Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
536/14.6TVLSB.L1-6
Relator: ANABELA CALAFATE
Descritores: PACTO PRIVATIVO DE JURISDIÇÃO
CONTRATO DE SWAP
REGULAMENTO (CE) Nº 44/2001
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/04/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: - Mesmo que seja confirmada pelo Tribunal da Relação com dupla conforme, a decisão da 1ª instância relativamente à questão da competência internacional, ainda que decorrente de um pacto privativo de jurisdição, é admissível recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça.
- A violação de pacto privativo de jurisdição, embora determine a incompetência absoluta do tribunal, não é de conhecimento oficioso no âmbito da legislação processual civil nacional.
– Embora sendo desnecessário, perante o Regulamento (CE) nº 44/2001, que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, é exigível que se trate de uma situação jurídica internacional.
- No caso concreto A. e R. aceitaram que o R. actue como uma Multybranch Party, podendo realizar transacções através das suas filiais em Londres e no Luxemburgo, o que significa que acordaram que o R. pode realizar operações financeiras no mercado internacional no âmbito da sua actuação como parte nos contratos de swap.
- Assim, é de concluir que estes concretos contratos de swap têm conexão com mais do que uma ordem jurídica, pelo que está demonstrada a internacionalidade da relação jurídica e preenchidos estão os pressupostos para a aplicação do art. 23º nº1 do Regulamento (CE) nº 44/2001.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa:



I – Relatório:


P … SA, com sede ... instaurou acção declarativa com processo comum em 01/04/2014 contra Banco ..., com sede ..., pedindo:
«a) Deverá a acção ser julgada procedente, por provada, e em consequência declarados nulos os contratos de derivados financeiros em crise;
b) Caso assim não se entenda, pede-se, subsidiariamente, que seja reconhecida a resolução dos contratos de derivados financeiros em crise, com fundamento na alteração das circunstâncias;
c) Caso assim não se entenda, pede-se, subsidiariamente, que o Réu seja declarado civilmente responsável pelos danos causados à Autora;
d) Consequentemente, em caso de procedência do pedido feito em a), em b), ou em c), deve ser restituído o seguinte montante à Autora: € 6.099.553,71 (Seis milhões…);
e) A este montante acrescem juros de mora à taxa legal comercial vencidos e vincendos até restituição integral do montante peticionado».

Alegou em síntese:
-nos termos do contrato ISDA Master Agreement celebrado entre a A. e o R. é atribuída competência aos tribunais ingleses para dirimir qualquer litígio referente à validade, interpretação e execução desse mesmo contrato;
- mas esse pacto privativo de jurisdição não é válido porquanto:
a) a relação jurídica em apreço não apresenta qualquer traço de transnacionalidade, encontrando-se fora do escopo do nº 1 do art. 23º do Regulamento (CE) nº 44/2001;
b) por isso tem de se aplicar as disposições do CPC, sendo que não estão verificados os requisitos de validade exigidos pelo art. 94º, pois a relação controvertida é puramente interna e a eleição do foro não se encontra justificada por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas;
c)a escolha dos tribunais ingleses representa graves inconvenientes para a A. sem que exista um interesse atendível por parte do R., pelo que de acordo com o art. 19º al g) do DL 446/85 de 25/10, tal pacto constitui uma cláusula geral proibida;
- a A. celebrou dois contratos de financiamento com taxa de juro indexada à Euribor a seis meses – um datado de 13/12/2002, no montante de 190.000.000 €, sendo mutuante a Z.... e outro datado de 30/10/2007, no montante de 125.000.000 €, sendo mutuantes o Banco ... e o Banco ...;
- para cobrir o risco da flutuação das taxas de juro, a A. celebrou com o R. dois contratos de derivados financeiros – swap de taxa de juro com knock-in e knock-out -, um com data início em 09/06/2008, estando subjacente a este swap a suposta cobertura do risco da variação da taxa de juro do financiamento obtido junto do Banco ... e do Banco … e outro com data início em 11/05/2006, estando  subjacente a este swap a suposta cobertura do risco da variação da taxa de juro do financiamento obtido junto da Z...;
- os referidos contratos são de teor altamente especulativo, não eliminando eficazmente o risco de variação de taxa de juro, antes consistem na troca de um risco por um risco ainda maior, não se incluindo pois, no âmbito da gestão da dívida da A.

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O R. contestou tendo, além do mais, pugnado pela sua absolvição da instância, invocando a excepção de incompetência internacional dos tribunais portugueses e caso assim não se entenda, a excepção de abuso de direito processual, alegando, para tanto e em síntese:
- foi a A. que propôs a assinatura do ISDA Master Agreement e do respectivo Schedule, o qual incluía uma cláusula de jurisdição a favor dos tribunais ingleses;
- a A. não só quis conferir jurisdição aos tribunais ingleses como o exigiu inequivocamente, fazendo da assinatura do Master Agreement uma verdadeira condição do concurso para contratar;
-é por isso em manifesto venire contra factum proprium que a A. alega a inaplicabilidade da cláusula de jurisdição, sendo evidente o abuso de direito processual;
-as normas do Regulamento CE 44/2001 referentes aos pactos de jurisdição prevalecem sobre as normas reguladoras da competência internacional constantes do CPC;
-não é líquido se o Regulamento é aplicável a qualquer litígio envolvendo Estados-Membros, incluindo os puramente domésticos, ou se é apenas aplicável a litígios sobre relações jurídicas com elementos de estraneidade, internacionalidade ou transnacionalidade, ou seja, elementos de conexão com outras ordens jurídicas;
-mesmo para quem entenda que são necessários elementos de estraneidade, é absolutamente consensual que os critérios de conexão podem ser subjectivos (caso da residência das partes, a sede ou a nacionalidade) ou objectivos (que se reportam a objectos e factos);
-a relação jurídica regulada pelo ISDA Master Agreement apresenta elementos de estraneidade porquanto:
- ambas as partes nos contratos de swap são portuguesas, é certo, mas o R. é uma filial do Banco ... com sede em Espanha sendo por este totalmente detido;
- o R. actuou na qualidade de banco internacional, o que se torna evidente no ISDA Master Agreement pois aí foi considerado uma Multibranch Party, podendo fazer e receber pagamento em qualquer transacção através da sua filial em Londres ou no Luxemburgo;
-os dois contratos de swap têm subjacentes financiamentos concedidos por bancos estrangeiros, estão redigidos em inglês e é-lhes aplicável a lei inglesa;
-os swaps são um produto do mercado internacional em que os bancos actuam como intermediários de partes localizadas em diferentes ordenamentos jurídicos;
-o art. 19º al g) do DL 446/85 é inaplicável, além do mais porque o direito aplicável aos contratos é o inglês.

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A A. respondeu às excepções, reiterando a alegação vertida na p.i. no sentido de que este pacto de jurisdição está fora da aplicação do nº 1 do art. 23º do Regulamento (CE) 44/2001, e invocando ainda, em resumo:
-a alegada actuação do R. como banco internacional e o facto de poder fazer e receber pagamentos através das filiais em Londres e no Luxemburgo não são suficientes para configurar um elemento de estraneidade, pois tal consideração pressupõe que (i) basta a existência de um accionista domiciliado além-fronteiras ou (ii) a mera referência contratual à possibilidade de ocorrerem pagamentos num outro país para que estejamos perante uma situação transnacional; o que releva é a nacionalidade/domicílio das partes e o local efectivo do cumprimento contratual;
-a redacção de um contrato numa língua estrangeira ou a escolha de uma lei estrangeira não são critério bastante de transnacionalidade;
-os contratos de swap em causa não são contratos internacionais;
-o contrato ISDA é um contrato padronizado, pré-elaborado por uma entidade estranha à relação contratual e por isso a A. não foi a proponente do pacto de jurisdição;
-não há abuso de direito processual por parte da A.;
-toda a lei portuguesa imperativa é aplicável aos contratos em crise.

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Após os articulados foram juntos pareceres jurídicos - dois pelo R. e um pela A.

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Dispensada audiência prévia, foi proferido despacho saneador que julgou procedente a excepção de incompetência internacional arguida pelo. R e declarou o tribunal português internacionalmente incompetente para julgar a causa, absolvendo o R. da instância.

