Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
433/17.3YHLSB.L1-6
Relator: CRISTINA NEVES
Descritores: PROPRIEDADE INTELECTUAL
VIOLAÇÃO EFECTIVA OU EMINENTE
REGISTO CONSTITUTIVO
SINAIS DISTINTIVOS DO COMÉRCIO
FUNÇÃO DISTINTIVA
FUNÇÃO PUBLICITÁRIA
USO ENGANOSO DE MARCA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/07/2018
Votação: MAIORIA COM * DEC VOT E * VOT VENC
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE / ALTERADA
Sumário: I- Até à entrada em vigor do CPI, aprovado pelo DL n.º 36/ 2003 de 05/03, a tutela cautelar dos direitos de propriedade intelectual era feita essencialmente através de providências cautelares não especificadas, nos termos dos arts. 381º, nº 1 e 387º, nº 1, do CPC, não se estabelecendo qualquer distinção entre as situações em que a lesão ainda não ocorrera (lesão iminente) e aquelas em que a lesão já efectivada, prosseguia de forma repetida ou continuada

II- Para ser decretada a providência cautelar ao abrigo do disposto no art.º 338.º-I do Código da Propriedade Industrial, basta a requerente alegar e demonstrar, sumariamente, ser titular de um direito de propriedade industrial ou de autorização para o utilizar e a sua violação efetiva ou iminente, sendo que, quando a lesão já se encontra concretizada, o decretamento das medidas cautelares não depende da apreciação da sua gravidade ou das dificuldades da sua reparação.

III- Nos termos do art.º 4.º, n.º2, do Código da Propriedade Industrial a concessão de direitos de propriedade industrial confere ao seu titular a presunção juris tantum dos requisitos da sua concessão, conferindo-se ao registo natureza constitutiva.

IV-A marca, em conjunto com outros como a insígnia e o nome do estabelecimento, constitui sinal distintivo do comércio, integrando os títulos de propriedade industrial, por esta protegidos.

V-Tem esta, como função essencial, distinguir e garantir que os produtos ou serviços se reportam a uma pessoa que assume em relação aos mesmos o ónus pelo seu uso não enganoso (função distintiva), uma função derivada de garantia indirecta de qualidade dos produtos ou serviços marcados por referência a uma origem não enganosa, e uma função complementar da função distintiva que é a de contribuir, por si mesma, para a promoção dos produtos ou serviços que assinala (função publicitária).~

VI-Sendo a marca registada em nome de diversos co-titulares, rege o disposto no artº 1405 e 1406 e segs. do C.C., no que se reporta ao exercício dos direitos de uso e administração da coisa, ou seja, que na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos proprietários é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito.

VII-Existindo acordo quanto ao uso e administração da marca comum, só nos termos deste acordo pode esta ser usada pelos seus co-titulares.

VIII-No mundo do espectáculo e da música, não existem, nem o consumidor espera que existam e co-existam, várias bandas/grupos musicais que, sob a mesma designação/marca, produzam os mesmos serviços.

IX-A constituição e actuação de uma banda composta pelos requeridos e por outros elementos, denominada “Táxi”, com novos temas e composições musicais, com actuação em espectáculos e concertos, apresentada ao público sob a marca “Táxi”, priva na prática os demais co-titulares do uso a que também têm direito.

X-Por outro lado, a constituição de uma nova banda, composta por outros elementos não titulares da marca, mas que se apresentam e actuam com essa denominação “Táxi”, aparecendo em cartazes e anúncios e recebendo os proveitos da mesma, constitui uma cedência não autorizada, nem titulada, da marca a terceiros e pode constituir um uso enganoso dessa mesma marca perante o consumidor final, que identifica os “Taxi” com a banda “Táxi”, que sempre conheceu.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO
               
FO, e RF, intentaram procedimento cautelar contra JC e RV, peticionando a condenação destes:
i. A abster-se de quaisquer actos de utilização abusiva do nome “TÁXI”, nomeadamente abstendo-se de realizar concertos ou qualquer outro tipo de performance sob essa designação, e de editar quaisquer novas obras artísticas sob a mesma designação, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 338.º-I do Código de Propriedade Industrial, bem como da alínea b) do n.º 1 do artigo 210.º-G do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos;
ii. No pagamento aos Requerentes da indemnização prevista no artigo 338.º-L do Código de Propriedade Industrial, bem como no artigo 211.º do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos.
iii. Nas custas e mais de lei, nomeadamente custas de parte.

