Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5999/20.8T8SNT-B.L1-6
Relator: MANUEL RODRIGUES
Descritores: LIVRANÇA EM BRANCO
DEVEDOR
INSOLVENTE
CESSÃO
PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/04/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I - A certeza e a liquidez de dívida garantida por livrança em branco, em relação à qual foi acertado pacto de preenchimento, nos termos do art.º 10.º da LULL, aplicável por força do art.º 77.º do mesmo diploma, alcança-se após o vencimento da obrigação exequenda e o preenchimento e completude desse título cambiário, que, assim, fica revestido de força executiva.
II - As obrigações a que se encontrem adstritos devedores insolventes têm-se por vencidas por força da declaração da sua insolvência, como consequência da impossibilidade de cumprimento de tais obrigações (artigos 91.º, n.º 1 e 3.º, n.º 1, do CIRE).
III - Tendo as livranças dadas à execução sido transmitidas para a exequente/recorrente por efeito de negócio de cessão de créditos (art.º 582.º do Cód. Civil), podem os avalistas, aqui recorridos, opor àquela portadora e cessionário todos os meios de defesa que lhe seria lícito invocar contra o cedente, com ressalva dos que provenham de facto posterior ao conhecimento da cessão (artigo 585.º do Cód. Civil).
IV - Numa livrança em branco, o prazo de prescrição de três anos previsto no artigo 70º ex vi do artigo 77º, da LULL conta-se a partir da data de vencimento que venha a ser aposta no título pelo respectivo portador, quer essa data coincida ou não com o incumprimento da obrigação subjacente ou com o vencimento dessa mesma obrigação decorrente da insolvência do subscritor, em conformidade com o preceituado no artigo 91º, n.º 1, do CIRE.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – Relatório
1.1.A sociedade E…, Lda., intentou acção executiva para pagamento de quantia certa contra José Manuel Mendes Nacimento, F…, MM..e MT…, com os sinais dos autos, dando à execução duas livranças subscritas pela sociedade P…, Lda. e avalizadas pelos executados, com vencimento em 03/07/2017 e emitidas pelos valores de € 520.746,28 (quinhentos e vinte mil setecentos e quarenta e seis euros e vinte e oito cêntimos) e de € 116.800.83 (cento e dezasseis mil e oitocentos euros e oitenta e três cêntimos), respectivamente.
1.2. Alega, para tanto, em síntese útil, que é legítima portadora das livranças dadas à execução, por efeito de cessão dos créditos subjacentes aos referidos títulos executivos e que a sociedade mutuária e subscritora das mencionadas livranças-caução veio a ser declarada insolvente no âmbito do processo n.º 18267/12.0T2SNT, que corre os seus termos no Juiz 3 do Juízo do Comércio de Sintra.
1.3. Citados, vieram os executados F…, V… e MT…, deduzir, por apenso, a presente oposição à execução, mediante embargos de executado, invocando as excepções da “prescrição da livrança dada à execução”, do “abuso de direito” e da “iliquidez da obrigação exequenda”.
1.4. A exequente apresentou contestação, pronunciando-se sobre as excepções invocadas e pugnando, a final, pela improcedência da oposição.
1.5. Foi proferido saneador-sentença, com data de 17/03/2021, com a ref.ª Citius  129771096, que concluiu pela procedência da excepção de inexequibilidade dos títulos executivos, por iliquidez das obrigações exequendas e, consequentemente, julgou procedente a oposição.
1.6. Inconformada com o assim decidido, a exequente apelou para esta Relação, rematando as alegações de recurso com as seguintes conclusões:
«A) A aqui Recorrente, instaurou acção executiva contra os Recorridos tendo dado à execução duas livranças preenchidas em 3/07/2017 e pelo valor de € 520.746,28 (quinhentos e vinte mil setecentos e quarenta e seis euros e vinte e oito cêntimos) e de € 116.800.83 (cento e dezasseis mil e oitocentos euros e oitenta e três cêntimos).
B) A livrança dada à execução constituiu uma das garantias do contrato de mútuo com hipoteca e fiança, celebrado com a P…, Lda., e com os executados, enquanto fiadores e avalistas.
C) Pelo aludido contrato, a CGD, S.A., concedeu dois empréstimos sob a forma de abertura de crédito, no montante global de € 1.100.000,00 (um milhão e cem mil euros);
D) Para garantia do capital mutuado, respectivos juros e despesas, a mutuária constituiu hipoteca sobre vários bens imóveis e, os executados, entre os quais os ora Recorridos, constituíram-se fiadores e principais pagadores, por tudo quanto viesse a ser devido em caso de incumprimento do referido contrato.
E) A Sociedade mutuária veio a ser declarada insolvente no âmbito do processo n.º 18267/12.0T2SNT, tendo os autos prosseguido para liquidação dos bens apreendidos, entre os quais os imóveis sobre os quais se encontrava registada hipoteca a favor da CGD, S.A. e, posteriormente, a favor da aqui Recorrente, ora cessionária.
F) Os referidos imóveis vieram a ser vendidos no âmbito do referido processo, sem que tenha existido qualquer abatimento ao valor em dívida resultante dos contratos que deram origem ao preenchimento das livranças executadas no âmbito dos presentes autos.
G) No apartado “Liquidação da Obrigação”, a Recorrente, discriminou todos os valores em dívida à data da instauração da execução, nomeadamente, o valor de juros vencidos e não pagos, o valor do imposto de selo em dívida, bem como o capital em dívida.
H) A sentença de que se recorre entendeu, sem mais, que “a obrigação exequenda não se mostra certa nem líquida, sendo, pois, inexigível ao executado/opoente”.
I) A sentença recorrida, assenta em três pressupostos, nomeadamente a iliquidez da obrigação constante da livrança dada à execução, a iliquidez da obrigação exequenda e desnecessidade do convite ao aperfeiçoamento.
J) Não pode a Recorrente conformar-se com o entendimento plasmado na sentença, o qual não tem qualquer correspondência com a realidade dos factos.
K) Inexplicavelmente, o douto Tribunal a quo, desconsiderou em absoluto os cálculos apresentados pela exequente, ora Recorrente.
L) Igualmente desconsiderou o douto Tribunal a quo todos os documentos juntos pela Recorrente e que provam, quer os valores recebidos naqueles autos de insolvência, quer o montante em dívida aquando do preenchimento da livrança.
M) Ao contrário do propugnado pelo Tribunal, a Recorrente juntou com a sua contestação a nota de débito que sustenta o montante pelo qual foi preenchida a livrança, discriminando parcela a parcela os valores devidos a título de capital, juros e despesas.
N) Junta a nota de débito, não se alcança o entendimento plasmado na douta sentença, quando refere que a exequente não liquidou a obrigação constante da livrança dada à execução.
O) A Recorrente, juntou todos os elementos necessários ao apuramento da dívida dos executados e procedeu à imputação discriminada do valor obtido com a venda dos imóveis garantes da presente operação.
P) Os Recorridos eram não só sócio, como gerente da sociedade insolvente à data da sua apresentação à insolvência, pelo que não poderiam, legitimamente, ignorar o valor em dívida por conta da operação peticionada.
Q) O valor em causa foi integralmente aceite pelo Recorrente nos autos de insolvência, tendo ali sido reconhecido e graduado em sede de sentença de verificação e graduação de créditos.
R) Impunha-se decisão diferente do Tribunal a quo, que face aos factos alegados e aos documentos juntos, tinha reunidas todas as condições para aferir da liquidez da obrigação constante da livrança dada à execução.
S) A sentença de que se recorre padece da nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do art.º 615º do CPC, quando consigna que a exequente não alegou o “incumprimento e/ou a resolução do contrato subjacente à emissão e preenchimento do título”.
T) Os Recorridos, em momento algum alegam a inexistência de incumprimento ou a falta de resolução do contrato.
U) A sentença recorrida padece do vício de excesso de pronúncia já que o Tribunal utilizou, como fundamento da decisão, matéria não alegada.
V) O incumprimento do contrato e a sua resolução, ao contrário do propugnado na douta sentença, igualmente resultam provados nos autos.
W) A declaração de insolvência, nos termos do art.º 91º/1 do CIRE determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente.
AA) A exequente deixou claro que a venda dos bens dados em garantia da obrigação peticionada não foi suficiente para integralmente liquidar o valor em dívida.
CC.
DD) Mal andou o Tribunal a quo quando se limitou a afirmar que a Recorrente optou por não demonstrar como alcançou o valor da obrigação exequenda.
EE) A exequente, no apartado “Liquidação da Obrigação” do requerimento executivo, efectuou o cálculo aritmético por forma a apurar e dar conhecimento do valor da quantia exequenda.
FF) A Recorrente ali discriminou o valor dos juros vencidos até à data da venda ocorrida no mencionado processo de insolvência, bem como o respectivo capital em dívida, indicou o valor da adjudicação e, considerando estes valores, efectuou o cálculo aritmético, por forma a apurar o valor que permaneceu em dívida.
GG) O valor obtido no apartado “Liquidação da Obrigação” é aquele que foi indicado como quantia exequenda.
HH) O Embargante, ora Recorrido, nos seus embargos, suscita questões sobre o valor peticionado, arguindo que os cálculos que lhe subjazem estão errados (ainda que não o demonstre matematicamente como lhe competia).
