Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
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Relator: | MARIA GORETE MORAIS | ||
Descritores: | NULIDADE DA SENTENÇA – ART.º 615.º N.º 1 AL. B) DO CPC VENDA A FILHOS OU NETOS LEGITIMIDADE ACTIVA | ||
Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 03/02/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 1ª SECÇÃO CÍVEL | ||
Sumário: | I. Não se verifica a nulidade da sentença a que se alude na alínea b) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil quando apenas tenha havido uma justificação deficiente ou pouco persuasiva, antes se impondo, para a ocorrência de tal vício, a ausência absoluta de motivação que impossibilite o anúncio das razões, incluindo as de natureza fatual, que conduziram à decisão proferida a final. II. A venda a filhos ou netos, possível perante o disposto no artigo 877º do Código Civil, constitui uma modalidade de compra e venda cuja validade exige o consentimento dos demais descendentes de quem vende, sem o que o negócio é anulável, podendo essa anulabilidade ser arguida pelos filhos ou netos que não deram o seu consentimento, no prazo de um ano a contar do conhecimento da celebração do contrato. III. Esta limitação legal à liberdade contratual, traduzida na exigência do consentimento de terceiros relativamente ao negócio jurídico, tem uma finalidade preventiva, visando evitar situações de simulação relativa, difíceis de provar, em prejuízo das legítimas dos descendentes alheios ao negócio (celebração simulada de contratos de compra e venda para realizar doações). IV. A ratio deste preceito, como é entendimento pacífico na doutrina, é a proteção da legítima dos filhos ou netos, nas situações em que venham a ser prejudicadas mediante vantagem ou favorecimento de outro descendente. V. A legitimidade conferida aos interessados a que aludem os artigos 287º, nº 1, e 877º, ambos do Código Civil, para anulação da venda a filhos ou netos, pressupõe um direito que não se mostre extinto na sequência da não aceitação, por repúdio, da herança pelo respetivo titular nos termos dos artigos 2039º e 2062º do mesmo diploma legal. | ||
Decisão Texto Integral: | I- RELATÓRIO AA intentou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra BB, CC, herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de BB, DD, EE, FF, BB, GG, HH, HH e HH, peticionando a anulação da venda do veículo automóvel que aí identifica, efetuada pelo seu pai a um filho sem consentimento da própria, bem como o cancelamento do respetivo registo de aquisição. Para substanciar tal pretensão alega, em síntese, que o seu pai, BB, vendeu ao filho BB, aqui réu, um veículo automóvel, sendo que a autora, também filha daquele, não prestou consentimento para a realização desse ato alienatório. Acrescenta que o seu pai faleceu no dia .../.../2020, tendo a autora repudiado a respetiva herança por escritura outorgada no dia 23/07/2020. Citados os réus, apenas BB e mulher II apresentaram contestação, onde se defendem quer por impugnação, quer por exceção, invocando as exceções dilatórias da ilegitimidade ativa e da falta de interesse em agir da autora. Cumprido o contraditório, a autora pronunciou-se pela improcedência das exceções invocadas. Foi proferido despacho saneador que julgou procedente a exceção dilatória da ilegitimidade, tendo absolvido os réus da instância. Não se conformando com o assim decidido, interpôs a autora o presente recurso, que foi admitido como apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes CONCLUSÕES 1ª- A sentença da qual se recorre é nula, nos termos do disposto nos artigos 607º, nº 4, e 615º, nº 1, alínea b), ambos do Código de Processo Civil, porquanto não contém a enunciação dos factos dados como provados, a enunciação dos factos dados como não provados, nem qualquer contextualização sobre os elementos carreados para o processo que poderiam permitir ao Tribunal efectuar o seu juízo sobre a matéria de facto alegada pelas partes. 2ª- Conforme resulta do documento nº ... junto aos autos com a petição inicial, a Autora é filha de BB e de DD, os quais, conforme doc. nº ... junto com a petição inicial, são igualmente pais do Réu BB; 3ª- Conforme doc. nº ... junto com a petição inicial, em 02/06/2020, o pai da Autora, BB, declarou vender ao seu também filho BB um veículo automóvel da marca ..., com a matrícula ..