Alegam em síntese que os quatro, Requerentes e Requeridos, formaram em 1979 o grupo musical “TÁXI”, que se veio a tornar uma das maiores bandas de rock em Portugal, que as suas obras musicais foram registadas na SPA tendo como titulares em partes iguais os quatro elementos da banda, (o que posteriormente foi alterado de forma a incluir também o autor da letra) estando, os quatro, inscritos na GDA, sendo também os quatro titulares do registo da marca nacional n.º 410487 TÁXI assinalando serviços de composição de música e produção de espectáculos.
Mais alegaram que, no seguimento de divergências entre os quatro elementos da banda, decidiram, entre todos, em 8.11.2010, extinguir a banda, ficando também acordando que a mesma apenas poderia voltar a actuar enquanto tal e sob a marca TÁXI com a intervenção e aprovação de todos os seus membros, motivo pelo qual os requeridos em 2013 constituíram uma banda designada “Os Porto” e que, em 2017, tomaram conhecimento de que os requeridos celebraram vários contratos para realização de concertos, sob a designação de “TÁXI”, sem autorização dos requerentes e apresentando-se com outros três elementos, tendo inclusive gravado e editado um single, sob a designação “TÁXI” sem a autorização dos requerentes.
Alegam que por tudo o exposto os Requeridos vêm violando os direitos protegidos dos Requerentes, quer os seus direitos de autor relativamente às obras artísticas em causa quer os seus direitos de propriedade industrial referentes à marca notória e de verdadeiro prestígio em Portugal, TÁXI.
Por último alegam que com esta actuação violam os requeridos a função distintiva, de garantia e publicitária associada à marca, criando confusão no público pelo aproveitamento da designação TÁXI e pela imagem de que “os TÁXI estão de volta”.
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Determinada a citação dos requeridos para deduzirem oposição, vieram estes invocar que não ocorre qualquer violação dos direitos dos Requerentes, continuando os mesmos a receber da SPA os direitos de autor relativos às músicas de que são co-autores e que os Requeridos continuam a tocar, não alegando qualquer utilização ou exploração abusiva dessas obras, não pedindo, em consequência, a cessação da conduta dos Requeridos relativamente à utilização/exploração de quaisquer obras protegidas pelos Direitos de Autor ou de quaisquer prestações tuteladas pelos Direitos Conexos. 
Quanto ao uso da marca nacional nominativa nº 410487 “TÁXI”, registada desde 2007, para serviços de composição de música e produção de espectáculos, solicitada pelo Requerido Rui Vasconcelos, que suportou os respectivos custos desde então, a mesma veio a ser “repartida” em 2010 em partes iguais por todos os Requerentes e Requeridos, mais considerando que na reunião de 18.11.2010, a actividade da banda ficou apenas suspensa e que, de todo o modo se tivesse ficado acordo o fim da banda, ter-se-ia de considerar que a marca regressaria à titularidade do Rui Vasconcelos
Por último alegam que a propriedade da marca por dois ou mais co-titulares é expressamente admitida pelo artigo 5º C) 3 da Convenção da União de Paris para Protecção da Propriedade Industrial, de 1883, e está sujeita ao regime da compropriedade previsto no Código Civil, com as necessárias adaptações, sendo que na falta de indicação em contrário no título constitutivo, as quotas dos comproprietários presumem-se iguais, sendo a qualquer dos comproprietários lícito servir-se da marca, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que se destina e que, inexistindo também acordo relativamente à gestão da marca, deve aplicar-se o disposto no artigo 985º do CC, por via do artigo 1407º do CC, sendo que, para deliberarem contra o uso da marca que os Requeridos têm vindo a fazer, os Requerentes haveriam de reunir, cumulativamente, a maioria dos consortes e representar, pelo menos, metade do valor total das quotas em que a marca se encontra repartida.
*
Realizou-se audiência final, gravada, sendo seguidamente proferida decisão final de cuja parte dispositiva consta:
“Pelo exposto, tudo visto e ponderado, julgo o presente procedimento cautelar improcedente.
Custas pelos Requerentes (art. 527.º do CPC)”.
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Não conformados com esta decisão, impetraram os requerentes recurso da mesma, formulando, a final, as seguintes conclusões:
“I. Salvo o devido respeito pelo Meritíssimo Juiz a quo, afigura-se ao Recorrente que a decisão final proferida se encontra ferida de nulidade consubstanciada na omissão de pronúncia sobre questão que devia ter conhecido; por outro lado, incorre em erro de julgamento porquanto a decisão final proferida não se encontra congruente com a prova produzida nos autos e, ainda, incorre em erro na aplicação do direito aos factos.
II. No que concerne à invocada nulidade da sentença recorrida, importa atentar que alegaram os Requerentes, na sua Petição Inicial, que Requerentes e Requeridos, enquanto membros originários da banda TÁXI, sempre tomaram todas as decisões relativas à “vida” da banda por unanimidade, concedendo assim um “direito de veto” a cada um dos membros (cfr. artigos 17.º, 18.º e 19.º da Petição Inicial).
III. O referido facto revela-se, por referência à causa de pedir e ao pedido formulado nestes autos, verdadeiramente essencial.
IV. O modo de funcionamento instituído dos TÁXI durante décadas (desde 1979) não é despiciendo para a boa decisão da causa, pois ao Tribunal é permitido estabelecer presunções judiciais.
V. Ora, independentemente da resposta que se vier a dar ao ponto 1. da matéria de facto dada como não provada na sentença recorrida, a resposta do Tribunal à matéria de facto referente àquele que era o procedimento instituído entre Requerentes e Requeridos para a tomada de todas as decisões relativas à banda permitir-lhe-á inferir o sentido do acordo que resultou da decisão de terminar a banda tomada em 18.11.2010 no que concerne ao uso da marca TÁXI daí em diante, ou seja, a necessidade do autorização de todos os membros para o uso da marca TÁXI por alguns deles.
VI. De facto, basta pensar que se o funcionamento da banda ao longo de décadas teve por base a decisão unânime de todos os seus membros relativamente a todos os aspectos da mesma por assim terem acordado Requerentes e Requeridos, a utilização da marca TÁXI e a actuação da banda, ou de qualquer dos seus membros, sob essa denominação estava também dependente da autorização de todos.
VII. Sobre o referido facto foi feita prova em audiência de julgamento, motivo pelo qual devia o Tribunal a quo ter tomado posição sobre o referido facto, dando-o como provado ou como não provado na sentença.
VIII. A omissão de pronúncia fere a decisão recorrida de nulidade, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, nulidade que aqui expressamente se invoca, a qual deverá ser sanada, pronunciando-se o Tribunal sobre o supra mencionado facto alegado pelos Recorrentes e tomando posição sobre ele
IX. O dito modo de funcionamento por unanimidade instituído entre os quatro membros originários dos TÁXI resultou evidente do relato feito por ambos os Requerentes, em declarações de parte, acerca da história da banda (declarações de parte prestadas na audiência de julgamento de 26.01.2018, gravado no CD único, tendo as do Requerente RF início em 10:26:29 e fim em 10:57:50 e as do Requerente FO início em 10:57:51 e fim em 11:48:50).
X. Sublinhe-se, em especial, o procedimento levado a cabo quando, depois de vários anos de “suspensão” da actividade da banda, resolveram, em 2006, retomar a carreira musical dos TÁXI, o que é bem ilustrativo de como funcionavam todas as decisões relativas à banda (cfr. declarações de parte Requerente FO prestadas na audiência de julgamento de 26.01.2018, gravado no CD único, com início em 10:57:51 e fim em 11:48:50, em concreto as passagens gravadas nos minutos 06:16 e 11:07)
XI. Acresce que, o Requerente FO explicou também que, fruto de alguns desentendimentos, quando, em 2006, os quatro membros resolveram retomar a carreira musical da banda, voltaram a acordar que todas as decisões seriam tomadas por todos, por unanimidade, como, de resto, já sucedia até então (cfr. declarações de parte Requerente FO prestadas na audiência de julgamento de 26.01.2018, gravado no CD único, com início em 10:57:51 e fim em 11:48:50, em concreto as passagens gravadas entre os minutos 08:10 e 09:18).
XII. Note-se que o que ficou dito supra não foi contrariado por nenhum outro meio de prova, designadamente por declarações de parte dos Requeridos, que optaram por não as prestar.
XIII. Dão-se aqui por reproduzidas as considerações tecidas infra acerca da valoração das declarações de parte.
XIV. Demonstrativo do referido modo de funcionamento da banda no sentido de que todas as decisões eram tomadas por unanimidade é ainda o Doc. 11 junto à Petição Inicial.
XV. Entendem os Recorrentes que a sentença recorrida deverá ser alterada no sentido de se acrescentar aos factos dados como provados o seguinte: “Requerentes e Requeridos, enquanto membros originários da banda TÁXI, sempre tomaram todas as decisões relativas à “vida” da banda por unanimidade.”
XVI. Relativamente à matéria de facto, quanto ao ponto 1. da matéria de facto dada como não provada na sentença recorrida, note-se que pretendem os Requerentes com a presente providência cautelar, como se pode ler na Petição Inicial que lhes deu origem, que os  Requeridos sejam condenados a abster-se de quaisquer actos de utilização abusiva do nome “TÁXI”, nomeadamente abstendo-se de realizar concertos ou qualquer outro tipo de performance sob essa designação, e de editar quaisquer novas obras artísticas sob a mesma designação.
XVII. Para tanto, alegaram os Requerentes, em suma, que estes e os Requeridos acordaram terminar com a banda TÁXI e que esta apenas poderia voltar a actuar enquanto tal e sob a marca TÁXI com a intervenção ou aprovação de todos os seus membros, acordo esse que os Recorridos têm vindo a incumprir prosseguindo com a actividade da banda sob a marca TÁXI sem a sua intervenção e sem a autorização dos Requerentes.
XVIII. É, pelos motivos expostos, essencial para a boa decisão da causa apurar os contornos do acordo a que chegaram Requerentes e Requeridos em 18.11.2010 no que concerne ao futuro da banda TÁXI e à utilização da marca TÁXI. Sobre o acordo alcançado entre Requerentes e Requeridos na referida reunião havida em 18.11.2010, deu, no entanto, o Tribunal a quo como provados os pontos 11 e 12 da matéria de facto provada na sentença recorrida para cuja convicção do Tribunal contribuíram as declarações dos Requerentes.
XIX. Já no que concerne ao facto dado como não provado, refere a sentença recorrida, na sua fundamentação, que tal “resultou da ausência de elementos de prova idóneos e suficientes a respeito do acordo havido (para além do que consta do ponto 11 da matéria de facto provada)” (sublinhado nosso).
XX. Daqui resulta que (i) as declarações de parte dos Requerentes prestadas em audiência de julgamento foram valoradas pelo Tribunal como um meio de prova credível e (ii) de acordo com o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo, as declarações de parte não são, por si só, um meio de prova suficiente para fazer prova de um facto.
XXI. Ora, o nosso legislador, na Reforma do Código de Processo Civil de 2013, introduziu as declarações de parte como um novo meio de prova.
XXII. Subjacente à consagração deste novo meio de prova esteve a preocupação de acautelar as situações em que, tratando-se de factos essencialmente praticados apenas pelas partes ou uma delas, não podem, as mais das vezes, ser atestados por terceiros.
XXIII. Se o legislador não lhes pretendesse atribuir qualquer valor probatório, não teria introduzido, com a Reforma de Processo Civil, este novo meio de prova, pelo que, apesar de naturalmente sujeito à livre apreciação da prova pelo Tribunal, não devem as declarações de partes, pelo simples facto de terem origem precisamente em quem é parte interessada no processo, ser pura e simplesmente desconsideradas.
XXIV. De acordo com os que perfilham a tese da autossuficiência das declarações de parte, que aqui pugnamos, pese embora as especificidades das declarações de parte, as mesmas podem estribar a convicção do juiz de forma autossuficiente.
XXV. Ora, esta é a única tese que se coaduna com a Reforma, introduzida em 2013, pelo nosso legislador ao Código de Processo Civil, no qual se fez constar, como um meio de prova a par dos demais, sujeito ao princípio da livre apreciação da prova, as declarações de parte.
XXVI. Em primeiro lugar, as declarações de parte foram introduzidas no Código de Processo Civil como um meio de prova autónomo, independente de qualquer outro.
XXVII. Desde logo, as declarações de parte estão “ao mesmo nível” da prova testemunhal e da prova pericial, sendo todas sujeitas à livre apreciação da prova pelo Tribunal.
XXVIII. A apreciação do juiz das declarações de parte, enquanto meio probatório e na parte que exceda uma eventual confissão é livre, nos termos do n.º 3 do artigo 466.º e ainda do n.º 5 do artigo 607.º do CPC.
XXIX. Será, pois, de repudiar o pré-juízo de desconfiança e de desvalorização das declarações de parte.
XXX. Acresce que, desde há muito que se enfatiza que o interesse da testemunha na causa não é fundamento de inabilidade, devendo apenas ser ponderado como um dos factores a ter em conta na valoração do testemunho.
XXXI. As declarações da parte podem constituir, elas próprias, uma fonte privilegiada de factos-base de presunções judiciais, lançando luz e permitindo concatenar - congruentemente - outros dados probatórios avulsos alcançados em sede de julgamento.
XXXII. Ao dar como não provado o ponto 1. da matéria de facto dada como não provada na sentença recorrida, considerando não ter sido produzida prova suficiente e idónea sobre o mesmo, desconsiderando, assim, as declarações de parte dos Requerentes, incorreu o Tribunal a quo num erro ostensivo na apreciação da prova, numa apreciação totalmente arbitrária das provas produzidas em audiência de julgamento, ignorando ou afrontando diretamente as mais elementares regras da experiência.
XXXIII. Conforme adiante se demonstrará, o facto dado como não provado na sentença recorrida, resultou amplamente demonstrado pelas declarações de parte dos Requerentes.
XXXIV. As declarações de parte dos Requerentes foram credíveis e assim consideradas pelo Tribunal a quo, na medida em que as teve em consideração para julgar demonstrados os pontos 11 e 12 da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida.
XXXV. Ademais, as referidas declarações de parte não foram contrariadas por qualquer outro meio de prova.
XXXVI. Em especial, importa sublinhar que os Requeridos optaram por não prestar declarações de parte.
XXXVII. Ambos os Requerentes prestaram declarações de parte na audiência de julgamento e atestaram, de forma coerente e credível, que em 18.11.2010, reuniram com os Requeridos e com estes acordaram (i) terminar com a banda TÁXI e (ii) que os TÁXI apenas voltariam a actuar enquanto tal e sob a marca TÁXI com a intervenção de todos os seus membros originários ou caso todos os Requerentes e Requeridos o consentissem (cfr. declarações de parte Requerente RF prestadas na audiência de julgamento de 26.01.2018, gravado no CD único, com início em 10:26:29 e fim em 10:57:50, em concreto as passagens gravadas entre nos minutos 04:30, entre os minutos 06:25 e 07:52, nos minutos 09:26, entre  os minutos 15:00 e 16:30, entre os minutos 24:00 e 25:07, nos minutos 25:43 e 28:12; e ainda declarações de parte Requerente FO prestadas na audiência de julgamento de 26.01.2018, gravado no CD único, com início em 10:57:51 e fim em11:48:50, em concreto as passagens gravadas nos minutos 03:29, entre os minutos 08:10 e 09:18, entre os minutos 14:30 e 20:47. Entre os minutos 23:48 e 25:37, entre os minutos 44:46 e 45:53, entre os minutos 49:18 e 50:38).
XXXVIII. O caso dos presentes autos é o caso-típico que esteve na origem da introdução das declarações de parte como um novo meio de prova pelo nosso legislador, na medida em que o acordo a que as Partes chegaram em 18.11.2010 foi falado apenas entre os quatro (Requerentes e Requeridos), não tendo sido testemunhado por mais ninguém.
XXXIX. Acresce que, as declarações de parte dos Requerentes revelaram-se credíveis, coerentes e verdadeiras.
XL. O detalhe das declarações; a constante invocação de coordenadas espácio-temporais para contextualização da generalidade dos factos relatados, bem como a reprodução de conversações ao longo das suas declarações ou mesmo a descrição de detalhes supérfluos, são características de um depoimento credível e verdadeiro e estiveram presentes nas declarações de parte de ambos os Requerentes.
XLI. Sendo que não pode deixar de ser tido em consideração o facto de os Requeridos, num primeiro momento, terem tentado retomar a sua carreira musical como “Os Porto” e apenas quando, como ficou demonstrado, se aperceberam da falta de sucesso da banda assim intitulada junto do público, o tenham tentado fazer utilizando a marca TÁXI.
XLII. O que bem demonstra que os Requeridos sabiam que não deveriam utilizar a marca TÁXI em face do que haviam acordado com os Requerentes, caso contrário, dizem-nos as regras da experiência, certamente teriam, desde o início, avançado com a utilização da referida marca, pois bem sabiam o sucesso adquirido pela marca junto do público ao longo de décadas.
XLIII. O que vem reforçar a credibilidade do depoimento das declarações de parte prestadas pelos Requerentes, na medida em que demonstram que as mesmas são verosímeis.
XLIV. Diga-se também, em abono das declarações de parte prestadas pelos Requerentes, que ambos fundamentaram as razões subjacentes ao acordo que tinha sido alcançado em 18.11.2010 e explicaram que, desde o início, as decisões relativamente à banda e à marca foram sempre tomadas pelos quatro, por unanimidade.
XLV. O Tribunal a quo valorou as declarações de parte dos Requerentes para prova dos pontos 11 e 12 da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, o que significa que, as reputou – e bem! – credíveis.
XLVI. Em virtude do exposto:
XLVII. Dúvidas não podem restar que deve a sentença recorrida ser alterada no sentido de se considerar provado o ponto 1. da matéria de facto dada como não provada peloTribunal a  quo, isto é, que “Na reunião realizada no dia 18.11.2010 Requerentes e Requeridos acordaram que a banda TÁXI apenas poderia voltar a actuar enquanto tal e sob a marca TÁXI com a intervenção ou aprovação de todos os seus membros”.
XLVIII. Por outro lado, quanto ao ponto 11 da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, alegaram os Requerentes, no artigo 15.º da Petição Inicial, ter acordado com os Recorridos, na referida reunião de 18.11.2010, terminar com a banda TÁXI, o que é diferente do que se pode ler no referido ponto 11 que foi dado como provado pelo Tribunal a quo.
XLIX. E, entendem os Recorrentes, não é irrelevante nem um preciosismo para a boa decisão da causa.
L. O facto correctamente dado como provado, como se pretende, aliado ao ponto 1. da matéria de facto dada como não provada que os Recorrentes entendem dever ser dado como provado, conforme já supra exposto, permitem ao Tribunal concluir, de forma mais segura, qual foi o verdadeiro âmbito do acordo de 18.11.2010: os TÁXI terminariam, naquela data, para todos os efeitos, seja como banda, seja como marca a ser utilizada somente por qualquer uma das Partes, salvo acordo unânime dos quatro membros originários.
LI. O acordo alcançado em 18.11.2010 entre Requerentes e Requeridos no sentido de extinguir a banda TÁXI resultou amplamente demonstrado das declarações de parte dos primeiros já supra indicadas e que aqui se dão por integralmente reproduzidas por razões de economia processual.
LII. Pelos mesmos motivos, dão-se aqui por reproduzidas as considerações tecidas acerca da valoração da prova por declarações de partes, que aqui valem integralmente.
LIII. Deve, assim, a sentença recorrida ser alterada, passando a ler-se no ponto 11. da matéria de facto dada como provada que: “No seguimento de divergências, num período em que pensaram retomar a carreira musical dos TÁXI, os quatro elementos da banda (que se mantinham os mesmos desde a sua formação) em reunião havida em 18.11.2010 acordaram terminar com a banda”.
LIV. Relativamente à matéria de direito, resultou, afinal, demonstrado que “Na reunião realizada no dia 18.11.2010 Requerentes e Requeridos acordaram que a banda TÁXI apenas poderia voltar a actuar enquanto tal e sob a marca TÁXI com a intervenção ou aprovação de todos os seus membros” e que “Requerentes e Requeridos, enquanto membros originários da banda TÁXI, sempre tomaram todas as decisões relativas à “vida” da banda por unanimidade.” (sendo que o último sempre permitiria ao Tribunal inferir, através de presunção judicial, que também o uso da marca TÁXI e a actuação de algum dos seus contitulares sob tal denominação estava sujeita à intervenção ou acordo de todos).
LV. Em virtude do exposto, verifica-se que existe e sempre existiu, no caso concreto, uma convenção dos contitulares da marca TÁXI quanto às regras específicas que devem nortear o uso e administração da marca.
LVI. O que, por si só, significa ser de afastar a aplicação das regras da compropriedade previstas nos artigos 1406.º e seguintes do Código Civil, que não têm carácter imperativo.
LVII. Acresce que, estando em causa, como é o caso, direitos disponíveis, nenhum motivo existe para que as partes não pudessem acordar em sentido diverso do regime legalmente previsto para a compropriedade o uso e administração da marca.
LVIII. Aliás, a própria doutrina e jurisprudência – que não perfilhamos – que se socorre das regras estabelecidas no regime da compropriedade previstas nos artigos 1406.º e seguintes do Código Civil e as faz aplicar cegamente à contitularidade de marcas apenas o faz quando não existe convenção dos contitulares da marca quanto às regras específicas pelas quais o uso e administração da marca se devem reger.
LIX. Assim, em face da alteração da decisão sobre a matéria de facto em conformidade com o que aqui se pugnou, necessariamente terá de ser alterada também a decisão de direito extraída na sentença recorrida.
LX. De facto, em face do acordo celebrado entre as partes, deverá ser alterada a decisão recorrida no sentido de decretar parcialmente procedente o procedimento cautelar, condenando-se os Requeridos a abster-se de quaisquer actos de utilização da marca “TÁXI”, nomeadamente abstendo-se de realizar concertos ou qualquer outro tipo de performance sob essa designação, e de editar quaisquer novas obras artísticas sob a mesma designação, bem como nas custas, sob pena de violação do disposto nos artigos 762.º, 798.º e 799.º do Código Civil.
LXI. Sem prescindir, entendem os Recorrentes que ainda que se mantivesse inalterada a decisão sobre a matéria de facto tal qual ela se encontra fixada na sentença recorrida – o que não se concede, mas por mera hipótese de raciocínio se admite –, nunca seria aplicável ao caso sub judice as regras previstas nos artigos 1406.º e seguintes do Código Civil para a compropriedade.
LXII. De acordo com o n.º 1 do artigo 224.º do Código da Propriedade Industrial (CPI), o registo da marca confere ao seu titular o direito de propriedade e do exclusivo da marca para os produtos e serviços a que esta se destina.
LXIII. Se é certo que daquela norma decorre inequivocamente um dever geral de abstenção de terceiros não titulares da marca a utilizarem, não menos verdade é que dali não resulta que, encontrando-se a marca registada a favor de mais do que um titular, qualquer um possa individual e concomitantemente utilizar a marca.