II) Não podem duas realidades antagónicas sobrevir no mesmo processo. A sentença ora recorrida limita-se a dizer que a recorrente não efectuou o cálculo para determinação da quantia exequenda, no entanto, o próprio embargante questiona o cálculo efectuado pela exequente.
JJ) Salvo o devido respeito que é muitíssimo, a sentença recorrida é, quanto a este apartado, absolutamente ininteligível, o que se reconduz à nulidade prevista na al. c) do n.º 1 do art.º 615º do CPC, já que não se alcança que cálculos ou explicações, para além dos apresentados, pretendia o MMº Juiz a quo.
KK) Tem sido entendimento pacífico na jurisprudência e doutrina que “uma obrigação ilíquida não é aquela que não está determinada mas sim aquela que não pode ser determinada de forma simples por cálculo aritmético.”
LL) Resulta à evidência demonstrado que a obrigação exequenda é determinável por simples cálculo aritmético, o qual foi desde logo apresentado no requerimento executivo.
MM) Impunha-se assim apreciação diversa pelo douto Tribunal a quo, que poderia ter suscitado questões sobre os cálculos apresentados pela exequente ou até sobre os mesmos pedir esclarecimentos (o que não fez), mas não poderia limitar-se a julgar verificada a iliquidez da obrigação, sem mais.
NN) Entendeu ainda o MMº Juiz que não haveria obrigação do Tribunal ao convite ao aperfeiçoamento.
OO) Ao contrário do plasmado na douta sentença, reitera-se, a exequente não só deixou cabalmente explícitos os montantes que consubstanciaram o preenchimento da livrança, como igualmente demonstrou matematicamente os cálculos que conduziram à determinação da obrigação exequenda.
PP) Subsistindo quaisquer dúvidas ao Tribunal, impunha-se ao MMº Juiz proceder ao convite ao aperfeiçoamento, ao contrário do propugnado na aludida sentença.
QQ) O convite ao aperfeiçoamento de articulados, nos termos do art.º 590º do CPC, é um dever a que o juiz está sujeito e cujo não cumprimento leva ao cometimento de nulidade processual.
RR) A omissão do convite ao aperfeiçoamento, influindo no exame e decisão da causa, como in casu sucedeu, implica a nulidade da sentença nos termos dos nºs 1 e 2 do art.º 195º do Código de Processo Civil.
SS) Não se alcança o motivo pelo qual o Tribunal desconsiderou em absoluto os cálculos apresentados pela aqui Recorrente, limitando-se a alegar que o Requerimento executivo era, quanto aos mesmos, omisso.
TT) Em momento algum a sentença recorrida afirma que a liquidez da obrigação exequenda não está dependente de simples cálculo aritmético, aliás, como resulta à evidência demonstrado que está, pelo que se impunha ao Tribunal o dever de convidar a exequente a esclarecer ou aperfeiçoar os elementos que considera em falta ou que não fossem claros.
Nestes termos e nos melhores de direito deve ser dado provimento ao presente recurso, e, em consequência, ser revogada a sentença sob recurso, sendo substituída por outra que ordene o prosseguimento dos autos pela quantia peticionada pela Recorrente».
1.7. Os recorridos contra-alegaram, sustentando a decisão recorrida e deduziram recurso subordinado, que finalizam com as seguintes conclusões:
«a) A Recorrente não demonstrou o direito a que se arroga, nomeadamente a existência do crédito reclamado e a sua correta liquidação;
b) A Recorrente não alegou os concretos factos, nem juntou os documentos necessários que, juntamente com o título executivo, permitiriam alcançar o valor em dívida;
c) A Recorrente também não alegou o incumprimento ou a resolução dos contratos subjacentes às emissões e preenchimento das livranças dadas a execução;
d) Não foi também possível apurar o valor da dívida dos Embargantes, nem a natureza dos valores apostos nas livranças dadas a execução;
e) A obrigação reclamada pela Recorrente não se mostra assim certa, líquida e exigível pelo que têm de proceder os embargos apresentados pelo ora Recorrido;
f) Também não há lugar ao convite da Embargada pelo Tribunal “a quo” para aperfeiçoar o requerimento executivo porque esta poderia tê-lo feito em sede de oposição/contestação dos embargos de executado;
g) Termos em que indeferindo-se, por não provado, o recurso apresentado pela Recorrente se fará a acostumada justiça;
h) Caso se entenda que a decisão recorrida deve ser anulada e substituída por outra, deverá o Tribunal considerar procedente o presente recurso subordinado e, por efeito do mesmo, declarar-se a procedência dos embargos de executado;
i) Dado o carácter de execução universal do processo de insolvência o qual acarreta o vencimento de todas as obrigações do insolvente não subordinadas a uma condição suspensiva, estava a credora legitimada, e em condições de preencher as livranças que tinha em seu poder;
j) Com a declaração de insolvência do devedor principal, a dívida garantida pelos títulos cambiários tornou-se imediatamente exigível;
k) A Recorrente encontrava-se assim legitimada e obrigada ao preenchimento da livrança incompleta ou em branco pelo valor em dívida, valor esse que, se fixou no momento do vencimento da obrigação, constituindo-se assim a obrigação cambiária;
l) A Embargada só preencheu a livrança quando estavam decorridos mais de 5 anos sobre o vencimento da obrigação;
m) O direito cartular da Recorrente, aquando do preenchimento da livrança e da interpelação do Embargante para pagamento, encontrava-se prescrito, atento o disposto no artigo 70.° ex vi artigo 77° da L.U.L.L.
n) Perante o exposto, deverá reconhecer-se a prescrição do direito cambiário invocado pela Embargada e das livranças dadas a execução;
o) A inércia no exercício de tal direito também é censurável, porque contrária aos ditames da boa-fé e à proteção legal conferida pelo legislador, atento o disposto no artigo 762.° n.º 2 do Código Civil;
p) O comportamento da credora consubstancia um abuso de direito tal como se encontra consagrado no art.º 334º do C. Civil porque se destina a afastar a aplicação do prazo de prescrição de 3 anos previsto no art.º 70º, nº 1, aplicável por remissão do art.º 77º ambos da L.U.L.L.
q) Pelo que deverá também declarar-se a prescrição das livranças dadas à Execução pela Recorrente anulando-se a decisão recorrida nessa parte;
r) Mesmo que se entenda que a decisão recorrida deva ser anulada por se considerar a obrigação certa, líquida e exigível, deverá declarar-se a procedência dos embargos de executado declarando-se a sua prescrição.
Nestes termos e nos demais de direito requer-se a Vossas Excelências que indefiram, por não provado o recurso apresentado pela Recorrente ou, caso assim não se entenda, declarem procedente, por provado, o recurso subordinado apresentado pelo Recorrido e a consequente procedência dos Embargos de Executado, fazendo-se assim a acostumada justiça.»
1.8. A exequente, recorrente principal, não respondeu ao recurso subordinado.
*
1.9. No despacho de admissão do recurso, o Exmo. Juiz a quo pronunciou-se sobre as nulidades arguidas, indeferindo-as - cfr. ref.ª Citius 131520584, de 18/06/2021.
1.10. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
II – Objecto e delimitação do recurso
O objecto do recurso é definido pelas conclusões da alegação do recorrente (artigos 5.º, 635º, n.º 3 e 639º, n.ºs 1 e 3, do CPC), no confronto com a decisão recorrida, sem prejuízo do conhecimento das questões de que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 608, n.º 2., ex vi do art.º 663º, nº 2, do mesmo diploma legal. E porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida, ou seja, “apenas pode incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se p tribunal ad quem com questões novas.”[[1]]
Assim, as seguintes as questões suscitadas no recurso são as seguintes:
- No recurso principal:
1.ª) - da alegada nulidade da sentença por excesso de pronúncia;
2-ª) - da alegada nulidade da sentença por ininteligibilidade;
3.ª) - da alegada nulidade processual, por falta de convite ao aperfeiçoamento;
4.ª) - da pretensa falta de liquidação das obrigações constantes das livranças dadas à execução;
5.ª) - Da pretensa falta de liquidação das obrigações exequendas;
- No recurso subordinado:
- das alegadas excepções de prescrição do direito cambiário e de abuso de direito por parte da exequente.
III – Do mérito do recurso
A) Motivação de Facto
A.1) Factos provados
Mostram-se provados, com relevo para a decisão a proferir, os seguintes factos:
1. A exequente intentou a execução de que dependem estes autos, apresentando como títulos executivos as livranças juntas com o requerimento executivo:
a) Livrança com data de emissão de 15/07/2011 e com a data de vencimento de 03/07/2017, no valor de €116.800,83, subscrita pela sociedade comercial “P…, Lda.”, em cujo verso se mostram apostas as assinaturas dos executados (entre eles, os ora oponentes) imediatamente abaixo da expressão “por aval à firma subscritora”, ou seja, avalizada pelos executados/opoentes;
b) Livrança com data de emissão de 22/09/2010 e com a data de vencimento de 03/07/2017, no valor de €520.746,28, subscrita pela sociedade comercial “P…, Lda.”, em cujo verso se mostram apostas as assinaturas dos executados (entre eles, os ora oponentes) imediatamente abaixo da expressão “por aval à firma subscritora”, ou seja, avalizada pelos executados/opoentes.
