Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2241/22.0T8VCT.G1
Relator: ALCIDES RODRIGUES
Descritores: CONTRATO DE ARRENDAMENTO
ATUALIZAÇÃO DA RENDA
COMUNICAÇÃO DO SENHORIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/22/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Quando pretenda a transição do contrato de arrendamento para o NRAU e a actualização da renda, a comunicação do senhorio, prevista no art. 50.º do NRAU, deve indicar todos os elementos elencados nas suas diversas alíneas.
II - A falta dos requisitos materiais da comunicação inicial do senhorio, previstos no citado art. 50.º do NRAU, tem como consequência a ineficácia da comunicação, tudo se passando como se ela não tivesse sido feita.
III - Nesse caso, a resposta do arrendatário, na qual comunicou a denúncia do contrato de arrendamento, não tem o condão de reverter a ineficácia da comunicação remetida pela recorrente, já que esta carecia de requisitos essenciais de que a lei faz depender a respectiva eficácia.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

A Santa Casa da Misericórdia ... intentou contra AA e mulher, BB, a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, peticionando que: (i) se declare que a Autora é dona e legítima possuidora do prédio identificado no artigo 1º, da petição inicial; (ii) se condenem os Réus a reconhecer a posse e o direito de propriedade da Autora sobre o identificado prédio; (iii) se declare que o contrato de arrendamento identificado no artigo 7º da petição inicial cessou por denúncia operada pelo Réu marido em 02.04.2015, com efeitos a partir de 02.07.2015; (iv) se declare que os Réus não têm direito a receber da Autora a quantia de € 102.672,02, reclamada a título de indemnização por benfeitorias; (v) se condenem os Réus ao pagamento de indemnização não inferior a € 60.000,00 pelos prejuízos causados à Autora pela demora na entrega do imóvel; (vi) subsidiariamente, e para o caso de se entender que os Réus têm direito a receber alguma indemnização por benfeitorias, a sua condenação a entregar à Autora o prédio identificado no artigo 1º da petição, logo que lhe seja paga por esta a indemnização que lhe vier a ser reconhecida; (vii) se condene o Réu marido a pagar à Autora um valor equivalente à renda mensal em vigor na data da denúncia do contrato de arrendamento - € 106,00 – a título de indemnização pela mora na entrega do locado, por cada mês que decorrer entre a data da entrada desta acção e a efectiva entrega do locado (ref.ª ...08 - fls. 2 a 10).
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Citados, os Réus apresentaram contestação na qual excepcionaram a ineficácia das declarações de 02.03.2015 e de 02.04.2015, impugnando parte da matéria de facto alegada e deduzindo reconvenção nos termos da qual peticionam (i) a condenação da Autora a pagar aos Réus a quantia de € 233.308,40, a título de indemnização pelas benfeitorias realizadas no imóvel e (ii) o reconhecimento do direito dos Réus de reterem o locado até ao pagamento da peticionada indemnização (ref.ª ...83 - fls. 34 a 59).
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A Autora apresentou réplica à reconvenção (ref.ª ...17 - fls. 69 a 78), pugnando a) pela admissão do pedido reconvencional apenas de acordo com o alegado na réplica; b) pela improcedência do pedido de condenação por litigância de má-fé formulado pelos réus; c) No mais, concluindo como na petição inicial.
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Foi realizada a audiência prévia, na qual foi concedido à Autora prazo para se pronunciar quanto às excepções invocadas pelos Réus (ref.ª ...35 - fls. 84).
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A Autora respondeu à exceção, concluindo pela sua improcedência (ref.ª ...73 - fls. 85 a 88).
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De seguida, e depois de ter admitido a reconvenção, o Mm.º Julgador “a quo” proferiu despacho saneador/sentença, nos termos do qual decidiu (ref.ª ...99 - fls. 89 a 93):
Julgar a acção proposta parcialmente procedente, e, consequentemente:
- Declarou a Autora dona e legítima proprietária do prédio urbano descrito na alínea a), do ponto II.1.;
- Absolveu os Réus do demais peticionado.
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Inconformada com o despacho saneador/sentença, dele interpôs recurso a Autora (ref.ª ...09 - fls. 94 a 105) tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos, na parte em que julgou a acção parcialmente improcedente e absolveu os Réus do demais peticionado e, concretamente, dos pedidos de (a) declaração de que o contrato de arrendamento identificado no artigo 7.º da petição inicial cessou por denúncia operada pelo Réu marido em 02/04/2015, com efeitos a partir de 02/07/2015, (b) de declaração de que os Réus não têm direito a receber da Autora a quantia de 102 672,02 €, reclamada a título de indemnização por benfeitorias e (c) de condenação dos Réus no pagamento de indemnização não inferior a 60 000,00 €, pelos prejuízos causados à Autora pela demora na entrega do imóvel; e, por fim, a título subsidiário e para o caso de se entender que os Réus têm direito a receber alguma indemnização por benfeitorias, (d) o pedido de condenação dos Réus a entregar à Autora o prédio identificado no artigo 1.º da petição inicial, logo que lhe seja paga por esta a indemnização que lhe vier a ser reconhecida, bem como (e) o pedido de condenação do Réu marido a pagar à Autora um valor equivalente à renda mensal em vigor na data da denúncia do contrato de arrendamento - € 106,00 – a título de indemnização pela mora na entrega do locado, por cada mês que decorrer entre a data da entrada desta acção e a efectiva entrega do arrendado.
2. Deve ter-se como ponto de partida interpretativo que, de acordo com o disposto no art. 9.º, n.º 3 do Cód. Civil, “Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”.
3. A segunda premissa a levar em conta é a de que, tradicionalmente, o legislador oferece uma protecção legal mais reforçada ao arrendamento para habitação do que ao arrendamento para comércio e indústria, já que este último tem uma grande amplitude de liberdade contratual, ao passo que àquele tem vários capítulos da lei civil dedicados, com disposições legais de natureza imperativa.
4. O art. 50.º do NRAU, que se refere à transição do arrendamento para o NRAU, no âmbito do arrendamento para fim não habitacional, não comina a falta de algum dos elementos aí previstos com ineficácia, já que essa norma legal, contrariamente ao art. 30.º do NRAU, não contém a expressão “sob pena de ineficácia da sua comunicação”.
5. Assim, o elemento literal da interpretação jurídica aponta para a seguinte conclusão: no âmbito do arrendamento habitacional, porque mais tutelado pelo legislador, a falta de elementos a que alude o art. 30.º do NRAU é causa de ineficácia da comunicação; no âmbito do arrendamento para outros fins, porque menos tutelado pelo legislador, a falta de algum dos elementos não         implica necessariamente a ineficácia da declaração.
6. Deve estar subjacente à interpretação jurídica a circunstância de que o legislador, ao prever uma determinada solução legal, age sempre com uma ratio legis, ou seja, com o propósito de acautelar algum interesse. A interpretação jurídica deve, pois, considerar sempre o elemento teleológico, qual seja o propósito visado pelo legislador ao prever uma determinada solução legal.
7. No caso do art. 50.º do NRAU, na sequência da alteração legislativa operada menos de 2 (dois) meses antes do envio das missivas de transição do contrato para o NRAU, notou-se um propósito do legislador de assegurar que o arrendatário, ao receber a comunicação de transição, é suficientemente alertado para os riscos e consequências da omissão de resposta.
8. Olhando à teleologia subjacente à norma do art. 50.º do NRAU, pode concluir-se, com o necessário grau de certeza, que o legislador, ao configurar o teor da comunicação de transição para o NRAU, não previu tal exigência como um fim em si mesmo. Pelo contrário, a exigência de conteúdo prevista nas diversas alíneas do art. 50.º do NRAU não é um fim em si mesma, antes visando um propósito claro do legislador (este sim, o fim de tal previsão legal), que é o de assegurar que os inquilinos são totalmente esclarecidos quanto às consequências jurídicas da comunicação prevista naquela disposição e, em particular, quanto àquilo que poderá suceder na ausência de resposta à mesma.
9. A partir do momento em que a carta do Réu marido revela esse conhecimento, tem-se por plenamente cumprido o desiderato visado pelo legislador ao prever a norma do art. 50.º do NRAU, o que, aliado à circunstância de, contrariamente ao regime do art. 30.º do NRAU, não estar aqui expressamente prevista a ineficácia da comunicação, torna certa e segura a conclusão de que sancionar a falta de elementos do art. 50.º do NRAU com vício de ineficácia contende com aquela disposição legal.
10. Há um outro argumento que aponta para a inexistência de qualquer prejuízo para os Réus, decorrente da inobservância integral do disposto no art. 50.º do NRAU. Concretamente, o valor de renda proposto é aquele que resultaria da circunstância de    o estabelecimento ser eventualmente uma microentidade. Por outras palavras, na fixação da renda, a Autora limitou-se a sugerir o pagamento de 918,06 €, que, olhando ao VPT do arrendado, mais não é do que a divisão desse valor por 15 (quinze) para achar o valor anual da renda, talqualmente previsto no art. 54.º, 2 do NRAU, que remete para o art. 35.º, n.º 2, als. a) e b) do NRAU, que, na redacção então em vigor, estabeleciam que o valor máximo anual da renda actualizada não poderia exceder 1/15 do VPT do locado.
