Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1149/22.4T9GMR.G1
Relator: PAULO CORREIA SERAFIM
Descritores: CREDIBILIDADE DA PROVA TESTEMUNHAL
CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
ATIPICIDADE
SITUAÇÃO ISOLADA
CRIME DE AMEAÇA AGRAVADA
TIPICIDADE
AGRESSÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/11/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I - A circunstância de declarantes/depoentes terem corroborado factos descritos no libelo acusatório, e, desse modo, a versão aduzida pela assistente, não significa, por si só, que tal factualidade deva ser dada como provada, porquanto, para tal era necessário que tais provas fossem credíveis e coerentes entre si e face a outros meios de prova, o que, no incensurável juízo valorativo do Tribunal a quo, não sucede.
II – Não se deve ter por preenchida a tipicidade do crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º do Código Penal, se os factos apurados se circunscrevem a uma situação única, temporalmente isolada e forem insuficientes para que se conclua que o respetivo comportamento do arguido reveste especial gravidade e traduz, mais do que insensibilidade, crueldade e um particular acinte na forma de tratamento que dispensou à ofendida, à data seu cônjuge.
III - Não obstante a inequívoca censurabilidade (e preenchimento de distinta tipicidade penal) da conduta do arguido, que incluiu um soez impropério à ofendida e o agarrar momentâneo do pescoço desta enquanto lhe anunciava a vontade de atentar contra a sua vida por forma a compeli-la a desistir da providência cautelar de arrolamento que havia intentado contra ele, urge ponderar o contexto em que tal comportamento foi realizado onde impera a decorrência de uma separação de facto prolongada, a pendência de uma ação de divórcio, até então litigioso, e a instauração pela ofendida do dito procedimento cautelar, no âmbito do qual, entre o mais, foi arrolado um motociclo que, entretanto, o arguido já havia vendido a terceiro, e perante o qual teria de prestar contas caso o negócio fosse anulado.
IV - Este particular circunstancialismo não justifica, mas explica o estado de exaltação em que atuou o arguido, perante a verbalizada recusa da assistente em desistir da mencionada providência cautelar, o que, a par da ausência de lesão física ou psíquica significativa, permite concluir não estarmos perante a prática de maus tratos, por o quadro global em apreço não revelar uma conduta maltratante do arguido especialmente intensa que tivesse deixado a vítima em situação degradante ou em estado de constante exposição de ofensa à sua liberdade de decisão, honra, integridade física e/ou vida. Os ajuizados atos não denotam um padrão comportamental associado a uma perigosidade típica para o bem-estar físico e/ou psíquico da vítima.
V - É elemento objetivo do crime de ameaça, o anúncio, por qualquer meio, de que o agente pretende infringir a outrem um mal futuro, dependente da vontade do autor.
VI – A circunstância de o arguido ter agarrado com as mãos o pescoço da assistente enquanto proferia a expressão «Desiste da ação. Mato-te, filha da puta» não consubstancia já um ato de execução da proclamada morte da mesma, que face à imprevista intervenção de terceiros, se exauriu aí, culminando numa hipotética tentativa de crime de homicídio, outrossim não traduz uma ação que esgotou a intenção única de ofender a integridade física da ofendida sem intenção de causação de um outro mal ulteriormente. No caso, aquele comportamento agressivo do arguido que acompanhou a prolação da expressão intimidatória destinou-se, antes, a conferir reforçada seriedade à ameaça produzida e, desse modo, lograr atemorizar a ofendida, levando-a a praticar o ato por ele almejado e exigido. Tanto que, como é evidente, o arguido necessitava que a visada vivesse para desistir do procedimento cautelar de arrolamento contra ele instaurado, como ele pretendia. VII - Ao proferir a dita expressão, no contexto em que o fez, o arguido não estava apenas a verbalizar que naquele momento iria imediatamente agredir a assistente, agarrando com as mãos o seu pescoço, como sucedeu, mas igualmente a exteriorizar uma ameaça que cumpriria futuramente caso ela não acedesse à sua determinação de desistir da providência cautelar que interpôs. E fê-lo de modo adequado a causar medo na ofendida de que a ameaça viesse a ser concretizada.
Decisão Texto Integral:
Relação de Guimarães:

I – Relatório:
           
I.1 Decisão recorrida
No âmbito do Processo Comum (Tribunal Singular) nº 1149/22.4T9GMR, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga - Juízo Local Criminal de Guimarães – Juiz ..., por sentença proferida e depositada no dia 25.06.2025 (referências ...43 e ...38, respetivamente), foi decidido:

“Pelo exposto, julga-se a acusação, parcialmente, procedente, e, consequentemente:
1. Parte crime:
a) Absolve-se o arguido AA da prática dos três crimes de violência doméstica de que vinha acusado.
b) Indefere-se a fixação de indemnização ao abrigo do disposto no art.º 82.º-A do CPP.
c) Condena-se o mesmo arguido pela prática de um crime de ameaça agravada p. e p. pelo artigo 153.º, e 155.º, n.º 1, al. a) do Código Penal na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa à taxa de €8,00 (oito) euros.
d) Condena-se o arguido no pagamento de 03 UC´s de taxa de justiça, e nos demais encargos do processo.
*
2. Parte cível:

Julgar os pedidos de indemnização civil, deduzidos pelos demandantes BB, totalmente improcedentes, e o pedido de indemnização civil, deduzido pela demandante CC, parcialmente, procedente e, em consequência:
1. Condenar o demandado AA a pagar-lhe a quantia de €500,00 (quinhentos euros), acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da notificação do PIC até integral pagamento.
2. Custas de acordo com os decaimentos.”

I.2 Recursos:

I.2.1 - Discordando da decisão proferida em primeira instância, na parte condenatória, interpôs recurso o arguido AA, cuja motivação culmina com as seguintes conclusões e petitório (referência ...65):

1. Afigura-se ao aqui Recorrente AA, que a douta Sentença condenatória, merece reparo e carece de fundamento de facto e de direito, mas exclusivamente quanto à prática pelo recorrente um crime de ameaça agravada, tendo erradamente condenado o recorrente pela prática desse crime,  que se encontra p. e p. pelo artigo 153.º, e 155.º, n.º 1, al. a) do Código Penal na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa à taxa de €8,00 (oito) euros, e condenado a pagar-lhe a quantia de €500,00 (quinhentos euros), acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da notificação do PIC até integral pagamento à Demandante CC,
2. O Tribunal a quo, sem prescindir a qualidade técnica e humana do Ilustre Magistrado Judicial, não fez, apenas no caso concreto que aqui é posto em crise, uma criteriosa e cuidada apreciação da prova produzida em julgamento, dando como provada a matéria fáctica que consta da douta sentença de que se recorre, que supra transcrevemos e aqui damos por reproduzida e que nos merece reparo;
3. Damos aqui por reproduzida a Sentença sob recurso, factos provados, não provados, e respetiva motivação;
4. Como ponto prévio, não queremos deixar de realçar e reiterar que, sem prescindir as demais críticas que faremos, é nosso entendimento que o Tribunal a quo, apesar da reconhecida qualidade técnica e humana do Meritíssimo Juiz, o qual é reconhecidamente qualificado e merece todo o respeito e é um bom exemplo da grande qualidade dos magistrados judicias portugueses, não efetuou nestes autos e no que se refere exclusivamente ao crime um crime de ameaça agravada p. e p. pelo artigo 153.º, e 155.º, n.º 1, al. a) do Código Penal dos autos, pelo qual condenou o recorrente AA, uma criteriosa e cuidada apreciação da prova validamente junta aos autos e produzida em julgamento;
5. Se é verdade quanto aos demais e crimes e factualidade o Tribunal a quo andou bem, não se deixando enganar e iludir por falsos depoimentos das testemunhas e declarações risíveis da assistente CC, declarações essas que consubstanciam manifestamente uma denuncia caluniosa, p. e p. pelo artigo 365º do C.P., no que se refere à factualidade assente e aqui oposta em crime e quanto ao crime em apreço, andou mal o Tribunal a quo, não só por que tal factualidade deveria sim ser dada como não provada e porque, também, como veremos infra, mesmo admitindo-se para mero efeito de raciocínio a prática dos factos, aqueles não são integradores do tipo legal do crime de ameaça agravada;
6. Encontra-se errada e incorretamente julgada a matéria de facto dada como provada nos pontos 12, 13, 14 e 15, a qual deveria ter sido dada como não provada, que supra se transcreveu e que aqui se dá por reproduzidos para todos os efeitos legais;
7. Ora, não foi produzida prova segura e inequívoca que permitisse dar tal factualidade como assente e que AA, praticou os factos dados por assentes, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar supra descritas no douto libelo acusatório e que vieram a ser, quanto ao crime dos autos, vertidos integralmente na factualidade dada como provada pelo Tribunal a quo, sem que contudo para tal tivesse sido feita prova segura e inequívoca, antes pelo contrário, inexistindo prova que permitisse dar tais factos como assentes;
8. Estes concretos pontos da matéria de facto que aqui impugnamos por se encontrarem incorretamente julgados, e que impugnaremos especificadamente mas conjugadamente, deveriam ter sido antes dados respetivamente como não provados, nos termos e pelas razões que infra elencaremos e porque a prova infra transcrita e a produzida assim o impunham, e também a ausência de prova em sentido contrário;
9. Relativamente ao facto n.º 12, deu-se como provado que: “No dia 8 de março de 2021, pelas 16:30 horas, o arguido dirigiu-se ao escritório da assistente, sito na Rua ..., ..., em Guimarães, devido ao facto da assistente ter dado entrada de uma providencia cautelar de arrolamento, de um motociclo do arguido (que tinha recentemente vendido a novo proprietário), este entrou no gabinete, empurrou a secretária encostando a assistente à parede, e agarrou-a, com as duas mãos, pelo pescoço, ao mesmo tempo disse-lhe: “Desiste da ação. Mato-te, filha da puta.”;
10. Quanto ao facto n.º 13: “Nesse momento foi surpreendido por DD e EE, e fugiu do local”;
11. Relativamente ao facto n.º 14, deu-se como provado que: “Com o aludido em 12), arguido quis e logrou ferir a ofendida na sua honra e consideração, saúde psíquica e física, molestá-la psíquica e fisicamente, intimidá-la, provocar-lhe medo, ansiedade e inquietação, provocar-lhe receio de vir a sofrer atos atentatórios contra a sua integridade física e vida, bem sabendo que a sua conduta era adequada a causar-lhe tal receio e limitar a sua liberdade pessoal, ambulatória”;
12. E por fim, no facto n.º 15, deu-se como provado que: “O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que estas suas condutas aludidas em 12), eram proibidas e punidas pela lei penal”;
13. É certo que o Arguido AA, dirigiu-se ao escritório da Assistente, sito na Rua ..., ..., em Guimarães, como o mesmo afirmou em sede de audiência de discussão e julgamento, do dia 28.02.2024, declarações que aqui se dão por reproduzidas para os devidos efeitos legais, conferir ficheiro n.º Diligencia_1149-22.4T9GMR_202410-09_10-21-42.mp3, gravado no sistema digital em uso pelo Tribunal, supra parcialmente transcritas e que aqui se dão por reproduzidas; 
14. Sucede porém, que esta tal visita confirmada pelo Arguido AA, não teve lugar no dia 8 de março de 2021, pelas 16:30 horas;
15. Aliás o aqui recorrente AA descreveu, juntando prova documental para o efeito, por requerimento apresentado a 17.06.2025, com a referência Citius n.º 52666527, que a alegada prática dos factos na data indicada de 08 de março de 2021, é materialmente impossível. Nessa data, a única ação então pendente era uma providência cautelar de arrolamento, com o n.º de processo 336/21.7T8GMR-B, que teve os seus termos no Juízo de Família e Menores de Guimarães – Juiz ..., cuja existência, naquela data, o Arguido desconhecia por completo, face ao seu carácter sigiloso, sendo que apenas foi conhecida pelo Arguido, após notificação da sua ali Ilustre Mandatária, Dra. FF, da sentença que decretou o arrolamento, a qual teve lugar via Citius apenas no dia 10 de março de 2021. Ou seja, dois dias após a alegada prática dos factos. Juntou-se para tal, em anexo ao supra identificado requerimento, documento comprovativo da notificação e respetiva data, que se encontra junto aos autos a fls. … e que aqui se dá por reproduzidos para os devidos efeitos legais;
16. Reitere-se, tal providência encontrava-se sujeita a segredo de justiça, sendo, por isso, totalmente desconhecida ao Arguido e à respetiva mandatária (na data em causa e que o representa na jurisdição de Família e Menores), conhecimento esse que só ocorre com a supra citada notificação;
17. Consequentemente, torna-se evidente que o Arguido não poderia ter praticado os atos que lhe são imputados, nos termos e com o móbil que lhe é atribuído, na data de 08 de março de 2021, como pretende fazer crer a alegada vítima, nem os atos foram praticados nos termos por aquela denunciados. Só após a notificação da sua mandatária da decisão judicial que decretou o arrolamento, poderia o Arguido junto da aqui Assistente, solicitar a desistência do mesmo. Acresce que, como infra referiremos, naquela data de 08 de março de 2021, no âmbito ação de divórcio litigioso com o n.º de processo 336/21.7T8GMR, que teve os seus termos pelo Tribunal de Família e Menores de Guimarães – J..., ter sido, de comum acordo convolado em mútuo consentimento em 04 de março de 2021, o divórcio é decretado em 08 de março de 2021, e notificado ao Arguido e à Assistente, tal como aos respetivos Mandatários;
18. No entanto, em sede de audiência de discussão e julgamento, no dia 10 de outubro de 2024 – cfr ficheiro “Diligencia_1149-22.4T9GMR_2024-10-
10_15-49-15.mp3” gravado no sistema digital em uso pelo Tribunal –, a Assistente CC, que é advogada e conhece todos procedimentos legais e processuais relativos a um processo de divórcio, e a um arrolamento ou quanto a partilhas, declara, a instâncias do Meritíssimo Juiz, versão contrária à realidade dos factos e articulando uma cronologia processual desmentida pela prova documental junta aos autos, declarações essas que supra parcialmente transcrevemos e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais; 
19. Conforme supra referido, naquela data de 08 de março de 2021, e ao contrário do que resulta das declarações da Assistente aqui supra acabadas de transcrever, o divórcio já havia sido decretado e notificado ao Arguido e à Assistente, tal como aos respetivos Mandatários que anteriormente, em 04 de março de 2021 já tinham chegado a acordo, inclusivamente, quanto ao destino da mota em causa, a qual foi atribuída ao aqui Arguido e portanto já nada havia a partilhar em 08 de março de 2021;
20. Para prova do alegado, aquando do requerimento apresentado pelo aqui Arguido (requerimento apresentado a 17.06.2025, com a referência Citius n.º 52666527), foi também junta a relação especificada de bens comuns acompanhante do requerimento de convolação do divórcio apesentado nos autos 631/24.3GBGMR, que teve os seus termos pelo Tribunal de Família e Menores de Guimarães – J...;
21. Logo, naquela data de 08 de março, inexistia qualquer facto, nos termos descritos pela Assistente, que pudesse justificar aquela deslocação ao escritório da Assistente, com o propósito vertido no facto n.º 12, e nas circunstâncias descritas pela assistente, não só nos articulados, como nas declarações prestadas em audiência de discussão e julgamento supra transcritas;
22. Ora, o que ocorreu foi que, o mandatário da ali requerente CC e a própria, não comunicaram à mandatária do ali Requerido AA, aqui Arguido, quando celebraram os acordos em causa (e supra identificados), e requereram convolação do divórcio litigioso em mútuo consentimento, que tinham intentado aquela providência de arrolamento, e que, apesar do acordo e da atribuição do bem em concreto ao Requerido/Arguido, aquele mandatário, da Assistente, também, seguramente por lapso (não queremos admitir outra hipótese), não tratou de desistir de imediato do arrolamento supra identificado ou pedir o levantamento do mesmo sobre aquela mota, como devia ter feito, de imediato e só o fez, após interpelação da Mandatária do arguido, e do próprio arguido, que foram surpreendidos com a supra referida sentença na providência cautelar em causa, apenas notificada e conhecida a 10 de março de 2021, o que aquele fez, só a 15 de março de 2021, pelas 18:08:52 horas, apresentando um requerimento a solicitar a extinção da instância da providência cautelar, face à inutilidade superveniente da mesma – o que bem demonstra a cronologia e lógica processual dos factos. E que, por despacho no processo 336/21.7T8GMR-B, que teve os seus termos pelo Tribunal de Família e Menores de Guimarães – J..., de 18 de março de 2021, o Mmo. Juiz ordenou o levantamento do arrolamento;
23. Face ao exposto, é irrefutável que não existia, à data de 08 de Março de 2021, qualquer outra ação pendente além da mencionada providência cautelar de arrolamento, que o Arguido não tinha, nessa data, conhecimento da mesma, que só adquiriu no dia 10 de Março de 2021, após notificação da sua mandatária, da supra referida decisão;
24. Neste sentido, a conversa entre o Arguido e a Assistente, que teve lugar nas circunstâncias de tempo, modo e lugar distintas das descritas, e que seriam suscetíveis de dar por assentes, ocorreram em data posterior, nos exatos termos e circunstâncias já relatadas pelo Arguido, em audiência de discussão e julgamento, no pretérito dia 09 de outubro de 2024;
25. Na realidade, aqueles factos não ocorreram conforme vertidos na acusação pública, sendo falsos os depoimentos prestados pelas testemunhas DD e EE, bem como, pelas demais testemunhas indicadas pela Assistente, sendo que os primeiros dois empenharam-se, com afinco, em tentar suportar a versão da assistente;
26. É manifesto, reitere-se, que tais testemunhas prestaram depoimentos falsos, certamente a pedido da aqui Assistente CC, uma vez estavam comprometidos com esta, que além de amiga dos mesmos, era advogada do Sr. EE (que por sua vez é companheiro, vivendo em união de facto, com o DD), como o mesmo declarou em sede de audiência e discussão de julgamento, depondo com o propósito de lograr a condenação do Arguido AA, por factos que este último não praticou e por crime que o recorrente não cometeu. Aliás, tal ficou demonstrado ao longo de todo o processo. As testemunhas arroladas pela assistente e pelo Ministério Público, com exceção da testemunha GG, tinham interesse direto na condenação do arguido;
27. Veja-se na senda do que vimos de dizer e para prova do por nós afirmado a este propósito, o depoimento da testemunha EE, prestado no dia 14.11.2024, gravado no sistema digital em uso pelo Tribunal, em sede de audiência e discussão de julgamento, sob o ficheiro Diligencia_1149-22.4T9GMR_2024-11-14_11-05-43.mp3, que supra parcialmente transcrevemos e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais; 
28. Note-se que, o dito estabelecimento comercial dos quais as testemunhas DD e EE eram proprietários, se situava a pelo menos 40 metros de distância do edifício onde se situa o escritório da Assistente CC, conforme resulta das fotografias do local, juntas aos autos no decurso desta inquirição em 14.11.2024, a fls. … dos autos. Estranho é, que com toda a distância e barulho normal que existe numa via pública e zona comercial, os mesmos conseguissem ouvir barulhos de uma alegada discussão, e que as portadas do escritório da assistente já se encontrassem abertas e num março com temperaturas médias ainda nos 16 graus, quando ainda para mais, estas alegadas testemunhas se encontravam, como os próprios referiram nos respetivos depoimentos, a descarregar compras que teriam feito para o estabelecimento comercial; 
29. Segundo o depoimento do Sr. EE, que supra parcialmente transcrevemos e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais, quando entrou no escritório da Assistente, juntamente com o seu companheiro DD, a assistente encontrava-se de um dos lados da secretária e o Arguido do outro lado da mesma, com pelo menos o tampo de intervalo que teria uma largura de 80 cm a 1 metro. Refere que esta não se encontrava caída, mas sim encostada à estante, à impressora e, portanto, à Assistente CC. Afirmou, reitere-se, que a secretária teria entre 80 centímetros a 1 metro de largura, logo, é totalmente impossível que o arguido, sendo um homem de estatura média/baixa, com braços curtos, conseguisse alcançar o pescoço da Assistente, que se encontrava a pelo menos cerca de 80 centímetros a 1 metro de distância deste. Mesa esta que se encontrava de pé, na sua posição normal, só encostada ou arrastada até junto do corpo da assistente. Contudo, esta versão é contrária à apresentada pela Assistente CC, como já supra se referiu,
e à da testemunha DD, uma vez que ambos afirmaram que a mesa se encontrava caída, tendo DD e EE, no final, colocado a mesma no devido lugar, versão na corroborada por aquele;
30. A este respeito, veja-se o depoimento da testemunha DD, prestado no dia 14.11.2024, em sede de audiência e discussão de julgamento, sob o ficheiro Diligencia_1149-22.4T9GMR_2024-1114_11-35-25.mp3, gravado no sistema digital em uso pelo Tribunal, que supra parcialmente transcrevemos e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais;
31. Cumpre destacar a relevante contradição existente entre os depoimentos das testemunhas EE e DD quanto à descrição da suposta secretária, não só nas suas caraterísticas, como na posição em que se encontrava quando alegadamente as testemunhas entraram na sala assistente e viram o arguido alegadamente a agarrar pelo pescoço a assistente;
32. Enquanto o Sr. EE afirmou que a referida secretária seria de cor ..., com vidro na parte superior, o Sr. DD, por sua vez, declarou que o móvel seria de cor ..., igualmente com vidro transparente no tampo;
33. Mas se tal se pode considerar um mero pormenor, o mesmo não se pode dizer quanto à disposição dos móveis e da própria secretária do escritório da Assistente. É afirmado de forma inequívoca pela testemunha EE, que a Secretária se encontrava de pé, tendo apenas sido arrastada de modo a “entalar” a Assistente. Contudo, tanto a própria Assistente CC, como a testemunha DD afirmaram que a secretária estava caída com o tampo virado para ela e as pernas viradas para o lado do arguido;
34. Segundo a teoria apresentada por EE, e sendo o Arguido uma pessoa de estatura média-baixa, não conseguiria alcançar, de modo algum, a Assistente se a secretária estivesse no meio destes;
35. Essa descrição do evento compromete seriamente a credibilidade dos depoimentos prestados por estas testemunhas, pois não se tratam de meros detalhes irrelevantes, tal como não é irrelevante a forma em condições existente no local e que permitiram às testemunhas, na rua, ouvir uma conversa no interior de um edifício, uma alegada discussão, entre arguido e testemunha. A incongruência entre as versões apresentadas pelas testemunhas evidencia a fragilidade da prova recolhida, não sendo possível, diante de tamanha imprecisão, concluir com segurança pela veracidade dos factos narrados, os quais, conforme supra descrevemos, não poderiam ter subjacente a motivação que a assistente descreve;
36. A verdade, é não naquele dia, mas no dia em que de facto o Arguido se deslocou ao escritório da Assistente, estas duas testemunhas não entraram no escritório desta última, nem poderiam, nem conseguiram, visualizar ou presenciar o que quer que fosse. Entre o escritório e o referido estabelecimento comercial pertencente às testemunhas, distavam cerca de 40 metros de distância, como supra se referiu. Diz-nos as regras da experiência, que no circunstancialismo em causa, não seria possível, perante tal distância e condições, que as mesmas conseguissem ouvir barulhos que se produziam dentro de um prédio e que alegadamente motivaram à deslocação daqueles ao gabinete da assistente;
37. A versão da assistente é falsa, não ocorreu qualquer agressão, nomeadamente aquela que aqui se impugna, sendo o contexto e motivação por ela alegada contrariado pelas peças processuais juntas aos autos, tendo a testemunha EE, que além de amigo da Assistente, era seu cliente, se apresentado a mentir para sustentar a versão daquela, tal como o seu companheiro DD o fez a pedido daquela e porventura deste último. Estas testemunhas não estiveram presentes na conversa que ocorreu entre arguido e assistente, não só porque aquela não teve lugar naquelas circunstâncias de tempo, modo e lugar, como porque não se deslocaram ao gabinete da assistente na data em que a conversa efetivamente teve lugar, nos termos da versão apresentada pelo arguido;
38. Estas testemunhas foram contar a versão pretendida pela Assistente CC, e com o desiderato de responsabilizar o Arguido AA por atos que o mesmo não cometeu. Por tal, não poderão os depoimentos destas duas testemunhas, nem o da assistente, merecer credibilidade, nem de forma alguma podem estes ser valorados positivamente e as declarações do arguido negativamente, o qual negou perentoriamente tais acusações, ao longo de todo este julgamento, sendo que as peças processuais juntas aos autos no dia 14.11.2024 infirmam a versão da assistente e destas testemunhas, corroborando a versão do arguido;
39. Todos os factos constantes dos pontos n.ºs 12, 13, 14 e 15 dados por assentes na douta Sentença devem ser dados como não provados, nos termos e pelos fundamentos e de acordo com meios de prova supra indicados e que aqui damos por reproduzidos e integrados para todos os efeitos legais,  por não corresponderem à verdade dos acontecimentos, por carecerem de fundamento probatório e por não resultarem da verdade material que resultou de toda a produção de prova validamente produzida – cfr. declarações do aqui Arguido AA, prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento, no dia 28.02.2024, declarações que aqui se dão por reproduzidas para os devidos efeitos legais, conferir ficheiro n.º Diligencia_1149-22.4T9GMR_2024-10-09_10-21-42.mp3, gravado no sistema digital em uso pelo Tribunal, supra parcialmente transcritas e que aqui se dão por reproduzidas; Declarações da Assistente CC, em sede de audiência de discussão e julgamento, no dia 10 de outubro de 2024 – cfr ficheiro “Diligencia_114922.4T9GMR_2024-10-10_15-49-15.mp3”, gravadas no sistema digital em uso pelo Tribunal, supra parcialmente transcritas e que aqui se dão por reproduzidas; Depoimento da testemunha EE, prestado no dia 14.11.2024, gravado no sistema digital em uso pelo Tribunal, em sede de audiência e discussão de julgamento, sob o ficheiro Diligencia_1149-22.4T9GMR_2024-11-14_11-05-43.mp3, supra parcialmente transcritas e que aqui se dão por reproduzidas; Depoimento da testemunha DD, prestado no dia 14.11.2024, em sede de audiência e discussão de julgamento, sob o ficheiro Diligencia_114922.4T9GMR_2024-11-14_11-35-25.mp3, gravado no sistema digital em uso pelo Tribunal, supra parcialmente transcritas e que aqui se dão por reproduzidas;
40. Pelo exposto e nos termos e pelos fundamentos supra aduzidos e de acordo cm prova supra indicada a factualidade dada por assente nos pontos 12, 13, 14 e 15, deveria ter sido dada como não provada, porque assim o impunha toda a prova validamente produzida, nomeadamente a supra indicada e prova documental junta aos autos com requerimento apresentado em requerimento apresentado a 17.06.2025, com a referência Citius n.º 52666527,  e a ausência de prova que corroborasse a versão Assistente que não merece qualquer credibilidade;
41. Sem prescindir o Tribunal a quo fez também uma errada qualificação jurídica da conduta do recorrente dada por assente, a qual não consubstancia a prática de um crime de ameaça agravada, pelo que o mesmo deveria ter sido quanto a este crime, absolvido;
42. Ora, a alegada expressão proferida pelo Arguido, que aqui se admite para efeito de raciocínio, “Desiste da ação. Mato-te, filha da puta”, tal como foi dado como ASSENTE no facto n.º 12 da douta sentença, enquanto alegadamente agredia fisicamente a Assistente, segurando-a pelo pescoço, não é suscetível, em abstrato, de consubstanciar a prática de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelo artigo 153.º do Código Penal;
43. Se o Arguido estava alegadamente a agarrar a Assistente pelo pescoço, está em pleno ato de execução. Isto é, a alegada ameaça, é proferida aquando da alegada agressão e circunscrita aquele momento temporal, não praticando o arguido outro ato de execução – admitindo para mero efeito de raciocínio a pratica dos factos pelo arguido AA – que não seja o de ofensas corporais, não se estando perante a verbalização de um mal futuro, mas sim de iminente mal, em plena execução e que se circunscreve contudo aquele ato, vindo de descrever;
44. Acompanhando a exposição de Américo Taipa de Carvalho, na sua anotação ao artigo 153.º no Comentário Conimbricense do Código Penal, são três as características essenciais do conceito de ameaça: (1) um mal (2) futuro (3) cuja ocorrência dependa da vontade do agente;
45. Está fora de causa que a expressão dirigida à Assistente, constitui uma referência à prática de um mal futuro – concretamente, uma agressão que preencheria, no mínimo, o elemento típico objetivo de um crime de ofensa à integridade física ou de crime mais grave;
46. Contudo, constata-se, in casu, que o comportamento verbalizado pelo Arguido não era um mal futuro, mas sim iminente. De facto, ao pronunciar aquela expressão no decurso de uma agressão física, o arguido, quanto muito, pretendia afirmar que naquele momento específico iria imediatamente, na dinâmica dos factos em curso, agredir a Assistente, como alegadamente o fez. Ou seja, tais palavras não podem deixar de ser entendidas como uma referência a algo que se vai fazer no momento imediato, e não uma ameaça que se cumprirá posteriormente, mas em que há desistência ou ausência da prática de qualquer outro ato de execução para além daquele que se acabou de praticar;
47. Ora, o bem jurídico protegido pela incriminação das ameaças é a liberdade de decisão e de ação, que é afetado pelo receio e pela intranquilidade provocados na vítima. Na verdade, a manifestação do propósito da prática de um mal futuro coloca a vítima numa situação de medo e de insegurança que, perturbando a sua paz individual, cerceará o âmbito de exercício da sua liberdade para tomar decisões e atuar conformemente. Já a expressão da intenção de agredir alguém, no imediato, proferida no decurso da própria agressão, não limita aquela liberdade, por não constituir uma perturbação autónoma da paz individual, diversa daquela concretizada no ato violento em si;
48. Na súmula de Taipa de Carvalho, haverá ameaça quando alguém afirma
“hei-de-te matar”, mas não “vou-te matar já”. No contexto em que é proferida uma afirmação deste género, a mesma aproxima-se mais de uma tentativa iminente de execução do mal em questão, e não tanto de uma ameaça com um mal futuro com a virtualidade de prejudicar a liberdade pessoal de auto-determinação da Assistente;
49. No mesmo sentido tem ido o entendimento da nossa jurisprudência. A título exemplificativo, cita-se o acórdão da Relação do Porto de 30 de Março de 2004, disponível em www.dgsi.pt, em que foi relator Fernando Monterroso, quando refere que: “A ameaça é um crime contra a liberdade pessoal (Título I, cap. V, da parte especial do Cód. Penal). Para que ocorra, é necessário que o agente use um qualquer expediente adequado a provocar no sujeito passivo medo ou inquietação ou a prejudicar-lhe a sua liberdade de determinação. O bem jurídico tutelado é a liberdade de decisão e de acção. Ninguém deve ser colocado em situação de não poder decidir ou fazer algo por receio de um mal que lhe foi prometido. Isso é indissociável do carácter futuro do mal anunciado.
Se a «ameaça» é iminente, a liberdade de determinação nunca chega a ser afectada. Se se concretizar, terá sido praticado o crime anunciado. Se não se concretizar, a vítima não fica inibida ou receosa de decidir ou fazer o que quer que seja, porque a possibilidade de sofrer o mal é algo que já não existe, por fazer parte do passado”;
50. Ainda no mesmo sentido, veja-se o Acórdão da Relação de Guimarães, de 18 de junho de 2024, relatador pelo Exmo. Sr. Desembargador Júlio Pinto, disponível em www.dgsi.pt, em que numa situação inversa à dos presentes autos, os intervenientes não entraram em contenda física, entenderam-se que se tratava de um crime de ameaça, uma vez que configurava um mal futuro, o que não é o presente caso, assim sumariado:1. Em situação ocorrida no âmbito de um litígio pendente, e alvo de processo entre as partes, quando no decorrer de dois encontros em que o arguido se dirige verbalmente ao assistente dizendo-lhe que o agride fisicamente, e tendo como móbil a desavença respeitante a um caminho, tendo aquele dirigido a este a expressão ““dou-te uma bofetada e um tiro”, desacompanhada de qualquer comportamento adicional e preparatório da concretização dessa intenção, só pode ser interpretada como um anúncio ao ofendido de que no futuro, qualquer dia, concretizará as ações ofensiva que anunciou; 2. Esse comportamento, repetido nove meses depois, só pode ser entendido como anunciador da prática de um crime contra o corpo do assistente, inclusive dar-lhe um tiro do qual pode resultar a sua morte, afigurando-se, tendo em conta o teor das expressões, e as circunstâncias em que se verificaram, ser inequívoco para qualquer destinatário normal estarmos na presença de uma ameaça de morte velada;3. A situação não está resolvida, também não está esquecida e a advertência agressora mantém-se e renova-se;
51. Pelas razões expostas, entende-se que a expressão atribuída ao aqui Arguido, ainda que improceda a impugnação desses factos, e se entenda como corretamente assente, não integra contudo o conceito jurídico-penal de ameaça agravada, porquanto o Arguido agora Recorrente, estava a executar factos que consubstanciavam um crime de ofensa à integridade física;
52. Ora, com o devido respeito, tendo em conta tudo que se vem de referir, quanto à absolvição do arguido, aqui recorrente, não deveria aquele ter sido condenado no pedido de indemnização civil nos termos em que o foi. O arguido não praticou o crime pelo qual foi condenado, nos termos e pelos fundamentos aduzidos supra na nossa impugnação de facto e de direito, pelo que de nenhuma forma deverá ser condenado a pagar, no todo ou em parte, qualquer quantia, nomeadamente a que aquele foi condenado.
53. Disposições violadas: Foram assim violadas as disposições contidas nos artigos 40º n.° 1 e 2, 71º, 132º, 143º, 145º, 153º, 155º, 131º, 181º todos do Código Penal, e ainda os artigos 205° e 32° da Constituição da República Portuguesa, e outras que V.ªs Exc.ªs sapientemente suprirão.
 
