Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6283/20.2T8GMR.G3
Relator: PAULA RIBAS
Descritores: REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
NULIDADE DA SENTENÇA
AUDIÇÃO DO MENOR
GUARDA DE MENOR
SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA
QUESTÕES DE PARTICULAR IMPORTÂNCIA
PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/29/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1 – Estando em causa um processo em que se discutem as responsabilidades parentais em relação a um menor de sete anos de idade, residindo cada um dos seus progenitores em local afastado um do outro, impossibilitando que se estabeleça uma guarda partilhada, a criança deverá ser ouvida no contexto da decisão a proferir.
2 – A falta de audição da criança pode ser invocada, pela primeira, em sede de alegações de recurso.
3 – Não existe tal falta de audição se, como no caso em apreço, foi realizada perícia ao menor tendo em vista, precisamente, a elaboração de “mapa afetivo da criança, apurando-se a relação dela com ambos os progenitores, bem como qual deles, se algum, é a figura principal de referência” e o menor foi ouvido em declarações para memória futura em processo crime, estando a gravação em vídeo anexa ao processo, tendo sido tema fulcral dessa inquirição a sua relação com cada um dos seus progenitores.
4 – O Tribunal de recurso deve substituir-se ao Tribunal de 1.º Instância quando inexiste fundamentação para algum dos segmentos decisórios, existindo elementos nos autos que permitam tal fundamentação.
5 – Não sendo possível a atribuição da guarda partilhada, considerando a distância existente entre as residências de cada um dos progenitores, tendo ambos os progenitores competências parentais, o superior interesse da criança pode determinar que o mesmo seja confiado àquele que está em melhores condições para promover a relação do menor com o outro progenitor, ainda que esta seja diferente da decisão provisória proferida nos autos.
Decisão Texto Integral:
Relator: Paula Ribas
1ª Adjunta: Maria da Conceição Barbosa de Carvalho Sampaio
2º Adjunto: Jorge dos Santos

Processo 6283/20.2T8GMR.G3
Juízo de Família e Menores ... - Juiz ... - Comarca ...

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório (elaborado tendo por base o que foi efetuado pela 1.ª Instância):

AA intentou a presente ação de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais contra o progenitor do menor BB, CC, alegando, em síntese:

- o menor BB nasceu no dia ../../2016 em Guimarães, sendo filho da requerente e do requerido,
- por sentença proferida a 28 de novembro de 2018, nos autos do proc. n.º 1665/18...., que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de-Juízo de Família e Menores ..., no âmbito de uma regulação do exercício do poder paternal, foi homologado o acordo a que os progenitores chegaram, ficando o menor entregue à guarda da mãe e do pai, de forma alternada, sob a forma de residência alternada, em regime semanal, conforme previsto no artigo 2º do referido acordo,
- após terem elaborado tal acordo, a requerente e o requerido resolveram retomar a relação em meados de 2019, voltando a ter uma vida em comum, residindo na mesma habitação em ...,
- quando a requerente pôs termo à relação, naquela época, o requerido ficou com o menor durante 3 meses impedindo a requerente de o ver ou privar com este durante 3 meses consecutivos,
- depois de retomarem a relação, passados 7 meses, o requerido voltou a ter os mesmos comportamentos que motivaram a separação - violência doméstica sobre a requerente, perseguindo-a sempre que saía da habitação -, procedimentos que, aliás, se agravaram cada vez com mais violência psicológica sobre a requerente, nomeadamente, com atos de agressão e possessão sobre a mesma,
- em meados de Maio de 2020 o requerido empurrou a requerente contra a parede de forma bruta sem motivo aparente, o que deixou a requerente aterrorizada,
- o requerido controlava a requerente no local de trabalho, deixou de permitir que a requerente fosse levar ou buscar o filho à escola, proibindo-a de o fazer,
- selou todas as panelas para a requerente não cozinhar, cozinhava apenas para ele e para o seu filho, para a requerente ficar impedida de comer, impedia de partilhar as refeições ou privar com o filho, obrigava-a a ir para o quarto,
- apelidava a requerente de “burra” e “baleia”, descredibilizando-a perante o filho de ambos, que sempre que a mesma falava ia perguntar ao requerido se o que a mãe dizia era correto,
- não permitia que a requerente se ausentasse da habitação com o filho de ambos,
- chegaram a fazer terapia de casal, mas sem sucesso, pois o requerido manteve os mesmos comportamentos,
- ameaçava constantemente a requerente de que se não fizesse o que ele queria lhe tirava o filho, provocando na requerente enorme tristeza, desgosto e medo,
- a requerente vivia aterrorizada com receio do requerido, encontrando-se cativa sobre a influência do mesmo,
- no dia 15 de dezembro de 2020, a requerente impôs-se e disse que ia levar o filho de ambos à escola;
- o requerido disse que o levava e, enfurecido, agrediu a requerente, agarrou-a pelo braço com bastante força e só não a agrediu mais porque o filho menor de ambos acudiu por esta;
- o filho pediu para a requerente o levar à escola, ela levou-o mas o requerido perseguiu-a para se assegurar que esta foi levar o filho;
- a requerente, farta e apavorada com os comportamentos do requerido, apercebendo-se que este foi chamado para uma obra em ..., de imediato, visto ter tempo para salvaguardar não só a sua vida como a vida do filho menor, foi busca-lo à escola e veio viver, juntamente com o seu filho, para Guimarães com os seus pais;
- nesse mesmo dia foi apresentar queixa contra o requerido à Guarda Nacional Republicana das ... pela prática, continuada, de um crime de violência doméstica, processo n.º 586/20.....
Pediu a atribuição de guarda total sobre o filho menor.
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Citado o requerido CC, veio este deduzir também pedido de alteração da regulação das responsabilidades parentais contra DD, pugnando pela prolação de despacho urgente para a entrega do menor e que, após, o processo fosse remetido ao tribunal territorialmente competente, pois que o facto da mãe retirar o menor da escola no dia 15 de dezembro de 2020 e dar entrada de uma ação no dia  seguinte, dizendo que o menor ai reside, há um dia, não é critério para aferir do local da residência do menor.

Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese, que:

- a requerida entrou em depressão e ficou de baixa psiquiátrica cerca de 3 meses, até ter terminado o vínculo a Câmara Municipal ...,
- durante o período de baixa, a requerida candidatou-se a uma oferta de trabalho na Base Aérea do ..., onde ficou, motivo pelo qual toda a família arrendou uma casa em ..., para onde todos se mudaram em 15 de outubro;
- o menor atenta a mudança do local de trabalho da requerida, também mudou de escola: no ano letivo de 2019/2020 frequentava a academia de música e belas artes EE e passou para o Agrupamento de Escolas ..., onde está matriculado para o ano 2020/2021,
- a vida familiar desde a reconciliação ocorrida no final do ano de 2019 foi marcada por frequentes episódios de violência por parte da requerida contra o requerente,
- a requerida tenta justificar as suas atitudes violentas, referindo que sofre de uma depressão nervosa aguda,
- a requerida é seguida por um psiquiatra – o Dr. FF (de Guimarães), que lhe prescreve a medicação a pedido desta telefonicamente,
- e por uma psicóloga – a Dra. GG (de ...),
- a requerida toma medicação diariamente (de manhã e à noite), a qual inclui, nomeadamente, Topiramato (um antiepilético utilizado como estabilizador de humor), Escitalopram (antidepressivo) e Lorazepam (ansiolítico/sedativo),
- a requerida tem um historial de problemas psiquiátricos, tendo estado grande parte da carreira contributiva de baixa,
- o que o requerente sabe sobre a origem do historial psiquiátrico da requerida foi contado por terceiros, os quais relataram que a requerida teve uma grande depressão aquando da separação do seu ex-marido, há cerca de 10 anos, tendo a mesma chegado a tentar o suicídio,
- numa expectativa de ajudar a requerida, o requerente fez terapia de casal, com quem manteve o contacto pedindo-lhe orientação sobre como ajudar a saúde mental da requerida,
- o requerente acredita que a saúde mental da requerida é mais grave do que o quadro clínico de uma depressão, a atuação errática da mesma não se explica apenas por uma depressão,
- a requerida sofrerá de um grave problema do foro psiquiátrico que a faz ter comportamentos desadequados, mudanças de humor extremas, ofendendo e atacando fisicamente o requerente,
- ameaça frequentemente auto mutilar-se bem como fugir com o filho para ... (onde reside o irmão desta),
- quando a sua vontade não é satisfeita – seja ela qual for -, a requerida ameaça matar o filho menor de ambos, dizendo que se não for para ela não é para ninguém,
- a requerida já agrediu fisicamente o requerente em pelo menos em cinco ocasiões – conforme queixas por violência apresentadas pelo requerente em 04/10/2018 e 04/12/2020,
- a requerida não se consegue controlar a frente do filho, o BB já assistiu a muitas agressões, exaltações e altercações da requerida,
- em 2018, após diversos episódios desconcertantes, chegou mesmo a requerida a agredir o requerente, tendo este apresentado queixa, a qual deu origem ao processo com o NUIPC 522/18....,
- neste ano de 2018 o requerente ficou sozinho com BB após vários episódios de ameaças de suicídio da requerida, e ameaças de matar o BB,
- a requerida batia constantemente e insistentemente com a cabeça nas paredes e portas à frente do BB e gritava que se mutilaria para culpar o requerente,
- em agosto de 2018, o requerente acompanhou a requerida a uma consulta de psiquiatria no Hospital ... em ..., consulta com a Dra. HH, que transmitiu ao requerente que a situação da requerida era muito grave e que, caso o requerente assistisse a algum outro episódio em que aquela batesse com a cabeça ou algo semelhante, se deveria deslocar de imediato a uma urgência médica com a requerida para que a mesma fosse internada,
- o culminar desta situação foi a agressão ocorrida no dia 1 de setembro de 2018, quando o requerente conduzia na autoestrada A... no sentido ... - ... e a requerida o agrediu, pondo em risco a vida de todos os ocupantes da viatura e fazendo com que o BB chorasse compulsivamente, tendo depois a requerida continuado a gritar e a bater de forma descontrolada no tablier do automóvel,
- infelizmente, em 2018, o requerente decidiu não prestar declarações para não prejudicar a mãe do seu filho e o processo que corria foi arquivado,
- em 2020, no dia 15 de junho, o requerente apercebeu-se que a requerida estava a gravar as conversas que tinham e a enviar à sua irmã e questionou-a sobre esse facto,
- a requerida em vez de responder, atacou-o, arranhando-o no peito e colocando as mãos no seu pescoço, tentando estrangulá-lo enquanto dizia que o matava,
- em 2020, no dia 25 de julho, o requerente disse à requerida que tinha uma consulta de oftalmologia em ... no dia 28 desse mês e que pretendia levar o BB consigo para passar em casa do avô, era o dia de aniversário do avô paterno do BB,
- a requerida ficou completamente alterada, respondeu que o requerente a estava a tentar pôr maluca para a internar para que pudesse ficar com o BB, tendo chegado a dizer ao BB – que presenciou tudo – que o Pai queria e ia matar a Mãe,
- disse ainda a requerida – em frente do BB - para o requerente lhe sair da frente porque de outra forma “se cortava toda com uma faca”,
- após este ataque, a requerida terá tomado medicação forte pois adormeceu, e, quando regressou à sala, vinha nitidamente medicada e quase caiu por duas vezes,
- em 2020, no dia 30 de novembro, na sequência de uma discussão o requerente comunicou à requerida que pretendia terminar a relacionamento, pois tinha chegado ao seu limite,
- a requerida, atirou-se ao requerente, em frente ao filho de ambos, e atingiu-o com um soco de mão fechada no maxilar inferior, junto ao queixo,
- o requerente não necessitou de cuidados médicos, mas ficou com dores na zona onde foi agredido durante três dias,
- em 2020, no dia 3 de dezembro, pelas 21h20, a requerida ainda não se encontrava em casa, tendo saído com o filho menor de ambos, habitualmente neste horário o menor já deveria estar a dormir,
- não sabendo do paradeiro da requerida, o requerido pediu ajuda à psicóloga, a qual conseguiu entrar em contacto com a requerida que a informou que estava a regressar a casa, mas apenas regressou depois das 22h35, sem dar qualquer tipo de esclarecimento onde tinha estado com o menor,
- em 2020, no dia 8 de dezembro, o requerente disse à requerida que uma vez que o BB passou o último Natal (altura em que requerente e requerida estiveram separados) com a família materna, este Natal de 2020 iria passar com a família paterna, tendo a requerida chamado a GNR, alegando que o requerente queria “roubar o filho à mãe”,
- a requerida começou a embalar roupa, tanto dela, como do menor, e a colocar vários objetos da casa de morada de família em sacos,
- em 2020, no dia 14 de dezembro, de manhã, por volta das 8:45h quando vestia o BB para ir para a escola, já a requerida tinha saído de casa, o requerente não encontrou as roupas do filho e enviou uma mensagem à requerida a perguntar por estas, não obtendo resposta,
- o requerente abriu uma das malas que a requerida tinha feito, e retirou a roupa necessária para vestir o BB,
- entretanto, a requerida entra em casa e ao ver a mala aberta, fica furiosa, fecha-a e atira-a com força contra o requerente,
- como o BB estava próximo do requerente, foi também o BB atingido com a mala que a requerida atirou,
- em 2020, no dia 14 de dezembro, o requerente perguntou o porquê de a requerida estar a fazer as malas com todas as roupas e pertences do BB e não obteve qualquer tipo de resposta, estava ao que agora se apurou, a planear a fuga com o menor do dia seguinte,
- além destes episódios a requerida teve infelizmente muitos outros:
• desliga o quadro elétrico quando o requerente está a trabalhar ao computador;
• é o requerente que prepara a grande parte das refeições do BB, sendo frequente que quando este se senta para dar de comer ao filho, está a requerida a dar-lhe sandes ou bolachas;
• pratica ‘bruxaria’, tendo diversos objetos associados a essa prática em casa, colocando pedras em forma de santuário, fazendo rezas, queimando incenso e velas;
- tais factos já chegaram a ser presenciados pela GNR, numa ocasião ocorrida há cerca de dois anos em que a requerida estava desequilibrada e abriu a porta a dois agentes da GNR completamente nua, tendo os agentes verificado que a mesma tinha a casa de banho cheia de velas acesas;
- nesta ocasião a GNR foi chamada ao local porque a requerida ameaçou suicidar-se e tirar a vida ao BB.
- pelo supra exposto, apresentou o requerente queixa em 2020/12/04, que deu origem ao processo com o NUIPC 586/20.....
- em 2020, no dia 15 de dezembro, antes de se deslocar à escola para ir buscar o BB, enviou o requerente por email o que já tinha sugerido, e a requerida concordado, na presença do BB, quanto à partilha das férias do menor;
- em 2020, no dia 15 de dezembro, o requerente quando foi buscar o filho à escola às 15:15h, horário normal de saída, e conforme fazia todos os dias, foi informado pela auxiliar da escola, que a requerida tinha ido buscar o BB antes da hora do almoço, tal, sem o conhecimento do requerente,
- o requerente ligou para a requerida e para os avós maternos, para saber do paradeiro do filho, ninguém atendeu o telefone,
- nessa mesma manhã – 15 de dezembro de 2020 - a requerida tinha feito mais uma ameaça de morte ao filho,
- de imediato o requerente deslocou-se à GNR e contactou a CPCJ ... a dar nota dos factos solicitando ajuda na localização do paradeiro do seu filho, chegando a temer pela vida do BB,
- só por volta das 17:30h é que foi informado pela GNR ... sobre o paradeiro do seu filho, estava em casa dos avós maternos em Guimarães,
- o requerente permaneceu nessas cerca de duas horas, que pareceram uma eternidade, num profundo desespero, angustia e aflição pela segurança e saúde do seu filho menor BB,
- o requerente deslocou-se diversas vezes à CPCJ ... a denunciar a situação em que o menor vivia, bem como diversas queixas foram apresentadas na GNR de ..., ... e posteriormente nas ... em Guimarães,
- neste mesmo dia 15 de dezembro tinha o BB uma consulta de otorrino, tendo faltado a essa consulta,
- por todo o supra exposto, não está a Requerida em condições de tomar conta do filho menor de ambos,
- toda a conduta da requerida é de alienação parental:
· inviabilização de visitas;
· insinuação/acusação de maus tratos;
· proibição de contacto do requerente com o menor;
· enceta conflitos com o requerente na presença do filho para influenciar a perceção do acontecimento;
· impede o menor do convívio normal com avós paternos.

Conclui pugnando pela procedência da alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais, passando a vigorar um regime de guarda e responsabilidades parentais em que estas sejam atribuídas ao pai, atento todo o supra exposto, e o facto de a mãe ter optado por ir viver para um local que inviabiliza uma guarda alternada e partilha de responsabilidades parentais.
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Por despacho de 14/01/2021 foi decidido julgar procedente a exceção de incompetência territorial suscitada pelo progenitor, entendendo ser competente o lugar da residência do menor, apesar da progenitora sustentar que desde dia 15/12 a residência do menor passou a ser na área deste Tribunal.
Nos termos do art.º 28.º do R.G.P.T.C., e por se ter entendido que o BB estava ilegitimamente fora da área da residência, foi determinada a entrega da criança ao pai, via técnico da E.M.A.T.
Tal decisão foi cumprida, conforme resulta da informação de 19/01/2021, aí se consignando que, “após o choque inicial da decisão judicial, uma vez que a progenitora a desconhecia, esta mostrou uma postura colaborante e facilitadora do processo de transição, sem focada no bem-estar do filho. A progenitora demonstrou um comportamento adequado para a situação, com tristeza e revolta face à decisão, mas com uma abordagem centrada no filho, tendo sido a própria a explicar ao BB e a incentivar que este fosse bem, conseguindo ultrapassar os seus próprios sentimentos. O BB face à abordagem da progenitora estava tranquilo, demonstrou felicidade ao ver o progenitor, avó paterna e tio paterno. O progenitor fez-se acompanhar por estes familiares, uma vez que também são pessoas de referência para o filho. O momento de entrega da criança ao progenitor foi adequado, com momentos de carinho e de proteção. No dia de hoje, o progenitor contatou a equipa, dando conhecimento do estado do filho, estando o mesmo sereno. Esta informação foi transmitida pela nossa equipa à progenitora. No momento da entrega, o progenitor foi sensibilizado a facilitar contatos telefónicos entre a progenitora e o BB, tendo o mesmo demonstrado consideração para o efeito (…)”.
Deste despacho de 14/01/2021 foi interposto recurso pelo Digno Magistrado do M.P., pugnando pela revogação do despacho e pela designação e conferência de pais, com brevidade, ordenando-se que a ação continuasse a ser tramitada no Juízo de Família e Menores ..., territorialmente competente para a fixação e um novo regime provisório mais amplo, que consagre visitas à mãe e que mantenha na sua essência o regime adotado pelo Juízo de Família e Menores ..., pugnando ainda para que seja realizado exame pericial psicológico aos progenitores com vista a determinar os traços de personalidade, a existência ou não de perturbações e/ou desvios de personalidade.
Também a progenitora apresentou recurso do despacho proferido, pugnando para que a guarda lhe fosse atribuída, decretando-se a imediata entrega do menor à progenitora.
O progenitor respondeu aos recursos interpostos, pugnando pela manutenção do despacho recorrido.
Neste Tribunal da Relação foi determinada a convolação do recurso da decisão que julgou territorialmente incompetente o Tribunal de Família e Menores ..., em reclamação e, convolada esta, veio a ser atendida a reclamação apresentada pelos recorrentes, declarando-se que o tribunal competente para os termos do processo era de facto o Juízo de Família e Menores ....
No mais, este Tribunal da Relação de Guimarães revogou parcialmente o despacho recorrido, determinando-se a designação da conferência de pais e, caso os progenitores não chegassem a acordo, fosse fixado um regime provisório mais amplo, que consagrasse visitas à mãe, ainda que supervisionadas e que se ordenasse a realização de um exame pericial psicológico aos progenitores.
Foi solicitada a ordenada perícia psicológica e designada data para uma conferência de pais.
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Na data designada para a conferencia - 07/07/2021, não estando ainda realizada a perícia -, foram reguladas as férias a favor da progenitora, em casa dos avós maternos, o aniversário do filho e as videochamadas, relegando-se para momento posterior a apreciação de um regime de visitas supervisionado ou não.
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Por despacho de 15/09/2021, na sequência de promoção do M.P., fixou-se o regime provisório de fins de semana de 15 em 15 dias, nos termos já adiantados na conferência de 07/07, sendo que, a fim das despesas serem equitativamente repartidas, fixou-se o local de entrega em ..., atenta a mudança de residência do progenitor e manteve-se os horários fixados, mantendo-se a data agendada para nova conferência - 20/10/2021.
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Nesta data e na conferência, manteve-se o regime em vigor no tocante ao convívio entre a criança, indeferiu-se a pretensão da mãe quanto à alteração do regime provisório em termos de guarda alternada e determinou-se que se aguardasse pelos relatórios periciais.
Deste despacho foi interposto recurso pela progenitora, ao qual responderam o M.P. e a progenitora, tendo, em 03/02/2022, o Tribunal da Relação de Guimarães julgado improcedente a apelação e confirmado a decisão recorrida.
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Foram juntos aos autos o relatório psicológico dos progenitores e do menor.
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Em paralelo com estes autos, correu termos processo de promoção e proteção - apenso A – que se iniciou em 19/01/2021, no Tribunal ..., com requerimento apresentado pelo Mº Pº, no qual foi proferida decisão provisória que, considerando a decisão já proferida nos autos principais em 14/01/2021, aplicou a medida cautelar de apoio junto do pai (despacho de 20/01/2021).
Desta decisão foi interposto recurso pela mãe do menor, pugnando pela alteração das responsabilidades parentais nos termos propostos na ação principal.
Também o Mº Pº recorreu da decisão proferida, pugnando pela aplicação de mediada de apoio junto de ambos os pais, entendendo não ser de ultrapassar o acordo que haviam alcançado no primeiro processo de responsabilidades parentais.
O pai do menor pugnou pela manutenção do despacho.
Nesses autos foi proferido Acórdão que, mantendo o despacho proferido, completou-o com um regime de convívio materno-filial, estabelecendo que o BB passasse com a mãe a tarde de Sábado, com supervisão.
Esses autos terminaram com despacho de cessação da medida aplicada, proferido em 20/09/2022.
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Com data de 16/02/2022, o Magistrado do Mº Pº. requereu a abertura de novo processo judicial de promoção e proteção referente ao menor, sustentando que o menor foi sinalizado pelo progenitor junto da CPCJ de ..., sustentando que o menor era vítima de violência psicológica e abuso sexual protagonizados pela progenitora, dando origem ao Apenso D.
Da informação social do E.M.A.T. e 13/06/2023, resulta que o menor não se encontra numa situação de perigo, mas que, se o conflito parental se mantiver e se o menor vivenciar essa dinâmica, num futuro próximo, este pode vir a afigurar-se como fator desestabilizador na vida escolar e social do menor.
Na diligência realizada nesses autos em 26/09/2023 foi determinado o arquivamento dos referidos autos.
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Por requerimento de 24/03/2022, em face à aproximação das férias da Páscoa, a progenitora pugnou para que o período de 7 a 10 de abril, que já lhe compete, seja alargado até ao dia ../../.....
Por requerimento de 04/04/2022, o progenitor pronunciou-se pelo indeferimento da pretensão deduzida pela progenitora, alegando que esta continuava a exercer violência psicológica sobre o menor.
O M.P. aderiu à posição da progenitora.
Por despacho de 08/04/2022 a pretensão da progenitora foi atendida.
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Por requerimento de 08/07/2022, veio a progenitora pugnar para que lhe fosse fixado um período de férias de verão com o menor de 21 a 31 de julho e de 14 a 31 de agosto.
Por requerimento de 14/07/2022, o progenitor deduziu oposição à posição da progenitora, alegando que a progenitora colocava o menor em risco, pugnando pela alteração do regime instituído, voltando as visitas da mãe a serem supervisionadas pelo CAFAP.
Por despacho de 15/07/2022, foi deferida parcialmente a pretensão da progenitora fixando-se o período de férias entre 14 e 31 de agosto, tendo em conta as consultas de psicologia do menor em julho.
Por despacho de 20/09/2022, tendo-se em conta que o menor iniciou o 1º ano do 1º ciclo, foi alterado o regime provisório, no tocante aos convívios com a mãe, passando os fins de semana, de 15 em 15 dias, a ocorrer desde o fim das aulas de sexta-feira (hora a combinar pelos progenitores, tendo em conta a deslocação até ao local de transição, que se mantém) até à hora de domingo atualmente em vigor. Foi designada para conferência o dia 09/11/2022.
Foi junto aos autos informação clinica do EMP01... onde o menor anda a ser seguido, por iniciativa do progenitor.
Na data designada para conferência de pais - 09/11/2022 - foram solicitadas perícias na Universidade ... e alterou-se o regime de fins de semana, determinando que a criança faltasse às sextas-feiras, de 15 em 15 dias, nos fins de semana da mãe, à ultima aula/atividade lúdica/física para que a criança estivesse na estação da ... até às 18:30, vindo jantar a casa da mãe; a hora de entrega ao domingo passou para as 17:30 horas na estação de .... Desde o fim das aulas do 1º período até às 15 horas do dia 26/12, a criança estaria com a mãe e daí em frente até ao início das aulas com o pai.
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Por requerimento de 10/01/2023, a progenitora veio alertar que o calendário escolar do menor era diferente do habitual, sendo que o menor teria uma interrupção entre ../../.... e 5 de fevereiro e outra entre 18 e 22 de fevereiro, devido ao carnaval, pugnando que se determinasse os dias em que o menor estaria com a mãe nos aludidos períodos.
Por requerimento de 23/01/2023, o progenitor opõe-se à pretensão da progenitora, alegando que nesses períodos o menor tinha aulas de inglês, natação, karaté e consultas de psicologia.
Por despacho de 27/01/2023 foi parcialmente atendida a pretensão da progenitora, deferindo-se o pedido da mãe de 31/01 a 04/02, deferindo-se também para o período de 20/02, mantendo-se o decidido quanto ao horário e local e recolha e entrega.
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Consta dos autos a perícia psicológica ao menor e progenitores realizada pela Universidade ....
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Por requerimento de 16/02/2022, o progenitor veio reclamar e pedir esclarecimentos aos relatórios periciais, tendo a progenitora exercido o contraditório.
Consta dos autos uma informação clínica da autoria da Dra. II, que acompanhava o menor, nas consultas levadas a cabo por iniciativa do progenitor.
Por despacho de 06/03/2023 foi indeferida a reclamação e o pedido de esclarecimentos.
Ainda neste despacho as partes foram notificadas para apresentarem alegações e rol de testemunhas nos termos do art. 39º/4 do RGPTC.
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Por requerimento de 27/03/2023, o progenitor apresentou as suas alegações e indicou a sua prova, propondo a fixação do seguinte regime definitivo:

Exercício das Responsabilidades Parentais
As Responsabilidades Parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho, incluindo as questões de saúde e escolares, serão exercidas pelo Pai e as responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente do filho cabem ao progenitor que tiver a guarda do menor nesse momento.
Guarda e Visitas do menor
O menor fica confiado aos cuidados do Pai, à sua guarda e tutela.
O menor passará com a mãe fins-de-semana alternados.
Para esse efeito, nos fins de semana da mãe, o pai entregará o menor a mãe, na sexta-feira, em frente ao Portugal dos ..., em Coimbra até as 18.30h, jantando o menor em casa da mãe.
A mãe, no domingo do seu fim de semana, entregará o menor ao pai as 17.30h em frente ao Portugal dos ..., em Coimbra.
Férias
Durante o período de férias compreendido entre o dia 1 e 31 de agosto, as férias serão repartidas em dois períodos iguais, um para cada um dos progenitores, cabendo o direito de escolha a mãe nos anos ímpares e ao pai nos anos pares.
Em todo o período de férias o menor deverá estar sempre contactável pelo progenitor que não está na sua companhia por telemóvel, entre as 19.00h e as 20.00h.
Épocas Festivas
Natal e Ano Novo:
O menor repartirá, alternadamente com cada um dos progenitores, as duas semanas de férias do Natal. A primeira semana de férias inicia-se no último dia de aulas do primeiro período, e termina às 15.00h do dia 26 de dezembro. A segunda semana inicia-se às 15.00h do dia 26 de dezembro, sendo a entrega e recolha do menor feita em Coimbra, em frente ao Portugal dos ..., e quando a primeira semana for da mãe, a entrega será as 17.30h.
O direito de escolha cabe a mãe nos anos pares e ao pai nos anos ímpares.
Páscoa:
O menor repartirá, alternadamente com cada um dos progenitores, as duas semanas de férias da Páscoa ou o período definido pelo estabelecimento de ensino. A primeira semana de férias inicia-se no último dia de aulas do segundo período e termina às 15.00h do Domingo de Páscoa. A segunda semana inicia-se às 16.00h do Domingo de Páscoa, sendo a entrega e recolha do menor feita em Coimbra, em frente ao Portugal dos ..., e quando a primeira semana for da mãe, a entrega será as 17.30h.
O direito de escolha cabe a mãe nos anos pares e ao pai nos anos ímpares.
Aniversários:
O menor passará o dia do seu aniversário com o progenitor com quem estiver de férias.
O menor passará o dia de aniversário do pai e o dia do pai com o pai, e o dia da mãe e o dia de aniversário da mãe com a mãe.
Se alguma destas quatro datas não calhar em dia que o menor esteja com os respetivos progenitores, e querendo estes, serão estes a ir ter com o menor ao local onde este se encontra.
Alimentos
A mãe prestará, a título de pensão de alimentos, ao BB a quantia mensal de € 150,00 (cento e cinquenta euros), esta quantia engloba a participação da mãe nas despesas de saúde e escolares, quantia que deverá estar disponível na conta bancária do Pai com o IBAN  ...05 até ao dia 8 do mês a que a pensão disser respeito”.
*
Por requerimento datado de 27/03/2023, a progenitora apresentou as suas alegações e meios de prova, pugnando que a guarda lhe fosse atribuída, sem prejuízo da fixação de um regime de visitas ao progenitor.

