Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
704/19.4T8CHV.G1
Relator: FERNANDA PROENÇA FERNANDES
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
REJEIÇÃO DO RECURSO
IMPUGNAÇÃO EM BLOCO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/14/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO DA AUTORA IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. A impugnação da matéria de facto “em bloco” viola o disposto no artigo 640.º do CPC, mormente quando não está em causa um pequeno número de factos ligados entre si e um número reduzido de meios de prova.
II. Estando em disputa a propriedade de uma porção de terreno, a cuja propriedade ambas as partes se arrogam e tendo a autora optado pela acção de reivindicação, sempre teria de alegar e provar a sua posse sobre o objecto da disputa, com as características capazes de transformá-la em direito de propriedade, não bastando fazer apelo à presunção registral.
III. Não se concluindo pela constituição de uma servidão de vistas a favor do prédio da autora, não é possível nessa sequência, concluir que aos réus estava proibida a construção que levaram a efeito, por violação de um direito de servidão de vistas, que inexiste.
IV. Não alegando a autora que ela própria (e não o réu) infringiu o disposto pelo art. 1365º do Cód. Civil, construindo no seu prédio sem que entre a beira do telhado ou da cobertura dessa construção e o prédio vizinho tenha deixado uma distância de pelo menos meio metro e sem que essa construção seja acompanhada de obras que permitam que as águas pluviais provindas do telhado ou da cobertura desse edifício sejam despejadas na sua propriedade, acabando as mesmas por cair gota a gota no prédio vizinho, ou quando recolha essas águas pluviais num local, escoando estas assim recolhidas no prédio vizinho, não pode pretender que declare que se constituiu uma servidão de estilicídio, em benefício do seu prédio (prédio dominante), onerando o prédio do réu (prédio serviente).
Decisão Texto Integral:
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório (feito com base no relatório da sentença apelada).

AA, viúva, com o NIF ...95, com o BI ...14, com residência no ...., ... ..., intentou a presente ação declarativa com processo comum contra BB, com residência no Largo ..., ... ..., formulando a seguinte pretensão:

“I - Nestes termos e nos melhores de direito, requer-se a V.ª Ex.ª que seja reconhecido à autora o direito de propriedade do prédio urbano que identifica e o direito de propriedade do dito espaço de permeio entre os dois prédios, e que o réu seja condenado no reconhecimento deste direito de propriedade, sendo consequentemente, obrigado a demolir e a remover a parte da obra e da sua construção que ocupa e tapa ilegitimamente a área do prédio da autora, restituindo-lhe o mesmo prédio na totalidade da sua área, livre e desocupado de pessoas e coisas, respeitando o direito de propriedade da autora sobre o seu prédio, abstendo-se de o prejudicar, não praticando qualquer ato ou comportamento que impeçam ou dificultem o exercício do direito da autora;
II - Se declare constituída servidão de vistas do prédio da autora sobre o prédio do réu, pela existência de uma varanda e de uma janela identificadas nos artigos 22.º, 36.º e 37.º da petição inicial, assim se condenando o réu, a demolir ou a recuar parte da obra, por modo a que entre esta e o prédio da autora fique um intervalo mínimo de 1,5 metros, destapado, aberto e com luz natural, entre a janela da autora e o prédio do réu, bem como a demolir ou recuar a totalidade da varanda constituída que confina e ocupa parte da fachada do prédio urbano da autora, de tal forma que deixem um espaço livre e desimpedido com a distância não inferior a 1,50 metros do prédio urbano da autora e o réu seja impedido de realizar qualquer obra, levantar edifício ou construção que atente contra a existência da referida servidão;
III - Se declare constituída servidão de estilicídio, do prédio da autora sobre o prédio do réu, pela existência de um telhado e a cobertura do telhado de uma varanda identificados no artigo 21.º da petição inicial, assim se condenando o réu a demolir ou a recuar a totalidade ou parte do telhado e da cobertura da varanda de tal forma que deixe livre e desimpedido o espaço aéreo correspondente ao terraço do prédio urbano da autora deixando um intervalo não inferior de cinco decímetros entre o terraço da autora e o beiral do telhado e o beiral da cobertura da varanda do prédio do réu, desta forma também permitindo o acesso livre e desimpedido às fachadas do prédio da autora e respetiva canalização aí existente relativa ao regular escoamento das águas pluviais, se faça exclusivamente sobre o seu prédio e o réu seja impedido de realizar qualquer obra, levantar edifício ou construção que atente contra a existência da referida servidão de estilicídio;
IV - O réu seja condenado a pagar a quantia de € 28.600,00, (Vinte e oito mil e seiscentos euros) a título de indemnização por danos patrimoniais já verificados, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor desde a citação e até integral pagamento;
V- O réu seja condenado a pagar à autora por danos causados e ainda não avaliados quantitativamente, nomeadamente pela ocupação da fachada, pelo referido fecho do espaço de permeio, pela ocupação de prédio, solo, espaço aéreo, pela abertura de varandas e janelas, inobservando os critérios legais, pela inobservância dos critérios legais quanto a estilicídio, a título de indemnização por danos patrimoniais, devendo a liquidação ser fixada em execução de sentença;
VI - O réu seja condenado a pagar a quantia de € 5.000,00, (cinco mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, quantia atualizada à presente data, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor desde a presente decisão e até integral pagamento;
VII - O Réu ser condenado a pagar à autora, por danos patrimoniais futuros que ainda vierem a ocorrer em consequência dos causados no prédio da autora, a liquidar em execução de sentença.
Alegou, em síntese, o seguinte:
- que é proprietária do prédio urbano que identifica;
- que o réu, por sua vez, é proprietário de um prédio confinante com o da autora;
- que o réu procedeu a obras na sua casa, a qual se mostra concluída, apesar de diversas queixas da parte da autora junto do Município ...;
- que com as obras levadas a cabo foi violado o direito de propriedade da autora, em vários aspetos que refere e descreve;
- que essas construções foram levadas a cabo sem autorização e contra a vontade da autora;
- que em consequência da atuação do réu, a autora sofreu danos que descreve.
Regularmente citado, o réu contestou, impugnando os factos tal como foram alegados pela autora e invocando que o prédio da autora se encontrava e encontra em muito mau estado de conservação, encontrando-se em estado de abandono; que o réu decidiu restaurar o seu prédio, para o que obteve as competentes licenças; que a autora apresentou várias queixas juntos de vários serviços da Câmara Municipal, que não tiveram provimento; que a deterioração do prédio da autora nada teve que ver com as obras levadas a cabo pelo réu, o qual em nada violou o direito da autora.
Conclui pela improcedência da ação e pela condenação da autora como litigante de má fé.
A autora apresentou resposta, mantendo o alegado na petição inicial, e pedindo, por sua vez, a condenação do réu como litigante de má fé.
Após convite ao aperfeiçoamento, veio a autora quantificar alguns dos danos que alegou, tendo, consequentemente alterado alguns dos pedidos formulados, ampliando o pedido, ampliação que foi admitida, passando o pedido formulado pela autora a ser o seguinte:
I - Nestes termos e nos melhores de direito, requer-se a V.ª Ex.ª que seja reconhecido à autora o direito de propriedade do prédio urbano que identifica e o direito de propriedade do dito espaço de permeio entre os dois prédios, e que o réu seja condenado no reconhecimento deste direito de propriedade, sendo consequentemente, obrigado a demolir e a remover a parte da obra e da sua construção que ocupa e tapa ilegitimamente a área do prédio das autora, restituindo-lhe o mesmo prédio na totalidade da sua área, livre e desocupado de pessoas e coisas, respeitando o direito de propriedade da autora sobre o seu prédio, abstendo-se de o prejudicar, não praticando quaisquer atos ou comportamentos que impeçam ou dificultem o exercício do direito da autora;
II - Se declare constituída servidão de vistas do prédio da autora sobre o prédio dos réus, pela existência de uma varanda e de uma janela identificadas nos artigos 22.º, 36.º e 37.º da petição inicial, assim se condenando os réus, a demolir ou a recuar parte da obra, por modo a que entre esta e o prédio da autora fique um intervalo mínimo de 1,5 metros, destapado, aberto e com luz natural, entre a janela da autora e o prédio do réu bem como a demolir ou recuar a totalidade da varanda constituída que confina e ocupa parte da fachada do prédio urbano da autora, de tal forma que deixem um espaço livre e desimpedido com a distância não inferior a 1,50 metros do prédio urbano da autora e os réus sejam impedidos de realizar qualquer obra, levantar edifício ou construção que atente contra a existência da referida servidão;
III - Se declare constituída servidão de estilicídio, do prédio da autora sobre o prédio dos réus, pela existência de um telhado e a cobertura do telhado de uma varanda identificados no artigo 21.º da petição inicial, assim se condenando o réu a demolir ou a recuar a totalidade ou parte do telhado e da cobertura da varanda de tal forma que deixem livre e desimpedido o espaço aéreo correspondente ao terraço do prédio urbano da autora deixando um intervalo não inferior de cinco decímetros entre o terraço da autora e o beiral do telhado e o beiral da cobertura da varanda do prédio do réu, desta forma também permitindo o acesso livre e desimpedido às fachadas do prédio da autora e respetiva canalização aí existente relativa ao regular escoamento das águas pluviais, se faça exclusivamente sobre o seu prédio e os réus sejam impedidos de realizar qualquer obra, levantar edifício ou construção que atente contra a existência da referida servidão de estilicídio;
IV - Os réus sejam condenados a pagar à autora a quantia de € 42.240,00, (quarenta e dois mil duzentos e quarenta euros), mais IVA à taxa legal, a título de indemnização por danos patrimoniais já verificados e concretizados, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor desde a citação e até integral pagamento;
V- Os réus sejam condenados a pagar a quantia de € 5.000,00, (cinco mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, quantia atualizada à presente data, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor desde a presente decisão e até integral pagamento;
VI - Os Réus serem condenados a pagar à autora, por danos patrimoniais futuros que ainda vierem a ocorrer em consequência dos causados no prédio da autora, a liquidar em execução de sentença.
Foi admitida a intervenção de CC, mulher do réu, a qual apresentou contestação, impugnando a matéria de facto tal como foi alegada pela autora, e deduziu reconvenção, pedindo que seja reconhecido como propriedade da reconvinte o espaço de permeio entre os prédios das partes.
Formulou, ainda, pedido de condenação da autora como litigante de má fé, dolosa, em indemnização no valor não inferior a € 10 000,00 (dez mil euros).
A autora replicou, concluindo pela improcedência da reconvenção e do pedido de condenação por litigância de má fé, formulando, por sua vez, pedido de condenação por litigância de má fé com indemnização não inferior a € 2 000,00 (dois mil euros).
Procedeu-se a audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador e fixado o objeto do litígio e os temas de prova, tendo sido admitida a reconvenção formulada.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:

“IV- DECISÃO:
Por tudo quanto exposto fica,
1º Julgo a ação apenas parcialmente procedente e, consequentemente:
a) Reconheço à autora o direito de propriedade sobre o prédio urbano que identifica no artigo 1.º da petição inicial.
b) Absolvo os réus de tudo mais que foi peticionado pela autora.
2º Julgo a reconvenção totalmente improcedente e, consequentemente, absolvo a autora reconvinda do pedido reconvencional.
3º Julgo improcedentes os pedidos de condenação por litigância de má-fé.
4º Custas da ação a cargo da autora (tendo em conta que o pedido procedente não foi impugnado) e da reconvenção a cargo dos réus.
5º Registe e notifique.”
*
Inconformada com esta decisão, a autora dela interpôs recurso e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem):
“CONCLUSÕES
DO ENQUADRAMENTO FACTUAL E DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
I. O presente recurso versa sobre matéria de Facto e de Direito, nos termos infra consignados, incidindo sobre a Sentença proferida na parte em que julgou a acção totalmente improcedente.
II. Sem quebra do devido respeito, entendem as Recorrentes que a Sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz é desajustada dos normativos legais positivos aplicáveis in casu.
III. A prova produzida leva a que alguns dos factos dados como não provados o devessem ter sido, pelo que se impõe forçosamente a alteração das respostas à matéria de facto em conformidade com o que efectivamente resultou de toda a prova produzida.
IV. A matéria de facto dada como provada encontra-se desfasada dos depoimentos prestados em sede de Audiência de Julgamento e da prova documental carreada para os autos e cuja validade e/ou autenticidade não foi impugnada.
V. O julgamento do Tribunal a quo afigura-se, na óptica das Recorrentes, profundamente errado, infundado e injusto, no que contende com a apreciação do Direito.

DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

VI. O Tribunal da Relação deve realizar, em sede de recurso, um novo julgamento na 2.ª Instância, tal como é estipulado pelo próprio Legislador no n.º 1 do artigo 662.º C.P.C.
VII. “ … ao afirmar que a Relação aprecia as provas, atendendo a quaisquer elementos probatórios… pretende que a Relação faça novo julgamento da matéria de facto impugnada, vá à procura da sua própria convicção, assim se assegurando o duplo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto em crise… “.
VIII. Destas considerações, resulta que o âmbito da apreciação do Tribunal da Relação, em sede de impugnação da matéria de facto, estabelece-se de acordo com os seguintes parâmetros: a) O Tribunal da Relação só tem que se pronunciar sobre a matéria de facto impugnada pela Recorrente; b) Sobre essa matéria de facto impugnada, o Tribunal da Relação tem que realizar um novo julgamento; c) Nesse novo julgamento o Tribunal da Relação forma a sua convicção de uma forma autónoma, mediante a reapreciação de todos os elementos probatórios que se mostrem acessíveis (e não só os indicados pelas partes). IX. Na reapreciação dos meios de prova, o Tribunal da Relação procede a novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção, desta forma assegurando o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria, com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância.
X. Impõe-se-lhe, assim, que “analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnação, quer a testemunhal, quer a documental, conjugando-as entre si, contextualizando-se, se necessário, no âmbito da demais prova disponível, de modo a formar a sua própria e autónoma convicção, que deve ser fundamentada”
XI. Seguindo a esteira do Tribunal da Relação de Guimarães, no seu aresto de 18 de Dezembro de 201743:
“Conferiu-se, assim, às partes um duplo grau de jurisdição, por forma a poderem reagir contra eventuais e hipotéticos erros de julgamento, com vista a alcançar uma maior certeza e segurança jurídicas e a, desse modo, obter decisões mais justas, alcançando-se, assim, uma maior equidade e paz social, sempre buscadas pelo Estado, verdadeiro interessado na realização da justiça.
O duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto pressupõe novo julgamento quanto à matéria de facto impugnada e “somente será alcançado se a Relação, perante o exame e análise crítica das provas produzidas, a respeito dos pontos de facto impugnados, puder formar a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das prova, sem estar limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida, em função do princípio da imediação da prova, princípio este que tido por absoluto transformaria este duplo grau de jurisdição em matéria de facto, numa garantia praticamente inútil”.
XII. Portanto, a alteração da matéria de facto deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando este Tribunal, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa, e delimitaram uma conclusão diferente daquela que vingou na primeira Instância – o que desde já se roga em função daquilo que será infra exposto.
XIII. Analisada a matéria de facto dada como provada na douta sentença por contraposição com a prova produzida nos autos, verifica-se que ocorreu um erro de julgamento notório e grave, que conduz à alteração da matéria de facto e impõe uma decisão diversa da proferida, nos termos do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o que aqui expressamente se invoca para todos os efeitos legais.
XIV. Pelo que deve a decisão da sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que considere esta acção totalmente procedente e absolva a Recorrente inteiramente dos pedidos contra si formulados, como é imperativo inderrogável de Justiça.

