Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4693/21.7T8BRG-A.G1
Relator: ALCIDES RODRIGUES
Descritores: DIREITO DE PROPRIEDADE
SERVIDÃO DE ÁGUAS
UTILIDADE ECONÓMICA
VALOR DA CAUSA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/07/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Na acção que tiver por fim fazer valer o direito de propriedade e/ou servidão sobre águas, e não estando em discussão o reconhecimento da propriedade dos respetivos prédios rústicos que beneficiam de tais águas, o valor da causa deve ser fixado apenas em função do valor das águas objeto do litígio, nos termos do disposto nos arts. 296°, n.º 1 e 302º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

No Juízo Local Cível ... - Juiz ... - do Tribunal Judicial da Comarca ..., os autores, AA e BB intentaram acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra 1ª. CC, 2º. DD, 3ª. EE, tendo peticionado:

«I – Decidir-se que os Réus são legítimos sucessores de FF, declarando-os habilitados para com ela prosseguirem os termos da demanda;
II – Que seja declarado e os Réus condenados a reconhecer:
a) - Que os Autores são legítimos proprietários e possuidores dos prédios identificados no artigo 4º, que lhes foram transmitidos com as águas, todos os direitos a regos e servidões, mencionados no artigo
5º, que formam o conjunto imobiliário denominado quinta do casal além de baixo, com a atual caraterização mencionada no artigo 10º;
b1) - A título principal – que os Autores são legítimos proprietários e possuidores do direito às águas mencionadas no supra artigo 5º em conformidade com a divisão e na forma e proporção mencionados no mesmo artigo;
b2) - A título subsidiário – que os Autores são legítimos possuidores do direito de servidão ao aproveitamento das águas mencionadas no supra artigo 5º, na forma e proporções mencionadas no mesmo artigo;
c1) - A título principal - que os Autores são titulares do direito de propriedade e possuidores das águas mencionadas nos supra artigos 6º, 7º, 8º e 9º, em conformidade com a forma e proporções aí mencionadas;
c2) - A título subsidiário – que os Autores são legítimos possuidores do direito de servidão ao aproveitamento das águas mencionas nos supra artigos 6º, 7º, 8º e 9º;
d) - Os Autores são legítimos possuidores do direito de servidão de presa, que consiste no direito de represar e derivar as águas mencionadas nos artigos 4º, 5º, 6º, 7º, 8º e 9º, da ..., situada no prédio dos Réus, descrito no supra artigo 21º, bem como as que a esta afluem provenientes da poça do rio e com origem, também, na poça de arrebenta boi e da poça da fontinha, para os prédios dos Autores identificados nos artigos 4º, 9º e 10º;
e) - Os Autores são legítimos possuidores do direito de servidão de aqueduto constituída sobre o prédio dos Réus, descrito no artigo 21º, para derivação e condução das águas com os trajetos e configuração expressos no artigo 34º, da ... para os prédios dos Autores, conforme aí mencionado.
f1) – a título principal – que os Autores são legítimos proprietários e possuidores do direito à água da nascente conforme o mencionado nos artigos 22º, 23º e 24º;
f2) – a título subsidiário – que os Autores são legítimos possuidores do direito de servidão ao aproveitamento da água da nascente conforme o mencionado nos artigos 22º, 23º e 24º;
III – Condenar-se os Réus a absterem-se de impedir que os Autores entrem no prédio identificado no artigo 21º desta inicial, na medida do necessário para seguirem as águas e procederem à limpeza e reparação das minas, nascente e poça, bem com dos regos e aquedutos, que por tais canalizações levam as águas identificadas nos pedidos formulados em II, b1), b2), c1), c2), f1) e f2), assim como a absterem- se de perturbar, por qualquer modo, o aproveitamento da água na nascente da ..., para os gastos domésticos, a recolha e apresamento das demais águas que afluem à ..., nos termos definidos nas escrituras públicas que integram os presentes autos.
IV – Condenar-se solidariamente os Réus a pagar aos Autores, no prazo de 30 dias, uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, no montante que se peticiona de e 20.852,00, mais o que se vier a apurar em liquidação de execução de sentença, acrescidos de juros à taxa legal contados da citação até efetivo e integral pagamento.
V - Condenar-se solidariamente os Réus a retirar os seis esteios colocados na propriedade dos Autores, ao longo e para vedação de acesso à ... ou outro fim, bem como quaisquer elementos de vedação que venham aí a colocar até final, no prazo de dez dias».
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Citados, os réus apresentaram contestação, concluindo pela improcedência da acção (ref.ª ...11).
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Por despacho de 7/11/2022, e com vista à determinação do valor da causa, o Tribunal ordenou a notificação dos autores para esclarecerem se dispunham de avaliação (desde logo bancária) do prédio, juntando-a em caso de resposta positiva, e indicarem o valor que atribuíam à propriedade das águas e servidões de que se arrogam titulares (ref.ª ...96).
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Responderam os AA., referindo que a avaliação atual atribuída ao prédio pela Autoridade Tributária é de € 4.320,00 e, para efeitos processuais tributários, atribuíram à propriedade de águas e servidões o valor de € 4.000,00 (ref.ª ...49).
