boa fé e da lealdade negocial, que não se vislumbra como sejam aplicáveis aos Recorrentes no caso concreto, e de que a Autora e Recorrida não invocou, nem fez prova salvo o devido respeito.
17) Sendo a existência desse contrato promessa atestado pelo depoimento do próprio MJo…, que também comprova, ter pago o montante de € 8000,00 a título de sinal.
18) Não se pode aceitar a conclusão de alguma forma simplista, com todo o respeito, quando o Tribunal a quo conclui que «assim sendo, constata-se que, in casu, os Réus vieram a obter um inequívoco benefício da atividade da Autora, vendendo a casa à interessada que a Autora localizou na sequência das promoções por si desenvolvidas»
19) Ora nada mais contraditório, quando o Tribunal a quo considera não provado que a Autora e Recorrida tenha feito promoções ou qualquer outra publicidade (facto 23) e depois conclua da forma como faz, a saber que a interessada que encontrou JB… e lhe pediu para ver a casa por dentro em Abril de 2017, e não o contrário, como aqui também afirma o Tribunal a quo, pois nada fez a Autora e Recorrida para esta pessoa falar com o seu colaborador, a não ser o cartaz da Remax, não da Recorrida, que se encontrava no Imóvel e que, conforme a transcrição do depoimento de PV… viu e resolveu falar com o dito colaborador no café dos seus pais, não sendo comprovadamente localizada pela Recorrida, como quer fazer crer o Tribunal a quo na sua douta sentença, e afinal com a mencionada contradição do facto 23.
20) Enfim PV… é que procurou JB… e não o contrário, por qualquer atividade da Recorrida ou na sequência de promoções por ela desenvolvidas.
21) Sendo que a este propósito não demonstra o Tribunal a quo de que atividades se refere, e de que promoções tem presentes, ao afirmar o que afirma na douta sentença, e que tenham sido desenvolvidas pela Recorrida, pois não está conforme nem com os depoimentos, nem com a matéria factual dada como provada e não provada pelo Tribunal a quo.
22) O Tribunal a quo tinha obrigação de conhecer e ter presente os diferentes depoimentos, que considerou como sendo credíveis, para além da documentação que consta nos autos, e não simplesmente afastar o contrato promessa de compra e venda celebrado com MS…, em 1 de julho de 2017, após a rescisão do contrato de mediação imobiliária com a Recorrida.
23) Também o Tribunal a quo devia ter presente, face aos diferentes depoimentos que se confirmam, e aliás que se confirma em factos dados como provados, de que as tentativas de abordagem dos Recorrentes, e em especial FC…, por parte de PV…, revelaram-se então sem sucesso (facto 20).
24) Sendo que o Tribunal a quo, não se substituindo à parte aqui recorrida, e ao fazer tais afirmações, teria que ser especifico, explicando na sua douta fundamentação como os Recorrentes se beneficiaram, e como tiraram proveito ulterior da atividade desenvolvida pela Recorrida, e que atividade foi mesmo desenvolvida em cumprimento do contrato de mediação imobiliária.
25) Não é suficiente dizer algumas conclusões, que podem parecer evidentes, mas que depois, confrontadas com os diferentes depoimentos aqui transcritos nas presentes Alegações, ou mesmo na matéria dada como provada e não provada manifestam-se claramente em contradição.
26) Aliás, em novembro de 2017, os Recorrentes recusaram a abordagem direta com deslocação de Arronches a Almada da parte de PV…, mais de seis meses depois de recusar uma proposta, aliás proposta sem sentido na altura, tendo em conta o teor do contrato de mediação imobiliária então em vigor.
27) Tanto mais que nesse momento cronológico (novembro de 2017) existia um contrato promessa de compra e venda e um arrendamento para as eleições autárquicas, e se esse contacto de PV… resultasse da atividade da Autora e Recorrida, teria que ser demonstrado, o que salvo o devido respeito não foi partindo o Tribunal a quo de uma presunção, ou eventualmente nem de tal conceito, mas se calhar de mera miragem, para fundamentar a tese da eficácia pós-contratual de obrigações.
28) E só assim se pode entender quando posteriormente em fevereiro/março de 2018 numa outra abordagem, e já com a rescisão do contrato promessa então existente (facto 19) e devolução do sinal em dobro (€ 16 000,00), vieram os Recorrentes e PV… iniciar a negociação e celebrar escritura de compra e venda em abril de 2018 (facto 21).
29) Arronches tem cerca de 1900 habitantes, não é Lisboa ou outra cidade, sendo que todos ali se conhecem, e as abordagens tornam-se bem mais fáceis, em especial quando um dos Réus, HC… ali reside desde sempre.
30) Logo não havendo qualquer sucesso no negócio conforme provado, em contactos anteriores por parte de PV…, passado praticamente um ano, conseguiu esta então iniciar a negociação para concretizar a outorga da escritura na data já mencionada (facto 21).
31) Ora o Tribunal a quo considera na sua conclusão, sem qualquer fundamento, de que esta escritura, depois de todos os circunstancialismos descritos até Abril de 2018, resultaram da atividade da Recorrida, porque subjetivamente (Tribunal a quo menciona objetivamente o que é inaceitável tal expressão) esse tempo de quase um ano não é suficiente para afastar os efeitos pós-contratuais, e daí se questiona para o Tribunal a quo, o que seria hiato temporal suficiente para afastar uma atividade que nunca existiu por parte da Recorrida, como demonstrado no conteúdo das presentes Alegações, 14 meses, 18 meses, 24 meses.
32) Tal não faz qualquer sentido, nem existe fundamento para a dita tese de eficácia pós-contratual, pois sempre esquece o Tribunal a quo que entre 1 de julho de 2017 e 12 de janeiro de 2018 existia um contrato promessa de compra e venda e um arrendamento do imóvel, outorgado de livre vontade entre as partes (Recorrentes e MS…), logo não há qualquer possibilidade de querer encontrar um nexo causal esticando o conceito de tempo e ligando a qualquer atividade inexistente.
33) Aliás se alguém não cumpriu o contrato de mediação imobiliária não foram os Recorrentes, pois foi a Recorrida que nada fez, que não promoveu o imóvel que nunca fez qualquer visita ao local com potenciais clientes, ou apresentou proposta para aquisição, não respeitou o preço acordado, deixando o tempo passar e o imóvel sofrer a degradação temporal, que abusou do direito ao proceder como o fez durante mais de dois anos e meio.
34) Para mais, conforme depoimento de PV…, aqui transcrito, o colaborador da Autora e Recorrida, JB…, nada mais fez, não houve qualquer contacto, não a abordou ou tentou fazer quaisquer perguntas sobre a possibilidade de negócio, nada mais existiu, nem nunca mais houve conversa ou foi abordada sobre o assunto da visita ao imóvel de abril de 2017.
35) Assim da parte dos Recorrentes estes não deram quaisquer passos, não motivaram qualquer contacto, não tentaram qualquer negócio, recusaram abordagens, antes celebraram contrato promessa de compra e venda e também arrendamento, contrato promessa nos autos, nunca impugnado, quer quanto à forma, quer quanto ao conteúdo ou momento de celebração.
