Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
597/20.9PCBRG.G1
Relator: ARMANDO AZEVEDO
Descritores: DECLARAÇÕES INFORMAIS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/10/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
Não podem ser valoradas declarações informais prestadas por arguido a militar da GNR, que depois as relatou em audiência de julgamento, numa altura em que já existia um inquérito pendente e o arguido já era suspeito da prática do crime, daí o OPC o ter interrogado e questionado sobre o ocorrido, o qual após insistência, terá confessado a prática dos factos.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:

I- RELATÓRIO

1. No Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Central Criminal de Braga, no processo comum coletivo nº 597/20.9PCBRG, em que são arguidos AA e BB, ambos com os demais sinais nos autos, procedeu-se à realização da audiência de julgamento na ausência dos arguidos, no termo da qual foi proferido acórdão, lido, assinado e depositado em 06.05.2024, com o seguinte dispositivo ( transcrição)[1]

Nos termos e pelos fundamentos explanados, decidem os juízes que compõem este Tribunal Coletivo:

a) Absolver o arguido BB da prática, em co-autoria material, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do CP;
b) Absolver o arguido AA da prática, em autoria material, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do CP (matéria do apenso D);
c) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do CP, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão (matéria do processo principal);
d) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do CP, na pena de 6 (seis) meses de prisão (matéria do apenso B);
e) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do CP, na pena de 6 (seis) meses de prisão (matéria do apenso A);
f) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do CP, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão (matéria do apenso C);
g) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do DL n.º 2/98, de 03-01, na pena de 6 (seis) meses de prisão (matéria do processo principal).
h) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do DL n.º 2/98, de 03-01, na pena de 6 (seis) meses de prisão (matéria do apenso B).
i) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do DL n.º 2/98, de 03-01, na pena de 6 (seis) meses de prisão (matéria do apenso A).
j) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do DL n.º 2/98, de 03-01, na pena de 4 (quatro) meses de prisão (matéria do apenso C).
k) Em cúmulo jurídico das penas aludidas nas als. c) a j) deste segmento decisório, condenar o arguido AA, na pena única de 3 (três) anos de prisão efectiva.
l) Ao abrigo da Lei n.º 38-A/2023, de 02-08, declarar perdoado 1 (um) ano prisão na pena única que nestes autos foi aplicada ao arguido AA, quedando por cumprir, dessa pena única, a pena de 2 (dois) anos de prisão efectiva.
m) Ordenar a recolha de amostra biológica para a base de perfis de ADN ao arguido AA, salvo se ela já tiver sido recolhida à ordem de outros processos;
n) Condenar o arguido AA nas custas do processo crime, fixando em 3 UC’s a taxa de justiça.

2. Não se conformando com tal decisão, dela interpôs recurso o arguido AA, apresentando as respetivas conclusões (transcrição):
1º. Salvo o devido respeito pelo douto acórdão em apreço, o depoimento prestado pela testemunha CC, militar da GNR, não poderia ter sido valorado nem concorrer para a formação da convicção do Tribunal a quo.
2º. O depoimento do OPC baseia-se em declarações do Arguido prestadas antes da sua constituição formal como tal e da abertura do inquérito, na altura em que já este era um suspeito, tendo contribuído decisivamente para a determinação da autoria dos crimes do apenso C.
3º. Repare-se que, aquando das alegadas declarações perante o OPC, o Recorrente já era um suspeito da prática do crime, visto que o OPC já tinha identificado as suas roupas e os seus ferimentos compatíveis com o acidente em apreço, daí o interrogar e questionar sobre a autoria do crime.
4º. De acordo com os arts. 356.º e 357.º do CPP, tais declarações do Arguido só podem ser lidas em audiência, caso a inquirição do OPC seja solicitada pelo próprio Arguido, o que não aconteceu no caso, sendo que estes artigos se aplicam a depoimentos formais e informais que ocorram antes a constituição formal do Arguido e da abertura do inquérito.
5º. A razão de ser destes artigos assenta na salvaguarda do estatuto do arguido e das suas garantias de defesa, em particular do direito ao silêncio e à não autoincriminação. 
6º. O Recorrente deveria ter sido constituído arguido e interrogado como tal. Não o tendo sido e ao valorar tal meio probatório, violou o OPC e o Tribunal a quo os artigos 57.º, 58.º, n.º 7, 59.º e 140.º e ss., do CPP.
7º. Isto posto, deve o Acórdão em crise ser revogado e substituído por outro desconsidere o depoimento da testemunha CC, militar da GNR, para efeitos probatórios, e declare não verificada a autoria do Recorrente quanto aos crimes referentes ao Apenso C, absolvendo-o dos mesmos, com as legais consequências.

CUMULATIVAMENTE, 
8º. Salvo o devido respeito, o acórdão do tribunal a quo incorpora uma errada subsunção jurídica dos factos ao direito na medida em que aplicou uma pena de prisão efetiva de 2 (dois) anos de prisão ao Recorrente.
9º. Deve por isso ser revogado e substituído por outro que suspenda a execução da pena única de 2 (dois) anos de prisão em que foi condenado o recorrente ou, pelo menos, altere a condenação para uma pena única nunca superior a 1 (um) ano de prisão.
10º. O Recorrente beneficia de circunstâncias atenuantes da sua conduta, as quais deveriam ter sido levadas em consideração pelo Tribunal a  quo.
11º. Os bens subtraídos pelo Arguido revestem um valor diminuto e todos eles foram suscetíveis de serem recuperados pelas autoridades, excluindo o combustível. 
12º. O que significa que a gravidade e ilicitude do crime praticado pelo Recorrente se revelam reduzidas!
13º. Salvo o devido respeito pelo douto acórdão em crise, ao condenar-se o Arguido em prisão efetiva adotou-se o caminho mais fácil, contudo, a suspensão da pena de prisão concedida satisfaria de um modo adequado as finalidades da punição.
14º. Atentas as circunstâncias do crime, o grau de ilicitude, o desvalor das consequências do ilícito, deveria ter-se lançado mão de outras soluções que se mostrassem mais adequadas do que a pena concretamente aplicada.
15º. No caso concreto entende-se que a suspensão da pena de prisão, acrescida de imposição de regras de conduta e de um plano de reinserção social, satisfaria as necessidades de reprovação do crime, enquanto que a pena de prisão se configura, perante as circunstâncias evidenciadas, acima de tudo, nefasta para a sua ressocialização, devendo ser dada uma oportunidade de se regenerar e deste modo tornar-se útil para a sociedade.
16º. Assim, deve o Acórdão em crise ser revogado e substituído por outro que condene o Arguido em pena de prisão suspensa na sua execução, ainda que a requerida suspensão ficasse sujeita a deveres, regras de conduta, regime de prova e ainda obedecendo a um plano de reinserção social, conforme o disposto nos artigos 51º, 52º, 53º e 54º do Código Penal.

SEM PRESCINDIR, CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, 
17º. Com respeito pela decisão do Tribunal a quo, é entendimento da defesa, suportado na doutrina e jurisprudência, que no caso em concreto, em caso de condenação do Recorrente, nunca deveria ter sido este condenado numa pena superior a 1 (um) ano de prisão.
18º. Como já mencionado, os bens furtados pelo Arguido revestem um valor diminuto e todos foram recuperados pelas autoridades, com exceção do combustível. 
19º. Não resultará nenhum dano gravoso para a sociedade, ou pelo menos demasiado prejudicial, reduzir a pena de prisão do Arguido, o que aliás se mostra proporcional e adequado face às circunstâncias do caso concreto. 
20º. Perante o exposto, deve o Acórdão em crise ser revogado e substituído por outro que condene o Recorrente, em cúmulo jurídico, numa pena única de prisão nunca superior a 1 (um) ano de prisão.
21º. Fundamenta assim o Arguido o presente RECURSO na errada interpretação, aplicação e subsunção jurídica dos factos ao direito da sentença recorrida, designadamente das normas elencadas nos arts.º 1.º,  40.º, 41.º e ss., 50.º e ss., 58.º e ss. e 70.º e ss. do Código Penal.
 
TERMOS EM QUE,
revogando o douto acórdão recorrido, substituindo-o por um que DESCONSIDERE O DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA CC, MILITAR DA GNR, PARA EFEITOS PROBATÓRIOS, E DECLARE NÃO VERIFICADA A AUTORIA DO RECORRENTE QUANTO AOS CRIMES REFERENTES AO APENSO C, ABSOLVENDO-O DOS MESMOS, COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS, nos termos acima requeridos e de acordo com a legislação vigente, farão Vossas Excelências a habitual J U S T I Ç A !