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Inconformada, apelou a A., que terminou a sua alegação com as seguintes conclusões:

A. INAPLICABILIDADE DO REGULAMENTO DE BRUXELAS

1.Na Sentença, considerou-se, erradamente, o pacto privativo de jurisdição celebrado pelas partes válido e eficaz à luz do ordenamento jurídico português e, como tal, o Réu, ora Recorrido, foi absolvido da instância, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 278.º, n.º 1, a), do CPC.
2.A Sentença merece vários reparos, tendo violado o artigo 23.º, n.º 1, do Regulamento de Bruxelas bem como o artigo 94.º, n.ºs 1 e 3, do CPC, e o artigo 19.º, g), da LCCG.
A.Inaplicabilidade do Regulamento de Bruxelas a situações puramente internas.
3.É entendimento uniforme do TJUE que a aplicação do Regulamento de Bruxelas pressupõe a existência de uma relação transnacional, como o demonstram inequivocamente os Acórdãos Maletic, Owusu e Lindner.
4.A questão da internacionalidade do litígio foi pura e simplesmente ignorada na Sentença, sendo certo que se a relação jurídica subjacente a um litígio não for transnacional, não está, ipso facto, preenchido o âmbito de aplicação pessoal ou espacial do Regulamento de Bruxelas.

B.Carácter puramente interno da relação jurídica em crise

5.No caso vertente, não há nenhum elemento do tipo dos elencados na jurisprudência do TJUE susceptível de conferir um carácter transnacional à relação jurídica em crise, visto que ambas as partes são pessoas colectivas de direito português, os contratos em crise foram celebrados em Portugal e o lugar do cumprimento da integralidade das obrigações deles decorrentes é também em Portugal.
6.Contrariamente ao que pretende o Recorrido, a internacionalidade do litígio não pode fundar-se: (i) no facto de os contratos de financiamento celebrados pela Recorrente com terceiros possuírem elementos de conexão com outras ordens jurídicas, (ii) na actuação do Recorrido como banco internacional, (iii) no uso da língua inglesa, (iv) na aplicação da lei inglesa ou (v) no facto de estarmos perante um produto importado que se insere num mercado internacional.
7.Não há qualquer ligação entre os contratos de mútuo e os swaps em crise, já que os segundos não contêm qualquer referência aos primeiros, sendo a respectiva existência totalmente autónoma.
8.Ademais, como salienta o Recorrido na sua contestação, a abstracção relativamente à realidade subjacente é característica dos derivados em geral: de facto, e como de resto aconteceu no caso do swap de 2006, o contrato de mútuo, mesmo que sirva de referência a um contrato swap, pode ser resolvido antecipadamente sem que isso implique a resolução automática do contrato swap.
9.Os swaps em crise não têm qualquer relação material com os supostos financiamentos subjacentes, conforme alegado na petição inicial.
10.A actuação do Recorrido como banco internacional, ou o facto de, ao abrigo do contrato ISDA, o Recorrido poder receber e fazer pagamentos através das filiais em Londres e no Luxemburgo, não configuram elemento de estraneidade relevante.
11.Se assim fosse, bastaria (i) a existência de um accionista domiciliado além-fronteiras ou (ii) a mera referência contratual à possibilidade de ocorrerem pagamentos num outro país para que estivéssemos perante uma situação transnacional.
12.A primeira destas duas condições corresponderia, desde logo, à desconsideração da autonomia jurídica da entidade contratante.
13.A segunda implicaria que, com uma mera referência contratual, e independentemente da sua verificação factual, se poderia afastar a competência dos tribunais portugueses para dirimir uma situação puramente interna.
14.O que releva neste âmbito é a nacionalidade, o domicílio das partes bem como o local efectivo do cumprimento contratual, conforme decorre da jurisprudência do TJUE acima referida.
15.Seria absurdo que a redacção de um contrato numa língua estrangeira ou a mera escolha de uma lei estrangeira – que só será efectiva na medida em que não contrarie as disposições imperativas da lei portuguesa, nos termos do artigo 3.º, n.º 3, da Convenção de Roma – fosse critério bastante de transnacionalidade para este efeito.
16.O mesmo se diga relativamente à alegação de que se trata de “produto importado” e de um “mercado internacional”.
17.O facto de os contratos swap usarem como referência a taxa Euribor para determinar as prestações das partes não pode, obviamente, ser critério para os definir como contratos internacionais.
18.Os swaps em crise foram celebrados entre Recorrente e Recorrido, únicas partes em tais contratos, não havendo qualquer referência expressa ou tácita à existência de um terceiro ou à actuação do Recorrido como intermediário.
19.A teleologia subjacente à exigência de um elemento efectivo de estraneidade como pressuposto de aplicação do Regulamento de Bruxelas prende-se com a necessidade de garantir que cada Estado-Membro mantenha jurisdição efectiva sobre disputas puramente internas, desiderato que manifestamente se frustraria caso fossem considerados relevantes elementos de conexão ténues e, ou, artificiais.
20.Estamos, pois, perante uma situação jurídica portuguesa puramente interna, que não apresenta nenhuma conexão com o território de qualquer outro Estado, pelo que não se encontra preenchido o pressuposto espacial ou pessoal de aplicação do Regulamento de Bruxelas.
C. Inadmissibilidade do pacto de jurisdição à luz do artigo 94.º do CPC
21.Sendo inaplicável o Regulamento de Bruxelas, a designação convencional da jurisdição competente para conhecer dos litígios eventualmente decorrentes de certa relação jurídica tem de se conformar com o disposto no artigo 92.º do CPC, que pressupõe, entre outros requisitos, cumulativamente que: (i) a relação controvertida tenha conexão com mais de uma ordem jurídica; (ii) [a designação seja] justificada por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas, desde que não envolva inconveniente grave para a outra.
22.Conforme exposto, a situação é puramente interna sendo, que cumulativamente, a escolha da jurisdição inglesa não é justificada por um interesse sério do Recorrido e envolve inconveniente grave para a Recorrente.
23.Efectivamente, a distância e os custos decorrentes de litigar no estrangeiro, a língua a adoptar no processo, bem como a circunstância de a Recorrente não ter qualquer experiência em litígios do mesmo género e perante jurisdições estrangeiras, constituirão obstáculos insuperáveis a uma defesa eficaz dos seus interesses.
24.Entre custas judiciais, honorários de advogados, honorários de peritos e outros custos, incluindo traduções, a Recorrente precisaria de, no mínimo, despender dois milhões de euros para conduzir um litígio deste tipo perante os tribunais ingleses.
25. O facto de todo o direito imperativo português ser aplicável, por força do artigo 3.º, n.º 3, da Convenção de Roma, à discussão material do litígio constitui, evidentemente, um obstáculo de monta, i.e., um grave inconveniente, à respectiva dirimição por um tribunal de uma jurisdição estrangeira.
D. Inadmissibilidade do pacto de jurisdição à luz da LCCG
26.Ainda que se qualificasse a relação jurídica em crise como internacional para efeitos do Regulamento de Bruxelas, exercício que se faz sem conceder, o pacto de jurisdição sempre seria inválido à luz da LCCG, designadamente do respectivo artigo 19.º, alínea g).
27.O contrato ISDA é um contrato padronizado, estando inclusivamente, as partes impossibilitadas de o alterar ao abrigo da protecção jurídica dada aos direitos de autor e direitos conexos existindo, portanto, um “pacto privativo de jurisdição assente numa cláusula elaborada de antemão, que as partes se limitaram a aceitar, cujo conteúdo não foi previamente elaborado e que o destinatário não pode influenciar, remetendo-nos, assim, para a apreciação do regime das cláusulas contratuais gerais e para a necessidade de ponderar a proteção do aderente a este tipo de negociação préformulada, sejam as cláusulas gerais elaboradas pelo proponente, pelo destinatário ou por terceiros (artigo 1.º, nºs 1 e 2, e artigo 2.º, do Decreto-Lei n.º 446/85)”, conforme
considerou o Tribunal da Relação de Lisboa, a propósito de documentação ISDA igual à dos presentes autos.
28.Estamos, claramente, perante um contrato padronizado, pré-elaborado por uma entidade estranha à relação contratual, sendo que, atentas as circunstâncias do caso concreto, elencadas supra, existem graves inconvenientes na escolha da jurisdição inglesa para a Recorrente sem que exista um interesse sério do Recorrido.
29.Na mesma linha, e em situação idêntica à dos presentes autos, o referido Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa considerou o pacto de jurisdição nulo nos termos e para os efeitos dos artigos 12.º e 19.º, g), da LCCG.
30.Ao contrário do que se sustenta na Sentença, ainda que o Regulamento de Bruxelas fosse aplicável, o Tribunal a quo poderia e deveria ter cotejado o pacto privativo de jurisdição com o regime da LCCG, com base, aliás, na própria jurisprudência do TJUE (Acórdãos Pénzügyi Lízing e Mohamed Aziz) e na esteira das citadas decisões do Tribunal da Relação de Lisboa.
31.A Recorrente, enquanto investidor não qualificado, é equiparada a consumidor para efeitos de aplicação da LCCG, nos termos do artigo 321.º, n.º 3, do Código dos Valores Mobiliários.
E. Eventual questão prejudicial de Direito da UE
32. Caso o Tribunal ad quem confirme a Sentença no que respeita à aplicabilidade do Regulamento de Bruxelas ao caso vertente, o que por absurdo se admite, não haverá lugar a recurso ordinário para o Supremo Tribunal de Justiça.
33.Nessa circunstância, o Tribunal ad quem terá o dever de submeter a questão da interpretação do âmbito de aplicação do Regulamento de Bruxelas ao TJUE, nos termos do artigo 267.º, §1 e §3 do TFUE, conforme jurisprudência constante do TJUE desde o Acórdão Costa ENEL.
34.A (in)aplicabilidade do Regulamento de Bruxelas ao quadro fáctico da relação jurídica em análise é, evidentemente, uma questão de interpretação de um acto de direito derivado, pelo que o TJUE tem competência para decidir a título prejudicial – cf. Artigo 267.º, §1, b) do TFUE.
35.O thema decidendum não se enquadra nas únicas excepções aduzidas pela jurisprudência do TJUE à obrigatoriedade de reenvio prejudicial por um tribunal de última instância, na denominada jurisprudência Cilfit.
36.Mesmos nos casos em que foi mais maximalista na definição de situação internacional – Acórdãos Maletic, Owusu e Lindner – nunca o TJUE considerou como internacional uma situação tão interna como a aqui em discussão.
37.Sem prejuízo da competência do Tribunal ad quem na definição da questão a submeter ao TJUE, a Recorrente propõe a seguinte formulação:
Uma situação jurídica em que (i) ambas as partes são pessoas colectivas de direito português; (ii) o contrato existente entre ambas foi celebrado e integralmente cumprido em Portugal; (iii) as partes designaram como aplicável a lei inglesa e celebraram um pacto de jurisdição atribuindo competência à jurisdição inglesa; e (iii) o contrato foi redigido em inglês, pode qualificar-se como contendo um elemento de estraneidade suficiente para preencher o âmbito de aplicação pessoal ou espacial do Regulamento
de (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, na versão aplicável aos factos em crise?
Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser julgada procedente a presente apelação, revogando-se, consequentemente, a sentença recorrida que declarou o Tribunal a quo incompetente.