11. O que se vem de expor não é infirmado pela jurisprudência citada na douta sentença recorrida, que tem como denominador comum o facto de, nos casos aí citados, os arrendatários não terem respondido à carta de transição do contrato de arrendamento para o NRAU ou não estarem devidamente esclarecidos quanto ao alcance de tal comunicação – o que manifestamente não corresponde ao caso dos autos.
12. Em súmula, a decisão recorrida, quer por recurso ao elemento literal, quer ao teleológico da interpretação jurídica, violou o art. 50.º do NRAU, pelo que deve ser revogada e substituída, nessa parte, por decisão que determine o prosseguimento dos autos até final, para conhecimento do mérito dos demais pedidos.
13. Só após a instauração desta acção e volvidos mais de sete anos sobre o envio da comunicação de transição para o NRAU é que os Réus se lembraram de questionar a validade da comunicação de transição para o NRAU, mesmo depois de terem denunciado o contrato de arrendamento.
14. Tal conduta não é curial e muito menos aceitável, pelo menos levando em conta o quadro de diligência e rectidão que deverá presidir a qualquer negociação.
15. Vir levantar a questão da ineficácia sete anos volvidos e após a prática de actos (em concreto, a denúncia contratual) que revelam perfeito conhecimento do regime legal aplicável, equivale a adoptar uma conduta que fica a dever, e muito, à boa-fé negocial.
16. A douta sentença recorrida, ao dar cobertura a uma tal conduta, contendeu com o princípio da boa-fé e, ademais, com o regime do art. 334.º, n.º 1 do Cód. Civil. E isso, aliado à circunstância de a douta sentença recorrida ter dado primazia à forma sobre a substância, é quanto baste para determinar a revogação de tal decisão e sua substituição por Douto Acórdão que determine o prosseguimento dos autos até final, para conhecimento do mérito dos demais pedidos.
17. O contrato de arrendamento mostra-se definitivamente cessado, por ter sido denunciado pelo Réu marido, que se limitou, em fase extrajudicial, a exercer um mero direito de retenção, como garantia da indemnização que reclama por benfeitorias supostamente executadas no arrendado.
18. A declaração de denúncia de um contrato de arrendamento é uma declaração negocial receptícia, o que significa que, tendo o contrato de arrendamento sido definitivamente denunciado pelo Réu marido, por sua própria iniciativa e escolha, mostra-se prejudicada a questão da eficácia da transição do contrato para o NRAU, porque situada a montante desta.
19. Não obsta a essa conclusão a falta de comunicação da transição do contrato para o NRAU à Ré esposa, já que a questão que se terá de colocar é se, tendo o Réu marido tomado a iniciativa de denunciar o contrato de arrendamento, o mesmo teria poderes de administração bastantes para operar tal denúncia.
20. O art. 1678.º do Cód. Civil define o modo de administração dos bens comuns do casal, tanto no regime da comunhão de adquiridos como no da comunhão geral, sendo que o n.º 4 desse artigo estabelece que “Fora dos casos previstos no número anterior, cada um dos cônjuges tem legitimidade para a prática de actos de administração ordinária relativamente aos bens comuns do casal; os restantes actos de administração só podem ser praticados com o consentimento de ambos os cônjuges.”
21. Atento o disposto no n.º 4 do art. 1678.º do Cód. Civil, os actos de administração ordinária de bens comuns do casal podem ser praticados por qualquer um dos cônjuges.
22. A denúncia do contrato de arrendamento, tal como a celebração de um contrato de arrendamento, é inquestionavelmente um acto administração ordinária – remete-se, a respeito do tema, para o Douto Ac. TRP de 09/09/2013.
23. Por essa razão, a denúncia do contrato de arrendamento dos autos, ainda que realizada apenas pelo cônjuge marido, como acto de administração ordinária que é, produziu plenos efeitos.
24. A Ré mulher limitou-se a invocar a questão da ineficácia da comunicação de transição do contrato para o NRAU, ou seja, não alegou qualquer facto do qual se pudesse inferir uma suposta discordância quanto à denúncia contratual operada pelo seu marido.
25. No limite, a ter-se por válida a tese vertida na douta contestação, a denúncia contratual operada pelo Réu marido poderia, em tese, ter sido emitida com erro sobre os motivos – designadamente, se o mesmo alegasse que denunciou o contrato no pressuposto da eficácia da comunicação de transição para o NRAU, bem como a essencialidade desse erro, e, por fim, peticionasse a anulação de tal declaração negocial, ao abrigo do regime do art. 252.º, n.º 1 do Cód. Civil.
26. Sucede que os Réus não alegaram factos susceptíveis de serem subsumidos a qualquer dos conceitos de erro previstos na lei civil. Estão, por isso, inibidos de provar tais factos. E, por fim, não peticionaram sequer a anulação da declaração negocial, consubstanciada na denúncia do contrato de arrendamento por si operada.
27. Esse é outro argumento desconsiderado na douta sentença recorrida, na medida em que, não tendo sido suscitado qualquer vício quanto à denúncia contratual operada, a mesma não poderia deixar de ter-se por realizada, o que equivale a dizer que, ao abster-se de declarar valida essa denúncia e de tomar posição sobre os demais pedidos, a douta sentença recorrida violou, entre outras, a norma do art. 1678.º, n.º 4 do Cód. Civil.
28. Daí que se imponha, também por aí, a revogação de tal decisão e sua substituição por Douto Acórdão que determine o prosseguimento dos autos até final, para conhecimento do mérito dos demais pedidos.
Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente, com a consequente revogação da douta sentença recorrida, na parte visada por este recurso, e sua substituição por Douto Acórdão que esteja em conformidade com as conclusões acima formuladas,
com o que se fará Justiça!».
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Contra-alegaram os recorridos, pugnando pelo não provimento do recurso e manutenção da sentença recorrida (ref.ª ...04 - fls. 106 a 124).
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo (ref.ª ...95 - fls. 125).
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Foram colhidos os vistos legais.
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II. Delimitação do objeto do recurso             

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do(a) recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber:               

No caso, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber:         
i. Da violação do art. 50.º do Novo Regime do Arrendamento Urbano;
ii. Da violação do princípio da boa-fé e /ou do abuso de direito;
iii. Da validade e eficácia de denúncia contratual operada pelo Réu marido.
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III. Fundamentos
IV. Fundamentação de facto.

1 – A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:
a) Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o nº ...06, um prédio urbano, composto de rés-do-chão e ... andar, para habitação, comércio escritório e quintal, com a área total de 530 m2, conforme descrição constante da certidão junta aos autos como documento nº ... da petição e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
b) A aquisição do direito de propriedade incidente sobre o prédio supra descrito encontra-se inscrita a favor da Autora mediante a Ap. ... de 2007/02/06, conforme descrição constante da certidão junta aos autos como documento nº ... da petição e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
c) Por escritura pública outorgada em 12.11.74, no Cartório Notarial ..., a Autora deu de arrendamento a CC, ao Réu AA e a DD o prédio identificado na alínea a), nos termos e condições que constam da cópia da mencionada escritura pública junta aos autos como documento nº ... da petição e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
d) A Autora remeteu ao Réu marido, em 02.03.2015, a missiva cuja cópia se encontra junta aos autos como documento nº ... da petição e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
e) O Réu marido remeteu à Autora, em 02.04.2015, a missiva cuja cópia se encontra junta aos autos como documento nº ... da petição e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
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V. Fundamentação de direito.

1. – Da violação do art. 50.º do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU).
Na sentença recorrida entendeu-se que, dado que a carta de comunicação da transição do contrato de arrendamento para o NRAU e alteração do valor da renda não continha a totalidade dos elementos previstos no art. 50.º do NRAU, tal comunicação ficou ferida de ineficácia.
A recorrente discorda desse entendimento, no essencial, por duas razões:
a) Porque tal interpretação da lei contende com o texto do art. 50.º do NRAU, ou seja, o elemento literal não permite concluir pela ineficácia, já que, contrariamente ao art. 30.º do NRAU, o art. 50.º desse diploma não sanciona a falta de algum desses elementos com sanção de ineficácia;
b) Porque tal interpretação da lei contende com o elemento teleológico, necessariamente subjacente à interpretação jurídica.
Vejamos.
A norma impugnada (art. 50.º do NRAU) inscreve-se no âmbito do regime que disciplina o procedimento facultado ao senhorio para fazer transitar para o NRAU, com as especificidades a que alude o art. 28.º da Lei n.º 6/2006, na versão resultante da Lei n.º 79/2014, de 19/12, os contratos de arrendamento para fins não habitacionais celebrados antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de setembro.
Para melhor compreender o sentido e alcance da solução em causa, há determinados aspetos do regime do contrato de arrendamento urbano para habitação e para fins não habitacionais e, sobretudo, da evolução que os mesmos conheceram a partir da Lei n.º 6/2006, que convém começar por considerar.
As regras relativas ao arrendamento urbano deixaram, em 1990, de estar contidas no Código Civil (CC) – nos arts. 1083.º a 1120.º – e passaram, com modificações, a integrar um diploma específico, o Regime do Arrendamento Urbano – RAU (aprovado pelo Dec. Lei n.º 321-B/90, de 15 de outubro).
Já o arrendamento para fins não habitacionais (arts. 110.º ss. do RAU) sofreu modificações relevantes com o Dec. Lei n.º 257/95, de 30/09.
