Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1501/16.4T8BGC.G1
Relator: VERA SOTTOMAYOR
Descritores: PROCESSO COMUM
ACÇÃO NÃO CONTESTADA
FALTA DE CITAÇÃO
NULIDADE
RECURSO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/01/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
I - Dos n.ºs 1 e 3 do artigo 223.º do CPC resulta antes de mais que as sociedades devem ser citadas na pessoa dos seus legais representantes, mas também se consideram pessoalmente citadas na pessoa de qualquer empregado, que se encontre na sede ou local onde funciona normalmente a administração.

II- O disposto no art. 246.º do CPC que estabelece que o regime de citação de pessoas colectivas é semelhante ao da citação das pessoas singulares, com as devidas adaptações e as especialidades constantes desta disposição legal.

III – Tendo a carta para citação da Ré sido endereçada para a morada sede desta e ai recepcionada por alguém que se comprometeu a entregá-la ao seu destinatário, considera-se ao abrigo do disposto no artigo 225.º n.º 4 conjugado com o artigo 246.º do CPC presumidamente feita a citação.

IV - Incumbindo à Ré demonstrar que não chegou a ter conhecimento da citação, por facto que não lhe é imputável, ilidindo assim a presunção legal, em conformidade com o previsto n artigo 350º n.º 2 do C.C. e não tendo logrado provar tais factos, fica por demonstrar a alegada falta de citação a que se reporta a alínea e) do n.º 1 do artigo 188º do CPC.

V - Tendo a Ré junto procuração aos autos, sem logo ter arguido a falta de citação, também por esta via tal nulidade sempre seria de considerar de sanada, em conformidade com o preceituado no artigo 189.º do CPC, já que a junção da procuração a advogado constitui a prática de um acto judicial relevante, sendo de presumir que a ré prescindiu de arguir a falta de citação.

VI - Decorre do disposto no n.º 1 do artigo 77º do CPT. que a arguição de nulidade da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso.

VII – Se a Recorrente não incluir no requerimento de interposição de recurso a arguição da nulidade e respectiva motivação, é de considerar extemporânea a arguição que seja feita apenas nas alegações de recurso, não sendo por isso de conhecer de tal nulidade.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães

APELANTE: EMPRESA X, SOC. UNIPESSOAL LDA.
APELADA: Maria

Comarca de Bragança, Juízo do Trabalho de Bragança, Juiz 1.

I - RELATÓRIO

MARIA casada, desempregada, residente na Estrada Nacional … (Macedo de Cavaleiros), veio intentar acção declarativa comum emergente de contrato individual de trabalho contra Empresa X, Sociedade Unipessoal, LDA., com sede em Rua … Morais, pedindo que a R. seja condenada a pagar-lhe:

-Uma indemnização de 2.100;00€ pela resolução do contrato de trabalho com justa causa fundada na falta de pagamento pontual da retribuição;
-A quantia de 1.820,00€ a título de salários em atraso;
-A quantia de 3.600,00€, a título de diferencial de salários;
-A quantia de 2.330,00€, a título de férias, respectivo subsídio, e sua violação, relativas ao ano de 2014;
-A quantia de 3.500,00€ a título de férias, respectivo subsídio, e sua violação, relativos ao ano de 2015;
-A quantia de 3.500,00€ a título de férias, respectivo subsídio, e sua violação, relativos ao ano de 2016;
-A quantia de 466,00€ a título de proporcionais de férias e respectivo subsídio, correspondente ao tempo de serviço prestado no ano da cessação do contrato;
-A quantia de 1.574,60€ a titulo de subsidio(s) de Natal;
-A quantia de 1.888,85€ referente ao trabalho suplementar
-Juros moratórios, à taxa legal, sobre todas as quantias ora peticionadas e sobre a data que se mostrarem vencidas e até integral e efectivo pagamento, acrescidos de sanção/juros compulsórios à taxa de 5% ao ano, a contar da sentença (transitada em julgada).

