Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1870/13.8TYLSB-B.L1-1
Relator: MANUELA ESPADANEIRA LOPES
Descritores: RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
IMPUGNAÇÃO
ÓNUS DA PROVA
CREDOR HIPOTECÁRIO
CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA
DIREITO DE RETENÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/02/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I- Nos termos do artigo 128º, nº 1, do CIRE, dentro do prazo fixado para o efeito, deverão os credores da insolvência reclamar a verificação dos seus créditos, sendo que, tal reclamação é imperativa, mesmo que os respectivos credores tenham o seu crédito reconhecido por sentença transitada em julgado - nº 3 do mesmo preceito.
II- Havendo impugnação, por credor da insolvente, de créditos reclamados por outros credores e constantes da lista de credores reconhecidos pelo AI, impende sobre o reclamante o ónus da prova da existência, exigibilidade e natureza comum, subordinada ou privilegiada ou garantida do seu crédito.
III- Uma certidão judicial trata-se de um documento autêntico na definição do artº 363º, nº2, do C.Civil e a sua força probatória mede-se pelos limites da competência ou da actividade legal em que é exarada – cfr artº 371º, nº1, do mesmo diploma.
IV- A certidão extraída de determinado processo judicial apenas faz prova plena dos factos que refere como praticados pelo agente judiciário competente, assim como dos factos que nela são atestados com base nas percepções deste.
V- Uma certidão extraída de um processo judicial da qual faz parte a petição inicial apresentada no processo e um documento que foi junto com este articulado – escrito sem assinaturas reconhecidas notarialmente intitulado “contrato promessa de compra e venda” – apenas faz prova plena de que no processo foi apresentada a petição inicial em causa, acompanhada do documento, mas já não faz, porém, prova plena de que o contrato promessa de compra e venda foi celebrado nos termos que constam do documento ali junto. Este mantém a sua natureza de documento particular.
VI- Nos termos do art. 374º, nº 2, do Código Civil: “Se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que apresentou o documento a prova da sua veracidade”.
VII- No que respeita à força probatória formal dos documentos particulares incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade acerca da letra e da assinatura, se a parte contrária o impugnar.
VIII- Já quanto à força probatória material de tais documentos rege o disposto no artº 376º, nº 2, do CC, segundo o qual “Os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante ;(…)”.
IX- Não sendo o factualismo declarado pelos promitentes no contrato promessa de compra e venda contrário aos seus interesses, incumbe aos respectivos declarantes fazer a prova da veracidade do conteúdo das declarações emitidas.
X- O credor hipotecário, não interveniente no processo em que foi reconhecido o direito de retenção, é terceiro, mas um terceiro juridicamente interessado, uma vez que a sentença é susceptível de lhe causar um prejuízo jurídico.
XI – Deste modo, não é invocável perante o credor hipotecário a sentença, ainda que transitada em julgado, que reconheceu, em acção em que o credor hipotecário não foi parte, a existência de direito de retenção alheio sobre o imóvel hipotecado.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam as Juízas na Secção do Comércio do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – Relatório
Sociedade Imobiliária O., SA, pessoa colectiva n.º …, com sede na Av. …, Lisboa, foi declarada insolvente por sentença de 7.11.2013, transitada em julgado.
Foi fixado o prazo de 30 dias para reclamação de créditos.
Findo o prazo da reclamação, em 31.12.2013, o Sr. Administradora da Insolvência juntou aos autos lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos (fls.7 a 11).
Foram apresentadas impugnações à lista de créditos reconhecidos por:
- B…, S.A. e H… Unidos, S.A. impugnando o crédito reconhecido a C… Unipessoal, Lda. (cuja posição nos autos foi transmitida a G… Eood);
- M… N…, reclamando o reconhecimento do seu crédito, com fundamento no incumprimento do contrato–promessa celebrado com a insolvente, como garantido, em virtude do direito de retenção de que beneficia face à tradição do imóvel apreendido sob a verba n.º 10 (fracção AR);
- Caixa …, reclamando o reconhecimento do seu crédito, no valor de €231.113,18, como garantido, por beneficiar de hipoteca registada sobre o imóvel apreendido sob a verba n.º 2 (fracção AC).
Nenhum interessado apresentou resposta às impugnações deduzidas por M… N… e por Caixa …  
Em 5.1.2022 foi proferida decisão que:
A) Considerou não reconhecidos os créditos da Autoridade Tributária, face à informação prestada pelo Ministério Público no sentido de que se encontram integralmente liquidados;
B) Considerou reconhecidos os créditos não impugnados integrados na lista de créditos junta pelo AI, constante de fls. 7 a 11;
C) Julgou procedente a impugnação apresentada por M… N… e em consequência verificou o crédito no montante de €210.887,71, com natureza garantida por direito de retenção sobre o imóvel apreendido sob a verba n.º 10 (fracção AR);
D) Julgou procedente a impugnação apresentada por Caixa … e em consequência verificou o crédito no montante de €231.113,18, com natureza garantida até ao montante máximo de €140.000,00, pela hipoteca registada sobre o imóvel apreendido sob a verba n.º 2 (fracção AC);
E) Determinou o prosseguimento dos autos para apreciação da impugnação do crédito reconhecido a C… Unipessoal, Lda. (cuja posição nos autos foi transmitida a G… Eood);
F) Relegou a graduação de todos os créditos para final – artigo 136º, n.º 7 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Realizou-se audiência final relativamente à impugnação do crédito reconhecido a C… Unipessoal, Lda e foi proferida sentença que julgou procedentes as impugnações do crédito reconhecido a C… Unipessoal, Lda. (cuja posição nos autos foi transmitida a G… Eood) e, consequentemente, não verificou o crédito sobre a insolvente no valor de €4.500.000,00, garantido por direito de retenção por aquela reclamado.
Seguidamente procedeu à graduação dos créditos sobre a insolvente Sociedade Imobiliária O…, SA, pessoa colectiva n.º …, para serem pagos da seguinte forma:
A) Sobre o produto da venda das fracções "B", "C", "D", "E", "F", "G", "H", "J", "P", "R", "T", "U", "V", "Z", "AB", "AF", "AH", "AI", "AL", "AM", "AN", "AQ", "AS", "AV", “BD” e “BF” do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …, para garantia do valor máximo de €3.243.000,00:
1 – Em primeiro lugar: Fazenda Nacional - crédito referente a IMI (eliminado nos termos do despacho proferido pelo tribunal a quo em 04/03/2023 e a que infra se fará referência).
2 – Em segundo lugar: Banco C…, S.A., para garantia do valor de €2.250.768,31
3 – Em terceiro lugar, a par: os créditos comuns
4 – Em quarto lugar, a par: os créditos subordinados
*
B) Sobre o produto da venda da fracção “AC” do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito:
1 – Em primeiro lugar: Fazenda Nacional - crédito referente a IMI (eliminado nos termos do despacho proferido pelo tribunal a quo em 04/03/2023 e a que infra se fará referência).
2 – Em segundo lugar: Banco C…, S.A., para garantia do valor de €2.250.768,31
3 – Em terceiro lugar: Caixa …, para garantia do valor máximo de €140.000,00.
4 – Em quarto lugar, a par: os créditos comuns
5 - Em quinto lugar, a par: os créditos subordinados
*
C) Sobre o produto da venda da fracção “AR” do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito:
1 – Em primeiro lugar: Fazenda Nacional - crédito referente a IMI (eliminado nos termos do despacho proferido pelo tribunal a quo em 04/03/2023 e a que infra se fará referência).
2 – Em segundo lugar: M… N…: €210.887,71, com natureza garantida por direito de retenção
3 – Em terceiro lugar: Banco …S.A., para garantia do valor de €2.250.768,31
4 – Em quarto lugar, a par: os créditos comuns
5 - Em quinto lugar, a par: os créditos subordinados
*
D) Sobre o produto da venda de 1990 acções BCP, domiciliadas no Banco BIC:
1 – Em primeiro lugar: P…, SA - €186.984,54 – crédito garantido por penhor
2 – Em segundo lugar, a par: os créditos comuns
3 – Em terceiro lugar: a par: os créditos subordinados
*
E) Sobre o produto da venda dos demais bens móveis apreendidos para a massa insolvente:
1 – Em primeiro lugar, a par: os créditos comuns
2 – Em segundo lugar, a par: os créditos subordinados.
E após a rectificação efectuada nos termos do despacho proferido em 04/03/2023 e a que infra se fará referência:
F) Sobre o produto da venda da fracção “A” do prédio urbano sito na Av. …, tornejando para a Rua …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São Jorge de Arroios e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …:
1 – Em primeiro lugar: Banco …, S.A., para garantia do valor de €2.250.768,31
2 – Em segundo lugar, a par: os créditos comuns
3 – Em terceiro lugar, a par: os créditos subordinados.
*
Notificada que foi a sentença, o Banco …, SA, requereu a rectificação da mesma e interpôs recurso, declarando que o mesmo deveria subir apenas no caso de o tribunal a quo “decidir julgar improcedente alguma parte do pedido de retificação de sentença oportunamente junto aos autos.
*
O Ministério Público requereu igualmente a rectificação da sentença, invocando a inexistência de créditos fiscais da AT, que tenham sido reclamados.
Terminou peticionando que não ficasse a constar da sentença a existência de quaisquer créditos fiscais da AT.
*
O Banco B…, SA, também requereu a rectificação da sentença por erro material de modo a que quanto ao produto da venda de 1990 acções BCP, a par do crédito da P…, por força do penhor de que beneficia sobre as supra mencionadas acções, seja incluído o crédito do Banco ora reclamante.
Interpôs recurso com o mesmo fundamento.
*
G… Eood interpôs igualmente recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES
1 – A sentença recorrida fez uma errada apreciação da matéria de facto, não tendo
considerado provas existentes nos autos, com força probatória plena, e, em consequência, deu por não provados factos que deveriam ter sido dado por provados e desconsiderou elementos documentais juntos aos autos que levariam a uma conclusão manifestamente diferente, improcedendo as impugnações do crédito da Recorrente, e consequentemente, devendo manter a posição de credora reconhecida e a graduar o crédito da aqui Recorrente.
2- Violou o Tribunal a quo a lei ao dar como não provados os factos das alíneas a) a e) e) a m) referenciados como não provados na sentença.
3 – O Tribunal a quo fundamentou a sua decisão de considerar esses factos como não provados, na total ausência de elementos probatórios nomeadamente por não ter sido
junto o contrato-promessa de compra e venda.
4 - Salvo o devido respeito, tal fundamentação não corresponde à verdade, tratando-se de um erro grosseiro de (omissão total de) análise e apreciação da prova documental junta aos autos.
5 - Aquando da apresentação da reclamação de créditos, aquela sociedade C…Unipessoal, Lda, apresentou o documento que constitui a transacção judicial melhor identificada nos factos dados por assentes nº i) e ii), ou seja, a transacção judicial homologada por sentença proferida em 6.6.2013, no processo nº …, da 1ª Vara Cível de Lisboa, conforme consta da reclamação de créditos apresentada pela C…, junta aos autos pelo Exmo. Sr. Administrador de Insolvência em 19/04/2021, com a referência citius 28986452, em cumprimento do Douto despacho do Tribunal a quo.
6 - O Exmo. Senhor Administrador de Insolvência reconheceu o crédito da sociedade C… Unipessoal, Lda (a quem sucedeu a aqui Recorrente) no montante de € 4.500.000,00 e classificou-o como garantido, atendendo ao reconhecimento do direito de retenção reconhecido pela referida sentença judicial transitada em julgado.
7 - A Recorrente convidada a aperfeiçoar a sua reclamação de créditos, o que fez por requerimento apresentado nos autos em 19/11/2021, de fls…, com referência citius
30881122.