Foi realizado o julgamento com observância do formalismo legal e, concluído este, foi decidido que:

Face a todo o exposto, julga-se totalmente procedente o pedido de alteração do regime de regulação das responsabilidades parentais deduzido pela Requerente AA, e totalmente improcedente o pedido de alteração do regime das responsabilidades parentais deduzido pelo Requerido CC e, em consequência determino que seja alterado o regime provisório relativo ao exercício das responsabilidades parentais do menor BB, nos seguintes termos:
A) “Exercício das Responsabilidades Parentais
As Responsabilidades Parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho, incluindo as questões de saúde e escolares, serão exercidas pela mãe que deverá matricular o menor num estabelecimento de ensino na área da sua residência, comprovando nos autos, em 10 dias, o estabelecimento de ensino escolhido, passando esta a figurar como encarregada de educação do menor.
A transição da residência para a progenitora ocorrerá às 15.00h do dia 26 de dezembro, sendo a entrega e recolha do menor feita em Coimbra, em frente ao Portugal dos ..., por forma a que o menor passe essa segunda semana de férias com a progenitora e possa iniciar as aulas no novo estabelecimento de ensino que vier a ser definido pela progenitora;
As responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente do filho cabem ao progenitor que tiver a guarda do menor nesse momento.
Até à data acima referida, vigorará o regime provisório fixado nos autos.
B) Guarda e Visitas do menor
O menor fica confiado aos cuidados da mãe, à sua guarda e tutela, fixando residência em Guimarães.
O menor passará com o pai fins-de-semana alternados.
Para esse efeito, nos fins de semana do pai, a mãe entregará o menor ao pai, na sexta-feira, em frente ao Portugal dos ..., em Coimbra até as 18.30h, jantando o menor em casa do pai.
O pai, no domingo do seu fim de semana, entregará o menor à mãe às 17.30h em frente ao Portugal dos ..., em Coimbra.
Férias
Durante o período de férias compreendido entre o dia 1 e 31 de agosto, as férias serão repartidas em dois períodos iguais, um para cada um dos progenitores, cabendo o direito de escolha ao pai nos anos ímpares e à mãe nos anos pares.
Em todo o período de férias o menor deverá estar sempre contactável pelo progenitor que não está na sua companhia por telemóvel, entre as 19.00h e as 20.00h.
Épocas Festivas
Natal e Ano Novo:
O menor repartirá, alternadamente com cada um dos progenitores, as duas semanas de férias do Natal. A primeira semana de férias inicia-se no último dia de aulas do primeiro período, e termina às 15.00h do dia 26 de dezembro. A segunda semana inicia-se às 15.00h do dia 26 de dezembro, sendo a entrega e recolha do menor feita em Coimbra, em frente ao Portugal dos ..., e quando a primeira semana for da mãe, a entrega será as 17.30h.
Este ano a primeira semana será do pai e a segunda da mãe.
Páscoa:
O menor repartirá, alternadamente com cada um dos progenitores, as duas semanas de férias da Páscoa ou o período definido pelo estabelecimento de ensino que o menor passará a frequentar. A primeira semana de férias inicia-se no último dia de aulas do segundo período e termina às 15.00h do Domingo de Páscoa. A segunda semana inicia-se às 16.00h do Domingo de Páscoa, sendo a entrega e recolha do menor feita em Coimbra, em frente ao Portugal dos ..., e quando a primeira semana for da mãe, a entrega será as 17.30h.
O direito de escolha cabe a mãe nos anos pares e ao pai nos anos ímpares.
Aniversários:
O menor passará o dia do seu aniversário com o progenitor com quem estiver de férias.
O menor passará o dia de aniversário do pai e o dia do pai com o pai, e o dia da mãe e o dia de aniversário da mãe com a mãe.
Se alguma destas quatro datas não calhar em dia que o menor esteja com os respetivos progenitores, e querendo estes, serão estes a ir ter com o menor ao local onde este se encontra.
C)Alimentos
O pai prestará, a título de pensão de alimentos, ao BB a quantia mensal de €300,00 (trezentos euros), ficando ainda obrigado a comparticipar em 50% nas despesas de saúde, escolares e extracurriculares, quantia que deverá estar disponível na conta bancária da mãe, para o NIB que esta vier a indicar até ao dia 8 do mês a que a pensão disser respeito”.
As prestações sociais relativas ao menor, como o abono de família, deverão ser recebidas pela mãe”.

É desta decisão que foi interposto recurso pelo pai do menor que conclui nos seguintes termos:
“1. O Tribunal a quo proferiu Sentença, ora em crise, alterando o regime de regulação das responsabilidades parentais do menor BB em vigor a título provisório desde ../../2021 – há quase 3 anos;
2. Esta alteração foi decidida sem a prévia audição do menor BB, em contravenção ao que se estipula no nosso direito, que consagra o direito à audição da criança, no n.º 9 do artigo 1906º do código civil, associando-o, ao princípio do reconhecimento do superior interesse da mesma, como decorre do art.º 5º do RGPTC (Lei n.º 141/2015, de 8 de setembro), sob a epígrafe, “Audição da criança“, em cujo nº 1 se refere que, «a criança tem direito a ser ouvida, sendo a sua opinião tida em consideração pelas autoridades judiciárias na determinação do seu superior interesse»;
3. Os artigos 4 ºn.º1 c), e n.º2, e 5º n.º1 e 2, da RGPTC, consagram os princípios orientadores e a audição da criança, e o art.º 35º nº 3 da RGPTC, dispõe que «a criança com idade superior a 12 anos ou com idade inferior, com capacidade para compreender os assuntos em discussão, tendo em atenção a sua idade e maturidade, é ouvida pelo Tribunal, nos termos previstos na alínea c) do artigo 4.º e no artigo 5.º, salvo se a defesa do seu superior interesse o desaconselhar»;
4. Está consagrada no nosso ordenamento jurídico que a criança, mesmo com idade inferior a 12 anos – idade esta, em que se presume a capacidade e a maturidade necessária – deve emitir a sua opinião quanto aos assuntos que lhe digam respeito;
5. Tal direito está também consagrado em legislação internacional: i) Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU, assinada em Nova Iorque a 26 de Janeiro de 1990 (Resolução da Assembleia da República 20/90, de 12 de Setembro e Decreto do Presidente da República 49/90, de 12 de setembro) no seu artigo 12.º, ii) na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, no seu art.º 24º, a respeito dos “Direitos das crianças”; iii) na Convenção Europeia sobre o Exercício dos Direitos da Criança de 25 de Janeiro de 1996 (Resolução da Assembleia da República 7/2014, de 13 de Dezembro de 2013, e Decreto do Presidente da República 3/2014, de 27 de Janeiro) no seu artigo 3.º, alínea b), e no art.º 6º, al b), §3; iv) O Regulamento (CE) n.º 2201/2003, de 27 de Novembro (Decisões em Matéria Matrimonial e Responsabilidade Parental – Bruxelas IIBis), tendo em vista a execução de decisões entre Estados – Membros salienta igualmente a importância da audição da criança;
6. A nossa jurisprudência é também nesse sentido – audição do menor- veja-se o Acórdão da Relação de Coimbra, de 13-06-2023, no Proc. 437/21.1T8CLD-A.C1, e o Acórdão do STJ de 14.12.2016, no Proc. 268/12.0TBMGL.C1.S1 - in www.dgsi.pt;
7. Dos autos resultam pelo menos três razões que impunham a audição do BB:
i) o relatório da psicóloga do BB Dra. II, datado de fevereiro de 2023, solicitado pelo M.P., e que deu origem ao Apenso D deste processo;
ii) Declaração da Testemunha JJ tendo prestado o seu depoimento na audiência de julgamento de 13 de outubro de 2023 (2ª sessão do julgamento), declarando relativamente ao BB “disse-me assim por variadas vezes, lembro-me de ter fixado esta visita, eu quero falar com o juiz “– declaração que consta da gravação disponibilizada no sistema citius entre as 14h28m-14h52m, da audiência de julgamento de 13.10.2023, nos minutos 5:19 a 5:52
iii) As declarações para memória futura que o BB prestou no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, e admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, sendo composta por 3 vídeos. Veja-se o vídeo 1: minuto 00:06:35 – a 00:07:55;
8. Ao abrigo do princípio do inquisitório, com esta informação nos autos, tinha o Tribunal “a quo” de tomar uma de duas opções, a) ouvir o menor, b) não ouvindo, fazer despacho justificando o porque de não ouvir o menor;
9. O menor BB, é uma criança autónoma, segura, falador e espontâneo, com estas características dará um contributo útil para uma decisão que lhe diga respeito, e o BB quer ser ouvido;
10. A falta de audição do BB afeta a validade desta Sentença, esta omissão é um desrespeito por um princípio enformador do direito das crianças, com repercussão processual, de natureza substantiva: o direito do BB a ser ouvido, e a ser-lhe proporcionada a liberdade de expressão de um verdadeiro sujeito de direitos;
11. A partir do momento em que o Tribunal deveria ter ouvido o  BB antes de  ter proferido a Sentença, e não ouviu, essa omissão corresponde a um erro de julgamento, por a infração praticada passar a estar coberta pela decisão;
12. Apesar da omissão indevida deste ato, o Tribunal decidiu algo que não podia decidir sem a realização do ato omitido – audição do BB – assim a Sentença é nula por excesso de pronúncia nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, nulidade que se alega para todos os efeitos legais;
13. É também nula esta sentença por violação do artigo 1906º n,º1 a 3, atribuiu o Tribunal “a quo” as responsabilidades parentais de particular importância apenas a mãe, sem decisão fundamentada a justificar (negrito nosso):
A) “Exercício das Responsabilidades Parentais
As Responsabilidades Parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho, incluindo as questões de saúde e escolares, serão exercidas pela mãe…
14. O artigo 1906º n.º2 do CC, faz depender de decisão fundamentada a estipulação do exercício de responsabilidades parentais apenas por um dos progenitores;
15. Ao estipular que as Responsabilidades Parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho, incluindo as questões de saúde e escolares, serão exercidas pela mãe, omitiu a decisão formalidade imposta por lei, o que é gerador de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do artigo 615º n. º1 alínea d) do CPC, nulidade que se alega para todos os efeitos legais;
16. Acresce que este regime é contrário ao interesse do BB, e não houve decisão fundamentada, porque nada nos autos justifica esta alteração: é o pai que desde sempre providencia por todas as necessidades do BB, e desde ../../2021, providencia sozinho pelas necessidades afetivas, escolares, curriculares, extracurriculares, karaté, natação, inglês e psicóloga, porquanto a mãe nem sequer monetariamente quis participar das mesmas;
17. A sentença é também nula por violação do art.º 2004 n.º1 do código civil, porquanto estipulou uma pensão de alimentos ao pai nos seguintes termos:
C) Alimentos
O pai prestará, a título de pensão de alimentos, ao BB a quantia mensal de €300,00 (trezentos euros), ficando ainda obrigado a comparticipar em 50% nas despesas de saúde, escolares e extracurriculares, quantia que deverá estar disponível na conta bancária da mãe, para o NIB que esta vier a indicar até ao dia 8 do mês a que a pensão disser respeito”.
As prestações sociais relativas ao menor, como o abono de família, deverão ser recebidas pela mãe;
18. Não apurou o Tribunal “a quo” os meios disponíveis do pai para prestá-los, nem quais as necessidades do BB;
19. Dos factos provados no processo constam apenas os rendimentos do pai/recorrente – que são eventuais, e o salário da recorrida, os artigos 22º e 27º dos factos provados;
20. Esta omissão é também geradora de nulidade, por excesso de pronuncia, nos termos do artigo 615º n. º1 alínea d) do CPC, nulidade que se alega para todos os efeitos legais;
21. A sentença é também nula por obscuridade, nos termos do artigo 615º n. º1 alínea c) do CPC, obscuridade que torna a decisão ininteligível, porquanto refere que o menor fica a tutela da mãe (negrito nosso);
22. Prevê o artigo 1921.º do CC, o regime da tutela, sendo que nenhuma dessas tipificações se aplica aos presentes autos, pelo que a Sentença é obscura, ininteligível, não se compreendendo o objetivo nem o alcance da mesma, nulidade que se alega para todos os efeitos legais;
23. Não obstante as nulidades supra invocadas, previstas no artigo 615º n.º1 alíneas d) e c) do CPC, sem prejuízo do conhecimento destas por este Venerando Tribunal, sempre se acrescentará também, que a prova constante dos autos quando corretamente valorada e selecionada para o rol dos factos provados, não poderia levar à decisão proferida pelo Tribunal “a quo”;
24. A Sentença prolatada pelo Tribunal “a quo” padece de manifesta desconformidade e erro entre os elementos probatórios constantes dos autos e a matéria fáctica apurada constante da respetiva fundamentação, em termos tais que impõem a alteração de tal matéria por este Tribunal Superior, nos termos do art..º. 662º, n.º 1, do CPC.
25. Desde logo o Tribunal “a quo” não teve em consideração na decisão, elementos probatórios carreados para o processo por iniciativa do próprio Tribunal, a pedido do M.P., como seja o relatório da Dra. II, de fevereiro de 2023, a fls … do Apenso D (classificado como confidencial), e que também consta dos presentes autos, sendo o documento n.º ... do requerimento datado de 16.02.2023, e as declarações para memória futura prestadas pelo BB no âmbito do processo n.º1753/21...., que foram aceites no despacho saneador, datado de 04-05-2023;
26. Estes elementos probatórios contêm matéria de facto relevante que deveria ter sido considerada;
27. A prova constante dos autos quando corretamente valorada e selecionada para o rol dos factos provados, não poderia levar à decisão proferida pelo Tribunal “a quo”;
28. Considerou o tribunal “a quo” como provados os factos 1º a 40º da sentença, fls… da sentença;
29. Desses factos, o 24º não poderia ser julgado como provado:
30. Este facto, considerado provado pelo tribunal “a quo” é conclusivo, baseado num raciocínio também conclusivo, do Tribunal “a quo”.
31. O que está dado como facto provado neste artigo 24º, não é um facto, é uma alegação da progenitora, e uma conclusão do Tribunal, feita através de interpretação extensiva das declarações da testemunha FF, prestadas em 26.09.2023, gravação no sistema Citius, das: 15:13 às 15:28, minuto 09:10 a 10:48 (negrito nosso):
32. Quanto ao histórico clínico da progenitora, a informação prestada pelo médico psiquiatra foi testemunho de ouvir dizer, baseado em auto-relatos da mãe, e o que confirma é que, a) mãe já se tentou suicidar; b) tem doença mental – apesar de o psicólogo não a qualificar como grave; c) continua medicada, Cfr, declarações do Dr. DD – psiquiatra que acompanha a Requerente/Recorrida (negrito nosso), prestadas no dia 26.09.2023, gravada no sistema citius hora: 15:13 às 15:28, minutos: 02:00 a 02:46
33. Consta também nos autos, junto pela progenitora, em requerimento de 15/07/2021, relatório do seu médico psiquiatra, Dr. FF, e que consta também como facto assente n.º 29, do qual resulta (negrito nosso): “trata-se de mulher com antecedentes de episódios depressivos prévios, apontando-se o diagnóstico de  uma reação depressiva prolongada, muito em linha com personalidade ansiosa de base. Tem estado medicada com antidepressivo e ansiolítico de forma regular (sem toxicidade comportamental) e cumprindo acompanhamento regular também em consultas de psicologia.
34. Confirma o médico psiquiatra que a recorrida já tinha historial depressivo antes do relacionamento com o pai recorrente, e que a ansiedade e medicação é o seu mecanismo habitual de reação.
35. O Tribunal “a quo”, tenta imputar responsabilidade ao progenitor pela doença mental da progenitora, acusando este de utilizar a doença da mãe, ao longo do processo, quando é o médico psiquiatra da mãe que refere doença mental e tentativa de suicídio, anteriores ao relacionamento dos progenitores do BB.
36. Na fundamentação da Sentença, o Tribunal “a quo” valida a subtração ilícita do BB, concretizada pela recorrida, justificando que a mesma está validada porque à mãe foi “colado um quadro depressivo”, quando esse quadro era prévio a este processo.
37. O Tribunal “a quo” confunde a proteção do BB, que teve de ser feita pelo pai, chamando-lhe violência psicológica da parte do pai/recorrente contra a mãe/recorrida;
38. Conforme resulta do documento junto com estas alegações, tendo o pai recorrido as instituições que servem para proteger os menores, IAC e SOS CRIANÇA, foi aconselhado pelo Dr. KK, secretário geral do IAC e coordenador da SOS CRIANÇA, a fazer participação criminal da atuação da mãe do BB, cfr documento n.º ... junto com o requerimento de recurso;
39. Não foi o pai/recorrente, condenado no âmbito de qualquer processo de violência doméstica;
40. A mãe/recorrida fez duas participações criminais contra o pai/recorrente, o Tribunal “a quo” nunca as refere nem valoriza, estava também obrigado a tal, de acordo com o princípio do inquisitório.
41. É assim este facto 24º, uma expressão genérica, tendenciosa e que não poderá constar como facto provado, mas antes como não provado porquanto não tem qualquer sustentação na prova produzida nos autos, o que se alega;
42. Outros factos há que deviam ter sido julgados como provados pelo tribunal “a quo” – e que devem ser aditados a matéria de facto provada,
43. Facto a aditar com o n.º 41º - que a requerida enquanto viveu com o Requerente tivesse tido vários comportamentos errantes/desviantes.
44. Este Facto devia ter sido julgado provado de acordo coma certidão emitida por OPC, junta ao processo em 08.01.2021, “… que abriu a porta toda nua e foi necessário insistir com ela para se vestir”, a alegação de comportamentos desviantes é relevante para aferir a competência da mãe requerente/recorrida.
45. Facto a aditar com o n.º 42º - que o pai, desde o nascimento do BB, é quem cuida do menor, que fosse a sua figura de referência.
46. Este facto deveria ter sido julgado provado, pois é um facto manifesto: a única altura que o BB esteve aos cuidados da mãe, foi quando foi ilicitamente subtraído por esta da casa de morada de família, no período de 20.12.2020 até ao despacho de14.01.2021. e resulta também das declarações da Testemunha LL, depoimento em 13.10.2023, gravado no sistema citius, hora : 14:54 – 15:09 minuto 0.55 a 01.51
47. Também conforme a certidão do OPC que consta dos autos, submetida no sistema citius em 08.01.2021, refere mais um episódio em que a mãe do BB o deixou aos cuidados do pai, para além do episódio de dia 04/09/2018 (negrito nosso): … no mesmo auto faz-se referência a uma outra vinda da progenitora para casa dos pais, por um período de tempo, em ..., Guimarães, ainda que dessa vez tenha deixado o filho com o pai e se tenha despedido da criança).
48. A Sentença ao dar este facto como não provado, entra em contradição com a sua fundamentação, pois refere o Tribunal “a quo”: (negrito nosso) …Não podemos esquecer que, desde ../../2021, que o BB está entregue ao pai, estando a progenitora sujeita a convívios esporádicos, de periodicidade quinzenal,
49. Este facto teria de ser julgado como provado, não só pelo tempo que o pai está com o BB, como também pelo facto de a mãe quando necessita de tratar da sua saúde mental deixar o menor com o pai, o que nos autos sucedeu pelo menos duas vezes.
50. Facto a aditar com o n.º 43º - que a mãe do BB, devido a depressão, ansiedade, e toma de medicação, estava numa situação de incapacidade.
51. Este facto devia ter sido julgado provado, resulta da declaração de OPC que consta do processo, submetida no sistema citius em 08.01.2021, e resulta também das declarações da testemunha, Dr. FF, prestadas em 26-09-2023, gravação no sistema citius, na hora: 15:13 às 15:28 – minuto 02:00 a 02:46.
52. Na fundamentação da Sentença o Tribunal “ a quo” desvaloriza o historial de depressão da mãe, com episodio de tentativa de suicídio, defendendo mesmo que o pai esteja a utiliza-lo como arma de arremesso.
53. Este historial é um facto (max. declaração deste médico psiquiatra, junta aos autos pela progenitora por requerimento de 15.07.2021), enquanto facto tem de ser valorado pelo Tribunal, tendo em conta que o bem em causa no processo é o BB, e não a mãe do BB.
54. Facto a aditar com o n.º 44º - que ao longo dos 6 anos de vida do BB, o pai foi sempre a figura de continuidade, a constante na vida do BB.
55. Este facto devia ter sido julgado provado, porque é manifesto que o BB esteve sempre com o pai, em ..., em Guimarães, em ..., em ..., e agora novamente em ..., (e desde ../../2021 apenas com o pai) (Cfr. declarações da avó do BB, prestadas em audiência de julgamento - Testemunha LL, depoimento em13.10.2023,gravado no sistema Citius, hora: 14:54 –15:09, minutos 0:55 a 01.51;
56. Facto a aditar com o n.º 45º - que o facto de o BB estar a residir com o Pai é o que lhe tem dado estabilidade, segurança e confiança.
57. Este facto devia ter sido julgado provado, desde logo porque consta das perícias solicitadas pelo Tribunal a necessidade de o BB ter apoio psicológico, o que foi imediatamente providenciado pelo pai (Cfr. o relatório médico-legal feito ao BB, pelo Gabinete medico legal e Forense do ... – relatório solicitado pelo Tribunal – de 25.01.2022, pontos 6.5 e 6.7, e a prova testemunhal, declarações da avó paterna do BB, LL, depoimento em 13.10.2023, gravado no sistema Citius, hora : 14:54 – 15:09, minutos 0:55 a 01:51, e ainda Cfr. doc. junto com o requerimento de recurso com o n.º2.
58. Foi o psicólogo KK, que instou o Recorrente a fazer participação criminal, sob pena de não o fazendo o pai/recorrente, serem estas instituições a fazê-lo (Cfr. documento junto com o requerimento de recurso com o n.º 1).
59. Também lhe foi transmitido que deveria gravar as chamadas telefónicas da mãe/recorrida, o que fez, gravação esta qualificada na Sentença como “ato abusivo”, pelo Tribunal “a quo”, mas não é pela jurisprudência, veja-se Ac. Tribunal da Relação do Porto, Processo 308/16.3GAVFR.P2, de 24-09-2020, in www.dgsi.pt;
60. Facto a aditar com o n.º 46º - que desde que o pai tem o BB à sua guarda, BB não foi privado do contacto com a mãe.
61. Este facto devia ter sido julgado como provado, é facto notório, desde logo pela ausência de facto contrário, não consta dos autos nenhuma ação de incumprimento.
62. Ainda assim veja-se a fundamentação do tribunal “a quo”, que acusa também o pai de ter implementado um inusitado sistema de alarme para assinalar o termo da videochamada, tal para justificar a fundamentação da Sentença, e acusa, porque tal não resulta dos depoimentos prestados pelas testemunhas da recorrente.
63. Nenhuma destas testemunhas da mãe - DD, MM, NN, mãe, colega de trabalho e amigo, se referiram a esta questão – “inusitado alarme- nem sequer foram inquiridas sobre esta questão.
64. Prestaram sim depoimento quanto a duração e tempo das chamadas, conforme depoimentos da testemunha Sra. DD – irmã da recorrida -, Gravação no sistema Citius em 26-09-2023 – hora: 15:30 às 15:47, minuto 5:16 a 6:16 (refere chamadas de 5 minutos); a Testemunha -Colega de trabalho - MM: depoimento prestado no dia 26. 09.2023, gravado no sistema citius: hora-16:04 às 16:13, minuto 07:27 a 08.52 (refere chamada telefónica as 17.30h quando o horário das chamadas é entre as 19.00h e as 20.00h), e a Testemunha: NN – amigo da recorrente – atesta chamadas de 20 a 30 minutos, gravação no sistema Citius, 26-09-2023 – hora: 16:16 às 16:26 , minuto 02:41 a 03:01, e 06:05 a 08:35.
65. A opinião do Tribunal “a quo” acerca do que deve ser um depoimento sobre a visualização de uma chamada é também de assinalar no depoimento da Testemunha NN gravação no sistema Citius, 26-09-2023 – hora: 16:16 às 16:26 , minuto 06:05 a 08:35.
66. Facto a aditar com o n.º 47º - que a mãe do BB não contribui para a sua estabilidade emocional, antes pelo contrário, é através da ameaça de males, ataques ao pai e família paterna que estabelece o relacionamento com o BB
67. Este facto devia ter sido julgado provado: o BB ao prestar declarações, afirma que nem o pai nem a família do pai dizem mal da mãe, contrariamente a mãe e família da mãe – declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023,– vídeo 1 minuto 00:10.17 a 00:10:36, vídeo 2, minuto 00:13:25 a 00:13:55;
68. Mas não ficando o facto provado, pelo menos teria de ficar provado o constante do relatório médico-legal feito ao BB, pelo Gabinete medico legal e Forense do ... – relatório solicitado pelo Tribunal – datado de 25 de janeiro de 2022, nos pontos 6.5, e 6.6.
69. Facto a aditar com o n.º 48º - que a mãe diz ao BB para mentir ao pai;
70. Este facto devia ser julgado como provado, conforme declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, que se transcrevem – vídeo 1, minuto 00:03:17 a 00:03:56.
71. Facto a aditar com o n.º 49º - que o pai não diz ao BB para mentir a mãe,
72. Este facto devia ter sido julgado como provado, conforme declarações para memória futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, vídeo 2, minuto 00:11.48 a 00:13:35.73. Facto a aditar com o n.º 50º - que um dos receios do BB quando está com a mãe é o de ficar proibido de ver o pai;
74. Este facto devia ter sido julgado como provado, conforme declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, vídeo 2, minuto 00:07:43 a 00:07:55,
75. Facto a aditar com o n.º 51º - que a mãe diz ao BB para dizer que não gosta de estar em ...
76. Este facto devia ter sido julgado como provado, conforme declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, vídeo 1, minuto 00:09.20 a 00:10:01 (negrito nosso):
77. Facto a aditar com o n.º 52º - que a mãe, e a família materna falam mal do pai,
78. Este facto devia ter sido dado como provado, conforme declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, vídeo 1, minuto 00:10:17 a 00:10:36, e vídeo 2, minuto 00:13:25 a 00:13:55:
79. Facto a aditar com o n.º 53º - que, nas palavras do BB, dizem que o pai é burro.
80. Este facto devia ter sido julgado como provado, conforme declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, vídeo 1, minuto 00:10:17 a 00:10.36:
81. Facto a aditar com o n.º 54º - que a atuação da mãe do BB em relação a família do pai é destrutiva,
82. Este facto devia ter sido julgado como provado, conforme declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, vídeo 1, minuto 00:10:45 a 00:11:18 (negrito nosso) :
83. Facto a aditar com o n.º 55º - que o menor na casa da mãe tinha uns aviões em miniatura, de coleção, que seriam do pai e do tio OO e que a mãe a frente do BB partiu “por querer” as hélices do avião e não pediu desculpa – palavras do BB;
84. Este facto devia ter sido julgado como provado, conforme declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, vídeo 1, minuto 00:20:00 a 00:21:57 e vídeo 2 minuto 00:00:01 a 00:00:24
85. Facto a aditar com o n.º 56º - que outro exemplo passou-se com um casaco vermelho oferecido pelo tio OO, que a mãe terá furado a frente do BB.
86. Este facto devia ter sido julgado como provado, conforme declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, vídeo 2, minuto 00.00.27 a 00:01:31
87. Facto a aditar com o n.º 57º - que, também nas palavras do BB, o pai e a família do pai não dizem coisas más da mãe.
88. Este facto devia ter sido julgado como provado, conforme declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, vídeo 1. Minuto 00:11.11 a minuto 00.11.18:
89. Facto a aditar com o n.º 58º - que o BB com frequência usa a expressão “a mãe chateia-me a cabeça”, entre outras situações quando diz ao BB que vai ficar com ela para sempre
90. Este facto devia ter sido julgado como provado, conforme declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, vídeo 1, minuto 00:13:13 a 00.13:31, e 00:14:47 a 00.16:16
91. Facto a aditar com o n.º 59º - que a mãe diz também ao BB para não gostar e não ir; i) ao Karaté, ii) a natação, iii) a psicóloga, iv) à escola.
92. Este facto devia ter sido julgado como provado, conforme declarações para memoria futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023, vídeo 1, minuto 00:12:14 a 00:13:13:
93. Facto a aditar com o n.º 60º - que a mãe impede o BB de participar em atividades escolares e lúdicas, essenciais para o seu desenvolvimento social, por coincidirem com períodos em que o menor estará com ela, mesmo tendo o pai proposto compensar esses dias.
94. Este facto devia ter sido julgado como provado, conforme email da mãe para o pai, datado de 22.06.2022, que consta dos autos, requerimento de 01.08.2022, sendo este email o documento n.º... (referencia ...38);
95. Facto a aditar com o n.º 61º - que, perante o descrito, o pai assegura que o BB tenha apoio psicológico, o BB tem estado a ser seguido pela Neuropsicóloga, Dra. II, membro efetivo da ....
96. Este facto devia ter sido julgado como provado: A fundamentação do Tribunal “a quo” para descredibilizar nesta Sentença a Dra. II, psicóloga do BB, é o facto de as consultas do BB, serem pagas pelo pai, em oposição a credibilidade que é dada ao psiquiatra da mãe que é pago pela mãe, demonstrando uma evidente parcialidade.
97. Sendo o critério do Tribunal o pagamento pela parte, se ambos os progenitores pagam, perante o Tribunal estariam em igualdade de circunstâncias.
98. Acresce que há contradição entre a fundamentação desta Sentença e os factos provados, designadamente o facto 20º, que considera as consultas do BB relevantes:
20º Nesta data, o BB frequenta consultas de psicologia 1 vez por semana, sendo estas consultas relevantes para o bem-estar emocional do BB. (negrito nosso);
99. Constam dos autos pelo menos dois relatórios da Dra. II, um do requerimento do pai datado de 26.09.2022, documento n.º..., e outro no requerimento datado de 16.02.2023, documento n.º..., este segundo relatório da Dra. II, que consta do Apenso D, foi elaborado a pedido do Tribunal, é prova pericial que foi solicitada pelo Tribunal de ..., e não foi valorada pelo Tribunal “a quo”.
100. Este facto devia ter sido julgado provado, também pelas declarações para memória futura do BB, no âmbito do processo 1753/21...., juntas em 28.03.2023, admitidas no despacho saneador de 04-05-2023 vídeo 1, minuto 00:14:14 a 00:17:57
101. Facto a aditar com o n.º 62º - que, por achar que o BB estava em perigo, em 03 de agosto de 2022, no cumprimento do seu dever enquanto psicóloga, fez um pedido de sinalização junto da CPCJ de ....
102. Este facto devia ter sido julgado provado: O Apenso D destes autos foi aberto por falta de consentimento da mãe/recorrida, para a intervenção da CPCJ de ..., que considerou haver comportamentos graves por parte da mãe que necessitavam de acompanhamento por parte da CPCJ, tal na sequência da sinalização que a Dra. II fez junto da CPCJ, documento que consta destes autos, é o documento ..., do requerimento do pai datado de 26.09.2022.
103. Foi a Dra. II contactada pelo Tribunal de ..., pelo Ministério Publico, para dar informação clínica ao processo, informação que consta do Apenso D, a fls … (processo classificado como confidencial).
104. Acresce ainda que o Tribunal “a quo” considerou como provado no artigo 33º o seguinte:
33º Com data de 16/02/2022, o Digno Magistrado do M.P., requereu a abertura de processo judicial de promoção e proteção referente ao menor, sustentando que o menor foi sinalizado pelo progenitor junto da CPCJ de ..., sustentando que o menor é vítima de violência psicológica e abuso sexual protagonizados pela progenitora, dando origem ao Apenso D.
105. Sendo que a sinalização a CPCJ foi feita pela Dra. II.
106. Em suma, pelo alegado e exposto supra, deveria o Tribunal “a quo” ter julgado como não provado o facto 24º e ter julgado como provados os factos suprarreferidos (Cfr. pontos 42 a 105 destas conclusões);
107. Está a Sentença do Tribunal “ a quo” ferida de vários vícios geradores de nulidade, designadamente excesso de pronúncia, nos termos do artigo 615º alíneas d) e c), por violação, dos artigos 1906ºn.º1, 2, 9 e artigos 4.º e 5.º, 35º n.º3 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível,  por i) não ter ouvido o menor, ii) não justificara falta de audição em despacho, iii) por estipular um regime excecional ao atribuir apenas a mãe as responsabilidades parentais as questões de particular importância e não justificar iv) por estipular alimentos sem apurar a necessidade do menor e capacidade do progenitor que vai prover, violando o artigo 2004º n.º1 do código civil, v)e por obscuridade ao estipular um regime de tutela, não podendo assim produzir efeitos.
108. O direito de audição do menor, está consagrado também na legislação internacional; A Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU, assinada em Nova Iorque a 26 de Janeiro de 1990 (Resolução da Assembleia da República 20/90, de 12 de Setembro e Decreto do Presidente da República 49/90, de 12 de setembro), artigo 12.º, A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, art 24º, A Convenção Europeia sobre o Exercício dos Direitos da Criança de 25 de Janeiro de 1996 (Resolução da Assembleia da República7/2014, de 13 de Dezembro de 2013, e Decreto do Presidente da República 3/2014, de 27 de Janeiro) no artigo 3.º, alínea b) , e o art 6º, al b), §3, O Regulamento (CE) n.º 2201/2003, de 27 de Novembro (Decisões em Matéria Matrimonial e Responsabilidade Parental – Bruxelas IIBis), tendo em vista a execução de decisões entre Estados – Membros salienta igualmente a importância da audição da criança.
109. Está também acautelado este direito do BB na nossa jurisprudência o Acórdão desta Relação de Guimarães: PROC:409/18.3T8BGC-D.G1- in www.dgsi.pt: I - Estando a criança no centro do processo decisório, é natural e imperioso que a mesma tenha a possibilidade de nele participar, de ser ouvida e manifestar os seus pontos de vista, e o Acórdão do STJ Proc. 268/12.0TBMGL.C1.S1 de 14/12/2016 – in www.dgsi.pt.
110. Mesmo que não seja esse o entendimento deste Venerando Tribunal, terá de se concluir que a decisão do Tribunal “a quo”, violou o disposto no artigo 1906º n. 8 do cc, e no artigo 40º n.º1 do RGPTC, por não ter acautelado o superior interesse do BB, pois atentos os factos dados como provados - factos 11º, 13º a 21º 32º - nunca poderia o Tribunal a quo ter feito a reversão do regime estipulado a titulo provisório, porque o que resulta destes factos provados na Sentença, é que o superior interesse do menor está acautelado com o pai.
111. A Sentença refere ainda como evidentes as competências parentais da progenitora/recorrida, quando nenhum documento nos autos diz que são evidentes as competências parentais da mãe.
112. E, ainda que tivesse competências, ter competências parentais é diferente de efetivamente exercer competências parentais – o que o pai fez até agora.
113. Ainda para fundamentar a reversão do regime instituído até à data, baseia-se a Sentença na conduta do pai, que, de acordo coma mesma, terá comprometido o regime provisório, mas nada há nos autos nesse sentido, antes pelo contrário, vejam-se os factos dados como provados na Sentença, factos 13º a 20º (2.1 da Sentença):
114. O superior interesse do BB, tem de ser o critério legal orientador a ter em conta para determinar qual o progenitor a quem o menor deve ficar confiado, uma vez que atenta a distância geográfica não é possível ser confiado a ambos os progenitores, Veja-se nesse sentido o Ac do STJ, proc 1431/17.2T8MTS.P1.S1 de 17-12-2019, in
115. Ora, o BB está ao cuidado do pai/recorrente, desde o despacho de 14.01.2021, por decisão proferida no âmbito deste processo.
116. Para a alteração deste regime, o critério que teria de presidir, é o do superior interesse do BB.
117. O superior interesse, é um conceito jurídico indeterminado que visa assegurar a solução mais adequada para a criança no sentido de promover o seu desenvolvimento harmonioso físico, psíquico, intelectual e moral, especialmente emmeio familiar, sendo, por isso, aferível em função das circunstâncias de cada caso. Ac do STJ Proc. 19384/16.2T8LSB-A.L1.S1de 27-01-2022 in www.dgsi.pt.
118. Ora as circunstâncias deste caso levam a que o interesse do BB seja o de continuar com o regime que teve até agora, nenhuma mudança se justifica.
119. O que resulta da prova dos autos é que é o pai que promove o seu desenvolvimento, físico, intelectual e moral, quem tem mais disponibilidade para satisfazer as suas necessidades e quem tem com a criança uma relação afetiva mais profunda.
120. Nesse sentido também o facto provado 32º relatório psicológico do menor, datado de 25/01/2022, que concluí nos seguintes termos (negrito nosso):
.Já na avaliação da interação filho-mãe a criança evidencia proximidade relacional cm a mãe, não obstante, demonstra uma postura algo tensa e insegura, à procura da aprovação da mãe. A mãe demonstra afetividade e mostra-se adequada nas respostas que dá em discurso direto com a criança, no entanto, evidencia infantilizar a criança e direcionar as suas respostas, bem como uma postura tendencialmente intrusiva em situações que não controla.
Manifesta igualmente a necessidade de induzir na criança expetativas de insegurança na sua ausência, sugerindo procurar transmitir à criança que espera que ele sinta que a sua segurança e bem-estar dependa exclusivamente da sua presença. Na interação com o pai a criança demonstrou cumplicidade, espontaneidade e segurança. O pai demonstrou uma postura indicadora de proximidade relacional e afetividade, transmite-lhe calma e promove a sua autonomia.
…. observam-se indicadores de incompreensão relativamente a algumas atitudes da mãe que indiciam induzir-lhe mal-estar e ambivalência em relação a que comportamento é esperado por si, bem como a necessidade de agradar a figura materna, como se disso dependesse a relação.
De acordo com o relatório é na interação com o pai que há proximidade relacional e afetividade, transmite-lhe calma e promove a sua autonomia.
121. Esta Sentença vem reverter o regime em vigor há quase 3 anos, invocando que o direito de visita da mãe, foi violado,
122. Mas na factualidade provada, não há nenhum incumprimento do pai relativamente ao direito de visita da mãe.
123. Havendo vários incumprimentos por parte da mãe/recorrida, Cfr. comunicação do Comandante do Posto da GNR ..., no sistema Citius  com data de 31.12.2020 (negrito nosso): Questionada, a Sra. PP, se iria proceder à entrega do menor ao seu progenitor, Sr. CC, a mesma afirmou negativamente em virtude de ter ordens explícitas por parte da progenitora para não o fazer.
124. A Sentença ao invés de apurar o interesse do menor, refere a necessidade de união parental, como se a mesma estivesse na disponibilidade apenas do pai, não está.
125. Quanto ao interesse superior do BB, apesar de a sentença se referir ao BB, o que consta desta decisão é um ataque ao pai e a vitimização da mãe, sem ouvir o BB, sem sequer querer apurar qual a vontade do menor.
126. O BB tem o direito a pronunciar-se acerca da mudança de todas as suas rotinas, atividades, acerca da Sua vida, mesmo não tendo 12 anos, tem o direito a ser ouvido relativamente a esta mudança abrupta que lhe foi imposta e que ele não quer, como tem verbalizado diariamente.
127. Do processo não resulta que o BB esteja em perigo, ou risco, pelo que não poderá ser alterado o regime que vigorou até esta data.~
128. No âmbito deste processo temos uma criança estabilizada com o pai, e que o Tribunal vem desequilibrar, sem que nada no processo o justifique.
129. Como faz o Tribunal este salto das competências do pai para as da mãe? Em que consubstancia? Num lembrete que toca as 20.00h por o pai ser organizado?
130. A Sentença é omissa na fundamentação, não há nenhuma razão para afastar o pai/recorrente da vida do BB, o menor está bem a guarda do pai, nada nos autos justifica esta alteração na vida do BB, motivo pelo qual a Sentença tem de ser alterada.
131. Sabendo-se que as decisões judiciais atinentes a processos que dizem respeito a crianças têm como escopo último a salvaguarda do seu superior interesse, impõe-se que o julgador se socorra de todos os elementos existentes nos autos que permitam a prolação de uma decisão avisada.
132. In casu, porém, inexplicavelmente, verifica-se a existência de um vasto manancial de factualidade que vem sendo carreado para os autos tanto nas declarações do BB como nos relatórios da psicóloga do BB, que são ignorados pelo Tribunal “a quo”.
133. Nestes termos e nos mais de Direito, deve ser dado provimento ao recurso e, em consequência, ser a sentença ora em crise, substituída por outra, que acautele o Superior Interesse do BB, conforme supra indicado pelo ora recorrente, nas páginas 85 e 86 destas Alegações, tal em cumprimento do disposto nos artigos 1906 n.º 8 do CC, e 40 n.º1 do RGPTC (Lei n.º 141/2015, de 8 de setembro), que o Tribunal “a quo” aplicou erradamente”.
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Perante o recurso interposto, foram apresentadas contra-alegações por parte do Ministério Público, que concluiu nos seguintes termos:    
                