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O apelado contra-alegou defendendo a confirmação da decisão recorrida e sustentou que não se verificam os pressupostos quanto ao dever de submissão da questão de interpretação do âmbito de aplicação do Regulamento de Bruxelas I ao TJUE caso seja confirmada a decisão da 1ª instância, dizendo, em síntese, que não está em causa uma dúvida de interpretação de um acto do direito comunitário derivado (a regra regulamentar comunitária é clara e mesmo quanto aos pressupostos de aplicação adicionados pela jurisprudência – necessidade de elementos de estraneidade, não há controvérsia).

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Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II – Questões a decidir
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, pelo que as questões a decidir são estas:
a) como questão prévia:- se é obrigatório o reenvio prejudicial ao TJUE nos termos do art. 267º do TFUE para interpretar se o Regulamento (CE) nº 44/2001 é aplicável no caso vertente
b) as restantes questões:
- se é inaplicável o art. 23º nº 1 do Regulamento (CE) nº 44/2001
- se é inadmissível o pacto de jurisdição à luz do art. 94º do NCPC
- se é inadmissível o pacto de jurisdição à luz da alínea g) do art. 19º do DL 446/85 de 25/10.

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III – Fundamentação
A) -Da questão prévia: se é obrigatório o reenvio prejudicial ao TJUE nos termos do art. 267º do TFUE para interpretar se o Regulamento (CE) nº 44/2001 é aplicável no caso vertente.
O art. 267º do TFUE (Tratado Sobre o Funcionamento da União Europeia) estabelece que o Tribunal de Justiça da União Europeia é competente para decidir, a título prejudicial, sobre a interpretação dos Tratados e que, sempre que uma questão desta natureza seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal.
A presente acção foi instaurada em 01/04/2014.
O art. 671º nº 3 do NCPC (aprovado pela Lei 41/2013 de 26/06) prevê: «Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte».
Ora, dispõe o art. 96º al a) que determina a incompetência absoluta do tribunal a infracção das regras de competência internacional.

Por sua vez, a art. 629º nº 2 al a) estatui que independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso com fundamento na violação das regras de competência internacional.

Portanto, mesmo que seja confirmada, com dupla conforme, a decisão da 1ª instância relativamente à questão da competência internacional, ainda que decorrente de um pacto privativo de jurisdição, é admissível recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, o que significa que, o Tribunal da Relação não funciona, quanto a esta questão, como tribunal de última instância.
Outra era a solução no anterior CPC, pois como resulta dos seus art. 108º e 111º, a infracção das regras de competência decorrentes do estipulado em pactos privativo e atributivo de jurisdição determinava a incompetência relativa do tribunal e da decisão final proferida sobre essa questão só era admissível recurso até à Relação.

Face ao exposto, improcede esta questão prévia.

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B) Factualidade a considerar

B) 1. Na decisão recorrida consignou-se:
«O pacto de jurisdição em que importa atentar encontra-se plasmado na cláusula 13ª do ISDA Master Agreement, que estipula nos seguintes termos: «Governing Law and Jusridiction
a) Governing Law. This Agreement will be governed by and construed in accordance with the law specified in the Schedule.
b) (…) Jurisdiction. With respect to any suit, action or proceeding relating to this Agreement (Proceedings), each party irrevocably: -
(i) Submits to the jurisdiction of de English courts, if this Agreement is expressed to be governed by English law (…)».»

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B) 2. É ainda de considerar o seguinte (ao abrigo do disposto no art. 607º nº 2, ex vi do art. 663º nº 2 do NCPC):
1 – A A. celebrou um contrato de financiamento datado de 13/12/2002 intitulado «Agreement (…) Loan Facility (…)» conforme consta no doc. 3 junto com a p.i.  a fls. 56 v. – 64 e alterado com data de 17/01/2003 conforme consta também nesse doc. 3 a fls. 48-56, sendo mutuárias a A. e S .., S ..., S ... e M... e sendo mutuante Z...., no montante de 190.000.000 € com vencimento em 2022, onde consta, além do mais, no escrito datado de 17/01/2003:
«(…)
(D) This Agreement (the Agreement”) is being entered into with the intention that this Agreement will supersede and replace the Original Loan Agreement with effect from the date of this Agreement.
(…)
8. Payments
8.1. Place
All payments by a Party under this Agreement shall be made to or to the account of the relevant Party at such account at such office or bank as it may notify to the other Party(ies) for this purpose.
Unless and until the Lender notifies the Borrowers to the contrary, all payments to be made to, or to the account oh, the lender shall be made to the Fiscal Agent at the following account:
HSB Bank plc London
(…)
20. Jurisdiction
20.1 Submission
Each of Lender and each Borrower agrees, for the benefit of the other Parties, that the courts of England have jurisdiction to settle any disputes in connection with this Agreement and according submits to the jurisdiction of the English courts for all purposes relating to this Agreement.
(…)
Forum convenience and enforcement abroad
  Each Party:
a)Waives objection to the English courts on grounds of inconvenient forum oir otherwise as regards proceedings in connection with this Agreement; and
b)Agrees that a judgement or order of an English court in connection with this Agreement is conclusive and binding on it and may be enforce against it in the courts of any jurisdiction.
c) (…)».
2-A A. celebrou um contrato de financiamento datado de 30/10/2007 intitulado «Loan Facility Agreement» conforme consta no doc. 4 junto com a p.i. a fls.67-78, sendo mutuárias a A. e S..., S..., S... e M... e sendo mutuantes Banco ... e Banca ..., no montante de 125.000.000 € distribuído pelas mutuárias conforme aí descrito e com vencimento em 2032, onde consta, além do mais:
«(…)
26. Law and Jurisdiction
This Agreement shall be governed by and construed in accordance with Portuguese law. The court of Lisbon shall have exclusive jurisdiction to settle any dispute arising out of or in connection with this Agreement.
(…)».
3 - O Governo Regional da Madeira, através de escrito datado de 06/01/2006 (Proc. 4.2.6 P1), comunicou ao R., Banco ..., o que consta no doc. 1 (de fls. 557-561) junto com a contestação, onde se lê, além do mais:
«Assunto: Operação Integrada de Gestão da Dívida Directa e Indirecta da Região Autónoma da Madeira.