8 - Do teor desse requerimento resulta que foram alegados factos relativos aos termos e condições do negócio, nomeadamente as condições do contrato promessa, bem como da interposição de ação judicial e respetivo acordo e sentença homologatória proferida (esta transacção e sentença já junta aos autos aquando da reclamação de créditos
inicialmente apresentada, bem como repetida pelo credor reclamante B…, SA a fls. 330
e seguintes dos autos).
9 - O contrato promessa foi junto aos autos com o requerimento apresentado nos autos em 17/12/2021, a fls. 335 e seguintes, com a referência citius 31149558.
10 – Foi junto pela Recorrente certidão judicial contendo a petição inicial, e respectivos documentos, que deu origem à acção judicial nº …, nomeadamente o contrato promessa.
11 - Não obstante a junção desta certidão judicial que continha a petição inicial e
também o contrato promessa, o Tribunal a quo deu como não provados os factos das alíneas a) a e) e K) a m), que correspondem, entre outros, às condições do contrato promessa, bem como à interposição da ação judicial.
12 - O Tribunal a quo não analisou todos os elementos documentais juntos aos autos, como a tal estava obrigado, violando assim o princípio da aquisição processual, vertido no artigo 413º do Código do Processo Civil (CPC) que determina “O tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que
devia produzi-las, sem prejuízo das disposições que declarem irrelevante a alegação de
um facto, quando não seja feita por certo interessado.”
13 – O Tribunal a quo deu como não provados factos (alíneas a) a e) e K) a m)) que se encontram provados por certidão judicial que constitui um documento autêntico, e como tal fazem prova plena do seu teor, violando assim o disposto no artigo 371º do
Código Civil.
14 - O documento junto pela Recorrente é uma certidão judicial emitida pelo Tribunal competente, onde correu termos a ação judicial e onde foram juntos os documentos que atesta, nos termos do disposto no artigo 371º do CC, e constitui prova plena da interposição da petição inicial, bem como da existência e teor dos documentos juntos, nomeadamente das declarações das partes intervenientes nesse processo judicial.
15 - Encontrando-se tal documento junto aos autos e, acrescendo, constando o mesmo de uma certidão judicial, sempre se imporia ter sido dado por provados os factos
constantes das alíneas a) a e) e k) a m) dos factos dados por não provados.
16 – No que diz respeito ao facto e), para além do mesmo se mostrar provar por documento autêntico que constitui prova plena, também a testemunha M …, cujo depoimento se encontra devidamente gravado na globalidade no sistema citius, no dia 02-02-2022, das 14:19:57 às 14:47:17, minutos 00:00:00 a 00:27:21, porteira que reside no imóvel há mais de 38 anos, que quando questionada, referiu que os representantes da sociedade C… Unipessoal, Lda (promitente comprador) lhe entregaram as chaves da fração “para poderem fazer obras” que “iam lá os pedreiros para fazer as obras”, e questionada sobre se as obras se iniciaram confirmou que sim e adiantou que “o 3º A está todo partido” - conforme depoimento gravado do minuto 00:09:00 a 00:10:30.
17 - Também a testemunha J …, cujo depoimento se encontra devidamente gravado na globalidade no sistema citius, no dia 02-02-2022 das 15:02:21, às 15:15:00, minutos 00:00:00 a 00:12:39, referiu que tinha uma sociedade que fazia trabalhos de construção e que foi contratado pela sociedade C… Unipessoal, Lda para fazer obras nas identificadas frações, sendo “a mais profunda foi no 3º, não me lembro se A ou B, mas era o A, a primeira casa do lado direito” e adianta “fiz outras, mas mais de reparações, essa foi a mais profunda” – vide declarações gravadas do minuto 00:03:45 a 00:04:10.
18 – Conjugada a apreciação do documento autêntico, incluindo o teor do contrato
promessa junto, bem como do teor dos depoimentos das testemunhas realçadas, sempre ter-se-ia de dar como provado o facto disposto na alínea e).
19 - Dúvidas não restam, até pela mera análise do documento referido (certidão judicial junta que integrava o contrato promessa), que o contrato promessa se encontrava junto aos autos.
20 - Constituindo o contrato promessa parte integrante de uma certidão judicial, fica a mesma investida de força probatória plena, ou seja, é suscetível de fazer prova dos
factos que a constituem, pelo que mal andou também o Tribunal a quo na fundamentação da sua decisão referindo “Mas ainda que se considerasse que o tribunal poderia presumir a celebração do acordo, tendo em conta o facto de, designadamente, o Sr. Administrador de Insolvência a ele ter aludido em sede de declarações, a verdade é que as condições nele estipuladas sempre ficariam por demonstrar, precisamente porque o acordo não está nestes autos.”
21 - O Tribunal a quo estava obrigado a conhecer, analisar e apreciar os documentos referidos pela Recorrente e, em violação do princípio da aquisição processual, vertido no artigo 413º do Código do Processo Civil (CPC), não o fez.
22 - A certidão judicial junta aos autos constitui um documento autêntico que, nos
termos do disposto no artigo 371º do Código Civil, tem força probatória plena, pelo que
sempre estaria o Tribunal a quo obrigado a considerá-lo como bastante para prova dos
factos que deu como não provados sob as alíneas a) a e) e K) a m).
23 - É manifesto que o Tribunal a quo nem sequer tomou conhecimento da existência deste documento nos autos, resultando demonstrado da reiterada declaração na
fundamentação que tal documento não se encontra junto aos autos nem os respetivos
termos do acordo são conhecidos, violando assim o Tribunal, como vai dito o princípio
da aquisição processual, explanado no artigo 413º do CPC.
24 - Do teor das impugnações verifica-se que as mesmas colocam em crise o negócio celebrado e/ou os factos constitutivos do direito de retenção e em momento algum, alegam a falsidade do documento autêntico (certidão judicial) junto.
25 - A sentença recorrida viola o disposto no artigo 347º do Código Civil ao dar como não provados os factos, colocando o ónus da prova no aqui Recorrente, que não provou que os factos impugnados pelos Impugnantes eram verdadeiros.
26 - Tal interpretação atenta frontalmente e viola a lei e os princípios gerais da prova.
27 - Mesmo que não se considerasse revestido de força probatória plena, mas um mero documento particular, o documento, conjugado com os demais elementos probatórios existentes nos autos, nomeadamente o depoimento da testemunha M … e da testemunha J … - gravados em sistema citius no dia 02/02/2022, das 14:19:57 às 14:47:17 e das 15:02:21 às 15:15:00, respetivamente -, sempre teria de se considerar estarem provados os factos alegados.
28 - A sentença homologatória da transacção alcançada naqueles autos que constituíram o Processo nº … tem a virtualidade de, na teoria, servir de título executivo contra o promitente vendedor, porquanto o mesmo se reconhece devedor da quantia de € 4.500.000,00 (valor do crédito reclamado nos autos de insolvência), pelo que sempre ter-se-á de se considerar como meio de prova pleno, cabendo ao Impugnante o ónus da prova da alegada falsidade do mesmo, o que não conseguiu.
29 - Pelos Impugnantes nenhuma prova foi produzida no sentido de provar a falsidade das declarações constantes do contrato promessa, nem da transacção judicial que foi homologada por sentença.
30 - Considera-se como confissão da Insolvente dos factos alegados, do recebimento do preço e da condição de devedora de €4.500.000,00 (indemnização pelo incumprimento do contrato promessa) o que se encontra vertido no termo de transacção homologado como sentença.
31 – O Administrador de Insolvência não foi ouvido em audiência de julgamento na qualidade de testemunha, não sendo as suas declarações suficientes para contrariar a
demais prova dos autos, nomeadamente a confissão do recebimento desse montante por parte da Insolvente, constante do teor do contrato promessa e, posteriormente, da transacção judicial homologada por sentença (certidão judicial junta aos autos).
32 - Não se conseguiu apurar das declarações do Administrador de Insolvência quaisquer factos que levassem a concluir que os cheques – aliás, meras cópias das frentes dos cheques – não pudessem ter sido alvo de endosso e, como tal, ter sido titulado o pagamento do sinal, tal como confessado por declaração no contrato promessa pelo Insolvente e o promitente comprador, credor reclamante originário.
33 - Mesmo que os cheques tivessem sido emitidos a favor de um terceiro que não a Insolvente, isso não obsta a que os mesmos não tenham sido posteriormente entregues
à Insolvente Olivia para pagamento do preço, através de endosso.
34 - O crédito da aqui Recorrente (por sucessão no crédito da C… Unipessoal, Lda) foi reconhecido judicialmente por sentença transitada em julgado que titula o seu crédito aqui reclamado.
35 – O negócio existiu, a credora procedeu ao pagamento do sinal e viu, posteriormente, reconhecido, por sentença transitada em julgado, o seu crédito, bem como o reconhecimento do direito de retenção dos bens.
36 - Não se pode o Tribunal a quo bastar com as meras declarações do Administrador de Insolvência para considerar como não existente o negócio prometido, atentos a todos os elementos de prova e a análise conjugada de todos os elementos probatórios.
37 - Tivesse o Tribunal a quo apreciado e conhecido todos os documentos juntos aos autos, nomeadamente a certidão judicial que continha o contrato promessa e se encontrava junto aos autos, como a tal estava obrigado em cumprimento da lei, a análise crítica e global de toda a prova produzida sempre conduziria a uma decisão diferente sobre a matéria de facto, nomeadamente os factos das alíneas a) a e) e K) a m), dando os mesmos como provados.
38 - Ao violar o princípio da aquisição processual, vertido no artigo 413º do Código do Processo Civil, o Tribunal a quo violou a lei ao não apreciar todos os elementos
probatórios juntos aos autos, conforme resulta claro da fundamentação da sentença recorrida que refere que os factos dados por não provados “(…) têm como justificação a total falta de elementos probatórios”, acrescentando, em contrário da verdade, “não ter sido junto o contrato promessa de compra e venda alegadamente celebrado entre a sociedade insolvente e a sociedade C…, Unipessoal, Lda, razão pela qual nem sequer consideramos demonstrada a celebração desse acordo, nem das condições do mesmo.”
39 - Existe um claro erro de julgamento da matéria de facto.
40 - Deve a sentença recorrida ser substituída por outra que considere como provados os factos das alíneas a) a e) e K) a m), procedendo-se a uma análise crítica de toda a prova existente nos autos e, necessariamente, concluindo-se pelo reconhecimento do crédito reclamado pela aqui Recorrente, sendo o mesmo reconhecido e graduado.
41 - O Tribunal a quo decidiu erradamente ao dar como não provados os factos
constantes das alíneas g) a j) (com excepção da alínea h)) por considerar que a prova produzida foi insuficiente, na medida em que a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento obrigaria a decisão oposta, ou seja, a considerar-se como provados tais factos.
42 – O depoimento das testemunhas, M …, porteira do prédio há trinta e oito anos, cujo depoimento se encontra gravado na generalidade no sistema citius, no dia 02-02-2022, das 14:19:57 às 14:47:17, minutos 00:00:00 a 00:27:21 e J …, empreiteiro da construção civil, com o seu depoimento gravado na globalidade no sistema citius, no dia 02-02-2022 das 15:02:21, às 15:15:00, minutos 00:00:00 a 00:12:39, impunham decisão diversa, considerando-se os factos constantes das alíneas g) a j) (com excepção da alínea h) como provados.
43 - O Tribunal a quo fez uma errada apreciação também da prova testemunhal, único elemento probatório nesta parte fáctica, desvalorizando o conteúdo dos depoimentos, sem que exista qualquer outra prova nos autos que permita inferir em sentido contrário, fazendo assim um erro sobre o julgamento da matéria de facto.