O regime dos contratos de arrendamento para habitação tinha um pendor acentuadamente vinculístico e caracterizado pela imposição de um significativo conjunto de restrições à liberdade contratual das partes, tendo em vista a estabilidade do vínculo contratual e a proteção da posição habitacional do locatário. No art. 1095.º do CC estabelecia-se então um princípio de prorrogação obrigatória ou automática dos contratos de arrendamento, impondo-se a respetiva renovação ao locador findo o prazo de duração convencionado pelas partes ou supletivamente estabelecido na lei. A faculdade de denúncia livre e discricionária do contrato encontrava-se, por isso, reservada em exclusivo ao arrendatário, ao senhorio apenas assistindo o direito de se opor à renovação do vínculo locatício nas hipóteses, muito excecionais, então previstas no n.º 1 do art. 1096.º do referido Código[1].
Com a entrada em vigor do RAU (em sede habitacional) e do Dec. Lei n.º 257/95 (em sede não habitacional), veio dar-se a possibilidade às partes de escolher uma outra via negocial (para além da vinculista): a dos contratos de duração limitada (arts. 98.º a 106.º e 117º, n.º 2). A par do regime vinculístico, que deixou de ser imperativo e acabou por converter-se numa escolha cada vez menos frequente das partes, o ordenamento jurídico passou a contemplar a possibilidade de celebração de contratos de arrendamento, pelo prazo mínimo de 5 anos, que qualquer das partes podia denunciar livremente caso não desejasse a sua renovação (art. 100.º, n.º 1)[2].
Os arrendamentos para comércio, indústria, exercício de profissões liberais e outros fins não habitacionais apenas passaram a poder ser celebrados em regime de duração limitada a partir da entrada em vigor do Dec. Lei n.º 275/95 (a partir de 30 de setembro de 1995). Só a partir daí passou a existir a alternativa entre o regime vinculístico e um regime de contratos a prazo, que as partes podiam livremente extinguir caso não desejassem a sua renovação[3] [4].
Tal faculdade não era, todavia, aplicável aos contratos celebrados antes da sua entrada em vigor (art. 6º do Dec. Lei n.º 275/95).
Com a aprovação do NRAU, levada a cabo pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro – que entrou em vigor no dia 28 de junho –, o regime vinculístico foi em larga medida abandonado. «De acordo com as novas regras consagradas no artigo 1101.º do Código Civil, ao senhorio passou a assistir o direito de denunciar o contrato, não apenas com fundamento na verificação de determinadas circunstâncias excecionais, mas ainda em termos potestativos e discricionários — isto é, independentemente da ocorrência de qualquer causa justificativa —, desde que observada na exigida comunicação ao arrendatário a antecedência mínima de cinco anos sobre a data em que pretenda a cessação (…).
Tendo em vista o acautelamento dos vínculos locatícios preteritamente constituídos, o NRAU estabeleceu, todavia, um regime transitório para os contratos de arrendamento celebrados antes da entrada em vigor da Lei n.º 6/2006, distinguindo, no âmbito do arrendamento para habitação, entre contratos habitacionais celebrados na vigência do RAU (artigo 26.º da Lei n.º 6/2006) e contratos habitacionais com início antes dessa vigência (artigos 27.º a 49.º na mesma Lei).
A Lei n.º 6/[2006] foi subsequentemente modificada pela Lei n.º 31/2012, cujo intuito foi o de promover a dinamização do mercado de arrendamento urbano através da alteração, quer do regime substantivo da locação, no sentido de conferir maior liberdade às partes na estipulação das regras relativas à duração dos contratos de arrendamento, quer do próprio regime transitório aplicável aos contratos de pretérito, reforçando a negociação entre as partes e facilitando a transição dos referidos contratos para o novo regime, num curto espaço de tempo (artigo 1.º, alíneas a) e b), da Lei n.º 31/2012). É o que resulta da Exposição de Motivos que acompanhou a Proposta de Lei n.º 38/XII, que, juntamente com o Projeto de Lei n.º 144/XII, esteve na génese da Lei n.º 31/2012. Tratou-se, conforme ali referido, da aprovação de um «amplo e profundo conjunto de reformas» orientado para a «dinamização do mercado de arrendamento», que contemplou, como um dos seus quatro vetores essenciais, a «revisão do sistema de transição dos contratos antigos para o novo regime»[5] [6] [7].
Na verdade, a citada Lei n.º 31/2012 introduziu profundas alterações em matéria de correção extraordinária das rendas nos contratos mais antigos por iniciativa do senhorio, estabelecendo também amplas possibilidades de tais contratos deixarem de ter impedimentos ao direito de livre denúncia do senhorio (o que a lei designa como transição para o NRAU), conferindo ainda ao senhorio o direito de denunciar o contrato mediante o pagamento de uma indemnização, quando as partes não cheguem a acordo quanto ao valor de uma nova renda.
Tais disposições – previstas no arrendamento para habitação nos arts. 30º a 37º e no arrendamento para fins não habitacionais nos arts. 50º a 54º – autorizam modificações de elementos objetivos do contrato ou mesmo a sua extinção, desde que o senhorio tome a iniciativa de desencadear a aplicação de tal procedimento negocial. O legislador não estabeleceu uma alteração imperativa do estatuto dessas matérias. Optou antes por conferir ao senhorio a faculdade de activar ou não a aplicação desse procedimento[8].
Apesar de o regime de transição para o NRAU e atualização das rendas conter, ainda, a base da reforma estabelecida pela Lei n.° 31/2012, certo é que as posteriores alterações tem atenuado o pendor liberal que havia sido dado a esta matéria[9]. No que aqui releva, a Lei n.º 79/2014, de 19 de dezembro, alargou este regime aos contratos de arrendamento não habitacionais e onerou o senhorio com uma maior burocracia procedimental em todo o processo de transição para o NRAU e atualização das rendas, tendo em vista a tutela do arrendatário.
Vejamos, então, o regime atinente à transição para o NRAU e atualização das rendas.
Por forma a corrigir a situação de desactualização das rendas dos contratos de arrendamento habitacionais celebrados antes da vigência do Regime do Arrendamento Urbano (RAU) – aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90 de 15 de outubro – e aos contratos não habitacionais celebrados antes da vigência do Decreto-Lei n.º 257/95 de 30 de setembro, a Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto (mantida na versão da Lei n.º 79/2014, de 19 de Dezembro, aplicável in casu) veio permitir ao senhorio efetuar a transição para o NRAU de tais contratos e a actualização das respectivas rendas, por sua iniciativa, o que foi consagrado nos arts. 30º e seguintes e 50.º e seguintes do NRAU[10].
Para os contratos sem duração limitada, mais antigos, portanto – anteriores ao Regime do Arrendamento Urbano (RAU) e ao regime do Decreto-Lei n.º 257/95 –, valem as regras transitórias expressas nos arts. 27.º a 29.º do NRAU, em especial a regra do art. 28.º, na parte em que este preceito remete para a aplicação do regime previsto no art. 26.º; a ideia chave da reforma de 2012 consistiu na possibilidade de aqueles contratos, inicialmente vinculísticos, poderem passar a um regime aberto, não vinculístico, decorridos certos prazos e com sujeição a uma actualização extraordinária da retribuição mensal, diversa da actualização ordinária prevista nos arts. 1077.º do CC e 24.º do NRAU, estando essa mudança dependente da iniciativa do senhorio e sujeita a determinados requisitos formais e materiais[11].
Referente aos arrendamentos para fins não habitacionais – celebrados antes da vigência do Decreto-Lei n.º 257/95 de 30/09 –, dispõe o art. 50º (“Iniciativa do senhorio[12]) do NRAU:
«A transição para o NRAU e a atualização da renda dependem de iniciativa do senhorio, que deve comunicar a sua intenção ao arrendatário, indicando:
a) O valor da renda, o tipo e a duração do contrato propostos;
b) O valor do locado, avaliado nos termos dos artigos 38.º e seguintes do CIMI, constante da caderneta predial urbana;
c) Cópia da caderneta predial urbana;
d) Que o prazo de resposta é de 30 dias;
e) O conteúdo que pode apresentar a resposta, nos termos do n.º 3 do artigo seguinte;
f) As circunstâncias que o arrendatário pode invocar, isolada ou conjuntamente com a resposta prevista na alínea anterior, e no mesmo prazo, conforme previsto no n.º 4 do artigo seguinte, e a necessidade de serem apresentados os respetivos documentos comprovativos, nos termos do disposto no n.º 6 do mesmo artigo;
g) As consequências da falta de resposta, bem como da não invocação de qualquer das circunstâncias previstas no n.º 4 do artigo seguinte».
Como se dá nota no citado Ac. do TC n.º 393/2020, de 13/07/2020 (relatora Joana Fernandes Costa), ao contrário do que sucede com os contratos celebrados durante a vigência do RAU (e do Decreto-Lei n.º 257/95, acrescentaríamos nós para efeitos do caso ajuizado) todos os contratos celebrados ao abrigo do regime vinculístico são contratos com duração indeterminada.
É essa a razão pela qual, apesar de uns e outros passarem a estar submetidos ao NRAU, a Lei n.º 31/2002 veio estabelecer para os arrendamentos vinculísticos um mecanismo especial de transição para o NRAU, destinado a viabilizar a respetiva conversão em contratos com prazo certo.