“1 - O recurso tem efeito meramente devolutivo, em conformidade com o disposto no artº32º do RGPTC, exceto se o tribunal lhe fixar outro efeito, suspensivo, nos termos do nº4.
2 - Salvo o devido respeito por opinião contraria não resulta dos autos qualquer circunstância para afastar o regime regra do efeito do recurso – devolutivo - estabelecido no artº32º do RGPTC.
3 - Assim, deverá ser indeferida a pretensão da Requerente fixando-se efeito devolutivo ao recurso.
4 - O BB, com idade inferior a 12 anos de idade - nascido a ../../2016, - com apenas 7 anos de idade, não foi ouvido pelo tribunal nem foi proferida justificação para a sua não audição, afigurando-se que atenta a sua idade e as perícias efetuadas, nomeadamente a perícia psicológica efetuada à criança com relatório elaborado a 30.01.2023, a não audição da criança não integrará a nulidade pugnada pelo recorrente.
5 - Quanto à atribuição das responsabilidades parentais relativas às questões de especial importância apenas à progenitora, refere-se desde logo que o recorrente pugnou para que lhe fosse atribuída em exclusivo essa responsabilidade parental; não se desconhecendo a legislação e jurisprudência no sentido de tais questões serem decididas por ambos os progenitores de modo a não afastar o progenitor com quem a criança não reside das decisões importantes da criança, mas nos casos de conflitualidade entre os progenitores será mais difícil o consenso de ambos na decisão dessas questões, o que na prática poderá inviabilizar o cumprimento desse regime/ regra o que poderá ter determinado a decisão pelo tribunal.
6 - Mas se Vossas Excelências entenderem verificada falta de fundamentação poderá ser alterado o regime fixado nesse segmento em conformidade.
7 - Quanto à fixação da prestação de alimentos como consta da sentença o tribunal convenceu-se que o progenitor aufere pelo menos os rendimentos prediais que documenta, embora tais rendimentos não sejam compatíveis com o desafogo financeiro quando faz alusão ao padrão de vida que proporciona ao filho, não se verificando falta de fundamentação como pugnado pelo recorrido.
8 - Quanto à nulidade da sentença nos termos do artº615º, nº1, al.c) do PC, por obscuridade que torna a decisão ininteligível na parte em que na sentença em apreço se faz referencia escrita à tutela, salvo o devido respeito por opinião contrária, tal escrito não poderá ter as consequências e ênfase jurídico dado pelo recorrente, uma vez que claramente resulta dos autos não se tratar de qualquer tutela tal como prevista no Código Civil.
9 - O recorrente impugna a matéria de facto dada como provada alegando que o tribunal não teve em consideração o relatório da Drª II de 2023 do Apenso D; que o facto provado sob o ponto 24 deverá ser retirado da matéria de facto provada e que deverão ser aditados à matéria de facto provada os factos por si elencados sob os pontos 41 a 62 das suas alegações que aqui se dão por reproduzidos e que se traduzem no essencial nos factos que o tribunal deu como não provados; que a verificar-se tal alteração conduziriam necessariamente a decisão distinta da proferida pelo Tribunal como sustentado pelo recorrente.
10 - Quanto ao facto dado como provado sob o ponto 24 o mesmo resulta tal como consta na sentença em apreço do depoimento do médico assistente da progenitora e do relatório junto a 15.07.2021.
11 - O recorrente discorda da matéria de facto não provada evidenciando o historial clinico da progenitora, depressivo e com tentativa de suicídio aos vinte e poucos anos de idade, o auto lavrado pelo OPC por factos ocorridos a 04.09.2018, o depoimento da mãe do progenitor que assegura que o recorrente é um pai presente.
12 - Sucede porém que esses meios de prova foram analisados pelo tribunal que considerou não serem suficientes para sustentar a matéria de facto provada nos termos pugnados pelo recorrente, resultando da motivação da matéria de facto dada como provada o raciocínio efetuado pelo tribunal, a análise dos meios de prova na sua globalidade que conduziram à sua convicção e decisão proferida, sem violar as regras de experiencia comum.
13 - O Tribunal na motivação da sentença recorrida enumerou os elementos probatórios de que se serviu para formar a sua convicção, não resultando qualquer discrepância com os depoimentos das testemunhas e demais meios de prova analisados na sua globalidade.
14 - A factualidade dada como assente na sentença em apreço tem plena sustentabilidade nas provas indicadas na motivação de tal matéria de facto.
15- Pelo que, não se verifica erro de julgamento e nulidade invocada.
16- A distância das residências dos progenitores – ... e Guimarães – e a impossibilidade da progenitora se aproximar da residência do progenitor inviabiliza a residência alternada da criança, que está a frequentar o segundo ano do ensino básico, pelo que, a guarda da criança teria que ser atribuída a um ou ao outro progenitor, com regime de convívios com o progenitor que não detém a guarda.
17- Resulta dos autos, designadamente dos relatórios de perícia psicológica efetuados no âmbito dos presentes autos que ambos os progenitores têm competência para exercerem as responsabilidades parentais e a criança, com apenas 7 anos de idade, completados a ../../2016, demonstra carinho e afeto e um relacionamento ajustado com ambos os progenitores.
18- Assim, a decisão a proferir passaria por apurar qual dos progenitores demonstra disponibilidade para promover relações habituais do filho com o outro.
19- É inquestionável a importância para a criança da figura do pai e da mãe e de que após a separação dos progenitores não sinta o afastamento do progenitor com quem não reside e que esse afastamento não seja percecionado como como abandono, devendo crescer com o acompanhamento tanto quanto possível do progenitor com quem não resida, traduzido este acompanhamento nas visitas, contactos telefónicos, convívios férias e festividades, para o qual é essencial que o progenitor que detém a guarda proporcione e incentive esse contacto regular e permanente, afastando da criança a perceção de eventuais conflitos existentes entre os progenitores.
20 - Só assim não será exigível quando se verificarem factos objetivos de que esse convívio com o progenitor com quem a criança não reside é prejudicial para o seu bem estar, desenvolvimento físico e psíquico, ou seja, para o superior interesse da criança.
21 - O Tribunal analisou a prova produzida conforme descrição efetuada na motivação da matéria de facto evidenciando as declarações dos progenitores, designadamente enquanto a progenitora reconhece virtudes ao progenitor, enquanto educador, que o ideal seria uma guarda partilhada, embora conceda que tal regime não seja possível de implementar por causa da distância geográfica, que não tem condições financeiras para viver mais próxima do progenitor, que o menor precisa de ter contatos assíduos com o progenitor e que, acaso a guarda lhe seja atribuída não criará obstáculos ao contato com o outro; o progenitor com a guarda exclusiva do filho não soube fomentar os contatos com a progenitora e família materna, nunca colocou a progenitora num plano de  igualdade, partiu sempre de uma ideia de desconfiança quanto à prestação desta, permitindo-se fiscalizar o estado em que a criança chegava a casa após os convívios, permitindo-se implementar um sistema de alarme/despertador, gravar as videochamadas estabelecidas entre a progenitora e o filho, como se este fosse uma mercadoria sua, ignorando os apelos para uma pacificação do conflito parental.
22 - Foi precisamente esta análise que o Tribunal fez acrescendo ainda como referido na sentença em apreço que a progenitora colaborou sempre com o processo e com as instituições que intervieram, até mesmo aquando da dolorosa execução do mandado de entrega da criança ao progenitor.
23- O Tribunal considerou, assim, que a progenitora demonstrou ter maior capacidade do que o progenitor para promover um contacto salutar com o outro.
24- E de acordo com o principio do interesse superior da criança que o tribunal ponderou e decidiu fixar o regime das responsabilidades parentais de que recorre o Requerido”.
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Também a mãe do menor contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:

“1.ª - O Recorrente apenas apresenta o seu recurso por não ver a sua pretensão ter acolhimento, e não pelo facto de o Tribunal a quo não ter feito a devida Justiça, pois a douta sentença recorrida, excelentemente fundamentada, julgou com acerto e perfeita observância dos factos e da lei aplicável, não podendo o caso sub judice, conscientemente, ser resolvido de outra forma;
2.ª - Peticiona o Recorrente que ao presente recurso seja atribuído efeito suspensivo ao abrigo do disposto no artigo 32.º, n.º 4, do RGPTC, “porquanto a Sentença recorrida provocará grave perturbação na vida e rotinas do menor BB, sem que o mesmo tenha sequer sido ouvido (…)”, além do que, a douta decisão proferida “(…) manifestamente não atende ao superior interesse do menor”, contudo, não se vislumbra qualquer circunstância excecional e justificativa para tal;
3.ª - Como refere a Digna Magistrada do Ministério Público nas suas contra-alegações, e bem, os argumentos invocados pelo Recorrente não são suscetíveis de poder levar a uma inversão da ordem dos fatores e, consequentemente, ao afastamento do regime regra, pois trata-se da “(…) consequência “natural” da Decisão a proferir pelos Tribunais Superiores; não se vislumbrando nos autos circunstância que determine a sua alteração”;
4.ª - Além do que, o facto de o menor, alegadamente, não ter sido ouvido ou não ter sido tida em consideração a sua opinião, como adiante se explanará, carece de qualquer fundamento de facto e/ou de direito, em especial, por tal não ter correspondência com a realidade;
5.ª - O Recorrente requer também, ao abrigo do disposto nos artigos 425.º e 651.º, n.º 1, do CPC, a junção aos autos de dois documentos – Documento n. º ... - Declaração do psicólogo KK, por alegadamente se tornar necessário em virtude da sentença, e Documento n. º ... - Registo de avaliação do menor, por não ter sido possível obter em momento anterior – mas a verdade é que não devem os mesmos ser admitidos;
6.ª - A declaração emitida pelo psicólogo extravasa por completo o limite do razoável, na medida em que o psicólogo se tenta sobrepor ao Tribunal ao afirmar que “A criança visada na gravação deve ser ouvida e o seu testemunho valorado, e não pode ser confrontada e muito menos confiada ao adulto que eventualmente lhe tenha causado “dano” e que Tendo em conta a situação e a necessária proteção desta criança considero que é de solicitar ao tribunal ou ao tribunal superior, salva melhor opinião, que analise ou reanalise esta complexa situação e que atribua as responsabilidades parentais ao progenitor que melhor garanta o equilíbrio emocional e a segurança adequada do BB.”;
7.ª - E para isso invoca factos que deram origem ao processo crime n.º 411/21.... – que correu termos no DIAP ... e no Juízo de Instrução Criminal ... – Juiz ..., e que depois de ter sido arquivado e de requerida a abertura da instrução pelo Recorrente, veio a ser arquivado por desistência do próprio Recorrente – e ao apenso D destes autos, também arquivado por desistência do Recorrente, como melhor resulta da ata de conferência de 26/09/2023, realizada no âmbito desse apenso;
8.ª - Trata-se de matéria que já foi discutida e arquivada, nada tendo sido provado contra a Recorrida, pelo que não se vislumbra qualquer justificação para concluir pela necessidade de juntar aos autos a declaração do psicólogo, em virtude da douta sentença proferida, devendo ter-se por não escritas todas as referências à mesma ao longo das alegações do Recorrente (Veja-se por todos neste sentido, o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30/04/2019, proferido no âmbito do processo n.º 22946/11.0T2SNT-A.L1.S2, relatado por Catarina Serra e disponível in www.dgsi.pt);
9.ª - Quanto à avaliação escolar do BB não se alcança a necessidade de junção de tal documento, pois é pacífico quer para o Tribunal, quer para as partes, que o menor é um bom aluno e tem bom aproveitamento escolar, mas a admitir-se a sua junção, impugna-se o mesmo quanto à sua força probatória material, mais concretamente, por através do mesmo não se poderem alcançar as consequências e os efeitos jurídicos pretendidos pelo Recorrido, nomeadamente, concluir que o BB apenas tem bom aproveitamento escolar por estar à guarda do pai e não da mãe;
10.ª - O Recorrente começa o seu recurso afirmando que a decisão recorrida padece de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), uma vez que, segundo alega, o menor não terá sido ouvido, nem houve despacho a justificar a sua não audição, mais esclarecendo que havia pelo menos três razões que impunham a audição do BB: o relatório da psicóloga do BB datado de fevereiro de 2023, o depoimento prestado pela testemunha JJ e as declarações para memória futura que o BB prestou no âmbito do processo crime n.º 1753/21....;
11.ª - O BB tem atualmente 7 anos de idade, pelo que, não sendo a sua audição obrigatória por lei, o Tribunal a quo optou por deixar essa avaliação do menor para quem se encontrava mais apto para a fazer, não só pela sua idade mas também pelo impacto negativo que outro tipo de inquirição/audição poderia ter para o mesmo;
12.ª - Como o Recorrente não desconhece, o Tribunal a quo, a 09/11/2022, mais concretamente, por douto despacho proferido na conferência de pais que nessa data teve lugar, determinou a realização de mais perícias psicológicas, quer aos progenitores, quer ao menor, a realizar na Unidade de Psicologia da Justiça da Universidade ..., solicitando expressamente que aí fossem valorados todos os documentos particulares e de entidades públicas já constantes dos autos e fosse aferida “(…) adequação para a parentalidade, se alguma delas sofre de psicopatologia impeditiva de um cabal exercício das mesmas, qual a estrutura das personalidades no que à parentalidade importar, bem como o mapa afetivo da criança, apurando-se a relação dela com ambos os progenitores bem como qual deles, se algum, é a figura principal de referência”;
13.ª - O dito relatório da psicóloga do BB, datado de fevereiro de 2023, diz respeito a factos sobre os quais o Recorrente apresentou queixa criminal contra a Recorrida, dando origem ao já referido processo crime n.º 411/21...., o qual, repita-se, foi arquivado, tal como o apenso D destes autos principais, relativo aos mesmos factos;
14.ª - O Recorrente pretende agora fazer “entrar pela janela, aquilo a que fechou a porta”, e prova disso é que se entendia que a informação fornecida pela psicóloga do BB era tão relevante, não prescindia da sua inquirição como testemunha em sede de audiência de discussão e julgamento;
15.ª - Isto sem esquecer, também, que o dito relatório da psicóloga do BB de fevereiro de 2023 foi junto a estes autos principais com a reclamação/pedido de esclarecimentos que o Recorrente apresentou relativamente ao relatório pericial elaborado pela Unidade de Psicologia da Justiça da Universidade ..., a 16/02/2023, e a que coube a referência Citius ...71, onde o Recorrente demonstra, de forma clara, aquilo que efetivamente pretende e considera ser benéfico para o seu filho, quando refere que “(…) o BB deverá ficar à guarda exclusiva do pai, com visitas sem pernoita à mãe, preferencialmente supervisionadas e em ambiente público, e mais reduzidas em número (…) 1 vez por mês, podendo colmatar com videochamadas”;
16.ª - Quanto ao depoimento prestado pela testemunha JJ, o Recorrente, nas suas alegações, cita o depoimento desta testemunha, entre os minutos 00:05:19 e 00:05:52, mas é preciso atentar em toda a parte do seu depoimento relativa a esta temática, designadamente entre os minutos 00:05:17 a 00:09:33, 00:22:10 a 00:23:00 e 00:23:29 a 00:24:19, onde se constata que pese embora a Ilustre mandatária do Recorrente tenha afirmado que a intenção do Recorrente não era sujeitar o menor a ser novamente ouvido num Tribunal, o certo é que a Meritíssima Juíza a quo foi bastante perspicaz desde o primeiro momento, detetando, de imediato, o objetivo inconfessado do Recorrente e da testemunha JJ, e dando nota disso durante a audiência de discussão e julgamento;
17.ª - Daí que, muito bem tenha andado a decisão recorrida ao concluir, quanto ao depoimento desta testemunha, “(…) cuja esposa, Advogada, patrocinou o Requerido em vários processos-crime contra a Requerente”, que o mesmo “(…) redundou na habitual diabolização da família materna, relatando que, após esse episódio, foram para casa e que o BB disse que queria falar com o Juiz, em jeito de quem pretende convencer o Tribunal a ouvir o menor, como forma de provar através desse depoimento inquinado, aquilo que o progenitor não logrou demonstrar através da perícia.”, pois é precisamente o que se veio a verificar;
18.ª - E muito se estranha que o Recorrente invoque agora a necessidade de audição do menor quando o próprio afirmou, na audiência levada a cabo no âmbito do apenso D destes autos principais, que, por ele, no âmbito do processo crime n.º 1753/21...., o menor nunca teria prestado declarações para memória futura, atendendo à violência psicológica de tal ato para o mesmo, o que também foi corroborado pela sua Ilustre mandatária durante o depoimento prestado pela testemunha JJ, entre os minutos 00:23:11 e 00:23:19;
19.ª - Quanto às declarações para memória futura prestadas pelo BB no âmbito do referido processo crime, não se compreende e muito menos se aceite que o recorrente as invoque, pois como bem sabe tal processo crime foi arquivado; após o seu requerimento de abertura da instrução, foi proferido despacho de não pronúncia contra a aí Arguida, aqui Recorrida; e, mesmo após o recurso que apresentou, tal decisão de não pronúncia veio a ser confirmada, por douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Guimarães;
20.ª - O Recorrente, “dispara” em todas as direções, mesmo sabendo estar completamente desprovido de razão, tão só com o fito de ver a douta sentença recorrida vir a ser julgada nula e, desta forma, acreditar que há possibilidade de vir a ser proferida uma nova, em sentido contrário, mas a verdade é que a sentença recorrida não violou o disposto nos artigos 1906.º, n.º 9 do CC, 4.º, n.º 1, alínea c), e n.º 2 e 5.º do RGPTC e, consequentemente, não padece da invocada nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, atendendo à idade do BB e a todas as perícias efetuadas ao mesmo, em especial, a da Unidade de Psicologia da Justiça da Universidade ..., com relatório datado de 30/01/2023 (Veja-se por todos neste sentido, o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16/11/2021, proferido no âmbito do processo n.º 1436/15.8T8PVZ.P1.S1, relatado por Pedro de Lima Gonçalves e disponível in www.dgsi.pt);
21.ª - Entende o Recorrente que a douta sentença recorrida padece de nulidade por violação do disposto no artigo 1906.º, n.ºs 1 a 3 do CC, uma vez que atribui em exclusivo à mãe o exercício das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância exclusivamente à mãe;
22.ª - Mas o Recorrente “esquece-se” que há uma patente conflitualidade entre os progenitores, fomentada de forma inequívoca e sem razão justificativa por si, o que pode levar a que seja difícil, ou mesmo impossível, lograrem alcançar uma solução de consenso relativamente a estas questões de particular importância;
23.ª - Por aqui se justifica o afastamento do regime regra previsto no n.º 1, do artigo 1906.º do CC, além do que o Recorrente só invoca esta pretensa nulidade da sentença, por tal não ter ido de acordo aos seus intentos, pois tal como a Digna Magistrada do Ministério Público salienta nas suas contra-alegações, “(…) o recorrente nas suas alegações para julgamento requereu, além do mais, lhe fosse atribuída a decisão exclusiva das questões de especial importância”;
24.ª - Alega, ainda, o Recorrente, que a sentença é nula por violação do disposto no artigo 2004.º, n.º 1, do CC, uma vez que, no seu entendimento, foi estipulada uma pensão de alimentos sem se apurarem “(…) os meios disponíveis do pai para prestá-los, nem quais as necessidades do BB”, sendo tal omissão geradora de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC – mais uma vez, sem razão;
25.ª - Quer o Recorrente quer a Recorrida foram notificados a 04/05/2023, por douto despacho, para juntarem aos autos os seus comprovativos de rendimentos, bem como a respetiva liquidação de IRS, além do que durante a audiência de discussão e julgamento, quer um, quer outro, foram instados acerca dos seus rendimentos, tudo como melhor resulta do depoimento prestado pela Recorrida entre os minutos 00:17:25 e 00:17:52 e pelo Recorrente entre os minutos 00:19:13 e 00:19:45;
26.ª - Permite-se, ainda, o Recorrente afirmar que a sentença recorrida é também nula por obscuridade, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c), do CPC, “porquanto refere que o menor fica a tutela da mãe”, no entanto, facilmente se compreende que se trata de um mero lapso de escrita, que, enquanto tal, e se assim se entender por necessário, poderá ser suprido pelo próprio Tribunal;
27.ª - O Recorrente entendeu, e bem, o alcance da sentença, caso contrário não tinha elaborado um recurso com mais de 100 páginas, onde demonstra ter plena consciência de que no caso sub judice não se trata de qualquer regime de tutela tal como previsto no Código Civil;
28.ª - Já quanto à matéria de facto, o Recorrente entende que o facto 24.º não pode ser dado como provado; que devem ser dados como provados outros factos além dos que constam da sentença; e que, por força da prova produzida e desses factos a aditar, sempre a decisão a proferir seria em sentido contrário àquela que foi proferida;
29.ª - Resulta do facto 24.º que “A mãe do BB é absolutamente capaz de exercer cabalmente as responsabilidades parentais”, o que é um facto mais do que provado nestes autos, quer por tudo aquilo que resultou da audiência de discussão e julgamento, quer por toda a prova carreada para os autos, em especial as várias perícias;
30.ª - E não adianta o Recorrente entrar na senda de imputar à Recorrida um “historial depressivo”, afirmando que a “ansiedade e medicação” são o seu “mecanismo de reação”, ou chegando mesmo ao ponto de alegar que “(….) o Tribunal “a quo” valida a subtração ilícita do BB, concretizada pela recorrida, justificando que a mesma está validada porque a mãe foi “colado um quadro depressivo”, quando esse quadro era prévio a este processo. Vai por um caminho arriscado, abrindo precedente e tornando Guimarães local de destino para subtração ilícita de menores, o chamado turismo judicial.”;
31.ª - Tais afirmações chegam ao ponto de extravasar tudo aquilo que se pode ter como razoável para o Recorrente exprimir a sua opinião e desacordo com a decisão proferida;
32.ª - A sentença recorrida fundamenta de forma especificada, inequívoca e objetiva como fundou a sua convicção quanto à matéria de facto dada como provada, em especial, quanto ao facto 24.º colocado em crise, dando-se aqui por integrado e reproduzido tudo e quanto supra se transcreveu a este respeito, mais concretamente, nas páginas 26 a 30 destas contra-alegações;
33.ª - Pelo que não adianta o Recorrente citar de forma parcial e cirúrgica o depoimento da testemunha Dr. FF, pois do mesmo não se pode extrair, de forma alguma, que a aqui Recorrida não seja “capaz de exercer cabalmente as responsabilidades parentais”; antes pelo contrário, bastando atentar no que este refere no seu depoimento, entre os minutos 00:10:51 e 00:12:00;
34.ª - Igualmente não colhe o argumento do Recorrente no sentido de que “A credibilidade dada pelo Tribunal “a quo” a esta testemunha, psiquiatra da progenitora/recorrida, paga pela própria recorrida, contrasta com a credibilidade dada aos relatórios elaborados pela psicóloga do BB”, pois como já se referiu, o Tribunal a quo, ao determinar a realização de novas perícias, junto da Unidade de Psicologia da Universidade ..., determinou, igualmente, que fossem tidos em consideração todos os relatórios/declarações, quer de entidades privadas, quer de entidades públicas, aqui se incluindo os relatórios da psicóloga do BB emitidos até à data que foi proferido tal despacho;
35.ª - Já quanto ao relatório de fevereiro de 2023 – que foi junto aos autos quando o progenitor optou por reclamar e pedir esclarecimentos destas novas perícias – o Tribunal a quo justificou de forma clara o porquê de não dar “relevo probatório” às considerações tecidas no mesmo, “(…) na parte em que não encontram respaldo nas perícias produzidas em cumprimento das regras processuais.”;
36.ª - E aqui se diga, mais uma vez, que o dito relatório da psicóloga do BB, datado de fevereiro de 2023, diz respeito a factos sobre os quais o Recorrente apresentou queixa criminal contra a Recorrida, dando origem ao já referido processo crime n.º 411/21...., o qual, repita-se, foi arquivado, tal como o apenso D destes autos principais, relativo aos mesmos factos;
37.ª - Salvo o devido respeito por opinião contrário, o facto 24.º deverá, assim, continuar a constar da matéria de facto dada como provada;
38.ª - Entende, ainda, o Recorrente, que os factos 41.º a 62.º deverão passar a constar da matéria de facto dada como provada, os quais, por brevidade, aqui se dão por integrados e reproduzidos para todos os efeitos legais;
39.ª - Quanto aos factos 41.º e 43.º, importa salientar que o processo crime relacionado com a referida certidão emitida por OPC foi arquivado, nada tendo sido provado a este respeito, além do que a adição do facto 43.º à matéria de facto dada como provada em nada iria alterar a evidência de a mãe, presentemente, ser mais do que capaz de exercer as responsabilidades parentais, que é o que está aqui em causa;
40.ª - Como a douta sentença recorrida refere, com todo o acerto, “(…) o progenitor não se coibiu de invocar, desde o início do processo, este quadro depressivo da mãe do seu filho, como arma de arremesso contra a progenitora”, usando-o para legitimar tudo o que fez e tem feito, “(…) E, a prova por exuberância, de que os autos andaram sempre centrados em torno do quadro depressivo da progenitora é a que foram realizadas várias perícias psicológicas ao menor e aos progenitores, tendo todas elas contrariado o quadro pintado pelo progenitor ao longo de todo o processo”;
41.ª - No que concerne aos factos 42.º, 44.º e 45.º, em abono da verdade se diga que quanto a estes aspetos, nada se provou em sede de audiência de discussão e julgamento e a verdade é que o que resulta das perícias é precisamente no sentido de que o menor demonstra vontade de estar com ambos os progenitores, afirmando “Gosto dos dois igual”, esforçando-se, até, por não fazer qualquer distinção entre ambos;
42.ª - Como se conclui na perícia da Unidade de Psicologia da Universidade ..., o “BB mostrou estabelecer um relacionamento ajustado com ambos os progenitores, tendo sido capaz de relatar sentimentos de afeto e proximidade em relação a ambos os pais, bem como de descrever momentos de interação positiva com estes. Não obstante, a partir dos relatos de BB foi possível perceber que este se encontra a vivenciar um conflito de lealdade”;
43.ª - Relativamente ao facto 46.º, pretende o Recorrente que seja dado como provado que “(…) desde que o pai tem o BB à sua guarda, o BB não foi privado do contacto com a mãe”, o que como já resulta mais que provado nestes autos, não corresponde à verdade;
44.ª - É certo que esta privação nunca teve lugar de forma direta, isto é, de forma que o Tribunal pudesse ter conhecimento e, como tal, pudesse levar essa atitude em linha de conta nas suas decisões, mas como o próprio Recorrente confessou em sede de audiência de discussão e julgamento, procedeu a várias gravações das chamadas que o BB tinha com a mãe – facto de que o menor se apercebia e transmitia à Recorrida – além de utilizar um despertador para limitar o tempo de conversas mantidas entre o menor e a Recorrida (cfr. depoimento prestado entre os minutos 00:10:00 a 00:13:13);
45.ª - Toda esta factualidade decorre também do depoimento prestado pela Recorrida entre os minutos 00:19:00 e 00:22:42 e pela testemunha DD entre os minutos 00:04:56 e 00:07:14, onde ambas corroboram que as chamadas são gravadas, de curta duração e muitas vezes interrompidas pelo dito despertador;
46.ª - Sendo também de ter em consideração que a própria Ilustre mandatária do Recorrente acaba por confessar a existência do despertador durante o depoimento desta testemunha DD, tentando logo de seguida justificar o injustificável, como se verifica entre os minutos 00:13:52 e 00:15:34;
47.ª - Ainda a respeito da forma como o pai permite à Recorrida contactar com o menor, será de atentar no depoimento prestado pela testemunha PP, avó do menor, mais concretamente, entre os minutos 00:03:23 e 00:04:34 e entre os minutos 00:04:55 e 00:06:00, a qual também confirma que as chamadas são de curta duração, que o Recorrente nem sempre atende e que desliga as chamadas abruptamente, sem as retornar;
48.ª - Saliente-se que esta testemunha, no depoimento que prestou entre os minutos 00:06:51 e 00:07:52, esclareceu, igualmente, que estas dificuldades de contacto com o outro progenitor não ocorrem quando o menor está com a mãe;
49.ª - Não tente o Recorrente alegar que não priva a mãe de contactar com o menor por não existirem ações de incumprimento por parte da Recorrida contra ele, porque ao contrário do Recorrente, a Recorrida tem plena consciência de que não são os inúmeros e constantes processos que vão ajudar o BB, pelo contrário;
50.ª - Como já disse nestes autos, e nos permitimos repetir, “O BB precisa de paz e não de ser o cerne de processos judiciais que o afetam presentemente e, com toda a certeza, o afetarão no futuro”.
51.ª - Quanto aos factos 47.º a 59.º estes mais não são senão aquilo que o Recorrente imputou à Recorrida no âmbito do processo crime n.º 1753/21...., fundamentando o Recorrente que tais devem ser aditados à matéria de facto dada como provada por força das declarações para memória futura prestadas pelo menor nesse processo;
52.ª - Somos forçados a repetir: o referido processo crime foi arquivado; após requerimento de abertura da instrução pelo Recorrente foi proferido despacho de não pronúncia; e, mesmo após recurso contra a decisão de não pronúncia, tal veio a ser confirmada pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães;
53.ª - Isto reflete a constante e notória postura de inconformismo do Recorrente, que se permite lançar mão de argumentos que já passaram pelo crivo da Justiça e que se encontram definitivamente decididos por douto Acórdão já transitado em julgado, configurando tal um manifesto abuso de direito;
54.ª - Além do que, se traduz numa inequívoca litigância de má-fé que só não se peticionará a final, pois a Recorrida mantém a postura que já vem tendo ao longo dos vários processos em que se viu envolvida, não pretendendo agudizar, ainda mais, a situação;
55.ª - Quanto ao facto n.º 60, aqui Recorrida nunca impediu o BB de participar em qualquer atividade escolar e, no que concerne a atividades lúdicas/extracurriculares, como o karaté, o menor apenas não foi uma vez, porque preferiu estar com a mãe, tendo sido o próprio a decidir e como o Tribunal a quo refere “(…) neste quadro de manifesta desigualdade na repartição das responsabilidades parentais, é compreensível que a progenitora nem sempre aceda em abdicar dos escassos períodos de convívio com o menor, para garantir que o mesmo frequente atividades extracurriculares nas quais o pai inscreveu o menor”;
56.ª - Quanto ao facto 61.º, em bom rigor, através do facto 20.º constante da matéria de facto dada como provada, já fica confirmado aquilo que é pacífico e do conhecimento de todos: que o BB é seguido em consultas de psicologia, não sendo de aditar nada a este respeito;
57.ª - Por último, pretende aditar o facto 62.º, justificando que decorre da decisão recorrida que o menor foi sinalizado pelo progenitor junto da CPCJ de ..., mas que, na realidade, quem sinalizou foi a psicóloga do menor;
58.ª - Mas tudo isto é para tentar fazer crer que o pai nunca quis atuar contra a mãe do menor?! Sinceramente, já ultrapassamos a fase em que o pai conseguia ludibriar a realidade…
59.ª - O Recorrente tem plena consciência que de imediato apresentou uma queixa criminal por esses factos contra a Recorrida – processo esse de que veio a desistir em fase de instrução, já depois de ter sido proferido despacho de arquivamento – e também sabe o momento oportuno em que o fez e o momento em que convenientemente surgiu o relatório da psicóloga do BB, sendo de louvar que, felizmente, o Tribunal a quo tenha apreciado bem todo este circunstancialismo não permitindo, de forma fundamentada, quaisquer esclarecimentos à perícia elaborada pela Unidade de Psicologia da Universidade ... e valorando o relatório da psicóloga da maneira que valorou;
60.ª - Sem se tecerem mais considerandos acerca da matéria de facto, muito bem andou o Tribunal a quo em não dar como provados os factos elencados pelo Recorrente, pois como afirma a Digna Magistrada do Ministério Público nas suas contra-alegações, “(…) a factualidade dada como assente no Acórdão em apreço tem plena sustentabilidade nas provas indicadas na motivação de tal matéria de facto”;
61.ª - Quer o pai, quer a mãe, têm competências para exercer as responsabilidades parentais – o que resulta à saciedade das perícias efetuadas – pelo que o critério para atribuição da guarda do BB teria sempre de passar por aferir qual dos progenitores potenciaria um melhor contacto com o outro, atendendo a que a distância geográfica entre as residências inviabiliza por completo o regime de residência alternada;
62.ª - No depoimento prestado pela Recorrida é possível constatar, desde logo, a sua plena consciência quanto ao que seria mais benéfico para o BB e a sua intenção de manter, sempre, o pai presente na vida do filho, mais concretamente entre os minutos 00:13:00 e 00:17:24;
63.ª - Já o Recorrente, foi incapaz de demonstrar ter como prioridade aquilo que o menor efetivamente precisa: o fim deste conflito constante e uma vida tranquila, com ambos os progenitores a fazerem parte da mesma, pois tanto alegou no minuto 00:15:21 do seu depoimento “(…) para o equilíbrio do BB, acho fundamental a mãe”, como recorreu da decisão proferida nos termos em que o fez, isto é, voltando a invocar um pretenso quadro depressivo da progenitora que a impede de exercer cabalmente as responsabilidades parentais – bem sabendo que isso é rotundamente falso – e, invocando, maioritariamente, as declarações para memória futura prestadas pelo menor, bem sabendo que o processo crime onde foram proferidas chegou ao ponto de ter o Venerando Tribunal da Relação a confirmar a decisão de não pronúncia da Recorrida, apesar de todas as invetivas do Recorrente;
64.ª - Acresce que, já numa fase bem avançada destes autos – onde as perícias não deixaram margem para dúvidas quanto à capacidade da Recorrida para o exercício cabal das responsabilidades parentais – o Recorrente ainda teve o desplante de afirmar por requerimento datado de 16/02/2023, e a que coube a referência Citius ...71, como supra já se disse, que o BB deveria ficar “à guarda exclusiva do pai, com visitas sem pernoita à mãe, preferencialmente supervisionadas e em ambiente público, e mais reduzidas em número (…) 1 vez por mês, podendo colmatar com videochamadas”, mantendo esta postura até à presente data, como se constata;
65.ª - Precisamente por isso, é que muito bem andou o Tribunal a quo ao concluir que “(…) resultou das declarações da progenitora que esta reconhece virtudes ao progenitor, enquanto educador, que reconhece que o ideal seria uma guarda partilhada” (…) que o menor precisa de ter contatos assíduos com o progenitor e que, acaso a guarda lhe seja atribuída não criará obstáculos ao contato com o outro” e que “Ao contrário, resultou das declarações do progenitor e de toda a sua conduta ao longo do processo que, tendo o mesmo sido investido num regime de guarda exclusiva, o mesmo não soube fomentar os contatos com a progenitora e família materna, nunca colocou a progenitora num plano de igualdade, partiu sempre de uma ideia de desconfiança quanto à prestação desta, permitindo-se fiscalizar o estado em que a criança chegava a casa após os convívios, permitindo-se implementar um sistema de alarme/despertador, gravar as videochamadas estabelecidas entre a progenitora e o filho, como se este fosse uma mercadoria sua, ignorando os apelos para uma pacificação do conflito parental.”;
66.ª - De facto, e como resulta da douta decisão aqui sob recurso, “(…) a mãe, num quadro tão adverso, foi sabendo lidar com a situação, conseguindo manter uma enorme resiliência, paciência, serenidade que poucos conseguiriam ter, mesmo depois de ter sido privada da guarda do filho”, sendo que “Já o pai parece usar um raciocínio invertido, aviltando a progenitora, brandindo contra ela o estado depressivo em que se viu mergulhada, não se coibindo de o agravar com a sua atuação (…) procurando defender que é ele e só ele quem tem as melhores condições para ter o menor consigo e passando um atestado de incompetência à progenitora”;
67.ª - Daí que a Meritíssima Juíza a quo tenha decidido, por força de tudo aquilo que resulta de forma clara e evidente dos autos e de toda a prova produzida, que “(…) a requerida, como bem se denota e foi salientado em resultado do exame psicológico realizado, tem condições psíquicas de manter uma normal relação parental com o filho, benéfica para ambos, sendo que não apresenta qualquer impedimento em termos psiquiátricos para o normal exercício da parentalidade”, pelo que se impõe, “(…) no superior interesse do BB, determinar uma alteração no paradigma da residência do menor, atribuindo a residência exclusiva do menor, à progenitora, pois que esta demonstrou ter maior capacidade que o progenitor para promover um contato salutar com o outro, esperando-se que a mesma saiba honrar este voto de confiança que o tribunal lhe concede.”;
68.ª - De forma extremamente ponderada e bem fundamentada como se pode constatar, mesmo que através de uma leitura perfunctória da sentença, o Tribunal a quo considerou que a Recorrida demonstrou ter maior capacidade para promover e garantir o contacto do menor com o outro progenitor por toda a prova que foi produzida nesse sentido, seja a nível documental, testemunhal, e mesmo, pericial;
69.ª - A única forma de salvaguardar o superior interesse do menor era acautelar que o mesmo continuaria a conviver com ambos os progenitores – como deseja – e tal só fica salvaguardado se o progenitor guardião promover de forma saudável o contacto com o outro, não resultando provado que o Recorrente seja capaz de o fazer;
70.ª - Em suma, temos uma mãe plenamente capaz de exercer as responsabilidades parentais e um pai que considera que tudo está errado, desde as decisões judiciais, aos relatórios periciais que não vão ao encontro dos seus desejos, tudo numa tentativa infrutífera de convencer tudo e todos de que a mãe do BB é psicologicamente instável e que o menor não quer viver com a mãe, mas o certo é que, por tudo quanto supra se expôs, por toda a prova produzida e por tudo e quanto refere a douta sentença recorrida, sempre deverá manter-se a decisão de atribuir a guarda do menor à Recorrida, nos termos aí propugnados”.
**
O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo, apesar da posição expressa pelo recorrente.
Sobre as nulidades invocadas, a Mm.ª Juiz que presidiu à realização da audiência referiu, aquando da admissão do recurso (despacho de 08/01/2024):
 “No recuso interposto o recorrente argui a nulidade da sentença por não ter sido ouvido o menor de 7 anos, nem ter sido justificada a sua não audição.
Cumpre proferir decisão a que alude o art. 641º/1 do CPC.
Mantém-se a decisão proferida, a qual é objeto do presente recurso, pois que, atenta a idade do menor - 7 anos - o tribunal não desconsiderou a posição e os sentimentos do menor, optando por deixar essa avaliação para quem se encontrava mais apto para a fazer, face à tenra idade do menor e ao impacto negativo que outro tipo de inquirição poderia ter para o mesmo, conforme resulta do despacho de 09/11/2022, que determinou a realização de mais perícias psicológicas, quer aos progenitores quer ao menor”.
**
Neste Tribunal da Relação de Guimarães, manteve-se o efeito devolutivo atribuído ao recurso, apesar da posição reiterada pelo progenitor no sentido da atribuição de efeito suspensivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
**
II - Questões a decidir:

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por C. P. Civil) -, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal consistem em saber:

1 - Da admissibilidade da junção de dois documentos.
2 - Da nulidade da sentença:
a) pela não audição do menor BB;
b) por ter atribuído à mãe as responsabilidades parentais de particular importância, sem fundamentar tal decisão;
c) por não ter apurado a situação patrimonial de quem tinha o dever de prestar alimentos e de os receber;
d) por obscuridade que a torna ininteligível ao referir a atribuição da tutela à mãe do menor.
3 - Da impugnação da matéria de facto suscitada pelo recorrente pai.
4 - Se, alterada ou não a decisão sobre a matéria de facto, deve ser alterada a decisão de direito considerando o superior interesse do BB.

III - Fundamentação de facto:

Os factos que foram dados como provados na decisão proferida foram os seguintes:

“2.1. FACTOS PROVADOS ORIUNDOS DAS ALEGAÇÕES DO PROGENITOR
1º Requerente e Requerida são pais do menor BB, nascido em ../../2016, fruto da sua relação de namoro e, posteriormente, de união de facto.
2º Em novembro de 2018, após separação, chegaram Requerente e Requerida a acordo relativamente ao exercício das responsabilidades parentais do menor BB, acordo esse que foi homologado pelo Juízo de Família e Menores ....
3º Em outubro de 2019, Requerente e Requerida reconciliaram-se e alteraram a residência para a Avenida ..., ... ..., onde residiram até ao dia ../../2020, tendo a Requerida começado a trabalhar na Câmara Municipal ..., no âmbito da mobilidade como funcionária pública.
4º A Requerida entrou em depressão e ficou de baixa psiquiátrica até ter terminado o vínculo a Câmara Municipal ...– o que ocorreu em 15 de outubro de 2020.
5º Durante o período de baixa, a Requerida candidatou-se a uma oferta de trabalho na Base Aérea do ..., onde ficou, motivo pelo qual toda a família se mudou para ..., tendo sido celebrado contrato de arrendamento de um imóvel aí sito, e a mudança para este imóvel em 15 de outubro de 2020.
6º O BB também mudou para uma escola em ..., no ano letivo de 2019/2020, frequentava a academia de música e belas artes EE, e com a mudança de local de trabalho da mãe e a mudança de casa, passou para o Agrupamento de Escolas ..., onde estava matriculado para o ano 2020/2021.
7ºA vida familiar desde a reconciliação ocorrida no final do ano de 2019 foi marcada por frequentes desentendimentos entre o casal.
8º No dia 15 de dezembro de 2020, o pai foi buscar o BB a escola, no horário habitual, 15:15H, e foi informado que a mãe do BB, sem nada ter dito ao pai, tinha ido buscar o BB antes da hora do almoço.
9º O pai fez inúmeros contactos telefónicos para a mãe e para a família materna, sem que ninguém atendesse o telefone.
10ºDeslocou-se à CPCJ e a GNR, tendo sido informado pelas 17.30h, pela GNR, que o menor estava em Guimarães na casa dos avós maternos.
11ºA mãe do BB retirou o menor da escola no dia 15 de dezembro de 2020, e deu entrada a esta ação no dia 16 de dezembro de 2020, invocando que a residência do menor era em Guimarães.
12º O BB tem presentemente 7 anos de idade, que completou em ../../2023.
13º desde ../../2021 que o BB está entregue ao Pai, sendo este responsável pelos seus cuidados de saúde, higiene, alimentação e estudo.
14º O pai, se necessitar, tem apoio familiar, tanto dos avós como dos tios e primos direitos do BB, vivendo os avós na mesma praceta e os tios em ..., com todos o BB tem um relacionamento de muito afeto e proximidade.
15º O Requerente diariamente leva o BB à escola, acompanha o BB no estudo, tendo a avaliação do BB oscilado entre Bom – educação artística, educação física, educação moral e religiosa, e Muito Bom nas demais disciplinas, conforme o último Relatório de avaliação escolar do BB.
16º É o pai que desde o início da frequência de estabelecimento de ensino pelo menor, que assegurou e continua a assegurar o pagamento das despesas escolares, encontrando-se todas as mensalidades, material escolar e alimentação pagas até à presente data.
17º O pai mantém relação de forte afeto e amor com o BB e cuida adequadamente deste, brincando com o BB em casa ou no parque infantil e desenvolvendo as atividades próprias e adequadas à sua idade.
18º O pai tem assegurado a satisfação de todas as necessidades básicas do BB, quer a nível de vestuário e alimentação, escolaridade, acompanhamento psicológico, e acompanhamento médico, despesas médicas e medicamentosas, e atividades extracurriculares como natação, karaté e inglês, suportando sozinho todas estas despesas.
19º O BB passa os seus tempos livres com o pai, que organiza a sua vida em função dos horários do BB, para o puder acompanhar sempre.
20º Nesta data, o BB frequenta consultas de psicologia 1 vez por semana, sendo estas consultas relevantes para o bem-estar emocional do BB.
21º O pai tem também assegurado o acompanhamento pediátrico de rotina do BB, as consultas de imunoalergologia, otorrinolaringologista, medicina dentária, oftalmologia, médica de família.
22º No ano de 2021 o progenitor não entregou declaração de rendimentos e no ano de 2023, auferiu mensalmente, pelo menos, rendimentos prediais brutos, na ordem dos 1 650,00 Euros.

2.2. FACTOS PROVADOS ORIUNDOS DAS ALEGAÇÕES DA PROGENITORA.
24º A mãe do BB é absolutamente capaz de exercer cabalmente as responsabilidades parentais.
25º A progenitora exerce as funções de Assistente Técnica em regime de contrato de trabalho em funções publicas, por tempo indeterminado neste agrupamento de escolas integrado no Município ... através do contrato de execução nº ...09, aí exercendo funções desde ../../2001, sendo que, no período compreendido entre 15 de outubro de 2019 e 28 de fevereiro de 2021, exerceu funções na Camara Municipal ... e na base Aérea do ..., em regime de mobilidade.
26º Consta da declaração de 23 de março de 2023, que a progenitora, no período em que esteve ao serviço do referido Agrupamento, sempre desempenhou as suas funções com adequada competência e sentido de responsabilidade, desfrutando de um ótimo relacionamento com todos os atores educativos, alunos, professores e encarregados de educação.
27º A progenitora auferiu no ano de 2021, o rendimento anual bruto 11 007,00 euros;