Nestes termos e nos melhores de direito, deverá revogar-se a douta sentença recorrida, nos termos propugnados, solvendo-se o arguido, com as legais consequências, assim se fazendo inteira e sã JUSTIÇA!”
 
I.2.1.1 Na primeira instância, a Digna Magistrada do Ministério Público, notificada do despacho de admissão do recurso apresentado pelo arguido AA, nos termos e para os efeitos do artigo 413.º, n.º 1 do CPP, apresentou resposta em que sustentou a negação de provimento do recurso e a manutenção da sentença recorrida (referência ...00).

I.2.1.2 Igualmente respondeu a assistente HH ao recurso deduzido pelo arguido AA, peticionando lhe seja negado provimento (referência ...00).
Formulou as seguintes conclusões: 

I. O Tribunal a quo efetuou uma valoração correta e fundamentada da prova produzida em julgamento relativamente aos factos impugnados constantes dos itens 12 a 15 da matéria de facto provada.   
 
II. Perante o texto da decisão não se vê qualquer razão para discordar da forma como, no essencial, o Tribunal formou a sua convicção relativamente a tais factos, os quais resultam da prova produzida em julgamento.
 
III.  Nomeadamente, a prova de tais factos resulta das declarações das testemunhas EE e DD, as quais foram produzidas de forma espontânea, pormenorizada e coerente entre si e conjugadas quer com as declarações do arguido quer as declarações da Assistente prestadas em julgamento. 
 
IV. As provas que serviram de suporte a tal convicção foram legalmente produzidas e criteriosa e detalhadamente ponderadas, dentro das regras da livre convicção do julgador que enunciou as razões dessa ponderação, delas não resultando qualquer alternativa quanto á possibilidade de outro ser o decurso dos eventos e, por isso, sem necessidade de aplicação ao caso do princípio in dúbio pro reo
 
V. O Tribunal a quo não violou, pois, o regime do artigo 127.º do Código de Processo Penal. 
 
VI. A factualidade dada como provada nos itens 12 a 15 da sentença, sem mais, consubstancia, ao contrário do defendido pelo recorrente, uma ameaça de um mal futuro e, por isso, subsumível ao crime de ameaça agravado dos artigos 153.º e 155.º do CP.

I.2.2 – Não se conformando com a decisão proferida em primeira instância, interpôs recurso a assistente CC, cuja motivação culmina com as seguintes conclusões e petitório (referência ...46):

I. O presente recurso é interposto da sentença datada de 25 de junho de 2025, que, tendo condenado o arguido AA pela prática de um crime de ameaça agravada p. e p. pelo artigo 153.º, e 155.º, n.º 1, al. a) do Código Penal, absolveu-o da prática dos três crimes de violência doméstica de que vinha acusado, bem como julgou os pedidos de indemnização civil deduzidos pelos Demandantes menores totalmente improcedentes e o deduzido pela Assistente Demandante parcialmente procedente. 
 
II. A Recorrente não se conforma com a decisão de absolvição do arguido pela prática dos crimes de violência doméstica, por manifestamente errada e injusta, nem com a consequente improcedência e procedência parcial dos pedidos de indemnização cíveis deduzidos, e vem impugná-la, em matéria de facto e de Direito.
 
III. Relativamente à decisão proferida sobre matéria de facto, por entender que resultaram de prova abundante, clara, coerente e credível produzida em sede de audiência de julgamento, a Recorrente impugna os seguintes pontos de facto que considera, assim, incorretamente julgados:
 
a. factos não provados referidos nos itens a) a n), o), ii) a mm) e oo) a rr) e zz) que correspondem aos factos 3 a 20, 38, 40 a 45 e 63 da acusação, relativos à contextualização
da vida do casal, à constante humilhação e ameaças da Recorrente, reveladores do ciclo da violência doméstica;
 
b. factos não provados referidos nos itens u) a hh) e nn), que correspondem aos factos 23 a 36 e 46 da acusação, relativos às agressões sexuais da Recorrente;
 
c. Factos não provados referidos nos itens ss), tt), vv) a xx), bbb), iii) e jjj), bem como os factos correspetivos decorrentes do PIC e constantes do rol de factos não provados aaaa) a gggg), kkkk) e qqqq), que correspondem aos factos 55, 56, 59 a 61, 63, 65, 72 e 73 da acusação, todos relativos aos maus-tratos dos filhos da Assistente;
 
d. Factos não provados referidos nos itens kkk) a nnn), bem como os factos correspetivos decorrentes do PIC e constantes do rol de factos não provados ppppp) e qqqqq), que correspondem aos factos 74 a 77 da acusação, relativos aos elementos subjetivos do tipo, vontade e intenção do arguido;
 
e. Factos não provados referidos nos itens vvvv) a yyyy) e ddddd) a jjjjj), decorrentes do PIC e relativos aos danos sofridos.
 
IV. Com a impugnação destes factos (não provados), pretende a Recorrente demonstrar que os factos descritos na acusação resultaram demonstrados em julgamento.
 
V. Pretende-se demonstrar que, da prova produzida, resultou provado que que, sobretudo após o nascimento dos filhos, o arguido passou a humilhar e insultar constantemente a ofendida Recorrente, chamando-a de “puta”, “vaca” e enaltecendo o seu poder sobre ela, referindo várias vezes que ninguém a queria, pois ela só tinha valor graças a ele (cfr. factos não provados a) a n), o), ii) a mm), oo) a rr) e zz) que correspondem aos factos 3 a 20, 38, 40 a 45 e 63 da acusação).
 
VI. Pretende-se demonstrar que o arguido não se inibiu de satisfazer as suas vontades sexuais, mesmo contra a vontade da ofendida, tendo ficado demonstrado que a violou, pelo menos, em julho de 2019 e janeiro de 2020 e janeiro de 2021 (cfr. factos não provados u) a hh) e nn), que correspondem aos factos 23 a 36 e 46 da acusação).
 
VII. Pretende-se demonstrar que o arguido maltratava não só a Assistente, mas também os seus filhos, agredindo-os, o que ocorreu em pelo menos duas ocasiões (cfr. factos não provados ss), tt), vv) a xx), zz), bbb), iii) e jjj), que correspondem aos factos 55, 56, 59 a 61, 63, 65, 72 e 73 da acusação).
 
VIII. Pretende-se demonstrar que, juntamente com os factos e episódios dados como provados,
o arguido pretendia humilhar, agredir, ameaçar e injuriar da sua mulher e filhos (cfr. factos não provados kkk) a nnn), que correspondem aos factos 74 a 77 da acusação).
 
IX. Pretende-se demonstrar, finalmente, que a conduta violenta, insultuosa, ameaçadora do arguido provocou danos na Assistente e seus filhos, os quais deverão ser adequadamente ressarcidos (cfr factos não provados vvvv) a yyyy) e ddddd) a jjjjj) do rol de factos relativos ao PIC).
 
X. Apreciando criticamente a sentença proferida, entende a Recorrente que a posição do Tribunal recorrido muito se deverá a algum desconhecimento do fenómeno da violência doméstica. 
 
XI. O Tribunal a quo parece ignorar que este fenómeno é:
 
a. É transversal a todos os sectores e classes sociais, que não escolhe géneros, idades, profissões ou mesmo estatutos socioeconómicos. 
 
b. Tanto ocorre no seio da família pobre, como da família rica; afeta tanto as vítimas instruídas, como aquelas sem habilitações superiores; vitimiza e é vitimizado tanto o padeiro como o médico, o engenheiro como o advogado, o produtor como o vendedor… e vice versa!
 
XII. A decisão em crise parece igualmente desconhecer as particulares dificuldades na prática judiciária, sobretudo no que respeita à apreciação da prova, designadamente que as vítimas de violência doméstica são muitas vezes a única prova direta dos maus-tratos.
 
XIII. Bem como, ainda no que à prova diz respeito, que a violência doméstica frequentemente ocorre em ambientes privados, sem testemunhas externas, o que dificulta a produção e valoração das provas. 
 
XIV. No presente caso, sendo certo que a prova direta da maioria dos factos também advém da própria vítima do crime perpetrado pelo arguido, existe ainda prova abundante e corroborante das suas declarações.
 
XV. Finalmente, entende a Recorrente que, para a apreciação correta da prova, será necessário ainda compreender a violência doméstica é frequentemente caracterizada por um ciclo de violência que se repete, e que, portanto, a postura dos envolvidos é, em cada momento desse ciclo, distinta.
 
XVI. O caso dos autos, infelizmente, é precisamente um caso típico do fenómeno da violência conjugal: o casal separou-se e reconciliou-se consecutivamente, a bem dos filhos e do amor mútuo declarado. 
 
XVII. A apreciação da prova produzida em sede de julgamento exige o conhecimento da fenomenologia própria da violência conjugal: os ciclos da violência e o sofrimento dos intervenientes. 
 
XVIII. In casu, o Tribunal recorrido ignorou este fenómeno e, em consequência, efetuou uma apreciação incompleta e, por vezes, cega, da prova produzida.
 
XIX. Na sua fundamentação, o Tribunal recorrido socorre-se de um método particular: tem por
base do seu raciocínio que a prova produzida é sustentada “nas declarações parciais e interessadas, por si e entre si, da assistente, seus pais, tia, e amigas, nomeadamente a testemunha (II), nomeadamente os insultos, ameaças, agressões sexuais, etc.”, para depois ilustrar a sua afirmação com a apreciação de alguns pontos da matéria de facto constante da acusação, concluindo pela sua não demonstração. 
 
XX. O Tribunal entendeu também que todas as provas dos factos descritos pela ofendida não foram corroboradas por outra prova coerente e imparcial. 
 
XXI. Entende a Recorrente que a douta sentença sob recurso não julgou corretamente a matéria
de facto dada como não provada e que o pressuposto da sua valoração – de que a ofendida e pessoas que lhe são próximas mentiram – é precipitado e não reflete a verdade nem o que se passou em audiência de julgamento.
 
XXII. Como se demonstrará, no presente caso, tal como de resto neste tipo de crime em gral, o depoimento da vítima assume uma centralidade particular, sendo suficiente para a condenação do arguido. 
 
XXIII. Isto porque as declarações da vítima, ora Recorrente, foram extremamente minuciosas, relatando factos devidamente circunstanciados no tempo e no espaço, relatando e repetindo pormenores que revelam a sua veracidade. 
 
XXIV. Não foi produzida qualquer prova direta que abale, por contrária, a demonstração dos factos tal como eles sucederam e foram relatados pela Assistente.
 
XXV. Finalmente, além de minuciosas, coerentes e sem contraprova que as ponha frontalmente em causa, as declarações da Recorrente, tal como os factos descritos na acusação, foram corroborados pela demais prova produzida. 
 
XXVI. As testemunhas familiares e amigos da Recorrente demonstram conhecimento de factos concretos, delimitados é certo, mas que corroboram os acontecimentos ocorridos e relatados: as marcas negras que lhe viam no corpo; os insultos que ouviram o arguido proferir; os comportamentos e atitudes detetadas na relação do casal, quando em público, que revelavam que algo se passava entre eles, as ameaças do arguido, etc.
 
XXVII. No que diz respeito às concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, em primeiro lugar, deveria o Tribunal considerar as declarações da ofendida, ora Recorrente, as quais foram minuciosas, contextualizadas, espontâneas e sofridas, não obstando à sua credibilidade ser a Assistente Advogada de profissão. 
 
XXVIII. Entende a Recorrente que as passagens das suas declarações que a seguir se indicam relativamente a cada grupo de factos, impõem uma decisão que considere tais factos como provados. 
 
XXIX. Sobre os factos não provados a) a n), o), ii) a mm) e oo) a rr) e zz) que correspondem aos
factos 3 a 20, 38, 40 a 45 e 63 da acusação deverão ser consideradas as seguintes passagens:
 
XXX. Das declarações prestadas no dia 9-10-2024, os minutos 00:12:04 a 00:14:48; minutos 00:15:44 a 00:24:04; minutos 00:23:41 a 00:26:22; e minutos 00:26:35 a 00:35:41.
 
XXXI. Das declarações prestadas no dia 10-10-2024 da parte da tarde, relativamente às ameaças, os minutos 00:43:53 a 00:47:58.
 
XXXII. Sobre os factos não provados que se impugnam, u) a hh) e nn), que correspondem aos factos 23 a 36 e 46 da acusação deverão ser consideradas as seguintes passagens, por referência a cada episódio de agressão sexual ocorrida.
 
XXXIII. Quanto à primeira violação sexual, ocorrida no dia 17 de julho de 2019, dentro da casa do
casal:
 
a. Declarações da Assistente do dia 9-10-2024, os minutos 00:37:17 a 00:49:13
 
b. Declarações da Assistente do dia 10-10-2024, os minutos 00:02:10 a 00:04:40 e minutos 00:04:40 a 00:06:10
 
XXXIV. Quanto à tentativa de violação sexual do dia 17 de agosto de 2019, dentro da casa do casal:
 
a. Declarações da Assistente do dia 10-10-2024, os minutos 00:09:10 a 00:14:40
 
b. Declarações da Assistente do dia 15-10-2024, os minutos 00:22:30 a 00:22:46.
 
XXXV. Quanto à segunda violação sexual, ocorrida no dia 12 de janeiro de 2021, dentro da casa
do casal:
 
a. Declarações da Assistente do dia 10-10-2024, os minutos 01:03:15 a 01:09:50
 
b. Declarações do mesmo dia 10-10-2024, da parte da tarde, os minutos 00:00:20 a 00:05:00
 
XXXVI. Quanto à terceira violação sexual, ocorrida no dia 29 de janeiro de 2020, dentro da casa do
casal:
 
a. Declarações da Assistente prestadas no dia 15-10-2024, os minutos 00:23:30 a 00:24:39 e minutos 00:29:07 a 00:32:11
 
XXXVII. Esta prova por declarações da Assistente, como se pode constatar até das passagens indicadas, ao contrário do argumentado na sentença recorrida, nada tem de genérico, concretizam no espaço, no tempo e no modo os maus-tratos sofridos e, como se verá, são corroboradas por outra prova também produzida em julgamento.
 
XXXVIII. Assim, deveria o Tribunal recorrido ter considerado provados os factos u) a hh) e nn),
correspondentes aos factos 23 a 36 e 46 da acusação.
 
XXXIX. Sobre os factos não provados constantes dos itens ss), tt), vv) a xx), bbb), iii) e jjj), que correspondem aos factos 55, 56, 59 a 61, 63, 65, 72 e 73 da acusação, bem como os factos correspetivos decorrentes do PIC e constantes do rol de factos não provados aaaa) a gggg), kkkk) e qqqq), todos relativos aos maus-tratos dos filhos da Assistente e arguido. 
 
XL. As declarações da Assistente, dentro do possível, concretizam os acontecimentos, sendo que a sua razão de ciência, por não os ter presenciado diretamente, advém, em primeiro lugar, das marcas das agressões que viu nos seus filhos e naquilo que estes lhe relataram, mas dos factos relatados por outras testemunhas (como veremos) que os confirmaram.
 
XLI. As passagens concretas das declarações da Assistente que impõe uma decisão diversa
relativamente a este grupo de factos são as seguintes:
 
a. Declarações prestadas no dia 10-10-2024 (segunda parte), do minuto 00:31:50 a 00:38:30. 
 
b. Declarações prestadas no dia 15-10-2024, do Minuto 00:17:14 a 00:21:05; do minuto 00:39:19 a 00:43:57; do minuto 00:45:17 a 00:48:42.
 
XLII. Todas as declarações da Assistente foram corroboradas pela prova produzida, que demonstrou factos particulares que confirmam a realidade relatada.
 
XLIII. Por referência aos grupos de factos não provados já mencionados, seguem as provas concretas que, corroborando as declarações da Assistente, impõem uma decisão destinta da proferida em Primeira Instância.
 
XLIV. Quanto ao grupo de factos não provados a) a n), o), ii) a mm) e oo) a rr) e zz) que correspondem aos factos 3 a 20, 38, 40 a 45 e 63 da acusação, que respeitam à conduta do arguido que, sobretudo após o nascimento dos filhos, passou a humilhar e insultar constantemente a ofendida Assistente, chamando-a de “puta”, “vaca” entre outros insultos e enaltecendo a sua ascensão sobre ela, referindo várias vezes que ninguém a queria, pois ela era o que era graças a ele, nunca se inibindo de a ameaçar quando os acontecimentos não lhe corriam de feição, deverão ser consideradas as seguintes provas.
 
XLV. A testemunha JJ, mãe da ofendida aqui Recorrente, apesar
de em alguns momentos ter demonstrado excessivamente o sofrimento de uma mãe que sabe o que lhe fizeram à filha e, por isso, certas passagens do seu testemunho serem precipitadas e nervosas, certo é que logrou demonstrar, além do mais os insultos constantes que a ofendida era alvo.
 
XLVI. Designadamente, as seguintes passagens das declarações da testemunha JJ, impõem uma diferente apreciação: 
 
a. Depoimento do dia 15-10-2024, Minutos 00:04:36 a 00:05:39, Minutos 00:29:41 a 00:30:49, Minutos 00:13:12 a 00:13:52 e Minutos 00:35:00 a 00:35:38.
 
XLVII. A testemunha KK, também prestou declarações e deixou igualmente
transparecer o seu sofrimento não só pelo que a sua filha, aqui ofendida, passou, mas também o que aconteceu com a sua neta preferida, a BB. 
 
XLVIII. Designadamente, as seguintes passagens das declarações desta testemunha, impõem uma
diferente apreciação: 
 
a. Depoimento do dia 15-10-2024, minutos 00:02:06 a 00:08:43
 
XLIX. A testemunha LL esclareceu que viu, em diversos momentos, documentos (e-mails) e ouviu expressões injuriosas proferidas pelo arguido AA dirigidas à aqui Recorrente. 
 
L. Designadamente, as seguintes passagens das declarações desta testemunha, impõem uma diferente apreciação: 
 
a. Depoimento do dia 05-11-2024, minutos 00:06:20 a 00:09:27
 
LI. Ainda no que respeita a esta matéria, bem como ao facto do arguido chegar reiteradamente tarde a casa, a altas horas da noite (cfr. factos 11 a 13 e 16 a 17 da acusação), as declarações
da Assistente foram também corroboradas pelo depoimento da testemunha MM.
 
LII. Designadamente, as seguintes passagens das declarações desta testemunha, impõem uma diferente apreciação: 
 
a. Depoimento do dia 14/11/2024, minutos 00:06:45 a 00:08:13
 
LIII. No que respeita à ameaça proferida pelo arguido em março de 2022 (facto 63 da acusação, zz) da sentença), o Tribunal acreditou na versão do arguido, que apenas a negou, e entendeu que o relatado pela Assistente e corroborado pelas declarações dos seus pais e primo eram parciais e, conclui-se, falsas. 
 
LIV. O Tribunal considerou estas declarações inconsistentes com a experiência comum, pois um pai e primo que ouvem uma ameaça de morte não se afastariam, mas quereriam saber o contexto. Por isso, os depoimentos foram considerados parciais e lacunosos, e não mereceram credibilidade.
 
LV. A Recorrente não pode aceitar esta argumentação, pois a conduta das testemunhas familiares está de acordo com o normal acontecer, que é dar privacidade aos interlocutores, não se preparando para ser testemunha num futuro e incerto processo.
 
LVI. Certo é que se trata de prova credível, espontânea e, sobretudo, corroborante das declarações da ofendida, nomeadamente as seguintes passagens:
 
a. As declarações da testemunha KK, do dia 15-10-2024, minutos 00:00:25 a 00:01:34
 
b. As declarações da testemunha JJ, do dia 15-10-2024, minutos 00:25:22 a 00:28:50
 
c. As declarações da testemunha JJ, do dia 5/11/2024, minutos 00:06:16 a 00:10:18 
 
d. As declarações da testemunha NN, do dia 19-11-2024, minutos 00:00:36 a 00:06:59 
LVII. O episódio do item 63 da acusação (facto zz, dado como não provado) relativo a mais uma ameaça do arguido foi assim confirmado por várias testemunhas que declararam com verdade, coerência e minúcia, não permitindo outra conclusão que não que tais factos ocorreram efetivamente.
 
LVIII. Os factos dados como não provados em a) a n), o), ii) a mm), oo) a rr) e zz) da sentença e
que correspondem aos factos 3 a 20, 38, 40 a 45 e 63 da acusação devem, pois, ser agora considerados provados, com as legais consequências.
 
LIX. Quanto ao grupo de factos não provados u) a hh) e nn), que correspondem aos factos 23
a 36 e 46 da acusação, relativos às agressões sexuais de que a Assistente foi vítima, deverão ser consideradas as provas que abaixo se indicam.
 
LX. Ao contrário da argumentação desenvolvida pelo Tribunal recorrido, entende a Recorrente que, nas suas declarações, descreveu minuciosamente três dos episódios de violação de que foi vítima. 
 