Este mecanismo especial de transição para o NRAU dos contratos celebrados ao abrigo do regime vinculístico, suscetível de originar tanto a respetiva transformação em contratos de duração limitada, como a atualização do valor da renda, foi colocado na dependência da iniciativa do senhorio, ao qual foi conferido o direito, necessariamente potestativo, de desencadear o procedimento negocial para o efeito regulado nos artigos 30º a 37º (arrendamentos para habitação) e 50.º a 54.º (arrendamentos para fins não habitacionais).
O procedimento é, assim, iniciado pelo senhorio, que deverá comunicar ao arrendatário, através de escrito por si assinado e remetido por carta registada com aviso de receção ou entregue em mão (art. 9.º, n.ºs 1 e 6), a sua intenção de fazer transitar o contrato para o NRAU e a atualização da renda, indicando os elementos mencionados no art. 50.º[13].
«A especificidade e o rigor impresso às formalidades exigidas explicam-se, em boa parte, pela circunstância de este não configurar um procedimento ordinário, mas antes um procedimento tendente a uma actualização extraordinária da renda.
A razão de ser da exigência da comunicação do valor do locado, avaliado nos termos dos artigos 38.º e seguintes do CIMI, prende-se com a possibilidade de esse valor vir a ser determinante no cálculo da renda, nas situações previstas nos artigos 33.º, n.º 5, al. b), 35.º, n.º 2, als. a), e b), 54.º, n.º 2, do NRAU, especialmente, quando se verifique oposição do arrendatário (…) [sendo, ainda, relevante para a ponderação que o arrendatário tem a efetuar].
(…)
No presente caso, os factos que permitem concluir pela legalidade do procedimento são constitutivos do direito que o senhorio pretende fazer valer direito à actualização/aumento de renda -, pelo que sobre si impende o ónus da respectiva alegação e prova (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil). (…)
A razão da complexidade do processo de actualização das rendas nos contratos anteriores a 1990 [ou anteriores a 1995, no caso dos contratos de arrendamento não habitacionais] prende-se com o facto de, por um lado, não se tratar de um mero aumento da renda, pois que em causa está também a negociação de um novo contrato integrado num verdadeiro processo negocial obrigatório, e, por outro lado, com a necessária e articulada conjugação entre o mercado do arrendamento e a avaliação fiscal do património a tributar. (…)
A falta dos requisitos materiais previstos no citado artigo 50.° ou o não cumprimento das regras relativas à forma e destinatário da comunicação tem como consequência a ineficácia da comunicação, tudo se passando como se ela não tivesse sido feita»[14].
À referida comunicação do senhorio poderá o arrendatário responder no prazo de 30 dias, exercendo, de acordo com o disposto no n.º 3 do art. 51.º do NRAU, alguma(s) das seguintes faculdades:
«a) Aceitar o valor da renda proposto pelo senhorio;
b) Opor-se ao valor da renda proposto pelo senhorio, propondo um novo valor, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 52.º;
c) Em qualquer dos casos previstos nas alíneas anteriores, pronunciar-se quanto ao tipo ou à duração do contrato propostos pelo senhorio;
d) Denunciar o contrato de arrendamento, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 53.º.
4 - Se for caso disso, o arrendatário deve ainda, na sua resposta, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 54.º, invocar uma das seguintes circunstâncias:
a) Que existe no locado um estabelecimento comercial aberto ao público e que é uma microempresa;
b) Que no locado funciona uma pessoa coletiva de direito privado sem fins lucrativos, regularmente constituída, que se dedica à atividade cultural, recreativa, de solidariedade social ou desportiva não profissional, e declarada de interesse público ou de interesse nacional ou municipal, ou uma pessoa coletiva de direito privado que prossiga uma atividade declarada de interesse nacional;
c) Que o locado funciona como casa fruída por república de estudantes, nos termos previstos na Lei n.º 2/82, de 15 de janeiro, alterada pela Lei n.º 12/85, de 20 de junho.
d) Que existe no locado um estabelecimento ou uma entidade de interesse histórico e cultural ou social local reconhecidos pelo município, nos termos do respetivo regime jurídico».
Caso o arrendatário não reaja à comunicação do senhorio, a falta de resposta do arrendatário vale como aceitação da renda, bem como do tipo e da duração do contrato propostos pelo senhorio, ficando o contrato submetido ao NRAU a partir do 1.º dia do 2.º mês seguinte ao do termo do prazo previsto nos n.ºs 1 e 2 do art. 31º (n.º 9º do art. 31º “ex vi” do n.º 7º do art. 51º do NRAU).
Da análise da evolução do regime do arrendamento urbano para fins não habitacionais que vimos efetuando duas conclusões parecem resultar evidentes[15]: a primeira é que, do ponto de vista do arrendatário e da tutela da sua posição arrendatícia, a transição para o NRAU do contrato celebrado antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 257/95 através do mecanismo negocial regulado nos arts. 50.º a 54.º do NRAU e, sobretudo, a possibilidade da sua conversão em contrato com prazo certo, está longe de poder ser considerada inócua; a segunda, é que aquela transição poderá revelar-se tanto mais gravosa para o locatário quanto menor for o nível da sua participação no âmbito do processo negocial iniciado pelo senhorio com vista a promover essa transição.
Os contratos não habitacionais (exclusivamente vinculísticos) celebrados antes da vigência do Dec.-Lei n.º 257/95, ao transitarem para o NRAU, podem, pois, converter-se, por força do mecanismo especial de transição previsto nos arts. 50.º a 54.º do NRAU, em arrendamentos com prazo certo, com implicações do ponto de vista tanto da duração efetiva do arrendamento, como do valor da renda.
Essas implicações — ou melhor, a sua efetiva extensão — dependem em larga medida dos termos em que o arrendatário reaja à comunicação endereçada pelo senhorio.
Caso o arrendatário não responda à comunicação do senhorio, o contrato celebrado ao abrigo do regime vinculístico converter-se-á automaticamente num contrato com prazo certo sempre que tiver sido esse o tipo contratual proposto pelo senhorio, com a duração e mediante o pagamento do valor da renda que este tiver indicado naquela comunicação
Ora, foi justamente tendo presente que, uma vez iniciado pelo senhorio o procedimento tendente a fazer transitar para o NRAU um contrato de arrendamento celebrado ao abrigo do regime vinculístico, a proteção do interesse do arrendatário depende do modo como o mesmo reagir à comunicação para esse efeito efetuada e, muito particularmente, das razões ou circunstâncias que vier a opor à concretização daquele projeto ou vontade, que, ao rever pela segunda vez o NRAU, a Lei n.º 79/2014, de 19 de dezembro, veio ampliar o conteúdo obrigatório de tal comunicação, de modo a assegurar as condições necessárias para uma tomada de posição esclarecida e eficiente por parte do arrendatário.
Feitos estes considerandos é altura de retomarmos o caso dos autos.
No caso em apreço, extrai-se que as partes estão vinculadas por um contrato de arrendamento celebrado por escritura pública de 12.11.74. Esse contrato tem como objecto o rés-do-chão do prédio urbano, descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o nº ...06, destinando-se o prédio a habitação, comércio e indústria (parte final do n.º 2 do art. 204.º, arts. 1022.º, 1023.º, 1064.º e 1067.º, n.º 1, todos do CC).
Na sentença recorrida partiu-se do pressuposto de se tratar de um contrato de arrendamento para fim não habitacional, o que não foi questionado (pela recorrente) na apelação deduzida[16].
Mais resulta apurado que, por intermédio de carta datada de 2 de março de 2015, a autora, na qualidade de senhoria, tomou a iniciativa de desencadear o processo de transição do arrendamento para o regime do NRAU e de proceder à actualização da renda[17].
Na sequência de tal comunicação, respondeu o Réu marido, remetendo à Autora, em 02.04.2015, a missiva cuja cópia consta de fls. 19 e 20[18].
Tal como se explicitou na sentença recorrida – e que não vem questionado na apelação –, dúvidas não oferecem que a missiva que a Autora enviou ao Réu marido, em 02.03.2015, na qual lhe comunicou a promoção da transição para o NRAU e a alteração do valor da renda, não contém as alusões, referência e informações impostas pelo disposto no art. 50º, alíneas b), d), f) e g), do NRAU.
Vimos já que os elementos que a comunicação do art. 50º do NRAU deve conter destinam-se a facultar ao arrendatário as informações que lhe permitirão avaliar a correção e a razoabilidade do aumento comunicado, a fim de que possa formar uma vontade esclarecida sobre a manutenção do arrendamento[19].
Atentos os efeitos gravosos que da comunicação podem advir para a correlação de forças entre as partes que resultará da nova relação contratual, o legislador estabeleceu um regime especialmente exigente, fixando um conjunto de regras para a sua elaboração com o propósito de, em último termo, assegurar que o seu destinatário se possa inteirar do seu conteúdo pela simples leitura da mesma.
Não foi isso, contudo, o que a recorrente/senhoria fez.
Na verdade, como resulta da leitura do seu escrito, omitiu a indicação do valor do locado, avaliado nos termos dos arts. 38.º e seguintes do CIMI, constante da caderneta predial urbana; igualmente omitiu a indicação do prazo de resposta; não detalhou o conteúdo que a resposta do arrendatário podia apresentar, nos termos do n.º 3 do art. 51.º; não detalhou as circunstâncias que o arrendatário podia invocar conforme previsto no n.º 4 do art. 51º, nem a necessidade de apresentação dos respetivos documentos comprovativos, nos termos do disposto no n.º 6 do art. 51º; tão pouco especificou as consequências que a falta de resposta, bem como da não invocação daquelas circunstâncias podia acarretar para a posição do arrendatário.