Convite para a apresentação de propostas de cobertura.

O Governo Regional da Madeira através da Secretaria Regional do Plano e Finanças, vem por este meio convidar a V/Instituição a participar em operações financeiras no âmbito da gestão da dívida pública regional (doravante designada abreviadamente por “Dívida”), que abrange empréstimos contraídos (ou em fase contratação) directamente pela Região Autónoma da Madeira (“Região”) ou por entidades com capitais exclusivamente públicos, com aval da Região (“Entidades”).

As operações financeiras objecto do presente convite para apresentação de propostas envolverão derivados financeiros e têm por objectivo a redução do risco da exposição da Dívida a subidas de taxa de juro – concorrendo ainda para os objectivos do seu perfil e de redução e optimização dos custos e responsabilidades dela decorrentes, numa perspectiva de médio e longo prazo.

Nesse sentido solicitamos que até ao dia 20 de Janeiro de 2006 nos sejam apresentadas propostas relativas aos pontos 1. e 2. seguintes:

1.   Cotação (reportada às condições de mercado às 10h00 T.M.G. de dia 17 de Janeiro de 2006) para os produtos derivados abaixo indicados os quais serão associados a financiamentos com as características descritas no ponto 3. Infra:
- IRS.
- Collar (sem custo) (Compra de um CAP sobre a Euribor com valor a cotar; Venda de um Floor a 2,75%).
- Collar KOO (sem custo) (Compra de um CAP sobre a Euribor com valor a cotar e com Barreira Knock Out a 6%; Venda de um Floor a 2,50%).

2. Além da cotação dos produtos derivados financeiros mencionados no ponto anterior, convidamos a V/ Instituição a apresentar não mais de duas estruturas alternativas que, no V/ entender, melhor compatibilizem os objectivos supra com as características essenciais das principais receitas do Orçamento da RAM.

3. As operações de financiamento que estão a ser objecto de cobertura têm as características tipo abaixo descritas:
A. Financiamento contraído directamente pela Região:
(…)
B. Financiamento contraído por uma Entidade com capitais exclusivamente públicos, com aval da Região:
(…)
A Região contratou o Banco BPI para a assessorar na selecção e avaliação das operações financeiras objecto do presente convite a adoptar, bem como no respectivo processo de contratação.
(…)
Gostaríamos ainda de salientar que:
(…)
. As operações financeiras a contratar serão suportadas pelos contratos ISDA em anexo, os quais deverão ser previamente aceites pela V/ instituição, em declarações cujos modelos se anexam, as quais deverão ser juntas às propostas a apresentar, como condição de participação nas operações financeiras;
. O Banco ... deverá ser informado de todos os aspectos relativos a estas operações;
(…)
A Região reserva-se o direito de não adjudicar as presentes operações financeiras ou de as adjudicar, no todo ou em parte, a um ou mais proponentes, e, ainda, de negociar as condições das mesmas.
Ficamos naturalmente à disposição de V. Exas para a prestação de quaisquer esclarecimentos adicionais considerados necessários ou convenientes, através dos contactos acima mencionados. Solicitamos que os pedidos de esclarecimento sejam endereçados por escrito a ambas as entidades.
(…)».

4 - Em 08/03/2006 o Secretário Regional do Plano e Finanças lavrou Despacho, onde se lê, além do mais:
«Considerando o aval da Região concedido às operações de financiamento contraídas por entidades de capitais exclusivamente públicos:
(…)
. P... SA.
(…)
Considerando que a contratação das operações de cobertura de risco da taxa de juro em questão, por serem acessórias aos financiamentos inicialmente avalizados, não terão influência directa no financiamento, e por isso não desvirtuarão os pressupostos que levaram à autorização do aval nem colidirão com a actividade necessária ou conveniente à prossecução do objecto de todas aquelas entidades, e contribuirão para a correcção do risco decorrente da excessiva exposição da dívida representada pelos empréstimos em questão a subidas de taxas de juro, concorrendo para diversificação do seu perfil;
Considerando o parecer legal emitido pela sociedade de advogados Abreu, Cardigos & Associados, datado de 23 de Dezembro de 2005, no qual se reconhece capacidade na celebração, por parte daquelas entidades, de operações financeiras de cobertura de risco de taxa de juro.

Assim,
Autorizo a contracção de operações financeiras de cobertura de risco de taxa de juro por parte das entidades acima especificadas, relativamente aos empréstimos cujo aval foi tornado extensível a estas operações, desde que as mesmas verifiquem os seguintes pressupostos:
a) (…).
b) Se materializem em produtos de cobertura de taxa de juro sem risco ou com risco limitado incorporado, como sejam IRS, Swap convertível em Cap, Collar e Collar KO.» (doc. 5 de fls. 576/577 junto com a contestação).
5 - O R., através de escritos datados de 13/01/2006, comunicou à Região Autónoma da Madeira /Governo Regional/Secretaria Regional do Plano e Finanças/Direcção Regional de Planeamento e Finanças bem como ao Banco ..., o que consta nos docs 6 e 7 (de fls. 578-585) juntos com a contestação onde se lê, além do mais:
«Referência/Assunto: Operação Integrada de Gestão da Dívida Directa e Indirecta da Região Autónoma da Madeira. Convite para a apresentação de propostas de cobertura.

Exmos Senhores
A carta convite que nos foi endereçada com a referência supra, suscitou-nos algumas dúvidas/comentários que gostaríamos de ver esclarecidos antes da data limite imposta para a apresentação de propostas (20 de Janeiro de 2006) e que têm a ver exclusivamente com o teor das minutas dos contratos ISDA apresentados em formato “Draft”.
(…)
Comentários à proposta de Multicurrency ISDA Master Agreement com as entidades madeirenses de capitais públicos (“Entidades”).
Quanto ao teor da proposta de “Shedule to de Master Agreement” por vós apresentada para as entidades madeirenses de capitais públicos (“Entidades”) aproveitamos também para adiantar como questões que gostaríamos de esclarecer:
(…)».
6-Por e-mail de 18/01/2006 o R. comunicou ao Governo Regional/Secretaria Regional do Plano e Finanças/Direcção Regional de Planeamento e Finanças o que consta no doc. 8 (de fls. 586) junto com a contestação onde se lê, além do mais:
«(…)
Na sequência do Vosso Ofício Circular com o assunto em referência (… de 06/01/2006 e Proc. 4.2.6.P1) (…) junto anexamos propostas para gestão de risco de taxa de juro dos empréstimos referenciados no referido ofício circular.
(…).
Anexo:
(…)
Aceitação de ISDA.pdf – Termos de aceitação do ISDA proposto
Propostas de Gestão de Risco.pdf -.(…)».
7 - No Anexo a esse e-mail que consta de fls. 587, datado de 17/01/2006, lê-se, além do mais:
«Modelo de aceitação da minuta de Contrato 1992 Multicurrency ISDA Master Agreement
(Anexo à proposta com a Refª RAM060117 apresentada por Banco Santander Totta, SA
17 de Janeiro de 2006
Em anexo à proposta acima identificada para a realização de operações financeiras com a(s) entidades madeirenses de capitais públicos (“Entidades”) e caso venhamos a contratar quaisquer operações financeiras com qualquer uma das Entidades, pela presente declaramos que desde que aceites e/ou esclarecidas as nossas dúvidas apresentadas por nossa carta de 13 de Janeiro de 2006, aceitaremos celebrar um contrato 1992 Multicurrency ISDA Master Agreement e respectiva Shedule com o teor da minuta junta pela Região Autónoma da Madeira, na carta convite que nos foi endereçada, ao abrigo do qual nos comprometemos a celebrar essas mesmas operações financeiras.».
8 - Por escrito datado de 24/03/2006, a Região Autónoma da Madeira/Governo Regional/Secretaria Regional do Plano e Finanças/Direcção Regional de Planeamento e Finanças comunicou ao R. o que consta no documento 10 (fls. 614-617) junto com a contestação, onde se lê, além do mais:
«Assunto: Operação Integrada de Gestão da Dívida Directa e Indirecta da Região Autónoma da Madeira – 2ª Fase
Convite para a apresentação de propostas de cobertura
No âmbito do n/ofício-circular ref. Nº 43/2006, de 6 de Janeiro e das conversações posteriormente havidas, o Governo Regional da Madeira através da Secretaria Regional do Plano e Finanças tem o prazer de comunicar que a V/Instituição foi seleccionada para a cotação de operações financeiras no âmbito da gestão da Dívida Pública Regional (…) que abrange empréstimos contraídos directamente pela Região Autónoma da Madeira (“Região”) ou por entidades com capitais exclusivamente públicos (“Entidades”).
(…)
Tratar-se-á de um processo competitivo, sendo a operação atribuída ao Banco que oferecer o preço mais vantajoso.
As operações financeiras a realizar serão suportadas pelos contratos ISDA enviados em carta anteriormente remetida a V. Exas, os quais foram aceites pela V/ Instituição, em modelos que vos foram oportunamente remetidos. Estas constituíam condição prévia para a participação nas operações financeiras objecto deste convite.

