Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3486/20.3T8VCT.G1
Relator: JORGE SANTOS
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
EQUIDADE
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/09/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
- No âmbito da determinação da indemnização ao lesado decorrente de acidente de viação, o chamado “cálculo dos danos futuros” não é um verdadeiro cálculo, porque assenta em dados futuros não conhecidos nem cognoscíveis, e envolve por isso um elemento inevitável de arbítrio.

- Assim, o montante que importa fixar é uma previsão feita em abstracto, muito embora baseada nos factos concretos já conhecidos e provados no processo.

- De harmonia com o disposto nos artigos 564º e 566º do Código Civil, o valor a encontrar para aqueles danos deve resultar, não de complexos cálculos matemáticos, mas apenas de um juízo de equidade.

- O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2002 do STJ, de 9.5.2002 (D.R-, I.ª, Série de 27.6.2002), fixou a seguinte jurisprudência: “Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do art.º 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos art.ºs 805°, n° 3 (interpretado restritivamente), e 806. °, n.º l, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação”.

- Uma decisão actualizadora da indemnização, em rigor, pressupõe que sobre algo já quantificado incida algum elemento ou índice de actualização, situação que se não reconduz necessariamente ao cálculo da indemnização com base no princípio de diferença de esfera patrimonial a que se reporta o nº. 2 do artigo 566º do Código Civil.

- Considerando que o tribunal da primeira instância, no âmbito da sentença, não procedeu ao cálculo da compensação devida pela Recorrente ao Recorrido por via de qualquer operação de actualização, e tendo condenado a aquela a pagar a este os juros moratórios à taxa legal desde a data da citação, limitou-se a cumprir o disposto nos artigos 805º, nº. 3, segunda parte, e 806º, nº. 1, ambos do Código Civil, de harmonia com o sentido interpretativo que lhes foi dado pelo mencionado acórdão de uniformização de jurisprudência.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO (que se transcreve)

AA veio propor contra EMP01... Plc – Sucursal em Portugal a presente acção declarativa de condenação, peticionando que a Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia global líquida de € 251.561,06, como indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais que lhe advieram do acidente descrito na petição inicial, até à data da instauração da presente acção, acrescida dos juros de mora que se vencerem após a citação, à taxa legal à taxa legal de 4%, até integral pagamento, e a indemnização que, por força dos factos vertidos nos artigos 235º a 256º, desta petição inicial vier a ser fixada em decisão ulterior ou em incidente de liquidação. Alega, para o efeito e em síntese, que no dia 04.10.2018 foi vítima de um acidente de viação quando circulava como passageiro no veículo de matrícula ..-..-OC, segurado na Ré, conduzido por BB. Alega que a culpa na eclosão do acidente se ficou a dever exclusivamente ao referido BB e que o Autor sofreu danos na sua saúde e no seu património que ascendem ao valor do peticionado.

Regularmente citada, contestou a Ré, assumindo a responsabilidade pelo acidente dos autos, mas defendendo-se por impugnação.

Foi proferido despacho saneador, definiu-se o objecto do processo e procedeu-se à selecção dos Temas de Prova.

Foi realizado o exame médico-legal na pessoa do Autor e junto aos autos o correspondente relatório pericial.

Procedeu-se a julgamento com observância de todas as formalidades legais.

Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
- “Em face do exposto, julgo a acção proposta por AA contra EMP01... Plc – Sucursal em Portugal, parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente condeno a Ré a pagar ao Autor a quantia global líquida de € 190.234,06, acrescida de juros contados desde data da citação sobre a quantia de € 140.234,06, e desde a data da prolação da presente decisão sobre a quantia de € 50.000,00, à taxa legal de 4%, até integral e efectivo pagamento, e, ainda, a quantia cuja fixação se remete para decisão ulterior, nos termos do disposto no artigo 564º, nº 2, do Código Civil, e que corresponder às despesas que o Autor comprovar ter despendido com (i) medicação analgésica, nos momentos de manifestação aguda dos fenómenos dolorosos e sob prescrição médica, (ii) tratamentos de fisioterapia para evitar um retrocesso ou agravamento das sequelas, com regularidade a definir em consulta anual de medicina física e de reabilitação, (iii) tratamentos de intervenção reabilitacional, para evitar um retrocesso ou agravamento das sequelas, com regularidade a definir em consulta médica de neuropsicologia e (iv) cirurgia plástica de molde a atenuar o impacto visual das cicatrizes hipertróficas/quelóides.

Inconformada com a sentença dela veio recorrer a Ré formulando as seguintes conclusões:

1. A Ré não se conforma com a Sentença proferida nos presentes autos, designadamente quanto aos montantes arbitrados a título de perda de capacidade de ganho e a título de danos não patrimoniais.

I- QUESTÃO PRÉVIA
2. A Sentença ora em apreço incluiu determinadas passagens que não dizem respeito aos presentes autos, o que, certamente, será resultado do uso da técnica informática de copy-paste.

3. Com efeito, é notório que os últimos sete parágrafos do capítulo 3 (“Motivação fundamentadora da decisão de facto”) – págs. 19 e 20 da Sentença – remetem para documentos que não constam dos autos, identifica testemunhas que não foram arroladas nem depuseram e, até, identifica partes que não intervieram na presente demanda.

4. O mesmo se verifica na pág. 28 da Sentença, mais precisamente no parágrafo que começa por “Estudando Estudos Portugueses…”.

5. Requer-se, por isso, que se proceda à rectificação dos referidos lapsos, dando-se tais partes da Sentença como não escritas.

II – DA PERDA DE CAPACIDADE DE GANHO

6. O Tribunal a quo fixou em €140.000,00 a indemnização devida pela perda de capacidade de ganho.

7. Porém, tal quantia afigura-se manifestamente exagerada.

Vejamos.
8. Dos factos provados resulta que data do sinistro o A. tinha 18 anos, era estudante do secundário e que actualmente estuda Engenharia Mecatrónica, no Instituto Politécnico de ....

9. Da Sentença resulta, ainda, que um engenheiro mecatrónico aufere em média €1.300,00 por mês e que, em consequência do sinistro, o A. ficou a padecer de um DFPIFP de 19 pontos.

Todavia,
10. para efeitos de fixação da indemnização, o Tribunal a quo teve como premissa um rendimento médio mensal de €1.500,00, não de €1.300,00.

11. Acresce que, à data do sinistro, o A. era estudante do secundário, não se encontrando a trabalhar (tal como hoje ainda não está), pelo que, tendo então 18 anos, por certo que não entrará no mercado de trabalho antes de completar 22 anos – idade que releva para efeitos de atribuição da compensação devida pela perda de capacidade de ganho.

12. Além disso, o facto de ser estudante de Engenharia Mecatrónica não é bastante para garantir, com previsibilidade suficientemente segura, que no futuro venha a exercer a profissão de engenheiro mecatrónico.

13. Há, ainda, que ter presente que em Portugal a idade da reforma é de 65 anos e a esperança média de vida para um homem é de 78 anos, sendo que dificilmente se trabalhará até então, pelo que deverá ter-se como referência uma idade mais próxima da da reforma.

14. Por fim, a indemnização que vier a ser atribuída ao A. nos presentes autos será paga de uma só vez, o que lhe permitirá rentabilizar o montante recebido.

15. Conclui-se, por isso, que o Tribunal a quo atribui ao A. uma compensação superior àquela que lhe devia ter arbitrada pela perda de capacidade de ganho de que ficou a padecer.

16. Assim, deve ser fixada ao A., a título de indemnização pela perda de capacidade de ganho, uma quantia nunca superior a €80.000,00.

III- DOS DANOS NÃO PATRIMONIAIS

17. A título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, foi arbitrada ao A. uma indemnização de €50.000,00.

18. Também tal quantia se afigura exagerada.

Vejamos.
19. Para o demonstrar, sigamos o que a mais avisada jurisprudência tem vindo a decidir em situações até mesmo mais gravosas para os lesados do que a dos presentes autos [Acórdãos disponíveis em www.dgsi.pt]3:

20. Acórdão do STJ de 12/12/2017 (Proc. 3088/12.8TBLLE.E1.S1): A. submetido a diversas cirurgias e a fisioterapia; internado por diversos períodos; dificuldades na condução automóvel; já não consegue fazer caminhadas; deixou de jogar futebol e de andar de bicicleta; DFPIFP de 20 pontos; dano estético de grau 3; quantum doloris de grau 5; repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer de grau 3; isola-se; desgosto; aquando do internamento nasceu o seu filho e não podia pegar nele ao colo – indemnização por danos não patrimoniais €30.000,00;

21. Acórdão do STJ de 29/10/2019 (Proc. 7614/15.2T8GMR.G1.S1): A. submetido a cinco cirurgias; dois anos de fisioterapia; DFPIFP de 16 pontos; quantum doloris de grau 4; dano estético de grau 3; afectação permanente nas actividades desportivas e de lazer de grau 3; desgosto; depressão – indemnização por danos não patrimoniais €30.000,00;

22. Acórdão do STJ de 16/12/2010 (Proc. 4948/07.3TBVNG.P1.S1): A. tinha 19 anos; acabado de entrar na universidade, perdeu o ano lectivo devido ao acidente; graves lesões corporais, designadamente fractura do côndilo femural, do prato tibial interno (ficou com parafusos), do joelho direito (com fractura cominutiva da rótula), esfacelo grave da coxa, joelho e perna direitas; quatro intervenções cirúrgicas; prolongados internamentos; graves sequelas, tais como limitações e dores na mão, perna e joelho direitos para a vida inteira, com tendência para agravamento e com reflexos nas actividades laborais e de lazer (praticava ciclismo, que teve que abandonar); dano estético de grau 3; quantum doloris de grau 5; prejuízo de afirmação pessoal de grau 2; IPP para o trabalho de 23,65%; futuro agravamento de 8% – indemnização por danos não patrimoniais €25.000,00;

23. Acórdão do STJ de 28/01/2016 (Proc. 7793/09.8T2SNT.L1.S1): 17 anos; incapacitado para a sua profissão habitual, da qual se reformou; quatro operações; dores intensas; internado por longos períodos; teve que efectuar tratamentos de reabilitação; terá que se submeter a mais duas cirurgias; cicatriz com 50 cm; dano estético de grau 4; quantum doloris de grau 5; IPP de 23% – indemnização por danos não patrimoniais €40.000,00.