44 - Decidindo-se por julgar provados os factos das alíneas a) a m), exceptuando-se o h), a decisão sobre as impugnações do crédito da Recorrida seriam necessariamente
improcedentes, levando a uma decisão distinta que reconhecesse o seu crédito e o qualificasse como garantido atento o direito de retenção reconhecido na transacção judicial homologada por sentença, bem como do teor da matéria de facto provada.
45 – O crédito reclamado pela aqui Recorrente resulta vertido em transacção judicial homologada por sentença proferida em 6.6.2013, no processo nº …, onde a ora Insolvente reconhece o direito de retenção da C… Unipessoal, Lda, (a quem sucedeu na posição de credor a aqui Recorrente) sobre as identificadas frações até ao valor total do crédito reclamado, por incumprimento do contrato promessa de compra e venda das mesmas.
46 - A transacção foi homologada por sentença já transitada em julgado.
47 - Dispõe a norma do artigo 1248º, nº 1 do Código Civil que a “transação é o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio mediante recíprocas concessões”.
48 - A sentença homologatória da transacção judicial na pendência de acção judicial, do litígio, é dotada de caso julgado material e como tal oponível a terceiros.
49 – Violou o Tribunal a quo o nº 1 do artigo 619º do CPC ao desvalorizar o caso julgado da decisão transitada em julgada que reconheceu a existência do crédito e o direito de retenção dos bens.
50 - A sentença homologatória da transacção judicial decide também sobre o mérito da causa condenando ambas as partes no cumprimento dos termos que transigiram, a qual constitui título executivo após o seu trânsito.
51 - Como decisão de mérito os termos da sentença proferida são oponíveis a terceiros, nomeadamente aos aqui Impugnantes.
52 - Não se pode aceitar o entendimento de que uma sentença homologatória de transacção no pedido não forma caso julgado material sobre o objeto da lide, por se considerar que nessa sentença não é proferida qualquer decisão de mérito sobre o pedido.
53 - A desistência do pedido, a confissão e a transacção exercem a mesma função que a sentença de mérito: como esta, põem termo à causa, compondo-a.
54 - Se o juiz desse processo entende que o acto é regular, homologa-o, julga-o válido, pelo que a lide fica arrumada e resolvida em conformidade com a manifestação de vontade emitida pelas partes.
55 - O autor, transigindo, renuncia ao demais direito que se arrogara contra o réu, e não pode, por isso, propor nova ação sobre o mesmo objecto.
56 - A sentença homologatória da desistência do pedido ou transacção recai sobre a relação jurídica substancial, ou seja, sobre o mérito da causa, formando, assim, um caso
julgado material.
57 - Mal andou o Tribunal a quo ao decidir em ofensa ao caso julgado da sentença
transitada em julgado proferida no processo que correu termos com o nº …
58 - E, mesmo que assim não se entendesse, por via da força probatória de tal decisão judicial sempre ter-se-ia de ter por confessados os factos dessa transação, reconhecendo-se o direito de retenção a favor da Recorrente e, consequentemente reconhecendo-se o seu crédito e graduando-se o mesmo.
59 - Deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por decisão que reconheça o crédito reclamado de €4.500.000,00, graduando-se o mesmo como crédito
garantido, sendo reconhecido o direito de retenção sobre os bens.
*
O Banco C…, SA contra-alegou, CONCLUINDO:
I. Quanto à alegada violação do caso julgado
1. A questão de saber se a sentença que homologou a transacção judicial celebrada no processo … é oponível aos credores da insolvência e, em especial, ao ora Recorrido, na sua qualidade de credor hipotecário, já foi decidida nos presentes autos, por despacho proferido no dia 01/10/2021.
2. A ora Recorrida foi devidamente notificada do referido despacho e, após vários pedidos de prorrogação de prazo, veio, por requerimento datado de 19/11/2021 (portanto, 49 dias após ter sido notificada), apresentar a reclamação de créditos aperfeiçoada, a qual foi admitida.
3. O comportamento processual da ora Recorrente, que não reagiu, por via de recurso ou reclamação, contra o referido despacho, tendo, antes, cumprido com o ali determinado, constitui facto inequivocamente incompatível com a vontade de recorrer.
4. O que o mesmo é dizer, a ora Recorrente conformou-se e aceitou a decisão proferida quanto a esta matéria, pelo que não agora recorrer quanto a esta matéria, nos termos do disposto no Artigo 632.º, n.º 2 e 3 do Código de Processo Civil.
5. Caso assim não se entenda, certo é que resulta das mais elementares noções de eficácia das decisões judiciais e da vastíssima jurisprudência uniforme sobre a matéria – de resto exaustivamente citada quer no despacho a que se fez referência, quer na própria sentença recorrida – que uma transacção celebrada entre duas partes, num processo declarativo, que reconhece direitos sobre imóveis hipotecados, sem que o credor hipotecário tenha participado nessa lide, não pode ser oponível a este credor, totalmente alheio àquele processo, no qual não participou, não teve oportunidade de fazer valer os seus direitos.
6. Pelo que andou bem a sentença recorrida ao decidiu como decidiu, no sentido da sentença homologatória do acordo celebrado no processo declarativo 630/13.0TVLSB não ser oponível ao credor hipotecário.
II. Quanto à certidão judicial junta aos autos, contendo a petição inicial e respectivos documentos, da acção n.º …
7. Analisado o processo, constata-se que por requerimento datado de 17/12/2021, a Recorrente juntou ao processo uma certidão da petição inicial do processo … e que dessa certidão é possível concluir, e considerar por provados, os factos elencados nas alíneas k), l) e m) dos factos não provados.
8. Não temos dúvidas que aquela peça processual (petição inicial), acompanhada dos respectivos documentos, deu entrada em juízo, e tinha aquele teor, sendo precisamente isto, e nada mais do que isto, que aquela certidão atesta
9. No que se acaba de expor reside e esgota-se a “verdade” e o mérito do Recurso interposto pela Recorrente.
10. A certidão em causa não se revela de qualquer utilidade para os restantes factos que a Recorrente defende que deveriam considerar-se como provados.
11. Por requerimento atravessado pelo ora Recorrido 06/12/2021, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido, foi expressamente impugnada a existência do contrato
promessa e foi expressamente invocado o disposto nos artigos 364.º, n.º 1 e 410.º, n.º 2,
ambos do código de processo civil, nos termos dos quais a prova de uma promessa do
compra e venda sobre imóveis apenas se faz pela via documental.
12. O Doc. 30 da petição inicial anexa à certidão junta aos autos é, ele próprio, cópia de uma digitalização do contrato-promessa propriamente dito, posto que aquela petição inicial deu entrada por transmissão eletrónica de dados, via CITIUS, conforme se constata pela análise da mesma.
13. É certo que nos termos do artigo 3.º, n.º 1, da Portaria n.º 114/2008, de 06 de Fevereiro, (que corresponde à redacção que, actualmente, vigora sob o artigo 4.º, n.º 1 da portaria 280/2013, de 26 de Agosto) a apresentação de peças processuais e documentos por transmissão electrónica de dados dispensa a remessa dos respectivos originais, duplicados e cópias, nos termos da lei.
14. Mas certo é também que o disposto naquele artigo 3.º, n.º 1 da Portaria n.º 114/2008, de 06 de Fevereiro, não prejudica o dever de exibição das peças processuais em suporte de papel e dos originais dos documentos juntos pelas partes por transmissão electrónica de dados, sempre que o juiz determine, designadamente, quando a) Duvidar da autenticidade ou genuinidade das peças ou dos documentos; b) For necessário realizar perícia à letra ou assinatura dos documentos – cfr. artigo 3.º, n.º 2 da referida portaria 14/2008, de 06 de Fevereiro, hoje inscrito no artigo 4.º, n.º 2 da portaria 280/2013, de 26 de Agosto).
15. A certidão de peça processual que deu entrada via citius não tem o “poder” de transformar uma digitalização de um documento num documento original, pelo que a certidão junta não substitui o original do contrato promessa, pelo simples facto do documento original, propriamente dito, não ter acompanhado a petição inicial.
16. A certidão de peça processual junta não é uma certidão de fotocópia conforme o original.
17. Por isso, face à expressa impugnação deduzida aos documentos juntos, e atentas as normas ali invocadas, não espanta que o tribunal a quo tenha concluído que o contrato promessa não consta dos autos, na exacta medida em que, efectivamente, apenas constam dos autos cópias de um alegado contrato, impugnadas pelo Credor.
Sem prejuízo do exposto,
18. Ainda que se considerasse por provada a celebração do contrato promessa, ficaria por provar os restantes elementos de que depende a existência do crédito reclamado, entre os quais importa aqui destacar o pagamento do sinal.
19. Com efeito, e de acordo com declarações prestadas pelo Exmo. Administrador de Insolvência, os cheques n.º …, n.º … e n.º …, sacados sobre o banco Caixa de Crédito Agrícola, não foram emitidos à ordem da Insolvente, nem nunca deram entrada em qualquer conta bancária da Insolvente, tudo conforme resulta do requerimento junto pelo senhor Administrador de Insolvência no APENSO H em 19/05/2017, requerimento esse anexo ao N/ requerimento de 29/12/2021.       
20. Em lugar algum do processo existe qualquer documento que prove a existência de um pagamento à insolvente, a título de sinal pelo alegado contrato-promessa.
21. E a própria Recorrente o reconhece, na medida em que afirma, sem qualquer “embaraço”, que os cheques que existem nos autos são meras cópias, e que o facto de não terem sido emitido à insolvente não significa que não tenham sido endossados posteriormente à Insolvente, conforme excertos supra transcritos, diretamente das alegações de recurso.
22. A Recorrente nada fez para provar o pagamento do sinal, limitando-se a referir, de forma vaga e indeterminada, que o facto das cópias dos referidos cheques indicarem que os mesmos não foram emitidos à Insolvente, tal não significa que não possam ter existido endossos.
23. Porém, cabia à Recorrente, precisamente à Recorrente, e ninguém mais, esclarecer o tribunal e os credores impugnantes, de forma clara, detalhada e concreta, de que forma aqueles referidos cheques pagaram o sinal, e se houve endossos, cabia-lhe demonstrar e provar a existência desses mesmos endossos,
24. tudo nos precisos termos do disposto no artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil: “Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.”
25. A prova produzida não permite concluir pelo pagamento de qualquer sinal, pelo que tal bastaria para que fosse julgada procedente a impugnação à lista de credores e, em consequência, não ser reconhecido qualquer crédito à G…
26. Não obstante, se alguma coisa se pode concluir, face à prova produzida, e para lá de qualquer dúvida, é que não deu entrada da conta bancária da massa insolvente qualquer quantia a título de pagamento do sinal invocado.
27. Sem pagamento de sinal, não existe direito a receber em dobro e, por isso, não existe qualquer crédito a reconhecer à Recorrente.
III. Quanto ao depoimento das testemunhas, M … e J … que alegadamente impunham que o tribunal a quo tivesse considerado provados os factos que constam as alíneas g) a j) (com exceção da alínea h)) dos factos não provados;
28. Não encontramos, no depoimento das referidas testemunhas, qualquer possibilidade de considerar provados os factos indicados nas alíneas g), i) e j)
29. a análise que o tribunal a quo faz dos referidos depoimentos corresponde àquilo que dos mesmos é possível extrair, designadamente, na parte em que a sentença recorrida considera não é possível apurar “quem foi ao prédio, nem a que título, sendo, porém, certo que a sociedade C… Unipessoal, Lda, não foi apresentada como a “nova senhoria”, “o comprador”, “novo dono” ou “pessoa que agora iria cuidar das obras dos andares”, pelo que fica por esclarecer a que título tinha as chaves de alguns andares”, sendo ainda certo que “ambas as testemunhas referiram que a C… Unipessoal, Lda, nunca passou recibos das rendas, nem recebia as rendas” e que a testemunha M … disse mesmo que “depois disseram que não sinalizaram e não fizeram a compra”.