Constata-se, efetivamente, o cumprimento defeituoso de exigências legais que encontram fundamento na circunstância de a comunicação em causa dar início a um verdadeiro processo negocial obrigatório encetado com vista à formação de um novo contrato e, bem assim, na necessária conjugação entre o mercado do arrendamento e a avaliação fiscal dos imóveis arrendados. Nessa medida, estamos, pois, bem distantes da imposição de um estrito formalismo burocrático desprovido de real utilidade[20].
O despoletar do mecanismo pelo senhorio é, por conseguinte, como se referiu no supra referido Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 393/2020, de 13/07, virtualmente apto a colocar o arrendatário numa posição tanto “mais gravosa (…) quanto menor for o nível da sua participação no âmbito do processo negocial iniciado”.          
Justifica-se, por isso, uma especial exigência na aferição dos requisitos de que depende a eficácia da comunicação em causa, tanto mais que esta, constituindo o início de um processo negocial, encerra em si mesma uma declaração de vontade cujo teor não poderá deixar de primar pela clareza e pela certeza, sob pena de, não o sendo, impedir o locatário de se inteirar da vontade real do senhorio e, com isso, de formar a sua própria vontade negocial de modo livre e esclarecido[21]. E, ainda de acordo com o Acórdão do Tribunal Constitucional, “apenas o cumprimento deste ónus de informação garante que o procedimento extrajudicial de transição para o NRAU consista numa definição negociada e paritária do estatuto do vínculo locatício, numa perspetiva dinâmica e dialética, em que senhorio e arrendatário possam intervir e influir nessa definição”.
De notar, ainda, que esta exigência surge refletida na própria evolução histórica do preceito em análise.
Na verdade, as indicações que a comunicação do senhorio deve conter às quais se alude nas alíneas d) a f) do art. 50º NRAU não estavam previstas na redação originária do preceito, só passando a está-lo com a alteração do preceito introduzida pela Lei n.º 79/2014, de 19/12. Isso mesmo foi, aliás, expressamente reconhecido pela recorrente ao aludir ao facto da mencionada alteração legislativa denotar «um propósito do legislador de assegurar que o arrendatário, ao receber a comunicação de transição, é suficientemente alertado para os riscos e consequências da omissão de resposta. Esse propósito é especialmente notório nas als. f) e g) do art. 50.º do NRAU, aditados na sequência da alteração legislativa operada pela Lei n.º 79/2014, de 19 de Dezembro».
Ora, como se refere no citado Ac. do TC n.º 393/2020, de 13/07/2020 (relatora Joana Fernandes Costa), foi precisamente em função da perceção da “severidade das consequências que a ausência pura e simples de resposta à comunicação do senhorio, ou uma resposta deficitária ou incompleta a essa mesma comunicação, é suscetível de gerar para a situação habitacional [e não habitacional] do arrendatário, a Lei n.º 79/2014 pretendeu assegurar que as mesmas se produzirão se e na medida em que este for previamente informado, quer das faculdades que lhe assistem e ónus que sobre si impendem, quer dos efeitos resultantes do seu não exercício ou observância”.
Como se decidiu no Ac. desta Relação de 3/10/2019 (relator Afonso Cabral de Andrade)[22], in www.dgsi.pt., o aludido regime jurídico «atribui ao senhorio um direito potestativo, o de desencadear um processo negocial com vista à substituição do contrato de arrendamento anterior, vinculístico, por um novo, com termo certo. E enquanto o senhorio tem total liberdade de escolha sobre se vai dar início a este processo ou não, bem como de escolha do tempo em que o vai fazer, já o arrendatário está sujeito à escolha que o senhorio faça, e tem de aceitar o início do processo negocial que lhe é imposto por aquele, e que, ainda por cima, como vimos, tem efeitos cominatórios. Daí que seja imperioso que a comunicação inicial de início do processo negocial seja imaculada, ou seja, não contenha qualquer omissão ou imprecisão relativamente aos elementos essenciais do contrato. Não se pode dizer que esta interpretação seja injusta para o senhorio, pois ninguém melhor do que ele está em condições de conhecer o locado e de ter acesso à documentação pertinente sobre o mesmo. Donde, não pode haver justificação para que a comunicação que dá início ao processo negocial contenha falhas, leia-se, desvios face às exigências impostas pelo legislador.
Daí, a cominação de ineficácia».
O rigor e a precisão que, como acima se mencionou, devem estar presentes na redação da comunicação do senhorio a dirigir ao arrendatário, são, assim, exigências decorrentes, não só do espírito da lei, mas, também, do espírito da lei refletido ao longo da sua evolução histórica.
O mesmo é dizer que os critérios de interpretação da lei (previstos no art. 9º do CC) como sejam o “elemento literal”, o “elemento teleológico” e o “elemento histórico” não permitem outra conclusão que não a de que aquilo que o legislador pressupôs no preceito em análise foi uma comunicação clara e suficientemente detalhada na descrição e enunciação dos elementos previstos nas alíneas em causa.
Ora, como se viu, a missiva da recorrente é manifestamente incompleta e deficiente, pois não habilita o destinatário com elementos necessários com vista a formar uma vontade esclarecida; este, ao lê-la, não fica suficientemente esclarecido daquilo que lhe é comunicado e daquilo que é suposto fazer perante o que lhe é comunicado.
E isso basta para que, em função do que acima foi dito, se conclua pela ineficácia da missiva.
De resto, o próprio princípio da boa fé que deve pautar o cumprimento das obrigações (art.º 762.º, n.º 2, do CC) assim o dita, na certeza de que, de outro modo, ficaria em aberto a possibilidade de o senhorio, a coberto de uma redação dúbia da comunicação, poder ver alterada a relação contratual a seu favor, por mero efeito da incompreensão ou do silêncio do inquilino[23].  
Não se olvida que o recorrido marido respondeu à missiva em questão, mediante carta remetida à Autora, em 02.04.2015 [alínea e) dos factos provados]. E que nessa missiva o arrendatário comunicou a denúncia do arrendamento.
Porém, tal resposta não tem o condão de reverter a ineficácia da comunicação remetida pela recorrente, já que, como vimos, a mesma padece, desde o primeiro momento, de um vício estrutural, atinente a quatro dos seus requisitos constitutivos, que impede a produção dos almejados efeitos. Dito de outra forma, ainda que se pudesse intuir que o recorrido marido compreendeu o alcance e sentido da missiva não obstaculiza a que se conclua que esta carecia de requisitos essenciais de que a lei faz depender a respectiva eficácia.
Por isso, não se vislumbra que se deva divergir do que se decidiu na sentença impugnada quando se aduziu que a falta de tais requisitos procedimentais da comunicação do senhorio sempre acarretaria a irrelevância ou ineficácia da resposta do arrendatário. Como aí se explicitou – e ora se subscreve –, «[c]onsequentemente, e por força do da ineficácia do acto primordial do processo negocial, nenhum valor pode igualmente ser atribuído à resposta do arrendatário, designadamente, à que consta da alínea e), do ponto II.1., porque, sendo uma resposta, baseou-se em pressupostos sem eficácia alguma, devendo ser julgada, igualmente, ineficaz. A ideia é que, tendo o legislador construído um processo negocial de intervenções contrapostas dependente da exaustivamente regulada primeira intervenção (do senhorio), a ineficácia desta inquina todos os passos/momentos posteriores».
E, diversamente do propugnado pela recorrente, embora tal cominação não conste expressamente do corpo do art. 50º do NRAU (ao invés do que sucede no proémio do art. 30º e resulta da locução “sob pena de ineficácia da sua comunicação”), certo é que a incompletude/imprecisão das indicações que, de acordo com as diversas alíneas que compõem o art. 50.º do NRAU devem constar da comunicação aí mencionada, conduz, de acordo com a melhor interpretação da lei, à sua ineficácia, pelo que se deve considerar que o legislador, propositadamente, afastou dessa ponderação a eventual resposta que possa ser aduzida pelo arrendatário[24].
Em conformidade com o decidido o Ac. da RP de 20/09/2021 (relatora Eugénia Cunha), in www.dgsi.pt., «atenta a circunstância de a comunicação em causa dar início a um verdadeiro processo negocial obrigatório que enceta com vista à formação de um novo contrato, atentando na finalidade dessa comunicação, torna-se claro que a incerteza gerada pela falta de elementos não é compaginável com a tomada conscienciosa de decisões respeitantes ao futuro da relação arrendatícia, gerando dúvidas e insegurança, desde logo por falta de indicação e comprovação do valor do locado. E constatando-se o cumprimento apenas parcial das exigências legais a comunicação padece de ineficácia, já que sofre, ab initio, de um vício estrutural, atinente aos seus requisitos constitutivos, que impede a produção dos efeitos por ela visados, pois que carece de requisitos essenciais de que a lei faz depender a respetiva eficácia (…).
Destarte, enquadrando-se a comunicação no contexto de um processo negocial obrigatório e devendo conter a indicação precisa dos elementos fundamentais para uma tomada de decisão consciente sobre o futuro da relação contratual, a incompletude das indicações, imputável ao Autor da comunicação (Senhorio/recorrente), que, de acordo com as diversas alíneas que compõem o artigo 50.º do NRAU, dela devem constar, conduz à sua ineficácia e o arrendamento vinculistico mantem-se, nunca operando aquela a transição do contrato para o NRAU».