24. Acórdão do TRP de 01/10/2012 (Proc. 1585/06.3TBPRD.P1): politraumatizado; edema cerebral; diversas hemorragias; várias cirurgias; apresenta assimetria do rosto e afundamento da hemi-face direita; mantém dores; perdeu capacidade de constituir família; deprimido e sem gosto pela vida; IPP de 76%, impeditiva do exercício da sua actividade habitual e de qualquer outra dentro das suas habilitações; necessitará para sempre de terceira pessoa para os actos da vida diária, para gerir os seus haveres e para tomar decisões – indemnização por danos não patrimoniais €45.000,00.

25. Com todo o respeito pela pessoa do A., a verdade é que a situação em apreço não se reveste de tanta gravidade como as dos Acórdãos acabados de citar.

26. Ora, a indemnização por danos não patrimoniais destina-se a, dentro do possível, proporcionar ao lesado uma compensação que lhe permita mitigar o mal sofrido através de uma compensação de índole consumista.

27. Há, por isso, que lançar mão de critérios de equidade, atendendo ao grau de culpa do responsável, à situação económica do lesante e do lesado e à gravidade do dano (Arts. 494º e 496º nº 4 do CC).

28. Assim, em linha com os critérios da jurisprudência acabada de seguir e tendo presente a situação concreta do A. afigura-se adequada uma compensação pelos danos não patrimoniais nunca superior a €25.000,00.

IV- DOS JUROS

29. Sobre a quantia fixada a título de indemnização por danos patrimoniais, o Tribunal a quo condenou a Ré no pagamento de juros calculados desde a data da citação.

30. Sucede que parte substancial dessa quantia (mais exactamente €140.000,00) diz respeito à perda de capacidade de ganho, cujo valor foi fixado com recurso a critérios de equidade, tal como consta expressamente da Sentença (vide antepenúltimo parágrafo da pág. 31: “Deste modo, consideramos que devemos recorrer à equidade”; ou penúltimo parágrafo da mesma pág.: “Feita esta ponderação, julgo adequado e proporcional que o Autor seja indemnizado, a este título, ou seja, pela perda da capacidade de ganho futuro, em € 140.000,00”).

31. Notório é, assim, que a indemnização aí fixada foi obtida com recurso à equidade e, por isso, o valor em questão encontrava-se actualizado à data da prolação da Sentença.

32. É entendimento pacífico na jurisprudência, que os juros moratórios sobre uma indemnização fixada com recurso à equidade devem ser calculados desde a data da decisão, nunca desde a data da citação (vide, entre outros, Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 4/02 e Acórdão do TRP de 27/09/2018 proferido no Proc. 75/10.4TBAMT.P1).

33. Assim, sobre a indemnização fixada a título de perda de capacidade de ganho devem apenas ser calculados os juros que se vencerem desde a data da prolação da Sentença.
Termos em que deve proceder o presente Recurso e, em consequência:
a) Serem dados como não escritos os últimos sete parágrafos do capítulo 3 da Sentença (páginas 19 e 20 da Sentença) e o segundo parágrafo da página 28 da Sentença, por incluírem matéria que não faz parte dos presentes autos;
b) Ser a indemnização pela perda de capacidade de ganho fixada em não mais de €80.000,00;
c) Ser a indemnização por danos não patrimoniais fixada em não mais de €25.000,00;
d) Os juros moratórios vencidos sobre a quantia fixada a título de perda de capacidade de ganho serem calculados desde a data da prolação da decisão.
Assim decidindo, farão Vªs. Exªs., aliás como sempre, JUSTIÇA.
*
Houve contra-alegações nelas se pugnando pela total improcedência do recurso.
*
Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

II – OBJECTO DO RECURSO

A – Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente, bem como das que forem do conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando notar que, em todo o caso, o tribunal não está vinculado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, atenta a liberdade do julgador na interpretação e aplicação do direito.

B – Deste modo, considerando a delimitação que decorre das conclusões formuladas pela recorrente, cumpre apreciar:
- Se deve ser rectificada a sentença;
- Se deve ser alterado para menos o montante indemnizatório relativo a perda da capacidade de ganho e o de danos não patrimoniais;
- Se deve ser alterada a sentença quanto ao momento a partir do qual se vencem juros de mora.

III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

1. Factos Provados na sentença:

a) No dia 4 de Outubro de 2018, pelas 11,25 horas, ocorreu um acidente de trânsito, na Auto Estrada nº. ...7... -, ao quilómetro número 17,00, na área da freguesia ..., concelho ...;

b) Nesse acidente, foram intervenientes: 1º. - o veículo automóvel ligeiro de passageiros, de matrícula ..-..-OC; 2º. – o passageiro – além de outros - desse veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-OC, AA;

c) A aquisição do direito de propriedade incidente sobre o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-OC estava, à data, inscrita a favor de CC na Conservatória do Registo Automóvel, conforme se retira do teor da respectiva certidão junta aos autos a fl. 39 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

d) Na altura da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, era conduzido por BB;

e) A Auto Estrada nº. ...7... -, no local do sinistro que deu origem à presente acção, configura um traçado curvilíneo, descrito para o lado esquerdo, tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...-...;

f) A visibilidade, no local da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, era, como é, muito boa, pois, era dia alto – 11,25 horas, do dia 4 de Outubro de 2018;

g) Para quem circula pela Auto Estrada nº. ...7... -, no sentido ..., ou seja, ...-..., conseguia e consegue avistar a sua faixa de rodagem, em direcção ao preciso local da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, numa posição em que se encontra, ainda, a uma distância superior a quatrocentos metros;

h) A faixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... -, no local da deflagração do sinistro que deu origem aos presentes autos – como, de resto, sucede ao longo de todo o seu traçado -, encontra-se dividida em duas pistas de tráfego, através de um separador central, em perfil de estrutura de cimento, com uma altura de 01,50 metros;

i) Uma das referidas pistas de tráfego – a situada do lado Norte - destina-se ao trânsito de veículos automóveis que desenvolvem a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-...;

j) A outra dessas pistas de tráfego – a situada do lado Sul - destina-se ao trânsito de veículos automóveis que desenvolvem a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-...;

k) A faixa de rodagem da sua pista de tráfego, destinada ao trânsito de veículos automóveis que desenvolvem a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-..., tem uma largura útil de 07,60 metros, e encontrava-se, como se encontra, dividida ao meio, em dois corredores de trânsito distintos, através de uma linha descontínua, pintada a cor branca;

l) Cada um desses dois corredores de trânsito – resultante da supra-referida subdivisão - tem uma largura de 03,80 metros;

n) O tempo estava bom e seco, de sol aberto;

m) O piso da referida faixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... - e, portanto, também, o piso de toda a faixa de rodagem da sua pista de tráfego destinada ao trânsito de veículos automóveis que desenvolvem a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-..., era, como é, pavimentado a asfalto;

n) O tempo estava bom e seco, de sol aberto;

o) E o pavimento asfáltico da faixa de rodagem da pista de tráfego da Auto Estrada nº. ...7... -, encontrava-se limpo, seco e em bom estado de conservação, pois, não apresentava ondulações, fissuras, soluções de continuidade ou buracos;

p) Pela sua margem direita, tendo em conta o indicado sentido de marcha – ..., ou seja, ...-... -, a faixa de rodagem asfáltica da pista de tráfego da Auto Estrada nº. ...7... - apresentava e apresenta uma berma, também pavimentada a asfalto, com uma largura de três metros;

q) A dividir essa faixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... - da berma asfáltica situada do seu lado direito – tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...-... -, existia e existe uma linha descontínua, pintada a cor branca;

r) A marginar essa berma do lado direito, existiam, como existem, “RAILS” de protecção metálicos;

s) A partir do termo dos supra-referidos “RAILS METÁLICOS”, existia e existe um rego ou valeta, com a largura de um (01,00) metros e com a largura de 0,80 metros, e pelo lado exterior desse rego ou valeta, existia e existe um talude em terra, em perfil oblíquo e inclinado para o lado exterior da faixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7..., com uma altura de três metros;

t) Junto ao separador central – em perfil de estrutura de cimento -, a faixa de rodagem da referida pista de tráfego destinada ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-..., apresentava e apresenta uma outra berma, com uma largura de 0,80 metros;

u) Também, delimitada, em relação à faixa de rodagem da referida pista de tráfego, através de uma linha descontínua, pintada a cor branca;

v) O plano configurado pelo pavimento asfáltico das duas referidas bermas asfálticas situa-se ao mesmo nível do plano configurado pelo pavimento asfáltico da faixa de rodagem da pista de tráfego da referida via – Auto Estrada nº. ...7...;

w) No local do sinistro, a faixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... - apresenta-se e apresenta-se em plano horizontal – patamar -, para quem circula no sentido de marcha supra-indicado – ..., ou seja, ...-... -, como, de resto, sucede para quem circula em sentido inverso;

x) No dia 4 de Outubro de 2018, pelas 11,25 horas, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-OC transitava pela Auto Estrada nº. ...7..., tripulado pelo supra-referido BB;

y) O veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-OC desenvolvia a sua marcha, no sentido ..., ou seja, ...-...;

z) Inicialmente, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..- OC desenvolvia a sua marcha sobre o corredor de tráfego situado mais à esquerda da faixa de rodagem da pista de tráfego da Auto Estrada nº. ...7... -, tendo em conta o supra-indicado sentido de marcha (..., ou seja, ...-...);

aa) O condutor do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..- OC – BB – apenas era titular de licença de condução de veículos automóveis, desde o dia .../.../2018 – há cerca de apenas 03,50 meses;

bb) Ao chegar ao quilómetro número 17,00, da referida via – Auto Estrada nº. ...7... - o BB perdeu, completamente, o controle do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-OC;

cc) Por essa razão, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..- ..- OC entrou em despiste;

dd) Desse modo, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..- OC inflectiu para o seu lado direito;

ee) Deixou, marcados na faixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... -, rastos de derrapagem;