-MS-.., tendo esse veículo sido registado a favor do Réu BB em 14/07/2020; 4ª- O referido BB, pai da Autora, conforme resulta do doc. nº ... junto com petição inicial, faleceu em .../.../2020; 5ª- Por escritura pública outorgada em 20/07/2020 no Cartório Notarial ..., junta aos autos como doc. nº ... da petição inicial, a Autora repudiou a herança do seu pai BB; 6ª- A Autora apenas teve conhecimento da supramencionada venda no dia ...; 7ª- A presente acção, entrada em juízo em 02/06/2021, corresponde ao exercício pela Autora de um direito que lhe é conferido pelo artigo 877º, nº 2, do Código Civil, porquanto a Autora não prestou o seu consentimento para que o seu pai BB tivesse vendido ao aludido BB o veículo automóvel da marca ..., com a matrícula ..-MS-..; 8ª- O posterior repúdio da herança efectuado pela Autora não colide com o regime da anulabilidade da venda que se pede nos presente autos; 9ª- À data da aludida transmissão, a mesma carecia de ser previamente consentida pela Autora por a mesma se tratar de uma venda feita pelo seu pai BB ao seu irmão BB; 10ª- É a lei quem no artigo 877º, nº 2 do Código Civil estabelece a legitimidade e o interesse processual em agir do filho que não prestou o seu consentimento para uma venda feita pelo seu pai a um seu irmão; 11ª- Direito que nasce na esfera jurídica do filho que não prestou o seu consentimento para a venda na data em que esta se realizou; 12ª- A referida norma do artigo 877º, nº 2 do Código Civil não estabelece qualquer associação entre a qualidade de filho e de herdeiro legitimário para o exercício do direito nela previsto; 13º- A circunstância de após o falecimento do seu pai a Autora ter repudiado a sua herança, não faz precludir o direito que lhe confere o artigo 877º, nº 2, do Código Civil; 14º- Pelos fundamentos vindos de expor, não poderia o Tribunal a quo ter julgado procedente a excepção de ilegitimidade activa formulada pelo Réu na sua contestação porquanto tal legitimidade resulta evidenciada dos documentos juntos na petição inicial como docs. ... a .... * Não foram apresentadas contra-alegações.*** II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSOO objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Cód. Processo Civil. Porque assim, atendendo às conclusões das alegações, são as seguintes as questões solvendas: . da nulidade da decisão recorrida nos termos da al. b) do nº1 do art. 615º do CPC; . aferir se a autora, apesar de ter renunciado à herança de seu pai, detém legitimidade ativa para a propositura da presente ação em que o pedido é a anulação da venda de um veículo que este efetuou a um filho, irmão daquela, sem o seu consentimento. *** III- FUNDAMENTOS DE FACTO A materialidade a atender para efeito de decisão do objeto do recurso é a seguinte (a qual resulta documentalmente demonstrada nos autos e admitida por acordo entre as partes): 1. A Autora e o Réu BB são filhos de BB e de DD - cfr. documentos nºs ... e ... juntos com a petição inicial. 2. BB vendeu ao filho BB o veículo automóvel de marca ..., com a matrícula ..-MS-.., tendo este último procedido, em 14/07/2020, ao registo a seu favor da referida viatura, registo a que coube a Apresentação 08059, de 14/07/2020 - cfr. documento nº ... junto com a petição inicial. 3. Esta venda foi realizada sem o consentimento da Autora, a qual teve conhecimento da mesma no dia .... 4. BB faleceu no dia .../.../2020 – cfr. documento nº ... junto com a petição inicial. 5. A autora repudiou a herança do seu pai por escritura realizada no dia 23/07/2020 - cfr. doc. nº ... junto com a petição inicial. *** IV – FUNDAMENTOS DE DIREITOIV.1. Da nulidade do saneador/sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão Como se deu nota, a apelante começa por imputar à decisão recorrida o vício de nulidade previsto na alínea b) do nº 1 do art. 615º do Cód. Processo Civil, porquanto a mesma, a respeito da suscitada questão da falta de legitimidade ativa da autora «não contém a enunciação dos factos dados como provados, a enunciação dos factos dados como não provados, nem qualquer contextualização sobre os elementos careados para o processo que poderiam permitir ao Tribunal efetuar o seu juízo sobre a matéria de facto alegada pelas partes». Dispõe o citado inciso que “[é] nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”. Como refere TEIXEIRA DE SOUSA[1], esta causa de nulidade verifica-se «quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art. 208º, n.º 1, CRP; art. 158º, n.º 1)». E, acrescenta o mesmo autor, «o dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível». No mesmo sentido militam ainda LEBRE DE FREITAS et alii[2] quando afirmam que «há nulidade quando falte em absoluto indicação dos fundamentos de facto da decisão ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão, não a constituindo a mera deficiência de fundamentação». Neste conspecto mostram-se, como sempre, proficientes as considerações de ALBERTO DOS REIS[3] para quem «há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade (…). Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade do n.º 2 do art. 668° [a que corresponde a atual al. b) do nº 1 do art. 615º do Cód. Processo Civil]». Neste entendimento das coisas também a jurisprudência pátria[4] vem sufragando que para que a sentença padeça do vício que consubstancia a nulidade de falta de fundamentação (al. b)) é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Logo, apenas se verificará a nulidade invocada nos casos em que se verifique uma ausência total de fundamentação que impossibilite o anúncio das razões que conduziram à decisão proferida. Já não se verificará a referida nulidade quando a fundamentação seja deficiente ou pouco persuasiva. Ora, volvendo ao caso em apreço, malgrado no saneador/sentença o juiz a quo não tenha discriminado formalmente a materialidade em que baseou a sua decisão de procedência da exceção dilatória da ilegitimidade ativa, o certo é que, no seu texto, fez constar os concretos factos relevantes para a apreciação da aludida exceção. Com efeito, procedendo à análise do ato decisório sob censura, constata-se que nele, a respeito de tal questão, se deixou consignado que «No caso dos autos (…) foi alegado que o pai BB vendeu ao filho BB, aqui réu, um veículo automóvel e que a autora não prestou consentimento para a realização dessa venda. O pedido é de anulação dessa venda e de cancelamento do registo do bem a favor do réu. A autora é filha de BB e irmã de BB. BB faleceu no dia .../.../2020. A autora AA repudiou a herança do seu pai por escritura realizada no dia 23/07/2020. A autora alega ainda que teve conhecimento da venda no dia ...». Resulta, assim, claro que o tribunal a quo tomou posição expressa sobre os factos em que baseou a sua decisão relativa à invocada exceção da legitimidade ativa, ainda que sem uma exaustiva fundamentação (designadamente, não tendo feito uma enunciação formal e correspondente referência aos documentos e/ou admissão por acordo das partes em que se baseou para os considerar como assentes), considerando que foi feita a venda de um veículo automóvel por BB ao seu filho BB, aqui réu, sem consentimento da autora, também sua filha, tendo o pai de ambos falecido no dia .../.../2020 e que a autora repudiou a herança do seu pai por escritura realizada no dia 23/07/2020. Nessa medida, entende-se que os factos (que se mostram assentes, quer por documentos não impugnados, quer pela sua aceitação pelas partes) que justificam a decisão relativa à exceção dilatória se encontram devidamente identificados. Consequentemente a decisão recorrida não pode ser havida por não motivada no sentido supra considerado, não incorrendo, pois, no vício de falta de fundamentação. *** IV.2. Da legitimidade ativa da autora para a propositura da presente ação Na decisão recorrida considerou-se que não assistia à autora legitimidade ativa para a propositura da presente ação, dado que sendo o seu pedido a anulação da venda de um veículo efetuada pelo seu pai a um filho, aqui réu, sem consentimento da autora, também filha, para a realização desse ato alienatório, tendo em conta os efeitos jurídicos da anulabilidade do negócio [regresso da propriedade à titularidade do alienante (atualmente a herança aberta por óbito do vendedor) e a restituição de tudo o que houver sido prestado (artigos 289º, n.º 1 e 290º do CC)], a eventual procedência da ação não irá trazer qualquer benefício para a demandante, uma vez que esta repudiou a herança do seu pai. A apelante rebela-se contra esse segmento decisório, advogando que não poderia o Tribunal a quo ter julgado procedente a mencionada exceção dilatória, posto que a propositura da presente ação, entrada em juízo em 02/06/2021, corresponde ao exercício de um direito que lhe é conferido pelo artigo 877º, nº 2, do Código Civil, sendo que o facto de ter repudiado a herança de seu pai não lhe retira essa legitimidade. Que dizer? Para a resolução da enunciada questão importa, desde logo, convocar as normas vertidas no art. 30º do CPC e arts. 877º e 2062º, ambos do CC. Vejamos então. Sob a epígrafe “Conceito de legitimidade” preceitua o art. 30º do CPC que: “1 - O autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer. 2 - O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha. 3 - Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor”. Da exegese do transcrito inciso normativo resulta que a legitimidade do autor se afere pela utilidade derivada da procedência da ação e a legitimidade do réu pelo prejuízo que dessa procedência advenha. Portanto, poderemos dizer que o autor é parte legítima sempre que a procedência da ação lhe venha a conferir, a