2. No requerimento executivo, no campo «TRIBUNAL COMPETENTE, TÍTULO EXECUTIVO E FACTOS», a exequente alegou o seguinte:
“1 - Por escritura pública, celebrada em 30 de Junho de 2017, a Caixa Geral de Depósitos, S.A., cedeu à M… Company, um conjunto do créditos vencidos de que era titular, conforme Escritura Pública e respetivo Documento Complementar que se junta como Doc. N.º 1 e se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
2 - Pela escritura pública supramencionada foram cedidos à M…Company vários créditos relativos à Penaferrim Construções E Urbanizações, Lda., nomeadamente, os créditos emergentes dos Contratos identificados com os números PT 0035078600261589091 e PT 0035078600259747091.
3 - A mencionada cessão de créditos incluiu a transmissão, relativamente ao mencionado crédito, de todos os direitos, garantias e direitos acessórios a eles inerentes.
(…)
Acto contínuo,
5 – A referida Mistlegrove …Company veio a ceder o suprarreferido crédito à aqui exequente, E…l, Lda., por escritura celebrada em 10 de Maio de 2019 – cfr. Documento que ora se junta como n.º 2.
6 - Pela escritura pública supramencionada foram cedidos à Mistlegrove …Company vários créditos relativos à Penaferrim Construções E Urbanizações, Lda., entre os quais, o crédito emergente do Contrato identificado com o número PT 0035078600237514091.
7 - O que faz com que, presentemente, a ora Exequente seja a actual titular do crédito referido supra.
8 - A sociedade acima identificada, aqui exequente, é assim parte legítima na presente acção.
II – Dos Contratos, respectivas livranças e Valor em dívida (…)
a) Empréstimo PT 0035078600261589091 – empréstimo no valor de €650.000
9 – Por contrato de abertura de crédito com hipoteca e pacto de preenchimento de livrança, celebrado em 15 de Julho de 2011 – cfr. Documento que ora se junta como n.º 3 - a CGD, S.A. concedeu à P…, Lda., um financiamento sob a forma de abertura de crédito até ao montante de €650.000.
10 – Para garantia do capital mutuado, respectivos juros e despesas, a mutuária constituiu hipoteca sobre vários bens imóveis, ali melhor identificados e, que infra igualmente se discriminarão.
11 – Ainda para garantia das obrigações assumidas, nomeadamente, por tudo quanto viesse a ser devido em caso de incumprimento do referido contrato, os aqui executados, J.., F…, V…, MM.., MT entregaram à CGD, S.A. uma livrança em branco, subscrita pela sociedade e avalizada pelos mesmos – cfr. Documento que ora se junta como n.º 4.
12 – Mais se consignou que, em caso de mora o capital mutuado venceria juros calculados à taxa mais elevada de juros remuneratórios, que se cifrava em 11,450% ao ano, acrescida da sobretaxa até 4% ao ano.
13 – A referida P…, Lda. utilizou a quantia de €65.000, quantia que lhe foi creditada na conta de depósitos à ordem na data de outorga do contrato, sendo que, o remanescente do capital mutuado seria entregues na sequência de vistorias efectuadas pela CGD, em função do grau de realização do Investimento financiado que viesse a ser apurado em tais vistorias, de acordo com o disposto no documento complementar da escritura de abertura de crédito, já junta.
14 – Sucede, porém, que a sociedade mutuária veio a ser declarada insolvente no âmbito do processo n.º …, que corre os seus termos no Juiz 3 do Juízo do Comércio de Sintra.
15 – Em face da referida declaração de insolvência veio a ser determinado o prosseguimento dos autos para liquidação dos bens apreendidos, entre os quais os imóveis sobre os quais se encontrava registada hipoteca a favor da CGD, S.A.
16 – Os referidos imóveis vieram assim a ser vendidos/adjudicados pelos seguintes montantes – cfr. Escritura de compra e venda celebrada que ora se junta como documento n.º 5:
i) Prédio urbano denominado Lote 1, sito em Albarraque, freguesia de Rio de Mouro, descrito na 2ª Conservatório do Registo Predial de Sintra sob o número 5959, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 10315 – valor de €70.125, tendo sido depositada para pagamento das custas o montante de €7.012,5;
ii) Prédio urbano denominado Lote 2, sito em Albarraque, freguesia de Rio de Mouro, descrito na 2ª Conservatório do Registo Predial de Sintra sob o número 5960, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 10316 – valor de €68.000, tendo sido depositada para pagamento das custas o montante de €6.800;
iii) Prédio urbano denominado Lote 3, sito em Albarraque, freguesia de Rio de Mouro, descrito na 2ª Conservatório do Registo Predial de Sintra sob o número 5961, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 10317 – valor de €68.000, tendo sido depositada para pagamento das custas o montante de €6.800;
iv) Prédio urbano denominado Lote 4, sito em Albarraque, freguesia de Rio de Mouro, descrito na 2ª Conservatório do Registo Predial de Sintra sob o número 5962, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 10318 – valor de €70.125, tendo sido depositada para pagamento das custas o montante de €7.012,5;
17 – Sucede, porém, que, sobre os referidos bens imóveis encontrava-se registada uma hipoteca voluntária prévia, também a favor da ora impetrante - AP. 41 de 2007/01/15 – Hipoteca Voluntária – constituída para garantia de um outro contrato - PT 0035078600237514091 – cujo valor em dívida em dívida, ascendia a €1.488.151,15.
18 – Assim, o valor obtido com a venda dos aludidos imóveis foi integralmente abatido ao valor em dívida por conta do referido contrato (PT 0035078600237514091) o qual se encontrava garantido por hipoteca voluntária de 1º grau.
19 – Ou seja, o valor da venda dos aludidos imóveis não permitiu liquidar integralmente o valor em dívida, garantido pela Hipoteca voluntária de 1º grau, pelo que, a aqui exequente instaurou uma outra execução para ressarcimento do valor que permaneceu em dívida e, que corre termos sob o número de processo 15165/19.0T8SNT.
20 – Assim, a livrança-caução garante da operação melhor identificada supra, veio a ser preenchida pelo valor efectivamente em dívida, no montante de €116.800,83, ao qual acrescem os competentes juros e imposto de selo, até efectivo e integral pagamento.
b) Empréstimo PT 0035078600259747091 – no valor de €450.000
21 - Por contrato de abertura de crédito com hipoteca e pacto de preenchimento de livrança, celebrado em 22 de Setembro de 2010 – cfr. Documento que ora se junta como n.º 6 - a CGD, S.A. concedeu à P…, Lda., um empréstimo sob a forma de abertura de crédito até ao montante de €450.000.
22 – Para garantia do capital mutuado, respectivos juros e despesas, a mutuária constituiu hipoteca sobre o lote de terreno para construção sito no Largo do Rossio e Lugar de Idanha, freguesia de Belas, concelho de Sintra, inscrito na respectiva matriz sob o artigo provisório P11243, descrito na Conservatória do Registo Predial de Queluz, sob o número 4780, da freguesia de Belas - AP. 330 de 2010/08/23– cfr. Informação Predial Simplificada que ora se junta como documento n.º 7.
23 – Ainda para garantia das obrigações assumidas, nomeadamente, por tudo quanto viesse a ser devido em caso de incumprimento do referido contrato, os aqui executados, J…, F…, V…, MM…e MT…entregaram à CGD, S.A. uma livrança em branco, subscrita pela sociedade e avalizada pelos mesmos – cfr. Documento que ora se junta como n.º 8.
24 – Como se referiu supra, a sociedade mutuária veio a ser declarada insolvente no âmbito do processo n.º … que corre os seus termos no Juiz 3 do Juízo do Comércio de Sintra.
25 – Em face da referida declaração de insolvência veio a ser determinado o prosseguimento dos autos para liquidação dos bens apreendidos, entre os quais o imóvel sobre os qual se encontrava registada hipoteca a favor da credora.
26 - Com efeito, sobre o aludido terreno para construção, veio a ser efectivamente construído prédio em propriedade horizontal, tendo a hipoteca garante do crédito aqui peticionado passado a abranger as competentes fracções autónomas.
27 – Sucede, porém, que, sobre os referidos bens imóveis encontrava-se registada uma hipoteca voluntária prévia, também a favor da ora impetrante - AP. 13 de 2007/09/07 – Hipoteca Voluntária – constituída para garantia de um outro contrato - PT 003507860024524991 – cujo valor em dívida em dívida, ascendia a €4.441.985,01.
28 – Assim, o valor obtido com a venda dos aludidos imóveis foi integralmente abatido ao valor em dívida por conta do referido contrato (PT 003507860024524991) o qual se encontrava garantido por hipoteca voluntária de 1º grau.
29 – Ou seja, o valor da venda dos aludidos imóveis não permitiu liquidar integralmente o valor em dívida, garantido pela Hipoteca voluntária de 1º grau, pelo que, a aqui exequente instaurou uma outra execução para ressarcimento do valor que permaneceu em dívida e, que corre termos sob o número de processo 703/20.3T8SNT.
30 – Assim, a livrança-caução garante da operação melhor identificada supra, veio a ser preenchida pelo valor em dívida, no montante de €520.746,28, ao qual acrescem os competentes juros e imposto de selo, até efectivo e integral pagamento.
