Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
846/23.1T8VVD.G1
Relator: MARIA AMÁLIA SANTOS
Descritores: DANO DA PRIVAÇÃO DO USO
INDEMNIZAÇÃO DIÁRIA PELA PARALISAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/04/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- Não deve ser apreciada a impugnação da matéria de facto se os factos impugnados não forem relevantes para a decisão da causa.
II - O valor diário a atribuir ao lesado pela paralisação da sua viatura tem de equivaler ao valor de circulação de uma viatura igual ou idêntica à que ficou sinistrada; só assim se alcançará a reposição da situação do lesado no estado anterior à do evento lesivo (art.º 562º do CC).
Decisão Texto Integral:
I - RELATÓRIO:

AA, residente na Travessa ..., ..., ..., ... ..., intentou ação declarativa sob a forma de processo comum contra EMP01...-COMPANHIA DE SEGUROS S.A., com  sede no Largo ..., ... ..., formulando contra a mesma o seguinte pedido:

“a) Deve a ré ser condenada no pagamento à Autora de uma indemnização correspondente a € 20,00 (vinte euros) por dia, pelos danos sofridos com a paralisação e privação do veículo, contados desde a data do acidente (22/09/2022) até 14/03/2023 (data em que a viatura ficou integralmente reparada), o que perfaz o total de 3.460,00 €, acrescida de juros vencidos desde a data da reparação da viatura, que atualmente se cifram em 19,34 €, o que, tudo somado resulta num total de 3.479,34 €, bem como nos juros que se vierem a vencer até efetivo e integral pagamento;
b) Deve a ré ser condenada a pagar à A. indemnização a título de danos morais causados, em montante nunca inferior a 5.000,00 € (cinco mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da data da citação até efetivo e integral pagamento;
c) Da soma da indemnização peticionada em a) e peticionada em b) resulta que deve a ré ser condenada a pagar à A. o total de 8.479,34 € (oito mil quatrocentos e setenta e nove euros e trinta e quatro cêntimos)…”
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Alega para tanto que é proprietária do veículo ligeiro de passageiros Marca ..., com a matrícula ..-..-DJ, e que em 22 de setembro de 2022 foi interveniente num acidente de viação com esse veículo, da responsabilidade total da condutora da viatura ..-..-QA, BB, segurada da Ré, que não respeitou um sinal de STOP existente na via por onde circulava, indo embater na viatura da A, danificando-a.
 Acontece que apesar da viatura da A ter ficado imobilizada e sem capacidade de circular, a Ré nunca colocou à sua disposição, de forma gratuita e sem encargos, um veículo de características e estado de conservação semelhantes ao DJ, durante o período de paralisação do mesmo – de 22.9.2022 a 14/03/2023, data em que a viatura ficou efetivamente reparada (e cuja reparação foi efetuada pela ré) -, o que perfaz o total indemnizatório de 3.460,00 € (20,00 € x 173 dias = 3.460,00 €).
Além disso, o DJ era o único veículo disponível que a Autora possuía, nas suas deslocações profissionais e pessoais, o que fez com que, após o sinistro, se visse obrigada a recorrer a transportes públicos, perdendo, por via dos horários dos mesmos, muito tempo.
Acresce que a autora tinha e tem uma grande estima pelo veículo em causa, que adquiriu no ano de 2000, tendo-se sempre esforçado por mantê-lo em bom estado de conservação, como estava, pelo que pretende ser ressarcida pelos danos morais sofridos, em montante nunca inferior a € 5.000,00, por todos os transtornos que toda esta situação lhe causou, pois perdeu muito tempo em viagens de autocarro, viu-se impossibilitada de se poder deslocar livremente para efeitos de lazer, e faltou a diversos compromissos, sentindo-se angustiada e triste, pelo facto de se ver privada do seu veículo automóvel, e, em consequência, ver as tarefas do dia a dia comprometidas.
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Regularmente citada, a Ré EMP01... apresentou contestação, aceitando a existência do contrato de seguro; a transferência para si da responsabilidade civil em relação a terceiros, decorrente da circulação do veículo com matrícula ..-..-QA; e que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do seu condutor.
Alega contudo, que procedeu ao pagamento à A do valor de € 996,30 pela perda total do veículo, e o montante de € 267,32, pela sua imobilização, tendo disponibilizado à Autora, na rent a car, um veiculo de substituição, desde o dia 7 ao dia 12 de outubro, que a A não aceitou.
Mais alega que a A. deu integral e plena quitação, na data em que foram liquidados todos os danos patrimoniais resultantes do sinistro em causa.
Considera ainda que os incómodos alegados pela A. para fundamentar os danos não patrimoniais reclamados são incómodos que não merecem a tutela do direito, sendo certo que esses ditos incómodos, sofridos pela falta do veículo, já foram ressarcidos pela indemnização da imobilização do mesmo.
Sem prescindir, considera excessivamente valorizados os danos não patrimoniais e patrimoniais peticionados pela A.