Por despacho datado de 24-11-2016 foi determinada a citação da Ré para comparecer à audiência de partes, designada para o dia 21-12-2016.
A 28-11-2016 foi expedida carta registada com aviso de receção, para a morada da sede da Ré, citando apenas para comparecer na audiência de partes e remetendo-lhe duplicados da P.I.

Em 29-11-2016, a referida carta para citação da Ré foi entregue e recepcionada por um terceiro - Manuel – que assinou o correspondente A/R, o qual foi identificado pelo distribuidor do serviço postal através do respectivo documento oficial de identificação, tendo anotado no A/R o número de tal documento, bem como advertido expressamente aquele terceiro do dever de prontamente entregar a carta de citação à Ré.

No dia 12-12-2016 teve lugar audiência de partes, diligência essa à qual a Ré não compareceu, nem se fez representar, tendo por isso sido determinada a sua notificação para contestar a presente acção, no prazo de 10 dias, sendo advertida nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 57º do CPT, tal como melhor se constata do teor da respectiva acta.

Em 14-12-2016 foi expedida carta para a morada da sede da Ré, com a notificação para contestar a presente acção nos termos determinados na audiência de partes, não tendo sido devolvida aos autos a referida carta.

Em 18-04-2017, por requerimento subscrito pelo Exmo. Sr. Dr. Tiago, Advogado, por via electrónica, através da plataforma citius, a Ré veio juntar aos autos procuração forense, constituindo seu procurado o referido Advogado, a quem conferiu os mais amplos poderes forenses em Direito permitidos, incluindo os especiais para desistir, confessar ou transigir, solicitando ainda que sejam inseridos no sistema citius os dados do seu mandatário.
Em 17-05-2017 foi proferida sentença, em cujo dispositivo se fez contar o seguinte:

”Assim, ao abrigo do nº 2 do citado art. 57º do Cód. Proc. Trabalho, julgo parcialmente procedente a acção e, em consequência, condeno a R. Empresa X, Sociedade Unipessoal, Lda., a pagar à A. Maria:

a) 2.100,00€ (dois mil e cem euros) a título de indemnização pela resolução unilateral do contrato de trabalho com justa causa;
b) 1.820,00€ (mil oitocentos e vinte euros) a título de salários em atraso;
c) 3.600,00€ (três mil e seiscentos euros) a título de diferencial de salários;
d) 2.330,00€ (dois mil trezentos e trinta euros), a título de férias, respectivo subsídio, e sua violação, relativas ao ano de 2014;
e) 3.500,00€ (três mil e quinhentos euros) a título de férias, respectivo subsídio, e sua violação, relativos ao ano de 2015;
f) 1.400,00€ (mil e quatrocentos euros) a título de férias e respectivo subsídio, relativos ao ano de 2016;
g) 466,00€ (quatrocentos e sessenta e seis euros) a título de proporcionais de férias e respectivo subsídio, correspondente ao tempo de serviço prestado no ano da cessação do contrato;
h) 1.574,60€ (mil quinhentos e setenta e quatro euros e sessenta cêntimos) a título de subsídio (s) de Natal;
i) 1.315,94€ (mil trezentos e quinze euros e noventa e quatro cêntimos) referente ao trabalho suplementar; e
j) Juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos, desde a data da cessação do contrato quanto à indemnização pela resolução do contrato de trabalho e compensação pela violação do direito a férias e desde a data do respectivo vencimento quanto às demais prestações e, a partir do trânsito em julgado da sentença, juros sancionatórios à taxa de 5% ao ano, nos termos do art.º. 829º-A nº 4 do Código Civil.
Custas por A. e R., na proporção do vencido.
Notifique.
Registe.”