Para além de ter sido estendido o Aval da Região às operações de cobertura em causa, foram atendidas e incorporadas no contrato ISDA as sugestões seguintes:
(…)
Permitimo-nos recordar que se mantém inalteradas as demais condições do convite originalmente remetido à Vossa instituição, ou seja:
(…).
. O Banco ... deverá ser informado de todos os aspectos relativos a estas operações;
(…)
Em anexo enviamos a informação relevante, nomeadamente:
(…)
. As características das operações a cotar
(…)
A Região reserva-se o direito de não adjudicar as presentes operações financeiras ou de as adjudicar, no todo ou em parte, a um ou mais proponentes, e, ainda, de negociar as condições das mesmas.
Ficamos naturalmente à disposição de V. Exas para a prestação de quaisquer esclarecimentos adicionais considerados necessários ou convenientes, através dos contactos acima mencionados. Solicitamos que os pedidos de esclarecimento sejam endereçados por escrito a ambas as entidades.
(…)».
9 - Foi assinado pela A., Ponta do Oeste - Sociedade de Promoção e Desenvolvimento da Zona Oeste da Madeira, SA em 08/08/2007 e pelo R., Banco Santander Totta Sa, em 13/08/2007, o escrito cuja cópia consta como doc. 1 (de fls. 29 v. -37) junto com a p.i., onde se lê, além do mais:
«(Multicurrency –Cross Border)
I...
Master Agreement
dated of 13 of June 2006
between
S...
and
Banco ...
have entered and/or anticipate into one or more transactions (each a “Transaction”) that are or will be governed by this Master Agreement, wich includes the schedule (the “Schedule”), and the documents and and other confirming evidence (each a “Confirmation”) exchanged between the parties confirming those Transactions.
Accordingly, the parties agree as follows:
1. Interpretation
(a)Definitions. The terms defined in Section14 and in the Schedule will have the meanings therein specified for the purpose of this Master Agreement.
(b) (…)
(c) Single Agreement. All Transactions are enter into reliance on the fact that this Master Agreement and all Confirmations form a single agreement between the parties (collectively refered to as this “Agreement”), and the parties would not otherwise enter into any Transations.
(…)
9. Miscellaneous
(a) Entire Agreement. This Agreement constitutes the entire agreement and understanding of the parties with respect to this subject matter and supersedes all oral, communication and prior writings with respect thereto.
(b)Amendments. No amendment, modification or waiver in respect of this Agreement will be effective unless in writing (including writing evidence by a facsimile transmission) and executed by each of the parties or confirmed by an exchange of telexes or electronic messages on an electronic messaging system.
(…)
10. Offices; Multibranch Parties
(a) If Section 10 (a) is specified in the Schedule as applying, each party that enters into a Transaction through an Office other than its head or home office represents to the other party that, notwithstanding the place of booking office or jurisdiction of incorporation or organization of such party, the obligations of such party are the same as if it had entered into the Transaction through its head or home office. This representation will be deemed to be repeated by such party on each date on which a Transaction is entered into.
(b) Neither party may change the Office trough wich it makes and receives payments or deliveries for the purpose of a Transaction without the prior written consent of the other party.
(c) If a party is specified as a Multibranch Party in the Schedule, such Multibranch Party may make and receive payments or deliveries with respect to a Transaction will be specified in the relevant Confirmation.
(…)
12. Notices.
(a) Effectiveness. Any notice or other communication in respect of this Agreement may be given in any manner forth below (…) to the address (…)
13. Governing Law and Jurisdiction.
(a) Governing Law. This Agreement will be governed by and construed in accordance with the law specified in the Schedule.
(b) Jurisdiction. With respect to any suit, action or proceeding relating to this Agreement (“Proceedings”), each party irrevocably: -
(i) submits to the jurisdiction of the English courts, if this Agreement is expressed to be governed by English law, or to non-exclusive jurisdictions of the courts of the State of New York and the United States District Court located in the Borough of Manhattan in New York City, if this Agreement is expressed to be governed by the laws of the State of New York; and
 (ii) waives any objections which it may have at any time to the laying of venue of any Proceedings brought in any inconvenient forum and further waives the right to object, with respect to such Proceedings  in any one or more jurisdictions preclude the bringing of Proceedings in any jurisdiction.
(…)
(c) Service of Process. Each Party irrevocably appoints the Process Agent (if any) specified opposite its name in the Shedule to receive, for it and on its behalf, service of process in any Proceedings. (…)
14. Definitions
(…)
As used this Agreement
“Affiliate” means, subject to the Schedule, in relation to any person, any entity controlled, directly or indirectly, by the person, any entity that controls, directly or indirectly, the person or any entity directly or indirectly under common control with the person. Fort this purpose, “control” of any entity or person means ownership of a majority of the voting power of the entity or person.
(…)
In Witness Whereof the parties have executed this document on the respective dates specified below effect from the first page of this document».
10 - Foi assinado pela A., P... e pelo R., Banco ... em 13/08/2007, o escrito cuja cópia faz parte do doc. 1 (a fls. 38-42) junto com a p.i., onde se lê, além do mais:
«(Multicurrency –Cross Border)
                        SCHEDULE              
                           to the
            Master Agreement
      Dated as of 13 June 2006
                 between    
S...
a company organized under the laws of Portugal
with head office at Avenida Zarco (…) Portugal
                                   as
                        (“Party A”)
                                   and
Banco ...
a bank organized under the laws of Portugal
with office at (…) Portugal
                                   as
                        (“Party” B”)
(…)
Part 4: Miscellaneous
(a)  Address for Notices. For the purpose of Section 12 (a) of this Agreement:
Address for notices or communications to the Party A:
    Avenida Zarco (…)
    Madeira Portugal
(…)
     For all purposes.

