Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
525/18.1T8BRG.G1
Relator: ALEXANDRA ROLIM MENDES
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
ADMINISTRAÇÃO PLURAL – PARTES COMUNS DELIMITADAS
CONDÓMINOS
DESPESAS DE MANUTENÇÃO E LIMPEZA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/19/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário:

1 - É admissível a existência de uma administração plural da propriedade horizontal, desde que se trate de partes comuns devidamente delimitadas, com funcionalidades próprias, nomeadamente quando nessa propriedade coexistem edifícios ou estruturas independentes e desde que essa gestão plural não incida sobre assuntos do interesse da totalidade dos condóminos mas apenas sobre as partes comuns específicas de cada grupo de frações.

2 – Mesmo que um condómino, por si ou por meio dos seus representantes, funcionários ou clientes não utilize determinadas instalações existentes nas partes comuns do condomínio, como por ex. os elevadores e o parque de estacionamento, é o mesmo responsável pelo pagamento das respetivas despesas de manutenção e limpeza desde que exista possibilidade de poder beneficiar de tal utilização.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

Relatório:

X – Investimentos Imobiliários Lda., sociedade comercial por quotas e sede na Avenida …, freguesia de ..., concelho de Braga, intentou a presente ação declarativa comum contra o Condomínio do Centro Comercial Y, Braga, contribuinte nº ..., com sede na Avenida …, freguesia de ..., concelho de Braga, W II Lda., contribuinte nº ..., com sede na Avenida da …, concelho de Braga, M. J., residente na Rua …, concelho de Braga, A. G., residente na Avenida …, concelho de Braga, B. B., residente no Lugar …, freguesia de …, concelho de Arcos de Valdevez, A. M., residente no Lugar …, freguesia de …, concelho de Amares, J. R., residente no Largo …, concelho de Braga, e A. J., casado, residente na Avenida da …, concelho de Braga, tendo pedido que:

a) a ata nº 48, de 02 de Dezembro de 2017, fosse declarada nula;
b) fossem declaradas nulas todas as deliberações aprovadas na ata nº 48, de 02 de Dezembro de 2017, por violação de normas imperativas legais, ou, subsidiariamente, fosse declaradas nulas as deliberações constantes dos pontos 3 e 5 da referida ata, por violação de normas imperativas legais;

Subsidiariamente, que

c) a ata nº 48 de 02 de Dezembro de 2017 fosse anulada,
d) fossem declaradas anuladas todas as deliberações aprovadas na ata nº 48, de 02 de Dezembro de 2017, por violação de normas imperativas legais, ou, subsidiariamente, fossem declaradas anuladas as deliberações constantes dos pontos 3 e 5 da referida ata, por violação de normas imperativas legais.

Para tanto, e em síntese, alegou que foram ilegítima e ilegalmente constituídos dois condomínios por referência ao condomínio réu, que foram convocando, separadamente, assembleias de condomínio, aprovando isolada e separadamente deliberações respeitantes às partes comuns, como sucedeu com a deliberação em causa nos autos, cuja respetiva assembleia foi convocada de forma irregular e por quem não tinha legitimidade para tal, não tendo ainda sido observado o quórum para a sua realização, sendo ademais que não foi eleito presidente e secretário para a referida assembleia, nem a ata foi subscrita pelos condóminos presentes.
Mais alegou que não consta da referida ata a fórmula de apuramento do valor das quotas a pagar pelos condóminos, sendo que, às frações de que é titular, não podem ser imputadas as despesas melhor elencadas no art. 93.º da petição inicial, porque delas não podem usufruir.
Por fim, alegou que as obras que a autora veio a realizar por referência à fração “..” foram consentidas pela assembleia de condomínio, sendo que, de resto, sempre foram usadas pela autora sem a oposição de ninguém, pelo que adquiriu o espaço em que vieram a ter lugar por usucapião, não podendo a assembleia de condóminos pôr em causa tal direito, tudo determinando a nulidade/anulabilidade da ata n.º 48 e das deliberações ali tomadas.
*
Tendo sido citados, os réus, com exceção do réu A. J., vieram apresentar contestação onde invocaram a ilegitimidade do primeiro e segunda ré e impugnaram a factualidade alegada pela autora, tendo, em suma, referido que sempre a administração do réu condomínio foi bipartida, o que foi ditado pelas distintas exigências e necessidades de administração de um prédio composto por zona habitacional e comercial, sendo que, de qualquer forma, sempre a administração dos diferentes espaços foi articulada e decorreu com o conhecimento da autora, pelo que, em face de tal, entende ser abusivo o direito que a autora se propõe exercer a tal respeito.
Mais alegaram que a lista de presenças da assembleia se mostra devidamente assinada pelos respetivos condóminos e foi devidamente presidida/secretariada.
Por fim, alegaram que as frações da autora, estando integradas no Centro Comercial Y, podem beneficiar dos serviços de interesse comum ali disponibilizados, pelo que carece de fundamento a pretensão da autora de não os custear, sendo ainda que as obras levadas a cabo pela autora em ocupação do terraço de cobertura não foram em momento algum autorizadas.
Prosseguiram os autos com a realização da audiência prévia, no decurso da qual se proferiu o despacho saneador onde se conheceu da arguida exceção de ilegitimidade, que foi julgada procedente, tendo o réu condomínio do Centro Comercial Y e a ré W II, Lda., sido absolvidos da instância.
Foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a ação e, em consequência, anulou a deliberação relativa ao ponto 5 da ordem de trabalhos da assembleia realizada no dia 2/12/2017, a que corresponde a ata n.º 48 da assembleia de condóminos do Centro Comercial Y, absolvendo os réus de tudo o demais peticionado.
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Inconformada veio a A. interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:

I - A Recorrente não pode concordar com a douta sentença recorrida por entender que nela se fez uma incorreta apreciação da prova e uma incorreta aplicação do direito.
II - Salvo o devido respeito, não se pode equiparar para efeitos de pagamentos de despesas de condomínio aquilo que não é equiparável: Uma loja virada para a Rua (in casu Av. ... em Braga) cujas portas dão acesso direto à Rua, não tendo qualquer porta ou acesso direto ao interior do Centro Comercial, não pode pagar as mesmas despesas de condomínio que tem que pagar as lojas que se situam no interior do Centro Comercial.
III - Não é justo, moral, equitativo, que uma loja situada no exterior do Centro Comercial pague as mesmas despesas de condomínio que pagam as lojas que se situam no interior do mesmo, nomeadamente de limpeza uma vez que os clientes das lojas da Recorrente porque acedem às mesmas diretamente pela Rua não sujam o interior do Centro Comercial, vigilância uma vez que a vigilância apenas é feita no interior do Centro Comercial, eletricidade uma vez que como as lojas se encontram no exterior não precisam nem possuem luz do condomínio para as iluminar e elevadores uma vez que como tais lojas se situam no exterior do centro comercial os clientes da Recorrente não utilizam nem precisam de utilizar os elevadores.
IV - Esta situação de se pretender que as lojas da Recorrente, que se encontram no exterior do Centro Comercial, paguem exatamente as mesmas despesas das lojas que se encontram no interior do mesmo é profundamente injusta e imoral, pelo que a Recorrente tem a firme esperança que V. Exas no alto da V/ sapiência e muito maior experiência, reponham a Justiça.
V - Atenta as regras da experiência comum e a prova carreada para os autos, nomeadamente, o depoimento isento e credível das testemunhas A. P. (declarações gravadas através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, no dia 29-01-2019, entre as 15:16:43 e as 16:30:40, por referência à ata de discussão e julgamento do dia 29 de Janeiro de 2019 e José (declarações gravadas através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, no dia 29-01-2019, entre as 16:32:15 e as 17:02:17, por referencia à ata de discussão e julgamento do dia 29 de Janeiro de 2019), os prova documental junta aos autos (os 29 documentos juntos á petição inicial e a acta nº 1 A junta com o requerimento de 06 de Julho de 2018), os Venerandos Desembargadores irão concluir pelo total desacerto do julgamento da matéria de facto feita pelo Tribunal a quo, o qual deveria ter julgado de forma diferente os factos constantes das alíneas S), U), V), HH) e II) da matéria de facto dada erradamente como provada, e ainda os factos constantes dos números 1, 2, 3, 4 e 5 da matéria de facto dada erradamente como não provada.
V I- Quanto aos factos melhor constantes da alínea S) dos factos dados como provados, atenta a prova produzida, o Tribunal a quo relativamente a este facto deveria ter dado como provado que: A rubrica das despesas com vigilância está associada à prestação do serviço de vigilância prestado dentro do centro comercial.
VII - O Tribunal a quo, salvo melhor opinião, pecou por defeito ao não ter dado como provado que tais serviços de vigilância apenas e só são prestados dentro do centro comercial, como aliás foi referido pelas testemunhas da Recorrente., dos quais resulta de forma clara que o Sr. Segurança/ Vigilante apenas presta serviços para as lojas localizadas dentro do centro comercial e que após o encerramento do centro comercial há um gradeamento que se fecha e o Sr. Segurança/ Vigilante fica dentro desse gradeamento a vigiar as lojas que existem nessa zona fechada, não sendo esse o caso das lojas da Recorrente que se situam na Rua, fora desse gradeamento.
VIII - Atentas as regras de experiência comum e o depoimento das testemunhas da Recorrente, o Tribunal a quo deveria ter dado o facto constante da alínea U) dos factos dados como provados apenas como parcialmente provado na medida em que deveria ter sido dado como provado apenas que as despesas de publicidade referem-se a um quadro publicitário que não possui qualquer menção às frações “A” e “B” nem a quem as explora e como provado o facto constante do ponto 5) da matéria de facto dada como não provada,
IX - Na medida em que resultou provado, através do depoimento das referidas duas testemunhas que, a Recorrente nunca utilizou o quadro publicitário e que não sabe quais são os termos da sua utilização, sendo o mesmo unicamente utilizado pelas lojas interiores do centro comercial, pelo que, a Recorrente não utilizando o quadro publicitário não deverá comparticipar nas suas despesas, como acontece incorretamente in casu.
X - Atenta a prova produzida nos presentes autos, nomeadamente os depoimentos das testemunhas da Recorrente, o Tribunal a quo deveria ter dado como não provado o facto que, salvo melhor opinião, erroneamente deu como provado na alínea V) dos factos dados como provados: “As frações “A” e “B” usufruem dos acessos aos wcs comuns para público (funcionários, fornecedores e clientes), para cuja utilização têm à sua disposição também os elevadores existentes no prédio, dos acessos ao parque de estacionamento, da limpeza das partes comuns, dos serviços de vigilância, dos pontos de luz incidentes sobre as montras, da iluminação de Natal e outras iniciativas temáticas que, com perspetiva mercantil, se realizam no Centro Comercial, tendo ainda à sua disposição um local próprio para publicidade.” e deveria ter dado como provados os factos constantes do ponto 3 dos factos dados como não provados “Os serviços de limpeza e de vigilância são do ponto 4 dos factos dados como não provados “A rubrica de despesas com manutenção relaciona- se com a manutenção das partes comuns do interior do Centro Comercial Y.”.
XI - Relativamente ao wc existente na cave ficou provado, através do depoimento das testemunhas inquiridas, que o mesmo não é utilizado pela Recorrente, seus clientes e fornecedores na medida em que as lojas da Recorrente possuem casa de banho própria que pode ser utilizada por todos aqueles, caso o pretendam, que em virtude de serem lojas voltadas para a rua, se algum cliente ou fornecedor, o entender, poderia ir a uma casa de banho num dos inúmeros cafés existentes aos lados das lojas, não fazendo sentido deslocar-se a um WC localizado na cave do centro comercial, muito distante das referidas lojas.
XII - Resultou ainda dos referidos depoimentos que ainda que qualquer cliente ou fornecedor das lojas da Recorrente pretendessem, mesmo assim e por absurdo, aceder á casa de banho do centro comercial estaria impedido de o fazer na medida em que a mesma se encontra fechada, sendo necessário pedir as chaves, sendo que ninguém sabe quem as detém.
XIII - Assim sendo, parece-nos evidente que as pessoas que privam e usam as frações da Recorrente, não utilizam as casas de banho do Centro Comercial.
XIV - Da prova carreada nos autos, nomeadamente da prova testemunhal supra transcrita resulta evidentemente que as frações “A” e “B” não utilizam o elevador, na medida em que são lojas de rua e não se incluem dentro do centro comercial, pelo que para aceder-se às mesmas não é necessário qualquer elevador.
XV - Relativamente ao parque de estacionamento, resulta da prova carreada nos autos que nenhuma das pessoas que se deslocam ás lojas da Recorrente utilizam o dito parque de estacionamento pertencente à Camara Municipal.
XVI - Justificar, tal como o Tribunal a quo erradamente o fez, que as lojas que se situam no exterior do centro comercial têm de pagar condomínio devido à existência de um parque de estacionamento, alheio ao condomínio, mas que se pode aceder ao mesmo através das partes comuns do centro comercial, parece-nos de todo irrazoável e injusto.
XVII - Relativamente aos serviços de limpeza que o Tribunal a quo entende que a Recorrente tem que comparticipar resulta da prova carreada nos autos que a parte comum existente em frente às frações “A” e “B” é limpa pelos arrendatários das aludidas frações, precisamente pela P. e que, em tempo algum, o condomínio limpou tal zona.
XVIII - E ainda, resulta que a “entradazinha” que faz esquina com as aludidas frações e que os Recorrentes ardilosamente tentam dizer que limpam por forma a puderem imputar tal despesas às frações “A” e “B”, é a “entradazinha” para os escritórios, pelo que a Recorrente não usufruiu que qualquer limpeza feita pelo “condomínio das lojas”.
XIX - Também é, pelos motivos já aduzidos, completamente irrazoável querer justificar que a Recorrente terá de pagar as limpezas porque algum dos clientes das lojas poderão utilizar o Wc situado na cave.
XX - Quanto aos serviços de vigilância, e atento o referido quanto à alínea S) da matéria de facto dada como provada e que no entender da Recorrente deveria ter sido dado como não provado, ficou claro do depoimento das testemunhas da Recorrente que o Sr. Segurança/ Vigilante apenas presta serviços para as lojas situadas dentro do centro comercial, as quais à noite se encontram fechadas pelo gradeamento, o que não é o caso das lojas da Recorrente.
XXI - Quanto à luz das montras: Resulta da prova testemunhal carreada nos autos que apenas existem 4 focos do condomínio direcionados para as lojas da Recorrente e que visam iluminar a entrada do Centro Comercial e não iluminar as lojas da Autora, que possuem a iluminação da rua.
XXII - Acresce que, no interior do centro comercial, existe muita iluminação a qual não beneficia de todo as lojas da Recorrente, pelo que é absolutamente injusto que a Recorrente pague eletricidade da qual não usufrui.
XXIII - Relativamente à possibilidade ficou claramente provado que o quadro publicitário é unicamente utilizado pelas lojas do centro comercial, que a Recorrente nunca utilizou o quadro publicitário do centro comercial e que nunca foi a mesma informada dos termos da utilização do quadro publicitário, pelo que não deverá comparticipar nas suas despesas, como acontece incorretamente in casu.
XXIV - Em suma, tentar a todo o custo imputar despesas com Wc’s, elevadores, estacionamento, limpeza de partes comuns, serviço de vigilância, luz de montras e quadro publicitário a quem nada usufruiu excede os limites impostos pela boa-fé e pelos bons costumes, pelo que, imputar tais despesas das partes comuns do interior do Centro Comercial Y à Recorrente, atentos os motivos supra expostos, além de ilegal, consubstancia um manifesto abuso de direito, nos termos e para os efeitos do previsto no artigo 334.º do Código Civil.
XXV - Assim, atenta a análise detalhada do que as frações “A” e “B” usufruem (ou melhor, não usufruem), o Tribunal a quo deveria ter dado como não provados os factos constantes da alínea V) da matéria de facto dada como provada e como provados os factos constantes dos pontos 3 e 4 da matéria de facto dada como não provadas.
XXVI - Quanto ao facto melhor constante da alínea HH) da matéria de facto dada como provada, o mesmo deveria ter sido dado como não provado, atenta a total inexistência prova carreada para os autos que o sustente.
XXVII - Não é pelo facto de em duas atas (ata n.º48 de 2-12-2017 e ata n.º 40 de 05-04-2011 se terem discutido questões de interesse a todas zonas do condomínio, nas quais as administrações que o dividiram ilegalmente se reuniram e entenderam quanto a essas questões, que significará que existe articulação entre ambas as administrações de condomínio, sendo tal situação manifestamente insuficiente para que o Tribunal a quo pudesse tirar essa conclusão, uma vez que tal facto não encontra qualquer outra sustentação probatória nos presentes autos. “ Não é uma andorinha que faz a Primavera.”
XXVIII - Aliás, prova de que não existia articulação entre ambas as administrações, é que após a Recorrente ter denunciado a ilegal gestão do condomínio por duas administrações distintas, o condomínio e a empresa W vieram reconhecer tal ilegalidade e o Condomínio Y passou a ser unicamente administrado pela W II, Lda, tendo o condomínio, ao ser citado dos presentes autos, procurado “sanar” e corrigir as irregularidades e ilegalidades que ferem a Assembleia de 02 de Dezembro de 2017 e consequentemente as deliberações tomadas em sede da mesma, através da Assembleia Geral de Condomínio realizada no dia 25 de Maio de 2018, através da qual foi designado como ponto 1 da ordem de trabalhos o seguinte: “Apreciação e discussão do conteúdo da ata nº48 relativa à Assembleia de Condóminos do Centro Comercial Y realizada a 2 de Dezembro de 2017 com vista á eventual ratificação das suas deliberações, em particular no que respeita aos seguintes pontos: 1- Relatório de Contas relativo a 2017, 2- Nomeação da Administração do Condomínio, 3- Orçamento anual para 2018,4- Prejuízos causados no âmbito da inundação em 21 de Novembro de 2016, com origem no sistema de águas pluviais e 5- ampliação de janelas e ocupação parcial do terraço/cobertura afeto ao uso das frações AA e AB por parte do titular da fração AF”.
XXIX - Só o facto de se verificarem as irregularidades e ilegalidades elencadas pela Recorrente no âmbito da sua petição apresentada nos presentes autos, é que justifica que o Condomínio Y e a sociedade W II, Lda. tivessem a necessidade de 05 meses decorridos após a realização da Assembleia de Condóminos realizada em 02 de Abril de 2018, voltarem a reunir numa tentativa de “sanar e corrigir” as ilegalidades ocorridas e verificadas na referida assembleia, o que não é de todo possível nem legalmente admissível.
