Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | LEOPOLDO SOARES | ||
Descritores: | OMISSÃO DE PRONÚNCIA INFRACÇÃO DISCIPLINAR LABORAL AMNISTIA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 06/18/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I - A nulidade de sentença/despacho, por omissão de pronúncia, ocorre quando o julgador deixe de resolver questões que tenham sido submetidas à sua apreciação pelas partes, a não ser que esse conhecimento fique prejudicado pela solução dada a outras questões antes apreciadas. II – Uma questão é prejudicial quando é susceptível de fazer desaparecer o fundamento ou a razão de ser de outras. III- Assume cariz prejudicial, em sentido lato, a situação em que o conhecimento prévio de determinada questão de fundo de acordo com a estrutura e encadeamento lógicos da sentença/decisão prejudica a decisão de outras questões suscitadas na acção. IV - A amnistia contemplada no art.º 6º da Lei 38-A/2023, de 2 de Agosto, não logra aplicação às infrações disciplinares laborais de direito privado. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | AA, residente na..., veio 1intentar, acção de impugnação judicial de impugnação judicial de decisão disciplinar, contra SAM – SOCIEDADE DE AUTOMÓVEIS DA MADEIRA, LDA, com sede em... São Martinho., Funchal Pede que se anule a sanção disciplinar, devendo o presente processo disciplinar ser arquivado. Mais solicita que a Ré seja condenada a pagar-lhe e uma indemnização por danos patrimoniais pela aplicação de uma sanção disciplinar abusiva, a qual nunca poderá ser inferior a € 5.000,00 (Cinco Mil Euros), nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 331.º do Código do Trabalho e à devolução da quantia que lhe foi retirada por força da aplicação de 15 dias de suspensão no vencimento. Em sede factual articulou que2: « II – Dos Factos 5. O trabalhador desde o ano 2021 e como o prevê não só o código do trabalho, mas também o próprio contrato coletivo aplicável à relação laboral pediu a dispensa da prestação do Trabalho suplementar. 6. Ao contrário do que resulta da decisão disciplinar, o regulamento (CE) nº 561/2006 não se aplica aos transportes rodoviários afetos ao serviço regular de transporte de passageiros, cujo percurso de linha não ultrapasse 50 quilómetros. Conforme o disposto na alínea a) do Artigo 3º do Regulamento (CE) nº 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Março de 2006. 7. O AETR aplica-se apenas nos território de cada Parte contratante a todo o transporte rodoviário internacional, efetuado por qualquer veículo matriculado no território dessa Parte contratante,ou no território de qualquer outra Parte contratante. (nº 1 do Art.º 2 do AETR) 8. É manifesto que o transporte de passageiros e mercadoria efetuado nas regiões autónomas (Madeira e Açores) é de âmbito regional e não de âmbito internacional, por inexistência física de quaisquer ligações entre essas regiões que permitam a existência de transporte rodoviário internacional. Donde se conclui forçosamente que o AETR não é aplicável às Regiões Autónomas do Estado Português. 9. O trabalhador informou a empresa que não pretendia prestar trabalho suplementar, ao abrigo do art.º 227º do CT. 10. Salvo melhor entendimento, a prestação de trabalho suplementar só pode ser prestado em 2 situações distintas, ou seja, só pode ser prestado quando a empresa tenha de fazer face a acréscimo eventual e transitório de trabalho e não se justifique para tal a admissão de trabalhador ou só pode ser prestado em caso de força maior ou quando seja indispensável para prevenir ou reparar prejuízo grave para a empresa ou para a sua viabilidade. 11. Nos casos supra, o trabalhador é obrigado a realizar a prestação de trabalho suplementar, salvo quando, havendo motivos atendíveis, expressamente solicite a sua dispensa. 12. Ora, salvo melhor entendimento, nenhum dos casos legalmente previstos estão preenchidos, pois a Ré impõe a prestação de trabalho suplementar diariamente como se de trabalho normal se tratasse. 13. A Ré, invoca o artigo 2.º do Dl nº 237/2007 de 19 de junho, o qual na sua alínea c) determina a definição de "Tempo de Disponibilidade", esquecendo-se que, a ordem jurídica transposta invocada (Diretiva nº 202/15/CE de 11 de março) aplica-se aos trabalhadores móveis abrangidos pelo Regulamento (CEE) nº 3830/85 de 20 de dezembro ou, quando aplicável, pelo acordo AETR. 14. Ora, no caso em apreço, o que poderia ser eventualmente aplicável ao arguido era o Regulamento (CEE) nº 3830/85. Mas tal Regulamento não lhe é aplicável por força do disposto no seu nº 3 do art.º 4, o qual determina que o presente regulamento não se aplica aos transportes afetos ao serviço regular de passageiros cujo percurso de linha não ultrapasse os 50 Km. 15. De sublinhar que o Dl 237/2007 não é aplicável ao ora trabalhador, porquanto apenas é aplicável aos trabalhadores móveis em território nacional e abrangidos pelo Regulamento (CE) nº 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de março ou pelo AETR – Acordo Europeu Relativo ao Trabalho das Tripulações dos Veículos Que Efectuam Transportes Internacionais Rodoviários. 16. Conforme resulta da própria nota de culpa a Ré dá a entender que o trabalho suplementar não é algo de extraordinário conforme resulta do código do trabalho e do contrato coletivo, mas algo comum e regular na empresa. 17. Diga-se que a ser verdade, tal situação é da exclusiva responsabilidade da empresa que não sabe gerir os seus recursos humanos ou que se abstém de os reforçar. 18. Ademais à data em que no Trabalhador Arguido solicitou a dispensa do trabalho suplementar era do prévio conhecimento da Arguente de que este tinha um filho menor com idade inferior a 12 anos e como tal ao abrigo do artigo 59.º do CT não é obrigado a prestar trabalho suplementar. 19. “Como se sabe, a exigência da prestação do trabalho suplementar, constituindo um acréscimo de disponibilidade do trabalhador perante o empregador, com o correspectivo prejuízo do seu direito ao descanso diário, pressupõe a prévia verificação de um apertado condicionalismo. O trabalhador é obrigado a realizar a prestação de trabalho suplementar apenas quando ocorram necessidades anormais de gestão (quando a empresa tenha de fazer face a um acréscimo eventual e transitório de trabalho e não se justifique para tal a admissão de trabalhador), se verifique uma situação de força maior, ou ainda se/quando a sua prestação seja indispensável à prevenção ou reparação de prejuízo grave para a empresa ou para a sua viabilidade – art.º 227.º, n.ºs 1 e 2, do CT/2009, regime homólogo do antes estabelecido no art.º 199.º do CT/2003.” (Cfr. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 17/12/2014 disponível em www.dgsi.pt) 20. Sendo da própria lavra da Ré que o seu trabalhador pediu a dispensa de prestar trabalho suplementar, o que empresa recusou, observa-se é que a empresa violou o disposto no artigo 59.º e 227.º ambos do código do trabalho e que cometeu de forma consciente uma contraordenação grave. (vide artigo 26.º da NC) 21. O trabalhador nunca deixou de solicitar antecipadamente à Arguente que pretendia ser dispensado do trabalho suplementar, na verdade já o vem fazendo pelos seus próprios meios desde o ano 2021. 22. Em contrapartida, observa-se que é manifestamente contraditório e até um abuso de direito a ré invocar que o trabalhador não lhe deu prazo razoável para responder ao pedido de horário flexível, quando apenas dá uma antecedência inferior a 24 horas a comunicar o horário de trabalho do dia seguinte. 23. E apesar da falta, essa sim da ré, do mínimo de antecedência e diga-se ainda de respeito para com o seu trabalhador, este sempre respondeu à empresa no próprio dia de tal comunicação, no tempo que ainda lhe restava desse dia e até mesmo em dias em que deveria estar a gozar o seu descanso, nomeadamente, dias de folga e férias. 24. O Trabalhador não desobedeceu de forma ilegítima, senão vejamos, 25. O trabalhador no dia 13 de setembro de 2022, comunicou à empresa que exercia o seu direito a dispensa de trabalho suplementar. 26. O trabalhador no dia 14 de setembro de 2022, comunicou à empresa que exercia o seu direito a dispensa de trabalho suplementar. 27. O trabalhador no dia 15 de setembro de 2022 comunicou à empresa que exercia o seu direito a dispensa de trabalho suplementar. 28. Não corresponde à verdade, conforme já se supra expôs que o tempo de disponibilidade seja aplicável ao caso em apreço do Trabalhador. 29. O que é pedido pela empresa e como esta própria assume na nota de culpa é que a sua organização de turnos de trabalhos, implica que os seus funcionários sejam forçados a prestar trabalho suplementar. 30. Porém, tal não pode ser exigido sempre quando existem direitos que assistem aos trabalhadores, concretamente, aqui o Trabalhador que os exerceu legitimamente e forma atempada e que a empresa não os reconhece e desrespeita. 31. O carácter reiterado com que a empresa vem assumindo uma posição de desrespeito pelos direitos do trabalhador transparece diariamente em todos os email’s em que lhe comunica o seu horário de trabalho. 32. E bem assim nas cartas que lhe foram dirigidas de forma sucessiva, ameaçando-o de ser despedido caso não cedesse e prestasse o trabalho suplementar imposto pela empresa. 