    Address for notices or communications to Party B
    Av. Eng Duarte Pacheco (…)
        (…) Lisboa – Portugal
        (…)
(b) Process Agent: For the purpose of Section 13 (c):
           Party A appoints as its Process Agent:
  S...
Av Zarco (…)
Madeira Portugal

Party B appoints as its Process Agent
         Banco ...
         18 King William Street
         London
(...)
United Kingdom
         Attention: Office Manager
(c) Offices. The provisions of Section 10 (a) will apply to this Agreement.
(d) Multibranch Party. For the Sectio 10 (c):
Party A is not a Multibranch Party.
Party B is a Mutibranch Party and may enter into transactions through Party B’s London or Luxembourg branches.
(…)
(h) Governing Law. This Agreement will be governed by and construed in accordance with the laws of England.
(…)
Part 5: Other Provisions
(…)
Additional Representations. Section 3 is hereby amended by adding the following additional subsections (), (h), (i):
(…).
The parties executing this Schedule have executed the Agreement and have agreed as to the contents of this Schedule.».
11–Em 11/05/2006 a A. celebrou com o R. uma transacção financeira – swap - com um valor nocional inicial de 60.971.000 €, documentada na «Confirmation» (doc. 12 junto com a p.i. a fls. 160-v-162 e Anexo I a fls. 163) onde consta, além do mais:
«Interest Rate Collar Transaction
Our reference: 995786/1063042
S... (…)
(…)
Dear Sirs
The purpose of this letter agreement (this “Confirmation”) is to confirm  the terms and conditions of the Swap Transaction entered between BST – Banco Santander Totta, SA (“Party A”) and S... (“Party B”) on the Trade specified below.
The definitions and provisions contained in the ISDA Definitions, as published by the International Swaps and Derivates Associations, Inc., are incorporated into this Confirmation. (…)
1. This Confirmation supplements, forms part of, and is subject to, the ISDA master Agreement dated as of 13th June, 2006, amended and supplemented from time to time (the “Agreement”), between us. All provisons contained in the Agreement govern this Confirmation except as expressly modified below.(…).
(…)
6. Additional Definitions and Provisions
(…)
Governing Law. This Transaction will be governed by and construed in accordance with the English law.
Jurisdiction. With respect to any suit, action or proceedings relating to this Transactions (“Proceedings”) each party irrevocably:
(i) Submits to the jurisdiction of the English courts; and
(ii) waives any objection which it may have at any time do the laying of venue of any Proceedings brought in any such court, wives any claim that such Proceedings have been brought in an inconvenient forum and further waives the right to object, with respect to such Proceedings, that such court does not have any jurisdiction over such party.
(…)».
12–Dos referidos financiamentos, o financiamento que está subjacente a este swap de 2006, é o que foi obtido junto da Z...., mencionado em 1.
13–O swap de 2006 foi reestruturado em 2009, através da assinatura pelas partes da «Confirmation» datada de 14/12/2009 (doc. 13 de fls. 163 v.- 165 e Anexo I e II de fls. 166 e v.)
14–Em 09/06/2008 a A. celebrou com o R. uma transacção financeira – swap - com um valor nocional inicial de 36.00.000 € documentada na «Confirmation» (doc. 8 junto com a p.i. a fls. 139-141 e Anexo I a fls. 142) onde consta, além do mais:
«Euribor Range Swap Transaction
Our reference: 2033576
S... (…)
(…)
Dear Sirs
The purpose of this letter agreement (this “Confirmation”) is to confirm  the terms and conditions of the Swap Transaction entered between Banco ... (“Party A”) and S... (“Party B”) on the Trade specified below.
The definitions and provisions contained in the ISDA Definitions, as published by the International Swaps and Derivates Associations, Inc., are incorporated into this Confirmation. (…)
1. This Confirmation supplements, forms part of, and is subject to, the ISDA master Agreement dated as of 13th June, 2006, amended and supplemented from time to time (the “Agreement”), between us. All provisions contained in the Agreement govern this Confirmation except as expressly modified below.
Each party is hereby advised, and such party acknowledges, that the other party has engaged in (or refrained from engaging in financial transaction and has taken other material actions in reliance upon the parties entry into this Transaction to which this Confirmation relates on the terms and conditions set forth below.
2. The terms of the particular Swap Transaction to which this Confirmation relates are as follows:
(…)
7. Additional Definitions and Provisions
(…)
Governing law. This Transaction will be governed by and construed in accordance with the English law.
Jurisdiction. With respect to any suit, action or proceedings relating to this Transaction (“Proceedings”), each party irrevocably:
(i) Submits to the jurisdiction of the English courts; and
(ii) waives any objection which it may have at any time do the laying of venue of any Proceedings brought in any such court, wives any claim that such Proceedings have been brought in an inconvenient forum and further waives the right to object, with respect to such Proceedings, that such court does not have any jurisdiction over such party.
(…)».
15–Dos referidos financiamentos, o financiamento que está subjacente a este swap de 2008, é o que foi obtido junto do Banco ... e do Banca ..., mencionado em 2.
16–O swap de 2008 foi reestruturado em 2011 através da assinatura pelas partes da Confirmation datada de 04/05/2011 (doc. 9 de fls. 143 v.).

*

Consigna-se que não se mostrou necessário ordenar a junção de tradução - ao abrigo do disposto no art. 134º nº 1 do NCPC - dos documentos escritos em língua inglesa que parcialmente reproduzimos pois o seu teor é compreensível para a apreciação das questões concretamente em causa neste acórdão, até porque na contestação o apelado reproduziu diverso clausulado dos mesmos em língua portuguesa e tal tradução não foi colocada em crise pela parte contrária, além de que com a contra-alegação deste recurso foi junta uma decisão de 1ª instância que reproduz várias cláusulas traduzidas para língua portuguesa que se evidencia serem iguais às que nos reportamos neste acórdão, sendo certo que os pareceres jurídicos juntos por ambas as partes também contribuem para a percepção do teor dos aludidos documentos.

*

C) O Direito
No Ac do STJ de 11/02/2015 (Proc. 877/12.7TVLSB.L1-A.S1, conhecendo-se da questão de saber se as partes estabeleceram validamente, em contratos de swap, um pacto privativo de jurisdição por via do qual resulta a incompetência internacional do tribunal português, explicou-se: «Os swap são um tipo de instrumento financeiro derivado também designado por contrato “de balcão” ou de negociação OTC (Over de Couter), nominado, previsto no art. 2º nº 1, al e) do Código de Valores Mobiliários (CVM), sem que o defina.

O swap, literalmente troca de uma coisa por outra, no âmbito contratual, nasceu como forma de responder à instabilidade dos mercados de câmbios e de taxas de juro, como um modo de aproveitamento recíproco da acessibilidade ou das vantagens de duas empresas que actuam em mercados financeiros diferentes, aproveitando o desenvolvimento tecnológico, e, num momento inicial, traduzia o contrato pelo qual as pessoas se vinculavam reciprocamente a pagar, em datas futuras, o montante das obrigações devidas pela contraparte perante terceiros, por efeitos de contratos de mútuo (ou de outros contratos financeiros) expressos em divisas diferentes (currency swap) ou com modalidades diferenciadas de cálculo das taxas de juro – v.g., taxa de juro fixa e taxa de juro variável (interest rate swap) – sendo o cumprimento das obrigações emergentes do contrato swap autónomas relativamente aos contratos com terceiros.
(…)
A estrutura básica de um swap de taxas de juro abrange três corpos: 1) O ISDA Master Agreement, acordo básico idêntico em todos eles, correspondente a um esquema internacional estandartizado; 2) O Master Agreement Schedule, anexo ao acordo base que confere uma certa personalização ao ISDA, fixando deste as cláusulas aplicáveis em cada caso; 3) A Confirmation, fixa os pontos concretos de cada contrato.

A negociação dos contratos de swap é feita tipicamente através do uso de documentação estandartizada.

Se inicialmente as instituições financeiras começaram a mediar a relação entre as partes do swap, com a função de angariadora e de as colocar em contacto, proporcionando o chamado “match” ou “acasalamento”, posteriormente acabaram por nele intervir tornando-se contraparte de cada uma das partes (intermediary), assumindo o risco de crédito conduzindo à celebração de dois contratos de swap, juridicamente independentes, mas economicamente ligados, ou contraparte pura em swap não simétrico (counterparty).

(…) Determinadas vezes, quando as partes prevêem celebrar, entre si, no futuro, vários contratos de swap, concluem previamente um contrato quadro – master agreement -, em que instituem um conjunto de cláusulas destinadas a regulamentar cada um dos contratos individuais de swap.

Com maior detalhe, a utilização, no âmbito dos contratos de swap, de um tipo de contrato – master agreement - traduz-se na definição de um regime geral para as sucessivas transacções acordadas, mediante a documentação global adequada dos actos praticados, assinando as partes o master agreement onde ficam coligidas as condições gerais das operações de swap que ocorram, previsivelmente, no futuro. Esse documento inicia-se com um preâmbulo, em que são descritas as motivações das partes, a que se segue a compilação de um conjunto de definições e, subsequentemente, todo o clausulado do contrato.