36) E contrário ao afirmado pelo Tribunal a quo, sem qualquer demonstração, os Recorrentes não tiraram qualquer benefício da atividade de mediação da parte da Recorrida, que como se concluiu não existiu, e que contribuiu apenas para uma degradação do imóvel em dois anos e meio sem nada se fazer, e a sua desvalorização, não colhendo a tese da eficácia pós-contratual, que o Tribunal a quo queria levar a bom porto, sem o mínimo sucesso, tendo em conta os factos cronológicos e os diferentes depoimentos em audiência de julgamento.
37) Em sede do Direito, os Recorrentes têm por importantes, e assim as destacam, ainda que não as repitam, porque estão contidas nas presentes Alegações, as citações efetuadas da sábia Jurisprudência, e acrescidas das menções doutrinais.
38) Mais entendem os Recorrentes de que o Tribunal a quo faz uma errada aplicação, sem fundamento, dos conceitos de eficácia pós-contratual das obrigações, da boa fé e da lealdade negocial.
39) Mais encontrando que o Tribunal a quo viola as menções que faz dos artigos do DL. 211/2004 de 20 de agosto, em especial artigos 2º número 2, 18º e 19º, por o fazer com um fundamento que não se compadece com a matéria factual, os diferentes documentos nos autos, e os depoimentos aqui transcritos.
40) Mais entendem os Recorrentes que o Tribunal a quo viola o conteúdo do artigo 342º, número 1 do CC, quando substitui-se à parte tentando que se considere provado, o que afinal assim não aconteceu, nem por alegado, nem por prova testemunhal ou documental, incluindo-se aqui a demonstração da atividade da Recorrida ou da Remax, tendo-se pela existência de alguma atividade se feita essa demonstração, pois a menção nos autos apenas existe uma, a saber de um cartaz Remax, e sem demonstração no caso concreto quem afinal fez essa simples e única publicidade, masque não fica demonstrado nos autos que tenha sido a Autora e Recorrida, salvo o devido respeito.
41) Finalmente entendem os Recorrentes que o Tribunal a quo mais conseguiu aplicar erradamente, salvo o devido respeito que é muito, os artigos 406º, número 1 e 798º ambos do CC, pelo já demonstrado, e face ao alegado haveria de se concluir quem afinal não cumpriu o contrato de mediação imobiliária, quanto ao seu conteúdo, forma e tempo.
42) A doutrina e Jurisprudência mencionadas nas presentes Alegações são reveladores da aplicação do direito, e do contradito, face à douta decisão de que se recorre.
43) Perante o conteúdo das presentes Alegações, e tendo em conta as suas conclusões, entendem os Recorrentes que só pode proceder o presente recurso, revogando-se a douta sentença nos seus precisos termos, e substituindo-a por decisão absolva os Réus e Recorrentes.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas.,
a. Deverá proceder o presente Recurso de Apelação;
b. Deverá revogar-se a sentença de que se recorre, absolvendo os Réus e Recorrentes nos precisos termos.
A autora contra-alegou, pugnando pela improcedência da apelação dos réus.
Colhidos os vistos[4], cumpre decidir.
OBJETO DO RECURSO[5],[6]
Emerge das conclusões de recurso apresentadas por FA…, MR…, HA… e, MJ…, ora apelantes, que o seu objeto está circunscrito às seguintes questões:
1.) Reapreciação da matéria de facto.
2.) Saber se é devida a quantia peticionada a título de remuneração, no âmbito de contrato de medição imobiliária extinto após denúncia por parte dos clientes.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. FACTOS PROVADOS NA 1ª INSTÂNCIA
1. A Autora é uma sociedade comercial por quotas que se dedica à atividade de mediação imobiliária.
2. Os Réus FC… e HC… são os únicos e universais herdeiros
da herança aberta por óbito de FA… e MA…, herança que era composta, designadamente, pelo bem imóvel sito na Rua …, … e Rua …, Bairro …, em Arronches, descrito na conservatória do registo predial de Arronches sob o nº …, freguesia da Assunção e inscrito na matriz predial rústica com o artigo … da freguesia de Arronches.
3. Por escrito denominado “contrato de mediação imobiliária”, datado de 22 de
Dezembro de 2014 e ao qual foi atribuído o n.º …/2014, a Autora acordou com os Réus diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra do prédio pertencente aos RR., acima descrito, pelo preço de €150 000 (cláusulas 1ª e 2ª do escrito).
4. Como contrapartida, foi acordado que os RR pagariam à Autora o correspondente
a 5% do valor da venda, acrescida de IVA à taxa legal em vigor (cláusula 5ª do escrito).
5. O acordo foi celebrado em regime de exclusividade (cláusula 4ª do escrito).
6. O acordo tem uma validade de 6 meses contados a partir da data da sua celebração, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não seja denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de receção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de 10 dias em relação ao seu termo (cláusula 8ª do escrito).
7. Na vigência do acordo, a Autora divulgou a venda do imóvel no sítio da internet
www.remax.pt e colocou cartazes publicitários no prédio.
8. Em data concretamente não apurada, PI… através dos
cartazes de publicidade afixados no imóvel, tomou conhecimento que o mesmo estava para venda.
9. Em 26 de Abril de 2017, a Autora mostrou o imóvel a PI…, a qual apresentou propostas de compra por valor inferior, propostas que a Autora transmitiu aos RR.
10. A primeira proposta, no montante de 70 000€, foi recusada pelos Réus, a 28 de
Abril de 2017.
11. Na mesma data acima referida, o Réu FC… informou a Autora que
apenas equacionariam a aceitação de uma proposta a partir de 95 000€.
12. A interessada P…, por intermédio do mediador imobiliário da Autora, JB…, apresentou nova proposta, no montante de €95 000.
13. Essa proposta foi recusada pelos RR, em 17 de julho de 2017.
14. Em 18 de Maio de 2017, o Réu FC… remeteu à Autora o seguinte email: “Serve o presente para desta forma levar ao conhecimento de V. Exas a intenção de desde já rescindir qualquer vínculo contratual que com fundamento jurídico bastante possa existir para a venda do imóvel, minha propriedade e supra referenciado, sito em Arronches”.
15. Em data posterior a 9 de junho de 2017, a Autora retirou os placares de publicidade afixados no imóvel.
16. Não obstante, os Réus continuaram com a intenção de vender o imóvel.
17. Em data concretamente não apurada, mas posteriormente a 18 de maio de 2017, a
interessada P… contactou diretamente com os RR. com o intuito de iniciar negociações para compra do imóvel.
18. Em 10 de Agosto de 2017, foi celebrado contrato promessa de compra e venda,
referente ao imóvel, outorgado entre os Réus e MJo….
19. O contrato-promessa de compra e venda veio a ser incumprido pelos RR. em 12
de janeiro de 2018, não se tendo realizado o negócio de compra e venda do prédio.
20. Em data não concretamente apurada, mas no mês de novembro de 2017, PV… propôs a entrega ao Réu F…, de um cheque, no valor de €10 000, que foi recusado por este último.
21. Por escritura pública celebrada a 5 de abril de 2018, em que foram intervenientes
os RR. e PI…, os primeiros declararam vender à última o bem imóvel melhor identificado em 2) pelo preço de 95 000€.
22. Naquele mesmo dia 5 de abril de 2018, PI… inscreveu a
seu favor o registo de aquisição do imóvel na Conservatória do Registo Predial de Arronches, sob a AP. 1401 de 2018/04/05.