30. Por isso, andou bem a sentença recorrida, ao considerar como não provados os factos constantes das alíneas g), i) e j), devendo improceder o recurso, também quanto a esta matéria.
IV. Quanto à requerida revogação da sentença recorrida e sua substituição por decisão que reconheça o crédito reclamado de €4.500.000,00, graduando-se o mesmo como crédito garantido por direito de retenção sobre os bens.
31. Existem nos autos documentos que impunham que alguns factos julgados como não provados que deviam ter sido considerados como factos provados – concretamente, os constantes das alíneas k), l) e m).
32. Porém, a qualificação dos referidos factos como provados não alterada nem belisca, de modo algum, a decisão de mérito proferida, na parte em que julgou procedentes as impugnações deduzidas aos créditos da Recorrente, e não lhe reconheceu os créditos reclamados.
33. Todos os restantes factos que constam do elenco dos factos dados como não provados foram correctamente julgados pelo doutro Tribunal a quo, pelo que devem manter-se inalterados.
34. Sem prejuízo do exposto, e conforme demonstramos ao longo das presentes contra-alegações, mesmo que fosse de considerar também por provados os factos constantes das alíneas a), b), d) e), f) e i) dos factos não provados – o que apenas por mera hipótese de raciocínio se equaciona – ainda assim a sentença de mérito proferida permaneceria inalterada na parte em que não reconhece os créditos reclamados pela Recorrente, pela simples (mas decisiva) razão da recorrente não ter provado o pagamento de qualquer quantia a título de sinal.
35. Por isso o Recurso interposto, ainda que imponha uma ou outra alteração pontual à sentença recorrida, não tem, em nosso ver, qualquer hipótese de alterar o sentido da decisão de mérito no que respeita ao não reconhecimento dos Créditos reclamados pela
Recorrente.
36. É que sem pagamento de sinal, não existe direito a receber em dobro e, por isso, não existe qualquer crédito a reconhecer à Recorrente.
37. Em face do exposto, cremos que esse douto Tribunal da Relação, conhecendo do mérito do recurso, deverá julgar improcedente a apelação, nos termos e com o fundamento expostos, substituindo-se ao tribunal a quo nas partes em que a sentença recorrida haja de ser alterada, tudo nos termos do disposto nos artigo 665.º do Código de Processo Civil,
Terminou peticionando que o recurso seja julgado improcedente, mantendo-se a sentença recorrida na parte em que não reconhece qualquer direito de crédito à recorrente, com as alterações pontuais que assinala nas contra-alegações no que respeita à matéria de facto.
*
Em 04/03/2023 foi proferido pelo tribunal a quo o seguinte Despacho:
“Em 9.1.2023, o Banco …, S.A. requereu a rectificação da sentença proferida em 26.12.2022 alegando que da mesma não consta a graduação de créditos relativamente ao imóvel apreendido sob a VERBA 29 do Auto de Apreensão, relativamente à qual constam diversos factos provados, o que evidencia ter ocorrido um lapso.
Não foi apresentada oposição ao presente pedido.
Apreciando.
Como evidencia o Banco … S.A., por manifesto lapso, de que me penitencio, não foi, a final, indicada a graduação concreta relativamente à Verba 29 do auto de apreensão de bens imóveis, pese embora a mesma estivesse já explanada na fundamentação.
Assim, ao abrigo do art.614º do Código de Processo Civil, importa rectificar tal situação, o que passo a fazer, graduando para pagamento:
F) Sobre o produto da venda da fracção “A” do prédio urbano sito na Av. …, tornejando para a Rua …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São Jorge de Arroios e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …:
1 – Em primeiro lugar: Banco …S.A., para garantia do valor de €2.250.768,31
2 – Em segundo lugar, a par: os créditos comuns
3 – Em terceiro lugar, a par: os créditos subordinados
Notifique.
*
Atento o supra decidido e como expresso pelo credor em sede de requerimento de interposição de recurso apresentado na mesma data, considero prejudicada a respectiva apreciação e determino a devolução da taxa de justiça paga, quando solicitada.
*
O Ministério Público solicitou a correcção da decisão na parte em que considerou e graduou créditos relativos a IMI, porquanto, em momento anterior - 5.1.2022 - o tribunal já havia considerado não reconhecidos os créditos da Autoridade Tributária, face à informação prestada pelo Ministério Público no sentido de que se encontram integralmente liquidados.
Apreciando.
O despacho saneador proferido em 5.1.2022 foi notificado aos credores e dele consta, efectivamente, “A) Considero não reconhecidos os créditos da Autoridade Tributária, face à informação prestada pelo Ministério Público no sentido de que se encontram integralmente liquidados.”
Nesta medida, na sentença proferida não deviam constar os créditos reclamados pelo Ministério Público, em representação da AT, atento o seu pagamento.
Destarte, dando provimento ao solicitado pelo Ministério Público, ao abrigo do art.614º do Código de Processo Civil, rectifico a decisão, dela eliminando as menções a créditos de IMI, com a consequente alteração da ordem de preferência na graduação de créditos, sempre que o IMI ocupe o primeiro lugar na graduação.
Notifique.
*
Em 17.1.2023, o Banco B…, S.A., solicitou a rectificação de erro material da sentença proferida porquanto, não obstante constar como facto provado o crédito reclamado pelo Banco B…, S.A. no montante global de €2.730.926,47, dos quais €133.920,75 com natureza de crédito garantido por força de “Um penhor sobre 62.956 ações, denominadas “BCP-NPR”, com o valor nominal de €1,00 cada uma; e outro penhor sobre 5.656 ações do BCP, com o valor nominal de €1,00 cada uma”, os respectivos créditos não foram objecto de reconhecimento e respectiva graduação, nomeadamente quanto ao produto da venda de 1990 acções BCP, em que apenas foi identificado o penhor constituído a favor do credor P…, SA.
Não foi apresentada oposição ao presente pedido.
Apreciando.
Consta do despacho saneador proferido em 5.1.2022 a verificação de vários créditos, entre os quais um crédito do Banco B…, S.A.
Logo, não haveria que voltar a verificar este crédito, mas cumpria colocá-lo na graduação referente às acções do Banco …, S.A. apreendidas, o que apenas aconteceu quanto ao crédito garantido por penhor da P…, S.A., mais uma vez, por manifesto lapso, de que me penitencio.
Portanto, há que rectificar esse lapso e graduar o crédito garantido por penhor do Banco B…, S.A., no valor de €133.920,75, sobre o produto da venda de 1990 acções BCP, domiciliadas no Banco BIC.
Contudo, não dispondo de elementos para determinar qual o penhor que prevalece, determino a notificação do Sr. Administrador de Insolvência para juntar as reclamações de créditos de ambos os credores garantidos por penhor.
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Em face do ora decidido notifique o requerente para informar se mantém interesse no recurso interposto.
Caso a resposta seja negativa, desde já determino a devolução da taxa de justiça paga, quando tal for solicitado.
(…)”
*
Em 06/03/2023, o Administrador da Insolvência apresentou requerimento, declarando que: “vem juntar aos autos as reclamações de créditos apresentadas pelos credores Banco …, SA e P…, SA”.
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Em 07/03/2023, o Banco B…, SA, apresentou requerimento com o seguinte teor: “(…) vem desistir do recurso interposto, em 17/01/2023 (…)”.
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Em 15/05/2023 e na sequência da decisão da ora relatora proferida na reclamação interposta pela recorrente G… Eood nos termos do disposto no artº 643º do C.P.Civil, relativamente ao despacho do tribunal a quo que não admitiu o recurso interposto por esta – a decisão da reclamação foi no sentido da admissão do recurso -, foi, pelo mesmo tribunal a quo, determinada a remessa dos autos a este tribunal.
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Foram colhidos os vistos das Exmªs Adjuntas.
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II– OBJECTO DO RECURSO
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do mesmo Código). Acresce que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
Cumpre desde já referir o seguinte:
Conforme resulta dos autos e ficou referido no relatório que antecede, por despacho de 4/3/2023, foi considerado prejudicado o recurso interposto pelo Banco … e, por requerimento de 7/3, o Banco B…, SA, desistiu do recurso interposto em 17/01/2023.
Assim, há unicamente que conhecer do recurso interposto pela credora G… Eood e, aqui chegados há que nos pronunciarmos sobre a seguinte questão prévia:
O recorrido Banco … começou por invocar que a questão de saber se a sentença que homologou a transacção judicial celebrada no processo … é oponível aos credores da insolvência e, em especial, ao ora Recorrido, na sua qualidade de credor hipotecário, já foi decidida nos presentes autos, por despacho proferido no dia 01/10/2021, despacho do qual a ora recorrente não interpôs recurso.
Diz que o comportamento processual da ora Recorrente, que não reagiu, por via de recurso ou reclamação, contra o referido despacho, tendo, antes, cumprido com o ali determinado – apresentação de reclamação de créditos aperfeiçoada - constitui facto inequivocamente incompatível com a vontade de recorrer. Conclui pela renúncia ao direito de recorrer. 
O despacho proferido em 01/10/2021 trata-se de despacho no qual o tribunal, após discorrer sobre as circunstâncias em que a eficácia do caso julgado se pode impor em situações que envolvam terceiros que não intervieram na acção, convida a ora recorrente “G…” Eood, “face à escassez dos factos alegados, e considerando a posição assumida quanto à inoponibilidade da sentença” a concretizar os factos dos quais resulte o seu crédito (elementos do contrato promessa, pagamento do sinal, incumprimento), e o invocado direito de retenção (entrega e posse dos imóveis)”.
O despacho em causa nada decidiu, em concreto, quanto ao crédito reclamado, sendo que a decisão de convidar ao aperfeiçoamento não é em si mesma uma decisão final quanto ao destino da causa e nem sequer é susceptível de recurso (n.º 7 do artigo 590.º do CPC).
Assim, o facto de a ora recorrente ter correspondido ao convite efectuado e aperfeiçoado o requerimento de reclamação de créditos, não significa qualquer renúncia ao recurso da sentença que veio a julgar procedentes as impugnações do crédito reconhecido a C…, Unipessoal, Lda, (cuja posição nos autos foi transmitida a “G…” Eood) e, consequentemente, não verificou o crédito sobre a insolvente no valor de €4.500.000,00, garantido por direito de retenção por aquela reclamado.
Deste modo, face às conclusões apresentadas pela recorrente G… Eood, importa decidir:
1- Da impugnação da matéria de facto e
2- se o crédito reclamado deve ser reconhecido e graduado como garantido por direito de retenção.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A) De Facto
i) Matéria de Facto decidida na 1ª Instância
Na decisão que proferiu o tribunal recorrido considerou como provados os seguintes factos:
1- Por decisão proferida em 5.1.2022, foram verificados os seguintes créditos:
2 - Foram apreendidos os seguintes bens imóveis:
Verba nº 1: Fracção autónoma designada pela letra “AB” correspondente ao 6D, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. … freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 2: Fracção autónoma designada pela letra “AC” correspondente ao 7A, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 3: Fracção autónoma designada pela letra “AF” correspondente ao 7D, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. … freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 4: Fracção autónoma designada pela letra “AH” correspondente ao 8B, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. … freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 5: Fracção autónoma designada pela letra “AI” correspondente ao 8C, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 6: Fracção autónoma designada pela letra “AL” correspondente ao 9A, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo ….