CUMULATIVAMENTE, revogando o douto acórdão recorrido, substituindo-a por um que SUSPENDA A EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO em que o Recorrente foi condenado nos termos acima requeridos e de acordo com a legislação vigente, farão Vossas Excelências a habitual J U S T I Ç A !
CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, SEMPRE SEM PRESCINDIR, revogando o douto acórdão recorrido, substituindo-o por um que CONDENE O RECORRENTE NUMA PENA ÚNICA NUNCA SUPERIOR A 1 (UM) ANO DE
PRISÃO nos termos acima requeridos e de acordo com a legislação vigente, farão Vossas Excelências a habitual J U S T I Ç A !

3. O recurso foi admitido, com súbita imediata, nos próprios autos, e com efeito suspensivo do processo.
4. O Exmo. Senhor Procurador da República, na primeira instância, respondeu ao recurso, defendendo que o mesmo deverá ser julgado improcedente, tendo concluído nos seguintes termos (transcrição):

1. Na fundamentação da matéria de facto, o Tribunal a quo fez constar expressamente os elementos de prova em que ancorou a sua convicção quanto à matéria respeitante ao apenso C.   
2. Assim, para a formação da convicção do Tribunal contribuíram três elementos de prova essenciais:
- a similitude da fisionomia do arguido com o indivíduo captado nas imagens de videovigilância;  
- a correspondência da indumentária de tal indivíduo com o vestuário que o arguido apresentava aquando do seu internamento, sobretudo das sapatilhas utilizadas, com cores e características incomuns;
- a compatibilidade das lesões que o arguido apresentava (e que motivaram o seu internamento hospitalar) com dos danos apresentados pelo motociclo em questão, claramente decorrentes de acidente de viação (queda).
3. Foram estes, e não outros, os elementos de prova de que o Tribunal a quo se socorreu para dar como provada tal matéria.
4. É verdade que, ainda na fundamentação, se faz referência ao depoimento do militar da G.N.R. CC, a quem o arguido terá confessado a autoria dos factos em apreço.
5. No entanto, tal elemento probatório é meramente subsidiário, sendo invocado apenas na medida em que corrobora a demais prova produzida e confirma uma convicção já formada.
6. Em todo o caso, tal depoimento é perfeitamente valido, dado que não se observa qualquer má-fé do órgão de polícia criminal que, sabendo que o motociclo subtraído ao seu dono foi interveniente em acidente de viação, se desloca ao Hospital da localidade, procede à identificação de um cidadão que tinha sinais de ter sido interveniente em acidente de viação de veículo de duas rodas, tira fotografias da sua roupa e confronta esse cidadão com os factos, vindo ele a admitir a sua autoria.
7. Nada há, por isso, a censurar quanto à fundamentação da matéria de facto relativa aos factos imputados no apenso C, nem a mesma se ancorou em meios de prova inválidos. 
8. No caso dos autos não pode deixar de se concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão não realizam, como não realizaram até à presente data, de forma adequada as finalidades da punição.
9. De notar que o recorrente tem já averbado no seu certificado de registo criminal um rol significativo de condenações, muitos deles por crimes contra o património - furtos, furtos qualificados e roubo - cometidos em território nacional e em ..., no período compreendido entre 2009 e 2023.
10. Observe-se, ainda nesta sede, que os crimes dos autos foram praticados durante o período da suspensão da execução da pena de prisão que lhe foi aplicada no processo n.º 133/17.4PFBRG.
11. Conclui-se, assim, que as sucessivas penas não detentivas que lhe foram sendo aplicadas, manifestamente não alcançaram o seu desiderato, dado que o arguido continuou na senda da prática dos actos criminalmente puníveis.
12. As necessidades de prevenção especial que no caso se fazem sentir são, por isso, elevadíssimas. 
13. Atendendo às matrizes que regem a suspensão da execução da pena de prisão, não se poderá afirmar que as condutas do arguido em causa nos autos consubstanciaram um episódio meramente acidental, esporádico, ocasional, e que a ameaça da pena, como medida de reflexos sobre o seu comportamento futuro, evitará a repetição de condutas delitivas.
14. Na verdade, a suspensão da execução da pena de prisão não se afigura susceptível de constituir a advertência firme e solene necessária para dissuadir o arguido da prática de factos idênticos e passaria uma mensagem de impunidade e insegurança à própria comunidade.
15. Bem andou, por isso, o Tribunal a quo ao decidir não suspender a execução da pena de prisão aplicada. 
16. Segundo o artigo 71º, n.º 1, do Código Penal, a determinação da pena far-se-á em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
17. A culpa reflecte a vertente pessoal do crime, assegurando que a pena não irá violar a dignidade da pessoa do arguido.
18. As exigências de prevenção na determinação da pena reflectem-se em dois domínios:
- no domínio da sociedade, visando restabelecer nela a confiança na norma violada e a sua vigência (prevenção geral positiva);
- no domínio pessoal do agente, tentando a sua reintegração e o respeito pelas normas jurídicas (prevenção especial positiva).
19. Os vectores da medida da pena previstos no artigo 40º do Código Penal são concretizados pelos factores de determinação da medida concreta da pena que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele.
 20. Alguns desses factores são elencados no artigo 71º, n.º 2, do Código Penal, a título exemplificativo.
21. Sendo assim, na determinação da medida concreta da pena valorar-se-ão o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste, a gravidade das suas consequências, a intensidade dolosa do agente, as suas condições pessoais, a sua conduta anterior e posterior ao facto, as exigências de prevenção e todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele, tendo em conta as exigências de futuros crimes.
22. No caso em apreço, impunha-se a realização de cúmulo das penas aplicadas ao recorrente.
23. A pena aplicável ao concurso terá, no caso concreto, o limite mínimo de um ano e seis meses de prisão e o limite máximo de cinco anos e seis meses de prisão.
24. No caso em apreço, há que considerar que:
- o facto de todos os crimes terem sido cometidos com dolo directo e intenso (o que releva em desfavor do arguido);
- que os bens/valores subtraídos, na sua globalidade alcançam um valor mediano;
- que todos os crimes não foram perpetrados na mesma ocasião e lugar (o que releva em seu desfavor), embora tenham sido cometidos dentro de um período temporal relativamente limitado (entre 31-08-2020 e 11-12-2020);
- O número de crimes praticados pelo arguido no referido período (entre 31-08-2020 e 11-122020) é significativo, sendo certo que ele já tem antecedentes criminais registados, inclusivamente pela prática de crimes que protegem, além do mais, o património. Esta  circunstância denuncia uma propensão, por parte do arguido, para a prática dos delitos que se encontram nestes autos em discussão.
25. Considerando os critérios estabelecidos, não merece qualquer reparo a medida da pena única de três anos de prisão aplicada ao arguido, ora recorrente, atendendo ao grau de culpa por si revelado, à intensidade do dolo e grau de ilicitude, bem como às exigências de prevenção geral e especial que ao caso se fazem sentir.
26. A decisão recorrida não violou quaisquer normativos legais, designadamente os invocados pelo recorrente. 
27. A decisão recorrida não merece censura, nomeadamente na parte ora sindicada pelo recorrente.    
*
Nestes termos, deverá negar-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
Este, o entendimento que perfilhámos.
Vossas Excelências, porém, farão justiça.
5. Neste Tribunal da Relação, a Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, no qual concluiu que o recurso não merece provimento.  
6. Foi cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do CPP, não tendo sido apresentada resposta.

II- FUNDAMENTAÇÃO

1- Objeto do recurso
O âmbito do recurso, conforme jurisprudência corrente, é delimitado pelas suas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, sem prejuízo naturalmente das questões de conhecimento oficioso[2] do tribunal, cfr. artigos 402º, 403º e 412º, nº 1, todos do CPP.
Assim, considerando o teor das conclusões do recurso interposto no sentido acabado de referir, as questões a decidir reconduzem-se ao seguinte:
- Desconsideração do depoimento efetuado pela testemunha CC, militar da GNR, na parte em relatou o que ouviu dizer o arguido / recorrente AA, estando em causa apenas os factos relativos ao apenso C;
- Suspensão da execução da pena única de prisão imposta ao arguido / recorrente AA; e, em caso de improcedência desta questão;
- Redução da pena única de prisão em que o recorrente foi condenado.    