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Os réus rejeitam tais valores, afirmando-se destituídos dos conhecimentos técnicos que lhes permitam atribuir ou determinar o valor dos mencionados bens, valor este que deveria ser aferido através de técnico/pessoa idónea e qualificada para o efeito (ref.ª ...75).
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Por despacho de 4/01/2023, a Mm.ª Julgadora da 1ª instância, ao abrigo do disposto nos arts. 308.º e 309.º do CPC, determinou a realização de arbitramento para a fixação do valor da causa tendo por objeto a avaliação dos prédios aludidos no art. 10º da PI, isoladamente e enquanto conjunto imobiliário, bem como o valor da propriedade sobre as águas identificadas nos arts. 5º a 9º da PI, da servidão de presa e aqueduto aludidos nos arts. 18º a 34º da PI (ref.ª ...74).
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O perito apresentou o relatório pericial de avaliação (ref.ª ...43), que não foi objeto de reclamação pelas partes.
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Findos os articulados, o Mm.º Juiz “a quo” proferiu o seguinte despacho (ref.ª ...77):
«I. Valor da causa
Nos termos dos arts 296º e 306º, n.º 1 do Cód de Proc Civil, a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, que representa a utilidade económica imediata do pedido; a competência para a fixação do valor da causa pertence ao juiz sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes.
Os critérios para a fixação do valor da causa constam dos arts. 297º a 309º do Código de Processo Civil.
No âmbito dos presentes autos, os autores formulam os seguintes pedidos: (a) reconhecimento do direito de propriedade dos autores sobre o prédio que identificam em 10º da PI, onde, afirmam, que os réus terão implantado seis esteios de cimento (que os réus afirmam colocados em prédio seu); (b) propriedade sobre as águas que identificam; (c) servidão de presa; (d) servidão de aqueduto; (e) danos patrimoniais do valor liquidado de € 20.852,00 e (f) condenação dos réus a retirar do seu prédio os seis esteios que afirmam ali colocados.
Foi determinada a avaliação dos prédios e das águas no despacho da Mmª Juiz com refª ...96 (17/11/2022), tendo o relatório pericial sido remetido aos autos através do requerimento com refª ...43 (25/10/2023).
Isto posto:
Nos termos do disposto no art 302º, n.º 1 do Cód de Proc Civil, a ação tiver por fim fazer valer o direito de propriedade sobre uma coisa, o valor desta determina o valor da causa. A isto acresce que nos termos do disposto no art 297º, n.º 1 e n.º 2 do Cod de Proc Civil,  se pela ação se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; se pela ação se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício; Cumulando-se na mesma ação vários pedidos, o valor é a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles. 
Em primeiro lugar, no tocante ao pedido de reconhecimento do direito de propriedade sobre os prédios e as águas, resulta do relatório pericial que os prédios têm o valor de €823.800,00 e as águas o valor de €24.200,00.
Em segundo lugar, no tocante ao pagamento das quantias referidas em (e), deve ser contabilizado o valor de €20.852,00.
Os valores acima referidos devem ser todos somados (art 297º, n.º 2 do Cód de Proc Civil).
Termos em que se fixa à causa o valor global de €868.852,00.
(…)».
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Inconformados com essa decisão dela interpuseram recurso os AA. (ref.ª ...50), tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«1ª As Recorrentes atribuem à presente ação o valor de € 30.001,00 (trinta mil e um euros).
2ª O Tribunal fixa à causa o valor global de € 868.852,00, considerando que no tocante ao pedido de reconhecimento do direito de propriedade sobre os prédios e as águas, resulta do relatório pericial que os prédios têm o valor de €823.800,00 e as águas o valor de €24.200,00. … no tocante ao pagamento das quantias referidas em (e), deve ser contabilizado o valor de €20.852,00.
3ª Para a fixação do valor da causa, o critério fundamental que a lei nos fornece é o da utilidade económica imediata que com a ação se pretende obter.
4ª A utilidade económica é evidenciada pela configuração do litígio, atendendo à causa de pedir e aos pedidos deduzidos, sobretudo em II – B1, B2, C1, C2, D, E, F1, F2, III, IV e V.
5ª A Recorrida não impugnou o valor da causa indicado na PI, significando que o aceitou.
6ª Por conseguinte será de acolher o valor indicado pela Recorrente na PI. (€ 30.001,00), porquanto traduzirá a utilidade económica imediata que com a ação se pretende obter.
7ª O valor da ação deve ser o fixado pelas partes de € 30.001,00, mas se assim não for doutamente entendido, por mais, deve então fixar-se à ação o valor de € 45.052,00.
TERMOS EM QUE, na procedência da apelação, deve ser revogada a decisão recorrida, fixando-se à ação o valor de € 30.001,00, assim se fazendo justiça.
(…)».
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Não consta que tenham sido apresentadas contra-alegações.
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, em separado e com efeito devolutivo (ref.ª ...44).
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Objecto do recurso             

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do(a)(s) recorrente(s) – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, a única questão a decidir prende-se com a determinação do valor da causa.