33. Por força de tais imposições o Trabalhador Arguido recorreu à Autoridade para as Condições do Trabalho e ao Tribunal do Trabalho. 34. A conduta da Ré só se pode caracterizar como mobbing no trabalho, dada o caracter de reiteração nas imposições que faz ao seu trabalhador e que o diminuem e o afetam psicologicamente. 35. Os factos narrados na nota de culpa e igualmente na decisão disciplinar não podem ser considerados como infração disciplinar, mas eventualmente o conflito de direitos, ou seja, entre o direito da empresa e o direito do trabalhador e que não podem ser resolvidos em sede de processo disciplinar. 36. Importa salientar que, tendo em conta o pedido do trabalhador para que lhe fosse aplicável o horário flexível, veio o CITE emitir parecer favorável a este. 37. Tal parecer foi impugnado judicialmente pela Ré, dando azo ao processo n.º 707/23.4T8FNC que correu termos no Juízo do Trabalho do Funchal e do qual resultou um acordo, no qual a empresa veio a reconhecer o direito do trabalhador ao horário flexível, tendo sido proferida sentença homologatória que se junta e se dá por integralmente reproduzida. 38. A sanção disciplinar que foi aplicada ao trabalhador de 15 (quinze) dias é manifestamente abusiva, tendo em conta os factos narrados, uma vez que, o trabalhador nunca desobedeceu a ordens legítimas, apenas tendo defendido os seus direitos legítimos. 39. O direito ao horário flexível não é um direito vazio, sem conteúdo, ao invés apresenta-se como um direito com respaldo naquelas que são as garantias que a Constituição oferece a todos os cidadãos. 40. O artigo 36.º da CRP consagra que “todos têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade” e que “os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos”. 41. Por sua vez, o artigo 68.º, n.º 1, da CRP dispõe que “os pais e as mães têm direito à proteção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível ação em relação aos filhos, nomeadamente, quanto à sua educação, com garantia de realização profissional e de participação na vida cívica do país”. 42. Segue o artigo 69.º, n.º 1, da CRP afirmando que “as crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições”. 43. Por fim, o artigo 59.º da CRP é claro ao dispor que “todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito: (…) b) A organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da atividade profissional com a vida familiar”. 44. Esclareceu ainda o Acórdão da Relação do Porto, de 02 de março de 2017, que: “São constitucionalmente protegidos os direitos ao livre exercício da iniciativa económica privada e à liberdade de organização empresarial [cfr. arts. 61.º e 80.º, n.º 1, al. c) da Constituição da República Portuguesa]. Tais interesses e direitos enfrentam, porém, as restrições decorrentes dos direitos fundamentais dos trabalhadores como os supra referidos direitos à conciliação da atividade profissional com a vida familiar, o direito à proteção da família como elemento fundamental da sociedade e o direito à maternidade e paternidade em condições de satisfazer os interesses da criança e as necessidades do agregado familiar, já que estes se sobrepõem àqueles quando em confronto e que estes só cedem perante aqueles, quando em presença de interesses imperiosos.” 45. Pelo que, a aplicação da sanção disciplinar de 15 dias de suspensão ao aqui trabalhador mostrou-se manifestamente abusiva, quando tinha por base o facto de este ter pedido a dispensa de trabalho suplementar e ainda a aplicação de horário flexível, por ter um filho menor de 12 anos. 46. Acresce que, de acordo com o CCT aplicável, o máximo de dias de suspensão que podem ser aplicáveis são 12 (doze) dias. 47. Pelo que, também a aplicação pela entidade empregadora de 15 (quinze) dias se mostra excessiva, contrariando o CCT aplicável e mais uma vez, reitera-se ABUSIVA!». Em termos de Direito referiu3: « A) Da Aplicação de Sanção Abusiva 48. Está vedado ao empregador a aplicação de sanções abusivas, sendo que são abusivas as sanções disciplinares motivadas pelo facto de o trabalhador: “b) Se recusar a cumprir ordem a que não deva obediência, nos termos da alínea e) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 128.º; […] d) Em geral, exercer, ter exercido, pretender exercer ou invocar os seus direitos ou garantias.”, nos termos do disposto no artigo 331.º do Código do Trabalho. 49. Vem a Ré alegar que o Trabalhador violou culposamente os seus deveres profissionais. 50. Das alíneas c) e e), do n.º 1 do artigo 128.º do Código do Trabalho retira-se que “Sem prejuízo de outras obrigações, o trabalhador deve: c) Realizar o trabalho com zelo e diligência; e) Cumprir as ordens e instruções do empregador respeitantes a execução ou disciplina do trabalho, bem como a segurança e saúde no trabalho, que não sejam contrárias aos seus direitos e garantias.” 51. Ora, do exposto supra forçosamente se compreenderá que o Trabalhador Autor não violou nenhum destes deveres, muito menos culposamente. 52. Isto porque, como bem sabe a Ré o Autor sempre realizou o seu trabalho com zelo e diligência pautando sempre por respeitar as instruções e ordens impostas pela Ré. 53. Relativamente ao cumprimento das ordens e instruções do empregador, é de referir que o Trabalhador Autor é um colaborador exemplar da Empresa, sendo este facto reconhecido por todas as pessoas que lidam com o mesmo, nunca tendo tido qualquer contratempo com a entidade empregadora ou com os seus superiores hierárquicos e colegas de trabalho. Ora, 54. Estipulam as normas laborais e toda doutrina a esta inerente que: "O empregador tem poder disciplinar sobre o trabalhador que se encontre ao seu serviço, enquanto vigorar o contrato de trabalho", significando tal premissa, que compete ao empregador exercer o poder disciplinar sobre os trabalhadores ao seu serviço enquanto durar o contrato de trabalho. 55. Traduz-se este no poder do empregador de aplicar medidas coativas (sanções disciplinares) ao trabalhador, cuja conduta prejudique ou ponha em perigo a empresa ou não seja adequada à correta efetivação dos deveres contratuais a que se encontra adstrito. 56. Nos termos do disposto no artigo 328.º do Código do Trabalho, prevê-se que no exercício do poder disciplinar, o empregador pode aplicar as seguintes sanções: a) Repreensão; b) Repreensão Registada; c) Sanção Pecuniária; d) Perda de dias de férias; e) Suspensão do Trabalho com perda de retribuição e antiguidade; f) Despedimento sem indemnização ou compensação. 57. Sendo que, acresce o artigo 330.º que a sanção disciplinar deve ser proporcional à gravidade da infração e à culpabilidade do infrator, o que se deve ter sempre em consideração, em caso de se decidir pela aplicação de uma sanção, de forma a torná-la justa, proporcional, adequada e eficaz. 58. Assim, através do processo disciplinar o empregador averiguará se os factos que podem consubstanciar infração disciplinar ocorreram, apurado do circunstancialismo que os rodeou, o grau de culpa do seu autor e procederá à aplicação da sanção. Mais, 59. Aquando do exercício do poder disciplinar, o empregador deverá proceder de boa-fé, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 126.º do Código do Trabalho, não lhe sendo legítimo aplicar uma sanção que não leve em consideração as circunstâncias em que os factos ocorreram. 60. Nestes termos, pela aplicação da sanção abusiva em causa, a Ré deverá indemnizar o Autor, nos termos gerais, sendo que a indemnização em questão nunca poderá ser inferior a 10 (dez) vezes a retribuição perdida, nos termos do disposto nos n.º 3 e 5 do artigo 331.º. 61. Assim, a Ré deverá ser condenada no pagamento de uma indemnização ao Autor, pela aplicação de uma sanção disciplinar abusiva, a qual nunca poderá ser inferior a € 2000,00 (Dois Mil Euros). 62. Caso não se considere a presente sanção como abusiva, o que por mero dever de patrocínio se admite, não se poderá ignorar o facto de a sanção ser manifestamente excessiva, devendo então condenar-se a Ré no arquivamento do procedimento disciplinar. B) Da aplicação da Lei n.º 38-A/2023 63. Em 02/08/2023 foi publicada a Lei nº 38-A/2023, que estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infrações penais e disciplinares por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude (art.º 1º), estando abrangidas as sanções relativas a infrações disciplinares, que não constituam simultaneamente ilícitos penais não amnistiados pela presente lei e cuja sanção aplicável, em ambos os casos, não seja superior a suspensão, praticadas até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023. 64. O Autor foi punido com pena de 15 (Quinze) dias de suspensão. 65. Salvo melhor entendimento, é aplicável ao A. o benefício da amnistia prevista no art.º 6.