2.2. FACTOS NÃO PROVADOS NA 1ª INSTÂNCIA
23. A Autora publicitou o imóvel no seu site, em publicidade de montra de loja e em
revista de publicidade do grupo REMAX.
24. Os RR e PV… acertaram os termos do negócio de compra e venda do imóvel em data anterior a 18 de maio de 2017.
2.3. O DIREITO
Importa conhecer o objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso[7].          
1.) REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO.   
A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa – art. 662º, nº 1, do CPCivil.
Pretendeu a Reforma de 2013, “reforçar” os poderes da 2ª instância em sede de reapreciação da matéria de facto impugnada. Assim, a Relação, para além de manter os poderes cassatórios (ou de anulação) da decisão recorrida decorrente de uma fundamentação indevida, insuficiente, obscura ou contraditória, passou a ver substancialmente incrementados os poderes-deveres de reapreciação fáctica, ordenado, quer a renovação (repetição) dos meios de prova pessoal, quer a produção de novos meios de prova”. Poderes esses (de utilização oficiosa), não só de caracter inquisitório, como também de carácter instrutório, em ordem ao proclamado e aludido desideratrum do alcance da verdade material[8].
A reapreciação, por parte do tribunal da 2.ª instância, da decisão de facto impugnada não se deve limitar à verificação da existência de erro notório, mas implica uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, pelo tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para só, em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do erro invocado, mantendo ou alterando os juízos probatórios em causa[9].
No âmbito dessa apreciação, dispõe o Tribunal da Relação de margem suficiente para, com base na prova produzida, em função do que for alegado pelo impugnante e pela parte contrária, bem como da fundamentação do tribunal da 1.ª instância, ajustar o nível de argumentação probatória de modo a revelar os fatores decisivos da reapreciação empreendida[10].
Porque necessariamente gravados os depoimentos prestados na audiência final (art. 155º), bem como (gravados e/ou registados os prestados antecipadamente ou por carta – art. 422º, nºs 1 e 2), pode a Relação reapreciar e reponderar a prova produzida sobre a qual haja assentado a decisão impugnada, atendendo aos elementos indicados, em ordem a formar a sua própria e autónoma convicção sobre o material fáctico (resultado probatório) processualmente adquirido[11].
Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas - art. 640º, nº 1, als. a), b) e c), do CPCivil.
A não satisfação destes ónus por parte do recorrente implica a rejeição imediata do recurso[12].
Ele (recorrente) tem de especificar obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da adotada pela decisão recorrida[13].
Parece ter sido deliberado propósito do legislador não instituir, nesta sede, qualquer convite ao aperfeiçoamento da alegação a dirigir ao apelante. A lei é a este respeito imperativa, ao cominar a imediata rejeição do recurso, nessa parte, para a falta de incumprimento pelo recorrente do referido ónus processual[14].
Não cumprindo o recorrente os ónus do artigo 640º, n.º 1 do CPCivil, dever-se-á rejeitar o seu recurso sobre a matéria de facto, uma vez que a lei não admite aqui despacho de aperfeiçoamento, ao contrário do que sucede quanto ao recurso em matéria de direito, face ao disposto no art. 639º, nº 3 do mesmo código.
Como resulta claro do art. 640º, nº 1, do CPCivil, a omissão de cumprimento dos ónus processuais aí referidos implica a rejeição da impugnação da matéria de facto. O que denega, de todo em todo, a ideia da possibilidade de prolação de um despacho de aperfeiçoamento. Manifestamente que a lei não quis impasses e tergiversações em matéria de impugnação do julgamento dos factos, impondo neste domínio rigor e autorresponsabilidade à parte recorrente. Aliás, só pode ser aperfeiçoado o ato processual da parte que, tendo sido praticado, se apresente como deficiente, obscuro ou complexo. Não o ato processual que pura e simplesmente não foi praticado, e seria o caso[15].
A cominação da rejeição do recurso, prevista para a falta das especificações quanto à matéria das alíneas a), b), e c), do n.º 1, ao contrário do que acontece quanto à matéria do n.º 2 do art. 640.º do CPCivil (a propósito da «exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso»), não funciona automaticamente, devendo o Tribunal convidar o recorrente a suprir a falta de especificação daqueles elementos ou a sua deficiente indicação[16].
Dever-se-á usar de maior rigor na apreciação da observância do ónus previsto no n.º 1 do art. 640.º (de delimitação do objeto do recuso e de fundamentação concludente do mesmo), face ao ónus do n.º 2 (destinado a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes, que tem oscilado em exigência ao longo do tempo, indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização exata das passagens da gravação relevantes)[17].
O ónus atinente à indicação exata das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, pelo que a falta de indicção, com exatidão, só será idónea a fundamentar a rejeição liminar se dificultar, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório, ou o exame pelo tribunal, sob pena de ser uma solução excessivamente formal, rigorosa e sem justificação razoável.
No recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorretamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa, relativamente a esses factos, e enuncie a decisão alternativa que propõe. Servindo as conclusões para delimitar o objeto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objeto de impugnação; quanto aos demais requisitos, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso[18].
Nas conclusões das suas alegações, basta que o recorrente refira, de forma sintética, os pontos de facto que considera incorretamente julgados e a resposta alternativa que, em sua opinião, se impõe, não cabendo ao recorrente voltar a cumprir nessas conclusões o ónus de indicar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem uma diversa decisão sobre aqueles pontos[19].
Acresce dizer que a apresentação de transcrições globais dos depoimentos das testemunhas não satisfaz a exigência determinada pela al. a), do n.º 2, do art. 640.º do CPCivil, o mesmo sucedendo com o recorrente que procede a uma referência genérica aos depoimentos das testemunhas considerados relevantes pelo tribunal para a prova dos factos, sem única alusão às passagens dos depoimentos de onde é depreendida a insuficiência dos mesmos para formar a convicção do juiz.
Vejamos se os apelantes, tendo impugnado a decisão proferida sobre a matéria de facto, cumpriram os ónus de especificação/identificação a que se referem os nºs 1 e 2, do art. 640º, do CPCivil.
Os apelantes nas suas alegações entendem que ““não colhe a fundamentação onde vem ancorar a matéria de facto, sendo que não se colocando em crise as respostas dadas, já não se pode entender como o Tribunal a quo consegue extrair dessa respostas e da matéria em causa, as conclusões onde depois fundamenta as suas teses do direito que pretende fazer vencer, sem razão, e apenas acreditando subjetivamente (não tomando em conta o conteúdo de alguns depoimentos) de que os Recorrentes retiraram benefícios de uma visita (única visita) ao imóvel”.  
Assim, os apelantes não cumprem os ónus de especificação/ identificação a que se referem os nºs 1 e 2, do art. 640º, do CPCivil, pois ao alegarem que “não se colocando em crise as respostas dadas”, além de não indicarem os pontos de facto que considera incorretamente julgados, também não indicam os concretos meios probatórios, que, em sua opinião, impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto adotada pela decisão recorrida, verdadeiramente, não impugnam as respostas dadas.
O que os apelantes discordarem é da interpretação e conclusão que o tribunal a quo faz dos factos provados, e não, propriamente, das respostas dadas à matéria de facto (“Pelo que não colhe a interpretação que o Tribunal a quo faz dos factos, e muito menos do que conclui deles, porque contrários à realidade, realidade essa que ele próprio reconhece nos factos dados como provados e não provados”).