Verba nº 7: Fracção autónoma designada pela letra “AM” correspondente ao 9B, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 8: Fracção autónoma designada pela letra “AN” correspondente ao 9C, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 9: Fracção autónoma designada pela letra “AQ” correspondente ao 10B, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 10: Fracção autónoma designada pela letra “AR” correspondente ao 10C, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 11: Fracção autónoma designada pela letra “AS” correspondente ao 10D, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…. , freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 12: Fracção autónoma designada pela letra “AV” correspondente ao 11C, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 13: Fracção autónoma designada pela letra “B” correspondente ao 1A, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 14: Fracção autónoma designada pela letra “BD” correspondente ao 13B, destinada a serviços, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…., freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 15: Fracção autónoma designada pela letra “BF” correspondente ao 13D, destinada a serviços, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…. , freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 16: Fracção autónoma designada pela letra “C” correspondente ao 1B, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. … , freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 17: Fracção autónoma designada pela letra “D” correspondente ao 1C, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 18: Fracção autónoma designada pela letra “E” correspondente ao 1D, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 19: Fracção autónoma designada pela letra “F” correspondente ao 2A, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 20: Fracção autónoma designada pela letra “G” correspondente ao 2B, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número …da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …
Verba nº 21: Fracção autónoma designada pela letra “H” correspondente ao 2C, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…., freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …
Verba nº 22: Fracção autónoma designada pela letra “J” correspondente ao 3A, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …
Verba nº 23: Fracção autónoma designada pela letra “P” correspondente ao 4B, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 24: Fracção autónoma designada pela letra “R” correspondente ao 4D, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av…, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …
Verba nº 25: Fracção autónoma designada pela letra “T” correspondente ao 5B, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 26: Fracção autónoma designada pela letra “U” correspondente ao 5C, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 27: Fracção autónoma designada pela letra “V” correspondente ao 5D, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 28: Fracção autónoma designada pela letra “Z” correspondente ao 6B, destinada a habitação, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …  
Verba nº 29: Fracção autónoma designada pela letra “A”, destinada a serviços, de que faz parte do prédio urbano sito na Av. …, tornejando para a Rua …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São Jorge de Arroios e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …
3 - Foram apreendidos nos autos:
- o saldo da conta D.O. Montepio Geral com o n.º…, no valor de €4.139.94;
- 1990 acções BCP, domiciliadas no Banco BIC (resultantes da incorporação de reservas, de 17/06/2011 e inverse stock split, de 24/10/2016, operados nas 142.996 acções iniciais)
4 - Por AP …, 2007.01.11, mostra-se registada a constituição de hipoteca voluntária a favor de Banco …, S.A. sobre as fracções "B", "C", "D", "E", "F", "G", "H", "J", "P", "R", "T", "U", "V", "Z", "AB", "AC", "AF", "AH", "AI", "AL", "AM", "AN", "AQ", "AR", "AS", "AV", “BD” e “BF” do prédio urbano sito na Av…, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …, para garantia do valor máximo de €3.243.000,00.
5 - Por AP. … 2011/09/26, mostra-se registada a favor de Caixa … a constituição de hipoteca voluntária sobre a "AC" do prédio urbano sito na Av. …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São João de Brito e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade, sob o artigo …, para garantia do valor máximo de €140.000,00.
6 - Por AP. … 2001/01/11, mostra-se registada a favor do Banco …, S.A. a constituição de hipoteca voluntária sobre a fracção “A” do prédio urbano sito na Av. …, tornejando para a Rua …, freguesia de Alvalade e concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … da freguesia de São Jorge de Arroios, para garantia do valor máximo de €3.243.000,00.
7 - Por sentença transitada em julgado proferida no apenso K foi declarada “G…” EOOD habilitada para prosseguir nos autos na posição da credora C… Unipessoal, Lda.
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O tribunal a quo considerou ainda que, com relevo para a decisão da impugnação do crédito reconhecido a C… Unipessoal, Lda, (cuja posição nos autos foi transmitida a “G…” Eood), resultaram da instrução da causa os seguintes factos assentes:
i) Por escrito denominado “termo de transacção”, outorgado entre C…, Unipessoal, Lda, e Sociedade Imobiliária O…, S.A., respectivamente Autora e Ré nesses autos, que se dá aqui por integralmente reproduzido, foi feito constar, entre o mais, (cláusula 2ª), que “A Ré reconhece (…) que, por razões a si imputáveis, não conseguiu reunir os meios financeiros para proceder ao distrate das hipotecas que recaem sobre os imóveis identificados na cláusula anterior e assim proceder à realização da escritura pública de compra e venda do refiro imóvel, livre de quaisquer ónus e encargos a favor da Autora” (cláusula 3.ª); “em consequência do referido no ponto anterior, a Ré reconhece a favor da Autora o direito de retenção sobre os referidos imóveis até pagamento integral da quantia em dobro entregue a título de sinal e princípio de pagamento que ascende a €5.000.000,00 (cinco milhões de euros)” (cláusula 4º); “A Autora declara aceitar a redução da dívida ao produto global resultante da alienação total das fracções indicadas no ponto n.º2 da presente transacção” (cláusula 5ª).
ii) A referida transacção foi homologada por sentença proferida em 6.6.2013, no processo nº …  
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Foram considerados não provados os seguintes factos:
a) Por contrato promessa datado de 10 de Abril de 2012, a sociedade C… Unipessoal, Lda. prometeu comprar e a ora Insolvente prometeu vender as fracções autónomas designadas pelas letras “H”, “J”, “P”, “R”, “T”, “U”, “V”, “BD”, “BF”, “C”, “D”, “E”, “F”, “G”, “AL”, “AM”, “AN”, “AQ”, “AR”, “AS”, “AV”, “B”, “AB”, “AC”, “AF”, “AH”, “AI” e “Z” do prédio urbano sito na Avenida …, com cruzamento para a Avenida … da freguesia de São João de Brito, inscrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o artigo nº … e inscrito na matriz urbana … da identificada freguesia (à data) e fracção autónoma designada pela letra “A” do prédio urbano sito na Avenida … e Rua …, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº … e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade sob o artigo …
b) Foi acordado que o preço global da compra e venda seria de €5.000.000,00.
c) Na data da assinatura do contrato promessa foi pago, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de €2.500.000,00.
d) As partes obrigaram-se à outorga da escritura de compra e venda até ao dia 20 de Dezembro de 2012.
e) Convencionaram as partes que com a celebração do contrato promessa, a sociedade C…, Unipessoal, Lda., promitente compradora, ficava “autorizada a cuidar da conservação e manutenção dos imóveis prometidos comprar”.
f) Com a assinatura do contrato promessa foram entregues à sociedade C…, Unipessoal, Lda. as chaves das fracções que estavam desocupadas.
g) O representante legal da C… acompanhou o representante legal da sociedade insolvente aos prédios, tendo sido apresentado à porteira do prédio como “o comprador”, “novo dono” e “pessoa que agora iria cuidar das obras dos andares”.
h) O representante legal da sociedade C…, conjuntamente com o representante legal da Insolvente, foram conhecer os arrendatários das fracções arrendadas e indicado aquela sociedade como a “nova senhoria” e a quem deveriam ser comunicadas as situações a resolver.
i) Foram iniciadas algumas obras pela sociedade C…, nomeadamente nas fracções “J”, “U” e “AI”.
j) Foi contratado um empreiteiro pela C…, que procedeu à reparação de um dano na fracção “P”, pouco tempo após a comunicação à arrendatária como sendo essa a empresa senhoria.
k) No dia 3 de Abril de 2013, a sociedade C…, Unipessoal, Lda, deu entrada de petição inicial no Tribunal, onde peticionava pelo reconhecimento da resolução do contrato promessa por incumprimento, pedindo-se a condenação da insolvente O… (nesse processo Ré) no pagamento do montante de €5.000.000,00, correspondente ao sinal prestado em dobro nos termos legais.
l) Mais peticionou que fosse reconhecido judicialmente o direito legal de retenção sobre as fracções objecto do contrato promessa de compra e venda, até integral pagamento do valor peticionado.
m) A título subsidiário, foi peticionado que fosse proferida decisão judicial que decretasse a transferência da titularidade das fracções a favor da promitente compradora.
n) A transacção foi homologada por sentença, transitada em julgado em 17.6.2013.
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ii) Da impugnação da matéria de facto
Nos termos do artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil:
«Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
No que toca à especificação dos meios probatórios: «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (artigo 640º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil).
Citando o Sr. Conselheiro Abrantes Geraldes: «Estabelecendo o paralelismo com a petição inicial, tal como esta está ferida de ineptidão quando falta a indicação do pedido, também as alegações destituídas em absoluto de conclusões são “ineptas”, determinando a rejeição de recurso (art. 641º, nº 2, al. b), sem que se justifique a prolação de qualquer despacho de convite à sua apresentação.(…) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões.(…)» – cfr Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª ed., p. 122 e 132.
Como consequência, segundo o mesmo autor, impõe-se a rejeição do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto nas seguintes situações:
a)  Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto;
b)  Falta de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados;
c) Falta de especificação dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exacta das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação;
f) Apresentação de conclusões deficientes, obscuras ou complexas, a tal ponto que a sua análise não permita concluir que se encontram preenchidos os requisitos mínimos que traduzam alguns dos elementos referidos - Ob. cit, pág. 135.
Existe divergência jurisprudencial no que concerne a saber se os requisitos do ónus impugnatório previstos no artigo 640º, nº1, devem figurar apenas no corpo das alegações ou se também devem ser levados às conclusões sob pena da rejeição do recurso (cf. Artigos 635º, nº2 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil). O Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a pronunciar-se nos seguintes termos: No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.2.2015, Tomé Gomes, 299/05, afirma-se que «(…) enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.»
No Acórdão de 11.4.2016, Ana Luísa Geraldes, 449/410, defendeu-se que, servindo as conclusões para delimitar o objeto do recurso, deverão nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação; quanto aos demais requisitos do ónus impugnatório, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso. As conclusões do recurso não têm de reproduzir todos os elementos do corpo da alegação – cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27.1.2015, Clara Sottomayor, 1060/07.
É também entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do STJ, que o recorrente não cumpre o ónus de especificação imposto no art.º 640º, nº 1, al b), do CPC, quando procede a uma mera indicação genérica da prova que, na sua perspectiva, justifica uma decisão diversa daquela a que chegou o Tribunal de 1.ª Instância, em relação a um conjunto de factos, sem especificar quais as provas produzidas quanto a cada um dos factos que, por as ter como incorrectamente apreciadas, imporiam decisão diversa, fazendo a apreciação crítica das mesmas – cfr  Acórdãos do STJ de 20-12-2017 e 5-09-2018, respectivamente, nos processos nºs 299/13.2TTVRL.C1.S2 e 15787/15.8T8PRT.P1.S2, disponíveis em www.dgsi.pt.
No nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da livre apreciação da prova, plasmado no art.º 607º, n.º 5 do Código de Processo Civil, segundo o qual: “O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.”
Assim, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g. força probatória plena dos documentos autênticos - cfr. art.º 371º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr a este respeito Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, IV vol., Coimbra Editora, 1987, pág. 566 e seg. e Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág. 660 e seg.).
Não pode ser exigida para a formação da convicção do julgador uma certeza absoluta, por via de regra não alcançável, quanto à ocorrência dos factos que aprecia. É, sim, necessário que da análise conjugada da prova produzida e da compatibilização da matéria de facto adquirida, extraindo dos factos apurados as presunções impostas por lei ou por regras da experiência (vide artigo 607º nº 4 do CPC) se forme no espírito do julgador a convicção de que com muito elevado grau de probabilidade os factos em análise ocorreram.
Começou a apelante por sustentar que a factualidade plasmada nas alíneas a) a e) dos factos não provados deve ser considerada demonstrada com base no teor do teor do documento junto aos autos com o requerimento apresentado nos autos em 17/12/2021, a fls 335 e ss, com a referência 31149558.
Diz que se trata de uma certidão judicial, contendo a petição inicial e respectivos documentos, que deu origem à acção judicial nº 630/13.0TVLSB, nomeadamente o contrato promessa e que, constituindo a certidão um documento autêntico, faz prova plena do seu teor.
Vejamos.