º da referida Lei, que dispõe que “São amnistiadas as infrações disciplinares e as infrações disciplinares militares que não constituam simultaneamente ilícitos penais não amnistiados pela presente lei e cuja sanção aplicável, em ambos os casos, não seja superior a suspensão ou prisão disciplinar” 66. Ora, a amnistia é uma providência que “apaga” a sanção disciplinar. Fala-se, aqui, numa abolição retroativa da alegada infração disciplinar, no sentido em que a amnistia, operando ex tunc, incide não só sobre a própria pena disciplinar, como também sobre o ato disciplinar passado, que cai em “esquecimento”, é tido como não praticado e, consequentemente, eliminado do cadastro disciplinar, com a consequente devolução das quantias eventualmente pagas. Devendo por isso ser declarada a amnistia da presente sanção disciplinar e em consequência ser a R. condenada a ressarcir o A. das quantias correspondente aos 15 dias de suspensão no vencimento. Em 30 de Abril de 2024, realizou-se audiência de partes.4 A Ré contestou.5 Alegou, em suma, na parte que para o recurso mais releva, que 6: « DAS IRREGULARIDADES FORMAIS DA PRESENTE AÇÃO 12.º Previamente a entrarmos na discussão da verificação material dos factos que se encontram subjacentes aos presentes autos (ou à ausência desses mesmo factos – conforme veremos abaixo), cumpre previamente proceder a um enquadramento da presente ação judicial. 13.º Por intermédio da qual chegaremos à conclusão que a Petição Inicial (podendo, de ora em diante, ser designada abreviadamente por “PI”) apresentada pelo A. padece de um conjunto de lapsos e irregularidades formais que, pela sua gravidade e forma, impossibilitam, quer a condenação da R., quer a própria apreciação dos presentes autos por parte do Digníssimo Tribunal, em virtude da PI apresentada não recolher, cumprir e observar os requisitos e formalidades necessárias para o efeito. Senão vejamos, A) Da Ineptidão da Petição Inicial por Discrepância entre o Pedido formulado e a Causa de Pedir – art.º 186.º al. a), b) e c) do CPC 14.º No âmbito da PI o A. apresentou os factos essenciais que sustentam o pedido de acordo com a seguinte estrutura: • Art.ºs 5.º a 47.º da PI – procura sustentar que estamos perante uma sanção abusiva (fazendo para o efeito menções jurídicas genéricas sem, em nosso entender, fazer o relato concreto e específico dos factos que lhe competia); • Art.ºs 48.º a 56.º – faz um conjunto de considerações jurídicas sobre a sanção abusiva; • Art.ºs 57.º a 59.º - faz uma alusão à proporcionalidade e grau de culpa na aplicação da sanção; • Art.ºs 60.º e 61.º - Requer que, pela aplicação da sanção abusiva em causa, a R. deveria indemnizar o A. nos termos gerais, sendo que a indemnização em questão nunca poderia ser inferior a € 2.000,00. 15.º Por outro lado, o A. conclui a sua PI e no pedido refere o seguinte: “NESTES TERMOS, e dada a não pertinência da matéria acusatória, vem o A., mui respeitosamente, requerer a V.Exa. que se digne a ordenar a anulação da sanção disciplinar, devendo o processo ser arquivado. A ré deverá ainda ser condenada ao pagamento de uma indemnização ao Autor, por danos patrimoniais pela aplicação de uma sanção disciplinar abusiva, a qual nunca poderá ser inferior a € 5.000,00 (cinco mil euros)”. Sublinhado nosso 16.º Ou seja, se compararmos os factos essenciais que constituem a causa de pedir (art.º 14.º supra da presente Contestação) e o pedido formulado veremos que a “bota não bate com a perdigota”. Senão vejamos, 17.º Por um lado, o A. sustenta os factos na aplicação de uma sanção abusiva na estrutura da PI. (conferir art.ºs 5.º a 47.º da PI). 18.º Por outro lado, assenta o seu Pedido na não pertinência da matéria acusatória (???) 19.º De igual forma, no art.º 61.º da PI o A. sustenta que a R. “deverá ser condenada no pagamento de uma indemnização ao Autor, pela aplicação de uma sanção disciplinar abusiva, a qual nunca poderá ser inferior a € 2.000,00 (dois mil euros)” 20.º Quando no pedido sustenta que “A ré deverá ainda ser condenada ao pagamento de uma indemnização ao Autor, por danos patrimoniais pela aplicação de uma sanção disciplinar abusiva, a qual nunca poderá ser inferior a € 5.000,00 (cinco mil euros)” negrito nosso 21.º Deste modo, fazendo a contraposição entre os factos essenciais que constituem a causa de pedir alegados pelo A. na sua PI e o pedido formulado, concluímos que existe uma contradição insanável entre os mesmos nos termos das al.s a) e b) do n.º 2 do art.º 186.º do CPC. Senão vejamos, 22.º O A. não pode construir toda uma Petição Inicial assentando na aplicação por parte da R. de uma sanção abusiva (factos essenciais onde assenta a causa de pedir) e depois formular um pedido baseado na não pertinência da matéria acusatória (conferir com Pedido da PI). 23.º Com efeito, em momento algum da estrutura da PI é feita referência, direta ou indireta, à pertinência, ou não, da matéria acusatória. 24.º Não obstante, é precisamente baseado na pertinência da matéria acusatória e não na aplicação de uma sanção abusiva que o A. sustenta o seu pedido. 25.º Fazendo com que os factos essenciais onde assenta a causa de pedir estejam em contradição com o pedido. 26.º O que causa a ineptidão da Petição Inicial nos termos das al.s a), b) e c) do n.º do art.º 186.º do CPC e, consequentemente, acarreta a nulidade de todo o processo, o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais. 27.º Por outro lado, veremos que existe uma discrepância entre as indemnizações pedidas na causa de pedir e no pedido que sustenta a PI, o que provoca a ineptidão da Petição Inicial nos termos do art.º 186.º do CPC. 28.º Com efeito, constata-se que o disposto nos art.ºs 60 e 61 da PI também se encontram em contradição com o Pedido Formulado. 29.º Porquanto, o A. não pode alegar, como alegar, como factos essenciais que constituem a causa de pedir que a R. deve ser condenada no pagamento de uma indemnização ao A. pela aplicação de uma sanção abusiva, nunca inferior a € 2.000,00 (dois mil euros). (conferir art.ºs 60.º e 61.º da PI). 30.º Quando o Pedido é formulado, pedindo uma indemnização nunca inferior a € 5.000,00 (cinco mil euros). 31.º Nesta conformidade, também aqui os factos essenciais que constituem a causa de pedir da presente ação judicial encontram-se em contradição com o Pedido, causando a ininteligibilidade do pedido e colocando em causa a defesa da R. que, assim, não tem como se defender adequadamente, uma vez que a causa de pedir se encontra em contradição com o Pedido, tornando-o ininteligível. 32.º Nesta conformidade, e também por este motivo, deverá reconhecer-se a ineptidão da PI do A., o que acarreta a nulidade de todo o processo, nos termos do disposto no n.º 1 e n.º 2 do art.º 186.º do CPC, o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais. B) Da Ineptidão da PI por falta da Causa de Pedir – al. a) do n.º 2 do art.º 186.º do CPC 33.º Previamente a entrarmos na discussão material sobre os factos apurados e a legalidade e proporcionalidade da sanção disciplinar aplicada ao A., sempre se dirá que, do ponto de vista formal, a presente impugnação da sanção disciplinar nunca poderia ser procedente, porquanto a PI é inepta por falta a causa de pedir. Senão vejamos, 34.º A impugnação de sanção disciplinar com base no facto de ser uma sanção abusiva nos termos do art.º 331.º do CT não corresponde a uma impugnação genérica e de apreciação igualmente genérica por parte do Digníssimo Tribunal. 35.º Pelo contrário, a impugnação de sanções disciplinares com base no facto de serem sanções abusivas implicam a observância de requisitos específicos (como o animus persecutório que falaremos mais adiante), assim como, o cumprimento de especificidades inerentes ao ónus de alegação das sanções abusivas. 36.º Com efeito, percorrendo a PI, conseguimos identificar que o A. não logra identificar qualquer ordem que lhe tenha sido endereçada e que se tenha recusado a cumpri-la por não lhe dever obediência. 37.º Por outro lado, o A. não indica a sua causa de pedir! 38.º Ou seja, na PI que apresentou o A. não logrou alegar os factos constitutivos da situação jurídica material que o mesmo se pretendia fazer valer. 39.º Com efeito, cabia ao A. indicar os factos concretos que o mesmo diz ter constituído o efeito pretendido, o que, no caso de ser uma sanção abusiva, o A. teria forçosamente de alegar os dois elementos que compõem a sanção abusiva, ou seja: 1. O elemento objetivo – o facto essencial e concreto que é enquadrado no n.º 1 do art.º 331.º do Código do Trabalho; e 2. O elemento subjetivo – a intenção persecutória ou de retaliação por parte do empregador. 40.º Analisado o conteúdo da PI que o A. apresentou, constata-se que não foram alegados factos essenciais e concretos suscetíveis de ser enquadrados no n.º 1 do art.º 331 do Trabalho. 41.º Nem tão pouco, é feita qualquer referência direta ou indireta à intenção persecutória ou de retaliação por parte do empregador – e que constitui o essencial elemento subjetivo da sanção abusiva. 42.º Com efeito, da análise do conteúdo da Pi se constata que a mesma assenta integralmente sobre a questão da R. ter aplicado uma sanção abusiva. 43.º Sucede que, percorrendo novamente a PI apresentada pelo A., verifica-se que o mesmo não logrou apresentar contexto factual que permita sustentar estarmos perante uma sanção abusiva. 44.º Ou seja, cumpria ao A. fornecer os factos, circunstanciando no tempo, local e espaço, nomeadamente os seguintes: 1. Indicar, de forma circunstanciada, quais as ordens relativamente às quais o A., supostamente, não devia obediência, por violar os seus direitos e garantias nos termos da al. e) do n.º 1 do art.º 128.