XXX - Atento o depoimento da testemunha da Recorrente A. P., único com conhecimento direto dos factos em apreço, o Tribunal a quo deveria ter dado como não provado o facto constante da alínea II) da matéria de facto dada como provada, na medida em que resultou provado de tal depoimento que há cerca de 3, 4 anos atrás a Recorrente não prestava atenção às questões do condomínio.
XXXI - O Tribunal a quo, atenta a prova carreada para os autos deveria ter dado como provado o facto melhor constante do ponto 1 da matéria de facto dada como não provada: “As frações “A” e “B” estão situadas no exterior do Centro Comercial Y.”
XXXII - Tal facto além de ser provado pelo depoimento das testemunhas da Recorrente, trata-se de um facto notório, bastando uma mera análise das fotografias das loja P. juntas pela Recorrente com a petição inicial, a fls. …, para dar como provado tal facto.
XXXIII - Atento o depoimento da Testemunha da Recorrente A. P., o qual se revelou, isento e credível, o Tribunal a quo deveria ter dado como provado o facto constante do ponto 2 da matéria de facto dada como não provada: “As despesas associadas às rubricas de Segurança Social e Seguro de Acidentes de trabalho estão relacionadas com a trabalhadora que presta os serviços de limpeza no interior do centro comercial.”, na medida em que o mesmo foi perentório em afirmar que as despesas associadas pelo menos às rubricas da segurança social respeitam aos serviços prestados pela funcionária de limpeza, inexistindo nos autos qualquer outra prova que corrobore o oposto.
XXXIV - Assim e em face do exposto, dúvidas não restam que era de inteira justiça alterar a matéria de facto em consonância com o ora alegado pela Recorrente e sustentado pela prova produzida nos presentes autos.
XXXV - Relativamente à matéria de direito, o Tribunal a quo aplica incorretamente a lei quanto às seguintes questões: Unicidade do condomínio; Ilegitimidade da W II, Lda., na qualidade de administradora de condomínio, uma vez que a mesma foi eleita em 2008 numa assembleia em que não foi convocada a totalidade dos proprietários das frações que integram o condomínio em causa (convocação de 49 de 76 frações que integram o mesmo) para convocar a assembleia de condomínio realizada a 02-12-2017; Falta de quórum da assembleia de condomínio realizada a 02-12-2017; Falta de subscrição da Ata n.º48 de 02-12-2017; Falta de eleição de presidente e secretário da assembleia; e Errada repartição dos encargos de conservação e fruição quanto às partes comuns.
XXXVI - O prédio denominado Centro Comercial Y sito na Avenida ... nº …, freguesia de ..., concelho de Braga, no qual se incluem as frações autónomas designadas pelas letras “A” e “B”, intitulado “condomínio do Centro Comercial Y”, é composto por 76 frações autónomas e não apenas pelas 49 frações destinadas a lojas.
XXXVII - Após a constituição da propriedade horizontal do respetivo prédio foi legalmente constituído o condomínio do mesmo, ao qual foi atribuído o número de pessoa coletiva e número de contribuinte ....
XXXVIII - Nunca houve qualquer assembleia de condomínio, muito menos ficou provado em sede de audiência de julgamento a sua existência, na qual tivesse sido deliberada a competente e necessária autorização para a existência de duas administrações de condomínio, uma para as lojas e outra para os escritórios.
XXXIX - Como não existiu tal deliberação, muito menos foi provada a sua existência, esta administração de condomínio (administração das lojas) é ilegal, sendo ilegais e nulas todas as convocatórias e assembleias realizadas por este suposto condomínio das lojas.
XL - Não obstante, existir apenas um único condomínio relativo ao prédio em causa, com um único número de contribuinte e pessoa coletiva, alguém decidiu, sem legitimidade e fundamento legal para tal, constituir dois condomínios utilizando esses dois condomínios o mesmo número de contribuinte e número de pessoa coletiva.
XLI - Tal como resulta do depoimento da testemunha A. P., a Recorrente logo que teve conhecimento desta ilegalidade procurou, através dos presentes autos, por cobro à mesma, pelo que não se pode considerar que atuou com abuso de direito quem, após se aperceber de uma ilegalidade, tenta pôr cobro à mesma pela via jurídica e judicial.
XLII - Assim, o Tribunal a quo ao lançar mão da figura do abuso de direito está a fazer uma incorretíssima subsunção dos factos à matéria de direito, competindo portanto aos Venerandos Desembargadores, considerarem nula, por via desta ilegalidade, a ata impugnada nos presentes autos e bem assim as deliberações nela constantes, ou caso assim não se entenda, ser anulada a ata e as respetivas deliberações.
XLIII - Quanto à ilegitimidade da W II, Lda. para convocar a assembleia de condomínio realizada a 02-12-2017, cumpre dizer que a mesma foi apenas eleita numa assembleia convocada para as 49 lojas ignorando as restantes 27 frações destinadas a escritórios que integram o condomínio, pelo que não tendo sido eleita pela totalidade dos condóminos não tem legitimidade para representar o condomínio e bem assim para convocar assembleias, nomeadamente a assembleia em apreço nos autos,
XLIV - Motivo pelo qual, todas as deliberações “supostamente” aprovadas na mesma foram-no em clara violação da lei, pelo que são nulas, nulidade essa que desde já se invoca para os devidos e legais efeitos.
XLV - Quanto à falta de quórum da assembleia de condomínio realizada a 02-12-2017, tendo em conta que apenas foram convocadas 49 das 76 frações que integram o condomínio, torna-se claro e evidente que faltou quórum para a sua realização, pelo que deveria o Tribunal a quo, ter declarado as deliberações tomadas no âmbito da referida assembleia nulas, ou caso assim não se entendesse, anuladas.
XLVI - Quanto à falta de subscrição da Ata n.º48 de 02-12-2017, é notório tal facto, na medida em que a mesma não se encontra assinada pelos condóminos que estiveram nessa assembleia, o que constitui uma anulabilidade, anulabilidade essa que desde já invoca para os devidos e legais efeitos.
XLVII - Quanto à falta de eleição de presidente e secretário da assembleia, é impossível a aludida Ata n.º48 estar assinada pelo Presidente da Assembleia, uma vez que não há qualquer referência à eleição do mesmo na alegada Assembleia, desconhecendo a Recorrente quem elaborou a ata que ora se impugna, não podendo a simples designação ou menção na ata de que determinada pessoa assumiu as funções de Presidente e Secretário da Assembleia ser suficiente para assegurar o exercício das mesmas dado que a nomeação para tais funções se faz por intermédio de eleição, que no caso concreto não ocorreu.
XLVIII - Por tal facto a assembleia de condomínio a que se refere a Ata n.º48, violou o disposto no artigo 1º do Decreto – Lei nº 268/94 de 25 de Outubro, o que o que constitui uma anulabilidade, anulabilidade essa que desde já invoca para os devidos e legais efeitos.
XLIX - Quanto à errada repartição dos encargos de conservação e fruição: Por uma questão de economia processual, remetemos para a leitura do supra referido a propósito da alínea V) da matéria de facto dada erradamente como provada e dos pontos 3 e 4 da matéria de facto dada erradamente como não provada.
L - Resulta do artigo 1424º do Código Civil, (na redação introduzida pelo Decreto Lei 267/94 de 25 de Outubro), inserido no capítulo regulador do regime da propriedade horizontal, sob a epígrafe “Encargos de conservação e fruição” o seguinte: “1. Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações. (…) 3. As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que dela se servem.
4. Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas frações por eles possam ser servidas.”
LI - Tal como já se referiu, as despesas com elevadores, limpeza de partes comuns, serviço de vigilância, luz de montras, eletricidade, e quadro publicitário, não devem ser imputadas á Recorrente, na medida em que as suas lojas, por serem exteriores ao Centro Comercial, com exclusivo acesso pela via pública, não usufruem dos bens e serviços que levam a tais despesas.
LII - No acesso à fração de que é proprietária, a Recorrente não utiliza os elevadores instalados no edifício uma vez que as suas lojas são “lojas de rua” em que o acesso às mesmas se faz exclusivamente pela Rua e não pelo interior do Centro Comercial.
LIII - Quanto à comparticipação da Recorrente no pagamento das despesas com a limpeza das partes comuns refere-se que é de todo injusta tal imputação ou exigência, uma vez que o acesso às lojas da Recorrente se faz exclusivamente pelo exterior, não sendo necessário sequer aceder ao interior do centro comercial, pelo que os seus clientes e fornecedores não o sujam, sendo totalmente injusto exigir-se que a Recorrente pague serviços de limpeza relacionados com o centro comercial quando a mesma, deles não o usufrui.
LIV - Tal como se referiu e provou, as lojas da Recorrente possuem wc próprio, pelo que quer clientes quer fornecedores, se assim o pretenderem podem utiliza-lo e caso não o façam podem aceder aos wcs dos cafés que se localizam ao lado das lojas e se, porventura pretendessem utilizar o wc existente na cave do condomínio, não o poderiam fazer uma vez que o mesmo se encontra fechado, pelo que este argumento utilizado pelo Tribunal a quo para justificar a responsabilidade da Recorrente na comparticipação no pagamento dos serviços de limpeza das partes comuns carece de total fundamento.
LV - Outro argumento invocado pelo Tribunal para justificar a imputação à Recorrente da responsabilidade daquela na comparticipação de tais despesas assentou no facto do Tribunal a quo ter entendido que, dada a existência de uma parque de estacionamento situado nas traseiras do centro comercial e com acesso à rua (Avenida ...) pelo interior do indicado centro faz com que, pretensos clientes da Recorrente possam, ao estacionar as viaturas naquele parte, para aceder às lojas da Recorrente, tenham que circular pelo interior do indicado centro comercial.
LVI - Justificar, tal como o Tribunal a quo erradamente o fez, que as lojas que se situam no exterior do centro comercial têm de pagar condomínio devido à existência de um parque de estacionamento, alheio ao condomínio, mas que se pode aceder ao mesmo através das partes comuns do centro comercial, parece-nos de todo irrazoável e injusto.
LVII - No que concerne aos serviços de vigilância ficou claramente provado que as lojas da Recorrente não beneficiam desses serviços, na medida em que tal vigilância apenas se faz no interior do centro comercial e às lojas que lá se encontram.
LVIII - Quanto à eletricidade, pretender que a Recorrente comparticipe em tal despesa porque existem quatro luzes em frente ao centro comercial que iluminam a sua entrada e que por estarem junto às lojas da Recorrente também as iluminam é salvo melhor opinião desajustado, injusto e ilegal.
LIX- Tais focos têm como único propósito iluminar a entrada do Centro Comercial. Como as lojas da Recorrente se encontram viradas para a Rua e perto desses focos, são iluminadas por eles. Porém as lojas não precisam de tal iluminação pois têm a iluminação da Av. ..., que como é do conhecimento público, é muito boa.
LX- Acresce ainda que, pelos motivos já expostos, os clientes e fornecedores das lojas da Recorrente não utilizam o wc situado na cave nem utilizam o elevador, pelo que, não há motivos para que as lojas exteriores, como são as da Recorrente, comparticipem nas despesas de eletricidade, a qual apenas é usufruída pelas lojas situadas no interior do centro comercial.
LXI - Quanto ao quadro publicitário cumpre esclarecer que o mesmo é unicamente utilizado pelas lojas interiores do centro comercial, nunca tendo sido utilizado pelas lojas da Recorrente nem nunca a Recorrente foi informada dos termos da sua utilização.
LXII - A Recorrente, não utilizando o quadro publicitário, não deverá comparticipar nas suas despesas.
LXIII - Tentar a todo o custo imputar despesas com limpezas, elevadores, serviço de vigilância, eletricidade e quadro publicitário a quem nada usufruiu excede os limites impostos pela boa-fé e pelos bons costumes, pelo que, imputar tais despesas das partes comuns do interior do Centro Comercial Y à Recorrente, atentos os motivos supra expostos, consubstancia um manifesto abuso de direito, nos termos e para os efeitos do previsto no artigo 334.º do Código Civil.
LXIV - Atento o exposto, a deliberação tomada pela assembleia de condóminos – ponto n.º3 da ata n.º48, a qual impõe à Recorrente o pagamento de despesas relacionadas com a manutenção dos elevadores, limpeza, vigilância, eletricidade e quadro publicitário, quando esta não pode usufruir, nem usufrui dos mesmos, dada a sua localização, viola a lei, nomeadamente os artigos 1433º, nº1 e 1424º do C.C, pelo que deve ser declarada nula, ou caso assim não se entenda anulada, fazendo-se assim a inteira justiça!!
LXV - A douta sentença recorrida violou, além do mais, os artigos 334º, 1424º, 1430º, 1431º, 1432º, 1433º e 1438º A do Código Civil, artigos 1º e 6º do Decreto de Lei 268/94 de 25/10 e os artigos 412º, 640º e 662º do Cód. Processo Civil.