O tribunal a quo considerou como não provados os factos invocados pela reclamante respeitantes à celebração de contrato promessa de compra e venda entre a sociedade C…, Unipessoal, Lda, na qualidade de promitente compradora, sociedade esta a quem a ora apelante sucedeu, conforme sentença proferida no apenso K – habilitação de cessionário – e a insolvente, enquanto promitente vendedora, contrato esse através do qual, nos termos alegados, esta se teria obrigado a vender à primeira as as fracções autónomas designadas pelas letras “H”, “J”, “P”, “R”, “T”, “U”, “V”, “BD”, “BF”, “C”, “D”, “E”, “F”, “G”, “AL”, “AM”, “AN”, “AQ”, “AR”, “AS”, “AV”, “B”, “AB”, “AC”, “AF”, “AH”, “AI” e “Z” do prédio urbano sito na Avenida …, com cruzamento para a Avenida … da freguesia de São João de Brito, inscrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o artigo nº … e inscrito na matriz urbana … da identificada freguesia (à data) e fracção autónoma designada pela letra “A” do prédio urbano sito na Avenida … e Rua …, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº … e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alvalade sob o artigo …  
Conforme consta da sentença, entendeu o mesmo tribunal que a factualidade ali referida como não provada e concretamente a plasmada nas alíneas a) a e) - não se encontrava demonstrada em virtude da “total falta de elementos probatórios.
Importa aqui deixar expresso que o art.11º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas não se aplica neste apenso, pelo que têm plena aplicação as regras que regem o ónus da prova, no caso, a prova dos factos constitutivos de crédito impugnado cabia ao reclamante, na medida em que a celebração do contrato promessa de compra e venda, o pagamento de sinal, o incumprimento definitivo do contrato e a posse dos imóveis foram contestados pelos impugnantes.
Releva em particular não ter sido junto o contrato promessa de compra e venda alegadamente celebrado entre a sociedade insolvente e a sociedade C… Unipessoal, Lda., razão pela qual nem sequer consideramos demonstrada a celebração desse acordo, nem das condições do mesmo.”   
Sustenta a ora apelante que o contrato promessa foi junto com o requerimento apresentado nos autos em 17/12/2021, com a referência 31149558, requerimento esse através do qual juntou certidão judicial respeitante ao processo nº … da qual faz parte integrante o referido contrato promessa de compra e venda e que, desta forma, os invocados factos se encontram provados por certidão judicial que constitui um documento autêntico, o qual, nos termos do disposto no artº 371º do CC, faz prova plena de tais factos.
Conforme refere a recorrente – e contrariamente ao consignado pelo tribunal a quo –, com o identificado requerimento procedeu a mesma à junção, via Citius, de certidão emitida pela Unidade Central – Arquivo – do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa -, da qual consta: “Certifico que nesta secção de arquivo existem uns autos de acção de processo ordinário em que foi autora C… Unipessoal, Lda e ré Sociedade Imobiliária O…,SA, dos quais as fotocópias juntas são a reprodução fiel de fls 2 a 79, inclusive, que correram seus termos pela …, desta comarca, sob o nº … – ficha de arquivo …”.
Dessa certidão consta a petição inicial, bem como os documentos juntos com a mesma, incluindo o intitulado “Contrato-Promessa de Compra e Venda”, do qual não consta que as respectivas assinaturas tenham sido objecto de reconhecimento notarial.
Notificado de tal documento, o credor BCP pronunciou-se nos seguintes termos:
“Impugna-se o teor do documento que titula o alegado contrato-promessa, bem como as conclusões que do mesmo se pretendam extrair, na medida em que tal documento não titula uma promessa de negócio, mais não constituindo do que um instrumento para criar a aparência de um direito de retenção sobre os imóveis em causa…”
Estabelece o artº 144º do C.P.Civil:
«Apresentação a juízo dos atos processuais
1 - Os atos processuais que devam ser praticados por escrito pelas partes são apresentados a juízo por transmissão eletrónica de dados, nos termos definidos na portaria prevista no n.º 1 do artigo 132.º, valendo como data da prática do ato processual a da respetiva expedição.
2 - A parte que pratique o ato processual nos termos do número anterior deve apresentar por transmissão eletrónica de dados a peça processual e os documentos que a devam acompanhar, ficando dispensada de remeter os respetivos originais.
(…)     
4 - Os documentos apresentados nos termos previstos no n.º 2 têm a força probatória dos originais, nos termos definidos para as certidões.
(…)”
Uma certidão judicial, qua tale, é um documento autêntico na definição do artº 363º, nº2, do C.Civil e a força probatória dos documentos autênticos mede-se pelos limites da competência ou da actividade legal em que são exarados – cfr artº 371º, nº1, do mesmo C. Civil, que estabelece que tais documentos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora.
Tal prova plena abrange a veracidade das atestações da entidade documentadora que versem sobre actos praticados por ela própria ou prestados na sua presença, o que é o mesmo que dizer que um documento autêntico tem força probatória plena quanto às acções ou percepções do oficial público no mesmo mencionadas, que, por isso, só podem ser ilididas com base na sua falsidade.
Considerando estes normativos, temos que a certidão supra referida extraída dos autos de acção ordinária que correu termos pela … do Tribunal da Comarca … goza de eficácia probatória plena apenas quanto a aspectos determinados do respectivo conteúdo e tramitação, seja, aqueles que, por serem objecto de realização ou de directa percepção pelos agentes judiciários competentes, são passíveis de nesses termos serem atestados ou confirmados. No fundo, o que se passa com qualquer autoridade pública.
Assim, tal certidão faz prova plena de que no processo foi apresentada a petição inicial em causa, acompanhada dos documentos, mas já não faz, porém, prova plena de que o contrato promessa de compra e venda foi celebrado nos termos que constam do documento ali junto. Este trata-se de um documento particular e este tipo de documentos, ao contrário do que sucede com os documentos autênticos, não provam por si sós a autenticidade da sua (aparente) proveniência.
Como salienta Antunes Varela, “A letra e assinatura, ou a assinatura só se consideram, neste caso, como verdadeiros, se forem expressa ou tacitamente reconhecidas pela parte contra quem o documento é exibido...” – cfr Código Civil Anotado, vol I, 4ª ed. revista e actualizada, Coimbra Editora, pág. 331 -, nos termos do art. 374º, nº 2, do Código Civil, segundo o qual : “Se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que apresentou o documento a prova da sua veracidade”.
No que respeita à força probatória formal dos documentos particulares rege, com efeito, este nº 2 do artº 374º, ou seja, incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade acerca da letra e da assinatura, se a parte contrária o impugnar.
Já quanto à força probatória material de tais documentos - independentemente da prova quanto às declarações atribuídas aos seus autores (promitentes vendedor e comprador) - rege o disposto no artº 376º, nº 2, do CC, segundo o qual “Os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante ;(…)”.
Ora, o factualismo declarado pelos promitentes em tal contrato promessa de compra e venda, não é contrário aos interesses dos respectivos declarantes, mormente da promitente-compradora, a quem sucedeu a ora apelante; bem pelo contrário.
Daí que tal documento particular não tenha a pretendida força probatória plena, como esgrime a recorrente.
Antes, incumbia-lhe fazer a prova, nomeadamente por depoimento ou declarações de parte ou, se for caso disso, por via testemunhal, da veracidade do conteúdo dessas declarações emitidas e constantes do mencionado contrato promessa.
Conforme se decidiu no Ac. do STJ de 12/02/2019, relator: José Rainho, o qual pode ser consultado in www. dgsi.pt: “A força probatória plena emergente da confissão exarada em documento particular só existe no âmbito da relação entre o declarante e o declaratário, e não também no confronto de terceiros, como é o caso da massa falida e dos credores do insolvente. Quanto aos terceiros a declaração confessória não tem eficácia plena, valendo apenas como elemento de prova a apreciar livremente.”
Invocou também a apelante que, da conjugação do teor do contrato promessa, com o declarado pelas testemunhas M … e J …, sempre se terá que considerar demonstrada a factualidade vertida na alínea e).
Indicou concretamente os minutos do registo dos depoimentos dos quais diz resultarem provados os factos em apreço.  
O tribunal a quo entendeu que, face à prova produzida, não ficou provado que as partes tenham convencionado que, «com a celebração do contrato promessa, a sociedade C…, Unipessoal, Lda, promitente compradora, ficava “autorizada a cuidar da conservação e manutenção dos imóveis prometidos comprar”».
Ouvidos os depoimentos não só na parte indicada pela recorrente, mas na sua totalidade – e independentemente de saber da possibilidade da factualidade em apreço ser provada por testemunhas -, verifica-se que M …, se identificou como porteira do prédio sito da Avenida …, nº 92, onde vive há 38 anos. Declarou que a sociedade O…, SA, era a dona do prédio, prédio esse que diz ter sido adquirido por esta sociedade em 2004 e que em 2012/2013 o legal representante da mesma – A… D… – lhe apresentou um casal como fazendo parte da C… e disse que esta ia comprar o prédio. Declarou que este casal lhe disse que iam fazer obras nas fracções, que lhe entregaram as chaves dos apartamentos que estavam  vazios – o 3º, o 1º A, o 7ª A e o 8º C - a fim de, por sua vez, as entregar aos pedreiros e que o 3º A está “todo partido”. Foi-lhe dito que as fracções acabaram por não ser vendidas e que voltou a ver o casal no prédio mais uma vez. Disse ainda não ter mais qualquer conhecimento relacionado com a compra e venda dos imóveis e que só uma vez o montante das rendas foi entregue pela própria ao casal supra referido, mas que a seguir o legal representante da sociedade O… lhe referiu que o montante das rendas devia ser entregue unicamente ao próprio.
J …, identificou-se como gestor de empresas da área da construção civil. Declarou que fazia trabalhos de construção civil e que em determinada altura, que depois identificou como sendo há cerca de 10 anos, começou obras em várias fracções deste prédio, as mais profundas no 3º andar, ao que julga, no 3ºA e que parou essas obras porque a C… lhe disse que não poderia continuar a pagar, uma vez que o negócio com a sociedade O… “não ia para a frente, não se estava a concretizar”. Disse que as chaves das fracções lhe foram entregues por “um senhor” da C… e não saber, em concreto, que negócio é que existia entre esta sociedade e a sociedade O… respeitante às fracções.
Do declarado pelas testemunhas apenas se pode concluir que nas fracções supra referidas foram realizadas obras, a solicitação da C… – desconhecendo-se de todo, inclusive, que obras em concreto foram realizadas e qual o fundamento para a sua realização -, nada tendo as testemunhas demonstrado saber no que respeita ao invocado contrato promessa de compra e venda.
Tal como sustenta, aliás, a própria apelante, o administrador da insolvência, ouvido em declarações na audiência final nos termos do disposto no artº 139º do CIRE, declarou relativamente aos três cheques invocados como tendo sido utilizados para pagamento do sinal respeitante ao alegado contrato promessa de compra e venda - um no montante de € 900.000,00 e dois no montante cada um de € 800.000,00 -, que não tem os respectivos originais na sua posse, que os mesmos não constam do processo e que os montantes titulados por tais cheques não deram entrada na contabilidade, nem em qualquer conta bancária da insolvente, uma vez que o valor em causa “está apreendido noutro processo do qual também é administrador da insolvência”. Disse que das cópias dos cheques resulta que os mesmos foram emitidos à ordem da sociedade Distri… – e não da insolvente - e que destes não consta qualquer endosso à insolvente. Declarou que o valor dos cheques se encontra apreendido à ordem da insolvência da Distri… e que o “dono da C… primitivo era precisamente o que era dono da Distri…”.  Referiu ainda, entre outra factualidade, que “a C… para comprar a Distri…passa estes cheques à Distri…” e que dos elementos a que teve acesso da O… não constava qualquer carta endereçada pela C… a “transformar” a mora relativa ao contrato promessa em incumprimento definitivo e que, quer na fase do PER, onde a C… não reclamou créditos, quer na fase da insolvência, antes de ter tomado posse dos imóveis,  quem recebia todas as rendas era o legal da insolvente. Disse que o valor dos cheques foi pago pela Caixa de Crédito Agrícola Mútuo à Distril… e que não existe qualquer processo crime ou acção em que se invoque a simulação contra a C… com fundamento nestes cheques. Disse que inicialmente reconheceu o crédito da apelante com base apenas nos termos da transacção outorgada entre a sociedade insolvente e a C…, transacção essa que foi homologada por sentença. Tal transacção, também referida ora pela apelante, foi considerada demonstrada como consta da sentença ora em recurso e do teor daquela nada mais resulta no que se refere à celebração do invocado contrato promessa.