Por fim, dizer que não é aqui aplicável a doutrina consagrada no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 6/2023 do Supremo Tribunal de Justiça, de 15 de junho[25] [26], visto que, no nosso caso, a recorrente/senhoria pretendeu promover não só a transição do contrato para o NRAU, como também a actualização da renda.
Em suma, a comunicação do senhorio ao inquilino que despoletou o mecanismo especial de transição para o NRAU, dada a sua incompletude – posto não conter os elementos aludidos nas alíneas b), d), f) e g), do art. 50.º do NRAU –, é ineficaz para os fins pretendidos pela recorrente, quais sejam a transição para o NRAU e a actualização da renda.
Inexiste, por conseguinte, violação do disposto no art. 50º do NRAU, pelo que improcede este fundamento da apelação.
*
2. Da violação do princípio da boa-fé e /ou do abuso de direito.

Sustenta a recorrente que, ao invocar a ineficácia da comunicação de transição do contrato de arrendamento dos autos para o NRAU, os recorridos agiram em abuso de direito.
Isto porque, só após a instauração desta acção e volvidos mais de sete anos sobre o envio da comunicação de transição para o NRAU é que os Réus se lembraram de questionar a validade da comunicação de transição para o NRAU, mesmo depois de terem denunciado o contrato de arrendamento.
Vejamos.
Preceitua o art. 334º do Cód. Civil que “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
Como ensina o Prof. Almeida Costa[27], o princípio do abuso do direito constitui um dos expedientes técnicos ditados pela consciência jurídica para obtemperar, em algumas situações particularmente clamorosas, às consequências da rígida estrutura das normas legais.
Segundo Pires de Lima e Antunes Varela[28], “[e]xige-se que o excesso cometido seja manifesto. Os tribunais só podem, pois, fiscalizar a moralidade dos actos no exercício de direitos ou a sua conformidade com as razões sociais ou económicas que os legitimaram, se houver manifesto abuso. É esta a lição de todos os autores e de todas as legislações. Manuel de Andrade refere-se aos direitos "exercidos em termos clamorosamente ofensivos da justiça (…)» e «Vaz Serra refere-se, igualmente, à «clamorosa ofensa do sentimento jurídico socialmente dominante»”.
O abuso de direito pressupõe logicamente que o direito existe, embora o seu titular se exceda no exercício dos seus poderes.
A fórmula adotada no actual Código Civil não se delimita tão só ao acto de emulação, entendido como o exercício de um direito sem utilidade própria e só para prejudicar outrem. Numa visão bem mais abrangente e ampla, o citado preceito normativo abrange o exercício de qualquer direito por forma anormal, quanto à sua intensidade ou à sua execução, de modo a poder comprometer o gozo dos direitos de terceiro e a criar uma desproporção objetiva entre a utilidade do exercício do direito por parte do seu titular, e as consequências que outros têm de suportar[29].
Segundo o legislador, a determinação da legitimidade ou ilegitimidade do exercício do direito, ou seja, da existência ou não de abuso do direito, afere-se a partir de três conceitos: a boa fé, os bons costumes e o fim social ou económico do direito.
O agir de boa fé envolve, além do mais, no quadro das relações jurídicas, a atuação honesta e conscienciosa, isto é, numa linha de correção e probidade, não procedendo de modo a alcançar resultados opostos aos que uma consciência razoável tolera. A boa-fé nesta sede serve de fundamento para a imposição de certos deveres de conduta, nomeadamente de honestidade, correção e lealdade[30].
Os bons costumes, por seu turno, são, grosso modo, o conjunto de regras de comportamento relacional acolhidas pelo direito, variáveis no tempo e, por isso, mutáveis, conforme as conceções ético-jurídicas dominantes na coletividade.
Por fim, o fim económico e social de um direito traduz-se, essencialmente, na satisfação do interesse do respetivo titular no âmbito dos limites legalmente previstos[31].
A manifestação mais clara do abuso do direito é a chamada conduta contraditória (“venire contra factum proprium”) em combinação com o princípio da tutela da confiança - exercício dum direito em contradição com uma conduta anterior em que a outra parte tenha confiado, vindo esta com base na confiança gerada e de boa fé a programar a sua vida e a tomar decisões[32].
Conforme sublinha Baptista Machado[33], a ideia imanente a esta proibição é a do dolus praesens, isto é, que a conduta sobre que incide a valoração negativa é a conduta presente, sendo a conduta anterior apenas ponto de referência para, tendo em conta a situação então criada, se ajuizar da legitimidade da conduta atual.
Na decorrência do exposto enumera o citado autor[34] três pressupostos para o desencadeamento dos efeitos do instituto:
1º - uma situação objetiva de confiança: uma conduta de alguém que de facto possa ser entendida como uma tomada de posição vinculante em relação a dada situação futura;
2º - investimento na confiança e irreversibilidade desse investimento: o conflito de interesses e a necessidade de tutela jurídica surgem quando uma contraparte, com base na situação de confiança criada, toma disposições ou organiza planos de vida de que surgirão danos, se a confiança legítima vier e ser frustrada;
3º - boa fé da contraparte que confiou: nos casos em que a intenção aparente do responsável pela confiança diverge da sua intenção real, a confiança do terceiro ou da contraparte só merecerá proteção jurídica quando este esteja de boa-fé (por desconhecer aquela divergência) e tenha agido com cuidados e precauções usuais no tráfico jurídico.
A caracterização da proibição do comportamento contraditório, nos seus elementos fundamentais, mostra-se feita no Ac. do STJ de 12/11/13 (relator Nuno Cameira), in www.dgsi.pt., nos seguintes termos:
«Assim, há desde logo um primeiro e fundamental pressuposto a considerar: a existência de um comportamento anterior do agente (o factum proprium) que seja susceptível de fundar uma situação objectiva de confiança. Em segundo lugar exige-se que, quer a conduta anterior (factum proprium), quer a actual (em contradição com aquela) sejam imputáveis ao agente. Em terceiro lugar, que a pessoa atingida com o comportamento contraditório esteja de boa fé, vale por dizer, que tenha confiado na situação criada pelo acto anterior, ignorando sem culpa a eventual intenção contrária do agente. Em quarto lugar, que haja um “investimento de confiança”, traduzido no facto de o confiante ter desenvolvido uma actividade com base no factum proprium, de modo tal que a destruição dessa actividade pela conduta posterior, contraditória, do agente (o venire) traduzam uma injustiça clara, evidente. Por último, exige-se que o referido “investimento de confiança” seja causado por uma confiança subjectiva objectivamente fundada; terá que existir, por conseguinte, causalidade entre, por um lado, a situação objectiva de confiança e a confiança da contraparte, e, por outro, entre esta e a “disposição” ou “investimento” levado a cabo que deu origem ao dano. Os pressupostos enumerados não podem em caso algum ser aplicados automaticamente pois, (…), o venire contra factum proprium é, em última análise, “uma técnica que não dispensa, e antes pressupõe, um controlo da adequação material da solução, com uma valoração global de todos os elementos à luz do ponto de vista da tutela da confiança legítima”; por isso, todos aqueles pressupostos “deverão ser globalmente ponderados, em concreto, para se averiguar se existe efectivamente uma “necessidade ético-jurídica” de impedir a conduta contraditória, designadamente, por não se poder evitar ou remover de outra forma o prejuízo do confiante, e por a situação conflituar com as exigências de conduta de uma contraparte leal, correcta e honesta – com os ditames da boa fé em sentido objectivo».
Salvaguardando sempre o devido respeito pela posição sufragada pela recorrente na apelação, dela dissentimos na medida em que julgamos não se verificarem os elementos circunstanciais para que possa ocorrer a invocada modalidade do abuso de direito.
Como já anteriormente demos conta, na sequência da promoção, por parte da senhoria, do mecanismo especial previsto nos arts. 50.º a 54.º do NRAU, tendente à transição para o NRAU e atualização da renda, o réu marido respondeu à missiva por aquela remetida, comunicando a denúncia do contrato de arrendamento, mais invocando o direito a compensação pelas obras feitas no locado (benfeitorias), de acordo com com o preceituado no art. 29º, n.º 2 do NRAU, com expressa invocação do direito de retenção nos termos do art. 754º e ss. do CC, até aquele direito de crédito se mostrar satisfeito/pago.
Ao responder nos moldes em que o fez, denunciando o contrato de arrendamento, sustenta a recorrente que o contrato mostra-se definitivamente cessado, o que determina a prejudicialidade da «questão da eficácia da transição do contrato para o NRAU, porque situada a montante desta».
Pois bem, como já anteriormente demos nota, a comunicação da denúncia do contrato insere-se no âmbito do processo negocial (extra judicial) de transição para o NRAU previsto nos arts. 50.º a 54.º do NRAU, o qual se iniciou, por iniciativa da senhoria, mediante o envio ao arrendatário da comunicação prescrita no art. 50.º do NRAU.