Como diz Calvão da Silva: “No fundo, a confirmação escrita, contendo os termos e condições do contrato (de swap) antes concluído e a que as partes se quiseram vincular desde logo, tem em vista apenas a consolidação (e não substituição) desse contrato anterior ou contemporâneo validamente celebrado, sendo formalidade ad probationem (e não ad substantiam) importantíssima em caso de o contrato ter sido oralmente concluído. Numa palavra: na arquitectura da ISDA, sob o mesmo “Master Agreement” a que as partes aderem podem, concluir-se várias transacções, cada uma documentada em “Confirmação” distinta.».

De entre os vários master agreements existentes destaca-se o ISDA Code que serviu para coligir as práticas mais generalizadas do mercado financeiro, bem como a interpretação a dar a uma série de termos difundidos entre os operadores, e que – pese embora não possuir força de lei ou de regulamento (trata-se de lex mercatoria) -, destina-se a regular o conjunto de relações estabelecidas entre partes signatárias, no domínio dos swaps, sendo à sua imagem e semelhança elaborados os contratos-tipo usados pelos bancos nacionais nas operações a realizar com os seus clientes.».

No caso concreto foram celebrados dois contratos de swap ao abrigo do ISDA Master Agreement datado de 13/06/2006 e assinado pela apelante e pelo apelado, tendo sido convencionado um pacto de jurisdição que atribuiu aos tribunais ingleses a competência para dirimir os litígios respeitantes a esses contratos.

O art. 96º al a) do NCPC estabelece que determina a incompetência absoluta a infracção das regras de competência internacional. Por sua vez, o art. 97º nº 1 estatui que «A incompetência absoluta pode ser arguida pelas partes e, exceto se decorrer da violação de pacto privativo de jurisdição, deve ser suscitada oficiosamente pelo tribunal enquanto não houver sentença com trânsito em julgado proferida sobre o fundo da causa».

Portanto, a violação de pacto privativo de jurisdição, embora determine a incompetência absoluta do tribunal, não é de conhecimento oficioso no âmbito da legislação processual civil nacional, e nos presentes autos foi invocada pelo R..
O art. 94º diz-nos:
«1–As partes podem convencionar qual a jurisdição competente para dirimir um litígio determinado, ou os litígios eventualmente decorrentes de certa relação jurídica, contanto que a relação controvertida tenha conexão com mais de uma ordem jurídica.
2–A designação convencional pode envolver a atribuição de competência exclusiva ou meramente alternativa com a dos tribunais portugueses, quando esta exista, presumindo-se que seja exclusiva em caso de dúvida.
3–A eleição do foro só é válida quando se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:
a) Dizer respeito a um litígio sobre direitos disponíveis;
b) Ser aceite pela lei do tribunal designado;
c) Ser justificada por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas, desde que não envolva inconveniente graves para a outra;
d) Não recair sobre matéria da exclusiva responsabilidade dos tribunais portugueses;
e) Resultar de acordo escrito ou confirmado por escrito, devendo nele fazer-se menção expressa da jurisdição competente.
4–Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se reduzido a escrito o acordo constante de documento assinado pelas partes, ou o emergente de troca de cartas, telex, telegramas ou outros meios de comunicação de que fique prova escrita, que tais documentos contenham directamente o acordo quer tais instrumentos contenham directamente o acordo quer deles conste cláusula de remissão para algum documento em que ele esteja contido.».

Perante este normativo, não é válido um pacto privativo de jurisdição se a relação controvertida não tiver conexão com mais de uma ordem jurídica e se o pacto não se mostrar justificado por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas se neste último caso envolver inconveniente grave para a outra.

Revertendo ao caso dos autos, não resulta dos documentos onde está corporizado, que o pacto privativo de jurisdição assente num interesse sério de ambas as partes ou só de uma delas, o que implica, desde logo, a sua invalidade à luz do art. 94º do NCPC.

Assim, cabe agora ponderar se esse pacto é válido considerando o direito da competência internacional da União Europeia, dada a sua prevalência no cotejo com as regras internas plasmadas no art. 62º do NCPC, pois o art. 59º deste diploma dispõe: «Sem prejuízo do que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigo 62º e 63º ou quando as partes lhes tenham atribuído competência nos termos do artigo 94º».

Voltamos, então, a citar o mencionado aresto do STJ: «Recorde-se, a este respeito, o princípio do primado do direito da União Europeia, acolhido, directamente, além do mais, pelo art. 8º nº 4 da Constituição da República Portuguesa (CRP) - “As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático” – ou mesmo por remissão do actual art. 59º do NCPC (…).

Nesta sede, importa considerar a aplicabilidade do Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho, de 22/12/2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial – que veio substituir, entre os Estados-Membros, a Convenção de Bruxelas de 1968 -, directamente aplicável a todos os Estados-Membros (excluindo a Dinamarca), em conformidade com o art. 249º do Tratado que instituiu a Comunidade Europeia (TCE) e com o actual art. 288º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) (cf., ainda, os arts 1º e 68º do Regulamento.
(…)».
No caso apreciado nesse aresto concluiu-se estar demonstrada «a ocorrência cumulativa dos diversos âmbitos - material, temporal, territorial e subjectivo – de aplicação do Regulamento nº 44/2001», explicando-se: «com efeito:
-o âmbito de aplicação material do Regulamento está preenchido, pois trata-se de matéria civil e não se encontra excluída por nenhuma das alíneas do art. 1º nº 2;
-o âmbito temporal também está atestado, pois a acção foi intentada depois de 01/03/2002 (art. 66º nº 1 e 76º);
-o âmbito territorial também se encontra verificado, pois a acção foi intentada em Portugal, que é um Estado-Membro da UE (art. 1º nº3);
-o âmbito de aplicação subjectivo está completado, pois o réu tem domicílio num Estado-Membro, em Inglaterra (art. 4º nº 1).
Destarte, sendo o Regulamento (CE) aplicável nos Estados-Membros, entre os quais se incluem Portugal e a Inglaterra, reforça-se, ter-se-à de atender à prevalência das suas normas sobre as regras de direito interno, em especial as que regulam a competência internacional (…)
(…)
A regra de ouro do Regulamento nº 44/2001 é de que o mesmo só é aplicável quando o demandado tiver domicílio ou sede no território de um Estado-Membro vinculado por esse Regulamento (art. 4º nº 1), sendo certo que, no que respeita às pessoas colectivas, consideram-se, em princípio, domiciliadas no local da sua sede social, da sua administração central ou do seu estabelecimento principal (art. 60º). É assim irrelevante, em sede de Regulamento, a localização das sucursais ou filiais, diferentemente do que ocorre no direito pátrio (cf a esse propósito, o art. 7º nº 2 do CPC revogado e o actual art. 13º nº 2 do NCPC).

Porém, o art. 23º do Regulamento nº 44/2001, que aqui importa observar e aplicar, compõe a disposição fundamental para a compreensão do papel da autonomia privada na individualização da jurisdição competente para resolver o litígio, possibilitando às partes a designação do tribunal competente para julgar um determinado pleito que as contrapõe, quando esteja preenchido o âmbito de aplicação do dito Regulamento, nos moldes a que anteriormente se aludiu, como ocorre a situação vertente.