LXIV[1].
LXV. A função primordial da marca é a sua função distintiva, isto é, aquela que permite ao consumidor médio distinguir certo produto ou certo serviço de outro produto ou outro serviço (em sentido estrito), e distinguir certo produto ou serviço de uma fonte, de outro produto ou serviço de fonte diferente (sentido amplo).
LXVI. Refira-se que a nossa lei impõe ao titular da marca, sob pena de caducidade do registo da mesma, o ónus de garantir o não uso enganoso da marca por si ou por terceiro.
LXVII. A nosso ver, no caso de contitularidade de marca, não é possível a um dos titulares garantir a função distintiva da marca e proibir o uso enganoso da marca se cada um dos outros contitulares, por si só, utilizar a marca como bem entender.
LXVIII. Por outro lado, a marca assume uma função de garantia que consiste numa referência de confiança, para o consumidor, da manutenção de certas características do produto ou serviço, porquanto estes são fornecidos por uma concreta entidade que detém o ónus de um uso não enganoso da marca e da qualidade intrínseca àquele sinal
distintivo.
LXIX. Ou seja, podemos afirmar que a marca tem, de alguma forma, um carácter intuitu personae, no sentido em que assegura e está intimamente ligada a determinada proveniência.
LXX. Sendo que a origem que a marca visa garantir fica manifestamente desvirtuada quando esta é utilizada individualmente por cada contitular da marca a seu belprazer.
LXXI. Acresce que, hoje é pacífico que a marca tem ainda uma função publicitária que consiste na aptidão que o sinal distintivo tem para, junto dos consumidores, promover o conhecimento da sua existência a sua imagem e, a final, a sua comercialização, o seu consumo.
LXXII. A capacidade da marca para a promoção dos produtos ou serviços que assinala pode ser gravemente afectada pela circunstância de não ser possível a um contitular de uma marca garantir a qualidade dos produtos nos quais ela é utilizada.
LXXIII. Face ao exposto, as regras da compropriedade previstas nos artigos 1406.º e seguintes do Código Civil não são aptas a proteger as funções juridicamente protegidas da marca.
LXXIV. Ademais, permitir a utilização da marca, a seu belprazer, por cada um dos seus contitulares, individualmente, significa que, no limite, no caso dos autos, poderíamos ter cada um dos Requerentes a utilizar, em simultâneo, a marca TÁXI em concertos, cartazes, Cd’s, etc. de bandas diferentes (uma de reggae, uma de heavy metal, uma pimba e uma pop, por ex).
LXXV. Importa ter em consideração que em causa estão bens imateriais ou incorpóreos cuja utilização é completamente diferente da utilização que é dada a um bem material/corpóreo. LXXVI. Cada utilização da marca tem efeitos que se prolongam no tempo e que pelas consequências/repercussões que têm na marca podem inutiliza-la, esgota-la ou esvaziar a possibilidade de utilização por outro contitular.
LXXVII. O uso exclusivo que a função de garantia concede à marca (e, para mais a uma marca “notoriamente conhecida” ou, até “marca de prestígio”, como o é a marca TAXI) só pode significar que terceiros estão proibidos de a usar mas que também os próprios contitulares da marca estão proibidos de a usar individualmente face aos outros contitulares, sem autorização dos mesmos, sob pena de se fazer ruir, com estrondo e por vias travessas, toda a construção teórico-prática do regime da propriedade intelectual.
LXXVIII. Importa, a este propósito, ter em consideração que a marca TÁXI é ainda utilizada por Requerentes e Requeridos, em conjunto, nos Cd’s e novas edições que estão à venda sob aquela marca referente a produtos dos membros originários da banda, conforme resultou demonstrado da prova produzida.
LXXIX. Isto posto, temos que, pelos motivos acima expostos, verifica-se uma incompatibilidade absoluta entre o regime da compropriedade previsto nos artigos 1406.º e seguintes do Código Civil e o regime especial da marca, o que contende com o estatuído no artigo 316.º do CPI e no artigo 1303.º do Código Civil.
LXXX. Afastadas que devem ser, como vimos, as regras da compropriedade previstas nos artigos 1406.º e seguintes do Código Civil, entendem os Recorrentes que a solução que melhor se coaduna com o regime especial da marca e com os fins juridicamente protegidos pela marca passa por interpretar o disposto no n.º 1 do artigo 224.º do CPI no sentido de conferir aos contitulares de uma marca o direito de propriedade e do uso exclusivo da marca em conjunto.
LXXXI. Ou seja, a referida norma, não só impede que terceiros não titulares da marca a utilizem sem o consentimento de todos os seus titulares, como também impede que qualquer um dos seus contitulares a possa utilizar individualmente ou sem o consentimento dos demais.
LXXXII. No caso, conforme resulta do ponto 12 da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, os Requerentes não deram a sua autorização para que os Requeridos utilizassem a marca TÁXI.
LXXXIII. Em virtude do exposto, devia a sentença recorrida ter decretado parcialmente procedente o procedimento cautelar, condenando-se os Requeridos a abster-se de quaisquer actos de utilização da marca “TÁXI”, nomeadamente abstendo-se realizar concertos ou qualquer outro tipo de performance sob essa designação, e de editar quaisquer novas obras artísticas sob a mesma designação, bem como nas custas, sob pena de violação do disposto no n.º 1 do artigo 224.º do CPI.
LXXXIV. Sem prescindir, ainda que considerasse, em tese aplicável à contitularidade de uma marca o regime previsto nos artigos 1406.º e seguintes do Código Civil – o que não se concede, mas por mera hipótese de raciocínio se admite –, sempre seria de concluir pela não aplicação ao caso concreto o disposto no n.º 1 do artigo 1406.º do Código Civil, como fez a sentença recorrida, desde logo, por não se verificar um dos requisitos ali expressamente previstos.
LXXXV. Com efeito, dispõe o n.º 1 do artigo do artigo 1406.º do Código Civil o uso individual da coisa por cada comproprietário só é possível na medida em que não prive os outros do seu uso.
LXXXVI. No caso dos presentes autos, o uso da marca pelos Requeridos impede os Requerentes de também a utilizarem.
LXXXVII. Em primeiro lugar, como se disse acima, tal privação do uso da marca é provocada pelo esvaziamento do direito ao exclusivo e concomitante “implosão” da marca.
LXXXVIII. Em segundo lugar, se nos seus concertos ou obras artísticas os Recorridos estiverem a utilizar a marca TÁXI, tal terá, como efeito, pelo menos prático, que os Recorrentes vejam o seu uso coarctado, limitado ou mesmo, impossibilitado, nos seus concertos e produções.
LXXXIX. Por outro lado, como também já se referiu, o uso da marca, individual e concomitantemente por cada um dos seus contitulares, não acautela os fins que a marca visa
proteger.
XC. Anota-se ainda que, a nosso ver, apenas o uso conjunto da marca pelos seus contitulares ou o seu uso por apenas alguns, mas com a autorização de todos, protege os direitos de personalidade dos titulares da marca que, como os Requerentes, têm o seu nome e imagem, bem como o seu legado, intimamente ligados à marca TÁXI.
XCI. Os direitos de propriedade industrial estão interligados aos direitos de personalidade.
XCII. Pelo que, sob pena de violação do disposto no n.º 1 do artigo 1406.º do Código Civil, deverá ser dado provimento ao presente recurso, substituindo-se a sentença recorrida por outra que decrete parcialmente o procedimento cautelar, condenando-se os Requeridos a abster-se de quaisquer actos de utilização da marca “TÁXI”, nomeadamente abstendo-se realizar concertos ou qualquer outro tipo de performance sob essa designação, e de editar quaisquer novas obras artísticas sob a mesma designação, bem como nas custas.
XCIII. Sem prescindir, admitindo-se ainda ser aplicável ao caso concreto o regime previsto nos artigos 1406.º e seguintes do Código Civil – o que não se concede, mas por mera hipótese de raciocínio se admite –, discordam os Recorrentes do Tribunal a quo também na parte em que este considerou que os Recorridos se encontram a usar a marcar, e não a administra-la, remetendo, dessa forma, a solução jurídica aplicável ao caso para o disposto no artigo 1406.º do Código Civil.
XCIV. Deu e sentença recorrida como provado que os Recorridos têm vindo a celebrar novos contratos para a realização de concertos sobre a designação TÁXI; que integram a composição da banda TÁXI dois outros elementos e que os Requeridos gravaram e editaram, sob a designação TÁXI, um novo single intitulado “Reality Show” (pontos 14., 15. e 31 da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida).
XCV. Ora, dúvidas não existem que os referidos factos integram o conceito de actos de inovação, pois estão em causa actos que transcendem a esfera da gestão ordinária e afectam a forma como a marca é vista pelo público, pelo que estão sujeitos ao consentimento unânime de todos os contitulares.
XCVI. Por outro lado, sempre se dirá que o n.º 1 do artigo 1407.º do Código Civil, que regula a administração da coisa, manda aplicar o disposto no artigo 985.º do mesmo código, que disciplina a administração das sociedades civis.
XCVII. Sendo que os actos praticados pelos Recorridos que foram dados como provados pelo Tribunal a quo são actos de administração.
XCVIII. De facto, a utilização da marca TÁXI, por exemplo, para lançar novos Cd’s ou dar novos concertos não se insere dentro do conceito de uso normal da coisa.
XCIX. Escolher utilizar a marca em novos concertos e novos produtos (ex: singles, Cd’s) é, a final, decidir o destino dessa mesma marca, gerir o seu percurso.
C. Acresce que, deu também a sentença como provado que a banda dos Requeridos, que utiliza a marca TÁXI, é composta por outros dois elementos, terceiros, não contitulares da marca.
CI. Ora, os Recorridos, ao permitir a utilização da marca por aqueles dois outros elementos, quando actuam ou quando produzem ou editam músicas com os Requerentes sob a marca TÁXI, estão, na prática, a conceder-lhes uma licença (não exclusiva) de utilização da marca.
CII. Sendo que esse contrato de licença de utilização da marca configura, sem dúvida alguma, um acto de administração da marca comum.
CIII. No mínimo e sem prescindir, estariam os Recorridos a permitir a terceiros o uso de um bem, detido em compropriedade, por quem não é consorte, sem o acordo dos demais contitulares.
CIV. Assim, de acordo com o regime previsto nos artigos 1407.º e 985.º do Código Civil, as decisões são tomadas por maioria, desde que a maioria dos consortes represente, pelo menos, metade do valor das quotas.
CV. Ora, evidente é que não têm os Recorridos, sendo dois em quatro consortes, a maioria legalmente exigida para utilizarem a marca TÁXI sem o consentimento dos Recorrentes.
CVI. Pelo que, também por aqui, deverá a sentença recorrida ser substituída por outra que decrete parcialmente o procedimento cautelar, condenando-se os Requeridos a abster-se de quaisquer actos de utilização da marca “TÁXI”, nomeadamente abstendo-se realizar concertos ou qualquer outro tipo de performance sob essa designação, e de editar quaisquer novas obras artísticas sob a mesma designação, bem como nas custas, sob pena de violação do disposto nos artigos 1406.º, 1407.º e 985.º do Código Civil.”
*
Os requeridos interpuseram contra-alegações, no termo das quais concluíram o seguinte:
“A) Os Requerentes, nas suas doutas alegações, invocam várias questões e discutem matéria de direito que, salvo o devido respeito, em nada importam ou interferem com a boa decisão da presente causa.
B) Nos presentes autos importa apenas perceber se algo foi expressamente acordado pelas partes quanto à utilização da marca “TÁXI”, registada, em partes iguais, a favor dos Requerentes e dos Requeridos, e não quanto à banda musical ou à sua composição.
C) O Tribunal a quo valorou a prova produzida em audiência – inclusive as declarações de parte prestadas pelos ora Recorrentes – de acordo com a sua livre convicção, tendo entendido, e bem, que os Requerentes não produziram prova idónea e suficiente para demonstrar a celebração de um acordo entre as partes que impedisse algum dos contitulares da marca «TÁXI» aqui em causa de a utilizar autonomamente.
D) Tendo concluído, no seguimento da posição que unanimemente tem vindo a ser assumida pela jurisprudência, que, «na ausência de qualquer acordo (que não resultou provado), temos que é lícito a qualquer comproprietário usar a marca, desde que a use para o fim a que a mesma se destina e não prive os restantes comproprietários de a usarem também» (p. 14 da sentença).
E) Entendem os ora Recorrentes que deveria o Tribunal a quo ter dado como provado que «Requerentes e Requeridos, enquanto membros originários da banda TÁXI, sempre tomaram todas as decisões relativas à “vida” da banda por unanimidade» (conclusão XV das alegações de recurso), inferindo deste facto que, na reunião realizada no dia 18/11/2010, ficou também acordado, no que ao uso da marca «TÁXI» concerne, a necessidade de autorização de todos os membros para o uso da referida marca por apenas alguns deles.
F) Ora, salvo o devido respeito, as conclusões que os Recorrentes pretendem sejam inferidas de tal facto são absolutamente inadmissíveis.
G) Conforme entendeu, e bem, o Tribunal a quo, não ficou provada a existência de um acordo expresso nos termos do qual se tenha determinado que a banda apenas poderia voltar actuar, enquanto tal e sob a marca “TAXI”, com a aprovação de todos os seus membros fundadores.
H) Razão pela qual, mesmo que hipoteticamente se considerasse como verdadeiro, em nada relevaria para a boa decisão da presente causa o facto de, durante a vida da banda composta pelos quatro elementos, estes terem tomado as suas decisões em conjunto.
I) Na verdade, ocorreram até outros factos que contrariam a verosimilhança desta afirmação, a saber: o facto de o registo da marca aqui em causa ter sido requerido e detido, durante mais de 3 anos, apenas pelo Requerido RV (ponto 10 dos factos provados) ou o facto de os álbuns de originais “Salutz” (1983) e “The Night” (1987), referidos no ponto 2 dos factos provados, não terem contado com a intervenção do Requerente RF.
J) O eventual facto de as partes, durante a vigência da banda (composta pelos quatro elementos iniciais), terem tomado as decisões relativas à vida da mesma por unanimidade poderia, como os próprios Recorrentes referem, relevar, quando muito, como argumento para que o Tribunal concluísse que também a utilização da marca sub judice estaria sujeita à aprovação dos quatro.
K) Como uniformemente tem sido entendido pelo STJ, a omissão de pronúncia só se verifica quando o juiz deixa de se pronunciar sobre questões concretas e problemas que lhe foram submetidos pelas partes e que como tal tem de abordar e resolver, ou de que deve conhecer oficiosamente e não as razões, no sentido de simples argumentos, opiniões ou motivos utilizados pelas partes (Ac. do STJ de 15/12/2011, processo n.ç 17/09.0TELSB.L1.S1, relator: Raúl Borges),
L) No caso em apreço, o Tribunal pronunciou-se de forma clara sobre todos e cada um dos aspectos relevantes para a boa decisão da causa, analisando devidamente as questões propostas e pertinentes, emitindo a sua opinião fundamentada e concluindo pela improcedência do pedido apresentado pelos Requerentes.
M) Pelo que não existe qualquer vício de omissão de pronúncia, devendo a decisão manter-se nos exactos termos em que foi proferida.
N) Na opinião dos Recorrentes, o Tribunal a quo deveria, com base nas declarações de parte prestadas pelos Requerentes, ter dado como provado o seguinte facto: «1. Na reunião realizada no dia 18.11.2010 Requerentes e Requeridos acordaram que a banda TÁXI apenas poderia voltar a actuar enquanto tal e sob a marca TAXI com a intervenção ou aprovação de todos os seus membros» constante da matéria de facto não provada.
O) Alegando que não faz sentido ter o Tribunal valorado as referidas declarações de parte para prova dos factos 11 e 12 da matéria de facto dada como provada e não ter considerado tais declarações para prova do facto supra referido.
P) No entanto, não se pode exigir ao Tribunal que valore tais declarações para dar como provado um facto que se revela essencial e decisivo para a boa decisão da presente causa, quando não resulta, de forma cabal e inequívoca, de tais declarações que tal facto corresponde à realidade.
Q) As próprias afirmações do Requerente RF demonstram claramente que não foi celebrado qualquer acordo expresso quanto à utilização da marca aqui em causa.
R) Este Requerente afirmou, pura e simplesmente, que achou/pensou/depreendeu que a marca aqui em disputa não seria mais utilizada.
S) Em momento algum os Requerentes afirmaram, de modo convincente e de forma clara, que a utilização da marca «TÁXI» por parte de um ou mais dos seus contitulares ficaria condicionada à autorização dos restantes, não podendo a banda continuar com outra composição.
T) Nenhuma testemunha atestou a existência deste alegado acordo.
U) Não foi feita outra prova, fosse de que natureza fosse, que corroborasse a tese aventada nas Alegações de recurso (que, reitere-se, não tem sequer respaldo nas declarações de parte dos Recorrentes) e lograsse provar a existência do famigerado acordo.
V) E afigura-se não fazer sentido utilizar, como argumento para corroborar a tese ora propugnada acerca da prova deste facto, a circunstância de os Requeridos não terem prestado declarações de parte para contrapor o que foi alegado pelos Requerentes.
W) O ónus da prova do alegado cabia aos Requerentes, sendo que estes poderiam ter requerido que fosse prestado depoimento de parte pelos Requeridos, no sentido de que por estes fosse confessada a veracidade de tal facto.
X) Não o fizeram porque o dito "facto" não corresponde à verdade, nunca tendo as partes acordado que a banda apenas poderia voltar a actuar, enquanto tal e sob a marca “TÁXI”, com a aprovação de todos os seus membros fundadores.
Y) Assim, bem andou o Tribunal a quo ao decidir como não provado este alegado acordo, devendo a sentença manter-se inalterada quanto ao que, relativamente a este ponto, foi – correctamente – decidido.
Z) Pretendem, ainda, os Requerentes que seja alterada a redacção do facto dado como provado no ponto 11, defendendo que do mesmo deveria constar que, na referida reunião, as partes acordaram «terminar com a banda».
AA) Para a boa decisão dos presentes autos, é absolutamente irrelevante o facto de se ter decidido ou não que a banda, com a composição que tinha nessa altura (com a intervenção dos Requerentes e dos Requeridos), cessava a partir daí a sua actividade.
BB) Contudo, como afirmaram várias das testemunhas, em especial o Marco Azevedo, "manager" da banda à data dos factos, as decisões dos seus membros, no que dizia respeito ao futuro da banda, eram sempre muito instáveis, tendo as partes decidido, noutras ocasiões, terminar a sua colaboração com a banda e, posteriormente, retomado a respectiva actividade.
CC) Nunca tendo ficado acordado que, a partir de certa data, a banda deixava de existir definitivamente.
DD) Assim, uma vez mais, andou bem o Tribunal a quo, quando decidiu dar como provado que, aquando da última reunião havida entre os Requerentes e os Requeridos, ficou apenas decidido que os quatro elementos da banda (Requerentes e Requeridos) não continuariam a trabalhar em conjunto.
EE) Quanto à matéria de direito, entendem os ora Recorrentes que, tendo ficado provada, em sua opinião, a existência de uma convenção celebrada entre os contitulares quanto à utilização e administração da marca «TÁXI», quedaria afastada a aplicação das regras da compropriedade previstas nos artigos 1406..º e ss do CC.
FF) Propugnam, ainda, que, mesmo que se mantenha inalterada a decisão sobre a matéria de facto, nunca deveriam ser aplicadas ao caso sub judiceas regras previstas nos artigos 1406.º e ss do CC, devendo interpretar-se o disposto no artigo 224.º do CPI (nos termos do qual o registo confere ao respectivo titular o direito de propriedade e de exclusivo da marca) no sentido de conferir aos contitulares de uma marca o direito de propriedade e de uso exclusivo da marca em conjunto.
GG) Tal entendimento, além de contrariar a posição que vem sendo acolhida e defendida pelos Tribunais superiores, viola os direitos de propriedade e exclusivo que são conferidos pela lei (supra citado artigo 224.º do CPI) a cada um dos contitulares da marca.
HH) A propriedade da marca detida por dois ou mais co-titulares é expressamente admitida pelo art.º 5º, C) 3 da Convenção da União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial, de 1883, e está sujeita ao regime da compropriedade previsto no CC, com as necessárias adaptações (art.º 1303.º, nº 2 CC).
II) Na falta de indicação em contrário no título constitutivo (registo da marca no INPI), as quotas dos 4 comproprietários da marca em causa presumem-se quantitativamente iguais, isto é, cada um deles é titular de uma quota-parte correspondente a 25% da referida marca (art.º 1403º, nº 2 C.C.).
JJ) Na falta de acordo sobre o uso da coisa comum (a marca “TÁXI”), dispõe o n.º 1 do art.º 1406.º C.C. que «a qualquer dos proprietários é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina», no caso, para distinguir serviços diferentes daqueles para os quais a marca “TÁXI” n.º 410487 se encontra registada.
KK) Assim tem entendido unanimemente a jurisprudência: veja-se, a título de mero exemplo, os acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 22/11/2012, no âmbito do processo n.º 88/12.1TYLSB.L1-6 e em 24/05/2017, no processo nº 380/13.8YHLSB.S1.L1.
LL) Por outro lado, não existindo um acordo relativo à administração da coisa comum, i.e. da marca, determina o artigo 1407.º do CC a aplicação, do disposto no artigo 985.º CC, respeitante à administração das sociedades civis: a administração cabe, por igual, a todos os consortes, devendo as deliberações ser tomadas por uma maioria formada com observância de dois requisitos: votarem no mesmo sentido mais de metade dos consortes (n.ºs 3 e 4 do artigo 985º) e representarem esses, pelo menos, metade do valor total das quotas, sob pena de os actos de administração praticados contra a vontade maioritária dos titulares legalmente estabelecida serem anuláveis (Neste mesmo sentido, cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22/11/2012, no processo n.º 88/12.1TYLSB.L1-6).
MM) Para deliberarem agora contra este uso da marca comum, os Requerentes teriam de reunir, cumulativamente, a maioria dos consortes e representar, pelo menos, metade do valor total das quotas em que a marca se encontra repartida.
NN) Na falta de um acordo em sentido diverso, o regime legal vigente da compropriedade contempla como perfeitamente lícito o uso da “coisa” (marca) tal como ele está a ser levado a cabo pelos Requeridos.
OO) Nada muda pelo facto de estar em causa um bem imaterial: a marca, continuando o uso a ser individual (Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 24/05/2017, no processo nº 380/13.8YHLSB.S1.L1).
PP) Não só o uso individual da marca em “contitularidade de direitos” é lícito, como os proveitos/ganhos retirados desse mesmo uso apenas são devidos aos contitulares que lhe deram causa (no caso, os Requeridos).
QQ) Do aqui exposto facilmente se retira que o uso que os Requeridos, representantes de 50% da marca nacional n.º 410487 «TÁXI», estão a fazer dela é absolutamente legítimo e não pode ser impedido pelos outros comproprietários.
RR) Assim, deve manter-se integralmente a decisão proferida pelo Tribunal a quo.”
*
QUESTÕES A DECIDIR