LXI. Contextualizou, identificou a data e o lugar, bem como descreveu com pormenor o que o
arguido lhe obrigou a sofrer.
 
LXII. Não pode, pois, dizer-se que estamos perante uma história lacunosa e abstrata. 
 
LXIII. No que respeita a não ter apresentado queixa logo após a sua primeira violação, a Assistente explicou-o consistentemente, nomeadamente na passagem das suas declarações prestadas no dia 15-10-2024, nos minutos 01:12:08 a 01:15:25.
 
LXIV. Como se pode verificar, é uma explicação coerente; Coerente com a gravidade do sucedido
e típica da vítima de violência doméstica; Coerente com a postura da ofendida ao longo de todos os ciclos de violência que sofreu: pretendia salvar o casamento, queria proteger os filhos.
 
LXV. Acresce que não é porque uma vítima não apresenta queixa de um facto, que o mesmo não tenha acontecido ou que isso retire credibilidade às declarações prestadas quando a vítima decide expor a situação.
 
LXVI. Por outro lado, apesar de ninguém ter testemunhado esses episódios de violação sexual da
ofendida, a demais prova – testemunhal e documental – corroboram factos por si relatados e atrás identificados. 
 
LXVII. A prova concreta que de seguida indicaremos, demonstra   
 
a. que, em consequência das agressões sexuais, a ofendida teve de recorrer ao seu ginecologista; 
b. que, em consequência das agressões sexuais, a ofendida ficou com várias marcas no corpo; 
c. que, em consequência do ocorrido, a ofendida andava cabisbaixa e a relação entre o casal era tensa.
 
LXVIII. Desde logo, deverá ser considerada a prova documental de fls 218 a 220 que revela que nos dias imediatamente a seguir a dois dos episódios de violação sofridos, a Assistente foi assistida no Hospital ... em Guimarães.
 
LXIX. O primeiro episódio detalhado pela ofendida ocorreu a 17/07/2019, um mês antes do batizado do seu filho mais novo e no dia seguinte, a 18/07/2019 a Assistente foi recebida, às 9h20m, em consulta de ginecologia – cfr. fls. 220 dos autos. 
 
LXX. O segundo episódio ocorreu a 29/01/2020, dia do aniversário da Assistente e, como resulta do documento de fls. 220, foi no dia seguinte, a 30/01/2020, assistida Hospital .... 
 
LXXI. Mais do que coincidências, é prova indiciária precisa e corroborante das declarações da Assistente.
 
LXXII. Acresce que, ao contrário do argumentado na sentença recorrida, as declarações da testemunha OO, médico ginecologista da Assistente, não desmentem categoricamente as declarações da ofendida. 
 
LXXIII. Como poderemos constatar, esta testemunha revela não ter memória dos factos questionados, não os desmente e, em algumas das suas declarações até admite tais agressões como possíveis face às queixas e marcas físicas descritas. 
 
LXXIV. O depoimento da testemunha OO prestado
no dia 26/11/2024, nomeadamente nas passagens dos minutos 00:16:28 a 00:18:34 e minutos 00:21:21 a 00:22:04, lança mais dúvidas do que certezas, mas definitivamente não desmente categoricamente os factos… até os refere como possíveis, apesar de não ter memória concreta do que sucedeu.
 
LXXV. Mas existe outra prova ainda que corrobora as declarações da Assistente, nomeadamente
as passagens concretas dos seguintes depoimentos: 
 
a. Depoimento da testemunha KK prestado no dia 15-10-2024, dos minutos 00:12:03 a 00:13:13 e 00:13:56 a 00:14:42
 
b. Depoimento da testemunha JJ prestado no dia 15-102024, dos minutos 00:08:46 a 00:13:10, Minutos 00:20:12 a 00:21:21, Minutos 00:22:38 a 00:23:00 e Minutos 00:42:07 a 00:43:23.
 
c. Depoimento da mesma testemunha prestado no dia 05-11-2024, dos Minutos 00:02:28 a 00:03:42 e minutos 00:27:04 a 00:28:28.
 
d. Depoimento da testemunha II prestado na audiência do dia 15/10/2024 dos Minuto 00:03:19 a 00:04:29 e Minuto 00:29:19 a 00:33:07 
 
e. Depoimento da testemunha LL prestado no dia 5/11/2024 dos Minuto 00:09:34 a 00:11:04 
 
f. Finalmente, o depoimento da testemunha PP, dos Minuto 00:05:08 a 00:07:23
 
LXXVI. Esta testemunha corroborou ainda os factos relativos ao item 36 da acusação, nomeadamente ao “ambiente” sentido durante o batizado do QQ, designadamente nas passagens das suas declarações dos Minutos 00:07:23 a 00:09:03
 
LXXVII. Como se pode comprovar, existe prova abundante que corrobora os factos relatados pela Assistente relativos às agressões sexuais. 
 
LXXVIII. Trata-se de relatos coerentes entre si, espontâneos, sofridos, mas corroborantes do depoimento da ofendida. 
 
LXXIX. Entende, pois, a Recorrente que os factos não provados dos itens u) a hh) e nn) da sentença
recorrida, que correspondem aos factos 23 a 36 e 46 da acusação, deveriam ter sido considerados provados.
 
LXXX. Quanto ao grupo de factos não provados ss), tt), vv) a xx), zz) bbb), iii), jjj), aaaa) a gggg), kkkk) e qqqq), que correspondem aos factos 55, 56, 59 a 61, 63, 65, 72 e 73 da acusação, relativo às agressões do arguido aos seus filhos, BB e QQ.
 
LXXXI. Como vimos acima, as declarações da Assistente a este propósito baseiam-se, efetivamente, nas palavras dos seus filhos menores, mas não só. 
 
LXXXII. As marcas das agressões que a Assistente viu estão registadas nas fotos de fls. 206 a 209 e 281 e 282 e revelam marcas de agressões e não de um qualquer acidente.
 
LXXXIII. Por outro lado, a existe também prova testemunhal que demonstra de forma direta e assertiva factos laterais, que corroboram tais declarações.
 
LXXXIV. De forma especial, a testemunha RR, ex-namorada da Assistente, apesar do depoimento ressabiado que prestou, a contragosto, certo é que confirmou os factos constantes dos itens 59 e 60 da acusação (vv) e ww) da sentença), que dizem respeito à sua apresentação aos filhos da Assistente.
 
LXXXV. As seguintes passagens concretas do seu depoimento, dos minutos 00:09:11 a 00:12:47 e
minutos 00:22:14 a 00:23:00 demostram isso mesmo.
 
LXXXVI. Como se depreende facilmente destes trechos, a testemunha a custo confirma que, quando
foi apresentado aos menores, das primeiras coisas que estes lhes disseram foi que o pai os agredia. 
 
LXXXVII. Se até uma testemunha relutante não consegue esconder que realmente tais expressões foram ditas, não podemos deixar de relevar tais declarações e considerar os respetivos factos como provados.
 
LXXXVIII. Entende, pois, a Recorrente que os factos constantes do rol dos não provados em ss), tt),
vv) a xx), bbb), iii) e jjj), bem como os factos correspetivos decorrentes do PIC e constantes do rol de factos não provados aaaa) a gggg), kkkk) e qqqq), todos correspondentes aos factos 55, 56, 59 a 61, 63, 65, 72 e 73 da acusação devem ser dados como provados, com as legais consequências.
 
LXXXIX. Quanto ao grupo de factos não provados kkk) a nnn), que correspondem aos factos 74 a 77 da acusação, relativos aos elementos subjetivos do tipo dos crimes de violência doméstica, a sua demonstração retira-se da conjugação dos factos que devem ser dados como provados com as regras da experiência comum, pois qualquer cidadão, que corresponde ao padrão do homem médio, agindo como agiu o arguido, revela intenção direta de praticar os factos, como efetivamente, o fez. 
 
XC. Entende, pois, a Recorrente que, considerando os demais factos como provados, deverá igualmente considerar provados os factos não provados kkk) a nnn) e ppppp) e qqqqq), que correspondem aos factos 74 a 77 da acusação.
 
XCI. Finalmente, quanto ao grupo de factos decorrentes do PIC e constantes do rol de factos não provados em vvvv) a yyyy) e ddddd) a jjjjj), relativos aos danos sofridos pela Assistente e seus filhos, decorrentes da conduta do arguido.
 
XCII. Na verdade, quanto a estes danos não patrimoniais, nomeadamente aos sentimentos de medo, impotência, tristeza, ansiedade e incómodo ali descritos, é de referir que, pelo menos esses, consubstanciam sentimentos expectáveis e normais para qualquer homem médio, em face da situação dos autos e, nessa medida, factos notórios. 
 
XCIII. Entende a Recorrente que, concedendo-se provimento à alteração da matéria de facto pela
qual vem pugnando, necessariamente se terão de considerar provados os factos relativos aos danos não patrimoniais sofridos pela Assistente e cada um dos seus filhos, com as legais consequências.
 
XCIV. Produzindo-se a alteração da matéria de facto pela qual a Recorrente pugna e que consubstancia a melhor apreciação da prova produzido nos termos que vimos de expor, torna-se evidente que o arguido deverá ser condenado pela prática dos crimes de violência doméstica de que vinha acusado. A saber:
 
a. Um crime de violência doméstica agravado, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, al.
a) e c) e 2, al. a) do Código Penal, na pessoa da sua ex-cônjuge, aqui Recorrente;
 
b. - Dois crimes de violência doméstica agravados, previstos e punidos pelo artigo 152.º, n.º 1, al. e) e 2, al. a) do Código Penal, nas pessoas dos seus filhos menores BB e QQ.
 
XCV. E, em consequência, ser determinadas novas penas parcelares e, após, uma pena única, e em como as aplicáveis penas acessórias correspondentes, nos termos e na medida que o Tribunal ad quem melhor entender em sua Justiça.
 
XCVI. Assim, não tendo o Tribunal a quo condenado o arguido AA violou as normas incriminadoras em causa, designadamente o artigo 152.º, n.º 1, al. a), c) e e) e 2, al. a) do Código Penal.
 
XCVII. Por outro lado, entende ainda a Recorrente que ao valorar incorretamente a prova produzida durante audiência de discussão e julgamento, o Tribunal a quo violou ainda o artigo 127.º do CPP.
 
XCVIII. Ainda que assim não venha a ser decidido, o que não se concebe face à apreciação da prova produzida nos termos atrás expostos, deverá o arguido ser condenado pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º n.º 1 al. a) do CP. 
 
XCIX. Isto é, ainda que não se produza a alteração da matéria de facto que a Recorrente defende,
ainda assim o Tribunal a quo deveria ter condenado o arguido por um crime de violência doméstica simples e não a norma do crime de ameaça agravado pelo qual foi o arguido condenado em primeira instância, uma vez que, além do mais, o tipo de ilícito do artigo 152.º fica completo ainda que apenas uma ação criminosa se verifique. 
 
C. Não o tendo feito, o Tribunal recorrido violou o disposto no art. art. 152.º n.º 1 al. a), o 153.º, e 155.º, n.º 1, al. a) todos do Código Penal.
 
CI. No que respeita ao pedido de indemnização cível, a matéria de facto fixada pelo Tribunal a quo, conquanto reconheça alguns danos sofridos pela Assistente, mostra-se claramente insuficiente face à gravidade e extensão da conduta do arguido, e, sobretudo, face às repercussões profundas e prolongadas que tal conduta gerou na sua esfera pessoal e dos seus filhos menores.
 
CII. Para além dos danos referidos nos itens 17 e 18 (na sua primeira parte) da matéria de facto dada como provada, e resultantes do episódio de ameaça perpetrado pelo arguido, como se defendeu ao longo desta motivação é evidente que o conjunto dos factos criminosos praticados  pelo arguido, deu origem a lesões físicas mas, sobretudo, ao sofrimento psicológico e emocional descritos nos segmentos vvvv) a yyyy) e ddddd) a jjjjj) dos factos não provados, em particular os que se referem a danos de natureza não patrimonial.
 
CIII. Os sentimentos de medo, impotência, tristeza, ansiedade e permanente incómodo
vivenciados pela Assistente e seus filhos constituem, não apenas uma consequência direta e necessária da conduta do arguido, como se enquadram numa reação perfeitamente expectável de qualquer pessoa colocada nas mesmas circunstâncias. 
 
CIV. Sendo procedente a alteração da matéria de facto defendida, a omissão do ressarcimento de tais danos ou a sua menorização traduzir-se-ia numa desconsideração inadmissível do sofrimento real e efetivo das vítimas, implicando uma violação do princípio da reparação integral legalmente consagrado e dos artigos 129.º do CP e 483.º e seg. do CC.
 
CV. Assim, entende a Recorrente que, sendo deferida a alteração da matéria de facto nos termos por si pugnados, tal implicará necessariamente a ampliação da matéria provada, com o reconhecimento expresso dos danos não patrimoniais sofridos pela Assistente e pelos seus filhos, devendo estes ser devidamente valorados para efeitos de fixação de indemnização.
 
CVI. O montante fixado deve refletir, de forma séria e proporcional, o sofrimento causado e o
impacto emocional persistente, dentro, é claro, do limite do montante então peticionado. 
 
CVII. Mas ainda que assim não se decida, entende a Recorrente que a indemnização que lhe foi
atribuída no montante de 500€ é manifestamente insuficiente face aos factos dados como provados, à sua gravidade, à intensidade do sofrimento infligido à Assistente, bem como à repercussão na sua vida familiar e profissional, devendo, por isso, ser fixada uma quantia substancialmente mais elevada.
 
CVIII. Ao atribuir o montante indemnizatório de 500€, o Tribunal recorrido, além do mais,
violou o disposto no citado art. 496.º do CC.
 
Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao presente recurso, e, em consequência:

A) deve a decisão da matéria de facto que consta da sentença ora recorrida ser modificada nos termos supra aduzidos e, em consequência, ser a mesma revogada e substituída por outra que condene o arguido pela prática de um crime de violência doméstica agravado, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, al. A) e c) e 2, al. A) do Código Penal, na pessoa da sua ex-cônjuge, aqui Recorrente, e dois crimes de violência doméstica agravados, previstos e punidos pelo artigo 152.º, n.º 1, al. e) e 2, al. a) do Código Penal, nas pessoas dos seus filhos menores BB e QQ, que lhe são imputados na acusação, e que, julgando parcialmente procedente por provado o pedido de indemnização civil deduzido pela Recorrente, condene o arguido a pagar a esta uma indemnização proporcional aos danos sofridos. 
Ou, mesmo que não se entenda pela modificação da decisão da matéria de facto, em qualquer caso, 
B) deve a decisão final proferida na sentença ora recorrida ser revogada e substituída por outra que condene o arguido pela prática de um crime de violência doméstica simples, p. e p. nos termos do art. 152.º n.º 1 do CP;
E, mesmo que não se entenda pela modificação da decisão da matéria de facto, 
C) revogar a sentença proferida relativamente ao valor da indemnização atribuída de 500€, condenando o arguido a pagar uma indemnização superior, mais proporcional e adequada aos danos sofridos, fazendo assim inteira e sã JUSTIÇA.

I.2.2.1 Na primeira instância, a Digna Magistrada do Ministério Público, notificada do despacho de admissão do recurso apresentado pela assistente CC, nos termos e para os efeitos do artigo 413.º, n.º 1 do CPP, apresentou resposta em que sustentou a negação de provimento do recurso e a manutenção da sentença recorrida (referência ...00).

I.2.2.2 Igualmente respondeu o arguido AA ao recurso deduzido pela assistente CC, peticionando lhe seja negado provimento (referência ...15).

Formulou as seguintes conclusões:

“I - Carece de fundamento quer de facto, quer de direito o recurso interposto pela Assistente CC, o qual não logra, a nosso ver, pôr em crise os fundamentos da decisão/discordância que justificaram a interposição do recurso. 
II - Andou muito bem o Tribunal a quo na valoração da prova produzida e ao não condenar o arguido AA, pelos crimes de violência doméstica que vinha acusado.
III - Não assiste qualquer tipo de razão à recorrente, pois da fundamentação por si aduzida, nomeadamente da que resulta das doutas conclusões – como é sabido o objeto do recurso é limitado pelas conclusões – não se vislumbra qualquer fundamento de facto ou de direito minimamente “válido” e apto, a colocar em crise o doutamente decidido e impor decisão diversa. 
IV - Como se pode verificar pela fundamentação, o Tribunal a quo, como é seu apanágio, procedeu a uma cuidadosa análise da prova produzida em sede de audiência e discussão de julgamento. 
V - O Tribunal a quo foi claro, e indicou devidamente os elementos e meios de prova que serviram para formar a sua convicção, fundamentando por isso suficientemente o seu percurso lógico-racional, por forma a concluir, como concluiu, e bem ao não condenar o recorrido AA nos termos em que o fez. 
VI - O que a Recorrente pretende, sob a capa de impugnação da matéria de facto, é só substituir a apreciação objetiva e fundamentada feita pelo Tribunal pela sua própria versão dos factos, e dos seus amigos e familiares, o que não é admissível em sede de recurso quando não se demonstram erros de julgamento, omissões ou contradições relevantes.
VII - A decisão do Tribunal a quo baseou-se numa análise minuciosa da prova produzida em sede de audiência e discussão de julgamento. O Tribunal não se limitou a acolher, de forma acrítica, a versão do Arguido. Pelo contrário, analisou as declarações da Assistente, os depoimentos das testemunhas por si apresentadas e confrontou-os com os restantes elementos constantes dos autos.
VIII - A prova testemunhal apresentada pela Assistente revelou-se frágil e incoerente, sendo composta essencialmente por familiares e amigos próximos, diretamente interessados no desfecho do processo. 
IX - Os depoimentos das testemunhas, além de contraditórios entre si, mostraram-se desprovidos de espontaneidade, denunciando uma narrativa construída e alinhada previamente.
X - Não existe qualquer elemento probatório — documental, pericial ou outro — que corrobore as versões apresentadas pela Assistente. A jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores é clara no sentido de que a multiplicidade de depoimentos provenientes de fontes interessadas, desacompanhados de outro elemento de prova, não basta para uma condenação penal.
XI - O próprio comportamento da Assistente desmente a sua versão dos factos. Com efeito, em sede de julgamento, a 22.05.2025, a mesma afirmou não ter qualquer problema que o Arguido convivesse com os filhos desde fevereiro, reconhecendo, implicitamente, que este jamais os teria maltratado ou agredido. Quem efetivamente acreditasse na existência de maus-tratos nunca se mostraria disponível para tal convívio.
XII - Ao contrário da Assistente, o Arguido sempre se mostrou coerente e consistente nas suas declarações, desde o primeiro interrogatório judicial até à audiência de julgamento, não variando a sua versão conforme a oportunidade, como sucedeu com a Recorrente.
XIII - Para além disso, o julgador teve contacto vivo e imediato, quer com o arguido, quer com as testemunhas, quer com a assistente, pelo que, dessa forma pôde firmar, com a imparcialidade que lhe é reconhecida, a sua convicção. 
XIV - Assim, conclui-se que nem a Recorrente CC abala minimamente a matéria de facto dada como não provada, nem invoca qualquer vício da sentença, nem o mesmo existe, pelo que, sem prescindir o muito respeito que nos merece, não tem a virtualidade de impor uma decisão diversa daquela que o Tribunal a quo, ponderada a acertadamente, tomou, não tendo ainda qualquer suporte de facto ou de direito, pelo que a decisão que sobre o mesmo recair não poderá ser outra que não a sua total improcedência, assim se fazendo a acostumada Justiça!!!

I.3 Tramitação processual neste Tribunal da Relação

Neste Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer em que, citando pertinente jurisprudência sobre as matérias em causa, pronunciou-se pela improcedência dos recursos deduzidos pelo arguido e pela assistente (referência ...88).
  
Cumprido o disposto no art. 417º, nº 2, do Código de Processo Penal (doravante denominado CPP), o arguido/recorrente deduziu resposta ao parecer em que, no essencial, reitera o já alegado nas suas alegações de recurso (referência ...43).

Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência, cumprindo, pois, conhecer e decidir.

II – Âmbito objetivo dos recursos (questões a decidir):

É hoje pacífico o entendimento doutrinário e jurisprudencial de que o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, sendo apenas as questões aí inventariadas (elencadas/sumariadas) as que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente dos vícios indicados no art. 410º, nº 2, do CPP.[1]

Assim sendo, no presente caso, as questões que importa decidir são as seguintes:

A) Recurso deduzido pela assistente HH:
A1) Erro de julgamento quanto aos factos não provados nos itens a) a n), o), ii) a mm), oo) a rr), zz), u) a hh), nn), ss), tt), vv) a xx), bbb), iii), jjj), aaaa) a gggg), kkkk), qqqq), kkk) a nnn), ppppp), qqqqq), vvvv) a yyyy) e ddddd) a jjjjj), que devia ter sido dada como provada.    
A2) Errada subsunção dos factos mesmo perante a factualidade dada por provada: peticionada condenação do arguido pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º, nº1, al. a), do Código Penal, e não por um crime de ameaça agravada.
A3) Insuficiência do montante indemnizatório fixado em primeira instância.

B) Recurso deduzido pelo arguido AA:
B1) Erro de julgamento relativamente à matéria de facto dada como provada nos pontos 12 a 15, que devia ter sido dada como não provada.
B2) Errada qualificação jurídica dos factos: não preenchimento da tipicidade do crime de ameaça agravado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 153º e 155º, nº1, al. a), ambos do CP.

III – Sentença recorrida      
III.1.1 – Factualidade dada por provada em primeira instância (transcrição):       

1. O arguido e a assistente CC, contraíram matrimónio no dia 25 de agosto de 2015, e fixaram residência na habitação dos pais desta, com que residiam, sita na Rua ..., ..., em Guimarães.
2. Da relação matrimonial nasceram BB, a ../../2017, e QQ, a ../../2019.
3. No dia 7 de janeiro de 2018, a assistente sofreu um aborto espontâneo.
4. Em meados de agosto de 2018, a assistente engravidou.
5. Em 28 de dezembro de 2018, o casal fixou residência, numa habitação arrendada, sita Rua ...., ..., ..., em Guimarães;
6. No dia 4 de maio de 2019, no Hospital ... em Guimarães, nasceu o filho, de ambos, QQ.
7. No dia 16 de julho de 2020 a assistente, saiu de casa, levando consigo os filhos, sendo que o arguido também a abandonou.
8. No dia ../../2020, a assistente intentou ação de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge, que correu termos no Juízo de Família e Menores de Guimarães, Juiz ..., sob o n.º 3404/20.9T8GMR.
9. No dia 13 de outubro de 2020, depois de uma ida da filha ao hospital, a assistente e este, reataram o relacionamento, e a assistente desistiu da ação de divórcio, e voltaram a residir na mesma habitação, sita na Rua ...., ..., ..., em Guimarães.
10. No dia ../../2021, a assistente saiu de casa e, levando consigo os filhos, e foram viver para a habitação dos seus pais, e o arguido, também, abandonou a residência e foi viver com os seus progenitores.
11. Em janeiro de 2021, a assistente deu entrada de nova ação de divórcio, com o n.º 336/21.7T8GMR, tendo o divórcio sido decretado e transitado em julgado no dia 14 de abril de 2021.
12. No dia 8 de março de 2021, pelas 16:30 horas, o arguido dirigiu-se ao escritório da assistente, sito na Rua ..., ..., em Guimarães, devido ao facto da assistente ter dado entrada de uma providencia cautelar de arrolamento, de um motociclo do arguido (que tinha recentemente vendido a novo proprietário), este entrou no gabinete, empurrou a secretária encostando a assistente à parede, e agarrou-a, com as duas mãos, pelo pescoço, ao mesmo tempo disse-lhe: Desiste da ação. Mato-te, filha da puta.”
13. Nesse momento foi surpreendido por DD e EE, e fugiu do local.
14. Com o aludido em 12), arguido quis e logrou ferir a ofendida na sua honra e consideração, saúde psíquica e física, molestá-la psíquica e fisicamente, intimidá-la, provocar-lhe medo, ansiedade e inquietação, provocar-lhe receio de vir a sofrer atos atentatórios contra a sua integridade física e vida, bem sabendo que a sua conduta era adequada a causar-lhe tal receio e limitar a sua liberdade pessoal, ambulatória.
15. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que estas suas condutas aludidas em 12), eram proibidas e punidas pela lei penal.
16. No dia 23 de janeiro de 2022, à tarde, o arguido levou ambos os filhos até ao aeroporto Francisco Sá Carneiro, no Porto, e deixou os menores no interior, do carro, enquanto ficou no exterior do carro a perscrutar o telemóvel.

Do PIC, referentes ao objecto do processo e com interesse para a decisão:
17. Em consequência adequada, directa e necessária das agressões infligidas e supra descritas, o demandado causou à demandante dores físicas, dores de cabeça, dores nos braços, no momento da perpetração da agressão e nos dias que se lhe seguiram, até completado o tempo necessário a recuperação e restabelecimento, o previu e quis.
18. A ameaça proferida foi levada muito a sério, pois, o seu teor é claro e objectivamente ameaçador O arguido trabalha como medidor orçamentista e aufere cerca de €1.100,00 mensais.
19. Vive com os progenitores, sendo que o pai é empresário e aufere cerca de €1.300,00 mensais, e com a mãe que trabalha como administrativa e aufere cerca de €900,00 mensais.
20. Vive em casa própria dos pais.
21. Frequentou o 1º ano do curso de fiscalidade na universidade.
22. O arguido iniciou nova relação amorosa em novembro ou dezembro de 2021, a qual perdura até hoje.
23. Consta do relatório social, além do mais que “O regime de visitas acordado para os convívios do arguido com os filhos terá sido cumprido regularmente até à apresentação da queixa-crime que desencadeou o presente processo. AA referiu ter sido privado de contactos presenciais com os filhos entre abril e setembro de 2022, altura em que foi solicitada pela EMAT a intervenção do CAFAP da ADCL, em Guimarães, para mediar a reaproximação do arguido aos menores e tentar gerir a contenda entre este e a ofendida. O convívio do arguido com os filhos foi retomado a partir de outubro de 2022, em contexto de visitas supervisionadas e confinadas às instalações do CAFAP, com periodicidade semanal e duração de uma hora. Este esquema de visitas manteve-se durante aproximadamente um ano, passando, depois, para um regime transitório, no âmbito do qual o convívio semanal do arguido com os menores passava a decorrer na residência deste (e, neste caso, dos avós paternos), entre as 09.30h e as 17.15h, sem supervisão. A entrega e recolha das crianças era realizada nas instalações do CAFAP, em horários desfasados entre o arguido e ofendida e/ou familiares desta, por forma a evitar encontros. Do que foi possível apurar, os momentos de convívio dos menores com o pai decorriam de forma positiva, tendo sido avaliada uma relação próxima do arguido com os filhos, sem indicadores de rejeição ou sentimentos negativos das crianças em relação ao progenitor. O último convívio de AA com os menores no exterior ocorreu em 25-11-2023. Nas datas seguintes, os menores deixaram de querer acompanhar o pai, tendo sido tentada mediação pela equipa técnica do CAFAP. Em 23/12/2023, após entrega dos menores nas instalações desta entidade, terá ocorrido, no exterior, uma altercação entre familiares do arguido e familiares da ofendida, com necessidade de intervenção dos OPC locais. A ofendida avaliou negativamente a atuação da equipa técnica do CAFAP e da EMAT de Guimarães, tendo adotado uma postura de oposição relativamente às mesmas, pelo que deixaram de estar reunidas as condições para dar continuidade aos processos em Guimarães. Neste seguimento, por decisão do Centro Distrital de Braga da Segurança Social, o processo de promoção e proteção sobre os menores foi transferido para a EMAT de Braga e, por conseguinte, o apoio e mediação familiar passou a ser realizado no CAFAP da Associação Famílias, em ..., a partir de janeiro de 2022. (…) As rotinas de AA afiguram-se normativas e estruturadas, sendo o seu quotidiano organizado em torno do exercício profissional. Refere uma vasta rede social, com amigos de vários contextos. Nos tempos livres dedica-se à prática informal de desporto (futebol, padel e motociclismo off road /todo-o-terreno). Mantém uma relação afetiva há cerca de três anos, que avalia como positiva e gratificante, pernoitando algumas vezes em casa da namorada, residente na .... No meio de inserção sociocomunitária, o arguido é amplamente conhecido, projetando uma imagem positiva, muito associada à empresa, aos hábitos de trabalho e a um estilo de vida desafogado. Em termos de interação social, nada consta em seu desabono, nem lhe são atribuídas práticas ilícitas.”
24. O arguido não tem antecedentes criminais.

