Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | TERESA PARDAL | ||
Descritores: | MEAÇÃO NOS BENS DO CASAL GARANTIA HIPOTECÁRIA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 01/11/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | N | ||
Texto Parcial: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | - Tendo sido apreendido para a massa insolvente o direito da insolvente à meação nos bens comuns do casal e não tendo sido requerida a separação de bens, não pode ser considerada a garantia hipotecária constituída sobre um imóvel que integre a meação. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa. RELATÓRIO: Por apenso ao processo de insolvência, onde foi declarada insolvente M… apresentada a lista de credores pela Sra Administradora, onde constam o C…, com um crédito comum de 284,56 euros e o N… com um crédito garantido por hipoteca de 69 373,75 euros, veio a ser proferida sentença que, considerando não terem sido apreendidos bens imóveis, mas sim a meação da insolvente nos bens comuns do casal, decidiu da seguinte forma: A)– Julgo verificados os seguintes créditos: 1.– C…, no montante de 284,56 euros, crédito comum. 2.– N…, no montante de 69 373,75 euros, crédito comum. B)– Graduo os créditos para serem pagos pelo produto dos bens apreendidos: 1.– Em primeiro e único lugar, rateadamente, os créditos comuns. Inconformado, o credor reclamante N… interpôs recurso e alegou, formulando conclusões com os seguintes argumentos: – Nos presentes autos foi apreendida a meação da insolvente relativamente ao imóvel do qual o recorrente era credor hipotecário e, em data anterior à declaração de insolvência, o recorrente adquiriu a meação do cônjuge da insolvente no âmbito de um processo executivo, pelo que à data da venda da meação do imóvel apreendido nos presentes autos, já o recorrente era proprietário da outra meação, razão pela qual não houve notificação ao comproprietário do imóvel para requerer a separação da sua meação da massa insolvente. – Deste modo, o Administrador de Insolvência procedeu à publicitação do anúncio de venda da meação do imóvel apreendido, tendo o mesmo sido adjudicado ao recorrente pelo montante de 21 075,00 euros. – Na sentença recorrida, veio a ser graduado o crédito como comum, por a hipoteca não incidir sobre o direito à meação do imóvel apreendido e não ter sido feita a separação de bens. – Apesar de o artigo 690º do CC não permitir a constituição de uma hipoteca sobre a meação de bens comuns do casal, no caso dos autos não se trata de uma hipoteca nova, mas sim de uma alteração na hipoteca já existente. – No âmbito dos presentes autos, não existia qualquer possibilidade de o comproprietário requerer a separação da sua meação, dado que a mesma já era propriedade do recorrente. – O direito do credor hipotecário e a sua legítima expectativa à respectiva garantia mantêm-se mesmo depois da insolvência de um dos mutuários e proprietários do imóvel. – Sobre os proprietários do imóvel não recai qualquer obrigação legal de instaurar acção de divisão da coisa antes de se apresentarem à insolvência ou de esta ser requerida por um credor. – Exigir a divisão do bem para que o crédito seja graduado como garantido constitui uma violação dos princípios da tutela jurisdicional efectiva, da protecção da confiança e da proporcionalidade, consignados nos artigos 2º, 18º e 20º da CRP, vendo-se o credor hipotecário privado do uso das prerrogativas inerentes a essa qualidade e conferidas pelo artigo 686º do CC, apenas porque os proprietários não cuidaram de dividir o património comum. – Não pode o direito do credor hipotecário ser prejudicado com a exigência de um acto prévio que não está na sua vontade, mas sim de terceiros, nomeadamente da insolvente. – Nos termos do artigo 925º do CPC, o recorrente não teria legitimidade para instaurar uma acção de divisão de coisa comum contra a insolvente e o seu cônjuge meeiro, pelo que estaria sempre dependente de um acto a praticar por terceiros. – A sentença recorrida deverá ser substituída por outra que gradue o crédito do recorrente como garantido e não como crédito comum, de acordo com a preferência que lhe é atribuída pelo artigo 686º do CC. Não foram apresentadas contra-alegações e o recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos autos e efeito devolutivo. A questão a decidir é a de saber se o crédito do apelante tem prioridade no pagamento do bem apreendido, por ser um crédito garantido e não comum. FACTOS. A sentença recorrida atendeu aos seguintes factos que considerou assentes: 1–O Administrador de Insolvência elaborou a relação de créditos reconhecidos da qual constam os seguintes créditos: 1.-C…, no montante de 284,56 euros, crédito comum. 2.-N…, no montante de 69 373,75 euros, crédito garantido (hipoteca). 2–Foi apreendido o direito à meação da insolvente nos bens comuns do casal. Ao abrigo dos artigos 607º nº4 e 663º nº2 do CPC, considera-se, ainda, provados os seguintes factos: 3–O ora recorrente reclamou créditos no montante global de 69 373,75 euros e juros, provenientes de três contratos de mútuo não cumpridos integralmente, celebrados respectivamente, em 23/07/2007, 23/07/2001 e 31/05/2010, com a insolvente e J…, casados entre si no regime de comunhão de adquiridos, (fls 8 e seguintes). 