Nos termos do disposto nos Artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial.[2] Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.[3]
Nestes termos, as questões a decidir que delimitam o objecto deste recurso, consistem em:
a) se a decisão recorrida enferma de nulidade por violação das alíneas d) do nº1 do artº 615 do C.P.C.
b) se a matéria de facto apreciada pelo tribunal recorrido, deve ser alterada;
c) Se existe utilização abusiva do nome e marca TÁXI pelos requeridos, co-titulares da mesma;
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Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O tribunal recorrido considerou a seguinte matéria de facto:

1. Requerentes e Requeridos fundaram em 1979 um grupo musical denominado “TÁXI”, que veio a granjear grande sucesso junto do público nacional;

2. No decorrer da sua carreira lançaram os seguintes álbuns de originais:
• “Táxi” (1981)
• “Cairo” (1982)
• “Salutz” (1983)
• “The Very Best Of” (1986)
• “The Night” (1987)
• “Amanhã” (2009).

3. Os quais foram acompanhados da edição de vários “singles”;

4. Assim como da edição das seguintes compilações:
• “The Very Best of Táxi” (1993)
• “O Céu Pode Esperar - O Melhor dos Táxi” (1999)
• “Ontem - O Melhor de Táxi” (2009).

5. Para além dos discos editados a banda deu vários concertos, principalmente em Portugal mas também no estrangeiro;

6. A banda “TAXI” tornou-se uma das maiores “bandas rock” de Portugal, tendo sido o primeiro grupo de música rock a atingir o galardão de “Disco de Ouro”, com o seu primeiro LP de nome igual ao da banda;

7. As obras musicais criadas pelos quatro membros da banda foram registadas junto da Sociedade Portuguesa de Direitos de Autor (SPA), na titularidade dos quatro, em partes iguais (estando actualmente os direitos patrimoniais a ser divididos em cinco partes, incluindo o autor da letra);
 
8. Todos os quatro membros da banda são cooperadores da cooperativa GDA – Gestão dos Direitos dos Artistas;

9. Requerentes e Requeridos são titulares do registo da marca nacional n.º 410487 TÁXI (sinal verbal), assinalando, na classe 41 da classificação internacional de Nice, serviços de composição de música e produção de espectáculos;

10. O registo da referida marca foi requerido em 12.01.2007 pelo Requerido RV e foi concedido em 6.06.2007, tendo como único titular o requerente até 23.10.2010, data em que foi transmitido para a titularidade dos quatro, Requerentes e Requeridos, sem determinação de partes;

11. No seguimento de divergências, num período em que pensaram retomar a carreira musical dos TÁXI, os quatro elementos da banda (que se mantinham os mesmos desde a sua formação) em reunião havida em 18.11.2010 acordaram em não o fazer;

12. Os Requerentes não deram a sua autorização para que os Requeridos prosseguissem com a actividade da banda sob a marca TAXI sem a sua intervenção;

13. Em 2013, os Requeridos, pretendendo continuar com a sua carreira musical, formaram a banda “Os Porto”, com a qual editaram um disco de originais de nome “Persícula Cingulata”;

14. Os Requeridos têm vindo recentemente a celebrar acordos para a realização de concertos sob a designação de TÁXI;

15. Integrando na composição da banda TÁXI dois outros elementos;

16. Estava agendada a participação da banda TÁXI no concerto a realizar na noite de S. João, no Porto, organizado pela entidade “Porto Lazer”;

17. Datadas de 19.05.2017, os Requerentes remeteram aos Requeridos as cartas registadas com aviso de recepção, cuja cópia está junta a fls. 31v.º e 32 dos autos (numeração do processo em suporte de papel, docs. 15 e 16 do requerimento inicial), cujo teor integral aqui se dá por reproduzido;

18. Na mesma data os Requerentes remeteram à “Porto Lazer”, a carta cuja cópia está junta a fls. 33 v.º (doc. 17), cujo teor integral aqui se dá por reproduzido;

19. A actuação dos TÁXI no concerto referido em 15. foi cancelada;

20. Posteriormente, chegou também ao conhecimento dos Requerentes que estava agendado para o dia 10 de Junho de 2017 um concerto da banda, integrado nas Festas da Comunidade organizadas pela Comissão Cultural da Junta de Freguesia da União das Freguesias de Merelim (São Pedro) e Frossos, divulgado com o seguinte cartaz, contendo uma fotografia dos Requerentes e dos Requeridos:[4]

21. Em 30.05.2017 a manager da banda dos Requeridos enviou á entidade produtora do espectáculo um e-mail com o seguinte teor: “Olá Jorge, numa das promoções do concerto TAXI no dia 10 de junho, está a foto que ponho em baixo em baixo já muito antiga e que já não corresponde á verdade. Pois agora é o João Grande, Rui Taborda e outros 3 músicos que vão tocar em braga.
Por favor peça imediatamente para retirar, e colocar esta nova que envio, que até é muito mais atractiva. A utilização da anterior é indevida e pode trazer problemas. Obrigada.”;

22. Tendo recebido em resposta um e-mail do seguinte teor: “Isso só foi nas publicações internas. Nas oficiais saídas recente e nas revistas da cultura já esta a actual”;

23. Com data de 8.06.2017 os Requerentes enviaram à entidade organizadora a carta cuja cópia está junta a fls. 39 (doc. 18), cujo teor integral aqui se dá por reproduzido;

24. O referido concerto veio a ter lugar na data agendada;

25. E foi transmitido em directo pelo site do Jornal de Notícias, constando do texto da notícia publicada com o título “Táxi voltaram aos palcos em Braga”, o seguinte:
Os Táxi voltaram aos palcos, este sábado à noite, com um concerto em Braga que foi transmitido em directo no "Jornal de Notícias".
Com sucessos como Chiclete, Cairo, Vida de Cão, ou Rosete, entre outros, os Táxi são uma das bandas portuguesas mais conhecidas e acabaram de lançar um novo tema: "Reality Show" que apresentaram ao vivo no Parque das Gerizes, em Merelim, S. Pedro.
João Grande, o vocalista da banda, diz que esta é uma música ao estilo Táxi, que transparece "a paixão com que fazemos música, com a evolução e amadurecimento naturais da nossa experiência".
Os Taxi, a banda de pop-rock nacional que conseguiu o primeiro Disco de Ouro do Rock Português (em 1981, com o álbum "Taxi"), volta à estrada apresentando-se com João Grande (voz), Rui Taborda (baixo), Ricardo Cavalera (guitarra), Nelson Funky (guitarra) e Hugo Pereira (bateria).
A banda originária do Porto gravou, até à data, cinco álbuns de originais, entre eles "Cairo";

26. No dia 28 de Junho de 2017, os Requeridos deram novo concerto, nas próprias instalações do Jornal de Notícias, que também foi transmitido em directo pelo respectivo site;

27. Constando do texto da notícia publicada com o título “Taxi em miniconcerto na redação do JN”, o seguinte:
Os Taxi, banda do Porto conhecida por temas como "Chiclete", "Cairo" ou "Vida de Cão", estão de novo na estrada e deram, esta quarta-feira à tarde, um miniconcerto na redação do JN.
A banda do Porto gravou, até à data, cinco álbuns de originais, entre eles o homónimo "Taxi", lançado em 1981, e "Cairo".
Da formação original da banda de pop-rock, que conseguiu o primeiro Disco de Ouro do Rock Português com o seu primeiro disco, ficaram João Grande (voz) e Rui Taborda (baixo), a que se juntam agora os guitarristas Ricardo Cavalera, Nelson Funky e o baterista Hugo Pereira.
A banda, que em abril de 1981 abriu o concerto dos britânicos "The Clash", volta à estrada este ano com o lançamento de um novo single, "Reality Show", que já tem mais de 200 mil visualizações na página oficial do grupo.
Os Taxi vão atuar no festival Flower Power Fest, em Cascais, a 5 de agosto, num programa que integra também os Beach Boys Band e os Ten Years After.

28. Chegou ainda ao conhecimento dos Requerentes que estava agendado para o dia 05 de Agosto de 2017 um concerto da banda, integrado no Flower Power Fest organizado pela LUS’ALMA - Associação de Divulgação e Promoção Cultural e Artística;

29. Tendo os Requerentes enviado á entidade organizadora a carta, data de 31.07.2017, cuja cópia está junta a fls. 43 v.º (doc. 22), cujo teor integral aqui se dá por reproduzido;

30. Por motivos de intempérie meteorológica, este concerto não veio a ter lugar na data agendada para todas as bandas em cartaz;

31. Em 2017 os Requeridos gravaram e editaram, sob a designação TÁXI, um novo “single” intitulado “Reality Show”;

32. A edição deste “single” motivou que alguém viesse a introduzir na respectiva página da Wikipedia o seguinte texto:
“Os TAXI voltam ao estúdio e à estrada. O single de estreia "Reality Show" alcança em apenas uma semana mais de 100.000 visualizações no Facebook.
Com uma nova formação, os TAXI, para além dos fundadores João Grande (voz) e Rui Taborda (baixo), contam ainda com Ricardo Cavalera (guitarra), Nelson Funky (guitarra) e Hugo Pereira (bateria).”

33. Em sites e blogues na internet foram publicados textos dando conta que “os Táxi estão de regresso”.
*
III.2. Matéria de facto não provada
Com relevância para a decisão da causa não resultou provado nesta sede os seguinte facto:
1. Na reunião realizada no dia 18.11.2010 Requerentes e Requeridos acordaram que a banda TÁXI apenas poderia voltar a actuar enquanto tal e sob a marca TAXI com a intervenção ou aprovação de todos os seus membros.
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DA ARGUIÇÃO DE NULIDADE DA SENTENÇA RECORRIDA
Insurgem-se os recorrentes contra a decisão que absolveu os recorridos do pedido formulado nos autos, arguindo a nulidade da decisão recorrida, por omissão e pronúncia e erro de julgamento.

a) se a decisão recorrida enferma de nulidade por violação da alínea d) do nº1 do artº 615 do C.P.C.

Nas suas conclusões recursórias invocam os apelantes a nulidade da decisão recorrida, por omissão de pronúncia e erro de julgamento, alegando terem invocado na decisão final que os requerentes e requeridos sempre tomaram as decisões relativas à banda por unanimidade, concedendo um direito de “veto” a cada um dos seus membros, o que não é despiciendo para o tribunal inferir o sentido do acordo tomado na reunião de 18/11/2010, no que concerne ao uso da marca TÁXI, alegando que foi feita prova sobre este facto, pelo que o tribunal deveria ter-se pronunciado sobre ele.
Em sede de contra-alegações, os recorridos pronunciaram-se chamando à colação a consensual jurisprudência sobre a distinção entre questões e argumentos, e o tribunal recorrido declinou a existência da referida nulidade, referindo que “ Da referência feita pelos recorrentes nas suas alegações de recurso a presunções e ilações que o Tribunal pode tirar de um facto conhecido, pode concluir-se que a qualificação daquele facto como essencial não será jurídica. De facto, o que está em causa neste procedimento é o direito de propriedade e exclusivo conferido pelo registo da marca nacional n.º 410487 TÁXI, que assinala serviços de composição de música e produção de espectáculos, titulada por Requerentes e Requeridos, e não uma banda musical com determinados elementos em concreto. Nessa medida não é relevante apreciar se os membros da banda “Táxi” sempre tomaram decisões por unanimidade, nem se acordaram por unanimidade pôr termo á banda.
De todo o modo, independentemente da forma de deliberação usual, na sentença não se omitiu a pronúncia sobre o resultado da reunião dos quatro membros da banda Táxi havida em Novembro de 2010 e na qual os Requerentes alegavam ter sido decidido por unanimidade (“em comum acordo”) extinguir a banda. Com efeito, ponderando a prova produzida considerou indiciariamente provado que, no seguimento de divergências, num período em que pensaram retomar a carreira musical dos TÁXI, os quatro elementos da banda (que se mantinham os mesmos desde a sua formação) em reunião havida em 18.11.2010 acordaram em não o fazer.
Pese embora a distinção que deve ser feita entre a extinção da banda musical Táxi e o uso da marca nacional TAXI pelos seus titulares, independentemente do “modo de funcionamento instituído dos Táxi durante décadas” quanto à unanimidade acordada para a tomada de decisões, da análise da prova produzida o Tribunal considerou não provado que, na reunião realizada no dia 18.11.2010 Requerentes e Requeridos acordaram que a banda TÁXI apenas poderia voltar a actuar enquanto tal e sob a marca TAXI com a intervenção ou aprovação de todos os seus membros.
Em suma, afigura-se que, podendo os Requerentes impugnar a decisão sobre a matéria de facto, a sentença não é nula por omissão de pronúncia conforme alegam”.

Decidindo:

A respeito das nulidades da sentença, dispõe o artº 615 nº 1 do C.P.C. que esta enferma de nulidade, no que ao caso importa, quando:
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;”
Tratam os de vícios descritos neste preceito legal, que inquinam de nulidade da sentença, uns formais respeitantes à sua estrutura (alíneas b) e c) , outros aos seus limites (alíneas d) e e), cuja verificação afecta a sua validade.
Ora, a nulidade invocada está directamente relacionada com o artigo 608º, nº2, do Código de Processo Civil, segundo o qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.”
Neste circunspecto, há que distinguir entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos pelas partes.
A omissão de pronúncia como causa de nulidade da sentença, circunscreve-se às questões/pretensões formuladas de que o tribunal tenha o dever de conhecer para a decisão da causa e de que não haja conhecido, realidade esta distinta da invocação de um facto ou argumento pela parte sobre os quais o tribunal não se tenha pronunciado.
Com efeito, “o julgador não tem que analisar e apreciar todos os argumentos, todos os raciocínios, todas as razões jurídicas invocadas pelas partes em abono das suas posições. Por isso, como se disse no acórdão desta secção de 23.6.2004 (6) não pode falar-se em omissão de pronúncia quando o tribunal, ao apreciar a questão que lhe foi colocada, não toma em consideração um qualquer argumento alegado pelas partes no sentido de procedência ou improcedência da acção. O que importa é que o julgador conheça de todas as questões que lhe foram colocadas, excepto aquelas cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras.
(…)
A dificuldade está em saber o que deve entender-se por questões, para efeitos do disposto nos artigos 660, n.º 2 e 668, n.º 1, d), do CPC. A resposta tem de ser procurada na configuração que as partes deram ao litígio, levando em conta a causa de pedir, o pedido e as excepções invocadas pelo réu, o que vale por dizer que questões serão apenas, como se disse no já citado acórdão de 21.9.2005, "as questões de fundo, isto é, as que integram matéria decisória, tendo em conta a pretensão que se visa obter." Não serão os argumentos, as motivações produzidas pelas partes, mas sim os pontos de facto ou de direito relevantes no quadro do litígio, ou seja, os concernentes ao pedido, à causa de pedir e às excepções (vide acórdãos deste tribunal de 7.4.2005 e de 14.4.2005)” - Ac. do S.T.J. de 29/11/2005, Proc. nº 05S2137.
Volvendo ao caso concreto, não se verifica qualquer omissão de pronúncia pelo tribunal recorrido, tendo este apreciado todos as questões, sejam de facto, sejam de direito a submetidas à sua consideração.
Por outro lado, conforme expressamente considerado também pelos recorrentes, o facto invocado não constitui facto estruturante (essencial) da causa de pedir, mas quanto muito facto instrumental, relativamente à forma acordada de gestão e decisão correntes da vida da banda, que, na própria alegação dos recorrentes poderia, permitir “inferir o sentido do acordo que resultou da decisão de terminar a banda tomada em 18.11.2010” (conclusão V).
Este invocado acordo entre requerentes e requeridos, para extinguir esta banda, afirmava-se como facto essencial (na construção dos requerentes) da causa de pedir e sobre este ponto em concreto, pronunciou-se o tribunal recorrido no ponto 11 e no único facto não provado (considerando em sede de motivação que resultava da ausência de elementos de prova idóneos e suficientes a respeito do acordo havido (para além do que consta do ponto 11 da matéria de facto provada).
Tendo sido alegado que houve acordo na extinção da banda e em que posteriores actuações desta só poderiam ter lugar com a intervenção de todos ou com a aprovação de todos, e tendo o tribunal recorrido proferido decisão de facto sobre este ponto, em concreto, dando apenas como provado que tinha havido acordo em não retomar a carreira musical dos TÁXI – facto 11 – a suposta essencialidade do facto omitido é revelada no próprio recurso como instrumental à reapreciação do facto não provado nº 1 e da alteração pretendida para o facto provado nº 11, em adequação à versão pretendida pelos requerentes, e citamos a partir das conclusões do recurso: “a resposta do Tribunal à matéria de facto referente àquele que era o procedimento instituído entre Requerentes e Requeridos para a tomada de todas as decisões relativas à banda permitir-lhe-á inferir o sentido do acordo que resultou da decisão de terminar a banda tomada em 18.11.2010 no que concerne ao uso da marca TÁXI daí em diante, ou seja, a necessidade do autorização de todos os membros para o uso da marca TÁXI por alguns deles”.  
Ocorrendo esta nulidade apenas quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição dos pleiteantes, no caso em apreço, não existe qualquer omissão de pronúncia, sendo que a eventual desconformidade quanto à matéria de facto quer dada como assente, quer não considerada pelo tribunal recorrido, é fundamento próprio de recurso de reapreciação da matéria de facto, mas não constitui nulidade da sentença recorrida.
Aliás, o que os apelantes põem em causa, é a aquisição da matéria de facto e a interpretação e aplicação do direito a estes factos, pelo que, a ser incorrecta tal invocação, ocorrerá um erro de julgamento, não consubstanciador de qualquer nulidade.
Conclui-se pois que a sentença recorrida não enferma de nulidade.
*
DA REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Impetram ainda os apelantes a alteração da matéria de facto assente, discordando dos fundamentos de direito da mesma, de acordo com as suas conclusões recursórias.

b) Dos fundamentos de reapreciação da matéria de facto;