III.1.2 – Factualidade dada como não provada em primeira instância (transcrição):

a) Durante a vivência em comum, no interior da habitação, diariamente, o arguido dirigiu à assistente as seguintes frases e expressões: Quem é que te quer, És o que és graças a mim.
b) O arguido saía muitas vezes, chegando a casa de madrugada.
c) Quando questionado pela assistente pelos motivos da sua chegada tardia a casa, este dizia-lhe: És uma estúpida, filha da puta, queres-me baixar as calças, mas não vais conseguir, não faltam mulheres que me queiram e queiram um filho meu.
d) Mais lhe dizia que trabalhava muito e não andava a coçar os tomates como a assistente, que esta não tinha nada que ver com a vida dele, e que fosse a última vez que o confrontasse com as suas saídas e ausências.
e) Sendo que muitas das vezes, o arguido dirigiu tais palavras à assistente, na presença da filha BB. 
f) No dia aludido em 3), o arguido não confortou a assistente, e saiu de casa para se encontrar com os seus amigos.
g) Encontrando-se grávida de 5 meses, a assistente ficou acordada à espera que arguido chegasse a casa.
h) O arguido regressou pelas 4:00 horas da madrugada, e a assistente quis falar sobre a relação, ao que este lhe disse: És uma filha da puta, cabra, achas que podes mandar em mim? Nunca, sua puta. 
i) Em face do sucedido, a assistente chorosa, disse ao arguido que, apesar de estar grávida, queria terminar o relacionamento.
j) Em reação, o arguido chorou, disse-lhe estar arrependido, pediu perdão, e que queria a família acima de tudo.
k) Após o aludido em 5), o arguido começou a chegar cada vez mais tarde a casa, e chegado a casa, o arguido dirigia à assistente as seguintes frases e expressões: és uma puta, grande cabra, não tens na a ver com a minha vida, cuida da tua vida que eu cuido da minha.
l) E, de seguida, dizia-lhe oh menina queres que te toque, mas isso nunca vai acontecer, em simultâneo, encostava a sua cabeça à da assistente.
m) Nessas ocasiões, a filha BB encontrava-se presente, começava a chorar e dizia: O papá é mau, bate na mãe.
n) Aquando do aludido em 6), quando a enfermeira entrou no quarto com o recém-nascido, o arguido não quis pegar no seu filho, continuando a rir-se enquanto olhava para o seu telemóvel.
o) Aquando do aludido em 7), antes de sair de casa, o arguido disse à assistente: Minha menina se abres a boca acerca do que sabes do “...” apareces morta numa valeta, que tanto eu como eles matamos-te, não sabes onde te estás a meter. Já sabes que tenho inúmeros conhecimentos nas polícias daqui da zona de Guimarães, e tudo que denuncies, saberei em primeira mão.
p) O aludido em 9), foi após insistência do arguido.
q) Aquando do aludido em 12), o arguido agarrou a assistente pelos braços, e abanou-a com força.
r) As lesões são consequência adequada, directa e necessária das agressões infligidas.
s) Desde data não concretamente apurada, o arguido trocava mensagens de foro íntimo com outras mulheres.
t) Volvido cerca de um mês após o nascimento do filho QQ, a assistente descobriu tais conversações íntimas do arguido.
u) Após tal descoberta, a assistente disse ao arguido que não queria mais manter relações sexuais com este.
v) Não obstante, por inúmeras ocasiões, o arguido agarrou o braço da assistente, e arrastou-a até ao seu quarto, e trancou a porta.
w) Nesses momentos, a assistente gritou-lhe que não queria ter relações, que tinha nojo dele;
x) Indiferente, o arguido agarrou com as mãos os braços da assistente, e com as pernas prendeu as pernas desta, e introduziu o seu pénis na vagina da ofendida, movimentando-se sucessivamente para a frente e para trás, até ejacular.
y) Os filhos do casal ouviram os gritos da assistente, começaram a chorar, dirigiram-se ao quarto e bateram na porta, pedindo ao pai que a abrisse.
z) Terminado o ato sexual, o arguido saía do quarto, e os filhos iam ao encontro da assistente e diziam-lhe: Mamã quando formos grandes chamamos a polícia.
aa) No dia 17 de agosto de 2019, de madrugada, no dia do batismo do filho
QQ, o arguido disse à assistente que queria ter relações sexuais com esta.
bb) Ao que esta recusou.
cc) No entanto, o arguido aproximou-se da assistente para a agarrar, tendo esta fugido e se colocado entre o guarda-fatos e o berço do filho, que se encontrava a dormir, e o arguido não logrou alcançá-la.
dd) Frustrado, o arguido desferiu várias cabeçadas, murros e pontapés no guarda-fatos e disse à assistente: sua filha da puta, grande vaca, achas que me consegues destruir, cabra do caralho. ee) Nesse momento, ao ver o arguido descompensado e descontrolado, a assistente começou a chorar, pedindo-lhe que se acalmasse.
ff) Na sequência, o arguido saiu do quarto e foi dormir no sofá.
gg) Durante a cerimónia do batizado do filho, o assistente e o arguido não falavam entre si, ao ponto de os convidados estranharem tal comportamento.
hh) Na boda, na Quinta ..., sita em ..., em Guimarães, o arguido puxou com força o braço da assistente, e disse-lhe: ou melhoras essa cara ou vamos ter problemas porque toda a gente se apercebeu que estamos chateados.
ii) Durante o período que se encontraram separados, o arguido disse à assistente que tinha mudado e que queria reatar a relacionamento.
jj) No dia 24 de dezembro de 2020, o arguido esteve todo o dia ausente de casa, e a assistente ligou-lhe para irem para a casa dos pais deste, onde iam passar a noite de consoada.
kk) Ao chegar a casa, o arguido, exaltado, disse à assistente: Já não posso festejar o Natal com os meus amigos, sua filha da puta, tu e as tuas desconfianças, grande cabra, e em simultâneo encostou a sua cabeça à da assistente.
ll) Amedrontada, a assistente começou a chorar e disse ao arguido: Vais-me bater até, mais do mesmo?
mm) Ao que este lhe respondeu: Era o que tu querias, sou mais fino do que pensas, tens a puta da mania que és advogada, que sabes mais do que os outros, eu chego para ti. Sabes que também conheço muitos procuradores e juízes, pois faço muitos trabalhos em casa deles.
nn) No dia 12 de janeiro de 2021, no interior da habitação, o arguido manteve relações sexuais contra a vontade da assistente.
oo) No período compreendido entre 13 de maio e inícios de novembro de 2021 o casal tentou uma reconciliação, e frequentaram consultas de terapia do casal.
pp) Tendo a assistente terminado, em início de novembro de 2021, o relacionamento, porquanto o arguido mantinha o mesmo comportamento agressivo e obsessivo. qq) E desde meados de novembro de 2021, o arguido, diariamente, deslocou-se ao escritório da assistente e enviou-lhe mensagens dizendo-lhe que estava à sua espera.
rr) E no mesmo período, deslocou-se frequentemente à residência da assistente, sita no ..., n.º 120, ... andar, em ..., Guimarães, circundando em frente à habitação desta.
ss) No dia 9 de janeiro de 2022, de modo não concretamente apurado, o arguido bateu no rosto do seu filho QQ, causando-lhe dor e hematoma.
tt) Em data não concretamente apurada, situada entre janeiro a 28 de setembro de 2022, o arguido bateu na face de BB causando-lhe dor e hematoma.
uu) Desde data não apurada, próxima do dia 28 de fevereiro de 2022, o arguido, de modo não apurado, associou o computador pessoal e profissional, e telemóvel, contas do Google e endereços eletrónicos da assistente, aos dispositivos deste.
vv) Em 7 de março de 2022, a assistente assumiu publicamente uma relação amorosa com RR, militar da GNR, a exercer funções, no Posto Territorial ... ww) No dia 12 de março de 2022, nas ..., BB disse a RR: És tu o polícia que vai prender o meu pai por ele me bater e bater na minha mamã?
xx) Ao ouvir tal frase vociferada pela sua irmã, QQ aproximou-se, dirigiu-se a RR e disse-lhe: Não quero que prendas o meu papá por ele me dar chapadas.
yy) No dia 26 de março de 2022, o arguido enviou para o contato de telemóvel do pai da assistente a seguinte mensagem, datada de 01-01-2022: Como é que a GNR aceita uma atiça da mesma pessoa e aaceita o pagamento da mesma pessoa (abuso de poder) a camara municipal de ... vao entrar o encarregado eo capataz apartir das 10h boa sorte até ao dia 25 de Agosto (data do casamento do arguido e da assistente), com vista a criar na assistente uma suspeição sobre o seu namorado.
zz) Em data não apurada, situada em março de 2022, o arguido ligou para a assistente e disse-lhe: “Estás sujeita a um dia destes aparecer morta numa valeta.”
aaa) O arguido, desde pelo menos meados de março de 2022, passou a ingerir bebidas alcoólicas de modo frequente e em excesso.
bbb) No dia 2 de abril de 2022, no ..., no Porto, o arguido distraiu-se e a sua filha BB ficou sozinha, sem saber do arguido, tendo sido auxiliada por um visitante que a viu a chorar e nervosa.
ccc) Em data não apurada, situada na primeira quinzena de abril de 2022, o arguido num bar, sito em ..., disse aos berros que “ia limpar o sebo da ex-mulher e ao namorado dela.” ddd) A assistente tomou conhecimento de tal frase intimidatória proferida pelo arguido.
eee) Em data não apurada, situada no início de agosto de 2023, com o propósito concretizado de saber onde a assistente se encontrava, o arguido acedeu à aplicação de controlo parental instalada pela assistente no telemóvel da BB, criando um email similar ao da assistente (..........@.....).
fff) Entretanto a assistente solicitou a um informático que desinstalasse as aplicações de localização do seu telemóvel e da filha.
ggg) Na sequência, o arguido passou a ligar, diariamente e várias vezes ao dia, para o telemóvel da filha questionando onde esta a assistente se encontravam.
hhh) Como o arguido continuava a deslocar-se ao escritório da assistente, esta teve que mudar de instalações, e contratou uma secretaria, e apenas se desloca ao escritório quando tem reuniões previamente marcadas, com vista a evitar encontrar-se com o arguido. iii) No dia 25 de novembro de 2023, o arguido desferiu uma bofetada na face direito do rosto do filho QQ, causando-lhe dores e um hematoma na parte atingida. jjj) Após, dirigindo-se aos filhos BB e QQ disse-lhes: se contaram à mãe, que a apanhava sozinha, que lhe ir dar muita porrada e pô-la no hospital.
kkk) Mercê do comportamento do arguido, a ofendida viveu num clima de medo, angústia, inquietação e insegurança, temendo que o denunciado atentasse contra sua integridade física e vida, sentindo-se constrangida na sua liberdade pessoal, ambulatória e sexual. lll) O arguido quis e logrou (com os factos dados como não provados) ferir a ofendida na sua honra e consideração, saúde psíquica e física, molestá-la psíquica e fisicamente, intimidá-la, provocar-lhe medo, ansiedade e inquietação, afetar o equilíbrio emocional e perturbar a vida privada, paz e sossego desta, provocar-lhe receio de vir a sofrer atos atentatórios contra a sua integridade física e vida, bem sabendo que a sua conduta era adequada a causar-lhe tal receio e limitar a sua liberdade pessoal, ambulatória e sexual, quando a ofendida se recusava a ter relações sexuais com este; tudo por forma a afetar a sua dignidade, não se coibindo de assim atuar na residência do casal, na presença dos filhos menores; apesar de esta ter sido a sua esposa, mãe do seus filhos e, como tal, lhe merecer especial respeito.
mmm) O arguido quis e logrou ferir os seus filhos BB e QQ na sua saúde física e psíquica, provocar-lhes medo, ansiedade e inquietação, ciente que a sua conduta era adequada a causar-lhe receio pela sua integridade física e vida, tudo por forma a afetar a sua dignidade pessoal, sabendo que, sendo pai daqueles e pela idade dos seus filhos, incumbia-lhe o dever de velar pela segurança e saúde destes e dirigir a sua  educação, que tinha grande ascendência sobre estes e que ao agir da forma descrita perturbava e estava a prejudicar, de forma grave e séria, o normal desenvolvimento psicológico, afetivo e o desenvolvimento da personalidade dos seus filhos, que não eram capazes de lhe mover qualquer resistência ou oposição.
nnn) O arguido agiu sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas (dadas como não provadas) eram proibidas e punidas pela lei penal.
ooo) Os adjectivos dirigidos à demandante são objectivamente e subjectivamente injuriosos, nomeadamente “és uma estupida, filha da puta, cabra, grande cabra, cabra do caralho”, entre outros melhor supra descritos.
ppp) Como consequência adequada, directa e necessária da perturbação decorrente da recepção das centenas de sms e do conteúdo injurioso das mesmas, das ameaças e perseguições constantes a demandante ficou num estado de pânico, ansiedade e nervosismo crescente, que se foi agudizando com a recepção de cada uma das mensagens.

Do PIC, com relevo para a decisão:
qqq) Verificando que o demandado estava muito estranho com a assistente, apercebendo-se esta que as noitadas e festas que aquele ia com os amigos não era normal, e cada vez piorando, dado que estavam a planear mudar de casa no final do mês de Dezembro de
2018, passando a viver sozinhos com a sua filha menor de dois anos, BB, rrr) No período compreendido entre 13 de maio e inícios de novembro de 2021 o demandado pretendia uma reconciliação, na altura afirmou sofrer de problemas psicológicos e assumiu necessitar de ajuda profissional, recorrendo aos serviços da Clínica ..., frequentando apenas 2 sessões de terapia.
sss) Durante esse período, contactou a Demandante alegando que a terapia que realizava só funcionava se a mesma também tivesse algumas sessões, para que o seu terapeuta entendesse o que se passava ou havia passado na relação, pois ambos os terapeutas iriam falar acerca do assunto.
ttt) O certo é que passadas três sessões a demandante, achando que tais consultas não faziam sentido, questionou a terapeuta se já tinha falado com o terapeuta do seu ex-marido, aqui demandado, para saber o problema de que este padecia.
uuu) Qual não é o espanto da Demandante, quando a terapeuta disse que não sabia de nada, nem quem era o ex-marido daquela, nem tão pouco os profissionais de saúde podiam falar a outros Colegas acerca das consultas que prestavam.
vvv) Nesse momento a Demandante, apercebendo-se que era mais uma mentira do Demandado questionou na recepção da clínica se o mesmo estava a frequentar as consultas, tendo sido informada que não, que este só foi a duas consultas e nunca mais apareceu.
www) Mais uma vez, o Demandado agiu de forma ardilosa, enganando a Demandante com o propósito de retomar a relação e continuar a abusar psicológica e fisicamente da Demandante.
xxx) Tendo a assistente/demandante terminado, em inícios de novembro de 2021, a comunicação, porquanto o arguido/demandado mantinha o mesmo comportamento agressivo e obsessivo.
yyy) E em meados de novembro de 2021, o arguido/demandado diariamente, deslocou-se ao escritório da assistente/demandante e envio-lhe mensagens dizendo-lhe que estava à sua espera.
zzz) E no mesmo período, deslocou-se frequentemente á residência da assistente/demandante, sita na Rua ..., em ..., Guimarães, circulando em frente à habitação desta. aaaa) No dia 9 de janeiro de 2022, de modo não concretamente apurado, o arguido bateu no rosto do seu filho QQ, causando-lhe dor e hematoma.
bbbb) Em data não concretamente apurada, situada entre janeiro a 28 de Setembro de 2022, o arguido/demandado bateu na face da BB causando-lhe dor e hematoma. cccc) No dia 23 de janeiro de 2022, á tarde, o arguido/demandado levou ambos os filhos até ao aeroporto Francisco Sá Carneiro, no Porto, e deixou os menores no interior do carro, enquanto este ficou no exterior do carro a perscrutar o telemóvel.
dddd) Desde data não apurada, próxima do dia 28 de Fevereiro de 2022, o arguido/demandado, de modo não apurado, associou o computador pessoal e profissional, e telemóvel contas do Google e endereços electrónicos da assistente/demandante, aos dispositivos deste.
eeee) Em 7 de março de 2022, a assistente/demandante assumiu publicamente uma relação amorosa com RR, militar da GNR, a exercer funções no Posto territorial das ....
ffff) No dia 12 de março de 2022, nas ... BB disse a RR: “És tu o polícia que vai prender o meu pai por ele bater na minha mãe?”
gggg) Ao ouvir tal frase vociferada pela sua irmã, QQ aproximou-se, dirigiu-se a RR e disse-lhe: “Não quero que prendas o meu papá por ele me dar chapadas”.
hhhh) No dia 26 de março de 2022, o arguido/ demandado enviou para o contacto de telemóvel da assistente/demandante a seguinte mensagem, datada de 01.01.2022:
“Como é que a GNR aceita atiça da mesma pessoa e aaceita o pagamento da mesma pessoa (abuso de poder) a camara municipal de ... vao entrar o encarregado e o capataz partir das 10h boa sorte até ao dia 25 de agosto (data do casamento do arguido e assistente), com vista a criar na assistente/demandante uma suspeição sobre o namorado.  
iiii) Em data não apurada, situada em março de 2022, o arguido/demandado ligou para a assistente/demandante e disse-lhe: “estás sujeita a um dia destes aparecer morta numa valeta”.
jjjj) O arguido/demandado, desde pelo menos meados de março de 2022, passou a ingerir bebidas alcoólicas de modo frequente e em excesso.
kkkk) No dia 2 de abril de 2022, no ..., no Porto, o arguido/demandado distraiu-se e a sua filha BB ficou sozinha, sem saber do arguido, tendo sido auxiliada por um visitante que a viu a chorar e nervosa.
llll) Em data não apurada, situada no inicio de agosto de 2023, com o propósito concretizado de saber onde a assistente/demandante se encontrava, o arguido/ demandado acedeu à aplicação de controlo parental instalada pela assistente/demandante no telemóvel da BB, criando  um            email   similar ao             da assistente/demandante(..........@.....)
mmmm) Entretanto a assistente/demandante solicitou a um informático que desinstalasse as aplicações de localização do seu telemóvel e da filha.
nnnn) Na sequência, o arguido/demandado passou a ligar, diariamente e várias vezes ao dia, para o telemóvel da filha questionando onde esta e a assistente/demandante se encontravam.
oooo) Como o arguido/demandado continuava a deslocar-se ao escritório da assistente/demandante, esta teve que mudar de instalações, e contratou uma secretária, e apenas de desloca ao escritório quando tem reuniões previamente marcadas, com vista a não se encontrar com o arguido.
pppp) No dia 25 de novembro de 2023, o arguido/demandado desferiu uma bofetada na face direita do rosto do filho QQ, causando-lhe dores e um hematoma na parte atingida.
qqqq) Após, dirigindo-se aos filhos BB e QQ disse-lhes: “se contarem á mãe, que a apanhava sozinha, que lhe ir dar uma porrada e pô-la no hospital.
rrrr) Desde o início do casamento que o demandado demonstrou ser uma pessoa com personalidade violenta, agressiva, controladora e autoritária no trato diário com a demandante.
ssss) Após os episódios relatados na douta acusação pública, e como a demandante não dava resposta aos sms e e-mails o demandado começou a fazer esperas à demandante, perseguindo-a.  
tttt) As ameaças do demandado foram proferidas de forma séria e grave.
uuuu) Dada a personalidade quezilenta do demandado, era de todo credível que viesse a concretizar as ameaças.   
vvvv) Como consequência adequada, directa e necessária de todos as condutas do demandado, resultou para a demandante e também para os seus filhos QQ e BB: um permanente sentimento de pânico, Um sentimento de temor pela sua integridade  física e até pela sua vida. Ficou com um permanente receio de que o demandado lhe aparecesse e concretizasse as ameaças;  Sentiu-se coarctada na sua liberdade. Ficou com temor que o demandado fizesse mal aos filhos, apesar de serem filhos de ambos, como chegou a acontecer e dirigisse a sua fúria para estes. 
wwww) Os factos levaram a que demandante alterasse os seus hábitos quotidianos, evitando andar sozinha, deixando de passear e de se deslocar sozinha, bem como deixando de estar permanentemente no seu escritório, desde novembro de 2021 a Março de 2022 (encontrando-se nesse período a trabalhar num escritório que teve de improvisar na casa que comprara e enquanto esta estava em obras) suportava a despesa do mesmo na esperança que o demandado cessasse as esperas, mas como tal não sucedeu, mudou inclusivamente de instalações, contratando uma funcionária.
xxxx) Ficando sempre ansiosa, sempre que tinha de sair de casa, de se deslocar para o trabalho ou do trabalho para casa.  yyyy) Evitou e, ainda, evita sair.
zzzz) Anda permanentemente com receio que, ao “dobrar de qualquer esquina” lhe apareça o demandado a cumprir as ameaças, aliás, mesmo com pulseira eletrónica o demandado faz questão de passar em frente á demandante, para demonstrar que quando quiser executa tais ameaças, o que a tem perturbado muito.
aaaaa) A ponto de ser acompanhada do local de trabalho até ao local onde o tem o carro
estacionado, de não pegar no carro sem o vistoriar de “fio a pavio”, abrindo inclusive a mala, de não sair do carro, seja em casa da mãe ou de amigos, sem ligar para lhe abrirem a porta, a fim de evitar ter de aguardar que lhe abram a porta e nesse hiato apareça o demandado a cumprir as ameaças.
bbbbb) Tornou-se numa pessoa mais triste, nervosa e ansiosa. ccccc) Desde os factos que passou noites em claro.
ddddd) Sofreu um permanente abalo psíquico, que hoje em dia ainda se reflecte.
eeeee) Passou a ter frequentes enxaquecas, um sono difícil, acordando a meio da noite sobressaltada, sofreu uma diminuição da sua capacidade de se relacionar socialmente, quer com a família, quer com amigos, perdeu a vontade de sair de casa, com medo de se
cruzar com o demandado. 
fffff) Deixou de comer, o sobressalto em que vive tirou-lhe o apetite.
ggggg) Emagreceu substancialmente, de 94 kg para 61 kg;
hhhhh) Passou a ter apoio psicológico, com a Dra. SS, no entanto, devido a dificuldades financeiras, pois cada consulta tinha o custo de €50,00, posteriormente, passou a ter consultas nos serviços camarários de apoio às vítimas de violência doméstica no espaço municipal para a igualdade, serviço gratuito.
iiiii) Teve de ser medicada para combater a ansiedade e o estado depressivo em que caiu, tomando, inicialmente, em Janeiro de 2022, sertralina 50mg e diazepam ratiopharm 10 mg, para conseguir dormir um pouco.
jjjjj) Tal causou (e continua a causar) à Demandante abalo psíquico que, ainda hoje, mais de três anos após, a deixam acabrunhada, abalada, amargurada e deprimida.
kkkkk) Deixando-a pessoa mais irritadiça e com menos capacidade de socializar. 
lllll) Por força dos factos teve de sair da casa dos pais, onde morava, e comprar uma habitação maior, onde os seus pais pudessem ir viver consigo, para não ficar nunca sozinha. 
mmmmm) A fim de evitar o pânico que lhe dava uma possível espera, as perseguições do demandado e o pânico que aquele local lhe passou a dar.
nnnnn) Incorreu, assim, numa despesa de € 399,07 de Novembro de 2021 a abril de 2022, €418,30 de maio de 2022 a outubro de 2022, € 660,20 de novembro de 2022 a Janeiro de 2023, €685,24 de fevereiro de 2023 a outubro de 2023, € 888,16 de Novembro de 2023 até abril de 2024 (valor da prestação do crédito habitação), desde 11.2021, no total de € 17.695,70, que não teria de suportar se não fosse o comportamento do demandado e que terá de suportar até que ultrapassado o temor.
ooooo) Mercê do comportamento do arguido/demandado, a ofendida/demandante viveu e vive num clima de medo, angústia, inquietação, insegurança, temendo que o denunciado/demandado atentasse e atente contra a sua integridade física e vida, sentindo-se constrangida na sua liberdade pessoal, ambulatória e sexual.
ppppp) O arguido/demandado quis e logrou ferir a demandante na sua honra e consideração,
saúde psíquica e física, molestá-la psíquica e fisicamente, intimidá-la, provocar-lhe medo, ansiedade e inquietação, afetar o equilíbrio emocional e perturbar a vida privada, paz e sossego desta, provocar-lhe receio de vir a sofrer atos atentatórios contra a sua integridade física e vida, bem sabendo que a sua conduta era adequada a causar-lhe tal receio e limitar a sua liberdade pessoal, ambulatória e sexual, quando a ofendida/demandante se recusava a ter relações sexuais com este; tudo por forma a afetar a sua dignidade, não se coibindo de assim atuar na residência do casal, na presença dos filhos menores, apesar de esta ter sido sua esposa e mãe dos seus filhos e, como tal, lhe merecer especial respeito.
qqqqq) O arguido/demandado quis e logrou ferir os seus filhos BB e QQ na sua saúde física e psíquica, provocar-lhe medo, ansiedade e inquietação, ciente que a sua conduta era adequada a causar-lhe receio pela sua integridade física e vida, tudo por forma a afetar a sua dignidade pessoal, sabendo que, sendo pai daqueles e pela idade dos seus filhos, incumbia-lhe o dever de velar pela segurança e saúde destes e dirigir a sua educação, que tinha grande ascendência sobre estes e que ao agir da forma descrita perturbava e estava a prejudicar, de forma grave e séria, o normal desenvolvimento psicológico, afectivo e o desenvolvimento da personalidade dos seus filhos, que não eram capazes de lhe mover qualquer resistência ou oposição.
rrrrr) Tendo a BB tido acompanhamento psicológico desde da separação da demandante e do demandado, inicialmente, com a Dra. TT, posteriormente, com a Dra. UU, no entanto, como o estado emocional e psicológico piorou, substancialmente, devido ao comportamento contínuo do Arguido/demandado, tornou-se necessário ter consultas com terapeutas mais especializados na área, estando a ter consultas no EMP01..., Unip. Lda. com a Dra. HH
..., tendo as consultas um custo de €80,00, cada uma.
sssss) Sendo que, actualmente, o arguido mantém o mesmo comportamento com os menores, de agressão, censura, represália e medo.

III.1.3 – O tribunal recorrido motivou a decisão sobre a matéria de facto do seguinte modo (transcrição):

“O Tribunal formou a sua convicção com base na valoração da prova produzida e examinada em audiência de discussão e julgamento, designadamente:
- pericial: relatório pericial de fls. 862 e 863.
- nos documentos, nomeadamente impressões e fotos de fls. 200 e ss., aditamento de fl. 260; impressões de fls. 266 v. e ss., fotogramas de fl. 281 e ss., assentos de nascimento de fls. 25 a 26; certificado de registo criminal; vídeos e mensagens juntos pela defesa, e seguintes.
- nas declarações do arguido, o qual, em suma, relatou que no ano de 2022 a ofendida intentou uma alteração de alimentos e ele recusou, e ela logo em abril de 2022, meteu-lhe o processo de violência doméstica. Mas é incapaz de fazer as coisas acusadas, sendo que a finalidade dela é fazer com que ele não tenha acesso aos filhos.