Ou seja, a interpretação e valoração da comunicação da denúncia do contrato de arrendamento por parte do arrendatário não pode ser vista dissociada e independente daqueloutra comunicação expedida pela senhoria. Na verdade, a resposta do réu marido, através da qual comunicou a denúncia do arrendamento, tem a precedê-la o envio da dita missiva pela recorrente que padece de vicissitudes consubstanciadas no facto de dela não constarem os elementos que, nos termos da lei (art. 50.º do NRAU), eram essenciais a que o seu destinatário, o recorrido marido, pudesse apreender o seu sentido e alcance decisivos.
Por conseguinte, ao serem (os recorridos) judicialmente confrontados com o pedido do reconhecimento da denúncia do contrato de arrendamento[35], não consubstancia qualquer comportamento abusivo a invocação da ineficácia da comunicação da transição para o NRAU e da atualização da renda, posto esta comunicação preceder a denúncia formulada pelo arrendatário e a denúncia apenas surgir como reação à comunicação do senhorio – não é totalmente correcto dizer-se que o contrato foi denunciado por “própria iniciativa e escolha” do arrendatário. E, como já vimos sobejamente, é manifesto que a recorrente não comunicou aos recorridos, como devia, todos os elementos exigidos por lei tendentes à promoção do processo negocial extrajudicial com vista à transição do NRAU, bem como à atualização da renda. Impunha-se que o arrendatário tivesse sido previamente esclarecido das faculdades que lhe assistiam e, mais do que isso, das consequências que a lei associa à sua eventual inação.
Como expresso no aludido Ac. do TC n.º 393/2020, de 13/07/2020 (relatora Joana Fernandes Costa), «a exclusão do âmbito do dever de comunicação a cargo do senhorio de dados imprescindíveis a uma tomada de posição consciente e esclarecida por parte do seu destinatário diminui tão dramática quanto desnecessariamente as condições do arrendatário para intervir eficientemente no procedimento extrajudicial em defesa dos seus interesses, sujeitando-o à contingência de, contra a sua vontade e em possível desconformidade com o que lhe seria devido, ver-se confrontado com um contrato de arrendamento com prazo certo - e, por isso, caducável - e/ou com uma renda de valor demasiado elevado para o seu nível de rendimentos».
A deficiência e incompletude da comunicação do senhorio torna esta – como já vimos –ineficaz, sendo que a denúncia do arrendamento foi formulada na sequência ou em reação a essa comunicação ineficaz, privando ou diminuindo o arrendatário de poder formar uma consciente e esclarecida tomada de posição sobre o futuro da relação arrendatícia.
Por conseguinte, tendo presente a ineficácia da comunicação que dá origem ao despoletar do processo negocial da transição para o NRAU, tal comunicação não tem a virtualidade de erigir como relevante e válida a comunicação da denúncia do contrato pelo arrendatário, posto que a recorrente/senhoria não cumpriu o ónus de lhe comunicar os elementos indispensáveis à formação de uma adequada e esclarecida vontade. Dá-se aqui por integralmente reproduzida a argumentação já atrás explicitada no sentido da resposta do arrendatário, contendo a menção da denúncia do arrendamento, não ter o condão nem a potencialidade de reverter a ineficácia da comunicação remetida pela recorrente.
Não há, pois, quaisquer elementos que justifiquem a confiança da recorrente num qualquer comportamento dos recorridos, a ponto de concluir que estes, com a sua conduta, tenham violado a boa fé daquela, agindo, com isso, em abuso de direito.
Por outro lado, o período de tempo entretanto decorrido desde o envio da comunicação de transição para o NRAU não pode ser considerado um não exercício prolongado do direito, nem é susceptível de gerar no senhorio uma situação de confiança. Muito menos esta pode ser considerada legítima.
De facto, continuando os RR. a usufruir do locado – ou, pelo menos, mantendo a sua detenção, pois não procederam à sua restituição e entrega à proprietária –, era ao senhorio que, a considerar não serem aqueles detentores de qualquer título legitimo dessa detenção – mormente por força da produção dos efeitos da denúncia do arrendamento operada –, competia deduzir acção tendente a ver reconhecido esse direito e a obter a restituição do prédio reivindicado.
Donde o decurso do tempo verificado seja irrelevante no sentido da verificação da exceção perentória de que a recorrente se pretende fazer valer.
Em suma, o comportamento dos recorridos revelado pelo concreto circunstancialismo fáctico apurado não é suscetível de evidenciar um comportamento em termos clamorosamente ofensivos dos limites impostos pela boa fé e/ou do sentimento jurídico socialmente dominante, pressuposto no instituto jurídico do abuso de direito.
Daí que não haja fundamento para se concluir pela verificação do exercício abusivo da invocação da ineficácia da comunicação da transição para o NRAU.
*
3. Da validade e eficácia de denúncia contratual operada pelo Réu marido.
Confirmado o juízo positivo da ineficácia da comunicação prevista no art. 50º do NRAU, que determinou a manutenção do arrendamento vinculístico e a não transição do contrato para o NRAU, nem a pretendida alteração da atualização da renda, e tendo-se concluído pela inverificação de qualquer comportamento abusivo ou violador do principio da boa-fé por parte dos recorridos, fica prejudicada (por inútil) a apreciação da última questão suscitada pela recorrente nas suas conclusões sob os n.ºs 17 a 28º, o que aqui se declara, nos termos do art. 608º, n.º 2 do CPC “ex vi” do art. 663º, n.º 2, in fine, do mesmo diploma.
Esta, tendo por objeto saber se o réu marido teria poderes de administração bastantes para operar a denúncia do contrato de arrendamento, deixa-se de colocar-se na medida em que, com a confirmação daquele juízo, decai a base legal que permitiria considerar válida e eficaz a denúncia do contrato de arrendamento nos termos e para os efeitos previstos nos arts. 51º, n.º 3, al. d) e 53º, do NRAU.
*
Nesta conformidade, o recurso terá de improceder, com a consequente confirmação da sentença recorrida.
*
As custas do recurso, mercê do princípio da causalidade, são integralmente da responsabilidade da recorrente, atento o seu integral decaimento (art. 527º do CPC).
*
VI. DECISÃO

Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas do recurso a cargo da Autora/recorrente (art. 527.º do CPC).
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Guimarães, 22 de fevereiro de 2024

Alcides Rodrigues (relator)
Carla Oliveira (1ª adjunta)
Ana Cristina Duarte (2ª adjunta)



[1] Cfr. Ac. do Tribunal Constitucional (TC) n.º 393/2020, de 13/07 (relatora Joana Fernandes Costa), in DR n.º 192/2020, Série II, de 2020-10-01, cuja fundamentação seguiremos de perto na exposição seguinte.
[2] Como elucida Fernando de Gravato de Morais, o princípio base passou a ser o da renovação automática (não imperativa) do contrato, que tinha necessariamente uma duração inicial de 5 anos. As outras medidas protecionistas mantinham-se em termos gerais, mas esbatiam-se com os efeitos da nova regra consagrada para tais negócios (cfr. As Novas Regras Transitórias Na Reforma do NRAU (Lei 31/2012), in Julgar, n.º 19, 2013, Coimbra Editora, p. 14].
[3] O citado diploma legal, no seu art. 2.º, inseriu no capítulo III do RAU os arts. 117.º a 120.º, com a redacção seguinte:
«Artigo 117.º
Estipulação de prazo de duração efectiva
1 - As partes podem convencionar um prazo para a duração efectiva dos arrendamentos urbanos para comércio ou indústria, desde que a respectiva cláusula seja inequivocamente prevista no texto do contrato, assinado pelas partes.
2 - Aos contratos para comércio ou indústria de duração limitada, celebrados nos termos do número anterior, aplica-se, com as necessárias adaptações, o regime dos artigos 98.º a 101.º, salvo o disposto no artigo seguinte.
Artigo 118.º
Renovação e denúncia
1 - Os contratos de arrendamento a que se refere o artigo anterior renovam-se automaticamente no fim do prazo, por igual período, se outro não estiver expressamente estipulado, quando não sejam denunciados por qualquer das partes.
2 - As partes podem livremente convencionar um prazo para a denúncia do contrato pelo senhorio, desde que a respectiva cláusula seja reduzida a escrito».
[4] Referiu o legislador no preâmbulo do Dec. Lei n.º 275/95 que o Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, procedeu a algumas inovações relevantes, designadamente facultando a celebração, no domínio do arrendamento habitacional, de contratos de duração limitada, o que permitiu trazer ao arrendamento uma dinâmica nova, pois fez ressurgir um mercado há muito paralisado e que uma política de incentivos fiscais tornou uma das melhores aplicações financeiras hoje disponíveis. Mais referiu que cabia «estender a reforma aos arrendamentos destinados ao comércio, indústria e ao exercício de profissões liberais e, bem assim, aos contratos destinados a outros fins não habitacionais». Isto porque também neste domínio se considerou que «a reanimação do mercado do arrendamento passará pela possibilidade, reconhecida às partes, de conferir natureza temporária aos contratos de arrendamento, podendo ainda ser convencionado um prazo para denúncia por parte do senhorio», sem prejuízo de se manter a possibilidade da celebração de contratos ao abrigo do regime vigente.
[5] Cfr. o citado Ac. do TC n.º 393/2020, de 13/07/2020 (relatora Joana Fernandes Costa), in www.dgsi.pt..