Pretendem os recorrentes a reapreciação da decisão proferida quanto ao facto não provado nº 1 “1. Na reunião realizada no dia 18.11.2010 Requerentes e Requeridos acordaram que a banda TÁXI apenas poderia voltar a actuar enquanto tal e sob a marca TAXI com a intervenção ou aprovação de todos os seus membros” e quanto ao facto provado nº 11 “No seguimento de divergências, num período em que pensaram retomar a carreira musical dos TÁXI, os quatro elementos da banda (que se mantinham os mesmos desde a sua formação) em reunião havida em 18.11.2010 acordaram em não o fazer”, estribando-se nas suas declarações de parte, reputando-as de credíveis, quer por si mesmas, tanto mais quanto não foram contrariadas por declarações de parte dos requeridos que optaram por não as prestar, quer enquanto foram consideradas credíveis pelo próprio tribunal recorrido para a prova do facto 12 (Os Requerentes não deram a sua autorização para que os Requeridos prosseguissem com a actividade da banda sob a marca TAXI sem a sua intervenção) quer finalmente em termos gerais, por apelo à consideração que deve ser dado a tal meio de prova. 
Quanto aos requisitos de reapreciação da matéria de facto, dispõe o artº 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, que:
«Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
No que toca à especificação dos meios probatórios, «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (Artigo 640º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil).
No que respeita à observância dos requisitos constantes do artº 640, após posições divergentes na nossa jurisprudência, o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a pronunciar-se no sentido de que «(…) enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.»[5]
Conforme refere o Ac. STJ. de 03.03.2016, Ana Luísa Geraldes, proc. nº 861/13.3TTVIS.C1.S, “O que verdadeiramente importa ao exercício do ónus de impugnação em sede de matéria de facto é que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham todos os requisitos que constam do art. 640º do Novo CPC.
A saber:
- A concretização dos pontos de facto incorrectamente julgados;
- A especificação dos meios probatórios que no entender do Recorrente impunham uma solução diversa;
- E a decisão alternativa que é pretendida.
Efectivamente, sendo as conclusões uma súmula e síntese da indicação dos fundamentos por que se deduz a impugnação relativa à matéria de facto, deixariam de ter esse cunho se a Recorrente tivesse que inserir e especificar detalhadamente, em sede conclusiva, todos os elementos que compõem a impugnação e que se mostram enunciados nas diversas alíneas do nº 1 do art. 640º do NCPC, com a repetição exaustiva da fundamentação desenvolvida ao longo do conteúdo das alegações.”
Quer no corpo das suas alegações, quer nas suas conclusões recursórias, os recorrentes satisfazem este ónus, pelo que nada obsta à apreciação do recurso nesta parte.
Apreciando o recurso, impugnam os recorrentes nas suas alegações e conclusões recursórias, a resposta dada pelo tribunal recorrido ao ponto 11 da matéria fáctica e subsequente único facto não apurado, fundamentando a sua discordância com o teor das declarações de parte, não contraditadas por outro meio de prova, declarações que reputam como meio de prova autónomo, auto-suficiente e credível, não desconsideradas aliás pelo tribunal recorrido.
Assim requerem que, em sede de reapreciação, dê este tribunal como provado que:
-“Requerentes e Requeridos, enquanto membros originários da banda TÁXI, sempre tomaram todas as decisões relativas à “vida” da banda por unanimidade.” (artº 19 do seu r.i.);
-altere a redacção do facto apurado nº 11 para “No seguimento de divergências, num período em que pensaram retomar a carreira musical dos TÁXI, os quatro elementos da banda (que se mantinham os mesmos desde a sua formação) em reunião havida em 18.11.2010 acordaram terminar com a banda”;
-dê como provado o facto não provado ou seja “Na reunião realizada no dia 18.11.2010 Requerentes e Requeridos acordaram que a banda TÁXI apenas poderia voltar a actuar enquanto tal e sob a marca TAXI com a intervenção ou aprovação de todos os seus membros.”
Posto isto, no que se reporta à reapreciação da matéria de facto, dispõe o artº 662º do Código de Processo Civil, que “1-A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem solução diversa.” e desde que do processo constem todos os elementos que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto posta em causa.
Como é sabido fixada a matéria de facto, através da regra da livre apreciação das provas, consagrada no artº 607 n.º 4 do Código de Processo Civil, esta é em princípio inalterável, só podendo ser alterada pela Relação nos casos previstos no artº 662º do Código de Processo Civil, onde se indicam as excepções à regra básica da imodificabilidade da decisão de facto.
Por outro lado, a impugnação da decisão quanto à matéria de facto não pode consistir numa mera reapreciação da convicção do julgador, mas antes na alegação de concretos meios de prova que não foram tidos em consideração pelo julgador ou pela alegação de que factos já assentes e os meios de prova produzidos, impunham conclusão diversa. (neste sentido vidé Acordão do Supremo Tribunal de 19/09/2006, relator Ribeiro de Almeida, Proc. nº 06ª2372).
Posto isto, o tribunal recorrido, fundamentou a sua decisão no que se reporta aos pontos 11 e ponto não provado, nos seguintes termos “os factos 11 e 12, o acordo das partes no que respeita ao não prosseguimento e ao facto da ausência de autorização, e as declarações dos Requerentes;” (…) “Quanto ao facto considerado não provado, resultou da ausência de elementos de prova idóneos e suficientes a respeito do acordo havido (para além do que consta do ponto 11 da matéria de facto provada).
Este tribunal procedeu ao exame dos documentos juntos aos autos e à audição de toda a prova, mormente das declarações de parte dos requerentes.
Ouvidas as declarações de parte do requerente RF, destas resultou que a banda sempre tomou as decisões relativas à vida da mesma, ou seja actuações, espectáculos, entrevistas, por unanimidade, que nesta reunião ocorrida em 18/11/10, ficou acordado que a banda Táxi, constituída desde o início pelos mesmo quatro elementos requerentes e requeridos, após várias divergências e desentendimentos (associados principalmente ao facto de terem descoberto que a marca Táxi estava apenas registada em nome do requerido Rui Taborda), se extinguia, razão pela qual os requeridos posteriormente e pretendendo continuar a actuar, o fizeram sob a designação “Os Porto” e que ele requerente foi inclusive convidado para tocar com eles mas nunca sob a designação “Táxi”.
Por seu turno, das declarações de parte do requerente FO, decorreu que os Táxi interromperam a sua actividade em 1989 (com intervenções muito pontuais nos anos seguintes), seguindo vidas profissionais distintas, que em 2006 foram convidados para um concerto na Casa da Música e, nessa sequência, decidiram retomar como banda, tendo combinado que para que não houvesse desentendimentos, a banda funcionasse/tomasse decisões sempre por unanimidade, o que ocorreu até 2010, ano em que, não tendo as coisas corrido como esperado (e como facto essencial de dissentimento o terem descoberto que a marca estava registada apenas no nome do Rui Taborda), reuniu em Outubro de 2010 com o requerido JC, tendo este comunicado ao declarante não pretender mais tocar com ele, razão pela qual devia sair desta banda, o que foi recusado pelo declarante.
Mais decorreu que, nessa sequência, foi convocada uma reunião com todos os elementos da banda, em 18/11/2010, na qual decidiram por um lado, pôr termo à banda, por outro que os requeridos pretendendo continuar a sua actividade, formariam nova banda, o que estes aliás fizeram.
A este respeito e quanto à credibilidade das declarações de parte e suficiência das mesmas (tendo ainda em conta que, em sede cautelar, a prova é indiciária), a questão colocada pelos requerentes é pertinente, tendo em conta que o tribunal recorrido fundamentou a sua convicção de forma muito parca, mesmo tendo em conta a natureza cautelar deste procedimento e a prova indiciária que neste é efectuada, invocando como fundamento para a sua convicção, por um lado as declarações dos requerentes, mas sem especificar os motivos da resposta restritiva dada ao facto nº11, por outro sem especificar os motivos da invocada ausência de “meios de prova idóneos e suficientes a respeito do acordo havido”, ou o porquê de os apresentados não serem idóneos nem suficientes[6].
Sendo certo que o ónus de prova deste facto (invocado acordo na reunião de 18/11/10) incumbia aos requerentes e que os meios de prova apresentados, para além do doc. 11 (não impugnado), se centravam única e exclusivamente nas declarações de parte, retira-se que a falta de suficiência e idoneidade, invocadas pelo tribunal recorrido, se referem no essencial às referidas declarações de parte.
Ora a este respeito, acompanha-se a alegação dos recorrentes, no sentido de que se não pode retirar relevância às declarações de parte, ou invocar a sua insuficiência e inidoneidade, porque provindas de quem tem interesse na causa, tendo em conta que o legislador o erigiu em meio de prova autónomo e sujeito à livre convicção do tribunal (artº 466 nº3 do C.P.C.) 
Sendo questão largamente debatida na nossa doutrina e jurisprudência, a respeito do valor probatório das declarações de parte e socorrendo-nos do bem fundamentado Ac. deste T.R.Lisboa de 26/04/17, relator Luís Filipe Sousa, proferido no Proc. nº 18591/15.0T8SNT.L1-7, no que tange à função e valoração das declarações de partes, são defendidas três teses essenciais, a saber:
“i.-Tese do caráter supletivo e vinculado à esfera restrita de conhecimento dos factos;
ii.-Tese do princípio de prova;
iii.-Tese da autossuficiência das declarações de parte.
No âmbito da primeira tese, (…) enfatiza-se a maior fragilidade deste meio de prova na demonstração dos factos, imputando-se às declarações de parte um valor autónomo e suficiente quanto a factualidade essencial que, segundo os articulados, apenas teve lugar entre as partes, sem a presença de terceiros intervenientes. [7]
A tese do princípio de prova defende que as declarações de parte não são suficientes para estabelecer, por si só, qualquer juízo de aceitabilidade final, podendo apenas coadjuvar a prova de um facto desde que em conjugação com outros elementos de prova.[8]
(…)
Para a terceira tese, pese embora as especificidades das declarações de parte, as mesmas podem estribar a convicção do juiz de forma autossuficiente.[9]
Desde já referimos que aderimos a esta última posição, em especial perante a alegação de factos que, por testemunhados apenas pelas partes, só por este meio podem ser provados (nomeadamente os termos de acordo havido em reunião em que apenas estiveram presentes as partes). Obviamente que, neste caso, poder-se-ia obstar que apenas foram vertidas as posições dos requerentes presentes nesta reunião e não as dos requeridos, que as não prestaram.
No entanto, não foi requerida a prestação de declarações de parte pelos requeridos nesta providência, sendo certo que o poderiam ter requerido nos termos do artº 466 do C.P.C., mormente para rebater o referido pelos requerentes (inquiridos no início da audiência final) quanto ao que se passou na referida reunião, nem foi determinado oficiosamente a sua audição, de forma a rebater eventuais dúvidas que surgissem no espírito do julgador sobre o teor desta reunião e os acordos dela resultantes (permitidos por via do artº 417 do C.P.C.).
Não é no entanto esta questão objecto deste recurso, sem prejuízo de o tribunal sempre poder lançar mão, se esclarecido não estiver, ou se vir necessidade de produção de outros meios de prova, do disposto no artº 662 nº2 a) e b) do C.P.C.
Assim sendo, temos que destas declarações resultaram três factos:
-o primeiro, que existiam divergências e desentendimentos entre os elementos da banda, até por questões profissionais alheias à mesma (relatados estes por Francisco Oliveira e relatados também estes desentendimentos pela testemunha Marco Azevedo);
-o segundo que os quatro elementos da banda Táxi, ao decidirem retomar a sua actividade em 2006, até por divergências existentes entre elementos da banda (em especial entre o requerente Francisco Oliveira e o requerido Rui Taborda), acordaram que as decisões relativas à vida da banda (entrevistas, actuações, espectáculos (televisivos ou outros), seriam tomadas por unanimidade, ou seja por acordo de todos;
-a terceira, que na reunião de 18/11/2010, face ao agravamento destes desentendimentos, os membros desta banda combinaram extinguir a banda designada “Táxi”, constituindo os elementos que desejassem prosseguir a sua vida artística, uma nova banda com outra denominação, sendo certo que nesse período os Táxi não estavam a pensar retomar a sua carreira musical (o que intentaram em 2006), mas sim terminá-la; 
Ora, não são estes inócuos para a decisão da causa, nem foram estas declarações contraditadas por qualquer outro meio de prova (documental ou testemunhal) e não podem, sem mais (sem qualquer explicação nem fundamentação), ser desconsideradas, ou parcialmente desconsideradas (sem que também se compreenda o porquê de apenas parcialmente serem desconsideradas), pelo tribunal recorrido, sendo certo que outros factos assentes, levam a concluir pela veracidade das mesmas, ou seja, que requeridos e requerentes nunca mais tocaram juntos, que os requeridos em 2013 constituíram uma nova banda e que, em 2017 ao decidirem retomar com o nome “TÁXI”, os requeridos não tenham, nem aleguem ter tido, qualquer contacto prévio com os requerentes para o efeito, não fazendo assim sentido a alegação de que “a actividade do grupo ficou suspensa” (artº 21 da oposição). Os factos posteriores demonstram o contrário, sendo certo que não foi intentado, à semelhança do que ocorrera previamente (em 2006), um retomar do grupo alegadamente “suspenso”.
Este “grupo”, a banda “Táxi”, constituído por estas pessoas, não ficou suspenso, terminou, extinguiu-se enquanto tal nesta reunião, sendo certo que não constitui esta diferença um preciosismo de linguagem, nem é absolutamente irrelevante esta distinção, nem está a mesma, efectuada pelo tribunal recorrido, assente em qualquer meio de prova, nem como tal foi aliás, justificada.
Por outro lado, não faz sentido a alegação dos requerentes de que ficou acordado que o grupo apenas poderia actuar com a intervenção e aprovação de todos os seus membros, pois que tal é contrária à tese de extinção da banda e não foi suportado pelas declarações das partes requerentes. O que estes afirmaram é que, pretendendo os demais seguir carreira musical, dar largas à sua criatividade, poderiam fazê-lo mas com outra denominação de grupo, sem que a manutenção do registo desta marca infira o contrário, tendo em conta a natureza dos direitos assegurados por esse mesmo registo.
 Assim sendo, acorda-se em alterar a matéria de facto adquirida pelo tribunal recorrido nos seguintes termos:
-adicionar à matéria de facto sob o nº 10-A o seguinte facto:“Requerentes e Requeridos, ao decidirem retomar a actividade da Banda Táxi em 2006, acordaram tomar todas as decisões relativas à “vida” da banda por unanimidade.”; (artº 19 do R.I.)
-alterar a redacção do facto apurado nº 11 para “No seguimento de divergências entre os elementos da banda, os quatro elementos da banda (que se mantinham os mesmos desde a sua formação) em reunião havida em 18.11.2010 acordaram extinguir a banda”; (artº 15º do R.I.)
No demais mantém-se inalterada a matéria de facto adquirida pela 1ª instância.
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FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
               
Passemos à apreciação dos fundamentos de direito do presente recurso, aqui invocados pelos Recorrentes no sentido de que ao caso se não aplicam as regras da compropriedade previstas nos artigos 1406º e seguintes do Código Civil.
Sustentam que, se do artigo 224º nº 1 do Código da Propriedade Industrial (CPI), o registo da marca confere ao seu titular o direito de propriedade e do exclusivo da marca para os produtos e serviços a que esta se destina e se de tal norma decorre pois um dever geral de abstenção de terceiros não titulares da marca a utilizarem, dela, por natureza, também decorre que se impeça que qualquer um dos seus contitulares a possa utilizar individualmente ou sem o consentimento dos demais.
Assim sucede, na sua perspectiva, porque tendo a marca a primordial função distintiva para o consumidor, tanto que o titular está obrigado a garantir o não uso enganoso da mesma por si ou por terceiro, isso não é possível se um dos contitulares a utilizar individualmente; porque tendo a marca uma função de garantia para o consumidor na manutenção das características do produto ou serviço, donde em última análise, “um carácter intuitu personae, no sentido em que assegura e está intimamente ligada a determinada proveniência”, a mesma garantia não é possível no caso de utilização individual; e finalmente porque tendo a marca “função publicitária que consiste na aptidão que o sinal distintivo tem para, junto dos consumidores, promover o conhecimento da sua existência a sua imagem e, a final, a sua comercialização, o seu consumo” que pode ser gravemente afectada por não ser possível a um dos contitulares assegurar a qualidade do produto ou serviço se outro proceder a uma utilização individual.
Em suma, as funções próprias da marca determinariam, pela sua especificidade e pelos fins com elas visados, a inaplicabilidade das regras da compropriedade, em obediência aliás ao que resulta do artigo 1303º do Código Civil.
Ilustram aliás os recorrentes esta impossibilidade elencando as seguintes hipóteses:
- se cada contitular pode utilizar a marca, a seu belo prazer, no limite poderíamos ter a utilização simultânea da marca TAXI em concertos, cartazes, CD’s de bandas diferentes, uma de reggae, outra de heavy metal, outra de música pimba, outra de música pop. E, estando em causa bens incorpóreos, cada diferente utilização tem efeitos que se prolongam no tempo e com repercussões que podem inutilizar, esgotar ou esvaziar a possibilidade de uso por outro contitular. Aliás, sendo a marca “notoriamente conhecida” ou até “de prestígio”, pode facilmente fazer-se ruir, com estrondo e por vias travessas, toda a construção teórico-prática do regime da propriedade industrial, em especial, quando a marca é ainda usada, em conjunto, por requerentes e requeridos, nas novas edições que estão à venda.
Numa segunda linha argumentativa contra a decisão recorrida, defendem ainda os recorrentes que, admitindo hipoteticamente que fossem aplicáveis as regras da compropriedade, resulta do nº 1 do artigo 1406º do Código Civil que só é possível o uso individual da coisa por cada comproprietário na medida em que o mesmo não prive os restantes contitulares do uso.
No caso concreto, o uso pelos recorridos priva o uso pelos recorrentes, na medida em que dele decorre um esvaziamento do direito ao exclusivo e concomitante ”implosão” da marca. Se os recorridos usarem a marca nos seus concertos ou obras artísticas, em termos práticos fica privado o uso da mesma marca pelos recorrentes.
De resto, apenas o uso conjunto da marca pelos seus contitulares ou o seu uso por apenas alguns, mas com a autorização de todos, protege os direitos de personalidade dos titulares da marca que, como os Requerentes, têm o seu nome e imagem, bem como o seu legado, intimamente ligados à marca.
Numa terceira linha, sustentam os recorrentes que o uso provado que os recorridos têm vindo a fazer - novos contratos para a realização de concertos sobre a designação TÁXI, integrando a banda dois outros elementos, com a gravação e edição de um novo single intitulado “Reality Show” – não constitui administração da coisa mas pelo contrário inovação (actos de inovação), transcendendo a esfera da gestão ordinária e afectando a forma como a marca é vista pelo público, pelo que estão sujeitos ao consentimento unânime de todos os contitulares.
Por fim, ao permitir a utilização da marca por dois outros elementos, quando actuam ou produzem ou editam músicas, os recorridos estão a conceder-lhes uma licença (não exclusiva) de utilização da marca, sendo que esse contrato de licença de utilização é acto de administração da marca comum, para o qual os recorridos não têm a maioria legalmente exigida.
Os recorridos sustentam que a interpretação propugnada pelos recorrentes, no sentido de conferir aos contitulares de uma marca o direito de propriedade e de uso exclusivo da marca em conjunto viola os direitos de propriedade e exclusivo que são conferidos pela lei a cada um dos contitulares da marca, que a propriedade da marca detida por dois ou mais titulares é expressamente admitida pelo art.º 5º, C) 3 da Convenção da União de Paris para Protecção da Propriedade Industrial, de 1883, e está sujeita ao regime da compropriedade previsto no CC, com as necessárias adaptações (art.º 1303.º, nº 2 CC), que na falta de indicação em contrário, as quotas dos quatro comproprietários se presumem quantitativamente iguais, que na falta de acordo sobre o uso da coisa comum a qualquer comproprietário é lícito servir-se dela, que não existindo um acordo relativo à administração da marca, a administração cabe, por igual, a todos os consortes, devendo as deliberações ser tomadas por uma maioria formada com observância de votarem no mesmo sentido mais de metade dos consortes e representarem esses, pelo menos, metade do valor total das quotas, sob pena de os actos de administração praticados contra a vontade maioritária dos titulares legalmente estabelecida serem anuláveis. Por isso, para deliberarem agora contra este uso da marca comum, os Requerentes teriam de reunir, cumulativamente, a maioria dos consortes e representar, pelo menos, metade do valor total das quotas em que a marca se encontra repartida.
Face aos argumentos esgrimidos pelos recorrentes e recorridos, cumpre-nos pois decidir se,
 
b) Se existe utilização abusiva do nome e marca TÁXI pelos requeridos, co-titulares da mesma;