Disse que até começar a ser o próprio a emitir, em nome da massa insolvente, os recibos de renda relativos ao arrendamento das fracções, os mesmos eram emitidos em nome da sociedade insolvente e que as despesas respeitantes às fracções – camarárias e outras - eram pagas por esta.
Sustentou ainda a apelante que não pode agora «ver negado o seu direito ao crédito (reconhecido judicialmente por sentença transitada em julgado, …), por a insolvente O… não ter alegadamente (pois não foi feita qualquer prova desse facto) depositado o cheque na sua conta bancária.
De facto, no requerimento apresentado pela ora Recorrente em 10/01/2022, com a referência citius 31322766, a aqui Recorrente requerer como diligência de prova que “Mais se requer que seja oficiada a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo Entre o Tejo e Sado para informar a quem foram pagos os identificados cheques, ou se o montante ainda se encontra cativo.
Aliás, tal requerimento de prova não foi alvo de qualquer despacho pelo Tribunal a quo, a deferir ou indeferir o mesmo, não considerando relevante essa informação, para a descoberta da verdade nos presentes autos.»
Compulsados os autos, verifica-se que o requerimento supra referido foi apresentado pela credora ora apelante, na data também aludida pela mesma.
Não consta dos autos que tal requerimento tenha sido objecto de decisão.
Em 02/02/2022 e 16/02/2022 tiveram lugar as 1ª e 2ª sessões de audiência final, tendo em ambas estado presente a Ilustre Mandatária da credora G… Eood, ora apelante.
No final da última sessão e antes de terem início as alegações, pela Mmª Juíza foi perguntado aos Ilustres Mandatários se pretendiam formular algum requerimento, tendo os mesmos respondido negativamente.
Está em causa uma diligência de prova e a omissão quanto à sua admissibilidade ou indeferimento constituirá uma irregularidade processual.
No caso não estamos perante a nulidade prevista no artigo 187º ou do artigo 194º, ambos do Código de Processo Civil e quanto às demais nulidades ou irregularidades cometidas no processo, dispõe o artigo 199º do mesmo diploma que, se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas nulidades, as mesmas podem ser arguidas enquanto o acto não terminar.
A irregularidade proveniente da falta de despacho sobre o deferimento ou indeferimento da requerida notificação da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo Entre o Tejo e Sado para informar a quem foram pagos os identificados cheques, ou se o montante ainda se encontra cativo devia e podia ter sido invocada pela mandatária que estava presente, até ao encerramento da audiência. Não o tendo sido, tem que se considerar a irregularidade sanada.
Por tudo o exposto e consistindo, como se viu, o invocado “Contrato promessa de compra e venda” em documento particular que foi objecto de impugnação pelo credor BCP e não permitindo os elementos probatórios indicados pela credora, ora apelante e produzidos a prova dos respectivos factos, tem que se concluir que a factualidade plasmada nas alíneas a) a e) não se encontra efectivamente demonstrada.
Relativamente ao invocado no que concerne à factualidade considerada não provada sob as alíneas k), l) e m), assiste razão à apelante atento o que resulta da certidão extraída do Proc. nº …, junta por requerimento de 17/12/2021.
Assim, nesta parte procede a impugnação, passando a considerar-se provada a seguinte factualidade:
iii) A sociedade C…, Unipessoal, Lda, interpôs acção ordinária contra a insolvente Sociedade Imobiliária O…, SA, a qual correu termos sob o nº … na …, peticionando o reconhecimento da resolução do contrato promessa de compra e venda celebrado em 10 de Abril de 2012, por incumprimento imputável à R. e a condenação desta no pagamento do montante de €5.000.000,00, correspondente ao sinal prestado em dobro. 
iv) Mais peticionou naqueles autos que fosse reconhecido o direito de retenção sobre as fracções objecto do contrato promessa de compra e venda, até integral pagamento do valor peticionado.
v) A título subsidiário, foi peticionado que fosse proferida decisão judicial que decretasse a transferência da titularidade das fracções a favor da promitente compradora.
Sustentou igualmente a apelante que a decisão de considerar como não provados os factos vertidos nas alíneas g), i) e j) merece igualmente censura, na medida em que, face ao declarado pelas testemunhas M … e A … demonstrado que:
«O representante legal da C… acompanhou o representante legal da sociedade insolvente aos prédios, tendo sido apresentado à porteira do prédio como o “comprador”» e atentos os depoimentos da primeira das referidas testemunhas e de João …, resultou provado que:
«Foram iniciadas obras pela sociedade C… e
«Foi contratado um empreiteiro pela C…, que procedeu à reparação em alguns apartamentos».
No que concerne a esta factualidade que a recorrente sustenta que se encontra provada, cumpre referir o seguinte:
A impugnação da decisão da matéria de facto tem como pressuposto que, com o resultado da mesma, a parte que impugnou passe a ter ao seu dispor elementos capazes de influenciar a decisão de mérito, modificando-a, assim logrando obter um efeito juridicamente útil ou relevante.
Dito de outro modo e conforme se decidiu no Ac. do STJ de 14-07-2021, relator: Fernando Baptista, Proc. nº 65/18.9T8EPS.G1.S1: “se o facto que se pretende impugnar for irrelevante para a decisão, segundo as várias soluções plausíveis, não há qualquer utilidade naquela impugnação da matéria de facto, pois o resultado a que se chegar (provado ou não provado) é sempre o mesmo: absolutamente inócuo. O mesmo é dizer que só se justifica que a Relação faça uso dos poderes de controlo da matéria de facto da 1ª instância quando essa actividade da Relação recaia sobre factos que tenham interesse para a decisão da causa, ut artº 130º do CPC. Quando assim não ocorre, a Relação deve abster-se de apreciar tal impugnação - é que aqui, como refere ABRANTES GERALDES [24- Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2ª edição revista e actualizada, p. 298.], a solução do caso, considerando as soluções plausíveis da questão de direito, não está minimamente dependente da modificação que o apelante pretende ver operada na matéria de facto a considerar provada”.
É totalmente inócuo para a decisão dos autos saber se o representante legal da C… acompanhou o representante legal da sociedade insolvente aos prédios e se aquele foi apresentado à porteira do prédio como o “comprador”. Esta factualidade é de todo irrelevante para efeitos de permitir concluir pela existência do crédito invocado pela recorrente, o qual, conforme resulta do alegado na reclamação de créditos apresentada C… Unipessoal, Lda e junta pelo AI, por determinação do tribunal a quo, em 19/04/2021 e do aperfeiçoamento a tal articulado apresentado pela ora recorrente, tem como causa de pedir a celebração do contrato promessa, acompanhado da tradição das fracções, a entrega por parte da alegada promitente compradora da quantia de € 2.500.000,00 a título de sinal e o respectivo incumprimento definitivo, alegadamente imputável à promitente vendedora.
De igual modo, não assume relevância a factualidade respeitante a saber se «foram iniciadas obras pela sociedade C… e se «foi contratado um empreiteiro pela C…, que procedeu à reparação em alguns apartamentos». Considerando o supra referido, nenhuma destes factos releva para a decisão a proferir. 
Assim e no que concerne à impugnação apresentada relativamente ao plasmado nas alíneas g), h) e i) decide-se pela respectiva rejeição.
Por tudo o exposto, decide-se aditar aos factos provados o seguinte:
iii) A sociedade C… Unipessoal, Lda, interpôs acção ordinária contra a insolvente Sociedade Imobiliária O…, SA, a qual correu termos sob o nº … na …, peticionando o reconhecimento da resolução do contrato promessa de compra e venda celebrado em 10 de Abril de 2012, por incumprimento imputável à R. e a condenação desta no pagamento do montante de €5.000.000,00, correspondente ao sinal prestado em dobro. 
iv) Mais peticionou naqueles autos que fosse reconhecido o direito de retenção sobre as fracções objecto do contrato promessa de compra e venda, até integral pagamento do valor peticionado.
v) A título subsidiário, foi peticionado que fosse proferida decisão judicial que decretasse a transferência da titularidade das fracções a favor da promitente compradora.
No mais improcede a impugnação da decisão da matéria de facto.
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Decidida que se encontra a impugnação da matéria de facto e fixada a mesma em conformidade com o referido, passemos a conhecer das questões suscitadas pelo credora/recorrente em termos de Direito.
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B) O Direito
Sustentou a recorrente que o tribunal a quo violou o disposto no nº 1 do artigo 619º do C.P.Civil ao “desvalorizar o caso julgado da decisão transitada em julgado que reconheceu a existência do crédito e o direito de retenção de bens”. Diz que “a sentença homologatória da transacção judicial decide também sobre o mérito da causa condenando ambas as partes no cumprimento dos termos que transigiram, a qual constitui título executivo após o seu trânsito” e que, contrariamente ao entendimento o tribunal recorrido, “como decisão de mérito os termos da sentença proferida são oponíveis a terceiros, nomeadamente aos aqui impugnantes”.
Com este fundamento, invoca que sempre o crédito por si reclamado tem que ser reconhecido e graduado em conformidade com o direito de retenção invocado.
Diz ainda que “mesmo que assim não se entendesse, por via da força probatória de tal decisão judicial sempre ter-se-ia de ter por confessados os factos dessa transação, reconhecendo-se o direito de retenção a favor da recorrente e, consequentemente reconhecendo-se o seu direito de crédito e graduando-se o mesmo”.  
Conforme consta da sentença, encontra-se provado que:
i) Por escrito denominado “termo de transacção”, outorgado entre C…, Unipessoal, Lda. e Sociedade Imobiliária O…, S.A., respectivamente Autora e Ré nesses autos, que se dá aqui por integralmente reproduzido, foi feito constar, entre o mais, (cláusula 2ª), que “A Ré reconhece (…) que, por razões a si imputáveis, não conseguiu reunir os meios financeiros para proceder ao distrate das hipotecas que recaem sobre os imóveis identificados na cláusula anterior e assim proceder à realização da escritura pública de compra e venda do refiro imóvel, livre de quaisquer ónus e encargos a favor da Autora” (cláusula 3.ª); “em consequência do referido no ponto anterior, a Ré reconhece a favor da Autora o direito de retenção sobre os referidos imóveis até pagamento integral da quantia em dobro entregue a título de sinal e princípio de pagamento que ascende a €5.000.000,00 (cinco milhões de euros)” (cláusula 4º); “A Autora declara aceitar a redução da dívida ao produto global resultante da alienação total das fracções indicadas no ponto n.º2 da presente transacção” (cláusula 5ª).
ii) A referida transacção foi homologada por sentença proferida em 6.6.2013, no processo nº … , da …  
Não obstante, entendeu o tribunal a quo que a decisão não faz caso julgado contra terceiros, designadamente o credor hipotecário e que, assim sendo, tornava-se “necessário que o credor reclamante demonstre nestes autos a existência do crédito, qual o montante, designadamente, se corresponde ao reconhecido pelo Administrador de Insolvência e bem assim os pressupostos do direito de retenção”.
