Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
| Processo: |
| ||
| Relator: | ARMANDO AZEVEDO | ||
| Descritores: | NULIDADE DE OMISSÃO DE PRONÚNCIA PENAS DE SUBSTITUIÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RG | ||
| Data do Acordão: | 07/10/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
| Indicações Eventuais: | SECÇÃO PENAL | ||
| Sumário: | I- Por forma a que não incorra em omissão de pronúncia, a sentença não tem necessariamente que referir-se especificamente a cada uma das penas de substituição abstratamente aplicáveis, desde que da respetiva fundamentação resulte, de forma clara, que o tribunal considerou ser absolutamente necessária a execução da pena de prisão, ou, não sendo esse o caso, a pena de substituição escolhida, de entre as abstratamente aplicáveis, era a única adequada, ficando consequentemente excluída a aplicação ao caso concreto as demais penas de substituição. II- Tendo o tribunal decidido aplicar ao arguido a pena de 4 meses de prisão, uma vez afastada a aplicação da pena de multa a título de pena principal com fundamento nos antecedentes criminais e na ausência de sentido critico do arguido relativamente à sua conduta, não fica excluída, por forma implícita, a aplicação da pena de multa de substituição, porque a pena principal de multa e a pena de multa de substituição são distintas, obedecendo a sua aplicação, por isso, a critérios também distintos e, em caso de incumprimento, as consequências são diversas. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I- RELATÓRIO 1. No processo comum singular nº nº3549/22.0T9BRG, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal de Braga – J..., em que é arguido AA, com os demais sinais nos autos, por sentença lida e depositada em 19.12.2024 foi decidido o seguinte (transcrição) [1]: a) Julgo a acusação pública procedente, por provada e, em consequência, condeno o arguido AA pela prática de um crime de importunação sexual, previsto e punido pelo artigo 170.º do Código Penal, na pena de 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano e condicionada ao pagamento da quantia de € 1.000,00 (mil euros), correspondente ao valor da compensação atribuída à ofendida pelos danos não patrimoniais sofridos, o que deverá comprovar documentalmente nos autos, até ao final do período da suspensão; b) Condeno o arguido no pagamento das custas penais, fixam-se em 4 (quatro) UC’s a taxa de justiça. c) Julgo parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido de indemnização civil deduzido por BB e, em consequência, condeno o arguido/demandando no pagamento de € 1.000,00 (mil euros) a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, acrescido de juros de mora a contar da presente decisão até efectivo e integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado; Custas pela demandante e demandado, na proporção do respectivo decaimento. 2. Não se conformando com a mencionada decisão, dela interpôs recurso o arguido, formulando as seguintes conclusões e pedido (transcrição): 1 - O PRESENTE RECURSO TEM POR OBJECTO: a) Da nulidade da sentença recorrida, por omissão de pronúncia, nos termos do art.º 379.º, n.º 1, al. c), do CPP, por violação dos art.ºs 45.º e 58.º do CP; Consequências jurídicas Subsidiariamente b) Pontos de facto indevidamente dados como provados, para os efeitos do estabelecido no artigo 412.º, n.º 3, alínea a) do CPP; Consequências jurídicas; Subsidiariamente c) Preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos da prática do crime de importunação sexual, p. e p. pelo art.º 170º do Código Penal; Consequências jurídicas; Subsidiariamente, d) Escolha da pena – Pena substitutiva. 2 – Emerge da Sentença prolatado em 19/12/2024, com a Ref. Citius n.º 194088926, a condenação do arguido/recorrente AA pela prática de um crime de importunação sexual, previsto e punido pelo artigo 170.º do Código Penal, na pena de 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano e condicionada ao pagamento da quantia de € 1.000,00 (mil euros), correspondente ao valor da compensação atribuída à ofendida pelos danos não patrimoniais sofridos, o que deverá comprovar documentalmente nos autos, até ao final do período da suspensão. 3 – No recurso, sinalizou-se a facticidade que o tribunal a quo deu como provada, bem como a pertinente motivação (que aqui se consideram descritas por economia processual). DA NULIDADE DO ACÓRDÃO RECORRIDO POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA, POR VIOLAÇÃO DO ART.º 379.º, N.º 1, AL. C) DO CPP E DOS ART.ºS 45.º E 58.º DO CP 4 – Realizou-se um discurso doutrinal e jurisprudencial sobre o tema em tela e pela sua impressividade citaram-se o Ac. do STJ de 15/12/2011, no Proc. n.º 17/09.0 TELSB.L1.S1, Acórdão da Relação de Coimbra de 3/10/2018, no Proc. n.º 19/18.5 PEFIG.C1, Relator Orlando Gonçalves e Acórdão da Relação de Coimbra de 10/2/2010, no Proc. n.º 113/09.3GCTB.C1, Relator Paulo Guerra in www.dgsi.pt, cujo teor se dá aqui por reproduzido por economia processual. 5 – Ora, o Tribunal a quo não afastou/ponderou expressamente, nem sequer implicitamente, a substituição da pena de prisão por uma pena de multa ou pela prestação de trabalho a favor da comunidade, a fim de aferir se estas assegurariam as finalidades da punição ou acautelariam a necessidade de prevenir a prática de futuros crimes. 6 - Perlustrando a sentença recorrida, maxime em sede de escolha e medida da pena inexiste qualquer posição por parte do tribunal acerca das aludidas penas substitutivas e impunha-se legalmente um juízo positivo ou negativo acerca de tal temática! 7 - Assim, não tendo o julgador equacionado e afastado a aplicação ao arguido de um pena de multa ou da prestação de trabalho a favor da comunidade, afigura-se conspícuo que a sentença recorrida é nula, por omissão de pronúncia, encontrando-se violados os art.ºs 43.º e 58.º do CP e 379.º, n.º 1, al. c) do CPP. CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS 8 - Deve a sentença recorrida ser declarada nula, por enfermar de nulidade, nos termos do art.º 379.º, n.º 1, al. c) do CPP. Subsecutivamente, reclama-se a ponderação das penas substitutivas aplicáveis in casu e após deverá ser prolatada nova sentença em conformidade. 9 – ERRO DE JULGAMENTO FACTOS QUE FORAM INDEVIDAMENTE DADOS COMO PROVADOS, para os efeitos do estabelecido no artigo 412.º, n.º 3, alínea a), do CPP – os factos descritos na Sentença sob os números 4.º, 7.º, 8.º, 9.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 18.º, 19.º, 20.º, 21.º, 22.º, 23.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 31.º, 32.º, 33.º, 34.º, 35.º e 36.º, dando-se aqui por reproduzido o seu teor, por exercício de síntese, e na medida em que já se transcreveu o seu teor em sede motivacional. 10 – Neste recorte, fez-se uma digressão acerca do seguinte: pertinente vício; da prova judiciária; da avaliação das provas; e da livre apreciação da prova. 11 – A motivação do tribunal a quo conformou-se nitidamente intercisa e intercadente; com efeito, na motivação, divisa-se um desígnio cristalino, por banda do Tribunal a quo, de privilegiar apenas algumas incidências do universo factual, para, dessa forma, atingir um objectivo bem direcionado e precogitado – a condenação do arguido/recorrente por um universo factual e temporal sobremodo amplificado. Por tal razão, nesse percurso, foram extrapolados alguns complexos fácticos imperativos, com idoneidade para subverter, fragmentar e detonar a facticidade assentada. 12 – Após, foi registada nótula acerca do posicionamento do arguido/recorrente na impugnação parcial da matéria de facto, em que se justapõem as regras da experiência e os critérios de normalidade (nos segmentos assinalados) com provas apontadas na motivação feita pelo Tribunal a quo. Nesse contexto, por mostrar total prestabilidade para a situação em foco, transcreveu-se um escólio de CC. 13 – No consectário desse procedimento, sem a convocação e o cotejo crítico de componentes probatórios relevantes, a correlacionar com alguma da matéria de facto assinalada na motivação, preteriu-se, de forma grave, a enumeração factual na sua exacta e acertada dimensão, que se postulava mais concreta e rigorosa. 14 – De seguida, foram reproduzidas, no prevalecente: º Passagens das declarações do arguido AA, prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 19/9/2024, Ref. Citius n.º 192398446, entre as 9h47m58seg e as 10h49m28seg; º Extractos do depoimento da ofendida/demandante BB, prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento, em 19/9/2024, Ref. Citius n.º 192398446, entre as 10h57m16seg e as 12h06m05seg, bem como entre as 12h09m15seg e as 12h13m40seg; º Excertos das declarações da testemunha DD, prestado em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 17/10/2024, com a Ref. Citius n.º 192944314, entre as 10h32m20seg e as 10h42m33seg; º Segmentos do depoimento da testemunha EE, ocorrido em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 17/10/2024, com a Ref. Citius n.º 192944314, entre as 10h43m17seg e as 11h17m58s; º Parcelas do declarado pela testemunha FF, prestado em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 17/10/2024, com a Ref. Citius n.º 192944314, entre as 11h50m34seg e as 12h03m36s; º Extractos do depoimento da testemunha GG, pai da ofendida, ocorrido em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 17/10/2024, com a Ref. Citius n.º 192944314, entre as 11h19m36seg e as 11h49m; º Passagens do depoimento da testemunha FF, filha da ofendida, ocorrido em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 5/11/2024, com a Ref. Citius n.º 193263429, entre as 16h20m26seg e as 16h58m06s. º Enfatizou-se o teor dos documentos de fls. 10 a 20, 53 a 61 e 210, verso. 15 – Em vista da prova produzida, emergente do relato feito, pode concluir-se o seguinte: - As declarações do arguido AA prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento foram indevidamente desvalorizadas pelo Tribunal na sua exacta dimensão; - Os depoimentos da ofendida/demandante BB, das testemunhas DD, EE, FF, filha da ofendida, GG e FF, produzidos em sede de audiência de discussão e julgamento e que são valorizados in totum não se alcançando o raciocínio que lhes preside em face do que infra se exporá; - A prova documental de fls. 10 a 20 e 53 a 61 não foi devidamente concatenada com o teor de fls. 210 verso; - Uma análise cuidada, sem omissões ou pré-juízos permite contextualizar o cenário ocorrido; - O relato dos factos trazida aos autos pelo arguido AA é o que melhor se compagina com o que na realidade sucedeu, concatenado com a demais prova coligida para os autos, mesmo apelando a critérios de verosimilhança e experiência comum, assim que a situação sub judice o reclame. - Os depoimentos/declarações dos supracitados sujeitos processuais, atento o circunstancialismo da matéria em causa nos presentes autos, devidamente conjugados com a valoração do teor da prova documental junta, maxime fls. 210 verso, devem merecer, ipso facto, adequadamente concatenados, diferente ponderação; e - tal circunstância deve, então, determinar, de forma inexorável, que se considerem não provados os factos retromencionados. 16 – Após, foram enfatizadas as fragilidades/friabilidades da motivação dos factos que foi esquematizado, em resumo, da forma seguinte: Sinalizou-se que encontram-se em colisão duas versões diametralmente opostas – arguido vs ofendida – sendo certo que apenas estes têm conhecimento directo dos factos. 17 - A tese da ofendida BB enferma de lacunas, contradições e perplexidades que resultam à saciedade do por si verbalizado quando conjugado com a prova por si arrolada, coincidente, em parte, com a do Ministério Público. 18 – Afigura-se inusitado, mas conveniente para a versão da ofendida, que todas as testemunhas por si indicadas, incluindo a própria verbalizassem as datas concretas dos episódios atribuídos ao arguido, ESTANDO DECORRIDOS MAIS DE 2 ANOS DA SITUAÇÃO EM ANÁLISE, sendo incompreensível que perante esta precisão desconheçam o valor recebido a título de indemnização e liquidado pela Seguradora. 19 – Inexiste qualquer suporte probatório para aquilatar dos propalados elogios veiculados pelo arguido, convites formais para jantar e muito menos de lugar para a ofendida na cama do arguido, sendo certo que, se existiu, torna-se premente contextualizar o mesmo de acordo com o vazado na acusação, qual seja, a ofendida questionou aquele onde poderia pernoitar. 20 – Ninguém esclareceu quantas vezes foi o arguido a ..., número de telefonemas, circunstancialismo do verbalizado, sendo inusitado que a ofendida confirme que uma das conversações foi bastante duradoura perante um indivíduo do qual tinha medo e receio. 21 – Assuntou-se que as contradições adensam-se quando a dado passo a ofendida afirma que o arguido nunca comunicava via SMS, para em momento anterior revelar o conteúdo de uma, culimando com uma das suas filhas a verbalizar que a sua mãe lhe transmitiu que aquele lhe remetia mensagens de teor indecoroso, sendo certo que a acusação pública nem tal menciona. 22 – É desafiador das mais elementares regras da experiência comum e da normalidade do acontecer a credibilização da tese da arguida pelos motivos que infra se renovam: - Quando o arguido e a ofendida encontravam-se no ... andar e o arguido, alegadamente, tentou agarrá-la e tendo esta conseguido fugir, afigura-se inverosímil, que momentos depois ainda lhe dê um copo de água, tendo medo e receio daquele! O pináculo do caricato traduz-se no facto de o arguido tentar novamente agarrar a ofendida com um copo na mão!? - Se nutre esses sentimentos pelo arguido, vivencia esse status quo durante 18 dias, nunca tendo o expulsado de casa, não chamou as autoridades, nem sequer gritou, alertando as filhas, ou clamou por socorro em nenhuma das situações, prosseguindo, isso sim, com as visitas à habitação! 23 – Resulta conspícuo, conjugando o teor de fls. 210 verso – factura remetida pelo arguido para a ofendida – com a comunicação da arguida à Seguradora, isso sim, que a relação contratual entre as partes cessou em face de alegado incumprimento/atrasos do arguido na conclusão dos trabalhos, sendo a queixa crime apresentada APÓS A RECEPÇÃO DAQUELA POR PARTE DA OFENDIDA, sendo revelador do que lhe subjaz, qual seja, a criação de um expediente legal a fim de se furtar ao pagamento. 24 – O devaneio e confusão dialéctica do Tribunal em sede de extracção de conclusões face à credibilização in totum dos depoimentos indirectos assume contornos surreais mediante o que alegadamente a ofendida lhes transmitiu na medida em que os relatos divergem, dando-se aqui por reproduzidas as contradições supra expostas, por exercício de síntese. 