ff) Com o seu início sobre a faixa de rodagem do corredor de trânsito situado mais à esquerda da hemifaixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... -, destinada ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-... e com o seu termo sobre a berma asfáltica situada do lado direito da hemifaixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... -, destinada ao trânsito que desenvolve a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-..., junto aos “RAILS” de protecção metálicos aí existentes, na margem direita da hemifaixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... -, destinada ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-...;

gg) O veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-OC – tripulado pelo BB - saiu para fora da faixa de rodagem dos corredores de tráfego situados à esquerda e à direita da hemifaixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... -, destinada ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-... (tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...-...);

hh) O veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-OC invadiu a berma asfáltica situada do lado direito da hemifaixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... -, destinada ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-... (tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...-...);

ii) Transpôs, para o seu lado direito, essa berma asfáltica, até que o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-OC foi embater, como embateu, contra os “RAILS” metálicos, situados na margem direita da Auto Estrada nº. ...7... -, tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...-...;

jj) O veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-OC prosseguiu, sempre a sua marcha, de raspão contra os referidos “RAILS DE PROTECÇÃO” metálicos;

kk) Invadiu o rego ou valeta, existente no termo do lado Poente – do lado de ... – dos “RAILS” metálicos de protecção, até ali existentes;

ll) Invadiu, depois, o talude em terra, situado na margem direita da hemifaixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... -, destinada ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-... (tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...-...);

mm) Percorreu, de raspão e de zorro, sobre a superfície do referido talude em terra, ao longo de uma distância de 64,70 metros;

nn) Após o que rodou sobre si próprio no sentido longitudinal;

oo) Desse modo, capotando, como, efectivamente, capotou;

pp) E ficou, imobilizado – capotado -, sobre a berma asfáltica situada na margem direita da hemifaixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... -, destinada ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-... (tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...-...);

qq) Com os seus rodados voltados para o ar;

rr) Com o seu tejadilho apoiado sobre o pavimento asfáltico da berma situada do lado direito da hemifaixa de rodagem da Auto Estrada nº. ...7... -, destinada ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido ..., ou seja, ...-... (tendo em conta o sentido ..., ou seja, ...-...);

ss) Com a sua parte frontal – do ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-OC – apontada no sentido Nascente – para o lado de ..., de onde provinha;

tt) E com a sua parta traseira – do ligeiro de passageiros de matrícula ..-..- OC – apontada no sentido Poente – para o lado de ..., para onde se dirigia;

uu) O Autor, na altura da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, seguia, como passageiro, no veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-OC;

vv) Como consequência directa e necessária do despiste supra descrito resultaram para o Autor traumatismo cranioencefálico, com hematoma, fractura do osso frontal, com múltiplas feridas no couro cabeludo e na região frontal, traumatismo da coluna lombar, dorsal e cervical, queimaduras em toda a região das costas, traumatismo da região torácica, fractura de vértebras da coluna cervical, fractura da coluna odontóide, tipo 2, fractura da lâmina de C2 instável, fractura das apófises espinhosas de D2, D3, D4 e D7, fracturas cominutivas das plataformas de D10 e D11, fractura dos ossos próprios do nariz, fractura de arcos costais bilateralmente – 2º, 3º, 4º, 7º, 8º, 9 e 10º esquerdos -, e à direita – 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º e 10 -, fractura do terço médio do corpo esternal, golpes na testa, golpes no sobrolho direito, golpes no sobrolho esquerdo, traumatismo dos olhos, escoriações e hematomas espalhados pelo corpo;

ww) O Autor foi transportado, na ambulância do INEM, para o hospital ..., em maca, em plano duro, imobilizado, com colar cervical;

xx) No hospital ..., foram-lhe prestados os primeiros socorros, no respectivo Serviço de Urgência, onde se manteve, internado, ao longo de um período de tempo de um dia;

yy) Foram-lhe, aí, efectuados exames radiológicos a todas as regiões do seu corpo atingidas e TCA’s ao crânio e às restantes partes do seu corpo atingidas;

zz) Foram-lhe, aí, prescritos medicamentos vários, nomeadamente, analgésicos, anti-inflamatórios, relaxantes, antibióticos e soro;

aaa) Ao fim de um (1) dia de permanência no hospital ..., o Autor foi transferido para o Hospital de ... – ..., EPE, onde se manteve, internado, ao longo de um período de tempo de dois dias, acamado e medicado;

bbb) Ao fim desse período de tempo de dois dias, de internamento, no Hospital de ... – ..., EPE -, o Autor foi, novamente, transferido para o hospital ..., onde se manteve, internado, ao longo de um período de tempo de cinco dias, na unidade de cuidados intensivos e no serviço de neurologia;

ccc) Ao fim desse período de tempo de internamento de cinco dias, na UCI e no Serviço de Neurologia, do hospital ..., o Autor foi, novamente, transferido para o Hospital de ... – ..., EPE;

ddd) Onde se manteve, internado, ao longo de um período de tempo de cerca de dez dias, no serviço de ortopedia;

eee) Na ..., o Autor foi submetido a uma intervenção cirúrgica, consubstanciada na redução da fractura das vértebras da coluna cervical, com aplicação de material de osteossíntese – parafusos metálicos;

fff) No dia 22 de Outubro de 2018, o Autor obteve alta hospitalar, do Hospital de ... – ..., EPE;

ggg) E regressou à sua casa de habitação, onde ficou imobilizado, com colete ortopédico e colar cervical durante cerca de um mês, fazendo as necessidades fisiológicas na cama e necessitando de ajuda de terceiro para todas as suas necessidades;

hhh) Em Janeiro de 2019, retomou a sua actividade escolar;

iii) Continuou a ser acompanhado em consultas externas de neurocirurgia, ortopedia e, mais tarde, passou a ser acompanhado pelos serviços clínicos da Ré;

jjj) Foi sendo assistido no Centro de Saúde ..., onde recebeu tratamentos de enfermagem, nomeadamente curativos, mudança de pensos e extracção dos pontos de sutura;

kkk) O Autor manteve, ainda, tratamento de Medicina Física e Reabilitação (MFR) – Fisioterapia, na Clínica ..., em ..., ao longo de 62 sessões, entre 6 de Março de 2018 e 15 de Novembro de 2019;

lll) O Autor apresenta as seguintes sequelas: (i) no crânio: na região parieto-frontal esquerda, cicatriz hipopigmentada, de forma irregular, medindo 8 centímetros de comprimento, coberta por cabelo; na região parieto-occipital esquerda, cicatriz hipopigmentada, de forma irregular, medindo 2 centímetros de maior eixo, coberta por cabelo; na região temporal direita, cicatriz hipopigmentada, irregular, medindo 3 centímetros de maior eixo, coberta por cabelo; (ii) face: na região frontal, à direita da linha média, anteriormente à linha de implantação capilar, observada cicatriz linear, hipopigmentada, discreta, disposta no plano coronal, medindo 6 centímetros de comprimento; na região frontal, à esquerda da linha média, próximo à linha de inserção capilar, cicatriz linear, hipopigmentada, disposta de modo quase transversal, medindo 3 centímetros de comprimento, parcialmente coberta por cabelo e discreta; ainda na região frontal, à esquerda da linha média, num plano inferior relativamente às cicatrizes previamente descritas, cicatriz hipopigmentada, linear, discreta, medindo 2 centímetros de comprimento; em topografia superior à extremidade medial da sobrancelha esquerda, cicatriz hipopigmentada, discreta, medindo 1,5 centímetros de maior eixo; creitação/ressalto na articulação temperomandibular; (iii) pescoço: na face ântero-lateral direita do terço inferior do pescoço observada cicatriz rosada, ligeiramente hipertrófica, não aderente, medindo 6,5 por 1 centímetros de maiores dimensões; (iv) Tórax: na região escapular direita, área cicatricial hipopigmentada/rosada, disposta de modo praticamente horizontal, medindo 14 por 1 centímetros de maiores dimensões, a qual englobando uma região quelóide rosada, elevada (cerca de 0,5 centímetros), medindo 4,5 centímetros de maior eixo; na região escapular esquerda, área cicatricial hipopigmentada/rosada, não quelóide, medindo 10 por 0,5 centímetros de maiores dimensões; múltiplas cicatrizes hipopigmentadas, lineares, discretas, na face posterior do tórax; (v) membro superior esquerdo: na face superior do ombro, cicatriz rosada, hipertrófica, saliente (elevação de cerca de 0,5 centímetros), medindo 2 por 1,5 centímetros de maiores dimensões;

mmm) Passou, em consequência das lesões sofridas, a estar limitado em permanecer de modo prolongado na posição ortostática, na corrida, em permanecer em decúbito dorsal de modo prolongado e em permanecer sentado de modo prolongado, para além de duas horas;

nnn) Passou, em consequência das lesões sofridas, a ter um raciocínio lentificado (lentificação ideativa), alterações de memória para factos recentes (dificuldades de memorização) e algumas dificuldades na comunicação oral (fatigabilidade intelectual);

ooo) Em consequência das lesões, passou a padecer de fenómenos dolorosos (i) na região cervical, sobretudo quando está tempo frio, quando acorda e com esforços, não constantes e não irradiados, (ii) na região dorso-lombar, menos frequentes comparativamente à região cervical, quando o tempo está frio, quando dorme em algumas posturas e com esforços, não irradiados e não constantes; (iii) cefaleia, à direita, ao acordar, quando dorme pouco ou dorme muito, (iv) esporadicamente, na grade costal;

ppp) As lesões sofridas pelo Autor determinaram-lhe:
 Um Período de Défice Funcional Temporário Total de 19 dias;
 Um Período de Défice Funcional Temporário Parcial de 388 dias;
 Um período de Repercussão Temporária na Actividade Formativa Total de 90 dias;
 Um quantum doloris fixável no grau 5, numa escala de 1 a 7;
 Um Dano Estético Permanente fixável no grau 3, numa escala de 1 a 7;
 Uma Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de Lazer, fixável no grau 4, numa escala de 1 a 7;
 Um Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 19 pontos;

qqq) O Autor obteve a consolidação médico-legal definitiva no dia 14.11.2019;