Sobre esta matéria, versam, conforme apreciado pelo tribunal de recurso, as disposições cautelares previstas no CPI, aprovado pelo DL n.º 36/ 2003 de 05/03, que entrou em vigor no dia 01 de Julho de 2003, revogando o anterior CPI aprovado pelo DL n.º 16/95 de 24/01, sucessivamente alterado pelos DL n.º 318/2007 de 26/09, DL n.º360/2007 de 02/11, Lei n.º16/2008 de 01/04, DL n.º 143/2008 de 25/07, Lei n.º52/2008 de 28/08 e Lei n.º46/2011 de 24/06.
Estas disposições cautelares do CPI (e do CDADC) resultaram da transposição para o ordenamento jurídico nacional da Directiva 2004/48/CE, de 29-4-04, (Directiva de Enforcement), revelando-se até então, as disposições cautelares existentes insuficientes para satisfazer as imposições e objectivos da Directiva, tendo sido assim introduzido um preceito em cada um deste diplomas, com redacções praticamente idênticas (art. 338º-I do CPI e art. 210º-G do CDADC).
Neste contexto, até à entrada em vigor do novo regime, a tutela cautelar dos direitos de propriedade intelectual era feita essencialmente através de providências cautelares não especificadas, nos termos dos arts. 381º, nº 1 e 387º, nº 1, do CPC, não se estabelecendo qualquer distinção entre as situações em que a lesão ainda não ocorrera (lesão iminente) e aquelas em que a lesão já efectivada, prosseguia de forma repetida ou continuada.
Em qualquer dos casos a lei não dispensava a prova sumária da ocorrência de uma actuação susceptível de causar “lesão grave e dificilmente reparável” no direito do requerente.
Outra é a solução que resulta dos referidos arts. 338º-I do CPI (e art. 210º-G do CDADC), cuja redacção deixa claro que o legislador tutelou, como seria de esperar, situações caracterizadas pelo fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável nos direitos de propriedade intelectual (violações iminentes), a par das situações em que já tenha ocorrido violação e em que, continuando essa violação, se prescindiu da gravidade ou das dificuldades de reparação da lesão.
Nestes termos dispõe o artº 338.º-I do CPI que:
1 - Sempre que haja violação ou fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável do direito de propriedade industrial, pode o tribunal, a pedido do interessado, decretar as providências adequadas a:
a) Inibir qualquer violação iminente; ou
b) Proibir a continuação da violação.
2 - O tribunal exige que o requerente forneça os elementos de prova para demonstrar que é titular do direito de propriedade industrial, ou que está autorizado a utilizá-lo, e que se verifica ou está iminente uma violação.
3 - As providências previstas no n.º 1 podem também ser decretadas contra qualquer intermediário cujos serviços estejam a ser utilizados por terceiros para violar direitos de propriedade industrial.
4 - Pode o tribunal, oficiosamente ou a pedido do requerente, decretar uma sanção pecuniária compulsória com vista a assegurar a execução das providências previstas no n.º 1.
5 - Ao presente artigo é aplicável o disposto nos artigos 338.º-E a 338.º-G.
6 - A pedido da parte requerida, as providências decretadas a que se refere o n.º 1 podem ser substituídas por caução, sempre que esta, ouvido o requerente, se mostre adequada a assegurar a indemnização do titular.
7 - Na determinação das providências previstas neste artigo, deve o tribunal atender à natureza dos direitos de propriedade industrial, salvaguardando, nomeadamente, a possibilidade de o titular continuar a explorar, sem qualquer restrição, os seus direitos.”
Do elemento literal do n.º 1 do normativo transcrito “Sempre que haja violação ou fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável”, particularmente da disjunção alternativa “ou”, se conclui, que a previsão legal se desdobra em duas situações distintas: i) sempre que haja violação do direito de propriedade individual; ii) sempre que exista fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável.
Em suma, na primeira situação prevista, quando a lesão já se encontra concretizada, o decretamento das medidas cautelares não depende da apreciação da sua gravidade ou das dificuldades da sua reparação- Ac. do T.R.P de 26/11/2012, Processo nº 1194/11.5TYVNG-A.P1 e nosso Ac. proferido em 19/19/17, no Proc. nº 341/17.8YHLSB.L1.
Ora, “Nos termos do art.º 4.º, n.º2, do Código da Propriedade Industrial a concessão de direitos de propriedade industrial confere ao seu titular a presunção juris tantum dos requisitos da sua concessão. Para ser decretada a providência cautelar ao abrigo do disposto no art.º 338.º-I do Código da Propriedade Industrial, basta a requerente alegar e demonstrar, sumariamente, ser titular de um direito de propriedade industrial ou de autorização para o utilizar e a sua violação efetiva ou iminente”. (Ac. deste Tribunal da Relação de Lisboa, 6ª Secção de 26/01/2012, Proc. nº 3021/11.4T2SNT.L1-A-6)
Na linha do que vinha sucedendo com a legislação anterior, atribuiu-se ao registo natureza constitutiva, consagrando-se o princípio do registo como fonte do direito de marca, sendo através do registo que o interessado adquire o direito privativo da propriedade industrial que é o direito à marca.
Registada a marca, nos termos do disposto no artigo 224º nº 1 do Código da Propriedade Industrial, este registo confere ao seu titular o direito de propriedade e do exclusivo da marca para os produtos e serviços a que esta se destina.
Assim sendo, da matéria de facto adquirida pelo tribunal “ad quo” resulta que requerentes e requeridos são co-titulares do registo da marca nacional n.º 410487 TÁXI (sinal verbal), assinalando, na classe 41 da classificação internacional de Nice, serviços de composição de música e produção de espectáculos.
Posto isto, não estando questionado que requerentes e requeridos são co-titulares da marca nominativa “Táxi”, em causa está saber se os requeridos têm direito à utilização desta marca, sem acordo nem autorização dos demais co-titulares e se, existindo esse direito, em que medida pode ser exercido.
A este respeito, considerou a sentença recorrida que “Face ao que consta do registo, são quatro (os dois Requerentes e os dois Requeridos) os titulares da marca TÁXI, pluralidade de titulares que se subsume às regras da compropriedade estabelecidas no Código Civil visto a lei não prever regras particulares (arts. 1403.º e 1404.º do CC). No que respeita ao uso da coisa comum, estabelece o artigo 1406º do Código Civil que, na falta de acordo, é lícito a qualquer dos comproprietários servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito. No tocante à sua administração rege o artigo 1407º, que determina a aplicação, nesta matéria, do artigo 985º respeitante à administração da sociedade civil. Não havendo convenção dos comproprietários quanto às regras específicas por que deve reger-se a administração da coisa comum, a regra que emerge daqueles normativos é a de a administração caber, por igual, a todos os consortes, devendo as deliberações ser tomadas por maioria formada com observância de dois requisitos: votarem no mesmo sentido mais de metade dos consortes (nºs 3 e 4 do artigo 985º) e representarem estes, pelo menos, metade do valor total das quotas, sob pena de os actos de administração praticados contra a vontade maioritária dos titulares legalmente estabelecida serem anuláveis. A unanimidade é, porém,  exigida para os actos de disposição e de oneração da coisa comum ou, mesmo, de parte específica dela, como decorre do disposto no artigo 1408º nº 1 do Código Civil. No caso está em causa o uso pelos Requeridos da marca TÁXI (que não a sua administração: a marca está a ser usada por dois dos seus contitulares, da mesma forma e nos mesmos moldes que antes – mesmo antes de ter ser registada – era usada pelos quatro). Na ausência de qualquer acordo (que não resultou provado), temos que é lícito a qualquer comproprietário usar a marca, desde que a use para o fim a que a mesma se destina, e não prive os restantes comproprietários de a usarem também. O recurso ao regime legal da compropriedade sobre a coisa não pode no entanto fazer esquecer que a coisa é, no caso, um bem imaterial. A marca é um sinal distintivo dos produtos ou serviços comercializados por um empresário ou empresa e propostos ao consumidor, destinada a identificar a proveniência de um produto ou serviço. Daí que se afirme que a função essencial da marca é a função de “garantir aos consumidores a proveniência do produto ou serviço” (a chamada “função de indicação de origem”), ainda que possa complementarmente desempenhar outras funções, designadamente, a função de garantia da qualidade dos produtos e serviços e/ou as funções de comunicação, de investimento ou de publicidade3. Para além do direito de propriedade, o seu registo confere também ao titular, o direito de exclusivo sobre a marca para os produtos e serviços a que a mesma se destina. Este direito de exclusivo sobre a marca registada significa que o titular tem o direito de a usar e explorar economicamente para distinguir os produtos ou serviços a que se destina, com exclusão de terceiros. Nos termos do disposto no art. 257.º do CPI, o registo da marca confere ao seu titular o direito de impedir terceiros, sem o seu consentimento, de usar, no exercício de actividades económicas, qualquer sinal igual, ou semelhante, em produtos ou serviços idênticos ou afins daqueles para os quais a marca foi registada, e que, em consequência da semelhança entre os sinais e da afinidade dos produtos ou serviços, possa causar um risco de confusão, ou associação, no espírito do consumidor.
Sobre as funções da marca vide decisões do TJUE de 29-09-1997, C-39/97, “Canon”, parágrafo 28, de 18-06-2009, C487/07, “L’Oreal”, parágrafos 58-59 ou de 23-03-2010, C-236/08 a C-238/08, “Google França, parágrafos 75-79.
Ora, no caso, o titular do registo da marca TÁXI são os quatro, Requerentes e Requeridos; têm, todos, em partes iguais, o direito de propriedade e de exclusivo que o registo da marca confere; e têm, todos, em partes iguais, o direito que a contitularidade do registo da marca lhes confere, de impedir que terceiros usem sem o seu consentimento um sinal igual ou semelhante. Ocorre, no caso, que nem está em causa o uso de um sinal igual, nem por terceiros: é o uso da marca por dois dos seus co-titulares. E estando em causa o mero uso, que não por ex. o licenciamento ou transmissão da marca, os Requerentes não têm na sua esfera jurídica o direito de impedir o uso da marca pelos Requeridos. Sublinhe-se que nem os Requeridos terão o direito de impedir que os Requerentes façam o mesmo uso da marca TÁXI – o que não resultou sequer referido nos autos que aconteça. Os Requerentes têm o mesmo direito de propriedade e de exclusivo sobre a marca TÁXI que os Requeridos, podendo usá-la para distinguir serviços de composição de música e produção de espectáculos sem que careçam de autorização dos outros co-titulares. Nenhum dos co-titulares do registo, comproprietários da marca, pode impedir os outros de usar a marca e receber os proveitos que esse uso gerar (a marca é um bem imaterial mas com um valor económico, material), não tendo que aprovar, designadamente, a qualidade das músicas ou o grafismo que acompanha a edição de discos da banda musical que os Requeridos integram usando a marca TAXI. O uso é o gozo e fruição da coisa, no caso da marca. Não está tão pouco em causa um uso enganoso da marca TÁXI: esta distingue serviços de composição de música e produção de espectáculos e não resultou sequer indiciado que não seja usada - como no passado – para distinguir outros serviços. É que a marca em questão não distingue “a banda TÁXI” e menos com uma determinada composição, com os quatro elementos iniciais. Por outro lado, da matéria de facto que nesta sede resultou provada não resulta que os Requeridos se apresentem como os mesmos “TÁXI” dos anos 80/90 (os “TÁXI” da chiclet, cairo, vida de cão, são os quatro, Requerentes e Requeridos). A fotografia do cartaz do concerto referido no ponto 20. da matéria de facto foi retirada, a pedido (também) dos próprios Requeridos; e quanto aos textos publicados na comunicação e redes sociais, não são da sua responsabilidade.”
Ora, se se concorda com o quadro jurídico explanado na decisão recorrida, já não se aceitam as conclusões que deste são retirados, pois que ao contrário do invocado pela Srª Juíza recorrida, a assim atender-se, chegar-se-ia, como referem os recorrentes, a um autêntico esvaziamento da marca registada em nome dos quatro elementos da banda. 
Com efeito, a marca, em conjunto com outros, como a insígnia e o nome do estabelecimento, constitui sinal distintivo do comércio, integrando por isso os títulos de propriedade industrial, por esta, como tais, protegidos.
São sinais distintivos que servem para identificar o produto ou o serviço proposto ao consumidor (cfr. artº 222 do CPI) e, como tal têm diversas funções, sendo as mais relevantes a
i) Individualização de bens ou serviços e a sua diferenciação de outros da mesma espécie;
ii) Indicação da procedência ou proveniência dos bens ou serviços;
iii) Garantia ou indicação de qualidade;
iv) Fixação de clientela;
v) Instrumento publicitário.[10]
No entanto, conforme referido no Ac. desta relação de Lisboa de 25/05/2017, de que foi relatora Ondina Carmo Alves, Porc. nº 1818/11.4TBEVR.L1-2, “pese embora a atribuição à marca de uma multiplicidade de funções, complementares entre si, a função essencial da marca é permitir a identificação dos produtos ou serviços que designa e distingui-los de outros de origem diversa, permitindo também estabelecer uma relação entre esses produtos ou serviços e um determinado agente económico, independentemente da individualização concreta deste.”
Com efeito, a marca tem como função essencial distinguir e garantir que os produtos ou serviços se reportam a uma pessoa que assume em relação aos mesmos o ónus pelo seu uso não enganoso (função distintiva), uma função derivada de garantia indirecta de qualidade dos produtos ou serviços marcados por referência a uma origem não enganosa, e uma função complementar da função distintiva que é a de contribuir, por si mesma, para a promoção dos produtos ou serviços que assinala (função publicitária).
Em especial o ónus de uso não enganoso da marca, obriga o titular da marca a, sob a cominação da perda do seu direito, não permitir qualquer uso da marca, ainda que praticado por si (outro co-titular) ou terceiro, com o seu consentimento, susceptível de provocar um engano negativo relativo junto do público, em relação às características essenciais dos produtos ou serviços a que a marca se refere, sem que os consumidores tenham sido disso, prévia ou imediatamente, informados, sob pena de caducidade do registo da marca.[11]
Posto isto, tendo em vista estas funções atribuídas à marca, e se é certo que o direito à marca é um direito sobre um bem imaterial, é igualmente certo que a marca não existe dissociada do produto ou serviço que designa e em relação ao qual foi registada. E esta marca “TÁXI” foi registada para serviços de composição de música e produção de espectáculos, com vista a gozar da protecção conferida pelo CPI e mormente impedir que outros usassem e eventualmente registassem na mesma categoria o nome “Táxi”.