Temos, pois, que os apelantes, nas suas alegações (e nem o fazem nas suas conclusões) de recurso, não só não especificam os concretos pontos de facto que consideram incorretamente julgados, como também não indicam os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (e nem o fazem nas conclusões de recurso), como também não indicam a decisão que, no seu entender, deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (e nem o fazem nas conclusões de recurso).
Não especificando os apelantes os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, nem os concretos meios probatórios constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que em sua opinião, impunham decisão diversa da recorrida, nem a decisão que, no seu entender, deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, não cumpriram os ónus de especificação/identificação a que se referem as als. a), b) e c), do nº 1, e al. a), do nº 2, do art. 640º, CPCivil, pelo que,  não pode esta Relação reponderar a prova produzida em que assentou a decisão impugnada[20],[21].
Concluindo, nesta parte, não se conhece do recurso, pois não constam das conclusões da apelação (nem das alegações de recurso), os concretos pontos de facto considerados incorretamente julgados, nem os concretos meios probatórios constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que em sua opinião, impunham decisão diversa da recorrida, nem a decisão que, no seu entender, deveria ser proferida sobre as questões de facto, nos termos estatuídos no art. 640º, do CPCivil[22] (sendo deste modo irrelevante a suscitada questão prévia).
Deste modo, não importa, pois, alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto e que ficou consagrada no julgamento efetuado em instância, pois não se mostra verificado o condicionalismo previsto no n.º 1, do art. 662º, do CPCivil.
Destarte, nesta parte, improcedem as conclusões 1) a 36) da apelação.
2.)  SABER SE É DEVIDA A QUANTIA PETICIONADA A TÍTULO DE REMUNERAÇÃO, NO ÂMBITO DE UM CONTRATO DE MEDIÇÃO IMOBILIÁRIA EXTINTO APÓS DENÚNCIA POR PARTE DOS CLIENTES.
Contrato de mediação imobiliária
Noção
A atividade de mediação imobiliária consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis – art. 2º, nº 1, da Lei n.º 15/2013, de 08-02, que estabelece o regime jurídico a que fica sujeito o acesso e o exercício da atividade de mediação
imobiliária.
O contrato de mediação constitui um contrato atípico com natureza similar a uma subespécie do contrato de prestação de serviços. No ordenamento jurídico português, o contrato de mediação encontra-se regulado apenas em relação a algumas categorias de atividade, tais como: a mediação de seguros (DL 144/2006, de 31 de julho), imediação imobiliária (Lei 15/2013, de 8-02) e mediação financeira (artigos 289º e seguintes do CVM).
Mediação significa o ato ou efeito de aproximar voluntariamente duas ou mais pessoas, de modo a que, entre elas, se estabeleçam negociações que possam conduzir à celebração de um contrato definitivo. Em sentido técnico ou estrito, a mediação reclama ainda que o mediador não represente nenhuma das partes a aproximar[23].
Mediação é a intermediação entre o comprador e o vendedor, ou entre as partes num outro tipo de negócio, em que o intermediário – o mediador – aproxima as partes no negócio, põe-nas em presença, por vezes até intervém na negociação para o promover, mas não participa no negócio. O mediador é um facilitador, não atua por conta de nenhuma das partes, embora contratado por uma delas, mas nunca representa qualquer delas no negócio que vem a ser celebrado[24].
Mediação é o contrato pelo qual uma parte (o mediador) se vincula para com a outra (o comitente ou solicitante) a, de modo independente e mediante retribuição, preparar e estabelecer uma relação de negociação entre este último e terceiros (os solicitados) com vista à eventual conclusão definitiva de negócio jurídico.
Assim, para que exista essa mediação, tem o mediador que ter recebido uma incumbência, expressa ou tácita, para certo negócio. Ou seja, tem que haver um acordo entre mediador e solicitante no sentido de o primeiro servir de intermediário num ou mais contratos a celebrar pelo último com terceiros, preparando e aproximando as respetivas partes, devendo a conclusão do negócio entre o comitente e o terceiro ser consequência da atividade do mediador/intermediário[25].
Pode pois definir-se o contrato de mediação como aquele pelo qual uma das partes se obriga a promover, de modo imparcial, a aproximação de duas ou mais pessoas, com vista à celebração de certo negócio, mediante retribuição[26],[27],[28],[29].
A atividade do mediador consiste essencialmente na prática de atos materiais, tendentes a favorecer o encontro de eventuais contraentes e a celebração do negócio em causa. Essa atividade tem, pois, carácter necessariamente pluridireccional, dirigindo-se a um resultado que envolve, pelo menos, duas pessoas[30].
Trata-se de um contrato bilateral e oneroso, pois o mediador obriga-se a procurar interessado e a aproximá-lo do comitente para a realização do negócio no sector imobiliário e este último obriga-se a remunerá-lo pelo serviço prestado.
Não constitui obrigação do mediador concluir o contrato, pois a sua obrigação essencial é a de conseguir interessado para certo negócio, sendo indiferente que este intervenha na fase final do negócio.
A obrigação fundamental do mediador é conseguir interessado para certo negócio que, raramente, conclui ele próprio. Limita-se a aproximar duas pessoas e a facilitar a celebração do contrato, podendo a sua remuneração caber a ambos os contraentes ou apenas àquele que recorreu aos seus serviços[31].
Contrato de mediação imobiliária será aquele pelo qual uma empresa de mediação imobiliária assume a incumbência (nalguns casos, assumindo mais que isso: uma obrigação – cfr. contrato com cláusula de exclusividade) de procurar, para os seus clientes, destinatários para a efetivação de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, a permuta ou arrendamento dos mesmos, ou o trespasse ou cessão de posição em contratos que tenham por objeto bens imóveis, mediante remuneração, esta devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação[32].
São elementos caracterizadores do contrato de mediação a obrigação de aproximação de contraentes; atividade tendente à celebração de negócio; imparcialidade; ocasionalidade; e retribuição, sendo a interposição do mediador entre os possíveis contraentes um elemento necessário para a verificação da relação de mediação e consistindo a atividade do mediador, essencialmente, na prática de atos materiais com carácter necessariamente pluridireccional e tendentes a favorecer o encontro de eventuais contraentes e a celebração do negócio em causa[33].
Para que se possa considerar ter sido celebrado contrato de mediação imobiliária, importa que exista uma relação jurídico-contratual de natureza civil ou comercial, através da qual o mediador tenha sido, expressa ou tacitamente incumbido pelo comitente de obter interessado para a celebração de um negócio[34].  
No contrato de mediação uma das partes (o mediador) obriga-se, em troca de uma remuneração, a promover ou facilitar a celebração de um determinado contrato entre outra parte e um terceiro que terá de buscar o efeito, ou seja, a mediação visa colocar duas partes numa relação entre si para efeitos de celebração futura de um contrato qualquer que este seja (compra e venda, mútuo, seguro, etc.)[35].
O contrato de mediação imobiliária é uma modalidade de contrato de prestação de serviço, especialmente tipificado na lei, pelo qual uma das partes se obriga, mediante remuneração, a conseguir interessado para certo negócio e a aproximar esse interessado da outra parte, de modo a que entre elas se estabeleçam negociações conducentes à celebração de um contrato definitivo. Assim, a obrigação do mediador é a de encontrar um terceiro com quem o contrato visado venha a ser celebrado, pelo que o fim da mediação só é alcançado com a concretização desse negócio com a entidade angariada[36].