[6] A Lei n.° 31/2012, de 14 de agosto, que veio alterar o regime transitório dos contratos de arrendamento habitacionais celebrados antes da entrada do RAU e dos não habitacionais celebrados antes do D.L. 257/95, de 30 de setembro, foi promulgada por pressão do Fundo Monetário Internacional, da Comissão Europeia e do Banco Central (Troika), que exigia uma liberalização das rendas antigas em troca de assistência financeira. Este regime veio facilitar a transição dos antigos contratos para o novo regime, promovendo uma negociação entre as partes e revogando o regime de atualização faseada presente na versão anterior do NRAU. Em termos concretos, todo o regime dos arts. 30.° a 37.° foi alterado, deixando a atualização das rendas de estar sujeita aos primitivos requisitos, que limitavam, em grande medida, a possibilidade de atualização (cfr. Vitor Palmela Fidalgo, in Estado atual do regime da transição para o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) e atualizacao das Rendas, Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Vol. LX — 2019/1, p. 150).
[7] Como refere Maria Olinda Garcia, a Lei n.º 31/2012 veio alterar significativamente o regime transitório, dando mais acolhimento aos interesses do senhorio em matéria de aumentos de rendas desatualizadas e de extinção dos contratos mais antigos, sem, todavia, desproteger de imediato os arrendatários mais idosos ou economicamente mais débeis (cfr. Arrendamento Urbano Anotado Regime Substantivo e Processual (alterações introduzidas pela Lei n.º 31/2012), 3ª ed., Coimbra Editora, 2014, p. 128.
[8] Cfr. Maria Olinda Garcia, obra citada, pp. 138/139.
[9] De que são exemplo a Lei n.º 79/2014, de 19 de dezembro, a Lei n.º 43/2017, de 14 de junho e a Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro.
Para uma enunciação de tais implicações, veja-se o citado estudo de Vitor Palmela Fidalgo, Estado atual do regime da transição (…), pp. 151/152.
[10] Cfr. Luís Menezes Leitão, Arrendamento Urbano, 8ª ed. Almedina, 2018, p. 183.
[11] Cfr. Acórdão Uniformizador de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2023, de 15 de junho, (relatora Maria da Graça Trigo), Diário da República n.º 135/2023, Série I de 2023-07-13, pp. 17 – 47.
[12] O conteúdo da comunicação é semelhante ao teor da comunicação nos contratos de arrendamento para habitação (art. 30º), apenas se alterando o texto da alínea f) do n.º 1 do art. 50.°, que remete para as circunstâncias que o arrendatário poderá invocar nos termos do n.º 4 do art. 51.°, que são diferentes das invocadas para os contratos de arrendamento habitacionais.
[13] Interessa-nos, sobretudo, o regime do arrendamento para fim não habitacional.
[14] Cfr. Acs. do STJ de 24/05/2018 (relatora Fernanda Isabel Pereira) e de 18/09/2018 (relatora Fernanda Isabel Pereira), in www.dgsi.pt.
[15] Argumentos extraídos do Ac. do TC n.º 393/2020, de 13/07/2020 (relatora Joana Fernandes Costa), referentes ao regime do arrendamento urbano para habitação, mas cuja aplicação vale, mutatis mutandis, para os arrendamentos urbanos para fins não habitacionais.
[16] Já os recorridos frisam que o locado destina-se não só a comércio, mas também a habitação e indústria, «tanto é que a comunicação que é feita ao Réu marido, é-o (ou devia sê-lo) nos termos do artigo 30º do NRAU». - (veja-se doc. ... carta junto com a petição inicial)».
[17] A referida missiva, cuja cópia consta de fls. 17 v.º, tem o seguinte conteúdo:
«(…)
Assunto: Actualização de Rendas e Transição para NRAU
Exmo. Senhor,
Escrevemos na qualidade de senhorios do prédio urbano sito na Rua ..., ..., inscrito na matriz predial respetiva sob o art. ... da vila e freguesia ....
Como é do V/ conhecimento, foi-vos arrendado o espaço correspondente ao rés-da-chão e 1.º A do referido prédio urbano.
Nessa qualidade e ao abrigo do disposto no art. 30.º do Novo Regime do Arrendamento Urbano, vimos comunicar o seguinte:
Pela presente, vimos promover a transição do contrato de arrendamento para o novo regime do arrendamento urbano, com atualização da renda mensal.
Assim, propomos que o contrato de arrendamento passe a ser um contrato de prazo certo, celebrado por um período de 5 (cinco) anos.
Para além disso, propomos que a renda atualizada passe para o montante de € 918 (novecentos e dezoito euros e seis cêntimos).
Anexamos fotocópia da caderneta predial, para que possa confirmar o valor patrimonial do locado: doc. n.º ....
Sem mais, de momento, subscrevemo-nos, com os melhores cumprimentos,
(…)».
[18] A referida missiva apresenta o seguinte teor:
«(…)
No seguimento da carta por V s, Ex.' enviada, em que comunicam a intenção do senhorio de promover a transição para o Novo Regime de Arrendamento Urbano do contrato de arrendamento não habitacional relativo ao rés--do-chão e 1ºA do prédio urbano, sito na Rua ..., em ..., inscrito na matriz. predial respectiva sob o n' ... da vila e freguesia ..., venho, nos termos dos artigos 53º n" 3 al. d) do mesmo diploma legal, denunciar o contrato de arrendamento em vigor.
Neste contexto, assiste-me o direito a ser compensado por V. Ex.'s pelas obras que licitamente realizei no locado, independentemente do estipulado no contrato de arrendamento, de harmonia com o preceituado no artigo 29º n' 2 do NRAU.
Deste modo, venho pelo presente meio reclamar o pagamento de I02.672,01€ (cento e dois mil seiscentos e setenta e dois euros e um cêntimos), que corresponde ao montante global das obras por mim realizadas no locado, cuja discriminação segue abaixo e cujas faturas de suporte seguem em anexo como docs. I e 2:
(…).
Adicionalmente, agradecia que me informassem se no trigésimo dia seguinte à cessão do contrato irão proceder ao pagamento da quantia reclamada e de que forma, visto que apenas procederei à entrega do locado mediante o pagamento do crédito que passei a deter sobre V. Ex.ª no valor de 102.672,01€, invocando expressamente o direito de retenção, de harmonia com o preceituado no artigo 754º e ss do Código Civil.
Face ao exposto, fico aguardar a Vossa resposta.
 (…)».
[19] Cfr. Ac. da RL de 27/06/2017 (relatora Rosa Coelho), in www.dgsi.pt.
[20] Cfr. Acs. do STJ de 24/05/2018 (relatora Fernanda Isabel Pereira) e de 18/09/2018 (relatora Fernanda Isabel Pereira), in www.dgsi.pt.
[21] Cfr. Ac. da RL de 11/01/2024 (relator José Correia), in www.dgsi.pt.
[22] Em que o ora relator interveio como 1º adjunto.
[23] Cfr. Ac. da RL de 11/01/2024 (relator José Correia), in www.dgsi.pt., cuja fundamentação foi seguida de perto na explanação em apreço.
[24] Cfr. Acs. do STJ de 24/05/2018 (relatora Fernanda Isabel Pereira) e de 18/09/2018 (relatora Fernanda Isabel Pereira) e Ac. da RL de 29/06/2023 (relatora Gabriela de Fátima Marques), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[25] Publicado no Diário da República n.º 135/2023, Série I de 2023-07-13, pp. 17 – 47
[26] O referido aresto uniformizou a jurisprudência nos seguintes termos:
«Nos arrendamentos para fins não habitacionais, celebrados antes do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de Setembro, o locador que pretenda promover a transição do contrato para o NRAU, sem actualização da renda, não está obrigado à indicação do valor do locado, avaliado nos termos dos artigos 38.º e seguintes do CIMI, nem à junção da cópia da caderneta predial urbana, como previsto nas alíneas b) e c) do artigo 50.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, na redacção da Lei n.º 79/2014, de 19 de Dezembro».
[27] Cfr. Direito das Obrigações, 6ª ed., Almedina, p. 64.
[28] Cfr. Código Civil Anotado, Vol. 1, 2ª ed., Coimbra Editora, p. 298.
[29] Cfr. neste sentido, entre outros, J. Rodrigues Bastos, Notas ao Código Civil, Vol. II, p. 102, Antunes Varela, RLJ, ano 114º, p. 75 e Das obrigações Em Geral Vol. I, 6ª ed., Almedina, p. 515 e Ac. do STJ de 28.11.1996, CJSTJ, 1996, T. III, p. 118.
[30] Cfr. Elsa Vaz de Sequeira, Comentário ao Código Civil, Parte Geral, 2ª ed., UCP Editora, 2023, p. 964 (anotação ao art. 334º do CC).
[31] Cfr. Acs. do STJ de 25 de Junho de 2009 (relator Salvador da Costa) e de 8/10/2009 (relator Serra Baptista), disponíveis em www.dgsi.pt.
[32] Cfr. Vaz Serra, RLJ, 111º, p. 296.
[33] Cfr. Tutela da Confiança e “Venire Contra Factum Proprium”, in “Obra Dispersa”, vol. I, Scientia Iuridica, Braga, 1991, pp. 385, 415 e 416.
[34] Cfr. Estudo e obra citada, pp. 415 a 418.
[35] Correspondente ao pedido formulado sob a al. c):
«Declarar-se que o contrato de arrendamento identificado no art. 7º da petição inicial cessou, por denúncia operada pelo Réu marido em 02 de abril de 2015, com efeitos a partir de 02 de Julho de 2015».