Antes mesmo de saber em que termos é que a sentença homologatória de transacção forma caso julgado, há que considerar o seguinte:
O credor reclamante Banco … , SA, que tem registada a seu favor, pela Ap. …, de 2007.01.11, hipoteca voluntária sobre as fracções apreendidas e relativamente às quais a apelante invoca direito de retenção, não teve intervenção no processo nº … da …, processo esse no qual foi efectuada a transacção entre a insolvente e a ora apelante.
O processo de insolvência trata-se de “um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores pela forma prevista num plano de insolvência, baseado, nomeadamente, na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente, ou, quando tal não se afigure possível, na liquidação do património do devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores” – cfr artº 1º do CIRE.
Trata-se, pois, de processo de natureza universal, concursal e célere, sendo a verificação do passivo, fase processual indispensável para viabilizar a repartição do produto da liquidação pelos credores, feita, como se vê dos arts. 128º a 140º, em processo que corre por apenso à insolvência.
Dentro do prazo fixado para o efeito, deverão todos os credores da insolvência reclamar a verificação dos seus créditos, sendo que, tal reclamação é imperativa, mesmo que tais credores tenham o seu crédito reconhecido por sentença transitada em julgado - cfr artigo 128º, nºs 1 e 3 do CIRE.
Da articulação destes dois números do referido preceito resulta que todos os credores da insolvência, qualquer que seja a natureza e fundamento do seu crédito, devem reclamá-lo no processo de insolvência, para aí poderem obter satisfação, sendo que uma das resoluções que se impõem neste processo é a da verificação do passivo, através do reconhecimento (ou não reconhecimento) dos créditos reclamados, sua graduação, com vista ao seu futuro pagamento. É através da sentença que se venha a produzir nesta sede que os credores reclamantes podem obter a sua satisfação nos termos do artigo 173º do CIRE.
Reclamado o crédito e ainda que o mesmo haja sido reconhecido pelo administrador na lista apresentada nos termos do artº 129º do CIRE, pode a inclusão do crédito como reconhecido ser impugnada por qualquer interessado de acordo com o disposto no artº 130º do mesmo diploma.
Aqui chegados e porque totalmente elucidativa, valemo-nos da fundamentação do Ac. do STJ de 13-11-2018, relatora: Ana Paula Boularot, Proc. 128/15.2T8VNG-B.P1.S1, consultável in www.dgsi.pt: “É óbvio que um dos principais interessados na impugnação dos créditos em questão seria, como foi, o credor hipotecário dos imóveis, o qual não teve, como não teria de ter, qualquer intervenção em sede declarativa, já que esta se desenvolveu apenas entre as Recorrentes e a Insolvente, com vista, no que aqui nos interessa, à resolução do contrato promessa havido por culpa desta, pagamento do sinal em dobro e reconhecimento do direito de retenção daquelas, tal como veio a ser decidido a final, mas a decisão assim obtida – sem qualquer contestação da então Ré, aqui Insolvente – não fez, nem pode fazer caso julgado no que toca à Credora/Recorrida Caixa Geral de Depósitos.
Prima facie, porque os requisitos do caso julgado a tal se opõem, cfr artigo 581º do CPCivil, sendo manifesta a diferença entre os sujeitos; secundum, pronunciando-se essa sentença sobre a existência de um direito de retenção por banda das promitentes compradoras sobre os imóveis hipotecados àquela Credora, direito de retenção esse que lhes atribuiria, em sede de verificação e graduação de créditos a proferir nos autos de insolvência, satisfação preferencial dos respectivos créditos em relação aos créditos provenientes das hipotecas constituídas sobre os imóveis nos termos dos artigos 755º, nº1, alínea f) e 759º, nº2 do CCivil, o que constituiria um atropelo aos direitos desta Credora Reclamante, violando-se, assim, de uma forma grosseira, o princípio do contraditório, cfr Lebre de Freitas, Sobre a prevalência, no apenso de reclamação de créditos do direito de retenção reconhecido por sentença, in BOA, Ano 66, Vol II, Setembro 2006.
Os limites subjectivos do caso julgado, embora digam apenas respeito à decisão transitada em julgado, resolvendo a questão suscitada ao Tribunal pelas partes em conflito, artigos 619º, nº1 e 621º do CPCivil, não descartam a sua eventual oponibilidade aos terceiros, aferindo-se a sua extensão a estes pela análise da sua vinculação directa, cfr Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre O Novo Processo Civil, 594/595.
Se a Credora Reclamante Caixa Geral de Depósitos, SA, aqui Recorrido, fosse tida como um terceiro juridicamente indiferente como pretendem as Recorrentes, por forma a serem-lhe oponíveis as sentenças produzidas em sede declarativa, veria ser afectado o posicionamento da sua garantia em confronto com a reconhecida àquelas, sem ter tido qualquer possibilidade de se poder pronunciar, situação esta que a ordem jurídica afasta, atribuindo-lhe antes o estatuto de terceiro juridicamente interessado pois as sentenças declarativas aqui esgrimidas a valerem nos termos enunciados reduziriam o conteúdo do seu direito de crédito, cfr Antunes Varela, J. Miguel Bezerra, Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição, 726; Manuel Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1976, 311/314; inter alia os Ac STJ de 20 de Maio de 2010 (Relator Hélder Roque) e de 18 de Fevereiro de 2015 (Relator Pinto de Almeida, aqui primeiro Adjunto), in www.dgsi.pt.
Temos assim, como assente, que qualquer sentença produzida em acção declarativa movida contra insolventes para além de não dispensar a pertinente reclamação de créditos em sede insolvencial, não faz caso julgado em relação a terceiros potencialmente afectados pela mesma, os quais são terceiros juridicamente interessados, cfr neste mesmo sentido o Ac STJ de 11 de Setembro de 2018, produzido no processo 954/13.7TJVNF-A.G1.S2, deste mesmo colectivo, in SASTJ, site do STJ.
Também o Ac. do STJ de 16-12-2021, relator Luís Espírito Santo, Proc. nº 4684/16.0T8VFX-E.L1.S1, o qual pode ser consultado no mesmo sítio, se pronunciou no mesmo sentido, fazendo alusão a vários acórdãos concordantes. Diz-se ali: «Há que reconhecer a inoponibilidade da sentença que, no âmbito do processo nº 2254/16..., correu termos no Juízo Central Cível ..., aos credores reclamantes do presente apenso do processo de insolvência, por não constituir, de facto, caso julgado relativamente a terceiros interessados, que nela não tiveram intervenção, o que implicará, por parte do reclamante, a necessidade de provar no presente processo de insolvência (e concretamente no apenso de verificação e graduação de créditos) os factos demonstrativos da natureza de crédito privilegiado por força do direito de retenção que o garante.
É o que resulta igualmente do artigo 789º, nº 5, do Código de Processo Civil quando se dispõe que: “Se o crédito estiver reconhecido por sentença que tenha força de caso julgado em relação ao impugnante, a impugnação só pode basear-se em algum dos fundamentos mencionados nos artigos 729º e 730º, na parte em que forem aplicáveis”.
(Conforme referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, in “Código de Processo Civil Anotado. Volume II. Processo de Execução, Processos Especiais e Processo de Inventário Judicial”, Almedina 2020, a página 195: “Assim, para efeitos deste nº 5, deve entender-se que não é oponível ao credor hipotecário a sentença proferida em acção declarativa, na qual não interveio, que haja reconhecido o seu crédito (exequendo ou reclamado) e o respectivo direito de retenção sobre o imóvel hipotecado. (...) Proposta a acção executiva pelo credor titular do direito de retenção (ou reclamado na execução de crédito assim garantido), o credor hipotecário, ao reclamar o seu crédito, pode impugnar aquele crédito ou a existência do direito de retenção, sob pena de o mesmo permanecer incólume, verificando-se o efeito cominatório previsto no artigo 791º, nº 4.”; no mesmo sentido, vide Rui Pinto, in “A Acção Executiva”, AAFDL, 2019, a páginas 824 a 825).
Trata-se aliás de uma posição aceite e consolidada, de forma praticamente pacífica, na jurisprudência nacional, não existindo razões bastantes para dela divergir. (vide acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de Fevereiro de 2020 (relator Abrantes Geraldes), proferido no processo nº 503/14.0T8CHV-A.G1.S1, publicado in ECLI; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Outubro de 2019 (relatora Maria João Vaz Tomé), proferido no processo nº 6906/11.4YYLSB-A.L1.S2, publicado in www.dgsi. pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Abril de 2018 (relator Joaquim Piçarra), proferido no processo nº 622/08.1TBPFR-A.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt); acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Janeiro de 2018 e 27 de Abril de 2017 (relator em ambos Pinto de Almeida), proferidos nos processos nº 212/14.0T8OLH-AB.E1.S1 e 44/14.5T8VIS.B.C1.S1, publicados in www.dgsi.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Outubro de 2015 (relator Silva Salazar), proferido no processo nº 5729/09.5YYPRT-C.P1.S1; acórdão de 18 de Fevereiro de 2015 (relator Fonseca Ramos), proferido no processo nº 2451/08.3TBCLD.L1.S1., publicado in www.dgsi.pt).»
No mesmo sentido pode ainda ver-se o Ac. do STJ de 02.02.2022, Proc. 1/18.2T8STS-C.P1.S1, referido na sentença recorrida.
Conclui-se, pois, que o que releva, desde logo, para efeitos da não oponibilidade da sentença proferida no processo nº …, da … ao credor impugnante Banco, …, SA, é o facto de este não ter tido intervenção naqueles autos e isto sempre seria assim mesmo que aqueles autos tivessem terminado com a prolação de uma sentença que tivesse conhecido do mérito da causa e não por transacção.
Não se verifica, assim, caso julgado, autoridade de caso julgado ou ainda eficácia reflexa dessas decisões que reconheçam créditos sobre a insolvência com base em incumprimento de contratos promessa de compra e venda pela insolvente e antes da propositura da insolvência e direito de retenção com base em tradição do bem imóvel objecto do contrato, enquanto direito real de garantia que prevalece no pagamento sobre a hipoteca, nos termos dos artºs 755º, nº 1, al. f), 759º, nº 2 e artºs 686º, nº1, 687º, 688º, nº1, al. a), todos do Código Civil.
Cabe aos credores reclamantes o ónus da alegação dos factos essenciais constitutivos dos seus pretensos direitos de crédito sobre a insolvente e as garantias de que estes disponham, dado que tal constitui a causa de pedir das reclamações de crédito.
Havendo impugnação por credor da insolvente, como é o caso, de créditos reclamados por outros credores e constantes da lista de credores reconhecidos pelo AI seguem-se os termos dos artº 130º a 140º CIRE. Sobre os credores reclamantes impende o respectivo ónus da prova da existência, exigibilidade e natureza comum, subordinada ou privilegiada ou garantida do seu crédito, com vista ao seu pagamento pelo produto dos bens apreendidos à insolvente, para os efeitos dos artºs 47º, nº4, 48º, e 174º a 177º CIRE.
Não tendo a apelante dado cumprimento ao ónus que sobre a mesma impendia relativo desde logo à prova do crédito reclamado, não merece censura a sentença proferida, sendo improcedente o recurso.   
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IV-Decisão
Em face do exposto, acordam as juízas na Secção do Comércio do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar o recurso improcedente, mantendo a sentença recorrida.
Custas pela apelante.
Registe e Notifique.  
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Nos termos do despacho proferido em 04/03/2023, deverá o tribunal da 1ª instância pronunciar-se quanto ao lugar que ocupará o crédito garantido por penhor do Banco B…, SA, no valor de € 133.920,75, sobre o produto da venda das 1990 acções BCP, domiciliadas no Banco BIC e já reconhecido nesses termos.

Lisboa, 02/10/2023
Manuela Espadaneira Lopes
Renata Linhares de Castro
Isabel Fonseca