º do Código do Trabalho; 2. Indicar quais os direitos e garantias que se encontravam a ser violados se as ordens fossem cumpridas; e por fim 3. Estabelecer um nexo de causalidade entre, por um lado, o cumprimento da ordem dada pela R. e por outro lado, o direito ou a garantia do A. violada. 45.º Verifica-se pelo conteúdo da PI que nenhum dos factos supra constam da PI apresentada pelo A.. 46.º Razão pela qual se conclui que à PI apresentada pelo A. faltam a alegação dos factos essenciais que sustentam o pedido – ou seja, que estamos perante uma sanção abusiva. 47.º Ou seja, não tendo sido alegado nenhum facto essencial para se sustentar que estamos perante uma sanção abusiva – a PI apresentada não tem causa de pedir! 48.º E como tal, considerando que os presentes autos assentam exclusivamente sobre o tema da sanção abusiva, não tendo sido alegados os factos essenciais que constituem a causa de pedir da presente ação, só se poderá concluir pela ineptidão da PI do A. e consequentemente, a nulidade de todo o processo nos termos da al. a) do n.º 2 do art.º 186.º do CPC. 49.º Com efeito, na sua PI, o A. limitou-se a tecer menções genéricas, e considerações jurídicas superficiais sobre o tema da sanção abusiva, mas sem nunca fazer o relato concreto e específico dos factos cuja verificação terá feito nascer o direito invocado. 50.º Por conseguinte, falta na PI a causa de pedir quanto ao pedido de condenação da R. pela aplicação de sanção abusiva. 51.º O que acarreta a ineptidão da PI e torna nulo todo o processo nos termos do n.º 1 do art.º 186.º do CPC. 52.º Veja-se neste sentido, e num processo com contornos em tudo semelhantes, o Acordão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10.9.2020, processo 17500/18.9T8LSB.L1-2, que refere o seguinte: “(…) A causa de pedir, além de existir e de ser inteligível, deve estar em conformidade como o pedido, formando com a qualificação jurídica as premissas que constituem o corolário da pretensão formulada. A causa de pedir constitui um dos elementos indispensáveis da petição inicial. Representando o fundamento da pretensão de tutela jurisdicional formulada, a causa de pedir tem de ser invocada na petição, sem o que faltará a base, isto é, o suporte da ação. E acrescente-se que não basta uma menção genérica da situação factual, é necessário o relato concreto e específico dos factos cuja verificação terá feito nascer o direito invocado pelo autor. (…) A falta de formulação do pedido ou de indicação da causa de pedir, traduzindo-se na falta do objeto do processo, constitui nulidade de todo ele por ineptidão da petição inicial”. Sublinhado e negrito nossos 53.º Veja-se também neste sentido o disposto no recentíssimo Acordão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22.11.2023, processo n.º 3704/22.3T8CSC.L1-A-4, que refere o seguinte: “Analisada a petição inicial, consta-se, antes de mais, que a Autora não alegou qualquer facto que possa subsumir-se à alínea b) do n.º 1 do artigo 331.º do Código do Trabalho. Com efeito, em lado algum da petição inicial, a Autora identifica uma qualquer ordem que lhe tenha sido endereçada e que se recusou a cumpri-la por não lhe dever obediência. Por conseguinte, não há causa de pedir quanto ao pedido de condenação da Ré pela aplicação de sanção abusiva nos termos da al. b) do n.º 1 do artigo 331.º do CT. E muito menos alegou a Autora factos que integrem assédio moral.” (…) Sucede que, percorrendo a petição inicial, não vislumbramos, como não vislumbrou o despacho recorrido, que a Autora tenha invocado que foi sancionada pela simples razão de exercer, ter exercido ou pretender exercer ou invocar os seus direitos ou garantias de trabalhadora; não alegou factos nesse sentido ou concluiu nesse sentido.” Sublinhado nosso 54.º Em face do exposto supra, seguindo os ensinamentos dos Doutos Acordãos transcritos acima, também no âmbito dos presentes autos, não se vislumbra na PI apresentada pelo A., a concretização dos factos essenciais que constituem a causa de pedir. 55.º Nesta conformidade e faltando a causa de pedir, forçosamente terá de reconhecer-se a ineptidão da PI apresentada por falta da causa de pedir, o que acarreta a nulidade de todo o processo nos termos do n.º 1 do art.ºs 186.º do CPC, o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais. C) Do Incumprimento do Ónus de Alegação para o reconhecimento da Sanção Abusiva e do Assédio Moral 56.º Dá-se aqui por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais, tudo o que foi exposto acima acerca da ineptidão da PI apresentada pelo A.. 57.º Mas mesmo que assim não se entenda, o que sempre sem conceder, apenas se admite por mero dever de prudente patrocínio, sempre se dirá que a presente ação nunca poderá proceder, em virtude do A. Não ter logrado cumprir o Ónus de Alegação que sobre si impendia sobre o tema da sanção abusiva. Senão vejamos, 58.º O A. sustenta integralmente a impugnação da sanção disciplinar aplicada e pedindo a sua anulação com base no facto de, no seu entender, foi aplicada uma sanção abusiva. 59.º Mas, em momento algum, da PI que apresenta o A. logrou cumprir o ónus de alegação que impende sobre o impugnante que sustenta que lhe foi aplicada uma sanção abusiva, conforme veremos em maior detalhe abaixo. Senão vejamos, 60.º Com efeito, também nos presentes autos, o A. não dotou a PI que apresentou de um contexto factual, nem tão pouco alegou, que teria sido sancionado, pela simples razão de ter exercido ou pretender exercer direitos ou garantias, não alegou factos nesse sentido, nem tão pouco concluiu nesse sentido. 61.º Sendo este o facto essencial, e nuclear, na medida em que consubstancia a causa de pedir, para que se possa discutir a existência, ou não, da aplicação de uma sanção abusiva nos presentes autos. 62.º Incumprindo assim o Ónus de Alegação que sobre si impende, em decorrência de não ter logrado alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir da presente ação – ou seja, a alegação dos factos essenciais que levariam a sanção disciplinar aplicada a poder ser considerada uma sanção abusiva. 63.º Com efeito, conforme já referimos supra, de facto, o A. na sua PI limitou-se a tecer umas considerações jurídicas genéricas sobre sanções abusivas. 64.º Mas sempre desprovidas de qualquer contexto factual por intermédio dos quais fosse alegado e sustentado, estarmos presente uma sanção abusiva, ou seja, a alegação e prova de: 1. Factos que ilustrassem que a sanção foi aplicada porque o A. se recusou a cumprir a ordem à qual não lhe era devida obediência e que a aplicação da sanção foi motivada pelo facto de exercer, ter exercido ou ter invocado os seus direitos ou garantias; e 2. Factos relativos ao animus persecutório da empregadora sobre o qual terá assentado a sanção disciplinar 65.º Veja-se igualmente neste sentido o Acordão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22.11.2023, processo n.º 3704/22.3T8CSC.L1-A-4, que refere o seguinte: “Assim, competia à Autora, na petição inicial, (1) alegar factos que ilustrassem que a sanção foi aplicada apenas porque se recusou a cumprir ordem à qual não lhe era devida obediência e que a aplicação da sanção foi motivada pelo facto de exercer, ter exercido, pretender exercer ou ter invocado os seus direitos ou garantias. E mais, (2) à Autora incumbia alegar factos relativos ao animus persecutório da empregadora sobre o qual terá assentado a sanção disciplinar” 66.º Neste sentido, e novamente percorrendo a PI apresentada pelo A., o mesmo não logrou apresentar contexto factual que permita sustentar estarmos perante uma sanção abusiva. 67.º Ou seja, cumpria ao A. fornecer os factos, circunstanciando no tempo, local e espaço, o seguinte: 4. Indicar, de forma circunstanciada, quais as ordens relativamente às quais o A., supostamente, não devia obediência, por violar os seus direitos e garantias nos termos da al. e) do n.º 1 do art.º 128.º do Código do Trabalho; 5. Indicar quais os direitos e garantias que se encontravam a ser violados se as ordens fossem cumpridas; e por fim 6. Estabelecer um nexo de causalidade entre, por um lado, o cumprimento da ordem dada pela R. e por outro lado, o direito ou a garantia do A. violada. 68.º Verificasse pelo conteúdo da PI que o A. não logrou cumprir o Ónus de Alegação relativamente a nenhum dos factos essenciais para que o Digníssimo Tribunal pudesse apurar a existência, ou não, de uma sanção abusiva nos presentes autos. 69.º E como tal, considerando que os presentes autos assentam exclusivamente sobre o tema da sanção abusiva, não tendo sido cumprido o Ónus de Alegação quanto à mesma, forçosamente teremos de concluir “cai por terra” a possibilidade de se conseguir extrair uma condenação no âmbito dos presentes autos, devendo a presente ser dada por improcedente por não provada para todos os devidos efeitos legais. 70.º E, muito pelo contrário, nem direta ou indiretamente, é alegado (muito menos provado e sustentado) qualquer animus persecutório sobre a qual teria assentado a sanção disciplinar. 71.º Deste modo, assentando os presentes autos integral e exclusivamente sobre o facto do A. entender que estamos perante uma sanção abusiva e não tendo o mesmo logrado cumprir o Ónus de Alegação que sobre si impendia sobre os factos essenciais onde assentam a sua causa de pedir – o contexto factual e os elementos constitutivos da Sanção Abusiva, forçosamente a presente ação terá de ser dada por integralmente improcedente por não provada, o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais. D) Da Regularidade da Tramitação Processual e Formal do Processo Disciplinar 72.