Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6036/23.6T8VNF.G1
Relator: JOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Descritores: PROCESSO ESPECIAL PARA ACORDO DE PAGAMENTO
INDEFERIMENTO LIMINAR
INSOLVÊNCIA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/01/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1- O processo especial para acordo de pagamento (PEAP) é um processo pré-insolvencial de que o devedor, que não sendo uma empresa, se pode socorrer quando se encontre numa situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, com vista a encetar negociações com os seus credores tendentes a celebrar um acordo de pagamento que preveja a reestruturação do seu passivo, de modo a obviar que caia numa situação de insolvência.
2- Daí que são pressupostos subjetivos para o recurso ao PEAP que o requerente não seja uma empresa para efeitos do art. 5º do CIRE, e são pressupostos substantivos do processo em causa que o devedor se encontre comprovadamente numa situação económica difícil ou numa situação de insolvência meramente iminente.
3- Encontra-se numa situação de insolvência iminente o devedor que, por falta de liquidez, ainda não se encontra numa situação impeditiva de cumprir com a generalidade (a maioria, ou seja, a maior parte) das suas obrigações vencidas, embora, de acordo com um juízo de prognose objetivo, atento o normal fluir das coisas, face à situação concreta em que se encontra, seja previsível que, se nada for feito, aquele ficará impossibilitado de cumprir com a generalidade dos seus compromissos financeiros à medida que estes se forem vencendo, caindo numa situação de insolvência.
4- A distinção entre situação económica difícil e insolvência iminente passa pelo seguinte critério: se o devedor tem sérias dificuldades, por falta de liquidez, para cumprir os seus compromissos financeiros à medida que estes se foram vencendo, mas não é previsível que os venha a incumprir, encontra-se numa “situação económica difícil”; se o juízo de prognose for o contrário, ou seja, se já for objetivamente previsível que o devedor não irá cumprir com aqueles compromissos financeiros à medida que estes se forem vencendo, o mesmo encontra-se numa situação de “insolvência iminente”.
5- O juiz deverá indeferir liminarmente a petição inicial, por manifesta improcedência da pretensão do requerente de PEAP, quando da alegação ali vertida ou dos documentos e declarações a ela anexas resultar, de forma objetiva, clara e manifesta, que já se encontra numa situação de insolvência atual.
6- Alegando a requerente de PEAP que, em virtude da crise económica, ela e o marido não conseguiram cumprir atempadamente as suas obrigações; que apesar de terem contraído dívidas junto de familiares para fazerem face aos seus compromissos, não obtiveram o efeito pretendido, que era a sua solvabilidade; que não consegue obter crédito junto da banca e que, inclusivamente, um banco credor já lhe moveu ação de insolvência, onde ainda não foi proferida sentença; que não consegue cumprir pontualmente as suas obrigações, quer por falta de liquidez, quer por não conseguir crédito; e resultando da relação de credores junta em anexo a esse articulado inicial que a requerente é devedora de um crédito de 668,68 euros, vencido em 04/10/2023, de um outro, no montante de 57.500,00 euros, vencido em 04/05/2023, e de um terceiro, no montante de 76.340,23 euros, vencido em 04/10/2023, impõe-se concluir, em termos objetivos, claros e manifestos, que a requerente se encontra já numa situação de insolvência atual e, em consequência, indeferir liminarmente a petição inicial com que se apresenta a PEAP, por manifesta falta de viabilidade da sua pretensão.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I- RELATÓRIO

AA, residente na Rua ..., ... ..., concelho ..., instaurou processo especial para acordo de pagamento fundamentando a sua pretensão nos seguintes termos:

1- A requerente atualmente encontra-se reformada, sendo o seu agregado familiar constituído por si e pelo seu marido.
2- Sucede que, o seu cônjuge exerceu atividade empresarial por conta própria, no ramo da carpintaria e,
3- Em virtude da crise económica que atravessa quer a economia internacional, quer nacional, a requerente viu os rendimentos do agregado familiar sofrerem um duro golpe e consequentemente não conseguiram cumprir atempadamente as suas obrigações.
4- Sendo que, e atento que, contraíram algumas dívidas para fazer face aos seus compromissos.
5- Não obstante as dificuldades económicas que a mesma atravessa, o certo é que o património que a mesma detém, a rentabilidade que poderá auferir do mesmo, está convicta a requerente que conseguirá ultrapassar as graves dificuldades que atravessa atualmente.
6- Não se encontrando numa situação de insolvência, o certo é que a sua real situação económica se afigura difícil.
7- Sendo considerado em situação económica difícil, nos termos do artigo 222º-B do CIRE, “O devedor que enfrente dificuldades sérias para cumprir pontualmente as suas obrigações, designadamente por ter falta de liquidez ou por não conseguir obter crédito.
8- No caso em apreço a requerente apresenta dificuldades sérias de liquidez,
9- E não consegue, a par, aliás, do que é comum à situação atual, obter crédito junto da banca.
10- Aliás, o banco credor daqui requerente, intentou processo de insolvência da qual a mesma se opôs, sendo aquele o maior entrave e intransigência nas negociações.
11- Não cumprindo com a suas obrigações legais, tais como a implementação da requerente no PERSI.
12- Porém, ainda é possível a sua recuperação, caso a presente providência venha a ser decretada, sendo assim possível, na sua sequência, estabelecer negociações com os respetivos credores da requerente de modo a concluir com estes um acordo conducente à sua recuperação.
13- Por graves dificuldades económicas esta não consegue cumprir pontualmente as suas obrigações, quer por falta de liquidez, quer por não conseguir obter crédito.
14- Por outro lado, o recurso ao mútuo junto de familiares não obteve o efeito pretendido pela requerente, a sua solvabilidade”.

Sugeriu que lhe fosse nomeado como administrador judicial provisório BB, que melhor identifica.

Juntou em anexo à petição inicial:
- Relação de credores – anexo I (“1- Autoridade Tributária e Aduaneira, (…), com um crédito de 668,86 euros, vencido à data de 04 de outubro de 2023; 2- CC, (…), com um crédito no montante de 57.500,00 euros, vencido à data de 4 de maio de 2023; 3- Banco 1..., S.A., (…), com um crédito no valor de 76.340,23 euros, vencido à data de 04 de outubro de 2023”);
- Relação de Ações/execuções – Anexo II (“1- processo de insolvência n.º 5355/21.... que corre termos no Juiz ... de ... de ... do Tribunal Judicial da Comarca ..., em que é requerente o Banco 1... e requerida a aqui requerente”);
  - Património da Requerente – Anexo III (“1- Prédio urbano inscrito na matriz predial ...57... extinto 438º da freguesia ..., com o valor de avaliação de 153.000,00 euros; 2- Prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o art. ...96º, fração ..., ... destinado a garagem e arrumos, da freguesia ..., com o valor de avaliação de 74.000,00 euros; 3- Prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o art. ...96º, fração ..., ... destinado a garagem, da freguesia ..., com o valor da avaliação de 58.500,00 euros; 4- Prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o art. ...96º, fração ..., ... andar destinado a habitação tipo ... da freguesia ..., com o valor de avaliação de 107.000,00 euros; 5- Prédio urbano descrito na matriz predial urbana sob o art. ...96º, fração ... destinado a habitação tipo ... da freguesia ..., com o valor de avaliação de 107.000,00 euros”);
- Relatório de perícia datado de “novembro de 2022” e subscrito por DD, em que procede à avaliação do património imobiliário da requerente;
- Declaração datada de 04 de maio de 2023, assinada pela requerente e por CC, este na qualidade de credor, em que “declaram e manifestam para efeitos do artigo 222º-C, n.º 1 do CIRE, a sua vontade recíproca de encetarem negociações conducentes à elaboração de acordo de pagamento no âmbito do processo especialmente previsto para esse fim”; e
- Certificado do registo criminal da requerente, em que nada consta.