No entanto, este nome “Táxi” está associado a um grupo musical, vulgo banda, designada “Táxi”, existente desde o final dos anos 70 e com grande visibilidade nos anos 80, embora requerido o registo da marca apenas em 2007 repartido este em co-titularidade pelos quatro membros desta mesma banda, banda esta que sob esta designação, prestava os serviços abrangidos pela referida marca.
Posto isto, resulta do disposto no artº 316 do CPI que “a propriedade industrial tem as garantias estabelecidas por lei para a propriedade em geral”, sendo-lhe pois aplicáveis nos termos do disposto no artº 1303 do C.C., as disposições deste diploma legal, quando se harmonizam com a natureza daqueles direitos e não contrariem o regime para eles especialmente estabelecido.
Nestes termos é aplicável conforme refere a decisão recorrida, à co-titularidade da marca, o disposto no artº 1405 e 1406 e segs. do C.C., no que se reporta ao exercício dos direitos de uso e administração da coisa, ou seja, que na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos proprietários é lícito servir-se dela, contanto que não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito.   
No que se reporta à administração da coisa comum aplicam-se as regras previstas no artº 985 do C.C., ou seja maioria tomada por mais de metade dos administradores, desde que estes representem pelo menos metade das quotas.
Posto isto, dos factos assentes resulta que, pelo menos desde 2006 (sendo certo que esta marca foi registada apenas em 2007), os quatro titulares desta marca, acordaram na tomada de decisões relativas à vida da banda (músicas, espectáculos, entrevistas, etc) por unanimidade.
Ou seja, sendo esta marca co-titulada pelos quatro e constituindo estes uma banda que, desde o seu início (ainda antes do registo da marca), prestava estes serviços de composição de músicas, concertos, espectáculos, entrevistas etc., ligada esta à banda Táxi, conhecida do grande público como os “TÁXI”, ficou acordado que o uso e administração desta marca e produtos e serviços associados à mesma, apenas pelos quatro poderia ser feita.
Mas ainda que assim não fosse, trata-se esta de uma marca de grande notoriedade, conhecida do público em geral, em especial do nascido nos anos 60/70, conhecido como uma das bandas rock portuguesas mais importantes da década de 80, tendo actuado em Portugal mas também no estrangeiro, tornando-se uma das maiores “bandas rock” de Portugal, tendo sido o primeiro grupo de música rock a atingir o galardão de “Disco de Ouro”, com o seu primeiro LP de nome igual ao da banda.
Não são estes factos indiferentes, pois que, conforme referido pelos requerentes no seu R.I. e não impugnado pelos requeridos, é esta uma marca notória, com grande visibilidade, conhecida do público em geral, dos produtores, compositores e de todos os que actuam neste meio.[12]
É igualmente uma marca ligada a um grupo musical, banda, que prestava estes serviços, que obteve grande sucesso e que é ainda hoje recordada, como indissociavelmente ligada a estes sucessos musicais, como o são os membros desta banda, co-titulares da marca. Assim, ainda que se pudesse considerar que não existia qualquer tipo de acordo, quer na tomada de decisões respeitantes à composição de músicas e outras ligadas à produção de espectáculos, quer no sentido de pôr termo a esta banda, o certo é que, pela sua natureza e notoriedade, esta marca não pode ser usada indistintamente por cada um dos seus co-titulares, no sentido de que cada um deles pode, por si só e à revelia dos demais, compor músicas, produzir espectáculos, nomeadamente com outros elementos, não titulares da marca e apresentar-se perante o público como banda “Táxi”.
Aliás, mesmo em relação às marcas em geral, conforme se refere no Ac. desta R. Lisboa de 22/11/12, de que foi relatora Fernanda Isabel Pereira, Proc. nº 88/12.1TYLSB.L1-6, citando esta Carlos Fernández-Nóvoa[13], “o uso simultâneo e independente da marca por todos os consortes é problemático, porque um uso simultâneo e incontrolado da marca comum poderá desembocar em situações que comprometem as funções da marca e atentam contra os interesses dos consumidores. Pense-se, com efeito, que os diversos titulares poderão oferecer sob a marca comum produtos ou serviços de qualidade muito diferente, o que porá em perigo a função indicadora da qualidade e, em consequência, desorientará os consumidores. A fim de evitar estas situações, é preciso que no acordo relativo ao uso da marca pelos titulares se regulamente cuidadosamente o uso, adoptando – em cada caso – um sistema afim a uma pluralidade de licenças de marca territorialmente limitadas.”
Assim, é certo que, ainda que não definido o uso comum da marca, associando os consumidores à marca “Táxi”, uma banda “Táxi” que compunha a música e efectuava os espectáculos, bem como os sues sucessos, o seu percurso musical e os seus elementos (os mesmos desde a sua constituição há quase 40 anos), não pode qualquer um destes co-titulares apresentar-se, por si, ou com outra banda, sob a designação “Táxi”, pois que no mundo do espectáculo e da música, não existem, nem o consumidor espera que existam e co-existam, várias bandas/grupos musicais que, sob a mesma designação/marca, produzam os mesmos serviços.
Ao contrário de outras marcas respeitantes a outros produtos e serviços, que permitem aos seus titulares que produzam os referidos produtos (sejam eles sabões, vinhos ou outros), ou prestem serviços (sejam eles dentários, de cabeleireiro, ou de consultadoria) sob a mesma designação (marca), no campo da composição de músicas e produção de espectáculos, associado a uma banda/grupo musical, não é possível esta diversidade de usos da mesma marca.
Assim sendo, a constituição e actuação de uma banda composta pelos requeridos e por outros elementos, denominada Táxi, com novos temas e composições musicais, com actuação em espectáculos e concertos, apresentada ao público sob a designação “Táxi”, priva na prática os demais co-titulares do uso a que também têm direito (sendo perfeitamente irrelevante saber se os requerentes pretendem ou não actuar e de que forma, certo que ficaram privados de o fazer usando este mesmo nome).
É certo que se poderia igualmente considerar que o contrário é igualmente verdadeiro – podem os requerentes impedir o uso da marca pelos requeridos, ao não dar o seu acordo para a produção de espectáculos e composição de músicas. É litígio no entanto, nascido da situação de compropriedade e administração da coisa comum, que terá de ser dirimido noutra sede que não esta.
Por outro lado, a constituição de uma nova banda, composta por outros elementos não titulares da marca, mas que se apresentam e actuam com essa denominação “Táxi”, aparecendo em cartazes e anúncios e recebendo os proveitos dessa denominação, constitui uma cedência não autorizada, nem titulada, da marca a terceiros e pode constituir um uso enganoso dessa mesma marca perante o consumidor final, que identifica os “Taxi” com a banda “Táxi”, que sempre conheceu.
Não pode manter-se assim o decidido pelo tribunal recorrido, impondo-se a revogação desta decisão, na parte impugnada.
*
DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes desta relação em julgar parcialmente procedente a apelação, pelo que:
A- indeferem a arguição de nulidade;
B- deferem parcialmente a reapreciação da matéria de facto, aditando um novo facto com a designação 10-A e alterando a redacção do Facto nº 11;
C- revogam parcialmente a decisão recorrida, julgando parcialmente procedente o procedimento cautelar, determinando-se assim que os requeridos se abstenham de quaisquer actos de utilização do nome “TÁXI”, nomeadamente abstendo-se de realizar concertos ou qualquer outro tipo de performance sob essa designação, e de editar quaisquer novas obras artísticas sob a mesma designação, à revelia dos requerentes.
*
Fixam-se as custas pelos requerentes e requeridos na proporção do decaimento, sendo 10% para os primeiros e 90% para os segundos.

Lisboa 07/06/18

Cristina Neves

Manuel Rodrigues

Eduardo Petersen Silva) - vencido conforme declaração anexa                                          


Processo nº 433/17.3YHLSB.L1
Apelação

Declaração de voto vencido do relator:
Atenta a distância de raciocínio para a solução vencedora, não é possível ser sintético na formulação do presente voto. Pelo contrário, e a benefício de elucidação dum pensamento que se construiu passo a passo e plano a plano, assume maior utilidade consignar a parte discordante do projecto de acórdão elaborado pelo relator.
Assim, quanto à reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, o projecto de acórdão do relator ora vencido considerava:
“Trata-se portanto de saber se se deve alterar o facto não provado nº 1, aliás único, para provado, e se a redacção do facto provado nº 11 deve passar de “No seguimento de divergências, num período em que pensaram retomar a carreira musical dos TÁXI, os quatro elementos da banda (que se mantinham os mesmos desde a sua formação) em reunião havida em 18.11.2010 acordaram em não o fazer” para “No seguimento de divergências, num período em que pensaram retomar a carreira musical dos TÁXI, os quatro elementos da banda (que se mantinham os mesmos desde a sua formação) em reunião havida em 18.11.2010 acordaram terminar com a banda”.
Acresce que, independentemente da procedência ou improcedência da nulidade de sentença invocada, resulta ainda da conclusão XV que os recorrentes pretendem que se dê como provado que “Requerentes e Requeridos, enquanto membros originários da banda TÁXI, sempre tomaram todas as decisões relativas à “vida” da banda por unanimidade”.
Começa por dizer-se que estamos de acordo com as doutas considerações dos recorrentes a propósito do valor da prova por declarações de parte. Mas a questão não pode ser posta em termos gerais, como se em qualquer caso tal meio devesse determinar sempre que qualquer tribunal o credibilizasse ao ponto de passar tudo o que é declarado a facto provado. Naturalmente, enquanto meio de prova sujeito à livre apreciação do tribunal, deve concatenar-se com a restante prova produzida e portanto a valoração de determinada declaração de parte tem de ser feita em concreto.
Depois, dizer que não pode valorar-se negativamente o facto dos requeridos não terem eles mesmo oferecido as suas declarações de parte. Às partes compete a escolha dos meios de prova que entendem melhor adequados à sua defesa e não podem as mesmas ser censuradas por não terem oferecido determinado meio de prova. Não resulta dos autos que os requeridos tivessem pedido as suas próprias declarações e à boca de julgamento as tivessem retirado, como que a medo dum confronto, não resulta que esse confronto fosse desejado pelos requerentes – caso contrário teriam pedido o depoimento de parte dos requeridos – e nem sequer resulta, em abstracto, que seja estritamente necessário para habilitar o tribunal a decidir com plena consciência que um tal confronto haja de ter lugar perante si. Mas a verdade é também, em termos práticos, que se as declarações de parte são um meio privilegiado para provar o que se passou entre paredes, o tribunal não deixa de estar confrontado apenas com uma das versões do que se passou, e o meio mais óbvio é convocar a outra parte a depor, levando-a à confissão.
Dizer ainda, antes de passarmos à apreciação global da prova, ou melhor, à apreciação das declarações de parte concatenadas com todos os demais meios de prova produzidos, que salvo melhor opinião falece razão aos recorrentes quando sustentam uma atitude contraditória do tribunal recorrido – a constituir um notório erro – ao valorar as suas declarações de parte para o efeito do facto provado 12, dando-lhes portanto credibilidade, e ao desconsiderar as suas declarações de parte para o efeito do facto 11 e do facto não provado nº 1. Não se pode traçar abstractamente uma linha de inteira credibilidade quanto a qualquer depoimento, seja declaração de parte ou depoimento testemunhal, porque os depoimentos variam ao longo da sua duração de acordo com os conhecimentos revelados e naturalmente também de acordo com a certeza e a convicção com que são prestados, e que pode ser maior ou menor consoante os diversos aspectos que são focados.
E em bom rigor e quanto à contradição apontada ao tribunal recorrido, é nenhuma, na nossa modesta opinião, porque nem precisamos de ouvir a prova para perceber que os requerentes não deram autorização aos requeridos para continuar a fazer concertos como TÁXI, porque doutro modo nem sequer teria sido intentado o presente procedimento cautelar. De resto, a falta de autorização consta afirmada nos documentos 15 a 17 com o requerimento inicial – comunicações aos requeridos e à Porto Lazer – e não foi expressamente referida pelos requerentes nas suas declarações de parte (RF e HO falaram na verdade mais sobre a surpresa e o desagrado de “terem voltado à estrada” por mão dos requeridos).
Começando pela pretensão de aditamento da regra de unanimidade adoptada por todos os elementos da banda, por acordo, em todas as decisões tomadas ao longo e a propósito da “vida” da banda, salientemos que RF nada disse, e HO o afirmou claramente a partir da retomada de 2006, referindo que propôs, para que não houvessem zangas, que tudo fosse decidido por unanimidade, ao que lhe responderam “claro que sim”. Mas este “claro que sim” foi dito não como enfático mas como “dito para agradar”, “dito para passar adiante”, dito para “não confrontar”. Das declarações de Henrique Oliveira, todavia, logo resulta que nada sabemos para trás de 2006, excepto que todos eram amigos desde os 13 anos de idade, ou pelo menos HO refere o conhecimento a partir dos 13 anos de idade, sendo certo que a maior actividade da banda se dá precisamente muitos anos antes de 2006. É absolutamente indiferente que no contrato da Polygram os 4 elementos sejam designados por “o Artista”, como se fossem só um, em termos de revelar que sempre as decisões na vida do grupo haviam sido tomadas por unanimidade. Depois, a regra da unanimidade é, em si, clara, mas todas as decisões relativas à “vida” da banda já apresentam um grau de generalidade tão extenso que deixam o tribunal com bastante pouco chão para decidir (factos concretos, digamos). Finalmente, verificado o documento 11 com o requerimento inicial, não vemos, salvo melhor opinião, que do impedimento de HO em participar dum concerto na SIC resulte, por via da opinião de Rodrigo de que não faz sentido aparecer na televisão sem os quatro membros, apoiada depois pelos outros membros, que sempre todas as decisões na vida da banda tenham sido tomadas por unanimidade, ou sequer que esta decisão de não fazer o concerto na SIC tenha sido ela mesma resultado duma regra de unanimidade, até porque é HO ele mesmo quem escreve que estando impedido em filmagens durante vários dias, será Canigio quem fará os concertos, e que após o impedimento voltará Henrique à actividade: ou seja, Henrique não disse: “não se faça o concerto na SIC sem mim”, donde “não fazer este concerto” não foi afinal decisão tomada por todos os 4 em unanimidade.
Entende-se portanto que não se pode dar como provado que “Requerentes e Requeridos, enquanto membros originários da banda TÁXI, sempre tomaram todas as decisões relativas à “vida” da banda por unanimidade”.
Que se passou na reunião de Novembro de 2010?
No seguimento de divergências, num período em que pensaram retomar a carreira musical dos TÁXI, os quatro elementos da banda (que se mantinham os mesmos desde a sua formação) em reunião havida em 18.11.2010 acordaram terminar com a banda” (versão proposta da alteração ao facto 11) e na mesma reunião acordaram ainda que “a banda TÁXI apenas poderia voltar a actuar enquanto tal e sob a marca TAXI com a intervenção ou aprovação de todos os seus membros” (facto não provado 1)? É esta a pretensão de facto dos recorrentes.
RF disse que sim, mas mais em concreto que “depreendeu” que foi isso que tinha sido acordado. Ora, depreendeu, já significa que o que foi dito não foi dito de forma expressa. As declarações de Henrique foram claras, encadeadas, a partir do historial que descreveu, pormenorizadas, e portanto coerentes. Henrique foi muito claro, no sentido de pormenorizado, referências em discurso directo, ao que se passou na reunião em que confrontou Rui com o facto do registo da marca estar apenas em nome dele. Quanto à reunião de Novembro, Henrique declarou que João – no seguimento da conversa de café anteriormente tida consigo, em que lhe havia dito que não queria mais tocar com ele e lhe havia dito para ele (Henrique) sair da banda, ao que este não houvera acedido e antes sugerira que João prosseguisse com nova banda e este dissera que era boa ideia – disse que não queria tocar mais com ele (Henrique) e literalmente que “Os TÁXI acabam aqui e agora”, no que todos concordaram, acrescentando que como sempre tinham concordado, nunca haviam, nem nesta ocasião também o fizeram, passado o acordo a escrito.
Em concreto, Henrique nada disse sobre se na mesma reunião os quatro haviam acordado que apesar, dizemos nós, de os Táxi acabarem ali e naquela altura, poderiam os Táxi voltar a actuar se os quatro tivessem intervenção ou conquanto aprovassem. Até podíamos chegar ao acordo implícito sobre a possibilidade duma actuação futura dos quatro, sobre a eventualidade dum reatamento, em simples decorrência natural do que é evolução das coisas, mas sem referência expressa não podemos dizer que efectivamente, na referida reunião, foi abordada, dita, acordada, a regra de que actuações futuras tinham de estar submetidas à aprovação de todos.
Mas vejamos melhor. Houve erro notório por parte do tribunal recorrido ao considerar esta prova (declarações de parte) insuficiente?
Salvo o devido respeito, não. É o próprio Henrique que autoriza uma dúvida: - primeiro, passado o tempo de grande actividade, com o correr das vidas de todos, afazeres profissionais e familiares, houve naturalmente uma cessação de actividade. E eventualmente teria sido definitiva se não tivessem sido convidados em 2006 para o concerto na Casa da Música, onde o prazer se renovou e a perspectiva de retomarem actividade agradou a todos – portanto, o que nos autoriza a pensar que 2010 não fosse igual a 1989? O agravamento das dissensões, a descoberta do registo em nome individual? Mas então não tinha havido um problema sério entre Henrique e Rui, na empresa que ambos formaram e não se prolongou para as posteriores empresas de cada um, tendo sempre ficado, a partir de então, uma situação esquisita entre ambos, que todavia não impediu a retomada de 2006? Segundo, esta situação um bocadinho esquisita, que afinal é retomada no, ainda que eventualmente maledicente e manipulador depoimento de Marco quando explica a diferença económica entre Henrique e Rui e as dívidas deste para aquele, e João a pôr-se ao lado de Rui (por partilhar dos mesmos valores morais, trecho em que a manipulação parece ressurgir, talvez apenas por vingança, porque não se consegue descortinar a persistência de qualquer interesse – económico – de Marco no desfecho da acção), esta situação um bocadinho esquisita, dizíamos, não é ela mesma, ao menos em teoria, razão para que o tribunal considere que Henrique poderá não estar a dizer a verdade?
E Rodrigo? Quando é Hugo que, apesar de pertencer agora à banda, diz que ensaiou e ensaiou com Rodrigo, e afirma claramente que este mente quando refere ao tribunal que foi contactado para continuar mas que ao aperceber-se de que era para continuar como TAXI recusou? E se Hugo tem razão nesses ensaios, isto é, na persistência do trabalho de Rodrigo na banda após o suposto fim da banda, então Rodrigo não terá mentido a Henrique, de modo que não seja verdade o que este diz sobre Rodrigo não ter aceitado continuar na banda? E se Rodrigo continuou, então como é que depreendeu da reunião de Novembro de 2010 que a banda tinha acabado? E será que foi mesmo dito nessa reunião que os TAXI acabavam ali e naquela altura, quando três dias depois Rodrigo é convidado para continuar na banda (aliás em coerência com o suposto propósito inicial de afastar Henrique) e aparentemente até continuou, mesmo sabendo, e Hugo é completamente peremptório, que a banda era TAXI, sempre TAXI? E esta situação um bocadinho esquisita, aproveite-se o termo, entre Rodrigo e Henrique, não resultará de Rodrigo afinal ser empregado de Henrique (depoimento de Marco)?
E se é afirmado que a regra terá sido sempre a da inconstância, a de nunca haver certezas, o tribunal, além de dever descartar esta colagem de inconstância à própria essência dos criadores deste género musical, tem para si como razoável probabilidade a duma decisão definitiva na reunião de Novembro? Parece que não.
Em suma, entendemos que a concatenação das declarações de parte de Rodrigo e Henrique com os demais meios de prova autorizam efectivamente dúvida razoável sobre a suficiência dessas declarações para a prova quer do facto 1 não provado, quer duma alteração à versão dada como provada relativamente ao facto 11.
Nestes termos, improcede a pretendida alteração da decisão sobre a matéria de facto”.
O mesmo projecto de acórdão do relator ora vencido considerava, quanto à questão terceira do recurso:
“Em face da não alteração da decisão sobre a matéria de facto, ficam prejudicadas as conclusões do recurso que se apoiam na existência de um acordo em contrário à aplicação das regras da compropriedade.
(…)
Em resumo, não são aplicáveis as regras da compropriedade porque adversas à natureza e correspondente especificidade legal sobre a marca? São aplicáveis mas a actuação dos recorridos priva os recorrentes do uso da coisa? São aplicáveis mas os actos que os recorridos têm praticado não são actos de administração mas de inovação e carecem do consentimento de todos os contitulares? São aplicáveis mas a concessão de licença a terceiros que agora integram a banda carecia de maioria administrativa que os recorridos não tinham?