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III. Fundamentos

IV. Fundamentação de facto.
Os factos materiais relevantes para a decisão do presente recurso são os que decorrem do relatório supra – que por brevidade aqui se dão por integralmente reproduzidos –, a que acrescem os seguintes:
1. Os AA. atribuíram à acção o valor de € 30.001,00.
2. Os RR. não impugnaram o valor da causa indicado na petição inicial.
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V. Fundamentação de direito   
                    
1. Do valor da causa.
Dispõe o art. 296º (“Atribuição de valor à causa e sua influência”) do CPC que:

 “1. A toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”.
2 - Atende-se a este valor para determinar a competência do tribunal, a forma do processo de execução comum e a relação da causa com a alçada do tribunal.
3 - Para efeito de custas judiciais, o valor da causa é fixado segundo as regras previstas no presente diploma e no Regulamento das Custas Processuais”.
O valor da causa há-de, pois, representar a utilidade económica imediata que pela acção se pretende obter, ou seja, deve ser a expressão monetária do benefício que pela acção se pretende assegurar.
Tal elemento é suscetível de influir designadamente na forma de processo (art. 550, n.º 2, al. d), do CPC), na competência do tribunal (arts. 117º e 130º da Lei da Organização do Sistema Judiciário/Lei n.º 62/2013, de 26.08), na obrigatoriedade ou não de patrocínio judiciário (art. 40º do CPC) ou mesmo em alguns segmentos da tramitação processual (arts. 597º, 468º, n.º 5, 511º, n.º 1 e 604º, n.º 5, do CPC). É ainda a partir desse dado objetivo que, em regra, se afere a recorribilidade das decisões (art. 629º, n.º 1, do CPC) e se determina o valor tributário (art. 296º, n.º 3, do CPC e art. 11º do RCP) que, por seu lado, serve de padrão à liquidação da taxa de justiça que cada parte deve pagar em diversos momentos processuais[1].
Estabelece o CPC, a par de critérios gerais (art. 297º), critérios especiais (art. 298º) para a fixação do valor e também critérios específicos para as acções que tenham por objeto prestações vincendas ou periódicas (art. 300º), um acto jurídico negocial (art. 301º), um direito real (art. 302º) ou o estado das pessoas e interesses materiais ou difusos (art. 303º).
Por referência aos critérios gerais para a fixação do valor, “[s]e pela ação se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; se pela ação se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício.” - n.º 1 do art. 297º.
No caso de se cumularem na mesma acção diversos pedidos, o valor é a quantia correspondente ao somatório dos valores de todos eles; mas quando se pedirem juros e rendimentos já vencidos e os que se vencerem durante a pendência da causa, na fixação do valor atende-se somente aos interesses já vencidos. - cfr. n.º 2 do preceito legal citado.
No caso de pedidos alternativos, atende-se unicamente ao pedido de maior valor e, no caso de pedidos subsidiários, ao pedido formulado em primeiro lugar. - cfr. n.º 3 do preceito legal citado.
Dos preceitos legais citados resulta que, se pela acção se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, o valor da causa é necessariamente igual ao montante do pedido, não podendo em tal caso o tribunal atribuir à causa valor diverso, nem por sua iniciativa, nem por vontade das partes; se, pelo contrário, se pedir uma prestação que não consista no pagamento de quantia certa, há que conjugar o pedido com a causa de pedir para se verificar qual a utilidade económica imediata que o autor pretende obter, qual o benefício expresso em dinheiro, que corresponde à pretensão do autor[2].
Na petição, com que propõe a acção, o autor deve declarar o valor da causa e se o réu não o impugnar tal significa que aceita o valor atribuído pelo autor (cfr. arts. 552º, n.º 1, al. f) e 305º, n.º 4, todos do CPC); no articulado em que deduza a sua defesa, pode o réu impugnar o valor da causa indicado na petição inicial, contanto que ofereça outro em substituição; nos articulados seguintes podem as partes acordar em qualquer valor (art. 305º, n.º 1, do CPC).
Porém, é ao juiz que compete fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes, sendo o momento processualmente adequado para tal efeito o despacho saneador, salvo nos processos a que se refere o n.º 4 do art. 299.º e naqueles em que não haja lugar a despacho saneador, sendo então fixado na sentença (cfr. art. 306º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
A determinação do valor da causa, quando as partes não tenham chegado a acordo ou quando o juiz o não aceite, faz-se em face dos elementos que constam do processo ou, mostrando-se estes insuficientes, mediante as diligências indispensáveis, que as partes requererem ou o juiz ordenar (cfr. art. 308º do CPC).
Daqui decorre que, mesmo estando as partes de acordo quanto ao valor da causa, o juiz pode não aceitar esse acordo e, se entender que o valor da acção é diverso do acordado, decide em função dos elementos existentes no processo ou, sendo estes insuficientes, depois de efetuadas as diligências consideradas indispensáveis.
Na determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a acção é proposta, exceto quando haja reconvenção ou intervenção principal (art. 299, n.º 1, do CPC).