º Regista-se, para não mais ser retirado, que em momento algum, o A. colocou em causa a regularidade formal do Processo, assim como, a sua tramitação, para todos os devidos efeitos legais. 73.º Razão pela qual, sem prejuízo de tudo o referido supra sobre as irregularidades formais que enfermam a PI apresentada e que resultam na ineptidão da PI e consequentemente na nulidade de todo o processo, ou no mínimo, a improcedência do mesmo, atenta e não impugnação da regularidade processual e formal na tramitação do Processo Disciplinar, sempre se dirá que também do ponto de vista material não assiste ao A. qualquer tipo de razão.» - fim de transcrição. A Ré também se defendeu por impugnação. Finaliza solicitando que se: 1) RECONHEÇA QUE A SANÇÃO DISCIPLINAR FOI LEGITIMAMENTE APLICADA E GRADUADA COM BASE NOS PRINCÍPIOS GESTIONÁRIOS E DE OPORTUNIDADE DA R.; 2) A ACÇÃO SEJA JULGADA IMPROCEDENTE DE FACTO E DE DIREITO, ABSOLVENDO-SE INTEGRALMENTE A R. DOS PEDIDOS ORMULADOS PELO A.. Em 2 de Outubro de 2024, foi proferido o seguinte despacho:7 « Os presentes autos encontram-se em fase de saneamento, cumprindo efectuar uma gestão inicial dos mesmos (artigos 61º, do CPT e 590º, do CPC). Em contestação, a Ré deduziu uma excepção, importando conferir ao Autor prazo para que este, querendo, possa se pronunciar. Assim sendo, determino, numa decisão de adequação e agilização processual, ao abrigo do disposto pelos artigos 27º, do CPT e 3º, n.º 3, a notificação do Autor para querendo, no prazo de 10 dias, se pronunciar. Notifique.» - fim de transcrição. O Autor veio a responder em 5 de Novembro de 202488. Sustentou que devem ser julgadas improcedentes, por não provadas, as exceções invocadas, e ser proferido despacho de aperfeiçoamento, para que as deficiências detetadas na petição inicial possam ser supridas, nos termos do artigo 590.º, n.º 4 do CPC. Em 5 de Novembro de 2024, foi proferido a seguinte decisão:9 « Compulsados os autos para saneamento, verifica-se que está em causa a apreciação de sanção disciplinar aplicada pela Ré ao Autor. Assim, pese embora a pertinência das questões formais suscitadas pela Ré, importa antes de mais e à luz de um critério de oportunidade e economia processual, conhecer da eventual amnistia da sanção disciplinar, o que se passa a fazer, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 6º, do Código de Processo Civil. O Autor na petição inicial veio pugnar pela aplicação da Lei 38-A/2023, devendo ser declarada amnistiada a sanção disciplinar que impugna. A Ré, na contestação, veio pugnar pela não aplicação da Lei da amnistia à sanção disciplinar em causa nos presentes autos. Regularmente notificado o Autor nada disse ou requereu. Cumpre apreciar e decidir. Com relevo importa considerar que nos presentes autos o Autor peticionou a anulação da sanção disciplinar com o arquivamento do processo disciplinar, com a condenação da Ré no pagamento de indemnização por danos patrimoniais pela aplicação e sanção disciplinar abusiva. Estão em causa factos ocorridos entre os dias 14 a 16 de Setembro de 2022. E, da factualidade alegada não resulta a prática de qualquer ilícito penal. A Lei 38-A/2023 veio estabelecer um perdão de penas e amnistia de infrações, prevendo, quando ao seu âmbito, “as sanções relativas a infracções disciplinares e infracções disciplinares militares praticadas até às 00:00horas de 19 de Junho de 2023, nos termos definidos no artigo 6º” (artigo 2º, n.º 2, alínea b), da referida Lei). Nos termos do artigo 6º, “são amnistiadas as infracções disciplinares e as infracções disciplinares militares que não constituam simultaneamente ilícitos penais não amnistiados pela presente lei e cuja sanção aplicável, em ambos os casos, não seja superior a suspensão ou prisão disciplinar”. A amnistia é uma figura oriunda do direito penal que implica a extinção do procedimento criminal e, no caso de já ter havido condenação, faz cessar a execução das penas aplicadas, com o apagamento dos efeitos jurídicos da infracção. Desde há muito tempo a amnistia deixou de ser um instituto específico do direito penal, estendendo-se aos direitos sancionatórios conexos, como é o caso do direito disciplinar (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, 20.01.1993, www.dgsi.pt). Por outro lado, a Constituição da República Portuguesa atribui competência à Assembleia da República para conceder amnistias, sem estabelecer qualquer concessão entre essa competência e a sua competência em matéria penal e, igualmente, sem impor qualquer restrição quanto ao âmbito dessa competência, podendo, consequentemente, abranger as infracções disciplinares qualquer que seja o seu tipo. E é esta Assembleia que estabelece, confere e delimita todo o quadro normativo laboral, inclusive no âmbito do processo disciplinar. Como tal, nem se diga que a amnistia está ligada ao poder primitivo do Estado, apenas sendo amnistiáveis as infracções que lhe cabe punir. Anote-se ainda que, a amnistia de infracções laborais já ocorreu anteriormente, como foi o caso da Lei 16/86, de 11 de Junho, sendo que, desta vez, foi estendida às infracções disciplinares comuns. Analisando a letra da lei, quanto à questão da idade importa atender à expressão “igualmente”, a qual, independentemente da técnica legislativa significa que acresce, logo não está dependente da verificação de quaisquer outras premissas, nomeadamente as previstas no n.º 1, do artigo 2º. Assim, da conjugação das duas normas citadas, não resulta qualquer limitação quando à idade do trabalhador visado. E estando a sua aplicação apenas dependente de as infracções disciplinares não constituírem crime não amnistiados pela Lei, da sanção disciplinar não ser superior a suspensão ou prisão disciplinar e de terem ocorrido até às 00:00horas de dia 19 de Junho de 2023, a amnistia em causa mostra-se aplicável aos presentes autos, o que se decide. No que à inconstitucionalidade suscitada respeita, importa considerar que a nossa lei fundamental protege uma panóplia de direitos e princípios, pelo que, com frequência, tais direitos possam se apresentar em colisão. E, neste caso, à luz dos princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade (artigos 2º e 18º, da Constituição da República Portuguesa), haverá que encontrar um equilíbrio. É certo o direito de gestão conferido pelo artigo 86º às empresas privadas, bem como o direito do estado a conferir amnistias. E neste confronto prepondera o direito à amnistia. Por último, importa considerar que o pedido de condenação em danos não patrimoniais se encontra natural e intrinsecamente dependente da apreciação da sanção disciplinar aqui amnistiada, razão pela qual se mostra prejudicada a sua apreciação (artigo 608º, n.º 2, do Código de Processo Civil. Nestes termos e atendendo aos fundamentos supra, ao abrigo do disposto nos artigos 2º, n.º 2, alínea b), 6º e 14º, da Lei 38-A/2023, declaro amnistiadas as infracções disciplinares cometidas pelo Autor. Sem custas atenta a simplicidade. Em consequência, dou sem efeito a audiência agendada. Notifique e desconvoque» - fim de transcrição. As notificações desta decisão foram expedidas em 6 de Novembro de 2024, data em que o MºPº também foi notificado. Em 11 de Dezembro de 2024, a Ré recorreu.10 Concluiu nos seguintes moldes: « A) FUNDAMENTO ESPECÍFICO DA RECORRIBILIDADE – O presente recurso prende-se com o facto da Sentença emitido pelo Tribunal a quo padecer dos seguintes Erros na Aplicação do Direito: • Nulidade da Sentença – al d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC – por omissão de pronúncia quantos às exceções levantadas pela ora Recorrente, nomeadamente a ineptidão da PI, o que, sendo procedente, inviabilizaria o conhecimento da amnistia levantada pela ora Recorrida; e • Erro na Aplicação do Direito - pelo facto do Tribunal a quo ter, em nosso entender, erroneamente, aplicado a Lei Amnistia JMJ nos presentes autos, quando não o poderia, uma vez que a Lei Amnistia JMJ não abrange no seu âmbito as infrações laborais praticadas por trabalhadores vinculados a empregadores privados (o que é claramente o caso em apreço). B) IDENTIFICAÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA – Nos presentes autos estamos perante uma “decisão estranha” e vai contra toda a jurisprudência consolidada no Ordenamento Jurídico Português, porquanto o Tribunal a quo considerou que pese embora a pertinência das questões formais suscitadas pela Ré”, declarou, sem mais, “amnistiadas as infrações disciplinares cometidas pelo Autor” por força da Lei Amnistia JMJ, e por este motivo, pôs termo ao processo. C) DA NULIDADE DA SENTENÇA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA NOS TERMOS DA AL. D) DO N.º 1 DO ART.º 615.º DO CPC D) No âmbito da Contestação que apresentou a ora Recorrente levantou as seguintes Exceções: • Da Ineptidão da Petição Inicial por Discrepância entre o Pedido formulado e a Causa de Pedir – art.º 186.º al. a), b) e c) do CPC – nos art.ºs 14.º a 32.º da Contestação; • Da Ineptidão da PI por falta da Causa de Pedir – al. a) do n.