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Tramitados regularmente os autos foi proferida a seguinte decisão:
“VI. DECISÃO:
Em face do exposto, julga-se a ação parcialmente procedente e, em consequência, decide-se condenar a Ré EMP01...-Companhia de Seguros S.A a pagar à Autora AA a quantia de € 2 237,68 (dois mil duzentos e trinta e sete euros e sessenta e oito cêntimos), acrescido de juros de mora legal à taxa legal de 4% ou outra que se encontre em vigor (artigo 559.º, n.º1 do Código Civil e Portaria n.º 291/03 de 08/04), desde da data da citação da Ré até ao efetivo e integral pagamento, absolvendo-se do demais peticionado contra si…”.
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Não se conformando com a decisão proferida, dela veio a A interpor o presente recurso de Apelação, apresentando Alegações e formulando as seguintes Conclusões:
“1.º Por sentença proferida no âmbito do processo supra referenciado, foi decidido o seguinte: “Em face do exposto, julga-se a ação parcialmente procedente e, em consequência, decide-se condenar a Ré EMP01... – Companhia de Seguros, S.A. a pagar à Autora AA a quantia de € 2.237,68 (dois mil e duzentos e trinta e sete euros e sessenta e oito cêntimos), acrescido de juros de mora legal à taxa legal de 4 % ou outra que se encontre em vigor (…), desde da data da citação da Ré até ao efetivo e integral pagamento, absolvendo-se do demais peticionado contra si.”
2.º Sendo que o Tribunal a quo fundamentou, e porque nos interessa para o presente recurso pelo que se transcreve, o seguinte: “In casu, há que ter em consideração que a Autora apenas peticiona danos de privação do veículo até ao dia 14.03.2023, porquanto a partir dessa data passou a poder circular com o seu veículo, deixando, assim, de haver um dano. Seria então de considerar o período que decorreu entre a data do sinistro (22 de setembro de 2022) e o dia 14.03.2023. Todavia, no caso em apreço, há que ter em conta que ficou provado que a Ré disponibilizou à Autora um veículo de substituição na rent a car desde o dia 7 ao dia 12 de outubro de 2022, veículo esse que aquela não levantou.
Ora, relativamente a este período, em que a Autora teve a possibilidade de utilizar um veículo disponibilizado pela Ré, não podemos considerar que ela esteve privada, por causa imputável à Ré, de utilizar um veículo. Por isso, esses 6 (seis) dias não serão tomados em consideração da indemnização a fixar. Nesta indemnização há ainda a descontar a quantia de € 267,32 paga para compensar as despesas resultantes da utilização de transportes públicos, pois caso contrário haveria uma duplicação de indemnização. Quanto ao montante da indemnização, considerando o uso destinado ao veículo e o período de privação referido mas tendo presente que nada em concreto se apurou quanto ao valor locativo de veículo semelhante, haverá que formular in casu um juízo de equidade ao abrigo do disposto no artigo 566.º, n.º 3 do Código Civil. Para o efeito, há que ter em consideração os montantes fixados pela jurisprudência (€ 10,00), mas também a necessidade de atualizar tais montantes tendo em conta a crescente inflação nos últimos anos. Assim, tudo ponderado, entende o Tribunal ser adequado e justo ficar o montante diário de € 15,00. Contas feitas, deverá a Ré indemnizar a Autora no montante de € 2 237,68 corresponde à quantia de € 2 505,00 (167 dias x € 15,00), deduzida da quantia já paga de € 267,32”.
3.º Ora, a Autora não concorda com a sentença ora recorrida, na medida em que esta viola o artigo 483.º, 562.º e 563.º do Código Civil; assim como não pode concordar com a improcedência total do pedido de indemnização a título de danos não patrimoniais, com fundamento na falta de prova de que a Autora tenha tido efetivamente o dano que peticiona, o que não se aceita, violando igualmente o artigo 496.º do Código Civil.
4.º Consta como não provados, os seguintes factos vertidos nos pontos 3.2.1, 3.2.2, 3.2.4. e 3.2.5., o que não se concorda, pois na verdade, a testemunha CC, que teve um depoimento livre, espontâneo e cuja credibilidade, aliás, mereceu por parte do Tribunal a quo, comprovou estes factos, a instâncias da Patrona da Autora, no minuto 2:00 a 2:30 da gravação e ainda o documento n.º 1 junto da Petição Inicial, inscrição correspondente à Apresentação n.º 530, de 26/05/2000 – registo de propriedade a favor de AA.
5.º Assim como, deveria constar como provado que perdeu muito tempo em viagens de autocarros e ficou impossibilitada de se poder deslocar livremente, havendo uma limitação da sua liberdade e, como é de conhecimento geral numa sociedade frenética, livre e curiosa, este facto torna necessariamente uma pessoa triste e angustiada.
6.º Ora, dúvidas não restam, salvo melhor entendimento, que os factos vertidos nos pontos 3.2.1, 3.2.2., 3.2.4 e 3.2.5 deveriam ter sido considerados provados, substituindo assim, e necessariamente, a sentença proferida.