2.3. FACTOS PROVADOS ORIUNDOS DA PROVA DOCUMENTAL OU PERICIAL:
28º A decisão de entrega imediata ao progenitor foi cumprida, conforme resulta da informação de 19/01/2021, aí se consignando que, “após o choque inicial da decisão judicial, uma vez que a progenitora a desconhecia, esta mostrou uma postura colaborante e facilitadora do processo de transição, sem focada no bem-estar do filho. A progenitora demonstrou um comportamento adequado para a situação, com tristeza e revolta face à decisão, mas com uma abordagem centrada no filho, tendo sido a própria a explicar ao BB e a incentivar que este fosse bem, conseguindo ultrapassar os seus próprios sentimentos. O BB face à abordagem da progenitora estava tranquilo, demonstrou felicidade ao ver o progenitor, avó paterna e tio paterno. O progenitor fez-se acompanhar por estes familiares, uma vez que também são pessoas de referencia para o filho. O momento de entrega da criança ao progenitor foi adequado, com momentos de carinho e de proteção. No dia de hoje, o progenitor contatou a equipa, dando conhecimento do estado do filho, estando o mesmo sereno. Esta informação foi transmitida pela nossa equipa à progenitora. No momento da entrega, o progenitor foi sensibilizado a facilitar contatos telefónicos entre a progenitora e o BB, tendo o mesmo demonstrado consideração para o efeito(…)”.
29º Foi junto aos autos pela progenitora, por requerimento de 15/07/2021, na sequencia de despacho anterior, relatório do seu médico psiquiatra, Dr. FF do qual resulta:
“trata-se de mulher com antecedentes de episódios depressivos prévios, apontando-se o diagnostico de uma reação depressiva prolongada, muito em linha com personalidade ansiosa de base. Tem estado medicada com antidepressivo e ansiolítico de forma regular (sem toxicidade comportamental) e cumprindo acompanhamento regular também em consultas de psicologia. Nunca foi evidente ao longo do acompanhamento psiquiátrico psiocopatologia grave, mas sim quadro reativo e situação familiar/conjugal. O afastamento do filho menor tem sido o principal elemento perpetuador do quadro clinico e mantendo apesar de tudo boa funcionalidade global mostrando-se resiliente. Prova disso foi o episódio de dezembro de 2020, que por agravamento da relação e segundo afirma, se ter sentido vitima de violência doméstica, regressou para o Norte do pais, tendo posteriormente ficado privada da presença do filho, originando ligeiro agravamento do quadro, compreensivelmente. Apesar de tudo com ajuste terapêutico manteve-se funcional. Não se vislumbra, assim, pelo quadro identificado, psicopatologia no passado ou no presente que aponte uma incapacidade de exercer de forma responsável o seu papel de mãe. Vai continuar a ser acompanhada em consultas de psiquiatria”.
30º O relatório psicológico realizado à progenitora, datado de 01/10/2021, conclui nos seguintes termos:
“Da informação recolhida ao longo da avaliação, e respondendo em específico aos quesitos colocados por esse tribunal, somos de parecer que pese embora QQ evidencie sintomas de ansiedade e depressão, tal não interfere de forma significativa com o seu funcionamento. Já no que respeita à personalidade, QQ surge-nos como uma pessoa globalmente calma, relaxada, satisfeita consigo própria e capaz de lidar com o stresse, ainda que tenda a experienciar emoções e sentimentos negativos como culpa, raiva e tristeza. QQ apresenta-se moderada na atividade e no entusiasmo: aprecia a companhia dos outros, mas também valoriza a privacidade. Revela-se uma pessoa aberta a novas experiências, curiosa, criativa, original e imaginativa e com uma grande amplitude de interesses. De um modo global, revela-se uma pessoa amável, altruísta, de bons sentimentos, prestável, disposta a acreditar nos outros, dotada de força de vontade, determinada, de confiança, escrupulosa, organizada, trabalhadora, autodisciplinada e ambiciosa. Da avaliação não resultou a presença de qualquer perturbação e/ou desvio da personalidade. Quanto à parentalidade, foi possível constatar que QQ se encontra motivada, revelando interesse e preocupação para com o bem-estar e segurança do filho. No que respeita a competências parentais, esta mostrou conhecer as principais características identitárias, habilidades e modos de funcionamento do filho. Mostrou-se, ainda, capaz de perspetivar necessidades atuais e futuras do menor e revelou possuir conhecimentos e competências a nível das estratégias didáticas, bem como competências de interação e de expressão adequada de afeto. Da mesma forma, foi possível constatar a existência de sentimentos de afeto positivo e adequado para com o filho. Não obstante o anteriormente exposto, à presente avaliação, verificou-se a presença de algumas vulnerabilidades e fragilidades, em especial no que respeita à relação interparental e à forma como vêm sendo geridas as questões referentes a BB (i.e., dificuldades de comunicação, hostilidade), as quais podem colocar o menor em risco de desajustamento e comprometer o estabelecimento de relações paterno-filiais salutares. Torna-se, assim, crucial promover a comunicação entre o ex-casal, bem como a adoção de competências de negociação e de coparentalidade mais saudáveis. Reforça-se ainda a necessidade de a progenitora manter o acompanhamento em Psiquiatria e o seu encaminhamento para consultas de Psicologia, atendendo à sintomatologia ainda evidenciada”.
31º Consta dos autos a informação social datada de 31/01/2022, que conclui nos seguintes termos:
“Decorrente dos convívios entre a díade mãe/filho, as necessidades básicas do BB, evidenciam-se adequadamente asseguradas. A mãe privilegia ainda a realização de atividades/experiências saudáveis, preferencialmente no exterior (sempre que o tempo permite) e que vão de encontro ao interesse da criança e engrandeçam o vínculo e a cumplicidade que se verifica entre ambos, particularmente, constatados através dos seus olhares.
Pese embora, a avaliação do regime convivial se reporte a dois momentos distintos, a postura e a espontaneidade observada na interação de ambos, revela por parte da mãe capacidade e competências parentais para a promoção do bem-estar e conforto do filho, direcionando a sua ação/decisão para a partilha de vivencias familiares ajustadas.
Neste sentido, esta equipa considera ser benéfico para a díade, e salvaguardando o superior interesse do BB, o alargamento do regime convivial, entre a criança e a figura materna, pese embora, considera-se importante aferir o resultado das perícias solicitadas, quer aos pais, quer à criança, de modo a podermos ajustar a nossa intervenção no que respeita a propor um regime adequado às circunstâncias de vida do BB”.
32º O relatório psicológico do menor, datado de 25/01/2022, concluí nos seguintes termos:
“O BB mantém uma interação adequada com a perita colaborando com empenho e interesse na execução de todas as atividades propostas. Evidencia um aspeto e cuidado investido na higiene e vestuário. O seu discurso é fluido atendendo à sua idade. Apresenta-se orientado no espaço e no tempo. Atenção e comportamento psicomotor sem alterações, com motricidades (geral e fina) desenvolvidas de acordo com o esperado para a idade. No âmbito da avaliação cognitiva a criança apresenta resultados que correspondem a um potencial de capacidade intelectual de nível médio. Também no grafismo e desenho remete para competências da 3ª fase do pré-esquematismo (4-7anos), que corresponde ao período pré-operatório (2-7 anos) de acordo com a teoria do desenvolvimento cognitivo de Piaget. Da análise integrada da informação recolhida junto dos progenitores, apuram-se parâmetros normais nas competências pró-sociais. Não obstante, identificam-se dificuldades com significado clinico nos sintomas emocionais e relacionamento com os colegas, que segundo o pai incomodam ou fazem sofrer o seu filho Muito em casa e com os amigos e Muitíssimo na aprendizagem na escola e nas brincadeiras/tempos livres. Seria importante confrontar com informação facultada pelo respetivo estabelecimento de ensino.
No que concerne às relações familiares, na avaliação instrumental, a criança sugere projetar algum tipo de valorização e de identificação com ambas as figuras parentais e padrões de vinculação segura.
Já na avaliação da interação filho-mãe a criança evidencia proximidade relacional cm a mãe, não obstante, demonstra uma postura algo tensa e insegura, à procura da aprovação da mãe. A mãe demonstra afetividade e mostra-se adequada nas respostas que dá em discurso direto com a criança, no entanto, evidencia infantilizar a criança e direcionar as suas respostas, bem como uma postura tendencialmente intrusiva em situações que não controla. Manifesta igualmente a necessidade de induzir na criança expetativas de insegurança na sua ausência, sugerindo procurar transmitir à criança que espera que ele sinta que a sua segurança e bem-estar dependa exclusivamente da sua presença. Na interação com o pai a criança demonstrou cumplicidade, espontaneidade e segurança. O pai demonstrou uma postura indicadora de proximidade relacional e afetividade, transmite-lhe calma e promove a sua autonomia.
Na análise integrada da informação recolhida, apura-se que a criança apresenta um desenvolvimento global cognitivo e social ajustado à sua idade. Não obstante, apuram-se dificuldades emocionais e na relação com pares reportados pelos pais e observam-se indicadores de incompreensão relativamente a algumas atitudes da mãe que indiciam induzir-lhe mal-estar e ambivalência em relação a que comportamento é esperado por si, bem como a necessidade de agradar a figura materna, como se disso dependesse a relação. Estas questões a prolongarem-se no tempo, associadas ao conflito parental que perceciona, poderão se afigurar como fatores de risco ao seu desenvolvimento emocional, com repercussões ao nível social e cognitivo. Face ao exposto, considera-se que a criança beneficia de continuar a ser acompanhada ao nível psicoterapêutico”.
O relatório psicológico do progenitor, datado de 24/01/2022, conclui:
“ (…)
Na analise se integrada da informação cínica recolhida na observação, sua historia de vida e avaliação instrumental da personalidade, não apuram traços de personalidade indiciadores de psicopatologia, desajustamento emocional ou comportamental que possa comprometer o exercício pleno da parentalidade.
No que diz respeito à avaliação das competências parentais apura-se que o examinando vivencia a parentalidade com baixo nível de stresse, manifesta conceções de praticas educativas adequadas (ex. dar conselhos; mandar a criança para o quarto, sem fechar a porta, elogiar a criança quando se porta bem; explicar á criança o que fez mal; castigar a criança retirando-lhe coisas que gosta) e reporta utilizá-las com regularidade. Indica ainda, considerar adequadas as praticas inadequadas que envolvem violência física aceitável de (3) bater no rabo com a mão e (10) dar palmadas na mão, referindo ter utilizado cada uma delas uma única vez no ultimo ano, bem como as práticas inadequadas não abusivas (22) Ameaçar a criança de que se lhe vai bater e (26) Dar sermões, sendo que reporta ter utilizado estas praticas com a frequência de menos de que uma vez por mês no decurso do ultimo ano. Relativamente ao estilo parental, na avaliação instrumental apura-se que o examinando perceciona-se com estilo parental tendencialmente democrático e participado, com predomínio de Suporte Emocional e scores normativos nos fatores Rejeição e Tentativa de Controlo.
Na avaliação da interação pai-filho observa-se indicadores de competências parentais ajustadas às especificidades da criança, denotando-se proximidade e qualidade afetiva entre o pai e filho.
Face ao exposto, considera-se que o examinando evidencia envolvimento afetivo adequado com o seu filho. Manifesta determinação em assumir as responsabilidades parentais na vida do filho facilitando contatos regulares (telefónicos e presenciais) com a progenitora, pelo que demonstra capacidade em ajustar a sua vida pessoal e agilizar recursos em função do que considera ser melhor para a criança”.
33º Com data de 16/02/2022, o Digno Magistrado do M.P., requereu a abertura de processo judicial de promoção e proteção referente ao menor, sustentando que o menor foi sinalizado pelo progenitor junto da CPCJ de ..., sustentando que o menor é vitima de violência psicológica e abuso sexual protagonizados pela progenitora, dando origem ao Apenso D.
34º Correram ainda termos pelo DIAP ... dois inquéritos criminais (NUIP´s 1753/21.... e 411/21....), ambos impulsionados pelo progenitor contra a progenitora, imputando à progenitora um crime de maus tratos e de abuso sexual agravado, respetivamente.
35º Em ambos os casos tais inquéritos foram arquivados por falta de indícios, requerendo o progenitor a abertura de instrução no âmbito do inquérito 411/21...., requerimento do qual o progenitor declarou desistir na ata de 26/03/2023, no âmbito destes autos.
36º No referido processo, o progenitor acusa a progenitora de adotar comportamentos indevidos de cariz sexual em relação ao menor, designadamente continuar a “amamentar” a criança, levando a que o menor coloque as mãos e a boca na “maminha” da progenitora.
37º Da informação social do E.M.A.T. e 13/06/2023, resulta que o menor não se encontra numa situação de perigo, mas que, se o conflito parental se mantiver e se o menor vivenciar essa dinâmica, num futuro próximo, este pode vir a afigurar-se como fator desestabilizador na vida escolar e social do menor.
38º Na diligência realizada nesses autos em 26/09/2023 foi determinado o arquivamento dos referidos autos.
39º Consta dos autos a perícia psicológica ao menor realizada pela Universidade ..., datada de 30/01/2023, da qual resulta, em síntese:
“Coligindo toda a informação recolhida e considerando o quesito enunciado a fim de avaliar “(,..)o mapa afetivo da criança, apurando-se a relação dela com ambos os progenitores bem como qual deles, se algum, é a figura principal de referência" (cf. V/ Oficio n° ...49 de 11.11.2022), BB mostrou estabelecer um relacionamento ajustado com ambos os progenitores, tendo sido capaz de relatar sentimentos de afeto e proximidade em relação a ambos os pais, bem como de descrever momentos de interação positiva com estes. Não obstante, a partir dos relatos de BB foi possível perceber que este se encontra a vivenciar um conflito de lealdade, caracterizado por uma postura de maior proteção face ao progenitor e uma simultânea tendência para transmitir afetividade para com ambos os progenitores, procurando desta forma corresponder às expectativas de cada uma das partes. Esta situação poderá resultar da exposição de BB à hostilidade e aos conflitos parentais, sendo que tal exposição o poderá colocar em risco de desajustamento e afetar o seu bem-estar emocional e psicológico, pelo que se torna urgente a sua cessação. Paralelamente, estes comportamentos podem fragilizar a relação que BB mantém com cada um dos progenitores, na medida em que retiram espaço à criança para formular juízos independentes, quanto à sua emotividade e relacionamento com cada um dos pais.
No que respeita ao regime de visitas, atendendo à relação positiva e de afetividade existente entre a criança e os seus progenitores, entendemos que os contactas deste com cada um dos pais se deve caracterizar por uma equitatividade no que respeita ao tempo que a criança despende com cada um, com vista à manutenção da proximidade com ambas as figuras parentais. Ressalve-se, contudo, que a distância geográfica existente entre a residência de cada progenitor, as dificuldades comunicacionais entre ambos e o reduzido diálogo acerca do filho poderão comprometer a implementação de um regime equitativo, podendo originar tentativas de manipulação da criança, exacerbar o conflito de lealdade evidenciado por BB e comprometer as relações paterno-filiais. Da mesma forma, o conflito coparental, e uma vez que este é entendido como o maior preditor de desajustamento nas crianças, pode precipitar problemas emocionais e comportamentais, independentemente do regime implementado.
Pese embora BB tenha evidenciado um funcionamento social e um padrão comportamental ajustado, evidenciando capacidade para estabelecer interações adequadas com os pares e com os adultos, é de sublinhar que a dificuldade em gerir o conflito coparental leva-o naturalmente a posicionar-se, aliando-se a um dos progenitores e afastando-se do outro. Desta forma, independentemente do regime de guarda e custódia que venha a ser decidido, é fulcral que os progenitores encetem uma mudança comportamental que se traduza numa gestão mais ajustada e funcional do conflito existente e na promoção de um modelo de coparentalidade alternativo à conflituosidade e judicialização, focado na proteção do filho e ajustado às necessidades do mesmo. Assim, importa alertar e responsabilizar os progenitores para o impacto prejudicial dos seus comportamentos e atitudes no bem-estar da criança e da relação que esta estabelece com os progenitores (e com a restante familia). Neste sentido, é essencial o envolvimento de ambos os progenitores neste processo, bem como de outros elementos familiares aos quais se estende o conflito. É, pois, fulcral a promoção da comunicação entre as partes, bem como a adoção de competências de coparentalidade saudáveis, só possível mediante apoio técnico especializado e regular, na medida em que a incapacidade de diálogo se nos afigura como um importante elemento de risco e potenciador de desajustamento no filho”.
40º Consta dos autos a perícia psicológica aos progenitores realizada pela Universidade ..., datada de 30/01/2023, da qual resulta, em síntese:
“Coligindo toda a informação recolhida na presente avaliação e considerando os quesitos formulados por esse Tribunal, conclui-se que ambos os progenitores se mostraram motivados para a parentalidade, não evidenciando indicadores de sintomatologia psicopatológica, perturbação emocional ou perturbação da personalidade impeditiva para o exercício da parentalidade. Apesar disto, QQ revelou maior fragilidade emocional, a qual parece estar sobretudo associado ao reduzido período de convivência com o filho (e ao quadro depressivo verificado no passado), encontrando-se no presente, a beneficiar de intervenção psicológica e tratamento farmacológico (condição que parece não interferir com o exercício adequado da parentalidade). Ao nível da personalidade, ambos os progenitores pontuaram de forma elevada na dimensão “manipulação de imagem" (cf., 16PF), o que significa que a análise das respostas no instrumento ministrado deve ser feita com alguma reserva, algo que não é incomum neste tipo de avaliações. Posto isto, QQ caraterizou-se como uma pessoa ponderada, menos sociável e aberta, tímida e tradicionalista, que opta por acomodar-se às demais opiniões ao invés de tomar a sua própria decisão. A avaliada destaca-se pela tranquilidade e paciência, sendo capaz de reagir a situações de maior tensão sem frustração. É ainda notória uma tendência em evitar o seu envolvimento em situações de conflito. Além disto, QQ pode ainda ser definida como alguém que segue as normas socialmente estabelecidas, que funciona de modo mais prático e realista e que, por ser mais reservada, não expõe com tanta facilidade os seus problemas. CC, por sua vez, caracterizou-se como uma pessoa reservada, objetiva e tradicionalista, com alguma dificuldade em alterar os seus pontos de vista. Destaca-se a timidez, dominância e inflexibilidade, pautada pela resistência em se adaptar a terceiros. Além disto, pode ser definido como cumpridor das normas e regras sociais, o que faz com que seja marcadamente rígido. CC é ainda caracterizado como alguém alegre, espontâneo e desejoso por atenção, alguém prático, realista e pragmático. À presente avaliação ambos os progenitores evidenciaram estar a par dos principais gostos e preferências de BB, sendo ainda capazes de identificar as necessidades deste a curto, médio e longo prazo. No que concerne às práticas e competências educativas, de um modo geral, ambos os progenitores privilegiam práticas educativas adequadas, embora, ocasionalmente, a progenitora assuma adotar práticas mais permissivas. Foi ainda possível perceber a existência de uma relação adequada entre os progenitores e o filho e de sentimentos de afeto positivo para com o mesmo, assim como de BB por ambos os pais. Os dois progenitores aludiram a uma relação positiva com o filho, marcada por diversas interações positivas, tal como corroborado pela criança. Assim, à presente avaliação, verificou-se que ambos os progenitores evidenciam reunir condições psicoemocionais favoráveis à condução da educação do filho, revelando boas capacidades para um exercício adequado e positivo da parentalidade. Salientamos, todavia, que ainda que o interesse e o bem-estar de BB assumam um caráter prioritário nos discursos de ambos os pais, esta consciência verbalizada não foi corroborada pelas posições que ambos mantêm a respeito um do outro e pelos conflitos e hostilidade existente na relação coparental. Concretamente, destaca-se a presença de um discurso de crítica e de acusação de cada progenitor em relação ao outro, mais evidente nos relatos providenciados por CC em relação a QQ, bem como a dificuldade em estabelecer uma comunicação eficaz e espaços de diálogo no que diz respeito ao BB e à exposição da criança ao elevado litígio (o qual é inteiramente percecionado por BB). Desta forma, independentemente do regime de guarda e custódia que venha a ser estabelecido, torna-se fulcral que os progenitores considerem uma mudança comportamental urgente, que se traduza numa gestão mais ajustada e funcional do conflito coparental existente e na promoção de um modelo de coparentalidade alternativo à conflituosidade e judicialização. Importa assim alertar e responsabilizar os progenitores para o impacto prejudicial que os seus comportamentos e atitudes já tiveram, estão a ter e/ou poderão vir a ter no filho, ao nível do seu bem-estar e da relação que este estabelece com os progenitores. Para este efeito, consideramos fulcral a promoção da comunicação entre o ex-casal, bem como a adoção de competências de coparentalidade saudáveis, mediante apoio técnico especializado e regular (ponderado mediante a distância geográfica entre os progenitores). Por fim, consideramos que o acompanhamento psicológico a BB deve continuar, devendo a progenitora ser incluída no processo terapêutico e na progressão do acompanhamento psicológico em curso junto do filho, para que também ela possa beneficiar de estratégias que sejam tidas como pertinentes pela técnica que acompanha a criança, e que possam contribuir para o bem-estar deste. A intervenção deverá ser alocada a uma equipa especializada que intervenha nas problemáticas identificadas, através de uma articulação interdisciplinar e interinstitucional”.
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De igual forma, considerou-se não provado nessa decisão que:

- que a progenitora praticasse atos de violência contra o progenitor, justificando essas atitudes com a depressão nervosa aguda de que padecia.
- que o Requerente tenha feito terapia de casal com a Dra. GG (de ...), numa expectativa de ajudar a Requerida, pedindo-lhe orientação sobre como ajudar a saúde mental da Requerida, pois esta, entre outros ameaçava suicidar-se.
- que a requerida enquanto viveu com o Requerente tivesse tido vários comportamentos errantes/desviantes.
- que o pai, desde o nascimento do BB, é quem cuida do menor, que fosse a sua figura de referência.
- que a mãe do BB, devido a depressão, ansiedade, e toma de medicação, estava numa situação de incapacidade.
- que o pai do BB não só tomava conta deste como também tinha de tomar conta da mãe do BB.
- que ao longo dos 6 anos de vida do BB, o pai foi sempre a figura de continuidade, a constante na vida do BB.
- que o facto de o BB estar a residir com o Pai é o que lhe tem dado estabilidade, segurança e confiança.
- que desde que o pai tem o BB à sua guarda, o BB não foi privado do contacto com a mãe.
- que a mãe do BB não contribui para a sua estabilidade emocional, antes pelo contrário, é através da ameaça de males, ataques ao pai e família paterna que estabelece o relacionamento com o BB;
- que a mãe diz ao BB para mentir ao pai;
- que o pai não diz ao BB para mentir a mãe,
- que um dos receios do BB quando está com a mãe é o de ficar proibido de ver o pai,
- que a mãe diz ao BB para dizer que não gosta de estar em ...,
- que a mãe, e a família materna falam mal do pai,
- que, nas palavras do BB, dizem que o pai é burro.
- que a atuação da mãe do BB em relação a família do pai é destrutiva,
- que o menor na casa da mãe tinha uns aviões em miniatura, de coleção, que seriam do pai e do tio OO e que a mãe a frente do BB partiu “por querer” as hélices do avião e não pediu desculpa – palavras do BB;
- que outro exemplo passou-se com um casaco vermelho oferecido pelo tio OO, que a mãe terá furado a frente do BB.
- que, também nas palavras do BB, o pai e a família do pai não dizem coisas más da mãe.
- que o BB com frequência usa a expressão “a mãe chateia-me a cabeça”, entre outras situações quando diz ao BB que vai ficar com ela para sempre.
- que a mãe diz também ao BB para não gostar e não ir; i) ao Karaté, ii) a natação, iii) a psicóloga, iv) à escola.
- que para a mãe o bem estar e interesse do BB sejam secundários;
- que a proibição de o BB ir ao exame de Karaté deixou-o numa tristeza muito grande.
- que o BB ficou de tal forma desolado quando a mãe lhe transmitiu em videochamada que não iria, que disse não querer falar com a mãe por videochamada no dia subsequente.
- que o BB verbalizou o seguinte: “estou triste, estou muito triste! Porque é que a mãe me faz estas coisas? Porque é que a mãe deita os doces para o lixo? porque é que vende o carro que a tia RR (tia avó paterna) me ofereceu? porque é que a mãe bateu no pai? Porque é que a mãe…?”.
- que uns dias mais tarde o pai informou a mãe por e-mail que o BB iria participar num SS tinha a expectativa que a mãe viesse, mas a mãe não apareceu, o BB ficou totalmente desgostoso e desconcentrado pelo facto de esperar que a sua mãe estivesse presente à semelhança da família da paterna - dos avós, dos tios, dos padrinhos, tios avós, das primas e do seu pai que estavam a assistir a exibição do BB.
- que a mãe impede o BB de participar em atividades escolares e lúdicas, essenciais para o seu desenvolvimento social, por coincidirem com períodos em que o menor estará com ela, mesmo tendo o pai proposto compensar esses dias.
- que BB quando vem dos fins de semana com a mãe continua a verbalizar o seguinte:
“… tenho medo em ir para a mãe. Tenho medo que a mãe me rapte”.
“… a mãe disse que te dava um murro no pescoço. A tua mãe ainda vai para a prisão por culpa do Pai”.
“… a mãe diz que tu és um psicopata…”
“… o TT, um dos namorados da mãe, diz que tu és parvalhão”.
“… sempre que eu defendo o pai ou digo alguma coisa que a mãe não gosta, fecha-me no quarto a pensar até que eu deixe de dizer bem do pai…” (isto com o conhecimento dos avós maternos).
“… os tios de ... e a tia DD dizem mal de ti.”
“… os avós dizem que tu és parvalhão.”
“… estava nervoso pai. Eles deixam-me nervoso, não pararam de falar mal de ti!"
"Porque é que não me foste buscar no domingo pai? Estava com tanto medo que continuasses doente e não me pudesses ir buscar a Guimarães. Estava cheio de saudades tuas. Estava cheio de saudades tuas."
- que o BB quando regressa de fim-de-semana da casa da mãe, apresenta falta de concentração e repete constantemente ao pai: porque é que a mãe está sempre a dizer mal de ti…
- que a mãe transmite ao BB que tudo o que se passa em Guimarães é segredo e ele não pode contar ao pai.
- que, perante o descrito, o pai assegura que o BB tenha apoio psicológico, o BB tem estado a ser seguido pela Neuropsicóloga, Dra. II, membro efetivo da ...,
- que, por achar que o BB estava em perigo, em 03 de agosto de 2022, no cumprimento do seu dever enquanto psicóloga, fez um pedido de sinalização junto da CPCJ de ....
- que, toda a conduta da mãe aí descrita é gravíssima, dando-se aqui por integralmente reproduzida.
- que a Requerida não contribui para a saúde do BB, nem mental nem física, o menor regressa de casa da mãe doente e fragilizado.
- que, quando o menor leva medicação – enviando o pai receita medica e as indicações da toma, a mãe, deliberadamente ignora, nada fazendo em prol da saúde do BB.
 -que, no passado dia 16/02/2023 o pai enviou email a mãe após ter ido com o BB a consulta de Imunoalergologia, onde informou a importância da medicação de reforço do sistema imunitário do BB, o que se verificou no dia seguinte, dia 17/02/2023 o BB levou para casa da mãe o reforço do sistema imunitário Lantigen B, a mãe devolveu a embalagem vazia – embalagem daria para várias semanas - e o BB disse ao pai que não tomou a medicação.
- que, toda a perturbação psicológica da mãe acarreta limitações ao nível da sua estabilidade emocional, repercutindo-se também na saúde tanto mental como física do BB”.
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IV - Do objeto do recurso:

1 – Da admissibilidade da junção de dois documentos:
Com as suas alegações de recurso veio o pai recorrente requerer a junção de dois documentos, um que traduz uma declaração de um psicólogo identificado como sendo Secretário Geral do IAC e Coordenador da SOS Criança, justificando a junção de tal documento por ser “necessário em virtude da sentença que ora se recorre” e um outro e que é o registo de avaliação do menor, enviado segundo alega o recorrente, em 15/11/2023 e que, assim, não teria sido possível obter em momento anterior.
Dispõe o art.º 651.º n.º 1 do C. P. Civil que “as partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância”.
Aquele art.º 425.º dispõe que “depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
Como se diz no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11/09/2018, do Juiz Desembargador Rui Moreira, proc. 8977/16.8T8PRT.P1, disponível em www.dgsi.pt. “na interpretação deste regime deve atentar-se em que a necessidade da junção de um documento que pode derivar do julgamento em primeira instância não corresponde à necessidade de suprir uma insuficiência instrutória anterior, revelada pela própria decisão da primeira instância.
Pelo contrário, identificar-se-á uma tal necessidade quando o tribunal, oficiosamente, lance mão de um facto novo cognoscível, mas em desrespeito para com o princípio do contraditório.
De igual forma, não pode considerar-se documento cuja junção tenha sido impossível até ao encerramento da discussão aquele que é formado posteriormente e demonstre um facto não alegado e, ele próprio, de ocorrência posterior, como explica Lebre de Freitas (CPC Anot, vol II, 3ª ed, pg. 243), citando ac. do STJ de 13/1/2005.
Em qualquer caso, sempre carece o apresentante de justificar a necessidade ou a impossibilidade da junção do documento que pretende oferecer, incluindo quanto à sua superveniência”.
Ora, no caso dos autos, no que se reporta ao documento n.º..., e muito embora o recorrente não indique para prova de que facto junta o documento, a matéria de facto subjacente a essa declaração é evidente. Ora, a sua superveniência não está alegada e muito menos demonstrada, pois que, como se retira dos autos, a questão que está na base da emissão da referida declaração foi já objeto de instrução e o pai agora recorrente poderia, se assim tivesse pretendido, ter, em devido tempo, solicitado a emissão daquela declaração à pessoa que agora a emitiu.
Como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13/06/2023, do Juiz Desembargador João Ramos Lopes, proc. 1169/21,6T8PVZ.P1, in www.dgsi.pt, não pode “justificar-se a junção de documentos para prova de ‘factos que já antes da sentença a parte sabia estarem sujeitos a prova, não podendo servir de pretexto a mera surpresa quanto ao resultado”, citando-se para o efeito Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª edição.
As situações justificativas da necessidade da junção por virtude da decisão proferida na primeira instância relacionam-se com a novidade ou imprevisibilidade da decisão – a segunda parte do nº 1 do art. 651º do CPC tem o seu âmbito de aplicação circunscrito às situações em que a decisão da 1ª instância cria, pela primeira vez, a necessidade de junção de determinado documento”.
Não é admissível, pois, a junção de documentos quanto a mesma se revelava “pertinente ab initio, por tais documentos se relacionarem de forma direta e ostensiva com a questão ou as questões suscitadas nos autos desde o primeiro momento””.
E continua “relacionando-se os documentos cuja junção é pretendida com matéria que se tem de considerar como a questão de facto controvertida que foi sujeita a discussão probatória e que mereceu das partes a proposição dos elementos probatórios que tiveram por pertinentes (ou seja, respeitam, ostensivamente, a questão de facto que se mostrava suscitada nos autos e era objeto de discussão), fica arredada a possibilidade de admitir a sua junção com fundamento no julgamento proferido na 1ª instância”.
Quanto ao documento junto como n.º 2, emitido em data posterior à conclusão da audiência, não sendo alegado que facto se pretende demonstrar com a sua junção, não se vislumbra, dos que foram impugnados na decisão proferida, a relevância da sua junção, considerando que nunca foi colocada em causa a avaliação escolar do menor, enquanto residia com o pai (estado, aliás, dado como provado o bom desempenho escolar do menor, sem que tal facto esteja impugnado neste recurso).
Não existe assim fundamento da admissão de novos documentos que, assim, se rejeitam.