Conclusos os autos, a 1ª Instância proferiu o despacho que se segue:
“É do meu conhecimento funcional que se encontra pendente neste Juízo ..., o processo n.º 5232/19.... onde foi declarada a insolvência do marido da devedora, EE.
Naqueles autos e no âmbito do apenso D, na sequência de ação de separação de bens intentada pela aqui devedora, AA, contra EE, sua massa insolvente e credores da mesma foi determinada a separação da massa insolvente da meação pertencente à A. AA relativo aos bens descritos na alínea E) da matéria de facto assente.
Assim, determino que a devedora venha retificar a relação de bens apresentada nos autos, pois que a mesma não é proprietária dos bens ali descritos, mas sim da meação relativa a tais bens”.
  
Nessa sequência, por requerimento de 10/10/2023, a requerente apresentou nova relação de bens em que relacionou o direito à meação sobre os prédios que antes descreveu no Anexo III, junto com a petição inicial.
Por despacho de 12/10/2023, a 1ª Instância indeferiu liminarmente a petição inicial com fundamento de que a requerente se encontra em situação de insolvência atual, constando esse despacho do teor que se segue (procede-se à sua reprodução integral e ipsis verbis):
AA, veio ao abrigo do disposto nos artigos 222.º-A, e ss. do CIRE, intentar o presente Processo Especial para Acordo de Pagamento (PEAP), comunicando que pretende dar início às negociações com os respetivos credores de modo a com estes concluir acordo de pagamento.
Para tanto alega que:
A requerente atualmente encontra-se reformada, sendo o seu agregado familiar, constituído por si pelo seu marido.
Sucede que, o seu cônjuge, exerceu atividade empresarial, por conta própria, no ramo da carpintaria e,
Em virtude da crise económica que atravessa quer a economia internacional, quer nacional, a requerente viu os rendimentos do agregado familiar sofrerem um duro golpe e consequentemente não conseguiram cumprir atempadamente as suas obrigações.
Sendo que, e atento que, contraíram algumas dívidas para fazer face aos seus compromissos.
Não obstante, as dificuldades económicas que a mesma atravessa, o certo é que o património que a mesma detém, a rentabilidade que poderá auferir do mesmo, está convicta a requerente que conseguirá ultrapassar as graves dificuldades que atravessa atualmente. No caso em apreço a requerente apresenta dificuldades sérias de liquidez,
E não consegue, a par, aliás, do que é comum à situação atual, obter crédito junto da banca.
Aliás, o banco credor daqui requerente, intentou processo de insolvência da qual a mesma se opôs, sendo aquele o maior entrave e intransigência nas negociações.
Porém, ainda é possível a sua recuperação, caso a presente providência venha a ser decretada, sendo assim possível, na sua sequência, estabelecer negociações com os respetivos credores da requerente de modo a concluir com estes um acordo conducente à sua recuperação. 
Por graves dificuldades financeiras, esta não consegue cumprir pontualmente as suas obrigações, quer por falta de liquidez, quer por não conseguir obter crédito.
Por outro lado, o recurso ao mútuo junto de familiares não obteve o efeito pretendido pelo requerente, a sua solvabilidade.
Com efeito, a Requerente obteve já junto de um dos seus credores, designadamente CC, a anuência à outorga de um acordo de recuperação, casa venha a ser este o entendimento.
Com o requerimento inicial juntou Relação de credores (3 credores), de onde resulta serem devedores de uma quantia global de 134.509,09€, assim descriminada:
1. Autoridade Tributária e Aduaneira, NIF ...79, com sede na Rua ... Lisboa, com um crédito no valor de 668.86€ (seiscentos e sessenta oito euros e oitenta seis cêntimos), vencido à data de 4 de outubro de 2023.
2. CC, NIF ...04, residente na Rua ... ... ..., com crédito no montante de 57.500.00€ (cinquenta e sete mil e quinhentos euros), vencido à data de 4 de maio de 2023.
3. Banco 1..., S.A, com sede na Praça ..., ... ..., com um crédito no valor de 76.340.23€, vencido à data de 4 de outubro de 2023.
Junta lista das ações contra si pendentes (identificando o Processo de insolvência n.º 5355/21.... que corre termos no Juiz ... de ... de ... do Tribunal Judicial Comarca ..., em que é requerente o Banco 1...).
Junta ainda relação de bens, da qual decorre ser titular de cinco prédios urbanos, no valor que estima de 499.500,00€.
Convidada a aperfeiçoar o requerimento inicial, retificando a relação de bens apresentada nos autos, pois que a mesma não é proprietária dos bens ali descritos, mas sim da meação relativa a tais bens, a mesma veio indicar ser proprietária da meação sobre os referidos bens. 
Vejamos.
Tal como já se deixou dito, urge adicionar à factualidade relevante que se deixou supra exposta, a seguinte:
A aqui devedora é casada com EE, o qual foi declarado insolvente em 19-06-2020, no processo n.º 5232/19...., que se encontra pendente neste Juízo, Juiz ..., estando em curso a liquidação do ativo.
Naqueles autos e no âmbito do apenso D, na sequência de ação de separação de bens intentada pela aqui devedora AA contra EE, sua massa insolvente e credores da mesma foi determinada a separação da massa insolvente da meação pertencente à A. AA relativa aos bens elencados pela devedora nestes autos como sendo o seu património.
 Banco 1..., S. A. intentou, em 30-09-2021, contra a aqui requente ação com o n.º 5355/21...., que corre termos no Juiz ..., deste Juízo de Comércio, pedindo a insolvência da devedora, alegando ser credor da quantia de € 315.009,52 (trezentos e quinze mil, nove euros e cinquenta e dois cêntimos), sendo o montante de € 274.312,24 (duzentos e setenta e quatro mil, trezentos e doze euros e vinte e quatro cêntimos) decorrente de crédito hipotecário e a importância de € 40.697,28 (quarenta mil, seiscentos e noventa e sete euros e vinte e oito cêntimos) decorrente de livrança, emitida em .../.../2012 e vencida em 19 de fevereiro de 2015, subscrita pela Requerida AA e pelo seu marido, EE, a qual titula as responsabilidades decorrentes do contrato de empréstimo.
Ora, considerando o alegado pela requerente no seu requerimento inicial e, bem assim a documentação pela mesma junta, salvo melhor opinião, é a própria requerente, nas suas alegações e através da documentação que junta que dá a conhecer a sua situação de insolvência atual e não iminente. É a própria insolvente quem diz que “Por graves dificuldades financeiras, esta não consegue cumprir pontualmente as suas obrigações, quer por falta de liquidez, quer por não conseguir obter crédito.”