VEJAMOS:
XV. Do elenco de factos não provados, e atenta a sua relevância para a justa apreciação do mérito da causa, DEVERIAM FORÇOSAMENTE – atenta a prova testemunhal e documental produzida nos autos – TER SIDO CONSIDERADOS COMO PROVADOS OS PONTOS P, R, GG, II, JJ E RR, PONTOS H, I, M, HH, CC, MM E P, PONTOS K, U, FF, SS, TT, PONTOS S, Z E AA, PONTOS VV, WW, XX, YY, AAA, DDD, EEE, HHH, LLL, MMM, OOO, PPP, QQQ, RRR, SSS.
XVI. Muito se estranha o teor da Sentença, principalmente pelas razões que infra se demonstram, incorrendo-se em erro de julgamento na análise que faz da prova produzida e da errática valoração que atribui à prova testemunhal.
XVII. Note-se que os depoimentos das testemunhas ora indicadas e transcritas pelas Recorrentes foram prestados de forma isenta, segura e com extrema objectividade, bem como demonstrando directo conhecimento dos factos em apreço, não obstante os longos depoimentos a que foram sujeitas.
XVIII. Não existem dúvidas de que a ter sido considerado o depoimento das testemunhas ora indicadas, bem como analisada criticamente a prova documental supra mencionada - como efectivamente deveria ter sido feito atento o seu conhecimento directo de toda a factualidade em discussão - cairia totalmente, qual castelo de cartas, a versão dos aqui Réus e outra decisão não poderia restar do que a procedência total da presente acção.
XIX. Cumpre sublinhar que a sua procedência sempre evidenciará o gritantemente erro de julgamento do Tribunal a quo que só poderá motivar uma efectiva alteração da matéria de facto.
XX. Não existem dúvidas de que uma melhor análise dos depoimentos das testemunhas, conjugados com a análise da vasta prova documental existente nos autos, cairia totalmente, qual castelo de cartas, a versão dos aqui Recorridos, reconhecendo-se a procedência do petitório da Recorrente.
XXI. Os Pontos P, R, GG, II, JJ e RR foram inexplicavelmente considerado como não provado por parte do Tribunal a quo, quando só poderia ter sido considerado PROVADOS.
XXII. Dúvidas não podem subsistir, depois de toda a prova documental e testemunhal carreada e produzida nos autos que existia um espaço de permeio entre os prédios da Autora (ora Recorrente) e dos Réus (ora Recorridos), sendo tal confirmado pelo próprio Relatório Pericial, sendo visível de uma fotografia área (IMAGEM 1 do Relatório Pericial) obtida pelo Exmo. Sr. Perito a existência de um espaço entre os prédios da Autora e dos Réus, resultando do Relatório Pericial que esse espaço de permeio existia efectivamente.
XXIII. A própria Recorrente AA, em sede de Depoimento de Parte, destacou a existência desse espaço da sua propriedade exclusiva (a partir do tempo 00:02:09 até ao tempo 00:06:14 do depoimento da parte), tendo num depoimento sério, credível e honesto explicado de forma elucidativa a existência do espaço entre os prédios, a sua dimensão de cerca de 1 metro, tendo inclusivamente elucidado que o acesso era feito através da cozinha da habitação, mediante passagem de uma porta ali situada para o efeito;
XXIV. A abertura da cozinha para esse espaço de permeio entre os prédios é igualmente atestada pelo Relatório Pericial que faz menção à sua existência, bem como na prova documental existente nos autos, designadamente DOCUMENTO N.º ...0 Fls. 1, 2 e 3.
XXV. Neste DOCUMENTO N.º ...0 Fls. 1, 2 e 3 é perceptível a existência do espaço de permeio entre os prédios ANTES DAS OBRAS realizadas pelos Réus, sendo que o mesmo DOCUMENTO N.º ...0 fls. 5 é perceptível a parede de tijolos APÓS A OBRA realizada pelo Réu, que acaba por TAPAR totalmente o acesso aquele espaço de permeio através da cozinha do prédio da Autora.
XXVI. A existência deste espaço e da “portinhola” de acesso ao mesmo é confirmado também pela testemunha DD, que mais refere que o prédio do Réu não possuía qualquer saída (janela ou “portinhola”) para aquele espaço de permeio dos prédios (a partir do tempo 00:02:58 até ao tempo 00:05:44 do depoimento de testemunha)
XXVII. A mesma testemunha DD, no seu depoimento verdadeiro, elucidativo e genuíno, descreveu ao Tribunal que conhece o prédio da Autora desde a década de 70, altura em que entrou lá pela primeira vez. Mais refere ao longo seu depoimento que tal saída para esse espaço de permeio (que apelida de “portinhola” tem cerca de 60cm de largura e 1 metro de altura, e que o espaço de permeio servia de ventilação para o prédio da Autora) (a partir do tempo 00:09:31 até ao tempo 00:13:34 do depoimento de testemunha).
XXVIII. O facto do Réu se ter apropriado do espaço da Autora é conhecido por quem era visita de casa e conhecia o antes e o depois. Veja-se, a este título, a testemunha EE que num depoimento descomprometido confirmou que o Réu se apropriou de uma parte do prédio da Autora (a partir do tempo 00:05:20 até ao tempo 00:05:58 do depoimento de testemunha)
XXIX. A testemunha FF é também plenamente elucidativo acerca da existência do espaço de permeio, e da ocupação ilícita por parte do Réu, após a realização das obras, de parte do prédio da Autora, espaço que permitia a entrada de luminosidade, o arejamento e entrada de pessoas (a partir do tempo 00:01:58 até ao tempo 00:05:15 do depoimento de testemunha) referindo também que referiu também que os Réus não possuíam qualquer abertura para aquele espaço de permeio, e que actualmente o mesmo é inexistente, tendo os Réus ocupado o mesmo (a partir do tempo 00:08:15 até ao tempo 00:09:30 do depoimento de testemunha)
XXX. Esta testemunha FF explicou mesmo ao Tribunal o local em concreto, como é que o mesmo era constituído, afirmando concludentemente que o espaço servia também para ventilação e que ERA COBERTO PELO TELHADO DO PRÉDIO DA AUTORA (a partir do tempo 00:13:30 até ao tempo 00:15:56 do depoimento de testemunha e (a partir do tempo 00:17:00 até ao tempo 00:18:25 do depoimento de testemunha).
XXXI. A testemunha GG foi concludente em denunciar a existência do espaço de permeio entre os prédios, mais afirmando que esse mesmo espaço era utilizado pela Autora como despensa e zona de arrumos, e que servia igualmente de zona de passagem para pessoas (a partir do tempo 00:01:46 até ao tempo 00:03:56 do depoimento de testemunha
XXXII. A testemunha HH confirmou a existência do espaço de permeio entre os prédios, a janela/portinhola de acesso a esse local, que servia igualmente como “espaço de arejo para as pessoas abrirem as janelas”, sendo concludente em atribuir a propriedade desse espaço ao prédio da Autora (a partir do tempo 00:11:30 até ao tempo 00:13:01 do depoimento de testemunha)
XXXIII. a testemunha II também foi categórica em afirmar a existência do espaço de permeio entre os prédios, e que o mesmo era “servido” pela portinhola da cozinha da Autora, encontrando-se actualmente (ilicitamente) obstruído pelos Réus após as suas obras (a partir do tempo 00:02:10 até ao tempo 00:03:42 do depoimento de testemunha)
XXXIV. E a testemunha JJ foi cabal e esclarecedor, num depoimento sério e credível, confirmou a existência da portinhola, o seu acesso através da mesma para o espaço de permeio a partir do prédio (cozinha) da Autora, tendo confirmado as dimensões do espaço de permeio (a partir do tempo 00:03:33 até ao tempo 00:05:10 do depoimento de testemunha)
XXXV. A testemunha KK admite a existência do espaço entre os prédios, que refere servir para circulação do ar, mais admitindo que o mesmo se encontra tapado com o telhado da Autora, sendo aquele o primitivo em relação ao telhado posteriormente colocado do Réu, atribuindo assim a propriedade do espaço à Autora. Mais acaba esta testemunha KK por reconhecer que é a nova parede de tijolo do Réu que fecha actualmente o espaço, e que anteriormente a mesma era inexistente (antes da obra), o que revela bem a apropriação ilegítima de parte substancial do espaço por parte do Réu (a partir do tempo 00:35:47 até ao tempo 00:45:07 do depoimento de testemunha56; a partir do tempo 01:20:55 até ao tempo 01:22:55 do depoimento de testemunha;
XXXVI. Esta testemunha KK reconhece que as chapas que se vêm no DOCUMENTO N.º ...0, fls. 2 da Petição Inicial são da propriedade da Autora, o que é revelador de que o espaço “sorreiro” só lhe poderia pertencer a ela, e a mais ninguém. Aliás, não seria por acaso que o prédio da Autora – ao contrário do prédio dos Réus, possuía uma saída e acesso aquele espaço, sendo o único que o detinha, sendo a Autora a única que lhe acedia e fazia uso do mesmo.
XXXVII. Além da prova testemunhal a verdade é que todos estes factos são igualmente atestados pela IMAGEM 1, IMAGEM 8, IMAGEM 9 do RELATÓRIO PERICIAL. Ademais, tal factualidade é devidamente confirmada e atestada pela insofismável prova documental existente nos autos, em concreto o DOCUMENTO N.º ...0, FLS 1, 2, 3 E 5 da Petição Inicial, sendo indubitável a existência do espaço de permeio com mínimo de 50 centímetros de largura antes dos Réus realizarem as obras; sendo igualmente incontestável que o mesmo integra a propriedade da Autora; e que serve para arrumo, circulação de ar e entrada de luminosidade; e que a Autora tem, inclusivamente, uma portinhola/janela para o mesmo espaço, que utilizava de forma exclusiva a seu bel-prazer, dúvidas não poderão subsistir de que o Réu se apropriou ilegitimamente de parte da propriedade da Autora, apropriando-se ilicitamente.
XXXVIII. Deveriam também os Pontos H, I, M, HH, CC, MM e PP terem sido considerados como PROVADOS, sendo manifesta a prova produzida em julgamento acerca desta matéria de facto, pelo que se reveste surpreendente como os mesmos não foram considerados provados.
XXXIX. A fachada e o telhado do prédio da Autora foi abusivamente ocupada pelo Réu após a realização das obras no seu prédio.
XL. Veja-se, por exemplo, os DOCUMENTOS N..º ..., ..., ..., ..., ..., comparando-a com o DOCUMENTO N.º ...0 fls. 1, 2, 3, ficando patenteadas as diferenças do antes e depois da obra realizada pelo Réu no seu prédio.
XLI. no DOCUMENTO N.º ...0 fls. 1, 2, 3 consegue-se perceber que, antes das obras realizadas pelo Réu, NÃO EXISTIA QUALQUER SOBREPOSIÇÃO DE PRÉDIOS AO NÍVEL DA FACHADA, contrariamente ao existente no presente e após a obra do Réu, e o o RELATÓRIO PERICIAL é igualmente paradigmático em reconhecer que a casa dos réus “avançou em direção à casa da autora, sobrepondo-se ao cunhal degranito da casa da autora em cerca de 7 cm” – cfr. página 4 de 26 do RELATÓRIO PERICIAL, em resposta aos quesitos 15.º, 19.º, 22.º a 24.º, 37.º, 43.º a 46.º.
XLII. a testemunha FF, quando confrotando com o Documento n.º ... da Petição Inicial, explica de forma transparente, séria e isenta que o prédio do Réu “invadiu” o prédio da Autora, tendo inclusivamente invadido o telhado do prédio da Autora (a partir do tempo 00:09:41 até ao tempo 00:11:25 do depoimento desta testemunha e a partir do tempo 00:12:38 até ao tempo 00:130:10 do depoimento desta testemunha)
XLIII. a testemunha GG, num depoimento sempre descomprometido e sério também assinala as alterações do prédio do Réu após as obras, tendo afirmado que a varanda dos Réus não ocupava a casa da Autora, não estando sequer encostada aquela (hoje, das fotografias actuais, vê-se que até se encontra em plena fachada da Autora) (a partir do tempo 00:04:40 até ao tempo 00:07:14 do depoimento desta testemunha)
XLIV. Atente-se igualmente no depoimento da testemunha LL, arquitecta responsável pelo projecto de obra dos Réus, ainda que se tenha escudado em “não me lembro”, “não me recordo” referente a uma obra que ela própria fiscalizou (o que demonstra o comprometimento desta testemunha e as ilicitudes da conduta do Réu), a verdade é que acabar por reconhecer perante o Tribunal a varanda dos Réus, após as obras, FICOU COM MAIS LARGURA DO QUE AQUILO QUE POSSUÍA ANTES DAS OBRAS REALIZADAS (a partir do tempo 0022:28 até ao tempo 00:24:51 do depoimento desta testemunha)
XLV. Os Pontos K, U, FF, SS, TT foram inexplicavelmente considerados como não provados por parte do Tribunal a quo, quando só poderiam ter sido considerado PROVADOS.
XLVI. A Autora AA elucidou bem o Tribunal, de forma séria e isenta, a actuação abusiva do Réu com as suas obras e a violação que tal conduta originou no direito de propriedade da Autora (a partir do tempo 00:06:14 até ao tempo 00:10:36 do depoimento desta parte
XLVII. A Autora é concludente em explanar, de forma credível, ao Tribunal que as cornijas acabaram cortadas em cerca de 20 cm. E tal é igualmente atestado pela prova documental constante nos autos, designadamente o DOCUMENTO N.º ... da Petição Inicial onde é bastante perceptível o corte que a cornija do prédio da Autora teve. E se existir uma comparação com o “antigamente”, visto no DOCUMENTO N.º ...0 fls 1, 2, 3 da Petição Inicial, é evidente tais diferenças ao nível do corte da cornija
XLVIII. Atente-se no depoimento da testemunha DD que transmitiu as diferenças existentes no prédio após a realização das obras do Réu, salientando a existência do corte nas cornijas (a partir do tempo 00:05:44 até ao tempo 00:08:30 do depoimento desta testemunha)
XLIX. Também a testemunha FF o atestou, afirmando de forma credível e descomprometida perante o Tribunal que o Réu fez um corte nas cornijas e, consequentemente, no próprio telhado (a partir do tempo 00:05:30 até ao tempo 00:08:25 do depoimento desta testemunha
L. Tal acabou igualmente por ser reiterado pela testemunha HH que revela a sobreposição do prédio do Réu ao da Autora após as obras, com apropriação de parte do telhado e com um corte da cornija que, segunda esta testemunha, é perfeitamente perceptível da análise das fotografias constantes do processo (a partir do tempo 00:24:12 até ao tempo 00:26:55 do depoimento desta testemunha (a partir do tempo 00:27:20 até ao tempo 00:28:57 do depoimento desta testemunha)
LI. Os Pontos S, Z e AA foram também inexplicavelmente considerados como não provados por parte do Tribunal a quo, quando só poderia ter sido considerado PROVADO, atento o teor do depoimento das várias testemunhas.
LII. Este ponto só pode ser consensual na apreciação da matéria de facto considerada como provada, na medida em que são evidentes os meios de prova que o sustenta e confirma, designadamente prova documental IMAGEM 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 23, 25, 26, 27, 28,29, 30, 31, 32,33, 34, do RELATÓRIO PERICIAL.
LIII. A prova testemunhal é irrepreensível nesta matéria, tendo a testemunha FF afirmado a existência de fissuras no prédio da Autora provocado pelas obras do Réu, os quais existiram depois das obras realizadas pelo Réu. Mais afirmou esta testemunha que os danos provocados pelas obras do Réu foram tantos que actualmente existe até receio de se fazer alguma intervenção do prédio derivado do estado em que o Réu o deixou com as suas obras (a partir do tempo 00:20:32 até ao tempo 00:22:34 do depoimento desta testemunha)
LIV. A testemunha GG foi liminar em demonstrar conhecer as fissuras ora existentes no prédio da Autora, afirmando que as mesmas não existiam antes do Réu realizar a sua obra (a partir do tempo 00:03:56 até ao tempo 00:04:40 do depoimento desta testemunha)
LV. A própria Autora AA descreveu de forma eximia, correcta e credível todos os danos e prejuízos causados no seu prédio derivado das obras realizadas pelo Réu, dando foco aos danos nas paredes da cozinha onde tinha “caído tudo” (a partir do tempo 00:17:46 até ao tempo 00:21:57 do depoimento desta parte)
LVI. Igualmente os Pontos VV, WW, XX, YY, AAA, DDD, EEE, HHH, LLL, MMM, OOO, PPP, QQQ, RRR, SSS foram inexplicavelmente considerados como não provado por parte do Tribunal a quo, quando só poderiam ter sido considerados PROVADOS.
LVII. Veja-se a própria Autora AA, que resumiu bem os danos não patrimoniais sofridos, nomeadamente os danos provocados por toda a situação e conduta ilícita prosseguida pelos Réus e que vitimou a Autora: (a partir do tempo 00:21:57 até ao tempo 00:10:36 do depoimento desta parte)
LVIII. Atente-se ainda que a testemunha DD confirma a existência desses mesmos danos morais na esfera da Autora, descrevendo as consequências das condutas ilícitas do Réu na sua esfera (a partir do tempo 00:08:50 até ao tempo 00:09:10 do depoimento desta testemunha).
LIX. Atenta a prova produzida no processo, testemunhal e documental, deveria a factualidade descrita pela Recorrente supra, e enumerada de Pontos P, R, GG, II, JJ e RR, Pontos H, I, M, HH, CC, MM e P, Pontos K, U, FF, SS, TT, Pontos S, Z e AA, Pontos VV, WW, XX, YY, AAA, DDD, EEE, HHH, LLL, MMM, OOO, PPP, QQQ, RRR, SSS, ter sido dados como PROVADOS.
DO DIREITO
LX. O Tribunal a quo não podia deixar de reconhecer que a Recorrente é a legítima proprietária do terreno melhor identificado no articulado inicial, e, concomitantemente, reconhecer a titularidade do direito de propriedade.
LXI. A questão da propriedade da Recorrente deve ser objecto de escrutínio, desde logo por ser a causa e o motivo para todos os direitos de que a Recorrente se arroga titular, uma vez que as condutas dos Recorridos tiveram reflexos não só no espaço entre os prédios, mas também no próprio imóvel da Recorrente.
LXII. Reconhecida a propriedade da Recorrente relativamente ao imóvel, como deveria ter sido, a Recorrente, na qualidade de proprietária, goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem.
LXIII. Tal reconhecimento desencadeia a aplicação de uma série de normativos que contraditam, em absoluto, o juízo de direito efectuado pelo Tribunal a quo relativamente à pertinência do reconhecimento da propriedade da Recorrente, razão pela qual deve ser revogada a Sentença proferida e substituída por uma outra que reconheça a propriedade da Recorrente sobre o imóvel.
LXIV. No que concerne ao espaço de permeio entre os dois imóveis, a prova produzida demonstrou de modo cabal que a Recorrente exerceu actos materiais de posse sobre tal espaço, de forma pacífica, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, ininterruptamente, durante tempo superior a 20 anos e com a convicção de estar a exercer um direito próprio.
LXV. Ficou demonstrado que a Recorrente tinha uma janela/portinhola no espaço de permeio, na qual entrava e saía, por desde logo ter utilizado tal espaço para arrumos. Além da própria Recorrente, foram várias as testemunhas que demonstraram a publicidade da posse daquele espaço, demonstrando conhecer o uso que era dado ao mesmo.
LXVI. O mesmo não se pode dizer quanto aos Recorridos, relativamente aos quais não existiu qualquer prova da posse do espaço.
LXVII. Ficou, concomitantemente, provada matéria de facto suficiente para se considerar a existência de uma posse adquirida pela prática reiterada, com publicidade, dos actos materiais correspondentes ao exercício do direito.
LXVIII. Conhecendo-se que a Recorrente é proprietária daquele prédio há mais de vinte anos, e que utilizou o espaço de permeio nos termos acima referenciados durante todo esse período de tempo, encontra-se reunida matéria de facto capaz de demonstrar que a Recorrente, enquanto possuidora, adquiriu o direito a cujo exercício correspondeu a sua actuação, razão pela qual deve ser revogada a Sentença proferida e substituída por uma outra que reconheça a propriedade da Recorrente do espaço de permeio entre os dois imóveis.
LXIX. E, concomitantemente, seja substituída a Sentença por uma outra que, face ao reconhecimento do direito de propriedade da Recorrente do prédio e do dito espaço de permeio entre os dois prédios, condene os Recorridos no reconhecimento desse mesmo direito e na demolição e remoção da parte da obra e da sua construção que ocupa e tapa ilegitimamente a área do prédio da Recorrente.
LXX. Mais deverão os Recorridos ser condenados na restituição do prédio na totalidade da sua área, livre e desocupado de pessoas e coisas, conquanto só uma Sentença proferida nesses termos é que logrará proteger o direito de propriedade da Recorrente sobre o seu prédio e sobre o referido espaço.
LXXI. Se uma obra for feita de má-fé, o que, conforme melhor explanado na impugnação de matéria de facto, corresponde ao verificado in casu, o dono do terreno tem direito de exigir que seja desfeita. Tem ainda direito a que o terrejo lhe seja restituído no seu primitivo estado à custa do responsável pela obra.
LXXII. Ainda que não fosse reconhecida a má-fé do executante da obra, quando na construção de um edifício em terreno próprio se ocupe de boa-fé uma parcela de terreno alheio, o construtor apenas poderá adquirir a propriedade do terreno ocupado se pagar o valor do terreno e reparar o prejuízo causado, sem oposição do proprietário.
LXXIII. As regras do Código Civil respeitantes a construções e edificações, as quais visam conciliar os interesses conflituantes de proprietários vizinhos, merecendo, concomitantemente, plena aplicação in casu – cfr. artigo 1360.º, n.º 1 CC. Igual restrição é aplicável às varandas, terraços, eirados ou obras semelhantes, quando sejam servidos de parapeitos de altura inferior a metro e meio em toda a sua extensão ou parte dela.
LXXIV. O proprietário não pode construir nem manter no seu prédio quaisquer obras, instalações ou depósitos de substâncias corrosivas ou perigosas, se for de recear que possam ter sobre o prédio vizinho efeitos nocivos não permitidos por lei, regra essa que deveria ter sido aplicada.
LXXV. Se as obras, instalações ou depósitos tiverem sido autorizados por entidade pública competente, ou tiverem sido observadas as condições especiais prescritas na lei para a construção ou manutenção deles, a sua inutilização só é admitida a partir do momento em que o prejuízo se torne efectivo, normativo esse que deveria ter sido aplicado.
LXXVI. Se para reparar algum edifício ou construção, for indispensável levantar andaime, colocar objectos sobre prédio alheio, fazer passar por ele os materiais para a obra ou praticar outros actos análogos, é o dono do prédio obrigado a consentir nesses actos.
LXXVII. Mesmo sendo lícita a ocupação momentânea, bastando que da mesma tenha sido de alguma forma alterado o espaço ocupado, sendo necessário proceder á sua reposição no estado anterior, o que implica despesas.
LXXVIII. Basta que o ocupante do prédio alheio tenha excedido os limites concedidos pelos dispositivo legal que lhe permitira a ocupação momentânea, ou porque essa ocupação foi excessiva em termos temporais, arrastando-se no tempo para além do necessário, atenta a natureza e volume das obras, exercendo-se abusivamente o direito, ou porque o ocupante causou danos não decorrentes das obras que se propunha realizar, agindo assim em manifesta violação do direito de propriedade alheio, cuja restrição já não tem sentido, ou ainda porque tal ocupação não se processou de harmonia com as regras da boa fé, agindo o ocupante como se dono fosse, pondo e dispondo como se de coisa sua se tratasse.
LXXIX. Há um nexo de causalidade entre a conduta do réu na prática dos actos lesivos e o resultado danoso produzido na esfera pessoal e patrimonial da autora.
LXXX. Tendo a Recorrente a propriedade de um terraço/varanda integrante do seu imóvel, e tendo os Recorridos construído e subido a sua varanda de tal modo que ocupou a fachada do prédio daquela, a verdade é que não foi observada a distância de metro e meio imposta por lei.
LXXXI. Todo o proprietário deve edificar de modo que a beira do telhado ou outra cobertura não goteje sobre o prédio-vizinho, deixando um intervalo mínimo de cinco decímetros entre o prédio e a beira, se de outro modo não puder evitá-lo, o que, in casu, não se verificou.
LXXXII. Acrescem ainda as normas previstas no Regulamento Geral das Edificações Urbanas, as quais não só acautelam o interesse público conexionado com a segurança dos cidadãos, aspecto estético e salubridade das edificações, como têm em vista a protecção do interesse particular de quem usufrua das habitações sitas na vizinha de obras em execução.
LXXXIII. É, precisamente, o caso dos artigos 59.º a 63.º do Decreto-Lei n.º 38382/51, de 07 de Agosto, os quais impõem restrições às distâncias e alturas de edifícios relativamente aos prédios vizinhos, por forma que fiquem assegurados o arejamento, iluminação natural e exposição à acção directa dos raios solares não só do prédio objecto dos trabalhos, mas também dos prédios vizinhos.
LXXXIV. Razões pelas quais, deveria o Tribunal a quo ter reconhecido à Recorrente o direito de propriedade do prédio urbano supra identificado, assim como o direito de propriedade sobre o espaço de permeio entre os dois prédios, o que, por sua vez, cominaria na condenação dos Recorridos ao reconhecimento do direito de propriedade da Recorrente, sendo, consequentemente, obrigado a demolir e a remover a parte da obra e da sua construção que ocupam e tapam a área do prédio da Recorrente.
LXXXV. Esse reconhecimento deveria passar por um cabal respeito pelo direito de propriedade da Recorrente do seu imóvel, o que passaria, naturalmente, pela restituição do prédio na totalidade da sua área, livre e desocupado de pessoas e coisas, e pela abstenção da práctica de actos e comportamentos que impeçam ou dificultem o exercício desse mesmo direito.
LXXXVI. O Tribunal a quo reconheceu a existência de uma servidão de vistas a favor da Recorrente.
LXXXVII. O proprietário que tiver janelas ou portas, e que seja obstruído por construção que impeça a sua normal utilização (v.g. entrada de luz) pode constituir uma servidão de vistas por usucapião.
LXXXVIII. A existência de janelas pode conduzir à constituição, por usucapião, de uma servidão que confere ao respectivo titular não só o direito de manter tais aberturas, como o direito de manter as vistas e a entrada de luz e ar, o que implica que não possa deixar de ser reconhecido à Recorrente o direito de impedir que os Recorridos, proprietários do prédio vizinho, vedem ou tapem as suas vistas.
LXXXIX. As construções realizadas pelos Recorridos retiraram as vistas ao prédio da Recorrente, tendo existido uma devassa objectiva sofrida pelo prédio da Recorrente antes e depois das alterações introduzidas pelos Recorridos.
XC. A servidão que beneficiava o prédio da Recorrente não se mantém, vendo-se o seu direito de servidão alvo de limitações, as quais deveriam justificar que os Recorridos adoptassem condutas, por condenação do Tribunal, no sentido do exercício pela Recorrente do seu direito ser restabelecido.
XCI. Razões pelas quais, deve a Sentença recorrida ser substituída por outra que declare constituída servidão de vistas do prédio da Recorrente sobre o prédio dos Recorridos, e condene os Recorridos: a) na demolição ou modificação da obra ou parte desta por modo a que, entre esta e o prédio da Recorrente, fique um intervalo mínimo de 1,5 metros, destapado, aberto e com luz natural, entre a janela da Recorrente e o prédio dos Recorridos; b) na demolição ou recuo da totalidade da varanda constituída que confina e ocupa parte da fachada do prédio urbano da Recorrente, de tal forma que deixem um espaço livre e desimpedido com a distância não inferior a 1,50 metros do prédio urbano da Recorrente; c) no impedimento da realização de qualquer obra, levantamento de edifício ou construção que atente contra a existência da referida servidão.
XCII. No que concerne aos requisitos da responsabilidade civil extracontratual, in casu, como cabalmente se demonstrou, os Recorridos enveredaram por uma conduta que violou, activamente, um direito da Recorrente, ao realizar construções e edificações que colocaram em causa o direito de propriedade desta última.
XCIII. Quanto à ilicitude, não só se evidenciou a violação do direito de propriedade da Recorrente, como se vislumbra uma evidente violação das disposições legais quer do Código Civil quer do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, as quais foram elencadas em sede de Petição Inicial.
XCIV. Violando os Recorridos o direito de propriedade da Recorrente, assim como deveres que nascem de fontes legais concernentes às edificações urbanas, caberia aos mesmos ressarcir a aqui Recorrente pelos danos causados em decorrência de tais violações.
XCV. Reside a ilicitude da conduta dos Recorridos na violação do direito de propriedade da Recorrente, bem como na violação de normas legais que lhes impunham o dever de agir de certo modo, uma vez que os mesmos não só se omitiram de tal padrão de conduta, como activamente agiram em incumprimento do mesmo. XCVI. Quanto à culpa, os Recorridos agiram com plena consciência de que a sua actuação não só violaria o direito de propriedade da Recorrente, afectando-o, limitando-o e prejudicando o seu exercício, como bem conheciam que as normas urbanísticas aplicáveis afastariam a licitude da sua conduta, desde logo por as consequências manifestas dos seus actos revelarem-se ostensivamente prejudiciais à propriedade alheia aos olhos de qualquer cidadão comum.
XCVII. Os Recorridos nunca contactaram a Recorrente, nunca tentaram pedir a sua permissão, consentimento ou, pelo menos, dar conhecimento, das construções que realizavam no seu prédio, bem sabendo que a Recorrente se oporia às mesmas. E isto mesmo quando a Recorrente tentou obter explicações para os factos praticados pelos Recorridos em meados de 2018, não tendo obtido qualquer resposta.
XCVIII. Se os Recorridos agissem de boa-fé e seguros da licitude das suas acções, jamais ignorariam totalmente os apelos da Recorrente e agiriam nas suas costas produzindo uma série de danos em propriedade alheia.
XCIX. Os Recorridos agiram dolosamente, em frontal oposição aos direitos que assistem à Recorrente na qualidade de proprietária.
C. Os Recorridos previram, como não poderia deixar de ser, a produção do resultado das suas acções e actuaram nessa estrita medida. Tinham os Recorridos conhecimento, capacidade natural, discernimento e liberdade de determinação, para prever os efeitos e medir o valor dos actos que praticaram.
CI. São condutas altamente reprováveis pois é de concluir que, sabendo que violavam o direito de propriedade de outrem e face ao estado degradado dos prédios poderiam e deveriam os Recorridos ter agido de outro modo.
CII. Os Recorridos, ao tapar parte da fachada da casa da Recorrente, sabiam que violavam o direito da Recorrente e representaram a produção de factos ilícitos tendo a intenção de os realizar.
CIII. Os Recorridos, ao realizar a sua obra, sabia que violava o direito da Recorrente e representou que poderia haver o risco de ruir a casa da Recorrente, ou seja, representou a produção de factos ilícitos como consequência necessária da sua conduta.
CIV. Os Recorridos ao tapar o espaço entre o seu prédio e o prédio da Recorrente deixando apenas um intervalo de 15 centímetros, espaço de permeio esse que é propriedade da Recorrente, sabiam que violavam o direito desta e representaram a produção de factos ilícitos tendo a intenção de os realizar.
CV. Os Recorridos ao cortar e ocupar o telhado da casa da Recorrente sabia que violava o direito desta e representou a produção de factos ilícitos tendo a intenção de os realizar.
CVI. Os Recorridos ao sobreporem a sua varanda sobre a fachada do prédio da Recorrente sabiam que violavam o direito desta e representaram que poderia haver gotejamento, acumulação de água e humidade na varanda do prédio da Recorrente, ou seja, representaram a produção de factos ilícitos como consequência necessária da sua conduta.
CVII. Os Recorridos, bem sabendo que, o prédio da Recorrente contíguo ao seu era antigo e que podia ruir, não se eximiram de fazer obras profundas no seu prédio, tendo em consequência dessa actuação provocado fendas nas paredes interiores do prédio da Recorrente.
CVIII. Desde que recomeçaram a obra, os Recorridos ocuparam e taparam parte da fachada do prédio da Recorrente levantando redes, andaimes, e outros materiais de construção sobre o prédio da Recorrente impedindo quem quer que fosse de conseguir ver a progressão e a execução da mesma.
CIX. Ainda que se considerasse que não agiram com dolo, sempre se deveria considerar que os Recorridos agiram de modo negligente, dado que o bom pai de família jamais procederia à realização de obras que colocassem em causa um imóvel alheio sem, sequer, tentar obter qualquer tipo de anuência da parte da proprietária.
CX. Não se deve olvidar que era aos Recorridos que incumbia provar que empregaram todas as providências exigidas pelas circunstâncias para prevenir os danos que geraram, dado executarem actividade perigosa, geradora de um perigo de ruína, conforme se articulou em sede de Petição Inicial e se demonstrou através de prova documental, prova essa que não foi realizada.  
CXI. Quanto aos danos, os Recorridos, ao cortarem as cornijas do prédio da Recorrente, causaram-lhe um prejuízo nunca inferior a 1.500,00 Euros (mil e quinhentos euros).
CXII. Ao cortarem grande parte do telhado da Recorrente e ocupando parte do seu prédio, os Recorridos causaram danos que remontam, pelo menos, a um montante de 14.000,00 Euros (catorze mil euros).
CXIII. Os Recorridos retiraram as antenas que existiam no telhado da Recorrente, danificando-as e gerando um prejuízo que se quantifica em valor nunca inferior a 100,00 Euros (cem euros).
CXIV. Os Recorridos abriram fendas no rés-do-chão e no primeiro andar das paredes interiores do prédio da Recorrente, sendo que pelas fissuras, rachas e fendas nas paredes causaram danos patrimoniais que ascendem, no mínimo, a um valor de 13.000,00 Euros (treze mil euros).
CXV. Ao ocupar parte da fachada do prédio da Recorrente, sobrepondo a sua varanda e respectivo telhado sobre o edifício daquela, pela violação do seu direito de servidão de vistas não deixando um intervalo de 1.50 metros, os Recorridos causaram danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos, devendo a liquidação ser fixada posteriormente em decisão ulterior.
CXVI. Os Recorridos, fechando por completo o espaço de permeio pertencente à Recorrente que existia entre os dois prédios, pela violação do seu direito de servidão de vistas, causaram danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos, devendo a liquidação ser fixada posteriormente em decisão ulterior.
CXVII. Pela ocupação do prédio, solo, espaço aéreo, ao prolongar o seu edifício por terreno alheio, de má-fé contra a vontade da Recorrente, pela violação do direito de propriedade da Recorrente, causaram danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos, devendo a liquidação ser fixada posteriormente em decisão ulterior.
CXVIII. Pela abertura de varandas e janelas inobservando os critérios legais, os Recorridos, pela violação do direito da Recorrente de servidão de vistas não deixando um intervalo de 1.50 metros, causaram danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos, devendo a liquidação ser fixada posteriormente em decisão ulterior.
CXIX. É previsível e ainda não determináveis a ocorrência de danos futuros que ainda vierem a ocorrer em consequência dos causados no prédio da Recorrente. Concretamente, em consequência da obra realizada pelos Recorridos, o interior da parede do prédio da Recorrente apresenta-se fissurado com queda de grandes superfícies de estuque e deterioração estrutural, com perigo de ruir.
CXX. Acrescem ainda os danos não patrimoniais, dado que as condutas dos Recorridos supra descritas foram e são causa de transtornos e preocupações na Recorrente.
CXXI. A Recorrente, com os factos praticados pelos Recorridos, vive ansiosa desde o recomeço das obras em 2016 até à presente data, andado constantemente, descontente, perturbada, inquieta, aflita vivendo num estado de angústia profunda.
CXXII. As diversas queixas que a Recorrente foi obrigada a apresentar na Câmara Municipal ..., em virtude dos factos praticados pelos Recorridos deixaram a Recorrente absolutamente desgastada emocionalmente.
CXXIII. A Recorrente já recorreu diversas vezes à sua médica de família através de consulta no centro de saúde, tendo-lhe sido diagnosticado um distúrbio depressivo maior.
CXXIV. Em consequência das acções ilícitas dos Recorridos foram diagnosticados à Recorrente anti-depressivos para combater a tristeza que ainda sofre.
CXXV. A Recorrente sempre foi uma pessoa séria, idónea, trabalhadora e honesta. Porém, como consequência dos factos descritos, a Recorrente apresenta actualmente problemas nas faculdades psicológicas.
CXXVI. A Recorrente, sendo pessoa saudável, nunca tomou medicação diária, sendo que por causa dos factos praticados pelos Recorridos começou a tomar anti-depressivos para controlar e suavizar os problemas respiratórios e de ansiedade de que padece.
CXXVII. A Recorrente sente-se depressiva e ansiosa com toda a situação em apreço, que contribuiu para agravar o estado de saúde da mesma. A isso acresce o facto de se encontrar extremamente nervosa e preocupada com o desfecho do presente processo, o qual apenas foi necessário por a conduta dos Recorridos ser ostensivamente violadora dos direitos que assistem à Recorrente.
CXXVIII. A Recorrente tem sérias dificuldades em dormir. Vive preocupada e receosa que as fendas que os Recorridos causou nas paredes da Recorrente ponham em risco a estrutura do seu prédio urbano.
CXXIX. A Recorrente sente sofrimento e angústia ao ver o seu prédio descaracterizado, alterado e a degradar-se progressivamente por causa dos factos praticados pelos Recorridos.
CXXX. A actividade ilícita e espelhada nos pontos supra referentes à factualidade, praticada pelos Recorridos, foi causa directa e necessária para a produção dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos na esfera da aqui Recorrente, pelo que a prática dos referidos factos ilícitos perpetrada pelos Recorridos fez nascer na esfera da aqui Recorrente o direito a ser indemnizada.
CXXXI. Deve a Sentença recorrida ser substituída por outra que condene os Recorridos a pagarem a quantia de 28.600,00 Euros (vinte e oito mil e seiscentos euros) a título de indemnização por danos patrimoniais, e que condene os Recorridos a pagarem à Recorrente os danos causados e ainda não avaliados quantitativamente, nos termos peticionados na Petição Inicial.
CXXXII. Devem os Recorridos ser condenados a indemnizar a Recorrente por danos patrimoniais futuros que venham a ocorrer em consequência da conduta do Recorrente, a liquidar em execução de sentença.
CXXXIII. Deve, ademais, a Sentença recorrida ser substituída por outra que condene os Recorridos a pagar a quantia de 5.000,00 Euros (cinco mil euros) a título de danos não patrimoniais.
CXXXIV. É perfeitamente notório que o Tribunal a quo não fez a melhor interpretação do Direito aplicável, violando, entre outros os artigos 483.º, 493.º, 1263.º alínea a), 1287.º, 1305.º, 1311.º, 1341.º, 1343.º, 1344.º, 1347.º, 1349.º/1 e 3, 1360.º, n.º 1, 1362.º, 1365.º, do Código Civil, bem como os artigos 59.º a 63.º do Decreto-Lei n.º 38382/51, de 07 de Agosto, devendo aos mesmos ser dado o sentido que lhes foi atribuído pela Recorrente ao longo das presentes Conclusões.