25 - Trata-se, por conseguinte, nesta sede, de matéria que foi incorretamente julgada por nítido erro e violação do princípio da livre apreciação da prova – cf. O artigo 412.º, n. º 3, alínea a), do CPP. Subsidiariamente. 26 – No limite, perante a incidência da prova, no caso de não se conceder absoluto crédito às cogitações desenvolvidas, subsiste, pelo menos, uma dúvida insanável no atinente à matéria de facto delimitada na Sentença recorrida nos números 4.º, 7.º, 8.º, 9.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 18.º, 19.º, 20.º, 21.º, 22.º, 23.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 31.º, 32.º, 33.º, 34.º, 35.º e 36.º. Significa isso que a supradita matéria de facto, considerada provada, devia ter sido dada como não demonstrada. 27 – De facto, a prova produzida, no extremo, não determinou a persuasão bastante relativamente a tais factos. Verifica-se, assim, uma dúvida insuperável no que toca aos sobreditos segmentos – tais dúvidas deveriam, então, beneficiar o arguido/recorrente. 28 – Tecnicamente, tal non liquet que se atingiu, no âmbito da prova, nesse particular aspecto, devia ter sido resolvido em benefício do arguido (nesta envolvência, foi ainda citado um excerto do Acórdão do STJ de 20/04/2006, no que tange às situações em que pode ocorrer a violação do princípio in dubio pro reo). 29 – Pela sua servência, validade e acerto, aportaram-se duas decisões jurisprudenciais, a propósito do correcto enfoque do princípio in dubio pro reo, proferidas na esfera do Acórdãos da Relação de Lisboa de 22/09/2020 e da Relação de Évora de 13/09/2016. 30 – Tais escólios representam o mais ajustado entendimento acerca do princípio in dubio pro reo, pois que a reflexão objectiva de tal princípio é imposta pelos princípios da culpa e da presunção de inocência. In veritas, o enfocamento subjectivo deste princípio convolaria o princípio in dubio pro reo em figura meramente decorativa do ordenamento processual penal, com aplicação inteiramente marginal ou residual, sendo certo que exsurge algo paradoxal e desarmónico que um juiz dê como provados factos desfavoráveis ao arguido e, simultaneamente, reconheça não estar convencido da verificação de tais factos. 31 – Conclui-se, assim, que o que interessa apurar é se o tribunal, perante a prova produzida, objectivamente, devia ter ficado num estado de dúvida sobre a matéria de facto impugnada – e não se o Tribunal ficou efectivamente com qualquer dúvida sobre essa matéria. 32 – Ao existirem, pelo menos, as dúvidas averbadas e tendo o arguido sido condenado, nos termos em que não se conforma, com uma amplitude factual desacertada, considera-se existir violação do Princípio Constitucional da Presunção de Inocência e do princípio in dubio pro reo. 33 – Nos presentes autos, foi pelo menos criada uma claríssima dúvida razoável pelo que tange à facticidade descrita sob os números ......, ......, ......, ......, ...1..., ...2..., ...3..., ...4..., ...5..., ...6..., ...7..., ...8..., ...9..., ...0..., ...1..., ...2..., ...3..., ...5..., ...6..., ...7..., ...8..., ...9..., ...1..., ...2..., ...3..., ...4..., ...5... e ...6.º 34 – Tais dúvidas, por força do princípio in dubio pro reo, não podem deixar de ser valoradas a favor do arguido. 35 – O tribunal a quo, condenando o Recorrente, da forma como o fez, com a apontada amplitude factual, atinente ao crime de importunação sexual, pode concluir- se que, no limite, perante a incidência da prova, no caso de não se conceder absoluto crédito às cogitações desenvolvidas, o Tribunal deveria ter ponderado E APLICADO o princípio in dubio pro reo, porquanto subsiste, pelo menos, uma dúvida insanável pelo tocante à responsabilidade criminal atribuída ao arguido, violando grosseiramente o disposto no n.º 2 do artigo 32.º da CRP. 36 – Na situação sub judice, em vista das replicações e questionamentos opostos, a fundamentação não está corretamente densificada. Efectivamente, o Tribunal não valorou, de forma atilada e judiciosa, a prova produzida; por tal motivo, as impostações indexadas sobrepõem-se claramente à convicção estabelecida pelo Tribunal, que fez apelo a presunções exorbitantes da realidade fáctica, preteriu a prova efectuada, na sua dimensão multiangular/poliédrica e, no apartado assinalado, infringiu as regras da experiência e os critérios de normalidade. 37 – As concretas provas que impõem decisão diversa são as seguintes: - Declarações do arguido AA, prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 19/9/2024, Ref. Citius n.º 192398446, entre as 9h47m58seg e as 10h49m28seg; - Depoimento da ofendida/demandante BB, prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento, em 19/9/2024, Ref. Citius n.º 192398446, entre as 10h57m16seg e as 12h06m05seg, bem como entre as 12h09m15seg e as 12h13m40seg; - Declarações das testemunhas DD, prestado em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 17/10/2024, com a Ref. Citius n.º 192944314, entre as 10h32m20seg e as 10h42m33seg, EE, ocorrido em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 17/10/2024, com a Ref. Citius n.º 192944314, entre as 10h43m17seg e as 11h17m58s, FF, filha da ofendida, prestado em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 17/10/2024, com a Ref. Citius n.º 192944314, entre as 11h50m34seg e as 12h03m36s, GG, pai da ofendida, ocorrido em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 17/10/2024, com a Ref. Citius n.º 192944314, entre as 11h19m36seg e as 11h49m, e FF, filha da ofendida, ocorrido em sede de audiência de discussão e julgamento no dia 5/11/2024, com a Ref. Citius n.º 193263429, entre as 16h20m26seg e as 16h58m06s. - Documentos de fls. 10 a 20, 53 a 61 e 210, verso. Os meios de prova supra elencados que foram indevidamente valorizados ou desvalorizados, não obstante estarem eivados de uma heterogeneidade discursiva inaceitável e se mostrarem, com frequência, atomizados, atópicos, incriteriosos e caldeados, o que os torna sobremodo frágeis, friáveis e não merecedores de credibilidade – vejam-se as passagens dos correspondentes depoimentos, acima transcritos, maiormente nos segmentos destacados e/ou sublinhados, maxime o teor de fls. 210, verso e fls. 10 a 20 e 53 a 61; e - as regras da experiência e os critérios de normalidade, que foram aqui abundantemente/profusamente preteridos, sobretudo nos juízos de valor deduzidos pelo Tribunal a quo. 38 – As referências/aclarações balizadas impõem/expostulam, pois, uma decisão diversa da recorrida. Ex positis, inexiste fundamento para dar como provada a matéria que consta da facticidade positiva, sob os números 4.º, 7.º, 8.º, 9.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 18.º, 19.º, 20.º, 21.º, 22.º, 23.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 31.º, 32.º, 33.º, 34.º, 35.º e 36.º. 39 – Significa isso que a matéria de facto descrita na Sentença, que se delimitou, devia ter sido dada como não provada – trata-se, portanto, de matéria que foi incorretamente julgada por nítido erro e violação do princípio da livre apreciação da prova – cf. o artigo 412.º, n.º 3, alínea a), do CPP. Subsidiariamente PREENCHIMENTO DOS ELEMENTOS OBJECTIVOS E SUBJECTIVOS DA PRÁTICA DO CRIME DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL, P. E P. PELO ART.º 170º DO CÓDIGO PENAL: 40 - Procedeu-se a uma resenha doutrinária e jurisprudencial sobre o crime em tela, e que aqui se dá por reproduzida, por brevidade e economia processual, tendo-se citado, pela sua impressividade o Ac. da Rel. de Guimarães de 23/11/2020, no Proc. n.º 1700/17.1 PBBRG.G1, Ac. da Rel. de Évora de 10/10/2023, no Proc. n.º 113/22.8 T9EVR.E1, in www.dgsi.pt e a Dissertação de In Wai Lok, Assédio Sexual e Importunação Sexual na Revisão dos Códigos Penais Portugueses e Macaense, in run.unl.pt. 41 – Conclui-se que o imputado nos art.ºs 4.º, 7.º, 9.º, 11.º, 12.º, 15.º, 16.º, 18.º, 20.º, 21.º, 22.º, 23.º, 26.º, 28.º, 31.º da acusação pública – e que aqui se dão por reproduzidos na medida em que já foram transcritos em sede motivacional, - não são subsumíveis a atitudes de constranger a ofendida a contactos de natureza sexual, nem consubstanciam propostas de teor sexual, pelo que redunda incompatível com o vazados nos art.ºs 31.º, 32.º, 33.º e 34.º da acusação pública – que se dão por reproduzidos nos mesmos termos -, inexistindo sustentação para afirmar a intenção do arguido em satisfazer o seu prazer sexual, lesando a liberdade sexual da ofendida. Subsidiariamente ESCOLHA DA PENA – PENA SUBSTITUTIVA 42 - ESCOLHA DA PENA Afirmou-se a possibilidade de fazer um juízo positivo quanto às finalidades de prevenção geral positiva de integração (protecção de bens jurídicos) e de prevenção especial (integração do agente), pelo que se pugna pela aplicação de uma sanção pecuniária, por se revelar suficiente para realizar as finalidades da punição, ao arguido AA, no que tange ao crime de importunação sexual, p. e p. pelo art.º 170.º do CP. 43 – PENA SUBSTITUTIVA Neste âmbito, deve atender-se à culpa do agente e às exigências de prevenção de futuros crimes, não podendo a medida da pena ultrapassar a medida da pena. De outro lado, a aplicação das penas visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade e o tribunal deve atender, na determinação concreta da pena, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele. 44 – No âmbito das exigências de prevenção, incluem-se aqui as vertentes da prevenção geral, negativa e positiva, e da prevenção especial. 45 – Os fins das penas só podem ter natureza preventiva – seja de prevenção geral, positiva ou negativa, seja de prevenção especial, positiva ou negativa –, e não natureza retributiva. 46 – Na determinação concreta da pena, o tribunal deve atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele. 47 – No atinente às exigências de prevenção geral, a pena deve então satisfazer aqui necessidades de fortalecimento da consciência jurídica comunitária, isto é, deve visar a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada, sendo certo que, na órbita do crime aqui em pauta, se fazem sentir necessidades de prevenção. 48 – No parâmetro das exigências de prevenção especial, a pena deve ser “usada” na sua função primordial de socialização, a fim de se obter uma maior conformação do arguido com os padrões axiológicos vigentes. 49 – Assuntou-se que: - As exigências de prevenção geral para o crime em causa não se afiguram elevadas/exorbitantes, EM FACE DO CONTEXTO DA SUA OCORRÊNCIA. - A ilicitude da conduta do arguido em sede do crime em tela afiguram-se diminutas. - Os antecedentes criminais que o arguido regista remontam a crimes praticados em 2016 e 2017, e cujas penas se encontram extintas. - Os factos remontam ao início de 2022. 50 - Subsecutivamente, entende o arguido que é forçoso realizar um juízo de prognose favorável quanto à substituição da pena de prisão aplicada por uma pena de multa, por encontrar-se devidamente acautelado o perigo, que inexiste, de cometimento de futuros crimes, nos termos do art.º 45.º do CP 51 – Não se pode deixar de concluir, que, o Tribunal recorrido, ao fazer uma aplicação espúria dos princípios que preordenam as necessidades de prevenção geral e especial, proferiu uma decisão inçada de clara violação do princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso, porquanto a punição utilizada (a pena concreta e escolhida) é desproporcionada/desarrazoada em relação aos fins de prevenção, especial e geral, requisitados pelo caso concreto, e, por identidade de razões, ao não aplicar o art.º 45.º do CP. 52 - Ex positis, por não se conformar com o princípio da proporcionalidade, previsto no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, o Acórdão inquina da correspondente inconstitucionalidade, que ora se invoca. 53 – Por derradeiro, o Tribunal a quo, ao decidir nos termos em que o fez, violou o estabelecido nos artigos 32.º, n.º 2 da CRP, 40.º, 45.º, 70.º e 170.º do Código Penal, bem como os art.ºs 127.º e 412.º, n.º 3, al. a) do CPP. NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS DE DIREITO, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, POR VIA DELE, SER: A1) Deve a sentença recorrida ser declarada nula, por enfermar de nulidade, nos termos do art.º 379.º, n.º 1, al. c) do CPP; A2) Subsecutivamente, devem ser equacionadas as penas substitutivas aplicáveis in casu e após deverá ser prolatada nova sentença em conformidade. Subsidiariamente, B) Reconhecido o erro de julgamento relativamente à matéria de facto controvertida e, nessa decorrência, arguido AA ser absolvido da prática, de 1 (um) crime de importunação sexual, p. e p. pelo art.º 170.º do CP; Subsidiariamente C) O arguido AA ser absolvido da prática de 1 (um) crime de importunação sexual, p. e p. pelo art.º 170.º do CP, por não se encontrarem preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do tipo de ilícito; Subsidiariamente D) Ser aplicada ao arguido AA uma pena de multa, a título principal, pela prática de 1 (um) crime de importunação sexual, p. e p. pelo art.º 170.º do CP; Subsidiariamente E) Ser substituída a pena de prisão aplicada, pela prática de 1 (um) crime de importunação sexual, p. e p. pelo art.º 170.º do CP, por uma pena de multa, nos termos do art.º 45.º do CP. DESSA FORMA, SERÁ FEITA A TÃO PEDAGÓGICA JUSTIÇA. 3. O Ministério Público, na primeira instância, respondeu ao recurso interposto pelo arguido, tendo-se pronunciado sobre as questões suscitadas no recurso, sem formular conclusões, pugnando pela improcedência do recurso. 4. Nesta instância, a Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seu parecer, no qual refere concordar com a resposta ao recurso apresentada pelo Ministério Público na primeira instância, pronunciando-se especificamente sobre as questões suscitadas pelo recorrente, e concluiu no sentido de que deverá ser negado provimento ao recurso. 5. Cumprido que foi o disposto no artigo 417º nº2 do CPP, o arguido respondeu ao parecer da Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta, sustentando não lhe assistir razão, pugnando pelos fundamentos do recurso. 6. Após ter sido efetuado exame preliminar, foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência. II- FUNDAMENTAÇÃO 1. Objeto do recurso O âmbito do recurso, conforme jurisprudência corrente, é delimitado pelas suas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, sem prejuízo naturalmente das questões de conhecimento oficioso[2] do tribunal, cfr. artigos 402, 403º e 412º, nº 1, todos do CPP. Assim, considerando o teor das conclusões do recurso interposto pela arguida / recorrente, as questões a decidir reconduzem-se às seguintes matérias: - Nulidade da sentença por omissão de pronúncia, em conformidade com o disposto no artigo 379º, nº 1, alínea c) do CPP; - Erro de julgamento da matéria de facto, quanto aos pontos 4, 7, 8, 9, 11 a 23, 25 a 29 e 31 e 36 dos factos provados da sentença recorrida por violação dos princípios da livre apreciação da prova e do in dubio pro reo; - Qualificação jurídica dos factos quanto ao crime de importunação sexual; e - Aplicação da pena de multa, a título de pena principal ou então como pena de substituição. 