rrr) As sequelas descritas são, em termos de Repercussão Permanente na actividade formativa, são compatíveis com o exercício da actividade formativa, podendo implicar esforços suplementares decorrentes da limitação em permanecer sentado de modo prolongado pelas queixas dolorosas no eixo vertebral e das alterações cognitivas, com dificuldades, nomeadamente na concentração e memorização;

sss) Em consequência das lesões e sequelas passou a ter dificuldade em manter-se de pé, prolongadamente, impedindo-o de executar algumas tarefas domésticas e na agricultura e em movimentar-se na actividade de reparação de automóveis, na qual auxiliava o pai;

ttt) Em consequência das lesões e sequelas sofridas, abandonou, a conselho médico, a prática de futebol federado (...);

uuu) Passou a depender regularmente, e até ao fim da vida, de medicação analgésica, nos momentos de manifestação aguda dos fenómenos dolorosos e sob prescrição médica, sem a qual a o Autor não conseguirá ultrapassar as suas dificuldades em termos funcionais e nas situações de vida diária;

vvv) Passou a depender regularmente, e até ao fim da vida, de tratamentos de fisioterapia para evitar um retrocesso ou agravamento das sequelas, com regularidade a definir em consulta anual de medicina física e de reabilitação;

www) Passou a depender regularmente, de tratamentos de intervenção reabilitacional, para evitar um retrocesso ou agravamento das sequelas, com regularidade a definir em consulta médica de neuropsicologia; impacto visual das cicatrizes hipertróficas/quelóides;

xxx) Necessitará de ser submetido a cirurgia plástica de molde a atenuar o impacto visual das cicatrizes hipertróficas/quelóides;

yyy) O Autor nasceu no dia .../.../2000, conforme se retira da certidão da Conservatória do Registo Civil junta aos autos a fl. 160 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

zzz) À data do acidente, o Autor era estudante do ensino secundário e, actualmente, é estudante do 1º ano de Engenharia Mecatrónica, na Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico de ...;

aaaa) O curso de Engenharia Mecatrónica tem a duração de três anos lectivos, tendo o Autor obtido, até ao momento, aprovação em seis cadeiras;

bbbb) Um engenheiro mecatrónico aufere, em média, e no início de carreira, a quantia de € 1.300,00 por mês, podendo, alguns anos mais tarde e com experiência, auferir mensalmente a quantia de € 2.000,00;

cccc) O Autor efectuou as seguintes despesas: (i) obtenção do Relatório Médico junto aos autos 410,00 €; (ii) consultas médicas 22,60 €; (iii) assistência no hospital ... 17,50 €; (iv) medicamentos 10,56 €; (v) taxas moderadoras 79,50 €; (vi) tratamento de enfermagem, no Centro de Saúde ... 5,90 €; (vii) tratamentos de fisioterapia 98,00 €; (viii) custo de 1 certidão da Conservatória do Registo Automóvel 17,00 €; (ix) custo de 1 certidão de nascimento – Registo Civil 20,00 €; (x) custo de 1 certidão da Participação de Acidente de Viação, junto da Guarda Nacional Republicana 70,00 €;

dddd) O Autor sente-se desgosto e infeliz com as lesões e sequelas de que ficou a padecer;

eeee) Para a Ré estava transferida, à data do embate, a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pelo veículo de matrícula ..-..-OC, através de contrato de seguro titulado pela apólice nº ...09.

2 – Factos não provados

Da petição inicial: artigos 6º a 9º, 16º, 33º, 34º, 36º, 40º, 50º a 55º, 59º a partir “com o comprimento”, 120º, 126º a 135º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea ggg), 148º a 154º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas ooo) e ppp), 167º a 168º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas lll) a ppp), 177ª, sem prejuízo do se deu por provado na alínea qqq), 178º a 193º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas lll) a xxx), 207º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea bbbb), 208º a 223º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas ppp) a sss), 230º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea cccc), 231º, 232º e 233º.
Da contestação da Ré: inexistem enunciados a que cumpra responder.
*
IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Da rectificação da sentença

Alega a Recorrente que a Sentença ora em apreço incluiu determinadas passagens que não dizem respeito aos presentes autos, o que, certamente, será resultado do uso da técnica informática de copy-paste. Tal verifica-se nos últimos sete parágrafos do capítulo 3 (“Motivação fundamentadora da decisão de facto”) – págs. 19 e 20 da Sentença – remetem para documentos que não constam dos autos, identifica testemunhas que não foram arroladas nem depuseram e, até, identifica partes que não intervieram na presente demanda. E o mesmo se verifica na pág. 28 da Sentença, mais precisamente no parágrafo que começa por “Estudando Estudos Portugueses…”.
Pretende a Recorrente que se proceda à rectificação dos referidos lapsos, dando-se tais partes da Sentença como não escritas.
O Recorrido nada opôs a tal.
A rectificação de erros materiais da sentença encontra-se prevista no artigo 614º do CPC.
Sucede que, o tribunal a quo não apreciou tal pedido de rectificação, a qual deveria ter lugar antes do recuso subir, como determina o nº 2, do referido artigo.
 Ora, analisado o texto da sentença, verifica-se que o mesmo enferma dos apontados lapsos de escrita.
Assim sendo, de harmonia com as disposições conjugadas dos art. 665º e 614º do CPC, defere-se a requerida rectificação da sentença relativamente a esses lapsos, considerando-os não escritos.

Do montante indemnizatório

Pugna a Ré/Recorrente que deve ser alterado para menos o montante indemnizatório fixado na sentença, de modo que se condene a Ré a pagar à Autora a indemnização pela perda de capacidade de ganho fixada em não mais de €80.000,00; ser a indemnização por danos não patrimoniais fixada em não mais de €25.000,00; pede ainda que os juros moratórios vencidos sobre a quantia fixada a título de perda de capacidade de ganho sejam calculados desde a data da prolação da decisão.