Inconformada com esta sentença, dela veio a Ré interpor recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam mediante a formulação das seguintes conclusões:

1 - A Ré não foi nunca citada ou sequer notificada, para os efeitos do disposto no art.º 54.º, números 2 a 5, vide citação com Ref.ª 19929110 de 28/11/2016, com registo postal RE...PT.
2 – A Ré nem sequer foi notificada para os efeitos do disposto nos art.ºs 56 e 57.º do CPT, com n.º de Ref.ª 19979241 de 14/12/2016, com número de registo postal RE…PT.
3 - Ao contrário do declarado no douto despacho de 12/12/2016 (ata da audiência de partes) e da douta sentença de 03/05/2017, a Ré nunca foi devidamente citada para a audiência de partes, nem para justificar a sua falta à mesma, nem foi notificada da petição inicial, nem da possibilidade de contestação da mesma,
4 - A falta de citação da aqui Ré é nulidade processual principal que determina a anulação de todo o processado posterior à petição inicial, prevista no art.º 187, al. a), do CPC, sendo assim nula a citação nos termos do disposto no art.º 191.º do CPC
5 - Por especificidade da legislação processual laboral, nos termos do disposto no art.º 77.º do CPT, a arguição de nulidades de sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso, o que por este meio se faz.
6 - a sentença em causa não respeita o dever legal de fundamentação, porquanto a douta decisão limita-se a aderir aos fundamentos legais da P.I. genericamente expostos.
7 - Deverá ser declarada a nulidade da sentença, uma vez que esta sempre teria de observar, na sua elaboração, os requisitos gerais resultantes da parte final do n.º 3 do artigo. 607.º do C.P.C.

NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO,

Deve o presente Recurso de apelação ser julgado procedente por provado e, em consequência, deve ser anulada a sentença proferida pelo Mmº. Juiz a quo com a refª. 20371318, datado de 22/05/2017, bem como de todo o processado posterior à petição inicial incluindo o saneador/sentença com a refª. 617107, absolvendo-se a Ré do pedido,
OU, quando assim se não entenda, sendo verificada qualquer invalidade processual, deve ser a Ré citada para os efeitos do disposto no art.º 54.º n.ºs 2 a 4 do CPT, e toda a posterior tramitação processual, assim fazendo V.Exªs. a habitual JUSTIÇA.”
Contra alegou a Recorrida defendendo a manutenção da sentença proferida pelo tribunal a quo.
Admitido o recurso na espécie própria e com o adequado regime de subida e efeito devolutivo, foram os autos remetidos a esta 2ª instância.
Foi determinado que se desse cumprimento ao disposto no artigo 87º n.º 3 do C.P.T., tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido douto parecer no sentido da total improcedência da apelação.
A Recorrente respondeu ao douto parecer, pugnando pela sua improcedência e pela procedência da nulidade processual decorrente da falta de citação.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões da Recorrente (artigos 635º, nº 4, 637º n.º 2 e 639º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 87º n.º 1 do CPT), as questões trazidas à apreciação deste Tribunal da Relação são as seguintes:

- Da falta de citação da Ré para comparecer na audiência de partes e da falta de notificação para contestar a acção.
- Da nulidade da sentença por falta de fundamentação;

III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos relevantes para a decisão da causa são os que resultam do relatório supra, acrescido do seguinte facto:

- A Recorrente à data da propositura da acção tinha a sua sede situada na Rua Dr. … Morais.

IV – APRECIAÇÃO DO RECURSO

Da falta de citação da Ré para comparecer na audiência de partes e da falta de notificação para contestar a acção

Antes de mais, incumbe-nos definir o regime processual aplicável aos presentes autos, atendendo à circunstância da presente ação ter dado entrada em tribunal em 22/11/2016, ou seja, depois da entrada em vigor das alterações introduzidas no Código do Processo do Trabalho pelo Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13/10, sendo por isso este regime o aplicável, de harmonia com o disposto no seu artigo 6º. Para efeitos de aplicação supletiva do regime adjetivo comum, esta acção foi instaurada depois da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, que ocorreu no dia 1/9/2013, sendo por isso este o regime aplicável.
Vejamos se no caso se verificou a falta de citação da Ré, já que a este propósito invoca a Recorrente, não ter sido citada nem para a audiência de partes, nem notificada para contestar a presente acção, já que a citação para a audiência de partes foi recebida por uma terceira pessoa, que, de resto, a Recorrente desconhece quem seja e que nunca a informou do facto de ter recebido a citação, tendo apenas por mero acaso tido conhecimento mais tarde da pendência da acção, altura em que juntou aos autos procuração subscrita a favor do seu ilustre mandatário.
Dispõe a al. a) do artigo 187.º do CPC que “É nulo tudo o que se processe depois da petição inicial, salvando-se apenas esta: Quando o réu não tenha sido citado.(…)”.