31 - As livranças emitidas e subscritas pelos Executados constituem título executivo nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 703, n.º 1 al. c) do C.P.C., titulando uma dívida certa, líquida e exigível nos termos consignados no art.º 716.º do mesmo diploma.”»– (negrito nosso).
32. No requerimento executivo, no campo «LIQUIDAÇÃO DA OBRIGAÇÃO», a exequente indicou:
Valor Líquido:                                                                               637.541,11€
Valor NÃO dependente de simples cálculo aritmético:                         
74.269,69€
Valor NÃO dependente de simples cálculo aritmético:     
0,00 €
Total:                                                                                                     711.816,80€
Livrança I:
a) Capital: €116.800,83;
b) Juros sobre o capital referido em a) supra, à taxa supletiva legal, desde a data de
vencimento da livrança (03/07/2017), até à presente data (15/04/2020): €13.017,69;
c) Imposto de selo: €586,94;
Livrança II
a) Capital: €520.746,28;
b) Juros sobre o capital referido em a) supra, à taxa supletiva legal, desde a data de
vencimento da livrança (03/07/2017), até à presente data (15/04/2020): €58.038,24;
c) Imposto de selo: €2.626,82”
B) Do mérito dos recursos
B.1) – As duas primeiras questões do recurso principal: das alegadas nulidades da sentença, por excesso de pronúncia e ininteligibilidade.
Nas conclusões S) a U), a exequente invoca a nulidade da sentença recorrida, por excesso de pronúncia, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, no segmento em que se nela se consignou que a exequente não alegou o “incumprimento e/ou resolução do contrato subjacente à emissão do preenchimento do título”, uma vez que em momento algum os Recorridos alegaram a inexistência de incumprimento ou a falta de resolução do contrato, não podendo, por isso, o Tribunal a quo utilizar, como fundamento da decisão, matéria não alegada.
E na conclusão S) afirma que a sentença recorrida também padece da nulidade prevista na alínea c), do n.º do artigo 615.º do CPC, já que não se alcança que cálculos ou explicitações, para além dos apresentados, pretendia o MM. Juiz a quo.
O artigo 615º do CPC, sob a epígrafe «Causas de nulidade da sentença», dispõe:
«1. É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido».
As nulidades previstas nas alíneas b) e c) reconduzem-se a vícios formais que respeitam à estrutura da sentença e as previstas nas alíneas d) e e) referem-se aos seus limites.
A nulidade prevista na segunda parte da alínea d) do n.º 1 deste artigo 615º do CPC só ocorre quando o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
As questões a que se reporta a alínea d) do n.º 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil são os pontos de facto e ou de direito relevantes no quadro do litígio, ou seja, os concernentes ao pedido, à causa de pedir e às excepções[[2]] e não a sua argumentação em defesa dos seus pontos de vista fáctico-jurídicos[[3]].
A nulidade prevista na segunda parte da alínea d) do n.º 1 do artigo 615º do CPC está directamente relacionada com o comando fixado na segunda parte do n.º 2 do artigo 608º do mesmo diploma legal, segundo o qual o juiz “não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras
O Tribunal deve resolver todas que as questões que lhe sejam submetidas a apreciação (a não ser aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras), todavia, mas, como vem sendo dominantemente entendido, o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir (vide, por todos, Ac. do STJ de 02/10/2003, in “Rec. Rev. nº 2585/03 – 2ª sec.” e Ac. do STJ de 02/10/2003, in “Rec. Agravo nº 480/03 – 7ª sec.”).
Ora, o vencimento e exigibilidade da obrigação exequenda, por via do seu incumprimento pelo devedor ou, como sucede no caso dos autos, por força da declaração de insolvência da mutuária e subscritora das livranças dadas à execução (cfr. artigos 91.º, n.º 1 e 3.º, n.º 1, do CIRE[[4]]), é uma questão simultaneamente de facto e de direito, que se afigura relevante no quadro do presente litígio, que o tribunal não pode deixar de apreciar e que tem de ser alegada pelo exequente para poder executar o seu crédito.
Não se verifica, por conseguinte, a apontada nulidade da sentença recorrida, excesso de pronúncia, pois o Tribunal a quo pronunciou-se sobre questão que podia e devia conhecer, o que se verifica, isso sim, é erro de julgamento na apreciação dos pertinentes factos e na subsunção destes ao direito aplicável, erro que não se confunde com a nulidade arguida,
Com efeito, a exequente alegou no requerimento executivo uma mole de factos que permitem concluir pelo vencimento das obrigações subjacentes à emissão das livranças, desde logo a declaração de insolvência da sociedade mutuária, subscritora das livranças, a implicar, como se disse o imediato vencimento dos respectivos créditos, podendo as correspectivas obrigações cambiárias ser imediatamente exigidas dos oponentes avalistas, em conjunto ou separadamente (artigos 44.º § 6º da LULL), obrigados nos mesmos termos que a sociedade avalizada (artigos 47.º§ 1.º e 77.º da LULL).
*
No que concerne à arguição de nulidade, por suposta ininteligibilidade da sentença recorrida, com o fundamento de “que se limita a dizer que a recorrente não efectuou o cálculo para determinação da quantia exequenda”, novamente está em causa o inconformismo da Recorrente e não qualquer dos vícios que determinam a nulidade da sentença.
Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27/11/2008, Proc.º n.º 08B2608, www.dgsi.pt., “Entre as nulidades da sentença não se inclui o erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário”.
Constitui entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência que a nulidade prevista no artigo 615º, n.º. 1, al. c) do CPC (correspondente ao art.º 668º, n.º 1, al. c), anterior à reforma introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho) só se verifica:
(i) quando os fundamentos invocados na sentença devessem, logicamente, conduzir a uma decisão diversa da que a sentença expressa, ou seja, o raciocínio do juiz aponta num determinado sentido e o dispositivo conclui de modo oposto ou diferente (cf.. Prof. Alberto dos Reis, CPC Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, pág. 141; acórdãos do STJ de 23/11/2006, proc. n.º. 06B4007 e da RE de 19/01/2012, proc. n.º 1458/08.5TBSTB e de 19/12/2013, proc. n.º 538/09.4TBELV, Ac. do T.R.E. de 25/06/2015, Proc. n.º 855/15.4T8PTM.E1 todos acessíveis em www.dgsi.pt), sabido que essa contradição remete-nos para o princípio da coerência lógica da sentença, pois que entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica (art.º 615.º/1-c)-1.ª parte); ou ainda
(ii) quando a parte decisória propriamente dita tem mais de um sentido, tornando-se, assim, incerto ou duvidoso o respectivo comando (ambiguidade), ou quando o seu exacto sentido não possa alcançar-se (artigo 615.º/1-c)-2.ª parte).
Estando em causa, a ininteligibilidade da decisão, os vícios da ambiguidade e/ou da obscuridade só a esta se podem reportar, com exclusão, portanto dos fundamentos invocados [[5]].
Realidade distinta desta é o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou erro na interpretação desta, ou seja, quando - embora mal - o juiz entenda que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação ou dela decorre, o que existe é erro de julgamento.
Certo é que a decisão constante da sentença em crise não se revela ambígua e/ou obscura, que a Recorrente alcançou claramente o respectivo comando e a forma como a 1.ª instância resolveu o litígio.
E também não se detecta qualquer ilogicismo ou contradições entre os respectivos fundamentos e a decisão proferida.
Vejamos o que a respeito desta pretensa nulidade alega a Recorrente no corpo das alegações:
“[…] poderia o Tribunal a quo discordar dos cálculos ali indicados, ou até suscitar questões sobre os mesmos, coisa que não fez. Não pode é, sem mais, dizer que a exequente não indicou o modo como alcançou o valor peticionado a título de quantia exequenda, pois que tal não tem qualquer correspondência com a realidade dos factos.
Em suma, a Recorrente limita-se a expressar o seu inconformismo com o decidido, concretamente com a conclusão a que chegou o Exmo. Juiz a quo acerca da alegada falta de liquidação da(s) obrigação(ões) exequenda(s), bem como a sua irresignação com a alegada desconformidade entre o afirmado na sentença em crise, a interpretação que aí se faz do alegado no requerimento executivo, e a factualidade concretamente alegada nesta peça processual.
Não há que confundir eventual erro de julgamento da matéria de facto com a ininteligibilidade da sentença, decorrente da sua ambiguidade ou obscuridade, a que se refere o artigo 615.º, n.º 1, alínea c), in fine, do CPC, vícios de que não enferma a sentença em crise.
Termos em que vão indeferidas as arguições de nulidades da sentença, enunciadas nas conclusões S) a U) e JJ).
B.2) Terceira questão do recurso principal: da pretensa nulidade processual, por omissão de convite ao aperfeiçoamento.
Nas conclusões PP) a TT), a exequente sustenta, em síntese, que subsistindo dúvidas ao Tribunal a quo, impunha-se ao Exmo. Juiz proceder ao convite ao aperfeiçoamento, nos termos do art.º 590.º do CPC, ao contrário do propugnado na sentença recorrida, e que tendo omitido esse dever, foi cometida uma omissão processual, com influência no exame e decisão da causa, a implicar a nulidade da sentença, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 195.º do CPC.