No caso “sub judice”, os autores, na petição inicial, atribuíram à causa o valor de 30.001,00€, que os réus tacitamente aceitaram (pois não o impugnaram).
Findos os articulados e após circunstâncias processuais que ora não relevam tendentes à determinação do valor da causa, o Tribunal da 1ª instância determinou a realização de arbitramento para fixação do valor da causa e, findo este, fixou à causa, com base nesse relatório, o valor global de €868.852,00.
Atendo-nos ao critério específico previsto para as acções que tenham por objeto um direito real previsto no art. 302º do CPC, estabelece o n.º 1 do citado normativo que, «se a ação tiver por fim fazer valer o direito de propriedade sobre uma coisa, o valor desta determina o valor da causa».
Tratando-se, porém, «de outro direito real, atende-se ao seu conteúdo e duração provável» (n.º 4).
Segundo o aludido n.º 1 do art. 302º do CPC, quando na acção se discuta ou vise exercer alguma das faculdades a que alude o art. 1305º do Cód. Civil (gozo, uso, fruição e disposição), o valor processual corresponde ao valor da coisa.
Portanto, sempre que haja de discutir-se ou exercer-se, por via judicial, algum destes direitos, o valor da coisa sobre a qual incidam determinará o valor da ação.
Independentemente da questão de saber se a posse constitui um direito, as mesmas razões que subjazem ao critério da determinação do valor da acção em que se faz valer o direito de fundo leva a que também o valor das acções possessórias seja determinado pelo valor da coisa[3].
Conforme resulta do n.º 1 do art. 1311° do Cód. Civil e ensinam Pires de Lima e Antunes Varela[4], a acção de reivindicação é "uma acção petitória que tem por objecto o reconhecimento do direito de propriedade por parte do autor e a consequente restituição da coisa por parte do possuidor ou detentor dela".
São, pois, dois os pedidos que integram e caracterizam este tipo de acção: o pedido de reconhecimento do direito de propriedade do autor sobre a coisa por ele reivindicada e o de entrega da mesma.
Todavia, neste tipo de acção, o tribunal não pode condenar o demandado no pedido de restituição da coisa sem antes se certificar da existência e violação do direito de propriedade do demandante e, por isso, há que considerar o pedido de reconhecimento do domínio implicitamente abrangido no pedido de restituição da coisa.
Significa isto que, na acção real de reivindicação, as duas operações, apreciação e condenação, não gozam de independência, sendo o reconhecimento da existência do direito um pressuposto e não um pedido a acrescer ao pedido da entrega da coisa, pelo que tal não configura uma cumulação real de pedidos[5].
Contudo, deve considerar-se o valor real da coisa que está em causa, ainda que não seja pedida a sua entrega, a determinar por referência ao respetivo rendimento ou, se o não produzir, ao que derivar de um juízo relativo à respetiva matéria, utilidade e estado de conservação ou de manutenção[6].
Por isso, nas acções de reivindicação o que interessa é o valor real do prédio e o valor da acção corresponde ao da coisa reivindicada; mas se estiver em causa apenas uma parte de uma coisa, ainda que se peça a declaração do direito de propriedade sobre toda ela, é o valor da parte em litígio que define o valor processual da causa[7]. Efectivamente, estando em discussão não a totalidade da coisa, mas uma fracção ou parte dela, o valor da acção há-de determinar-se pelo valor da fracção sobre que versa o litígio[8]. Neste caso, e em casos semelhantes, o pedido tem que ser posto em relação com a causa de pedir e o valor da causa será o que resultar da conjunção dos dois elementos[9]. O mesmo é dizer que se estiver em causa a prática de actos por um terceiro que o proprietário repute lesivos do seu direito de propriedade, qualificando-os como usurpação de parte dos seus direitos, e delimitando-se o litígio a uma fracção ou parte do prédio, só ao valor desta parte em discussão, e não ao valor total do(s) prédio(s), se deverá atender para efeitos de determinação do valor da causa.
Tratando-se de outro direito real limitado [como seja o usufruto (art. 1439º do CC), o uso e habitação (art. 1484 º do CC), o direito de superfície (art. 1524 º do CC) e as servidões prediais (art. 1543 º do CC)], a determinação do valor da acção deve orientar-se pela utilidade económica que é proporcionada pelo tipo de direito real ao seu titular, considerando-se ainda a sua duração provável (n.º 4 do art. 302º do CPC)[10].
Nas palavras de Salvador da Costa[11], «o valor processual da causa que tenha por objeto fazer valer direitos de servição predial deve ser determinado nos termos do art. 1544º do CC, tendo em contas as utilidades, ainda que futuras ou eventuais, suscetíveis de ser gozadas por intermédio do prédio dominante, mesmo que lhe não aumentem o valor, ou seja, o valor dos cómodos no que concerne ao prédio dominante e o correspetivo valor do detrimento do prédio serviente».
Por sua vez, do direito de propriedade das águas tratam os arts. 1385º e sgs., enquanto que das servidões legais tratam especialmente os arts. 1557º e sgs. e, das voluntárias, os arts. 1543º e seguintes, todos do CC.