Nega os factos acusados sob os nºs 3, 4 (excepto que em situações pontuais chegou mais tarde), 5, 6, 7, 9 (ela ia fazer uma raspagem, e ele ofereceu-se que ficava com ela, e ela disse-lhe que preferia ficar com a mãe, para ele ir ter com os amigos porque já tinha combinado), 11 (ela estava a dormir), 12 (chegou do jantar de natal pelas 2 horas, e não houve conversa), 13, 14, 16 (ia jogar futebol às sextas-feiras, e chegava entre as 23.30 e as 24horas), 17, 18, 19 (nunca tiveram discussões com os filhos presentes), 20, 21, 22 (tinha conversas com pessoas do sexo feminino, mas sobre trabalho – foi confrontado pela ofendida mas não eram conversas intimas -, ela pegava-lhe no telemóvel quando ele estava a dormir, e outras vezes entregava-o voluntariamente para não se chatearem), 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29 (ambos queriam), 30 (não se lembra), 31, 32, 33, 34 (nunca dormiu no sofá), 35 (no dia do batismo estavam zangados por causa da logística, mas foi passageiro), 36, 37 (foi ele quem abandonou a casa em 7/2020, porque ela o queria “burlar”, em relação ao IRS, sendo que o contabilista lhe deu razão, e houve discussão, e ela disse para ele sair e ele saiu, tendo ela mudado a fechadura. Em outubro/2020, regressou porque ela pediu-lhe para que se encontrassem no escritório dela, e disse para esquecer o divórcio e regressar, e ele não voltou. Ela anulou o divórcio), 38 (falaram por WhatsApp, e ela disse que ia contar as mulheres dos amigos o que viu no ... – porque ela acedia sem ele saber), 40 (passaram férias juntos em  agosto, mas depois ele voltou para casa dos seus pais), 41 (a ofendida foi para o hospital com a filha por causa da situação escola, e ele foi lá ter, mas não chegou a tempo, e foi a casa dela, e acabou a dormir lá. Falaram sobre a família e ele ficou lá até 15 de janeiro), 43 (ela estava chateada porque ele esteve todo o dia fora, mas não houve discussão), 44, 45, 46 (acha que no dia 12/1/2021, foi o última vez que tiveram relações sexuais, mas foram consentidas), 47 (ele também abandonou a casa; descobriu que ela lhe meteu um localizador no carro, e disse-lhe, e ela passou-se, e tiveram uma discussão pelo telemóvel e ela insultou-o – não se recorda dos nomes -e disse que se queria separar), 49 (foi ao escritório pedir-lhe para ela tirar o arrolamento à mota, porque já a tinha vendido e não queria problemas com o novo proprietário, não lhe tocou, ameaçou ou insultou), 50 (não os viu lá), 51 (houve alguma aproximação entre maio e julho de 2021, e não até novembro, nem fizeram terapia), 52 (podem ter tido relações sexuais, mas não ficaram como namorados), 53 (mandou um email a dizer que estava à espera dela para falar sobre os filhos, mas estava bloqueado, e por isso foi ao escritório dela duas vezes), 54, 55 (acha que o filho caiu, e foi no seu fim-de-semana), 56, 57 (levou os filhos ao aeroporto, porque eles gostam de ver os aviões, e abriu o tecto panorâmico, e não os tirou do carro porque é perigoso), 60 (não sabe), 62, 63, 64, 65 (foram ao ..., mas a filha não se perdeu), 66 (esteve bar em 8/4/2022, e a ofendida estava com o namorado, mas não falou com eles), 68, 69 (não sabe), 70 (ligou várias vezes porque soube que a filha tinha telemóvel, e o juiz do tribunal de menores, disse que ele podia ligar todos os dias, e ele fazia-o, mas a ofendida bloqueou-o), 71 (sabe que ela mudou de escritório, mas não o motivo), 72 (foi num sábado e era aniversário da sua mãe, não bateu no menor; a ofendida tentou meter uma despesa imprimindo-a duas vezes de forma diferente, e ele ligou-lhe e disse que ia agir contra ela judicialmente, e depois na 5ª feira soube que ela foi fazer a queixa à CAFAF, sendo que o hematoma já existia no sábado); 
Pode ter dito expressões como “estupida ou burra”, mas não mais que isso. Mas ela também usava as mesmas expressões em relação a si.      
A ofendida quer vingar-se e tirar-lhe os filhos.
Ajudava nas tarefas da casa e tratava dos filhos, dando-lhes banho.
A ofendida tem caráter forte, é vingativa e explosiva, e ganhava mais que ele.
Não é pessoa dependente, e é muito ciumenta.
No ...” eram divulgados filmes pornográficos e ela ameaçou que ia divulgar, e ele só a avisou para não contar às mulheres dos seus amigos.
 As relações sexuais foram sempre consentidas.
Foram feitas perícias à filha, e nas visitas os filhos gostam de estar consigo e no Cafaf viam isso.
Tem uma nova relação desde 11/2021, e tinha os seus filhos, mas depois da queixa de violência doméstica, em 4/2022, deixou de os ver.
- nas declarações da assistente; 
- nos depoimentos das testemunhas nomeadamente II, KK, JJ, LL, JJ, MM, EE, DD, NN, GG, AA, VV, WW, XX, YY, MM, ZZ, OO, RR.
*
Feita esta breve súmula da prova produzida, tem que se concluir no sentido de que os factos dados como provados, efectivamente, aconteceram. Na verdade, a factualidade referente ao casamento, terem tido dois filhos em comum, à separação, que após se voltaram a juntar, nova separação e ao divórcio, e períodos, e onde fixaram residências em Guimarães, foi confirmada pelas declarações do arguido, declarações da assistente e documentos juntos aos autos.
Já no que concerne à factualidade referente ao episódio de agressão aludida no facto 49º da acusação, dado como provado, mereceu tal resposta em virtude de ter sido demonstrada não só pelas declarações da assistente, mas, principalmente, pelos depoimentos das testemunhas EE e DD – conjugados com as declarações do arguido -, as quais os prestaram de forma coerente por si e entre si, e souberam esclarecer, com  verosimilhança, que já sabiam do divórcio, viram a assistente a entrar no escritório, e o arguido atrás dela, ouviram discussão e um estrondo, e subiram para ver o que se estava a passar, e foi quando viram o arguido a empurrar a mesa contra a estante, com impressora e computador, e a assistente aí presa, e o arguido a agarrá-la pelo pescoço e a dizer-lhe “ou desistes ou mato-te, sua filha da puta”, e logo entrou a testemunha DD que perguntou “o que se passa aqui”, e o arguido fugiu pelas escadas, tendo a assistente ficado a chorar, recusou ir ao hospital, foram para o seu “café”. 
Ademais, tal tese está de acordo com juízos de experiência comum e normal acontecer, atento que o próprio arguido admitiu, nas suas declarações, que foi, efetivamente, ao escritório da assistente lhe pedir para que retirasse o arrolamento ao motociclo, que já tinha vendido, que houve discussão porque ela se recusava a fazê-lo, mas ele não queria problemas com o novo proprietário.  
Assim sendo, as declarações do arguido, a este propósito, não mostraram credibilidade, sendo mais credível a demais prova produzida. 
A factualidade, referente ao episodio ocorrido no aeroporto, mereceu resposta positiva, porque admitida pelo arguido, sendo que as declarações de ouvir de dizer da assistente à testemunha que prestou depoimento a esse propósito, não mostraram ter havido algum tipo de maus-tratos aos menores, por terem ficado dentro do automóvel, enquanto o progenitor estava no seu exterior – aliás a factualidade alegada era de todo insuficiente e genérica se era esse o fito acusatório. 
Já a factualidade referente ao tipo de relação do casal, seu término, motivação, relação com os filhos, o tribunal valorou a conjugação das declarações do arguido, com as da assistente, e os depoimentos das testemunhas, nomeadamente II, KK, JJ, LL, JJ, MM, EE, DD, NN, GG, AA, VV, WW, XX, YY, MM, ZZ, OO, RR. 
Já quanto aos factos dados como não provados, mereceram resposta negativa, porquanto, praticamente, apenas sustentada, a prova, nas declarações parciais e interessadas, por si e entre si, da assistente, seus pais, tia, e amigas, nomeadamente a testemunha (II), nomeadamente os insultos, ameaças, agressões sexuais, etc. E é assim, porque, em primeiro lugar, quase todos os factos, alegadamente, teriam ocorrido na residência do casal, sem a presença de testemunhas – sendo que a testemunha II disse que “nunca presenciou a nada” directamente, LL, testemunho de ouvir dizer, e a tia da arguida PP, disse que “nunca ouviu o arguido a insultar a ofendida, talvez expressões de cara”, e também de ouvir dizer à assistente, e, em segundo, porque as declarações da assistente se mostraram, várias vezes, interessadas, incoerentes e até contraditórias, quando conjugadas com a demais prova produzida, e, ainda, desamparadas em qualquer outra prova mais segura, quer testemunhal, quer documental, ou pericial ou outra. Atente-se, por um lado, que o arguido negou todos estes factos, e por outro a prova da acusação se mostrou, totalmente, parcial, contando uma versão enviesada, e desmontada peça por peça ao seu produzida a prova em julgamento. 
Vejamos, por exemplo, os factos acusados sob o nºs 21 a 23:
A acusação publica, alega que o arguido trocava mensagens do for íntimo com outras mulheres.
O arguido não negou a troca de mensagens, mas negou que fosse do foro íntimo.
Já a assistente relatou que questionou o arguido, este ofereceu-lhe o telemóvel para que o analisasse, o que ela recusou, numa primeira fase, mas cerca das três horas da manhã, ela pegou no telemóvel dele, e viu mensagens trocadas pelo arguido com uma secretária de nome AAA, em que ele a questionava sobre a profissão, “sempre a puxar por ela”, e que era gira – o que para si é conversa intima, ainda, que não fosse de teor sexual, nem se enquadrasse em relação extraconjugal. Quando o arguido acordou, questionou-o, e ele disse que não tinha mal nenhum, e ela respondeu, afinal, que era “traição” e que “não ia ficar assim”. 
Foi ao Stand da ..., onde trabalhava a tal AAA e questionou-a e “ela respondeu “já deve saber o que a casa gasta” e voltou-lhe as costas.
Depois ligou à sogra a queixar-se, e o arguido quando chegou pediu-lhe desculpa e disse que se ela não quisesse não voltava a trocar mensagens com outras mulheres.
Ora, a tese da acusação pública (artºs 21º a 23º) visou insinuar que o arguido trocava mensagens emocionais, eróticas ou sexuais (íntimas) com outras mulheres, e que foi este facto que esteve na base da decisão da assistente em não querer manter mais relações sexuais com ele. Todavia, nem o teor desse tipo de mensagens foi provado – sendo que a acusação era até genérica a este propósito, omitindo qual o teor efetivo de tais alegadas mensagens -, e foi até desmentido pelas declarações da assistente nos termos supra aludidos – não obstante, se tenha apurado, que pudesse haver uma, efetiva, tentativa de flirt (de maneira leve e lúdica) por parte do arguido -, nem foi provado que as trocou com várias mulheres (como acusado), visto que a assistente falou apenas de uma. E menos, ainda, demonstrou que, por isso, não quis mais ter relações sexuais com o arguido, como abaixo veremos.
O que se percebeu com a produção da prova da acusação, foi que os factos foram sendo sempre empolados, visando uma gravidade que não tiveram, ou até tentar alegar algo que não aconteceu, tudo motivado por ciúmes exacerbados, e com o fito de represália pelo término da relação, e nos termos em que o foi.
Mas vejamos, agora, os episódios acusados sobre as alegadas “violações”:
No facto n.º 24 da acusação pública, diz-se que o arguido por “inúmeras ocasiões”, agarrou o braço da assistente, e arrastou-a até ao seu quarto, e trancou a porta. Que a assistente lhe gritou que não queria ter relações, que tinha nojo dele, e que este manteve coito contra a sua vontade. Que os filhos ouviam os gritos da assistente, choravam e dirigiam-se ao quarto e batiam à porta, pedindo ao pai para a abrir.
Em primeiro lugar, este facto acusatório é também ele genérico, porque não esclarece, quantas vezes aconteceu, em que datas terão ocorrido os episódios alegados, se foi de manhã, à tarde ou à noite, quais as suas consequências, etc. Só por aqui, se constata a falta de verosimilhança do imputado, porque nenhuma pessoa vítima – e uma advogada sabe ainda melhor - de violação, esquece os episódios, necessariamente, traumáticos que teria sofrido, e, por isso, sabe esclarecer, pelo menos, aquelas informações – bem como o bom investigador sabe perguntá-las, concretizá-las, e reunir a prova, para que possam ser julgadas (e não se limitar, a quase, copiar a denúncia), para que o arguido se possa defender devidamente.
No facto acusatório nº 46, alega-se que no dia 12.01.2021, “o arguido manteve relações sexuais contra a vontade da assistente”. Este episódio é, ainda, escrito de forma mais genérica que os anteriores, porque agora tem a data, mas não narra, em concreto, o que, terá, alegadamente, acontecido. Foi coito? 
A acusação nesta parte, a nosso ver, é nula.
Não obstante, vejamos a prova produzida a esse respeito:
O arguido negou as alegadas relações sexuais não consentidas, tendo até referido que quer ele quer a assistente tinham muita vontade em praticá-las até ao fim da relação.
Já a assistente, quanto ao facto nº 26º da acusação, relatou, em suma, que houve discussão, que o arguido a agarrou pelo braço, arrastou-a para o quarto, e forçou-a a ter relações sexuais, e que finalizado o acto, ele subiu a braguilha e saiu do quarto. Ela pensou que quando o confrontou que ele lhe ia bater, mas afinal violou-a. 
Os filhos choravam e ela também, e saíram do quarto e foram todos para a sala. Ora, esta conduta não está de acordo com juízos de experiência comum e normal acontecer, porquanto seria mais plausível que, a assistente, telefonasse a familiares ou amigos, que chamasse a polícia, que ficasse longe do pretenso agressor, e não que fossem todos para a sala, como se nada se tivesse passado – esta conduta e até contraria a proatividade reforçada da ofendida ao longo do processo – como referiu a sua mãe “é uma guerreira”.
Mas relatou, ainda, a assistente que, no dia seguinte, telefonou para o ginecologista, “porque lhe doía”, e ele marcou consulta para o dia seguinte, e lá chegada o médico viu que ela estava “assada” e questionou-a, e ela disse-lhe que o arguido não tinha usado de preliminares, e ele passou-lhe um medicamento e antibiótico, porque estava vermelha. E que não contou ao médico o sucedido por vergonha, e por ser advogada, nem apresentou queixa.
Só no ano de 2020, contou à sua amiga HH.
Também, relatou que, no dia 12/1/2021, voltou a haver discussão, agora por causa de dinheiro, e que o arguido a agarrou pelo braço, empurrou-a para o quarto, os filhos batiam à porta a chorar, e ele manteve consigo coito não consentido, forçando-a, nomeadamente agarrando-lhe as pernas, e quando acabou o arguido saiu do quarto, e foi para a cozinha.

Não apresentou queixa, nem foi ao hospital, nem ao ginecologista.

No dia seguinte levou os filhos à creche, e mais tarde jantaram juntos, mas ela estava com medo dele.
Acrescentou, ainda, a assistente, no julgamento, que afinal foram quatro episódios de violação: 17/7/2020, 18/8/2020, 29/1/2020, 11/2020 – mas fê-lo de forma genérica e sem credibilidade, pretendendo fazer crer ao tribunal que no decurso das discussões do casal “sempre por causa de mulheres”, o arguido, exaltado, em vez de a agredir, levava-a para o quarto à força para a violar.    
Esta versão da acusação e assistente, acabou desmentida, categoricamente, pela testemunha OO, médico ginecologista – testemunha chamada pelo tribunal -, a qual de forma isenta – não tem proximidade a nenhuma das partes -, relatou que assistiu a assistente nas consultas pós-parto e que ela teve algumas infecções, mas não viu marcas de violência, equimoses, ou lacerações;  que as consultas eram de rotina; que as infecções e a violência são coisas diferentes, e o que a assistente teve foram infeções vaginais das frequentes, e que podem ter várias origens; que não tem memória de ter visto hematomas nas pernas; e que analisou os seus relatórios, e não fez menção a traumas.
Devidamente sujeita a acareação esta testemunha, a requerimento da assistente, não sobre os indícios de violação (que era o que interessava) mas sobre se conhecia a amiga daquela, esclareceu que efetivamente a conhece como técnica de radiologia, e não como médica, e, por isso, a confusão. E mais acrescentou que não se lembra de ter tido qualquer conversa a este propósito com aquela.   
Não olvidar, anda, que a assistente juntou aos autos um requerimento a fls. 198 e 199, onde diz que junta aos autos o mapa das consultas de ginecologia, no Hospital ..., em Guimarães, “que a denunciante tinha que recorrer sempre que era abusada sexualmente pelo denunciado, cfr. doc. nº 13 (…) ” – onde constam 15 consultas.  Ora, é constante o ziguezaguear (o que é habitual quando se pretende construir uma narrativa, que não é realidade dos factos) da assistente nos autos. Tanto diz que o mapa de fls. 219, se refere a todas as vezes que era abusada sexualmente, como em sede de declarações que prestou em audiência disse que afinal só lá foi (à consulta) uma vez por essa causa.
Desta feita, a tese acusatória, mostrou ser lacunosa de facto e assente em prova inconsistente, frágil, facilmente desmontável, pelo que não foi, de todo, demonstrada a tese da existência de relações sexuais não consentidas como consta no libelo acusatório.
É certo que as testemunhas II (amiga da assistente), KK (pai da assistente), JJ (mãe da assistente), além do mais, também, vieram relatar ao tribunal que viram marcas nas pernas da assistente, mas além de serem pessoas interessadas, porque familiares ou amiga dela, prestaram depoimentos lacunosos e incoerentes por si e entre si, tentando fazer passar a tese que a assistente tomava banho na sua presença ou saía deste desnudada e assim andava pela casa, o que não está de acordo com juízos de experiência comum e normal acontecer. Além do mais, foram desmentidas, como já se expôs, pela testemunha OO, médico, que disse não ter feito menção de traumas. Logicamente, um médico ginecologista, se visse a assistente com o órgão genital com “assadura” – como ela relatou que viu -, hematomas nas pernas, compatíveis com violação, teria agido, nomeadamente dito à assistente que sabia o que tinha ocorrido - atenta a sua experiência profissional -, ou pelo menos feito menção disso nos seus relatórios clínicos.
Ademais, as mensagens trocadas pelo arguido e assistente de fls. 814 verso e ss., objecto de perícia (atento que esta as qualificou como falsas), e que a Polícia Judiciária, após análise ao telemóvel do arguido, a fls. 861, concluiu como sendo verídicas, e onde se consta que a aludida assistente, pelo menos, em 20.05.2021, 10.06.2021, 5/9/2021, trocou mensagens de cariz sexual com o arguido, incompatíveis, com a tese acusatória de que não queria ter relação sexuais com o arguido, “que tinha nojo” dele, e que, por isso, foi sendo forçada nos  termos acusados. Mais verosímil a tese do arguido ao relatar que ambos tinham muita libido, até ao fim da relação.
É certo que a assistente, mesmo perante a conclusão da perícia, veio aos autos requerer prestar declarações complementares para tentar contrariar as conclusões da perícia, mas nada trouxe de objectivo e esclarecedor que cumprisse tal finalidade e convencesse o tribunal.  
Ademais, bastaria analisar (fls. 102 e ss., e 174 e ss.) o CD (com o conteúdo do telemóvel do arguido), que a GNR, juntou aos autos, em sede de inquérito, após a busca (e apreensão) requerida pela própria assistente ao arguido, para se concluir que existem outras mensagens do mesmo teor, trocadas pelo ex-casal. E o certo é que o arguido não tinha razão para as fabricar já naquela altura – é o que nos dizem os juízos de experiência comum e normal acontecer. 
Vide, por exemplo, o DVD, 1/2, pasta Whatsapp-...00(…), chat-12, mensagens datadas de 16/12/2019, 02/9/2021, 05/9/2021 e 21/9/2021 – antes e depois da separação.   
Dito isto, temos que conceder que a prova por declarações da assistente, e depoimentos dos seus familiares e amiga, são manifestamente parciais, contraditórias com a demais prova, e, por isso, sem credibilidade para desacompanhada de prova segura e coerente, poder convencer o tribunal que os factos acusados, efetivamente, aconteceram.
A corroborar a afirmação do tribunal, veja-se, ainda, o episódio, alegadamente, ocorrido em 17/8/2019.
Refere a acusação que o arguido pretendia ter relações sexuais com a assistente, mas que ela recusou, ele a insultou, e foi dormir para o sofá. E que no dia seguinte o casal não se falava no batizado, ao ponto dos convidados estranharem o comportamento.
O arguido negou.
Já a assistente relatou que ele queria ter relações sexuais, mas ela recusou porque estavam zangados por causa de uma festa de solteiro, e ele veio para a agarrar, ela fugiu dele, ele insultou-a, ela saiu do quarto e mandou mensagem a contar à mãe o sucedido, e esta ligou-lhe. Que o arguido disse que já não havia batizado, e ficavam por ali, e que pediu à mãe para não dormir a noite toda
Foram ao batizado, mas não se falavam, e as famílias estavam separadas, e ele agarrou-a pelo braço dizendo-lhe para mudar a cara.
A mãe da assistente, a testemunha JJ, que prestou um depoimento exaltado, e interessado (por vezes mais que a assistente), disse que recebeu mensagens da filha no tablet, e que a filha dizia que “tinha sido violada e que estava mau”, e pedia ajuda para ela ficar acordada porque podia precisar de ajuda, e que tinha medo, que ele a ia matar. E então o seu marido foi lá para a porta da casa deles e ficou lá até às quatro horas da manhã.   
Mas mais uma vez a tese da assistente, foi desmentida, não só pela testemunha II (sua amiga), que relatou que no dia do batizado acha que o casal estava bem um com o outro; como pela testemunha KK, (seu pai), que relatou que no batizado não houve qualquer episódio, eles não estavam zangados – “quem afirmou isso está a mentir”. 
Ora, a assistente alega discussão, agressão física e insultos por parte do arguido na noite anterior ao batizado, e neste, até ameaças, a sua mãe diz que ela lhe falou até em violação. Todavia, é de estranhar que a não tenha de imediato a ido ajudar, não tenha chamado a policia, etc., terá antes mandado o marido para a porta da residência do casal até às 4 horas da manhã, e este - que teria, nesta versão, passado a noite às claras - desmente-as categoricamente, relatando ao tribunal que nada se passou, que eles não estavam zangados e “quem afirmou isso está a mentir”. Com certeza se lembraria do sofrimento ao saber que a filha teria sido violada, ou pelo menos agredida, e bem assim por ter estado à porta dela até as 4 horas da manhã, na noite anterior ao batizado do seu neto.
A prova produzida arrolada na acusação padece de graves inconsistências e contradições, a qual, desafia, por vezes, até a lógica e o bom senso – grave por estarmos em sede de processo penal – e estar em causa a liberdade do arguido.
E a acusação pública é parcialmente genérica e conclusiva – senão, parcialmente, nula - não concretiza datas, episódios e contextos concretos, e a ofendida quando o faz é para inflar os factos. Estranhamente ou não refere que não se queixava sequer a familiares ou amigas desses episódios. Ac. TRP. nº 04/20.6PAVLG.P1, de 24-11-2021, in www.dgsi.pt “I - As imputações conclusivas, genéricas, abrangentes e difusas, sem qualquer especificação das condutas em que se concretizou o mau trato físico e/ou psíquico, com menção do tempo e lugar em que tal aconteceu, por não serem passíveis de um efetivo contraditório e, portanto, do direito de defesa constitucionalmente consagrado, devem ter-se como não escritas, não podendo servir de suporte à qualificação da conduta do agente. (…) IV - Ainda assim, a descrição fáctica sempre terá que ter alguma concretização, de forma a que seja possível localizar as imputações no tempo e no espaço com suficiente precisão, ainda que por referência apenas ao ano, a algum momento festivo, a algum acontecimento, com mais ou menos significado; a solução terá de ser encontrada caso a caso, o que passará por ponderar se a factualidade descrita tem a densidade suficiente para permitir uma defesa eficaz por parte do arguido, ao nível do exercício do seu direito ao contraditório.”
Também não se apurou que o arguido usasse de dominância sobre a ofendida, pelo contrário, o que foi demonstrado é que a assistente pretendia dominar o arguido nos seus movimentos, pretendendo saber onde estava, com quem estava, quem lhe enviava mensagens e seus teores, ela própria admitiu que as discussões eram sempre por causa de mulheres – o que demonstra os ciúmes exacerbados de que padecia.
Já no que concerne as imputadas agressões físicas aos menores, não foi feita prova segura e coerente que tivessem acontecido, sendo que as fotografias juntas aos autos, demonstram hematomas, mas não que ocorreram através de agressões físicas e menos ainda que o agente tenha sido o progenitor. E é assim, porque a assistente, admitiu que não as presenciou, e relatou o que lhe teria sido dito pela sua filha menor, a data com 4/5 anos de idade.
Há que referir que o facto acusatório sob o nº 55, alega que o arguido “bateu no rosto do filho” causando-lhe um hematoma.
E o facto acusatório sob o nº 56, alega que o arguido “bateu na face da filha” causando-lhe um hematoma. 
Mais uma vez a acusação padece por ser genérica, porque não tratou de clarificar se foi com a mão (bofetada ou soco), com o pé, ou outra parte do corpo ou com algum objecto. Mas mais grave, quanto ao segundo, alude a uma distância temporal entre janeiro e 28/9/2022 – nove meses (!) 
Ora, a assistente e a investigação não apuraram, ainda a que por aproximação, em que dia terá ocorrido tal, alegada, agressão, para o apor na denuncia e acusação?
Só por aqui, se conclui da inverosimilhança da tese acusada, porque qualquer mãe extremosa e protectora, como a assistente fez passar a ideia, no julgamento, que é, logo teria sabido datar o facto, o que não correu.  
E o mesmo se passou na audiência de julgamento, visto que o arguido referiu que o filho terá caído, negou a agressão a filha, e a assistente disse que não foi nesse período, mas antes no dia 28/11/2021.
E que no dia 9/1/2022, também, viu o filho marcado na cara e questionou o arguido sobre a referida agressão e que este negou-a.
A assistente refere sempre que questionava a filha sobre o ocorrido no tempo que passavam com o pai, e por isso ia sabendo. Falamos de uma criança de 4/5, facilmente sugestionável. 
Vide, ainda, o que refere o relatório pericial, datado de 19/8/2024, a fls. 682 e ss., “(…)
De notar que, no discurso de BB é já evidente a polarização mãe adorada versus pai odiado. (…) De salientar o elevado conhecimento que que BB tem acerca de questões referentes a esfera do ex-casal, tendo em conta a idade da criança e a ainda reduzida capacidade de integração dessa informação, pode resultar em percepções algo desenquadradas da realidade dos diferentes acontecimentos (…). Face a figura paterna, BB recorreu a um discurso de recusa e critica, muitas vezes por recurso a informações pouco compatíveis com o seu nível desenvolvimental e que, mais uma vez, indiciam a sua elevada exposição a questões referentes á esfera do ex-casal. (…) De notar, todavia, que quando solicitada a concretizar episódios em que o pai lhe teria batido, a criança evidenciou dificuldades em providenciar informações mais especificas acerca dos mesmos (…). (…) negando a ocorrência de episódios que envolvessem o recurso a violência física da parte do pai em relação a si, com exceção do alegadamente ocorrido quando a mãe estava grávida do irmão (…).”
Desta feita, não só a prova produzida decorre de depoimento indirecto, como do relatório acima aludido não resulta, que o discurso da menor, possua objectividade e segurança suficiente para que se possa imputar agressões acusadas do arguido aos filhos.
Pelo contrário, a senhora perita, concluiu a fls. 687, referindo que “(…) entendemos como fundamental o encaminhamento de BB para consultas de psicóloga com vista também a promover e potenciar a relação pai-filha”. (sublinhado nosso) Ora, não seria, com certeza uma perita do IML, a promover tal diligência, se acreditasse que a menor foi vítima de agressões ou violência doméstica por parte do pai. 
Ademais, a testemunha GG, atual namorada do arguido, relatou que o relacionamento deste com os filhos era muito saudável, que era ele quem trocava as fraldas ao mais pequeno, os alimentava, aos fins-de-semana, os quais brincavam com o pai. 
Assim, e por as razões apontadas não seriam os factos nºs 60 e 61, a ter a virtualidade de demonstrar as alegadas agressões. É certo que a testemunha RR, militar da GNR e ex-namorado da assistente, relatou que a ajudou a elaborar a denúncia – e que até é suspeito de ter praticado um crime de acesso ilegítimo, e corre processo crime contra si, por alegadamente, consultar os presentes autos na fase de inquérito -, e que os meninos lhe disseram que tinham receio de estarem com o pai, porque lhes batia “dava tau-tau”– mas que ele próprio não sabe se era mentira, até porque não voltaram a falar disso. 
Mas disse mais, que o arguido não mostrou desagrado do seu namoro com a assistente, ainda, que algumas pessoas lhe tenham dito o contrário. E que não se recorda de mensagens em que fosse visado pelo arguido.
Assim sendo, a versão da assistente quanto aos factos imputados sob o nº 66 e 67, não foram corroboradas por qualquer outra prova, pelo que não merecem resposta positiva.
Já no facto nº 72 acusado, já é imputada uma bofetada na face direita, perpetrada pelo arguido ao filho. Todavia, nas fotografias de fls. 206 e ss., o que se vê é vermelhidão na face esquerda e testa (sendo que não foi adiantada justificação para a lesão da testa) do menor, sendo certo que se desconhece a data em que foram tiradas.
Já a fls. 281 e 282, constam, efectivamente, fotografias, nas quais se vislumbra vermelhidão na face do menor, mas desacompanhadas de outros elementos probatórios concretizadores e coerentes que corroborem a imputação ao arguido a agressão acusada, porque apenas assente em depoimento indirecto, e parcial, da assistente.
Mais uma vez, a prova é lacunosa e incoerente, pelo que tal factualidade mereceu, também, reposta negativa.
A assistente desmentiu o facto nº 51 da acusação, e que consta também no PIC sob o nº 52º e ss., dizendo que não existiram consultas de terapia de casal, e que ela é que indicou uma clinica ao arguido para fazer consultas de psicologia. 
No que concerne aos factos nºs 58, 62, 68 e 69, não foi feita qualquer prova coerente, nomeadamente pericial, ou por depoimento do técnico, bastando-se a assistente com meras especulações, sendo, patentes, nomeadamente quando alegou que estava emparelhado um dispositivo no seu computador que tinha a capacidade de fazer o arguido aceder à sua informação pessoal e profissional, e visto verifica-se que se trata do mero emparelhamento de uns headphones da marca ...” - fls. 200 (como explicou o arguido – que usava, no computador dela, quando ainda o casal estava junto), já foi visto pela assistente como programa “espião” (!) – e razão para o acusar da prática de factos graves sem fundamento.
No que concerne ao facto nº 63, acusado, o arguido negou-o, e a assistente disse que ia a conduzir (a sua mãe seguia no lugar do passageiro), e com o telemóvel em alta voz, que estacionou, e a mãe e primo ouviram a ameaça. E a testemunha JJ, mãe da assistente, disse que a ouviu, sem saber concretizar o teor da alegada, conversa, mais dizendo que o seu marido e primo também a ouviram. A testemunha KK, começou por afirmar que ouviu a ameaça, junto à obra, quando estavam a descarregar, para logo após, referir que afinal, não percebeu a conversa, mas só a ameaça porque se afastou. O mesmo, o primo da assistente, NN, relatou que passou pelo automóvel da assistente, e ouviu a ameaça, porque ela tinha os vidros abertos, mas que se afastou porque não quis ouvir mais.
Ora, estes comportamentos não estão de acordo com o normal acontecer e juízos de experiência comum, porque um pai e primo que ouvem uma ameaça de morte, não se afastam para não ouvir mais, mas antes querem saber o que está a ser dito, até para perceberem o contexto da discussão, e para se poderem antecipar a qualquer acto. 
Assim, não mereceram credibilidade, por serem parciais e lacunosos os seus depoimentos.      
O episódio, acusado, em que o arguido terá “perdido” a filha no ..., foi desmentido por este, e pela testemunha GG, a qual disse que os meninos não se afastaram deles até porque tinham medo das mascotes que lá estavam, sendo certo que a assistente se terá baseado em depoimento de ouvir dizer à filha, sem concretização e verosimilhança. 
No mesmo sentido, o episódio acusado, sobre a mudança de escritório, por parte da assistente, a qual tentou fazer vingar a tese que se mudou por medo do arguido, e até lhe imputa as despesas das obras na sua residência, local do novo escritório. Todavia, mais uma vez as suas declarações e depoimentos dos seus familiares foram desmentidos pela demais prova. É que o que se apurou, da prova produzida, é que na sequência da separação a assistente, adquiriu uma moradia, e que lá começou obras de restauro já com o fito de ser também o seu escritório, poupando nas rendas, e, assim, que não por receio da conduta do arguido que se mudou, até porque ela própria admitiu que arrendou logo outro espaço (uma sala) noutro escritório, mais perto do tribunal, onde se pode reunir com clientes – como a assistente acabou por esclarecer nas suas declarações.     
O tribunal visualizou, ainda, o CD de fls. 596, no qual a assistente, também, imputa ao arguido manter relações extraconjugais – que fez referência em audiência mas não provou -, e que serão a causa, pelo menos, das suas infecçoes vaginais, e que o médico lhe dizia “isto não é vida para ti”, além de não confirmado, em julgamento, por este, mostra bem o fito da assistente em “castigar”, a todo custo, o arguido, não só no tribunal, mas até nas redes sociais, não obstante saber da fragilidade ou até da ausência total de prova do que imputa, ainda, por cima com conhecimento qualificado por ser advogada. 
As testemunhas de defesa GG, BBB, VV, WW, XX, YY, prestaram depoimentos mais coerentes e serenos, em contraposição com os das testemunhas de acusação, relataram, namorada e os familiares, que o arguido tinha excelentes relações com os filhos, que a relação do casal era boa, mas que após o nascimento do filho, a assistente passou a ser pessoa muito ciumenta e desconfiada, até quando o arguido falava com mulheres quando iam a restaurantes, que o batizado correu normalmente, e que após o divórcio a assistente impediu-os de ver os netos e sobrinhos.
Já as testemunhas MM e ZZ, amigos do arguido, relataram que nunca tiveram conhecimento que este tivesse tido um relacionamento extraconjugal, que os vídeos eróticos que existiam no ...”, não eram de membros de tal grupo, mas de outras pessoas, e que o arguido não abusava de bebidas alcoólicas.
É certo que havia, como se disse, um clima de conflituosidade entre os membros do casal – motivados por ciúmes (com razão ou sem razão) da assistente, os quais geravam discussões, e levaram a separação do casal - bem patente nas declarações deles, prestadas em audiência de julgamento. Todavia, os factos acusados, além do supra já apreciados, no sentido de existirem, também, injurias, ameaças, ofensas à integridade física nos termos acusados, do que fica exposto e feita a devida valoração e ponderação da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, afigura-se que perante a ausência de qualquer outra prova mais segura, credível, imparcial, coerente e concretizada, não podem ser atribuídos ao arguido, sendo consabido que o tribunal só poderá criar a convicção da verdade dos factos quando a mesma esteja para além de toda a dúvida razoável, não se tratando de uma mera opção voluntarista pela certeza de um facto ou operada em virtude da alta verosimilhança ou probabilidade do facto, mas sim de um processo que só se completará quando o tribunal por uma via racionalizável tenha logrado afastar qualquer dúvida para a qual pudessem ser dadas razões por pouco verosímil ou provável que ela se apresentasse, sendo consabido que a falta de prova, sobre a verificação dos elementos típicos do ilícito, não possa desfavorecer o arguido (vide a propósito, Figueiredo Dias, Sebenta de processo Penal, Princípios do P.P. págs. 146).
Na elaboração da sua convicção, o tribunal não pode prescindir de uma grande exigência de rigor na apreciação da prova.
Neste jaez, não se podem dar como provados os factos que mereceram resposta negativa (acusação e PIC), por a prova resultante da imediação, conjugada com a demais, ser contraditória, parcial, frágil e lacunosa, e, bem assim, afectada pelo facto de não ser corroborada por qualquer outra mais sólida e segura.
As condições económicas, pessoais e sociais do arguido, resultaram das suas declarações e relatório social.
A (in)existência de antecedentes criminais, resulta do certificado de registo criminal junto aos autos.”