Ao pronunciar-se sobre a referida arguição de nulidade, o Exmo. Juiz a quo expressou que a falta de convite ao aperfeiçoamento foi uma opção clara do Tribunal por se entender que, in casu, o mesmo não tinha lugar.
Vejamos,
Resulta dos artigos 6.º, n.º 2 e 278.º, nº 3 do CPC que as excepções dilatórias só subsistem (só dão lugar à absolvição da instância) se não forem sanadas, incumbindo ao juiz providenciar pelo respectivo suprimento, determinando a realização dos actos necessários à regularização da instância.
A opção do nosso ordenamento processual civil pela providência de mérito em detrimento da decisão formal (das decisões proferidas em aplicação de normas processuais) objectiva-se, na acção executiva, “no realce dado ao aperfeiçoamento do requerimento inicial”, devendo o juiz “convidar o exequente a suprir a falta de pressupostos processuais e outras irregularidades de que enferme o requerimento executivo, desde que sanáveis (art.º 726º, nº 4) e só no caso de não suprimento deve, num segundo despacho, indeferir o requerimento (art.º 726º, nº 5)”, ficando por isso o “indeferimento liminar imediato reservado para os casos em que seja manifesta” a “falta insuprível de pressuposto processual de conhecimento oficioso” (José Lebre de Freitas, A Acção Executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, 7ª edição, págs. 188-189 ).
O convite ao aperfeiçoamento do requerimento executivo está reservado aos vícios não subsumíveis ao n.º 2 do art.º 726º do CPC.
Apenas fora desses casos, o juiz deverá proferir despacho de aperfeiçoamento para suprimento de irregularidades do requerimento executivo e sanação de falta de pressupostos processuais (Rui Pinto, A Acção Executiva, 2020, Reimpressão, pág. 354).
Na decisão sob censura, fundando-se a execução em causa de pedir complexa, que inclui títulos negociais (contratos de mútuo e convenção de preenchimento), a par dos dois títulos de crédito, constituídos pelas livranças apresentadas, o Exmo. Juiz a quo considerou que as obrigações subjacentes às referidas livranças, emergentes dos referidos títulos negociais, não se mostravam liquidadas e, consequentemente, não eram exigíveis, vício este subsumível à alínea c) do n.º 2 do artigo 726.º do CPC.
A verificar-se este vício – e ele não se verifica como procuraremos demonstrar mais adiante – ele não era passível de suprimento através de convite a aperfeiçoamento, como já se referiu anteriormente.
Daí que se perceba a opção tomada pelo Tribunal a quo nesta matéria, sem prejuízo de não podermos acompanhar e sufragar a solução alcançada, por considerarmos que as obrigações constantes dos títulos executivos (livranças), face aos elementos constantes do requerimento executivo e documentos carreados para os autos, são certas, líquidas e exigíveis, sem prejuízo do direito dos executados de demonstrarem, em sede de oposição, que, apesar disso, assim não é (v.g.: que a liquidação efectuada está errada, que o valor em dívida é inferior, etc..).
Indefere-se, portanto, a arguição de nulidade processual por omissão de convite ao aperfeiçoamento do requerimento executivo feita nas conclusões PP) a TT).
B.3) – Quarta e quinta questões do recurso principal: das pretensas faltas de liquidação das obrigações cartulares e das obrigações exequendas.
Entendeu o Tribunal a quo que a obrigação constante de cada uma das livranças dadas à execução não se mostra líquida, uma vez que “nem do requerimento executivo nem da contestação resultam especificados os componentes incluídos na quantia inscrita na livrança, de forma a espelhar, parcela a parcela, os valores relativos ao capital, juros remuneratórios, comissões, juros de mora, eventuais penalizações, imposto de selo, etc. Não resulta, desde logo, alegado o incumprimento e/ou a resolução do contrato subjacente à emissão e preenchimento do título”.
Não podemos acompanhar e sufragar a decisão em crise, por considerarmos que a exequente alegou no requerimento executivo todos os factos pertinentes e relevantes para o efeito e ainda porque, em sede de contestação, juntou dois prints de notas de débito emitidas pela Cedente, Caixa Geral de Depósitos, S.A. (CGD), das quais decorre sem margem para dúvidas e, parcela a parcela, o valor em dívida e que sustentou o preenchimento das livranças dadas à execução.
Nas aludidas notas de débito mostra-se claramente discriminado o montante total em dívida relativamente a cada um dos contratos de mútuo, o qual à data de preenchimento das livranças ascendia a 116.800,93€ e a 520.746,26€, respectivamente, valores pelos quais foram preenchidas as livranças dadas à execução.
Para além do valor global das livranças, consta também das referidas notas de débito o desdobramento da dívida, onde se podem verificar todas as parcelas, cuja soma consubstancia o valor global em dívida, nomeadamente:
i) Livrança de € 116.800,93 (nota de débito junta como Doc. n.º 1 da Contestação):
a. Capital: € 65.000,00;
b. Juros remuneratórios: € 2.330,57;
c. Juros de mora: € 49.470,26;
ii) Livrança de € 520.746,26 (nota de débito junta como Doc. n.º 2 da Contestação):
a. Capital: € 285.400,00;
b. Juros remuneratórios: 9.936,70;
c. Juros de mora: 226.126.98;
d. Comissões: € 280.60;.
Não se percebe, assim, salvo o devido respeito, o entendimento expresso na sentença recorrida, quando refere que a exequente não especificou os valores em dívida, já que tal não tem correspondência com a verdade.
Refere-se ainda na sentença recorrida, que a recorrente “não alegou oincumprimento e/ou a resolução do contrato subjacente à emissão e preenchimento do título”, como que a inculcar que as obrigações exequendas não estavam vencidas e não eram exigíveis o que, a verificar-se – e não se verifica -  conduziria a uma situação de abuso de preenchimento das livranças.
Sucede que a recorrente alegou no requerimento executivo que a sociedade mutuária (Penaferrim, Lda.), subscritora das livranças, veio a ser declarada insolvente, facto que em momento algum, foi colocado em causa pelos embargantes, ora recorridos, assim como não questionaram a sua qualidade de avalistas das livranças dadas à execução[[6]].
Como é sabido, nos termos do n.º 1 do art.º 91.º do CIRE “a declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente não subordinadas a uma condição suspensiva”.
Como se pondera no Acórdão desta Relação de Lisboa, de 25/01/2018, proferido no Processo n.º 12989/15.0T8LSB-A.L1-6 (Desembargadora Maria de Deus Correia), citado muito a propósito pela recorrente “(…) as obrigações emergentes dos negócios subjacentes à emissão das livranças em branco têm-se por vencidas por força da declaração de insolvência da subscritora (art.º 91º, n.º 1, do CIRE) como consequência da impossibilidade de cumprimento das obrigações vencidas (art.º 3º, n.º 1, do CIRE), pelo que o exequente procedeu ao preenchimento das livranças, fazendo corresponder a data de vencimento com a data da declaração de insolvência da sociedade subscritora.
De resto, para o exercício do direito de ação do portador é indiferente saber se a livrança foi ou não apresentada a pagamento à subscritora declarada insolvente, podendo a obrigação cambiária ser logo exigida tanto daquela como do respetivo avalista, obrigado que se encontra à semelhança do próprio avalizado (art.s 32º, § 1 e 77º, § 3 da LULL), sendo suficiente a apresentação da sentença declaratória da insolvência (art.º 44º, § 6 da LULL).”
A recorrente também alegou no requerimento executivo que a venda dos bens garantia de tais obrigações ocorreu em sede de tal insolvência e, indicou que, após a venda, veio a apurar-se valor em dívida, não tendo sido abatido qualquer valor aos contratos cuja celebração deu origem ao preenchimento das livranças dadas à execução no âmbito dos presentes autos.
Dívida esta, que sustentou a instauração da execução e cujos valores se mostram claramente especificados no requerimento executivo, dependendo a sua liquidação de simples cálculo aritmético.
Diga-se, ainda, que a certeza e a liquidez de dívida garantida por livrança em branco, em relação à qual foi acertado pacto de preenchimento, nos termos do art.º 10.º da LULL, aplicável por força do art.º 77.º do mesmo diploma, alcança-se após o vencimento da obrigação exequenda e o preenchimento e completude desse título cambiário, que, assim, fica revestido de força executiva.[[7]]
*
Entendeu ainda o Exmo. Juiz a quo a exequente, ora recorrente igualmente optou por não demonstrar como alcançou o valor da obrigação exequenda.
Também não podemos acompanhar esta afirmação.
Na verdade, no campo “LIQUIDAÇÃO DA OBRIGAÇÃO” do requerimento executivo, a recorrente efectuou todos os cálculos e indicou todos os valores em causa, por forma a apurar-se o valor da quantia exequenda.
De facto, a recorrente ali discriminou o valor dos juros vencidos até à data da venda ocorrida no mencionado processo de insolvência, bem como o respectivo capital.
E também indicou o valor da adjudicação e, pegando nestes valores, efectuou o cálculo aritmético, por forma a apurar que aos contratos em causa no âmbito dos presentes autos não foi abatido qualquer valor resultante das vendas efectuadas no âmbito do processo de insolvência.