º 2 do art.º 186.º do CPC – nos art.ºs 33.º a 55.º da Contestação; e • Do Incumprimento do Ónus de Alegação para o reconhecimento da Sanção Abusiva e do Assédio Moral – nos art.ºs 56.º a 71.º da Contestação; E) Não obstante as nulidades processuais levantadas pela ora Recorrente, o Tribunal a quo, a nosso ver erroneamente, fez “tábua rasa” das exceções e nulidades levantadas pela R. e conheceu de uma questão de mérito da ação (a questão da amnistia – aplicabilidade da Lei Amnistia JMJ). F) Não podia o Tribunal a quo reconhecer que as questões formais levantadas pela R. tinham “pertinência” para depois não se pronunciar sobre essas mesmas questões formais/nulidade, e pôr termo ao processo ao conhecer uma questão de mérito (a Amnistia por via da Lei n.º 38-A/2023). G) Veja-se precisamente nesse mesmo sentido, e entre muitos outros, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18.10.2016, processo 3848/14.2YIPRT.C1 em que é relator Manuel Capelo, disponível em dgsi.pt, que refere o seguinte: “A ineptidão da petição inicial é uma excepção dilatória que conduz à abstenção do conhecimento do mérito da causa e à absolvição dos Réus da instância e que tal excepção é de conhecimento oficioso pelo tribunal, conforme os artigos 186.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), e 278.º, n.º 1, alínea b), ambos do Código de Processo Civil.” Sublinhado nosso H) Desta forma, deve o Saneador Sentença ser declarado como nulo por omissão de pronúncia nos termos da al. d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, substituindo-se por outra Sentença que reconheça a Ineptição da PI, declare como nulo todo o processo e em consequência, absolva a R. da instância, o que se requer para todos os devidos efeitos legais. I) DO ERRO NA APLICAÇÃO DO DIREITO – PELO FACTO DO TRIBUNAL A QUO TER, EM NOSSO ENTENDER, ERRONEAMENTE, TER APLICADO A LEI N.º 38-A/2023, DE 2 DE AGOSTO NOS PRESENTES AUTOS J) Por força da Lei Amnistia JMJ, o Tribunal a quo declarou “amnistiadas as infrações cometidas pelo autor”. K) Não obstante, é conhecimento público e notório que a R. é uma sociedade comercial por quotas de Direito Privado, ou seja, um empregador privado e o A. é um trabalhador vinculado a um empregador privado (neste caso a R.). L) Sendo que a Lei Amnistia JMJ não abrange no seu âmbito as infrações disciplinares laborais praticadas por trabalhadores vinculados a empregadores privados (o que é claramente o caso), conforme tem sido a posição unânime dos Tribunais Superiores Portugueses, diga-se, de Norte a Sul do País, sem vozes dissonantes conhecidas, de que é exemplo o recentíssimo Acordão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24.1.2024, processo 778/23.3T8PDL-A.L1-4 em que é relator Celina Nóbrega, disponível em dgsi.pt, que refere o seguinte: “Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto (estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infracções por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude), não abrange no seu âmbito as infracções disciplinares laborais praticadas por trabalhadores vinculados a empregadores privados.” Sublinhado nosso M) A jurisprudência consolidada é a “âncora” que permite dotar os cidadãos (e também aos mandatários e demais agentes da Justiça), a confiança na estabilidade e previsibilidade nas decisões dos Tribunais Superiores Portugueses, de modo a que os cidadãos e agentes da Justiça possam, com segurança antecipar as consequências jurídicas das suas ações. N) Nesta conformidade, considerando que o Saneador Sentença Recorrido constitui um desvio injustificado face àquela que é a jurisprudência consolidada, dos Tribunais Superiores Portugueses, violando o princípio da segurança e certeza jurídicas, deverá o Acórdão Recorrido ser revogado e substituído por outro, por intermédio do qual se reconheça que a Lei Amnistia JMJ não é aplicável a trabalhadores vinculados e empregadores privados (o que é claramente o caso), em linha com a jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores Portugueses (sem vozes dissonantes conhecidas), e consequentemente, que reconheça que as infrações disciplinares em causa não se encontram amnistiadas e que foram aplicadas de forma justa e proporcional, mantendo-se as mesmas nos exatos termos em que foram aplicadas para todos os devidos efeitos legais, absolvendo-se a ora Recorrente de todos os pedidos, para todos os devidos efeitos legais)….» - fim de transcrição. Não foram apresentadas contra alegações. Em 17/02/2025, foi proferido o seguinte despacho:11 « Por ser tempestivo, legalmente admissível e tendo o recorrente legitimidade para o efeito, que é de apelação e sobe imediatamente, nos termos dos artigos 79º-A, n.º 1, alínea a), 80º, 81º, n.º 1 e 82º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho. Notifique. Subam os autos ao Tribunal da Relação de Lisboa» - fim de transcrição. Em 28 de Março de 2025, o valor da causa foi fixado nos seguintes moldes: « Compulsados os autos resulta que, por manifesto lapso não se ficou o valor à presente acção, o que se passa a fazer, como segue. * Nos presentes autos está em causa a apreciação de sanção disciplinar aplicada ao Autor pela Ré de 15 dias de suspensão da prestação de trabalho com perda de retribuição e antiguidade. E o Autor peticiona a condenação da Ré no pagamento de danos patrimoniais por aplicação de sanção abusiva no valor de 5.000€. Assim, de acordo com o disposto nos artigos 296º e 297º, n.º 1, do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho, atenta a utilidade económica do pedido, o valor da acção deve ser fixado no valor de 5.000€, o que se decide. Notifique. * Subam os autos ao Tribunal da Relação de Lisboa.»- fim de transcrição. A Exmª Procuradora Geral Adjunta formulou o seguinte parecer: « Inconformada com a decisão de 5 de novembro de 2024 que declarando amnistiadas as infrações disciplinares alegadamente praticadas pelo Autor AA, e prejudicada a apreciação do pedido de condenação em danos não patrimoniais, deu sem efeito a audiência agendada, recorre a Ré SAM – SOCIEDADE DE AUTOMÓVEIS DA MADEIRA, LDA. Alega e conclui, em síntese, e no que releva: a) A sentença padece de nulidade nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alíneas d) do CPC por não se ter pronunciado quanto às exceções invocadas pela Recorrente, designadamente a ineptidão da petição inicial, que, sendo procedente inviabilizaria o conhecimento da amnistia suscitada pelo Recorrido; b) O Tribunal a quo aplicou erradamente Lei da Amnistia JMJ, quando não podia fazê-lo, porque a mesma não se aplica a infrações laborais praticadas por trabalhadores vinculados a empregadores privados, como é o caso dos autos. Tem razão. O Tribunal a quo não apreciou a questão da ineptidão da petição inicial que, sendo procedente determinaria a absolvição da instância e, por outro lado, julgou erradamente amnistiadas as infrações disciplinares cometidas pelo Autor. Efetivamente, sobre a questão de saber se a expressão “infrações disciplinares” constante do artigo 6.º da Lei n.º 38-A/2023, de 02 de Agosto inclui as infrações disciplinares laborais praticadas por trabalhadores de empresas privadas já se pronunciou este Tribunal da Relação, além do mais no Acórdão de 24 de janeiro de 2024, no Proc. 778/23.3T8PDL-A.L1-412, seguindo a posição de António Monteiro Fernandes e João Vilaça em Atualidade Laboral: “Estarão as infrações laborais cobertas pela amnistia?” - RHmagazine, e não vemos razões para divergir desta posição: a Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto (estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude), não abrange no seu âmbito as infrações disciplinares laborais praticadas por trabalhadores vinculados a empregadores privados. Deve, pois, proceder o recurso interposto, revogando-se a sentença recorrida, e determinar-se o prosseguimento dos autos.» - fim de transcrição. Não houve respostas. Foram colhidos os vistos. Nada obsta ao conhecimento. **** Na elaboração do presente acórdão será levada em conta a matéria resultante do relatório. *** É sabido que o objecto do recurso apresenta-se delimitado pelas conclusões da respectiva alegação (artigos 635º e 639º ambos do CPC ex vi do artigo 87º do CPT aplicável). Mostra-se interposto um recurso pela Ré no qual suscita duas questões. A primeira consiste em saber se nos encontramos perante uma situação de nulidade de sentença por omissão de pronúncia no tocante às arguidas: • Ineptidão da Petição Inicial por Discrepância entre o Pedido formulado e a Causa de Pedir; • Ineptidão da PI por falta da Causa de Pedir – al. a) do n.º 2 do art.º 186.º do CPC – nos art.ºs 33.º a 55.