III.2 – Quanto à análise das sobreditas questões concretas suscitadas nos recursos em apreço, por ordem de precedência lógica:

III.2.1 - Impugnações amplas da decisão sobre a matéria de facto:

Preceitua o art. 412º do CPP, na parte que ora releva:
“1 – A motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.
[…]
3 – Quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve especificar:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c) As provas que devem ser renovadas.
4 – Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no nº3 do artigo 364º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação.
[…]
6 – No caso previsto no nº4, o tribunal procede à audição ou visualização das passagens indicadas e de outras que considere relevantes para a descoberta da verdade e a boa decisão da causa.”  

Como tem entendido sem disparidade o Supremo Tribunal de Justiça, o recurso em matéria de facto («quando o recorrente impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto») não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso do complexo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, mas apenas uma reapreciação sobre a razoabilidade da convicção formada pelo tribunal a quo relativamente à decisão sobre os «pontos de facto» que o recorrente considere incorretamente julgados, na base da avaliação das provas que, na indicação do recorrente, imponham «decisão diversa» da recorrida (provas, em suporte técnico ou transcritas quando as provas tiverem sido gravadas) - art. 412.º, n.º 3, al. b), do CPP -, ou da renovação das provas nos pontos em que entenda que esta deve ocorrer.[2]
Por outro lado, nessa tarefa de reapreciação da prova pelo tribunal de recurso intrometem-se necessariamente fatores como a ausência de imediação e, em menor escala, da oralidade – sendo que, como é sobejamente sabido, a imediação e a oralidade constituem princípios estruturantes do direito processual penal português. 

Em conformidade, a ausência de imediação e, de modo mitigado, da oralidade - dado que o “contacto” com as provas se circunscreve ao que consta das gravações - determina que o tribunal de segunda instância, no recurso da matéria de facto, só possa alterar o decidido pela primeira instância se as provas indicadas pelo recorrente impuserem decisão diversa da proferida e não apenas se a permitirem [al. b) do n.º3 do citado artigo 412.º][3].

Com efeito, quando está em causa a questão da apreciação da prova cumpre dar a devida relevância à perceção que a oralidade e a imediação conferem aos julgadores do Tribunal a quo. Deste modo, quando a atribuição de credibilidade a uma fonte de prova se baseia na opção assente na imediação e na oralidade, o Tribunal de recurso só pode censurá-la se demonstrado ficar que tal opção é de todo em todo inadmissível face às regras de experiência comum.

Como loquazmente se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18/07/2013, processo 1/05.2JFLSB.L1-3, acessível em www.dgsi.pt:
«São os Juízes de 1.ª instância quem de forma direta e «imediata» podem observar as intransferíveis sensações que derivam das declarações e que se obtêm a partir do que os arguidos e das testemunhas disseram, do que calaram, dos seus gestos, da palidez ou do suor do seu rosto, das suas hesitações. É uma verdade empírica que frente a um mesmo facto diversos testemunhos presenciais, de boa-fé, incorrem em observações distintas.
A congruência dos testemunhos entre si, o grau de coerência com outras provas que existam e com outros factos objetivamente comprováveis, quer dizer, a apreciação conjunta das provas, são elementos fundamentais para dar maior credibilidade a um testemunho que a outro.
Para tal, a convicção do Tribunal tem de ser formada na ponderação de toda a prova produzida, não podendo censurar-se aquele por nesse juízo ter optado por uma versão em detrimento de outra. Não existindo prova legal ou tarifada que se impusesse ao Tribunal, o Tribunal julga a prova segundo as regras de experiência comum e a livre convicção que sobre ela forma (art. 127.º do Código de Processo Penal).»
Ou seja, é comumente aceite que a (re)apreciação da matéria de facto pelo tribunal de recurso não implica a realização de um “segundo julgamento”, agora baseado na prova gravada, em que o tribunal ad quem aprecia toda a prova produzida e documentada em primeira instância, como se o julgamento ali realizado não existisse. Como se refere, de modo impressivo, no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 19/05/2015, processo 441/10.5TABJA.E2, acessível em www.dgsi.pt, «O poder de cognição do Tribunal da Relação, em matéria de facto, não assume uma amplitude tal que implique um novo julgamento e faça tábua rasa da livre apreciação da prova, da oralidade e da imediação, apenas constitui remédio para os vícios do julgamento em 1ª instância. Os recursos, mesmo em matéria de facto, são remédios jurídicos destinados a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros.»
Relevantes ainda as seguintes palavras de Paulo Saragoça da Matta[4]:
«Ao Tribunal de recurso não cabe repetir a produção de prova havida, nem a prova anteriormente produzida na instância recorrida perde seja o que for de vivacidade. Pelo contrário, o Tribunal de recurso limitar-se-á a aferir se os juízos de racionalidade, de lógica e de experiência confirmam ou não o raciocínio e a avaliação feita em primeira instância sobre o material probatório constante dos autos e os factos cuja veracidade cumpria demonstrar. Se o juízo recorrido for compatível com os critérios de apreciação devidos, então significará que não merece censura o julgamento da matéria de facto fixada. Se o não for, então a decisão recorrida merece alteração. Com o que em nada se viola a imediação da prova, que fica acessível, imediatamente, ao juiz de recurso tal e qual como foi produzida em primeira instância.»  
Concluindo.
O artigo 412º, nº3, al. b) do CPP, ao exigir que o recorrente que impugne a decisão proferida sobre matéria de facto especifique as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, implica que o tribunal de recurso só pode (e deve) alterar aquela decisão se da análise que faz das provas documentadas indicadas pelo recorrente, em concatenação com as regras da experiência comum e da lógica, concluir que o juízo probatório levado a cabo pelo tribunal a quo é, à luz daqueles elementos, insustentável, indefensável (porque decidiu claramente sem prova ou em indiscutível contradição com as preditas regras), revelando-se por isso imperioso decidir de forma distinta.
Diferentemente, «se o tribunal de recurso se convencer que os concretos elementos de prova indicados pelo recorrente permitem ou consentem uma decisão diferente, mas que não a “tornam necessária” ou racionalmente “obrigatória”, então deve manter a decisão da primeira instância tal como está» - cf. acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23/03/2015, processo 159/11.5PAPTL.G1, acessível em www.dgsi.pt.

No domínio da operação jurisdicional de julgamento da matéria de facto, vigora o princípio da livre apreciação da prova. Constituindo um princípio estruturante do direito processual penal português, encontra-se vertido no art. 127º do Código Processo Penal, que preceitua: “Salvo quando a lei dispuser diferentemente a prova é apreciada segundo as regras da experiência e livre convicção da entidade competente.”
Tal princípio está intimamente conexionado com o princípio da descoberta da verdade material e contrapõe-se ao sistema probatório fundado nas provas tabelares ou tarifárias que estabelece um valor racionalizado a cada prova, porquanto por via da livre apreciação da prova concede-se ao julgador um âmbito de discricionariedade, ainda que limitada, na valoração de cada uma das provas atendíveis que estribam a decisão de facto.
Tal discricionariedade não é absoluta, antes balizada pelas regras da ciência, da lógica e da argumentação que devem nortear o decisor na apreciação da prova produzida. Por conseguinte, o juiz, na fundamentação da decisão de facto, deve justificar, fundamentando convenientemente, as suas próprias escolhas, ou seja, porque valorou cada prova de determinado modo (por exemplo, porque concedeu credibilidade ao depoimento de uma testemunha e negou credibilidade ao depoimento de outra testemunha). Compreende-se que assim seja, sob pena de a convicção do tribunal se tornar não sindicável, caindo no mero livre arbítrio, o que não se coaduna com um sistema de justiça próprio de um estado de direito democrático.    
É por isso que José Mouraz Lopes, in “Comentário Judiciário do Código de Processo Penal”, Tomo II, p. 78, entende que a «livre apreciação da prova» é, de alguma forma, um sofisma, na medida em que se deve falar é de uma livre apreciação racional e fundamentada da prova.
Nas palavras de José Tomé de Carvalho, in “Breves palavras sobre a fundamentação da matéria de facto no âmbito da decisão final penal no ordenamento jurídico português”, Revista Julgar, nº21, 2013, p. 84, «o livre convencimento não equivale assim a valoração livre, estando o processo deliberativo condicionado pelas regras de lógica, experiência, técnica e ciência, apesar de na reconstrução de determinado facto o juiz ser livre de crer (ou não) numa determinada fonte probatória, agora que o tempo das provas legais e tabelares se finou».
Assim também tem sido entendido, reiteradamente, pelo Tribunal Constitucional, num juízo de conformidade do disposto no art. 127º do CPP com a Constituição.
Como se decidiu no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 1165/96, de 19.11.1996, in DR, Série II, de 06.02.1197 (reiterado pelo acórdão do mesmo Tribunal nº 464/97, de 01.07.1997, in DR, Série II, de 12.01.1998): «A livre apreciação da prova não pode ser entendida como uma operação puramente subjetiva, emocional e, portanto, imotivável. Há-de traduzir-se em valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas de experiência e dos conhecimentos científicos, que permita ao julgador objetivar a apreciação dos factos, requisitos necessários para uma efetiva motivação da decisão»
Ainda o acórdão do Tribunal Constitucional nº 401/02, no âmbito do processo nº 528/02, onde se lê «(…) de acordo com o entendimento que tem vindo a ser professado por este tribunal, a valoração da prova segundo a livre convicção do julgador não significa uma apreciação contra a prova ou uma valoração que se desprendeu da legalidade dos meios de prova ou das regras gerais de produção da prova, ou seja, não é admissível uma valoração arbitrária da prova, sendo a convicção do julgador «objetivável e motivável», conjugando-se com dever de fundamentar os actos decisórios e de promover a sua aceitabilidade».
Como pertinentemente se observa no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09.02.2005, proferido no Processo nº 04P4721, relator Henriques Gaspar, acessível em www.dgsi.pt, «A livre apreciação não significa, no entanto, apreciação segundo as impressões, nem inexistência de pressupostos valorativos, ou de desconsideração do valor de critérios, ainda objetivos ou objetiváveis, determinados pela experiência comum das coisas e da vida e pelas inferências lógicas do homem comum suposto pela ordem jurídica. A livre convicção não significa liberdade não motivada de valoração, mas constitui antes um modo não estritamente vinculado de valoração da prova e de descoberta da verdade processualmente relevante, isto é, uma conclusão subordinada à lógica e à razão e não limitada por prescrições formais exteriores.»

III.2.1.1 Quanto ao recurso da assistente CC:

Nesta vertente recursória, alega a assistente/recorrente CCC ter existido erro de julgamento quanto aos factos não provados nos itens a) a n), o), ii) a mm), oo) a rr), zz), u) a hh), nn), ss), tt), vv) a xx), bbb), iii), jjj), aaaa) a gggg), kkkk), qqqq), kkk) a nnn), ppppp), qqqqq), vvvv) a yyyy) e ddddd) a jjjjj), que deviam ter sido dados como provados.

Alega, em síntese, que no julgamento do tipo de crime de violência doméstica o depoimento da vítima assume uma centralidade particular, sendo suficiente para a condenação do arguido.

No caso, diz, as declarações da vítima foram extremamente minuciosas, relatando os factos devidamente circunstanciados no tempo e no espaço, relatando e repetindo pormenores que revelam a sua veracidade, nem foi produzida qualquer prova direta que abale, por contrária, a demonstração dos factos tal como eles sucederam e foram relatados pela assistente.

Ademais, considera que as suas declarações foram corroboradas por outras provas, de cariz testemunhal, atentos os depoimentos prestados pelas testemunhas JJ (sua mãe), KK, (seu pai), LL (sua amiga), MM (seu primo), II, PP e RR (seu ex-namorado), bem como de caráter documental, considerando, nomeadamente, os registos clínicos juntos aos autos, tudo conforme às regras de experiência comum, ao normal suceder.          

Conhecendo.
Em conformidade com o disposto no art. 412º, nº6 do CPP, procedemos à audição integral das declarações dos sujeitos processuais e dos depoimentos prestados em audiência de julgamento [gravações disponíveis no sistema informático citius – media studio].

A recorrente indicou no douto recurso os concretos pontos da matéria de facto sobre os quais julga ter existido erro de julgamento, assim como mencionou as concretas provas que, no seu entender, impunham decisão diversa da recorrida, procedendo para o efeito, em geral, à indicação das concretas passagens – que transcreveu – dos depoimentos de testemunhas inquiridas em audiência de julgamento, assim como invocou o teor de documentos juntos aos autos e trechos da própria motivação da decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida.

No entanto, em parte, o predito ónus de especificação das concretas provas que determinam diferente decisão não foi convenientemente cumprido. Referimo-nos às invocadas declarações pretensamente prestadas pela assistente CC em audiência de julgamento cuja alegação não surge consubstanciada em transcrições de concretas passagens, em discurso direto, mas em meras alocuções recursórias interpretativas e conclusivas.  

Vejamos quanto ao demais.

- Quanto aos factos não provados a) a n), o), ii) a mm), oo) a rr) e zz), referentes a humilhações, insultos constantes à ofendida e ameaças dirigidas pelo arguido:
Os convocados trechos das declarações da assistente CC e dos depoimentos das testemunhas JJ (mãe da assistente), KK (pai), LL (amiga), MM e NN, não se revelam, sem mais, suficientes para alterar a decisão do Tribunal de primeira instância.   
Com efeito, a recorrente pretende impor a sua perceção, necessariamente interessada e parcial, da prova produzida quanto aos alegados insultos, humilhações, ameaças e agressões sexuais, olvidando que o Tribunal a quo, no exercício da sua livre apreciação, de modo suficientemente fundamentado, desacreditou as provas em questão por julgar não credíveis e isentos tais declarações e depoimentos da assistente/demandante civil e dos seus referidos familiares e amigos, antes tendentes a sustentar, a todo o custo, a narrativa acusatória.
A circunstância de os mencionados declarantes terem corroborado factos descritos no libelo acusatório, e, desse modo, a versão aduzida pela assistente, não significa, por si só, que tal factualidade deva ser dada como provada.
Para tal, como vimos, era necessário que tais provas fossem credíveis e coerentes entre si e face a outros meios de prova, o que, no entendimento do Tribunal a quo, não sucede. 
Esse juízo valorativo da prova emitido pelo Mmo. Juiz afigura-se-nos incensurável.
Relativamente aos pretensos impropérios com que o arguido brindava frequentemente a ofendida, descortinam-se nos depoimentos prestados pelos pais dela discrepâncias significativas, invocando a testemunha JJ expressões que não foram nunca mencionadas pelo marido, KK, e pela testemunha LL, nem sequer constam da acusação, assente nas declarações da queixosa (por exemplo, gorda, desmazelada), sendo que também não coincidem os dizeres destinados a rebaixar a assistente (“quem é que te quer, fui eu que te fiz, tu não és ninguém”, diz a progenitora, “tu és o que és porque eu tenho um estatuto”, diz o pai).    
Por outro lado, é manifestamente insuficiente o depoimento da testemunha MM para provar que o arguido chegava reiteradamente tarde a casa e, muito menos, que fosse por motivo censurável, suscetível de consubstanciar uma desconsideração sistémica pela pessoa da sua então esposa – a testemunha limitou-se a transmitir ter visto o arguido, mais do que uma vez, sempre ao fim de semana, a estacionar o carro à porta de casa, por volta das 02:40, sem que, porém, soubesse o que ele tinha estado a fazer até então.
Também a propósito de episódios concretizados na acusação são percetíveis incongruências relevantes.    
Relativamente à suposta ameaça dirigida pelo arguido à assistente, telefonicamente, em março de 2022, em que aquele teria mencionado: “Estás sujeita a um dia destes aparecer morta numa valeta”.
Assim, temos a testemunha JJ a adiantar ter ouvido uma frase de teor bastante díspar e com uma construção semântica que indicia fortemente ter sido por ela inventada: “ou largas esse gajo ou pego umas caçadeiras que tenho do meu pai e prego-te um tiro nessa cabeça ou arranjo o grupo dos motoqueiros e damos-te semelhante coça que apareces morta numa valeta”. Acresce que a mesma depoente, primeiramente referiu, espontaneamente, que dentro do carro só estava ela e a filha e que no exterior estaria o seu sobrinho NN, que também ouviu a conversa, por estar em voz alta no sistema Bluetooth do veículo, sem qualquer menção à presença do seu marido e pai da assistente. Ulteriormente, a instâncias do Exmo. Mandatário da Assistente, de forma sugestionada, já mencionou que o seu marido também se encontrava no exterior do veículo, embora sem referir se ele podia ou não ter ouvido a conversação telefónica que estava a decorrer entre o arguido e filha daqueles.
Para além da conveniente (para a posição da acusação), mas improvável presença das testemunhas KK e NN naquele circunstancialismo de tempo, modo e lugar, de forma a lograrem ouvir a conversa intimidatória em apreço, é de aceitar a objeção veiculada pelo Exmo. Julgador no sentido do inusitado afastamento do local por parte destes dois familiares, por, alegadamente, não quererem ouvir mais nada da conversa. Ora, como bem nota o Tribunal recorrido, estes comportamentos são inusuais, desconformes com o normal acontecer e juízos de experiência comum, «porque um pai e primo que ouvem uma ameaça de morte, não se afastam para não ouvir mais, mas antes querem saber o que está a ser dito, até para perceberem o contexto da discussão, e para se poderem antecipar a qualquer acto.». Logo, salvo o devido respeito, não colhe o entendimento da recorrente de que o expectável numa situação como essa é que o ouvinte casual se afaste, dando privacidade aos interlocutores (até por se tratar de uma mera conversa telefónica).