A requerida tem, na sua alegação, créditos vencidos, a três credores distintos, no valor total de € 134.509,09. (Diga-se que se afigura que esse valor poderá vir a ser maior face ao alegado pelo Banco requerente no pedido de insolvência da aqui requerida).
 Relativamente ao património que indica, apenas é titular do direito à meação incidente sobre o mesmo, pois que a meação do marido se encontra apreendida nos autos de insolvência daquele.
Créditos vencidos no valor referido que para alguém que se encontra reformada, apesar de não dizer o valor mensal da reforma auferida, desconhecendo-se outros rendimentos ou meios de que dispõe, está integrada num agregado familiar composto por si e pelo seu marido insolvente, não tem crédito, não consegue negociar com o maior credor, não pode levar a outra conclusão senão a de que a requerida se encontra impossibilitada de cumprir as suas obrigações vencidas, tendo ocorrido a falta de cumprimento de pelo menos três obrigações que, pelo seu montante e pelas circunstâncias do incumprimento, revelam a impossibilidade de a devedora satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações.  Tais factos, conjugados entre si e ainda associados aos demais que são igualmente alegados relativamente à sua situação patrimonial, permitem, desde já, concluir que a requerente se encontra impossibilitada de cumprir, de forma generalizada, as suas obrigações vencidas. Ou seja, é manifesto que a situação da devedora não é meramente uma situação económica difícil, constituindo antes, verdadeiramente, uma situação de insolvência atual.  
A questão que agora se põe é se é admissível a este tribunal apreciar no despacho inicial a referida factualidade e indeferir liminarmente o requerimento de apresentação do PEAP com fundamento em que a requerente se encontra em situação de insolvência atual. Ou seja, a questão que aqui se coloca é a de saber se, nesta análise liminar de recebimento do PEAP, pode/deve o juiz ir mais além, apreciando o pressuposto substantivo do PEAP de existência de uma situação pré-insolvencial.
Com respostas positivas a esta temática podemos ver os acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Coimbra, disponíveis em www.dgsi.pt.: AC. de 13-06-2023 proferido no processo 1365/23.1T8CBR.C1, pela Exma. Desembargadora Maria João Areias; de 01-12-2019, no processo 5494/19.8T8CBR.C1, pelo Exmo. Desembargador Ferreira Lopes.
Assim, face ao que se deixou plasmado, indefiro liminarmente o requerimento de apresentação do PEAP com fundamento em que a requerente se encontra em situação de insolvência atual.
Custas pela requerente.
Notifique.
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Dê conhecimento deste despacho ao processo com o n.º 5355/21...., que corre termos no Juiz ..., deste Juízo de Comércio”.

Inconformada com o decidido a requerente, AA, interpôs recurso em que formula as conclusões que se seguem:
I. Em 6/10/2023 foi pela recorrente instaurado processo especial para acordo de pagamento.  
II. Em 12-10-2023, o tribunal a quo decidiu indeferir liminarmente tal pedido, em virtude de considerar que a recorrente se encontra em situação de insolvência atual. 
III. Contudo, o PEAP deveria ter sido deferido liminarmente. 
IV- Como referido no requerimento inicial, a recorrente não se encontra em situação de insolvência atual. 
V- A recorrente, contrariamente à consideração alcançada pelo tribunal recorrido, encontra-se sim numa situação económica difícil, contudo, capaz de cumprir as suas obrigações, ainda com sérias dificuldades, quer por falta de liquidez, quer por não conseguir obter crédito.
VI- Não existem no articulado factos que permitam ao Tribunal concluir ainda que a Recorrente se encontra impossibilitada de cumprir, de forma generalizada, as suas obrigações vencidas, tendo já ultrapassado os limites da iminência (de insolvência), integrando uma verdadeira situação de insolvência, na definição contida no artigo 3.º, n.º 1, do CIRE, pois ao longo de toda a PI a Recorrente afirmou precisamente o contrário - padecendo assim, a sentença de falta de fundamentação.
VII- Num PEAP a análise da efetiva situação económico-financeira do devedor depende de uma multiplicidade de fatores e circunstâncias e bem assim da sua própria evolução; fatores e circunstâncias cuja apreciação, nesta fase tão precoce, o Tribunal não tem tempo para fazer, devendo, assim e na dúvida, deferir o PEAP, permitindo à Requerente do mesmo a possibilidade de se recuperar.
VIII- Atentos ao caso em concreto, apreciado o património da recorrente resulta um valor patrimonial dos imóveis no montante global de 249.750,00€, valor este resultante de relatório de avaliação efetuado no âmbito de processo de insolvência do marido da insolvente, sendo que, assim, permaneceria superior o valor do ativo ao valor do passivo alegadamente existente no montante global de 134.509,09€.
IX- Deste modo, não se percebe como é que o tribunal a quo considera que a recorrente se encontra em situação de insolvência atual. 
X- A recorrente tem rendimentos. 
XI- A recorrente é titular do direito de meação de diversos prédios. 
XII- Desta feita, não se pode considerar que a mesma se encontra em insolvência atual. 
XIII- Pelo que, não existem no articulado factos que permitem ao Tribunal concluir que a Recorrente se encontra impossibilitada de cumprir, de forma generalizada, as suas obrigações vencidas, integrando uma verdadeira situação de insolvência, na definição contida no artigo 3.º, n.º 1, do CIRE, pois ao longo de toda a PI a Recorrente afirmou precisamente o contrário - padecendo assim, a sentença de falta de fundamentação.
XIV- Pelo que, tendo em consideração tudo o que fora referido, deverá ser revogado o despacho que indeferiu liminarmente o pedido de processo especial de acordo de pagamento e, consequentemente, deverá ser proferida decisão nos termos previstos no nº 4 do artigo 222º-C do CIRE. 
Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, deverá ser revogado o despacho que indeferiu liminarmente o pedido de processo especial de acordo de pagamento e, consequentemente, deverá ser proferida decisão nos termos previstos no nº 4 do artigo 222º-C do CIRE
ASSIM DECIDINDO, VOSSAS EXCELÊNCIAS, MUITO ILUSTRES DESEMBARGADORES FARÃO, COMO SEMPRE, JUSTIÇA!
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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A 1ª instância admitiu o recurso interposto como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, o que não foi alvo de modificação no tribunal ad quem.  
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO OBJETO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
Acresce que, o tribunal ad quem também não pode conhecer de questão nova, isto é, que não tenha sido objeto da decisão sob sindicância, salvo se se tratar de questão que seja do conhecimento oficioso, dado que, sendo os recursos os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, mediante o reexame de questões que tenham sido nelas apreciadas, visando obter a anulação da decisão recorrida (quando padeça de vício determinativo da sua nulidade) ou a sua revogação ou alteração (quando padeça de erro de julgamento, seja na vertente de erro de julgamento da matéria de facto e/ou na vertente de erro de julgamento da matéria de direito) nos recursos, salvo a já enunciada exceção, não podem ser versadas questões de natureza adjetivo-processual e/ou substantivo material sobre as quais não tenha recaído, ou devesse recair, a decisão recorrida[1].