Retribuição
A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra – art. 19º, nº 1, da Lei n.º 15/2013, de 08-02.
É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel – art. 19º, nº 2, da Lei n.º 15/2013, de 08-02.
No contrato de mediação imobiliária a regra é a de que a remuneração da empresa mediadora só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, ou seja, que a comissão do mediador apenas é devida quando a sua atividade tenha contribuído, de forma determinante, para a celebração (e perfeição) do negócio, por via da aproximação do comitente com terceiros para o efeito[37].
A remuneração do mediador é independente do cumprimento do contrato, diversamente do que sucede com a retribuição do agente, podendo exigi-la logo que o mesmo seja celebrado[38].
Tendo a mediadora direito à remuneração desde que conseguisse um interessado que concretizasse o negócio, como efetivamente aconteceu, está o réu obrigado ao pagamento da remuneração estabelecida no acordo[39].
A remuneração do mediador só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação e com a venda ao cliente angariado pelo mediador. Para tanto, deverá o mediador demonstrar que o comprador foi angariado por si ou que a venda em causa, apesar de ter sido feita a um terceiro, foi-o simuladamente, para encobrir o verdadeiro comprador - o cliente angariado pelo mediador[40].
O mediador mantém o direito à remuneração, ainda que a venda se tenha efetuado por valor inferior ao que os réus pretendiam no contrato de mediação, pois o negócio visado era a venda das frações autónomas, sendo o preço apenas um dos elementos do negócio, na inteira disponibilidade do vendedor[41].
Para que a mediadora tenha direito à remuneração acordada não basta, no entanto, que o interessado com quem vem a ser celebrado o negócio a tenha contactado, tal como não basta que o tenha acompanhado numa visita ao imóvel, ainda que tenham sido esse contacto e essa visita que despoletaram nesse terceiro o interesse no negócio que, mais tarde, se veio a concretizar. Para que a mediadora tenha direito a tal remuneração será ainda necessário que tenha apresentado esse interessado ao seu cliente (ainda que seja pelo mero fornecimento da identificação das pessoas que a contactam e às quais proporciona uma visita ao imóvel) ou que, de qualquer forma, tenha potenciado ou facilitado o contacto entre ambos, promovendo a sua aproximação, já que é este o cerne da mediação e o conteúdo essencial da prestação a que se obrigou pelo contrato de mediação[42].
A existência de um contrato de mediação em regime de exclusividade autoriza a presunção (de facto) de que a atividade da empresa mediadora contribuiu para a aproximação entre o comitente e terceiros, facilitando o negócio (ou seja, presunção de existência do nexo causal), sendo devida a remuneração[43].
Nexo de causalidade entre a atividade de mediação e o contrato celebrado
O mediador, no contrato de mediação imobiliária, só tem direito à remuneração convencionada com o comitente/ cliente se o negócio visado (constituindo objeto legal da sua atividade de mediação) vier a ser concluído/concretizado e desde que a celebração deste tenha sido o corolário ou a consequência da sua atividade – exigindo-se um nexo causal entre a sua atuação (no âmbito da mediação) e a outorga do contrato visado (competindo ao mediador a alegação e prova dos pressupostos do seu direito, particularmente da verificação desse mesmo nexo causal). Isto é, o direito à remuneração implica a execução da prestação contratual a que o mediador se obrigou, nomeadamente a prática dos atos adequados a conseguir que seja atingido o objetivo do contrato – a concretização e perfeição do negócio visado com a mediação[44].
Não é de conceder uma presunção de facto quanto à verificação de nexo de causalidade entre a atividade da mediadora imobiliária, contratada em regime de exclusividade, e uma venda efetuada mais de um ano depois de denunciado o contrato de mediação, sendo essa denúncia efetivada nos termos contratualmente previstos. Tal não exclui porém a verificação, no confronto da factualidade apurada, desse nexo de causalidade, fundamentando o direito à comissão acordada[45].
No contrato de mediação imobiliária, a remuneração só é devida se houver uma relação causal entre a atuação do mediador e a conclusão e perfeição do contrato. Se há uma relação causal entre a atividade da mediadora que angariou um cliente e a compra que este veio a fazer do imóvel cuja venda se visava com a mediação, não obstante esta ter sido levada a cabo depois de ele ter referido não estar interessado no negócio e de ter sido denunciado o contrato de mediação, o STJ só pode apreciar se, em abstrato, tal atividade era adequada à efetivação da venda[46].
Quanto aos requisitos que devem revestir o nexo causal, neste tipo de contrato, tendentes à sua adequada delimitação, defende-se na doutrina e jurisprudência mais abalizadas que devem ser considerados os seguintes: a) a atividade do mediador deve fazer parte das causas próximas e imediatas da conclusão do negócio; b) é preciso que a atividade do intermediário tenha carácter consciente e voluntário, seja prestada animus adimplendi contractus, por modo que o efeito causal não se produza só fortuitamente; c) não é necessário que a atividade do mediador seja contínua e ininterrupta, que o mediador tenha participado em todas as tentativas e até à fase conclusiva do negócio: o efeito causal da obra do mediador pode, de facto subsistir sem aquela continuidade e sem esta participação[47].
O nexo causal necessário à atribuição à mediadora do direito à comissão não exige que a sua atividade, com vista à consecução do negócio, seja contínua e ininterrupta, no sentido de que tenha participado em todas as tentativas até à sua fase conclusiva, antes sendo apenas necessário que ela indique a pessoa disposta a fazer o negócio e consiga a sua adesão à celebração deste; e competindo ao comitente a prova de factos interruptivos de tal nexo[48].
Pode considerar-se assente que o conceito de causalidade não implica que a atividade do mediador, para como tal se deva considerar, não possa conduzir a outro resultado senão à feitura do negócio, não se tratando de aplicar a teoria da causalidade adequada. Por exemplo se o mediador consegue um comprador e este está disposto a adquirir por determinado preço – inferior ao combinado entre o incumbente e o mediador[49] – e o comitente não aceita, mas posteriormente vem a concluir o negócio com o mesmo (indicado) comprador, já sem a intervenção do mediador, este autor estima que este tem o direito à perceção da remuneração. Ocorrendo, no entanto, que o contrato é abandonado e, “depois, com superveniência de circunstâncias novas e em condições modificadas a ele volta e o conclui, diretamente ou por meio de outro corretor, o primeiro corretor procurado não tem o direito à comissão”[50].
O mediador só adquiriu o seu direito à remuneração quando influiu diretamente sobre a conclusão, mas não é necessário, por outro lado, que tenha cooperado no desenvolvimento das negociações, pelo que basta ter-se limitado o nome duma pessoa disposta a fazer determinado negócio[51].  
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Em face deste quadro jurídico importa averiguar se os apelantes/réus devem ser responsabilizados pelo pagamento à apelada/autora da quantia peticionada a título de remuneração, no âmbito de um contrato de medição imobiliária extinto após denúncia por parte daqueles.
Está provado que:
– Por escrito denominado “contrato de mediação imobiliária”, datado de 22 de
Dezembro de 2014 e ao qual foi atribuído o n.º …/2014, a Autora acordou com os Réus diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra do prédio pertencente aos RR., acima descrito, pelo preço de €150 000 (cláusulas 1ª e 2ª do escrito) – facto provado nº 3.