2 – Da nulidade da sentença proferida:

a) Da não audição do menor BB.
Alega o pai recorrente que a sentença proferida é nula porquanto teria sido negado ao menor o direito de ser ouvido numa decisão que muda por completo a sua vida e rotinas, não sendo dada justificação para essa não audição.
Consagra o art.º 4.º da Lei 141/2015, de 08/09 (doravante RGPTC):
Os processos tutelares cíveis regulados no RGPTC regem-se pelos princípios orientadores de intervenção estabelecidos na lei de proteção de crianças e jovens em perigo e ainda pelos seguintes:
(…)
c) Audição e participação da criança - a criança, com capacidade de compreensão dos assuntos em discussão, tendo em atenção a sua idade e maturidade, é sempre ouvida sobre as decisões que lhe digam respeito, preferencialmente com o apoio da assessoria técnica ao tribunal, sendo garantido, salvo recusa fundamentada do juiz, o acompanhamento por adulto da sua escolha sempre que nisso manifeste interesse.
2 - Para efeitos do disposto na alínea c) do número anterior, o juiz afere, casuisticamente e por despacho, a capacidade de compreensão dos assuntos em discussão pela criança, podendo para o efeito recorrer ao apoio da assessoria técnica”.
Por sua vez, regulando os termos desta audição, preceitua o art.º da mesma Lei que:
“1 - A criança tem direito a ser ouvida, sendo a sua opinião tida em consideração pelas autoridades judiciárias na determinação do seu superior interesse.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o juiz promove a audição da criança, a qual pode ter lugar em diligência judicial especialmente agendada para o efeito.
3 - A audição da criança é precedida da prestação de informação clara sobre o significado e alcance da mesma.
4 - A audição da criança respeita a sua específica condição, garantindo-se, em qualquer caso, a existência de condições adequadas para o efeito, designadamente:
a) A não sujeição da criança a espaço ou ambiente intimidatório, hostil ou inadequado à sua idade, maturidade e características pessoais;
b) A intervenção de operadores judiciários com formação adequada.
5 - Tendo em vista o cumprimento do disposto no número anterior, privilegia-se a não utilização de traje profissional aquando da audição da criança.
6 - Sempre que o interesse da criança o justificar, o tribunal, a requerimento ou oficiosamente, pode proceder à audição da criança, em qualquer fase do processo, a fim de que o seu depoimento possa ser considerado como meio probatório nos atos processuais posteriores, incluindo o julgamento.
7 - A tomada de declarações obedece às seguintes regras:
a) A tomada de declarações é realizada em ambiente informal e reservado, com vista a garantir, nomeadamente, a espontaneidade e a sinceridade das respostas, devendo a criança ser assistida no decurso do ato processual por um técnico especialmente habilitado para o seu acompanhamento, previamente designado para o efeito;
b) A inquirição é feita pelo juiz, podendo o Ministério Público e os advogados formular perguntas adicionais;
c) As declarações da criança são gravadas mediante registo áudio ou audiovisual, só podendo ser utilizados outros meios técnicos idóneos a assegurar a reprodução integral daquelas quando aqueles meios não estiverem disponíveis e dando-se preferência, em qualquer caso, à gravação audiovisual sempre que a natureza do assunto a decidir ou o interesse da criança assim o exigirem;
d) Quando em processo-crime a criança tenha prestado declarações para memória futura, podem estas ser consideradas como meio probatório no processo tutelar cível;
e) Quando em processo de natureza cível a criança tenha prestado declarações perante o juiz ou Ministério Público, com observância do princípio do contraditório, podem estas ser consideradas como meio probatório no processo tutelar cível;
f) A tomada de declarações nos termos das alíneas anteriores não prejudica a prestação de depoimento em audiência de julgamento, sempre que ela deva ser possível e não puser em causa a saúde física e psíquica e o desenvolvimento integral da criança;
g) Em tudo o que não contrarie este preceito, aplica-se, com as necessárias adaptações, o regime processual civil previsto para a prova antecipada”.
Especificamente no âmbito das responsabilidades parentais em que nos encontramos, estabelece o art.º 35.º, n.º3, do mesmo diploma que “a criança com idade superior a 12 anos ou com idade inferior, com capacidade para compreender os assuntos em discussão, tendo em atenção a sua idade e maturidade, é ouvida pelo tribunal, nos termos previstos na alínea c) do artigo 4.º e no artigo 5.º, salvo se a defesa do seu superior interesse o desaconselhar”.
É inequívoco o tratamento doutrinal e jurisprudencial que este direito de audição tem merecido, de forma a ser, hoje, pacífica a interpretação que resulta da sua aplicação prática.
Como se refere no Acórdão do Tribunal desta Relação de Guimarães de 19/10/2017, da Juiz Desembargadora Maria João Matos, proc. 1020/12.8TBVRL.G1, referindo-se a uma situação de divórcio mas que é também aplicável à cessação da união de facto, “está, assim, indiscutivelmente pressuposto que, não só as crianças são sujeitos de direito (e não seu objeto), como «são dotadas de uma progressiva autonomia no exercício dos seus direitos em função da sua idade, maturidade e desenvolvimento das suas capacidades, adquirindo um estatuto de cidadania social», tendo o direito de participar nas decisões que lhes digam respeito (Maria Clara Sottomayor, Temas de Direito das Crianças, Almedina, Coimbra, p. 52 e 53).
Compreende-se, por isso, que, em sede de regulação do exercício das responsabilidades parentais após divórcio, quer a lei substantiva (art. 1906º do C.C.), quer a lei processual (art. 40º do R.G.P.T.C.), expressa e reiteradamente imponham que aquele seja feito tendo em conta «o interesse do menor», «de harmonia com os interesses da criança», ponderando «o superior interesse da criança».
Este «superior interesse da criança», «enquanto conceito jurídico indeterminado carece de preenchimento valorativo, cuja concretização deve ter por referência os princípios constitucionais, como o direito da criança à proteção da sociedade e do Estado com vista ao seu desenvolvimento integral, reclamando uma análise sistémica e interdisciplinar da situação concreta de cada criança, na sua individualidade própria e envolvência externa» (Ac. da RC, de 03.05.2006, Jorge Arcanjo, Processo nº 681/06.
No mesmo sentido, Ac. da RC, de 02.06.2009, Costa Fernandes, Processo n.º 810/08.0TBCTB.C1, onde se lê que se trata «de um conceito indeterminado que terá de ser concretizado, em conformidade com as orientações legais sobre o conteúdo do poder paternal, designadamente as respeitantes à segurança e saúde do menor, ao seu sustento e educação, ao seu desenvolvimento físico, intelectual e moral, à sua instrução geral e profissional, à auscultação da sua opinião, de acordo com as suas idade e maturidade, e à sua autonomização progressiva». Com inexcedível utilidade para a recolha e ponderação de potenciais elementos de concretização do «superior interesse da criança», Clara Sottomayor, Regulação do Exercício as Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio, 2016 - 6ª edição revista, aumentada e atualizada, Almedina, abril de 2016, p. 41 a 80. Ainda Anabela Miranda Rodrigues, «O Superior Interesse da Criança», Estudos em Homenagem a R. N. Epifânio, Coordenação de Armando Leandro, Álvaro Laborinho Lúcio e Paulo Guerra, Almedina, 35-41, numa outra perspetiva, de compreensão do próprio conceito).
Contrariamente ao que parece resultar das alegações de recurso do pai do BB, o direito de audição deste não dependia do teor da decisão que iria ser proferida, existindo ainda que o Tribunal de 1.ª Instância entendesse manter as decisões provisórias que constam dos autos e que foram tomadas sem que o mesmo tivesse sido ouvido pelo Juiz do Juízo de Família e Menores, então sem qualquer contestação por parte dos seus progenitores, incluindo dele próprio.
Nenhum dos seus progenitores entendeu ser necessária a sua audição, de modo a requere-la no Juízo de Família e Menores onde se discutia com quem passaria a residir, considerando que os progenitores residem longe um do outro (aliás, nas alegações de recurso apresentadas nestes autos em face do despacho inicial proferido, o pai pugna pela sua não audição, considerando que tinha então apenas quatro anos de idade).
Esta questão surge nos autos, nesta fase de decisão definitiva, pela 1.ª vez, em sede de alegações de recurso e sob a invocação de nulidade da sentença por excesso de pronúncia, nos termos do art.º 615.º, n.º1, alínea d), do C. P. Civil.
Esta norma sanciona com a nulidade a sentença proferida que deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
 O recorrente cita um Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra que, por sua vez, faz uma citação de um texto publicado por Teixeira de Sousa no Blog do IPPC sobre nulidades, concluindo pela verificação, na situação em apreço, da que que está prevista na alínea d) do n.º1, do art.º 651.º do C. P. Civil.
No referido texto, o autor equaciona três possibilidades.
- aquela em que o ato proibido é praticado ou a omissão de ato obrigatório é admitida por despacho judicial (primeira);
- aquela em que o ato proibido é praticado ou o ato obrigatório é omitido e, depois dessa prática, há uma decisão judicial (segunda);
- aquela em que uma decisão dispensa ou impõe a realização de um ato obrigatório ou proibido e em que uma outra decisão decide uma outra matéria, pois que, neste caso, há duas decisões distintas (terceira).
Como é bom de ver, na situação dos autos, o que está em causa é a segunda situação, pois que, na alegação do recorrente, o BB não foi ouvido e não foi justificada a sua não audição, tendo sido proferida a sentença final dos autos, sem que tal inquirição se fizesse ou fosse justificada.
Ora, a solução que Teixeira de Sousa configura como sendo de excesso de pronúncia não é esta segunda (relativamente à qual se limita a escrever “o que importa considerar é a consequência da nulidade processual na decisão posterior. Quer dizer: já não se está a tratar apenas da nulidade processual, mas também das consequências da nulidade processual para a decisão que é posteriormente proferida”).
Na situação que está subjacente ao texto citado, o Tribunal havia proferido despacho a dispensar a realização da audiência prévia e proferido despacho saneador, existindo assim dois despachos, entendendo Teixeira de Sousa que, estando causa a terceira situação por si enunciada, haveria de equacionar a forma de impugnação destes dois despachos, concluindo estar-se perante a nulidade do art.º 615.º, n.º1, alínea d): “se, apesar da omissão indevida de um ato, o juiz conhecer na decisão de algo de que não podia conhecer sem a realização do ato omitido (ou, pela positiva, conhecer de algo de que só podia conhecer na sequência da realização do ato), essa decisão é nula por excesso de pronúncia (art. 615.º, n.º 1, al. d), CPC).
Portanto, o que a RL deveria ter feito era verificar se:
- A dispensa da realização da audiência prévia era admissível;
-  A dispensa indevida da audiência prévia implicava a nulidade do despacho saneador por excesso de pronúncia
”.
Ou seja, a nulidade por excesso de pronúncia a que se reporta o pai recorrente não é referida pelo autor citado para a situação dos autos em que, na sua versão, foi totalmente omitida a apreciação do tribunal sobre a audição da criança. A nulidade por excesso de pronúncia é referida para a situação em que há despacho de dispensa de um ato que deveria ter sido realizado e, a seguir, é proferido um outro despacho sem que o ato dispensado se tenha realizado.
Não existe assim a nulidade invocada por excesso de pronúncia, considerando os argumentos apresentados pelo próprio recorrente.
Ainda que assim se não entendesse e estivesse em causa a nulidade invocada de omissão de pronúncia, sempre teríamos de considerar que, nos estritos poderes que a lei confere ao julgador de 1.ª Instância no sentido de suprir a nulidade cometida, teria a Mmª Juiz que presidiu à realização da audiência fundamentado a não audição do BB quando, no despacho de admissão do recurso, referiu que “atenta a idade do menor - 7 anos - o tribunal não desconsiderou a posição e os sentimentos do menor, optando por deixar essa avaliação para quem se encontrava mais apto para a fazer, face à tenra idade do menor e ao impacto negativo que outro tipo de inquirição poderia ter para o mesmo, conforme resulta do despacho de 09/11/2022, que determinou a realização de mais perícias psicológicas, quer aos progenitores quer ao menor”.
É este precisamente o sentido da lei quando estabelece que, arguida qualquer das nulidades do art.º 615.º do C. P. Civil, possa o julgador pronunciar-se sobre as mesmas antes da subida do recurso interposto, podendo supri-la nos termos do art. 617.º do mesmo diploma.
Ou seja, concorde-se ou não com a fundamentação então expressa, entendeu então a Mm.ª Juiz que realizou a audiência de julgamento que não se justificava a audição do BB, declarando-o ainda que de forma singela, tendo em vista a decisão a proferir.
Daqui decorre que, quer se entenda como totalmente omitido o despacho sobre a audição da criança, quer se discorde da fundamentação apresentada para a sua não audição, ainda que expressa depois de proferida a sentença, sempre terá de se verificar se, na situação em apreço, se impunha a audição do menor pelo Juiz do Juízo de Família e Menores e, neste caso, qual a consequência da sua não audição.
E, aqui concordámos na íntegra com a jurisprudência citada pelo recorrente.
Como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 05/12/2023, da Juiz Desembargadora Cristina Silva Maximiano, proc. 28159/17.0T8LSB.L1.7, “quanto às consequências processuais da falta de audição da criança quando a audição é devida, ou da falta de justificação para a não audição, entende-se, na esteira do mencionado Acórdão do STJ de 14/12/2016 [posição também propugnada no citado Acórdão do TRL de 14/07/2020, relator Nuno Ribeiro] que tal falta, não obstante configurar uma falta processual, afeta a validade das decisões finais dos correspondentes processos, por corresponder a um princípio geral com relevância substantiva e, por isso mesmo, processual, não sendo de aplicar o regime das nulidades processuais.
Neste sentido, chamamos, ainda, aqui à colação as palavras de:
- Salazar Casanova, que sustenta que as razões que permitem a audição de uma criança em juízo, após o ano de 2003, são de “ordem substantiva” e que se devem ao superior interesse da criança, e “assim, onde determinada diligência processual colida com tal interesse, há-de prevalecer este” - in “O regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho e o princípio da audição da criança”, Scientia Juridica, Tomo LV, nº 306 – Abril/Junho 2016, p. 236;
- Paulo Guerra, que aduz que, atento o princípio do respeito pelas opiniões da criança, reconhecido pelo art.º 12º da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, “fácil é de concluir que o regime das nulidades processuais não é, de facto, o mais adequado à catalogação do vício da falta de audição de uma criança em sede judiciária. (…) Na realidade, e para finalizar, se é verdade que a criança não tem, em regra, capacidade de exercer sozinha os seus legais direitos, também o é que haverá certos direitos ligados à substância e ao «ser» da criança que só podem gozados por ela própria, de viva voz, sem interferência de terceiros. E aí basta-lhe a sua capacidade regra de gozo de direitos. E bastará ao tribunal afirmar essa essência e substância para declarar que a omissão da audição de uma criança com maturidade para o efeito, quando conveniente, afeta a subsistência da decisão que não a admitiu, não por força da constatação de uma nulidade processual civil de natureza secundária, mas por aplicação direta do princípio básico (de essência) da existência de uma criança – ter direito a ser ouvida por quem vai decidir relevantes aspetos da sua vida.”- in “A Audição de Crianças em Tribunal – e quando não se ouvem?”, em “Questões do Regime Geral do Processo Tutelar Cível”, caderno de “Coleção Formação Contínua”, E-book publicado pelo Centro de Estudos Judiciários, Julho 2019, p. 89-90, acessível emhttps://cej.justica.gov.pt/LinkClick.aspx?fileticket=wpeLi5nKGq0%3D&portalid=30”.
Assim, esta alegação relativa à omissão de audição do menor, no momento em que nos encontramos e que é a fase de recurso da sentença proferida, é ainda admissível na medida em que dela (a omissão) resulta, sempre, um erro de julgamento.
O que este Tribunal já discorda é da decisão de anulação da sentença (no processo referido foi decidido “anular a decisão recorrida e determinar que o processo baixe a fim de, ou serem ouvidas as crianças, se a sua capacidade de compreensão assim o determinar, ou ser justificada a sua não audição”), quando, como acontece nestes autos, está em condições de apreciar se se impunha ou não a audição do BB para que a decisão fosse proferida.
Temos por certo que, numa situação como a dos autos, de grande conflituosidade entre os pais, com residências tão distantes, se impunha que tivesse sido proferido um despacho claro e fundamentado quanto à questão da audição de uma criança com sete anos de idade, quando se tornou certo que não haveria uma decisão consensual.
As normas citadas, que vigoram no sistema jurídico nacional, mas que são já fruto de diplomas internacionais que, nesta matéria, há longos anos versam sobre os direitos da criança (Convenção sobre os Direitos da Criança, A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e a Convenção Europeia sobre os Direitos da Criança), impunham que tal despacho tivesse sido proferido com clareza.
Mesmo considerando o que foi escrito pela Mmª. Juiz quando admitiu o recurso, a questão da audição da criança é hoje matéria de grande relevância jurídica e fáctica, razão pela qual deve ser necessariamente objeto de decisão autónoma.
Daqui não resulta, contrariamente ao que entende o recorrente, que se imponha a este Tribunal a anulação da sentença para que o BB seja ouvido e, após, ser proferida nova decisão.
E, aqui, concorrem duas questões essenciais:
A primeira é de ordem processual.
A lei processual civil estabelece uma regra de substituição do tribunal recorrido pelo tribunal de recurso. Com efeito, ainda que declare nula a decisão que pôs termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objeto da apelação – art.º 665.º do C. P. Civil.
Ou seja, ainda que o Tribunal entendesse que a decisão era nula por falta de audição do menor, deveria conhecer do objeto da apelação, e que, no que aqui está em causa, se reporta à obrigatoriedade da sua audição.
A segunda diz respeito à própria questão material relativa à audição do menor.
Com efeito, quando foi requerida a realização de perícia à Unidade de Psicologia da Universidade ... foi solicitado “mapa afetivo da criança, apurando-se a relação dela com ambos os progenitores, bem como qual deles, se algum, é a figura principal de referência”.
Ou seja, foi solicitado que aquela unidade com competência técnica na área da psicologia abordasse precisamente a relação do menor com cada um dos seus progenitores, tendo em vista, precisamente, a decisão que tinha de ser proferida, residindo os progenitores tão longe um do outro.
Assim, não pode dizer-se que o menor não foi ouvido neste processo judicial, porque o foi, no contexto da perícia realizada, com essa intenção clara de saber como convivia com cada um dos seus progenitores, determinada pelo então Juiz titular do processo.
Por outro lado, e de forma ainda mais relevante, não pode ignorar-se que existem nos autos as declarações que prestou em sede de processo crime, em registo vídeo e áudio, que este Tribunal de recurso também viu e ouviu e que, como resulta do supra citado art.º 5.º, n.º 7, alínea d), do RGPTC podem ser aqui consideradas e foram-no (basta atentar que parte substancial da impugnação da matéria de facto do recorrente se centra nas declarações então prestadas pelo menor).
É, aliás, inequívoco que os factos que aqui estavam em causa foram o objeto essencial daquela inquirição, que se centrou na relação do menor com cada um dos progenitores e no que diziam, cada um deles e as respetivas famílias, um do outro e como o menor via essa relação, incluindo sobre o facto de gostar ou não de estar em Guimarães e em “...”.
Ou seja, quer através da perícia especializada e técnica realizada, quer através das declarações prestadas em processo crime, foi o BB ouvido nestes autos e dessa audição resultou com clareza a forma como vive este conflito parental que o envolve e as relações estabelecidas com cada progenitor (não havendo aqui que cuidar se tal meio de prova foi ou não considerado, pois que tal é matéria a apreciar em sede de impugnação da matéria de facto).
Está em causa uma criança de apenas sete anos de idade, que sempre viveu com o pai e que, desde os três anos de idade vive apenas com o pai, sendo muito conturbada a relação entre os seus progenitores.
Como evidencia a conclusão do relatório pericial, “foi possível perceber que este se encontra a vivenciar um conflito de lealdade”, e que o conflito coparental leva a que se posicione, aliando-se a um dos progenitores contra o outro.
Neste contexto, existindo já dois momentos em que o BB pode pronunciar-se sobre a sua relação com cada um dos progenitores, tendo apenas sete anos de idade e sendo naturalmente evidente, porque errado, atento o conflito que vive já hoje, que este não poderá ser colocado na posição de escolher entre residir com a mãe ou com o pai, entendemos que existe fundamentação bastante para se decidir não ouvir, novamente, a criança no contexto da decisão a proferir.
É o próprio pai que refere esta audição do BB quando, no email junto ao apenso D e datado de 13/03/2023 refere que “o BB quando foi ouvido quer pelas perícias quer no processo de violência psicológica, referiu quando lhe perguntaram, que quer as peritas quer o juiz estavam ali para o proteger”.
Podemos assim concluir que, na situação em apreço, ainda que se entenda que o tribunal recorrido deveria ter proferido despacho expresso sobre a não audição do menor pelo juiz do processo ao longo das decisões que foram sendo tomadas quanto à sua guarda e direito de visitas, tal não implica a anulação da decisão proferida, porquanto, impondo-se a este tribunal de recurso substituir-se ao tribunal de 1.ª instância, entendemos existirem elementos para concluir que a sua opinião foi manifestada de forma concludente através da perícia e declarações prestadas em processo crime, sempre se justificando que não fosse novamente ouvido, considerando a situação de conflito em que se vê envolvido e que fortemente o desgasta.
Não seria assim relevante para este efeito que este verbalizasse a vontade de ser ouvido “pelo juiz”, sendo que os demais elementos invocados (opinião do foro psicológico e declarações em processo crime) expressamente inculcam a desnecessidade de nova audição.
Não existe assim fundamento para que se remetam os autos à 1.ª Instância para nova audição do BB.

b) Invoca ainda o recorrente a nulidade da sentença proferida por ter atribuído à mãe as responsabilidades parentais de particular importância, mais uma vez por excesso de pronúncia, nos termos do art.º 615.º, n.º1, alínea d), do C. P. Civil.

Dispõe o art.º 1906.º do C. Civil: 
1 - As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
2 - Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o Tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores”.
É inequívoco que a lei estabelece a regra de que compete a ambos os progenitores as responsabilidades parentais relativas a questões de particular importância, só podendo um dos progenitores ser afastado dessas decisões se tal for contrário aos interesses do menor.
Não está aqui em causa a fixação da residência do menor com a mãe, que está determinada na decisão, ao fixar-se um momento temporal para a entrega do menor, mas, apenas, a decisão que atribuiu apenas a esta as responsabilidades parentais relativas a questões de particular importância para a vida do BB.
Ou seja, a atribuição da guarda do menor à mãe não implica, como parece entender a decisão proferida, que tais competências fiquem a pertencer à mãe, como decorre expressamente do art.º 1906.º do C. Civil. Necessário se torna que tal atribuição conjunta seja contrária aos interesses do menor e que tal seja objeto de decisão fundamentada.
Essa decisão fundamentada não existe.
Em momento algum na sentença proferida fundamenta o Tribunal aquele segmento decisório da sentença que proferiu.
Daqui decorre que a sentença proferida seja de facto nula, não por excesso de pronúncia, pois que compete ao Tribunal de 1.ª Instância decidir a quem competem as responsabilidades parentais em questões de particular importância, mas por total ausência de fundamentação da decisão por si proferida, nos termos da alínea b) do n.º1 do art.º 615.º do C. P. Civil.
O reconhecimento desta nulidade não implica, porém, que os autos sejam remetidos à 1.ª Instância tendo em vista o suprimento da nulidade – leia-se a fundamentação daquele segmento da decisão.
Nos termos já referidos e impostos pelo art.º 665.º do C. P. Civil, incumbe a este Tribunal de recurso substituir-se ao Tribunal de 1.ª Instância e, assim, apreciar se aquele segmento da decisão deve ou não manter-se, fundamentando a decisão a proferir, realizado que foi o julgamento e estando toda prova produzida documentada nos autos.
Assim, embora nula a decisão na parte em que atribuiu apenas à mãe as responsabilidades parentais em questões de particular importância, dessa nulidade não decorre a devolução dos autos à 1.ª Instância, tendo em vista a obtenção de fundamentação, sendo o mérito da apelação apreciado neste acórdão, quando forem apreciados os demais fundamentos da apelação para a sua alteração.
 
c) Invoca ainda o recorrente a nulidade da sentença também por excesso de pronúncia por não ter apurado a situação patrimonial de quem tinha de prestar alimentos e de quem tinha de os receber.
Mais uma vez equivoca-se a recorrente quando fundamenta a sua arguição no excesso de pronúncia.
A sentença que regula as responsabilidades parentais tem de pronunciar-se sobre se são ou não devidos alimentos e em que montante, resultando essa obrigação do disposto nos arts.º 1905.º (ex vi art. 1911.º) e 1878.º do C. Civil.
Assim, ao pronunciar-se sobre essa questão, não está o Tribunal a exceder-se na sua pronúncia, e, por isso, não existe a nulidade invocada.
O que alega o recorrente é que “não constam dos autos factos e documentos que levem o Tribunal” a fixar o montante de 300,00 euros a título de alimentos, já que apenas estão demonstrados os rendimentos do recorrente, que são eventuais, e o salário da recorrida, factos 22 e 27 da matéria de facto provada.
Mais uma vez, o que acontece é que a decisão proferida não contém, no que ao segmento dos alimentos se reporta, qualquer fundamentação jurídica, sendo por isso nula, não por excesso de pronúncia, pois que compete ao Tribunal de 1.ª Instância fixar os alimentos que seriam devidos pelo progenitor a quem o menor não é confiado, mas por total ausência de fundamentação da decisão por si proferida, nos termos da alínea b) do n.º1, do art.º 615.º do C. P. Civil.
O reconhecimento desta nulidade não implica, porém, que os autos sejam remetidos à 1.ª Instância tendo em vista o suprimento da nulidade – leia-se a fundamentação daquele segmento da decisão -, como se referiu anteriormente.
Nos termos já referidos e impostos pelo art.º 665.º do C. P. Civil, incumbe a este Tribunal de recurso substituir-se ao Tribunal de 1.ª Instância e, assim, apreciar se aquele segmento da decisão deve ou não manter-se, fundamentando a decisão a proferir, realizado que foi o julgamento e estando toda prova produzida documentada nos autos, quando fizer a apreciação dos fundamentos da apelação.
Assim, embora nula a decisão na parte em que fixou os alimentos devidos pelo pai do menor, dessa nulidade não decorre a devolução dos autos à 1.ª Instância, tendo em vista a obtenção de fundamentação, sendo o mérito da apelação apreciado neste acórdão.

d) Invoca por fim o recorrente a nulidade resultante da obscuridade da sentença proferida, que a torna ininteligível, ao referir a atribuição da tutela à mãe do menor.
Alega o recorrente não se compreender o alcance da menção efetuada ao decidir “o menor fica confiado aos cuidados da mãe, à sua guarda e tutela”, porque inexiste uma situação de atribuição de tutela (cfr. art.º 1921.º do C. Civil), sendo a sentença nula nos termos da alínea c) do n.º1 do art.º 615.º do C. P. Civil.
A decisão é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja inteligível e é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Em STJ 20-5-21, 69/11 e STJ 8-10-20, 1886/19, decidiu-se que a ambiguidade ou obscuridade prevista na alínea c) só releva quando torne a parte decisória ininteligível, o que ocorre quando um declaratário normal, nos termos do art. 236º, nº1 e 238.º, n.º1, do C.C, não possa retirar da decisão um sentido unívoco, mesmo depois de recorrer à fundamentação para a interpretar”, nas palavras de Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Volume I, em anotação ao art.º 615.º do C. P. Civil.
Começa por referir-se que a arguição desta nulidade evidencia um comportamento muito próximo da má-fé processual quando se constata que o recorrente, quando apresentou as suas alegações nestes autos, em 27/03/2023, concluiu-as pedindo que a guarda do menor lhe fosse confiada escrevendo no pedido então formulado “o menor fica confiado aos cuidados do pai, à sua guarda e tutela” (fls. 681 do processo físico).
Ou seja, a obscuridade que aponta à sentença proferida e que a torna ininteligível é a mesma que consta do seu requerimento em que, em seu benefício, peticionava a atribuição da tutela do menor.
O conteúdo do que estava então a pedir ao Tribunal é, assim, do seu conhecimento e, assim, por si claramente inteligível.
Resulta assim com clareza das alegações do recorrente apresentadas nos termos do art.º 39.º, n.º4, do RGPTC que, quando se referia a “tutela”, mais não estava que a reforçar as expressões anteriores de “cuidados” e “guarda”, sem que se estivesse a referir à tutela como instituto jurídico.
Do mesmo modo, quando na sentença proferida se faz a mesma exata referência, é esse o contexto em causa.
Tendo a palavra “tutela” um significado jurídico inequívoco e que não se aplica a estes autos, sendo manifestamente redundante em face do que se pretendeu decidir e constava já escrito, a menção constante do segmento decisório em apreciação deve ser eliminada, sem que tal signifique que a sentença seja nula, por ser obscura e por isso ininteligível.
Não existe qualquer obscuridade ou ininteligibilidade mas apenas incorreção jurídica na afirmação do direito de guarda que foi requerido (pelo recorrente pai, em seu benefício) e definido pelo Tribunal (em benefício da mãe).