No seguimento desta orientação cumpre ao tribunal ad quem apreciar uma única questão que consiste em saber se a decisão, ao indeferir liminarmente a petição inicial com que a apelante instaurou a presente ação especial para acordo de pagamento (por manifesta improcedência, porquanto, a facticidade por aquela alegada é demonstrativa que já se encontra numa situação de insolvência atual) padece de erro de direito e se, em consequência, se impõe revogar a decisão sob sindicância e determinar o prosseguimento dos autos.
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III- DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos que relevam para apreciar a questão submetida à apreciação desta Relação são os que constam do relatório acima elaborado.
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IV- DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

O processo especial para acordo de pagamento (PEAP), foi introduzido no ordenamento jurídico nacional pelo DL n.º 79/2017, de 30/06, que entrou em vigor em 01 de julho de 2017, e que aditou ao CIRE os arts. 222º-A a 222º-J, criando o novo processo especial para acordo de pagamento, o qual permite ao devedor que, não sendo uma empresa e que comprovadamente se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir um acordo de pagamento, que obste a que caia numa situação de irremediável insolvência (n.º 1 do art. 222º-A do CIRE).
Após um período inicial, em que o PER foi aplicado a todos os sujeitos passivos  suscetíveis de serem declarados insolventes (quer fossem pessoas singulares ou coletivas, titulares ou não de empresas) bem como aos patrimónios autónomos, em que se consideravam excluídos do seu âmbito subjetivo de aplicação apenas os sujeitos passivos que estivessem excluídos da declaração de insolvência, foi-se progressivamente instalando a dúvida sobre se o PER seria ou não aplicável às pessoas singulares que não fossem titulares de empresa.
Essas dúvidas foram ultrapassadas com as alterações introduzidas ao CIRE pelo DL n.º 79/2017, que introduziu na ordem jurídica nacional o PEAP e que veio esclarecer que o PER se aplica apenas aos devedores que sejam empresas, estas compreendidas enquanto organização de capital e de trabalho destinadas ao exercício de qualquer atividade económica (art. 5º), independentemente de serem tituladas por pessoa singular, coletiva ou integrarem um património autónomo (art. 2º), que comprovadamente se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda sejam suscetíveis de recuperação (arts. 1º, n.º 2 e 17º-A, n.º 1), que pretendam estabelecer negociações com os respetivos credores, com vista à aprovação de um acordo que permita a sua revitalização, não sendo o PER aplicável aos devedores que não tiverem o estatuto de empresa, aos quais é aplicável o PEAP.
O PEAP constitui, assim, o instrumento processual a que os devedores que não sejam empresas e que se encontrem numa situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente, que pretendam estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir um acordo de pagamento, podem recorrer com vista a evitar incorrerem numa situação de insolvência (art. 222º-A, n.º 1 do CIRE).
O PEAP destina-se, pois, aos devedores que não sejam empresários, quer sejam pessoas singulares ou coletivas sem finalidades lucrativas (como por exemplo, as associações, as fundações, as misericórdias, etc.), que se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente e que pretendam estabelecer negociações com os seus credores com vista à aprovação de um acordo de pagamento que preveja a reestruturação do seu passivo, evitando-se, por esta via, a sua insolvência.
O PEAP traduz-se num mecanismo que é em tudo idêntico ao regime  do PER para os devedores empresários[2]. Aliás, ao criar esse novo processo o legislador pensou o respetivo regime jurídico essencialmente em termos idênticos aos estabelecidos para o PER, decalcando-o praticamente do regime deste, não admirando, por isso, que se afirme que “o PEAP não é, na verdade, outra coisa senão “o PER não empresários”, configurando-se o seu regime como o regime do antigo PER deslocado para outra parte do Código”[3].
A semelhança do PER, também o PEAP é um processo pré insolvencial na medida em que é aplicável a devedores não empresários que já se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente e que não estejam ainda numa situação de insolvência atual, distinguindo-se ambos os processos, porquanto, conforme antedito, o PER é aplicável a devedores empresários enquanto o PEAP é aplicável a devedores não empresários.
Também como o PER, o PEAP é igualmente um processo recuperatório, na medida em que se destina a permitir ao devedor que, não sendo uma empresa, inicie negociações de modo a celebrar um acordo de pagamento com os seus credores, garantindo a sua satisfação, por forma a evitar que se venha a constituir em estado de insolvência.
Acresce que o PEAP é também um processo concursal, na medida em que são chamados ao mesmo todos os credores do devedor interessados em estabelecer negociações com vista a evitar que o devedor entre em insolvência. Por isso, a sentença homologatória do plano de pagamento que venha a ser aprovado, ainda que por maioria dos credores, vincula todos os credores quanto aos créditos de que sejam titulares perante o devedor, à data da prolação do despacho de nomeação do administrador judicial provisório, incluindo os que não tenham reclamado os seus créditos ou que não tenham participado nas negociações, ou que, tendo-o feito, votaram contra a aprovação da proposta de plano de pagamento que acabou por ser aprovada pela maioria dos credores e homologada (arts. 17º-F, n.º 10 e 222º-F, n.º 8).
PER e PEAP têm natureza híbrida, uma vez que ambos os processos são compostos por uma forte componente extrajudicial (a fase das negociações, em que não intervém o juiz, mas sim o devedor e os seus credores, sob a alçada, orientação e fiscalização do administrador judicial provisório), embora temperada com a intervenção do juiz em momentos chave, indispensável ao caráter concursal do processo em causa[4].   
Apesar do regime jurídico do PEAP ter sido praticamente decalcado do PER e, conforme supra antedito, se poder afirmar grosso modo que o PEAP é o “PER não empresários”, enfatize-se que, conforme salientam Ana Alves Leal e Cláudia Trindade, o elemento distintivo essencial entre ambos os processos “não é só o facto de o PER se destinar a devedores empresários: é o facto de também pressupor a recuperabilidade destes, diversamente do que sucede no regime do PEAP”[5]. Tanto assim é que, nem nos arts. 1º, n.º 3 e 222º-A, n.º 1, nem em qualquer disposição legal respeitante ao PEAP, se prevê a aprovação de qualquer plano de recuperação do devedor, mas apenas um acordo de pagamento; e, por esse motivo, também não se exige que o devedor obtenha uma certificação de que não se encontra em situação de insolvência atual, ao contrário do que se encontra previsto para o PER[6].
A referida diferença de regimes mostra-se perfeitamente compreensível quando se pondera que, sendo o PER aplicável a devedores que sejam empresas, com o desiderato de evitar que a empresa devedora que a ele recorra acabe por ficar numa situação de insolvência (o que pressupõe necessariamente a  recuperabilidade económica desta), o PEAP é aplicável a devedores não empresários, pelo que o evitar-se que esses devedores não empresários incorram numa situação de insolvência passa por celebrarem um plano de pagamento com os seus credores que lhes permita o pagamento da generalidade (isto é, da grande maioria) das suas obrigações vencidas[7].