O art. 23º do Regulamento nº 44/2001, constante da Secção 7, epigrafada “Extensão de competência” estabelece nos seus nº 1 e 2:
“1. Se as partes, das quais pelo menos uma se encontre domiciliada no território de um Estado-Membro, tiverem convencionado que um tribunal ou os tribunais de um Estado-Membro têm competência para decidir quaisquer litígios que tenham surgido ou que possam surgir de uma determinada relação jurídica, esse tribunal ou esses tribunais terão competência. Essa competência será exclusiva a menos que as partes convencionem em contrário. Este pacto atributivo de jurisdição deve ser celebrado:
a) Por escrito ou verbalmente com confirmação escrita:
b) Em conformidade com os usos que as partes estabeleceram entre si; ou
c) No comércio internacional, em conformidade com os usos que as partes conheçam ou devam conhecer e que, em tal comércio, sejam completamente conhecidos e regularmente observados pelas partes em contratos do mesmo tipo, no ramo comercial considerado.
2. Qualquer comunicação por via electrónica que permita um registo duradouro do pacto equivale à «forma escrita».
Podem, assim, elencar-se três pressupostos, cumulativos, de admissibilidade e validade do pacto de jurisdição; a saber, que:
- pelo menos uma das partes se encontre domiciliada no território de um Estado-Membro;
- o pacto atribua competência a um tribunal ou aos tribunais de um Estado-Membro; e,
- se trate de uma situação jurídica internacional.
O momento que releva para aferir o domicílio das partes é o do momento da conclusão da cláusula atributiva de jurisdição.
(…)
O art. 23º estabelece, segundo Dário Moura Vicente, um regime claramente mais liberal do que aquele que vigora actualmente no direito português, o que assoma, de modo cristalino, do seu cotejo com o art. 99º do CPC revogado e mesmo com o actual art. 94º do NCPC.
(…)
Urge enfatizar que o Regulamento nº 44/2001 não exige qualquer solenidade especial para a atribuição de competência judiciária, procurando fundamentalmente conciliar a autonomia privada e a celeridade que é cada vez mais premente no comércio internacional, sendo ostensivo que o disposto no art. 23º nºs 1 e 2, prevalece, pelos motivos já expostos, sobre as regas de forma de direito interno que fixam requisitos formais mais exigentes para os pactos de jurisdição.
(…)
Considera-se, assim, que existe, ainda que por via de remissão, incorporação e aceitação do Acordo ISDA, na concreta negociação das partes, uma aceitação escrita, clara e precisa, de uma cláusula geral atributiva de competência exclusiva aos Tribunais Ingleses, encontrando-se preenchidos os pressupostos do art. 23º nº 1 al. a) do Regulamento nº 44/2001.».

Também se explanou nesse aresto que «o pacto de jurisdição privativo, subsumível ao art. 23º do Regulamento nº 44/2001, ao atribuir competência exclusiva ao tribunal escolhido pelas partes – o inglês, in casu -, e afastar as regras dos art. 2º e segs desse Regulamento, não só permite que o tribunal conheça oficiosamente da preterição do pacto – na eventualidade do requerido ser domiciliado no território de um Estado-Membro e não comparecer em juízo, de harmonia com a regra do art. 25º, não relevando se foram eventualmente respeitadas as competências legais, que foram afastadas pela vontade das partes -da mesma forma que, evidentemente, possibilita aquela apreciação judicial, mediante arguição da parte interessada que seja prejudicada pela preterição de tal pacto, como ocorre na circunstância».

Retornando ao caso dos presentes autos, mostra-se observado o requisito formal plasmado no art. 23º nº 1 al a) do Regulamento (CE) nº 44/2001.

Porém, temos de apurar se este Regulamento é aplicável, o que depende de estarmos perante uma situação jurídica transnacional, ou seja, com elementos de estraneidade conforme o entendimento expresso no aresto do STJ e que acolhemos. Vejam-se, por exemplo, os «considerandos» ( 8), (11) e (12) do Regulamento:
«(8) Os litígios abrangidos pelo presente regulamento devem ter conexão com o território dos Estados-Membros que este vincula. Devem, portanto, aplicar-se, em princípio, as regras comuns em matéria de competência sempre que o requerido esteja domiciliado num desses Estados-Membros»
«(11) As regras de competência devem apresentar um elevado grau de certeza jurídica e devem articular-se em torno do princípio de que em geral a competência tem por base o domicílio do requerido e que tal competência deve estar sempre disponível, excepto em alguns casos bem determinados em que a matéria em litígio ou a autonomia das partes justificam outro critério de conexão. No respeitante às pessoas colectivas, o domicílio deve ser definido de forma autónoma, de modo a aumentar a transparência das regras comuns e evitar os conflitos de jurisdição.».
«(12) O foro do domicílio do requerido deve ser completado pelos foros alternativos permitidos em razão do vínculo estreito entre a jurisdição e o litígio ou com vista a facilitar uma boa administração da justiça».

Embora desnecessário, perante o Regulamento (CE) nº 44/2001, que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, é exigível que se trate de uma situação jurídica internacional (neste sentido, cfr o citado Ac do STJ).

A apelante e o apelado são duas sociedades com sede em Portugal. Os contratos de swap foram celebrados em Portugal. Embora subjacentes a esses contratos estejam dois contratos de financiamento em que foram partes sociedades estrangeiras – Zarco Finance e Banca OPI, Sp.A, é de considerar que «Na prática, um instrumento financeiro derivado pode ser utilizado sem ligação a um contrato nominado subjacente, uma vez que o próprio contrato de “swap” se basta a si próprio», ou seja, o contrato de swap «basta-se a si próprio, tendo natureza financeira e não é complementar de outro (como v.g. mútuo ou algum financiamento) gozando de abstracção pura e absoluta)» (cfr Ac do STJ de 11/02/2015 – Proc. 309/11.8TVLSB.L1.S1 – in www.dgsi.pt).

Portanto, os contratos de financiamento mencionados nestes autos não têm qualquer relevo para se aferir da existência do elemento de estraneidade nos contratos de swap. Também não lhes confere a natureza de contratos internacionais a redacção dos presentes contratos de swap em língua inglesa nem a mera utilização do ISDA Master Agreement, pois este pode destinar-se a regular o conjunto das relações estabelecidas entre as partes signatárias no domínio dos swaps em contratos de natureza puramente interna.

Sucede que no caso concreto A. e R. aceitaram que o R. actue como uma Multybranch Party, podendo realizar transacções através das suas filiais em Londres e no Luxemburgo, o que significa que acordaram que o R. pode realizar operações financeiras no mercado internacional no âmbito da sua actuação como parte nos contratos de swap.

Assim, é de concluir que estes concretos contratos de swap têm conexão com mais do que uma ordem jurídica, pelo que está demonstrada a internacionalidade da relação jurídica e preenchidos estão os pressupostos para a aplicação do art. 23º nº 1 do Regulamento (CE) nº 44/2001.

*

Importa então apreciar se este pacto privativo de jurisdição é inadmissível à luz da alínea g) do art. 19º do DL 446/85 de 25/10.
Dispõe esse normativo que são proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, as cláusulas contratuais gerais que «Estabeleçam um foro competente que envolva graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra o justifiquem».

Ora, foi a A. que impôs a utilização dos contratos ISDA como claramente resulta do escrito elaborado pelo Governo Regional da Madeira, datado de 06/01/2006 (Proc. 4.2.6 P1) doc. 1 (de fls. 557-561), através do qual foi comunicado ao R., conforme acima se transcreveu, que «As operações financeiras a contratar serão suportadas pelos contratos ISDA em anexo, os quais deverão ser previamente aceites pela V/ instituição, em declarações cujos modelos se anexam, as quais deverão ser juntas às propostas a apresentar, como condição de participação nas operações financeira».

Por outro lado, como se refere no Ac do STJ de11/02/2015 (Proc. 877/12.7TVLSB.L1-A.S1), «A orientação do TJUE é, pois, categórica e inequívoca no sentido dos requisitos de validade do pacto de jurisdição só serem aqueles que estão vertidos no art. 23º do Regulamento nº 44/2001.
(…)
Destarte, é irrelevante para esse efeito, fazer qualquer tipo de apreciação da validade do pacto de jurisdição à luz do direito interno do respectivo Estado-Membro.

E, assim sendo, para que a escolha do tribunal seja válida, é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado.»

De notar, ainda, que a A. é uma entidade de natureza empresarial e não um mero consumidor individual, pelo que e mais uma vez acolhendo o que vem exposto neste aresto do STJ «nessa circunstância, inexiste qualquer disposição de Direito da União Europeia que deva ser respeitada, ao abrigo do art. 67º do Regulamento, pelo que a validade do pacto de jurisdição é aferida exclusivamente pelo disposto no art. 23º do Regulamento.
(…)
Em resumo, a validade do pacto de jurisdição constante de uma cláusula contratual geral integrada num contrato celebrado entre um empresário ou entidade equiparada é analisada, exclusivamente, segundo o disposto no art. 23º do Regulamento nº 44/2001».

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IV - Decisão:

Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação e confirma-se a decisão recorrida.
Custas pela apelante.


Lisboa, 04 de Junho de 2015


Anabela Calafate
Tomé Ramião
José Vítor dos Santos Amaral