Termos em que, deve o presente Recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada a Sentença proferida, dando-se assim provimento ao recurso que ora se interpõe, decidindo-se em consonância com o peticionado na Petição Inicial, a matéria de facto dada como provada e não provada e a prova produzida nos autos.
* *
 *
Nestes termos, e nos melhores de Direito, que Vossas Excelências doutamente suprirão, deverá o Recurso ser julgado procedente, por provado, e, em consequência, ser revogada a sentença “a quo”, com as demais consequências legais, requerendo-se a condenação dos Réus nos peticionados em sede de Petição Inicial e respectivo Articulado de Aperfeiçoamento.
Só assim se fará a costumeira Justiça!.”.
*
Os réus apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso interposto, terminando com as seguintes conclusões (que igualmente se transcrevem):
V. CONCLUSÕES

1. Alcança-se na douta sentença em recurso que o Tribunal entendeu que “(…) existem contradições entre os vários depoimentos, pelo que o tribunal se socorreu da prova documental e pericial para a decisão (…)
2. Efectivamente, uma testemunha – Engº HH-, o Sr. Perito e as partes juntaram aos autos vasta prova documental, entre ela fotografias, com a PI, com as Contestações e mais tarde reiteraram a junção das fotografias porquanto foi alcançado que no processo físico as mesmas não tinham sido incorporadas e as que o tinham sido apresentavam-se em preto e branco por economia financeira bem como as demais apresentadas, chegando mesmo assim a faltar algumas em especial em fls.. 288.
3. O mesmo se diga quanto ao Relatório Pericial e esclarecimentos que no processo físico se alcançam em fls.. 257V a 270 e 278 a 279V e 285 a 286, em preto e branco.
4. Acontece que as fotografias apresentadas pelos Recorridos o foram a cores e em formato PDF/JPEG, o Relatório Pericial e Esclarecimentos Periciais que continham imagens (fotos) o são a cores bem como as imagens apresentadas em 06/07/2022 com refª ...24 pela testemunha HH das quais as partes tomaram conhecimento e não as impugnaram, são, tal como na douta sentença se alcança, elemento probatório da máxima importância porque ela ajuda e conduziram a uma boa decisão da causa pois traduzem a verdade que se alcança e alcançou face ao captado, e, desde logo, entendemos, afasta erradas interpretações da realidade, tal como o faz a recorrente, mais uma vez, ao considerar, erroneamente, que da imagem 1 (fotografia aérea) ínsita no Relatório Pericial a fls.. 258 se alcança que entre os prédios da Autora e dos Recorridos existe um espaço.
5. Todavia, cumpre referir que toda a referida documentação (fotografias, Relatório Pericial e seus Esclarecimentos bem como as fotografias apresentadas pela testemunha HH), pese se alcance no processo físico em preto e branco a mesma é alcançável em colorido e nos devidos formatos de PDF/JPEG - que até permitem ampliação em ZOOM-, no processo digitalizado e que é alcançável através da plataforma CITIUS.
6. Assim, dever-se-ão ter em conta tais documentos em PDF/JPEG e a cores porque são elemento essencial para a manutenção da boa decisão da causa.
7. Porque o Tribunal ad quo julgou totalmente improcedente a acção, a Autora por discordar, recorre e pretende um segundo julgamento, porque lhe desfavorável todo o petitório.
8. Todavia, alcança-se que a Recorrente pretende, não um remédio, nem remediar um erro que de facto e de Direito não existiu, mas um segundo julgamento e repetição de toda a prova produzida, pois que, no fundo, impugna toda a decisão na multiplicidade de pedidos e, sobretudo, pretende a inversão dos factos dados como não provados em provados.
9. Ora, o Tribunal recorrido, de forma cristalina, logo afirma que “A convicção do Tribunal no que diz respeito à decisão da matéria de facto baseou-se na análise e confronto de todos os depoimentos prestados em audiência de julgamento e de todos os documentos constantes nos autos.”
10. E, ao contrário do alegado, pretendido e reiterado pela Recorrente, alguns depoimentos, de algumas testemunhas, efectivamente, não foram sérios em subjectivação e falta de seriedade no depoimento porque contrários à verdade factual, alguma dela, sustentada em prova documental.
11. Diga-se, até, e tal não mereceu reparo pela Recorrente, que a expressão, ínsita na sentença “Aliás, a autora afirmou que a sua casa tinha fendas, antes dos Recorridos fazerem obras, o que claramente não corresponde à verdade.”, é sintomático da credibilidade que a Recorrente pôde transmitir.
12. Estas meias palavras são sintomáticas da credibilidade transmitida por alguns testemunhos até porque desfasados e impossíveis na sua prática.
13. Refira-se, a título de exemplo, e só de exemplo, um diálogo curto entre o signatário e a testemunha, MM, que é sintomático do conhecimento, da imparcialidade, mas podendo, de facto, ser genuíno ou original se fosse a única, pois que, imputa malévola e insconscientemente a prática de factos ao Recorrido assim como dá respostas sem perguntas,(em tempos de 00.06.54 a 00.07.27 e 00.08.01 a 00.09.0139)
14. Ora, como se alcança na douta sentença sob recurso, o Tribunal apreciou os depoimentos, deu-lhes o seu valor e a sua credibilidade, concluindo, através da mediação e da oralidade, e, algumas vezes até intervindo com reparos de aviso, daí que se alcance na douta sentença sob recurso,” Como resulta do exposto, existem contradições entre os vários depoimentos, pelo que o tribunal se socorreu da prova documental e pericial para a decisão, (…).As regras da experiência comum permitem concluir ser difícil que a autora não se tivesse apercebido da construção, tendo em conta que reside na zona, sem necessidade de ser alertada pelos vizinhos, pelo que o tribunal não deu tal factualidade como provada.”
15. Deste modo, o Tribunal recorrido, seguiu os mais basilares princípios, os da Imediação e Oralidade, pois que, “(…) os depoimentos não são só palavras; a comunicação estabelece-se também por outras formas que permitem informação decisiva para a valoração da prova produzida e apreciada segundo as regras da experiência comum e que, no entanto, se trata de elementos que são intraduzíveis numa gravação.