si e não a outrem, uma vantagem ou utilidade, e o réu é parte legítima sempre que se vislumbre que tal procedência lhe venha a causar (para si e não para outrem) uma desvantagem. Para efeito da determinação da legitimidade das partes, o seu nº 3 fornece um critério subsidiário do qual resulta que, sem prejuízo de disposição legal em contrário, a legitimidade se apura pela relação controvertida, tal como ela é configurada pelo autor na petição inicial. Por seu turno, o art. 877º do Cód. Civil (sob a epígrafe “venda a filhos ou netos”) postula que: “1. Os pais e avós não podem vender a filhos ou netos, se os outros filhos ou netos não consentirem na venda; o consentimento dos descendentes, quando não possa ser prestado, ou seja recusado, é suscetível de suprimento judicial. 2. A venda feita com quebra do que preceitua o número anterior é anulável; a anulação pode ser pedida pelos filhos ou netos que não deram o seu consentimento, dentro do prazo de um ano a contar do conhecimento da celebração do contrato, ou do termo da incapacidade, se forem incapazes. 3. A proibição não abrange a dação em cumprimento feita pelo ascendente.” Para uma melhor interpretação desta norma importa perceber o que está na base da proibição nela estabelecida. Como sublinha MENEZES LEITÃO[5] a sua justificação “foi sempre de evitar que, sob a capa da compra e venda, se efetuassem doações simuladas a favor de algum ou algum dos descendentes, com o fim de evitar a sua imputação nas respetivas quotas legitimárias, assim se prejudicando os restantes. E, reforçando esta ideia, a proibição legal prevista foi pensada para evitar uma simulação, difícil de provar em prejuízo das legítimas dos descendentes”. Em idêntico sentido milita GALVÃO TELLES[6], para quem esta norma “é de carácter preventivo, fundada no receio ou perigo de simulações adaptadas a esconder liberalidades de uma venda ardilosa e inventada. A lei proíbe o ascendente de vender ao descendente porque receia que, na obscuridade, se esteja a doar. Para alcançar este objetivo a lei exige o assentimento dos outros filhos ou netos na perspetiva de garantir que a venda não é simulada. Na falta desta anuência ou do seu suprimento, este ato é anulável”. Também a jurisprudência[7] se tem debruçado sobre esta temática, podendo ver-se, a título de exemplo, o acórdão do STJ de 25/3/1982, onde se escreveu que “sempre se entendeu e entende que o referido normativo visou obstar a que se praticassem vendas simuladas, sempre difíceis de provar, em prejuízo das legítimas dos descendentes, pois, encobrindo doações iriam lesar as mesmas, quando fossem partilhados os bens dos simuladores alienantes”, acrescentando, mais adiante, “essa proibição assenta numa presunção juris et de jure, ou seja, não admite prova em contrário”. Em anotação a este acórdão, ANTUNES VARELA[8] refere que “a lei não presume que todas as vendas de pais a filho ou de avós a netos, sem consentimento dos demais, sejam simuladas. A sua ratio não é de raiz concreto-individual, nem estritamente repressiva, alicerçada na convicção sistemática, generalizada, de que em todos estes casos pai e filho (arvorados em vendedor e comprador) se conluiaram no intuito de iludir as legítimas dos outros filhos. A intenção da lei consiste em evitar – é coisa diferente – as vendas simuladas entre pais e filhos, com o fim altamente reprovável de lesar as expetativas sucessórias dos outros filhos, assentes na própria lei (e não na vontade dos pais). A sua finalidade, ao instituir o mecanismo do assentimento prévio dos outros filhos, é de carácter essencialmente preventivo.”
[3] In Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pág. 140. [4] Cfr., por todos, acórdão do STJ, de 15/12/2011 (PEREIRA RODRIGUES), acessível em www.dgsi.pt, onde se pode ler que “a nulidade da sentença por falta de fundamentação não se verifica quando apenas tenha havido uma justificação deficiente ou pouco persuasiva, antes se impondo, para a verificação da nulidade, a ausência de motivação que impossibilite o anúncio das razões que conduziram à decisão proferida a final”. [5] In Direito das Obrigações, vol. III, 6ª edição, Almedina, pág. 44. [6] Venda a Descendentes e o Problema da Superação da Personalidade Jurídica das Sociedades, in Revista da Ordem dos Advogados, ano 39 (1979), Tomo III, págs. 513 e seguintes. [7] Cfr., inter alia, acórdão da Relação de Lisboa de 20-5-1997 (CJ, ano XXII, Tomo 2º, pág. 95) e acórdãos da Relação do Porto de 21-3-1985 (CJ, ano X, Tomo 2º, pág. 227) e de 25-10-2010 (processo nº 2905/05.3 TBVRL), este último acessível em www.dgsi.pt. [8] In Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 118º, pág. 341. |