Da perda da capacidade de ganho

Parta tanto alega a Recorrente que a indemnização que o Tribunal a quo fixou, em €140.000,00, devida pela perda de capacidade de ganho, é manifestamente exagerada; que dos factos provados resulta que data do sinistro o A. tinha 18 anos, era estudante do secundário e que actualmente estuda Engenharia Mecatrónica, no Instituto Politécnico de ...; que da Sentença resulta, ainda, que um engenheiro mecatrónico aufere em média €1.300,00 por mês e que, em consequência do sinistro, o A. ficou a padecer de um DFPIFP de 19 pontos; que para efeitos de fixação da indemnização, o Tribunal a quo teve como premissa um rendimento médio mensal de €1.500,00, não de €1.300,00; que à data do sinistro, o A. era estudante do secundário, não se encontrando a trabalhar (tal como hoje ainda não está), pelo que, tendo então 18 anos, por certo que não entrará no mercado de trabalho antes de completar 22 anos – idade que releva para efeitos de atribuição da compensação devida pela perda de capacidade de ganho; que o facto de ser estudante de Engenharia Mecatrónica não é bastante para garantir, com previsibilidade suficientemente segura, que no futuro venha a exercer a profissão de engenheiro mecatrónico; que há, ainda, que ter presente que em Portugal a idade da reforma é de 65 anos e a esperança média de vida para um homem é de 78 anos, sendo que dificilmente se trabalhará até então, pelo que deverá ter-se como referência uma idade mais próxima da da reforma; e que a indemnização que vier a ser atribuída ao A. nos presentes autos será paga de uma só vez, o que lhe permitirá rentabilizar o montante recebido. Conclui a Recorrente que o Tribunal a quo atribui ao A. uma compensação superior àquela que lhe devia ter arbitrada pela perda de capacidade de ganho de que ficou a padecer.
Vejamos.
Conforme se estrai do acima exposto, a presente acção versa sobre a ocorrência de um acidente de viação que vitimou o Autor e ocorreu por culpa exclusiva do veículo segurado da Ré, para quem a responsabilidade se encontrava transferida por contrato de seguro.
Estando assente nos autos a culpa na origem do acidente, os danos e o dever de indemnizar por parte da Ré, a questão aqui em discussão prende-se somente com a discordância sobre o montante indemnizatório fixado na sentença.
Sobre esta matéria a sentença recorrida condenou a Ré a pagar a quantia de € 140 000,00 a título de dano futuro.
Relativamente ao valor fixado a título de indemnização pelo referido dano, acompanhamos aqui a conclusão a que se chegou na sentença.
O art. 564º do CC estipula quanto ao dano futuro o seguinte:
1) O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão;
2) Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior.
Em matéria de danos patrimoniais rege, em primeiro lugar, o princípio da reconstituição natural expresso no art. 562º do CC e, quando esta não for possível, bastante ou idónea (art. 566º, nº1 CC) vale a indemnização em dinheiro a fixar de acordo com a teoria da diferença nos termos do art. 566º, nº 2 do mesmo diploma, segundo a qual a indemnização tem como medida, em princípio, a diferença entre a situação patrimonial real do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal (encerramento da discussão em 1ª instância) e a situação hipotética que teria nessa data se não tivesse ocorrido o facto lesivo gerador do dano.
Assim, a previsibilidade é a condição de ressarcibilidade dos danos futuros, ou seja, relevam aqui apenas os danos futuros previsíveis decorrentes da afectação da capacidade laboral do lesado.
E a jurisprudência tem-se orientado para considerar que a referida indemnização deve ser fixada segundo critérios de equidade nos termos do art. 566º, 3 CC, em função dos seguintes factores: idade do lesado, tempo provável de vida activa (nos últimos tempos a jurisprudência do Supremo, face às recentes alterações legislativas, tem-se afastado dos 65 anos e aproximado dos 70 anos), esperança média de vida, grau de incapacidade geral permanente, impedimento para o exercício da sua actividade profissional habitual, limitações que as sequelas de que o Autor é portador implicam para o seu dia-a-dia e salário auferido.
O conceito de dano biológico surgiu na Portaria nº 377/2008 de 26/05 em cujo preâmbulo se diz “ (…) ainda que não tenha direito a indemnização por dano patrimonial futuro, em situação de incapacidade permanente parcial, o lesado terá direito à indemnização pelo seu dano biológico, entendido este como ofensa à integridade física e psíquica”. E o art. 3º b) do diploma considera indemnizável o dano biológico, resulte dele ou não, perda da capacidade de ganho.
A Jurisprudência, como se retira das citações constantes da sentença recorrida, para as quais remetemos, tem aceite maioritariamente este dano.
A Portaria 377/08 de 26/05/08, alterada pela Portaria 679/2009 de 25/06, prevê os critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados de acidente de viação de proposta razoável para indemnização do dano corporal, mas não vincula os tribunais: o que se tem entendido é que tais tabelas se destinam a ser aplicadas na esfera extrajudicial, não sendo lícita a sua sobreposição aos critérios legais e de equidade a adoptar pelo Julgador.
E reafirmando o que se escreve na sentença recorrida, a jurisprudência tem-se orientado para considerar que a referida indemnização deve ser fixada segundo critérios de equidade nos termos do art. 566º, 3 CC, em função dos seguintes factores: idade do lesado, tempo provável de vida activa (nos últimos tempos a jurisprudência do Supremo, face às recentes alterações legislativas, tem-se afastado dos 65 anos e aproximado dos 70 anos), esperança média de vida, grau de incapacidade geral permanente, impedimento para o exercício da sua actividade profissional habitual, limitações que as sequelas de que o Autor é portador implicam para o seu dia-a-dia e salário auferido.
Veja-se ainda o seguinte: “a fixação da indemnização por danos patrimoniais resultantes do “dano biológico” não pode seguir a teoria da diferença (art. 566º,2 do CC) como se tais danos fossem determináveis, devendo antes fazer-se segundo juízos de equidade (art. 566º,3 do CC). Para tanto, relevam: (i) a idade do lesado à data do sinistro; (ii) a sua esperança média de vida (e não a sua previsível idade da reforma, já que a perda da capacidade geral de ganho tem repercussões negativas ao longo de toda a vida do lesado); (iii) a percentagem de incapacidade geral permanente; e (iv) a conexão entre as lesões físicas sofridas e as exigências próprias de actividades profissionais ou económicas alternativas, compatíveis com a formação/preparação técnica do lesado” (Acórdão do STJ de 1/3/2018 – Relatora: Maria da Graça Trigo).
Mostra-se aqui secundária a questão de saber se tal dano deve ser indemnizado em sede de danos patrimoniais ou de danos não patrimoniais, sendo que, como já resulta das citações jurisprudenciais feitas supra, consideramos que tal dano biológico, por uma questão de coerência conceptual, deve ser visto como dano patrimonial, por se traduzir sempre numa situação de incapacidade funcional.
Vejamos agora como quantificar os danos.
Decidiu bem a sentença recorrida ao ter recorrido à equidade.
Neste conspecto, a sentença recorrida pronunciou-se nos seguintes termos:
- (…) “Os princípios fundamentais adoptados pelo Supremo Tribunal de Justiça nesta matéria estão resumidos no acórdão de 5 de Julho de 20072 deste Supremo Tribunal e são os seguintes: (i) a indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não auferirá e que se extingue no final do período provável de vida; (ii) no cálculo desse capital interfere necessariamente, e de forma decisiva, a equidade, o que implica que deve conferir-se relevo às regras da experiência e àquilo que, segundo o curso normal das coisas, é razoável; (iii) as tabelas financeiras por vezes utilizadas para apurar a indemnização têm um mero carácter auxiliar, indicativo, não substituindo de modo algum a ponderação judicial com base na equidade; (iv) deve ser proporcionalmente deduzida no cômputo da indemnização a importância que o próprio lesado gastaria consigo mesmo ao longo da vida (em média, para despesas de sobrevivência, um terço dos proventos auferidos), consideração esta que somente vale no caso de morte; (v) deve ponderar-se o facto de a indemnização ser paga de uma só vez, o que permitirá ao seu beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros; logo, haverá que considerar esses proveitos, introduzindo um desconto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia; (vi) deve ter-se preferencialmente em conta, mais do que a esperança média de vida activa da vítima, a esperança média de vida, uma vez que, como é óbvio, as necessidades básicas do lesado não cessam no dia em que deixa de trabalhar por virtude da reforma (em Portugal, no momento presente, a esperança média de vida dos homens já é de sensivelmente 78 anos, e tem tendência para aumentar; e a das mulheres chegou aos 83)”.
Qual o valor do rendimento anual médio do Autor a considerar para este efeito?
É sabido que deve ser fixada indemnização pelo dano patrimonial futuro ainda que o lesado não exerça, à data do acidente, uma actividade profissional remunerada e que o montante do salário mínimo nacional não é adequado para avaliar o valor patrimonial da redução da capacidade de ganho do Autor que é, actualmente, um estudante do ensino superior3.
“Importa, porém, ter presente que, conforme tem sido entendido na jurisprudência, ainda que o lesado não exerça uma actividade profissional remunerada (nomeadamente por ser estudante), deve ser fixada indemnização pelos danos patrimoniais (futuros) sofridos, decorrentes da incapacidade permanente de que fica a padecer, em consequência do acidente, uma vez que ficará impossibilitado – no futuro – de exercer determinadas profissões, ou, pelo menos, obrigado a um esforço acrescido no respectivo desempenho. Na verdade, o facto de o lesado não exercer qualquer actividade da qual provenham rendimentos, não é impeditiva da ressarcibilidade deste dano, de cariz patrimonial.
Acresce que a utilização de critérios de equidade não impede que se tenham em conta as exigências do princípio da igualdade. A prossecução desse princípio implica a procura de uma uniformização de critérios, naturalmente não incompatível com a devida atenção às circunstâncias do caso concreto.
O que significa que, aquando da fixação da indemnização, o julgador deverá ter em consideração as decisões judiciais que fixem indemnizações similares, o que é exigido por uma interpretação e aplicação uniformes do direito (art. 8º, n.º 3 do Código Civil).
A este propósito, e tendo em atenção serem aplicáveis critérios de equidade, vejamos os padrões indemnizatórios seguidos recentemente pelos nossos Tribunais Superiores relativamente a casos em que os lesados eram estudantes:
- Acórdão do STJ de 11/04/2019 (relator Oliveira Abreu): autor, nascido no dia .../.../1999; padece de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 46 pontos; as sequelas de que ficou a padecer são compatíveis com o exercício da actividade de estudante do Autor/AA, implicando esforços suplementares, sequelas que, no entanto, condicionarão, de forma indelével as suas opções profissionais futuras, sendo que o Autor/AA ingressou, ..., no curso de licenciatura; a indemnização a título de perda de ganho futuro foi arbitrada na quantia de € 390.000,00;
- Acórdão do STJ de 10/11/2016 (relator Lopes do Rego): autora, então com 18 anos de idade, ficou a padecer de uma IPG de 31,20%, com possibilidade de agravamento futuro, envolvendo impossibilidade absoluta para o exercício da actividade profissional habitual e de todas as que envolvam componente significativa de esforço físico (e que eram as imediata e efectivamente acessíveis às capacidades naturais e habilitações da lesada antes do acidente); a indemnização como ressarcimento dos danos patrimoniais futuros situou-se no montante de € 100.000,00.
- Acórdão do STJ de 09/07/2014 (relator Alves Velho): menor de 16 anos à data do acidente, que vai ficar para o resto da vida com sequelas tão graves que atingem o nível da tetraplegia a que corresponde uma incapacidade permanente geral de 70%; foi considerado justo e equitativo fixar a indemnização, a título de diminuição da capacidade de ganho, na quantia de € 275.000,00.
- Acórdão do STJ de 08.05.2012 (relator Nuno Cameira): autora à data do acidente com 19 anos, estudante do 12º ano, tendo ficado a padecer com uma incapacidade permanente geral de 7%, a que acrescerão 2% no futuro, decidiu ser justo e equitativo o valor atribuído pelas instâncias no montante de € 39.000,00 a título de danos futuros associados à IPP de que a autora ficou a padecer.
- Acórdão do STJ de 19.04.2012 (relator Serra Baptista): autor nascido em .../.../1987 e que, em ...12, perfez 24/25 anos de idade; desde então, com uma esperança de vida de cerca de 53/54 anos (...5); sofreu, por via do acidente, de que foi único culpado o condutor do veículo seguro na ré, uma IPG de 13%, agravando-se as lesões para o futuro, entendendo-se como mais adequado o arbitramento da quantia de € 35.000,00 a título de indemnização por danos futuros.
- Acórdão do STJ de 30/09/2010 (relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza): autora tinha 17 anos e era estudante à data do acidente e da propositura da acção; a incapacidade resultante do acidente – 20% de IPP – é compatível com o exercício da actividade habitual, mas implica esforços suplementares; considerou que o montante encontrado pelo acórdão recorrido – € 80.000,00 – a titulo de danos patrimoniais futuros, decorrentes da perda de capacidade de ganho, corresponde a uma correcção significativa (para mais) em relação ao resultado a que se chega utilizando o montante de € 900,00 mensais, permitindo considerar preenchidos os factores elencados tendentes à fixação duma indemnização ressarcitória daqueles danos, pelo que o manteve, rejeitando quer o seu aumento, quer o seu abaixamento.
- Acórdão do STJ de 25/06/2009 (relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza): autora, estudante à data do acidente, e que em virtude deste não se pode integrar no mercado de trabalho; em consequência desse evento ficou a sofrer de uma incapacidade parcial permanente muito acentuada (50%, 53% de futuro) e de graves limitações no que respeita ao exercício futuro de uma actividade profissional. O Supremo manteve a indemnização arbitrada pela Relação, no valor de € 110.000,00, a título danos patrimoniais decorrentes da incapacidade parcial permanente, negando a revista.