Por estas razões, está em melhor situação o julgador de primeira instância para apreciar os depoimentos prestados uma vez que o foram perante si, pela possibilidade de apreensão de elementos não apreensíveis na gravação dos depoimentos.”
16. Posto isto, importa agora tomar posição quanto ao alegado pela Recorrente seguindo os concretos pontos que esta indica nas suas alegações e conclusões: NÃO SEM ANTES SE AFIRMAR QUE NENHUM DOCUMENTO FOI POSTO EM CAUSA, TENDO SIDO ACEITE, INCLUSIVÈ, OS ESCLARECIMENTOS DO PERITO, DONDE, TODA A PROVA DOCUMENTAL JUNTA E APENSA AOS AUTOS FOI ACOLHIDA E ACEITE PELAS PARTES, BEM COMO AS IMAGENS FOTOGRÁFICAS, JUNTAS EM FORMATO PDF E A CORES NÃO ALCANÇÃVEIS NO PROCESSO FISICO MAS SIM NO DIGITAL, MORMENTE, NO CITIUS Referindo-se que a mesma foi apreciada em sede de audiência de julgamento. Assim,
17. A recorrente considera que os pontos P, R, GG, II, JJ e RR “foram inexplicavelmente considerado como não provado por parte do Tribunal a quo, quando só poderia ter sido considerado PROVADOS”. Vejamos,
18. Se é incontestável a existência dum espaço, tal, em seu fim e propriedade é, em parte, questionável.
19. Mas é inquestionável a existência na parede desse espaço duma janela, na sua verdadeira essência, o fecho desse mesmo espaço, a vista, a entrada e circulação de pessoas no espaço, a luz, uso do espaço, etc, pois nada disso existia nem podia existir.
20. Todavia, antes de qualquer alegação e consideração, entendemos que, para melhor elucidação e condução à verdade, facto que até e também resulta pela leitura das alegações, por indiciar ignorar-se por complecto parte da verdade existencial, torna-se necessário fazer uma descrição da realidade sustentada em depoimentos e documentos, estes, tanto em escrito como em imagens acerca do dito espaço, portinhola/janela/, cobertura e vista, e, desmistificar a adjectivaçao que se fazem a alguns depoimentos testemunhais.
21. Como se alcança nas fotografias juntas com as Contestações, mormente a da CC como docs. ... a ...2, ...2... a 17 e 19 a 39 assim como nos documentos apresentados pela testemunha HH em fls. 296-verso a 300, do processo apenso enviado pela Câmara Municipal ... e relativo ao licenciamento da obra dos Recorridos a fls. 18, 19, 255, 306, 396, 396 verso, 398 e 406, e, nas imagens 1, 2 e 3 do Relatório de Peritagem junto aos autos de fls. 257 a 270 e bem assim o dado como provado no item 15, alcançamos que tanto o prédio da autora como o prédio dos Recorridos são confinantes assim como o eram à data em que os Recorridos ainda não eram proprietários do imóvel. Alcança-se nas fotos que o prédio da Autora tinha e tem, além do rés do chão, um primeiro andar e o prédio dos Recorridos além do rés do chão tinha e tem um primeiro e segundo andares.
22. Sendo certo que “Não há paredes comuns dos prédios da Autora e do Réu, desde os alicerces até ao meio do primeiro andar o prédio do Réu é constituído por blocos de granito”, conforme facto dado como provado com o nº 36.
23. Sendo assim, o demais em altura até ao telhado que era em tabique foi substituído por tijolo de 15 assente pelo lado interno e na face interior da parede de granito com largura duns 50 centímetros e uma altura superior a 2 metros que era pertença do Recorridos(BB tempos de 00.05.42 a 00.07.11)NN (em tempos de 00.07.50 a 00.08.17)(KK (em tempos de 19.20 a 19.45 e 38.31 a 39.02)aliás, como também, tudo se alcança nas imagens 8 e 9 do Relatório de Peritagem a fls. 257 a 270 e fotografias como docs. ...2... a 12-G e doc. nº ...0 fls. 2, 3 e 5 juntas com a Petição Inicial. Dai que,
24. .Como se alcança na resposta do Perito, que elaborou o Relatório da Peritagem, ao pedido de esclarecimento formulado pela Autora, e enviado ao Tribunal, junto a fls. 286 com o devido esclarecimento:
 “b) O perito deslocou-se ao Tribunal Judicial para análise das fotografias invocadas no pedido de esclarecimentos, as quais não são da sua autoria. O espaço existente entre as duas paredes, cujo afastamento medido pelo perito se situa entre 15 a 30 cm, localiza-se no primeiro andar. O perito entendeu que a discussão sobre o eventual avanço se restringe ao nível deste piso. Ao nível inferior, no r/c, conforme ilustrado nas Imagens 8 e 9 do Relatório de Peritagem, as paredes chegam mesmo a encostar-se, efetivamente.”
25. Para, ainda declarar em esclarecimento datado de 23/12/2021, conforme dos. a fls.. 285 a 286 e 278 a 279verso, que: “Na qualidade de perito relativamente ao processo supra indicado, dando cumprimento ao despacho de V. Ex.a ref.ª ...39, desloquei-me novamente à habitação dos RR com vista à medição requerida pela Autora do armário embutido cuja fotografia já havia sido enviada nos anteriores esclarecimentos datados de 21/10/2021. Na referida segunda inspeção pericial compareceram os Ilustres Mandatários do processo que assistiram à medição, concluindo-se que o armário embutido possui uma profundidade de cerca de 0,32 metros, uma largura de 0,73 metros e uma altura de cerca de 1,73 metros. Com a presente medição, o perito mantém o entendimento desenvolvido no Relatório de Peritagem bem como nos esclarecimentos datados de 21/10/2021, nada mais tendo a acrescentar.”
26. Logo, assim, se deve concluir que, se as paredes de granito da autora e Recorridos se chegam mesmo a encostar no rés do chão tal pressupõe que se as mesmas paredes se estendessem na vertical o espaço entre as mesmas continuava, mas, como a parede da Autora, como se alcança na imagem nº 9 do Relatório de Peritagem e em docs. ...0 a fls. 1 e 2 juntas com a PI e docs. ...2... a 12-G juntas com a Contestação e a fls. 255, 306 do Processo Administrativo de Licenciamento de Obra não apresenta qualquer saliência nem relevância, aliás, nem foi tocada para qualquer fim, nem, alguma vez a Recorrente, a tal se manifestou, logo toda a parede do imóvel da Recorrente, confinante com o imóvel dos Recorridos, está complecta e na vertical, e, a dos Recorridos que era em tabique assente na beira interior da parede de granito e a mesma foi substituída por tijolo assente também pelo lado interior da habitação, logo se deve concluir que o espaço, dito, sorreira, espaço existente entre os imóveis da Recorrente e Recorridos, em grande parte, é dos Recorridos pois que, como declarado pelo Sr. Perito, o Recorridos têm encrustado nessa parede um armário com a profundidade de 0,32metros.
27. Aliás, se se alcançar na imagem a fls.. 297, apresentada pelo Engº HH, e que foi tirada no ano de 2005 logo se alcança, numa abertura, a parede dos Recorridos que ao tempo era de tabique e nas imagens 8 e 9 a páginas 8 do Relatório Pericial a fls. 257 a 270, agora, a tijolo, o que denota semelhança em espaço entre as paredes
28. Como o declarou o Recorrido BB, demoliram as paredes em tabique e construíram paredes em tijolo de 15 assente na base interior das paredes de pedra que tinham em largura por volta de 50 centímetros, donde, no seu pensar, até, a parte restante, não ocupada pelo tijolo e que faz parte do espaço que se alcança entre os imóveis das partes, deve ser dele, como se alcança,(tempos de 00.05.29 a 00.07.1144)
29. E, a testemunha KK, que além de Director de Obra foi o autor do projecto, questionado, que as paredes ao nível do rés do chão eram em granito até uma altura superior a 2 metros. E, como não podiam mexer na pedra por determinação do IPAR, teve de elaborar um plano para a construção, dai que construíram as paredes em tijolo assente na berma interior das paredes que existiam em granito que não retiraram, e eram pertença dos Recorridos(em tempos de 19.24 a 19.45, 22.15 a 23.58 e 36.24 a37.4845)
30. E, já agora, se se ponderar visualmente as distâncias entre as paredes, mormente através da consulta das fotografias a fls. 297 e imagens 8 e 9 no Relatório Pericial junto a fls.. 257 a 270, alcança-se que o espaço do antes das obras é semelhante ao após obras e que a parede da Recorrente que confina com o prédio dos Recorridos, prolonga-se na vertical conforme se alcança nas fotografias juntas a folhas 255, 306 e 396 e 396 verso do Processo Administrativo de Licenciamento, apenso com os presentes autos, conforme documentos nº ...0 a fls.. 1 e 2 juntos com a Petição Inicial, e, documentos ..., ..., ...2... a 12-J juntos com a Contestação e imagem 9 do Relatório de Peritagem junto a fls.. 257 a 270 dos autos.
31. Ora, na parte superior, essa mesma parede, é chapeada com chapa de zinco ondulada.
32. E nessa chapa de zinco encontram-se outras chapas que fazem uma rampa de descarga para o interior e prédio dos Recorridos, e, se verifica e alcança que o telhado dos Recorridos termina sob a dita chapa de zinco e por baixo da rampa, docs. a fls.. 396 e 396 verso do Processo de Licenciamento apenso com os autos, imagens 4, 6, 12D a 12G, 12J juntas com a Contestação e ainda as imagens 10 a fls. 1 e 2juntas com a PI, e, ainda, fls. 249, 255 e 306 do Processo Administrativo do Licenciamento junto aos autos. Como, também o declarou a testemunha e Recorrido BB (tempos de 00.38.38 a 00.39.3446)HH (tempos de 14.05 a 00.16.45 e 00.29.56 a 30.27)KK (tempos de 39.18 a 44.48, 77.21 a 78.24 e 78.52 a 81.33
33. Daqui resulta que a parede da Autora que confina com o imóvel dos Recorridos, marca o limite da sua propriedade e sobretudo o seu telhado, tanto que é, também, a própria testemunha arrolada pela mesma Autora, ora Recorrente, Engº HH, quem o declara.
34. E, é declarado pelo ARQº KK que o telhado dos Recorridos vai até à parede da Recorrente e termina sob a chapa em rampa que está unida à chapa ondulada.
35. Deste modo resulta que o espaço, dito sorreira, está coberto com o telhado dos Recorridos.
36. Ainda, que o espaço, dito de sorreira, com a largura referida pelo Perito, coincide com o espaço que os Recorridos continuaram a deixar quando da substituição da parede de tabique por tijolo, até porque, como se alcança das declarações da testemunha KK, quando foi ao prédio da Recorrente, no ano de 2005, fotografou o espaço e nele só meteu a cabeça porque só esta lá cabia,(conforme em tempos de 49.52 a 50.20, 82.33 a 82.37 e 84.06 84.12)
37. Ainda como patente na imagem 9 a Páginas 8 do Relatório de Peritagem a fls.. 257 a 270 e se alcança na imagem enviada pela testemunha Engº HH e que constam nos autos a fls.. 296 a 300.
38. Mas, em tudo se alcança que o espaço entre os prédios da Recorrente e Recorridos, estão e sempre estiveram fechados nos topos e na superfície conforme se alcança nas fotografias, documentos ... a ...1 juntos com a Contestação que respeitam a antes das obras e fotografias como documentos ...3, ...4, ...9 a ...2, ...5, ...8, ...1, ...4 a ...6 depois das obras.
39. E de fácil constactação que nunca ao espaço foi retirada qualquer luz porquanto nunca a teve, tal como se alcança nas fotografias que foram juntas pela testemunha Engº HH e que foram obtidas do imóvel da Autora quando numa deslocação da testemunha OO ao seu imóvel no ano de 2005 (declarado pela Recorrente nas suas declarações em tempos de 00.18.1447) a fim de fazer um levantamento para posterior elaboração de projecto para obras a realizar pela Autora no seu imóvel, e, a testemunha da Autora, GG que afirma lá se ter deslocado e tudo estar muito escuro, de tal forma que se não fosse o filho da Recorrente a o informar, ele não sabia que aquele espaço abrangia a largura do imóvel, (conforme em tempos de 00.02.42, 00.10.38 a 00.10.4248) 40. Refira-se ainda que no primeiro andar do prédio da Autora existia e ainda existe a cozinha que do seu lado sw confronta com a casa dos Recorridos, conforme declarações de NN (em tempos 00.02.33 e 00.02.38) e Arqº KK(em tempos de 00.09.11 a 00.09.5050), bem como a Recorrente nos artigos 22º e 23º da PI
41. Nessa cozinha na parede que confina com a parede dos Recorridos, existe uma abertura, acima alguns centímetros do chão, é como se fosse uma janela com aduelas pintadas a cor azul, como se alcança na imagem 8 a fls.. 8 do Relatório de Peritagem a fls.. 257 a 270 dos autos, e, fls.5 do doc. ...0 junto com a PI, imagem obtida após a realização das obras pelos Recorridos, bem como se alcança, ainda, na imagem a fls.. 297 que foi uma imagem obtida pela testemunha Arqº KK mas junta aos autos em 06/07/2022 com a referência ...24 pela testemunha Engº HH, imagem que foi obtida antes das obras dos Recorridos.
42. Abertura essa que a Recorrente tanto diz que se tratava duma entrada, como duma despensa e até como janela, e que por ela entrava para o espaço que existe entre os prédios da Recorrente e Recorridos mas…. pela janela, aquela que é alcançável em doc. ...0 a fls.. 5 junta com a PI e 297 dos autos, (como se alcança em tempos de 00.02.53 a 00.03.23, 00.04.07 a 00.05.1951),
43. Já a testemunha MM, de forma expedita, que responde sem que lhe sejam feitas perguntas, responde que foi ao imóvel, uns 6 meses antes de depor como testemunha da Recorrente, a pedido desta, para confirmar a existência duma portinhola, só que ela não estava porque tinham sido os Recorridos a retirá-la. Ou seja, TODOS esqueceram-se que no ano de 2005, quando da deslocação da, também, testemunha Arqº KK numa deslocação ao imóvel ao serviço do Engº HH, a mesma já não existia como se alcança na foto então pelo Arqº KK obtida e junta a fls.. 297.(em tempos de 00.02.17, 00.03.30 a 00.03.52 e 00.08.01 a 00.09.37)
44. E, a testemunha JJ, que tinha ideia do espaço porque lá tinha ido recentemente, com o seu amigo que é o filho da Recorrente, tendo como causa os presentes autos. Contudo já lá tinha ido uma vez, não disse quando, mas que entrou num espaço por uma porta. Mas, por incrível que pareça, esta testemunha, que tinha ido, declarou, ao imóvel da Recorrente há cerca de 2/3 semanas antes do seu depoimento, declarou que percorreu todo o imóvel, mas não viu que o mesmo não tinha vidros nas janelas, e, curiosamente, mais disse que foi afrontado por pombos, apesar, de, como declarou, estar tudo escuro por falta de luz devido a estarem fechadas as portadas. (como se alcança das suas declarações em tempos de 00.0051, 00.03.57, 00.04.14 a 00.04.48, 00.05.17, 00.13.53 a 00.14.24 e 00.09.37 a 00.102552)
45. Já por sua vez a Testemunha DD, categoricamente, declarou que no imóvel dos autos e propriedade da Recorrente, só esteve 2 vezes, sendo a primeira no ano de 1999 e a última na quarta-feira da semana em que prestou depoimento. Mais declarou, pasme-se, e aqui se afere da credibilidade das testemunhas, que a primeira vez foi no ano de 1976 ou 1977 e com o filho da Recorrente, facto impossível face ao declarado pela Recorrente no que tange à aquisição do imóvel uma vez que a mesma declarou em tempos de 00.00.56 das suas declarações, que “Este imóvel comprou o meu marido em 83.”. Mas, não fica por aqui, pois, declarou que em “noventa e tais” lá foi, altura em que os Recorridos tinham iniciado as obras, e então, “meteu a cabeça” no espaço entre os prédios da Recorrente e Recorridos, todavia, dizemos nós, as obras só foram licenciadas no ano de 2012 e nunca às mesmas se deu inicio antes do licenciamento. Mas, diz, o espaço entre os imóveis, era um espaço de ventilação dos imóveis.(como se alcança em tempos de ...0....2....8, ...0....6....0 a ...0....6....6, ...0....8....2 a ...0....8....1, ...53)
46. Já a Testemunha FF, filho da Recorrente e aquele que acompanhou algumas testemunhas ao imóvel para fins que se não alcançam, logo com interesse na causa, declarou que entrava através duma “portazinha” no espaço entre os imóveis e os ombros não tocavam nas paredes, sendo este espaço coberto pelo telhado do prédio da Recorrente, todavia, este espaço servia de ventilação aos prédios, (conforme em tempos de 00.00.38 a 00.00.4554)
47. Ora, face ao demais já carreado, se, quando em 2005 o Arqº KK se deslocou ao imóvel da Recorrente e só conseguiu meter a cabeça no espaço entre os imóveis das partes, e, se se já mostrou que a cobertura desse espaço era feita pelo telhado dos Recorridos, até alcançável pelo documento a fls. 249, 255 e 397 do Processo Camarário, não se concebe, como alguém poderia circular entre os imóveis, entrando pela “janela/portinhola/” quando, como se alcança nas imagens nºs 10 1 e 2, se alcança essa abertura na parede da Recorrente e não se alcança sustentação para que alguém possa por essa abertura caminhar.
48. Tanto mais que, segundo a Testemunha GG, que conhece a recorrente por esta ser a mãe do seu amigo, declarou que a “janela baixa, janeluco ou portinhola” mais não era senão uma despensa. Mas, curiosamente, declarou que entrou no espaço entre os imóveis da partes mas ficou a saber que aquele espaço “dava duma ponta à outra da casa, (Impercetível) das costas da casa,” porque o filho da Recorrente lho tinha dito. Ainda, esta testemunha, tem um depoimento tão categórico que à pergunta se sabia para que era usado o espaço respondeu “ Ao entrar via-se uma porta de madeira, ou assim do género, do lado esquerdo, que era tipo um móvel, se calhar, não sei, supostamente devia ser para pôr os presuntos ou coisas do género.” Curiosamente, para guardar presuntos, que não se sabe se eram os mesmos que a testemunha, filho da Recorrente FF declarou quando na prestação das suas declarações a tempos [00:04:04] Testemunha – Desse surreiro. Do lado direito tinha um armário em madeira, que era usado tipo despensa. Depois até tinha lá um… Nesse espaço tinha lá tipo umas vigas, que tinha lá uns ferros pendurados que era onde penduravam o presunto, o fumeiro. 55Ainda, curiosamente, a credibilidade e isenção desta testemunha pode ser aferida pela dúvida constante que manifesta nos seus diálogos, (como se alcança em tempos de 00.00.23 a 00.00.33, 00.01.47 a 00.03.54, 00.08.39 a 00.13.1256)
49. Ao invés a Testemunha NN, que declarou que a dita “janela/portinhola/porta” era um louceiro, lugar onde se guardavam umas “coisas” como sendo panelas ou coisas típicas, e, que não era nem tinha nenhuma passagem para qualquer lugar, donde, muito menos, para o espaço que mediava entre os imóveis da Recorrente e Recorridos.(como se alcança em tempos de 00.05.24 a 00.06.3857)
50. Por fim a testemunha KK, perfeitamente conhecedora de toda a situação, que além de isenta, verdadeira, com depoimento verdadeiramente elucidativo, não só por ser conhecido e amigo das partes como por às mesmas ter prestado serviços de Arquitectura, e mais adiante se aflorará, que, confrontado com a imagem 9 do Relatório Pericial, logo declarou que o tijolo que se alcança está assente na pedra que é a parede dos Recorridos.(conforme se alcança em tempos de 35.51 a 39.02, 84.18 a 84.4358) o que provocou na MMª Juiz uma expressão de desalento por inutilidade em perda de tempo.
51. Esta testemunha, quando confrontado com a fotografia junta como doc. ..., 12E e 12F, declarou que a chapa que se alcança está na propriedade da Recorrente e lhe estar a servir de revestimento da parede. E, mais declarou que a chapa em rampa que se alcança na mesma e que reveste a parede, ía cair em cima do telhado dos Recorridos pois que, declarou “O telhado do senhor BB encastrava aqui por baixo para, para que... para que não entrasse humidade na zona da surreira.”, acrescentando que mais uma razão para ser dos Recorridos, é devido ao facto do sorreiro estar sem telhado porque o dos Recorridos foi destruído para a realização das obras, o que se alcança. Mais declarou que entre os imóveis da Recorrente e Recorridos havia uma caixa de ar de permeio que deveria fazer a ventilação de ambos os imóveis, o que nos tempos de hoje não é feito, (como se alcança em tempos de 39.18 a 44.51 e 78.82 a 80.27e 83.47 a 84.1859)
52. Ainda, foi confrontada com o documento a fls.. 237 (documento enviado ao Tribunal pelo Engº HH) e que por ele foi fabricado, tendo contado a forma como o obteve bem como os demais lhe apresentados. Referiu, quando na instância da MMª Juiz que as fotos são do tecto da surreira e para isso meteu a cabeça por uma abertura que havia na cozinha, que só podia ser a tal e falada portinhola/janela/porta que o mesmo afirmou e repetiu ser um nicho, nicho que era um armário, encastrado na parede (Como se alcança em tempos de 45.30 a 52.0060)
53. Mas, esta mesma testemunha, quando até interpelada acerca da limpeza do espaço de permeio, o mesmo referiu que era um espaço de ventilação, e acrescentou que não era necessária qualquer limpeza porque aquele espaço não é habitável e era impossível limpá-lo, tendo como único propósito as habitações não terem humidade, ao invés do que se faz hoje em que é deixada uma camara de ar por baixo da casa (como se alcança em tempos de 82.53 a 84.1861)
54. Deste modo o espaço entre os prédios da Recorrente e Recorridos, temos que as declarações prestadas quanto ao seu tipo, dimensões e utilidades, foram dispares.
55. É inquestionável que o espaço, que efectivamente existia e existe entre os imóveis nasce na sua base, e na sua perpendicular sem obstáculo, assim como se alcança dos documentos juntos com a PI nºs 10 fls.. 1 e 2 como com as fotografias juntas aos autos com a Contestação e sob documentos nºs ... a 12J.
56. Assim, entre os prédios da Recorrente e Recorridos, há um espaço, facto que já anteriormente sucedia porque sob a parede dos Recorridos foi assente tijolo em substituição do tabique que ambos estavam e estão assentes na berma interior da parede, como se alcança no Relatório Pericial em imagem nº 9 e é referido pelo Sr. Perito em Aditamento e Esclarecimento junto aos autos a folhas 278 a 279verso e 285 a 286 e pela testemunha Arqº KK, e, sobretudo, é lógico.
57. Deste modo, entendemos, os itens P, R, GG, II, JJ, e RR dados como não provados, tal o deverão continuar a ser, bem como os pontos H, I, M, HH, CC, MM e PP.
58. Vem a Recorrente, pese não o tenho levado às Conclusões, que o item “H” dos factos dados como não provados deveria ter sido dado como provado.
59. O Tribunal discorreu na Douta Sentença, no que tange à fundamentação deste tema, que:“As regras da experiência comum permitem concluir ser difícil que a autora não se tivesse apercebido da construção, tendo em conta que reside na zona, sem necessidade de ser alertada pelos vizinhos, pelo que o tribunal não deu tal factualidade como provada.”
60. Com todo o respeito que o Tribunal merece e mesmo assim a Recorrente, mas o Tribunal foi brando demais. Pois que,
61. Pretende que o Tribunal aceite que só teve conhecimento que “(…) o réu com a sua obra ocupou parte da fachada e do telhado da casa da autora(…) porque foi informada por moradores do bairro.
62. A testemunha PP, além de declarar que vive no mesmo prédio que a recorrente, porquanto ela reside no ..., logo declarou que vive em frente do imóvel dos autos e via tudo quanto na obra se passasse. Assim, quer dizer, que a Recorrente podia e via o mesmo. É que, também, a testemunha declarou que a Recorrente nunca se ausentou da sua residência (tudo como se alcança em tempos de 06.14 a 07.5962)
63. E a própria Recorrente AA declarou que sempre acompanhou a obra (Em tempos de 00.10.33 a 00.10.3563)
64. Tanto acompanhou a obra que, além das reclamações, juntou aos autos fotografias da construção, como sejam as juntas como documentos ...0 fls. 1, 2 e 3.
65. E apresentou inúmeras reclamações de vário teor junto da Câmara Municipal ..., por escrito e oralmente, sendo que algumas constam e outras são referidas no processo Administrativo apenso aos autos, de tal sorte que a testemunha LL, por isso ter ordenado e ter feito várias vistorias à construção dos Recorridos(Em tempos de 00.03.00 a 00.04.0264)
66. Do exposto resulta, inquestionavelmente que os factos identificados com as letras ... e ... devem continuar a ser dados como não provados.
67. Insurge-se, ainda, a Recorrente, conforme suas conclusões XXXVIII a XLIV, no facto de, no seu entender, lhe ter sido ocupada a fachada e o telhado do imóvel.
68. Pese se entenda e aceite a subida das cotas, a verdade é que a varanda está como estava, até porque, a tal estava obrigado, como se alcança e extrai do documento junto a fls. 53 e 52 do Processo Administrativo enviado pela Câmara Municipal ... e que se encontra apenso aos presentes autos.
69. Tal documento, emitido pela Direcção Regional de Cultura do Norte do Ministério da Cultura, referente `”Reconstrução de uma edificação destinada a habitação unifamiliar sita no ... nº 18, Freguesia ... em ...”, com indicação de “..., incluindo os restos de muralhas militares existentes na cidade e os ... e de ..., M. N. Decreto nº 28536 de 22/03/1938, depois de apreciado o projecto e reconstrução, conclui em:
“3. Conclusões:
Da análise dos elementos apresentados, somos de parecer que não é aceitável a alteração da varanda balançada existente, devendo promover-se a reconstituição do seu desenho original, contemplando-se o respeito pelos respetivos sistemas construtivos. No que respeita à composição dos alçados deverá ser respeitada a proporção da dimensão dos vãos de modo a valorizar o equilíbrio no conjunto.”
70. Tal conclusão permite alcançar, sem mais, que a varanda deveria ser reconstruída nos seus precisos termos e em conformidade com a anterior.
71. Por isso o Recorrido BB, declarou que a varanda foi reconstruída conforme lhe determinado e estava anteriormente. Reconhece que a caleira está um pouco a sobrepor o cunhal, mas tal deveu-se a proteger os edifícios das chuvas no sentido das águas serem canalizadas directamente para o chão.(conforme se alcança em tempos de 00.04.38 a 00.05.14 e 00.37.59 a 00.38.3265)
72. E a testemunha GG, que se bastou na remissão para um relatório fotográfico, manifestou conhecimento de que a Recorrente, num passado e antes das obras, nunca se tinha manifestado quanto à situação da varanda (conforme tempos de 00.06.33 a 00.07.19, e 00.14.00 a 00.14.3366)
73. Por sua vez a testemunha LL, responsável pelo projecto da obra junto da Câmara Municipal ..., ao contrário do que se pretende fazer crer em sede de motivação do recurso, mas esta testemunha prestou declarações por videoconferência, e, como é bom de supor não tem nem tinha nem pode ter pormenorizadamente presente um acontecimento que acompanhou há alguns anos sem interesse pessoal e dai, qualquer conclusão negativa que se possa fazer face ao seu depoimento é uma conclusão de intenção negativa por se querer desviar da realidade que é o confronto documental. Todavia a mesma confirma o antes declarado pelo Recorrido no que concerne à obrigatoriedade de reconstruir a varanda como antes, e, não ocupa a largura toda da fachada do imóvel da Recorrente, mas sim, o beiral que vai um pouco mais longe, (Tudo como se alcança em tempos de 00.08.41 a 00.09.08 e 00.22.27 a 00.24.3867)
74. E, a sobreposição do beiral da varanda sob o cunhal foi, também, em consonância com a Arqª LL, declarado pela testemunha QQ (que em tempos de 00.14.06 a 00.14.3668) de que há, sim, uma pequena sobreposição do beiral sobre a fachada.
75. Mas, não se pode esquecer o que o Autor do Projecto Arqº KK claramente declarou que a varanda aumentou em volume e a mesma apresenta-se hoje como antes, (Conforme em tempos de 88.13 a 89.30)
76. Face à prova produzida, entendemos que os itens dados como não provados, no mesmo devem continuar a ser decididos, pois que a Recorrente não mostrou prova que insofismavelmente venha contrariar o doutamente decidido.
77. Ainda, entende ainda a Recorrente que os itens K, U, FF, SS e TT, foram inexplicavelmente dados como não provados, mormente, quanto a corte do telhado e das cornijas.
78. Teimosamente, e, como se defenderá, imbuída de má-fé, a Recorrente persiste na invocação de danos sendo, em tal é acompanhada pelo seu filho FF e, em especial, por um seu amigo DD, (que se deslocou ao imóvel nos anos 90 uma vez e a outra foi na semana anterior a ir depor).
79. Teimosamente, dizemos, porque o douto Tribunal foi perfeitamente esclarecedor na decisão tomada na matéria impugnada, aliás, foi dado como provado, item 48 dos factos dados como provados, e, não impugnado, que “48. O telhado do prédio da Autora tinha, antes das obras realizadas pelo Réu, desde a claraboia até ao beiral confinante com o prédio do Réu, 12 fileiras de telha, fileiras de telhas que se mantêm.”.
80. Mesmo assim continua a alegar que o corte do telhado e cornijas é alcançável pelos documentos nºs ... e ...0 a fls. 1 a 3 juntos com a PI e pelo acolhimento do seu depoimento, do seu filho e dum familiar RR.
81. Ora, na documentação referida, mormente o documento ...0 a fls.. 1 e 2, que se alcance, não se divisam as cornijas, e, quanto ao telhado muito menos, pois que, mostram, sim, e só, o limite da propriedade da Recorrente, contudo, não deixa de ser relevante a junção dessas fotos para logo afastar a aceitação das declarações prestadas pela Recorrente no que concerne a lhe ter sido cortado o telhado da sorreira, porquanto o telhado do seu imóvel tão só é alcançável no doc. ...0 fls.. 1 e 2 juntas com a PI e ainda no documento a fls. 397 que são duas fotografias do antes e depois da obra dos Recorridos e que consta no Processo de Licenciamento da Câmara Municipal ... e apenso com os presentes autos.
82. A Recorrente é e foi useira e vezeira em declarar o que declara e apresentar queixas e mais queixas junto da CM ... sobre o assunto e os serviços camarários a nunca lhe darem razão, conforme se alcança no Processo de Licenciamento apenso junto aos autos a, por exemplo, fls.. 394, 385.
83. Diga-se ainda que o tema foi profundamente debatido entre a MMª Juíza, personificando o Tribunal, e os mandatários da Recorrente e o mandatário dos Recorridos, na análise pormenorizada e profunda da vasta prova documental.
84. Diga-se ainda que, o alcance no doc. ...0 a fls.. 3 junto com a PI foi comparado com a imagem 39 a fls.. 25 do Relatório de Peritagem e se conclui que o alcançado é a caleira.
85. Contudo, a Recorrente, teimosamente, invoca sempre o mesmo, pese em muito já tenha sido informada e categoricamente esclarecida mas que não aceitou os esclarecimentos, como se alcança, além do constante nos documentos a fls.. 409 e 411/413, o declarado, em especial, pela testemunha Arqª KK (em tempos de 58.28 a 58.53 e 88.01 a 88.0469)que é categórica em afirmar que não foram cortadas as cornijas, e, que, aliás, tal junto da Recorrente e do seu filho, mostrou-lhes por “A+B” mesmo com recurso a ZOOM que as cornijas não haviam sido cortadas, sempre secundados pelo Recorrido SS TEMPOS DE 00.03.00 A 00.03.1570)pelaArqª TT VIDEIRA(em tempos de 00.10.18 a 00.19.45, 00.28.39 a 00.30.0371) e pelo Arqª UU(em tempos de 00.33.35 a 00.35.1472)
86. Assim, se dúvidas ainda houvesse, entendemos que as mesmas são afastadas, até porque todas as declarações foram prestadas por profissionais especializados nas matérias e não se limitaram a olhar para os objectos e logo, duma só vez, tirar conclusões., e, não são relacionáveis, pois que o Arqº KK, amigo das partes, à Recorrente e ao seu filho VV, anteriormente à prestação de declarações nos autos e em especial na diligência de audiência de julgamento, com os mesmos já tinha reunido, informado e esclarecido, donde, entendemos, dúvidas não há nem pode haver, desde que se queira.- O Arqº UU, foi suficientemente esclarecedor que, apear da Recorrente estar devidamente informada da não razão sobre o que reclama, a verdade é que é e os serviços também o são, impotentes para impedir que a Recorrente continue junto dos serviços camarários da C. M. ... de apresentar reclamações.- A Arqª LL, que clara e compreensivelmente esclareceu que as cornijas não foram cortadas.- E, o Recorrido que logo esclareceu que ninguém “mexeu naquilo”.
87. Face ao ante exposto, dúvidas não restam senão confirmar que os itens ou pontos identificados por K, U, FF, SS, e TT devem continuar a ser dados como não provados.
88. ACRESCE, que a Recorrente entende, ainda, que os itens S, Z e AA deviam ter sido dados como provados “(…) atento o teor do depoimento das várias testemunhas e prova documental e pericial (…)”
89. Assim, motiva que existem fissuras no prédio de que é proprietária, provocadas pela obra dos Recorridos, invocando para tal o testemunho do seu filho VV e da testemunha, amigo do filho, GG, invocando os documentos, imagens, com os nºs 16 a 23 e 25 a 34 do Relatório Pericial.
90. Refira-se desde já, sem prejuízo de se vir a repetir nesta peça, que a Recorrente, pese tenha visto uma advertência na sentença ora recorrida, “(…) a sua atuação nos autos raia a litigância de má fé, embora ainda se consiga admitir que a mesma não atuou com dolo ou negligência grave, por se acreditar que estava convencida de que ocorreu a violação do seu direito de propriedade e pretendeu através desta ação ver resolvida a situação que não conseguiu resolver junto da Câmara Municipal.” isto ao tempo, no hoje persiste nos seus propósitos e utilizando os mesmos termos e meios com acréscimo nesta fase processual, e,
91. Sem fazer introspecção, para não dizer mea culpa, do sentido da frase “Aliás, a autora afirmou que a sua não tinha fendas, antes dos réus fazerem obras, o que claramente não corresponde à verdade”(última linha de fls 28 e primeira e segunda linha de fls 29 da sentença. Mas,
92. No que tange a este tema, foram inquiridas além da Recorrente, o seu filho e um amigo do mesmo, que, curiosamente, alegaram, além do suporte de prova documental, como sejam as imagens 16 a 23 e 25 a 34 do Relatório Pericial, a AA que queria renovar o imóvel dos autos e por isso solicitou os serviços do Engº HH tendo este enviado ao imóvel o Arqº KK que obteve umas fotografias, e, que as obras levadas a cabo pelos Recorridos, abriram fendas no seu imóvel, fendas estas que não existiam, FF, declarou, que depois das obras notou bastantes alterações nas fissuras, GG, declarou, incertezas, pois que, quando confrontado se o imóvel tinha algumas fendas nas paredes, o mesmo respondeu que não se via tanta coisa, mas, agora, POSSIVELMENTE existem.
93. Atente-se que o imóvel, propriedade da Recorrente, composto por rés do chão e primeiro andar, desde o ano de 1998/1999 que está devoluto de pessoas mas só no rés do chão é que, supostamente, lá é guardado material de ginásio do filho da Recorrente AA, VV, conforme declarado por aquela (em tempos de 00.26.23 a 00.27.0873)
94. Parte do seu interior, cozinha que se situa no ... andar e é a parte do imóvel confinante com o prédio dos Recorridos, no ano de 2005 apresenta-se como se alcança na foto a fls.. 297 que foi apresentada pela testemunha Engº WW, foto essa que, conforme declarado pela Recorrente, foi obtida pela testemunha Arqº KK aquando duma deslocação ao imóvel a fim de elaborar um projecto tendente a renovar o imóvel, conforme supra se deixou expresso das declarações que a Recorrente AA prestou em audiência.(tempo de 00.17.52 a 00.18.1474) e se se observar a fotografia a fls. 297 com as fotografias juntas pelos Recorridos e a docs. ... a ...1 juntas com a Contestação, fotografias essas obtidas antes da compra pelos recorrentes do imóvel, hoje sua propriedade, sendo patente no imóvel dos Recorridos um dístico de publicidade para venda, observamos que o imóvel da Recorrente, ao tempo, já estava muito, mas muito degradado em especial o seu exterior, E, essa degradação é perfeitamente visível a olho nu, porquanto se alcançam as manchas nas paredes, as caleiras desfeitas com ferrugem, portas sem vidros e sobretudo, todo o imóvel com ar de total abandono.
95. E se se observar o doc.... junto com as Contestações (escritura) alcança-se que a compra e venda por parte dos Recorridos do imóvel sua propriedade, ocorreu em 23/08/2010 e se se alcançar os documento ... junto com as contestações, verificar-se-á que a renovação do prédio dos Recorridos ocorreu no ano de 10/09/2012, e, pelas fotografias juntas como documentos nºs ... a ...7, ...9 a ...9 juntas com a Contestação confirma-se o continuo estado degradativo do prédio da Recorrente, chegando ao que se mostra no Relatório Pericial, e, sem esquecer, a imagem obtida no ano de 2005, de parte da cozinha, imagem a fls.. 297 onde se alcança o péssimo estado das paredes (curiosamente a confinada com o imóvel dos recorridos) e de todo o mais envolvente.
96. Contudo e ainda, deve ter-se em atenção a dedicação dada ao imóvel que não é nenhuma pois que nas fotos 37 a 39, com aplicação de zoom o que se alcança é que, ainda, o imóvel está a ser utilizado como pombal, de forma voluntária, porque se assim não fosse, até, teria, de bom senso, sido eliminado o “decór” que se alcança na imagem nº 5 em doc. ...0 junto com a PI
97. Refira-se ainda, a coragem da Recorrente é tanta que, invoca a imagem com o nº 16 do Relatório Pericial (junto a fls. 257 a 270 dos autos) para mostrar a degradação na parede frontal, imagem obtida em Julho do ano de 2021, quando a mesma situação já se verificava no ano de 2005, conforme se alcança na fotografia junta a docs. ... a ... pelos Recorridos com a Contestação.
98. As imagens com os nºs 17 e 21 são parte do tecto junto da claraboia que fica bastante distante da parede confinante dos Recorridos, conforme se alcança na imagem nº 1, 39 e ainda nas fotos a docs. ... a ..., ...3, ...4, ...6, ...9, ...1, ...2 e ...5 apresentadas pelos Recorridos com a Contestação e juntas a fls, atente-se que no próprio Relatório Pericial, logo a fls.. 11 é dito pelo Sr. Engº Perito que “Na inspeção pericial constatou-se a existência de fissuras e fendas em várias paredes com diferentes localizações na casa da autora, entre as quais as paredes que confinam com a casa dos Recorridos, bem como em tetos e no pavimento da entrada do edifício.”75
99. Acresce, para aferir a falta de sensatez da recorrente, referir, que invocar o estado degradante em que se encontram as demais divisões do imóvel, como sejam quartos de dormir e salas (imagens de 16 a 28 e 30 a 37, e como se apresentam tenham como causa os trabalhos no imóvel dos Recorridos, é ofensivo e ainda deplorável de que os danos são provenientes da obra levada a cabo pelos Recorridos juntando para o efeito a imagem documento ...0 fls. 4 mas também identificada como 5, em que se alcança a porta do nicho, parte dum tronco de pinheiro e….. dejectos de aves …. Pombos…. animais esses alcançáveis nas fotos obtidas depois das obras e apresentadas pelos Recorridos como documentos ...7, ...8 e ...9 juntas com a Contestação a fls.
100. Ainda, para aferir o estado do imóvel da Recorrente antes das obras, basta avaliar o seu estado com base nas fotos juntas com as Contestações como docs. ... a ...2 referentes a antes das obras, docs. ...3 a ...7 durante as obras e docs. ...9 a ...9 depois das obras.
101. Ainda, basta ampliar por efeito de ZOOM as fotografias e alcançar-se-á o estado degradante das caleiras e a falta de condutas das águas das chuvas para o solo, e, alcançar-se-á ainda, no que resta das caleiras que as mesmas estão além de podres e irregulares, cheias de ervas e outros dejectos.
102. E, para culminar a desfaçatez da Recorrente ainda vem concluir que “(…) sente sofrimento e angústia ao ver o seu prédio descaracterizado, alterado e a degradar-se por causa dos factos praticados pelos Recorridos.”
103. Mas mais é preciso quando, já antes, muito antes, em data que se não alcança mas que foi supostamente antes de 2012, depois de “algumas reclamações telefonicamente e por escrito” feitas pela Recorrente à Câmara Municipal ..., à mesma reivindicava responsabilidades por, quando na realização de obras de beneficiação do Largo ..., foram efectuadas intervenções no solo que causaram “ alteração na estrutura do edifício, havendo um deslocamento de um dos pilares da casa, fazendo com que a estrutura cedesse. Essa cedência do pilar fez com que a casa tenha rachado em vários locais.”. , conforme se alcança no documento a fls.. 391 verso do Processo Administrativo de Licenciamento, que se encontra apenso com os presentes autos e que merece a devida e cuidada atenção.
104. Assim, tudo ponderado, não deve merecer decisão de provado o pretendido pela Recorrente, concretamente dar-se como provado os itens S, Z, e AA:
105. A Recorrente entende ainda que os itens dados como não provados e identificados pelas letras ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., foram inexplicavelmente considerados como não provados.
106. As preocupações da Recorrente não começaram, ao contrário do que pretende que se aceite, no ano de 2016, pois que, se de facto a Recorrente sofre de transtornos e preocupações tal há muitos anos se verifica mas não tendo como causa qualquer conduta dos Recorridos.
107. Não pretendem os Recorridos é, serem “bodes expiatórios.” até porque os lamentos de agora já se manifestaram, também, em …. Quando numa exposição à Câmara Municipal ... atribuindo-lhes responsabilidades por obras levadas a cabo pelo Município no Largo ...., conforme exposição/reclamação que a Recorrente ao tempo enviou.
108. Alega a Recorrente que toma medicação para dormir, mas logo a testemunha DD, declara que a Recorrente é uma pessoa nervosa e,. a testemunha PP (em tempos de 00.08.06 a 00.08.4476) diz que “ela diz que sim, que foi operada ao peito, e essas coisas”
109. Face à prova produzida o Tribunal tomou douta decisão “No entanto, a indemnização por danos de natureza não patrimonial, implica igualmente a verificação dos requisitos da responsabilidade civil, os quais, como referido, não se verificam. Neste caso, os danos não patrimoniais invocados pela autora consistem em incómodos e transtornos, danos que para além de não se poderem considerar como sendo suficientemente graves para merecerem a tutela do direito, não resultaram serem consequência de qualquer atuação ilícita e culposa da parte dos Recorridos, ainda que se tivessem verificado, pelo que, sem necessidade de outras considerações, improcede também este pedido. E não se tendo provada a verificação dos danos alegados, muito menos se provou que a alegada atuação dos Recorridos irá provocar danos futuros.”
110. Ao qual se adere, plenamente pelo que, devem continuar a ser considerados como não provados tais itens.
Termos em que e nos mais de direito que V. Exas. Venerandos Juízes Desembargadores suprirão, deve negar-se provimento ao recurso e confirmar-se, totalmente, a douta decisão recorrida, como é de JUSTIÇA!”.
*
O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II. Questões a decidir.