2- A decisão recorrida 1. Na sentença recorrida consideraram-se como provados e não provados os seguintes factos, seguidos da respetiva motivação da matéria de facto (transcrição): A. Factos provados Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos: 1. O arguido AA é sócio gerente da empresa EMP01..., Lda. 2. Devido ao facto de no dia 31 de março de 2022 ter sofrido uma infiltração no interior da sua habitação, sita na Rua ..., ..., ..., a ofendida BB, accionou o seguro multirriscos habitação com a Apólice n.º ...89 da Companhia de Seguros EMP02.... 3. Assim, no dia 06 de abril de 2022, o arguido, em substituição do perito HH, que estava impedido, deslocou-se à residência da ofendida, para proceder a uma peritagem, juntamente com uma colaboradora. 4. Nesse mesmo dia, o arguido fez o levantamento do sinistro, tendo incrementado danos no relatório da peritagem, razão pela qual, no final, se dirigiu à ofendida e lhe disse que se o mesmo fosse aprovado esta lhe ficava a dever um jantar, quando se deslocasse à cidade .... 5. Posteriormente, a prestação de serviços de realização das obras necessárias na habitação da ofendida foi adjudicada à empresa do arguido. 6. No dia ../../.... de 2022, após o serviço lhe ter sido adjudicado, o arguido deslocou-se novamente à habitação da ofendida, para ver as obras que teria de realizar e para informar a mesma da data de início de obra. 7. Nessas circunstâncias, quando se encontrava apenas na presença da ofendida, o arguido disse-lhe que era muito bonita e insistiu para que a mesma aceitasse o seu convite para irem jantar. 8. Devido ao facto da conduta do arguido a deixar desconfortável, a ofendida advertiu-o que deveria parar com esses comportamentos, referindo ainda que se encontrava numa relação. 9. Apesar da advertência da ofendida, o arguido, entre o dia ../../.... e ../../2022, sempre que se deslocou à cidade ..., telefonou à ofendida para convidar a mesma para irem tomar café, pedidos aos quais a ofendida nunca acedeu. 10. O arguido apenas teve acesso ao número de telemóvel da ofendida em virtude de estar responsável pela realização das obras na habitação desta. 11. Em data não concretamente apurada, mas situada no referido período temporal, quando a ofendida questionou o arguido sobre a alternativa que a mesma tinha para pernoitar, uma vez que não podia ficar no interior da sua residência durante a realização das reparações por parte do taqueiro, o arguido respondeu-lhe para que mandasse as filhas para o pai e que a ofendida tinha lugar na cama dele. 12. No referido período de tempo, em número de vezes não concretamente apurado, o arguido ligou através do seu telemóvel para o contacto telefónico da ofendida e disse-lhe que tinha saudades, questionando a mesma sobre quando é que se deslocava até ao ... para tomarem um café. 13. No dia ../../2022, o arguido deslocou-se, novamente, à residência da ofendida, tendo-lhe perguntado, mal chegou, se estava sozinha. 14. Com medo do comportamento que o arguido pudesse adoptar, a ofendida disse-lhe que as suas filhas estavam na garagem. 15. Apesar disso, o arguido não se coibiu de, por diversas vezes, colocar a mão no cabelo da ofendida, dizendo-lhe que era muito bonito. 16. Da mesma forma, o arguido disse à ofendida, repetidamente, que era muito bonita, enquanto tentou agarrar as suas mãos e aproximar-se da mesma. 17. Em face do exposto, a ofendida pediu ao arguido, por diversas vezes, para parar com aqueles comportamentos, explicando-lhe que os mesmos a deixavam desconfortável e que se não parasse iria chamar as suas filhas. 18. Não obstante, quando se encontravam no quarto de banho da suite principal do ... andar e a ofendida estava em frente ao espelho, o arguido foi por trás da mesma, abraçou-a, colocando ambos os braços a envolver o torço superior da ofendida e apertou-a. 19. Contudo, a ofendida agachou-se e conseguiu fugir pelo meio dos braços do arguido. 20. Acto contínuo, o arguido agarrou novamente a ofendida, tirou uma fotografia da imagem de ambos naquela posição reflectida no espelho, contra a vontade da ofendida, e disse-lhe que ficavam muito bem juntos. 21. Já no quarto de banho do rés do chão o arguido pediu um copo de água à ofendida, sendo que aquele aproveitou o momento em que esta lhe estava a entregar o copo para a voltar a agarrar, apertando-a contra si. 22. Posteriormente, quando se encontravam na porta de entrada da habitação, o arguido questionou a ofendida sobre quando é que iam jantar. 23. No dia 13 de maio de 2022, o arguido ligou à ofendida, perguntando-lhe se «precisava de ajuda para desfazer a cama», tendo a ofendida respondido que precisava era de saber quando é que o arguido começava a obra. 24. Só no dia 17 de maio de 2022 é que o arguido se deslocou à habitação da ofendida para dar início à obra. 25. Em virtude dos comportamentos do arguido e devido ao facto de não querer voltar a estar sozinha com o mesmo, a ofendida solicitou a EE para que estivesse presente aquando da chegada e da permanência do arguido na sua habitação. 26. No referido dia, na parte da tarde, a ofendida disse ao arguido que tinha uma pessoa, que lá tinha estado no dia anterior e que não gostava das suas abordagens, ao que aquele respondeu que “isso não o afectava… que não tinha ciúmes e que ia continuar a tentar, pois poderia ter sorte». 27. No dia 18 de maio, o arguido dirigiu-se à habitação da ofendida para esta assinar um documento. 28. Quando a ofendida estava em cima de uma cadeira e alcançou um dossier que se encontrava no móvel superior e do qual estava à procura, desiquilibrando-se, altura em que o arguido lhe disse «podia ter pedido que eu amparava-lhe a queda». 29. Face aos comportamentos reiterados do arguido, a ofendida solicitava sempre ao Sr. EE ou às suas filhas para os mesmos ficarem consigo na habitação durante os períodos em que o arguido lá permanecia pois, o mesmo aproveitava os momentos em que estavam sozinhos para actuar da maneira descrita. 30. Posteriormente, a ofendida prescindiu dos serviços do arguido, não o deixando entrar mais no interior da sua residência e dando conhecimento dos factos à Companhia de Seguros. 31. Com os comportamentos descritos, o arguido agiu, de forma reiterada e incessantemente, com o intuito de estabelecer contactos físicos com a ofendida, mesmo contra a sua vontade, e de a constranger a aceitar os seus convites para ir jantar e tomar café, indiferente ao facto de não haver uma qualquer relação entre os mesmos, nem mesmo de amizade, tão só um relacionamento no âmbito dos serviços prestados pelo arguido e aos pedidos da ofendida para que parasse com tais comportamentos. 32. O arguido agiu de modo livre, voluntário e consciente, com o propósito de satisfazer o seu prazer sexual, lesando a liberdade sexual da ofendida, aproveitando-se do facto de ter acesso à habitação da ofendida em virtude das funções que exercia e actuando sempre nos momentos em que os mesmos se encontravam sozinhos. 33. Com a sua conduta o arguido provocou medo e constrangimento na ofendida e fê-lo no interior da sua habitação, espaço mais íntimo da mesma, onde se deveria sentir segura, livre e confortável. 34. Bem sabendo que as suas condutas eram proibidas por lei e criminalmente punidas. 35. Em consequência das condutas do arguido, a ofendida sentiu desconforto, constrangimento, vergonha e receio que o arguido a voltasse a abordar e que os seus comportamentos se agravassem e que a mesma não se conseguisse defender. 36. Nas noites que se seguiram ao sucedido teve dificuldade em dormir. Mais se provou que: 37. O arguido reside com a companheira, em casa própria desta. 38. É proprietário de um imóvel, tipologia T1. 39. Suporta mensalmente €400,00 para amortização de empréstimo habitação do imóvel mencionado em 38. 40. Suporta, ainda, o valor mensal de € 80,00 para amortização de um crédito pessoal. 41. Tem dois filhos, com 14 e 24 anos de idade. 42. Não suporta qualquer montante a título de pensão de alimentos, residindo o seu filho menor de idade consigo, de quinze em quinze dias. 43. Aufere em média € 1600,00 mensais. 44. Não denotou qualquer arrependimento, nem juízo de auto-censura quanto aos factos por si praticados. 45. Sofreu as seguintes condenações: i) PCS n.º 961/16.8PAESP, que correu termos no Juízo de Competência Genérica, Juiz ..., por sentença transitada em julgado em 09.03.2018, pela prática, em 30.11.2016, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 142.º, n.º 1 do CP e um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181.º, n.º 1 do CP, na pena única de 120 dias de multa, à taxa diária de € 6,00, declarada extinta pelo cumprimento da prestação de trabalho decretada em sua substituição, por despacho datado de 11.01.2019; ii) PCS n.º 749/17.9PHMTS, que correu termos no Juízo Local Criminal de Matosinhos, Juiz ..., por sentença transitada em julgado em 22.11.2019, pela prática, em 19.06.2017, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, nº 1 als. a) e c) do CP, n apena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova e na pena acessória de frequência de programas específicos de prevenção de violência doméstica, declaradas extintas pelo cumprimento por despachos datados de 22.11.2022 e 22.05.2021, respectivamente. * B. Factos não provadosNão se provaram quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa. Designadamente não se provou que: a) Aquando do mencionado em 23. o arguido tivesse dito à ofendida que estava na cidade .... b) Aquando do mencionado em 26. o arguido tivesse dito à ofendida que gostava muito dela. c) Em consequência da conduta do arguido, durante o dia, a ofendida apresentasse sonolência, irritabilidade, incapacidade para raciocinar com facilidade e lentidão de reflexos. * C. Motivação da matéria de factoEstriba a decisão do Tribunal quanto aos Factos Provados e Factos Não Provados, acima enunciada, a articulação de todos os meios de prova apresentados em Audiência de Discussão e Julgamento de que resultou valor probatório, devidamente articulados com as regras de experiência comum e que permitiram, no seu conjunto, ao Tribunal alcançar as conclusões que infra melhor se fundamentam (artigos 125.º, 127.º e 355.º, a contrario, do Código de Processo Penal). Vejamos de forma mais pormenorizada. O arguido afirmou que, à data dos factos – que sabe ter ocorrido no ano de 2022, em data que já não consegue precisar - exercia funções como perito na EMP03..., tendo sido convidado a deslocar-se à residência da ofendida, com a testemunha II, com vista a efectuar a peritagem, o que fez em substituição do perito HH. Nessa altura, constatou que a ofendida se encontrava “muito em baixo, triste e abatida”, dizendo “não ter sorte, que o pai das filhas a tinha abandonado, que as filhas estavam a estudar na universidade, que tinha mais dificuldades…”. Ao vê-la naquele estado, tentou acalmá-la, dizendo-lhe que “todos tínhamos maus momentos, que também se tinha divorciado, que ao início não é fácil, mas que como o tempo conseguimos chegar lá”, prometendo “que faria tudo o que estivesse ao seu alcance para a ajudar”. Aí a ofendida disse-lhe “se me ajudar até lhe pago um almoço”, ao que respondeu “nós depois vemos isso, vamos primeiro tentar com que isto seja aprovado”. Confirmou que, posteriormente, foi outra colega a casa da ofendida efectuar nova peritagem, a seu pedido, tendo o serviço (de reparação da moradia) sido adjudicado à empresa EMP01..., Lda., da qual é gerente, tendo sido acrescentado àquilo que elaborou a entrega de dois móveis de casa de banho. Admitiu que tivessem encetado contactos telefónicos, nomeadamente a ofendida, questionando-o quando daria início às obras. Só após ter obtido autorização pelos seus superiores voltou a contactar a ofendida, dizendo-lhe que “tinha boas notícias” pois havia ficado com o serviço, informando-a do dia em que iniciariam as obras, o qual agora já não tem memória. Nessa sequência, deslocou-se a casa da ofendida - o que terá ocorrido um ou dois dias antes de dar início às obras -, tendo aquela lhe entregue as respectivas chaves, as quais ia entregando aos colaboradores, mediante as suas deslocações Referiu que, contrariamente ao que havia sido decidido pela Companhia de Seguros, a ofendida solicitou-lhe se era possível proceder à pintura do quarto em vez de trocar os móveis e cerâmica do wc, ao que respondeu afirmativamente. Nessa sequência, procedeu à aquisição do material necessário – nomeadamente diluentes, vernizes, primário e a tinta, esta última escolhida pela ofendida -, tendo procedido, ainda, ao tratamento de algumas fissuras nas paredes e pintado, primeiramente, o quarto e depois o hall de entrada, as escadas e a sala. Instado, afirmou que comunicou tal alteração à Seguradora. Esclareceu que a intervenção nos wc’s ainda não podia ser feita e que por essa razão iniciaram a pintura, nos termos expostos. Admitiu ter-se deslocado por duas ou três vezes a casa da ofendida, sempre por força da obra. Negou que alguma vez estivesse estado sozinho com a ofendida, mas confirmou que chegou a abordá-la novamente quanto à existência ou não de almoço/jantar entre ambos e, ainda que a determinado momento percebeu que a ofendida pretendia pagar os tais serviços extra com um almoço/jantar. Deu a conhecer à ofendida que quando fosse efectuada a intervenção no chão e, bem assim, o tratamento das fissuras do quarto, não havia condições de o agregado ali permanecer. Aí a ofendida disse-lhe para não se preocupar, que tinha como se resolver, negando ter-lhe dito as palavras que constam da acusação pública. Referiu que a dado momento da obra, ficaram todos infectados com COVID, o próprio, os funcionários e a ofendida, o que necessariamente originou atrasos na obra. Avisaram esta última de tal situação, por email, tendo a mesma se mostrado bastante desagrada com o sucedido. Nessa altura, e com vista a evitar maiores delongas na obra, sugeriu-lhe que o taqueiro (que seria a último a entrar) começasse a efectuar o serviço, o que acabou por acontecer (por 2/3 dias). Após o taqueiro ter efectuado o serviço, e como necessitava de “fechar o processo”, deslocou-se a casa da ofendida para verificar o trabalho efectuado por aquele, altura em que o colaborador lhe devolveu das chaves da moradia. Quando já se