- Quanto aos pontos u) a hh) e nn) dos factos não provados, concernentes às agressões sexuais sobre a assistente imputadas ao arguido:
Neste segmento, a recorrente transcreve apenas declarações que prestou na sessão de 15/10/2024 em que aduz o motivo para não se ter queixado das violações e tentativa de violação perpetradas pelo arguido, e não, como devia, da descrição que efetuou desses acontecimentos. 
 Ainda assim, cumpre observar que a motivação que explana no douto recurso não coincide com o que transparece da transcrição efetuada. Na peça processual sob análise a recorrente conclui que não se queixou a ninguém porque pretendia salvar o casamento, queria proteger os filhos; todavia, o que resulta das declarações transcritas, segundo afirma, com assumido recurso a considerações teóricas sobre as condutas de agressor e vítima no contexto da violência doméstica, é que “estava completamente dominada” e “o agressor sabe que a vítima não vai contar a ninguém”; mais disse que “tinha medo constante daquilo voltar a acontecer, principalmente pelos miúdos, porque reparou que a filha BB estava a ficar com marcas irreparáveis, porque depois só falava daquilo e as pessoas não percebiam”. Desse modo, sempre com respeito por opinião contrária, julgamos que estas razões, centradas no medo de reincidência por parte do então marido e preocupação com as repercussões do sucedido na formação da personalidade da filha, ainda de tenra idade, aconselhariam antes a pronta denúncia dos graves factos, a fim de salvaguardar novas ocorrências e, mormente, o saudável crescimento dos seus descendentes, nomeadamente, da filha BB.            
Ademais, a prova documental junta a fls. 218 a 220, comprovativa de realização de consultas de ginecologia no dia 18.07.2019 e 30.01.2020, ou seja, em dias subsequentes a dois dos quatro invocados episódios de violação, conjugada com o depoimento prestado em audiência de julgamento pelo médico ginecologista daquela, OO, não corrobora a versão da ofendida, dado que dali não ressuma a existência de quaisquer marcas ou vestígios de violação ou relação violenta no corpo da ofendida, não obstante ela referir essa circunstância.
O Exmo. Médico foi ouvido como testemunha em audiência de julgamento e, contrariamente ao que pretende fazer crer a recorrente, não ressumou do seu depoimento dúvida ou falta de lembrança quanto ao objeto essencial da inquirição.
Assim, afirmou perentoriamente que a assistente, sua paciente, nunca lhe comunicou em qualquer das consultas que não fosse de rotina e que tivesse sido violada pelo marido e que nas observações que fez não chegou à conclusão de que podia ter acontecido isso [minutos 05:00 a 05:07]; que a medicou para infeções e nunca viu nenhuma marca de violência na zona que ele trata [minutos 06:03 a 06:34]; que o que fez constar das suas anotações eram as medicações que fez, era aquelas de rotina de consulta de registo clínico, nunca teve registo de queixa de uma relação mais violenta por parte do marido [minutos 06:59 a 07:17]; e que se tivesse visto marca de violação, violência física sexual, conseguia distinguir das infeções, explicando que um traumatismo provocado por uma relação não consentida muitas vezes deixa outro tipo de marcas e sinais que não são infeções, como equimoses e lacerações; se tivessem acontecido tais “agressões” no dia anterior à consulta, esse tipo de marcas ainda seriam visíveis, e ele não as viu [07:20 a 08:07].
Se alguma dúvida depois foi adiantada pela testemunha a instâncias do ilustre mandatário do assistente, cremos, salvo o devido respeito, que tal incerteza só pode ter sido fomentada, artificialmente criada pela repetição ad nauseam das mesmas questões, com diferentes formulações.
Portanto, como corretamente observou o Tribunal recorrido, estas provas infirmam a versão dos factos veiculada pela assistente.
Onde a recorrente vê, por força da ocorrência das consultas de ginecologia nos dias seguintes às datas de dois dos episódios de agressão sexual de que se diz vítima, provas indiciárias precisas e não meras coincidências, é possível também colocar a hipótese de ela ter construído a sua narrativa ao contrário, ou seja partindo das datas das consultas para indicar os dias em que alegadamente sucederam as mencionadas agressões.
Aliás, apesar de reportados três episódios de violação, aparentemente, de modo contraditório, a assistente não sentiu necessidade de recorrer à consulta no dia seguinte ao de uma das ocorrências. 
A mencionada descredibilização da versão acusatória não é afastada, neste conspecto, pelos depoimentos nada plausíveis prestados pelos pais da assistente, JJ e KK, pela sua tia PP e pela sua amiga II, no sentido de terem vistos marcas no corpo da ofendida compatíveis com violência exercida para forçar relações sexuais.             
Desde logo, atenta as idades da assistente e da mãe, não é minimamente normal que aquela tomasse banho, nua, à frente desta, e, menos ainda, que saísse do banho desnudada perante a tia PP ou a amiga II.
O pai da assistente também não explicou satisfatoriamente como logrou visualizar supostas nódoas negras nas pernas da filha, quando, a existirem no decurso de uma violação, tentada ou consumada, teriam de se situar na parte de cima das pernas, na zona das coxas. Também é incomum que a assistente só chorasse (sem nada explicar) perante o pai quando este lhe perguntava como tinha ficado com as nódoas negras, mas já não quando tal questão lhe era colocada pelas demais testemunhas.
A mãe da Assistente, na sua saga persecutória contra o arguido, procurando favorecer a tese da filha, uma vez mais, quis acentuar a negritude do quadro e, de modo inovador e singular, porque desacompanhado de outras declarações nesse sentido, referiu que os hematomas que viu nos braços e coxas da filha correspondiam às marcas das pontas de todos os dedos das mãos de quem a agarrou.
Afirmou ainda ter observado marcas de agressões no corpo da filha “sete, oito vezes ou mais”, isto é, incluindo por certo em ocasiões a que não corresponderam as quatro agressões de cariz sexual que a assistente imputou ao arguido.
As concretas passagens a este propósito transcritas do depoimento da testemunha II, amiga da assistente, demostram ainda flagrante discrepância face às declarações da assistente, pois que aquela, além de se equivocar quanto à data do batizado do filho desta, indicando o dia 07/08/2019 quando aquela celebração ocorreu no dia 17/08/2019, mencionou ter visto marcas nas partes superiores do antebraço e na parte superior dos membros inferiores (coxas) do corpo da ofendida, não umas horas antes da realização do batizado, mas sim uns dias antes da sua realização.       
A testemunha LL, amiga da assistente, disse ter visto nódoas negras na zona do peito, parte do corpo que não foi mencionada por outros declarantes.
Relativamente ao ambiente sentido no batizado do filho QQ, comprovativo do mau estar vivenciado pela assistente, em função da tentativa de violação e insultos de que esta alegadamente foi alvo na noite anterior, a recorrente invoca o depoimento da tia PP, em que afirma que não havia grande comunicação entre o casal e que, em determinada altura, viu o arguido a puxar o braço da mulher de maneira muito rude. Esquece, porém, os depoimentos em sentido contrário prestados em audiência de julgamento pelo seu pai, KK, e pela sua amiga II, os quais, como saliente o Tribunal na motivação, asseveraram que a assistente e o arguido estavam bem entre si, não aparentavam estar zangados, e que não sucedeu nenhum episódio negativo entre eles. 
           
- Quanto aos factos não provados ss), tt), vv) a xx), zz), bbb), iii), jjj), aaaa) a gggg), kkkk) e qqqq), reportada aos maus-tratos aos filhos do casal: 

Neste segmento, a assistente/recorrente veicula no recurso a discordância quanto à fundamentação da decisão sobre a matéria de facto em questão, invocando dualidade de critérios na apreciação da prova, pois, contrariamente, ao que sucedeu com as suas declarações, dos seus familiares e amigas, o Tribunal a quo não vislumbrou no depoimento da companheira do arguido qualquer parcialidade.
Pretendendo colocar em causa a credibilidade do depoimento da testemunha GG, a recorrente classifica-o de pouco espontâneo, procurando acompanhar a tese do arguido e que relatou factos incoerentes com a demais prova, designadamente a relativa à relação entre pais e filhos, como demonstrado pelo ponto 16 dos factos provados.
No ponto 16 dos factos provados, consta “No dia 23 de janeiro de 2022, à tarde, o arguido levou ambos os filhos até ao aeroporto Francisco Sá Carneiro, no Porto, e deixou os menores no interior do carro, enquanto ficou no exterior do carro a perscrutar o telemóvel.”
Ora, não se descortina na predita factualidade, sem mais, substância ou gravidade para preencher a prática de maus-tratos – desconhece-se o lapso temporal que decorreu com os menores no interior do veículo e até se tal não sucedeu como forma de protegê-los do frio que porventura se verificava no exterior.    
Para comprovar a alegada falta de credibilidade e isenção da depoente GG, a recorrente convoca ainda o depoimento da testemunha RR, ex-namorado da ofendida.
Contudo, salvo melhor opinião, o depoimento prestado por essa testemunha não é idóneo e suficiente para comprovar a ocorrência de agressões do arguido sobre os filhos, uma vez que se reconduz a transmitir o que lhe foi dito por duas crianças de tenra idade (“o papá dá tau-tau” ou algo do género), facilmente sugestionáveis e manipuláveis, numa altura em que os pais já se encontravam separados, e não foi produzida prova segura e inequívoca que comprove tal realidade.                
           
- Quanto aos factos não provados nos pontos kkkk) a nnn), ppppp) e qqqqq), relativos aos elementos subjetivos do tipo, vontade e intenção do arguido, e nos pontos vvvv) a yyyy) e ddddd) a jjjjj), decorrentes do pedido de indemnização civil, a inconsequência da impugnação resulta da precedente improcedência relativamente aos demais pontos da matéria de facto, atenta a intrínseca conexão verificada entre eles.     

Concluindo.
O juízo valorativo da prova realizado pelo Tribunal a quo traduz uma realidade plausível, não inequivocamente infirmada pela globalidade da prova produzida nos autos (incluindo de jaez documental e pericial) nem pelas regras da experiência, do normal suceder; pelo contrário, o juízo produzido é o que se apresenta mais consentâneo com os preditos fatores contributivos para a boa apreciação da prova.
A modificação pelo Tribunal ad quem da decisão sobre a matéria de facto provinda da primeira instância só pode ocorrer se a apreciação feita for ilógica, arbitrária, de todo insustentável face às regras da experiência comum ou dos conhecimentos técnico-científicos, o que, reitera-se, não se verifica neste caso.  
Por conseguinte, improcede a impugnação ampla da decisão sobre a matéria de facto deduzida pela assistente CC.

III.2.1.2 Quanto ao recurso do arguido AA:

Alega o arguido/recorrente AA que os pontos 12 a 15 da matéria de facto foram incorretamente julgados pelo Tribunal a quo, pois que, no seu entendimento, tal factualidade devia ter sido dada como não provada.
Invoca o arguido, em síntese, que não foi produzida prova segura e inequívoca quanto àquela factualidade. Pelo contrário, entende que as suas declarações, conjugadas com os documentos juntos aos autos atinentes à providência cautelar de arrolamento, afastam o motivo alegado para a prática dos factos, acrescendo que os depoimentos prestados pelas testemunhas DD e EE, no sentido de confirmar a versão da assistente, revelam-se não credíveis e falsos.     

Apreciando.
Em conformidade com o disposto no art. 412º, nº6 do CPP, procedemos à audição das declarações prestadas em audiência de julgamento, neste conspecto, pelo arguido AA, pela assistente CC e pelas testemunhas DD e EE [gravações disponíveis no sistema informático citius – media studio].
O recorrente indicou os concretos pontos da matéria de facto sobre os quais julga ter existido erro de julgamento, assim como mencionou as concretas provas que, no seu entender, impunham decisão diversa da recorrida, procedendo para o efeito à indicação das concretas passagens – que transcreveu – das declarações dos sujeitos processuais e dos depoimentos das duas mencionadas testemunhas.

Diremos desde já que é de negar provimento ao douto recurso do arguido pois que não ressuma das provas produzidas nos autos, particularmente das especificadas no recurso, valoradas à luz das regras de experiência comum e da lógica, prova contrária ou dúvida insanável de que os acontecimentos em causa, reportados ao dia 08.03.2021, sucederam do modo como o Tribunal recorrido decidiu.

Primeiramente, urge notar que o Tribunal a quo, no contexto da sua exercida livre convicção, explanou convenientemente na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto os motivos para ter considerado credíveis, nesta parte, as declarações da assistente, porque corroboradas pelos consentâneos depoimentos das testemunhas DD e EE, conjugados com as declarações do arguido na parte em que admitiu ter se deslocado ao escritório da assistente para que ela desistisse do arrolamento que tinha “feito”, porque dele constava uma mota que ele já tinha vendido e não queria problemas com o novo proprietário, tendo-se gerado uma discussão entre ambos porque ela se recusava a fazê-lo.
 
Não colhem as objeções arremessadas pelo arguido/recorrente quanto à falta de credibilidade e veracidade dos depoimentos das testemunhas EE e DD 
Invoca o recorrente que, conforme decorre dos documentos juntos aos autos referentes a esse procedimento, só tomou conhecimento da pendência da providência cautelar de arrolamento interposta pela assistente no dia 10/03/2021 – data em que foi notificado –, ou seja, dois dias depois dos alegados factos. Ademais, refere, que o divórcio inicialmente litigioso veio a ser convolado, por acordo das partes, em mútuo consentimento, no dia 08/03/2021, pelo que nada havia a partilhar nesse dia.
Conclui, então, que os factos não podiam ter ocorrido no dia 08/03/2021 e com o motivo para a atuação do arguido que a acusação e a assistente indicam, ou seja, para obrigar esta a desistir do arrolamento.
Todavia, salvo o devido respeito, julgamos que as próprias declarações prestadas pelo arguido na audiência de julgamento se encarregam de contrariar aquela contestação, porquanto ele não indicou outra data alternativa para a deslocação que fez ao escritório da assistente e confirmou que o assunto que o levou a deslocar-se ali, naquele circunstancialismo temporal, para confrontar a sua ainda esposa (o divórcio só foi decretado no dia ../../2021), foi precisamente o da pendência do procedimento cautelar de arrolamento – pelo que, obviamente, já sabia desse facto (independentemente do modo como dele tomou conhecimento) –, que incluiu um motociclo que entretanto já havia vendido a terceiro, e para tentar convencer a assistente a desistir dessa providência.         
Por outro lado, ouvidas as declarações prestadas pela assistente e pelas sobreditas testemunhas quanto a este concreto episódio, não se descortinam inconsistências ou contradições suscetíveis de retirar credibilidade aos relatos por elas efetuados.
Os depoentes EE e DD explicaram de modo coerente e convincente o conhecimento prévio que tinham da assistente e do arguido e relacionamento tenso que à data estes mantinham entre si, a razão para, no momento dos factos, se encontrarem nas proximidades do escritório da assistente (exploravam um estabelecimento comercial de café e restauração a cerca de 40 metros), se terem apercebido da ocorrência de uma discussão, em voz alta, entre a ofendida e o arguido, provinda do interior daquele escritório, e no decurso da mesma ouvirem um forte estrondo (por as portadas da janela/varanda estarem abertas e se terem deslocado para junto da entrada do prédio onde se situa aquele escritório, no primeiro andar), o que os levou, preocupados, a entrarem nas instalações pertencentes à assistente, onde assistiram aos factos que, pormenorizada e consistentemente, também narraram. 
Clama o recorrente que existe contradição entre as declarações da assistente e da testemunha DD face o depoimento da testemunha EE, na medida em que enquanto a primeira mencionou que o arguido arremessou a secretária contra a si, fazendo com que o computador caísse e ela ficasse entalada entre a mesa e os armários e impressora que se situavam atrás dela, situação verificada pela testemunha DD quando entrou no gabinete da ofendida (o tampo da mesa encontrava-se virado para ela e as pernas viradas para a porta de entrada), EE não afirmou que a mesa estivesse caída mas tão só que a assistente estava entalada entre a mesa e os armários/impressora.
Com isto, visa também o recorrente provar que, encontrando-se a mesa de premeio entre si e a assistente, era impossível, pela largura da mesa (80 cm/1 metro) e estatura baixa/média do arguido, que ele conseguisse agarrar o pescoço dela.
Salvo o devido respeito, não concordamos com a interpretação que o arguido faz da prova produzida.
O depoimento da testemunha EE não afasta a possibilidade de a mesa se encontrar virada no momento em que, conjuntamente com o DD, entrou no gabinete da Sra. Dra. CC, antes a reforça. Na verdade, o estrondo que a testemunha diz ter ouvido quando se encontrava no exterior, junto ao hall de entrada do prédio, coaduna-se com a secretária ser virada e bater no chão do escritório produzindo um forte ruído pelo impacto, não tanto com o mero arrastamento da mesma, circunstância que, normalmente, provoca um som tipo chiadeira ou arranhar. Além disso, o facto de a testemunha afirmar que a mesa se encontrava “encostada” contra a assistente não significa necessariamente que esse móvel não se encontrasse tombado.               
Acrescente-se que, diferentemente do que sustenta o recorrente, ainda que a secretária estivesse de pé e encostada ao corpo da ofendida, tal facto não seria impeditivo de o arguido, sendo de estatura mediana, inclinar-se sobre o tampo da mesa e alcançar com as mãos o pescoço daquela, pois a largura do tampo desse tipo de móvel habitualmente não excede os 80 centímetros – medida referida, aliás, pelos mesmos declarantes – tendo, em regra, entre 62,5 e 65 centímetros.     
Outrossim, não se nos afigura decisiva a circunstância de existir desencontro entre as testemunhas sobre a cor da secretária, tendo EE dito que era preta e DD, de modo não assertivo, manifestando dúvida por falta de memória que era branca. Com efeito, ambos mencionaram que o móvel em questão apresentava tampo de vidro e é compreensível que dois observadores colocados perante aquele concreto circunstancialismo não partilhem a mesma perceção quanto a todos os pormenores do “cenário”, visto que o que na altura demandava maior concentração e urgência era pôr cobro à conduta agressiva do arguido e prestar auxílio à ofendida. No mais, os depoimentos das testemunhas foram concordantes entre si e com o declarado pela assistente na descrição feita acerca dos móveis existentes no escritório e sua localização relativa face às posições dos intervenientes.

Em suma.
O juízo valorativo da prova realizado pelo Tribunal a quo acerca da factualidade em apreço expressa uma realidade viável, que não é contrariada pela globalidade da prova produzida nos autos nem pelas regras da experiência, do normal suceder; diferentemente, o juízo produzido prefigura-se conforme com os preditos fatores que norteiam a boa apreciação da prova.
A modificação pelo Tribunal ad quem da decisão sobre a matéria de facto provinda da primeira instância só pode ocorrer se a apreciação feita for ilógica, arbitrária, de todo insustentável face às regras da experiência comum ou dos conhecimentos técnico-científicos, o que, frisa-se, não se verifica no presente caso.  
Por conseguinte, improcede a impugnação ampla da decisão sobre a matéria de facto deduzida pelo arguido AA.

III.2.2Qualificação jurídica dos factos dados como provados nos pontos 12 a 15 (questão comum a ambos os recursos) – crime de violência doméstica ou crime de ameaça agravado:

III.2.2.1 - Sobre o crime de violência doméstica:

Neste conspecto, a assistente aduz que mesmo perante a factualidade dada por provada em primeira instância – sem alteração em sede de recurso –, o arguido deve ser condenado pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º n.º 1 al. a) do CP, não por crime de ameaça agravado, uma vez que, além do mais, o tipo de ilícito do artigo 152.º fica completo ainda que apenas uma ação criminosa se verifique. 

Vejamos.

Prescreve o art. 152º do Código Penal, onde se prevê o crime de violência doméstica [na parte que ora releva]:

“1 - Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade, ofensas sexuais ou impedir o acesso ou fruição aos recursos económicos e patrimoniais próprios ou comuns: [redação conferida pela Lei nº 57/2021, de 16.08] 
a) Ao cônjuge ou ex-cônjuge;
(…)
é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.”

Como referido no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 28.09.2011, processo nº 170/10.0GAVLC.P1, disponível em www.dgsi.pt., «no ilícito de violência doméstica é objectivo da lei assegurar uma “tutela especial e reforçada” da vítima perante situações de violência desenvolvida no seio da vida familiar ou doméstica que, pelo seu carácter violento ou pela sua configuração global de desrespeito pela pessoa da vítima ou de desejo de prevalência de dominação sobre a mesma, evidenciem um estado de degradação, enfraquecimento ou aviltamento da dignidade pessoal quanto ao perigo ou de ameaça de prejuízo sério para a saúde e para o bem-estar físico e psíquico da vítima».
O sobredito aresto seguiu, nesta parte, a tese proposta por Nuno Brandão, in “A Tutela penal especial reforçada da violência doméstica”, Revista Julgar, 12 (Especial), p. 9-24, segundo a qual «o desvalor potencial fundamentalmente tomado em consideração para justificar esta específica modalidade de incriminação se prende com os riscos para a integridade psíquica da vítima que podem advir da sujeição a maus tratos físicos e/ou psíquicos, sobremaneira quando se prolongam no tempo» (pág. 18).
No crime de violência doméstica tutela-se a dignidade humana dos sujeitos passivos aí elencados, mormente na vertente da sua saúde, seja a nível físico ou psíquico, ou na vertente da sua privacidade, seja de liberdade pessoal ou de autodeterminação sexual.[5]
O bem jurídico protegido por este tipo legal de crime é, assim, primordialmente, a saúde da vítima, entendida nas suas vertentes de saúde física, psíquica e mental, visando a incriminação protegê-la de comportamentos que impeçam ou dificultem o normal desenvolvimento de uma pessoa, afetem a dignidade pessoal e individual da pessoa que com o agente mantém (ou manteve) vínculos relacionais estreitos e/ou duradouros.
André Lamas Leite, in “A violência relacional íntima: reflexões cruzadas entre o Direito Penal e a criminologia”, Revista Julgar nº12 (especial), Edição da ASJP, 2010, págs. 46 e 47, após admitir as dificuldades derivadas de um tipo legal em cuja base se encontre um bem jurídico tão multimodo como o da violência doméstica, preconiza que «o fundamento último das ações e omissões abrangidas pelo tipo reconduz-se ao asseguramento das condições de livre desenvolvimento da personalidade de um indivíduo no âmbito de uma relação interpessoal próxima, de tipo familiar ou análogo.»     
A necessidade prática da criminalização das espécies de comportamentos descritos no art. 152º, nº1, resultou da consciencialização ético-social dos tempos recentes sobre a gravidade individual e social destes comportamentos; não porque estejamos perante um fenómeno novo ou recente, mas antes porquanto atualmente vinga uma maior e mais ampla consciencialização acerca da inadequação e da gravidade e perniciosidade desses comportamentos, o que os faz encarar como um problema de dimensão social.   
No apontado sentido, também Victor de Sá Pereira e Alexandre Lafayette (in “Código Penal Anotado e Comentado, 2ª Edição, anotação 4 ao art. 152º, págs. 438 e 439):
«As relações conjugais, como outras – de certa analogia ou proximidade, que o legislador equipara àquelas –, desenrolam-se, por via de regra, num determinado clima de confiança, solidariedade e respeito, que resiste à atinente cessação, persistindo para além dela. O aproveitamento da cobertura que as mesmas relações podem facultar à prática de condutas violentas por qualquer dos respetivos sujeitos, atuando sobre o outro, em contradição com a índole mesma daquele clima e com os ditames do vínculo estabelecido, seja ele qual for, torna-se, por isso, muito em particular reprovável. A lei, assim, dado que tais condutas vão acontecendo com alguma regularidade, optou por enérgica intervenção específica, tentando reagir contra a violação da harmonia estruturante das relações em causa. Repugna-lhe, com efeito, toda a forma de violência, em nome da preservação da paz doméstica (lato sensu), cuja negação gravemente se repercute na própria paz social – minando-lhe os alicerces –, a cujo nível as referidas relações dispõem de precípuo lugar. Por isso, acorre em defesa das vítimas, atribuindo-lhes um meio capaz de garantir boa proteção da vida, da integridade física e psíquica, da liberdade e da dignidade, contra qualquer inflição de maus tratos, dos quais se não excluem, v.g., «castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais». Em tal proteção se consubstancia a tutela penal aqui estruturada e conferida. A qual, mediatamente, não deixa de alastrar ao bem supra-individual que é a referida paz doméstica».    
Estamos perante um crime específico, porquanto pressupõe que o sujeito activo se encontre numa determinada relação para com o sujeito passivo, a vítima dos seus comportamentos. No caso da norma incriminadora da alínea a) do nº1, o sujeito passivo ou vítima só pode ser pessoa que mantenha ou tenha mantido uma relação conjugal com o agente ou sujeito activo.
Como sublinha André Lamas Leite, releva aqui «a especial relação que intercede entre o agente e o ofendido, a qual é sempre de proximidade, se não física, ao menos existencial, ou seja, de partilha (atual ou anterior) de afetos e de confiança em um comportamento não apenas de respeito e abstenção de lesão da esfera jurídica da vítima, mas até de atitude pró-ativa, porquanto em várias das hipóteses do art. 152º, são divisáveis deveres legais, de garante.» [ibidem, p. 51].
As condutas típicas preenchem-se com a inflição de maus tratos físicos (ofensas à integridade física simples) e maus tratos psíquicos (ameaças, humilhações, provocações, molestações).
A conduta típica do crime de violência doméstica inclui, assim, para além da agressão física (mais ou menos violenta, reiterada ou não), a agressão verbal, a agressão emocional (p. ex., coagindo a vítima a praticar atos contra a sua vontade), a agressão sexual, a agressão económica (p. ex., impedindo-a de gerir os seus proventos) e a agressão às liberdades (de decisão, de ação, de movimentação, etc.), as quais, analisadas no contexto específico em que são produzidas e face ao tipo de relacionamento concreto estabelecido entre o agressor e a vítima, indiciam uma situação de maus tratos, ou seja, um tratamento cruel, degradante ou desumano da vítima.
Os maus tratos podem ser infligidos de modo reiterado ou não (conduta isolada).  
A este propósito urge ter presente a jurisprudência que já antes da alteração legislativa de 2007 considerava que uma conduta ainda que isolada podia configurar um crime de maus tratos desde que pela sua gravidade pusesse em causa a dignidade humana do ofendido.[6]
Importa aquilatar nessas situações se o comportamento único do agente reveste, ainda assim, uma certa gravidade, traduzindo crueldade, insensibilidade ou até vingança desnecessária da sua parte, a ponto de constituir causa justificativa da dissolução do vínculo conjugal, por comprometer a possibilidade de vida em comum.
O conjunto de ações típicas que integram o ilícito criminal em apreço, uma vez analisadas à luz do contexto especialmente desvalioso em que são cometidas, constituirão maus tratos quando revelem uma conduta maltratante especialmente intensa que deixa a vítima em situação degradante ou em estado de agressão permanente.
Tais comportamentos integram o conceito legal de “maus tratos” quando geram uma situação consubstanciadora de um padrão comportamental associado a uma perigosidade típica para o bem-estar físico e psíquico da vítima.
Ainda que indicie sobremaneira a ocorrência de sevícias típicas a existência de uma relação de domínio ou subjugação da vítima perante o agente, o tipo legal não exige necessariamente este predomínio constante ou habitual – neste sentido, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23.01.2025, proferido no Processo nº 227/22.4PBMTS.P1.S1, relator Conselheiro Jorge Gonçalves, disponível em www.dgsi.pt.
O que justifica a punição mais severa do agente através deste tipo legal de crime numa situação de concurso aparente com as ofensas à integridade física simples, injúrias, ameaças ou outra conduta penalmente típica suscetível de integrar a violência doméstica, é precisamente o desprezo do agressor pela dignidade pessoal da vítima, enquanto revelador de um pesado desvalor de acção que agrava a ilicitude material do facto – Cf. Nuno Brandão, ob. cit., p. 18.
Como referido no aludido Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 28.09.2011 - citando também Nuno Brandão e o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17.05.2010, relatado pelo Exmo. Desembargador Cruz Bucho - «o importante é, pois, analisar e caracterizar o quadro global da agressão física de forma a determinar se ela evidencia um estado de degradação, enfraquecimento, ou aviltamento da dignidade pessoal da vítima que permita classificar a situação como de maus tratos, que, por si, constitui um risco qualificado que a situação apresenta para a saúde psíquica da vítima. Nesse caso, impõe-se a condenação pelo crime de violência doméstica, do art. 152º do CP. Se não, a situação integrará a prática de um ou vários crimes de ofensas à integridade física simples, do art. 143º, do CP».  
E acrescenta-se no aresto: «a acção não pode limitar-se a uma mera agressão física ou verbal, ou à simples violação de alguma ou algumas das liberdades da pessoa (vítima) tuteladas por outros tipos legais de crimes. Importa que a agressão (em sentido lato) constitua uma situação de “maus tratos”. E estes (maus tratos) só se dão como verificados quando a acção do agente concretiza actos violentos que, pela sua imagem global do facto e pela gravidade da situação concreta são tipificados como crime pela sua perigosidade típica para a saúde e bem-estar físico e psíquico da vítima».
O elemento subjetivo do tipo preenche-se por qualquer forma de dolo.