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC) –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal consistem em saber:
1. Da impugnação da matéria de facto;
3. Se deve a sentença apelada ser revogada/alterada, em razão da alteração da decisão relativa à matéria de facto proferida pelo tribunal a quo – no seguimento da impugnação da autora/apelante - decidindo-se pela procedência da acção.
*
III. Fundamentação de facto.

Os factos que foram dados como provados na sentença sob recurso são os seguintes:
“1. A Autora é proprietária e legítima possuidora do prédio urbano sito no Largo ..., composto por uma casa de habitação de rés-do-chão e primeiro andar - logradouro - norte, via pública; nascente, XX; sul, ... e poente, Largo ..., da Freguesia ... e ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...87, e inscrito na respetiva matriz com o n.º ...53 Urbano.
2. O réu, YY é proprietário do prédio confinante da Autora, sito na mesma morada, no n.º 18.
3. O prédio da autora é bastante antigo e encontra-se em estado degradado pelo que não está habitado.
4. O réu requereu um alvará de obras de alteração e ampliação do seu prédio à Câmara Municipal ....
5. A operação urbanística em causa relativa à reconstrução da sua casa, foi objeto de diversas queixas e reclamações por parte da autora.
6. As obras consistiram na alteração da estrutura do prédio do réu, nomeadamente no aumento da altura do prédio e de varandas, remodelação de interior e de fachada, bem como remodelação do telhado da varanda frontal e da parte superior do edifício.
7. O Réu utiliza o 1.º e 2.º andares do prédio como residência pessoal, sendo este um facto notório para qualquer vizinho.
8. Em resposta às queixas da autora, o Município ... garante que a obra foi titulada com alvará, e certifica que foram cumpridas as normas urbanísticas aplicáveis não sendo violada nenhuma regra urbanística ou que houvesse qualquer violação de regras urbanísticas praticadas por funcionário.
9. Os prédios da autora e do réu são antigos.
10. A varanda do prédio reconstruído pelo réu foi subida e colocada sensivelmente ao nível do terraço (varanda) do prédio da autora, sobrepondo-se o respetivo telhado a alguns centímetros de um cunhal da fachada do prédio da autora.
11. Na cozinha da casa da autora existia uma abertura que deitava para um espaço que existe entre as duas casas.
12. O espaço de permeio que existe entre os prédios, mede aproximadamente 15 a 30 centímetros.
13. O beiral do telhado da varanda do prédio do réu, da forma que foi construído, não permite um intervalo de um metro e cinquenta centímetros do prédio da autora.
14. A autora é pessoa séria, idónea, trabalhadora e honesta.
15. Os prédios da autora e dos réus são confinantes, pois que o prédio propriedade da Autora e que se identifica como estando descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...07 e inscrito na matriz predial urbana da freguesia ... e ... e do concelho ... sob o artigo ...53 confina a Sul com o prédio do Réu, prédio esse que se identifica como estando descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...29 e inscrito na matriz predial urbana da freguesia ... e ... do concelho de ... sob o artigo nº ...4.
16. À data de 2012, o prédio da Autora encontrava-se em muito mau estado de conservação, tanto que beneficiava em sede de IMI do estatuto de “Prédio não licenciado em condições muito deficientes de habitabilidade”.
17. E o do Réu, pese em não tão mau estado, não mereceu reparo por parte da AT.
18. Mesmo assim, apesar da AT, ou mesmo qualquer outra entidade, não ter feito qualquer reparo no que se refere ao estado do prédio propriedade do Réu, desde a data de 23/08/2010, data da compra, este decidiu restaurá-lo.
19. Intentou processo junto da Câmara Municipal ..., processo ao qual foi atribuído o nº ...1, tendente a reconstrução do seu prédio sito no ... nº 18 em ..., pelo que lhe foi emitido Alvará de Obras de ampliação/alteração com o nº 133/12.
20. Logo iniciou as obras em conformidade com o projeto aprovado.
21. E, se ao longo da obra surgiram imprevistos, os mesmos foram superados.
22. A Autora, por si e representada, desde, pelo menos, o ano de 2014, apresentou várias queixas e reclamações junto de vários serviços da C.M. ... que decidiu: “Essas queixas/reclamações foram sendo respondidas verbalmente ou por intermédio de informações da DGUT, DSCH e Sector de Fiscalização da DAF, designadamente em 2014 (Ficha de acompanhamento de Operações Urbanísticas nº 39/2014 – Zona C, e informação da DGUT datada de 17/11/2014) e em 2016 (informação nº ...16 de 10/11/2016).”
23. Ainda, é referido e informado à ora Autora que “Do acompanhamento e fiscalização de que a presente operação urbanística foi objeto e das diligências que, entretanto, foram executadas, pode-se extrair a conclusão que os incumprimentos ao projeto ou a normas urbanísticas aplicáveis, foram sendo sucessivamente resolvidos. Não se detetaram, no momento em que foram feitas as informações… quaisquer incumprimentos às normas urbanísticas aplicáveis.”
24. Prosseguindo, “Relativamente a outras questões de âmbito privado, apesar de muitas estarem excluídas das competências municipais, foram também acompanhadas, não tendo sido possível confirmar as alegações da queixosa, designadamente as referentes à ocupação de espaço da sua propriedade, a janelas tapadas, à demolição de paredes meeiras ou ao corte de cornijas.” 25. Para logo após acrescentar que “Nunca foram antes referenciados quaisquer danos no prédio da queixosa que pusessem a sua estabilidade em risco, pelo que não nos podemos pronunciar sobre esse assunto.”
26. Mas referiu-se que “Resta apenas a questão da janela da varanda que abre para o espaço adjacente à construção da queixosa, que poderá incumprir o disposto no nº 2 do artº 1360º do CC. Apesar de, conforme acima referido, a verificação do cumprimento de tais normas não estar dentro das competências municipais, esse assunto foi identificado, tendo sido exploradas, junto do proprietário em causa, as formas de resolução dessa questão.”
27. Para concluir: “A licença para a execução das obras de reconstrução acima referidas, apoiava-se nos projetos e aditamentos apresentados, e que foram objeto de aprovação pelo município.
Essa aprovação, que pressupõe o cumprimento pelos respetivos projetos, das normas técnicas e legais aplicáveis, foi fundamentada nos termos de responsabilidade que acompanhavam esses projetos, emitidos pelos respetivos autores, e na análise complementar efetuada pelos serviços técnicos municipais.
Durante o acompanhamento e a fiscalização da obra não se detetaram, até à data da última informação produzida, em 2016, incumprimentos aos projetos que não tenham sido posteriormente ultrapassados.”
28. A Autora, apesar de ter sido notificada da informação de que supra trechos foram transcritos, por ofício datado de 13/11/2018, mesmo assim, instaurou a presente ação.
29. O imóvel que o Réu comprou, porque não estava nas condições ideais para nele se viver, foi entendido nele realizar obras.
30. O réu celebrou com o Sr. Arquiteto KK um contrato de prestação de serviços com o fim de lhe elaborar um projeto de arquitetura, com as suas especialidades, a fim de ampliar/alterar o imóvel.
31. Para o efeito foi elaborado um livro fotográfico a fim de servir de suporte ao trabalho para o projeto final.
32. Projeto que foi elaborado e apresentado em 02/05/2011 na Câmara Municipal ..., onde lhe atribuído o nº ...1.
33. O projeto foi aprovado e foi emitido Alvará de Obras de Ampliação/Alteração com o nº 133/12.
34. No ano de 2012, o Réu deu início às obras, tendo, previamente, tomado todas as instruções e orientações emanadas e presumidas de segurança para si, seus bens, pessoas e bens de terceiros que circundavam a sua obra, até porque a nascente tinha o prédio da Autora em deterioração e a Sul, prédios onde residem pessoas.
35. Jamais foi suposta ou posta em perigo a casa ou mesmo a estrutura do imóvel, propriedade da Autora ou doutrem nem foi violada qualquer norma urbanística de segurança aplicável.
36. Não há paredes comuns dos prédios da Autora e do Réu, desde os alicerces até ao meio do primeiro andar o prédio do Réu é construído por blocos de granito.
37. Por isso, na ampliação ascendente das paredes não necessitou de usar qualquer meio violento uma vez que foi utilizado tijolo.
38. Nem teve que mexer ou tocar nas paredes do imóvel da Autora, uma vez que a mesma tem parede própria que confina, mas não é comum.
39. Nunca foi propósito do Réu altear o imóvel, nem tão-pouco ao início foi perspetivado, e projetado.
40. O que o Réu constatou na execução da obra foi, tomando como comparação os demais imóveis na zona, que se se não alteasse o edifício no que concerne a dar altura em relação ao nível da rua, uma vez que a zona é frequentemente inundável por vazamento do rio Tâmega, logo seria facilmente inundável e além de pôr em perigo e risco o seu património, inquestionavelmente punha o de terceiros.
41. Pelo que, respeitando todo o projeto exterior, só subiu o edifício na zona frontal e em vez de o alinhar com o prédio da Autora, à sua esquerda, alinhou-o ao edifício da direita.
42. A paragem da obra foi de alguns meses e porque se esperou a decisão camarária quanto a um Projeto de Alterações ao projeto inicial.
43. Por isso foi requerida a prorrogação do Alvará, que foi deferida. 44. Retomadas as obras foram as mesmas exteriormente concluídas, com pintura, no início do ano de 2017.
45. O projeto inicial sofreu alterações, porquanto na prática as obras consistiram na alteração da estrutura do prédio no sentido de o elevar em altura na parte da fachada e consequente elevação das portas, janelas e varanda, com a inevitável remodelação do interior, fachada e telhado, com a finalidade de ficar a entrada acima do nível da rua e daí não propenso a inundações por efeito do vazamento do rio Tâmega.
46. A Autora reside a 2 metros do lado direito do imóvel dos autos e a cerca de 10 metros do imóvel do Réu.
47. A Autora, desde, pelo menos, o ano de 2014, estava a apresentar queixas e reclamações junto de entidades, mormente a Câmara Municipal ...,
48. O telhado do prédio da Autora tinha, antes das obras realizadas pelo Réu, desde a claraboia até ao beiral confinante com o prédio do Réu, 12 fileiras de telha, fileiras de telhas que se mantêm.
49. A antena de TV está onde sempre esteve, no telhado da Autora.
50. Tanto antes das obras como depois, a área e localização da varanda é igual e só alterou em altura estrutural.
51. Toda a estrutura do prédio do Réu se mantém do antes para o depois e não houve a criação de janelas nem varandas.
52. O prédio do Réu só tem uma varanda e a varanda não tem qualquer janela aberta para a Autora.
53. A cobertura da varanda que o Réu construiu, já no antes assim estava.
54. Não goteja, porque já antes não gotejava e o prédio do Réu tem caleiras que apanham as águas pluviais provindas do telhado da varanda do Réu, bem como as provindas do prédio da Autora.
55. Já antes do ano de 2010, o imóvel da autora apresentava-se, exteriormente e em toda a sua envolvência, em estado lastimoso.
56. O prédio da Autora denota total abandono com portas, janelas, telhado, algerozes, paredes, vidros das portas das varandas e janelas, e, as fissuras exteriores nas paredes.
57. No prédio da Autora, as caleiras estão podres, estão entupidas com ervas e estão sem tubo de escoamento e condução para o solo.
58. A água que se acumula no terraço e se infiltra no prédio da Autora resulta por deficiência de escoamento das águas das varandas e porque as “caleiras” que o prédio parcialmente dispõe não estão nas mínimas condições.
59. Já muito antes do Réu comprar o imóvel, considerado causador da deterioração, o prédio da Autora apresentava-se em abandono, o mesmo apresentava algumas janelas e portas aparentemente sem vidros e a madeira das janelas e portas apodrecida, paredes com substanciais fendas, grandes manchas de cor negra sinónimo de humidade para não dizer apodrecimento, sem tubo de escoamento de caleiras e caleiras entupidas com visíveis ervas e a despejar sobre o prédio do Réu.”.
*
Foram dados como não provados os seguintes factos:
“a- O réu, pretendia alterar estruturalmente a sua casa.
b- A execução da obra punha manifestamente em perigo a estrutura da casa da autora e consubstanciava uma violação aparente das normas urbanísticas aplicáveis.
c- A obra do réu, esteve parada durante aproximadamente 2 anos. d- Desde o final de 2016, as obras referentes à reconstrução da casa do réu, recomeçaram e aparentemente terminaram no início de 2018.
e- O Município ..., através dos seus responsáveis, garantiu diversas vezes à aqui autora que a obra realizada pelo réu não cumpria as regras urbanísticas pelo que não se preocupasse, pois, a obra do réu não teria viabilidade para prosseguir sendo demolido tudo o que houvesse sido feito.
f- Nessa medida, a autora aguardou que a obra do réu fosse demolida, acreditando na palavra dos responsáveis da Câmara Municipal ....
g- Para espanto da autora, aproximadamente entre fevereiro e março de 2018 teve conhecimento que a obra do réu tinha sido concluída.
h- Nessa mesma altura, data em que aparentemente foram concluídas as obras, retirados os andaimes e as redes de proteção, a autora foi informada por moradores do bairro que o réu com a sua obra ocupou parte da fachada e do telhado da casa da autora, sendo esse um facto notório para qualquer pessoa que passe na rua.
i- De imediato, a autora foi verificar a conclusão da obra do réu e constatou que, sem que nada o fizesse prever, de má fé, sem o consentimento e contra a vontade da autora, o réu construiu e prolongou a sua obra pelo terreno e prédio da autora.
j- De má fé, sem o consentimento e contra a sua vontade, sabendo que lesava o direito da autora, o réu para reconstruir o seu prédio cortou as cornijas da fachada e das traseiras do prédio daquela.
k- Contra a vontade da autora, sabendo que lesava o direito desta, o réu cortou grande parte do telhado e ocupou parte do prédio da autora com as obras que efetuou no seu edifício.
l- Em consequência disso, o réu retirou as antenas que existiam no telhado da autora, danificando-as e colocando as referidas antenas deitadas em cima do telhado da autora.
m- Ocupou, ainda, o réu, parte da fachada do prédio da autora, sobrepondo, com a subida de uma varanda e respetivo telhado, parte daquele edifício.
n- Abriu janelas e varandas que deitam diretamente sobre o prédio da autora não observando o intervalo mínimo de metro e meio.
o- A cobertura da varanda que o réu construiu, goteja diretamente sobre o terraço da autora.
p- Ocupou e fechou, ainda, o réu, por completo, um espaço de permeio de cinquenta centímetros, que era aberto e que faz parte do terreno da autora, que existia entre os dois prédios, não deixando nenhum foco de luz natural e qualquer entrada de ar, a uma janela interior.
q- Com a ocupação do terreno apenas existe um intervalo de 15 centímetros entre os dois prédios, e a janela interior da cozinha do prédio da autora.
r- Com o fecho do espaço de permeio que existia entre os dois prédios e que pertence e é terreno da autora, o réu prolongou o seu edifício por terreno alheio, de má fé contra a vontade da autora, causando-lhe graves prejuízos.
s- O réu, com as obras efetuadas, de má fé, bem sabendo que lesava o direito da autora, abriu fendas no rés-do-chão e primeiro andar das paredes interiores do prédio da autora, e confinantes com as obras realizadas, existindo assim perigo de ruir.
t- O réu, desde que recomeçou a sua obra, ocupou e tapou parte da fachada do prédio da autora levantando redes, andaimes, e outros materiais de construção sobre o prédio da autora, impedindo quem quer que fosse de conseguir ver a progressão e a execução da mesma.
u- Aproveitando ainda o facto de a autora estar a viver em ..., o réu, de má fé, bem sabendo que violava o direito de outrem, cortou as cornijas e subiu ao telhado da mesma, alterando a sua estrutura, e cortando parte deste telhado, pois sabia que a autora nunca permitiria nem consentiria na prática de esses atos ilícitos.
v- Aproveitou o réu o facto de o prédio estar desabitado e de a autora aí se deslocar raramente, agindo sem a sua autorização, por assim lhe ser mais cómodo.
w- Aproximadamente em meados de 2018, a autora tentou junto do réu, explicações para os factos por este praticados, não tendo até à data nenhuma resposta.
x- Atendendo ao facto de, após inúmeras reclamações à Câmara Municipal ... nada ter sido feito, a autora pediu recentemente esclarecimentos sobre a obra realizada e de que forma a mesma cumpriu os regulamentos municipais e a própria lei.
y- Antes da reconstrução da obra do réu, era manifestamente evidente os perigos de eventuais danos que pudessem advir de uma execução de obra estrutural em qualquer um dos prédios descritos.
z- O réu, bem sabendo que o prédio da autora contíguo ao seu, era antigo e que podia ruir, não se eximiu de fazer obras profundas no seu prédio, tendo em consequência dessa atuação provocado fendas nas paredes interiores do prédio da autora.
aa- Em consequência da obra realizada pelo réu, o interior da parede do prédio da autora apresenta-se fissurado com queda de grandes superfícies de estuque e deterioração estrutural, com perigo de ruir.
bb- A varanda do prédio reconstruído pelo réu é suscetível de prejudicar o aproveitamento adequado de ar e luz do prédio, prejudicando muito a estética deste edifício.
cc- Dessa atuação ilícita por parte do réu inexiste ainda qualquer intervalo entre a referida varanda do réu e o prédio da autora, bem pelo contrário, a referida varanda sobrepõe-se ao prédio desta.
dd- Para agravar aos danos sofridos, a beira do telhado e a cobertura da nova varanda do réu goteja para o terraço (varanda) da autora causando acumulação de água e humidade.
ee- As distâncias entre a chaminé no rés-do-chão do prédio do réu e as paredes e varandas do prédio da autora permitem a acumulação de humidade, e maus-cheiros, causando infiltrações de água no prédio da autora e perigo para fios elétricos que ali se encontram.
ff- A parte superior da fachada do prédio do réu e consequentemente o seu telhado prolongam-se pelo interior do terreno e do telhado do prédio da autora.
gg- Para a realiz45. O espaço de permeio que existia entre os prédios, e que pertence à autora, media aproximadamente 15 centímetros na parte sul dos edifícios e progressivamente ia aumentando até chegar a medir 50 centímetros na parte norte dos edifícios, ação da obra do réu, foi alterado, cortado e ocupado o telhado do prédio da autora.
hh- E para o efeito, foram cortadas as cornijas da fachada do prédio da autora e as cornijas da parte traseira deste edifício.
ii- Desde a respetiva edificação, que a janela interior na cozinha sempre permitira à autora uma vista livre e desimpedida de ar e luz, no seguimento aliás do que já sucedia quando ali existia um espaço de permeio aberto sobre os dois prédios, intervalo esse pertencente à autora.
jj- Neste momento, tendo o réu tapado por completo o referido espaço de permeio que existia entre os dois prédios não possibilita uma vista livre e desimpedida e ocupou de má fé terreno que o réu sabia não ser seu, mas sim da autora.
kk- O espaço de permeio que existia entre os prédios, e que pertence à autora, media aproximadamente 15 centímetros na parte sul dos edifícios e progressivamente ia aumentando até chegar a medir 50 centímetros na parte norte dos edifícios.
ll- Atualmente, com os factos praticados pelo réu, apenas existe um intervalo de 15 centímetros entre o prédio da autora e réu.
mm- Relativamente à varanda situada ao nível do ... andar da fachada do prédio da autora determina a redução de luminosidade. nn- O beiral do telhado da varanda do prédio do réu é suscetível de permitir a entrada e infiltração de águas pluviais escorrestes do referido telhado.
oo- As infiltrações de humidades, e escoamento de águas irão agravar-se nos invernos subsequentes.
pp- O réu ao tapar parte da fachada da casa da autora, sabia que violava o direito da autora e representou a produção de factos ilícitos tendo a intenção de os realizar.
qq- O réu ao realizar a sua obra, sabia que violava o direito da autora e representou que poderia haver o risco de ruir a casa da autora, ou seja, representou a produção de factos ilícitos como consequência necessária da sua conduta.
rr- O réu ao tapar o espaço entre o seu prédio e o prédio da autora, deixando apenas um intervalo de 15 centímetros, espaço de permeio esse que é propriedade da autora, sabia que violava o direito desta e representou a produção de factos ilícitos tendo a intenção de os realizar.
ss- O réu ao cortar e ocupar o telhado da casa da autora, sabia que violava o direito desta e representou a produção de factos ilícitos tendo a intenção de os realizar.
tt- O réu ao sobrepor a sua varanda sobre a fachada do prédio da autora, sabia que violava o direito desta e representou que poderia haver gotejamento, acumulação de água e humidade na varanda do prédio da autora, ou seja, representou a produção de factos ilícitos como consequência necessária da sua conduta.
uu- O réu ao cortar as cornijas do prédio da autora, sabia que violava o direito desta e representou a produção de factos ilícitos tendo a intenção de os realizar.
vv- Não teria a autora sofrido estes danos, não fosse a conduta dolosa adotada pelo réu.
ww- As condutas do réu supra, descritas, foram e são causa de transtornos e preocupações na autora.
xx- A autora, com os factos praticados pelo réu, vive ansiosa desde o recomeço das obras em 2016 até à presente data, andado constantemente, descontente, perturbada, inquieta, aflita vivendo num estado de angústia profunda.
yy- As diversas queixas que a autora foi obrigada a apresentar na Câmara Municipal ..., em virtude dos factos praticados pelo réu, deixaram a autora absolutamente desgastada emocionalmente.
zz- A autora já recorreu diversas vezes à sua médica de família através de consulta no centro de saúde, tendo-lhe sido diagnosticado um distúrbio depressivo maior.
zz- Em consequência das ações ilícitas do réu, foram-lhe diagnosticados à autora antidepressivos para combater a tristeza que ainda sofre.
aaa- Os factos descritos afligem e entristecem a autora.
bbb- Como consequência dos factos descritos, a autora apresenta atualmente problemas nas faculdades psicológicas.
ccc- A autora sendo pessoa saudável, nunca tomou medicação diária, sendo que por causa dos factos praticados pelo réu começou a tomar antidepressivos para controlar e suavizar os problemas respiratórios e de ansiedade de que padece.
ddd- A autora sente-se depressiva e ansiosa com toda a situação em apreço, que contribuiu para agravar o estado de saúde da mesma.
eee- A autora ficou ansiosa e nervosa com a conduta culposa do réu, bem como preocupada com o desfecho do presente processo.
fff- Tem sérias dificuldades em dormir.
ggg- A autora vive preocupada e receosa que a água proveniente das chuvas ou humidades se infiltrem no seu descrito prédio urbano.
hhh- A autora vive preocupada e receosa que as fendas que o réu causou nas paredes da autora ponham em risco a estrutura do seu prédio urbano.
iii- A autora sente sofrimento e angústia ao ver a sua habitação descaracterizada, alterada e a degradar-se progressivamente por causa dos factos praticados pelo réu.
jjj- A autora sente-se humilhada pela situação em que se encontra e para a qual em nada contribuiu.
kkk- Factos que a deixam extremamente abalada física e psicologicamente.
lll- O réu, ao cortar as cornijas do prédio da autora, causou-lhe um prejuízo nunca inferior a 1640 €.
mmm- Contra a vontade da autora, o réu, de má fé, com as obras que efetuou no seu edifício cortou grande parte do telhado da autora e ocupou parte deste prédio, causando-lhe danos patrimoniais no valor de 17.200 €.
nnn- Em consequência disso, o réu retirou as antenas que existiam no telhado da autora, danificando-as, prejuízo que se quantifica em valor nunca inferior a 100 €.
ooo- Acresce ainda que, o réu, com as obras efetuadas, de má fé, bem sabendo que lesava o direito da autora, abriu fendas no rés-do-chão e primeiro andar das paredes interiores do prédio da autora, sendo que pelas fissuras, rachas e fendas nas paredes causou-lhe danos patrimoniais no valor nunca inferior a 13.000 €, e ainda outros danos, num valor total de € 23 400,00.
ppp- Ao ocupar parte da fachada do prédio da autora, sobrepondo a sua varanda e respetivo telhado sobre o edifício daquela, pela violação do seu direito de servidão de vistas não deixando um intervalo de 1.50 metros, o réu causou danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos, devendo a liquidação ser fixada posteriormente em decisão ulterior.
qqq- O réu fechando por completo o espaço de permeio pertencente à A. que existia entre os dois prédios, pela violação do seu direito de servidão de vistas, o réu causou danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos, devendo a liquidação ser fixada posteriormente em decisão ulterior.
rrr- O réu pela ocupação do prédio, solo, espaço aéreo, ao prolongar o seu edifício por terreno alheio, de má fé contra a vontade da autora, pela violação do direito de propriedade da autora, causou danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos.
sss- Pela abertura de varandas e janelas inobservando os critérios legais, o réu, pela violação do seu direito de servidão de vistas não deixando um intervalo de 1,50 metros, causou danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos.
ttt- Pela violação e inobservância dos critérios legais quanto ao estilicídio, causou o réu, danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos.
uuu- O espaço de permeio entre as paredes, a existir, não é da Autora, mas do Réu.
vvv- Jamais o Réu tapou, ocupou no prolongamento do seu prédio ou fechou qualquer espaço porque o alegado não existia a céu aberto.
www- Tudo está como antes estava.
xxx- O prédio da autora evidencia eminência de ruir.
yyy- A autora com o seu comportamento pôs em causa a confiança gentia e relacional na comunidade com o propósito de ofender a personalidade, o bom nome e reputação do Réu.
zzz- Para realizar a obra que se tinham proposto, a parede em tijolo que construíram do lado que a sua casa confina com a da autora, os réus construíram tal parede sobre a parede de granito do rés-do-chão da sua casa, assentando os tijolos em prumo com a parede interior, pelo que se originou um espaço livre entre a parede da casa da autora e a parede da casa dos réus, que que era ocupado pela parede antiga da casa dos réus.”.
*
IV. Do objecto do recurso.   