De seguida, contabilizou os juros entretanto vencidos sobre o valor de capital apurado como estando em dívida após a aludida venda.
Destarte, como bem refere a recorrente, poderia o Tribunal a quo discordar dos cálculos ali indicados, como fizeram os recorridos, ou até suscitar questões sobre os mesmos, coisa que não fez. Não podia era, sem mais, dizer que a exequente não indicou o modo como alcançou o valor peticionado a título de quantia exequenda, pois que tal não tem qualquer correspondência com a realidade dos factos.
Da análise do requerimento executivo, dúvidas não restam que tais cálculos foram efectivamente efectuados e apresentados. Se os montantes parcelares ou globais especificados na liquidação e o respectivo cálculo estão certos ou não é questão que não releva para esta fase, cabendo aos executados o direito de demonstrarem, em sede de oposição/julgamento, que assim não é.
Não encontramos, assim fundamento válido para o afirmado na sentença recorrida de que a exequente não demonstrou como alcançou o valor da obrigação exequenda. Aliás, o próprio valor da execução é coincidente com o valor que resulta indicado no campo “LIQUIDAÇÃO DA OBRIGAÇÃO”, como também resulta inclusivamente das duas notas de débito juntas pela recorrente com a contestação.
Com efeito, no requerimento executivo e na contestação a exequente explica como chegou à quantia exequenda, indicando, designadamente, qual(ais) a(s) taxa(s) de juro(s) aplicada(s) e sobre que montante(s), e em que datas e durante que períodos foram contabilizados tais juros, fazendo-o de forma inteligível e que permite aos executados/oponentes o integral exercício do direito de defesa, sem necessidade de grande esforço interpretativo e aritmético, cumprindo, assim, a exequente com o correspondente ónus de alegação e especificação que sobre si impende (cfr. artigos 10.º, n.ºs 4 e 5 do CPC e 342.º, n.º 1 Cód. Civil).
E por assim ser é que os executados, aqui oponentes não arguiram a ineptidão do requerimento executivo, por falta ou ininteligibilidade da causa de pedir, vício esse que a verificar-se – e não se verifica - constituiria uma excepção dilatória que conduziria à absolvição dos executados da instância (artigos 577.º, al. b), ex vi 186.º, n.os 1 e 2, al. a) CPC).
O título executivo é o instrumento considerado como condição necessária e suficiente da acção executiva, necessária porque os actos executivos em que se desenvolve a acção não podem ser praticados senão na presença dele, suficiente porque, em face da sua presença, se segue, imediatamente, a execução, sem que se torne necessário efectuar qualquer indagação prévia sobre a real existência ou subsistência do direito a que o mesmo se refere.
Atendendo a esta última característica, o título é, pois, algo que faz as vezes do direito que se pretende realizar, e que se lhe substitui, não podendo, por isso, reduzir-se à natureza de um simples meio de prova, mas antes significando um requisito necessário da existência do direito mencionado no documento, assumindo, assim, uma função constitutiva.
Trata-se de uma função constitutiva, que se não restringe ao momento inicial da vida do direito, mas que reveste um carácter permanente, pois que o documento é imprescindível, também, para o exercício e a transferência do direito.
O título executivo realiza, portanto, uma função constitutiva, na medida em que atribui exequibilidade a uma pretensão, possibilitando que a correspondente prestação seja realizada, através das medidas coactivas impostas ao executado pelo Tribunal.
O título executivo, apesar de ser um pressuposto específico da execução, de carácter formal, condiciona, igualmente, a exequibilidade extrínseca da pretensão.
É que a acção executiva pretende efectivar, na prática, a sanção emergente do incumprimento do devedor, com base na presunção ilidível da existência do direito subjectivo que se contém num documento, que se designa por título executivo.
Dispõe o artigo 10.º, n.º 5, do CPC, que “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”.
Efectivamente, a acção executiva supõe um título executivo, isto é, um título com força legal suficiente para servir de base à execução, que lhe determina os limites, ou seja, a extensão e o conteúdo da obrigação do devedor, a espécie e o montante da quantia, a identidade da coisa, a delimitação do facto e, consequentemente, até onde pode ir a acção do credor.
Por isso, a extensão do pedido encontra no texto do título a base necessária e suficiente para o exercício do direito de acção executória, emergindo ou nascendo do mesmo, porque fonte autónoma e imediata desta, com eficácia constitutiva, o direito do credor e a obrigação do devedor, o poder de executar daquele e a responsabilidade executiva deste.
Tendo o título executivo esta eficácia, importa que a extensão da demanda executiva se ache bem definida, quanto ao direito do credor e à obrigação ou responsabilidade executiva do devedor, isto é, que entre a causa de pedir, o título, com a respectiva factualidade obrigacional nele reflectida, e o pedido de satisfação da quantia nele contida, exista harmonia ou conformidade.
Por outro lado, o título executivo não é a causa de pedir na acção executiva, porquanto a causa de pedir é um facto, um elemento essencial de identificação da pretensão processual, enquanto que o título executivo é o documento ou a obrigação documentada, um instrumento probatório especial da obrigação exequenda.
Como é sabido, é a partir da análise da forma como o litígio se mostra estruturado na petição inicial [leia-se requerimento executivo] que poderemos encontrar as bases para responder à questão de saber se a petição/requerimento inicial é inepta, designadamente por incompatibilidade substancial de causas de pedir ou de pedidos [art.º 186.º, n.º 2, alínea c), do CPC].
Ora, as livranças dada à execução constituem um verdadeiro título executivo, nos termos do art.º 703.º, n,º 1, alínea c), do CPC “Os títulos de crédito, ainda que meros quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo“.
De acordo com o n.º 2 do normativo citado “consideram-se abrangidos pelo título executivo os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante”.
Ora, se considerarmos os elementos constantes dos títulos cambiários dados à execução [livranças], a exposição de factos feita pelo exequente no requerimento executivo e o teor dos documentos que acompanharam a contestação aos embargos de executado, do qual constam expressamente o capital mutuado e ainda em dívida, as taxas de juros e as comissões aplicáveis logo se conclui pela falta de razão dos executados, ora recorridos.
Em suma, no caso vertente mostram-se verificados os pressupostos materiais da certeza, exigibilidade e liquidez, exigidos pelo artigo 713.º do CPC para a exequibilidade do direito da exequente, sem os quais não era possível satisfazer a sua pretensão.
Termos em que se impõe concluir pela procedência do recurso principal.
*
Face à procedência do recurso principal, passaremos a conhecer do mérito do recurso subordinado interposto pelos oponentes.
Assim,
B.4) Recurso subordinado: das alegadas excepções de prescrição do direito cambiário e do abuso de direito da exequente.
Os oponentes alegam que as livranças dadas à execução se encontram prescritas, por terem decorrido mais de 3 anos entre a data de incumprimento ocorrido em 13/07/212 com a declaração de insolvência da sociedade subscritora e avalizada e a data do efectivo preenchimento dos referidos títulos cambiários (03/07/2017).
Sustentam, em síntese útil, que a CGD ao preencher as livranças dadas à execução apenas em 03/07/2017, decorridos que estavam cerca de 5 anos sobre o momento do vencimento da obrigação, pretendeu aquela apenas afastar e protelar o prazo de prescrição das livranças legalmente estatuído e continuar a contabilizar juros, prescrição essa que, na sua perspectiva, não deve ser afastada pelo facto de não ter sido estipulado um prazo para o preenchimento do título ou de não ter sido expressamente estabelecido um critério de aposição de data de vencimento, no correspectivo pacto de preenchimento.
Para sustentar a sua posição, os embargantes invocam a doutrina sufragada pela Prof. Carolina Cunha (Manual de Letras e Livranças, Almedina 1016, pp. 200 a 206), que tem defendido o entendimento contrário ao propugnado por jurisprudência expressivamente maioritária.
Nos termos do art.º 70.º § 1, ex vi do art.º 77.º, ambos da LULL, todas as acções contra o subscritor e avalista de livranças prescrevem em três anos, desde a data de vencimento inscrita nas mesmas.
Assim, o prazo de prescrição começa a correr a partir da data inscrita no título como sendo a do vencimento.
Prazo que foi respeitado na execução intentada ela exequente, a que respeitam os presentes embargos de executado (a execução deu entrada em 28/04/2020).
Com efeito, como dá devida nota a exequente, aqui recorrente, a jurisprudência tem sido uniforme na resposta afirmativa à questão de saber se o início do cômputo do prazo de prescrição se afere ou não da data de vencimento inscrita na letra ou na livrança, considerando que enquanto a letra ou a livrança não for preenchida e nela inserida a data do vencimento, não se inicia a contagem de qualquer prazo de prescrição.