NESTES TERMOS, deve o presente recurso merecer provimento, de acordo com as precedentes conclusões, revogando-se a douta sentença do Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo Local Cível de Braga, e em consequência julgar procedentes os pedidos formulados pela Recorrente que foram julgados improcedentes na Sentença Recorrida, como é de elementar justiça!
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Os Réus apresentaram contra alegações, concluindo nos seguintes termos:

1. O Tribunal de 1ª instância fez uma correta, ponderada, serena e criteriosa análise da prova produzida nos presente autos, nomeadamente da prova documental carreada para os autos e da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento.
2. Na definição da matéria de facto dada por assente, o Tribunal a quo valeu-se de todos os elementos capazes de contribuir para a formação de uma ponderada convicção, nomeadamente todos os elementos que resultam da imediação da produção de prova.
3. Dessa análise não resultaram provados os elementos integradores dos direitos que a Recorrente pretendia fazer valer através deste processo ora em crise.
4. A douta sentença recorrida é, por outro lado, igualmente inatacável no que se refere à aplicação da Lei e do Direito, que tão bem sustentou e fundamentou no seu relatório.
5. Nenhum reparo merece, pelo exposto, a douta sentença recorrida.
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Questões a decidir:

- Verificar se a matéria de facto foi bem julgada na 1ª instância;
- Análise da legalidade da existência de pluralidade de administradores do condomínio;
- Análise da legitimidade do convocante da assembleia de condóminos;
- Verificar se existiu falta de quórum para a realização da assembleia;
- Verificar se existe irregularidade na deliberação por falta de subscrição da ata da assembleia pelos condóminos presentes;
- Verificar se existe irregularidade na deliberação por falta de eleição do presidente e secretário da assembleia;
- Verificar se existe indevida imputação de algumas despesas comuns à Autora.
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São os seguintes os factos provados na 1ª instância:

A) A Autora, desde 01 de Dezembro de 2008, é locatária financeira das frações autónomas designadas pelas letras “ A” e “B” do prédio designado por Centro Comercial Y sito na Avenida ..., nº …, freguesia de ..., concelho de Braga correspondente a duas lojas comerciais, sendo uma situada na cave do prédio, designada pela letra nº 1-H, e outra situada no rés-do-chão, designada por estabelecimento nº 1, inscritas na matriz urbana com os artigos … - A e …- B e descritas na Conservatória do Registo Predial de … sob os nºs …-A e …-B.
B) Os Réus M. J., A. G., B. B., A. M., J. R. e A. J. são donos e legítimos proprietários de frações autónomas integrantes do prédio designado por Centro Comercial Y, sito na Avenida ..., nº …, freguesia de ..., concelho de Braga.
C) O prédio denominado Centro Comercial Y é composto por 76 frações, sendo 49 frações respeitantes a lojas comerciais e 27 frações autónomas respeitantes a escritórios e habitação.
D) Após a constituição da propriedade horizontal do respetivo prédio, foi legalmente constituído o condomínio do mesmo, ao qual foi atribuído o número de pessoa coletiva e número de contribuinte ....
E) A Administração do condomínio do Centro Comercial Y referente às lojas comerciais identificadas pelas frações autónomas designadas pelas letras “ A” a “Z”, “AA” a “AC”, “BH” a “BZ” E “CA a CG” é levada a cabo pela sociedade W II, Lda..
F) Por seu turno, a Administração do condomínio do Centro Comercial Y referente restantes frações autónomas destinadas a escritórios e habitações é levada a cabo pelo Dr. J. L..
G) Cada um dos respetivos administradores convoca as suas Assembleias Gerais e Extraordinárias, separadamente, aprovando, isolada e separadamente, deliberações que respeitam às partes comuns do prédio, sem a convocação e presença de todos os condóminos do mesmo.
H) A sociedade W II, Lda., foi, em 30 de Dezembro de 2008, nomeada Administradora do Condomínio do Centro Comercial Y.
I) Para a Assembleia de nomeação de tal administradora apenas foram convocadas as 49 frações respeitantes a lojas comerciais, e, após essa data, a sociedade W II foi sendo reeleita administradora nos mesmos moldes, ou seja, apenas mediante assembleia de condomínio convocada para as 49 frações respeitantes a lojas comerciais.
J) No dia 02 de Dezembro de 2017, teve lugar a realização da Assembleia Geral de Condóminos do Centro Comercial Y, sito na Avenida ..., nº …, freguesia de …, concelho de Braga, da qual foi lavrada a ata n.º 48 com os dizeres que constam de fls. 55 a 58, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
K) A sociedade referida em H), em representação do referido condomínio, convocou e realizou a assembleia de condomínio referida em J), na qual a autora não esteve presente.
L) Os réus estiveram presentes na assembleia referida em J) e votaram favoravelmente as deliberações aí tomadas.
M) A convocatória para a realização da assembleia referida em J) não foi remetida para os proprietários das 76 frações autónomas que integram o prédio do Centro Comercial Y mas apenas para as 49 frações autónomas que representam as lojas comerciais.
N) Na assembleia referida em J) apenas estiveram presentes os condóminos das frações C, E,G, H, I, P, AA,AB,AC, BH, BI, BJ, BL, BM, BN, BO, BP, BQ, BT, BU, BV, BZ, CD, CE,CF e CG.
O) A ata nº 48 referente à Assembleia Geral de Condóminos realizada no dia 02 de Dezembro de 2017 encontra-se assinada pelo Presidente da Mesa, não se encontrando subscrita pelos Condóminos presentes na Assembleia.
P) A lista de presenças a que respeita a ata encontra-se já assinada por todos os presentes.
Q) As frações autónomas designadas pelas letras “A” e “B” tratam-se de “lojas de rua” e dispõem das entradas n.ºs 648 e 652 de polícia, tendo sido pela autora fechada a porta correspondente ao n.º 648, que se encontrava virada para o interior do edifício e que sempre aí existiu, razão pela qual as lojas, que fisicamente se encontram unidas, são servidas apenas pelo n.º 652 de polícia, que dá acesso direto para a Avenida ....
R) Quando ocorre o encerramento do Centro Comercial Y, o mesmo é vedado com um gradeamento, sendo que as lojas em causa situam-se já fora desse gradeamento.
S) A rubrica das despesas com vigilância está associada à prestação do serviço de vigilância.
T) Os elevadores existentes no Centro Comercial Y localizam-se no interior do referido centro comercial e apenas permitem o acesso entre os pisos interiores daquele.
U) As despesas de publicidade referem-se a um quadro publicitário que não possui qualquer menção às frações “A” e “B” nem a quem as explora mas que está à disposição da autora.
V) As frações “A” e “B” usufruem dos acessos aos wcs comuns para público (funcionários, fornecedores e clientes), para cuja utilização têm à sua disposição também os elevadores existentes no prédio, dos acessos ao parque de estacionamento, da limpeza das partes comuns, dos serviços de vigilância, dos pontos de luz incidentes sobre as montras, da iluminação de Natal e outras iniciativas temáticas que, com perspetiva mercantil, se realizam no Centro Comercial, tendo ainda à sua disposição um local próprio para publicidade.
W) A Autora é também locatária Financeira da fração autónoma designada pelas letras “AF”.
X) A autora, no início do ano de 2008, realizou obras de ampliação das janelas da fração “AF”, bem como colocou uma estrutura revestida em madeira (deck) no terraço/cobertura, ocupando-o e tendo-o transformado em varanda.
Y) Tais obras foram realizadas de forma pública, à frente de toda a gente, inclusive dos réus, de forma pacífica e sem a oposição de quem quer que fosse.
Z) Essas obras foram realizadas num espaço que não era utilizado por qualquer condómino e embelezaram o espaço, tornando-o muito mais aprazível.
AA) Após a data referida em X), a autora, ininterruptamente, passou a usufruir do alargamento das janelas e da parte do terraço, usando as janelas e usando e ocupando o terraço em causa, à vista de toda a gente e sem ter havido qualquer violência inicial ou ulterior.
BB) Na ata n.º 5 da Assembleia Geral de condomínio realizada em 23 de Julho de 2008 consta o seguinte: “Alterações operadas na fração AF” (…) a administração informou que, em dada altura, há uns meses atrás foi alertada por condóminos acerca das alterações que a fração AF estava a sofrer, quer ao nível da fachada traseira, quer na parte comum do “hall”. Historiou as diligências levadas a cabo junto da G. – locatária da fração e o desfecho do assunto. Foi entendido, unanimemente, que das alterações introduzidas não decorrem prejuízos para o condomínio, mas que, antes de iniciadas as obras, deveria o condomínio ter sido consultado. Foi sugerido que a Administração emita uma Circular, lembrando a obrigação de as obras em partes comuns deverem, previamente, ser submetidas à apreciação do condomínio. (…) a assembleia decidiu suspender os trabalhos até ao dia 25 de Julho de 2008, às 17horas. Retomados os trabalhos no dia 25 de julho de 2008 (…) o representante das frações AO, AS e BG declarou não estar de acordo com as alterações operadas na fração AF (ponto 4 da Ordem de Trabalhos). (…)”.
CC) Após a data de tal assembleia, a autora colocou uma vedação no espaço referido em X) com quase dois metros de altura.
DD) A autora, desde 1/12/2008, sempre agiu como condómina do Centro Comercial Y, pagando quotas, sendo convocada para as respetivas assembleias de condomínio, nelas comparecendo ou fazendo-se representar, votando as respetivas deliberações, sendo que, quando não comparece ou não se faz representar, é notificada pelo Condomínio das respetivas atas, para no prazo legal as poder impugnar, querendo.
EE) E, desde pelo menos 2008, têm vindo a coexistir no edifício duas administrações distintas para as duas zonas do prédio, sendo uma para a zona com lojas comerciais e outra para a zona com habitações, o que sempre foi aceite pela autora.
FF) Do ponto 6 da Ata n.º 48 (de 2/12/2017) consta o seguinte: “a reclamação de €624,65 ao bloco que integra os escritórios e habitações deste condomínio com acesso pelo n.º 642 de polícia, a título das reparações e pintura efetuados no âmbito de uma infiltração de águas pluviais que se manifestava na cave e com origem na caixa norte de descargas de águas pluviais da cobertura do edifício”.
GG) E, da Ata n.º 40 (de 5/4/2011), consta o seguinte: “os condóminos presentes solicitaram à Administração do condomínio que diligencie no sentido de obter a boa cobrança, junto da …, da comparticipação dos trabalhos da ligação do saneamento do edifício à rede de esgotos, nos termos exigidos pela Agere EM e oportunamente comunicados à Administração da zona de escritórios e habitações que integram esta propriedade horizontal”.
HH) Existe articulação entre ambas as administrações de condomínio em questões estruturais do edifício.
II) É do perfeito conhecimento da autora, e consta expressamente na deliberação do terceiro ponto da Ordem de Trabalhos da Assembleia de 29/12/2010 (Ata n.º 39), que “em relação à afetação das diversas rubricas de despesas às diversas frações, os condóminos presentes, por unanimidade, votaram e reiteraram que o fundo Comum de Reserva, o Seguro de Responsabilidade Civil (...) e as Receitas de aluguer de partes comuns continuam a ser afetadas aos proprietários das respetivas frações”.
JJ) No segundo ponto da Ordem de Trabalhos, 17º parágrafo, da Ata da Assembleia de 3/1/2002 (ata n.º 17) consta o seguinte: “relativamente à comparticipação de cada um dos três pisos para o Orçamento anual, foram unânimes os condóminos em aceitar a proposta apresentada pelo presidente da Assembleia que consiste em atribuir à cave (piso – 1) trinta por cento da dotação orçamental, ao rés-do-chão (piso 0) quarenta e um por cento e ao primeiro andar (piso 1) vinte e nove por cento. Quanto à comparticipação de cada fração da cave, esta passará a ser feita de acordo com a permilagem de cada fração. Em relação aos restantes pisos aplicar-se-á o critério já adotado com alguns ajustes por forma a aproximar a contribuição de cada fração à correspondente permilagem”.
KK) Em 2009 foi celebrado um acordo, homologado por sentença, no âmbito do processo 9083/07.1TBBRG, que correu termos pela então Vara de Competência Mista deste Tribunal, entre o Condomínio do Centro Comercial Y (como Autor) e …-Crédito Especializado, … Financeira de Crédito SA e G. – Indústria de Vestuário, Lda. (como Réus) e X- Investimentos Imobiliários, Lda (como Chamado), nos termos do qual o aí Autor, a Ré G. e a aí Chamada (aqui Autora) fixaram a quantia de €21.000 (vinte e um mil euros) em dívida por estas ao Condomínio do Centro Comercial Y, incluindo nesta quantia, para além dos montantes peticionados, todas as prestações de condomínio devidas até 29 de Dezembro de 2009 e respeitantes a todas as frações que a X – Investimentos Imobiliários, Lda (aqui Autora), explora no Centro Comercial.
LL) Mais ficou então consignado no acordo que “os efeitos da presente transação ficam contudo pendentes da deliberação da Assembleia de Condóminos, respeitante ao Centro Comercial Y, que ocorrerá no próximo dia 29 de Dezembro de 2009…”.
MM) Consta da Ata da Assembleia de condóminos de 29 de Dezembro de 2009 (Ata n.º 38), no ponto quinto da Ordem de Trabalhos, o seguinte: “ o presidente da mesa informou que foi efetuada uma transação, sujeita a ratificação por parte da Assembleia de Condóminos, no âmbito da Ação Judicial n.º 9083/07.11TBBRG (que opõe este condomínio ao proprietário da fração B e outros) nos seguintes termos e condições: a) as partes acordam em vinte e um mil euros (€21.000,00) o valor integral a liquidar; b) tal valor será liquidado em sessenta prestações mensais iguais e sucessivas no valor de trezentos e cinquenta euros (€350,00) cada, vencendo-se a primeira no dia 8 de Janeiro de 2010; c) a liquidação fora do prazo de qualquer uma das prestações determina o vencimento imediato de todas as restantes; d) cumulativamente o proprietário das frações A e B compromete-se a liquidar atempada e integralmente todas as quotas de condomínio vincendas que vierem a ser determinadas pela Assembleia Geral de Condóminos convocada para o efeito, bem como a cumprir todas as regras do Condomínio do Centro Comercial Y, em Braga, do qual neste ato reconhece que as frações A e B fazem parte integrante de forma plena; e) as firmas G. – Indústria de Vestuário, Lda número fiscal … e a X – Investimentos Imobiliários, Lda número fiscal … responsabilizam-se, solidariamente, pelo cumprimento integral das condições acordadas; e f) as custas judicias serão suportadas em partes iguais. Mediante o integral cumprimento do presente acordo, a Assembleia Geral de Condóminos do Centro Comercial Y considerará sanados todos os valores relacionados com quotas de condomínio das frações A e B vencidas até 31 de Dezembro de 2009. Posto isto, após um período de apreciação e debate da proposta de acordo apresentada, os condóminos presentes votaram e deliberaram aceitar e ratificar esta transação nos termos atrás explanados…”.
NN) O réu A. M., em Dezembro de 2016, enviou a comunicação escrita que consta de fls. 156, cujo teor aqui se dá por reproduzido, e de onde constam, ademais, os seguintes dizeres: “(…) cumpre-me logicamente denunciar tais infrações e exigir por parte das administrações que este seja notificado no sentido de retirar a referida varanda e repor a fachada no seu original, conforme projeto do prédio, licença de ocupação e título de propriedade horizontal”,
OO) Consta da ata n.º 46, de 3/12/2016, o seguinte “… a pedido do sr A. M. a próxima convocatória deverá incluir na Ordem dos Trabalhos a apreciação e discussão acerca da ampliação das janelas da fração AF e a ocupação parcial, mas não autorizada, de um terraço/cobertura afeto ao uso exclusivo das frações AA e AB por parte do proprietário das frações A, B e AF”.
PP) E consta da Ata n.º 47, de 18/1/2017, o seguinte “(…) após um período de esclarecimentos e tendo em consideração o adiantado da hora, a Assembleia de condóminos decidiu não se pronunciar nem deliberar acerca da ocupação parcial do terraço/cobertura afeto às frações AA e AB nem da ampliação das janelas por parte da fração AF, sendo que ficou acordado que os condóminos das frações envolvidas deverão negociar uma solução para esta questão que, por sua vez, submeterão à apreciação e votação da Assembleia de Condóminos”.
QQ) O terraço onde foram realizadas as obras referidas em X) e CC) é um terraço com função de cobertura.
RR) Foi realizada uma assembleia de condomínio no dia 25/5/2018 onde foram tomadas as deliberações que constam melhor descrita na ata n.º 1A de fls. 163, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
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Factos não provados:

1. As frações “A” e “B” estão situadas no exterior do Centro Comercial Y.
2. As despesas associadas às rubricas de Segurança Social e Seguro de Acidentes de trabalho estão relacionadas com a trabalhadora que presta os serviços de limpeza no interior do centro comercial.
3. Os serviços de limpeza e de vigilância são prestados apenas para o interior do centro Comercial.
4. A rubrica de despesas com manutenção relaciona-se com a manutenção das partes comuns do interior do Centro Comercial Y.
5. O quadro publicitário referido em U) é unicamente utilizado e destinado às lojas que se encontram no interior do Centro Comercial.
6. A Autora praticou os atos referidos em AA) com ânimo de exclusiva possuidora e sem a oposição de quem quer que seja.
7. Desde 1982, coexistem no edifício duas administrações distintas.
8. No início dos anos de 1980, correu termos uma demanda laboral intentada contra a zona comercial do edifício à qual foi totalmente alheia a zona habitacional.
9. É prática corrente que a assinatura da ata pelos condóminos ocorra na Assembleia seguinte, após a sua redação, leitura e aprovação.
10. A deliberação constate de JJ) é do conhecimento da autora.
11. O terraço onde foram realizadas as obras pela autora está afeto às frações AA e AB.
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Nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
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Da impugnação da matéria de facto:

Resulta do disposto no art. 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

Conforme explica Abrantes Geraldes (1), a Relação deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações na matéria provada e não provada. Acrescentando que, em face da redação do art. 662º do C. P. Civil, fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe a sua própria convicção, mediante reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis, apenas cedendo nos fatores da imediação e oralidade.

A Recorrente considera incorretamente julgados os pontos S), U), V), HH) e II) dos factos provados e com os pontos 1, 2, 3, 4, 5 nos não provados.

Vejamos:

S) A rubrica das despesas com vigilância está associada à prestação do serviço de vigilância.
3. Os serviços de limpeza e de vigilância são prestados apenas para o interior do centro Comercial.

Quanto ao ponto S, entende a Recorrente que “peca por defeito”, entendendo que deveria ter sido considerado provado que A rubrica das despesas com vigilância está associada à prestação do serviço de vigilância prestado dentro do centro comercial.”

Considera que o ponto 3 deve ser julgado provado.

Sobre esta matéria, referiu a testemunha A. P., acionista da Autora que “as minhas lojas ficam fora do gradeamento. Não têm qualquer segurança as minhas lojas”, querendo referir-se às lojas da A. Acrescentando que à noite o gradeamento fica fechado e o segurança fica dentro do espaço das lojas. No entanto, mais à frente no seu depoimento, quando lhe foi perguntado se o segurança é noturno ou também é diurno e onde fica o segurança, referiu desconhecer, desconhecendo ainda o que o mesmo faz em termos de patrulha. A testemunha José, contabilista da A. desde 2009, desconhecia se o Centro Comercial possuía segurança.

Assim, a testemunha José, não trouxe qualquer contributo para a prova da matéria em causa e a testemunha A. P., não obstante ter referido que era apenas acionista da Autora, já foi seu administrador e todo o seu depoimento se mostrou parcial, referindo-se amiúdes vezes em nome próprio quando queria referir-se à A., depondo como se fosse parte na ação, pelo que, não tendo havido corroboração dos factos relatados através de outros meios de prova, não podemos considerar provados tais factos.