7.ºA Autora deve ser ressarcida pelos danos não patrimoniais sofridos com a privação do uso, nomeadamente a violação da sua liberdade e tranquilidade, isto porque não estamos a falar de uns dias, semanas ou um mês, mas quase meio ano sem viatura, o que não é comummente aceitável e certamente merece a tutela do direito.
8.º Pelo que, a Ré deve ser condenada a pagar à Autora uma indemnização a título de danos não patrimoniais, em montante nunca inferior a 5.000,00 €, o que desde já se requer que seja proferido pelo douto acórdão.
9.º Como refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15/04/2009, processo n.º 08P3704: “Danos não patrimoniais são os insusceptíveis de avaliação pecuniária ou medida monetária, porque atingem bens, como a vida, a saúde, a integridade física, a perfeição física, a liberdade, a honra, o bom nome, a reputação, a beleza, dos quais resulta o inerente sofrimento físico e psíquico, o desgosto pela perda, a angústia por ter de viver com uma deformidade ou deficiência, os vexames, a perda de prestígio ou reputação, tudo constituindo prejuízos que não se integram no património do lesado, apenas podendo ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo mais uma satisfação do que uma indemnização, assumindo o seu ressarcimento uma função essencialmente compensatória, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória ou de pena privada.”.
10.º Assim como, esta violação da sua liberdade, não se pode confundir com o dano de privação do uso, que traduz-se em efetiva lesão do direito real de propriedade e, como é defendido pela jurisprudência.
11.º Não há impedimento à cumulação das indemnizações pelo dano patrimonial, que se traduz em efetiva lesão do correspondente direito real de propriedade, e pelo dano de natureza não patrimonial que eventualmente o lesado tenha suportado, e que se traduz na sua afetação moral, desde que não sejam os mesmos factos a suportar ambas as indemnizações – vide Acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães, processo n.º 2125/18.7T8VNF.G2, de 15/06/2021 e do Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.º 7289/16.1T8LRS.L1-2, de 05/03/2020.
12.º Pelo que, deve a Ré ser condenada a pagar uma indemnização a título de danos não patrimoniais, como vem peticionado e foi provado, porquanto “Provando-se que por não ter veículo automóvel, o A. teve ´stress`, atrasos e faltas a eventos sociais, limitação da liberdade de locomoção, e bem assim que o A. tinha muito gosto no veículo, o qual mantinha bem cuidado, valorizando o facto de se tratar de um veículo edição especial, justifica-se, ainda, a compensação por danos não patrimoniais.” – vide Ac. Relação de Coimbra, processo n.º 1022/20.0T8LRA.C1, de 07/09/2021.
13.º Relativamente ao facto que consta no ponto 3.1.17 dos factos provados, o facto é verdadeiro, mas também é verdadeiro o alegado no artigo 15.º da Petição Inicial que “A Ré nunca colocou à disposição da Autora, de forma gratuita e sem encargos, um veículo de características e estado de conservação semelhantes ao veículo ..-..-DJ durante o período de paralisação do mesmo”.
14.º Efetivamente, a Autora só teria direito a usar um veículo de substituição se procedesse ao pagamento de uma caução, por apenas 5 dias.
15.º Na verdade, a Autora entende, e com razão, que não lhe deveria ser exigido qualquer caução, porquanto não tem de suportar qualquer despesa ou encargo associado a um aluguer de um automóvel quando não foi causadora daquela situação.
16.º Ao abrigo do disposto no artigo 562.º do Código Civil, quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, devendo assim ser a Ré a assegurar essa caução, sem prejuízo de ter direito a ação de regresso, assegurar a disponibilidade de uma viatura de forma gratuita à Autora, durante o período em que se viu privada de usar a sua própria viatura.
17.º Posto isto, não consideramos razoável nem aceitável que, ao valor atribuído para compensação do dano de privação do uso, sejam deduzidos os 6 dias em que a Autora poderia proceder ao levantamento do veículo alugado, após prestar caução às suas expensas, assim como não é deduzir as despesas de transporte, no valor de 267,32 € (duzentos e sessenta e sete euros e trinta e dois cêntimos).
18.º Na verdade, em prol do princípio da reconstituição natural, a Autora nunca teria tais despesas se não tivesse sofrido o acidente de viação e, consequentemente, não tivesse sido privada do uso do seu veículo.
19.º O facto de ser agora compensada pela privação do uso do seu veículo, não impede de ser ressarcida por todas as despesas que tenha tido com o acidente de viação.
20.º A Autora, para além de dever ser ressarcida pela privação do uso, também deve ser reembolsada das despesas tidas com transportes, sendo ambos os danos autónomos.
21.º Face ao exposto, a sentença deve ser alterada no sentido de a Ré proceder ao pagamento de 173 dias de privação do uso, na sua totalidade, sem qualquer dedução: nem de dias nem de montantes pagos a título de transportes.