encontrava na auto-estrada, recebeu um telefonema da ofendida a pedir-lhe para proceder à entrega das chaves, dizendo-lhe que apenas as entregaria no dia seguinte, pessoalmente, o que fez. Afirmou que a ofendida efectuou tal pedido alegando que, uma vez que não se iriam deslocar para a sua casa no dia seguinte, não necessitavam de ter as chaves. Disse que ofendida sempre esteve no interior de casa, pese embora lhe tenha entregue as chaves. Como a ofendida não permitiu que concluíssem a obra, a EMP03... deslocou-se ao local, fizeram um levantamento do que foi feito e do que ficou por fazer, propuseram à ofendida que a obra fosse realizada por outra empresa, o que esta não aceitou, tendo sido indemnizada do valor da obra. Nessa altura, não lhe foi permitida a entrada na residência. Esclareceu que o valor da indemnização concedida pela Companhia de Seguros à ofendida incluía o valor dos trabalhos por si efectuados, sendo que esta sempre recusou proceder ao seu pagamento. Afirmou que este processo apenas teve início após a emissão de uma factura por parte da sua empresa (cfr. fls. 210 verso), relativa aos trabalhos por si efectuados e cujo custo não foi arcado pela Companhia de Seguros, na medida em que não se encontravam no caderno de encargos (pintura e tratamento das paredes). Confirmou a presença de um indivíduo do sexo masculino na residência da ofendida, pelo menos, por uma vez. Afirmou que nunca esteve sozinho com a ofendida. Admitiu que falou com a mesma, via telefone, algumas vezes. Instado afirmou que o fez, mas sempre por motivos profissionais. Confessou que efectivamente num dos dias em que se deslocou ao local, a ofendida lhe ofereceu um copo de água, negando que a tivesse agarrado. Tem ideia de ter acompanhado a ofendida ao escritório, porque esta lhe queria mostrar que o número de contribuinte da empresa não constava na base de dados a que a mesma tinha acesso, tendo sido essa a única vez que com a mesma permaneceu sozinho. Instado afirmou que na altura da obra se deslocava à cidade ... com regularidade. Por seu turno, a demandante civil BB, afirmou que teve um sinistro em casa, tendo dado conhecimento à respectiva companhia de seguros, deslocando-se à mesma o aqui arguido (que foi em substituição do Sr. HH) acompanhado de uma senhora, para efectuar a peritagem. Nessa altura, o arguido disse-lhe “se isto correr bem vai ter de me pagar um jantar”. Esclareceu que, uns dias depois, se deslocou um novo perito à sua residência para realizar nova peritagem, tendo aditado algumas situações que não constavam da peritagem efectuada pelo arguido. Confirmou que, na altura da peritagem foi questionada se aceitava que as obras fossem realizadas pela empresa a indicar pela companhia de seguros, ao que respondeu afirmativamente, desde logo, porque estava com urgência na reparação e, bem assim, porque as anteriores intervenções tinham corrido de modo favorável. Referiu que no dia 06.05.2022, no início da tarde, o arguido se deslocou à sua residência para efectuar o “levantamento de obra”, tendo de imediato a questionado se se encontrava sozinha, ao que lhe respondeu que não, na medida em que as filhas se encontravam em casa. Frisou que o arguido “estava sempre a tentar assediá-la… tocando-lhe nas mãos, colocando as mãos no seu cabelo e elogiando-o”, pelo que, estranhando a sua atitude, lhe disse que se não parasse chamaria as filhas. Na altura em que se deslocaram ao wc, que se situa no piso superior, próximo dos quartos, para constarem as obras que necessitavam de ser efectuadas, o arguido agarrou-a por trás, abraçando-a, tirando uma foto de ambos, dizendo “ficamos muito bem juntos”. Nessa altura, esquivou-se, dizendo-lhe “pare com isso se faz favor”. A dado momento apareceu a filha, tendo-lhe dado a indicação para sair sem despedir, com o intuito de o arguido não perceber que iria ficar sozinha com ele em casa. Após ambos desceram para o piso inferior, para visualizar outro wc, altura em que o arguido lhe pediu um copo de água, porque “estava nervoso”. Quando lhe entregou o tal copo, o arguido voltou a agarrá-la na mão, altura em que lhe disse “se não muda o comportamento, não vai haver obra”, tendo o arguido afirmado que iria mudar de comportamento. Nesse mesmo dia, e à saída da residência, o arguido dirigiu-se à sua pessoa dizendo “temos de marcar um jantar”. Após o sucedido teve uma reunião com a testemunha DD. Marcou o início de obra para o dia 17 de Maio de 2022. No dia 13 do mesmo mês, o arguido contactou-a telefonicamente a perguntar se estava todo pronto para dar início à obra, tendo-lhe a ofendida dito que “se encontrava a desfazer as camas”, altura em que aquele lhe perguntou se necessitava de ajuda, ao que respondeu negativamente, afirmando que precisava de saber quando daria inicio à obra, sentindo-se, no entanto, incomodada com aquela abordagem. Ainda relativamente à entrada do taqueiro na obra, esclareceu que abordou o arguido no sentido de saber quando tal iria suceder, pois necessitava de procurar local para pernoitar com as filhas. Nessa altura, o arguido disse-lhe que “isso não era necessário…que poderia colocar as filhas a dormir com o pai, porque a cama dele tinha espaço para ela”. Afirmou ter-se sentido muito desconfortável com a abordagem do arguido, tendo-lhe dito para ter juízo. Em virtude da conduta do arguido, solicitou a um colega, a testemunha EE, que se deslocasse à sua residência, para que a mesma não permanecesse sozinha, convite a que este acedeu. No dia 17 de Maio, disse ao arguido que tinha uma pessoa e e que não gostava daquela abordagem ao que o arguido respondeu “que isso não o afectava, que não tinha ciúmes…e que ia continuar a tentar, pois poderia ter sorte”. Confirmou que o arguido ficou com as chaves da sua residência, pois a mesma poderia não estar em casa e os funcionários poderiam ter necessidade de aceder à mesma. No dia seguinte, e quando se dirigiu ao escritório, pois necessitava de mostrar um papel ao arguido, subiu a uma cadeira para alcançar uma capa de arquivo, desequilibrando-se, tendo o arguido lhe dito “podia ter pedido que eu amparava-lhe a queda”. Salientou que o arguido, entre ../../.... e Maio de 2022, a contactou, por telefone, inúmeras vezes, convidando-a para tomar café, dizendo-lhe que gostava muito do seu cabelo, que era muito bonita, que gostava muito dela, para ficar tranquila que a obra iria correr bem. Referiu que, por diversas vezes, disse que não gostava daquela abordagem, que não estava interessada, que estava numa relação. Num dos telefonas chegou a dizer que tinha saudades da sua voz. Instada, afirmou que durante a obra estiveram por diversas vezes sozinhos, e era aí que o arguido a tentava agarrar, fazer-lhe festas no cabelo/braços, o que terá acontecido, pelo menos três vezes. Confirmou que houve trocas nos trabalhos a realizar na sua moradia, mas dentro do orçamento indicado pela Companhia de Seguros, No fim de semana de 21/22 de Maio informou a Companhia de Seguros que prescindia dos serviços do arguido. O arguido dirigiu-se à sua residência, no dia 24/25 de Maio, altura em que o informou que já não o queria em obra e que tinha comunicado tal facto à Companhia de Seguros e, bem assim, para que o mesmo procedesse à devolução da chaves, o que só aconteceu por intermédio de terceiros. Aqui chegados, e antes de prosseguirmos com a análise da demais prova produzida nos autos, verificamos que foram apresentadas duas versões diametralmente opostas. Por um lado, a do arguido, que negou peremptoriamente que alguma vez tenha praticado os factos pelos quais se encontra acusado, justificando a pendência dos presentes autos como uma espécie de retaliação pelo facto de ter emitido uma factura em nome da ofendida pelos serviços que prestou na residência daquela, a qual se encontra junta a fls. 210 verso dos autos. Por outro, a da ofendida, que afirma que o arguido levou a cabo os actos nos termos supra expostos e que, como tal, a pendência destes autos nada tem que ver com a emissão da factura. Como se deu a entender em sede de audiência de julgamento, e sempre ressalvado melhor entendimento, não releva a circunstância de o arguido, ou a empresa na qual exerce gerência, ter ou não efectuado os trabalhos a que estava adstricto ou sequer de ser devido qualquer montante por parte da ofendida pela realização de trabalhos extra, salientando-se, desde logo, que a mera emissão de uma factura de per se não constitui ninguém devedor de outrem e, bem assim, que a própria ofendida não negou – e poderia tê-lo feito – que o arguido efectuou trabalhos a seu pedido, os quais, na sua versão, estariam cobertos pelo valor a ser suportado pela Companhia de Seguros. No mais, dúvidas não existem que efectivamente o arguido se deslocou por várias vezes a casa da ofendida, que a génese da primeira deslocação se prendeu com a realização de uma peritagem e que foram encetados vários contactos telefónicos entre ambos. Vejamos, agora, a demais prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento. A testemunha DD, cliente da ofendida, afirmou que, em data que já não consegue precisar, mas que presume ter ocorrido em Maio de 2022, quando se encontrava em reunião com a ofendida, esta mostrava-se nitidamente alterada. Entretanto, e após receber um telefonema da filha, desabafou com a testemunha, referindo que estava com obras em casa e que o responsável pela obra “estava a ter comportamentos menos próprios”. Instada, esclareceu que a ofendida lhe relatou que o mesmo lhe mandava “piropos” relativamente ao seu corpo e à sua forma física, tendo-lhe numa das vezes, tocado no braço, o que deixava desconfortável. Por seu turno, a testemunha EE, amigo da ofendida, afirmou aquando das obras, a ofendida o contactou dando-lhe conta do que havia sucedido, enquanto chorava e se mostrava bastante nervosa, pedindo-lhe para se deslocar à sua residência sempre que o arguido aí estivesse presente. Acedeu ao seu pedido, sendo que nesse mesmo dia, da parte da tarde, se cruzou com o arguido em casa da ofendida, o qual afirmou que iria dar início à obra, razão pela qual se deslocou à referida residência nos três dias seguintes. Referiu que a presença do arguido a deixava nervosa. Teve conhecimento, porque tal lhe foi contado pela ofendida, que o arguido a tentou agarrar, tentou tirar fotografias e a contactava telefonicamente, questionando se precisava de ajuda e de companhia. Mencionou que BB ainda hoje se sente “desrespeitada enquanto mulher” e que andava triste, revoltada e com dificuldades em dormir. Notou que a mesma sentiu vergonha ao partilhar o sucedido. Instado, esclareceu que a ofendida “não mandou o arguido embora porque queria que a obra terminasse”. Por fim, referiu que não assistiu a nenhum comportamento “estranho” por parte do arguido. A testemunha GG, mediador de seguros e pai da assistente, afirmou que só esteve na presença do arguido por uma vez, no mês de Outubro, quando “quando foi feito o fecho daquilo que a Companhia tinha de pagar”. Confirmou que a filha teve uma inundação na sua residência em 31.03.2022, contactando-o, tendo acompanhado todo o processo, funcionando como elo de ligação entre a filha e a Companhia de Seguros, não tendo presenciado nenhum dos factos alegadamente cometidos pelo arguido. Referiu que a filha lhe solicitou o afastamento da obra por parte do arguido, tendo alegado junto da Companhia de Seguros que tal se devia ao incumprimento na realização das mesmas. No entanto, perante a sua pessoa, confidenciou que o “arguido era abusador”, razão pela qual a testemunha lhe disse que tal circunstancialismo tinha que chegar ao conhecimento da companhia, tendo insistido com a filha para denunciar o sucedido quer junto da Companhia, quer junto dos tribunais. Salientou que a filha é muto emotiva e costuma resolver todos os seus assuntos, não se querendo expor ao ponto a que se expôs. A testemunha FF, filha da ofendida, afirmou que as obras em questão ocorreram em Maio do ano de 2022, sendo que permaneceram a residir na mesma morada, tendo a família se ausentado entre 5 a 7 dias, aquando da intervenção do taqueiro. Confirmou que a mãe tem escritório em casa e que, aquando dos factos, a mesma andava stressada, exausta e não dormia direito. Apenas teve conhecimento do sucedido posteriormente, na altura em que a mãe lhe contou que não se sentia segura com a presença do senhor que estava encarregue de realizar as obras, dentando vergonha e desconforto ao abordar a temática. A irmã incentivou a mãe a formalizar a queixa. Concatenando todo o exposto, verificamos que a tese apresentada pelo arguido não colheu. Isto porque, pese embora a queixa que deu origem estes autos tenha data posterior à da alegada emissão da factura – 22.05.2022 – a verdade é que, em momento prévio a tal circunstancialismo e contemporâneo às obras realizadas, a ofendida contou o sucedido quer à testemunha EE, que por essa razão se deslocou à sua residência e cuja presença foi corroborada pelo arguido, quer à testemunha DD, as quais descreveram o seu estado anímico em consequência do sucedido. Todas as testemunhas a que fizemos referência depuseram com isenção, credibilidade, objectividade e sem empolamento, logrando, deste modo, convencer o Tribunal como supra se explanou, razão pela qual não se atribuiu credibilidade à versão trazida pelo arguido. A testemunha II, afirmou que se deslocou à residência da ofendida, juntamente com o arguido, aquando da realização da peritagem. Instada, afirmou que a ofendida “estava normal”, não tendo abordado qualquer temática relacionada com a sua vida pessoal - o que se mostra em oposição com aquilo que foi relatado pelo arguido - confirmando que a mesma não estava acompanhada por nenhum individuo do sexo masculino. Desconhece se houve alguma conversa acerca de fazer outras obras “ou ir dormir fora”. A testemunha JJ, que no ano de 2022 prestava serviços para a sociedade gerida pelo arguido, afirmou que se deslocou à residência da ofendida durante 4 dias, efectuando serviço de pichelaria e tratamento das fissuras das paredes. Esclareceu que no primeiro dia viu lá um senhor a acompanhar a ofendida, sendo que nos outros dias não o viu. Referiu que levaram a chave da residência no primeiro dia, mas que nos dias que se seguiram era a ofendida quem lhe abria a porta, permanecendo na residência. Por fim, disse que nunca viu “nada de estranho” entre ambos. Assim, o afirmado pelas testemunhas arroladas pela defesa não abalou a convicção probatória nos termos supra espelhados. Atentamos, ainda, ao teor dos documentos juntos a fls. 10 a 20 e 53 a 61. As consequências da conduta do arguido na pessoa da ofendida, tal como elencadas em 35. e 36., para além de terem sido corroboradas