1. Da impugnação da matéria de facto.
Resulta das conclusões da recorrente que esta pretende a alteração da matéria de facto, devendo dar-se como provados os factos constantes das als. P, R, GG, II, JJ e RR; H, I, M, HH, CC e MM; K, U, FF, SS e TT; S, Z e AA; VV, WW, XX, YY, AAA, DDD, EEE, HHH, LLL, MMM, OOO, PPP, QQQ, RRR, SSS dos factos considerados como não provados.
Ao fazer a sua impugnação, a apelante agrupa tais factos em 5 blocos.
O primeiro deles, com os factos das als. P, R, GG, II, JJ e RR, que têm a seguinte redacção:
“p- Ocupou e fechou, ainda, o réu, por completo, um espaço de permeio de cinquenta centímetros, que era aberto e que faz parte do terreno da autora, que existia entre os dois prédios, não deixando nenhum foco de luz natural e qualquer entrada de ar, a uma janela interior.
r- Com o fecho do espaço de permeio que existia entre os dois prédios e que pertence e é terreno da autora, o réu prolongou o seu edifício por terreno alheio, de má fé contra a vontade da autora, causando-lhe graves prejuízos.
gg- O espaço de permeio que existia entre os prédios, e que pertence à autora, media aproximadamente 15 centímetros na parte sul dos edifícios e progressivamente ia aumentando até chegar a medir 50 centímetros na parte norte dos edifícios, ação da obra do réu, foi alterado, cortado e ocupado o telhado do prédio da autora.
ii- Desde a respetiva edificação, que a janela interior na cozinha sempre permitira à autora uma vista livre e desimpedida de ar e luz, no seguimento aliás do que já sucedia quando ali existia um espaço de permeio aberto sobre os dois prédios, intervalo esse pertencente à autora.
jj- Neste momento, tendo o réu tapado por completo o referido espaço de permeio que existia entre os dois prédios não possibilita uma vista livre e desimpedida e ocupou de má fé terreno que o réu sabia não ser seu, mas sim da autora.
rr- O réu ao tapar o espaço entre o seu prédio e o prédio da autora, deixando apenas um intervalo de 15 centímetros, espaço de permeio esse que é propriedade da autora, sabia que violava o direito desta e representou a produção de factos ilícitos tendo a intenção de os realizar.
O segundo desses blocos, com os factos das als. H, I, M, HH, CC e MM, que têm a seguinte redacção:
h- Nessa mesma altura, data em que aparentemente foram concluídas as obras, retirados os andaimes e as redes de proteção, a autora foi informada por moradores do bairro que o réu com a sua obra ocupou parte da fachada e do telhado da casa da autora, sendo esse um facto notório para qualquer pessoa que passe na rua.
i- De imediato, a autora foi verificar a conclusão da obra do réu e constatou que, sem que nada o fizesse prever, de má fé, sem o consentimento e contra a vontade da autora, o réu construiu e prolongou a sua obra pelo terreno e prédio da autora.
m- Ocupou, ainda, o réu, parte da fachada do prédio da autora, sobrepondo, com a subida de uma varanda e respetivo telhado, parte daquele edifício.
hh- E para o efeito, foram cortadas as cornijas da fachada do prédio da autora e as cornijas da parte traseira deste edifício.
cc- Dessa atuação ilícita por parte do réu inexiste ainda qualquer intervalo entre a referida varanda do réu e o prédio da autora, bem pelo contrário, a referida varanda sobrepõe-se ao prédio desta.
mm- Relativamente à varanda situada ao nível do ... andar da fachada do prédio da autora determina a redução de luminosidade.
O terceiro dos referidos blocos com os factos das als. K, U, FF, SS, TT,, que têm a seguinte redacção:
k- Contra a vontade da autora, sabendo que lesava o direito desta, o réu cortou grande parte do telhado e ocupou parte do prédio da autora com as obras que efetuou no seu edifício.
u- Aproveitando ainda o facto de a autora estar a viver em ..., o réu, de má fé, bem sabendo que violava o direito de outrem, cortou as cornijas e subiu ao telhado da mesma, alterando a sua estrutura, e cortando parte deste telhado, pois sabia que a autora nunca permitiria nem consentiria na prática de esses atos ilícitos.
ff- A parte superior da fachada do prédio do réu e consequentemente o seu telhado prolongam-se pelo interior do terreno e do telhado do prédio da autora.
ss- O réu ao cortar e ocupar o telhado da casa da autora, sabia que violava o direito desta e representou a produção de factos ilícitos tendo a intenção de os realizar.
tt- O réu ao sobrepor a sua varanda sobre a fachada do prédio da autora, sabia que violava o direito desta e representou que poderia haver gotejamento, acumulação de água e humidade na varanda do prédio da autora, ou seja, representou a produção de factos ilícitos como consequência necessária da sua conduta.
O quarto desses blocos com os factos das als. S, Z e AA, que têm a seguinte redacção:
s- O réu, com as obras efetuadas, de má fé, bem sabendo que lesava o direito da autora, abriu fendas no rés-do-chão e primeiro andar das paredes interiores do prédio da autora, e confinantes com as obras realizadas, existindo assim perigo de ruir.
z- O réu, bem sabendo que o prédio da autora contíguo ao seu, era antigo e que podia ruir, não se eximiu de fazer obras profundas no seu prédio, tendo em consequência dessa atuação provocado fendas nas paredes interiores do prédio da autora.
aa- Em consequência da obra realizada pelo réu, o interior da parede do prédio da autora apresenta-se fissurado com queda de grandes superfícies de estuque e deterioração estrutural, com perigo de ruir.
E o quinto e último desses blocos com os factos da als. VV, WW, XX, YY, AAA, DDD, EEE, HHH, LLL, MMM, OOO, PPP, QQQ, RRR, SSS, que têm a seguinte redacção:
vv- Não teria a autora sofrido estes danos, não fosse a conduta dolosa adotada pelo réu.
ww- As condutas do réu supra, descritas, foram e são causa de transtornos e preocupações na autora.
xx- A autora, com os factos praticados pelo réu, vive ansiosa desde o recomeço das obras em 2016 até à presente data, andado constantemente, descontente, perturbada, inquieta, aflita vivendo num estado de angústia profunda.
yy- As diversas queixas que a autora foi obrigada a apresentar na Câmara Municipal ..., em virtude dos factos praticados pelo réu, deixaram a autora absolutamente desgastada emocionalmente
aaa- Os factos descritos afligem e entristecem a autora.
ddd- A autora sente-se depressiva e ansiosa com toda a situação em apreço, que contribuiu para agravar o estado de saúde da mesma.
eee- A autora ficou ansiosa e nervosa com a conduta culposa do réu, bem como preocupada com o desfecho do presente processo.
hhh- A autora vive preocupada e receosa que as fendas que o réu causou nas paredes da autora ponham em risco a estrutura do seu prédio urbano.
lll- O réu, ao cortar as cornijas do prédio da autora, causou-lhe um prejuízo nunca inferior a 1640 €.
mmm- Contra a vontade da autora, o réu, de má fé, com as obras que efetuou no seu edifício cortou grande parte do telhado da autora e ocupou parte deste prédio, causando-lhe danos patrimoniais no valor de 17.200 €.
ooo- Acresce ainda que, o réu, com as obras efetuadas, de má fé, bem sabendo que lesava o direito da autora, abriu fendas no rés-do-chão e primeiro andar das paredes interiores do prédio da autora, sendo que pelas fissuras, rachas e fendas nas paredes causou-lhe danos patrimoniais no valor nunca inferior a 13.000 €, e ainda outros danos, num valor total de € 23 400,00.
ppp- Ao ocupar parte da fachada do prédio da autora, sobrepondo a sua varanda e respetivo telhado sobre o edifício daquela, pela violação do seu direito de servidão de vistas não deixando um intervalo de 1.50 metros, o réu causou danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos, devendo a liquidação ser fixada posteriormente em decisão ulterior.
qqq- O réu fechando por completo o espaço de permeio pertencente à A. que existia entre os dois prédios, pela violação do seu direito de servidão de vistas, o réu causou danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos, devendo a liquidação ser fixada posteriormente em decisão ulterior.
rrr- O réu pela ocupação do prédio, solo, espaço aéreo, ao prolongar o seu edifício por terreno alheio, de má fé contra a vontade da autora, pela violação do direito de propriedade da autora, causou danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos.
sss- Pela abertura de varandas e janelas inobservando os critérios legais, o réu, pela violação do seu direito de servidão de vistas não deixando um intervalo de 1,50 metros, causou danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos.

Vejamos.

Para a impugnação da matéria de facto deve a parte observar os requisitos legais previstos no art. 640º do CPC, incluindo a formulação de conclusões, pois são estas que delimitam o objecto do recurso.