Julga-se, pois, improcedente a arguida nulidade, retificando-se o segmento da decisão com a eliminação da menção à palavra “tutela”.
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3 - Da impugnação da matéria de facto:

a) Dispõe o art.º 640.º do C. P. Civil, que:
1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo, de poder proceder à transcrição do excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636º”.
A jurisprudência tem entendido que desta norma resulta um conjunto de ónus para o recorrente que visa impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto.
Nas palavras do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01/10/2015, da Juiz Conselheira Ana Luísa Geraldes, proc. 824/11.3TTLRS.L1.S1 i, das normas aplicáveis resulta que “recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus:
Primo: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento;
Secundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa;
Tertio: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas.
Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa-fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão”.
Estes ónus exigem que a impugnação da matéria de facto seja precisa, visando o regime vigente dois objetivos: “sanar dúvidas que o anterior preceito ainda suscitava e reforçar o ónus de alegação imposto ao recorrente, prevendo que deixe expressa a decisão alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação em sede de reapreciação dos meios de prova” (cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, pág. 198).
Recai assim sobre o recorrente o ónus de, sob pena de rejeição do recurso, determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretendem questionar (delimitar o objeto do recurso), motivar o seu recurso através da transcrição das passagens da gravação que reproduzem os meios de prova, ou a indicação das passagens da gravação (fundamentação) que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre cada um dos factos que impugnam e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação.
No âmbito da impugnação da matéria de facto não há lugar ao convite ao aperfeiçoamento da alegação, ao contrário do que se verifica quanto às alegações de direito (vide, por todos, Abrantes Geraldes, no livro já citado, pág. 199).
Analisadas as alegações apresentadas, o recorrente indica de forma correta os factos que pretende sejam decididos de forma diversa, fundamentando a sua alegação em concretos meios probatórios que entende permitir concluir no sentido por si proposto, fazendo menção aos específicos momentos da gravação dos depoimentos, quando estão estes em causa, nada obstando assim à reapreciação da matéria de facto da decisão recorrida.
Veja-se, por todos, a jurisprudência citada no Acórdão recente do Supremo Tribunal de Justiça de 12/10/2023, da Juiz Conselheira Maria da Graça Trigo, proc. 1/20.2T8AVR.P1.S1, e em particular o Acórdão do mesmo Tribunal de 10/12/2020 (proc. n.º 274/17.8T8AVR.P1.S1), nele citado, que estabelece que “na verificação do cumprimento dos ónus de alegação previstos no art. 640.º do CPC, os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, dando-se prevalência à dimensão substancial sobre a estritamente formal”.
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b) Nos termos do art.º 662.º, n.º 1, do C. P. Civil, “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 12/10/2023, da Juiz Desembargadora Margarida Gomes, proc. 2199/18.3T8BRG.G1, in www.dgsi.pt, “a reapreciação da prova pela 2ª Instância, não visa obter uma nova e diferente convicção, mas antes apreciar se a convicção do Tribunal a quo tem suporte razoável, à luz das regras da experiência comum e da lógica, atendendo aos elementos de prova que constam dos autos, aferindo-se, assim, se houve erro de julgamento na apreciação da prova e na decisão da matéria de facto.
De todo o modo, necessário se torna que os elementos de prova se revelem inequívocos no sentido pretendido pelo recorrente, impondo, pois, decisão diversa da proferida pelo tribunal recorrido, conforme a parte final da al. a) do nº 1 do artº 640º, do Código de Processo Civil.
Competirá assim, ao Tribunal da Relação reapreciar as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, atendendo ao conteúdo das alegações do recorrente, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados”.
Estão em causa o facto provado 24 e os que enumera e que foram considerados não provados.
Vejamos, assim, cada um dos indicados e os meios de prova que são considerados pelo recorrente.
É dado como provado que a mãe do menor é absolutamente capaz de exercer cabalmente as responsabilidades parentais.
Insurge-se o pai recorrente quanto a este item da matéria de facto provada, considerando que não está em causa um facto (1), mas uma alegação da progenitora e uma conclusão do Tribunal que não está alicerçada na prova produzida (2).
Analisemos se foi ou não dada como provada matéria de facto (1).
Como decorre do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27/09/2023, do Juiz Desembargador Jerónimo Freitas, proc. 9028/21.2T8MTS.P1 in www.dgsi.pt, “conforme é entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do Supremo Tribunal de Justiça, as conclusões apenas podem extrair-se de factos materiais, concretos e precisos que tenham sido alegados, sobre os quais tenha recaído prova que suporte o sentido dessas alegações, sendo esse juízo conclusivo formulado a jusante, na sentença, onde cabe fazer a apreciação crítica da matéria de facto provada. Dito de outro modo, só os factos materiais são suscetíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados. As conclusões, envolvam elas juízos valorativos ou um juízo jurídico, devem decorrer dos factos provados, não podendo elas mesmas serem objeto de prova”, remetendo para o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23/09/2009 do Juiz Conselheiro Bravo Serra, proc. n.º 238/06.7TTBGR.S1, também ele disponível in www.dgsi.pt.
Nas palavras de Anselmo de Castro só “acontecimentos ou factos concretos no sentido indicado podem constituir objeto da especificação e questionário (isto é, matéria de facto assente e factos controvertidos), o que importa não poderem aí figurar nos termos gerais e abstratos com que os descreve a norma legal, porque tanto envolveria já conterem a valoração jurídica própria do juízo de direito ou da aplicação deste” (Direito Processual Civil Declaratório, Almedina, Coimbra, Volume III, 1982, pág. 268/269).
O Tribunal seguirá aqui de perto o entendimento expresso no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12/09/2019, da Juiz Conselheira Rosa Ribeiro Coelho, proc. 1333/15.7T8LMG.C1.S1, in www.dgsi.pt: “no regime anterior na audiência de julgamento, após a produção da prova, abria-se o debate sobre a matéria de facto, com produção de alegações sobre o tema pelos advogados das partes, e seguia-se o proferimento de decisão onde se julgavam os factos, indicando-se os tidos como provados e aqueles que se consideravam como não provados. Ultrapassada a fase em que às partes era facultada a discussão sobre o aspeto jurídico da causa, era proferida a sentença na qual, além do mais, se discriminavam os factos admitidos por acordo, os factos provados por documento ou por confissão reduzida a escrito e os factos constantes do acórdão ou do despacho proferido no final da audiência; seguia-se a indicação interpretação e aplicação das normas jurídicas pertinentes a esses factos, assim se chegando à decisão final - tudo nos termos enunciados nos arts. 652º, 653º e 659º do CPC então vigente,
Atualmente, porém, à audiência final, onde são produzidas as provas e as partes produzem alegações sobre a matéria de facto e o direito aplicável, segue-se o proferimento da sentença, em cuja fundamentação o juiz discrimina os factos que considera provados e não provados, através de análise crítica das provas, tomando ainda em consideração os admitidos por acordo e os provados por documento ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e indicando, interpretando e aplicando as normas jurídicas pertinentes, concluindo pela decisão final – arts. 604º e 607º do atual CPC.
Coerentemente, não havendo já, na tramitação de um concreto processo, a prolação de uma decisão sobre os factos e, depois, o proferimento de uma decisão de mérito, muitas vezes com a intervenção sucessiva de julgadores diferentes – o do facto e o do direito –, foi eliminado o antigo nº 4 do art. 646º, que rezava assim: “têm-se por não escritas as respostas do tribunal coletivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.
Como a este propósito escrevem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, esta “(…) opção legislativa tem subjacente a admissibilidade de uma metodologia em que, com mais maleabilidade, se faça o cruzamento entre a matéria de facto e a matéria de direito, tanto mais que a circunstância de ambos os segmentos surgirem agregados na mesma peça processual facilita e simplifica a decisão do litígio (…).”.
Porém, tal “(…) opção não significa, obviamente, que seja admissível doravante a assimilação entre o julgamento da matéria de facto e o da matéria de direito ou que seja possível, através de uma afirmação de pendor estritamente jurídico, superar os aspetos que dependem da decisão da matéria de facto”.
E continua, “não poderá, portanto, a sentença, ao emitir o julgamento sobre os factos atinentes a uma dada questão de direito, considerar como provado o correspondente conceito jurídico, desacompanhado dos factos suscetíveis de o integrarem”.
Como se concluiu no Acórdão que acompanhamos “sendo incluída, em sede de decisão sobre a matéria de facto, a afirmação de uma dada conclusão jurídica sem que se julguem como provados factos concretos que a integrem, não se poderá fazer uso do remédio previsto no nº 4 do antigo art. ...46... – desaparecido que está da nossa ordem jurídica –, mas haverá lugar à constatação de que a matéria de facto apurada não suporta essa conclusão jurídica, que, por isso, não será vinculativa para a decisão de mérito a proferir; na verdade, um erro do tribunal com esse conteúdo não pode suprir o facto em falta”.
Daqui resulta que, se este Tribunal entendesse que a matéria considerada provada não encerrava qualquer facto concreto, sempre teríamos de verificar se a prova produzida permitiria que fosse afirmado o facto concreto subjacente a tal conclusão.
O que está dado como provado no ponto 24 da decisão encerra uma apreciação de facto sobre a capacidade da mãe do BB de assumir responsabilidades parentais, considerando que nestes autos se discute, desde o início, se a mesma tem ou não tal capacidade, colocada em causa pelo recorrente, considerando o quadro existente de doença psiquiátrica daquela.
Aliás, o recorrente pugna precisamente no sentido de Tribunal dar como provado que a mãe do BB estava numa situação de incapacidade (facto 43 que se pretende seja aditado), sendo manifestamente contraditório que alegue que o Tribunal não possa considerar demonstrada a situação de capacidade, por entender estar em causa matéria conclusiva e, pretenda algumas conclusões abaixo na sua apelação, que se considere provada a alegação que traduz precisamente o seu contrário.
Assim, ou existem elementos probatórios que nos permitam excluir tal capacidade, ou esta não pode deixar de ser afirmada. E, aqui, apreciando a questão suscitada pelo recorrente, para além do que consta dos requerimentos ou articulados que apresentou, não existe qualquer elemento probatório que permita duvidar de tal capacidade e muito menos exclui-la.
A desvalorização que é agora proposta pelo recorrente relativamente ao depoimento do psiquiatra que acompanha a mãe do menor (e que foi por si mencionado no art.º 12.º do seu pedido de alteração das responsabilidades) não é sequer séria quando, logo a seguir, se utilizam essas mesmas declarações para pretender concluir que o facto de não ser encontrada psicopatologia não significa que esta não exista.
Aliás, o depoimento dos psiquiatras ouvidos está em sintonia com o resultado da perícia que foi realizada e que pretendia, como consta da enunciação do seu objeto, no que aos pais se refere, “proceder à avaliação psicológica de ambos e elaborar relatórios psicológicos sobre as partes, bem como a sua adequação para a parentalidade, se alguma delas sofre de psicopatologia impeditiva de um cabal exercício das mesmas, qual a estrutura das personalidades no que à parentalidade importar”.
O que é dito em relação à sentença proferida e à forma diferenciada como foi considerado o relatório elaborado pela psicóloga II e o depoimento prestado pelo psiquiatra, ambos prestadores de serviços a cada um dos progenitores, não se adequa ao que naquela foi declarado.
Com efeito, o que na sentença se referiu é que aquele relatório da psicóloga II não seria considerado na parte em que não foi corroborado pela perícia realizada – precisamente na especialidade de psicologia –, tendo em consideração aquela natureza de prestação de serviços, mas também as declarações feitas em relação a quem não foi objeto de qualquer avaliação.
Aliás, tendo o Tribunal entendido como necessária a realização da perícia, por organismo independente e que ouviu todos os envolvidos, dificilmente se admitiria que as suas conclusões pudessem ser afastadas pela declaração emitida pela Drª II.
Entendemos assim que dever manter-se como provado o facto 24, pois que os depoimentos das testemunhas psiquiatras citados pelo recorrente e a prova pericial realizada permitem que se considere demonstrada a referida factualidade.
Quanto aos factos que foram considerados não provados, entende o recorrente que devem considerar-se provados os seguintes factos:
- que a requerida enquanto viveu com o requerente tivesse tido vários comportamentos errantes/desviantes (facto a aditar com o nº 41);
- que o pai, desde o nascimento do BB, é quem cuida do menor, que fosse (é) a sua figura de referência (facto a aditar com o nº42);
- que a mãe do BB, devido a depressão, ansiedade, e toma de medicação, estava numa situação de incapacidade (facto a aditar com o nº43);
- que ao longo dos 6 anos de vida do BB, o pai foi sempre a figura de continuidade, a constante na vida do BB (facto a aditar com o nº44);
- que o facto de o BB estar a residir com o Pai é o que lhe tem dado estabilidade, segurança e confiança (facto a aditar com o nº45);
- que desde que o pai tem o BB à sua guarda, o BB não foi privado do contacto com a mãe (facto a aditar com o nº46);
- que a mãe do BB não contribui para a sua estabilidade emocional, antes pelo contrário, é através da ameaça de males, ataques ao pai e família paterna que estabelece o relacionamento com o BB (facto a aditar com o nº47);
- que a mãe diz ao BB para mentir ao pai (facto a aditar com o nº48);
- que o pai não diz ao BB para mentir a mãe (facto a aditar com o nº49);
- que um dos receios do BB quando está com a mãe é o de ficar proibido de ver o pai (facto a aditar com o nº50);
- que a mãe diz ao BB para dizer que não gosta de estar em ... (facto a aditar com o nº51);
- que a mãe, e a família materna falam mal do pai (facto a aditar com o nº52);
- que, nas palavras do BB, dizem que o pai é burro ((facto a aditar com o nº53);
- que a atuação da mãe do BB em relação a família do pai é destrutiva (facto a aditar com o nº54);
- que o menor na casa da mãe tinha uns aviões em miniatura, de coleção, que seriam do pai e do tio OO e que a mãe a frente do BB partiu “por querer” as hélices do avião e não pediu desculpa – palavras do BB (facto a aditar com o nº55);
- que outro exemplo passou-se com um casaco vermelho oferecido pelo tio OO, que a mãe terá furado à frente do BB (facto a aditar com o nº56);
- que, também nas palavras do BB, o pai e a família do pais não dizem coisas más da mãe (facto a aditar com o nº57)
- que o BB com frequência usa a expressão “a mãe chateia-me a cabeça”, entre outras situações quando diz ao BB que vai ficar com ela para sempre (facto a aditar com o nº58);
- que a mãe diz também ao BB para não gostar e não ir; i) ao Karaté, ii) a natação, iii) a psicóloga, iv) à escola (facto a aditar com o nº59);
- que a mãe impede o BB de participar em atividades escolares e lúdicas, essenciais para o seu desenvolvimento social, por coincidirem com períodos em que o menor estará com ela, mesmo tendo o pai proposto compensar esses dias (facto a aditar com o nº60);
- que, perante o descrito, o pai assegura que o BB tenha apoio psicológico, o BB tem estado a ser seguido pela Neuropsicóloga, Dra. II, membro efetivo da ... (facto a aditar com o nº61);
- que, por achar que o BB estava em perigo, em 03 de Agosto de 2022, no cumprimento do seu dever enquanto psicóloga, fez um pedido de sinalização junto da CPCJ de ... (facto a aditar com o nº62).
Uma primeira nota nos merece esta impugnação da decisão sobre a matéria de facto. Muitos dos factos que o recorrente pretende sejam aditados resultam exclusivamente das declarações prestadas pelo menor (o que comprova de forma inequívoca o que supra se referiu no sentido de ter o mesmo sido ouvido nestes autos, embora através das declarações prestadas no processo crime).
Ora, como se disse, o Tribunal viu e ouviu com atenção os três vídeos que constam dos autos.
É impossível não nos comovermos com a situação do menor, colocado na ingrata situação de falar com estranhos sobre as suas emoções.
Vimos um menino de seis anos de idade, irrequieto, sem conseguir estar quieto na sua cadeira, que, questionado sobre com quem vivia respondeu claramente que “para já” vivia com o pai, exprimindo, quando questionado diretamente se queria ficar com a mãe, que se estivesse com o pai ele ia deixar ver a mãe, se eu estiver com a mãe ela não vai deixar ver o pai (“nem dois dias, nem nada”).
Afirmou não ter medo de nenhum deles, nem do pai, nem da mãe, sendo muito claro que não quer ficar sem ver o pai, e que este é afinal o seu maior receio.
Não sabemos se os pais já viram esse registo vídeo, mas aconselha-se que seja feito tal visionamento, numa perspetiva de perceberem como tudo o que fazem pode refletir-se no comportamento do filho que ambos amam.
Nas suas declarações, o menor, que tinha então apenas seis anos de idade, e sobretudo nos seus silêncios e nas frases que mais foi repetindo, como “a mãe chateia-me”, “eu não gosto que digam mal do pai”, a forma como explicou porque chorava quando passava da mãe para o pai, “porque queria ficar mais um bocadinho com a mãe”, “passear com ela” e que era por isso que ficava triste e chorava, não nos permitem ter por certo que o que refere é espontâneo e corresponde ao que efetivamente aconteceu.
Mesmo nas alegações de recurso, em alguns dos factos enumerados, o que se pretende que se dê como provado é apenas o que diz o BB que acontece (“nas palavras do BB”).
Se o Tribunal não tem dúvidas que o BB disse o que se alega que disse (porque viu e ouviu os vídeos juntos aos autos), não tem por certo se o que foi dito corresponde ao que efetivamente aconteceu ou é a sua perceção (induzida ou não) do que deve dizer para, como manifestou ser o seu único receio, não ficar sem ver o pai.
E, note-se, que o problema que verbalizou de ficar com a mãe era precisamente este, o de deixar de ver o pai.
Não vemos como, do contexto dos autos, em que o menor reside com o pai em exclusivo desde o início de 2021, tendo estado, na sequência da decisão proferida nestes autos, meses sem ver a mãe e tendo-a visto de forma supervisionada durante outros tantos, estando com esta desde então num regime de visitas e de férias, este receio seja real e lhe possa ter sido transmitido pela mãe.
 Refere-se no relatório pericial “estes comportamentos (de conflituosidade dos progenitores) e atitudes retiram espaço à criança para formular juízos independentes, quanto à sua emotividade e relacionamento com cada um dos pais. De facto, foi já patente na criança a vivência de um conflito de lealdade, tal como supramencionado. Este conflito de lealdade parece ultrapassar a esfera dos progenitores e englobar também outros elementos da família, tendo sido visível aquando da sessão de interação da criança em cada um dos progenitores. Tendo CC e QQ vindo acompanhados pelas respetivas mães, quando o BB se apercebeu que ambas as avós estariam presentes e aquando da presença destas na sala de espera após o término da sessão, mostrou-se bastante ambivalente”, “pouco espontâneo e muito ponderado nas suas atitudes”.
Veja-se o teor das suas declarações relativas aos incidentes com o casaco do tio e sobretudo com os aviões. Tendo o BB relatado o que é referido pelo progenitor nas suas alegações de recurso, foi claro que entendia que a mãe fez de propósito porque não pediu desculpa, não sendo capaz de explicar porque teria feito o que fez, mas apenas que se não pediu desculpa é porque foi de propósito, sendo que, em relação ao casaco, referiu que a mãe fez uns furos, e que assim já não podia andar com ele, sem qualquer outro contexto que não fosse indicar que fez uns furos no casaco com um alfinete.
A própria Drª II escreveu em documento que consta do processo de promoção e proteção de menores, apenso A, com carimbo de entrada de 03/08 que “ressalvo que esta é a perceção do menor. Se está correta ou não, pouco interessa, porque é construída nas vivências de cada agregado familiar”.
O Tribunal entende assim, como claro, perante o depoimento prestado pelo menor, então de apenas seis anos, que o mesmo não é suficiente para que se considerem provados os factos indicados e que se baseiam, apenas, nesse meio de prova.
Estão nesta situação os factos que se pretendia considerar como provados com os números 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58 e 59.
No que se refere ao facto relativo à incapacidade da progenitora, o Tribunal afirmou já porque considera provada a sua capacidade, razão pela qual, porque contrário a esta, deve este (o da incapacidade) manter-se como não provado (facto que se pretendia fosse aditado como ponto 43).
Vejamos assim cada um dos demais.
Requer o recorrente que seja considerado provado que a requerida enquanto viveu com o requerente teve vários comportamentos errantes/desviantes, sob o ponto 41.
“Errante e desviante” é uma caracterização que pode ser dada a um concreto comportamento que tem, para que possa ser qualificado como tal, de ser descrito.
Esta afirmação é, por isso, claramente conclusiva.
O que pode e deve dar-se como provado é o facto que, não tendo sido diretamente alegado pelo pai do menor (veja-se art.º 9º das suas alegações apresentadas nos termos do art.º 39.º, n.º4, do RGPTC), foi por ele pressuposto quando afirmou tal conclusão.
Assim, com base no documento junto aos autos a fls. 74 e que reflete o auto de notícia do processo 522/18...., pode efetivamente dar-se como provado que, em 04/09/2018, quando a GNR se deslocou à casa onde residia a mãe do menor, esta se apresentou totalmente despida, acabada de sair do banho e que após alguma insistência cobriu-se com uma toalha, encontrando-se emocionalmente debilitada, não mantendo um discurso coerente.
Este facto será aditado com o nº 41.
Entende ainda o recorrente que deve dar-se como provado que é o pai, desde o nascimento do BB, quem cuida do menor e que foi e é a sua figura de referência (facto 42).
Invoca para este efeito as declarações da avó paterna do BB e uma situação relacionada com a visita efetuada pela autoridade policial em que, posteriormente, foi agendado um encontro para que a mãe se despedisse do BB, tendo-se deslocado para Guimarães e ficando, então, o BB com o pai.
Este episódio, documentado nos autos por referência a fls. 74, reporta-se a 04/09/2018 e, assim, é anterior quer ao acordo que estes fizeram de partilha das responsabilidades parentais que aqui pretendem alterar, quer à sua reconciliação.
Não permite, por isso, que se dê como provado que é o pai, desde o nascimento do BB quem cuida do menor e que fosse a sua figura de referência. O que está já provado, porque resulta dos factos 13.º a 21.º é o papel que assume desde ../../2021, e apenas este, sendo que as declarações da avó do menor reproduzidas reportam-se necessariamente ao período em que o BB estava já aos cuidados do pai, quando se refere a algo que fez antes e o entregar à mãe.
Ouvidas as declarações da mãe do menor – que, nessa parte não foram contestadas pelo pai, que corrigiu parte delas quanto à duração do período de convivência em comum – esta afirmou ter estado sem trabalhar após o nascimento do BB, pois que o mesmo nasceu com alguns problemas de saúde – teria tido um AVC -, sendo que, pelo menos nesse período, era certamente também a mãe a dele cuidar.
Se é certo que, no episódio relatado de 04/09/2018, a mãe se ausentou para Guimarães, tendo deixado o BB com o pai, não sabendo nós por quanto tempo, mas apenas que em novembro de 2018 estavam já a acordar num regime de guarda partilhada que durou até à sua reconciliação (em outubro de 2019) daqui não se retira que, desde que nasceu, foi apenas o pai que dele cuidou e foi a figura de referência.
O que sabemos é, apenas, o que resultou provado e relativo ao período posterior a janeiro de 2021, mais concretamente 18, após ter sido confiada ao pai a guarda do BB.
Não existe assim qualquer contradição entre considerar este facto como não provado – com referência a toda a vida do BB – e o que se deu como provado e que, a partir de 18/01/2021, é inequívoco.
Mantém-se assim como não provado o facto em causa.
Pretende ainda o pai do BB que se dê como provado que ao longo dos seis anos de vida do BB, o pai foi sempre a figura de continuidade, a constante na vida do BB (facto a aditar com o nº44).
Entende o recorrente que este facto é manifesto, porque o pai esteve sempre presente na vida do BB.
É um facto que o pai se manteve a viver com o BB durante os seus seis anos de vida, ressalvado o período em que esteve em vigor o regime de responsabilidades parentais partilhadas que ambas as partes aceitaram e que vigorou até que se reconciliaram.
Considerando a homologação do acordo a que as partes chegaram no primeiro processo de atribuição das responsabilidades parentais e as decisões proferidas nestes autos e nos seus apensos, resulta claro que ao longo dos sete primeiros anos de vida do BB (que este concluiu após as alegações apresentadas pelo pai do BB), o pai foi sempre figura de continuidade e constante na vida do BB. Este facto, com esta redação, que a explicita, será assim aditado como facto 42.
Pretende ainda o recorrente que o Tribunal considere provado que o facto de o BB estar a residir com o pai é o que lhe tem dado estabilidade, segurança e confiança (facto a aditar com o nº45).
Indica como meios de prova as perícias realizadas, entendendo que o Tribunal desvalorizou o acompanhamento psicológico que lhe foi proporcionado pelo pai e o mesmo depoimento da avó paterna já anteriormente citado e que demonstra que o pai providencia pelas suas idas ao médico e trata de forma cuidada da sua alimentação.
Quem lê os relatórios elaborados (todos, incluindo os da psicóloga que acompanha o BB), em particular o que consta já dos factos provados, a última conclusão que extrai é que o BB é uma criança estável, segura e confiante e, como tal, não pode dar como provado que é o pai, a quem está confiada a sua guarda desde ../../2021, que lhe proporciona estabilidade, segurança e confiança.
É de facto um ótimo aluno. Mas não é uma criança estável, segura e confiante.
Mantém-se assim como não provado o facto em causa.
Pretende ainda o recorrente que se dê como provado que desde que tem o BB à sua guarda, este nunca foi privado do contacto com a mãe (facto a aditar com o nº46).
Na sentença proferida faz-se referência ao sistema de alarme que toca quando são horas de terminar a chamada diária que o BB mantém com mãe.
Alega o recorrente que as testemunhas ouvidas não o referiram. Mas admite que tem um lembrete no telemóvel que toca às 20.00 horas, independentemente de estar com o BB ou não, ou de este estar ou não a falar com a mãe. Foi de facto o que disse o pai do BB.
Voltaremos a esta questão mais tarde.
Certo é que todos os atos praticados pelo pai do BB, todos sem exceção, foram no sentido de limitar esses contatos, reduzi-los a uma visita vigiada em local neutro, quando é inequívoco o vínculo que existe entre mãe e filho e que as suas declarações evidenciam.
No contexto destes autos, e com a prova que foi produzida, não pode o Tribunal afirmar positivamente que o pai não privou o BB do contacto com a mãe desde que lhe foi atribuída a guarda do menor, apenas porque não existiram incidentes de incumprimento.
Mantém-se assim o facto como não provado.
Alega ainda que deve dar-se como provado que a mãe do BB não contribui para a sua estabilidade emocional, antes pelo contrário, é através da ameaça de males, ataques ao pai e família paterna que estabelece o relacionamento com o BB (facto a aditar com o nº47).
Mais uma vez, o recorrente faz assentar a prova deste facto das declarações do BB, que dissemos já porque não podem sem valoradas, e na perícia realizada, fazendo uma citação que consta de um dos relatórios.
Essa citação consta como provada, na íntegra, no facto 32 e está, por isso, ela própria demonstrada. O que não está é a conclusão que o recorrente pretende extrair da mesma em que assume como verdadeiras afirmações do BB e outras que foram afirmadas pelo recorrente e que não foram confirmadas por outros meios de prova (ameaça de males).
Mantém-se assim o facto dado como não provado.
Pretende ainda o recorrente que se considere provado que a mãe impede o BB de participar em atividades escolares e lúdicas, essenciais para o seu desenvolvimento social, por coincidirem com períodos em que o menor estará com ela, mesmo tendo o pai proposto compensar esses dias (facto a aditar com o nº60).
O que está alegado é uma generalização de comportamento que não resulta minimamente demonstrado com o exemplo a que se refere a troca e mensagens junta.
O que está em causa é um exame de karaté. A mãe não acedeu em trocar o dia em que estaria com o BB para que este fosse fazer o exame, como sugerido pelo seu treinador, que, segundo o pai, o deixaria feliz.
Aconselha-se a leitura atenta dos emails juntos pelo pai:
- em 24/05, o pai informa que o BB tem exame a 26/06, sem mais requerer.
- a mãe questiona, no mesmo dia, onde será o exame;
- o pai responde que costuma ser no ... e que quando tiver essa informação a dará;
 - de seguida segue-se uma troca de emails entre os progenitores sobre uma outra troca de fins de semana, sugerida pela mãe do menor, considerando a existência de casamentos numa família e na outra, uma visita de escola, que não obteve a concordância do pai do BB (fls. 706); aliás, a solução deste era a de que a mãe fosse passar uns dias a ... para evitar mais uma viagem do menor.
- seguem-se depois os emails apenas relacionados com o exame de karaté.
Ou seja, nada cedendo o pai do BB, que se refere ao casamento da família da mãe como o “suposto” casamento, espera-se que esta, que priva com o filho de 15 em 15 dias, se preocupe com o exame de karaté a que o pai se refere nas suas missivas e que se retire desta concreta situação, com estes exatos contornos, que a mãe impede o BB de participar em atividades lúdicas essenciais para o seu desenvolvimento. Este único exemplo não comprova o que se alega.
O facto terá naturalmente que manter-se como não provado.
 Alega ainda o recorrente que deverá considerar como provado que, perante o descrito, o pai assegura que o BB tenha apoio psicológico, o BB tem estado a ser seguido pela Neuropsicóloga, Dra. II, membro efetivo da ... (facto a aditar com o nº61),
O que estava antes descrito não resultou provado, como vimos. E que o BB tem apoio psicológico, assegurado pelo pai, que tinha a sua guarda provisória, resulta claro do facto 20º que foi dado como provado. É o que se retira da leitura deste facto juntamente com o 21º onde se escreveu, “o pai tem também assegurado” as demais consultas de especialidade.
Daqui resulta que o que se pretende seja aditado à matéria de facto provada nada acrescenta ao que resulta já provado, não existindo qualquer contradição entre a fundamentação desta sentença e os factos provados, designadamente o facto 20º, que considera as consultas do BB relevantes.
Que as consultas são relevantes resulta inequívoco das perícias realizadas. Que possam extrair-se da posição assumida pela psicóloga conclusões diferentes daquelas que se retiram daquela prova pericial é que foi rejeitado pelo Tribunal a quo, entendimento que é sufragado por este Tribunal de recurso.
Alega, por último o recorrente que deve ser dado como provado que, por achar que o BB estava em perigo, em 03 de agosto de 2022, no cumprimento do seu dever enquanto psicóloga, esta fez um pedido de sinalização junto da CPCJ de ... (facto a aditar com o nº62).
A psicóloga em causa remeteu à comissão de proteção de menores de ... email de 03/08/2022 que foi por esta comissão remetido ao apenso A destes autos, onde deu entrada em 09/08/2022, tendo sido considerado na decisão aí proferida em 20/09/2022, como dela expressamente se retira.
Não é um pedido de sinalização. É uma declaração no sentido de ser dada continuidade à intervenção psicológica até conclusão do processo judicial e até os progenitores conseguirem desenvolver ambientes harmoniosos e comunicação assertiva entre ambos e para com o filho, para um ajustado desenvolvimento bi-psico-social do menor, solicitando ajuda e orientação na sinalização do menor (são estas as expressões da missiva).
Assim, não pode deixar de manter-se como não provado o facto alegado.

V -  Reapreciação de direito:

1 - Os factos a considerar são os que acima foram dados como provados e os que aqui se acrescentam:
41 - Em 04/09/2018, quando a GNR se deslocou à casa onde residia a mãe do menor, esta se apresentou totalmente despida, acabada de sair do banho e que após alguma insistência cobriu-se com uma toalha, encontrando-se emocionalmente debilitada, não mantendo um discurso coerente.
42 - Considerando a homologação do acordo a que as partes chegaram no primeiro processo de atribuição das responsabilidades parentais e as decisões proferidas nestes autos e nos seus apensos, ao longo dos sete primeiros anos de vida do BB, o pai foi sempre figura de continuidade e constante na vida do BB

2 – Como acima de referiu, reconhecendo-se a existência de duas nulidades na sentença proferida no que se reporta à decisão relativa à atribuição exclusivamente à mãe do BB das responsabilidades parentais em matérias de particular relevância e ao valor da prestação de alimentos que foi definido, apenas faz sentido aprecia-las se este Tribunal de recurso entender que se mantém a guarda do menor aos cuidados da mãe.
Se assim não for, terá o Tribunal de apreciar essas decisões, partindo do pressuposto contrário que é a atribuição da guarda ao pai, sendo então necessário verificar se deve este assumir, sozinho, tais responsabilidades parentais ou em conjunto com a mãe e qual a prestação de alimentos que sereia devia, neste caso, pela mãe do menor.