Por outro lado, do facto de as lojas da A. terem acesso direto à rua, não se retira que o serviço de segurança não as abranja, uma vez que ninguém põe em causa que as mesmas pertencem ao Centro Comercial mencionado nos autos. Na verdade, nada nas atas das assembleias de condóminos ou de qualquer outra prova, resulta que algumas das lojas do Centro Comercial, nomeadamente as da A., tenham sido excluídas do âmbito da Segurança implantada no Centro.

No que respeita aos serviços de limpeza desde já se refere que a testemunha A. P. referiu que uma das lojas da A. “está de esquina”, dando uma das montras para a entrada do Centro Comercial, como aliás se verifica da análise das fotografias constantes dos autos, e que esse espaço da entrada é limpo a mando da administração do Centro Comercial. Por outro lado, a A. também beneficia da limpeza das partes comuns no interior no Centro Comercial, nomeadamente, casas de banho, elevadores e acesso ao parque de estacionamento, como infra se verá.

Não se pode pois considerar provada a matéria que a A. pretende acrescentar ao ponto S, nem o ponto 3 dos factos não provados.

U) As despesas de publicidade referem-se a um quadro publicitário que não possui qualquer menção às frações “A” e “B” nem a quem as explora mas que está à disposição da autora.
5. O quadro publicitário referido em U) é unicamente utilizado e destinado às lojas que se encontram no interior do Centro Comercial.

Entende que do ponto U) deveria constar que: O quadro publicitário referido em U) é unicamente utilizado e destinado às lojas que se encontram no interior do Centro Comercial e que o ponto 5 deveria ter sido considerado provado.

Sobre este ponto disse a testemunha A. P. que as lojas da A. não utilizam o placard de publicidade colocado à entrada do Centro Comercial, tendo referido que o mesmo “é para pôr coisas manuscritas, fotografias, coisas assim.” Nada sabendo sobre o que diz o regulamento do condomínio sobre a sua utilização. A testemunha José referiu a existência do placard com a identificação das lojas do Centro Comercial mas nada sabia sobre as regras da sua utilização.

Deste modo, não pode considerar-se provado que tal placard é unicamente destinado às lojas que se encontram no interior do Centro Comercial, como a Recorrente pretende. O facto de aí se poder colocar “coisas manuscritas” é mais um indicador no sentido de que o seu uso não é restrito às lojas que estão no interior do Centro Comercial, podendo ser utilizado por todos os lojistas.
V) As frações “A” e “B” usufruem dos acessos aos wcs comuns para público (funcionários, fornecedores e clientes), para cuja utilização têm à sua disposição também os elevadores existentes no prédio, dos acessos ao parque de estacionamento, da limpeza das partes comuns, dos serviços de vigilância, dos pontos de luz incidentes sobre as montras, da iluminação de Natal e outras iniciativas temáticas que, com perspetiva mercantil, se realizam no Centro Comercial, tendo ainda à sua disposição um local próprio para publicidade.
4. A rubrica de despesas com manutenção relaciona-se com a manutenção das partes comuns do interior do Centro Comercial Y.
A Autora entende que as frações “A” e “B” não usufruem dos serviços mencionados no ponto V acima transcrito porque estão viradas para o exterior e porque essas mesmas frações possuem casa de banho.
Quanto a este último aspeto, as testemunhas ouvidas não souberam dizer se tais WC´s podem ser utilizados pelo público ou apenas pelos trabalhadores das ditas lojas. Ora, como resulta da experiência comum, embora existam diversas lojas nos centros comerciais que possuem lavabos, tais instalações não podem ser utilizadas pelo público. Assim, as pessoas que frequentam o Centro na qualidade de clientes, terão que utilizar as casas de banho existentes no interior deste e não a que está situada na fração pertencente à Autora.
A questão sobre o local para publicidade já foi acima abordada, pelo que para lá remetemos.

No que concerne aos elevadores, acesso aos parques de estacionamento e limpeza desses locais, o facto de as lojas da A. terem as montras e portas viradas para o exterior do Centro Comercial não invalida que tais lojas são parte integrante do Centro Comercial, como aliás a A. admitiu ao transacionar na ação 9083/07.1TBBRG, em que era pedida a condenação da A. no pagamento de despesas de condomínio referentes as suas frações ora em causa (v. ata da transação). Por outro lado, como admitiu a testemunha A. P., uma das lojas pertencentes à Autora tem uma porta para o interior do Centro Comercial, no entanto, a A. fechou-a quando uniram as duas frações, criando apenas um espaço de loja. Assim, fazendo-se o acesso do parque de estacionamento ao centro Comercial e vice-versa e sendo um dos acessos possíveis a tal parque através dos elevadores existentes neste Centro, tem de se considerar provado que as frações “A” e “B” usufruem desses serviços. O facto de existir na zona um melhor parque de estacionamento (facto que foi apenas referido pela testemunha A. P.) não faz concluir de outra forma, pois o que interessa é que os clientes das lojas do Centro e designadamente de quem utiliza as mencionadas frações ou os funcionários que aí trabalham podem, se quiserem, utilizar tais equipamentos e para isso precisam circular nas partes comuns que existem no interior do Centro Comercial.
O mesmo raciocínio se aplica às campanhas/iluminações que eventualmente ocorram no Centro, pois beneficiam todos os lojistas.
Improcede também neste aspeto, a pretensão da A. de alterar a matéria de facto fixada na 1ª instância.
HH) Existe articulação entre ambas as administrações de condomínio em questões estruturais do edifício.

O teor das atas nº 40 e nº 48, junta a estes autos, demonstra a existência da articulação referida no ponto em causa, pelo que, na falta de prova que tenha infirmado aquela, nada há a alterar a este ponto.
II) É do perfeito conhecimento da autora, e consta expressamente na deliberação do terceiro ponto da Ordem de Trabalhos da Assembleia de 29/12/2010 (Ata n.º 39), que “em relação à afetação das diversas rubricas de despesas às diversas frações, os condóminos presentes, por unanimidade, votaram e reiteraram que o fundo Comum de Reserva, o Seguro de Responsabilidade Civil (...) e as Receitas de aluguer de partes comuns continuam a ser afetadas aos proprietários das respetivas frações”.
A Autora impugna este ponto mas sem qualquer razão pois é ela própria que na p.i. (art. 19º), a propósito da sua legitimidade para a ação, diz que “Sendo que quando não comparece ou não se faz representar [a Autora] é notificada pela 1º Ré [condomínio do Centro Comercial Y] das respetivas atas para no prazo legal as poder impugnar, querendo”.
Ou seja, a A. reconhece que teve conhecimento do teor de todas as deliberações tomadas pela assembleia de condóminos, mesmo quando não esteve presente nas mesmas.

Tem assim, necessariamente que improceder a impugnação deste ponto dos factos provados.

1. As frações “A” e “B” estão situadas no exterior do Centro Comercial Y.
A Autora pretende que se considere provado este ponto, contudo, como acima se explicou, o facto de as frações em causa terem entrada e montras para o exterior, não invalida que as mesmas se integrem no Centro Comercial identificado nos autos.
2. As despesas associadas às rubricas de Segurança Social e Seguro de Acidentes de trabalho estão relacionadas com a trabalhadora que presta os serviços de limpeza no interior do centro comercial.
Sobre este ponto não houve qualquer prova, pelo que, o mesmo continuará inserido na matéria de facto não provada.
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Do Direito:

Legalidade da gestão bipartida do condomínio:

Não é pacífica na doutrina e na jurisprudência a solução dada à questão em análise, no entanto, a jurisprudência maioritária mostra-se a favor da existência de uma administração plural da propriedade horizontal, desde que se trate de partes comuns devidamente delimitadas, com funcionalidades próprias, nomeadamente quando nessa propriedade coexistem edifícios ou estruturas independentes.

No Acórdão do STJ de 16/10/10 (in www.dgsi.pt) admitiu-se a legalidade de constituição de mais de um condomínio com administração própria, para gerir as partes comuns que só servem uma zona do edifício, não obstante a constituição de uma só propriedade horizontal.

No Acórdão desta Relação de 17/12/18, pode ler-se no respetivo sumário que “o princípio da unidade de condomínio aplicável ao edifício em regime de propriedade horizontal pode ser afastado quando haja interesse dos condóminos na autonomização da administração de áreas comuns, que servem determinadas frações do edifício.” (v. no mesmo sentido Acs. do STJ de 21/5/2009; Ac. deste Tribunal de 2/5/16, Acs. R.L. de 3/2/17 e de 22/3/18 e Ac. a R.P. de 31/3/08, todos in www.dgsi.pt. Em sentido contrário Ac. R.P. de 24/2/05, também em www.dgsi.pt ).