No caso versado nos autos os pedidos formulados sob os itens II-a), b1), c1 e f1 são tipicamente de acção de reivindicação, quais sejam: o reconhecimento do direito de propriedade – quer referente aos prédios identificados nos arts. 4º e 10º da p.i., quer sobre as águas mencionadas nos arts. 5º, 6º, 7º, 8º e 9º e o direito à água da nascente conforme o mencionado nos arts. 22º, 23º e 24º [pedidos objeto dos itens II-b1), c1) e f1) – e a condenação dos «Réus a absterem-se de impedir que os Autores entrem no prédio identificado no artigo 21º desta inicial na medida do necessário para seguirem as águas e procederem à limpeza e reparação das minas, nascente e poça, bem com dos regos e aquedutos, que por tais canalizações levam as águas identificadas nos pedidos formulados em II, b1), b2), c1), c2), f1) e f2), assim como a absterem-se de perturbar, por qualquer modo, o aproveitamento da água na nascente da ..., para os gastos domésticos, a recolha e apresamento das demais águas que afluem à ... (…)» [pedido formulado sob o item III).
A título principal, os AA. peticionam, ainda, i) o reconhecimento do direito de servidão de presa, que consiste no direito de represar e derivar as águas mencionadas nos artigos 4º, 5º, 6º, 7º, 8º e 9º, da ..., situada no prédio dos Réus, descrito no art. 21º, bem como as que a esta afluem provenientes da poça do rio e com origem, também, na poça de arrebenta boi e da poça da fontinha, para os prédios dos Autores identificados nos artigos 4º, 9º e 10º [pedido formulado sob o item II-d)]; ii) o reconhecimento de que são possuidores do direito de servidão de aqueduto constituída sobre o prédio dos Réus, descrito no art. 21º, para derivação e condução das águas com os trajetos e configuração expressos no art. 34º, da ... para os prédios dos Autores [pedido deduzido sob o item II-e)].
Cumulativamente, os AA. pedem também a condenação solidária dos Réus a pagar-lhes uma indemnização por danos não patrimoniais e patrimoniais, no montante de 6.000,00€ e 20.852,00€, acrescido do que vier a ser apurado «em liquidação de execução de sentença» [pedido formulado sob o item IV] e a condenação solidária dos Réus a retirar os seis esteios colocados na propriedade dos Autores, ao longo e para vedação de acesso à ... ou outro fim, bem como quaisquer elementos de vedação que venham aí a colocar até final [pedido correspondente ao item V].
Sucede que, embora peticionem o reconhecimento da propriedade sobre a totalidade dos prédios identificados nos arts. 4º e 10º da p.i., que formam o conjunto imobiliário denominado quinta do casal além de baixo [pedido formulado sob o item II-a)], a verdade é que essa pretensão é meramente antecedente ou pressuposto das subsequentes que com ela estão conexas atinentes ao peticionado direito às águas, posto alegarem que tais prédios lhes foram  transmitidos com o direito às águas, todos os direitos a regos e servidões, mencionados no art. 5º, pedindo, a título principal, o reconhecimento de que são legítimos proprietários e possuidores do direito às águas mencionadas nos arts. 5º, 6º, 7º, 8º e 9º e o direito à água da nascente conforme o mencionado nos arts. 22º, 23º e 24º [pedidos objeto dos itens II-b1), c1) e f1)] e a condenação dos RR. a absterem-se de perturbar, por qualquer modo, o aproveitamento da água pelos Autores.
Como bem referem os recorrentes, não está em discussão a propriedade dos prédios a que os Autores aludem nos arts. 4º e 10º da P.I., mas apenas o direito à propriedade das águas indicadas nos arts. 5º a 9º da P.I., bem como a servidão de presa e aqueduto aludidas nos arts. 18º a 34º da P.I.
Veja-se que os RR. não questionam aquele direito dos AA., posto não se arrogarem proprietários dos prédios pertencentes aos AA., nem titulares de qualquer direito sobre eles. Nem essa invocação é feita na causa de pedir que serve de fundamento à acção. Inexiste, por conseguinte, controvérsia alguma a tal respeito (cfr. arts. 6º e 7º da contestação[12]).
Questionam, sim, o direito de propriedade sobre as águas reivindicado pelos AA. (cfr. arts. 8º a 15º da contestação[13]).
Ou seja, a controvérsia referente a tais pedidos circunscreve-se, essencialmente, à titularidade do direito às águas, inexistindo litígio – quer por referência à causa de pedir alegada na petição inicial, quer por reporte à defesa deduzida na contestação – sobre a titularidade e domínio dos prédios identificados nos arts. 4º e 10º da p.i..
Analisado o relatório pericial produzido nos autos constatamos que os prédios (rústicos e urbanos) dos AA. foram avaliados no valor total de 823.800,00 €[14].
Por sua vez, a respeito do valor da propriedade sobre as águas, da servidão de presa e aqueduto, foi atribuído o valor de 24.100,00€ «a todas as águas que provêm da poça em discussão para os campos dos Autores (…) considerando o interesse de manter os abastecimentos de água, servindo os prédios conforme supra descrito»[15].