º da Contestação. • Incumprimento do Ónus de Alegação para o reconhecimento da Sanção Abusiva e do Assédio Moral. Entendemos negativamente. É sabido que as nulidades da sentença se encontram taxativamente previstas no artigo 615º do CPC. Tais nulidades têm a ver com vícios estruturais ou intrínsecos da sentença ou despacho, sendo que não se confundem com o erro de julgamento de facto ou de direito. Segundo a alínea d) do nº 1 da citada norma, ex vi do artigo 77º do CPT, “é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento”. Tal preceito deve ser coonestado com o nº 2 no artigo 608º do CPC, segundo o qual “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo não se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.” Como tal, a nulidade por omissão de pronúncia só se verifica quando o julgador deixe de resolver questões que tenham sido submetidas à sua apreciação pelas partes, a não ser que esse conhecimento fique prejudicado pela solução de outras questões anteriormente dirimidas.13 In casu, a decisão recorrida julgou [bem ou mal, o que neste particular não releva] que a infracção disciplinar que terá sido cometida pelo Autor se mostra amnistiada. Ou seja, de acordo com o raciocínio implicitamente perfilhado na decisão recorrida tal questão assumia(u) cariz prévio. É certo que não se trata de uma questão prejudicial em sentido estrito 1415 16. Todavia, trata-se de questão cujo conhecimento prévio prejudica a análise das restantes, nomeadamente o da verificação das arguidas nulidades processuais, na justa medida em que desaparecendo a infracção disciplinar (eventualmente) praticada pelo Autor, por força da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, a presente causa torna-se desnecessária. Em suma, de acordo com a estrutura e encadeamento lógico da verberada decisão tal problemática carecia de prévia decisão, desde logo, por razões de economia e celeridade processuais e de eficácia das decisões. Assim, cumpre concluir que assume cariz prejudicial, em sentido lato, que também se pode reputar de prévio, a situação em que o conhecimento prévio de determinada questão de fundo ou até de forma de acordo com a estrutura e encadeamento lógicos da sentença/decisão prejudique o conhecimento de outras questões suscitadas na acção. É o caso. Como tal, atento o nº 2 do artigo 608º, do CPC, ex vi da alínea a) do nº 2 do artigo 1º do CPT, o conhecimento das demais questões suscitadas nestes autos ficou prejudicado pela solução encontrada. Aliás, deve salientar-se que o Autor, convidado para o efeito, também sustentou que «devem ser julgadas improcedentes, por não provadas, as exceções invocadas, e ser proferido despacho de aperfeiçoamento, para que as deficiências detetadas na petição inicial possam ser supridas, nos termos do artigo 590.º, n.º 4 do CPC». Em suma, não se reputa verificada a arguida nulidade de sentença. **** A segunda questão suscitada no recurso consiste em saber se o disposto no artigo 2.º n.º 2, alínea b) e artigo 6.º da Lei n.º 38-A/2023 de 2 de agosto (“Lei da Amnistia”) é aplicável ao caso. Anote-se, desde logo, que não se mostra controvertido que entre a Ré e a Autora vigorava um contrato de trabalho. De outra forma, a Ré não sancionaria disciplinarmente o peticionante com quinze dias de suspensão. Tal relação rege–se por leis de direito privado pelo que nem o Autor nem a Ré estão sujeitos à subordinação jurídica ou à tutela disciplinar do Estado. Dito isto, afigura-se-nos que as invocadas normas da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, não logram aplicação a infracções disciplinares laborais, nomeadamente as praticadas por trabalhadores vinculados a empregadores privados. Nas palavras de Jorge Miranda e Rui Medeiros a amnistia é uma « medida excepcional, expressão do poder soberano simétrica do poder de punir, a decisão de amnistiar assenta na pura discricionariedade política, seja qual for a sua finalidade (celebrativa do evento, pacificadora da sociedade, correctiva de prática legislativa ou judicial, etc» - fim de transcrição. Nos termos dos artigos 127º e 128º do Código Penal, a amnistia, extingue a responsabilidade do agente. A amnistia em sentido próprio tem por efeito a «abollitio criminis» anulando, pois, o crime ou infracção. A amnistia imprópria extingue a punibilidade e a pena. Na situação em exame encontramo-nos no âmbito de uma relação contratual de índole privada da qual derivam deveres para ambos os outorgantes do contrato de trabalho e poder disciplinar para a entidade patronal [recorde-se o disposto nos artigos 328º a 332º do CT/2009]. Assim, atenta a natureza da medida em causa afigura-se-nos que a mesma não pode, nem deve abranger as relações contratuais laborais estabelecidas entre trabalhadores e empresas privadas sob pena de o Estado se estar a intrometer em relações contratuais com as quais nada tem a ver. É que não se está perante infracção de ordem criminal. Também não se está a apreciar a prática de contra ordenação laboral, mas perante a prática de (eventual) infracção disciplinar decorrente da violação de deveres contratuais de um trabalhador susceptível de gerar responsabilidade disciplinar e contratual. Argumentar-se-á com o teor dúbio das invocadas normas da referida Lei da Amnistia, sendo que aludem a “infracções disciplinares” sem destrinçar entre as praticadas por trabalhadores de empresas privadas e trabalhadores ao serviço de empresas ou organismos públicos. Assim, pode argumentar-se que a dita Lei da Amnistia abrange as infracções disciplinares laborais praticadas por trabalhadores vinculados por relação laboral privada. Porém, isso não resulta claro da letra da Lei nem se pode inferir do seu preâmbulo, sempre cumprindo recordar o disposto no artigo 9º do Código Civil. Anote-se ainda que a amnistia é uma medida de índole excepcional, sendo que nos termos do artigo 11º do Código Civil as normas excepcionais não comportam aplicação analógica. Frise-se ainda que usualmente as Leis de Amnistia não vão no sentido de abranger infracções disciplinares laborais praticadas por trabalhadores vinculados a empregadores privados, o que se explica pela circunstância de o Estado não ter poderes para dispor de um direito de que não é titular. Sobre esta questão escrevem António de Lemos Monteiro Fernandes e João Vilaça, em RH Magazine, 12 de Setembro de 2023, consultável em https://rhmagazine.pt/atualidade-laboral-estarao-as-infracoes-laborais-cobertas-pela-amnistia/: « Em termos de consequências práticas, importará saber se as infrações que, no quadro das relações de trabalho privadas, tenham sido punidas com sanções conservatórias (a repreensão, a sanção pecuniária, a perda de dias de férias e a suspensão do trabalho sem retribuição) devem considerar-se cobertas pela amnistia estabelecida, impondo-se o seu apagamento dos respetivos registos disciplinares e a eventual devolução de valores salariais retidos. Em geral, os anteriores diplomas referentes a amnistias não deixavam espaço significativo para tal dúvida. Tomando como exemplos os que assinalaram as visitas a Portugal do Papa João Paulo II, encontramos dois enunciados diferentes, mas que respondiam no mesmo sentido à questão posta. A Lei n.º 23/91, de 4 de julho estendia a amnistia às infrações disciplinares cometidas por trabalhadores de empresas públicas ou de capitais públicos, excetuando aquelas que, em simultâneo, constituíssem ilícito penal não amnistiado pela referida lei e tivessem sido punidas com despedimento. Por seu lado, a Lei n.º 29/99, de 12 de maio, excluía liminarmente do âmbito da amnistia os “ilícitos laborais”, e incluía ao mesmo tempo nesse âmbito as “infrações disciplinares e os ilícitos disciplinares militares”, sob as mesmas condições definidas pela lei anteriormente citada. Era assim claro que, pelo menos, as infrações disciplinares praticadas por trabalhadores de empresas com as quais tivessem relações reguladas pela legislação laboral geral estariam excluídas do âmbito da amnistia. Por outro lado, é estabelecida uma amnistia, a qual cobre as infrações penais cuja pena não ultrapasse 1 ano ou 120 dias de multa, e “as infrações disciplinares e infrações disciplinares militares praticadas até àquela data, que não se revelem, em simultâneo, como ilícitos penais, e desde que não superiores a suspensão ou prisão disciplinar” – ou seja, infrações disciplinares punidas com sanções conservatórias. Quanto a este último ponto, todavia, a Lei n.º 38-A/2023 parece deixar em aberto o significado a atribuir à expressão “infrações disciplinares”. O restante texto não oferece nenhuma indicação a esse propósito. Fica, aparentemente, de pé a questão de saber se essa expressão também abrangerá as sanções disciplinares laborais, aplicadas pelos empregadores privados, no exercício do seu poder disciplinar. A infeliz opção do legislador atual foi a de reproduzir uma parte da solução acolhida pela Lei n.º 29/99 (a inclusão na amnistia das infrações disciplinares e dos ilícitos disciplinares militares) omitindo a fórmula através da qual esse diploma afastava liminarmente da amnistia os “ilícitos laborais”. Uma interpretação literal do art.º 6º da Lei n.