Estabelece o artigo 188º do CPC o seguinte:

1- Há falta de citação:
a) Quando o ato tenha sido completamente omitido;
b) Quando tenha havido erro de identificação do citando;
c) Quando se tenha empregado indevidamente a citação edital;
d) Quando se mostre que foi efetuada depois do falecimento do citando ou da extinção desta;
e) Quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do ato, por facto que não lhe seja imputável.
2-(…)”.
Nos termos do nº 1 do artigo 191º do CPC “ Sem prejuízo do disposto no artigo 188º, é nula a citação quando não hajam sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei.
Nos termos do artigo 225º n.º 1 do CPC a citação de pessoas singulares é pessoal ou edital.

E prescreve o n.º 2 do citado artigo que:

A citação pessoal é feita mediante:

a) Transmissão eletrónica de dados, nos termos definidos na portaria prevista no nº 1 do artigo 132º;
b) Entrega ao citando de carta registada com aviso de receção, sem depósito, nos termos do nº 5 do artigo 229º, ou certificação da recusa de recebimento, nos termos do nº 3 do mesmo artigo;
c) Contacto pessoal do agente de execução.
Por fim estabelece o n.º 4 do citado artigo que “Nos casos expressamente previstos na lei, é equiparada à citação pessoal efetuada em pessoa diversa do citando, encarregada de lhe transmitir o conteúdo do ato, presumindo-se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve oportuno conhecimento.”
A citada norma é aplicável às pessoas colectivas por força do disposto no artigo 246º do CPC.

No que respeita à citação e notificação as pessoas colectivas prevê ainda o artigo 223º do CPC sob a epígrafe “ Citação ou notificação de incapazes e pessoas coletivas:

1- Os incapazes, os incertos, as pessoas coletivas, as sociedades, os patrimónios autónomos e o condomínio são citados ou notificados na pessoa dos seus legais representantes, sem prejuízo do disposto no artigo 19º.
2- Quando a representação pertença a mais de uma pessoa, ainda que cumulativamente, basta que seja citada ou notificada uma delas, sem prejuízo do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 16º.
3- As pessoas coletivas e as sociedades consideram-se ainda pessoalmente citadas ou notificadas na pessoa de qualquer empregado que se encontre na sede ou local onde funciona normalmente a administração.”
Dos n.ºs 1 e 3 desta disposição legal resulta antes de mais que as sociedades devem ser citadas na pessoa dos seus legais representantes e que as sociedades consideram-se pessoalmente citadas na pessoa de qualquer empregado, que se encontre na sede ou local onde funciona normalmente a administração.

Por fim, importa referir o disposto no art. 246º do CPC que estabelece que o regime de citação de pessoas colectivas é semelhante ao da citação das pessoas singulares, com as devidas adaptações e as especialidades constantes desta disposição legal.
Uma dessas especialidades é precisamente o facto da citação realizada por via postal através de carta registada com aviso de recepção ser feita por carta «endereçada para a sede da citanda inscrita no ficheiro central de pessoas colectivas do Registo Nacional de Pessoas Colectivas» (art.º 246º, nº 2) e não para qualquer outro lugar.
E sendo devolvida a carta, «é repetida a citação, enviando-se nova carta registada com aviso de recepção à citanda e advertindo-a da comunicação constante do nº 2 do artº 230, observando-se o disposto no nº 5 do artigo 229º» (artº 246º, nº 4).