22.º Mas também, e no que ao montante diário diz respeito, é já defendido pela maioria da jurisprudência portuguesa que o valor a aplicar-se atualmente é de 20,00 € diários.
23.º Neste sentido, vide o Ac. da Relação de Coimbra, 318/23.4T8PMS.C1, de 24/09/2024: “Na realidade, o valor de 10 €/dia que tem vindo a ser fixado pela nossa jurisprudência quando não existe um aluguer de um veículo por parte do lesado, começou a ser fixado em acórdãos proferidos já na distante data de 2010 e assim mantido em acórdãos bem posteriores (o último assinalado na sentença apelada é de Maio de 2019, ou seja com 9 anos de intervalo). Partindo desta base de 10 €, importa actualizá-lo, decorridos 14 anos, atenta a inflação que tem grassado, especialmente mais severa nos últimos 5 anos. Como é do conhecimento público. Com resultados médios de 7,8% em 2022 e 4,3% em 2023 (fonte: www.pordata.pt – com a palavra chave taxa de inflação nos últimos 5 aos), tal e qual como justamente assinalado pela apelante no corpo das suas alegações de recurso, o que forçosamente desvalorizou o valor de 10 € inicialmente apontado pela dita jurisprudência no já longínquo ano de 2010, e que hoje em dia temos por perfeitamente desajustado. Ponderando, a apontada desvalorização e um juízo de equidade, cremos ser muito mais adequado e justo, afastando-nos do imobilismo jurisprudencial, o valor diário de privação de uso do veículo o montante de 20 €.”
24.º Posto isto, não se aceita, porque é injusto e desproporcional, o montante de 15,00 € fixo por cada dia, que viola o juízo de equidade previsto no artigo 566.º, n.º 3 do Código Civil e, com respeito à taxa de inflação sofrida nos últimos 5 anos, deverá fixar-se um montante diário de 20,00€, como vem aliás peticionado.
25.º Pelo que deve a sentença recorrida ser revogada e substituir por outra que condene a Ré a pagar à Autora a quantia de € 3460,00 (três mil quatro centos e sessenta euros) a título de danos patrimoniais e uma indemnização de montante nunca inferior a € 5000,00 (cinco mil euros) a título de danos não patrimoniais, fazendo assim Justiça.
Nestes termos, e nos melhores de Direito, deve ser dado provimento ao recurso e ser a sentença recorrida revogada e substituída por outra que julgue a ação totalmente procedente e, em consequência, condena a Ré sobre os pedidos formulados pela Autora…”.
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Dos autos não consta que tenha sido apresentada Resposta ao recurso.
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II - OBJETO DO RECURSO:          

Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente (acima transcritas), sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso (artigos 635º e 639º do CPC), as questões a decidir no presente recurso de Apelação (por ordem lógica de conhecimento) são as seguintes:

I- A de saber é de alterar a matéria de facto, no sentido pretendido pela recorrente;
II- Em caso afirmativo, se devem ser ressarcidos os danos não patrimoniais reclamados pela A; e
III- Se deveria ser procedente, na íntegra, o pedido indemnizatório formulado pela A, pela privação do uso da sua viatura.
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III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:

Foi fixada na 1ª Instância a seguinte matéria de facto:
“3.1. Factos Provados:
3.1.1. A autora é proprietária do veículo ligeiro de passageiros Marca ..., com a matrícula ..-..-DJ.
3.1.2. Em 22 de setembro de 2022, pelas 08:30h, na Avenida ..., ... ... e ..., mais concretamente, na EN ...01, sentido ... – ..., a Autora circulava ao volante da sua viatura ..-..-DJ, na EN ...01, nesse mesmo sentido, quando foi surpreendida pelo embate da viatura ..-..-QA, marca ..., conduzida por BB.
3.1.3. A referida viatura ..-..-QA circulava na Rua ..., sendo que nessa via encontra-se – tal como se encontrava na data do sinistro - sinalização vertical Stop.
3.1.4. Todavia, a condutora da viatura ..-..-QA não respeitou a sinalização vertical stop no local, invadindo a via de trânsito onde circulava a Autora.
3.1.5. Consequentemente, a viatura ..-..-QA bateu na parte frontal esquerda do veículo da Autora.
3.1.6. A viatura com matrícula ..-..-DJ encontrava-se à direita da viatura ..-..-QA.
3.1.7. À data do sinistro, a viatura ..-..-DJ detinha seguro automóvel válido, com o número de apólice ...94, válida até 13/09/2023, na Companhia EMP02..., S.A.
3.1.8. À data do sinistro, a responsabilidade civil em relação a terceiros decorrente da circulação do veículo com matrícula ..-..-QA, propriedade de DD, encontrava-se transferida para a Ré através de contrato de seguro titulado pela apólice nº ...55, válida até 14/12/2022.
3.1.9. Em virtude do referido embate, o veículo ligeiro de matrícula ..-..-DJ ficou impossibilitado de circular desde 22.09.2022 até 14.03.2023.