pela própria e pelas testemunhas inquiridas em sede de audiência de julgamento, nos termos já expostos supra, afiguram-se-nos consentâneas com as mais basilares regras da experiência e da vida. Os factos relativos aos elementos intelectual e volitivo do dolo concernente à conduta do arguido foram considerados assentes a partir do conjunto das circunstâncias de facto dadas como provadas supra aliado às regras de experiência comum. Trata-se, é certo, de uma prova indirecta, mas a situação factual acima referida é suficientemente expressiva e abrangente para permitir afirmar, com segurança e segundo as máximas da experiência comum, a realidade de outro facto. Aliás, as situações de funcionamento da prova indirecta são inevitáveis no domínio da prova dos elementos da estrutura psicológica da vontade, com excepção, obviamente, de situações de confissão, pois o dolo é de natureza subjectiva e insusceptível de directa apreensão. As condenações judiciais sofridas pelo arguido resultam provados atento o teor do certificado de registo criminal junto a fls 189 a 192. Relativamente às condições socio-económicas, profissionais e familiares do arguido relevamos o teor das declarações prestadas pelo arguido, as quais, nesta parte, se nos afiguraram credíveis, porque não contrariadas por qualquer outro elemento de prova. * A tomada de posição quanto aos factos insertos em a) a c) resultou da ausência de prova que permitisse sustentar o aí vertido.3. Apreciação do recurso 3.1- O recorrente suscita a ocorrência de erro de julgamento da matéria de facto provada, pretendendo a alteração da sentença recorrida no que concerne aos pontos dos factos provados que indica. O erro de julgamento em matéria de facto ocorre quando o tribunal dá como provado um facto sem que se tenha feito prova do mesmo, ou quando dá como não provado um facto que deveria, em face da prova produzida, ter sido considerado como provado. O artigo 412º, nº 3, aI. a) e b), do CPP é claro ao estabelecer que quando o recorrente impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, assim como as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida. A especificação das “concretas provas” só se satisfaz com a indicação do conteúdo específico do meio de prova ou de obtenção de prova que impõe decisão diversa. Acresce que o recorrente deve explicar porque razão essa prova “impõe” decisão diversa. É este o cerne do dever de especificação, cfr. Paulo Pinto Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, 2ª edição, pág. 1131. No sentido de cumprir o referido ónus “…o recorrente deverá explicitar «por que razão essa prova “impõe” decisão diversa da recorrida. Este é o cerne do dever de especificação. O grau acrescido de concretização exigido pela Lei n.º 48/2007, de 29.8, visa precisamente impor ao recorrente que relacione o facto individualizado que considera incorretamente julgado (…)», cfr. Ac STJ de 18.02.2016, processo 9/13.4PATVR.R1.S1, publicado em www.dgsi.pt. Como se salientou no Ac. RE de 01.06.2008, processo 360/08-01, disponível em www.dgsi.pt, “ Impor decisão diversa da recorrida não significa admitir uma decisão diversa da recorrida. Tem um alcance muito mais exigente, muito mais impositivo, no sentido de que não basta contrapor à convicção do julgador uma outra convicção diferente, ainda que também possível, para provocar uma modificação na decisão de facto. É necessário que o recorrente desenvolva um quadro argumentativo que demonstre, através da análise das provas por si especificadas, que a convicção formada pelo julgador, relativamente aos pontos de facto impugnados, é impossível ou desprovida de razoabilidade. É inequivocamente este o sentido da referida expressão, que consubstancia um ónus imposto ao recorrente.” No mesmo sentido vide o Ac. RG de 11.07.2017, processo 376/11.4TACHV.G2, disponível em www.dgsi.pt, no qual se refere que “A especificação das “concretas provas” só se satisfaz com a indicação do conteúdo específico dos meios de prova ou de obtenção de prova e com a explicitação da razão pela qual impõem decisão diversa da recorrida. Exige-se, pois, que o recorrente refira o que é que nesses meios de prova não sustenta o facto dado por provado ou como não provado, de forma a relacionar o seu conteúdo específico, que impõe decisão diversa da recorrida, com o facto individualizado que se considera incorretamente julgado.”. Por outro lado, o nº4 do artigo 412 do CPP, estabelece que no caso de as provas terem sido gravadas, as especificações previstas na aI. b) do nº 3 se fazem por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no nº 3 do art.º 364º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação. É propósito do legislador com a referida norma delimitar claramente o âmbito do recurso interposto sobre a decisão a matéria de facto, em termos de o permitir apenas nos casos em que haja uma identificação do concreto erro de julgamento ocorrido, bem como dos específicos meios de provas que concretamente o demonstrem. O erro de julgamento da matéria de facto tem de ser especificamente apontado, com indicação dos factos concretos a que o mesmo se reporta e especificação das respetivas provas. Ora, tais requisitos são verdadeiramente essenciais para que este tribunal possa conhecer do mérito da impugnação da decisão da matéria de facto. No caso em apreço, o recorrente indicou concretamente os pontos de facto incorretamente julgados da sentença recorrida, que, no seu entender, deveriam ter sido considerados como não provados, cfr. artigo 412º, nº 3 al. a) do CPP. Outrossim, o recorrente indicou também, ao menos formalmente, as provas que, no seu entender, impõem decisão diversa da recorrida, cfr. artigo 412º, nº 3 al. b) e nº 4 do CPP. Porém, ao impugnar os referidos pontos dos factos provados da sentença recorrida, da leitura da motivação do recurso, sintetizadas nas conclusões, não há dúvida de que o que recorrente verdadeiramente questiona é a livre convicção do tribunal recorrido. O princípio da livre apreciação da prova encontra-se consagrado no artigo 127º do CPP, o qual estabelece que “Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.” Este princípio assume particular relevo na fase de julgamento. Se é certo que a convicção do juiz não pode ser puramente subjetiva, imotivável e por isso, o art.374.º n.º2 do C.P.Penal exige que a sentença contenha “uma exposição tanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito, que fundamentaram a decisão, com a indicação do exame crítico das provas que serviram para fundamentar a decisão do tribunal” também não se pode esquecer que a decisão do juiz é sempre uma convicção pessoal, «até porque nela desempenham um papel de relevo não só a atividade cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v.g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais» in Jorge de Figueiredo Dias, “Direito Processual Penal”, Coimbra Editora, edição 1974, pág.204. Ao princípio da livre apreciação da prova, estão intimamente associados os princípios da imediação e da oralidade. Na verdade, o juiz, mercê do contacto direto com a testemunha, ao valorar o seu depoimento tem de atender a vários aspetos que têm a ver, designadamente, com a razão de ciência, a imparcialidade, a espontaneidade do depoimento, as hesitações, as contradições, os gestos, etc. Ao tribunal de recurso compete sindicar a aplicação no caso concreto do princípio da livre apreciação da prova consagrado no artigo 127º do CPP. Para tanto, deverá socorrer-se da motivação em sede de matéria de facto da sentença, por forma a constatar o caminho percorrido pelo tribunal de primeira instância ao abrigo do disposto no artigo 374º, nº 2 do CPP. Contudo, conforme tem sido, unânime e repetidamente, sustentado pela jurisprudência[3] e doutrina[4], o recurso da matéria de facto visa a deteção do erro de julgamento em matéria de facto, constituindo um remédio jurídico e não um segundo julgamento, como se não tivesse ocorrido um julgamento anterior. As declarações prestadas pelo arguido, pelo assistente /ofendido e os depoimentos prestados pelas testemunhas estão sujeitos à livre apreciação da prova. A lei não diz que as declarações prestadas por uns prevaleçam sobre as declarações prestadas pelos outros. O seu valor probatório não é, pois, predeterminado ou tarifado, pelo que depende, nomeadamente, da sua consistência, da sua coerência ou da sua corroboração por outros meios de prova. No caso sub judice o arguido - que em audiência de julgamento negou a prática dos factos que lhe foram imputados, atribuindo a imputação que lhe foi feita a retaliação, vingança da ofendida por lhe apresentado fatura de fls. 210, constituindo a criação de um expediente a fim de se furtar ao pagamento - pretende que este Tribunal da Relação, enquanto tribunal de recurso, diferentemente do que fez o tribunal recorrido, credibilize as declarações por si prestadas e descredibilize as declarações prestadas pela ofendida, nas quais se baseou a sentença recorrida, ainda que conjugadamente com os depoimentos efetuados pelas testemunhas arroladas pela acusação. E, em consequência, seja acolhida a leitura que ele própria faz da prova, procedendo-se à alteração da matéria de facto provada nos termos que indica. O tribunal recorrido, pelo contrário, julgou convincentes as declarações prestadas pela ofendida e nos depoimentos efetuados pelas testemunhas arroladas pela acusação (não dando credibilidade ao declarado pelo arguido e aos depoimentos efetuados pelas testemunhas inquiridas em julgamento arroladas pela sua defesa) e explicou detalhadamente as razões de assim se ter convencido, por forma coerente e lógica, segundo as regras da experiência comum. Em casos como o presente, as provas indicadas pelo recorrente impõem decisão diversa quando, confrontadas com as provas que serviram para formar a convicção do tribunal, seja claro que outra teria necessariamente de ter sido a decisão, por ter sido violado o princípio da livre apreciação da prova. Isto é, que a decisão recorrida não respeitou os limites de tal princípio[5], designadamente, porque afronta manifestamente as regras da experiência comum, quer porque assenta em prova ilegal ou proibida ou no valor de determinados documentos. Mas já não assim se as provas indicadas pelo recorrente demonstrem apenas ser possível outra decisão. Ora, lendo a motivação da matéria de facto da sentença recorrida e ouvida a gravação da prova, designadamente as declarações prestadas pelo arguido, as declarações prestadas pela ofendida e os depoimentos efetuados pelas testemunhas inquiridas em julgamento (não apenas os excertos indicados), em conformidade com o disposto no artigo 412º nº6 do CPP, julgamos não assistir razão ao recorrente. Na verdade, depois de transcrever os excertos dos depoimentos que considera relevantes, refere o recorrente que: “Em síntese, vista/transcrita/analisada a prova produzida, na fração pertinente, emergente do relato feito, pode concluir-se, de plano, sem nenhum retardamento, por constituir referência matriz do presente recurso, o seguinte: - As declarações do arguido AA prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento foram indevidamente desvalorizadas pelo Tribunal na sua exacta dimensão; - Os depoimentos da ofendida/demandante BB, das testemunhas DD, EE, FF, filha da ofendida, GG e FF, produzidos em sede de audiência de discussão e julgamento e que são valorizados in totum não se alcançando o raciocínio que lhes preside em face do que infra se exporá; - A prova documental de fls. 10 a 20 e 53 a 61 não foi devidamente concatenada com o teor de fls. 210 verso; - Uma análise cuidada, sem omissões ou pré-juízos permite contextualizar o cenário ocorrido; - O relato dos factos trazida aos autos pelo arguido AA é o que melhor se compagina com o que na realidade sucedeu, concatenado com a demais prova coligida para os autos, mesmo apelando a critérios de verosimilhança e experiência comum, assim que a situação sub judice o reclame. - Os depoimentos/declarações dos supracitados sujeitos processuais, atento o circunstancialismo da matéria em causa nos presentes autos, devidamente conjugados com a valoração do teor da prova documental junta, maxime fls. 210 verso, devem merecer, ipso facto, adequadamente concatenados, diferente ponderação; e - tal circunstância deve, então, determinar, de forma inexorável, que se considerem não provados os factos retromencionados.” * Atente-se, hic et nunc, em jeito de sinopse, nas fragilidades/friabilidades da motivação dos factos que se transcreveram supra.Nótula Prévia: º Encontram-se em colisão duas versões diametralmente opostas – arguido vs ofendida – sendo certo que apenas estes têm conhecimento directo dos factos. Adentrando, º A tese da ofendida BB enferma de lacunas, contradições e perplexidades que resultam à saciedade do por si verbalizado quando conjugado com a prova por si arrolada, coincidente, em parte, com a do Ministério Público. º Afigura-se inusitado, mas conveniente para a versão da ofendida, que todas as testemunhas por si indicadas, incluindo a própria verbalizassem as datas concretas dos episódios atribuídos ao arguido, ESTANDO DECORRIDOS MAIS DE 2 ANOS DA SITUAÇÃO EM ANÁLISE! º É incompreensível que perante esta precisão desconheçam o valor recebido a título de indemnização e liquidado pela Seguradora. º Inexiste qualquer suporte probatório para aquilatar dos propalados elogios propalados pelo arguido, convites formais para jantar e muito menos de lugar para a ofendida na cama do arguido, sendo certo que, se existiu, torna-se premente contextualizar o mesmo de acordo com o vazado na acusação, qual seja, a ofendida questionou aquele onde poderia pernoitar. º Ninguém esclareceu quantas vezes foi o arguido a ..., número detelefonemas (vide declarações da testemunha EE), circunstancialismo do verbalizado, sendo inusitado que a ofendida confirme que uma das conversações foi bastante duradoura perante um indivíduo do qual tinha medo e receio. º A ofendida nem sequer confirma a tese da acusação quando declara que o alegado jantar, proposto pelo arguido, teve lugar antes da obra ser aprovada, colidindo com o facto de poder ter ocorrido em 18/4/2022. º As contradições adensam-se quando a dado passo a ofendida afirma que o arguido nunca comunicava via SMS, para em momento anterior revelar o conteúdo de uma, culimando com uma das suas filhas a verbalizar que a sua mãe lhe transmitiu que aquele lhe remetia mensagens deteorindecoroso, sendo certo que aacusação públicanem tal menciona… º A dúvida permanece perante o relatado pela ofendida, a testemunha EE e as suas filhas: A ofendida, peranteos comportamentos abusivos queatribui ao arguido, quis estar sozinha com o arguido, evitando a permanência das suas filhas quando este estava presente, ou procurou estar sempre acompanhada aquando da sua presença? Não se sabe… º É desafiador das mais elementares regras da experiência comum e da normalidade do acontecer a credibilização da tese da arguida pelos motivos que infra se expõem: - Quando o arguido e a ofendida encontravam-se no ... andar e o arguido, alegadamente, tentou agarrá-la e tendo esta conseguido fugir, afigura-se inverosímil, que momentos depois ainda lhe dê um copo de água, tendo medo e receio daquele! O pináculo do caricato traduz-se no facto de o arguido tentar novamente agarrar a ofendida com um copo na mão!? -Senutreesses sentimentos pelo arguido, vivencia esse status quo durante 18 dias, nunca tendo o expulsado de casa, não chamou as autoridades, nem sequer gritou, alertando as filhas, ou clamou por socorro em nenhuma das situações, prosseguindo, isso sim, com as visitas à habitação! º Por derradeiro, resulta conspícuo, conjugando o teor de fls. 210 verso – factura remetida pelo arguido para a ofendida – com a comunicação da arguida à Seguradora, isso sim, que a relação contratual entre as partes cessou em face de alegado incumprimento/atrasos do arguido na conclusão dos trabalhos, sendo a queixa crime apresentada APÓS A RECEPÇÃO DAQUELA POR PARTE DA OFENDIDA, sendo revelador do que lhe subjaz, qual seja, a criação de um expediente legal a fim de se furtar ao pagamento. º O devaneio e confusão dialéctica do Tribunal em sede de extracção de conclusões face à credibilização in totum dos depoimentos indirectos assume contornos surreais mediante o que alegadamente a ofendida lhes transmitiu na medida em que os relatos divergem. Com efeito, o arguido tentou agarrá-la, fazia-lhe festas nos braços e proferia piropos relativamente ao seu corpo e forma física, remetendo sms de conteúdo ofensivo, sendo que as aludidas testemunhas não coincidem no que a ofendida lhes terá dado a conhecer, conforme facilmente se extrai das transcrições supra!”