Num outro cálculo possível – que pressuporia quantificar a desvalorização comercial dos bens (campos servidos) não considerando disponíveis as águas para rega de 20% do seu valor, a que o perito atribuiu o valor próximo de 20% –, o perito considerou que o valor de desvalorização corresponde a 24.320,00€[16].
E, no que concerne à água da poça, da servidão de presa e aqueduto – abrangendo a água presente na poça em discussão e que serve os prédios dos Autores, sem considerar a água que abastece o campo dos Réus –, o seu valor comercial foi estimado em cerca de 24.200,00€[17] [18].
Como tal, a utilidade económica da presente acção corresponderá à soma dos seguintes valores:
i) O pedido sob o item II-a), 1ª parte, não deve ser valorado para efeitos da determinação do valor da causa, visto ter sido formulado como pressuposto ou antecedente dos demais pedidos que lhe seguem atinente ao direito às águas;
ii) Aos pedidos formulados sob o itens II-a), 2ª parte, II-b1), c1), d), e) e f1) é de atribuir – tendo por base o arbitramento efetuado – o valor de 24.200,00€;
iii) Ao pedido objeto do item IV deve ser atribuído o valor de, pelo menos, 26.852,00€[19] [20].
iv) Ao pedido deduzido sob o item V – condenação solidária dos Réus «a retirar os seis esteios colocados na propriedade dos Autores, ao longo e para vedação de acesso à ... ou outro fim» – e à míngua de outros elementos afigura-se-nos adequado quantificá-lo em 200,00€[21].
É, pois, manifesto que o valor indicado pelos Recorrentes na p.i. (€ 30.001,00) não poderá ser acolhido, porquanto não traduz a utilidade económica imediata que com a acção se pretende obter (art. 296º, n.º 1, do CPC).
Pelo exposto, feita a devida conformação entre os pedidos e a causa de pedir que lhes serve de fundamento, e não olvidando o critério da utilidade económica que com esta acção os AA. pretendem alcançar (art. 296º, n.º 1, do CPC), isto é, o valor da vantagem económica que com os pedidos querem ver assegurada, forçoso será concluir que, ao abrigo do disposto nos arts. 302º, n.º 1, 296º, n.º 1, e 297º, n.ºs 1 e 2, do CPC, o valor da causa deverá ser fixado em, pelo menos, € 51.252,00 (24.200,00 + 26.852,00 + 200,00), e não – como decidido na 1ª instância – em € 868.852,00, nem como atribuído na p.i. em € 30.001,00.
Nesta conformidade, o recurso merece (parcial) provimento, pelo que se impõe a revogação da decisão recorrida e, consequentemente, é de fixar à causa o valor de € 51.252,00.
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Decisão:

Em face do exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente o recurso e, em consequência, revogam a decisão recorrida, fixando à acção o valor de € 51.252,00 (cinquenta e um mil, duzentos e cinquenta e dois euros).
Custas do incidente na instância recorrida a cargo dos AA. e dos RR., na proporção de, respetivamente, 1/2 para cada um (tendo em conta que, ambos, haviam acordado na fixação do valor da acção em € 30.000,01), fixando a taxa de justiça em 1 UC - art. 7º, n.º 4 e tabela II do Regulamento das Custas Processuais.
Custas da apelação pela parte vencida a final.
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Guimarães, 7 de março de 2024

Alcides Rodrigues (relator)
Joaquim Boavida (1º adjunto)
José Carlos Dias Cravo (2º adjunto)



[1] Cfr. Ac. do STJ de 7/03/19 (relator Abrantes Geraldes), in www.dgsi.pt.
[2] Cfr. Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. III, pág. 593.
[3] Cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 1º, 4ª ed., Almedina, 2018, p. 611.
[4] Cfr. Código Civil Anotado, Volume III, 2ª ed., 1987, Coimbra Editora, p. 112.
[5] Cfr. Ac. da RG de 20/10/2009 (relatora Rosa Tching), www.dgsi.pt.
[6] Cfr. Salvador da Costa, Os Incidentes da Instância, 9ª ed., 2017, Almedina, p. 43.
[7] Cfr. Salvador da Costa, obra e local citados.
[8] Cfr. Na doutrina, de um modo unânime: Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil Anotado, Vol. 3º, Coimbra Editora, 1946, p. 594 e ss. (em especial p. 596), Jacinto Fernandes Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, Vol. II, 3ª ed. Revista e actualizada, 2000, p. 96, Ary de Almeida Elias da Costa, Fernando Carlos Ramalho da Silva Costa, João A. Gomes Figueiredo de Sousa, Código de Processo Civil Anotado e Comentado, 4ª vol., Almedina, 1974, p. 54 e José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 1º, 4ª ed., Almedina, 2018, p. 611.