3.1.10. O veículo de matrícula ..-..-DJ ficou danificado na pintura, para-choques, piscas frontais, farol esquerdo, calços, kit rolamento rodas, fole direção, guarda lama.
3.1.11. O veículo ..-..-DJ era o único veículo disponível que a Autora possuía e que utilizava nas suas deslocações profissionais e pessoais, nomeadamente para ir às compras, para atividades de lazer, idas ao médico, ao banco, ao mercado, visitas a amigos e familiares.
3.1.12. Após o acidente, a Autora teve que recorrer a transportes públicos.
3.1.13. Em 1 de outubro de 2022 foi realizada a peritagem a veículo de matrícula ..-..-DJ, tendo dessa peritagem resultado que os danos tinham um valor estimado de € 2 049,28.
3.1.14. O valor venal do veículo de matrícula ..-..-DJ, à data do sinistro, era de € 800,00.
3.1.15. A reparação do veículo de matrícula ..-..-DJ é tecnicamente não aconselhável.
3.1.16. A Ré comunicou o relatório de perda total do veículo em 6 de outubro de 2022.
3.1.17. A Ré disponibilizou à Autora um veículo de substituição na rent a car do dia 7 ao dia 12 de outubro de 2022, mediante o pagamento por esta de uma caução, que não foi levantado.
3.1.18. Em 25 de maio de 2023, a Ré procedeu ao pagamento dos montantes de € 996,30 e de € 267,32, este último para compensar despesas com transportes efetuadas pela Autora.
3.1.19. Com a quantia de € 996,30 era possível, à data, a aquisição no mercado de um veículo com as mesmas características do veículo de matrícula ..-..-DJ.
3.1.20. Com o pagamento das quantias referidas em 3.1.18., a Autora assinou o recibo n.º ...05 que continha as seguintes declarações: “Declaramos dar quitação a este Segurador, como indemnização por todos os danos patrimoniais resultantes do sinistro acima mencionado, renunciando a qualquer outro direito perante a referida companhia, o seu Segurado e o condutor do respetivo veículo, aos quais conferimos plena e integral quitação”. “Recebi s/ me ser dada discriminação das despesas.”.
3.1.21. A Autora mandou reparar a viatura.

3.2. Factos não provados:
3.2.1. A Autora tinha e tem uma grande estima pelo veículo em causa, que adquiriu no ano de 2000.
3.2.2. A Autora sempre se esforçou por manter a viatura em causa em bom estado de conservação, como estava.
3.2.3. O veículo ..-..-DJ ficou integralmente reparado em 14.03.2023.
3.2.4. A Autora perdeu muito tempo em viagens de autocarro, viu-se impossibilitada de se poder deslocar livremente para efeitos de lazer e faltou a diversos compromissos.
3.2.5. A Autora sentiu-se angustiada e triste pelo facto de se ver privada do seu veículo automóvel, e, em consequência, ver as tarefas do dia a dia comprometidas.
***
Não existem outros factos provados ou não provados com interesse para a discussão da causa e os demais alegados são matéria conclusiva/instrumental e/ou de direito ou repetida e irrelevante, pelo que não constam dos factos provados ou não provados…”.
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Da Impugnação da Matéria de Facto:

Insurge-se a recorrente contra a matéria de facto não provada, vertida nos pontos 3.2.1, 3.2.2, 3.2.4. e 3.2.5., dizendo que a testemunha CC, que teve um depoimento livre e espontâneo, e que mereceu credibilidade por parte do Tribunal, comprovou estes factos. Convoca ainda para prova desses factos o documento n.º 1 junto da Petição Inicial, comprovativo do registo de propriedade da viatura sinistrada a seu favor.

Vejamos:
Consta dos pontos da matéria de facto impugnada o seguinte:
3.2.1. A Autora tinha e tem uma grande estima pelo veículo em causa, que adquiriu no ano de 2000.
3.2.2. A Autora sempre se esforçou por manter a viatura em causa em bom estado de conservação, como estava.
3.2.4. A Autora perdeu muito tempo em viagens de autocarro, viu-se impossibilitada de se poder deslocar livremente para efeitos de lazer e faltou a diversos compromissos.
3.2.5. A Autora sentiu-se angustiada e triste pelo facto de se ver privada do seu veículo automóvel, e, em consequência, ver as tarefas do dia a dia comprometidas.
*
Sobre a questão da propriedade da viatura sinistrada, adiantamos já que ela nunca foi posta em causa pelo tribunal recorrido, como ficou a constar do ponto 3.1.1. da matéria de facto provada – do qual consta que “a A autora é proprietária do veículo ligeiro de passageiros Marca ..., com a matrícula ..-..-DJ” -, pelo que se mostra irrelevante a redação da última parte do ponto 3.2.1, mostrando-se também despicienda a análise do documento junto pela A com a p.i. (comprovativo do registo de propriedade da viatura sinistrada a seu favor) – única prova capaz de dar como provado tal facto.