- Acórdão da RG de 29/10/2015 (relatora Anabela Tenreiro): lesada, vítima de atropelamento em plena passadeira, que, à data do acidente, tinha 13 anos de idade e sofreu uma limitação grave do membro inferior (encurtamento de 3,8 cm), não havendo actualmente qualquer garantia de correcção da dismetria a nível cirúrgico; foi fixada uma indemnização do dano patrimonial futuro no montante de € 40.000,00.
- Acórdão da RG de 27/10/2014 (relator Filipe Caroço): autora que ainda não entrou no mercado do trabalho e, à data da consolidação médico-legal, tinha cerca de 19 anos; as sequelas de que ficou a padecer determinam-lhe um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 6 pontos; partindo da referência dum vencimento mensal médio de € 750,00 considerou afigurar-se justa e equitativa a fixação da indemnização pelo dano biológico em € 23.000,00.
- Acórdão da RG de 05.06.2014 (relator Jorge Teixeira): lesado era menor (7 anos), estudante, não exercendo qualquer actividade profissional remunerada e ficou com um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 18 pontos, sendo que, em termos de rebate profissional (estudante), as sequelas são compatíveis com o exercício dessa actividade, mas implicam esforços suplementares e à data do embate frequentava o 2º ano da Escola EB11 da …, em …; foi decidido não ser de alterar o valor atribuído a título de indemnização por danos patrimoniais emergentes da perda da capacidade aquisitiva, fixado em € 90.000,00.
- Acórdão da RG de 15.10.2013 (relator António Fernandes dos Santos): autor com 15 anos de idade à data do “acidente, então estudante [frequentava o 10.º ano do ensino secundário, na área de “Artes” e, tendo mais tarde frequentado o 12º ano de escolaridade, não o veio a concluir], era antes do acidente uma pessoa saudável, fisicamente bem constituído e sem qualquer defeito aparente, tendo ficado a padecer de uma IPP de 6 pontos; como referência foi considerada uma remuneração mensal não inferior a uma vez e meia o salário mínimo nacional vigente à (€727,50€); A Relação aumentou a indemnização arbitrada a título de indemnização pelo dano patrimonial futuro e relacionada com a perda da capacidade aquisitiva de ganho do demandante, fixando-a em € 13.500,00”4.
(…)
De acordo com a factualidade dada por provada, não repugna considerar como rendimento médio de um engenheiro mecatrónico a quantia mensal de € 1.500,00. O rendimento médio anual a considerar deve ascender, pois, a € 21.000,00. Deve, pois, ser este o valor a considerar-se para o cálculo da prestação anual.
Tomando, assim, como base esse rendimento, ter-se-á que calcular uma indemnização que assuma o tempo provável da sua vida activa, de forma a obter-se um capital produtor desse mesmo rendimento perdido, de tal modo que, no fim dessa vida activa, esse capital se esgote.
Tendo em conta que o Autor nasceu em .../.../2000, calcular-se-á tal perda de rendimento não desde a data da consolidação médico-legal, mas da data em que, previsivelmente, o Autor, em condições normais, já terá concluído o curso de Engenharia Mecatrónica, ou seja, 01.01.2026, na altura já com 26 anos, até 2078 (52 anos), uma vez que a esperança média de vida situa-se, actualmente, para os homens, nos 78 anos.
Além do rendimento anual exposto consideraremos uma taxa de juro de remuneração do capital de 3% ao ano, uma taxa inflação de 1% ao ano, uma taxa de 1% para os ganhos de produtividade e uma taxa de 1% ao ano para a progressão profissional5.
Assim, a fórmula a utilizar traduzir-se-á no seguinte enunciado:
C = (1+i)n – 1 x P
(1+i)n x i
Sendo
P = a prestação anual = € 21.000,00;
C = capital a depositar no primeiro ano;
n = anos de expectativa de vida activa (52 anos);
i = taxa de juro nominal (actualizada nos 52 anos seguintes) que se obtém com o desenvolvimento da seguinte fórmula: i = (1+r) : (1+K); em que r é a taxa de juro nominal líquida das aplicações financeiras e k a taxa anual de crescimento da prestação.
Défice permanente da integridade físico-psíquica: 19 pontos (19%).
Deste modo, o valor da indemnização por danos futuros pela perda da capacidade de ganho seria, no caso € 161.172,83.
Uma vez que, conforme supra exposto o cálculo através da fórmula matemática é apenas um ponto de partida (necessário, no nosso entendimento) para a formulação de um adequado juízo equitativo, a questão que deve colocar-se agora, face ao caso concreto e à matéria de facto dada por provada, é saber se este montante é justo e adequado a indemnizar os reais danos do Autor e se a quantia apontada cabe nos quadros gerais das indemnizações arbitradas pelos tribunais portugueses em casos similares.
Citemos a este propósito o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.12.2016 do Supremo Tribunal de Justiça6: “nas palavras do acórdão de 28/01/2016 (proc. nº 7793/09.8T2SNT.L1.S1), in www.dgsi.pt, retomadas no acórdão de 07/04/2016 (proc. nº 237/13.2TCGMR.G1.S1), in www.dgsi.pt, “A afectação da integridade físico-psíquica (em si mesma um dano evento, que, na senda do direito italiano, tem vindo a ser denominado “dano biológico”) pode ter como consequência danos de natureza patrimonial e danos de natureza não patrimonial. Na primeira categoria não se compreende apenas a perda de rendimentos pela incapacidade laboral para a profissão habitual, mas também as consequências da afectação, em maior ou menor grau, da capacidade para o exercício de outras actividades profissionais ou económicas, susceptíveis de ganhos materiais (neste sentido, decidiram os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Junho de 2015 (proc. nº 1166/10.7TBVCD.P1.S1), de 19 de Fevereiro de 2015 (proc. nº 99/12.7TCGMR.G1.S1), de 7 de Maio de 2014 (proc. nº 436/11.1TBRGR.L1.S1), de 10 de Outubro de 2012 (proc. nº 632/2001.G1.S1), e de 20 de Outubro de 2011 (proc. nº 428/07.5TBFAF.G1.S1), todos em www.dgsi.pt.)”. (…)  Afirma-se, mais à frente, no acórdão de 28/01/2016, que vimos citando: “Para além dos danos patrimoniais consistentes em perda de rendimentos laborais da profissão habitual, segue-se a orientação deste Supremo Tribunal, supra referida, de procurar ressarcir as consequências da afectação, em maior ou menor grau, da capacidade laboral para o exercício de outras actividades profissionais ou económicas, susceptíveis de ganhos materiais. Trata-se das consequências patrimoniais do denominado “dano biológico”, expressão que tem sido utilizada na lei, na doutrina e na jurisprudência nacionais com sentidos nem sempre coincidentes. Na verdade, a lesão físico-psíquica é o dano-evento, que pode gerar danos-consequência, os quais se distinguem na tradicional dicotomia de danos patrimoniais e danos não patrimoniais (cfr. tratamento mais desenvolvido pela relatora do presente acórdão, Responsabilidade Civil – Temas Especiais, 2015, págs. 69 e segs.). Com esta precisão, a indemnização pela perda da capacidade de ganho, tem a seguinte justificação, nas palavras do acórdão do Supremo Tribunal de 10 de Outubro de 2012, cit.: “a compensação do dano biológico [dentro das consequências patrimoniais da lesão físico-psíquica] tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou reconversão de emprego pelo lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar; quer a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.” (…) Entende-se que o aumento da penosidade e esforço para realizar as tarefas diárias pode ser atendido no âmbito dos danos patrimoniais (e não apenas dos danos não patrimoniais), na medida em que se prove ter como consequência provável a redução da capacidade de obtenção de proventos, no exercício de actividade profissional ou de outras actividades económicas. (…) “A perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe [ao lesado], de forma relevante e substancial, as possibilidades de exercício profissional e de escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável - e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, - erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais” (acórdão do Supremo Tribunal de 10 de Outubro de 2012, cit.).”
(…) Nestes termos, consideram-se reparáveis como danos patrimoniais as consequências danosas resultantes da incapacidade geral permanente (ou dano biológico), ainda que esta incapacidade não tenha tido repercussão directa no exercício da profissão habitual. Considera-se ainda que o aumento da penosidade e esforço pode ser atendido nesse mesmo âmbito (danos patrimoniais) - e não apenas no âmbito dos danos não patrimoniais -, desde que seja provado que tal aumento de penosidade e esforço tem como consequência provável a redução da capacidade genérica de obtenção de proventos, no exercício de actividade profissional ou de outras actividades económicas”.
Em face deste posicionamento do Supremo Tribunal de Justiça, com o qual concordamos e seguimos, consideramos, em face da matéria de facto dada por provada, tornando penoso ao Autor, a escolha e aceitação numa profissão para a qual estava vocacionado e, por outro, reduzindo, se não eliminando, o número de entidades empregadoras que queiram contratá-lo, que o montante que indemniza adequadamente a situação real do Autor em face das lesões sofridas e sequelas subsistentes e se enquadra, não perdendo de vista o caso concreto, no quadro geral das indemnizações arbitradas pelos tribunais portugueses para situações similares, é o de € 140.000,00.
Deste modo, consideramos que devemos recorrer à equidade, tal como proposto no referido aresto, nos termos do disposto no artigo 566º, nº 3, do Código Civil, em função dos seguintes factores: (i) a idade do lesado; (ii) o seu grau de incapacidade geral permanente; (iii) as suas potencialidades de aumento de ganho em profissão ou actividade económica alternativa, aferidas, em regra pelas suas qualificações; e (iv) outros que relevem casuisticamente como, no caso dos autos, o facto de o Autor ter ficado limitado para exercer a sua profissão.”
Concordamos inteiramente com estas considerações jurídicas da sentença, bem como com a jurisprudência nela citadas e com a subsunção jurídica dos factos apurados nos autos, na base das quais se concluiu fixar em € 140.000 o valor indemnizatório relativo aos danos em apreço.
Cumpre ainda relevar que o A. não contribuiu com qualquer culpa para a produção do sinistro em causa.
Em face do exposto, é evidente que o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de que o autor ficou a padecer irá impossibilitar-lhe a realização de algumas tarefas quotidianas e dificultar e tornar mais penosas a execução de outras, dado que uma pessoa com incapacidade, está numa situação diferente e pior do que outra sem qualquer incapacidade.
A afectação do ponto de vista funcional, não pode deixar de ser determinante de consequências negativas a nível da actividade geral do lesado.
Apesar das sequelas resultantes das lesões que o A. sofreu serem compatíveis com a sua profissão, a verdade é que as suas limitações funcionais poderão constituir entraves à sua manutenção a médio ou longo prazo, em razão dos esforços físicos suplementares a que está sujeito decorrentes dessas limitações.
Assim sendo, há ainda que ter presente que a fixação do valor dos danos aqui a indemnizar não tem por base um verdadeiro cálculo, porque, apesar de envolver alguns elementos concretos e determinados, conforme supra exposto, envolve acima de tudo realidades futuras não conhecidas e não cognoscíveis. É um dado adquirido que o direito positivo não contém regras precisas destinadas à fixação da indemnização pelo dano futuro, em casos como o que agora nos ocupa, de incapacidade permanente de vítimas de acidentes de viação. Os traços distintivos desta situação são, por um lado, a previsibilidade da existência de danos patrimoniais futuros, mas por outro a impossibilidade de quantificação dos mesmos no presente.
A determinação do valor desse dano é sempre uma operação delicada, porque obriga a ter em conta a situação hipotética em que o lesado estaria se não houvesse sofrido a lesão, o que implica a previsão pouco segura, sobre danos verificáveis no futuro. É por isso que tais danos se devem calcular segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade, de acordo com o que, no caso concreto, poderá vir a acontecer, seguindo as coisas o seu curso normal, e se mesmo assim não puder apurar-se o seu valor exacto, deverá o Tribunal julgar segundo a equidade, em obediência ao critério enunciado no art. 566º,3 do CC (neste sentido, cfr. Vaz Serra, RLJ,112º, 339 e 114º, 287 e seguintes; Dario Martins de Almeida, Manual de acidentes de viação, pág. 114 e Acórdão do STJ de 10.2.1998, CJSTJ, Tomo I, pág. 67) (1).
Deste modo, atenta a factualidade supra exposta e os considerandos jurídicos a ela respeitantes, entendemos razoável e adequado o montante fixado na sentença quanto ao valor indemnizatório relativo aos danos em causa, .com expressão na esfera patrimonial do autor ao longo de toda a sua vida.
Assim, deve manter-se a sentença quanto à quantia indemnizatória fixada a este respeito, no valor de €140.000,00.
Neste ponto, carece de razão a Recorrente ao pugnar que o tribunal deveria ter em conta o salário que um engenheiro mecatrónico aufere em média, de €1.300,00 por mês, para efeitos de fixação da indemnização, e não o de €1.500,00, como o fez.
Com efeito, resultou provado que o Autor nasceu no dia .../.../2000, à data do acidente, era estudante do ensino secundário e, actualmente, é estudante do 1º ano de Engenharia Mecatrónica, na Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico de ...; que o curso de Engenharia Mecatrónica tem a duração de três anos lectivos, tendo o Autor obtido, até ao momento, aprovação em seis cadeiras; e que um engenheiro mecatrónico aufere, em média, e no início de carreira, a quantia de € 1.300,00 por mês, podendo, alguns anos mais tarde e com experiência, auferir mensalmente a quantia de € 2.000,00.
Perante este quadro fáctico apurado, fez bem o tribunal a quo ter em consideração o salário de €1.500,00, pois atende a uma previsível evolução salarial do Autor em função do aumento da respectiva experiência profissional, o que se nos afigura mais razoável, em vez de ater-nos, somente, ao valor do salário médio no início da carreira.
Assim sendo, deve manter-se o valor indemnizatório relativo aos danos em apreço, improcedendo nesta parte as conclusões do recurso.
*
Dos danos não patrimoniais