Finalmente, tal como o PER, também o PEAP é um processo voluntário, isto é, os devedores empresários e não empresários que se encontrem numa situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente eminente não podem ser forçados a recorrer, respetivamente, a PER e a PEAP. Daí que, por um lado, apenas o devedor disponha de legitimidade ativa para instaurar os processos em causa (cfr. n.º 1 do art. 17º e n.º 1, do art. 222º-C); e, por outro, lhe assista o direito de pôr termo às negociações a todo o tempo, independentemente de qualquer causa, sujeitando-se, contudo, a poder ser requerida a sua insolvência caso o administrador judicial provisório emita parecer no sentido de que já se encontra em estado de insolvência (n.ºs 6, 3 e 4, do art. 222º-G). Acresce que também os credores do devedor que, convidados para encetarem negociações tendo em vista concluírem um acordo de pagamento (no caso de PEAP) ou um plano de recuperação (no caso de PER), não sejam obrigados a encetar negociações ou a aprovar, respetivamente, a proposta de acordo de pagamento ou de plano de recuperação apresentada pelo devedor.
O PEAP inicia-se por um requerimento apresentado pelo devedor no tribunal que seria competente para o processo de insolvência (arts. 7º e 222º-C, n.º 3).
Nesse requerimento, por declaração escrita e assinada pelo devedor e, pelo menos, por um credor, declaram ser sua vontade encetarem negociações conducentes à elaboração de um acordo de pagamento (art. 222º-C, n.ºs 1 e 2).
O requerimento tem de ser acompanhado de declaração assinada pelo requerente em como preenche os requisitos necessários para a abertura do PEAP (n.º 2 do art. 222º-A e al. a), do n.º 3 do art. 222º-C), ou seja: contrariamente ao que acontece no PER (em que o requerimento inicial tem de ser acompanhado de declaração subscrita, há não mais de 30 dias, por contabilista certificado ou por revisor oficial de contas, sempre que a revisão de contas seja legalmente exigida, atestando em como o devedor/requerente não se encontra em situação de insolvência atual, à luz dos critérios previstos no art. 3º - cfr. art. 17º-A, n.º 2), no PEAP a lei não exige qualquer certificação externa em como o requerente não se encontra já numa situação de insolvência atual, bastando-se com uma espécie de “autoatestado” do próprio requerente do PEAP.
Acresce que, contrariamente ao que acontece no PER, em que o requerimento tem de ser acompanhado de uma proposta de plano de recuperação acompanhada, pelo menos, da descrição da situação patrimonial, financeira e reditícia da empresa requerente (art. 17º-C, n.º 3, al. c)), no PEAP o requerimento de abertura do processo não tem de ser acompanhado de uma proposta de plano de pagamento.
O requerimento para abertura do PEAP (para além de ter de ser instruído com declaração assinada pelo requerente em como preenche os requisitos para a abertura desse processo e, bem assim, de requerimento escrito e assinado pelo requerente e por, pelo menos, um dos seus credores, declarando pretenderem encetar negociações conducentes à elaboração de acordo de pagamento) tem ainda de ser instruído com uma lista de todas as ações de cobrança de dívida que se encontrem pendentes contra o devedor, de comprovativo de declaração de rendimento do devedor e da sua situação profissional ou, se aplicável, da sua situação de desemprego, bem como de cópias dos documentos identificados nas als. a), d) e e) do n.º 1 do art. 24º (al. b), do n.º 3 do art. 222º-C).
Os requisitos da apresentação a PEAP são assim: “o requerimento de abertura do processo (art. 222º-C, n.º 3, proémio), uma declaração escrita e assinada pelo devedor atestando que cumpre os pressupostos do processo (cfr. art. 22º-A, n.º 3), uma declaração escrita em que o devedor e pelo menos um dos seus credores manifestam a vontade de encetarem negociações conducentes à elaboração de acordo de pagamentos, assinado por todos os declarantes e contendo a data da assinatura (cfr. art. 222º-C, n.ºs 1, 2, e 3, al. a)), uma lista de todas as ações de cobrança de dívida pendentes contra o devedor, um comprovativo da sua situação profissional ou, se aplicável, situação de desemprego e, por último, uma cópia de cada um dos documentos elencados nas als. a), d) e e) do n.º 1, do art. 24º (cfr. art. 222º-C, n.º 3, al. b))”[8].
O processo é concluso ao juiz, que, apesar da sua natureza urgentíssima não está desonerado de efetuar um controlo perfunctório sobre se os requisitos formais de abertura de PEAP estão preenchidos (v.g. não foi junta a declaração do devedor e de, pelo menos, um dos seus credores manifestando ser sua vontade encetarem negociações conducentes à elaboração de acordo de pagamento, ou não foram juntos ao processo os documentos previsto na al. b), do n.º 3, do art. 222º-C) e, bem assim, sobre se estão (ou não) preenchidos os requisitos substantivos de recurso a esse processo, ou se ocorrem factos impeditivos do requerente recorrer àquele. Impondo-se que o julgador convide o requerente a suprir as exceções e as omissões formais que sejam sanáveis e que indefira liminarmente o requerimento inicial quando conclua pela manifesta inviabilidade da ação, posto que não é concebível que o juiz (que tem de proferir o despacho nomeando ao requerente administrador judicial provisório para que o processo prossiga os seus legais termos) tivesse de proferir despacho de prosseguimento do PEAP, pondo em movimento a máquina judiciária, quando seja ostensivo não estarem reunidos os pressupostos do recurso ao PEAP[9].
Neste sentido expende Catarina Serra que sempre que ocorrem de forma ostensiva factos impeditivos do direito de usar ou recorrer ao PEAP, ou quando “existe desrespeito manifesto do pressuposto de abertura” desse processo (a pré-insolvência), impõe-se a rejeição liminar do requerimento inicial, porquanto “nunca o valor (formal) da celeridade poderá prevalecer sobre os valores substanciais do processo e prejudicar a observância dos princípios e das regras que os consagram”, adiantando que “não se compreenderia que, com a “conivência” do juiz, um processo pré-insolvencial fosse utilizado em casos  em que, manifestamente” o requerente “não está pré-insolvente (não está ainda pré-insolvente ou, pior, já está insolvente)”. Depois, “a ausência de um prazo legal definido representa, de certa forma, a transferência para o juiz do poder/dever de decidir a duração das diligências dependendo das necessidades concretas. O tempo a dedicar à atividade jurisdicional deve ser aquela que o juiz considere, em cada caso, razoável e adequado, ou seja, aquele que, pese embora a exigência de celeridade, seja o necessário à realização dos fins do processo (“de imediato” como sinónimo de “tão imediatamente quanto possível”). O juiz não terá, com certeza, no PER” (e no PEAP), a possibilidade de empreender uma atividade exaustiva ou sistemática de apreciação dos respetivos pressupostos. Mas também não é isso que se pretende, sob pena de desequilíbrio na direção oposta, ou seja, de uma absoluta desconsideração da celeridade e de outros vetores formais do processo. O dever do juiz é, tão-somente, o de “honrar” a existência de pressupostos,  esforçando-se por verificá-los, especialmente quando vêm ao seu conhecimento factos que indicam que eles não se verificam, e de se recusar a pôr em movimento a máquina judiciária sempre que conclua, sem margem para dúvidas, pela sua falta” (sublinhado nosso)[10].   