Relevantes para fundamentar o pedido formulado pela A quanto aos alegados danos não patrimoniais, são os pontos seguintes (assim como a primeira parte do ponto 3.2.1.), relacionados com o alegado sofrimento da A com a paralisação da sua viatura.
E ainda assim, haverá que separar tais pontos.
Assim, dos pontos 3.2.1. e 3.2.2. resulta tão somente que a A tinha e tem uma grande estima pelo veículo em causa, e que sempre se esforçou por manter a viatura em causa em bom estado de conservação, como estava.
Como é bom de ver, estes factos não contêm em si qualquer situação de dano ou de prejuízo sofrido pela A. São uma mera constatação de uma realidade, sem qualquer relevância em termos de danos e da sua eventual ressarcibilidade.
E o mesmo se passa quanto ao facto descrito em 3.2.4. – que a A Autora perdeu muito tempo em viagens de autocarro, viu-se impossibilitada de se poder deslocar livremente para efeitos de lazer e faltou a diversos compromissos –, uma vez que ainda estamos no âmbito da constatação de uma realidade, sem qualquer repercussão na saúde ou no estado anímico da A.
Ademais, parte dessa matéria de facto ficou a constar dos pontos 3.1.11. e 3.1.12 da matéria de facto provada - O veículo ..-..-DJ era o único veículo disponível que a Autora possuía e que utilizava nas suas deslocações profissionais e pessoais, nomeadamente para ir às compras, para atividades de lazer, idas ao médico, ao banco, ao mercado, visitas a amigos e familiares (…). Após o acidente, a Autora teve que recorrer a transportes públicos” – alicerçando tais factos a indemnização pelo dano da privação do uso, já fixada na sentença recorrida.
Ora, perante essa constatação, mostra-se desnecessário levar a cabo a apreciação da prova convocada pela A para dar tais factos como provados – designadamente o depoimento da testemunha CC -, uma vez que a convolação de tais factos para “provados” não iria alterar o sentido decisório. Daqueles pontos, como dissemos, não consta qualquer dano não patrimonial, nem qualquer afetação da saúde da A – física ou mental.
Como refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15/04/2009 (citado pela recorrente) “Danos não patrimoniais são os insusceptíveis de avaliação pecuniária ou medida monetária, porque atingem bens, como a vida, a saúde, a integridade física, a perfeição física, a liberdade, a honra, o bom nome, a reputação, a beleza, dos quais resulta o inerente sofrimento físico e psíquico, o desgosto pela perda, a angústia por ter de viver com uma deformidade ou deficiência, os vexames, a perda de prestígio ou reputação, tudo constituindo prejuízos que não se integram no património do lesado, apenas podendo ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo mais uma satisfação do que uma indemnização, assumindo o seu ressarcimento uma função essencialmente compensatória, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória ou de pena privada.”
Ora, analisados os factos descritos, em nenhum deles consta qualquer das situações descritas, de sofrimento físico ou psíquico da A.
Donde, nos abstemos de apreciar tal matéria de facto, seguindo o entendimento, defendido unanimemente na jurisprudência, de que o direito à impugnação da matéria de facto não subsiste por si só, antes assume um carácter instrumental face à decisão de mérito da ação. Deste modo, por força dos princípios da utilidade, economia e celeridade processual, o tribunal de recurso não deve reapreciar a matéria de facto, quando os factos concretos objeto da impugnação forem insuscetíveis de, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, e às diversas soluções plausíveis de direito, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente (Ac. RC de 24.04.2012 e de 27-05-2014, e desta RG de 15-02-2018 e de 11-07-2017, todos disponíveis em www.dgsi.pt.)
Concluímos assim do exposto que a matéria de facto vertida nos pontos 3.2.1., 3.2.2., e 3.2.4 se apresenta de todo irrelevante em termos de decisão jurídica da causa, qualquer que seja o sentido que pudesse ser dado à mesma, pelo que nos dispensamos de a reapreciar, para evitar levar a cabo a prática de atos inúteis que a lei processual proíbe (art.º 130º do CPC).
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O único ponto relevante para efeitos de reparação do dano não patrimonial é o descrito em 3.2.5. – do qual consta que “A Autora sentiu-se angustiada e triste pelo facto de se ver privada do seu veículo automóvel, e, em consequência, ver as tarefas do dia a dia comprometidas”.
Afirma a recorrente que a testemunha CC confirmou esses factos.
Mas com todo o respeito, tal não aconteceu.
Auditado o seu depoimentos, o mesmo confirmou apenas os factos descritos em 3.2.1. e 3.2.2., – os quais por si só, como referimos, não revelam qualquer sofrimento físico ou psíquico por parte da A., não se podendo também extrair daqueles, como pretende a recorrente, que a A necessariamente se sentiu triste e angustiada com toda esta situação.
Trata-se de uma realidade que competia à A provar, e não o fez, pelo que aderimos aqui ao que foi considerado na primeira instância, de que não foi feita prova pela A dos alegados danos morais por si sofridos.