2- A decisão recorrida
1. No acórdão recorrido foram considerados como provados e não provados os seguintes factos, seguidos da respetiva fundamentação de matéria de facto e de direito:

II - FUNDAMENTAÇÃO

II.1 Da matéria de facto.
Discutida a causa, resultaram provados, com interesse para a decisão, os seguintes factos:

Quanto à culpabilidade.
(Autos principais)
1. Entre as 19h40 do dia 31 de Agosto de 2020 e as 08h40h do dia 01 de Setembro de 2020, o arguido AA abeirou-se do veículo de matrícula ..-..-DP, marca ..., modelo ..., cor cinza, normalmente utilizado por DD e pertença do seu pai EE, no valor de € 1000,00, que se encontrava estacionado na Rua ..., em ....
2. De forma não apurada, o arguido AA forçou e estroncou a fechadura da porta dianteira, do lado de condutor, do mesmo, introduzindo-se, com toda a sua pessoa no seu interior.
3. Após, o arguido AA, de forma não apurada, colocou-o em andamento, dali o levando conduzindo-o na via pública, apesar de não estar apetrechado com título legal bastante para o fazer.
4. O arguido AA fez seu o referido veículo, dando-lhe o destino que bem entendeu, em seu próprio proveito.
5. O veículo foi recuperado pela GNR no dia 29 de Setembro de 2020, pelas 17h15, na Rua ..., em ..., ....
6. O arguido AA agiu com o propósito concretizado de fazer seu o veículo em apreço, apesar de saber que este não lhe pertencia e que estava a agir contra a vontade e em prejuízo do respectivo proprietário.
7. Sabia o arguido carecer de habilitação para dirigir o dito veículo como suprarreferido; apesar de tal, não se coibiu de o tripular, como descrito.
(Apenso D).
8. No dia 07 de Setembro de 2020, cerca das 12.24 horas, pessoa cuja identidade não foi possível apurar dirigiu-se ao estabelecimento “EMP01...”, sito na Rua ..., ..., ..., ..., pertencente à sociedade Comercial “EMP02..., Lda”, com o propósito de se apropriar de produtos lá expostos para venda ao público.
9. Uma vez aí, essa pessoa retirou dos expositores e das prateleiras seis garrafas de whisky, da marca ...” (três com a denominação “...”, de 0,70 litros, e as outras três com a denominação “...”, de 0,70 litros), tudo no valor global de € 137,94.
10. Na posse de tais artigos, a referida pessoa cuja identidade não foi possível apurar passou para além da zona das caixas registadoras para o exterior da loja sem as ter apresentado a pagamento.

(Apenso B)
11. No dia 17 de Setembro de 2020, por volta das 20h15, o arguido AA, conduzindo o veículo ligeiro de passageiros descrito em 1., na via pública, apesar de não estar apetrechado com título legal bastante para o fazer, dirigiu-se ao posto de abastecimento de combustíveis “EMP03...”, sito na Rua ..., ..., ....
12. Aí chegado abasteceu o aludido veículo com 19,02 litros de gasolina, no valor de €: 25,09 (vinte e cinco euros e nove cêntimos) e ausentou-se do local sem ter procedido ao respectivo pagamento.
13. O arguido AA actuou do modo descrito com o propósito concretizado de fazer seu o aludido combustível, bem sabendo que o mesmo não lhe pertencia e que actuava contra a vontade da legítima dona, EMP03..., SA.
14. Sabia o arguido AA carecer de habilitação para dirigir o dito veículo como suprarreferido; apesar de tal, não se coibiu de o tripular, como descrito.

(Apenso A)
15. No dia 24 de Setembro de 2020, por volta das 17h32, o arguido AA, conduzindo o veículo ligeiro de passageiros descrito em 1, na via pública, apesar de não estar apetrechado com título legal bastante para o fazer, juntamente com o arguido BB, dirigiram-se ao posto de abastecimento de combustíveis “EMP03...”, sito na Rua ..., ..., ....
16. Aí chegado, o arguido AA abasteceu o aludido veículo com 24,79 litros de gasolina, no valor de €: 32,70 (trinta e dois euros e setenta cêntimos) e ausentou-se do local sem ter procedido ao respectivo pagamento.
17. Agiu o arguido AA com o propósito concretizado de fazer seu o aludido combustível, bem sabendo que o mesmo não lhe pertencia e que actuava contra a vontade da legítima dona, EMP03..., SA.
18. Sabia o arguido AA carecer de habilitação para dirigir o dito veículo como suprarreferido; apesar de tal, não se coibiu de o tripular, como descrito.

 (Apenso C)
19. Por volta das 19h30, do dia 11 de Dezembro de 2020, o arguido AA abeirou-se do motociclo de matrícula ..-ZJ-.., marca ..., modelo ..., pertença de EMP04... SA, de valor não apurado, mas não inferior a € 1000,00, que se encontrava estacionado na Rua ..., em ..., ....
20. O arguido AA colocou-se em cima do mesmo e de forma não apurada, colocou-o em andamento, dali o levando conduzindo-o na via pública, apesar de não estar apetrechado com título legal bastante para o fazer.
21. O arguido AA fez seu o referido veículo, dando-lhe o destino que bem entendeu, em seu próprio proveito.
22. O veículo foi recuperado pela GNR, no dia seguinte, pelas 08h50, na Rua ... em ..., ....
23. O arguido AA agiu com o propósito concretizado de fazer seu o veículo em apreço, apesar de saber que este não lhe pertencia e que estava a agir contra a vontade e em prejuízo do respectivo proprietário.
24. Sabia o arguido carecer de habilitação para dirigir o dito veículo como suprarreferido; apesar de tal, não se coibiu de o tripular, como descrito.
25. Agiu o arguido AA, sempre, de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

Mais se se provou que:
26. Os bens subtraídos e supra descritos em 9. foram posteriormente recuperados.