A título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, foi arbitrada ao A. uma indemnização de €50.000,00.
A Recorrente alega que tal quantia se afigura exagerada, pugnando que a situação concreta do A. reclama uma compensação pelos danos não patrimoniais nunca superior a €25.000,00.
Vejamos.
No que tange ao valor indemnizatório dos danos não patrimoniais, podemos também adiantar que o valor que a sentença fixou sobre esta matéria mostra-se adequado.
O art. 496º nº3 CC prescreve que o montante de indemnização desta espécie de danos é calculado segundo critérios de equidade, tendo em atenção as circunstâncias indicadas no art. 494º CC.
É sabido que a nossa lei consagra a indemnização por danos não patrimoniais, nos termos e com as condições resultantes do art. 496º, nº 1 e 4 CC. A indemnização por danos morais não visa reconstituir a situação que existiria se o dano não tivesse ocorrido, mas simplesmente e, de alguma forma, compensar o lesado pelos abalos e sofrimentos sentidos e igualmente sancionar a conduta do lesante.
Na verdade, trata-se de prejuízos de natureza infungível, pelo que não é possível uma reintegração por equivalente, susceptível de indemnização, mas apenas um quantitativo que proporcione ao beneficiário certas satisfações decorrentes da utilização do dinheiro (Ac. STJ de 20.11.2003 in CJ Ano XI, tomo 3, pg. 149; Ac. RL de 5.05.95 in CJ Ano XX, tomo 3, pg. 95; Ac. STJ de 11.10.94 in CJ Ano II, tomo 3, pg. 89; Ac. STJ de 20.11.2003 in CJ Ano XI, tomo 3, pg. 149; Ac. STJ de 15.12.98 in CJ Ano VI, tomo 3, pg. 155; Ac. STJ de 20.11.2003 in CJ Ano XI, tomo 3, pg. 149; Ac. STJ de 25.11.2009 in http://www.dgsi.pt/ processo nº 397/03.0GEBNV.S1.
Esta compensação deve ser proporcionada à gravidade do dano e deverá ter um alcance significativo e não meramente simbólico; por outro lado, a sua valoração é actual, motivo pelo qual não há lugar à sua actualização nem deverão ser estipulados juros a partir da citação.
Em geral, as circunstâncias aqui a ter em conta prendem-se com o quantum doloris, o período de doença, com prolongados internamentos hospitalares, períodos de imobilização e intervenções cirúrgicas, dificuldades de locomoção e de condução, além das restrições pessoais e sociais daí decorrentes, angústia e ansiedade produzidas pela situação de alguém que sofreu um acidente e as lesões decorrentes, os danos resultantes de desvalorização, deformidades, prejuízo estético, além do sofrimento actual e sentido durante o tempo de incapacidade, a angústia acerca da incerteza e futuro da situação e a existência e grau de incapacidade sofridos, situação anterior e posterior do lesado em termos de afirmação social, apresentação e auto-estima, alegria de viver, idade, esperança de vida, perspectivas para o futuro, etc.
A equidade deve traduzir a «a justiça do caso concreto, flexível, humana, independente de critérios normativos fixados na lei, devendo o julgador ter em conta as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida (…)”- Cf. acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 12/01/2017, processo n.º50/12.4TBPTL.G1, disponível em www.dgsi.pt.
Nesta conformidade e face ao caso concreto, há aqui a considerar, relativamente ao Autor: o número de dias em que o Autor esteve com um défice funcional temporário total (19 dias), o número de dias com um défice funcional temporário parcial (388 dias), o período de repercussão temporária na actividade formativa total (90 dias), o défice permanente (19 pontos), às dores sofridas (5/7), o dano estético permanente (3/7), à repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer (4/7). Há ainda a considerar a idade do Autor, a circunstância de ter sido submetido um internamento e a uma cirurgia, ter visto a sua qualidade de vida, quer do ponto vista físico, quer do ponto de vista social, afectada, de ter ficado limitado funcionalmente. E conforme se realça na sentença recorrida, decorre dessa limitação que, em qualquer juízo de prognose que se fizer quanto ao seu futuro, se concluirá que nas actividades mais quotidianas e normais do dia-a-dia o Autor necessitará de desenvolver esforços suplementares e de se submeter a tratamentos regulares.
Tudo isto decorre da factualidade provada sob os pontos pontos vv), ww), xx), yy), zz), aaa), bbb), ccc), ddd), eee), fff), ggg), hhh), iii), jjj), kkk), 11l), mmm), nnn), 000), ppp), qqq), rrr), sss), ttt), uuu), vvv), www), xxx), yyy) e dddd).
Temos assim a considerar as dores e desgostos sofridos, o dano estético permanente, a repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer, a natureza das lesões sofridas, tratamentos recebidos, e natureza das sequelas de que ficou portador, e bem assim o período de tempo desde o acidente até à consolidação.
 Estamos, pois, perante danos não patrimoniais que o autor sofreu, merecedores da tutela do direito, e que se encontram espelhados no rol de factos provados.
O tribunal a quo considerou adequada e justa uma indemnização de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) por danos não patrimoniais.
Concordamos inteiramente com a ponderação efectuada e a com a conclusão indemnizatória produzida na sentença.
Na verdade, como ensina Antunes Varela, e como vem sendo seguido pela jurisprudência dos nossos tribunais, o juízo de equidade requer do julgador que tome «em conta todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida», sem esquecer que sobredita “indemnização” tem natureza mista, já que visa não só reparar, de algum modo, o dano, mas também reprovar a conduta lesiva. Com efeito, ante a imaterialidade dos interesses em jogo, a indemnização dos danos não patrimoniais não pode ter por escopo a sua reparação económica. Visa sim, por um lado, compensar o lesado pelo dano sofrido, em termos de lhes proporcionar uma quantia pecuniária que permita satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão; e, por outro lado, servir de sancionamento da conduta do agente.
Todavia, no critério a adoptar, não se devem perder de vista os padrões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, procurando - até por uma questão de justiça relativa - uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, como aliás impõe o nº 3 do artigo 8º do CC. E temos de ter presente que a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (de que é exemplo, entre outros, os Acórdãos citados na sentença) vem acentuando a ideia de que tais compensações devem ter um alcance significativo, e não meramente simbólico nem miserabilista.
Nesta conformidade, entendemos que o valor encontrado ou fixado na sentença recorrida se mostra adequado e justo.
Deste modo, improcedem nesta parte as conclusões do recurso.