Como salientam Eurico Lopes Cardoso e Álvaro Lopes Cardoso, Manual dos Incidentes da instância em Processo Civil, 3ª ed., Livraria Petrony, 1999, pp. 69 e 70, o preceito (referindo-se ao art. 311º do pretérito CPC, que corresponde ao actual art. 302º) tem, porém, que entender-se em termos hábeis, pois pode muito bem suceder que o direito discutido, de propriedade ou de posse, respeite tão somente a uma parcela da coisa ou a uma fracção dela. Então o valor da causa terá que ser determinado não pelo valor de toda a coisa, mas pelo da parcela ou fracção em litígio.
Na jurisprudência, entre outros, todos consultáveis in www.dgsi.pt.:
- Ac. da RP de 29/09/1998 (relator Soares de Almeida):
«Na acção em que se reivindica determinada parcela de terreno e se peça o reconhecimento do direito de propriedade sobre todo o prédio, porque este pedido é apenas um antecedente lógico do primeiro, o valor daquela para efeito de determinar a competência do tribunal é o que resultar da avaliação da parcela».
- Ac. da RG de 20/10/2009 (relatora Rosa Tching):
«4°- Na acção de reivindicação, não obstante os autores pedirem o reconhecimento do direito de propriedade sobre a totalidade do seu prédio bem como a condenação dos réus nos pedidos acessórios de indemnização dos danos causados na coisa ou de condenação na demolição de obra feita por eles, o valor da causa deve ser fixado em função do valor da parcela de terreno reivindicada, nos termos do disposto no art. 305°, n° 1 do C. P. Civil».
- Ac. da RC de 11/07/2012 (relator Freitas Neto):
«1. Não é pelo facto de o autor pedir o reconhecimento da propriedade de todo o seu prédio que o valor da acção passa necessariamente a ser o de todo esse prédio. Se afinal o A. apenas pretende que se reconheça que certa faixa faz parte do seu prédio por força da linha divisória que o separa de outro, há um “contraste manifesto entre o pedido formulado pelo autor e o objectivo real da acção”.
2. O interesse do autor é, tão só, a resolução do litígio e este cinge-se à porção de terreno que é negada pelo réu. Quanto ao restante - isto é, quanto à propriedade do terreno restante do prédio do autor - não há qualquer diferendo a dirimir. Daí que não haja qualquer utilidade para o autor na declaração de tal extensão».
- Ac. da RG de 14/02/2013 (relator Antero Veiga):
«I - O nº 1 do art. 311º do Código de Processo Civil, que estabelece ser o valor da acção determinado pelo valor da coisa quando a acção tem por fim valer o direito de propriedade, deve ser aplicado de forma hábil quando está em causa apenas uma parte da coisa.
II – Neste caso, não há razão para o valor da acção corresponder ao valor da totalidade da coisa, mas apenas à parte em discussão, o que está em consonância, aliás, com a utilidade económica imediata do pedido a que alude o art. 305º, nº 1, do mesmo Código.»
- Ac. da RG de 29/10/2013 (relator Paulo Barreto), www.dgsi.pt.,
«III - Estando em causa apenas uma parcela de 1.435 m2 de um imóvel com a área total de 2,377800 ha (23.778 m2), o valor da acção deveria ser o equivalente ao valor da parcela em litígio e não o da totalidade do prédio».
- Ac. da RG de 18/12/2017 (relatora Maria Purificação Carvalho):
«- Numa acção em que se pretende fazer valer o direito de propriedade sobre uma coisa o seu valor processual corresponde ao valor real da coisa, a determinar por referência ao respectivo rendimento ou, se o não produzir, ao que derivar de um juízo relativo à respectiva matéria, utilidade e estado de conservação ou de manutenção o que não se confunde com o respectivo valor matricial.
- Mas se estiver em causa apenas uma parte de uma coisa, ainda que se peça a declaração do direito de propriedade sobre toda ela, é o valor da parte em litígio que define o valor processual da causa».
- Ac. da RC de 24/01/2023 (relator Fonte Ramos):
«Nas ações de reivindicação (…), se apenas estiver em causa parte de uma coisa, ainda que se peça a declaração do direito de propriedade sobre toda ela, é o valor da parte em litígio que marca o valor processual da causa».
[9] Cfr. Alberto dos Reis, obra e local citados.
[10] Cfr. Miguel Teixeira de Sousa, CPC ONLINE CPC - LIVRO II, https://drive.google.com/file/d/1s1_hx9B-ANEea2kKSw8LD_cNgkQtK6P6/view, p. 211.
[11] Cfr. obra citada, p. 46.
[12] Aí referem os RR. que:
«6. Com efeito, tal como alegado na petição inicial, os Autores são proprietários e legítimos possuidores dos prédios identificados no artigo 4.º,
7. através da escritura pública outorgada no ... Cartório Notarial ..., em 30.05.1980 e se encontra exarada no livro ...85..., a fls 12 v a 15v- Livro de Notas (cfr doc. ... junto com a p.i.) os AA. adquiriram os prédios melhor descritos no artº 4º da p.i., com o direito às seguintes águas, com todos os direitos, regos e servidões já existentes:
- da ..., entre os dias de São Pedro e dos Santos, desde o pôr do sol do segundo dia a contar do dia de São Pedro até ao pôr do Sol do quarto dia e desde o pôr do Sol do quinto dia até ao pôr do sol do sétimo dia e assim sucessivamente;
- da ..., entre o São Pedro e a Misericórdia, desde quarta feira ao pôr do sol até sexta feira ao meio dia:
- das águas da ..., entre o São Pedro e a Misericórdia, desde domingo ao pôr do sol até segunda-feira ao pôr do sol;
- da água da ..., entre o São Pedro e a Misericórdia, desde o pôr do sol de Domingo até ao pôr do sol de terça feira;
- da água dos ..., entre o São Pedro e a Misericórdia, de nove em nove dias a contar do dia de São Pedro, desde as nove horas da manhã até ao pôr do sol desse dia».