Concordamos com a posição que admite a autonomização da administração de determinadas partes comuns de um imóvel constituído em propriedade horizontal quando no caso existam razões que justifiquem tal autonomização.

Na verdade, como salienta o Ac. da Relação do Porto de 9/2/06 (in www.dgsi.pt) a autonomização de administrações poderá corresponder a uma melhor defesa dos interesses que apenas dizem respeito a um determinado conjunto de condóminos, tornando possível uma melhor eficiência na administração.

No caso, existem (ou existiam no período referente à deliberação impugnada) duas administrações de condomínio, uma respeitante às lojas que integram o Centro Comercial e a outra referentes às restantes frações destinadas a escritórios e habitações, sendo que todas as referidas frações pertencem ao mesmo prédio, ou prédios constituídos numa única propriedade horizontal.

Assim, sendo certo que cada um dos referidos conjuntos de frações tem partes comuns específicas, que só dizem respeito a um grupo de condóminos, faz sentido que se tenham constituído dois condomínios diferentes para administrar as partes comuns a cada grupo, até por economia de tempo e de meios, permitindo uma gestão mais eficiente, uma vez que existem zonas comuns que só servem cada uma das referidas partes do edifício e inúmeros assuntos que só interessam a cada um dos grupos autonomizados de condóminos, como por exemplo a limpeza do centro comercial, as despesas de manutenção dos elevadores que apenas servem esta parte do edifício, as despesas referentes a campanhas destinadas a promover as lojas do Centro.

Deste modo, e sendo certo que ficou demonstrado que existe articulação entre as duas administrações sempre que se mostra necessário, considera-se legal a gestão bipartida das partes comuns do edifício em causa, desde que essa gestão não incida sobre assuntos do interesse da totalidade dos condóminos mas apenas sobre as partes específicas de cada grupo de frações.

De qualquer forma, como bem se salientou na decisão recorrida, na data em que a Recorrente se tornou locatária financeira das frações acima identificadas, já existia a bipartição da gestão, situação que a Recorrente sempre aceitou, designadamente participando nas assembleias de condóminos ou fazendo-se representar nas mesmas.

Este comportamento integra uma situação de venire contra factum próprio pois há uma contradição direta entra a primeira situação (aceitação da bipartição da gestão do condomínio) e o segundo comportamento (impugnação de deliberações da assembleia com fundamento em tal bipartição) o que consubstancia uma situação de abuso de direito (v. art. 334º do C. Civil), por constituir um exercício ilegítimo de um direito por o seu titular ter excedido manifestamente os limites impostos pela boa fé (v. Menezes Cordeiro, da Boa Fé no Direito Civil, Coleção Teses, vol. II, pág. 742).

Deste modo, ainda que se considerasse ilegal a gestão bipartida do condomínio, estaria vedada à Autora a invocação de tal ilegalidade, com base na figura do abuso de direito.

Legitimidade do convocante da Assembleia:

A Recorrente põe em causa a legitimidade da pessoa que convocou a Assembleia em causa por entender que deveria existir apenas uma administração da totalidade das partes comuns.

Assim, uma vez que a alegada irregularidade na convocação da assembleia de condóminos se prende unicamente com a ilegalidade da gestão bipartida e que, como se acima se explicou, tal gestão é legal, não existe qualquer vício em tal convocação ou ilegitimidade da pessoa que determinou a realização da mencionada assembleia.

Falta de quórum:

Também este ponto está relacionado com a alegada ilegalidade da gestão bipartida, pois é manifesto que na assembleia em causa apenas estiveram presentes os condóminos referentes às frações do Centro Comercial.

Assim, tendo sido considerada legal a gestão bipartida e tendo sido convocados para a Assembleia todos os proprietários das frações que integram o Centro Comercial ou seus representantes e tendo o quórum sido o necessário em função do disposto no art. 1432º, nº 4 do C. Civil, não existe qualquer vício no funcionamento da Assembleia.

Falta de assinatura da ata pelos condóminos que nela participaram:

Diz-nos o art. 1º, nº 1 do DL 268/94 de 25/10 (regime da propriedade horizontal) que “São obrigatoriamente lavradas atas das assembleia da condóminos, redigidas e assinadas por quem nelas tenha servido de presidente e subscritas por todos os condóminos que nelas hajam participado”.

A lei não comina com qualquer sanção a falta de assinatura da ata designadamente com a inexistência, ineficácia ou nulidade.

A jurisprudência tem, quase unanimemente, defendido que a ata da assembleia de condóminos é uma formalidade ad probationem, sendo uma mera irregularidade a falta de assinatura de condóminos que nela participaram que não afeta a deliberação tomada (v. Ac. do STJ de 14/10/14, Acs. R.L. de 15/2/07 e de 7/4/16, Acs. deste Tribunal de 21/11/13 e 17/1/19, Acs. R.E de3/11/16 e de 25/1/18).

Assim, não obstante a ata em causa só ter sido assinada pelo presidente da assembleia, tal não acarreta a invalidade dessa ata, sendo certo que não se põe em causa que tal ata documenta fielmente o que se passou nessa reunião.

Falta de eleição do presidente e secretário da assembleia:

No que a este ponto respeita, subscrevemos inteiramente o que a propósito foi dito na sentença recorrida, já que a lei e designadamente o art. 1º do DL 268/94, não exige a eleição de um presidente para dirigir a assembleia de condóminos, mas apenas “a sua designação ou exercício de facto de tal cargo por quem se apresente para tal e não seja repudiado pela assembleia (veja-se que a lei diz que a ata é redigida e assinada “por quem nelas tenha servido de presidente”)”.

Com efeito, basta que alguém, normalmente o administrador do condomínio ou quem o representa, exerça essas funções, sendo que não existe qualquer disposição que determine a eleição ou designação de secretário.

No caso, as funções de presidente da assembleia de condóminos foram exercidas por quem, nessa qualidade, assinou a ata em causa e nenhuma das pessoas presentes na assembleia se opôs ao exercício dessas funções, não havendo pois qualquer irregularidade relacionada com essa atuação.

Da indevida imputação de algumas despesas comuns à Autora:

A Recorrente entende que não tem de pagar as despesas de eletricidade, vigilância, limpeza, segurança social, seguro de acidentes de trabalho, água, despesas de manutenção, manutenção de elevadores e publicidade, por não beneficiar desses serviços.

A alteração da decisão recorrida nesta parte, pressupunha a alteração da matéria de facto nos termos pretendidos pela Recorrente, o que, como acima se verifica, não ocorreu. Deste modo, há que confirmar, também aqui a sentença proferida no Tribunal a quo.

De qualquer forma sempre se diz o seguinte:

Resulta do disposto no art. 1424º, nº 1 do C. Civil que “Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns de edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações., Decorre, todavia, dos números 3 e 4 deste preceito que as despesas relativas a partes comuns que sirvam ou aproveitem apenas a algum ou alguns dos condóminos, ficam a cargo destes.

No entanto, conforme se esclarece no Ac. da R.P. de 11/10/11 (in www.dgsi.pt), “Em propriedade horizontal, a obrigação de contribuir para as despesas com as partes comuns não depende da utilização efetiva que delas se faça, mas da possibilidade de as utilizar ao serviço da fração”

Com efeito, como exemplos de exceções à regra do nº 4 do mencionado preceito, referem José António França Pitão e Gustavo França Pitão (in Condomínio e propriedade horizontal, pág. 103) os casos em que as garagens do edifício se situem no piso -1 ou -2 ou em que a sala do condomínio está instalada no terraço que abrange todo o prédio no seu topo, o que determinará que o condómino do r/c contribua para as despesas de manutenção os respetivos elevadores.

Deste modo, ainda que a Autora, por meio dos seus representantes, funcionários ou clientes não utilize as instalações ou serviços acima mencionados, é responsável pelo seu pagamento, uma vez que tal responsabilidade advém da suscetibilidade de poder ocorrer tal utilização.

Assim, no caso concreto, podendo ocorrer utilização dos ascensores, escadas e outros espaços comuns do Centro Comercial para aceder ao parque de estacionamento ou ao wc, podendo a A. beneficiar da publicidade, vigilância, seguros, limpeza, etc., tem que pagar as despesas respetivas, na proporção fixada na Assembleia de Condóminos, não constituindo a sua exigência qualquer atuação em abuso de direito, por não estarem a ser excedidos, por parte dos RR., os limites da boa-fé.

Improcede, pois, totalmente a apelação da Autora.
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Decisão:

Pelo exposto, acorda-se nesta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães julgar improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.
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Guimarães, 19 de setembro de 2019

Alexandra Rolim Mendes
Maria de Purificação Carvalho
Maria dos Anjos Melo Nogueira


1 - Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 3ª Edição, pág. 245.