Quanto à determinação da sanção.
27. O arguido AA tem as seguintes condenações criminais registadas no seu CRC;
28. O arguido foi condenado no processo 192/09.3GAAMR por sentença datada de 06-05-2009, transitada em julgado em 08-06-2009, pela prática em 06-05-2009, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, na pena de 60 dias de multa. Essa pena já foi declarada extinta.
29. O arguido foi condenado no processo 167/13.8TABRG, por sentença datada de 04-12-2013, transitada em julgado em 16-01-2014, pela prática em 11-01-2013, de um crime de detenção de arma proibida, na pena de 160 dias de multa. Essa pena já foi declarada extinta.
30. O arguido foi condenado no processo 668/12.5GAAMR, por acórdão datado de 11-03-2016, transitado em julgado em 19-04-2016, pela prática em 16-11-2012, de um crime de furto qualificado, na pena de 1 ano e 10 meses de prisão, substituída por 480 horas de trabalho a favor da comunidade. Essa pena já foi declarada extinta.
31. O arguido foi condenado no processo 133/17.4PFBRG, por acórdão datado de 29-11-2018, transitado em 11-01-2019, pela prática em 21-12-2017, de três crimes de roubo e um crime de detenção de arma proibida, na pena de 2 anos e 10 meses suspensa na sua execução e ainda na pena de 200 dias de multa.
32. O arguido foi condenado no processo 1105/18.7PBBRG, por sentença datada de 30-01-2020, transitada em julgado em 02-03-2020, pela prática em 18- 08-2018, de um crime de furto de uso de veículo, na pena de 165 dias de multa, posteriormente substituída por prisão subsidiária. Essa pena foi declarada extinta pelo cumprimento.
33. O arguido foi condenado no processo 475/17.9PBBRG, por sentença datada de 11-11-2021, transitada em julgado em 13-12-2021, pela prática em 01-03-2017, de 3 crimes de roubo, na pena única de 2 anos e 2 meses, suspensa na sua execução por igual período, com sujeição a regime de prova.
34. O arguido foi condenado no processo 1795/20.0PBBRG, por sentença datada de 31-03-2022, transitada em julgado em 09-05-2022, pela prática em 07- 12-2020, de 3 crimes de furto qualificado, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período, com sujeição a regime de prova.
35. O arguido foi condenado no processo 794/20.0GCBRG, por sentença datada de 30-11-2022, transitada em julgado em 22-02-2024, pela prática em 01-12-2020, de 1 crime de furto qualificado, na pena de 2 anos e 8 meses de prisão, suspensa na sua execução por 3 anos, com sujeição a regime de prova.
36. O arguido foi condenado por Tribunal Francês por sentença de 06-07-2023, transitada em julgado em 17-07-2023, pela prática, em 21-04-2023 de um crime de furto após violação de propriedade privada, em 30-04-2023, de um crime de furto após violação de propriedade privada, em 09-05-2023, de um crime de furto agravado e em 19-05-2023, de um crime de furto após violação de propriedade privada, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão.
37. O arguido foi condenado por Tribunal Francês por sentença de 18-08-2023, transitada em julgado em 20-11-2023, pela prática, em 19-04-2023, de um crime de furto agravado, em pena de multa.
38. O arguido foi condenado por Tribunal Francês por sentença de 13-10-2023, transitada em julgado em 03-11-2023, pela prática, em 10-10-2023, de um crime de furto após violação de propriedade privada, na pena de 3 meses de prisão. 
39. O arguido BB tem as seguintes condenações criminais registadas no seu CRC;
a) O arguido foi condenado no processo 512/10.8GCBRG, por sentença datada de 24-04-2012, transitada em julgado em 15-04-2012, pela prática em 29-05-2010, de 1 crime de dano simples, um crime de ofensa à integridade física simples e um crime de ameaça agravada, na pena de 700 dias de multa à taxa diária de euros 6. A referida pena foi substituída por prisão subsidiária, tendo esta sido declarada extinta pelo cumprimento.
b) O arguido foi condenado no processo 359/16.8GCBRG, por sentença datada de 29-06-2017, transitada em julgado em 31-07-2017, pela prática em 03-07-2016, de 1 crime de violência doméstica, na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova e sujeição a deveres. A referida pena foi declarada extinta pelo cumprimento.
c) O arguido foi condenado no processo 404/15.4GCBRG, por sentença de 25-09-2020, transitada em julgado em 22-10-2020, pela prática em 28-07-2015, de um crime de cultivo de estupefacientes, na pena de 60 dias de multa. A referida pena foi declarada extinta.
Condições pessoais, laborais e familiares dos arguidos.
40. Do arguido AA:
a) O arguido nasceu no dia ../../1992 e é solteiro.
b) Não efectua descontos para a Segurança Social.
c) Não é beneficiário de qualquer pensão ou reforma.
d) Não consta como proprietário ou usufrutuário de qualquer bem imóvel.
e) É herdeiro, com a quota de 1/3, na herança aberta por óbito de AA.
f) É herdeiro, com a quota de 1/10, na herança aberta por óbito de FF.
g) Esteve em cumprimento de pena de prisão desde ../../2021, tendo sido libertado em 09-10-2021 por termo da pena.
h) Não se mostrou possível realizar relatório social às condições pessoais, familiares e sociais do arguido AA, apesar das diligências realizadas para o efeito.
41. Quanto ao arguido BB:
a) O arguido nasceu no dia ../../1972 e é divorciado.
b) Não efectua descontos para a Segurança Social.
c) Não é beneficiário de qualquer pensão ou reforma.
d) Não consta como proprietário ou usufrutuário de qualquer bem imóvel.
e) Não se mostrou possível realizar relatório social às condições pessoais, familiares e sociais do arguido BB, apesar das diligências realizadas para o efeito.
***
Factos não provados.

Com interesse para a correcta decisão da causa, não resultaram provados quaisquer factos diferentes e/ou contrários dos que especificamente foram dados como provados, designadamente, que:
a) O arguido AA praticou os factos descritos em 8. a 10..
b) O arguido AA agiu com o propósito de se apropriar, como se apropriou, dos artigos aludidos em 9., não obstante saber que os mesmos lhe não pertenciam e que actuava sem o consentimento e contra a vontade da proprietária dos referidos bens.
c) O arguido BB praticou os factos descritos em 16. a 18. em execução da um plano comum com o arguido AA.
d) Nessa situação agiram os arguidos em comunhão de esforços e de intentos.
e) Agiu o arguido BB com o propósito concretizado de fazer seu o aludido combustível.
f) Agiu o arguido BB, sempre, de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
***
Convicção do Tribunal.