Assim, nesta segunda tentativa de citação deverá resultar claro para a citanda que a citação se considerará validamente efectuada na data certificada pelo distribuidor do serviço postal” (artº 230º, nº 2), que deverá também certificar “o local exacto em que depositou o expediente e remeter de imediato a certidão ao tribunal” (artº 229º, nº 5), com as consequências legalmente aplicáveis, “presumindo-se que o destinatário teve oportuno conhecimento dos elementos que lhe foram deixados(artº 230º, nº 2, in fine).
No caso dos autos não chegou sequer a ser necessário utilizar o mecanismo da segunda tentativa de citação, pois a mesma foi conseguida à primeira, já que a carta foi endereçada para a morada sede da Ré e ai recepcionada por alguém que se comprometeu a entregá-la ao seu destinatário, considerando-se por isso ao abrigo do disposto no artigo 225.º n.º 4 conjugado com o artigo 246.º do CPC presumidamente feita a citação.

Sem margem para dúvida que foram observadas pelo tribunal da 1ª instância as formalidades legais previstas na lei para citação da Ré, estando assim a mesma devida e regularmente citada aquando da realização da audiência de partes, sem que a Recorrente tivesse logrado provar qualquer facto que ilidisse a presunção.
Estando a Ré devidamente citada para audiência de partes e não tendo comparecido, mais não restava à juiz a quo do que determinar a notificação da Ré para contestar a presente acção nos termos previstos nos artigos 56º al. a) e 57º n.º1 do CPT, tal como efectivamente veio a suceder.
Insurge-se ainda a Recorrente quanto ao facto de não ter sido notificada para contestar a presente acção, dizendo que ulteriormente à data designada para audiência de partes também não tomou conhecimento da notificação para contestar, já que não a recebeu.
Importa desde já salientar que no âmbito das acções declarativas de processo comum laboral, como sucede no caso em apreço, a Ré é notificada e não citada para contestar, tal como resulta da alínea a) do artigo 56º al. b) do CPT, pela simples razão que a citação para os termos da acção ocorre quando o réu é convocado para a audiência de parte, tal como resulta do disposto no artigo 54º do CPT, sem que nessa altura se inicie qualquer prazo para o réu se defender.
Estabelece o artigo 249º n.º 1 do CPC (aplicável por força do disposto no artigo 23º do CPT) que no caso de o Réu ser pessoa colectiva e não ter constituído mandatário as notificações são feitas por carta registada, dirigida para a sede, presumindo-se feita no 3º dia posterior ao do registo ou no 1º dia útil seguinte. Estabelecendo o n.º 2 do citado normativo que “a notificação não deixa de produzir os seus efeitos pelo facto do expediente ser devolvido, desde que a remessa tenha sido feita para (…) a sede da parte (…), nesse caso, ou no de a carta não ter sido entregue por ausência do destinatário, juntar-se-á ao processo o sobrescrito, presumindo-se a notificação feita no dia a que se refere a parte final do número anterior”.

Na verdade, o tribunal da 1ª instância observou todas as formalidades legalmente exigidas para a notificação da pessoa colectiva sem mandatário constituído, pois foi determinada a notificação da Ré para contestar e em 14-12-2016, foi expedida carta registada para a morada sede da Ré, com a notificação para contestar no prazo de 10 dias, com a advertência da cominação do n.º 1 do artigo 57º do CPT, não tendo à data da expedição a Ré constituído mandatário, já que tal só veio a suceder no dia 18/04/2017.
Esta carta também não veio a ser devolvida, considerando-se assim devidamente realizada a notificação em conformidade com o n,º 1 do artigo 249.º do CPC, que se tem assim por efectuada no 3º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando o não seja (19/12/2016).
Impõe assim considerar a notificação para a Ré contestar validamente efectuada.
Em suma, quer citação da Ré, quer a notificação para contestar foram efectuadas com observância das formalidades legais prescritas para o caso, sendo certo que cabia à Ré provar que não teve conhecimento ou que não teve oportuno conhecimento dos elementos, no que respeita à citação, por não lhe terem sido entregues. Ou seja cabia-lhe afastar a presunção a que alude o nº 3 do artigo 223.º do CPC demonstrando que a carta enviada para a sua citação não lhe foi oportunamente entregue pela pessoa que a recepcionou e não logrando obter tal prova, impõe-se concluir que não se verifica de forma alguma a nulidade da citação, a que alude o nº 1, do art. 191.º, do Código de Processo Civil.