Preceitua o artigo 640º do CPC:
1 – Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) – Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) – Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) – A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) – Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição, do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) – Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes”. 
Como se lê no Acórdão do STJ de 01.10.2015, disponível in www.dgsi.pt:
Quer isto dizer que recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus:
Primo: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento;
Secundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa;
Tertio: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas.
Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa-fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão”. (cfr., também, sobre esta matéria, Lopes do Rego, in “Comentários ao Código de Processo Civil”, pág. 465 e que, nesta parte, se mantém actual).
Diz-se também no acórdão do STJ de 19 de Fevereiro de 2015, acessível em www.dgsi.pt, que:
“(...), a exigência da especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem questionar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio tem por função delimitar o objeto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto”.
“…Por sua vez, a especificação dos concretos meios probatórios convocados, bem como a indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, serve sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova, sem prejuízo do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, como decorre hoje, claramente, do preceituado no nº 1 do artigo 662º do CPC”.
“…É, pois, em vista dessa função, no tocante à decisão de facto, que a lei comina a inobservância daqueles requisitos de impugnação com a sanção da rejeição imediata do recurso, ou seja, sem possibilidade de suprimento, na parte afetada, nos termos do artigo 640º, nº 1, proémio, e nº 2, alínea a), do CPC”.
“…Não sofre, pois, qualquer dúvida que a falta de especificação dos requisitos enunciados no nº 1 do referido artigo 640º implica a imediata rejeição do recurso na parte infirmada”.
E no Ac. do STJ de 14.07.2021 - Revista n.º 65/18.9T8EPS.G1.S1 – relator  Fernando Baptista:
“III - Limitando-se o impugnante a discorrer sobre os meios de prova carreados aos autos, sem a indicação/separação dos concretos meios de prova que, relativamente a cada um desses factos, impunham uma resposta diferente da proferida pelo tribunal recorrido, numa análise crítica dessa prova, não dá cumprimento ao ónus referido na al. b) do n.º 1 do art. 640.º do CPC.
IV - Ou seja, o apelante deve fazer corresponder a cada uma das pretendidas alterações da matéria de facto o(s) segmento(s) dos depoimentos testemunhais e a parte concreta dos documentos que fundou as mesmas, sob pena de se tornar inviável o estabelecimento de uma concreta correlação entre estes e aquelas.”.
Vemos assim que o recorrente tem que especificar os exactos pontos que foram, no seu entender, erradamente decididos e indicar, também com precisão, o que entende que se dê como provado.
A imposição de tais indicações precisas ao recorrente, visou impedir “recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, restringindo-se a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente.” (cfr. Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª Edição, p.153).
Também por esses motivos, o recorrente, além de ter que assinalar os pontos de facto que considera incorrectamente julgados e indicar expressamente a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre esses pontos, tem igualmente que especificar os meios de prova constantes do processo que determinam decisão diversa quanto a cada um dos factos (cfr. Abrantes Geraldes, ob. cit., p.155).
Assim, quanto a cada um dos factos que pretende obter diferente decisão da tomada na sentença, tem o recorrente que, com detalhe, indicar os meios de prova deficientemente valorados, criticar os mesmos e, discriminadamente, concluir pela resposta que deveria ter sido dada, evitando-se assim que sejam apresentados recursos inconsequentes, e sem fundamentação que possa ser apreciada e analisada.
Ou seja, não são admissíveis impugnações em bloco que avolumem num ou em vários conjuntos de factos diversos a referência à pertinente prova que motiva a pretendida alteração das decisões e que, na prática, se reconduzem a uma impugnação genérica, ainda que parcelar.
Nesse sentido, veja-se o Ac. do S.T.J., de 20.12.2017, onde, no sumário, se escreveu o seguinte: “I- A alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique “os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”, impõe que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respectivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos            II - Não cumpre aquele ónus o apelante que, nas alegações e nas conclusões, divide a matéria de facto impugnada em três “blocos distintos de factos” e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna.”.
No mesmo sentido o Ac. do STJ de 05.09.2018, disponível in www.dgsi.pt, ou ainda o Ac. do STJ de 14.10.2021, cujo sumário se mostra disponível in https://www.stj.pt/:
“III - Limitando-se o impugnante a discorrer sobre os meios de prova carreados aos autos, sem a indicação/separação dos concretos meios de prova que, relativamente a cada um desses factos, impunham uma resposta diferente da proferida pelo tribunal recorrido, numa análise crítica dessa prova, não dá cumprimento ao ónus referido na al. b) do n.º 1 do art. 640.º do CPC.
IV - Ou seja, o apelante deve fazer corresponder a cada uma das pretendidas alterações da matéria de facto o(s) segmento(s) dos depoimentos testemunhais e a parte concreta dos documentos que fundou as mesmas, sob pena de se tornar inviável o estabelecimento de uma concreta correlação entre estes e aquelas.”
Também o acórdão do STJ de 06.11.2019, disponível in www.dgsi.pt:
“I. As coordenadas estabelecidas pelo Supremo Tribunal de Justiça no que concerne à interpretação do disposto no artigo 640.º do Código de Processo Civil, referente ao ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, visam evitar soluções que possam conduzir a uma repetição total do julgamento, em virtude de recursos genéricos contra uma decisão da matéria de facto alegadamente errada, observando-se assim a opção do legislador de viabilizar apenas uma reapreciação de questões concretas, relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente, permitindo deste modo um efetivo exercício do contraditório por parte do recorrido.
II. A verificação do cumprimento dos ónus de alegação previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil, no que respeita aos aspetos de ordem formal, deve ser norteada pelo princípio da proporcionalidade e da razoabilidade.
III. Não cumprem o ónus imposto pelo art.º 640.º, n.º 1, alíneas b) e c) e n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil os recorrentes que não concretizaram, por referência a cada um dos mencionados factos que impugnaram, quais os meios probatórios que, no seu entender, imporiam decisão diversa daquela que foi dada pelo Tribunal de 1.ª Instância, não indicando também a decisão que, no seu entender, devia ser proferida sobre a matéria de facto, relativamente a determinados factos impugnados;
Ou ainda o acórdão do STJ de 08.10.2019, disponível no mesmo sítio:
“I- Os recorrentes que pedem na apelação a reapreciação da matéria de facto e não indicam os meios de prova e as passagens das gravações dos depoimentos que, no seu entender, impõem decisão diversa da proferida, não cumprem os ónus de alegação previstos no art. 640º, n.º 1 do CPC”, e onde se concretiza que: “Segundo o entendimento do Supremo Tribunal de Justiça, a impugnação da decisão de facto não tem por fim uma reapreciação global, pelo Tribunal da Relação, da prova valorada no Tribunal de 1.ª Instância. Incumbe, por isso, ao Recorrente um especial ónus de alegação no que toca à delimitação do objeto do recurso e à sua fundamentação. Não observa, por conseguinte, esse ónus o recorrente que identifica os pontos de facto que considera mal julgados, mas se limita a indicar os depoimentos prestados e a elencar documentos, omitindo a referência àqueles pontos de facto, especificando os concretos meios de prova que impunham que cada um desses pontos fosse julgado provado ou não provado”.
Entendemos assim que a falta de indicação por parte dos apelantes de elementos probatórios que realmente imponham a alteração de cada um desses pontos nos termos por eles propugnados, relativamente a cada facto concreto, tem como consequência a imediata rejeição do recurso, na parte respeitante aos pontos da matéria de facto relativamente aos quais se verifica a omissão.
O Conselheiro Abrantes Geraldes na sua obra “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5.ª edição, 2018, Almedina, págs. 165 e 166, resume as obrigações impostas ao recorrente que impugne a matéria de facto no domínio actual do seguinte modo:
a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;
d) O recorrente pode sugerir à Relação a renovação da produção de certos meios de prova, nos termos do art. 662.º, n.º 2, al. a), ou mesmo a produção de novos meios de prova nas situações referidas na al. b).(…);
e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente.
(...)”
A verificação do cumprimento destas exigências deve ser feita à “luz de um critério de rigor”, pois “trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da autorresponsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo”, e na medida em que tais exigências devem ser o “contraponto dos esforços de todos quantos, durante décadas, reclamaram a atenuação do princípio da oralidade pura e a atribuição à Relação de efetivos poderes de sindicância da decisão da matéria de facto como instrumento de realização de justiça (Abrantes Geraldes, obra citada, pág. 169).
Acresce salientar que a crítica de quem impugna a convicção do Tribunal, sustentada na livre apreciação da prova e nas regras da experiência, não pode ter sucesso se se alicerçar apenas na diferente convicção sobre a prova produzida. Ou seja, não basta afirmar ou transcrever aquilo que foi afirmado pelas testemunhas, para se concluir que um determinado facto foi ou não incorrectamente julgado. Na verdade, a parte que impugne a decisão da matéria de facto não está dispensada de efectuar a análise crítica da prova, já que pretendendo contrariar a apreciação crítica da prova feita pelo Tribunal terá de apresentar razões objectivas para contrariar a prevalência dada a um meio de prova sobre outro de sinal oposto, ou o maior crédito dado a um depoimento sobre outro contrário, não sendo suficiente para o efeito a mera transcrição de excertos de alguns dos depoimentos prestados (vide Acs. desta Relação de 11.07.2017, e Ac. R.L. de 26.09.2019, in www.dgsi.pt).
A este ónus de impugnação, soma-se um outro não menos importante, que é o ónus de conclusão, previsto no art. 639.º, nº 1 do CPC, onde se lê que o «recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão».
Este ónus de conclusão para além de visar a síntese das razões que estão subjacentes à interposição do recurso, visa também a definição do seu objecto.
No caso dos autos, verifica-se que, pese embora a apelante indique quais os factos que pretende impugnar e a redacção que entende deve ser dada aos mesmos, o facto é que não especifica os meios de prova constantes do processo que determinam decisão diversa quanto a cada um desses factos, não indicando com detalhe, quanto a cada um desses factos os meios de prova deficientemente valorados, posto que os agrupa em blocos.
A apelante não distingue qual a prova que entende ser relevante e que deveria ter sido considerada quanto a cada um dos factos dados como não provados, que entende deveriam ser dados como provados, visto que discorreu sobre a prova documental, testemunhal, pericial e ainda sobre as suas declarações de parte, para concluir, sem qualquer distinção entre factos, que da mesma resulta aquilo que pretende.
Do mesmo modo, limitou-se a discorrer sobre os meios de prova carreados aos autos, sem a indicação ou separação dos concretos meios de prova que, relativamente a cada um dos factos impugnados, impunham uma resposta diferente da proferida pelo tribunal recorrido, numa análise crítica dessa prova, não fazendo corresponder a cada uma das pretendidas alterações da matéria de facto os segmentos dos depoimentos testemunhais e de parte e a parte concreta dos documentos que fundaram as mesmas, tornando inviável o estabelecimento de uma concreta correlação entre estes e aquelas.
Ou seja, não cumpriu o ónus de impugnação previsto no art. 640º, nº 1, al. b) do CPC que exige que os recorrentes especifiquem os meios probatórios que determinariam decisão diversa da tomada em primeira Instância para cada um dos factos que pretendem impugnar, para o que não é suficiente a genérica indicação dos ditos meios de prova, isto é, desacompanhada do reporte a cada um dos factos sindicados, e antes oferecida para a totalidade da matéria de facto sob recurso (cfr. Ac. desta Relação de Guimarães de 22.10.2020, disponível in www,dgsi.pt).
É que, para além de a impugnação ser feita em bloco, não se verifica que os factos impugnados em cada um desses cinco blocos estejam interligados entre si.
Com efeito, no primeiro desses blocos está em causa factualidade muito diversa, como os actos que os réus terão praticado na faixa de terreno que a autora alega ser sua; a propriedade dessa faixa de terreno; a largura da mesma; as consequências da actuação dos réus; a existência de uma abertura na cozinha da autora; a finalidade da mesma; entre outros.
No segundo desses blocos, também está em causa factualidade distinta, desde a data em que foram concluídas as obras; a informação que foi prestada à autora por moradores do bairro; o que a autora constatou; as alterações existentes numa varanda e respectivo telhado; o corte de cornijas; a sobreposição da varanda; entre outros.
Também no terceiro desses blocos está em causa factualidade diversa, como o corte do telhado; a ocupação do prédio da autora com as obras; novamente o corte das cornijas; a subida do telhado; o corte do telhado da autora; o prolongamento da fachada do prédio do réu e do seu telhado pelo interior do prédio e telhado da autora; a possibilidade de haver gotejamento e acumulação de água, entre outros.
O mesmo se diga quanto ao quarto desses blocos de factos, em que está em causa factualidade que vai desde a actuação do réu com as obras; as consequências para o prédio da autora; a possibilidade de ruir o prédio da autora.
Finalmente tal também sucede com o quarto bloco de factos, em que está igualmente em causa factualidade muito diversa, desde as consequências que a autora alega ter sofrido em virtude da actuação do réu com as obras que levou a cabo (e que são várias), aos valores dos danos por si invocados (que são igualmente vários).
Para além disso, também se verifica que grande parte da factualidade impugnada pela apelante não consubstancia matéria de facto, mas antes juízos conclusivos e de direito, que nunca poderiam constar da matéria de facto provada (cfr. a título de exemplo as als. rr), parte da i), parte da k), ss), parte da tt), parte da s), vv), mmm), ooo), ppp), qqq), rrr) e sss)).
Ora, para qualquer um dos blocos de factos impugnados, a apelante indicou prova documental, pericial e testemunhal e ainda as suas declarações de parte, sem concretizar em que medida tais meios de prova poderiam contribuir para a alteração de cada um dos factos que impugnou.
Ora, é nosso entendimento que em situações como a dos autos, a possibilidade de impugnação da matéria de facto por blocos de factos e blocos de meios de prova apenas deverá ser admitida quando o recorrente alegue ou seja manifesto que esse conjunto de factos (v.g. pelo seu número e natureza) e de meios de prova correspondem a uma mesma realidade factual que deverá ser julgada com os mesmos meios de prova (os mesmos segmentos sinalizados dos depoimentos das várias testemunhas e os mesmos documentos) (cfr. neste sentido o recentíssimo ac. do STJ de 30.11.2023, disponível in www.dgsi.pt).
Assim também os Acórdãos do STJ de 21.09.2022, constando do respetivo sumário:
 “I- A impugnação da matéria de facto “em bloco” viola o disposto no artigo 640.º do CPC, mormente quando não está em causa um pequeno número de factos ligados entre si e um número reduzido de meios de prova (por exemplo, o mesmo depoimento), mas um amplíssimo conjunto de factos (ou, melhor, dois amplos blocos de factos) e numerosos meios de prova”;
de 10.05.2023, constando do respetivo sumário:
“I- Deve rejeitar-se o recurso quando o Recorrente impugna blocos de pontos da matéria de facto sem estreita ligação entre si”;
de 21.03.2023, constando do respetivo sumário:
“O facto de o recorrente, ter indicado os concretos pontos de facto que considerava incorrectamente julgados, sem os relacionar com cada um dos meios de prova, com cada uma passagens relevantes dos meios de prova gravados, ou com a transcrição de cada uma das passagens relevantes dos meios de prova gravados prejudica a inteligibilidade do fim e do objecto do recurso e, em consequência, a possibilidade de um contraditório esclarecido”;
de 12.10.2022, constando do respetivo sumário:
I – Para poder validamente impugnar a matéria de facto, o Recorrente tem de cumprir os ónus imposto pelo art.º 640º do CPC.
II – Em princípio, a impugnação da matéria de facto não pode ser feita por blocos de factos, antes tem de ser feita discriminadamente, por concreto ponto de facto.
II - E não pode ser feita por remissão genérica para determinados meios de prova, sem demonstrar a sua relevância quanto a determinado facto concreto.”;
de 17.02.2022, constando do respetivo sumário:
“III. Se é certo que a adequada interpretação do art. 640º, nº 1, b), do CPC, leva a que se exija que a indicação dos meios de prova seja feita de tal modo que permita ao Tribunal da Relação, para o cabal exercício dos poderes que lhe são conferidos pelo art. 662º do CPC, estabelecer a ponte entre os concretos meios de prova e os factos impugnados, considera-se que deve fazer-se, sobre essa exigência, uma ponderação caso a caso, não sendo de rejeitar uma impugnação, ainda que em bloco, da decisão da matéria de facto numa situação em que os factos impugnados sejam poucos e estejam ligados entre si, de modo que não haja obstáculo a que se faça a dita associação entre factos impugnados e meios de prova”;
e de 16.12.2021, constando do respetivo sumário:
“Não cumpre o ónus previsto no art.° 640.°do Código de Processo Civil o apelante que, nas alegações e nas conclusões, agrega a matéria de facto impugnada em blocos ou temas e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna.”;
entre outros, todos disponíveis in www.dgsi.pt.
No caso dos autos, analisando o corpo das alegações e as conclusões da apelação atrás transcritas, verificamos que, no que se refere à prova que a apelante indica para fundar as alterações que defende, relativamente ao conjunto de factos que pretende impugnar, esta efectivamente não concretiza, por referência a cada facto impugnado, quais os meios probatórios que, no seu entender, imporiam decisão diversa daquela que foi dada pelo Tribunal de 1.ª instância, antes se limitando a proceder a uma indicação genérica e em bloco, para aquele conjunto de factos, sendo que os mesmos não estão interligados, por se referirem a questões de facto díspares.
Assim, a apelante não indicou os concretos meios de prova (as passagens dos depoimentos que transcreve e a prova documental) e que, no seu entendimento, imporiam a pretendida alteração, por referência a cada um dos factos concretos cuja decisão pretende impugnar.
Ou seja, a apelante omitiu, relativamente ao conjunto alargado de factos objecto da sua censura, qualquer indicação especificada do(s) meio(s) probatório(s) que deveria levar a um juízo probatório em sentido diverso do decidido na sentença (para cada um dos factos).
Ora, tem sido também jurisprudência pacífica, e que se perfilha, que no âmbito da impugnação da matéria de facto não há lugar ao convite ao aperfeiçoamento da alegação, ao contrário do que se verifica quanto às alegações de direito (cfr. entre muitos outros Acs. do STJ de 02.06.2016, 14.07.2016, 24.05.2018, 27.09.2018, 03.10.2019, 02.06.2020 e 25.03.2021, todos disponíveis in www.dgsi.pt).
Com efeito, a intenção da lei é não permitir impugnações vagas e genéricas da decisão da matéria de facto (sendo aqui mais exigente no princípio da auto-responsabilização das partes). É que, essa maior responsabilização é premiada com um alargamento do prazo processual para a apresentação das alegações quando o recurso se funda também na impugnação da matéria de facto.
A tal acresce que, a leitura das normas que regem esta matéria não permite outro entendimento, como resulta da análise do teor taxativo do artigo 640º e da previsão dos casos que justificam o convite constante do artigo 639º do CPC. 
Considerando o que ficou exposto, temos que, no caso dos autos não estão reunidos os pressupostos de ordem formal para admitir a reapreciação da decisão da matéria de facto requerida, que assim é de rejeitar.
 Mas ainda que assim se não entendesse, sempre seria inútil o conhecimento de grande parte da matéria de facto impugnada.
Com efeito, começando pelo primeiro desses blocos de factos, temos que o que está em causa, primordialmente, é uma faixa de terreno existente entre o imóvel da autora e o dos réus e que a autora entende pertencer-lhe.
Quanto a tal faixa de terreno, o que foi invocado pela autora, foi o seguinte:
“Ocupou e fechou ainda o réu por completo um espaço de permeio de cinquenta centímetros, que era aberto e que faz parte do terreno da autora, que existia entre os dois prédios…”;
“Com a o fecho do espaço de permeio que existia entre os dois prédios e que pertence e é terreno da autora…”;
“Neste momento tendo o réu tapado por completo o referido espaço de permeio que existia entre os dois prédios não possibilita uma vista livre e desimpedida e ocupou de má fé terreno que o réu sabia não ser seu mas sim da autora”;
“O espaço de permeio que existia entre os prédios, e que pertence à autora, media aproximadamente 15 centímetros na parte sul dos edifícios e progressivamente ia aumentando até chegar a medir 50 centímetros na parte norte dos edifícios”;
“O réu ao tapar o espaço entre o seu prédio e o prédio da autora deixando apenas um intervalo de 15 centímetros, espaço de permeio esse que é propriedade da autora sabia que violava o direito desta e representou a produção de factos ilícitos tendo a intenção de os realizar”;
“O réu fechando por completo o espaço de permeio pertencente à A. que existia entre os dois prédios, pela violação do seu direito de servidão de vistas, o réu causou danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos, devendo a liquidação ser fixada posteriormente em decisão ulterior”;
 “O réu pela ocupação do prédio, solo, espaço aéreo, ao prolongar o seu edifício por terreno alheio, de má fé contra a vontade da autora, pela violação do direito de propriedade da autora, causou danos patrimoniais ainda não avaliados em termos quantitativos, devendo a liquidação ser fixada posteriormente em decisão ulterior”;
“Os factos demonstram a titularidade do direito da autora, sobre a referida parcela de terreno que existia entre os dois prédios, que nos termos do artigo 1311.º do Código Civil, é possível exigir judicialmente o seu reconhecimento e a consequente restituição do que lhe pertence”;
“Nesta conformidade a autora é a legítima proprietária do terreno descrito e que foi identificado, e requer que lhe seja reconhecida a titularidade do direito de propriedade e restituída a sua posse”.
Após tal alegação, o pedido deduzido pela autora, quanto a tal matéria foi o seguinte:
I - Nestes termos e nos melhores de direito, requer-se a V.ª Ex.ª que seja reconhecido à autora o direito de propriedade do prédio urbano que identifica e o direito de propriedade do dito espaço de permeio entre os dois prédios, e que o réu seja condenado no reconhecimento deste direito de propriedade, sendo consequentemente, obrigado a demolir e a remover a parte da obra e da sua construção que ocupa e tapa ilegitimamente a área do prédio das autora, restituindo-lhe o mesmo prédio na totalidade da sua área, livre e desocupado de pessoas e coisas, respeitando o direito de propriedade da autora sobre o seu prédio, abstendo-se de o prejudicar, não praticando quaisquer ato ou comportamento que impeçam ou dificultem o exercício do direito da autora”.
O direito real pode definir-se como a afectação jurídico-privada de uma coisa corpórea aos fins das pessoas individualmente consideradas, caracterizando-se, assim, a relação de natureza real por um direito de domínio ou de soberania (total ou parcial) sobre a coisa em que incida, por um poder que todos os outros têm de respeitar (cfr. Pires de Lima, Lições de Direitos Reais, pág. 50, Menezes Cordeiro, Direitos Reais, pág. 351, Henrique Mesquita, Direitos Reais, pág. 10 e Oliveira Ascensão, Direitos Reais, pág. 72).
Dispõe o art. 1305º do Cód. Civil que o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas.
E o art. 1311º, nº 1, do mesmo diploma legal, que o proprietário pode exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituição do que lhe pertence.
Assim, a pretensão reivindicatória, é integrada por dois pedidos entre si logicamente articulados:
1º - Reconhecimento judicial do direito de propriedade do autor da acção sobre a coisa reivindicada;
2º - Condenação do demandado a restituí-la ao seu proprietário.
Impende sobre o autor de uma acção de reivindicação o ónus de alegar e provar que é proprietário da coisa que reivindica e que esta se encontra em poder do réu.
O réu, por sua vez, se quiser evitar a condenação terá de alegar e provar que a sua detenção é legítima e oponível ao autor. De modo que, comprovado o direito de propriedade do reivindicante, a restituição da coisa reivindicada só pode ser recusada se o seu detentor tiver título que legitime a recusa.
O registo predial, cujo objecto são factos jurídicos, tem por escopo principal dar a conhecer aos interessados a situação jurídica do bem, garantindo a segurança e genuinidade das relações jurídicas que sobre ele incidam, assegurando que, em regra, a pessoa que se encontra inscrita adquiriu validamente esse direito e com esse direito permanecerá para os seus futuros adquirentes.
Mas, se bem que, de acordo com o estatuído no art.º 7.º, do Código do Registo Predial, a inscrição no registo predial faça presumir a titularidade do direito de propriedade, o certo é que essa presunção não abrange a área ou a definição da delimitação física do prédio.
De facto é hoje entendimento pacífico que a presunção resultante da inscrição do direito não abrange a área, limites, estremas ou confrontações dos prédios descritos no registo pois que o registo predial, que não é constitutivo, não tem como finalidade garantir os elementos de identificação do prédio (Oliveira Ascensão, Direito Civil – Reais, p. 352, e, entre outros, os Acs. do STJ de 08.10.2009, 13.02.2014, 11.02.2016 e 18.03.2021 acessíveis em www.dgsi.pt).
Sendo assim não pode o titular do registo pretender que, pelo facto de certo prédio estar registado em seu nome, se têm por provadas as dimensões dele, as confrontações e seus limites.
Vista a petição inicial, resulta claramente que a autora se limitou a alegar a sua aquisição derivada do imóvel (por sucessão), e a existência de registo dessa aquisição a seu favor.
Ora, o facto de existir o invocado registo não resolve a questão em disputa, a propriedade de uma porção de terreno, a cuja propriedade ambas as partes se arrogam.
Tendo a autora optado pela acção de reivindicação, sempre teria de alegar e provar a sua posse sobre o objecto da disputa, com as características capazes de transformá-la em direito de propriedade, não bastando fazer apelo à presunção registral.
Contudo, em momento algum da petição inicial a autora alega quaisquer factos tendentes a significar uma aquisição originária fundada na usucapião, ou a prática de quaisquer actos de posse.
Como resulta dos arts. 1292º e 303º do Cód. Civil, a usucapião não opera automaticamente, não podendo ser oficiosamente conhecida, impondo-se antes a sua invocação pelos interessados, ainda que se não exija para tanto a obediência a qualquer fórmula sacramental, sendo suficiente que se aleguem os factos a ela conducentes, pois tal significará que, com toda a probabilidade, querem aproveitar-se os efeitos dela (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume III, 2ª edição revista e actualizada (com a colaboração de Henrique Mesquita), nota 3 ao art. 1293º, pp. 71/72.).
No entanto, no caso dos autos não foram alegados os actos de posse que se coadunam com tal figura e invocado o domínio sobre a coisa, pelo que não se pode considerar invocada a usucapião.
A alegação e consequente prova do direito, devia ser feita pela autora, não bastando justificar a própria aquisição, por sucessão hereditária. É que, no caso concreto, essa aquisição, se não é controvertida relativamente ao prédio como um todo, coloca-se quanto a esta concreta parcela de terreno, que se situa entre ambos os prédios.
Impunha-se, assim, que a autora tivesse invocado um modo de aquisição originário, gerado na sua própria esfera jurídica, ou daquele ou daqueles que lhe transmitiram a posse.
Mais se diga que a descrição factual efectuada pela apelante na petição inicial não careceria de qualquer convite ao aperfeiçoamento, no sentido de vir esta invocar factos tendentes a demonstrar a aquisição de tal faixa de terreno por usucapião, pois que o juiz não pode substituir-se às partes na defesa dos seus interesses e convidá-las a apresentar uma causa de pedir distinta daquela que as mesmas invocaram.
De facto, como afirmam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa (Código Civil Anotado. Vol. I – Parte Geral e Processo de Declaração, Coimbra 2019, p. 680), «[A] intervenção do juiz, apontando defeitos na narração dos factos, deve pautar-se por grande rigor e sobriedade, não cabendo ao juiz imiscuir-se nas opções assumidas pelas partes, nem sugerir outras alternativas, ainda que, eventualmente, mais vantajosas. Neste âmbito a estratégia da parte baliza a intervenção do juiz e será dentro desses limites que o juiz deve cuidar de verificar se a alegação fáctica apresenta insuficiências ou imprecisões, proferindo o despacho de convite ao aperfeiçoamento quando conclua haver imperfeições».
Afastada está, assim, a possibilidade de uma aquisição fundada na usucapião.
Com efeito, não sendo controvertida a titularidade do direito de propriedade sobre o prédio da autora, o que está em causa, é uma pequena parcela de terreno existente entre o prédio desta e o dos réus.
Assim, o direito de propriedade reivindicado pela autora não poderia ser reconhecido/declarado, relativamente à parcela em discussão, com base na apontada presunção registral, já que o que está em causa é saber se aquela parcela faz parte integrante do prédio da autora e, como se disse, a referida presunção registral não abrange a área, os limites e a configuração dos imóveis.
E, este concreto pedido de reconhecimento do direito real de propriedade não pode basear-se na presunção derivada do registo mencionado, pois que aquele reconhecimento pressupõe o apuramento dos elementos de identificação física do prédio a que respeita, designadamente da sua composição e da sua área, os quais não estão abrangidos por esta presunção.
Nesta medida, a autora apesar de ser titular registal do prédio descrito no registo, não beneficia de qualquer presunção de que é proprietária da faixa de terreno em discussão.
Tudo isto para significar que, o conhecimento da impugnação de qualquer dos factos atinentes à prova da propriedade sobre a referida faixa de terreno, se mostra absolutamente inútil, o que levaria à desnecessidade da sua reapreciação.
Assim, nunca seria de se proceder à reapreciação dos factos constantes das als. r) e rr) (esta última, também por conter matéria conclusiva e de direito), nem dos restantes factos constantes deste primeiro bloco, em tudo o que se refira à propriedade da autora sobre a referida faixa de terreno. O mesmo se aplica à al. i) do segundo bloco de factos impugnados pela apelante (que, para além disso, e parcialmente conclusiva).
Deste modo haveria que apreciar se se provou que:
p- Ocupou e fechou, ainda, o réu, por completo, um espaço de permeio de cinquenta centímetros, que era aberto …, que existia entre os dois prédios, não deixando nenhum foco de luz natural e qualquer entrada de ar, a uma janela interior.