Por outro lado, como também salienta a exequente na contestação aos embargos de executados, nos casos em que a dívida se encontra garantida por hipoteca sobre bens imóveis, como sucede o caso vertente, mostra-se claro que “tal entendimento não pode proceder. Dispõe o art.º 752º do CPC que, “Executando-se dívida com garantia real que onere bens pertencentes ao devedor, a penhora inicia-se pelos bens sobre que incida a garantia e só pode recair noutros quando se reconheça a insuficiência deles para conseguir o fim da execução.” Ora, a acreditar na bondade de raciocínio dos embargantes, a CGD teria de ter preenchido a livrança em 2012 e teria, necessariamente de instaurar a competente execução até 2015, por força da limitação temporal de 3 anos. Todavia e, conforme resulta à evidência demonstrado, os imóveis garantes da obrigação ora reclamada apenas vieram a ser vendidos em 2018, no âmbito do referido processo de insolvência. (…)”
E em abono desta sua posição, citou, com pertinência, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19/06/2019, Processo 1025/18.5T8PRT.P1.S1 (Conselheiro Bernardino Domingos) onde se lê que, “Numa livrança em branco, o prazo de prescrição de três anos previsto no artigo 70º ex vi do artigo 77º, da LULL conta-se a partir da data de vencimento que venha a ser aposta no título pelo respectivo portador, quer essa data coincida ou não com o incumprimento do contrato subjacente ou com o vencimento da obrigação subjacente, nomeadamente quando esse vencimento decorre da insolvência do subscritor, em conformidade com o preceituado no artigo 91º, n.º 1, do CIRE.”
Só podemos sufragar este entendimento, pelo que bem andou o Exmo. Juiz a quo em julgar improcedente a excepção peremptória de prescrição do direito de acção invocada, seguindo a orientação maioritária da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, de que cita alguns exemplos de arestos, orientação a que nos acolhemos por não vermos razões válidas para dela nos afastarmos.
Termos em que improcedem as conclusões h) a n), q) e r) do recurso subordinado.
*
Por fim, os oponentes sustentam, nas conclusões o) e p):
“o) A inércia no exercício de tal direito também é censurável, porque contrária aos ditames da boa-fé e à proteção legal conferida pelo legislador, atento o disposto no artigo 762.° n.º 2 do Código Civil;
p) O comportamento da credora consubstancia um abuso de direito tal como se encontra consagrado no art.º 334º do C. Civil porque se destina a afastar a aplicação do prazo de prescrição de 3 anos previsto no art.º 70º, nº 1, aplicável por remissão do art.º 77º ambos da L.U.L.L.”.
A propósito desta questão, pode ler-se na sentença recorrida:
Distinta é a questão do preenchimento abusivo ou indevido das livranças cuja resolução implica necessariamente a consideração do exato teor dos respetivos pactos de preenchimento, pelos quais os embargantes avalistas também se encontram vinculados, que aqui se reproduz:
«Cláusula 19.ª (LIVRANÇA EM BRANCO): ----------------------------
1 – Para titular e assegurar o pagamento de todas as responsabilidades decorrentes do empréstimo, a parte devedora entrega à CAIXA, neste acto, uma livrança com montante e vencimento em branco, devidamente datada, subscrita pela parte devedora e avalizada pessoalmente pelos senhores J… e sua mulher D.ª MM…, FI…e V…, autorizando a preencher a sobredita livrança, quando tal se mostre necessário, a juízo da própria CAIXA, tendo em conta, nomeadamente, o seguinte: --------
a) A data de vencimento será fixada pela CAIXA quando, em caso de incumprimento pela parte devedora das obrigações assumidas, a CAIXA decida preencher a livrança: -------------------------------------
b) A importância da livrança corresponderá ao total das responsabilidades decorrentes do presente empréstimo, nomeadamente em capital, juros remuneratórios e moratórios, comissões, despesas e encargos fiscais, incluindo os da própria livrança; ----------------------------------------------------------------------------
c) A CAIXA poderá inserir a cláusula “sem protesto” e definir o local de pagamento; -------------------------------------------------------------
d) A livrança não constitui novação do crédito, pelo que se mantêm as condições do empréstimo, incluindo as garantias. »
Tendo a exequente embargada ficado autorizada a, de acordo com o seu próprio juízo, preencher a data de vencimento das livranças em função do incumprimento das obrigações pela devedora, não é possível concluir-se que aquela (exequente) – ao apor nas livranças a data de 03.07.2017, mais de três anos ulterior em relação à declaração de insolvência da devedora, e alguns meses anterior à ação executiva – incorreu em preenchimento abusivo. Por outras palavras, a ampla margem de discricionariedade concedida à portadora das livranças nos respetivos pactos de preenchimento não permite considerar-se verificado o invocado preenchimento abusivo, no que à aposição da data do vencimento das livranças concerne.
Mas mesmo que os termos acordados não atribuíssem à exequente tal margem de discricionariedade, atento o regime normativo da prescrição, sempre seria discutível se o simples decurso do tempo sem exigência do cumprimento das obrigações bastaria para configurar uma situação de abuso do direito – ver, em sentido negativo, Ac. STJ 19/10/2017 (proc. n.º 1468/11.5TBALQ-B.L1.S1): “O simples decurso do tempo, sem que tenha sido exigido o pagamento da dívida por parte do credor, não é suscetível de, sem mais, criar no devedor a confiança de que não lhe vai mais ser exigido o cumprimento da obrigação que sobre ele impende; O preenchimento de uma livrança, entregue em branco ao credor quanto ao montante e data de vencimento, decorridos mais de doze anos sobre a data da constituição da obrigação e mais de sete anos sobre a declaração de insolvência da sociedade subscritora da livrança, e a instauração da ação executiva contra a avalista desta sociedade, só por si, não consubstanciam fundamento bastante para o reconhecimento do abuso de direito previsto no artigo 334º do Código Civil, na modalidade de venire contra factum proprium”. Acresce, in casu, que o exequente justifica o decurso do tempo com o facto de estarmos perante uma dívida garantida por hipoteca, o que obstaria à demanda dos avalistas antes de ver excutidos os bens da devedora principal, atento o disposto no artigo 752º do CPC. E, a ser assim, a CGD teria de ter preenchido a livrança em 2012 e teria, necessariamente de instaurar a competente execução até 2015, por força da limitação temporal de 3 anos. Embora o exposto pela exequente não seja assim tão líquido, na medida em que, estando em causa responsabilidades solidárias, é discutível que aquela tivesse que aguardar a excussão dos bens do devedor principal onerados com as invocadas garantias hipotecárias para, após, demandar os avalistas – ver, a propósito, o Ac. RP, de 17.12.2014, relatado por Caimoto Jácome, assim sumariado: “A responsabilidade (cambiária) do avalista não é subsidiária da do avalizado. III - Não tem cabimento, na execução cambiária, a invocação pelo executado avalista do fundamento de oposição à penhora previsto na referida al. b), do artº 784º, do CPC, com referência ao estatuído no artº 752º, do mesmo diploma. IV - Nada impede, pois, a imediata penhora do imóvel pertencente ao executado apelante, enquanto obrigado cambiário (ver arts 32º, 43º e 47º, da LULL, aplicável ex vi do artº 77º, do mesmo diploma).” –, não deixa de ser um argumento válido, em face das várias soluções de direitos plausíveis quanto a tal matéria/questão. Deste modo, conclui-se pela não verificação da exceção da prescrição invocada. “(Fim de citação).
Também relativamente a este segmento decisório acompanhamos, pelo seu acerto, a fundamentação expendida e a solução alcançada sobre a questão sub iudice, pois não se vislumbram razões válidas que sustentem o invocado abuso de direito de acção por parte da exequente que justifiquem afastar o funcionamento da excepção de prescrição desse direito.
O abuso do direito, nas suas várias modalidades, pressupõe sempre que “o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito” (artigo 334.º do CC).
Conforme se afirma no acórdão do STJ, de 11/6/2007, relatado pelo Conselheiro Nuno Cameira[[8]], “a proibição do comportamento contraditório configura actualmente um instituto jurídico autonomizado, que se enquadra, justamente, na proibição do abuso do direito, nessa medida sendo de conhecimento oficioso. No entanto, não existe no direito civil um princípio geral de proibição do comportamento contraditório, ou, dito de outro modo, “uma regra geral de coerência do comportamento dos sujeitos jurídico-privados, juridicamente exigível” [[9]]. Assim, o indivíduo é livre de mudar de opinião e de conduta fora dos casos em que assumiu compromissos negociais. Daí que, em princípio, o mecanismo disponibilizado pela ordem jurídica para possibilitar a formação da confiança na palavra dada e, consequentemente, na conduta futura dos contraentes seja só o negócio jurídico. Sabido, porém, que uma das funções essenciais do direito é a tutela das expectativas das pessoas, facilmente se intui que por si só o negócio jurídico, sob pena de cometimento de flagrantes injustiças em muitas situações concretas, não pode constituir o único modo de protecção das expectativas dos sujeitos na não contradição da conduta da contraparte; casos há em que, ainda antes do limiar da vinculação contratual, o agente deve ser obrigado a honrar as expectativas que criou, podendo exigir-se-lhe, então, que actue de forma correspondente à confiança que despertou; casos, isto é, em que não pode venire contra factum proprium. A delimitação de tais casos obrigou a doutrina e a jurisprudência a terem que precisar com o máximo de rigor possível os pressupostos da proibição desta modalidade do abuso, desde logo por se ter a noção de que este instituto, construído, todo ele, a partir da cláusula geral da boa-fé, apenas deve funcionar em situações limite, como verdadeira válvula de segurança e de escape do sistema, e não como uma tal ou qual panaceia de que se lança mão sempre que a aplicação das regras de direito estrito pareça ser insuficiente para assegurar a solução justa do caso. Importa evitar a todo o custo, como escreveu o autor atrás citado, “a utilização da boa fé como um “nevoeiro” que serve para tudo”[[10]].