Teve-se em consideração, a respeito da apreciação da prova, ao disposto no artigo 127.º do CPP.
O critério fundamental observado por este Tribunal quanto ao standard probatório foi o que corresponde ao principio da assunção da prova para além de toda a duvida razoável.
Como refere José Mouraz Lopes in Comentário Judiciário do CPP, t. II, 3.ª ed., Almedina, p. 85: “Trata-se de conseguir, através deste principio, a possibilidade de condenar alguém apenas quando se tenha alcançado a ‘certeza’ da sua culpabilidade, devendo ser absolvido sempre que existam dúvidas razoáveis. O conceito, «para além da dúvida razoável» tem sido entendido como a hipótese, probatoriamente admissível, frente à qual a hipótese antagónica (ou apresentada como contrária) tem apenas uma remote probability (probabilidade remota) de ter acontecido. Não constitui, no entanto, um critério assente na exclusão da «sombra de dúvidas»”.
A dúvida razoável, que determina a impossibilidade de convicção do Tribunal sobre a realidade de um facto, distingue-se da dúvida ligeira, meramente possível, hipotética. Só a dúvida séria se impõe à íntima convicção. Esta deve ser, pois, argumentada, coerente, razoável (cfr., nestes sentido, Jean-Denis Bredin, Le Doute et L’intime Conviction, Revue Française de Théorie, de Philosophie e de Culture Juridique, Vol. 23, (1996), p. 25., citado no Ac. da R.C. de 09-05-2012 in www.dgsi.pt., proc. n.º 347/10.8PATNV.C1).
A convicção do tribunal, relativamente à matéria de facto objecto deste processo, baseou-se na análise e ponderação crítica, à luz das regras da experiência, do conjunto da prova produzida, devidamente conjugada entre si.
A prova produzida em audiência de julgamento subsume-se – no seu essencial – a prova documental diversa, a prova pericial e a prova testemunhal, dado que os arguidos, regularmente notificados para comparência, faltaram à diligência não tendo justificado a respectiva falta.
Assim, desde logo, o Tribunal atendeu ao teor dos seguintes elementos;
 - Quanto à matéria dos autos principais: Auto de denúncia de fls. 15 (especialmente no que diz respeito á data e local da ocorrência dos factos); Aditamento de fls. 9 e 10 (relativo á recuperação da viatura dos autos); Termo de entrega da viatura em 29-09-2020 (cfr. fls. 11); Relatório de Inspecção Judiciária de fls. 28 a 31, e relatório fotográfico de fls. 32 e 33; relatório do exame pericial de fls. 46 e ss.. Do teor do relatório de inspecção judiciária conjugado com o conteúdo do relatório pericial extrai-se que do espelho retrovisor interior do veículo subtraído foram obtidas impressões digitais pertencentes ao arguido AA e da parte superior, lado exterior, do vidro da porta do lado direito na frente da viatura foram obtidas impressões digitais pertencentes ao arguido BB;
- Quanto à matéria do apenso D: Auto de notícia de fls. 40 a 42; Resultado da pesquisa nas bases de dados da Conservatória do Registo Automóvel do veículo de matrícula ..-..-DP (cfr. fls. 57); Auto de visionamento e extracção de fotogramas de fls. 58 a 60; DVD com imagens de videovigilância junto na contracapa;
- Quanto à matéria do apenso B: Auto de denúncia de fls. 8; DVD com imagens de videovigilância de fls. 16; Fotogramas de fls. 17 a 18; Factura de fls. 12; Resultado da pesquisa nas bases de dados da Conservatória do Registo Automóvel do veículo de matrícula ..-..-DP (cfr. fls. 21);
- Quanto à matéria do apenso A: Auto de denúncia de fls. 8; DVD com imagens de videovigilância de fls. 16; Fotogramas de fls. 17 a 20; Factura de fls. 22; Resultado da pesquisa nas bases de dados da Conservatória do Registo Automóvel do veículo de matrícula ..-..-DP (cfr. fls. 28);
- Quanto à matéria do apenso C: Auto de notícia de fls. 97; Resultados das pesquisas nas bases de dados inerentes ao motociclo de matricula ..-JZ-.. (cfr. fls. 65 e 77); Aditamento ao auto de noticia (cfr. fls. 105 a 106, atinente á recuperação do motociclo); auto de apreensão de fls. 107; Termo de entrega de fls. 108; Aditamento ao auto de notícia de fls. 109 e relatório fotográfico anexo; CD contendo imagens de videovigilância (fls. 116); Auto de visionamento e extracção de fotogramas de fls. 116 e ss.
Observe-se que o relatório pericial de fls. 46 e ss. deste processo principal foi elaborado por entidade com competência legal para o efeito, estando suficientemente fundamentado e, por isso, logrou obter total credibilidade probatória.
Quanto aos antecedentes criminais tomou-se especialmente em consideração o teor dos CRC dos arguidos que constam de fls. 314 e ss. (arguido AA) e 324 e ss. (arguido BB).
No que concerne às condições pessoais, sociais, familiares e laborais dos arguidos o Tribunal alicerçou-se nos documentos resultantes das pesquisas nas bases de dados.
Efectivamente, apesar das diligências tomadas para o efeito, não se mostrou possível a efectivação do relatório social às condições dos arguidos AA e BB, uma vez que os mesmos não foram localizados.
De facto, por despacho de fls. 238 (de 30-06-2023) foi determinada a elaboração de relatório social dos arguidos. A fls. 281 e ss. a DGRSP informou os autos de que não era possível elaborar o relatório social de AA por impossibilidade de contacto com o arguido apesar das diligências efectuadas. A fls. 283 e ss. a DGRSP informou que não era possível a realização de relatório social por impossibilidade de aferir o paradeiro de BB. Nessa sequência, por despacho de fls. 292, foi determinada a notificação dos arguidos para esclarecerem e justificarem o que tivessem por conveniente quanto á informação prestada pela DGRSP. Os arguidos foram notificados desse despacho e nada disseram, sendo que também não compareceram em juízo na data de julgamento.
A não realização de relatório social é, pois, totalmente imputável aos arguidos, pois que o Tribunal diligenciou, ao longo do tempo, pela sua elaboração, apenas não tendo ele sido efectuado uma vez que não se logrou apurar o actual paradeiro dos falados arguidos (cfr., a propósito, o Ac. da R.L. de 31-01-2017 in www.dgsi.pt., proc. n.º 947/13.4PCLSB.L1.5; Ac. da R.G. de 13-07-2020 in www.dgsi.pt., proc. n.º 414/19.2GAEPS.G1; Ac. do S.T.J de 26-05-2021 in www.dgsi.pt., proc. n.º 293/07.2GACBT.S1).
Os arguidos não compareceram à audiência, nem justificaram a respectiva falta, pelo que também nela não prestaram declarações.
Refira-se, agora, que na formação da sua convicção o Tribunal atendeu á prova testemunhal produzida.
Assim, no que respeita aos autos principais, desde logo o Tribunal atendeu ao testemunho de DD, que declarou que, desde 2018, era habitual utilizadora do veículo de marca ..., modelo ..., de matrícula ..-..-DP, veículo esse pertença do seu pai e que à data tinha valor de 1.000,00 euros.
Acrescentou a testemunha que certo dia, por volta das 19 ou 19:30 horas, estacionou a falada viatura na Rua ..., em ..., dele saiu, fechou e trancou as respectivas portas e, no dia seguinte quando voltou para o local onde havia estacionado, o carro já ali não se encontrava. Acrescentou que, mais tarde, a viatura foi recuperada e foi-lhe entregue no dia 29-09-2020, sendo que nessa altura ela apresentava alguns danos, designadamente ao nível do canhão da ignição.
 Confrontada com a imagem dos fotogramas de fls. 17 e ss. do apenso A, disse desconhecer a identidade da pessoa que se encontra no exterior do veículo.
Também no que respeita aos autos principais, analisou-se criticamente o testemunho de EE, dono do veículo de marca ..., modelo ..., de matrícula ..-..-DP, que logo afirmou que a condutora habitual dele, na data dos factos, era a sua filha DD.
A testemunha adiantou saber que o carro foi “furtado”, vindo posteriormente a ser recuperado. Na sequência dessa recuperação, como o carro tinha alguns danos (designadamente, o canhão da ignição estava estroncado e havia danos no canhão da fechadura da porta do condutor), foi levado para ... a fim de ali ser reparado. Acrescentou que a viatura tinha o valor de cerca de 1.000,00 euros.
Ainda no atinente aos factos do processo principal, o Tribunal valorou criticamente o testemunho de GG, militar da GNR que, encontrando-se de patrulha, se deslocou ao local onde a viatura dos autos se encontrava estacionada, a fim de ser recuperada. Avançou esta testemunha que a viatura em causa, nessa altura, apresentava a porta do condutor fechada, mas não trancada. Mais testemunhou no sentido de que a viatura foi entregue à denunciante.
No que respeita aos apensos B e A o Tribunal tomou em consideração, além do mais, o depoimento de HH, gerente de Postos de Abastecimento da EMP03... que relatou que, no exercício das suas funções, teve conhecimento (até pelo visionamento das imagens de videovigilância que depois foram juntas aos autos) que nos dias 17.09.2020 e 24.09.2020 existiram abastecimentos com fuga no Posto de Abastecimento de Combustíveis da EMP03..., em ..., .... Segundo a testemunha, em ambas as situações o veículo era o mesmo, e o autor dos factos parecia o mesmo. A testemunha confirmou ainda que as facturas de fls. 12 do apenso B e 22 do apenso A são as inerentes aos abastecimentos dos autos.
Relativamente à matéria do apenso C o Tribunal atendeu, desde logo, ao depoimento da testemunha II, gestor de zona do EMP05..., que transmitiu recordar-se de um furto do motociclo de marca ..., ocorrido na parte de trás das instalações do restaurante. Relatou que, através das imagens de videovigilância, viu que o motociclo estava na parte de trás das instalações e que um desconhecido subiu para a mota e arrancou com ela para parte incerta, sendo que quando o funcionário que estava a utilizar a mota chegou ao local para carregar ela já não se encontrava ali.
Ainda no que respeita a este apenso, valorou-se o testemunho de JJ, pintor da construção civil, que declarou que, determinado dia, se deslocava para ... para fazer um serviço, tendo constatado que o motociclo dos autos se encontrava parado no monte. Acrescentou que quando chegou ao local de trabalho ligou para o posto da GNR a relatar o que tinha presenciado. Referiu ainda que, nesse mesmo dia, ainda se deslocou ao local. Disse que a mota em causa tinha publicidade do EMP05....
Relativamente ao apenso C, considerou-se igualmente o testemunho de KK, militar da GNR que subscreveu o aditamento de fls. 105 do apenso C e, no essencial, confirmou o respectivo conteúdo. Assim, adiantou a testemunha que nesse dia foram avisados da existência de um motociclo abandonado, pelo que se deslocou ao local. Referiu que, uma vez chegada ao local, viu que o motociclo dos autos, estava no chão, encontrando-se a chave na respectiva ignição. Relatou que o motociclo apresentava danos, aparentando ter sido interveniente em acidente.  Através da matrícula, verificou que esse motociclo constava para apreensão, pelo que procedeu à respectiva apreensão. Acrescentou ter existido lapso na indicação da data da ocorrência constante do auto de notícia de fls. 105 e ss. do apenso C, pois que tal ocorreu no dia 12-12-2020
Ainda no que respeita à matéria do apenso C, atendeu-se ao testemunho de CC, militar da GNR, que subscreveu o aditamento ao auto de notícia de fls. 109 e ss. do apenso C, cujo teor confirmou.
Esta testemunha transmitiu que na altura em que se recuperou o motociclo dos autos pensaram que ele apresentava danos compatíveis com o facto de ele ter sido interveniente em acidente de viação. Assim, diligenciou junto do Hospital ... no sentido de obter informações acerca de pessoas que ali tivessem dado entrada com sinais de terem sido intervenientes em acidente de viação, tendo obtido notícia de que um individuo com tais sinais havia ali dado entrada. Nessa sequência, ainda segundo a testemunha, deslocou-se ao falado Hospital, onde chegou á fala com o arguido, que apresentava ferimentos consentâneos com a queda de uma viatura de duas rodas. Acrescentou que o arguido inicialmente negou os factos, mas posteriormente afirmou que tinha sofrido despiste com o motociclo que tinha “furtado”. Na altura tirou fotografias á roupa e sapatilhas de AA, que são as constantes de fls. 111 e 111 verso.
Os depoimentos de todas estas testemunhas mostraram-se firmes e seguros, sustentados em válida razão de ciência, coerentes com a demais prova constante dos autos, assim logrando obter total credibilidade probatória na parte em que foram concordantes com a matéria de facto dada como assente.
No que tange à matéria do apenso D, o Tribunal atendeu ao depoimento de LL,  responsável de loja do EMP01... de ..., que declarou que, na data dos autos, um individuo subtraiu do interior do estabelecimento 8 ou 9 garrafas de “bebidas brancas”. Referiu que visualizou as imagens de videovigilância, tendo constatado que o autor dos factos subtraiu aquelas garrafas, pensando que as meteu num saco. Acrescentou que dias depois a GNR lhe entregou 6 das garrafas que lhe haviam sido subtraídas, as quais estavam intactas. Também no concernente ao apenso D o Tribunal considerou o teor do depoimento de MM, responsável de loja do EMP01... de ..., que declarou ter visto a subtracção dos autos através das imagens de videovigilância, tendo constatado que “o moço” tirou as garrafas para dentro de um saco e foi embora sem pagar.
Analisados criticamente estes dois depoimentos refira-se que os mesmos foram mais titubeantes, inseguros, pouco desenvolvidos e algo confusos.
De todo o modo não se vislumbraram nos depoimentos quaisquer sinais de inimizade relativamente a qualquer dos arguidos dos autos.
Por esses motivos, os depoimentos destas testemunhas convenceram o Tribunal quando se mostraram consonantes com a matéria de facto dada como provada  (por exemplo, não convenceram o Tribunal as declarações da testemunha LL quanto ao número de garrafas subtraídas dado que, como deriva do segundo vídeo junto no DVD da contracapa do apenso D, o autor dos factos meteu 6 garrafas no interior da mochila que o acompanhava).
A principal questão suscitada nos autos em termos probatórios é a da determinação da autoria dos factos dados como provados.
Neste conspecto, o Tribunal, a par da prova directa, lançou mão da prova indiciária, indirecta ou circunstancial.
Com efeito, na formação da convicção judicial intervêm provas e presunções, sendo certo que as primeiras são instrumentos de verificação directa dos factos ocorridos e as segundas permitem estabelecer a ligação entre aquilo que temos por adquirido e aquilo que as regras da experiência nos ensinam poder inferir.
A prova do facto criminoso nem sempre é directa, de percepção imediata; muitas vezes é necessário fazer uso dos indícios. Os indícios podem referir-se à integração dos elementos materiais do tipo legal (indicio do delito) ou à autoria material do crime. Quem comete um crime busca intencionalmente o segredo da sua actuação pelo que, evidentemente, é frequente a ausência de provas directas. Exigir a todo o custo a existência destas provas implicaria o fracasso do processo penal (cfr., neste sentido, Euclides Dâmaso Simões, “Prova Indiciária” in  Julgar, n.º 2, 2007, p. 205). 