E no sentido de que o juiz deve indeferir liminarmente o requerimento inicial com que o devedor instaura o PEAP quando da sua alegação ou dos documentos e declarações obrigatórias resultar, de forma clara e manifesta, a situação de insolvência atual do requerente, se tem pronunciado a jurisprudência nacional[11].
Posto isto, conforme antedito, nos termos do art. 222º-A, n.º 1 são requisitos substantivos de recurso ao PEAP que o requerente se encontre numa situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente.
A noção de “situação económica difícil” consta do art. 222º-B, em que se dispõe que: “Para efeitos do presente processo, encontra-se em situação económica difícil o devedor que enfrentar dificuldade séria para cumprir pontualmente as suas obrigações, designadamente por ter falta de liquidez ou por não conseguir obter crédito”.
Por sua vez, embora o CIRE não defina o que se entende por “insolvência iminente”, do conceito de insolvência constante do art. 3º, n.º 1 – “É considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas”-, dir-se-á que é iminente a insolvência em que o devedor ainda não atingiu um estado de insolvência atual por não se encontrar impossibilidade de cumprir com a maior parte, ou seja, a maioria das suas obrigações vencidas, por essa situação de impossibilidade caracterizar já o estado de insolvência atual.
Logo, encontra-se em situação de insolvência iminente o devedor que, por falta de liquidez, ainda não se encontra numa situação impeditiva de cumprir com a generalidade (isto é, a maioria ou a maior parte) das suas obrigações vencidas, embora, de acordo com um juízo de prognose objetivo, se anteveja, com elevado grau de probabilidade, que se nada for feito, atento o normal fluir das coisas, face à situação concreta em que se encontra, este irá atingir esse estado de insolvência atual, ficando impossibilitado de cumprir com a maior parte das suas obrigações vencidas por falta de liquidez.
Dito por outras palavras, “a iminência da insolvência caracteriza-se pela ocorrência de circunstâncias que, não tendo ainda conduzido ao incumprimento em condições de poder considerar-se a situação de insolvência já atual, com toda a probabilidade a vão determinar a curto prazo, exatamente pela insuficiência do ativo líquido e disponível para satisfazer o passivo exigível. Haverá, pois, que levar em conta a expectativa do homem médio face à evolução normal da situação do devedor, de acordo com os factos conhecidos e na eventualidade de nada acontecer de incomum que altere o curso dos acontecimentos”[12] (destacado nosso).
Ou, conforme observa Alexandre Soveral Martins, o estado do devedor de insolvência iminente pressupõe uma “ameaça” daquele ficar insolvente. “Mas não basta um medo ou pavor por parte do devedor. É preciso que se trata de uma probabilidade objetiva. Daí que seja necessário efetuar um juízo de prognose, que pode ser auxiliado pela elaboração de um estudo sobre a liquidez do devedor. Será preciso averiguar qual a probabilidade de o devedor não pagar as obrigações vencidas e as obrigações atuais não vencidas quando estas se vencerem. Se for mais provável que isso venha a acontecer do que a hipótese contrária, há insolvência iminente. Isto, evidentemente, se a insolvência de que se trata é a prevista no art. 3º, n.º 1: está iminente a impossibilidade de cumprimento das obrigações vencidas”[13].
Na mesmo linha do que se vem expendendo Pestana de Vasconcelos refere que “o núcleo da distinção” entre a situação económica difícil e a situação de insolvência iminente passa pelo seguinte: respetivamente, “num caso o devedor terá dificuldade séria para cumprir, não sendo, ainda assim previsível, que venha a incumprir, enquanto no outro, pelo contrário, é já previsível que se venha a verificar esse incumprimento”[14].
Assentes nas premissas que se acabam de enunciar, compulsada a petição inicial, a situação que nela vem descrita, tal como foi ponderado pela 1ª Instância, não é de “situação económica difícil”, nem de “insolvência iminente”, mas antes uma situação de insolvência atual da apelante.
Com efeito, na petição inicial é a própria apelante que alega que, “em virtude da crise económica que atravessa quer a economia internacional, quer a nacional, a requerente viu os rendimentos do agregado familiar sofrerem um duro golpe e, consequentemente, não conseguiram (ela e o marido) cumprir atempadamente as suas obrigações”, confessando, pois, que está sem liquidez que lhe permita cumprir com as suas obrigações já vencidas.
Acresce que a apelante alega que, apesar dela e o marido terem contraído “algumas dívidas para fazer face aos seus compromissos”, “o recurso ao mútuo junto de familiares não obteve o efeito pretendido pela requerente, a sua solvabilidade”, confessando, por isso, que não dispõe de solvabilidade, ou seja, de liquidez que lhe permita não só liquidar as obrigações que já se venceram, como aquelas que se venham a vencer proximamente.
Reiterando nessa confissão, a apelante alega que “não consegue obter crédito junto da banca” e que o banco credor daquela, inclusivamente, já “intentou processo de insolvência da qual a mesma se opôs”.
Ou seja, não só a apelante confessa não ter conseguido cumprir com as suas obrigações vencidas, por falta de liquidez, como confessa já não conseguir obter crédito junto da banca ou de familiares, não conseguindo, pois, “cumprir pontualmente as suas obrigações, quer por falta de liquidez, quer por não conseguir obter crédito”, quer as que já se venceram, em relação às quais está em incumprimento (mora), como as que se venham ainda a vencer.
Ademais, no anexo I – Relação de credores -, que a apelante juntou em anexo à petição inicial, verifica-se que esta confessa dever: à Autoridade Tributária o montante de 668,68 euros, que se venceu em 04/10/2023; a CC o montante de 57.500,00 euros, que se venceu em 04/05/2023; e ao Banco 1..., S.A. o montante de 76.340,23 euros, que se venceu em 04/10/2023. A magnitude e o longo período de tempo em que já perdura o incumprimento só por si são evidenciadoras de um estado de impotência daquela de poder cumprir com a generalidade dos seus compromissos vencidos, ou seja, os que já se venceram e os que se vierem a vencer futuramente, isto é, que se encontra num estado de insolvência atual, tal como definido no art. 3º, n.º 1 do CIRE.

Insiste a apelante que apesar da confessada situação de falta de liquidez em que se encontra (impeditiva de poder liquidar os consideráveis compromissos já vencidos, bem como os que se vierem a vencer futuramente) não se encontra numa situação de insolvência atual, mas tão-só de “situação económica difícil”, porquanto, liquidado/vendido “o património que detém” obterá meios financeiros suficientes que permitirão “ultrapassar as graves dificuldades que atravessa atualmente”. Mas sem razão, confundindo indiscutivelmente a apelante ativo líquido e disponível para satisfazer o passivo exigível (ou seja, já vencido) - que é o que releva para a caraterização da situação de insolvência atual - com património imobiliário ou mobiliário, que poderá ser superior ao seu passivo mas que, porque não equivale a liquidez (posto que é necessário que seja vendido para que se obtenha liquidez para satisfazer a generalidade das obrigações já vencidas ), naturalmente não impede que se encontre em situação de insolvência atual.