. * A verdade é que a sentença recorrida, ao nível da fundamentação da matéria de facto encontra-se fundamentada por forma criteriosa, tendo a prova sido analisada de forma completa, lógica, e racional, segundo as regras da experiência comum. Nesta medida, ao contrário do sustentado pelo recorrente, não se vislumbra que os meios de prova tenham sido indevidamente valorizados ou desvalorizados. As regras da experiência e os critérios de normalidade não foram abundantemente /profusamente preteridos. O tribunal a quo, no seu prudente critério, beneficiando da imediação e da oralidade explicou, por forma detalhada, as razões de assim ter procedido, dizendo claramente as razões da sua decisão. Ou seja, porque se convenceu da veracidade do teor das declarações prestadas pela ofendida, e porque não lhe mereceram credibilidade as declarações prestadas pelo arguido, justificando a sua decisão. A tese aventada pelo recorrente segundo a qual a queixa apresentada pela ofendida constitui retaliação ou um expediente para se furtar ao pagamento da fatura de fls. 210 verso foi considerada e afastada na fundamentação da sentença recorrida, diga-se, com inteiro acerto segundo as regras da experiência comum, tendo-se referido que: “Concatenando todo o exposto, verificamos que a tese apresentada pelo arguido não colheu. Isto porque, pese embora a queixa que deu origem estes autos tenha data posterior à da alegada emissão da factura – 22.05.2022 – a verdade é que, em momento prévio a tal circunstancialismo e contemporâneo às obras realizadas, a ofendida contou o sucedido quer à testemunha EE, que por essa razão se deslocou à sua residência e cuja presença foi corroborada pelo arguido, quer à testemunha DD, as quais descreveram o seu estado anímico em consequência do sucedido.” Ao contrário do sustentado pelo recorrente, não se vislumbram quaisquer lacunas, contradições e incoerências relevantes no depoimento prestado pela ofendida, sendo que este depoimento, só por ter si prestado pela ofendida não pode deixar de ser considerado isento e imparcial. Por isso, é incompreensível a afirmação do recorrente segundo a qual “inexiste qualquer suporte probatório para aquilatar dos propalados elogios propalados pelo arguido, convites formais para jantar e muito menos de lugar para a ofendida na cama do arguido”. No contexto do confronto /avaliação efetuado pelo tribunal recorrido das declarações prestadas pelo arguido, com as declarações prestadas pela ofendida e os depoimentos efetuados pelas testemunhas EE e DD, a circunstância de as testemunhas indicadas pela ofendida conhecerem as datas dos episódios atribuídos ao arguido e desconhecerem o valor recebido e liquidado pela Seguradora constituem aspetos laterais e secundários, sem relevo bastante para inquinar ou descredibilizar os depoimentos prestados. Do mesmo modo assim se apresenta a questão da contabilização do número de dias que o arguido se deslocou a ... e do número de telefonemas do arguido para a ofendida. Acresce dizer que o comportamento da ofendida, perante os episódios descritos imputados ao arguido, podendo ter sido outro, não se mostra contrário às regras da experiência comum, designadamente nos relatos que fez às testemunhas DD e EE, acabano por prescindir dos serviços do arguido. O ato de julgar implica decidir e para decidir é necessário fazer escolhas racionalmente explicáveis. Não ofende as regras do direito probatório penal o facto de a convicção do tribunal se basear fundamentalmente nas declarações do ofendido. Como tem sido assinalado repetidamente pela jurisprudência (cfr. v.g. Ac. RG de 25.02.2008, processo 557/07-1disponível em www.dgsi.pt), nada obsta que o tribunal alicerce a sua convicção no depoimento de uma única pessoa, mesma até que essa pessoa seja o assistente, desde que tais declarações se lhe afigurem pertinentes e credíveis, uma vez que há muito deixou de vigorar a velha regra do “unus testis, testis nullius”, ultrapassado que está o regime da prova legal ou tarifada, substituído pelo princípio da livre apreciação da prova (artigo 127° do Código de Processo Penal). Conforme se refere no sumário do Ac. RE de 06.10.2015, processo 200/12.0GAGLG.E1, disponível em www.dgsi.pt I - Acreditar num depoente e não acreditar noutro é uma questão de convicção. Essencial é que a explicação do tribunal porque é que acredita naquele e já não acredita no outro seja racional e tenha lógica. II - Quem está numa posição privilegiada para avaliar essa credibilidade é o tribunal de primeira instância, que beneficiou da oralidade e da imediação que teve com a prova. III - Não visando o recurso em matéria de facto um novo julgamento, o recurso apenas deve constituir um remédio para os erros/vícios do julgamento em primeira instância, não podendo o tribunal de recurso, sem imediação e oralidade, limitar-se a sobrepor à do tribunal a quo a sua convicção sobre a credibilidade das pessoas ouvidas em audiência de discussão e julgamento” Acresce que “A verdade processual que se busca em processo penal não se confunde com a verdade ontológica. A verdade processual é o resultado probatório processualmente válido, isto é, a convicção de que certa alegação singular de facto é justificavelmente aceitável como pressuposto da decisão, por ter sido obtida por meios processualmente válidos. A verdade processual não é absoluta ou ontológica, mas uma verdade judicial, prática e, sobretudo, não uma verdade obtida a todo o preço mas processualmente válida”, cfr. Ac STJ de 03.10.2002, proc. n.º 45.931 - 5.ª Secção, relator Pereira Madeira. Noutros termos, segundo o Tribunal Constitucional, Ac. do TC n.º 198/2004 – DR II série, de 2/6/2004, a impugnação teria de se basear “na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objetivos que se apontam na convicção ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objetivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma, seria uma inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão”. A livre apreciação da prova, diferentemente do sistema da prova tarifada ou legal, consiste na possibilidade conferida ao tribunal de, entre as provas produzidas, poder escolher aquela ou aqueles de que se convença, segundo um raciocínio coerente, lógico segundo as regras da experiência comum. E, como se refere no Ac STJ de 11.07.2007, processo 07P1416, acessível em www.dgsi.pt, “O juiz aprecia a prova produzida – que se mede pelo seu peso e não pelo número –, dando conta na motivação dos resultados adquiridos e dos critérios adotados para justificar a decisão.” No caso vertente o julgador, apesar a negação dos factos pelo arguido e da explicação por ele dada para a imputação que lhe foi feita, logrou convencer-se da veracidade das declarações prestadas pela ofendida e fundamentou a sua convicção com base no princípio da livre apreciação da prova, segundo as regras da experiência comum, de forma lógica e coerente. Ao recorrente assiste o direito de discordar da convicção em matéria de facto alcançada pelo julgador, mas não lhe basta demonstrar que outra convicção era também possível. Com efeito, no sentido de obter ganho de causa, o recorrente tem o ónus de demonstrar que ocorreu erro de julgamento, o qual apenas se verifica se as provas que indicar impuserem decisão diversa da recorrida. Ora, como bem se refere no Ac. RG de 20.03.2006, processo 245/06-1, acessível em www.dgsi.pt, quando o ataque à decisão da matéria de facto é feito pela via da credibilidade que o tribunal de primeira instância deu a determinados depoimentos pressuporia a revogação pela Relação da norma do art. 127 do CPP, a que os tribunais devem, naturalmente, obediência e que manda que o Juiz julgue segundo a sua livre convicção. “O princípio da livre apreciação da prova não é posto em causa quando o Tribunal funda a sua opção probatória de forma sustentada e justificada, de um modo consistente e que permite perceber qual a escolha efetuada, porquê esta opção e não aquela e isso se mostra coerente em todo o percurso analítico efetuado”, como sucede no caso destes autos”, cfr. Ac. RC de 05.05.2010, processo 125/08.4TASPS.C1, acessível em www.dgsi.pt. Por conseguinte, os aspetos evidenciados pelo recorrente, ao contrário do por ele defendido, não contrariam de forma ostensiva as regras da experiência comum, pelo que, por esta via, não têm a virtualidade de impor uma decisão diversa da decisão recorrida, nos termos do disposto na alínea b) do nº 3 do artigo 412º do CPP. Invoca também o recorrente, a título subsidiário, em defesa da sua tese recursiva quanto aos factos que impugna suscetíveis de integrar a pratica do crime pelo qual foi condenado em primeira instância, a violação do princípio do in dubio pro reo com fundamento, no essencial, que: “(…) no caso em pauta, os factos foram dados como provados indevidamente, pois que se mostram copiosamente não demonstrados. Ou seja: é incontroverso que os factos surgem assentados de modo desarrazoado, sendo certo que o Tribunal a quo se limitou a observar/seguir, de forma espúria e acrítica, o que constava da acusação. À vista do aduzido, é notório que, nos presentes autos, foi pelo menos criada uma claríssima dúvida razoável, insanável e insuperável no que concerne aos factos que foram erroneamente dados como provados, que, no consectário, deviam estribar a absolvição do arguido, nos termos pugnados, relativamente ao crime de importunação sexual. Dessarte, tais dúvidas, por força do princípio in dubio pro reo, não podiam deixar de ser valoradas a favor do arguido.”. (…) Concluindo: o tribunal a quo, condenando o Recorrente, da forma como o fez, no que tange ao crime de importunação sexual, NÃO “interpretou” adequadamente o disposto no n.º 2 do artigo 32.º da CRP, configurando uma inconstitucionalidade material, o que aqui expressamente se invoca.” No sobredito contexto, a invocação por parte do recorrente do princípio do in dubio pro reo[6] carece totalmente de sentido. O aludido princípio, sendo uma decorrência do princípio da presunção de inocência do arguido previsto no artigo 32º, nº 2 2ª parte da CRP, tem o significado de que o juiz quando não tiver a certeza sobre a ocorrência de factos relevantes que prejudiquem o arguido, e subsistir a dúvida, deverá decidir em favor do arguido[7]. Mas, nesse caso, terá de ser uma dúvida razoável, inultrapassável, que impeça a convicção do tribunal[8]. Como é sabido, em processo penal não existe um ónus da prova que impenda sobre os sujeitos processuais, devendo o tribunal investigar autonomamente o caso submetido a julgamento. Nas palavras de Figueiredo Dias[9] “À luz do princípio da investigação, bem se compreende, efetivamente, que todos os factos relevantes para a decisão (…) que, apesar de toda a prova recolhida, não possam ser subtraídos à «dúvida razoável» do tribunal, também não possam considerar-se como «provados». E se, por outro lado, aquele mesmo princípio obriga em último termo o tribunal a reunir todas as provas necessárias à decisão, logo se compreende que a falta delas não possa, de modo algum, desfavorecer a posição do arguido: um non liquet na questão da prova (…) tem de ser sempre valorado a favor do arguido”. A violação do in dubio pro reo ocorre, nomeadamente, quando o tribunal tendo ficado com dúvidas sobre factos relevantes, mesmo assim, tenha decidido contra o arguido, pelo que, nesta hipótese - como tem sido salientado pela jurisprudência, nomeadamente, do STJ[10] enquanto tribunal de revista - tal como os vícios da sentença do artigo 410º do CPP, o estado de dúvida do julgador terá de resultar do texto da sentença, por si ou conjugadamente com as regras da experiência comum, sendo o caso suscetível de configurar erro notório na apreciação da prova do nº 2 al. c) do artigo 410º do CPP. Mas, a violação do princípio do in dubio pro reo pode ser analisado em duas perspetivas consoante o estado de dúvida que se considere relevante, ou seja, a dúvida subjetiva sentida pelo tribunal, ou a dúvida em sentido objetivo, não se exigindo, neste caso, a dúvida subjetiva ou histórica, para que possa ocorrer a sua violação[11]. Neste último sentido (dúvida em sentido objetivo), que é em nosso entender o claramente perfilhado pelo legislador, ocorre violação do princípio do in dubio pro reo na hipótese de o tribunal recorrido considerar como provados factos relevantes desfavoráveis que prejudiquem o arguido relativamente aos quais, numa análise racional, objetiva e criteriosa da prova, se impunha que tivesse dúvidas inultrapassáveis. Por isso, diferentemente do que sucede no caso do STJ enquanto tribunal de revista, o Tribunal da Relação conhece de facto e de direito, cfr. artigo 428º do CPP. E, sendo assim, mesmo que a violação do princípio in dubio não resulte do texto da decisão recorrida, só por si ou conjugada com as regras da experiência comum, enquanto erro notório na apreciação da prova da al. c) do n.