Para a valoração das presunções judiciais devem exigir-se os seguintes requisitos: 
- Pluralidade de factos-base ou indícios;
 - Precisão de tais indícios que estejam acreditados por prova de carácter directo;
 - Que sejam periféricos do facto a provar ou interrelacionados com esse facto;
 - Racionalidade da inferência;
 - Expressão, na motivação do tribunal de instância, de como se chegou à inferência.

No caso dos autos, da prova directa obtida o Tribunal sabe, em primeiro lugar, no espelho retrovisor interior do veículo de matrícula ..-..-DP foram, logo após a sua recuperação em 29-09-2020, extraídas impressões digitais pertencentes ao arguido AA e da parte superior, lado exterior, do vidro da porta do lado direito na frente da viatura foram obtidas impressões digitais pertencentes ao arguido BB.
A localização das impressões digitais do arguido AA demonstra que ele foi condutor do veículo. Efectivamente, as regras da experiência comum apontam no sentido de que, salvo situações muito pontuais, quem mexe no espelho retrovisor do veículo é o respectivo condutor, a fim de poder exercer a condução em segurança.
Por outro lado, a localização das impressões digitais atribuídas ao arguido BB é compatível com a circunstância de ele ter ocupado o lugar de passageiro na frente da viatura.
Da prova directa obtida o Tribunal sabe, em segundo lugar, que mais nenhumas impressões digitais foram localizadas no interior do veículo, o que aponta no sentido de que o condutor do veículo automóvel, durante o tempo em que ele esteve subtraído ao respectivo dono, foi sempre o mesmo.
Em terceiro lugar, o Tribunal sabe que a pessoa que, no dia 17-09-2020 e a pessoa que, no dia 24-09-2020 abasteceram o veiculo ..., de matrícula ..-..-DP têm características físicas em tudo idênticas (magro, alto, cabelo curto; tudo como melhor se percepciona através da comparação dos vídeos constantes dos DVD’s juntos em cada um dos apensos), tendo também comportamentos em tudo semelhantes (por exemplo, colocar a mangueira com a mão direita; mão esquerda a arranjar a máscara). 
Em quarto lugar, o Tribunal sabe que o modo de operar no âmbito do apenso B e no apenso A foi exactamente o mesmo. O autor dos factos desloca-se na viatura de matricula ..-..-DP ao Posto de Abastecimento da EMP03..., em ..., sai do veículo com máscara, abastece precisamente com o mesmíssimo combustível (Top 95) e abandona as instalações do posto sem proceder ao pagamento.
Em quinto lugar, o espaço temporal entre os factos é relativamente curto (os factos dos autos principais ocorreram entre 31-08-2020 e 1-09-2020, os factos do apenso B ocorreram no dia 17-09-2020 e os factos do apenso A ocorreram no dia 24-09-2020 e a viatura foi recuperada no dia 29-09-2020).
Em sexto lugar, o espaço geográfico em que os factos dos autos principais, dos apensos A e B e o lugar em que a viatura foi encontrada é relativamente reduzido.
Em sétimo lugar, inexiste qualquer facto que aponte, ainda que indiciariamente, no sentido de não ter sido o arguido AA o autor dos factos de que curam os autos principais e os apensos B e A.
Ora, todos estes factos e circunstâncias concorrem no mesmo sentido e, devidamente concatenados e perspectivados à luz das regras da normalidade (observando-se que é das regras da experiência comum que quem subtrai um veículo automóvel normalmente não comunica a terceiros esse facto criminoso, antes tenta ocultar essa circunstância da generalidade das pessoas; é também das regras da experiência comum que quem utiliza um veículo automóvel subtraído ao seu legitimo dono, a não ser que não saiba conduzir, não permite que sejam outros a conduzi-lo assim correndo riscos decorrentes da imperícia de terceiros), conduzem à conclusão (com suficiente grau de certeza) de que foi o arguido AA o autor dos factos dados como provados relativamente á matéria dos autos principais e dos apensos B e A.
Assim, da conjugação de toda a prova produzida resultou apurado, sem dúvida razoável, que foram praticados os factos descritos na matéria de facto dada como provada relativos à subtracção a que se reportam os autos principais e os apensos B e A, sendo o seu autor o arguido AA.
Passando agora á situação do apenso C, das imagens de videovigilância é possível extrair que o autor dos factos é um indivíduo alto, magro, de cabelo rapado que trajava blusão de ganga com gola branca, calças escuras e sapatilhas ... amarelas com riscas mais escuras e sola branca.
Além disso, o Tribunal sabe ainda que o motociclo subtraído foi encontrado, no dia 12-12-2020, pelas 8.50 horas da manhã, com sinais de ter sido interveniente em acidente de viação.
Ora, foi precisamente o arguido que, no dia 14-12-2020 ainda se encontrava no Hospital ..., internado no serviço de Ortopedia, com ferimentos no osso metatarso do dedo principal do pé direito e escoriações nas pernas e mãos os quais, em face das regras da experiência comum, são compatíveis com o facto de ter sido interveniente em acidente de veículo de duas rodas.
Ademais, o arguido, no Hospital, tinha umas sapatilhas de marca ..., amarelas, com riscas azuis e sola branca e um casaco da ganga com gola branca.
Todos estes factos e circunstâncias (destacando-se, entre o mais, as muito pouco comuns sapatilhas ..., de cor ..., riscas azuis e sola branca) conduzem à conclusão segura (até porque nada em contrário, sequer, se indiciou) de que foi o arguido AA, o autor da subtracção de que cura o apenso C.
Esta prova é bastante para que o Tribunal dê como provada essa autoria, por parte do arguido AA, dos factos atinentes ao apenso C.
Observe-se, neste conspecto, que ainda que tal não fosse necessário, a verdade é que o referido AA, antes de ser constituído como arguido, quando se encontrava no Hospital ..., veio a admitir perante a testemunha CC, militar da GNR, que foi ele o autor da subtracção em causa.
Ainda que para o efeito não fosse necessária, refira-se que não se vislumbra qualquer invalidade deste meio de prova, dado que não se observa qualquer má-fé do órgão de polícia criminal que, sabendo que o motociclo subtraído ao seu dono foi interveniente em acidente de viação, se desloca ao Hospital da localidade, procede á identificação de um cidadão que tinha sinais de ter sido interveniente em acidente de viação de veículo de duas rodas, tira fotografias da sua roupa e confronta esse cidadão com os factos, vindo ele a admitir a sua autoria.
Como foi bem observado no Ac. da RE de 04-06-2013 in www.dgsi.pt., proc. n.º 40/11-4GTPTG.E1, a “proibição de prova não abrange as declarações ouvidas pelos agentes policiais ao arguido, antes de este o ser ou haver obrigação de constituição, se não houver culpa das forças policiais no atrasar da formalização daquela constituição.(…) Face ao ordenamento português parece indubitável que o simples cidadão ou cidadão suspeito não goza do direito ao silêncio e, como tal, a prova produzida pelas suas declarações, melhor, depoimento, é válida se ainda não havia obrigação de constituição como arguido. (…) Se as entidades policiais agem dentro dos poderes concedidos pelas normas reguladoras da aquisição e notícia do crime (artigos 241º e 242º) e de medidas cautelares e de policia (artigos 248º e segs., designadamente o artigo 250º do C.P.P.) e, sem má fé ou atraso propositado na constituição de arguido, ouvem do cidadão ou suspeito a informação da prática de um crime, isso não constitui violação de lei ou fraude à lei, nem obtenção de prova proibida”.
(…) Por isso que a questão não se centra em saber se a proibição de “conversas informais” deve abranger afirmações anteriores ou posteriores à constituição de arguido, já que são sempre proibidas após a constituição como arguido. E nunca são antes da constituição como arguido, excepto se a má-fé policial tiver ilegalmente atrasado essa constituição.”.
Conclui assim, este Tribunal Colectivo, que, ainda que não necessária para a demonstração da autoria, esta prova é válida e vai no mesmo sentido da demais, a este propósito, produzida.
A matéria de facto dada como provada relativa aos elementos subjectivos resultou da globalidade da prova produzida, concatenada com as regras da experiência comum.
Efectivamente, a prova do elemento subjectivo, por pertencer ao mundo interior do agente, é muitas vezes indirecta (excepto nos casos em que haja confissão do arguido que abarque os inerentes pontos factuais) e infere-se da generalidade da prova gerada quando perspectivada sobre critérios de normalidade.
A matéria de facto dada como não provada deve-se à falta de elementos seguros que a permita sustentar.
Observe-se, neste conspecto, que não há prova suficiente para que se possa concluir que o arguido AA foi o autor dos factos atinentes ao apenso D.
Efectivamente, da visualização dos vídeos junto àquele apenso não possível extrair a conclusão de que o autor dos factos (que trajava camisa clara e calcões acinzentados, usando óculos de sol e máscara de protecção facial da Covid 19) tenha sido o arguido AA. Ademais, não foi possível apurar se o autor dos factos se deslocou para o estabelecimento, ou dele para qualquer outro local, apeado ou de carro e, neste caso, se o fez como condutor ou ocupante da viatura de marca ..., modelo ..., de matrícula ..-..-DP.
Ou seja, nada nos vídeos permite ligar o autor daqueles factos ao aqui arguido AA, sendo certo que a prova testemunhal, a esse propósito produzida, também não almejou tal desiderato.
Daí a não prova da autoria dos factos do apenso D.
Também não existe qualquer prova da comparticipação do arguido BB nos factos do apenso A, sendo que a mera presença do arguido no local do furto, sem qualquer participação relevante, não é suficiente para o efeito.
Foi da apreciação da prova, efectuada nos sobreditos termos, que resultou apurada a matéria de facto dada como provada e não provada.
***
II.2 ASPECTO JURÍDICO DA CAUSA