– Como contrapartida, foi acordado que os RR pagariam à Autora o correspondente a 5% do valor da venda, acrescida de IVA à taxa legal em vigor (cláusula 5ª do escrito) – facto provado nº 4.
– O acordo foi celebrado em regime de exclusividade (cláusula 4ª do escrito) – facto provado nº 5.
– Na vigência do acordo, a Autora divulgou a venda do imóvel no sítio da internet www.remax.pt e colocou cartazes publicitários no prédio – facto provado nº 7.
– Em data concretamente não apurada, PI… através dos
cartazes de publicidade afixados no imóvel, tomou conhecimento que o mesmo estava para venda – facto provado nº 8.
– Em 26 de Abril de 2017, a Autora mostrou o imóvel a PI…, a qual apresentou propostas de compra por valor inferior, propostas que a Autora transmitiu aos RR – facto provado nº 9.
– A primeira proposta, no montante de 70 000€, foi recusada pelos Réus, a 28 de
Abril de 2017 – facto provado nº 10.
– Na mesma data acima referida, o Réu FC… informou a Autora que
apenas equacionariam a aceitação de uma proposta a partir de 95 000€ – facto provado nº 11.
– A interessada P…, por intermédio do mediador imobiliário da Autora, JB…, apresentou nova proposta, no montante de €95 000 – facto provado nº 12.
– Essa proposta foi recusada pelos RR, em 17 de julho de 2017 – facto provado nº 13.
– Em data concretamente não apurada, mas posteriormente a 18 de maio de 2017, a interessada P… contactou diretamente com os RR. com o intuito de iniciar negociações para compra do imóvel – facto provado nº 17.
– Por escritura pública celebrada a 5 de abril de 2018, em que foram intervenientes
os RR. e PI…, os primeiros declararam vender à última o bem imóvel melhor identificado em 2) pelo preço de 95 000€ – facto provado nº 21.
Conforme entendimento do tribunal a quo, que subscrevemos, “a A. logrou provar uma relação causal entre a atividade desenvolvida pela mediadora e a realização do negócio visado pelo contrato de mediação. Com efeito, resulta da matéria provada que foi devido aos cartazes de publicidade afixados pela Autora que a interessada P… tomou conhecimento de que o imóvel estava para venda, pelo que é de concluir que, através desta atividade, que foi a A quem potenciou ou facilitou o contacto entre a compradora e os vendedores, aqui réus. Assim sendo, constata-se que, in casu, os Réus vieram a obter um inequívoco benefício da atividade da Autora, vendendo a casa à interessada que a Autora localizou na sequência das promoções por si desenvolvidas”.
Mais se refere que pese embora “ter resultado provado que a interessada encetou negociações com os RR. após estes terem manifestado intenção junto da Autora de pôr termo ao vínculo contratual", note-se que não se exige que a celebração do negócio objeto do contrato de mediação resulte exclusivamente da atuação do mediador, bastando-se com a demonstração de que a atuação da mediadora foi decisiva para a concretização da venda, que foram as suas diligências que serviram para aproximar os interessados na realização do negócio e que o seu trabalho influiu na conclusão do mesmo”.
É certo que não é de conceder uma presunção de facto quanto à verificação de nexo de causalidade entre a atividade da mediadora imobiliária, contratada em regime de exclusividade, e uma venda efetuada mais de um ano depois de denunciado o contrato de mediação[52].
Tal não exclui a verificação, no confronto da factualidade apurada, desse nexo de causalidade, fundamentando o direito à comissão acordada[53].
Ora, como entendeu o tribunal a quo, a cuja fundamentação aderimos, “resultando provado que desde o término do contrato e a realização do
negócio de compra e venda do imóvel decorreu cerca de dez meses, não se verifica qualquer presunção de facto quanto ao verificado nexo causal entre a atividade da mediadora e o negócio”.
Porém, “não obstante, a A. logrou provar, ou seja, resultou da matéria de facto provada, que chegou ao conhecimento da interessada P… que o imóvel se encontrava para venda na sequência das diligências de promoção encetadas pela Autora”.
Assim sendo, “a atividade da A. contribuiu para a cadeia de factos posteriores que deram lugar ao negócio de celebração da compra e venda do
imóvel. A interessada é a mesma e até o valor do negócio é o mesmo (o da última proposta apresentada - €95 000)”.
Mais, “ficou demonstrado nos autos que a atual proprietária do imóvel
tomou conhecimento de que o prédio se encontrava para venda por via da atividade
desenvolvida pela Autora”.
Temos, pois, que tendo a apelada/autora praticado determinados atos de publicitação e promoção do imóvel, nomeadamente, através da divulgação no sítio da REMAX na internet e cartazes publicitários no prédio, e um desses atos consistiu em mostrar o imóvel a uma interessada (PV…), a qual apresentou propostas que foram transmitidas aos réus/apelantes, e que veio, mais tarde, após a denúncia do contrato de mediação, a adquiri-lo pelo mesmo valor de uma das propostas que tinha feito, e que tinha chegado ao conhecimento dos apelantes por intermédio da apelada.
Há assim, um nexo de causalidade entre a atividade desenvolvida pela apelada/autora, e concretamente a visita ao imóvel, e a celebração do contrato de compra e venda entre os réus/apelantes e aquela interessada.
Isto porque a apelada/autora transmitiu aos apelantes, pelo menos, duas propostas da interessada (PV…), dando assim, desta forma, conhecimento da sua identidade.
Face à matéria fáctica, a visita ao imóvel tem de se considerar como elemento decisivo para a celebração do contrato de compra e venda, em termos tais que a tal visita se seguiu, como sua consequência a conclusão do contrato.
Assim, tendo a apelada/autora conseguido uma compradora e disposta a adquirir por determinado preço, no caso inferior ao acordado entre os incumbentes e a mediadora,  preço esse que os comitentes não aceitaram, mas posteriormente vêm a concluir o negócio com a mesma (indicada) compradora e pelo preço da proposta, mas já sem a intervenção da apelada/autora, esta tem o direito à perceção da remuneração[54].
Concluindo, a apelante/autora demonstrou uma relação causal entre a atividade de promoção que desenvolveu junto da potencial compradora (a visita realizada ao imóvel em 2017-04-26 e as propostas da interessada que foram transmitidas aos apelantes) e a celebração do contrato de compra e venda, sendo pois determinante a sua atividade para a conclusão deste negócio, pelo que, lhe assiste o direito à remuneração acordada (correspondente a 5% do preço pago pelo comprador, acrescido de IVA à taxa legal em vigor à data da transação, o que perfaz o montante total de € 5842,50).
Pós-eficácia das obrigações
Os apelantes alegam ainda “que não pode colher a tese da eficácia pós contratual defendida pelo Tribunal a quo violando ele sim as normas substantivas
que tenta aplicar ao caso concreto”.
Vejamos a questão.
No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa féart. 762º, nº 2, do CCivil.
Ao lado dos deveres principais podem surgir os deveres secundários ou acidentais da prestação que inclui os deveres acessórios da prestação principal (destinados a preparar o cumprimento ou a assegurar a perfeita execução da prestação) os deveres relativos às prestações substitutivas ou complementares da prestação principal e ainda os compreendidos nas operações de liquidação das relações obrigacionais duradouras. Além destes, surgem os deveres de conduta que não respeitando à prestação principal, revestem, contudo, um papel essencial no desenrolar da relação obrigacional quanto aos termos em que a mesma deve processar-se entre contraentes que agem honestamente e de boa fé nas suas relações. Estes deveres estão genericamente consagrados no artº 762º do CC que estipula que, no cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder com boa fé, ou seja, com lealdade e correção no cumprimento dos deveres[55].