Dos juros

Sobre a quantia fixada a título de indemnização por danos patrimoniais, o Tribunal a quo condenou a Ré no pagamento de juros calculados desde a data da citação.
Alega a Recorrente que o montante fixado a tal respeito, foi alcançado com recurso à equidade, pelo que, o valor em questão foi actualizado à data da prolação da Sentença, razão apela qual, entende que sobre a indemnização fixada a título de perda de capacidade de ganho devem apenas ser calculados os juros que se vencerem desde a data da prolação da Sentença.
A Recorrente discorda do assim decidido, alegando que não está conforme com o que a este título resulta do acórdão uniformizador de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, de 9 de maio de 2002.
Vejamos.
A sentença recorrida computou em € € 140.234,06, o montante dos danos patrimoniais sofridos pelo autor. E decidiu condenar a Ré no pagamento ao autor desse valor, acrescido de juros, desde a citação até efetivo e integral pagamento.
A Recorrente suscita a questão da obrigação temporal de pagamento de juros de mora sobre o valor arbitrado ao recorrido a título de compensação por danos patrimoniais, à luz do acórdão de uniformização de jurisprudência nº. 4/2002, de 9 de Maio, publicado no Diário da República, I Série A, nº. 146, de 27 de Junho de 2002.
Afigura-se-nos que a Ré/Recorrente não tem razão.
O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2002 do STJ, de 9.5.2002 (D.R-, I.ª, Série de 27.6.2002), fixou a seguinte jurisprudência: “Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do art.º 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos art.ºs 805°, n° 3 (interpretado restritivamente), e 806. °, n.º l, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação”.
Sobre esta temática, seguiremos de perto o entendimento plasmado no Ac. do STJ de 13.07.2004, relatado pelo Conselheiro Salvador da Costas, que incidiu sobre um caso semelhante e que tece as seguintes considerações, com as quais concordamos:
- (…) “No recurso em que foi preferido o referido acórdão uniformizador de jurisprudência, na sequência de no acórdão da Relação se haver fixado a compensação por danos não patrimoniais actualizada à data da sentença, os recorrentes alegaram que sobre o montante global da indemnização devia incidir a actualização em função dos valores da inflação entre a data do acidente e a propositura da acção e que, a partir da data da citação e até ao pagamento, deviam incidir juros moratórios sobre o montante global da indemnização.
No referido acórdão afirmou-se, além do mais que aqui não releva, que o valor da compensação a título de danos não patrimoniais havia sido actualizado à data da sentença em conformidade com o disposto no artigo 566º, nº. 2, do Código Civil, e que a questão de direito a resolver se prendia com a determinação do momento do início da contagem de juros de mora sobre os quantitativos da indemnização arbitrada a título de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, designadamente os respeitantes a danos não patrimoniais.
Afirmou-se tratar-se de interpretar a segunda parte do nº. 3 do artigo 805º na sua ligação sistemática com o artigo 566º, nº. 2, ambos do Código Civil e que, conforme se adoptasse uma ou outra das orientações em confronto, adquirida que estivesse a atribuição de uma indemnização actualizada, ou seja, objecto de correcção monetária, o sentido do primeiro dos referidos normativos, na sua necessária articulação com o segundo, teria de ser objecto de interpretação literal ou restritiva.
Colocou-se em confronto a orientação que entendia a compatibilidade dos mencionados normativos, ou seja, da acumulação de juros de mora desde a citação com a actualização da indemnização em função da taxa da inflação fundada no argumento do distinto objecto e da diversa natureza que preside à actualização da expressão monetária da indemnização entre as datas da citação e da decisão actualizadora, e a da não cumulatividade de juros de mora desde a citação com a actualização da indemnização, fundada no facto de ambas as providências influenciadoras do cálculo obedecerem à mesma finalidade de fazer face à erosão do valor da moeda entre o evento danoso e a satisfação da obrigação indemnizatória.
Referiu-se que se o juiz fizer apelo ao critério actualizador previsto no artigo 566º, nº. 2, do Código Civil, atribuindo a indemnização monetária aferida pelo valor da moeda à data da sentença da primeira instância, não podia, sem se repetir, mandar acrescer a tal montante juros de mora desde a citação por força do nº. 3 do artigo 805º daquele diploma.
Salientou-se ainda, por um lado, que a intenção do legislador de 1983 só foi a de compensar o prejuízo da inflação relativamente ao que falhava na previsão do nº. 2 do artigo 566º do Código Civil quando, por efeito da inflação, o valor do pedido se depreciava em termos tais que a actualização com referência à data da sentença conduzia a um valor superior ao do pedido que o tribunal não podia considerar, atenta a limitação decorrente do artigo 661º, nº. 1, do Código de Processo Civil.
E, por outro, expressou-se que no caso de o juiz não poder valer-se do nº. 2 do artigo 566º do Código Civil, por o pedido estar muito desactualizado e não ter sido ampliado, os juros de mora podiam e deviam ser contados desde a citação, por aplicação do nº. 3 do artigo 805º daquele diploma.
Essencialmente com base na mencionada argumentação é que foi votado maioritariamente o acórdão de uniformização de jurisprudência em causa, segundo o qual, sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo, nos termos do nº. 2 do artigo 566º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805º, nº. 3, interpretado restritivamente, e 806º, nº. 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação.
Resulta do referido acórdão de uniformização de jurisprudência, tendo em conta o seu conteúdo, salientado pontualmente nas expressões que acima se deixaram assinaladas, e as alegações de recurso sobre as quais se pronunciou, a ideia de uma decisão actualizadora da indemnização em razão da inflação no período compreendido entre ela e o momento do evento danoso causador do dano, sob a invocação do nº. 2 do artigo 566º do Código Civil, que consagra o critério derivado do confronto da efectiva situação patrimonial do lesado na data mais recente atendível pelo tribunal e a que teria nessa data se não tivesse ocorrido o dano.
A prolacção dessa decisão actualizadora, tendo em conta a motivação do referido acórdão de uniformização de jurisprudência, tem que ter alguma expressão nesse sentido, designadamente a referência à utilização no cálculo do critério chamado da diferença na esfera jurídico-patrimonial constante no artigo 566º, nº. 2, do Código Civil e à consideração no cômputo da indemnização ou da compensação da desvalorização do valor da moeda.
Isto posto, reconduzindo-nos ao caso vertente, há que atentar no teor da motivação da sentença relativa ao cálculo do valor compensatório por danos patrimoniais sofridos pelo recorrido e confrontá-lo com o conteúdo do referido acórdão de fixação de jurisprudência.
Na sentença recorrida foi a Recorrente condenada no pagamento de juros de mora ao Recorrida, que respeita ao montante compensatório relativo aos danos patrimoniais, desde a data da sua citação.
No âmbito dessa motivação, o tribunal a quo limitou-se a declarar que considerava suficiente e equitativa a atribuição ao Recorrido da compensação a que se referiu, sem qualquer alusão a actualização, e condenou a Recorrente no pagamento de juros de mora desde a data da sua citação para acção.
Conforme se realça no citado acórdão do STJ, (…) “Uma decisão actualizadora da indemnização, em rigor, pressupõe que sobre algo já quantificado incida algum elemento ou índice de actualização, situação que se não reconduz necessariamente ao cálculo da indemnização com base no princípio de diferença de esfera patrimonial a que se reporta o nº. 2 do artigo 566º do Código Civil.”
Ora, na sentença recorrida, nada se referiu quanto a qualquer decisão actualizadora à luz do nº. 2 do artigo 566º do Código Civil, nem à consideração até à sentença em análise dos índices da inflação, ou seja, da desvalorização da moeda no período compreendido entre ela e o evento danoso.
Ao invés do que a Recorrente alegou, inexiste fundamento legal para concluir que o juiz da primeira instância procedeu à actualização da compensação por danos patrimoniais em causa, a que se reporta o mencionado acórdão de uniformização de jurisprudência.
Com efeito, o tribunal a quo limitou-se a calcular a compensação ao Recorrido pelos danos em apreço, à luz do artigo 496º, nº. 4, do Código Civil, sem qualquer operação de actualização.
Considerando que o tribunal da primeira instância, no âmbito da sentença, não procedeu ao cálculo da compensação devida pela Recorrente ao Recorrido por via de qualquer operação de actualização, e tendo condenado aquela a pagar a este os juros moratórios à taxa legal desde a data da citação, limitou-se a cumprir o disposto nos artigos 805º, nº. 3, segunda parte, e 806º, nº. 1, ambos do Código Civil, de harmonia com o sentido interpretativo que lhes foi dado pelo mencionado acórdão de uniformização de jurisprudência.
Por consequência, improcedem totalmente as alegações da apelação, devendo manter-se a sentença recorrida.
*
Sumário:

- No âmbito da determinação da indemnização ao lesado decorrente de acidente de viação, o chamado “cálculo dos danos futuros” não é um verdadeiro cálculo, porque assenta em dados futuros não conhecidos nem cognoscíveis, e envolve por isso um elemento inevitável de arbítrio.

- Assim, o montante que importa fixar é uma previsão feita em abstracto, muito embora baseada nos factos concretos já conhecidos e provados no processo.

- De harmonia com o disposto nos artigos 564º e 566º do Código Civil, o valor a encontrar para aqueles danos deve resultar, não de complexos cálculos matemáticos, mas apenas de um juízo de equidade.

- O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2002 do STJ, de 9.5.2002 (D.R-, I.ª, Série de 27.6.2002), fixou a seguinte jurisprudência: “Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do art.º 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos art.ºs 805°, n° 3 (interpretado restritivamente), e 806. °, n.º l, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação”.

- Uma decisão actualizadora da indemnização, em rigor, pressupõe que sobre algo já quantificado incida algum elemento ou índice de actualização, situação que se não reconduz necessariamente ao cálculo da indemnização com base no princípio de diferença de esfera patrimonial a que se reporta o nº. 2 do artigo 566º do Código Civil.

- Considerando que o tribunal da primeira instância, no âmbito da sentença, não procedeu ao cálculo da compensação devida pela Recorrente ao Recorrido por via de qualquer operação de actualização, e tendo condenado a aquela a pagar a este os juros moratórios à taxa legal desde a data da citação, limitou-se a cumprir o disposto nos artigos 805º, nº. 3, segunda parte, e 806º, nº. 1, ambos do Código Civil, de harmonia com o sentido interpretativo que lhes foi dado pelo mencionado acórdão de uniformização de jurisprudência.

DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar totalmente improcedente o recurso e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.
TRG, 09.11.2023

Relator: Jorge Santos
Adjuntos: Fernanda Proença
Paula Ribas