Por outro lado, incumbindo à Ré demonstrar que não chegou a ter conhecimento da citação, por facto que não lhe é imputável, ilidindo assim a presunção legal, em conformidade com o previsto n artigo 350º n.º 2 do C.C. e não tendo logrado provar tais factos, fica por demonstrar a alegada falta de citação a que se reporta a alínea e) do n.º 1 do artigo 188º do CPC.

Como se refere no sumário do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 09.12.2013, in www.dgsi.pt que embora ainda se reporte às normas do anterior Código de Processo Civil é aplicável ao caso: “I-A citação de uma sociedade, por carta registada com A/R, deve fazer-se na pessoa dos seus legais representantes; porém, pode ser feita na pessoa de qualquer empregado, que se encontre na respectiva sede ou local onde funciona normalmente a administração, cfr. art. 231º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil.

II - Tendo a citação da ré sido efectuada com observância das formalidades legais prescritas para o caso, rege o disposto no art. 238º, nº 1, do Código de Processo Civil e, face ao que se dispõe neste artigo e à regra estabelecida no art. 350º do Código Civil, cabia à ré/apelante demonstrar que a carta enviada para a sua citação não lhe foi oportunamente entregue pela pessoa que a recepcionou, o que não logrou fazer, pelo que não se verifica a falta de citação, a que alude a al. e), do nº 1, do art. 195, do Código de Processo Civil.”

Importa ainda acrescentar que decorre do disposto no n.º 2 do artigo 198.º do CPC. que a nulidade decorrente da falta de citação pode ser arguida em qualquer estado do processo, enquanto não deva considerar-se sanada, dispondo o artigo 189.º do CPC., que se o réu intervier no processo sem arguir logo a falta de citação, considera-se sanada a nulidade, pois o réu tem ou pode ter logo pleno conhecimento do processado, pelo que, optando pela não arguição da falta, não pode deixar de presumir-se iuris et de iure que dela não quer prevalecer-se.

Como refere o Prof. A. dos Reis (Comentário, vol. 2º, pág. 446/447 e CPC Anot., I, 3ª ed., pág. 313), para a arguição da falta de citação não há prazo; enquanto o réu se mantiver em situação de revelia, ou melhor, enquanto se mantiver alheio ao processo, está sempre a tempo de arguir a falta da sua citação, só perdendo o direito de o fazer se intervier no processo e não reagir imediatamente contra ela. J. Rodrigues Bastos (Notas ao Cód. Proc. Civil, 2ª ed., vol. I, pág. 397/398), depois de referir que o réu deve arguir a falta de citação logo que intervenha no processo, isto é, no acto que constitua a sua primeira intervenção, observa que, ainda que o réu tenha conhecimento do processo, desde que não intervenha nele, pode arguir em qualquer altura a falta da sua citação.

Resulta dos autos que a Ré juntou em 18/04/2017, procuração subscrita a favor do seu mandatário, pressupondo-se assim o seu conhecimento da pendência do processo, tal como decorreria da citação, tendo apenas sido proferida sentença em 17/05/2017.

Ora, tendo a Ré praticado acto susceptível de pôr termo à revelia, ao juntar aos autos procuração subscrita a favor do seu ilustre mandatário, sem logo ter arguido a falta de citação, também por esta via tal nulidade sempre seria de considerar de sanada, pois é de presumir que a ré prescindiu conscientemente de arguir a falta de citação. Não colhe de forma alguma a argumentação da Recorrente no sentido de que só teve acesso à plataforma citius depois da prolação da sentença, já que a sua intervenção no processo verificou-se com a junção da procuração, altura em que deveria ter sido arguida a nulidade, sob pena de se considerar sanada.