Assim, há desde logo um primeiro e fundamental pressuposto a considerar: a existência de um comportamento anterior do agente (o factum proprium) que seja susceptível de fundar uma situação objectiva de confiança. Em segundo lugar exige-se que, quer a conduta anterior (factum proprium), quer a actual (em contradição com aquela) sejam imputáveis ao agente. Em terceiro lugar, que a pessoa atingida com o comportamento contraditório esteja de boa-fé, vale por dizer, que tenha confiado na situação criada pelo acto anterior, ignorando sem culpa a eventual intenção contrária do agente. Em quarto lugar, que haja um “investimento de confiança”, traduzido no facto de o confiante ter desenvolvido uma actividade com base no factum proprium, de modo tal que a destruição dessa actividade pela conduta posterior, contraditória, do agente (o venire) traduzam uma injustiça clara, evidente[[11]]. Por último, exige-se que o referido “investimento de confiança” seja causado por uma confiança subjectiva objectivamente fundada; terá que existir, por conseguinte, causalidade entre, por um lado, a situação objectiva de confiança e a confiança da contraparte, e, por outro, entre esta e a “disposição” ou “investimento” levado a cabo que deu origem ao dano.
Os pressupostos enumerados não podem em caso algum ser aplicados automaticamente pois, como observa o autor que vimos a acompanhar, o venire contra factum proprium é, em última análise, “uma técnica....que não dispensa, e antes pressupõe, um controlo da adequação material da solução, com uma valoração global de todos os elementos à luz do ponto de vista da tutela da confiança legítima” [[12]]; por isso, todos aqueles pressupostos “deverão ser globalmente ponderados, em concreto, para se averiguar se existe efectivamente uma “necessidade ético-jurídica” de impedir a conduta contraditória, designadamente, por não se poder evitar ou remover de outra forma o prejuízo do confiante, e por a situação conflituar com as exigências de conduta de uma contraparte leal, correcta e honesta – com os ditames da boa fé em sentido objectivo” [[13]].”
No âmbito da fórmula manifesto excesso” cabe a figura da conduta contraditória (venire contra factum proprium), que se inscreve no contexto da violação do princípio da confiança, que sucede quando o agente adopta uma conduta inconciliável com as expectativas adquiridas pela contraparte em função do modo como antes actuara.
O princípio da confiança é um princípio ético fundamental de que a ordem jurídica em momento algum se alheia; ele está presente, desde logo, na norma do art.º 334º do CC, que, ao falar nos limites impostos pela boa-fé ao exercício dos direitos, pretende por essa via assegurar a protecção da confiança legítima que o comportamento contraditório do titular do direito possa ter gerado na contraparte.
No caso dos autos, verifica-se que a exequente preencheu e accionou as livranças que os executados e recorrentes subordinados avalizaram em branco, segundo pacto de preenchimento acordado entre as partes, que subscreveram.
É irrelevante, para o caso, pelas razões já antes expostas, que a exequente tenha preenchido e dado à execução as livranças cerca de cinco anos após o incumprimento ocorrido com a declaração de insolvência da sociedade subscritora e avalizada.
Na verdade, a conduta da exequente está justificada com o facto de estarmos perante uma dívida garantida por hipoteca, o que obstou à demanda dos avalistas antes de ver excutidos os bens da devedora principal, atento o disposto no artigo 752.º do CPC e tem cobertura na ampla margem de discricionariedade concedida pelos executados/avalistas à portadora das livranças nos respetivos pactos de preenchimento.
Termos em que se conclui que a conduta da exequente não ultrapassou os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes, ou pelo fim social ou económico do seu direito de crédito e que, como tal, não se justifica afastar o funcionamento da excepção de prescrição do direito de acção por si exercido
Por quanto se disse, improcede o recurso subordinado.
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 Face à procedência do recurso principal e improcedência do recurso subordinado, impõe-se concluir pela revogação da sentença recorrida que considerou os títulos executivos (livranças) inexequíveis e julgou procedente a oposição, substituindo-a por outra que julgue improcedente a invocada excepção de inexequibilidade dos títulos cambiários dados à execução e determine o prosseguimento dos termos ulteriores e normais destes autos, face à subsistência de matéria de facto impugnada e controvertida.
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Por terem decaído, quer no recurso principal, quer no recurso subordinado, as custas respectivas serão suportadas pelos oponentes F…, MT…e V…– artigos 527.º do CPC.
III – Decisão
Por tudo quanto exposto ficou, acordam os Juízes que compõem a 6ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa, em:
a) julgar improcedente o recurso subordinado;
b) julgar procedente o recurso principal e, em consequência, revogam a sentença recorrida que substituem por este acórdão que julga improcedente a excepção de inexequibilidade dos títulos cambiários dados à execução e determina o prosseguimento dos ulteriores e normais termos dos presentes autos de oposição à execução.
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A custas do recurso principal e as do recurso subordinado ficam a cargo dos oponentes F…, MT… e V….
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Registe e notifique.
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Lisboa, 4 de Novembro de 2021
Manuel Rodrigues
Ana Paula Albarran Carvalho
Nuno Lopes Ribeiro
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[1] Cf. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 4.ª edição, p. 109.
[2] Cf. Ac. STJ, de 18.05.2006, Proc. n.º 06B1441, disponível em www.dgsi.pt.
[3] Cf. Ac. do STJ, de 05.02.2004, Proc. 04B522, disponível em www.dgsi-pt.
[4] As obrigações a que se encontrem adstritos os insolventes têm-se por vencidas por força da declaração da sua insolvência, como consequência da impossibilidade de cumprimento de tais obrigações.
[5] Cf. Abílio Neto, Código de Processo Civil Anot., , 2.ª Edição …, anotação ao art.º 615.º, pág. 739.
[6] Decorre do artigo 32º II da LULL, aplicável à livrança por força do artigo 77º do mesmo diploma, que a obrigação do avalista se mantém mesmo no caso de a obrigação que ele garantia ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma.
O Professor Paulo Sendim (Letra de Câmbio, vol.II, 781) analisando o artigo 32º da LULL observa que ao dizer-se que o avalista responde ainda que a obrigação que garantiu seja nula por razões que não se reconduzam a um vício de forma se «procurou traduzir praticamente toda a situação em que essa obrigação, ao fim e ao cabo, não exista: ou porque se constituiu e é nula, foi anulada ou porque nem se chegou a constituir».
O aval reveste-se, pois, de autonomia relativamente à obrigação avalizada, servindo esta apenas de medida formal para determinação da obrigação do avalista (no sentido da autonomia do aval relativamente à operação avalizada vide, entre outros, Prof. Paulo Sendim in, Letra de Câmbio, Vol.II, 783/784; Prof. Ferrer Correia, in Letra de Câmbio, 207; Prof Vaz Serra, in RLJ, ano 103, pag.429; Ac. Rel Coimbra, 6.1.1994, CJ, I).
Esta autonomia do aval, reconhecida pela grande maioria da doutrina, assume a maior importância na medida em que justifica que se vede ao avalista, como já se referiu, a possibilidade de se defender com as excepções do avalizado, diferentemente do que se passa nas relações entre o fiador e o credor. O que bem se compreende dada a diferente natureza das duas figuras.
Na verdade, como decorre do mencionado artigo 17º da LULL - aplicável ex vi do artigo 77º do mesmo diploma - apenas no âmbito das relações imediatas se pode lançar mão de toda a defesa, isto é, tudo se passa como se a obrigação cartular deixasse de ser literal e abstracta, assim se admitindo se possa discutir a relação subjacente. No caso vertente, tendo as livranças dadas à execução sido transmitidas para a exequente por efeito de negócio de cessão de créditos (art.º 582.º do Cód. Civil), essa possibilidade de defesa alargada por parte dos avalistas, oponentes e recorridos, decorre do disposto no artigo 585.º do Cód. Civil, nos termos do qual «o devedor pode opor ao cessionário, ainda que este os ignorasse, todos os meios de defesa que lhe seria lícito invocar contra o cedente, com ressalva dos que provenham de facto posterior ao conhecimento da cessão».
[7] A certeza da prestação contende com a prestação em si, ou com o seu objecto (é certa a obrigação cuja prestação se encontra qualitativamente determinada, ainda que esteja por liquidar ou por individualizar), já não com o quantum, que se afere em sede de liquidação, a par de que a exigibilidade está, por sua vez, relacionada com o tempo do vencimento.
[8] Revista 2960/07, cujo texto completo está acessível em www.stj.pt.
[9] Paulo Mota Pinto, Sobre a Proibição do Comportamento Contraditório (Venire Contra Factum Proprium) no Direito Civil, BFDUC, Volume Comemorativo (2003), pág. 276.
[10] Obra e loc. citados, pág. 302.
[11] Neste exacto sentido, Meneses Cordeiro, “Contrato Promessa – Art.º 410º, nº 3, do Código Civil – Abuso do Direito - Inalegabilidade Formal”, ROA, Julho de 1998, II, pág. 964 (que se seguiu de muito perto no texto).
[12] Obra e loc. citados, pág. 302.
[13] Obra e loc. citados, pág. 305.