Neste sentido expende a Relação de Lisboa que: “a situação de insolvência corresponde a uma incapacidade de cumprimento, em que alguém, por carência de meios próprios e por falta de crédito, se encontra impossibilitado de cumprir pontualmente as suas obrigações. Se o devedor por falta de capacidade creditória, estiver impossibilitado de cumprir pontualmente com a generalidade das suas obrigações, incorre na situação de insolvência, mesmo dispondo de um ativo superior ao passivo”[15].

Na mesma linha referem Carvalho Fernandes e João Labareda que: “o conceito básico de insolvência” que é acolhido no art. 3º, n.º 1 traduz-se “na impossibilidade de cumprimento pelo devedor as suas obrigações vencidas”; mas “de há muito que tem sido geral e pacificamente entendido pela doutrina e pela jurisprudência que, para caraterizar a insolvência, a impossibilidade de cumprimento não tem de abranger todas as obrigações assumidas pelo insolvente e vencidas”, posto que, “o que verdadeiramente releva para a insolvência é a insusceptibilidade de satisfazer obrigações que, pelo seu significado no conjunto do passivo do devedor, ou pelas próprias circunstâncias do incumprimento, evidenciam a impotência, para o obrigado, de continuar a satisfazer a generalidade dos seus compromissos. Com efeito, pode até suceder que a não satisfação de um pequeno número de obrigações ou até de uma única indicie, só por si, a penúria do devedor, característica da sua insolvência, do mesmo modo que  facto de continuar a honrar um número quantitativamente significativo pode não ser suficiente para fundar saúde financeira bastante”[16].

Catarina Serra é expressa em afirmar que: “a insolvência é definida na lei como a impossibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações vencidas (art. 3º, n.º 1)” e adianta: “a única exigência legal para que se verifique a insolvência é que haja uma ou mais obrigações vencidas. Pode, portanto, tal impossibilidade revelar-se quando o devedor está meramente constituído em mora e não havendo incumprimento em sentido próprio (incumprimento definitivo”, advertindo que: “A insolvência no sentido referido (impossibilidade de cumprir) não coincide necessariamente com – e por isso não significa – uma situação patrimonial líquida negativa (superioridade do passivo face ao ativo). Com efeito, pode muito bem verificar-se a primeira sem se verificar a segunda: não obstante ser titular de um património sólido e abundante, o devedor vê-se impossibilitado de cumprir por faltar liquidez. E pode verificar-se a segunda sem se verificar a primeira: não obstante não ter património suficiente para cumprir as obrigações, o devedor mantém a capacidade de cumprir por via do crédito que lhe é disponibilizado. A lei reserva, contudo, para certas entidades, uma disciplina especial. De acordo com a norma do art. 3º, n.º 2, as pessoas jurídicas e os patrimónios autónomos por cujas dívidas nenhuma pessoa singular responde pessoal e ilimitadamente devem também ser considerados insolventes sempre que estejam numa situação de superioridade manifesta do passivo sobre o ativo, avaliados estes segundo as normas contabilísticas aplicáveis”[17].
Logo, a circunstância da apelante eventualmente ser detentora de um património imobiliário que, uma vez vendido, lhe permita granjear liquidez, possibilitando-lhe satisfazer todos os seus compromissos financeiros assumidos perante os seus credores, não releva para efeitos de a considerar (ou não) numa situação de insolvência atual: o que releva é apenas que esta se encontre numa situação de falta de liquidez e de impossibilidade de obter essa liquidez mediante o recurso a crédito que lhe permita satisfazer a generalidade das suas obrigações já vencidas.
Ora, conforme antedito, não só é a própria apelante que confessa não dispor de liquidez que lhe permita cumprir atempadamente com as suas obrigações já vencidas, nem ter acesso ao crédito, de modo que, “por graves dificuldades financeiras, não consegue cumprir pontualmente as suas obrigações, quer por falta de liquidez, quer por não conseguir crédito”, como o montante considerável das obrigações já vencidas que se encontram refletivas no anexo I junto com a petição inicial, e o período significativo em que perdura o incumprimento dessas obrigações, é revelador do estado de penúria generalizada em que se encontra: por falta de liquidez, encontra-se impossibilitada de cumprir com a generalidade das suas obrigações já vencidas, bem como com os compromissos financeiros que assumiu e se venham a vencer futuramente à medida que estes se forem vencendo, o que é típico da situação de insolvência atual em que se encontra.
Ora, o “PEAP não é meio idóneo para ultrapassar uma situação económica em que o devedor já atingiu um estádio de impossibilidade de cumprimento de obrigações vencidas, pelo que, não é possível ficcionar uma solvabilidade do requerente em face dos rendimentos e património que lhe são atribuídos”[18].
Decorre do excurso antecedente que, ao rejeitar liminarmente a petição inicial, por manifesta inviabilidade da pretensão formulada pela apelante, dado encontrar-se já num estado de insolvência atual, a 1ª Instância não incorreu em nenhum dos erros de direito que são assacados pela apelante à decisão recorrida, impondo-se julgar improcedente a presente apelação e, em consequência, confirmar essa decisão.
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Sumário (elaborado pelo relator – art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil).
1- O processo especial para acordo de pagamento (PEAP) é um processo pré-insolvencial de que o devedor, que não sendo uma empresa, se pode socorrer quando se encontre numa situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, com vista a encetar negociações com os seus credores tendentes a celebrar um acordo de pagamento que preveja a reestruturação do seu passivo, de modo a obviar que caia numa situação de insolvência.
2- Daí que são pressupostos subjetivos para o recurso ao PEAP que o requerente não seja uma empresa para efeitos do art. 5º do CIRE, e são pressupostos substantivos do processo em causa que o devedor se encontre comprovadamente numa situação económica difícil ou numa situação de insolvência meramente iminente.
3- Encontra-se numa situação de insolvência iminente o devedor que, por falta de liquidez, ainda não se encontra numa situação impeditiva de cumprir com a generalidade (a maioria, ou seja, a maior parte) das suas obrigações vencidas, embora, de acordo com um juízo de prognose objetivo, atento o normal fluir das coisas, face à situação concreta em que se encontra, seja previsível que, se nada for feito, aquele ficará impossibilitado de cumprir com a generalidade dos seus compromissos financeiros à medida que estes se forem vencendo, caindo numa situação de insolvência.
4- A distinção entre situação económica difícil e insolvência iminente passa pelo seguinte critério: se o devedor tem sérias dificuldades, por falta de liquidez, para cumprir os seus compromissos financeiros à medida que estes se foram vencendo, mas não é previsível que os venha a incumprir, encontra-se numa “situação económica difícil”; se o juízo de prognose for o contrário, ou seja, se já for objetivamente previsível que o devedor não irá cumprir com aqueles compromissos financeiros à medida que estes se forem vencendo, o mesmo encontra-se numa situação de “insolvência iminente”.
5- O juiz deverá indeferir liminarmente a petição inicial, por manifesta improcedência da pretensão do requerente de PEAP, quando da alegação ali vertida ou dos documentos e declarações a ela anexas resultar, de forma objetiva, clara e manifesta, que já se encontra numa situação de insolvência atual.