Mesmo em relação ao ponto 3.2.4, auditado o depoimento da testemunha CC, o mesmo confirmou apenas o que resulta das regras da experiência: que “a A andava de transportes públicos, e às vezes quando precisava de alguma coisa eu levava (…). Andou de comboio, de táxi, andava de transportes, as amigas levavam.”, não conseguindo precisar também em que medida a falta do carro afetou a vida da A, nem a que compromissos ela faltou, sendo o seu depoimento muito vago, ao afirmar simplesmente, que a falta da viatura “afetou-a muito, afetou-a muito porque ela tem que andar, tem que ir aos clientes…”. Quando questionado sobre a forma como resolveu o problema, se deixou de ir aos clientes ou se a levavam, respondeu muito vagamente “não sei, deixou de puder ir a muitos por não ter transportes.”
Ora, perante este depoimento tão vago sobre o ponto 3.2.4., nada temos a objetar à sua inclusão também na matéria de facto não provada.
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Improcede assim a impugnação da matéria de facto, sendo à luz da matéria de facto fixada que deverão ser apreciadas as demais questões colocadas.
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IV - FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA:

Da questão da indemnização peticionada pelos alegados danos não patrimoniais sofridos pela A:
Perante a matéria de facto provada – e não provada -, subscrevemos a decisão da primeira instância de que “A Autora peticiona ainda uma indemnização no montante de € 5 000,00 por danos morais. Atentando nos factos provados, não resulta dos autos que a Autor tenha tido efetivamente o dano que peticiona. Assim sendo, não estando demostrado o dano concreto sofrido, entende-se ser de absolver a Ré do peticionado nesta parte”.
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Diremos apenas, que nesta questão aderimos ao entendimento da recorrente de que não há impedimento – em tese -, à cumulação da indemnização pelo dano patrimonial, que se traduz em efetiva lesão do correspondente direito real de propriedade, com a indemnização pelo dano de natureza não patrimonial que eventualmente o lesado tenha suportado, e que se traduz na sua afetação moral, desde que não sejam os mesmos factos a suportar ambas as indemnizações (na esteira dos citados Acórdãos deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 15/06/2021, do Tribunal da Relação de Lisboa, de 05/03/2020, e do Ac. Relação de Coimbra, de 07/09/2021, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
A questão é que a recorrente não logrou provar, como lhe competia, que sofreu efetivamente danos de natureza não patrimonial com a paralisação da sua viatura, designadamente o sofrimento psíquico alegado – angústia e tristeza –, que são os verdadeiros danos ressarcíveis, por se traduzirem em verdadeiras lesões à saúde mental da A.
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Da indemnização do dano pela paralisação da viatura:
Alega também a recorrente que relativamente ao facto que consta no ponto 3.1.17 dos factos provados, o facto é verdadeiro, mas também é verdadeiro o facto alegado no artigo 15.º da Petição Inicial, que “A Ré nunca colocou à disposição da Autora, de forma gratuita e sem encargos, um veículo de características e estado de conservação semelhantes ao veículo ..-..-DJ durante o período de paralisação do mesmo”.
E que a Autora só teria direito a usar um veículo de substituição, se procedesse ao pagamento de uma caução, por apenas 5 dias.
Tudo quanto se afirma é verdadeiro, mas também é verdade que a questão apenas foi colocada nos autos pela A.
Ou seja, analisada a petição inicial – na qual vem alegado o facto descrito em 15º -, não vemos nela referido (também) que a A tenha suscitado essa questão perante a ré na altura em que a viatura lhe foi colocada à disposição, sendo certo que como é do conhecimento público, é a empresa de rent a car que exige essa caução aos clientes.
A caução para aluguer de carros em Portugal é uma garantia (que pode consistir num valor bloqueado no cartão de crédito) para cobrir potenciais despesas, como danos no veículo, multas, portagens não pagas, combustível em falta, ou dias adicionais de aluguer. Se o carro for devolvido em boas condições e não houver custos extra, o valor é devolvido, ou não é cobrado do cliente.
Perante essa norma, praticada pelas empresas de aluguer de viaturas em geral, seria caso para a A colocar essa questão à ré, na altura em que foi levantar a viatura, e não o fez. Donde, nem sequer podemos apreciar – em termos jurídicos -, a recusa da ré em efetuar o pagamento da caução que foi exigido à A pela rent a car.
Ademais, sendo a caução um valor reembolsável, pôr-se-ia apenas a questão da disponibilidade financeira da A para o seu adiantamento. Ora, também não vemos referido em lado nenhum, que a A não tenha pago a caução por falta de capacidade financeira para adiantar o valor que lhe foi exigido.
Concluímos assim do exposto, que nos dias em que a viatura de substituição foi facultado à A, não havia motivos válidos para ela ter recusado a disponibilidade que lhe foi concedida pela seguradora.