Estes deveres acessórios de conduta, não interessando diretamente à prestação principal, nem dando origem a qualquer ação autónoma de cumprimento (cfr. art. 817º e sgs.) são todavia essenciais ao correto processamento da relação obrigacional em que a prestação se integra [56].
Deveres acessórios de conduta que, não respeitando diretamente, nem à perfeição, nem à perfeita (correta) realização da prestação debitória (principal), interessam todavia ao regular desenvolvimento da relação obrigacional, nos termos em que ela deve processar-se entre os contraentes que agem honestamente e de boa-fé nas suas relações recíprocas[57].
O vínculo obrigacional não se esgota na execução pura da prestação: antes impendem sobre o devedor toda uma série de deveres acessórios destinados a proporcionar ao credor o bem que o direito lhe confere, pelo que, o dever acessório se inscreve no conteúdo da própria obrigação, e os eu não cumprimento deve ser equiparado, para todos os efeitos, ao não cumprimento desta[58].
E poderão estes deveres manterem-se para além do contrato?
A doutrina da pós-eficácia surgiu na Alemanha dos anos 20 como fenómeno simétrico da culpa in contrahendo. Tratava-se de questionar se mesmo depois da extinção de um contrato poderia subsistir a obrigação principal ou os deveres acessórios que se reconduziam ao contrato extinto[59].
A responsabilidade pós-contratual, também chamada de culpa post pactum finitum, caracteriza-se pelo dever de responsabilização pelos danos advindos após a extinção do contrato, independentemente do adimplemento da obrigação. A pós-eficácia das obrigações manifesta-se em sede de incumprimento dos deveres acessórios, assumindo expressão no âmbito dos contratos duradouros. O contrato não é uma relação estática, mas sim uma relação dinâmica que se desenrola ao longo do tempo.
O entendimento dominante era de que somente aquelas deliberações expressamente consentidas pelas partes poderiam vinculá-las, devendo estar expressas por estas no instrumento do contrato. Quando muito, poder-se-ia admitir, também, uma vinculação jurídica naquelas manifestações que, embora não constantes do instrumento contratual, decorressem necessariamente da natureza do contrato. A nova visão do vínculo obrigacional como uma relação dinâmica implica considerar que as relações contratuais na fase de execução, no momento de elaboração e mesmo no momento posterior (pós-eficácia) não envolvem apenas a obrigação de prestar, mas também uma obrigação de conduta.
A confiança exige a proteção, no período subsequente ao da extinção do contrato, das expectativas provocadas na celebração e no seu cumprimento, pelo comportamento dos intervenientes. O fim contratual não pode ser frustrado a pretexto de que a obrigação se extinguiu.
A pós-eficácia das obrigações sedia-se, para a doutrina, no princípio da boa fé no cumprimento dos contratos, como um dever lateral de lealdade. Tal dever será necessariamente funcionalizado ao fim do contrato, autonomizando-se em relação à prestação principal, para assegurar a realização do escopo do contrato. Assim, subsistem deveres pós-eficazes ao termo do cumprimento do contrato, no interesse da correta concretização do seu fim [60].
Da boa-fé resulta deverem as partes lealdade à convenção livremente celebrada. A lealdade em causa traduzir-se-ia, nomeadamente, na necessidade jurídica de, para além da realização formal da prestação, providenciar a efetiva obtenção e manutenção do escopo contratual. Essa ideia de salvaguarda do escopo contratual mantém-se, naturalmente, para além da extinção do contrato em si. Há pós-eficácia[61].
O instituto da pós-eficácia das obrigações ou culpa post pactum finitum corresponde a um dever lateral de conduta de lealdade, no sentido de que a boa-fé exige, segundo as circunstâncias, que os contratantes, depois do fim da relação contratual, omitam toda conduta mediante a qual a outra parte se veria despojada ou essencialmente reduzida das vantagens oferecidas pelo contrato[62].
Como entendeu o tribunal a quo, que subscrevemos, “No caso em apreço, impunha-se aos RR. que não tirassem proveito ulterior da atividade desenvolvida pela Autora, o que manifestamente aconteceu, ao contratarem com a potencial interessada encontrada pela A., tanto mais que o negócio foi realizado nos exatos moldes que foram trazidos ao conhecimento dos RR e que anteriormente tinha sido rejeitado pelos mesmos. Tal conduta consubstancia uma violação do dever acessório de lealdade a que os RR. estavam vinculados por saberem que a atual proprietária do prédio chegou ao seu conhecimento por via da atividade desenvolvida pela Autora. Pelo que os efeitos contratuais, não obstante o seu término, no que respeitam aos deveres acessórios de lealdade e de boa fé, persistiam”.
Destarte, improcedendo as conclusões do recurso de apelação, há que confirmar a decisão proferida pelo tribunal a quo.
3. DISPOSITIVO
3.1. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível (2ª) do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso e, consequentemente, em confirmar-se a decisão recorrida.       
3.2. REGIME DE CUSTAS
Custas pelos apelantes (na vertente de custas de parte, por outras não haver[63]), porquanto a elas deram causa por terem ficado vencidos[64].
                    
Lisboa, 2020-10-22[65],[66]
Nelson Borges Carneiro
Pedro Martins
Inês Moura
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[1] Para além do dever de apresentar a sua alegação, impende sobre o recorrente o ónus de nela concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – ónus de formular conclusões (art. 639º, nº 1) – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 503.
[2] As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 639º, nº 3. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 795.
[3] O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar, as normas jurídicas violadas; o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, e invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada – art. 639º, nºs 1 e 2, do CPCivil.
[4] Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação – art. 657º, n.º 2, do CPCivil.
[5] Todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas, não podendo de elas conhecer o tribunal de recurso.
[6] Vem sendo entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.
[7] Relativamente a questões de conhecimento oficioso e que, por isso mesmo, não foram suscitadas anteriormente, a Relação deve assegurar o contraditório, nos termos gerais do art. 3º, nº 3. A Relação não pode surpreender as partes com uma decisão que venha contra a corrente do processo, impondo-se que as ouça previamente – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 829.
[8] FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, pp. 535/36.
[9] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2017-09-07, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[10] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2017-09-07, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[11] FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, pp. 537/38.
[12] AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 4ª ed., Revista e Atualizada, Almedina, p. 157, nota (333).
[13] LEBRE DE FREITAS - ARMINDO RIBEIRO MENDES, Código de Processo Civil Anotado, Artigos 676º a 943º, volume 3º, Coimbra Editora, 2003, p. 53.
[14] FERREIRA DE ALMEIDA, ob. cit., pp. 534/5.
[15] Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2016-10-27, processo 13176/11.8YBBCL.G1. S1, Relator: JOSÉ RAÍNHO.
[16] Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2015-05-26, processo 1426/08.7CSNT.L1, Relator: HÉLDER ROQUE.
[17] Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 29-10-2015, processo 233/09.4TBVNG.G1, Relator: LOPES DO REGO.