6- Alegando a requerente de PEAP que, em virtude da crise económica, ela e o marido não conseguiram cumprir atempadamente as suas obrigações; que apesar de terem contraído dívidas junto de familiares para fazerem face aos seus compromissos, não obtiveram o efeito pretendido, que era a sua solvabilidade; que não consegue obter crédito junto da banca e que, inclusivamente, um banco credor já lhe moveu ação de insolvência, onde ainda não foi proferida sentença; que não consegue cumprir pontualmente as suas obrigações, quer por falta de liquidez, quer por não conseguir crédito; e resultando da relação de credores junta em anexo a esse articulado inicial que a requerente é devedora de um crédito de 668,68 euros, vencido em 04/10/2023, de um outro, no montante de 57.500,00 euros, vencido em 04/05/2023, e de um terceiro, no montante de 76.340,23 euros, vencido em 04/10/2023, impõe-se concluir, em termos objetivos, claros e manifestos, que a requerente se encontra já numa situação de insolvência atual e, em consequência, indeferir liminarmente a petição inicial com que se apresenta a PEAP, por manifesta falta de viabilidade da sua pretensão. 
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V- Decisão:
 
Nesta conformidade, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar a presente apelação improcedente e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
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Custas da apelação pela apelante (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.
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Guimarães, 01 de fevereiro de 2024

José Alberto Moreira Dias – Relator
Maria João Marques Pinto de Matos – 1ª Adjunta
Fernando Manuel Barroso Cabanelas – 2º Adjunto
                                              


[1] Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. II, 2015, Almedina, págs. 395 e 396.
[2] Acs. RG. de 25/10/2018, Proc. 1820/17.2TBCHV.G1; de 23/11/2017, Proc. 206/17.3T8VRL.G1 e de 02/11/2017, Proc. 2699/17.0T8VCT-A, in base de dados da DGSI, onde constam todos os acórdãos a que se venha a fazer referência sem menção em contrário.
[3] Ac. STJ. de 04/07/2019, Proc. 3774/17.6T8AVR.P1.S2.
[4] Maria do Rosário Epifânio, “Manuel de Direito da Insolvência”, 7ª ed., Almedina, págs. 413 e 489 a 491; Catarina Serra, Lições de Direito da Insolvência”, abril de 2018, Almedina, págs. 333 a 339.
[5] Ana Alves Leal e Cláudia Trindade, RDS IX (2017), 1, pág. 80. 
[6] Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”, 11ª ed., Almedina, pág. 265; Maria do Rosário Epifânio, ob. cit., pág. 491, em que expende que “(…) diferentemente do PER (art. 17º-A, n.º 1), a lei não exige (pelo menos expressamente) a sua recuperabilidade – aliás, em nenhum preceito do PEAP se faz essa referência”; Catarina Serra, ob. cit., págs. 584 e 585: “Tal como o PER (antigo e atual), o PEAP é um processo pré-insolvencial, logo pressupõe a pré-insolvência (insolvência iminente ou situação económica difícil). Todavia, enquanto no PER (antigo e atual) se exige que a empresa seja recuperável, no PEAP não. A dispensa deste segundo pressuposto no PEAP compreende-se à luz do facto de que os destinatários do PEAP não são empresas e entendida a recuperabilidade em sentido estrito (como suscetibilidade de sobrevivência). Quando muito, sabendo que são destinatários do PEAP certas pessoas jurídicas, poderia discutir-se se a dispensa da recuperabilidade se justifica em todos os casos”.
[7] Ac. RP. de 11/07/2018, Proc. 2408/17.3T8STS.
[8] Catarina Serra, ob. cit., pág.  586.
[9] Neste sentido Nuno Salazar Casanova e David Sequeira Dinis, “PER – O Processo Especial de Revitalização”, Coimbra Editora, 1ª ed., março de 2014, pág. 17, em que ponderam: “Admitamos, não obstante, que em caso de manifesta inviabilidade o juiz rejeite de imediato o PER. Não se poderia conceber que um juiz, a quem cabe dar despacho sobre esta matéria, ficasse impotente perante uma clara ilegalidade”; Maria do Rosário Epifânio, ob. cit., pág. 493, em que obtempera: “Apresentado o requerimento, e realizada a distribuição do processo, o juiz deve de imediato proferir despacho (art. 222º-c, n.º 4). Para nós, e à semelhança do PER, esta imediatez (que lhe confere um caráter “urgentíssimo”) não é impeditiva de um controlo mínimo dos seus pressupostos materiais. Ou seja, o juiz deverá proferir um despacho de indeferimento liminar, com fundamento nos elementos carreados para o processo ou noutros elementos que cheguem ao seu conhecimento: por exemplo, se o devedor foi declarado insolvente em processo de insolvência pendente, ou beneficiou de PEAP nos dois anos anteriores, e se o juiz tomar conhecimento de tal facto no momento da prolação do despacho liminar, deve proferir despacho de indeferimento liminar”; Marco Carvalho Gonçalves, “Processo de Insolvência e Processos Pré-Insolvenciais”, Almedina, 2023, pág. 744, em que pronunciando-se no mesmo sentido, escreve: “Uma vez apresentado o requerimento de início do processo especial para acordo de pagamento, nos termos do art. 222º-C, n.ºs 1 e 2, o mesmo deve ser remetido ao juiz, para efeitos de proferimento de despacho liminar. Nessa eventualidade, o juiz pode indeferir liminarmente a petição inicial quando, nomeadamente, conclua pela verificação de exceções dilatórias insanáveis ou considere que o pedido é manifestamente improcedente”.
[10] Catarina Serra, ob. cit., pág. 384, em que a propósito do PER expende ainda serem factos indiciadores de que se não verificam os pressupostos de recurso ao processo em causa, “a empresa ter-se apresentado à insolvência imediatamente antes do PER ou confessado a sua insolvência atual ou a sua recuperabilidade no requerimento inicial”
[11] Acs. RG., de 06/02/2020, Proc. 348/19.0T8VNL.G1 (relatado pela aqui 1ª Adjunta); de 20/02/2014, Proc. 3617/13.0TBBRG.G1; RP., de 15/11/2018, Proc. 118/18.3STS.P1; RC., de 13/06/2023, Proc. 1365/23.1T8CBR.C1; de 01/12/2019, Proc. 5494/19.8T8CBR.C1; de 13/11/2018, Proc. 1535/17.1T8CBR.C2; e de 10/07/2013, Proc. 754/13.4TBLRA.C1.
[12] Carvalho Fernandes e João Labareda, “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado”, 3ª ed., Quid Juris, pág. 87, nota 7; Ac. RG., de 06/02/2020, já antes citado.
[13] Alexandre de Soveral Martins, “Um Curso de Direito da Insolvência”, vol. I, 4ª ed., Almedina, pág. 80.
[14] Pestana de Vasconcelos, “Recuperação de Empresas: o Processo Especial de Revitalização”, Almedina, 2017, págs. 42 e 43.
[15] Ac. R.L., de 30/06/2011, Proc. 524/11.4TJLSB-A.L1-6.
[16] Carvalho Fernandes e João Labareda, ob. cit., pág. 86.
[17] Catarina Serra, ob. cit., págs. 55 a 58.
[18] Ac. R.P., de 15/11/2018, Proc. 118/18.BSTS.P1