2.1. No essencial, a discordância fundamental da apelação é a decisão de confiar à mãe a guarda e cuidados do BB, entendendo o recorrente que BB deve ficar confiado à sua guarda e cuidados.
Citando Acórdão deste Tribunal da Relação de Guimarães de 07/12/2019, da Juiz Desembargadora Eugénia Cunha, proc. 784/18.0T8FAF-B.G1,:
Decorre de imposição constitucional, enunciada em vários preceitos, entre eles o art. 69º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, que consagra que “as crianças têm direito a proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições”, que o critério norteador que deve presidir a toda e qualquer decisão do tribunal em matéria de regulação de responsabilidades parentais é o interesse superior da criança, critério este que deve estar acima dos direitos e interesses dos pais quando estes sejam conflituantes com os daquela.
Também da lei ordinária, no seguimento do constitucionalmente consagrado - v. art. 1878º, n.º 1, do Código Civil, abreviadamente, - estabelece que o poder paternal é um poder-dever dos pais funcionalizado pelo interesse dos filhos, competindo aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros e administrar os seus bens, tendo de o exercer, altruisticamente, ao interesse da criança.
Nos diversos casos de rutura da relação entre os progenitores, a lei estabelece – cfr. art. 1906º, do CC - a regra do exercício conjunto das responsabilidades parentais quanto às questões de particular importância.
Somente em casos excecionais, e mediante decisão fundamentada, poderá esta regra ser afastada pelo tribunal, face à conclusão, não meramente de que a mesma não é adequada, mas que se revela contrária aos interesses do menor (juízo conclusivo que pode advir de fatores de diversa etiologia)”.
Devendo ter-se em atenção que, existindo uma situação de união de facto que cessou, a aplicação destas normas à situação em apreço decorre do disposto no art.º 1911.º do C. Civil, continua o Acórdão citado.
O nº7, do artigo 1906º, determina que, no exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento, o tribunal decidirá sempre de harmonia com os interesses do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreça, amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles.
Este tipo de processo é de jurisdição voluntária, pelo que nele o julgador não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo, antes, adotar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna, no exercício do poder-dever a que se encontra adstrito, (art. 12º, do RGPTC e 987º, do CPC) efetuando as diligências de averiguação e de instrução necessárias à prolação mais adequada ao caso concreto.
Dúvidas não existem de que o critério orientador e que terá necessariamente de presidir à decisão do tribunal é o interesse superior da criança e não os dos progenitores, o qual apenas terá e deverá ser considerado, até por imposição constitucional (arts. 36º, n.ºs 3 a 6, 67º, 68º e 69º da CRP), na medida em que se mostrem conformes ao interesse superior da criança, não colocando em crise esse interesse.
A Jurisprudência dos Tribunais, designadamente a do STJ, vai no sentido de, “por mais que aceitemos a existência de um “direito subjetivo” dos pais a terem os filhos consigo, é no entanto o denominado “interesse superior da criança” - conceito abstrato a preencher face a cada caso concreto – que deve estar acima de tudo. Se esse “interesse subjetivo” dos pais não coincide com o “interesse superior do menor” não há outro remédio senão seguir este último interesse”. 
A lei não define o que deve entender-se por “interesse superior da criança”, estando-se na presença de um conceito aberto, a concretizar atentando nas necessidades físicas, intelectuais, religiosas e materiais da criança, na sua idade, sexo, grau de desenvolvimento físico e psíquico, na continuidade das relações daquela, a sua adaptação ao ambiente escolar e familiar, bem como as relações que vai estabelecendo com a comunidade em que se integra.
Assente que está qual o superior interesse que deve presidir à decisão do tribunal e que, em caso de incompatibilidade entre os direitos e os interesses dos progenitores e os da criança, é o interesse desta última que há-de impreterivelmente prevalecer, cumpre apreciar qual o melhor regime das responsabilidades parentais para a criança, que satisfaça de modo mais eficaz esse seu interesse.
E, para além da decisão quanto ao exercício das responsabilidades parentais em questões importantes para o menor, há que estabelecer a residência do filho.
Face à lei vigente, e embora a questão continue a ser muito discutida e, até, com entendimentos dispares, quer na doutrina quer na jurisprudência, verifica-se como possibilidades, quanto a tal, de a residência habitual ser com um dos progenitores, com um terceiro ou, ainda, por períodos alternados com um e outro dos progenitores (residência alternada).
A fixação da residência do filho reveste-se de primordial importância, constituindo o elemento determinante do regime de exercício das responsabilidades parentais, uma vez que cabe ao progenitor com quem o filho resida habitualmente o exercício de tais responsabilidades quanto aos atos da vida corrente, competindo a cada um dos progenitores, pelo período em que o filho consigo resida, nos casos de residência alternada.
Quanto à determinação da residência da criança, deve continuar a entender-se que deverá residir com o progenitor que seja a principal referência afetiva e securizante da criança, aquela com quem mantém uma relação de maior proximidade, aquele que no dia-a-dia, enquanto os pais viviam juntos, lhe prestava os cuidados, ao progenitor que se mostre mais capaz de lhe garantir um adequado desenvolvimento físico e psíquico, a sua segurança e saúde, a formação da sua personalidade, a sua educação, o seu bem-estar, o seu desenvolvimento integral e harmonioso, em clima de tranquilidade, atenção e afeto, como tem vindo a ser entendido pela jurisprudência e doutrina, no respeito pelo superior interesse da criança e sem abdicar do princípio da igualdade entre os progenitores.

Assim, os princípios basilares a observar, no que respeita à determinação da residência são:
- o superior interesse da criança;
- a igualdade entre os progenitores;
- e a disponibilidade manifestada por cada um dos progenitores para promover relações habituais do filho com o outro progenitor, prevalecendo, contudo, sempre, o primeiro.

Entendemos que, não o desaconselhando os outros dois princípios, o regime da residência alternada é o regime de regulação do exercício do poder paternal mais conforme ao interesse da criança porque lhe possibilita contactos em igual proporção com o pai, a mãe e respetivas famílias.
Não se deve exagerar o facto de a mudança de residência criar instabilidade e, por isso, representar inconveniente para a criança, pois que a instabilidade é uma realidade na vida de uma criança com pais separados, que, sempre, terão de se integrar em duas residências, sendo essa mais uma adaptação a fazer nas suas vidas, sendo certo que as crianças são dotadas de grande aptidão para se integrarem em situações novas” (citação integral, excluindo as citações do próprio Acórdão, para as quais se aconselha a leitura da sua redação publicada).
Concorda-se na íntegra com esta fundamentação doutrinal e jurisprudencial, reportada ao interesse que cumpre prosseguir ao proferir-se decisão no âmbito das responsabilidades parentais e em particular numa situação em que os pais residem longe um do outro, tornando inexequível, porque desconforme ao interesse do BB, uma guarda partilhada que implicaria sempre a frequência de dois diferentes estabelecimentos de ensino.
Este Tribunal de recurso percebe a indignação do pai do BB e a sua vontade em manter a situação existente e que resulta das decisões provisórias que foram sendo proferidas nestes autos, sendo que, a partir de determinado momento, foi entendido que nenhum risco representava a mãe para a criança, havendo apenas que regular os termos em que o menor viveria com um progenitor e visitaria o outro, considerando que a sua residência é de tal forma distante que impossibilita que se estabeleça um regime de guarda partilhada.
O recorrente pai não aceita que a mãe tenha quaisquer competências parentais e, volvidos então quase três anos de manter em exclusivo a guarda do menor, continuava a entender que ao menor deveria ser permitido apenas ver a mãe, sem pernoita, de forma supervisionada (ver o conteúdo das suas alegações, apresentadas nos termos do art.º 39.º, n.º4, do RGPTC).
É que o que está em causa não são os direitos da mãe ou do pai, mas os do BB, como acima se evidenciou na citação efetuada, que tem o direito de privar com cada um dos seus progenitores todo o tempo que seja possível e do modo mais igualitário possível.
Como se disse já, o Tribunal ouviu o BB nas declarações prestadas para memória futura e no âmbito da perícia realizada.
Retira-se com clareza dessas declarações, sobretudo das primeiras, que o BB gosta de viver com o pai, que é, fruto do acordo alcançado no primeiro processo de atribuição das responsabilidades parentais e destes autos, a presença constante na sua vida.
É também claro que tal não está relacionado com o local onde cada um dos progenitores vive, porque o BB gosta de Guimarães e de ..., percebendo-se que sabia que a decisão de saber com quem ia ficar viver ainda não era definitiva (“para já” vivia com o pai).
O que as suas declarações evidenciam é que o único medo que tem é o de ficar sem ver o pai. É este o seu receio, no contexto deste processo.
O BB não esteve com o pai cerca de um mês e alguns dias até à execução da primeira decisão proferida nestes autos (de 15/12/2020 a 17/01/2021).
Desde ../../2021 não pôde estar com a mãe até à execução da decisão do Acórdão proferida no apenso A (promoção e proteção), de 04/03/2021, e, assim, apenas a partir de 24/04/2021, passou a existir uma visita semanal em local neutro com a mãe, supervisionada, que se manteve até às férias de 2021. Até 24/04 contactava-a por vídeo-chamada)
Ou seja, foi com a mãe que o menor esteve privado de relacionar-se por mais tempo, mas é em relação ao pai que tem receio de deixar de o poder ver.
Este receio não é, no contexto destes autos, fundado.
Como deveriam ambos os progenitores ter explicado ao filho, ele tem pai e mãe e, como tal, a atribuição da confiança a qualquer um deles não impede o BB de estar com o outro o máximo de tempo possível.
É esta afirmação positiva que se impõe seja feita sempre que o mesmo verbalize o receio de deixar de ver um dos seus progenitores.
Ambos os progenitores têm, na situação em apreço, competências parentais.
O que se assinalou na decisão proferida é a maior flexibilidade da mãe para se adaptar, mesmo quando a situação evoluiu e as decisões proferidas em relação ao BB lhe foram sendo desfavoráveis.
Não é uma questão de parcialidade, como se refere nas alegações da apelação.
É a realidade. E é o interesse do BB que o justifica.
Quando, em janeiro de 2021, e tendo tomado a errada decisão de trazer o BB para aquela que foi a área de residência do casal quando o BB nasceu, e onde se encontra a sua família de origem, foi confrontada com a decisão provisória do Tribunal que ordenou a sua entrega ao pai, e reagiu como era exigível para proteger o BB, como demonstra o auto então elaborado.
Daí que não faça sentido que o recorrente se reporte “à validação da subtração ilícita do BB”, sendo certo que o Tribunal de recurso, ao considerar competente o Tribunal ... para a tramitação destes autos expressamente entendeu que a conduta da mãe do BB não era de “turismo judicial” como foi então invocado e é agora reiterado nestas alegações de recurso.
Insurge-se o recorrente ainda quanto ao que foi referido pelo Tribunal a quo relativamente ao direito de BB de passar férias de natal com a mãe (e não o contrário, pois que sendo apenas relevante o superior interesse do BB, é no interesse deste e não dos seus progenitores que são definidos estes direitos de visita), num momento em que a mãe avisou que estaria atrasada, estando o pai já no local do encontro.

Vejamos o que aconteceu.
Como refere o pai do BB está em causa o dia 26/12/2021.
Nos fins de semana que a mãe passava com o BB, o horário de entrega era às 16.00 horas de 5ª feira.
O regime para vigorar no Natal ficou definido em 20/10/2021, estabelecendo-se as 12.00 horas do dia 26 como momento de entrega, mantendo-se o BB com a mãe até ao dia ../../2022, até às 12.00 horas, momento para a sua entrega ao pai.
Como evidencia a troca de mensagens, a mãe enganou-se quanto ao horário de entrega e, considerando que seriam as 16.00 horas, avisou o pai que se atrasaria porque tinha um problema no carro quando este, cumprindo o horário estabelecido, já se encontrava no local da troca, ....
O que fez o pai?
Estando o menor inconsolável, segundo alega, entendeu que não era o mais correto sujeitar o BB a esperar pela mãe cinco ou mais horas, dentro do carro ou num centro comercial.
Entende que o Tribunal transformou um ato “ostensivamente negligente” da mãe num “ato rígido e pouco tolerante do pai”.
O que este episódio evidencia é que o pai não pensou no direito do BB de passar as férias de Natal com a mãe e, sobretudo, no que lhe causaria, ao BB, menor transtorno.
Com efeito, perante o engano da mãe quanto à hora da entrega (o ato ostensivamente negligente invocado), a solução de fazer regressar o BB a casa, que foi a opção do pai, se causava transtorno à mãe, pois que a obrigava a deslocar-se à residência do pai para recolher o BB, causava ainda maior transtorno ao BB porque o obrigava a fazer novamente a distância ... / residência do pai, residência do pai / ..., sem qualquer necessidade.
A não ser que o pai estivesse convencido que, não comparecendo à hora marcada, o BB perdia o direito de passar as férias com a mãe, ou pelo menos aquele dia de férias, a sua decisão foi, para o BB inconsolável, a pior possível.
E se esperar era uma solução possível, não se percebe sequer porque não se equacionou trazer o BB a Guimarães, ainda que, para tudo ser absolutamente igualitário, na volta (que existiria) a mãe o levasse a ... e não apenas a ....
E a questão é precisamente esta. Porque estava o BB inconsolável? Porque a mãe não compareceu à hora marcada, confundindo a hora da entrega, estando atrasada cerca de cinco horas, com um problema com o carro para resolver? Ou porque pensou que já não passaria as férias com a mãe?
O que a sentença recorrida refere em relação ao pai é absolutamente legítimo. A decisão tomada foi a pior possível, considerando o único interesse relevante e que era o do BB.
O mesmo acontece em relação ao segundo processo de promoção e proteção que foi intentado.
Mas comecemos pelo primeiro.
O apenso A destes autos iniciou-se com um requerimento do Ministério Público de 19/01/2021, tendo por base comunicações do pai do BB anteriores de 09/12 e referindo uma comunicação do pai do BB de 14/12/2020.
Ou seja, se em 15/12/2020, a mãe vai à escola do BB e trá-lo consigo para Guimarães, em data anterior já o pai do BB se tinha deslocado à comissão de proteção de menores da área da sua residência, alegando então que a mãe do menor o agredira e que representava perigo para este.
Estas queixas não estão demonstradas.
A medida então aplicada de apoio junto do pai foi declarada cessada em 20/09/2022, estando então junto um relatório da psicóloga que acompanhava o menor a solicitar o rápido desfecho do processo judicial em benefício da estabilização da situação do menor (e, aqui, parece-nos que o que estaria em causa era a rápida decisão da questão das responsabilidades parentais). 
Nestes autos de alteração das responsabilidades parentais foi determinada a realização de prova pericial e o seu resultado foi junto aos autos em 01/02/2023.
Perante os relatórios apresentados – e cujo conteúdo, no essencial, consta do elenco dos factos provados – o pai apresentou extensa reclamação, em 16/02/2023, que foi indeferida em 16/03/2023.
O que é que aconteceu então?
Em 16/02/2023 deu entrada no Juízo Competente de ... novo processo de promoção e proteção, intentado pelo Mº Pº, referindo uma sinalização efetuada pelo pai do menor em 07/10/2022, que teria dito que o menor vem muitas vezes das visitas à mãe completamente alterado e muitas vezes a gritar, pedindo uma avaliação psicológica urgente.
Reiterou a necessidade dessa intervenção por email de 27/02/2023.
Ou seja, cerca de 17 dias depois de cessada a intervenção do Tribunal no âmbito do processo de promoção e proteção inicial, e perante o que estava  desenrolar-se nestes autos, estava o pai do BB a contatar novamente a comissão de proteção de menores para relatar comportamentos que entendia serem de violência psicológica perpetrados pela mãe do menor, visando com essa atuação restringir as visitas do menor à mãe, novamente, a contactos supervisionados como sugere no email de 13/03/2023 junto ao apenso D.
Note-se que, pedindo a realização de uma avaliação psicológica urgente, em momento algum referiu então que a mesma estava já em curso nestes nossos autos.
Ou seja, são efetivamente reiteradas as denúncias efetuadas pelo pai do BB, imputando à mãe comportamentos de violência psicológica e até abusos sexuais que não resultam demonstrados e que sucessivamente invoca com o objetivo de limitar os contactos do filho com a mãe, quando é certo que, como resulta do depoimento do BB que tantas vezes invocou, este gosta do pai e da mãe, gosta de estar em ... e em Guimarães, só tendo medo de ficar sem ver o pai.
Foi este sucessivo comportamento do pai que fez pender a balança para a mãe do menor, entendendo-se que esta tem melhores condições para colocar em prática uma ideia essencial para esta criança. Se é certo que apenas a um dos progenitores será atribuída a sua guarda, é preciso assegurar que o BB conviva com ambos, com a maior calma e igualdade possíveis.
Essa calma e igualdade de papéis é absolutamente negada pelo pai do BB.
Não é assim o interesse da mãe do menor que justifica a opção tomada, mas o interesse que existe e que é salientado pelo próprio e pelas perícias realizadas de permitir o seu convívio com ambos os progenitores, com a igualdade possível quando se percebe que a guarda conjunta não é uma possibilidade.
E a sentença proferida não é um castigo, como leu, mas um afirmar que se impunha que tivesse tido outro comportamento quando, após ../../2021 ficou com a guarda do filho. E não estão aqui em causa as opiniões que recebeu e se foi ou não bem aconselhado. Estão em causa os atos que praticou e que os requerimentos remetidos aos autos (estes e seus apensos) evidenciam, e que visaram sempre limitar os contactos do menor com a mãe, sempre invocados ao contrário, como negativos contactos da mãe com o menor.
Note-se como, entre as suas alegações de março de 2023 e as que agora apresentou neste recurso, já o pai do BB defende que se a guarda lhe for atribuída as responsabilidades parentais em matérias de particular importância devem ser asseguradas por ambos e que as visitas do BB à mãe se mantenham como estão, ou seja, sem supervisão e com pernoita.
Só agora, após a decisão proferida, se colocou no lugar do progenitor a quem a guarda não é atribuída.
E se é certo que o que a mãe fez, em dezembro de 2020, foi incorreto, como incorreto foi a atitude de quem impediu o pai do menor de o ver no dia 31/12/2020 (episódio referido nas alegações de recurso e que está documentado nos autos), justificando a instituição de um regime provisório de entrega do menor aos cuidados do pai, desse facto não se retira que o mesmo não possa ser revertido se se entender que a conduta do progenitor, enquanto teve aquela guarda, não foi pautada pelo superior interesse do BB.
É também despropositada a menção de que anda o BB de um lado para o outro como se fosse “uma mercadoria experimental”, quando sabemos, porque o pai nos disse nas suas declarações, que viveram todos em Guimarães até determinado momento, tendo depois, juntos como casal vivido em ..., ..., ... e novamente em ..., sendo que a realidade é esta: o BB tem um dos progenitores a viver em ... e o outro em Guimarães.
O BB não tem de estar em risco com o pai – que não está – para que se altere a decisão provisória dos autos.
O que está aqui em causa é alterar a decisão de responsabilidades parentais que foi alcançada por acordo e homologada aquando da primeira separação dos progenitores, pois que não é já possível a guarda conjunta.
Nesse âmbito, foi proferida decisão provisória que confiou o menor ao pai, com base na conduta da mãe de dezembro de 2020 e na alegação do pai de estar o menor em risco quando estava com a mãe.
Esta situação de risco não se demonstrou.
E, não se demonstrando, não faz sentido afirmar, como faz o pai do BB que, existindo uma decisão provisória, haveria que mantê-la porque não há fundamento para altera-la.
Não se demonstrando a situação de risco, o que há que decidir é a quem deve o BB ser confiado, pois que a guarda partilhada está afastada por via do afastamento geográfico das residências dos progenitores.
E, aqui, pelas razões já expendidas, concorda este Tribunal de recurso com o raciocínio expresso na sentença da 1.ª Instância.
Entende o pai do BB que este tem o direito de se pronunciar sobre a mudança que se opera na sua vida, nas suas rotinas. O BB gosta de viver com o pai e disse-o em ambos os contextos em que foi ouvido.
Com tudo o que evidenciam os relatórios dos autos, o desgaste visível no menor e o conflito de lealdade em que se encontra já, entenderá o pai do BB que faz sentido perguntar-lhe com quem quer ficar a viver, ou seja, se quer ficar a viver com o pai ou com a mãe? Com sete anos de idade? E mais, que possa ser com base nessa resposta que o Tribunal a quo possa tomar uma decisão?
Nem o superior interesse do menor permite que a questão seja assim colocada (como uma escolha), nem poderia tal vontade (com as limitações decorrentes da idade e do conflito que já vivencia) determinar a decisão a proferir sobre a referida guarda.
É também despropositada a referência à inadequação do meio processual utilizado para alterar a residência do menor, pois que seria correta a ação do art.º 4
4.º do RGPTC.
A mãe do menor, tal como o pai, que usou precisamente do mesmo meio processual – a alteração das responsabilidades parentais –, visou alterar o regime da guarda partilhada e é este que, quer este fosse confiado à mãe, quer fosse confiado ao pai, se alteraria por via desta decisão.
O meio processual é, assim, o correto, utilizado por ambas a partes, sendo certo que sempre seria possível fazer uma adequação formal nos autos se não fosse o correto, estando em causa processo de jurisdição voluntária.
Uma última palavra para nos referirmos à questão do “despertador”. Como se disse, o Tribunal ouviu a prova produzida. Ouviu o que foi dito sobre o mesmo e a sua relevância nas conversas mantidas entre a mãe e o filho e o que o pai disse sobre a sua existência, visando avisá-lo que eram horas de o BB jantar, porque este demorava cerca de uma hora a jantar e, se assim não fosse, iria muito tarde para a cama.
Não existe forma de explicar o que não tem explicação. Louva-se que o pai do BB seja uma pessoa organizada e metódica, como demonstra com o calendário que fez juntar aos autos. Louva-se também a necessidade de cumprimento de horários, sendo a disciplina uma regra de ouro para quem educa uma criança.
Não se pode, no entanto, compreender que entenda razoável que o filho esteja ao telefone com a mãe e que, à hora em que tal chamada deveria terminar, comece a tocar um alarme.
Não perceber o alcance deste ato é verdadeiramente eloquente sobre a forma como este pai entendia poder regular o relacionamento do BB com a mãe. Se o pai do BB precisava de ser lembrado que eram horas de dar o jantar ao filho, por todas a razões que invocou, colocava o despertador noutro aparelho, de modo a poder chegar junto do filho e dizer “está na hora do jantar, despede-te da mãe”. O alarme existente no telefone utilizado pelo BB para falar com a mãe é revelador da forma controladora e despropositada com que o pai entendia poder controlar aquele relacionamento e que este Tribunal não pode aceitar.
Mantém-se assim a decisão de 1.ª Instância que confiou o BB à guarda e cuidados da mãe, não tendo os novos factos aditados relevância para que se afaste a fundamentação daquela.

2.2. Aqui chegados, mantendo-se a decisão proferida na parte em que atribui a confiança e guarda do BB à mãe (e não já a sua tutela), cumpre fundamentar os demais segmentos da decisão que supra se reconheceu não estarem fundamentadas (a da atribuição das responsabilidades parentais exclusivamente à mãe e a prestação de alimentos que foi fixada), apreciando se devem ou não manter-se.
2.2.1. No que se reporta às responsabilidades parentais relativas a questões de particular importância, vimos já que a sua atribuição em exclusivo a um dos progenitores da criança tem de ser fundamentada e não o foi.
Como decorre da lei, é o interesse do menor que justifica que tal atribuição seja efetuada apenas a um dos progenitores, devendo fazê-la, fundamentadamente, se o interesse do menor for contrário a essa atribuição conjunta.
Seria muito simples ao Tribunal fundamentar esta atribuição nos mesmos exatos termos em que o pai recorrente fundamentou a sua pretensão no sentido de ser tal guarda atribuída. Como alegou em 27/03/2023, tal atribuição exclusiva justificava-se porque “revela-se muito difícil comunicar e cooperar com a mãe no que respeita a debater e decidir conjuntamente a vida do BB, havendo entre as partes uma relação inquinada pela desconfiança, a qual inviabiliza o exercício conjunto das responsabilidades parentais” – art.º 71º das suas alegações apresentadas nos termos do art.º 39.º, n.º4, do RGPTC.
Tal justificação não colhe.
O BB tem apenas sete anos e, tendo os pais vivido juntos apenas por cerca de três anos, no tempo em que estiveram separados, também por causa das decisões que foram sendo proferidas nestes autos, não existiu ainda um período de serenidade e, sobretudo, de igualdade entre os progenitores que possa levar o Tribunal a concluir, agora, definida que fica a situação do menor, que estes não saberão tomar em conjunto as decisões mais importantes na vida do BB.
Tem, pelo menos, que ser dada oportunidade a ambos de viverem em conjunto estas decisões, só se justificando esta atribuição exclusiva ao progenitor que tem a guarda do menor se aquela atribuição conjunta não funcionar (porque as pessoas não se conseguem entender) ou não for possível por falta de capacidade do outro progenitor para o exercício da parentalidade.
Só então se poderá concluir que a atribuição conjunta destas responsabilidades é contrária ao interesse do menor.
Ora, nenhuma destas situações se pode afirmar agora, na situação do BB, sendo certo que esta decisão, como todas nesta matéria, sempre poderá ser alterada pelo Tribunal, a requerimento das partes ou do Ministério Público, demonstrando-se a impossibilidade prática do seu funcionamento, se tal vier a verificar-se no futuro que não pode, nem deve, por via desta decisão excludente, prevenir-se.
Assim, analisando a questão suscitada por via do recurso, entendemos que não pode manter-se a decisão proferida, pois que não foi apresentado, nem existe, fundamento para excluir o pai do BB da atribuição de responsabilidades parentais em questões de particular relevância e, em consequência, aplica-se o regime regra em que tais competências são atribuídas e exercidas por ambos os progenitores, revogando-se, nessa parte, a decisão proferida.
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2.2.2. Quanto à prestação de alimentos que foi fixada, insurge-se o recorrente quanto à falta de fundamentação do valor definido, alegando que não foram apuradas as necessidades de quem tem de os receber e os rendimentos de quem tem de os prestar.
Como se disse já, inexiste fundamentação jurídica deste segmento da decisão.
É, por outro lado, muito lacónica a matéria de facto relativa a esta questão de natureza patrimonial.
Mas, neste caso, a insuficiência resulta da falta de alegação relevante das partes sobre esta matéria, bastando ler os seus sucessivos requerimentos para perceber que a questão financeira nunca foi abordada com rigor (note-se que, não tendo tal questão sido colocada por qualquer das partes, nunca foram fixados alimentos provisórios, apesar de o BB ter estado sempre a viver com o pai, desde a intervenção do Tribunal).
Dificilmente se podem apurar as necessidades financeiras associadas ao BB ou os rendimentos dos seus progenitores se estes, em particular o que tem a sua guarda no que aos primeiros se reporta, não os alegar.
Daqui não se retira que não se possa saber quais são.
Sabemos que o BB tem consultas de psicologia e que beneficia com a sua existência, que devem assim manter-se.
Sabemos que tem natação, karaté e inglês.
E que tem sete anos de idade.
E, aqui, não podemos deixar de considerar o que foi requerido pelo próprio progenitor (sem qualquer preocupação de fundamentação) que, tendo então o menor à sua guarda, sabendo quais os rendimentos da mãe do menor (pois que não são diferentes daqueles que auferia, como funcionária de organismo público, quando vivia com ele), requereu que fosse fixada na quantia de 150,00 euros a prestação de alimentos que deveria ser suportada pela mãe do BB.
Sendo os rendimentos prediais do pai do BB de valor superior ao dobro daqueles que eram auferidos pela mãe do menor, considerar que esta poderia suportar uma prestação de alimentos de 150,00 euros, significa admitir como justa uma prestação equivalente ao seu dobro, caso a guarda seja entregue à mãe, que é o raciocínio expresso na decisão, ainda que não fundamentado.
Nesta particular questão, anotam-se com particular ênfase as respostas evasivas que o depoente pai deu à Mm.ª Juiz que presidiu à realização da audiência sobre a ausência de quaisquer rendimentos do trabalho, apesar de ter também justificado a existência do despertador para ser lembrado das atividades do BB quando estava a “trabalhar” ou justificado a saída da família da sua residência de Guimarães para poder “trabalhar”, e conste das suas alegações que é um pai “trabalhador”, não sendo provável que se trabalhe sem que tais rendimentos existam.
Anota-se ainda, e por último, que o recorrente, embora invoque a ausência de fundamentação da decisão proferida quanto a alimentos, em momento algum invoca que tal valor é excessivo para as necessidades do BB (que certamente conhece, pois que o teve à sua guarda exclusiva desde ../../2021), ou que não possa pagar tal valor, por não ter rendimentos para tal (pois que conhece também os seus efetivos rendimentos).
Assim, neste contexto, não tem o Tribunal qualquer dúvida em suprir a nulidade cometida pelo Tribunal de 1.ª Instância, e fundamentando a decisão relativa a alimentos, com base no que foi requerido pelo pai quando tinha o BB à sua guarda, e o que resulta provado, mantém os termos da decisão proferida.

Sumário: (ao abrigo do disposto no art.º 663º, n.º 7, do C. P. Civil):

1 – Estando em causa um processo em que se discutem as responsabilidades parentais em relação a um menor de sete anos de idade, residindo cada um dos seus progenitores em local afastado um do outro, impossibilitando que se estabeleça uma guarda partilhada, a criança deverá ser ouvida no contexto da decisão a proferir.
2 – A falta de audição da criança pode ser invocada, pela primeira, em sede de alegações de recurso.
3 – Não existe tal falta de audição se, como no caso em apreço, foi realizada perícia ao menor tendo em vista, precisamente, a elaboração de “mapa afetivo da criança, apurando-se a relação dela com ambos os progenitores, bem como qual deles, se algum, é a figura principal de referência” e o menor foi ouvido em declarações para memória futura em processo crime, estando a gravação em vídeo anexa ao processo, tendo sido tema fulcral dessa inquirição a sua relação com cada um dos seus progenitores.
4 – O Tribunal de recurso deve substituir-se ao Tribunal de 1.º Instância quando inexiste fundamentação para algum dos segmentos decisórios, existindo elementos nos autos que permitam tal fundamentação.
5 – Não sendo possível a atribuição da guarda partilhada, considerando a distância existente entre as residências de cada um dos progenitores, tendo ambos os progenitores competências parentais, o superior interesse da criança pode determinar que o mesmo seja confiado àquele que está em melhores condições para promover a relação do menor com o outro progenitor, ainda que esta seja diferente da decisão provisória proferida nos autos.
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VI – Decisão:

Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e, assim:
a) não admitem a junção dos dois documentos apresentados com as alegações de recurso pelo recorrente;
b) declaram nula a sentença proferida no que se reporta à atribuição apenas à mãe do menor das responsabilidades parentais em questões de particular importância;
c) declaram nula a sentença proferida no que se reporta à obrigação de alimentos que foi fixada;
d) eliminam a referência à palavra tutela que consta da decisão proferida, ficando o segmento decisório com a seguinte redação: “o menor fica confiado aos cuidados e guarda da mãe, fixando residência em Guimarães”;
e) aditam à matéria de facto provada os factos 41 e 42 que acima se referem;
f) suprem a nulidade referida em a) e, fundamentando a decisão, revogam-na, atribuindo a ambos os progenitores as responsabilidades parentais relativas a questões de particular importância;
g) suprem a nulidade referida em b) e fundamentando a decisão proferida, mantêm os termos da prestação de alimentos que foi fixada;
h) no mais, mantêm a decisão proferida, incluindo a atribuição da guarda do menor BB aos cuidados da mãe e o regime de visitas fixado.
Quanto a custas, nos termos do art.º 527.º do C. P. Civil:
I – As custas da ação são devidas por ambos os progenitores, fixando-se a responsabilidade da mãe em 1/5 e do pai em 4/5;
II – Nesta apelação, as custas são devidas também por ambas as partes, sendo da responsabilidade do recorrente em 8/10 e da mãe recorrida em 2/10.
Guimarães, 29 de fevereiro de 2023
(elaborado, revisto e assinado eletronicamente)