Enquadramento jurídico-penal dos factos.

Como supra se expendeu, a acusação pública imputa:
 - Ao arguido AA a prática, em autoria material e na forma consumada de 5 (cinco) crimes de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do CP e 4 (quatro) crimes de condução sem habilitação legal de veículo, p. e p. pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do DL n.º 2/98, de 3-01;
 - Ao arguido BB a prática, em co-autoria material e na forma consumada, de 1 (um) crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do CP.
Cumpre, pois, analisar se, em face dos factos provados, se poderá afirmar que os arguidos cometeram os crimes em causa.

O crime de furto.

Preceitua o artigo 203.º, n.º 1 do C.P. que “quem com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair coisa móvel ou animal alheios, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa”.
São elementos típicos do tipo-de-ilícito matricial de furto:
- A subtracção;
- de coisa móvel ou animal alheios;
- Com ilegítima intenção de apropriação (dolo específico); e,
- o elemento subjectivo, o dolo genérico - o agente tem de ter consciência que o seu comportamento é proibido por lei e mesmo assim actuar com intenção de realizar o facto tipicamente ilícito ou simplesmente aceitando o resultado (o furto) como consequência necessária do seu comportamento ou conformando-se com a eventualidade desse resultado (art. 14.º do C.P.).

Ora, considerando o que se deixa exposto e o manancial fáctico provado, temos por certo ter o arguido AA praticado os 4 crimes de furto de que curam os autos principais e os apensos B, A e C.

Com efeito, da matéria de facto dada como provada resulta que:
- Entre as 19h40 do dia 31 de Agosto de 2020 e as 08h40h do dia 01 de Setembro de 2020, o arguido AA abeirou-se do veículo de matrícula ..-..-DP, marca ..., modelo ..., cor cinza, normalmente utilizado por DD e pertença do seu pai EE, no valor de € 1000,00, que se encontrava estacionado na Rua ..., em ....
- De forma não apurada, o arguido AA forçou e estroncou a fechadura da porta dianteira, do lado de condutor, do mesmo, introduzindo-se, com toda a sua pessoa no seu interior.
- Após, o arguido AA, de forma não apurada, colocou-o em andamento, dali o levando conduzindo-o na via pública;
- O arguido AA fez seu o referido veículo, dando-lhe o destino que bem entendeu, em seu próprio proveito.
- No dia 17 de Setembro de 2020, por volta das 20h15, o arguido AA, conduzindo o veículo ligeiro de passageiros descrito em 1., na via pública, dirigiu-se ao posto de abastecimento de combustíveis “EMP03...”, sito na Rua ..., ..., ....
- Aí chegado abasteceu o aludido veículo com 19,02 litros de gasolina, no valor de €: 25,09 (vinte e cinco euros e nove cêntimos) e ausentou-se do local sem ter procedido ao respectivo pagamento.
- No dia 24 de Setembro de 2020, por volta das 17h32, o arguido AA, conduzindo o veículo ligeiro de passageiros descrito em 1, juntamente com o arguido BB, dirigiram-se ao posto de abastecimento de combustíveis “EMP03...”, sito na Rua ..., ..., ....
- Aí chegado, o arguido AA abasteceu o aludido veículo com 24,79 litros de gasolina, no valor de €: 32,70 (trinta e dois euros e setenta cêntimos) e ausentou-se do local sem ter procedido ao respectivo pagamento;
- Por volta das 19h30, do dia 11 de Dezembro de 2020, o arguido AA abeirou -se do motociclo de matrícula ..-ZJ-.., marca ..., modelo ..., pertença de EMP04... SA, de valor não apurado, mas não inferior a € 1000,00, que se encontrava estacionado na Rua ..., em ..., ....
- O arguido AA colocou-se em cima do mesmo e de forma não apurada, colocou-o em andamento, dali o levando conduzindo-o na via pública, apesar de não estar apetrechado com título legal bastante para o fazer.
Encontram-se assim preenchidos os elementos objectivos do tipo em referência.

No que diz respeito ao elemento subjectivo dos falados crimes, está ínsita na factualidade apurada (cfr. matéria de facto dada como provada sob os n.ºs 6., 13., 17., 23. e 25.) a intencionalidade e a voluntariedade dos comportamentos do arguido AA e o óbvio conhecimento da sua ilicitude, ocorrendo, pois, o dolo, aqui na sua forma directa (art. 14.º, n.º 1 do C.P.).
Inexistem quaisquer causas que justifiquem ou excluam a ilicitude da conduta do mesmo (art. 31.º e ss. do CP).
Consequentemente, face ao exposto, conclui-se que o arguido AA cometeu, em autoria material e na forma consumada, 4 crimes de furto simples (um crime inerente aos autos principais, outro relativamente à matéria do apenso B, outro atinente à matéria do apenso A e o último relativamente à matéria do apenso C), p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do CP.
Da matéria de facto dada como provada não resulta que o arguido AA tenha sido o autor da subtracção atinente à matéria do apenso D, pelo que se impõe, nessa parte, a respectiva absolvição.
Ademais, da factualidade apurada também não emerge que o arguido BB tivesse, de alguma forma, comparticipado no cometimento do crime de furto de que trata o apenso D pelo que igualmente se impõe a absolvição da prática respectiva.