4–Para garantia dos três referidos mútuos foram constituídas hipotecas sobre a fracção autónoma inscrita a favor dos mutuários e correspondente à fracção G, 3º andar esquerdo do prédio urbano sito na T…, lote 30, na Rua … nº8, Praceta … nº8 e 8-A e Avenida …, freguesia de …, Concelho de Sintra, descrita na CRP de Sintra sob o nº…, inscrito na respectiva matriz sob o artigo …, encontrando-se as hipotecas inscritas a favor do reclamante (antes B…, incorporado no BB…, cujos activos foram transferidos para o recorrente), respectivamente pela ap. 2 de 2001/05/30, ap. 6 de 2006/11/03 e ap.5725 de 2010/06/02 (fls 34 e seguintes). ENQUADRAMENTO JURÍDICO. O crédito reclamado pelo ora recorrente foi indicado como crédito garantido, por gozar de hipotecas sobre o imóvel descrito no ponto 4 dos factos e foi classificado nessa qualidade na lista de credores apresentada pela Administradora Judicial. Estatuindo o artigo 686º do CC que a hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, são coisas imóveis as descritas no artigo 204º do CC e são coisas móveis, segundo o artigo 205º do mesmo código, todas as não compreendidas no artigo anterior. Porém, nos presentes autos, apenas se mostra apreendido, ao abrigo do artigo 149º do CIRE, o direito à meação da insolvente nos bens comuns do casal, direito este que constitui um bem móvel, de acordo com a classificação constante nos referidos artigos, não estando apreendido o imóvel referido no ponto 4 dos factos. Não foi, assim, apreendido o bem sobre o qual recaem as hipotecas invocadas, sendo indiferente que esse imóvel objecto da hipoteca integre a meação apreendida, pois o direito à meação não confere o direito aos bens concretos que integram a comunhão conjugal e sendo certo que, não podendo a meação ser objecto de hipoteca por força do artigo 690º do CC, não poderia agora permitir-se que aquilo que este artigo proíbe. Alega o recorrente estar dependente da iniciativa da insolvente ou do cônjuge meeiro em promover a separação de bens, não podendo a sua legítima expectativa de se fazer pagar com preferência sobre os outros credores ser frustrada por tal separação não ter sido requerida por quem teria legitimidade para o efeito. A separação de bens, forma de alterar o regime de comunhão de bens, geral ou de adquiridos, opera nos termos do artigo 1715º nº1, alíneas b), c) e d) do CC, nomeadamente, em sede de insolvência, mediante a separação a que se refere o artigo 141º nº 1 b) e nº3 do CIRE. No caso dos autos, ao não ser promovida a separação por qualquer das referidas formas, o direito do recorrente às garantias hipotecárias e a expectativa daí decorrente não ficam prejudicados, uma vez que, face ao direito de sequela inerente a este direito, a respectiva garantia mantém-se se o bem for transmitido, independentemente de quem, a final, vier a ser o adquirente do imóvel, não se mostrando violados os direitos constitucionais invocados pelo recorrente, cuja garantia hipotecária não se extingue e continua a vigorar sobre o imóvel. Deste modo, não tendo sido efectuada a separação de bens, não poderia ser atendida a garantia de hipoteca, cujo objecto é um bem que não se encontra apreendido, não tendo o recorrente prioridade ver satisfeitos os seus créditos através do direito à meação dos bens comuns do casal, efectivamente apreendido (cfr neste sentido os acs RL 24/09/2013, p. 2448/13, RP de 29/04/2014, p. 378/12, RC de 24/09/2013, p. 1260/12 e 14/02/2012, p. 88/11, RG 30/10/2008, p. 2007/08, todos em www.dgsi.pt). O facto invocado nas alegações de que foi o ora recorrente quem, em sede de um processo de execução, adquiriu a outra meação e de que veio a adquirir a meação da insolvente destes autos (o recorrente refere-se à aquisição da meação do imóvel, mas o que consta nos factos provados é a apreensão da meação dos bens comuns do casal) não está demonstrado nos presentes autos. De qualquer forma tal não obstaria ao supra exposto, desde logo porque, sendo o bem vendido diferente daquele sobre o qual recai a hipoteca, podendo eventualmente incluir outros bens para além do imóvel hipotecado e ter um valor diferente do valor do imóvel, não pode cumprir a função de garantia inerente a este último; por outro lado, a confirmar-se o alegado pelo recorrente, de aquisição das duas meações dos bens comuns do casal, cessaria a comunhão do património do casal e os bens concretos que o integram, incluindo o imóvel em causa, passariam a pertencer-lhe, podendo o recorrente aliená-los à sua vontade e fazer-se pagar pelo produto da sua venda. Improcedem, portanto, as alegações de recurso. DECISÃO. Pelo exposto, decide-se julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida Custas pelo apelante. Lisboa, 2017-01-11 Maria Teresa Pardal Carlos Marinho Anabela Calafate | ||
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Decisão Texto Integral: |