[13] Alegam para o efeito que:
«8. Acresce que, mediante escritura pública de compra e venda outorgada em 01.04.1982 no Cartório Notarial ..., os AA. adquiriram à Ré CC e seu falecido marido, FF, três dias de uso da água por semana, aos Domingos, Terças e Quintas-feiras, desde o dia 9 de Setembro a 23 de Junho de cada ano, da ..., sita no campo ... de ...,
9. poça esta que faz parte do prédio misto, propriedade dos RR., sito no ..., freguesia ..., descrito em livro na Conservatória com o nº ...22, atual 618/...25 e inscrito na matriz urbana sob o artº ...0.º e na rústica sob os artºs ...69, ...70, ...71, ...72 e ...73. (cfr doc n.º 3 junto com a p.i.).
10. A referida aquisição ao uso da água, descrita supra no artº 8º e conforme consta da respetiva escritura pública destina-se apenas a lima dos prédios, sitos na freguesia ..., pertença dos Autores e melhor identificados naquele documento nº ..., e não a rega dos mesmos tal como se alega na p.i..
11. Assim, a água, oriunda da ..., conforme consta do titulo de aquisição junto como doc. ... com a p.i. serve a finalidade de rega dos campos agrícolas dos AA., entre os dias de São Pedro e dos Santos, desde o pôr do sol do segundo dia a contar do dia de São Pedro até ao pôr do Sol do quarto dia e desde o pôr do Sol do quinto dia até ao pôr do sol do sétimo dia e assim sucessivamente,
12. e de lima dos campos agrícolas dos Autores, sitos na freguesia ... e melhor identificados no documento nº ... junto com a petição inicial, três dias de uso da água por semana, aos Domingos, Terças e Quintas-feiras, desde o dia 9 de Setembro a 23 de Junho de cada ano.
13. Nos restantes dias não consignados aos AA. e referidos nos títulos contratuais de aquisição aludidos supra, a água da ... pertence exclusivamente aos Réus, que a utilizavam para a rega e lima dos seus campos agrícolas e para consumo doméstico
14. Ora, é manifesto até pelos factos tal como se mostram alegados pelos AA. no seu articulado, que estes não são donos e legítimos possuidores da água mencionada nos artigos 5.º a), 6.º, 7.º, 8.º e 9.º da petição inicial, oriunda da ...,
15. possuindo apenas um direito de servidão ou o direito ao seu uso e respetivo aproveitamento, em conformidade com a forma e a divisão constantes dos títulos contratuais de aquisição juntos aos autos com a p.i. como docs 2 e 3.».
[14] Cfr. pp. 36 a 42 do relatório.
[15] Cfr. pp. 44 a 53 do relatório.
[16] Cfr. pp. 53 e 54 do relatório.
[17] O perito esclareceu que «o custo da construção da poça (servidão de presa) e o aqueduto apenas poderá ser quantificado se o sistema for limpo, e ficando visíveis as características da poça e do aqueduto, sendo que o próprio desenvolvimento do aqueduto será enterrado no solo do terreno dos Réus a que o perito não teve acesso, não tendo forma de verificar o seu percurso».
[18] Cfr. p. 54 do relatório.
[19] Correspondente a 20.852,00€ (danos patrimoniais, na vertente de prejuízos diretos ou danos emergentes) + € 6.000,00€ (danos não patrimoniais).
Embora os AA. tenham omitido no segmento petitório a especificação do valor peticionado a título de danos não patrimoniais – admitindo tratar-se de mero lapso informático –, a sua indicação quantitativa consta expressa e inequivocamente do art. 97º da petição inicial [«(…) que se peticiona em condenação solidária em valor nunca inferior a € 6.000,00 (seis mil euros)»].
[20] O uso da locução “pelo menos” deve-se ao facto de não se entrar em linha de consideração com o valor correspondente ao segmento do pedido (indemnizatório) genérico – “(…) mais o que se vier a apurar em liquidação de execução de sentença (…)” –, se bem que que ainda que seja formulada pretensão genérica, como é o caso em que se relegou a determinação do seu montante para momento posterior (ao abrigo do disposto nos art. 556º, n.º 1, al. b), e n.º 2, CPC), a lei não dispensa o autor de atribuir um concreto valor à sua pretensão indemnizatória, de acordo com os critérios do art. 297º do CPC (cfr. Ac. da RC de 12/10/2020 (relatora Maria João Areias), www.dgsi.pt.).
[21] Por referência ao previsível custo da retirada de tais esteios.