º2 do artigo 410.º do C.P.P., pode a mesma ser detetada no âmbito de impugnação ampla da decisão proferida sobre a matéria de facto. Nesta conformidade, faz todo o sentido afirmar-se que pode acontecer que o tribunal recorrido considere, expressa ou implicitamente, não ter tido dúvidas, quando deveria tê-las,[12] ocorrendo, neste caso, um vício na formação da convicção do tribunal. Nesta hipótese, deverá a questão ser a analisada no âmbito de uma eventual violação do princípio da livre apreciação da prova do artigo 127º do CPP[13], tendo presente, nomeadamente, a possibilidade de violação das regras da experiência comum, isto evidentemente caso tenha sido impugnada, por forma ampla, a matéria de facto. No caso vertente - em que foi impugnada, por forma ampla, a matéria de facto provada – o tribunal recorrido não teve dúvidas de que o arguido, aqui recorrente, praticou os factos considerados provados objeto de impugnação no presente recurso. A simples leitura da fundamentação de facto da sentença recorrida é clara a este propósito, tendo o tribunal recorrido explicado e evidenciado, as razões porque se convenceu de que o arguido praticou os factos. Ou seja, repete-se, com base fundamentalmente na credibilidade que atribuiu ao depoimento prestado pela ofendida. E não é pelo facto de existir contradição entre, por um lado, o declarado pela ofendida e, por outro, o declarado pelo arguido que ocorre violação do in dubio pro reo. Assim, o tribunal recorrido não teve dúvidas e não as tinha que as ter tido, porquanto logrou convencer-se, em função de juízos de normalidade segundo as regras da experiência comum, do depoimento efetuado pela ofendida, donde resulta não ter sido violado o princípio da presunção de inocência do arguido e do in dubio pro reo, previstos no artigo 32º, nº 2 da CRP, não tendo, pois, sido cometido a inconstitucionalidade invocada. O que quer dizer que, no caso em análise, a prova produzida e examinada em audiência de julgamento suporta perfeitamente a convicção que dela formou o tribunal recorrido, sem que tenham ocorrido, consequentemente, qualquer erro ou atropelos às regras legais de apreciação da prova. Em síntese de tudo o que deixamos dito, a decisão recorrida está devidamente fundamentada, tendo sido claramente explicitados, sendo por isso perfeitamente percetíveis, os motivos da convicção alcançada pelo tribunal. Por outro lado, os aspetos evidenciados pelo recorrente não têm a virtualidade de impor decisão diversa da proferida, não se verificando, pois, erro de julgamento da matéria de facto. Nesta conformidade, nesta parte, o recurso não pode lograr procedência. 3.2- O recorrente insurge-se contra a qualificação jurídica dos factos como integrando a perpetração de um crime de importunação sexual previsto e punido pelo artigo 170º do CP, porquanto, em síntese, não são subsumíveis a atitudes de constranger a ofendida a contactos de natureza sexual, nem consubstanciam propostas de teor sexual, inexistindo sustentação para afirmar a intenção do arguido em satisfazer o seu prazer sexual, lesando a liberdade sexual da ofendida. Porém, também quanto a este ponto não assiste razão ao recorrente. Efetivamente, comete o crime de importunação sexual previsto e punido pelo artigo 170º do Código Penal “Quem importunar outra pessoa, praticando perante ela atos de carácter exibicionista, formulando propostas de teor sexual ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual…”. A importação sexual para ter relevância típica tem de revestir, pelo menos, uma das três formas previstas na lei, a saber: prática perante ela de ato de carácter exibicionista; a formulação de proposta de teor sexual; e o constrangimento a contacto de natureza sexual. “A criminalização da conduta de formulação de propostas de teor sexual dá-se pela Lei 83/2015, de 05/08 que visou dar cumprimento ao art.º 40º da Convenção de Istambul, sob a epígrafe «assédio sexual», e rompe com um status quo de tolerância em relação a um certo estereótipo de comportamento essencialmente masculino culturalmente enraizado, que choca com os valores adotados pelas sociedades hodiernas da igualdade de género e da luta contra todas as formas de violência, em especial sobre as mulheres.”, cfr. Ac. RL de 20.02.2024, processo 524/20.3PCRGR.L1-5, disponível em www.dgsi.pt. Como bem se assinalou no Ac. RE de 10.10.2023, processo 113/22.8T9EVR.E1, disponível em www.dgsi.pt, “A lei exige, sendo elemento do tipo de crime, a formulação de uma proposta (um convite) a um ato de natureza sexual, e que a conduta do agente efetivamente importune a vítima (“quem importunar outra pessoa…”) - cause uma perturbação do estado psíquico da vítima por ela sentida como negativa e / ou indesejada.”. Mas “Não se exige o envolvimento da vítima na execução corporal de um ato sexual, ao contrário do que se passa com outros crimes de natureza sexual, bastando-se com a receção, por parte desta, de atos comunicativos de teor sexual.” O constrangimento a contacto de natureza sexual consiste, pois, apenas uma das modalidades da ação típica. “A formulação de propostas de teor sexual inclui palavras ou sons exprimidos ou comunicados pelo agente, tais como piadas, questões, considerações, exprimidas oralmente ou por escrito, bem como expressões ou comunicações do agente que não envolvam palavras ou sonos, como por exemplo, expressões faciais, movimentos com as mãos ou símbolos”, cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código Penal, UCE,5ª ed., 2022, pág. 758. O tipo subjetivo admite qualquer forma de dolo – artigo 14º, do Código Penal. Feitas estas considerações e atenta a factualidade provada, é manifesto que estão preenchidos os elementos objetivos do crime na modalidade de proposta de natureza sexual. Efetivamente, como foi referido com inteiro acerto na sentença recorrida “O arguido não se limitou, pois, a dizer que a ofendida era bonita. O arguido, aproveitando-se sempre do facto de se encontrar sozinho com aquela e no interior da sua residência, agarrou a ofendida, pelo menos três vezes, tocou no seu corpo, no seu cabelo, disse-lhe “que tinha lugar na cama dele”, conduta que manteve mesmo após a ofendida lhe dizer que não estava interessada, que tinha uma pessoa e que pedir para cessar aqueles comportamentos, pelo que entendemos que se mostram preenchidos os elementos objectivos do tipo de ilícito em análise. Mais se provou que com os comportamentos descritos, o arguido agiu, de forma reiterada e incessantemente, com o intuito de estabelecer contactos físicos com a ofendida, mesmo contra a sua vontade, e de a constranger a aceitar os seus convites para ir jantar e tomar café, indiferente ao facto de não haver uma qualquer relação entre os mesmos, nem mesmo de amizade, tão só um relacionamento no âmbito dos serviços prestados pelo arguido e aos pedidos da ofendida para que parasse com tais comportamentos. Provou-se, ainda, que o arguido agiu de modo livre, voluntário e consciente, com o propósito de satisfazer o seu prazer sexual, lesando a liberdade sexual da ofendida, aproveitando-se do facto de ter acesso à habitação da ofendida em virtude das funções que exercia e actuando sempre nos momentos em que os mesmos se encontravam sozinhos. E, por fim, resultou assente que com a sua conduta o arguido provocou medo e constrangimento na ofendida e fê-lo no interior da sua habitação, espaço mais íntimo da mesma, onde se deveria sentir segura, livre e confortável, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas por lei e criminalmente punidas.” Ora, é incompreensível a tese recursiva do recorrente relativamente a este segmento do recurso, na medida em que é manifesto que conduta do arguido para com a ofendida, considerada como provada na sentença recorrida, integra os elementos típicos (objetivo e subjetivo) do tipo legal de importunação sexual na modalidade de formulação de proposta de teor sexual. Assim, e ao contrário do defendido pelo recorrente, mantém-se a sua condenação pela prática do aludido tipo legal de crime e, em consequência, no pagamento à ofendida da quantia de mil euros como compensação pelos danos não patrimoniais por ela sofridos. Por conseguinte, improcede também nesta parte o recurso. 3.3- O recorrente pugna pela aplicação de uma pena de multa (pena principal) por entender que esta se revela suficiente para realizar as finalidades da punição, face à integração social e familiar do arguido, ao facto de o bem jurídico protegido ser diferente dos tipos legais de crime pelos quais foi anteriormente condenado, sendo os factos destes autos de 2022 e os seus antecedentes criminais por factos ocorridos em 2016 e 2017. Analisando. A aplicação de penas visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, sendo que a medida da pena não poderá exceder a medida da culpa - artigo 40º, nº 1 e 2, do Código Penal. Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição – artigo 70º do CP. Quer isto dizer, que sempre que o tribunal entender que as finalidades de prevenção geral e especial se encontram suficientemente acauteladas com a simples pena de multa, deve esta ser aplicada em detrimento da pena de prisão. Com efeito, são as finalidades exclusivamente preventivas, especiais e gerais, que justificam a preferência por uma pena alternativa à de prisão, cfr. Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime, Coimbra Editora, pág. 331. Conforme defendido por este ilustre professor[14], são as necessidades de prevenção especial de socialização que prevalecem sobre a escolha do tipo de pena aplicar e que justificam, numa perspetiva político-criminal, todo o movimento de luta contra as penas privativas da liberdade. Só nas situações em que o tribunal considerar que a pena de prisão se revela necessária ou conveniente à ressocialização do arguido é que deverá afastar a aplicação da pena de multa. Quanto à prevenção geral na determinação do tipo de pena a aplicar, ela apenas atuará sob a forma de conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico. Isto é, sempre que das circunstâncias do caso resultar que a aplicação de uma pena não detentiva é possível, ela só não será aplicada caso se entenda que a pena de prisão é absolutamente necessária à proteção de bens jurídicos e à estabilização das expectativas da comunidade na validade das normas. No caso em apreço, relativamente à questão da escolha da pena, a efetuar, nos termos do disposto no artigo 70º do CP, na sentença recorrida referiu-se que: ”(…) verificamos que o arguido, à data da prática dos factos em análise, já havia sido condenado pela prática de um crime de injúria, um crime de ofensa à integridade física e um crime de violência doméstica, não denotando qualquer arrependimento, nem juízo de auto-censura quanto aos factos tidos por provados, razão pela qual entendemos que a aplicação de uma pena não detentiva da liberdade já não assegura de forma eficaz as necessidades da punição que, no caso, se fazem sentir, pelo que se opta por uma pena de prisão.” Ora, pese embora a argumentação do recorrente, julgamos acertada a escolha da pena de prisão em detrimento da pena de multa efetuada na sentença recorrida. Na verdade, a integração social e familiar do arguido, pese embora a sua condenação por três tipos legais de crime de natureza diversa, não o impediram de ter praticado os factos destes autos. Assim, face às duas anteriores condenações sofridas pelo recorrente, aliado ao facto de não ter interiorizado o desvalor das suas condutas, a opção por uma pena de multa não teria o efeito preventivo desejado no comportamento futuro do arguido. Acresce dizer que, no sobredito contexto, a opção pela pena de multa seria também sentida pela comunidade como ineficaz para proteção do bem jurídico atingido. Por conseguinte, por razões de prevenção geral e especial, bem andou o tribunal recorrido na escolha que fez ao ter decidido aplicar pena de prisão em lugar de pena de multa. Nesta conformidade improcede este ponto do recurso. 3.4- O recorrente suscitou a nulidade da sentença recorrida com fundamento em o tribunal recorrido não ter equacionado e afastado a aplicação das penas de substituição de multa ou da prestação de trabalho a favor da comunidade, nos termos do disposto nos artigos 45º e 58º do CP e no artigo 379º, nº 1 al. c) do CPP. Vejamos. O artigo 379.°, n.º 1, al. c), 1.ª parte, do CPP, estatui que é nula a sentença quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, sendo tal disposição correspondentemente aplicável aos acórdãos proferidos em recurso, por força do n.º 4 do artigo 425.° do mesmo diploma. A omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, significa, a ausência de posição ou de decisão do tribunal sobre matérias em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa. Tais questões são aquelas que os sujeitos processuais interessados submetem à apreciação do tribunal as que sejam de conhecimento oficioso, de que o tribunal deva conhecer independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual. Acresce que, conforme entendimento consolidado da jurisprudência, a pronúncia cuja omissão determina a nulidade da sentença deve incidir sobre os concretos problemas, as questões específicas sobre que é chamado a pronunciar-se o tribunal (o thema decidendum), e não sobre motivos ou argumentos, cfr. por todos Ac. STJ de 15.12.2011, processo 17/09.0TELSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt. No caso vertente, não pode subsistir dúvidas de que, tendo o tribunal recorrido decidido aplicar ao arguido a pena de 4 meses de prisão, tinha obrigatória de se de ter pronunciado sobre a possibilidade de, no caso concreto, a pena ser substituída por pena de substituição não detentiva ou não privativa da liberdade. E isso é assim porque, tendo em conta a medida da pena de prisão aplicada, a lei prevê tal possibilidade, substituindo a prisão por multa (artigo 45º do CP), pela suspensão da execução da pena de prisão (artigo 50º do CP) ou ainda pela prestação de trabalho a favor da comunidade (artigo 58º do CP). De facto, é consensual na jurisprudência o entendimento de que “O tribunal não é livre de aplicar ou deixar de aplicar tal pena de substituição ou qualquer outra, pois não detém uma faculdade discricionária; antes, o que está consagrado na lei é um poder/dever ou um poder vinculado, tal como sucede com a suspensão da execução da pena, pelo que, uma vez verificados os respetivos pressupostos, o tribunal não pode deixar de aplicar a pena de substituição. Não o fazendo comete a nulidade prevista no art. 379.