Atentemos. A decisão recorrida, em matéria de direito, estabeleceu que:
(…)
Assim sendo, no caso concreto, para a obtenção de uma tutela cautelar do direito alegado, os Requerentes apenas têm de demonstrar, para além do tradicional fumu boni iuris, ou seja, a probabilidade séria da existência do direito, a violação deste e perigo de continuação de tal violação”. (fim de citação).

O segmento em causa não é questionado quer pelos recorrentes quer pelos recorridos. Na verdade, a decisão recorrida concluiu que os requerentes não tinham demonstrado sumariamente a existência do direito, e é disso que estes recorrem.
Por isso, aparentemente, o objecto do recurso – no primeiro aspecto em que se desdobra esta terceira questão – resume-se a saber se os recorrentes têm o direito à utilização apenas conjunta ou mediante autorização de todos, no caso da contitularidade de marca (isto porque, naturalmente, não está em causa o primeiro segmento lógico: - são contitulares, são nessa medida titulares, e por isso cada contitular tem direito à marca e à sua utilização).
Ora, o ponto de resolução é o artigo 1303º do Código Civil, segundo o qual:
“1. Os direitos de autor e a propriedade industrial estão sujeitos a legislação especial.
2. São, todavia, subsidiariamente aplicáveis aos direitos de autor e à propriedade industrial as disposições deste código, quando se harmonizem com a natureza daqueles direitos e não contrariem o regime para eles especialmente estabelecido”, justamente nesta parte final do nº 2, perguntando-se se as normas que regem a compropriedade – e designadamente o artigo 1406º nº 1 do Código Civil que estipula que “Na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito” – se harmonizam com a natureza daqueles direitos e não contrariam o regime para eles especialmente estabelecido, estando também adquirido entre as partes que não havendo convenção em sentido diverso, as quotas de cada um dos quatro contitulares são iguais.
               
Voltemos a atentar. A função dos tribunais não é a de dizer o direito mas a de o aplicar ao caso concreto, ou seja, a de dirimir um conflito ou a de estabelecer um interesse atendível, no caso da jurisdição voluntária. Pressuposto lógico desta função é a interpretação do direito, como é claro, mas a interpretação não vale por si, não é o fim do processo.
Quando perguntamos se o uso individual dum contitular da marca é desarmónico com a natureza da marca, do direito à marca, a resposta não pode ser sim nem não, sob pena duma dicção em resultado dum exercício abstracto de raciocínio em operação de cultura jurídica. Ou seja, não podemos responder.
Só podemos responder quando no raciocínio ponderamos factores concretos – e isto, em processo, significa factos concretos provados.
A que nível de concretização chegamos no caso dos autos? À marca relativa à criação musical e à produção de espectáculos que porta o nome – de facto – duma banda musical que alcançou grande sucesso.
E então podemos perguntar: no caso duma marca relativa à criação musical e à produção de espectáculos que porta o nome duma banda musical grandemente sucedida, a utilização individual dum contitular da mesma marca é desarmónica com a natureza do direito à marca?
Podemos responder, ou não será que a nossa resposta é afinal a definição duma regra jurídica abstracta, com um grau de abstracção menor do que o que corresponde, em teoria, à definição conceptual da norma jurídica legal, que estabelece – e não esqueçamos o valor da jurisprudência em tempos de tecnologia de informação – que no caso das bandas musicais de sucesso, em que o direito à marca pertence aos elementos da banda, não pode (ou pode, conforme a resposta) haver utilização individual?
A estas preocupações haverá de responder-se: - a decisão tem de basear-se em factos concretos, isto é, entre os factos provados, temos de encontrar matéria que nos permita dizer que no caso concreto a utilização por dois contitulares, desacompanhados dos restantes dois contitulares e sem autorização destes, é desarmónica ou harmónica com a natureza do direito à marca.

No rigor dos rigores de lógica formal, a primeira sub-questão desta terceira questão - não são aplicáveis as regras da compropriedade porque adversas à natureza e correspondente especificidade legal sobre a marca contitulada – não pode ser respondida pelo tribunal.
Mas porquê?
Porque, quando pensamos na função distintiva da marca, na função de garantia da marca e na função publicitária da marca, num caso em que há quatro titulares com quotas iguais, chegaremos sempre à resposta – e os ostracistas da criatividade dos tribunais que nos perdoem – “nim”. E “nim” não é não, o não em que intervêm razões de interesse público que derroguem o princípio da liberdade que é base de todo o direito civil, no afloramento que o artigo 405º do Código Civil nos traz.
Mas “nim” porquê?
A marca referencia, neste caso, um serviço, pelas suas características específicas, distingue-o de outros serviços, distingue-o de outros serviços similares. No caso, a criação musical e a produção de espectáculos. Ora, vindo ao mundo uma nova música com a marca TÁXI, porém criada apenas por dois dos contitulares, ora, sendo dado um novo espectáculo musical com a marca TÁXI, nas mesmas circunstâncias, podemos dizer que a origem, mais concretamente, a autoria que é a sua específica distinção, não é a mesma? Sim e não. Sim a 50%, não a 50%.
O consumidor é enganado, há frustração da garantia da marca TÁXI aposta à nova música ou espectáculo? Mesma resposta.
Mas talvez menos: porque no caso da criação de música e da produção de espectáculos musicais, como de resto no caso de qualquer criação ou manifestação artística, a mudança, melhor ainda, a evolução é absoluta decorrência da natureza, da natureza humana e da natureza especificamente artística. Não se nasce artista, faz-se artista. A produção artística, por necessário, procede do trabalho de sensibilidade ao mundo e nesse mundo, para esse mundo, entra o próprio trabalho produzido. O pianista prodígio aos 5 anos de idade nada será se não continuar a tocar, e o que for aos 50, é o produto puro da sua evolução pessoal e sobretudo da sua evolução enquanto instrumentista. Por isso, do ponto de vista do consumidor não há uma pretensão legítima de que o novo concerto dos TÁXI seja igual ao concerto que deram há 30 anos.
E voltando à função anterior e à resposta sim e não, a pura verdade é que um artista o é na medida em que o foi, aquilo que faz hoje é, além do mais, produto do que fez antes – nem que seja na decisão de totalmente rejeitar o anterior – e portanto os dois contitulares que se apresentam em palco são os mesmos artistas.
E quanto à função publicitária? Ela interessa evidentemente ao produtor na sua capacidade de colocar o produto no mercado. Não há, em matéria artística, em matéria do artista, como rejeitar o passado – a própria decisão de rejeição que acima aflorámos é feita a partir do conhecimento do passado, não pode ser feita sem ele. Isto aliás é uma regra geral para os humanos. Somos o resultado do que fizemos antes. Portanto, estes dois contitulares, que se fizeram artistas enquanto TAXI, quando se apresentam como TAXI aproveitam, em inteira legitimidade do aproveitamento, por quem quer que seja, do seu passado, do seu passado constituinte, o mais profundo ou o mais verdadeiro da sua essência enquanto artistas. Fomos TÁXI, não há como deixar de sê-lo, se entramos em palco agora é assim como somos, isto é, em resultado do que fomos.
               
Mas tudo isto, senhores juízes, se pode dizer exactamente dos outros dois contitulares!
Sem dúvida, em abstracto, as posições dos recorrentes e dos recorridos podem, na sua inversão, ser sempre respondidas afirmativamente.
Mas aí a questão é que temos de ir aos factos concretos: - estes outros dois contitulares não (comprovadamente) estão a criar novas músicas e a produzir novos espectáculos. Nem mesmo, em termos de factos provados, estão a pretender, a dar um qualquer primeiro passo, para criar novas músicas ou realizar novos espectáculos.
Dir-se-ia, diz-se, por isso, que o estão a fazer nestes autos é a exercer o seu direito de propriedade contra o direito de criação artística. E, no conflito entre estes dois direitos constitucionalmente garantidos, nos termos dos artigos 42º e 62º da Constituição da República Portuguesa, é o próprio texto que ressalva, no último caso, limitações à propriedade privada e não estabelece, no texto do primeiro, a previsão de limitação. De resto, possivelmente, porque é mais prestimoso à sobrevivência da sociedade a liberdade de criação que funciona afinal como garante da inventiva necessária à apropriação privada, no quadro da expansão dos limites das possibilidades de aproveitamento económico. Traduzindo: não tivessem inventado o automóvel não haveria direito às marcas respectivas nem à exploração económica delas.
               
Entendemos portanto que não está demonstrada a desarmonia entre o exercício individual de um contitular e a natureza da marca.

Mas assim autorizam que haja duas bandas, ou quatro, a – estendendo os limites da argumentação recursiva – darem dois ou quatro concertos à mesma hora, no mesmo dia, na mesma cidade, todos usando a marca TÁXI, e ainda conseguem dizer que isto não esvazia completamente a marca?
Não conseguimos.
Então não é isto razão suficiente para decretarem a providência, em decorrência de concluírem que não é possível o uso individual no caso da contitularidade de marca notória ou de grande prestígio referente a serviços de criação musical e produção de espectáculos?
Voltamos a dizer: não, porque esta última afirmação corresponde à dicção duma norma abstracta e a função do tribunal não é essa. Não, porque não está demonstrado nos autos em termos de factos provados que existam duas ou quatro bandas a criarem músicas e a produzirem espectáculos com a mesma marca, nem está sequer demonstrado que exista intenção dos recorrentes em criarem músicas e produzirem espectáculos.
E, aquilo que nos pedem é que impeçamos os recorridos de criarem músicas e produzirem espectáculos com a marca TÁXI, não porque os recorrentes também o estejam ou pretendam fazer, com iminente risco de esvaziamento da marca, mas simplesmente porque são contitulares da marca.

Mas, última nota, a marca aqui não está intimamente ligada aos direitos de personalidade? Até pode estar, mas na medida em que dois dos artistas anteriores continuam a apresentar-se, a personalidade deles continua a ser respeitada. E a dos outros? Para isso era preciso demonstrar, e não foi feita essa demonstração, que a qualidade musical actual era verdadeiramente ofensiva da criação cultural conjunta antes realizada.

Na sub-questão seguinte, a da privação do uso, sem discurso sobre o nível de resolução abstracta ou concreta, é manifesto que temos de ir aos factos provados, e neles, repete-se, nada se encontra sobre a privação de uso. O que existe é uma afirmação teórica, abstracta, de que se os recorridos estão a criar música TÁXI e a dar concertos TÁXI, os recorrentes não o poderão fazer. Mas tentaram? Há algum facto provado sobre terem negociado um concerto e ter-lhes sido recusado porque já tinha sido negociado um concerto com os “outros” TÁXI? Quiseram editar um disco de músicas novas e foi-lhes negado? Pensaram reunir-se para compor uma música nova mas desistiram porque algum editor lhes disse que não editaria?
               
A criação de novas músicas e a produção de novos espectáculos sob a marca, não é um acto de administração mas de inovação que carece de aprovação maioritária? Com o devido respeito, não vamos discorrer teoricamente sobre actos de administração, e vamos apenas relembrar o que já dissemos sobre a natureza da criação artística, sobre a natureza processual inerente a qualquer criação artística. Se a marca se refere à criação de música, é evidente que a música a criar tem de ser nova em relação à música já criada ao abrigo da mesma marca, sob pena da marca se referir não à criação mas à repetição de música. O mesmo vale para os espectáculos, ao que aliás se soma a passagem do tempo, o espectáculo de hoje não será seguramente igual ao de há 30 anos, salvo se tiverem encontrado o elixir da eterna juventude. Isto é, a marca em si, no que protege, protege precisamente a inovação, e não apenas a tradição. Sob pena da possibilidade de contratação de concertos diminuir bastante, caso optassem por tocar sempre as mesmas músicas e se apresentassem em palco sempre da mesma maneira, com os mesmos instrumentos, as mesmas luzes, as mesmas roupas.

Finalmente, a questão da concessão de licença de utilização aos novos membros da banda.
A primeira nota é que estamos perante uma questão nova, de carácter não oficioso, a qual os tribunais de recurso, por via do artigo 627º do CPC, estão impedidos de conhecer. Com efeito, no requerimento inicial não foi invocada esta questão.
A segunda é a de que a providência requerida não tem qualquer relação com a anulabilidade da decisão de concessão de licença de utilização da marca nem é apresentada como dependência de uma futura acção de anulação.
Por esta razão, mesmo que a questão não fosse nova, também não procederia.

Em conclusão, entende-se que falece razão aos recorrentes nesta terceira questão, e que em consequência improcede o recurso na sua totalidade”.


Lisboa, 7 de Junho de 2018

Eduardo Petersen Silva

Processado por meios informáticos e revisto pelo subscritor

[1] Sem texto
[2] Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pp. 84-85.
[3] Abrantes Geraldes, Op. Cit., p. 87.
Conforme se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.7.2016, Gonçalves Rocha, 156/12, «Efetivamente, e como é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na Jurisprudência, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação». No mesmo sentido, cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4.10.2007, Simas Santos, 07P2433, de 9.4.2015, Silva Miguel, 353/13.
[4] Cartaz constante dos autos e reproduzido na matéria de facto que por adquirido se dispensa a sua reprodução.
[5] Ac. STJ de 01.10.2015, P. 824/11.3TTLRS.L1.S1, Ana Luísa Geraldes; Ac. STJ de 14.01.2016, P. n.º 326/14.6TTCBR.C1.S1, Mário Belo Morgado; Ac. STJ de 11.02.2016, P. n.º 157/12.8TUGMR.G1.S1, Mário Belo Morgado; Ac. STJ, datado de 19/2/2015, P. nº 299/05, Tomé Gomes; Ac. STJ de 22.09.2015, P. 29/12.6TBFAF.G1.S1, 6ª Secção, Pinto de Almeida; Ac. STJ, datado de 29/09/2015, P. nº 233/09, Lopes do Rego; Acórdão de 31.5.2016, Garcia Calejo, 1572/12; Acórdão de 11.4.2016, Ana Luísa Geraldes, 449/410; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27.1.2015, Clara Sottomayor, 1060/07.
[6] Não se vendo, no entanto, utilidade no recurso ao disposto no artº 662 nº2 d) do C.P.C.
[7] Neste sentido vidé Lebre de Freitas, A Ação Declarativa Comum, À Luz do Processo Civil de 2013, Coimbra Editora, 2013, p. 278 e Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, Almedina, 2014, p. 357.
[8] Neste sentido vidé na doutrina, Carolina Henriques Martins, Declarações de Parte, Universidade de Coimbra, 2015, p. 58; na jurisprudência Ac. do T.R.P. de 20.11.2014 e de 17.12.2014, relator Pedro Martins, Procs nº 1878/11, e nº 2952/12; Ac. do T.R.P. de 26.6.2014 e 30/06/14, relator António José Ramos, Procs nº 216/11 e nº 46/13, www.colectaneadejurisprudencia.com.; Ac. do T.R.P. de 17.12.2014, relator Pinto dos Santos, proc. nº 8181/11; Ac. do T.R.P. de 23.3.2015, relator Eusébio Almeida, Proc nº 1002/10; Ac. T.R.P. de 20.6.2016, relator Manuel Fernandes, Proc. nº 2050/14 e Ac. do T.R.L. de 13.10.2016, relatora Ondina Alves, Proc. nº 640/13, disponíveis in www.dgsi.pt
[9] Na doutrina Catarina Gomes Pedra, A Prova por Declarações das Partes no Novo Código de Processo Civil. Em Busca da Verdade Material no Processo, Escola de Direito, Universidade do Minho, 2014, p. 145; Mariana Fidalgo, A Prova por Declarações de Parte, FDUL, 2015, p. 80; Luis Filipe Sousa, Prova Testemunhal, Almedina, 2013, pp. 300-302; na jurisprudência Ac. citado do T.R.Lisboa de 26/04/17, relator Luís Filipe Sousa, proferido no Proc. nº 18591/15.0T8SNT.L1-7, disponível in www.dgsi.pt
[10] Pedro Sousa e Silva, O princípio da especialidade das marcas, a regra e a excepção: As marcas de grande prestígio, ROA, ano 58, Jan. 98, 378-440
[11] Ac. do T.R.L de 05/05/11, Vaz Gomes, proc. nº 975/09.4TYLSB-A.L1-2, disponível in www.dgsi.pt.
[12] Na definição de Couto Gonçalves, in “Manual de Direito Industrial”, pág. 304: “marca notoriamente conhecida é entendida como a marca conhecida de uma grande parte do público consumidor como a que distingue de uma forma imediata um determinado produto ou serviço. Uma forte corrente doutrinária e jurisprudencial distingue ainda duas hipóteses: se o produto ou o ou serviço for de consumo específico, a marca deve ser conhecida de grande parte do público interessado nesse produto ou serviço.
A marca notoriamente conhecida deve ser notória no país onde se solicita a especial protecção – pois é nele que, obviamente, se haverá de dirimir o conflito entre a marca a registar e a marca notoriamente conhecida – embora não careça de nele ser usada de modo efectivo.”; sob a natureza de marca notória e de prestígio vidé ainda Ac. do S.T.J. de 13/07/10, relator Fonseca Ramos, Proc. nº 3/05.9TYLSB.P1.S1,
www.dgsi.pt
[13] Tratado sobre Derecho de Marcas, segunda edición, Gomez-Acebo Pombo, Abogados, Marcial Pons, Ediciones Jurídicas y Sociales, SA, 2004, Barcelona, págs. 529 e 530.