gg- O espaço de permeio que existia entre os prédios, …, media aproximadamente 15 centímetros na parte sul dos edifícios e progressivamente ia aumentando até chegar a medir 50 centímetros na parte norte dos edifícios, ação da obra do réu, foi alterado, cortado e ocupado o telhado do prédio da autora.
ii- Desde a respetiva edificação, que a janela interior na cozinha sempre permitira à autora uma vista livre e desimpedida de ar e luz, no seguimento aliás do que já sucedia quando ali existia um espaço de permeio aberto sobre os dois prédios, ….
jj- Neste momento, tendo o réu tapado por completo o referido espaço de permeio que existia entre os dois prédios não possibilita uma vista livre e desimpedida…”.
Quanto a esta factualidade, bem como a constante das als.cc) e mm) do segundo bloco de factos impugnados pela autora, o pedido que foi deduzido foi o seguinte:
“II - Se declare constituída servidão de vistas do prédio da autora sobre o prédio dos réus, pela existência de uma varanda e de uma janela identificadas nos artigos 22.º, 36.º e 37.º da petição inicial, assim se condenando os réus, a demolir ou a recuar parte da obra, por modo a que entre esta e o prédio da autora fique um intervalo mínimo de 1,5 metros, destapado, aberto e com luz natural, entre a janela da autora e o prédio do réu bem como a demolir ou recuar a totalidade da varanda constituída que confina e ocupa parte da fachada do prédio urbano da autora, de tal forma que deixem um espaço livre e desimpedido com a distância não inferior a 1,50 metros do prédio urbano da autora e os réus sejam impedidos de realizar qualquer obra, levantar edifício ou construção que atente contra a existência da referida servidão”.
Para aferir do relevo do conhecimento de tal matéria de facto impugnada, há que ver, antes de mais, se as invocadas “janela” e varanda existentes no prédio da autora foram irregularmente construídas, bem como se a permanência das mesmas durante determinado lapso de tempo, sem oposição dos réus, permite a aquisição de um direito de servidão de vistas por usucapião a favor do prédio da autora.
A propriedade dos imóveis abrange o espaço aéreo correspondente à superfície, bem como o subsolo, como tudo o que neles se contem e não esteja desintegrado do domínio por lei ou negócio jurídico (cfr. art. 1344º, do Cód. Civil).
Por regra, o direito de propriedade compreende a faculdade de levantar edificações ou construções no respetivo prédio e não impondo o nosso Código qualquer distância mínima obrigatória entre construções realizadas em diferentes prédios contíguos, aquele que construir pode fazê-lo até às estremas do seu prédio (cfr. José Alberto Gonzalez, “Limitações de Vizinhança, Direito Privado”, Universidade Lusíada 1997, p. 141).
Como se afirma no Ac. da Relação de Coimbra de 11.10.2017, relatora Maria João Areias, in www.dgsi.pt, e que agora passamos a seguir de perto, em princípio, o proprietário pode fazer no seu prédio portas, janelas, varandas, terraços, sacadas, eirados e obras semelhantes, que lhe apetecer, e ainda que com elas fique devassado o prédio vizinho. Como esclarece Cunha Gonçalves, o proprietário pode, em princípio, fazer a edificação que lhe aprouver junto da estrema do seu terreno, ocupando-o totalmente ou deixando espaço em volta bem como levantá-lo até à maior altura possível (desde que com respeito dos regulamentos municipais e administrativos), sem que o proprietário se possa opor com a alegação de que o novo edifício ou construção lhe retira a vista de que gozava ou lhe diminua a luz ou o ar (Cunha Gonçalves, Tratado de Direito Civil, Vol. XII, Coimbra Editora – 1938, p.69).
Contudo, entre as limitações ao direito de propriedade destacam-se as emergentes das relações de vizinhança.
A vizinhança imobiliária é uma situação jurídica com propensão a criar conflitos entre particulares e, utilizando as palavras de Oliveira Ascensão (in, Direito Civil, Reais, 5ª Ed. Revista e ampliada, pág. 249): “o exercício de um direito no próprio prédio não pode deixar de repercutir-se sobre o exercício do direito no prédio vizinho. A lei previne o conflito, regulando vários aspectos que considerou particularmente importantes. Estabelece-se uma teia de relações jurídicas”.
É que, se de uma forma geral, o proprietário pode, no exercício do seu direito de uso e fruição, construir até à estrema do seu prédio, os interesses do titular de direito sobre o prédio vizinho podem ditar limitações que visam, entre o mais e quanto a construções, evitar o seu devassamento, seja pela vista e indiscrição de estranhos, seja pelo arremesso de objetos.

Assim, a tal respeito, o Cód. Civil prevê o seguinte:
O art. 1360º, sob a epígrafe “Abertura de janelas, portas, varandas e obras semelhantes
1. O titular do direito real não pode abrir portas ou janelas viradas para o prédio vizinho sem deixar entre estas e o limite daquele uma distancia de, pelo menos um metro e meio.
2. Igual restrição é aplicável às varandas, terraços, eirados ou obras semelhantes, quando sejam servidos de parapeitos de altura inferior a metro e meio em toda a sua extensão ou parte dela.
(…).

O art. 1361º - Prédios isentos da restrição:
As restrições do artigo precedente não são aplicáveis a prédios separados entre si por estrada, caminho, rua, travessa ou outra passagem por terreno do domínio público.
O artigo 1363º “Frestas, seteiras ou óculos para luz e ar
1. Não se consideram abrangidos pelas restrições da lei as frestas, seteiras ou óculos para a luz e ar, podendo o vizinho levantar a todo o tempo a sua casa ou contramuro, ainda que vede tais aberturas.
2. As frestas, seteiras ou óculos para a luz e ar devem, todavia, situar-se pelo menos a um metro e oitenta centímetros de altura, a contar do solo ou do sobrado, e não devem ter, numa das suas dimensões, mais de quinze centímetros; a altura de um metro e oitenta centímetros; a altura de um metro e oitenta centímetros respeita a ambos os lados da parede ou muro onde essas aberturas se encontram.
A doutrina e a jurisprudência vêm fazendo a seguinte interpretação da leitura conjugada de tais normas:
A regra geral surge contida no artigo 1360º: o proprietário não pode abrir portas ou janelas viradas para o prédio vizinho, sem que deixe entre estas e o limite do prédio vizinho uma distância de um metro e meio (proibição extensiva a varandas e terraços com beirados a altura inferior a um metro e meio).
Com tal limitação, pretende-se evitar que o prédio vizinho seja facilmente objeto da indiscrição de estranhos e impedir que o prédio seja facilmente devassado com o arremesso de objetos (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. III, 2ª ed., Coimbra Editora 1967, pág. 212).
Assim, com as restrições ao direito de propriedade contidas no art. 1360º foi intenção do legislador evitar, não propriamente as vistas que se podem desfrutar sobre o prédio vizinho, mas antes o devassamento deste, ou melhor, a ocupação do prédio vizinho: “Basta que, no parapeito de uma janela ou terraço, a pessoa se debruce numa atitude natural, ou estenda um braço, para que haja violação do direito de propriedade alheia, e é isso que se pretende evitar” (Pires de Lima, Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 99, p.240).
Os artigos 1363º e 1364º do Cód. Civil vêm consagrar duas excepções a tal proibição: se não respeitar a distância de um metro e meio relativamente ao prédio vizinho, o proprietário poderá ainda abrir óculos ou seteiras ou janelas gradadas, desde que possuam as caraterísticas aí definidas.
Por outro lado, não dizendo o Código Civil o que deve entender-se por janela, a doutrina e a jurisprudência entendem que tal vocábulo é usado com o sentido que tem na linguagem corrente (cfr. Henrique Mesquita, Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 128 (1996), anotação ao Acórdão do STJ de 03.03.2001, p. 151; Acórdão do STJ de 15.05.2008, relatado por Salvador da Costa, e Acórdão do TRL de 03.03.2015, relatado por Alexandre Reis, disponível in www.dgsi.pt).
Na concepção perfilhada por Henrique Mesquita (ob cit., pág. 149”: “as janelas e as frestas são aberturas feitas nas paredes de edifícios, mas que se distinguem não só pelas respectivas dimensões, como pelo fim a que se destinam. As frestas são aberturas estreitas, que têm apenas por função a entrada de luz e ar. As janelas, além de serem mais amplas do que as frestas, dispõem, de um parapeito onde as pessoas podem apoiar-se ou debruçar-se e desfrutar comodamente as vistas que tais aberturas proporcionam, olhando quer em frente, quer para os lados, quer para cima ou para baixo”.
Ou, noutra formulação, a diferença específica entre a janela, por um lado, e a fresta, a seteira e os óculos de luz, por outro, consubstancia-se, em relação à primeira, ao invés da última, no tamanho em largura e altura e na função de permitir a visão pelas pessoas de dentro para fora. O objecto do direito real de servidão de vistas, susceptível de ser adquirido por usucapião, é a existência da janela em condições de por ela se poder ver e de devassar o prédio vizinho, independentemente da concretização dessa usufruição, consubstanciando-se o corpus da posse na existência daquela janela em infracção do disposto no artigo 1360º, nº 1, do Código Civil (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15.05.2008, in www.dgsi.pt).
A jurisprudência, segundo cremos maioritária, tem-se pronunciado no sentido de que, quando o proprietário constrói uma parede no limite do seu prédio e deixa nela uma abertura, esta abertura só poderá ser qualificada de janela se permitir que um utilizador comum possa apoiar-se ou debruçar-se sobre o seu parapeito, ou sobre superfície que lhe corresponda, e com tal possa devassar o prédio vizinho (cfr. entre outros Ac. do TRC de 03.03.2015, e Ac. do STJ de 26.02.2004, disponíveis in www.dgsi.pt).
Se a possibilidade de devassa não existir, a abertura não pode ser considerada janela para efeitos do artigo 1362º do Cód. Civil.
No caso dos autos, temos que na cozinha da casa da autora existia uma abertura que deitava para um espaço que existe entre as duas casas.
Por outro lado existe também no prédio da autora uma varanda que não confronta nem é virada para o prédio dos réus.
Desde logo daqui resulta que, quanto à varanda, esta não confronta sequer com o prédio dos réus, razão pela qual, a partir dela não pode haver qualquer devassa do prédio vizinho.
Quanto à abertura, o mesmo se diga, pois que a mesma não dá para o prédio vizinho, mas antes para um espaço existente entre os dois prédios.
Para além disso, a abertura existente na cozinha da casa da autora não pode ser qualificada como janela, pois que nada foi alegado nesse sentido.
E desde logo, com a configuração que se apresenta tal abertura, não permite a invasão do espaço aéreo do prédio vizinho.
De qualquer modo, sem a alegação e prova da configuração da abertura em causa, nunca a mesma poderia ser considerada uma janela.
Segundo Pires de Lima e Antunes Varela (obra citada, anotação ao artigo 1363º, p.223.) toda a abertura que não obedeça, quer pelas suas dimensões quer pela respetiva localização, aos requisitos indicados no artigo 1362º, não pode ser considerada como abertura de tolerância (fresta, seteira ou óculo para luz), devendo considerar-se sujeita ao regime que o nº1 do artigo 1360º do Cód. Civil estabelece para as janelas, ou seja, é proibida.
Contudo, em nosso entender (como no do Ac. da Relação de Coimbra acima indicado e que vimos seguindo), a equiparação de tais aberturas às janelas, fica-se por aí.
Tratando-se de uma abertura irregular, os réus poderiam ter-se insurgido contra a sua manutenção, impondo à autora a sua tapagem ou a modificação das suas características em conformidade com a lei.
Não o tendo feito até hoje, chegamos à segunda parte da questão, de saber quais os efeitos de tal inércia por parte dos réus, nomeadamente se o decurso dos prazos da usucapião permitirá a aquisição de uma servidão de vistas a favor do prédio da autora, com o consequente impedimento para os réus de levantarem qualquer construção que as vede e não permita que o ar e a luz por elas entre, por força do art. 1362º do Cód. Civil.

Dispõe o artigo 1362º (Servidão de Vistas):
1. A existência de janelas, portas, varandas, terraços, eirados ou obras semelhantes, em contravenção do disposto na lei, pode importar, nos termos gerais, a constituição da servidão de vistas por usucapião.
2. Constituída a servidão de vistas, por usucapião ou outro título, ao proprietário vizinho só é permitido levantar edifício ou outra construção no seu prédio desde que deixe entre o novo edifício ou construção e as obras mencionadas no nº1 um espaço mínimo de metro e meio, correspondente à extensão das obras.
As janelas e demais obras aí referidas podem levar à constituição de uma servidão de vistas por usucapião – importando a consequente imposição ao proprietário vizinho de deixar um espaço mínimo de um metro e meio nas obras que venha a efetuar em frente de tais janelas.
Quanto às frestas e as janelas gradadas que obedeçam aos requisitos previstos nos artigos 1363º e 1364º, se o proprietário vizinho não se pode insurgir contra a sua abertura ou manutenção, pode, a todo o tempo, erguer construção no seu prédio até à estrema, ainda que com a mesma tape tais aberturas (nº1 do artigo 1363º). Tais aberturas nunca podem importar a constituição de uma servidão de vistas.
Contudo, o Cód. Civil não é expresso na solução a dar às frestas e janelas gradadas que, não obedecendo às caraterísticas impostas pelos arts. 1363º e 1364º – aberturas irregulares, relativamente às quais o proprietário vizinho tem o direito de exigir que sejam modificadas e postas em conformidade com a lei –, se venham a manter pelo tempo necessário à usucapião.
Pese embora existam posições diferentes quanto a esta questão, entendemos que a manutenção de aberturas irregulares – frestas ou janelas gradadas que não respeitem as dimensões, altura mínima e demais características definidas nos artigos 1363º e 1364º – nunca poderão dar lugar à constituição de uma servidão de vistas.
Desde logo, a designação de servidão de vistas não é a mais adequada, prestando-se a equívocos. “O objeto da restrição não é propriamente a vista sobre o prédio vizinho, mas a existência da porta, da janela, da varanda, do terraço, do beirado ou de obra semelhante, que deite sobre o prédio nas condições previstas no artigo 1360º. Não se exerce a servidão com o facto de se disfrutarem as vistas sobre o prédio, mas mantendo-se a obra em condições de se poder ver e devassar o prédio vizinho. Pode a janela ou a porta estar fechada, desde que o não seja definitivamente, com pedra e cal, que a servidão não deixa de ser exercida.” (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado”, Vol. III, 2ª ed., Coimbra Editora 1967, pág. 219).
Quanto às frestas e janelas gradadas, quando abertas em desrespeito dos limites legais, a jurisprudência dominante vai atualmente no sentido de que não se lhes pode aplicar o regime que o artigo 1362º prevê para as janelas e demais obras nele mencionadas (relativamente às quais o decurso do tempo necessário à usucapião poderá importar a constituição de uma servidão de vista).
Quanto a estas frestas ou janelas irregulares, ao proprietário vizinho assiste o direito de exigir que sejam modificadas e postas em conformidade com a lei.
Se o vizinho afetado pelas frestas irregulares não reagir contra o abuso cometido, a situação possessória que delas resulta dará origem, logo que decorra o prazo da usucapião, a uma servidão predial.
Constituída a servidão, o proprietário vizinho deixa de ter o direito, que antes lhe cabia, de exigir, através de uma acção negatória, que as frestas sejam modificadas e harmonizadas com a lei. E o proprietário que abriu as frestas adquire, por seu turno, o direito, de que não dispunha até então, de manter tais aberturas em condições irregulares.
Mas, como salienta Henrique Mesquita, da constituição desta servidão nenhum outro efeito resulta. “Concretamente, o proprietário vizinho não perde o direito de construir mesmo junto à linha divisória, ainda que tape as frestas, porque a restrição que cria uma zona non aedificandi, não permitindo edificar no espaço de um metro e meio, medido a partir dos limites do prédio, só é estabelecido pela lei em relação à servidão de vistas regulada no artigo 1362º, em cujo campo de aplicação não se incluem as frestas../../../../../fa00140/Jurisprudência/Civil/2ª Sec/Drª Mª João Areias/Proc. n┬║ 10705 M JOÃO AREIAS.docx - _ftn26”. (obra citada, p. 153).
Voltando ao caso dos autos, temos que a varanda e a abertura existentes no prédio da autora não permitem o tal devassamento e a intromissão no espaço aéreo vizinho. A abertura dá para um espaço existente entre os dois prédios e a varanda para a rua.
Por outro lado, desconhecem-se as características da referida abertura.
Ou seja, a manutenção de tal varanda e abertura pelo prazo da usucapião nunca poderiam levar à constituição de uma servidão de vistas.
Quando muito, e no que à abertura diz respeito, decorrido o tempo necessário à usucapião, os réus perderiam a faculdade de se insurgir contra a mesma, nunca ficando, contudo, sujeitos à obrigatoriedade de respeitar a distância de um metro e meio relativamente a qualquer construção que levantassem em frente à mesma.
É que, a imposição de manter uma distância de um metro e meio entre o edifício ou construção que venha a ser levantado em frente a “janelas, portas, varandas, terraços, eirados ou obras semelhantes”, só se encontra prevista pelo nº2 do artigo 1362º como consequência da constituição de uma servidão de vistas.
A tal acresce que, também nunca foi invocado pela apelante qualquer facto de onde resulte a constituição de uma servidão de vistas, por usucapião.
Ora, o pedido deduzido pela autora (acima transcrito) e para a procedência do qual eram relevantes os factos também acima referidos, apenas seria procedente se se pudesse concluir pela constituição de uma servidão de vistas, por usucapião ou outro título, o que, como vimos, não é possível.
E não se concluindo pela constituição de uma servidão de vistas a favor do prédio da autora, não é possível nessa sequência, concluir que aos réus estava proibida a construção que levaram a efeito, por violação de um direito de servidão de vistas, que como vimos inexiste.
Daí que, tal como sucedeu com os factos anteriormente referidos (do 1º bloco da impugnação), também se mostraria inútil o conhecimento da impugnação destes.
Quanto à als. h) constante do segundo bloco de factos impugnados, a prova ou não prova da mesma em nada relevaria para a decisão a proferir, razão pela qual, não seria tal impugnação de conhecer.
Já a matéria constante da al. i) desse mesmo bloco de factos, para além de conclusiva, contém matéria de direito.
No que diz respeito à al. m), temos que a apelante não impugnou a matéria dada como provada nos pontos 50, 51, 52 e 53 e que está em manifesta contradição com a constante da al. m) que a apelante entende dever ser dada como provada.
No terceiro bloco de factos, também a al. k), para além de conclusiva, contém matéria de direito, o mesmo sucedendo com parte da al. u), que para além disso está em contradição com factualidade dada como provada que a apelante não impugnou (cfr. pontos 48, 51). Também em contradição com tal factualidade dada como provada e não impugnada está a matéria da al. ff), sendo a matéria da al. ss) conclusiva e de direito. E a al. tt), para além de ser em parte conclusiva e conter matéria de direito, está em contradição com a factualidade provada acima assinalada e ainda com o ponto 54, não impugnados.
Para além disso, nunca a apreciação desta última al.tt) teria qualquer relevância, nomeadamente para a invocada servidão de estilicídio, pois que não foi invocado pela autora qualquer facto de onde resultasse a existência de tal servidão.
Com efeito, não alegou a autora que ela própria (e não o réu) infringiu o disposto pelo art. 1365º do Cód. Civil, construindo no seu prédio sem que entre a beira do telhado ou da cobertura dessa construção e o prédio vizinho tenha deixado uma distância de pelo menos meio metro e sem que essa construção seja acompanhada de obras que permitam que as águas pluviais provindas do telhado ou da cobertura desse edifício sejam despejadas na sua propriedade, acabando as mesmas por cair gota a gota no prédio vizinho, ou quando recolha essas águas pluviais num local, escoando estas assim recolhidas no prédio vizinho.
Só esta alegação fáctica e prova da mesma seria susceptível de levar à constituição de uma servidão de estilicídio, em benefício do seu prédio (prédio dominante), onerando o prédio do réu (prédio serviente).
E a constituição de uma servidão de estilicídio, nos termos do n.º 2, do mencionado art. 1365º, impediria que o proprietário do prédio onerado pela servidão (prédio serviente) pudesse levantar nele qualquer edifício ou construção que impedisse o escoamento das águas, devendo realizar as obras, necessárias para que o escoamento se fizesse sobre o seu prédio, sem prejuízo para o prédio dominante.
Ou seja, a servidão de estilicídio consiste, no direito que assiste ao proprietário do telhado ou outra cobertura de os manter construídos de modo que as águas pluviais se escoem sobre o prédio vizinho.
Nada disto é o alegado pela autora/apelante, razão pela qual seria manifestamente inútil conhecer da matéria de facto relacionada com o pedido deduzido pela autora, no que concerne à invocada servidão de estilicídio.
Por outro lado, também os factos constantes do quarto bloco de factos impugnados estão em manifesta contradição com a factualidade que se deu como provada nos pontos 16, 35, 36, 37, 38, 55, 56, 57, 58 e 59 e que a apelante não impugnou.
E a matéria constante do quinto bloco de factos impugnados, para além de ser na sua generalidade manifestamente conclusiva e de direito, dependia, para ter relevo, da prova da restante factualidade impugnada.
Nesta medida, ainda que não fosse de rejeitar a impugnação da matéria de facto, sempre se mostraria o conhecimento da mesma inútil, sem relevo ou improcedente.
*
Considerando que não foram introduzidas alterações na decisão relativa à matéria de facto, a factualidade (provada) a atender para efeito da decisão a proferir é a que já consta do ponto III, supra.
*
2. Cabe agora verificar se deve a sentença apelada ser revogada/alterada, em razão da alteração da decisão relativa à matéria de facto proferida pelo tribunal a quo – no seguimento da impugnação da autora/apelante - decidindo-se pela procedência da acção.
Como resulta das conclusões do recurso da autora/apelante, é manifesto que a pretendida alteração da decisão, na parte da matéria de direito, dependia integralmente da modificação/alteração da decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal a quo.
De facto, pese embora nas suas alegações invoque a autora que mesmo sem alteração da matéria de facto, a decisão de direito teria de ser alterada, a verdade é que quando fundamenta tal alteração da matéria de direito, parte do pressuposto da alteração da matéria de facto.
Ora, como vimos, não ocorreu qualquer alteração à matéria de facto.
Mas ainda que ocorresse, em nada relevaria tal modificação, considerando os pedidos deduzidos pela autora, que ab initio, não tinham suporte na factualidade por si alegada, como se deixou já expresso.
Com efeito, e como acima já afirmámos, não foi invocada pela autora matéria de facto de onde pudesse resultar o seu direito de propriedade sobre a faixa de terreno em discussão, nem matéria de facto de onde pudesse resultar quer a existência da invocada servidão de vistas, quer a existência da invocada servidão de estilicídio.
Donde, tais pedidos sempre seriam manifestamente improcedentes. E com eles os restantes pedidos deduzidos, que deles dependiam directamente.
Assim, a apelação terá de inevitavelmente improceder, mantendo-se a sentença recorrida.
*
Sumário (ao abrigo do disposto no art. 663º, n.º 7 do CPC):

I. A impugnação da matéria de facto “em bloco” viola o disposto no artigo 640.º do CPC, mormente quando não está em causa um pequeno número de factos ligados entre si e um número reduzido de meios de prova.
II. Estando em disputa a propriedade de uma porção de terreno, a cuja propriedade ambas as partes se arrogam e tendo a autora optado pela acção de reivindicação, sempre teria de alegar e provar a sua posse sobre o objecto da disputa, com as características capazes de transformá-la em direito de propriedade, não bastando fazer apelo à presunção registral.
III. Não se concluindo pela constituição de uma servidão de vistas a favor do prédio da autora, não é possível nessa sequência, concluir que aos réus estava proibida a construção que levaram a efeito, por violação de um direito de servidão de vistas, que inexiste.
IV. Não alegando a autora que ela própria (e não o réu) infringiu o disposto pelo art. 1365º do Cód. Civil, construindo no seu prédio sem que entre a beira do telhado ou da cobertura dessa construção e o prédio vizinho tenha deixado uma distância de pelo menos meio metro e sem que essa construção seja acompanhada de obras que permitam que as águas pluviais provindas do telhado ou da cobertura desse edifício sejam despejadas na sua propriedade, acabando as mesmas por cair gota a gota no prédio vizinho, ou quando recolha essas águas pluviais num local, escoando estas assim recolhidas no prédio vizinho, não pode pretender que declare que se constituiu uma servidão de estilicídio, em benefício do seu prédio (prédio dominante), onerando o prédio do réu (prédio serviente).
*
V. Decisão.

Perante o exposto, acordam as Juízes da 3ª Secção deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação, confirmando, em consequência, a decisão recorrida.
Custas do recurso pela autora/recorrente. 
*
Guimarães, 14 de Março de 2024

Assinado electronicamente por:
Fernanda Proença Fernandes
Sandra Melo
Conceição Sampaio
(O presente acórdão não segue na sua redacção as regras do novo acordo ortográfico, com excepção das “citações/transcrições” efectuadas que o sigam)