Neste sentido, também se decidiu, entre outros, no Acórdão da Relação de Évora de 16/04/2015, proferido no Proc. n.º 401/10.6TBETZ.E1; no Acórdão da Relação do Porto de 25/11/2013, proferido no Proc.º n.º192/12.6TBBAO.B.P1 e no Acórdão da Relação de Lisboa de 20/04/2015, proferido no Proc.º n.º 564/14.1TVLSB.L1-2 (disponíveis em www.dgsi.pt), tendo-se consignado neste último o seguinte sumário:

“2. Considera-se sanada a falta de citação, nos termos do artigo 189º do nCPC, sempre que o réu intervier no processo sem arguir logo aquela omissão, entendendo-se por intervenção no processo a prática de acto susceptível de pôr termo a revelia do réu.
3. A junção de procuração a advogado e a notificação deste para os termos do disposto no artigo 567º do nCPC, constituem actos judiciais relevantes que, iniludivelmente, fazem pressupor o conhecimento do processo, permitindo presumir que o réu prescindiu conscientemente de arguir a falta de citação.
4. E manifestamente intempestiva a arguição de nulidade de falta de citação no recurso interposto da decisão final.”

Em face do exposto improcedem as conclusões de recurso de 1 a 4.

- Da nulidade da sentença por falta de fundamentação

A recorrente/apelante veio arguir a nulidade da sentença invocando que a mesma padece de falta de fundamentação – artigo 615º n.º 1 al. b), do CPC. uma vez que se limita a aderir aos fundamentos legais da p.i.
Resulta do nº 4 deste art. 615.º do CPC que a arguição de nulidades (salvo a respeitante à falta de assinatura do juiz) deve ser feita perante o tribunal que proferiu a decisão, se esta não admitir recurso ordinário. Caso contrário, o recurso pode ter como fundamento qualquer uma dessas nulidades.
No entanto o processo laboral tem uma particularidade que resulta do disposto no artigo 77.º n.º 1 do CPT ao prever que a arguição de nulidades da sentença deve ser feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso, sob pena de delas não se conhecer.
Do citado normativo legal resulta que o anúncio da arguição e a correspondente motivação das nulidades deve constar do requerimento de interposição do recurso que é dirigido ao órgão judicial recorrido, de forma a permitir de forma imediata e fácil, da censura invocada, para que se possa proceder ao eventual suprimento da nulidade invocada, nos termos previstos no n.º 3 do citado normativo.
Esta regra do regime da arguição das nulidades da sentença é ditada por razões de economia e celeridade processuais e tem a ver com a faculdade concedida ao juiz de poder sempre suprir a nulidade antes da subida do recurso, conforme prevê o n.º 3 do citado artigo 77.º do CPT
Assim, para que tal faculdade possa ser exercida, importa que a nulidade seja arguida no requerimento de interposição do recurso que é dirigido ao juiz a quo e não nas alegações do recurso que são dirigidas ao tribunal superior, o que implica, naturalmente, que a motivação da arguição também conste daquele requerimento.
Tem sido entendimento pacífico da jurisprudência, o entendimento de que o tribunal superior não deve conhecer da nulidade ou nulidades da sentença que não tenham sido arguidas, expressa e separadamente, no requerimento de interposição do recurso, mas somente nas respectivas alegações - cfr. a título de exemplo, os Acórdãos do STJ de 22/10/2008, 5/11/2014, Proc. n.º 279/08.0TTBCL.P1.S1 e de 14/01/2016, Proc. N.º 359/14.2TTLSB.L1.S1, e Ac da Relação de Coimbra de 10-05-2001, disponíveis em www.dgsi.pt., entre muitos.
Como refere António Santos Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª ed., pág. 540 “…as nulidades da sentença devem ser arguidas expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso, como o determina o art. 77.º, n.º 1, do CPT, exigência que vem sendo interpretada de forma rigorosa e cujo incumprimento determina o não conhecimento das mesmas. Neste sentido cfr. os Acs. do STJ, de 17/06/2010, de 27/05/10, de 27-03-14, de 16-06-15 e de 1-10-15(www.dgsi.pt).
Na verdade, verificamos no caso sub judice que a recorrente não arguiu a referida nulidade no requerimento de interposição de recurso, tendo por isso desrespeitado o imperativamente estatuído no n.ºs 1 e 3 do artigo 77.º do CPT, já que veio arguir a nulidade da sentença no corpo das suas alegações e nas respectivas conclusões do recurso.
Em suma, a Recorrente, não incluiu, como exige o citado artigo art.77º, nº 1, do C.P.T., no requerimento de interposição do recurso, a autónoma motivação da arguição, o que torna extemporânea a arguição da nulidade e obsta a que delas se conheça – vd. Neste sentido o recente Acórdão do STJ de 22/02/2017, Proc. n.º 5384/15.3T8GMR.G1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
Contudo sempre se dirá que não se verifica a pretensa nulidade por falta de fundamentação da sentença, pois ao contrário do que estaria obrigada a Mmª Juiz a quo, por estarmos perante uma acção não contestada, podia a fundamentação da sentença ser feita mediante simples adesão ao alegado pelo autor, o certo é que tal não sucedeu, já que de forma especificada, suficiente, clara e precisa se fundamentou quer a decisão de facto, quer a de direito que conduziu à condenação parcial da Ré no pedido.
Em face do exposto se decide não conhecer da arguida nulidade, não se apreciando por isso as conclusões 5 a 7 do recurso de apelação.
Improcede, assim, quer a arguida falta de citação, quer a nulidade da citação.