º, n.º 1, alínea c) do CPP”, cfr. Ac. RC de 10.02.2010, processo 113/09.3GTCTB.C1, disponível em www.dgsi.pt. No mesmo sentido, vide v.g. Ac RC de 09.03.2016, processo 506/10.3GBLSA.C1, também disponível em www.dgsi.pt. Outrossim, no seguimento dos ensinamentos de Figueiredo Dias, como bem se refere no Ac RP de 07.04.2016, processo 557/04.7GAPRD.P1 “…o legislador não estabelece uma hierarquia entre as penas de substituição, - para além da gradação que estabeleceu em função da pena principal a substituir, pelo que será em função dessa gradação e dos critérios de adequação e suficiência da pena de substituição, em face dos fins das penas, e das necessidades de prevenção especial (positiva) de reinserção social, e é tendo presente o comando ínsito no artº 18º1 CRP (principio da proporcionalidade e da menor restrição) que deve ser escolhida a pena de substituição (mormente entre duas igualmente adequadas deve optar-se pela pena de substituição não detentiva) que constituiu também o princípio ínsito no artº 70º CP quanto às penas principais (prisão e multa) – e daí em concreto apurar a mais adequada (cf. Figueiredo Dias As Consequências jurídicas do crime, pág. 333), Neste sentido e por forma a que não incorra em omissão de pronúncia, a sentença não tem necessariamente que referir-se especificamente a cada uma das penas de substituição abstratamente aplicáveis, desde que da respetiva fundamentação resulte, de forma clara, que o tribunal considerou ser absolutamente necessária a execução da pena de prisão, ou, não sendo esse o caso, a pena de substituição escolhida, de entre as abstratamente aplicáveis, era a única adequada, ficando consequentemente excluída a aplicação ao caso concreto as demais penas de substituição. O essencial é que o tribunal, uma vez determinada a medida concreta da pena de prisão, não deixe de equacionar a possibilidade de aplicar, de entre a panóplia das penas de substituição abstratamente aplicáveis, aquela que se mostre mais adequada, o que deverá resultar da fundamentação da sentença. Assim se decidiu, v.g., no Ac. RL de 25.10.2011, processo 96/10.7PTFUN.L1-5, disponível em dgsi.pt, com o seguinte sumário: “Iº A circunstância da sentença não mencionar expressamente cada uma das penas de substituição que seriam abstratamente aplicáveis, percorrendo exaustivamente o catálogo legal, não determina a verificação do vício de omissão de pronúncia, desde que, da fundamentação apresentada, resulte com toda a clareza que o tribunal considerou imperioso o cumprimento efetivo da pena de prisão, afastando a aplicação de qualquer pena de substituição, em sentido próprio ou impróprio;IIº Não resultando esse circunstancialismo da fundamentação, a falta de ponderação da possibilidade de substituição da pena de prisão, nos casos em que é admissível, constitui nulidade por omissão de pronúncia, nos termos da al. c, do nº1, do art.379, do Código de Processo Penal”. No mesmo sentido vide Ac. RL de 17.04.2012, processo 82/11.0SOLSB.L1-5, também disponível em www.dgsi. Revertendo o que fica dito para o caso em apreço, verifica-se que, na sentença recorrida, em sede de escolha da pena, tendo em conta o disposto no artigo 70º do CP, uma vez que o crime cometido pelo arguido é punível com pena de prisão ou multa, ou seja, no estrito âmbito da escolha da pena (principal) de prisão ou multa, encontra-se devidamente fundamentada a escolha da pena de prisão em detrimento da pena de multa. Na verdade, no referido âmbito, foi referido que: ”(…) verificamos que o arguido, à data da prática dos factos em análise, já havia sido condenado pela prática de um crime de injúria, um crime de ofensa à integridade física e um crime de violência doméstica, não denotando qualquer arrependimento, nem juízo de auto-censura quanto aos factos tidos por provados, razão pela qual entendemos que a aplicação de uma pena não detentiva da liberdade já não assegura de forma eficaz as necessidades da punição que, no caso, se fazem sentir, pelo que se opta por uma pena de prisão.” Seguidamente, na sentença, foi determinada a medida concreta da pena de prisão, a qual foi fixada em 4 meses. Após o que, partiu-se para a análise da substituição da referida pena de 4 meses de prisão pela pena (autónoma) de suspensão da execução da referida pena de prisão. Assim, considerando a fundamentação da sentença, concluiu-se, desde logo, pela desnecessidade de execução da pena de prisão, substituindo a pena de 4 meses de prisão pela pena de substituição de suspensão da sua execução, pelo período de um ano, com imposição de deveres. Mas, o certo é que, tendo-se concluído pela desnecessidade de execução da concreta pena de 4 meses de prisão, outras penas de substituição em sentido próprio existem para além da pena de suspensão de execução da pena de prisão, sendo que, no caso concreto, da fundamentação aduzida não resulta excluída, por forma expressa ou implícita, a possibilidade da sua aplicação, nomeadamente da pena de substituição por multa (artigo 45º do CP) e da pena de substituição de trabalho a favor da comunidade (artigo 58º do CP). Com efeito, na sentença recorrida nada é referido expressamente porque razão foram afastadas estas penas de substituição. Poder-se-ia dizer que, uma vez que foi afastada a aplicação da pena de multa a título de pena principal com fundamento nos antecedentes criminais e na ausência de sentido critico do arguido relativamente à sua conduta, ao menos por forma implícita, ficaria excluída a aplicação da pena de multa de substituição. Todavia, tal argumento não colhe, porque, em termos dogmáticos, a pena principal de multa e a pena de multa de substituição da pena de prisão são distintas, obedecendo a sua aplicação, por isso, a critérios também distintos e, em caso de incumprimento, as consequências são diversas. Como bem refere Maria João Antunes[15], no seguimento, aliás, dos ensinamentos de Figueiredo Dias[16], “São (…) distintos os critérios que conduzem a preferência de multa principal e os que levam à escolha da pena de multa de substituição. No primeiro caso, o critério é o da conveniência ou da maior ou menor adequação da pena, ao passo que no segundo o critério é o da necessidade da pena. Assim se compreendendo que que o tribunal possa, numa primeira operação, escolher a pena de prisão em detrimento da pena de multa (principal) e acabe por escolher a pena de multa (de substituição) na última operação. Por outro lado, a opção pela pena de prisão, em detrimento da multa alternativa (pena principal), pode revelar-se mais vantajosa do ponto de vista preventivo-especial, uma vez que fazendo esta opção o tribunal poderá ter depois, em sede de substituição da pena de prisão não superior a cinco anos, um leque alargado de penas não privativas da liberdade. Além de que é distinto o regime de execução da pena de multa principal e da pena de multa de substituição…” Por conseguinte, nada foi referido na sentença recorrida acerca da não aplicação da pena de multa de substituição. Acresce que a sentença é também completamente omissa sobre a não aplicação da pena de substituição de trabalho a favor da comunidade, a qual é, certo, depende da aceitação do condenado, o qual não se encontra comprovado nos autos, cfr. nº 5 do artigo 58º do CP. Poderíamos ainda ser levados a crer que, tendo sido substituída a pena de prisão pela pena de substituição de suspensão da execução da pena de prisão, o julgador teria entendido que esta era a única pena de substituição adequada ao caso concreto - donde decorreria implicitamente o afastamento das demais penas de substituição abstratamente aplicáveis – mas também tal consideração não consta da fundamentação da sentença recorrida. Na verdade, a fundamentação aduzida até se poderá levar a entender o contrário, como decorre da seguinte passagem: “(…) considerando que o arguido se encontra profissional e familiarmente inserido e nunca cumpriu pena de prisão, entendemos que a advertência que constitui a condenação numa pena de quatro meses de prisão – associada à condição que adiante se explanará – será, quanto a nós, um factor mais do que suficiente, de acordo com um juízo normal de prognose, de que no futuro se abstenha da prática de condutas delituosas.” (sublinhado nosso). Por isso, julga-se, assim, que a sentença recorrida incorreu no vício de omissão de pronúncia, determinante da nulidade da sentença prevista na alínea c), do n.º 1, do artigo 379.º do C.P.P., que ocorre quando a sentença é omissa por falta de tomada de posição quanto às questões cujo conhecimento a lei impõe, ou seja, às questões de conhecimento oficioso e àquelas cuja apreciação é solicitada pelos sujeitos processuais – cfr. o artigo 608.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi do artigo 4.º do CPP. Nesta conformidade, não tendo sido ponderada, no sentido no seu afastamento, a aplicação no caso concreto, da pena de substituição por multa (artigo 45º do CP) e da pena de substituição de trabalho a favor da comunidade (artigo 58º do CP), a sentença, nesta parte, é nula por omissão de pronúncia. Por isso, o processo terá de baixar à 1.ª instância para que se proceda à elaboração de nova sentença, por forma a emitir pronúncia sobre a substituição da pena de 4 meses de prisão por multa e pela pena de trabalho a favor da comunidade nos termos sobreditos. Na nova sentença se ponderará a possibilidade de substituição da pena de prisão pelas penas de substituição referidas legalmente previstas e não conhecidas na fundamentação da sentença, optando-se, a final, por uma delas, se for caso disso, ou justificando-se a sua não aplicação. Nos termos expostos, procede este segmento do recurso, ficando, consequentemente, prejudicado o conhecimento do mais suscitado pelo recorrente. III – DISPOSITIVO Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo arguido, em consequência do que se decide: 1) Declarar nula a sentença recorrida, por omissão de pronúncia, por não ter sido ponderada a aplicação, no caso concreto, da pena de substituição por multa (artigo 45º do CP) e da pena de substituição de trabalho a favor da comunidade (artigo 58º do CP), em conformidade com o disposto no artigo 379º, nº 1 al. c) do CPP. Em consequência, determina-se que o processo baixe à primeira instância para que se proceda à elaboração de nova sentença, por forma a emitir pronúncia sobre a substituição da pena de 4 meses de prisão por multa e pela pena de trabalho a favor da comunidade nos termos sobreditos. Na nova sentença se ponderará a possibilidade de substituição da pena de prisão pelas penas de substituição referidas legalmente previstas e não conhecidas na fundamentação da sentença, optando-se, a final, por uma delas, se for caso disso, ou justificando-se a sua não aplicação; e 2) Julgar prejudicado o conhecimento do mais suscitado pelo recorrente e não apreciado neste acórdão. Sem custas – artigo 513º, nº 1 do CPP. Notifique. Guimarães, 10 de julho de 2025 Texto integralmente elaborado pelo seu relator e revisto pelos seus signatários – artigo 94º, nº 2 do CPP, encontrando-se assinado eletronicamente na 1ª página, nos termos do disposto no artigo 19º da Portaria nº 280/2013, de 26.08, revista pela Portaria nº 267/2018, de 20.09. Os Juízes Desembargadores Armando Azevedo - Relator António Teixeira – 1º Adjunto Paula Albuquerque – 2ª Adjunta [1] Nas transcrições de peças processuais irá reproduzir-se a ortografia segundo o texto original, sem prejuízo da correção de erro ou lapsos manifestos e da formatação do texto da responsabilidade do relator. [2]De entre as questões de conhecimento oficioso do tribunal estão os vícios da sentença do nº 2 do artigo 410º do C.P.P., cfr. Ac. do STJ nº 7/95, de 19.10, in DR, I-A, de 28.12.1995, as nulidades da sentença do artigo 379º, nº 1 e nº 2 do CPP, irregularidades no caso no nº 2 do artigo 123º do CPP e as nulidades insanáveis do artigo 119º do C.P.P.. [3] Cfr., entre outros, Ac. do STJ de 15-12-2005, Proc. nº 05P2951 e Ac. do STJ de 9-03-2006, Proc. nº 06P461, disponíveis em www.dgsi.pt. [4] Segundo o Prof. Germano Marques da Silva “o recurso sobre a matéria de facto não significa um novo julgamento, mas antes um remédio para os vícios do julgamento em 1ª instância” Forum Justitiae, Maio 99. Em sentido idêntico sustenta Damião Cunha ao afirmar que os recursos “…são entendidos como juízos de censura crítica « e não como «novos julgamentos», in O Caso Julgado Parcial, Publicações Universidade Católica, 2002, pág. 37. [5] Acerca dos limites do princípio da livre apreciação da prova, vide Simas Santos e Leal – Henriques, Noções de Processo Penal, Rei do Livros, 2ª edição, 2011, pág. 52 e 53. [6] Segundo Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada”, 4.ª edição revista, 519, “o princípio da presunção de inocência surge articulado com o tradicional princípio in dubio pro reo. Além de ser uma garantia subjetiva, o princípio é também uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao réu, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa”. [7] Este princípio restringe-se ao domínio da apreciação da prova, constituindo um limite ao princípio da livre apreciação da prova, cfr. Ac STJ de 27.05.2010, processo 18/07.2GAAMT.P1.S1, relator Raúl Borges; e Ac. STJ de 12.03.2009, processo 07P1769, relator Soreto de Barros, ambos acessíveis em www.dgsi.pt [8] A dúvida que leva o tribunal a decidir “pro reo” tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária. Por outras palavras ainda uma dúvida que impeça a convicção do tribunal, cfr. Cristina Líbano Monteiro, Boletim da Faculdade de Direito, Coimbra Editora, 1997, pág. 51. [9] In Direito Processual Penal, Coimbra Editora, 2004, pág. 213. [10] Assim, vide, v.g., Ac STJ de 12.03.2009, processo 07P1769, relator Soreto de Barros; e Ac STJ de 14.07.2010, processo 149/07.9JELSB.E1.S1, relator Raúl Borges, ambos publicados em www.dgsi.pt [11] Cfr Ac RL de 07.05.2019, processo 485/15.0GABRR.L2-5, relator. Jorge Gonçalves; Ac RE de 13.09.2016, processo 89/15.8GTABF.E2, relator António Latas; Ac RE de 30.01.2007, processo 2457/06-1, relator António Latas, todos disponíveis in www.dgsi.pt. [12] Note-se que, neste caso, trata-se de uma questão de facto que não cabe num recurso restrito à matéria de direito, mesmo que de revista alargada. Neste sentido vide Ac STJ de 12.03.2009, processo 07P1769, relator Soreto de Barros, disponível em www.dgsi.pt [13] Cfr. Ac. STJ de 05.07.2007, proc. 07P22279, rel. Simas Santos, disponível em www.dgsi.pt [14] Obra citada, pág. 332. [15] In Penas e Medidas de Segurança, Almedina, 2018, pág. 78. [16] In Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 359 e seguintes. |