[18] Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 01-10-2015, processo 824/11.3TTLRS.L1.S1, Relatora: ANA GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[19] TEIXEIRA DE SOUSA, Blogue do IPPC, “Recurso de apelação; alegações de recurso; conclusões das alegações”.
[20] É que expostas pelo recorrente, no corpo da alegação, as razões de facto e de direito da sua discordância com a decisão impugnada, deve ele, face à sua vinculação ao ónus de formular conclusões, terminar a sua minuta pela indicação resumida, através de proposições sintéticas, dos fundamentos, de facto e/ou de direito, por que pede a alteração ou anulação da decisão - FERNANDO AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 4ª ed., abril de 2003, pp. 154/5.
[21] Deverá rejeitar-se o recurso em que se impugna a decisão da matéria de facto quando o recorrente, invocando embora como fundamento do erro na apreciação das provas depoimentos gravados cujas passagens relevantes transcreveu no corpo da minuta, não levar às conclusões, não apenas a indicação precisa e concreta dos factos que considera incorretamente julgados pelo tribunal recorrido, mas também daqueles que, de harmonia com os fundamentos apontados, reputa demonstrados - Ac. Rel. Coimbra de 25-05-99, proc. JTRC61/2, Relator: NUNO CAMEIRA, http://www. dgsi.pt/jtrc.nsf/.
[22] O recorrente não aduziu argumentos no sentido de infirmar diretamente os termos do raciocínio adotado pelo tribunal a quo, evidenciando que o mesmo é injustificado e consubstancia um exercício incorreto da hierarquização dos parâmetros de credibilidade dos meios de prova produzidos, ou seja, que é inconsistente -
ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 797.
[23] MENEZES CORDEIRO, Do contrato de mediação, Revista “O Direito”, ano 139º, 2007, Tomo III, p. 517.
[24] PEDRO PAIS DE VASCONCELOS, Direito Comercial, volume I, p. 197.
[25] FERNANDO BATISTA DE OLIVEIRA, Contrato de mediação imobiliária na prática judicial, CEJ, p. 11.
[26] LACERDA BARATA, Contrato de Mediação, Estudos do Instituto de Direito do Consumo, I, p. 193.
[27] BRITO CORREIA, Direito Comercial, I, pp. 202/203.
[28] PESSOA JORGE, O Mandato sem Representação, p. 231.
[29] HELENA BRITO, O Contrato de Concessão Comercial, pp. 6/7.
[30] LACERDA BARATA, Contrato de Mediação, Estudos do Instituto de Direito do Consumo, I, p. 192.
[31] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2013-12-12, Relator: GRANJA DA FONSECA, http://www.dgsi.pt/jstj.
[32] FERNANDO BATISTA DE OLIVEIRA, Contrato de mediação imobiliária na prática judicial, CEJ, pp. 16/17.
[33] Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2008-07-03, Relatora: DEOLINDA VARÃO, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[34] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2009-04-28, Relator: FONSECA RAMOS, http://www.dgsi.pt/jstj.
[35] Ac. Tribunal da Relação de Coimbra de 2014-09-09, Relator: CARLOS MOREIRA, http://www.dgsi.pt/jtrc.
[36] Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2010-10-30, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[37] FERNANDO BATISTA DE OLIVEIRA, Contrato de mediação imobiliária na prática judicial, CEJ, p. 48.
[38] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2013-12-12, Relator: GRANJA DA FONSECA, http://www.dgsi.pt/jstj.
[39] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2011-09-29, Relator: SÉRGIO POÇAS, http://www.dgsi.pt/jstj.
[40] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2009-04-23, Relator: CUSTÓDIO MONTES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[41] Ac. Tribunal da Relação de Guimarães de 2014-09-29, Relatora: EVA ALMEIDA, http://www.dgsi.pt/jtrg.
[42] Ac. Tribunal da Relação de Coimbra de 2014-12-17, Relatora: CATARINA GONÇALVES, http://www.dgsi.pt/jtrc. 
[43] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2012-10-10, Relator: MOITNHO DE ALMEIDA, http://www.dgsi.pt/jstj.
[44] FERNANDO BATISTA DE OLIVEIRA, Contrato de mediação imobiliária na prática judicial, CEJ, p. 57.
[45] Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2015-03-20, Relator: EZAGUY MARTINS, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[46] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2007-11-15, Relator: JOÃO BERNARDO, http://www.dgsi.pt/jstj.
[47] Ac. Tribunal da Relação de Coimbra de 2014-09-09, Relator: CARLOS MOREIRA, http://www.dgsi.pt/jtrc.
[48] Ac. Tribunal da Relação de Coimbra de 2014-09-09, Relator: CARLOS MOREIRA, http://www.dgsi.pt/jtrc.
[49] É seguro que a conclusão de negócio por preço inferior não faz perder àquele o seu direito, pela razão de ser opinião comum que não é necessária perfeita coincidência entre o contrato desejado e o efetivamente realizado; o mediador conseguira já a adesão do terceiro á celebração do negócio (celebração esta só impedida pelo preço demasiado elevado proposto pelo mandante): daí a sua participação no nexo causal – MANUEL SALVADOR, Contrato de Mediação, pp. 98/9.
[50] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2014-04-01, Relator: GABRIEL CATARINO, http://www.dgsi.pt/jstj apud MANUEL SALVADOR, Contrato de Mediação, pp. 96/104.
[51] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2014-04-01, Relator: GABRIEL CATARINO, http://www.dgsi.pt/jstj.
[52] Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2015-03-20, Relator: EZAGUY MARTINS, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[53] Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2015-03-20, Relator: EZAGUY MARTINS, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[54] MANUEL SALVADOR, Contrato de Mediação, pp. 96/104.
[55] ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, volume 1, 4ª edição, pp. 106/109.
[56] ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, volume 1, 4ª edição, pp. 106/109.
[57] JOSÉ JOÃO ABRANTES, A Exceção de não cumprimento do contrato no direito civil português, pp. 42/3, nota (8).
[58] MENEZES CORDEIRO, Violação positiva do contrato, ROA, 1981, p. 131 apud JOSÉ JOÃO ABRANTES, A Exceção de não cumprimento do contrato no direito civil português, pp. 42/3, nota (8).
[59] ADELAIDE MENEZES LEITÃO, «Revogação unilateral» do mandato pós-eficácia e responsabilidade pela confiança, Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Inocêncio Galvão Telles, I Volume, p. 327.
[60] Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2015-07-08, Relator: RUI MOREIRA, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[61] MENEZES CORDEIRO, Da Pós-eficácia das Obrigações, 1984, p. 31.
[62] MAURÍCIO MOTA, A Pós-eficácia das Obrigações Revisitada apud Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2015-07-08, Relator: RUI MOREIRA, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[63] Como o conceito de custas stricto sensu é polissémico, porque é suscetível de envolver, nos termos do nº 1 do artigo 529º, além da taxa de justiça, que, em regra, não é objeto de condenação – os encargos e as custas de parte, importa que o juiz, ou o coletivo de juízes, nos segmentos condenatórios das partes no pagamento de custas, expressem as vertentes a que a condenação se reporta – SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 8.
[64] A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito – art. 527º, nº 1, do CPCivil.
[65] A assinatura eletrónica substitui e dispensa para todos os efeitos a assinatura autógrafa em suporte de papel dos atos processuais – art. 19º, nº 2, da Portaria n.º 280/2013, de 26/08, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 267/2018, de 20/09.
[66] Acórdão assinado digitalmente.