V – DECISÃO

Pelo exposto e ao abrigo do disposto nos artigos 87º do C.P.T. e 663º do C.P.C., acorda-se, neste Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso de apelação interposto por Empresa X, Sociedade Unipessoal, LDA., confirmando-se na íntegra a decisão recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Guimarães, 1 de Fevereiro de 2018


Vera Maria Sottomayor (relatora)
Antero Dinis Ramos Veiga
Alda Martins


Sumário – artigo 663º n.º 7 do C.P.C.

I - Dos n.ºs 1 e 3 do artigo 223.º do CPC resulta antes de mais que as sociedades devem ser citadas na pessoa dos seus legais representantes, mas também se consideram pessoalmente citadas na pessoa de qualquer empregado, que se encontre na sede ou local onde funciona normalmente a administração.
II- O disposto no art. 246.º do CPC que estabelece que o regime de citação de pessoas colectivas é semelhante ao da citação das pessoas singulares, com as devidas adaptações e as especialidades constantes desta disposição legal.
III – Tendo a carta para citação da Ré sido endereçada para a morada sede desta e ai recepcionada por alguém que se comprometeu a entregá-la ao seu destinatário, considera-se ao abrigo do disposto no artigo 225.º n.º 4 conjugado com o artigo 246.º do CPC presumidamente feita a citação.
IV - Incumbindo à Ré demonstrar que não chegou a ter conhecimento da citação, por facto que não lhe é imputável, ilidindo assim a presunção legal, em conformidade com o previsto n artigo 350º n.º 2 do C.C. e não tendo logrado provar tais factos, fica por demonstrar a alegada falta de citação a que se reporta a alínea e) do n.º 1 do artigo 188º do CPC.
V - Tendo a Ré junto procuração aos autos, sem logo ter arguido a falta de citação, também por esta via tal nulidade sempre seria de considerar de sanada, em conformidade com o preceituado no artigo 189.º do CPC, já que a junção da procuração a advogado constitui a prática de um acto judicial relevante, sendo de presumir que a ré prescindiu de arguir a falta de citação.
VI - Decorre do disposto no n.º 1 do artigo 77º do CPT. que a arguição de nulidade da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso.
VII – Se a Recorrente não incluir no requerimento de interposição de recurso a arguição da nulidade e respectiva motivação, é de considerar extemporânea a arguição que seja feita apenas nas alegações de recurso, não sendo por isso de conhecer de tal nulidade.

Vera Sottomayor