Donde, nada temos a objetar ao que foi decidido na primeira instância, de que ao valor atribuído à A para compensação do dano de privação do uso, sejam deduzidos os 6 dias de paralisação em que a Autora poderia proceder ao levantamento de uma viatura de aluguer a custear pela ré.
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Relativamente ao valor das despesas de transporte que a ré pagou à A, no valor de 267,32 €, não vemos também como não as deduzir ao valor total da indemnização, uma vez que elas constituem despesas feitas pela A em virtude do acidente, sendo de as incluir no dano da privação do uso.
O que acontece é que se vem considerando o dano da privação do uso como um dano que abrange todas as despesas que o A tenha em virtude de se ver privado do uso da sua viatura, sem necessidade de as quantificar. Se elas estiverem quantificadas, elas devem ser ressarcidas e abatidas ao valor que for fixado – genericamente – para indemnizar o dano da privação do uso.
De outra forma, como bem se referiu na sentença recorrida, seria duplicar a indemnização pela reparação do dano, não se podendo considerar que se trata de danos autónomos (quantificados e não quantificados).
Improcede assim a pretensão da A nesta matéria.
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Da quantificação da indemnização diária pela privação do uso da viatura:
Considera finalmente a recorrente, que no que diz respeito ao montante diário da indemnização, é já defendido pela maioria da jurisprudência portuguesa, que o valor diário a aplicar atualmente é de € 20,00 (discordando assim do valor de € 15,00 fixado na sentença recorrida), fazendo apelo a vários acórdãos da Relação a defender essa posição.
Vejamos:
Considerou-se na decisão recorrida o seguinte:
“Na atribuição do valor ao dano sofrido pela privação do uso do veículo automóvel, o tribunal deve nortear-se por imperativos de justiça, tendo em consideração todas as circunstâncias do caso, que deverá sopesar prudentemente, com ponderação das vantagens e inconvenientes, tendo em vista uma decisão que contenha uma solução equilibrada.
Para tanto, deve atender-se ao tipo de utilização que a Autora fazia da viatura (mais ou menos intensa), à sua utilidade – se era para fins laborais, familiares ou de lazer – e ao período de tempo que durou essa privação (neste sentido, veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07/05/2015, processo n.º 1222-07.9YXLSB-C.L1, disponível em www.dgsi.pt) (…).
Quanto ao montante da indemnização, considerando o uso destinado ao veículo e o período de privação referido mas tendo presente que nada em concreto se apurou quanto ao valor locativo de veículo semelhante, haverá que formular in casu um juízo de equidade ao abrigo do disposto no artigo 566.º, n.º 3 do Código Civil.
Para o efeito, há que ter em consideração os montantes fixados pela jurisprudência (€ 10,00 por dia), mas também a necessidade de atualizar tais montantes tendo em conta a crescente inflação nos últimos anos.
Assim, tudo ponderado, entende o Tribunal ser adequado e justo fixar o montante diário de € 15,00…”.
Começamos por dizer que aderimos integralmente ao que foi decidido na primeira instância sobre o valor diário a atribuir à A, a título de indemnização pelos dias de paralisação da sua viatura.
Acrescentamos apenas que, se não foi apurado o valor locativo do veículo sinistrado, apurou-se que se trata de uma carrinha ... com mais de 20 anos (embora em bom estado de conservação, segundo a testemunha CC), que a A usava no seu dia a dia, para trabalhar e para a sua vida corrente.
Ora, o que se indemniza neste tipo de dano, é o valor do veículo paralisado, ou o dano patrimonial sofrido pelo lesado pela privação do seu uso.
Donde, o valor a atribuir-lhe tem necessariamente de equivaler ao valor de circulação de uma viatura igual ou idêntica à que ficou sinistrada; só assim se alcançará a reposição da situação do lesado no estado anterior à do evento lesivo (art.º 562º do CC).
Daí que o valor a considerar para efeitos de indemnização tenha necessariamente de passar por aferir qual o valor locativo de uma viatura igual ou idêntica à sinistrada, que assegure ao seu proprietário as mesmas necessidades que a viatura paralisada garantia.
Ora, feita uma pesquisa na internet, verificamos que o valor locativo de uma carrinha ... usada (marca e modelo da da recorrente) ronda os € 279 por mês (IVA incluído), pelo que consideramos que o valor diário fixada na sentença recorrido é suficiente para indemnizar a A pela paralisação da sua viatura, valor esse que seria o valor que ela teria de despender, caso tivesse recorrido ao aluguer de uma viatura igual ou semelhante para suprir a falta da sua.
Concluímos assim do exposto, que o valor fixado – de € 15 diários -, se mostra adequado para ressarcir os danos sofridos pela A com a paralisação da sua viatura.
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V. DECISÃO:

Em face do exposto, julga-se improcedente a Apelação e confirma-se a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente (art.º 527º nº 1 e 2 do CPC).
Notifique e D.N
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Guimarães, 4.11.2025

Relatora: Maria Amália Santos
1º Adjunto: João Paulo Pereira
2ª Adjunta: Elisabete Moura Alves