º 38-A/2023 conduzirá, assim, à inserção de toda e qualquer infração disciplinar não extintiva no âmbito coberto pela amnistia. Mas será, a nosso ver, uma interpretação errónea. O ato de clemência que se corporizou na Lei 38-A/2023 representa uma renúncia parcial e momentânea do Estado ao seu poder de punir (ius puniendi), reduzindo ou anulando penas aplicadas por crimes, coimas correspondentes a contraordenações e sanções fundadas em infrações disciplinares praticadas no âmbito de funções públicas, incluindo o sector militar. O Estado dispôs assim de faculdades sancionatórias que lhe pertencem, com o propósito de assinalar o acontecimento relevante que foi a Jornada Mundial de Juventude, com a presença do Papa. Fora desse domínio se situa a disciplina laboral, conjunto de dispositivos de natureza normativa e sancionatória que se encontram na titularidade de quem gere empresas, como condição de viabilidade do funcionamento e da coesão interna destas. Em relação ao exercício do poder disciplinar, o legislador cria, normativamente, condições de controlo dos excessos e abusos a que ele pode conduzir, como poder funcionalizado ao interesse de uma das partes no contrato de trabalho. Mas não pode ir além disso. Não pode, nomeadamente, agir como se lhe pertencesse esse poder, renunciando totalmente ou parcialmente ao seu exercício – e privando da sua titularidade plena os empregadores. A neutralização de decisões disciplinares nas empresas – para além dos casos em que a sua ilicitude seja declarada pelos tribunais – teria consequências conflituantes com a liberdade de organização e gestão das empresas, consagrada nos art.ºs 61º e 80º-c) da Constituição, e representaria uma forma de ingerência manifestamente não comportável nos limites definidos pelo art.º 86º/2 da Lei Fundamental. Esvaziar juízos disciplinares legitimamente realizados sobre comportamentos dos trabalhadores constitui um facto de enorme perturbação na ordem e na coesão interna das empresas, sem apoio no ordenamento constitucional. Assim, pode bem interpretar-se o art.º 6º da Lei 38-A/2023, nomeadamente no tocante à omissão do segmento que, na Lei 29/99, expressamente excluía os “ilícitos laborais”, como a expressão do reconhecimento das evidências que se acaba de apontar e, por conseguinte, em sentido restritivo, deixando à margem da amnistia decretada as infrações praticadas por trabalhadores ao serviço de empresas com as quais tenham relações reguladas pela lei geral do trabalho » - fim de transcrição, sendo que tal artigo é citado no aresto da Relação de Lisboa, de 24 de Janeiro de 2024, processo n.º778/23.3T8PDL-A.L1-4, Relatora Celina Nóbrega,acessível em www.dgsi.pt. Aliás, cumpre salientar que segundo os Professores Jorge Miranda e Rui Medeiros «Já no âmbito de empresas públicas e das entidades privadas afigura-se-nos problemática a possibilidade de amnistiar. Se for possível amnistiar faltas disciplinares em empresas públicas, dir-se-á que o princípio da igualdade exige a sua extensão às privadas. Mas, em contrapartida, conceder amnistias em entidades privadas por factos cometidos no seu interior poderá ser entendido como ofensa à liberdade de iniciativa económica privada» - fim de transcrição. Concorda-se, pois, com o dirimido nos Acórdãos: - do Tribunal da Relação de Lisboa, de 24 de Janeiro de 2024, proferido no processo n.º778/23.3T8PDL-A.L1-4, Relatora Celina Nóbrega,acessível em www.dgsi.pt, que logrou o seguinte sumário: «A Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto (estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infracções por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude), não abrange no seu âmbito as infracções disciplinares laborais praticadas por trabalhadores vinculados a empregadores privados»; - do Tribunal da Relação de Lisboa, de 6 de Março de 2024, processo n.º 10517/23.3T8LSB.L1, Relator Sérgio Almeida que teve o seguinte sumário: «O Estado não tem legitimidade, no atual quadro jurídico-político e constitucional, para dispor, por via legislativa, do exercício do poder disciplinar de entidades que não fazem parte do mesmo e que exercem um poder disciplinar que é delas e não do Estado. Consequentemente, a Lei 38-A/2023 de 2/08 (lei da amnistia) não é aplicável às infracções disciplinares laborais de direito privado»; - do Tribunal da Relação de Guimarães, de 2 de Maio de 2024, processo 1773/23.8T8VCT-A.G1, Relatora Maria Leonor Barroso, acessível em www.dgsi.pt, segundo o qual : «As infracções disciplinares laborais praticadas por trabalhadores vinculados a empregadores privados não se encontram abrangidas pela lei de amnistia, aprovada aquando das “JMJ”, Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto». - da Relação do Porto, de 20-05-2024, proferido no,processo nº 1680/23.2T8AGD.P1, Nº Convencional:JTRP000, Nº do Documento:RP202405201680/23.2T8AGD.P1, Relator Rui Penha que teve o seguinte sumário: «A amnistia prevista no art.º 6º da Lei 38-A/2023, de 2 de Agosto, não se aplica às infrações disciplinares laborais de direito privado». - da Relação do Porto, de 3-06-2024, proferido no processo nº 15694/23.0T8PRT.P1, Nº Convencional:JTRP000, Relatora Rita Romeira, acessível em www.dgsi.pt, que teve o seguinte sumário: « I - O perdão de penas e a amnistia de infracções estabelecida na Lei nº 38-A/ 2023, de 2 de Agosto, decorrente da realização da Jornada Mundial da Juventude em Portugal, quando refere “infracções disciplinares” não está a incluir os ilícitos de natureza laboral praticados por trabalhadores vinculados a empregadores privados, ou seja, não abrange as infracções disciplinares laborais praticadas no âmbito de relações desta natureza». Em suma, cumpre concluir que a Lei n.º 38-A /2023, de 2 de Agosto (Lei da Amnistia), não abrange as infracções disciplinares laborais praticadas por trabalhadores vinculados a empregadores privados, o que no caso acarreta a revogação do despacho recorrido com as inerentes consequências processuais, nomeadamente a apreciação das arguidas nulidades no momento processual próprio. **** Em face exposto, acorda-se em revogar o despacho recorrido que deve ser substituído por outro, que faça prosseguir a acção nos moldes que se reputarem por convenientes. Custas do recurso pela parte vencida a final. Notifique. DN (processado e revisto pelo relator). Lisboa, 18-06-2025 Leopoldo Soares Maria José Costa Pinto Alves Duarte _______________________________________________________ 1. Em 4 de Abril de 2024- fls. 1. 2. Fls. 3 a 7. 3. Fls. 7 a 9. 4. Fls. 33. 5. Fls. 35 v a 71. 6. Fls. 37 a 41 v. 7. Fls. 350 – II Volume. 8. Vide fls. 355 a 358 v. 9. Vide fls.353 e 354. 10. Vide fls. 362 a 367 v. 11. Fls. 370. 12. 1 No mesmo sentido vejam-se também, entre outros, o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 2 de maio de 2024, processo 1773/23.8T8VCT-A.G1, o Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 20 de maio de 2024, processo 1680/23.2T8AGD.P1 13. Vide neste sentido ac. do STJ, de 11-10-2022, proferido no processo nº 602/15.0T8AGH.L1-A.S1 Nº Convencional:1.ª SECÇÃO, Relator Conselheiro Isaías Pádua, acessível em www.dgsi.pt. 14. Decorre do nº. 2 do art.º 276º do CPC que uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão da primeira pode fazer desaparecer o fundamento ou a razão de ser da segunda. Assim, uma questão pode ser prejudicial quando é susceptível de fazer desaparecer o fundamento ou a razão de ser de outras. 15. Segundo aresto do STA, de 08-07-1999, 042629, Tribunal: 2 SUBSECÇÃO DO CA, Relator Pires Esteves acessível em https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/7fa2ea1fec084f0a802568fc003a19fa?OpenDocument,: « I - Questões prévias são todas aquelas que devem ser resolvidas antes do julgamento final. II - Questões prejudiciais são aquelas de cuja resolução depende o conhecimento e resolução de uma outra. III - As questões prejudiciais são assim, também, questões prévias. IV - Há erro nos pressupostos de facto quando o acto administrativo se baseia em factos materialmente inexistentes ou apreciados erroneamente. V - O erro nos pressupostos de facto integra o vício de violação de lei.». 16. No fundo trata-se de uma situação em que o conhecimento do objecto (fundo ou mérito da causa) se encontra dependente da resolução prévia de uma outra questão «que faz parte do encadeamento lógico da sentença a proferir». – vide nesse sentido ac. da Relação de Lisboa, de 06-09-2018, proferido no processo, 4730/16.7T8LSB.L1-2, Relator Arlindo Crua, acessível em www.dgsi.pt, embora se admita que em situação diversa. Ali se refere no sumário: «- Questão prejudicial pode definir-se como aquela cuja solução é necessária para se decidir uma outra; - existe prejudicialidade nas situações em que o conhecimento do fundo ou mérito da acção (ou seja, para se prover sobre o petitório formulado) está dependente da prévia resolução de uma outra questão que, segundo a estrutura lógica ou o encadeamento lógico da sentença, carece de prévia decisão ».. Nesse aresto também se refere: «Relativamente à noção ou caracterização de questão ou causa prejudicial (já supra definimos a noção daquela), afirma-se que “uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão da primeira pode destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda”. « Acrescenta Alberto dos Reis [14- Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 3º, 1946, Coimbra Editora, pág. 268 e 269.] que “segundo o Prof. Andrade, verdadeira prejudicialidade e dependência só existirá quando na primeira causa se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta em via incidental, como teria de o ser, desde que a segunda causa não é reprodução, pura e simples, da primeira. Mas nada impede que se alargue a noção de prejudicialidade, de maneira a abranger outros casos. Assim pode considerar-se como prejudicial, em relação a outro em que se discute a título incidental uma dada questão, o processo em que a mesma questão é discutida a título principal. |