Volvendo ao caso vertente.

O Tribunal a quo afastou a verificação do tipo de crime de violência doméstica nos seguintes termos:
«(…)atentando-se na matéria de facto, entendemos que apesar da censurabilidade da conduta do arguido, dada como provada, a mesma, vista de forma global e avaliada no contexto que rodeou, não é suficiente para nos permitir concluir que o único episódio de agressão física, e ameaça e injuria (na mesma expressão), até pelas lesões insignificantes apuradas – nem careceram de tratamento médico), são suficientemente graves para afectar de forma marcante a saúde física e psíquica e integrar um verdadeiro aviltamento da dignidade pessoal da ofendida, pressuposto pela infracção penal em causa.
Na verdade, não se colhe, da conduta do arguido, a intenção de exercer um poder de domínio sobre a ofendida no âmbito das diversas valências existenciais da mesma, mas antes, reconhece-se, um contexto, episódico, de exaltação por se ter sentido enganado e traído, ao ver o motociclo que tinha vendido ser objecto de processo judicial, vendo, assim, a sua reputação, eventualmente, afectada junto do comprador.»

Aderimos à sobredita argumentação e reforçamo-la.
Os factos apurados nos pontos 12 a 15 circunscrevem-se a uma situação única, temporalmente isolada e não se afiguram suficientes para que se conclua que o respetivo comportamento do arguido reveste especial gravidade e traduz, mais do que insensibilidade, crueldade e um particular acinte na forma tratou a ofendida HH, à data ainda seu cônjuge.
A factualidade em apreço não demonstra da parte do arguido um desígnio de predomínio sobre a ofendida, humilhando-a e amedrontando-a de modo a mantê-la subalternizada face à sua pessoa.
Não obstante a inequívoca censurabilidade da conduta do arguido, que incluiu um soez impropério à ofendida e o agarrar momentâneo do pescoço desta enquanto lhe anunciava a vontade de atentar contra a sua vida por forma a compeli-la a desistir da providência cautelar de arrolamento que havia intentado contra ele, urge ponderar o contexto em que tal comportamento foi realizado onde impera a decorrência de uma separação de facto prolongada, a pendência de uma ação de divórcio, até então litigioso, e a instauração pela ofendida do dito procedimento cautelar, no âmbito do qual, entre o mais, foi arrolado um motociclo que, entretanto, o arguido já havia vendido a terceiro, e perante o qual teria de prestar contas caso o negócio fosse anulado. Este particular circunstancialismo não justifica, mas explica o estado de exaltação em que atuou o arguido, perante a verbalizada recusa da assistente em desistir da mencionada providência cautelar, o que, a par da ausência de lesão física ou psíquica significativa, permite concluir não estarmos perante a prática de maus tratos, por o quadro global em apreço não revelar uma conduta maltratante do arguido especialmente intensa que tivesse deixado a vítima em situação degradante ou em estado de constante exposição de ofensa à sua liberdade de decisão, honra, integridade física e/ou vida.
Os ajuizados atos não denotam um padrão comportamental associado a uma perigosidade típica para o bem-estar físico e/ou psíquico da vítima.
Pelo exposto, não merce censura a decisão do tribunal a quo de absolver o arguido, como autor material, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º, nº 1, alínea a), do Código Penal, alegadamente cometido sobre o seu cônjuge (atual ex-cônjuge) CC.
Soçobra, nesta parte, o douto recurso da assistente.

III.2.2.2 - Sobre o crime de ameaça agravado:

O arguido/recorrente, AA, alega, em súmula: 

- O Tribunal a quo fez uma errada qualificação jurídica da conduta do recorrente dada por assente, a qual não consubstancia a prática de um crime de ameaça agravada, pelo que o mesmo deveria ter sido quanto a este crime, absolvido;
- A alegada expressão proferida pelo Arguido, “Desiste da ação. Mato-te, filha da puta”, enquanto alegadamente agredia fisicamente a Assistente, segurando-a pelo pescoço, não é suscetível, em abstrato, de consubstanciar a prática de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelo artigo 153.º do Código Penal. Se o Arguido estava alegadamente a agarrar a Assistente pelo pescoço, está em pleno ato de execução. Isto é, a alegada ameaça, é proferida aquando da alegada agressão e circunscrita aquele momento temporal, não praticando o arguido outro ato de execução que não seja o de ofensas corporais, não se estando perante a verbalização de um mal futuro, mas sim de iminente mal, em plena execução e que se circunscreve, contudo, àquele ato;
- Está fora de causa que a expressão dirigida à Assistente, constitui uma referência à prática de um mal futuro – concretamente, uma agressão que preencheria, no mínimo, o elemento típico objetivo de um crime de ofensa à integridade física ou de crime mais grave; contudo, constata-se, in casu, que o comportamento verbalizado pelo Arguido não era um mal futuro, mas sim iminente. De facto, ao pronunciar aquela expressão no decurso de uma agressão física, o arguido, quanto muito, pretendia afirmar que naquele momento específico iria imediatamente, na dinâmica dos factos em curso, agredir a Assistente, como alegadamente o fez. Ou seja, tais palavras não podem deixar de ser entendidas como uma referência a algo que se vai fazer no momento imediato, e não uma ameaça que se cumprirá posteriormente, mas em que há desistência ou ausência da prática de qualquer outro ato de execução para além daquele que se acabou de praticar;
- Ora, o bem jurídico protegido pela incriminação das ameaças é a liberdade de decisão e de ação, que é afetado pelo receio e pela intranquilidade provocados na vítima. A expressão da intenção de agredir alguém, no imediato, proferida no decurso da própria agressão, não limita aquela liberdade, por não constituir uma perturbação autónoma da paz individual, diversa daquela concretizada no ato violento em si.

Analisando.
De acordo com o estipulado no art. 153º, nº1 do Código Penal, “quem ameaçar outra pessoa com a prática de crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor, de forma adequada a provocar-lhe medo ou inquietação, ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias”. 
A forma agravada do dito crime ocorre, por força do disposto no art. 155º, nº1, al. a), do CP, quando os factos descritos naqueloutro preceito legal forem realizados “por meio de ameaça com a prática de crime punível com pena de prisão superior a 3 anos”[7]
O bem jurídico protegido pela incriminação é a liberdade de decisão e ação de outra pessoa, visando obstar ao seu embotamento ou supressão.
São elementos objetivos do tipo legal de crime em apreço que o agente dirija a outrem uma ameaça contra a sua vida ou integridade física, e que o faça em termos adequados a, em abstrato, causar-lhe medo ou inquietação quanto à possibilidade de concretização desse anúncio de um mal futuro.
Destarte, é, desde logo, elemento objetivo do crime de ameaça, o anúncio, por qualquer meio, de que o agente pretende infringir a outrem um mal futuro, dependente da vontade do autor.
A propósito da imperiosidade de o mal apregoado ser de causação diferida no tempo, não atual ou iminente, salienta o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 02.06.2014, processo nº 380/06.4GEGMR.G2, disponível em www.dgsi.pt: «I – Sendo requisito do crime de ameaça que o mal anunciado seja futuro, tal característica temporal há-de resultar da ponderação de um conjunto diversificado de fatores referentes à conformação global do facto, em que relevam quer elementos objetivos, quer elementos subjetivos referentes ao propósito ou fim visado pelo agente. II – O mal anunciado será de considerar como futuro quando não se tratar duma tentativa criminosa, nos termos em que o art. 22 do Cod. Penal a descreve, ou seja, enquanto o agente não praticar atos de execução de um crime que decidiu cometer. III – A circunstância dos arguidos terem agarrado e empurrado o ofendido enquanto pronunciavam frases como “agora vais pagar por aquilo que fizeste, vamos-te matar” não significa necessariamente que o pretendiam fazer naquele preciso momento, ou no presente imediato. Tal comportamento não contém atos de execução de um crime de homicídio.»
Igualmente se sumaria no acórdão deste mesmo Tribunal da Relação de 21.05.2018, processo nº 375/15.0GAVLP.G1, disponível em www.dgsi.pt: «I) Ainda que a doutrina e a jurisprudência estejam de acordo em que uma das características essenciais do crime de ameaça reside em vaticinar-se um mal futuro, sobre a interpretação desta expressão é de aderir ao entendimento de que haverá ameaça de mal futuro sempre que se não esteja perante uma execução iminente, pelo que o mal anunciado terá a característica de mal futuro desde que não se trate já duma tentativa criminosa. II) Sempre que alguém dirija a outrem uma expressão, verbal ou de outra natureza, de anúncio de causação de um mal, não acompanhando essa ação com os atos de execução correspondentes, permanecendo inativo em relação à execução do mal anunciado, todo o tempo que durar essa inação e se mantiver a possibilidade de o mal anunciado se concretizar é futuro, em termos de interpretação da expressão em causa.»
O crime, objeto da ameaça, tem de consubstanciar uma conduta contra os bens especificamente previstos no tipo (“contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor”), sendo que no tipo agravado em apreço nos autos o mal anunciado há de traduzir-se na prática de ilícito criminal punível com pena superior a três anos. 
Para o preenchimento do tipo é obviamente necessário que a ameaça chegue ao conhecimento do visado/destinatário, pois que de outro modo nunca o bem jurídico protegido pela incriminação poderia ser afetado.
Por outro lado, como é pacificamente entendido pela doutrina e jurisprudência, a adequação legalmente exigida pressupõe que a expressão intimidatória dirigida pelo agente do crime ao destinatário seja, de acordo com a experiência comum, suscetível de ser tomada a sério pelo ameaçado, independentemente de este ficar ou não intimidado.
Após a Revisão do Código Penal de 1995, o crime de ameaça é legalmente configurado como um crime de mera atividade e de perigo, já não, como sucedia no regime penal anterior [art. 155º do CP de 1982], um crime de resultado e de dano.  

Como nota Paulo Pinto de Albuquerque [“Comentário do Código Penal”, anotação 8 ao art. 153º, p. 413], não é necessário que o destinatário tenha efetivamente ficado com medo ou inquieto ou inibido na sua liberdade de determinação. Basta que as palavras tivessem essa potencialidade, aferida esta de acordo com as características do destinatário. Por outro lado, a potencialidade da ameaça não depende da intenção do agente de concretizar a ameaça.

No mesmo sentido, na doutrina, Américo Taipa de Carvalho, in “Comentário Conimbricense do Código Penal”, Parte Especial, Tomo I, anot. ao art. 153º, § 19, p. 348; Leal-Henriques/Simas Santos, in “Código Penal”, 2º Volume, 2ª Edição, p. 185; Victor de Sá Pereira e Alexandre Lafayette, in “Código Penal, Anotado e Comentado”, 2ª Edição, anot. 13 ao art. 153º; na jurisprudência, a título exemplificativo, vide os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12.09.2012, processo nº 1221/11.6JAPRT.S1; do Tribunal da Relação de Guimarães de 21.06.2010, processo nº 380/06.4GEGMR.G2, de 23.04.2012, processo nº 326/11.8PBVCT.G1, e de 11.07.2013, processo nº 1400/10.3GAFLG.G1; do Tribunal da Relação do Porto de 09.07.2014, processo nº 150/10.5PBCBR.P2, e de 25.02.2015, processo nº 1193/12.0GAMAI.P1, do Tribunal da Relação de Lisboa de 19.05.2015, processo nº 361/12.9GAMTA.L1-5; e do Tribunal da Relação de Coimbra de 07/03/2012, processo nº 110/09.9TATCS.C1, todos disponíveis em www.dgsi.pt
O elemento subjetivo preenche-se por uma conduta dolosa do agente, em qualquer das modalidades do dolo previstas no art. 14º do C.P., relativamente a todos os elementos do tipo.

Está provado nos pontos 12 a 15: 
12. No dia 8 de março de 2021, pelas 16:30 horas, o arguido dirigiu-se ao escritório da assistente, sito na Rua ..., ..., em Guimarães, devido ao facto da assistente ter dado entrada de uma providencia cautelar de arrolamento, de um motociclo do arguido (que tinha recentemente vendido a novo proprietário), este entrou no gabinete, empurrou a secretária encostando a assistente à parede, e agarrou-a, com as duas mãos, pelo pescoço, ao mesmo tempo disse-lhe: Desiste da ação. Mato-te, filha da puta.”
13. Nesse momento foi surpreendido por DD e EE, e fugiu do local.
14. Com o aludido em 12), arguido quis e logrou ferir a ofendida na sua honra e consideração, saúde psíquica e física, molestá-la psíquica e fisicamente, intimidá-la, provocar-lhe medo, ansiedade e inquietação, provocar-lhe receio de vir a sofrer atos atentatórios contra a sua integridade física e vida, bem sabendo que a sua conduta era adequada a causar-lhe tal receio e limitar a sua liberdade pessoal, ambulatória.
15. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que estas suas condutas aludidas em 12), eram proibidas e punidas pela lei penal.

Como vimos, o arguido/recorrente reivindica que não se verifica o crime agravado de ameaça pelo qual foi condenado, porquanto entende que a conduta de proferir a expressão “Desiste da ação. Mato-te, filha da puta”, ao mesmo tempo que agredia fisicamente a Assistente, segurando-a pelo pescoço, consubstancia já um ato de execução do mal anunciado. Acrescenta que a ameaça é proferida aquando da agressão e circunscrita àquele momento temporal, não praticando o arguido outro ato de execução que não seja o de ofensas corporais, não se estando perante a verbalização de um mal futuro, mas sim de iminente mal, em plena execução e que se circunscreve, contudo, àquele ato.
Não obstante a valia da argumentação recursória aduzida, não concordamos com a respeitável posição do recorrente.
Com efeito, a circunstância de, no circunstancialismo de tempo, modo e lugar descrito, o arguido ter agarrado com as mãos o pescoço da assistente enquanto proferia a sobredita expressão não consubstancia já um ato de execução da proclamada morte da mesma, que face à imprevista intervenção de terceiros, se exauriu aí, culminando numa tentativa de crime de homicídio, bem como não traduz uma ação que esgotou a intenção única de ofender a integridade física da ofendida sem intenção de causação de um outro mal ulteriormente. Ao invés, aquele comportamento agressivo do arguido que acompanhou a prolação da expressão intimidatória destinou-se a conferir reforçada seriedade à ameaça produzida e, desse modo, lograr atemorizar a ofendida, levando-a a praticar o ato por ele almejado e exigido.
Tanto que, como é evidente, o arguido necessitava que a visada vivesse para desistir do procedimento cautelar de arrolamento contra ele instaurado, como ele pretendia.       
Ou seja, ao proferir a dita expressão, no contexto em que o fez, o arguido não estava somente a afirmar que naquele momento iria imediatamente agredir a assistente, agarrando com as mãos o seu pescoço, como sucedeu, mas igualmente a exteriorizar uma ameaça que cumpriria futuramente caso ela não acedesse à sua determinação de desistir da providência cautelar que interpôs. E fê-lo de modo adequado a causar medo na ofendida de que a ameaça viesse a ser concretizada.   
Portanto, como também concluiu o Tribunal recorrido, a factualidade apurada preenche a tipicidade objetiva e subjetiva do tipo de crime de ameaça agravada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 153º1 e 155º, nº1 al. a), por referência ao art. 131º, todos do CP.
Falece, assim, este fundamento recursório e, in totum, o douto recurso do arguido.

III.2.3 – (In)suficiência do quantum indemnizatório fixado:

Considera a demandante civil CC que a indemnização que lhe foi atribuída no montante de 500€ é manifestamente insuficiente face aos factos dados como provados, à sua gravidade, à intensidade do sofrimento infligido, bem como à repercussão na sua vida familiar e profissional, devendo, por isso, ser fixada uma quantia substancialmente mais elevada.
           
Apreciando.

Do elenco da factualidade dado por provada na sentença recorrida consta:  
“12. No dia 8 de março de 2021, pelas 16:30 horas, o arguido dirigiu-se ao escritório da assistente, sito na Rua ..., ..., em Guimarães, devido ao facto da assistente ter dado entrada de uma providencia cautelar de arrolamento, de um motociclo do arguido (que tinha recentemente vendido a novo proprietário), este entrou no gabinete, empurrou a secretária encostando a assistente à parede, e agarrou-a, com as duas mãos, pelo pescoço, ao mesmo tempo disse-lhe: Desiste da ação. Mato-te, filha da puta.”
[…]
14. Com o aludido em 12), arguido quis e logrou ferir a ofendida na sua honra e consideração, saúde psíquica e física, molestá-la psíquica e fisicamente, intimidá-la, provocar-lhe medo, ansiedade e inquietação, provocar-lhe receio de vir a sofrer atos atentatórios contra a sua integridade física e vida, bem sabendo que a sua conduta era adequada a causar-lhe tal receio e limitar a sua liberdade pessoal, ambulatória.
[…]
17. Em consequência adequada, directa e necessária das agressões infligidas e supra descritas, o demandado causou à demandante dores físicas, dores de cabeça, dores nos braços, no momento da perpetração da agressão e nos dias que se lhe seguiram, até completado o tempo necessário a recuperação e restabelecimento, o previu e quis.
18. A ameaça proferida foi levada muito a sério, pois, o seu teor é claro e objectivamente ameaçador. O arguido trabalha como medidor orçamentista e aufere cerca de €1.100,00 mensais.
19. Vive com os progenitores, sendo que o pai é empresário e aufere cerca de €1.300,00 mensais, e com a mãe que trabalha como administrativa e aufere cerca de €900,00 mensais.
20. Vive em casa própria dos pais.
21. Frequentou o 1º ano do curso de fiscalidade na universidade.”

Na sentença recorrida menciona-se quanto ao pedido de indemnização civil formulado pela demandante CC contra o demandado AA:
«Já face aos factos que foram dados como provados, encontram-se preenchidos os requisitos da responsabilidade civil por factos ilícitos, quanto ao pedido formulado pela demandante CC quanto aos alegados danos decorrentes do crime de ameaça agravada. Isto porque, resultou apurada a existência de um facto voluntário do agente, consubstanciado no dano; a ilicitude, porque tal conduta violou bens jurídicos; a culpa do lesante, uma vez que se traduziu numa conduta desvaliosa (agindo com dolo directo); o nexo de causalidade, que resulta da adequação da conduta do agente à produção do resultado.
No que respeita aos danos não patrimoniais, há que verificar se, pela sua gravidade, serão merecedores de tutela do direito (artº 496º, do C.C.) e, se se concluir positivamente, deve o montante da indemnização ser fixado equitativamente pelo tribunal tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.
Ora, a aludida demandante viu a sua esfera jurídica, face à factualidade dada como provada, na sua vertente não patrimonial, afectada pela conduta supracitada do demandado, nomeadamente pela vergonha, receio, tristeza que sentiu, pelo que julgo, verificados os pressupostos da obrigação de indemnizar.
O tribunal fixa o montante da indemnização equitativamente de acordo com o preceituado no artº 496º, nº 3 do Código Civil, que remete para os critérios estabelecidos no artº 494º do mesmo diploma, designadamente o grau de culpabilidade do agente, a sua situação económica e a do lesado, aos padrões de indemnização geralmente adoptados na jurisprudência e as flutuações do valor da moeda.
“A indemnização reveste, no caso dos danos não patrimoniais, uma natureza acentuadamente mista: por um lado, visa reparar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar; no plano civilístico e com meios próprios do direito privado, a conduta do agente” (Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral, vol. I, 10ª edição, Almedina, pág. 608).
Sufragando esta posição o Ac. da Rel. do Porto, Proc. nº 0443639, de 13/07/2005, www.dgsi.pt, onde se diz “A reparação judicial dos danos ou prejuízos, na jurisdição criminal, quer para os danos patrimoniais, quer para dos danos não patrimoniais, deve ser determinada, quanto ao montante da indemnização, segundo o prudente arbítrio do julgador que atenderá à gravidade da infracção, ao dano material e moral por ele causado, à situação económica e à condição social do ofendido e do infractor.”
Neste jaez, e conjugando, in casu, os critérios supracitados e a factualidade dada como provada, decide-se condenar o demandado a pagar à aludida demandante, a quantia de €500,00 (quinhentos euros) a título de danos não patrimoniais, tendo em conta o contexto apurado e ter sido apenas uma situação episódica.
O demandado será também condenado no pagamento de juros sobre o referido montante, contados a partir da data da presente sentença, calculados à taxa legal, até efectivo e integral pagamento (cfr. Ac. uniformizador nº 4/2002, de 9/05, publicado no D.R. nº 146, de 27 de Junho de 2002).»

Acolhem-se como corretos os critérios de fixação da indemnização por danos não patrimoniais a que o Meritíssimo Juiz atendeu.
Contudo, julgamos assistir razão à recorrente quando defende que o montante da indemnização fixado peca por defeito.
Na verdade, cremos que a decisão recorrida não valorou devidamente o facto de o arguido ter atuado com o dolo mais intenso (direto ou de primeiro grau), de os factos terem ocorrido no local onde a ofendida exerce a sua atividade profissional de advogada, e de, não obstante se tratar de um episódio isolado, o mesmo ser objetivamente grave porquanto foi perpetrado pelo demandado sobre quem ainda era seu cônjuge – ainda que decorresse processo de divórcio – e mãe dos seus filhos, ser demonstrativo de uma personalidade violenta e descontrolada do demandado e ter causado na lesada, entre o mais, fundado receio de vir a sofrer atentado à sua vida, que constitui o bem jurídico mais valioso da pessoa humana.
A deliberação desconsiderou ainda a situação económica desafogada do lesante.
Em conformidade, ponderando em concatenação todos os mencionados factores, julgamos adequada e suficiente para compensar os danos não patrimoniais sofridos pela demandante civil, como consequência direta e necessária da conduta do demandado AA, a quantia de € 1.000,00 (mil euros).
Uma vez que na determinação do montante indemnizatório já estamos a atender ao atual momento de discussão da causa, os juros de mora sobre tal quantia são devidos, à taxa legal, desde a data da prolação da presente decisão até efetivo e integral pagamento (cf. acórdão uniformizador de jurisprudência do STJ nº 4/2002, de 09/05/2002, publicado no Diário da República nº 146, Série I-A, de 27/06/2002, págs. 5057 a 5070).
Nos termos preditos, procede parcialmente o douto recurso da assistente/demandante civil.   
*
IV - Dispositivo:

Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Guimarães em:

IV.1 – Julgar improcedente o douto recurso interposto pelo arguido AA.  
 
IV.2 – Julgar parcialmente procedente o douto recurso interposto pela assistente/demandante civil CC, fixando-se a indemnização por danos não patrimoniais a pagar-lhe pelo demandado AA em € 1.000,00 (mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do presente aresto até efetivo e integral pagamento.

IV.3 – No mais, manter a douta sentença recorrida.  

Custas pelo arguido/recorrente AA, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (arts. 513º, nº1 e 514º, ambos do CPP, e arts. 1º, 2º, 3º, 8º, nº 9, todos do Regulamento das Custas Processuais, e Tabela III anexa ao mesmo).
*
Notifique (art. 425º, nº6, do CPP).
*
Guimarães, 11 de novembro de 2025,
                            
Paulo Correia Serafim (Relator)
[assinatura eletrónica]
Isilda Pinho (1ª Adjunta)
[assinatura eletrónica]
Artur Cordeiro (2º Adjunto)
[assinatura eletrónica]

(Acórdão processado pelo relator, com recurso a meios informáticos, e revisto pelos signatários, que o assinam eletronicamente – cfr. art. 94º, nºs 2 e 3, do CPP)



[1] Cfr., neste sentido, Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do Código de Processo Penal”, 2ª Edição, UCE, 2008, anot. 3 ao art. 402º, págs. 1030 e 1031; M. Simas Santos/M. Leal Henriques, in “Código de Processo Penal Anotado”, II Volume, 2ª Edição, Editora Reis dos Livros, 2004, p. 696; Germano Marques da Silva, in “Direito Processual Penal Português - Do Procedimento (Marcha do Processo)”, Vol. 3, Universidade Católica Editora, 2018, pág. 335; Acórdão de Fixação de Jurisprudência do S.T.J. nº 7/95 de 19/10/1995, publicado no DR, Série I-A, de 28/12/1995, em interpretação que mantém atualidade.
[2] Cfr., por todos, os acórdãos do STJ de 31/05/2007, proferido no Processo nº 07P1412 [relatado pelo Exmo. Conselheiro Simas Santos], e de 23/05/2007, proferido no Processo nº 07P1498 [relatado pelo Exmo. Conselheiro Henrique Gaspar], ambos disponíveis in www.dgsi.pt.
[3] Neste sentido, a título exemplificativo, vejam-se os Acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 23/03/2015, processo 159/11.5PAPTL.G1; do Tribunal da Relação de Lisboa de 29/03/2011, processo 288/09.1GBMTJ.L1-5, de 18/07/2013, processo 1/05.2JFLSB.L1-3, de 21/05/2015, processo 3793/09.6TDLSB.L1-9, e de 08/10/2015, processo 220/15.3PBAMD.L1-9; e do Tribunal da Relação de Évora de 19.05.2015, processo 441/10.5TABJA.E2, todos disponíveis em www.dgsi.pt
[4]  “A Livre Apreciação da Prova e o Dever de Fundamentação da Sentença”, in “Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais”, Almedina, pp. 253-254.
[5] cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26.05.2010, processo nº 179/08.3GDSTS.P1, in www.dgsi.pt.
[6] Cf., a título exemplificativo, os Acórdãos da Relação de Coimbra de 13.06.2007, in www.dgsi.pt, do Supremo Tribunal de Justiça de 14.11.1997, CJSTJ, III, 235, e de 17.10.1996, CJSTJ, IV, 170, da Relação de Évora de 23.11.1999, CJ, V, 283 e de 25.01.2005, CJ, I, 260, e da Relação do Porto, de 12.05.2004, Recurso 6422/03-4ª Secção, e de 06.10.2010, processo nº 296/08.0PDVNG.P1, in www.dgsi.pt.
[7] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Fixação de Jurisprudência nº 7/2013, de 20.03, publicado no DR, I Série, de 20.03.2013: «A ameaça de prática de qualquer um dos crimes previstos no n.º 1 do artigo 153º do Código Penal, quando punível com pena de prisão superior a três anos, integra o crime de ameaça agravado da alínea a) do n.º 1 do artigo 155º do mesmo diploma legal.»