O crime de condução sem habilitação legal.

Preceitua o art.º 3.º, da Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, que “Quem conduzir veículo a motor na via pública ou equiparada sem para tal estar habilitado nos termos do Código da Estrada é punido com prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias”, acrescentando o n.º 2 do mesmo inciso legal que, se “(...) o agente conduzir, nos termos do numero anterior, motociclo ou automóvel a pena é de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias”.
E, das disposições conjugadas dos artigos 105.º, 107.º, 121.º, n.º 1 e 123, n.º 1 e 2  todos do Código da Estrada resulta que apenas pode conduzir veículo a motor na via pública quem para tanto esteja habilitado com a respectiva carta ou licença de condução.
Na situação dos autos deverá concluir-se que o arguido cometeu, por 4 vezes distintas, este crime cuja prática lhe foi imputada na acusação pública.
Com efeito demonstrou-se que o arguido conduziu o veículo mencionado em 1. na via pública, sem que para o efeito estivesse habilitado com título bastante para o fazer;
- Numa primeira situação, entre as 19h40 do dia 31 de Agosto de 2020 e as 8h40 do dia 1 de Setembro de 2020 (cfr. situação dos autos principais);
-  Numa segunda situação, por volta das 20h15 do dia 17 de Setembro de 2020 (cfr. situação do apenso B);
- Numa terceira situação, por volta das 17h32 do dia 24 de Setembro de 2020 (cfr. situação do apenso A).
Ademais, no dia 11 de Dezembro de 2020, por volta das 19h30 o arguido conduziu o motociclo aludido em 19. na via pública, sem que para o efeito estivesse habilitado com título bastante para o fazer (cfr. situação do apenso C).
Encontram-se assim preenchidos, por 4 vezes, os elementos objectivos do tipo em referência.

No que diz respeito ao elemento subjectivo dos falados crimes, está ínsita na factualidade apurada (cfr. matéria de facto dada como provada sob os n.ºs 7., 14., 18., 24. e 25) a intencionalidade e a voluntariedade dos comportamentos do arguido AA e o óbvio conhecimento da sua ilicitude, ocorrendo, pois, o dolo, aqui na sua forma directa (art. 14.º, n.º 1 do C.P.).
Inexistem quaisquer causas que justifiquem ou excluam a ilicitude da conduta doo mesmo (art. 31.º e ss. do CP).
Consequentemente, face ao exposto, conclui-se que o arguido AA cometeu, em autoria material e na forma consumada, 4 crimes de condução sem habilitação legal de veículo, p, e p pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do DL n.º 2/98, de 03-01.
***
CONSEQUÊNCIAS JURIDICAS DO CRIME.

Qualificados os factos, cumpre agora proceder à determinação da natureza e medida da pena a aplicar.
As molduras penais abstractas para os crimes praticados pelo arguido são as seguintes:
- Furto simples – Pena de prisão de 1 mês até 3 anos ou pena de multa de 10 até 360 dias;
- Condução sem habilitação legal – Pena de prisão de 1 mês até 2 ano ou pena de multa de 10 até 240 dias.
Uma vez que os crimes em causa definem uma pena alternativa de prisão ou multa importará, num primeiro momento, determinar qual das duas penas será aplicável ao arguido pela prática dos falados crimes.
Nesta sede, afirme-se que ainda que se entenda a pena privativa de liberdade como ultima ratio da política criminal e os arts. 70.º e 40.º do C.P. imponham que entre a aplicação de uma pena privativa da liberdade e de uma pena não detentiva, se dê preferência à segunda, desde que ela realize “de forma adequada e suficiente as finalidades da prevenção” e prossiga a protecção dos bens jurídicos violados e a reintegração do agente na sociedade, entende-se que in casu, considerando o rol de condenações penais já sofridas pelo arguido AA (o arguido conta com condenações penais pela prática, desde o ano de 2009 de diversos crimes, designadamente, condução sem habilitação legal e furto) a aplicação de uma pena de multa seria incompreensível para a generalidade da comunidade jurídica e perturbaria a confiança do público no direito, para além de representar para o arguido uma censura ética muito suave, destituída de suficiente poder persuasor para se alcançar o proposto e desejável objectivo de prevenção especial (recuperação e ressocialização do mesmo).
Desta forma, quanto à natureza da pena a aplicar ao arguido pela prática dos crimes de furto simples e de condução sem habilitação legal, entende-se que, no caso concreto, é de aplicar uma pena de prisão por cada um dos falados crimes cometidos.
Determinada a natureza das penas a aplicar cumpre agora proceder à sua fixação concreta.
Dentro dos limites das penas de prisão acima referidas para os crimes em confronto teremos, portanto, de elaborar a dosimetria cingidos à regra do art. 71º do C.P. vigente, valorando: a culpa do agente, a concorrência de circunstâncias agravantes ou atenuantes estranhas à tipicidade e a satisfação das exigências preventivas (geral e especial).

Assim, valora-se:

a) Em desfavor do arguido.
- O grau de culpa é elevado, sendo o dolo directo e intenso em todos os crimes cometidos pelo arguido;
- Quanto aos crimes de furto, o grau de ilicitude é médio (no que respeita aos crimes de furto do processo principal e do apenso C) e médio/baixo (nos demais) tendo presente, designadamente, as modalidades das acções perpetradas pelo arguido, os seus alvos e as quantias e valores dos bens de que se apropriou. No que respeita ao crime condução sem habilitação legal o grau de ilicitude é médio nas situações em que o arguido conduziu viatura automóvel e médio/baixo no que respeita ao motociclo;
- Atendeu-se ainda aqui, no que respeita aos crimes de furto, à não reparação dos donos dos bens/valores subtraídos;
– Os motivos que estiveram na determinação dos crimes de furto estão na incapacidade do arguido em respeitar o património alheio;
 - Os sentimentos manifestados no cometimento dos crimes – comportamento egoístico e socialmente desajustado;
- As exigências de prevenção geral são muito elevadas, dado o crescente aumento destes tipos de delitos;
 - As exigências de prevenção especial são elevadas, valorando-se especialmente: a)  O número de crimes perpetrados pelo arguido que nestes autos se encontram em causa; b) A circunstância de o arguido já ter outras condenações penais pela prática, desde 2009, de diversos crimes, entre os quais se incluem os crimes de condução sem habilitação legal e de furto; c) Os crimes em causa foram praticados durante o período de suspensão da execução da pena de prisão que lhe foi aplicada no processo n.º 133/17.4PFBRG (nesse processo, por acórdão datado de 29-11-2018, transitado em 11-01-2019, foi condenado, pela prática em 21-12-2017, de três crimes de roubo e um crime de detenção de arma proibida, na pena de 2 anos e 10 meses suspensa na sua execução e ainda na pena de 200 dias de multa).

b) Em favor do arguido;
 - Que os valores subtraídos no âmbito dos apensos B e A foram diminutos.
- Os veículos dos autos foram ambos recuperados pela GNR;
Destarte, tudo ponderado, atendendo aos limites abstractos das penas de prisão acima referidos, fazendo apelo a critérios de justiça, adequada proporcionalidade entre a gravidade dos crimes e a culpa do arguido, concomitantemente com a ideia de uma certa intimidação e dissuasão ou de pura prevenção geral negativa, entende-se justa a imposição ao arguido AA;
 - Da pena de 1 ano e 6 meses de prisão pela prática do crime de furto simples, atinente à matéria do processo principal;
- Da pena de 6 meses de prisão pela prática de cada um dos (dois) crimes de furto simples relativos à matéria dos apensos B e A;
- Da pena de 1 ano e 2 meses de prisão pela prática do crime de furto simples atinente à matéria do apenso C;
- Da pena de 6 meses de prisão por cada um dos 3 crimes de condução sem habilitação legal atinentes á matéria dos autos principais e dos apensos B e A;
- Da pena de 4 meses de prisão pelo crime de condução sem habilitação legal relativo á matéria do apenso C.

O concurso de penas.
Como supra se referiu, o arguido AA cometeu vários crimes, tendo já sido fixada a pena parcelar de cada um deles.
Exige-se agora que, em cumprimento do disposto no artigo 77.º, n.º 1 do C.P., o Tribunal fixe uma pena única.
A este propósito e antes de mais, diga-se que a pena aplicável ao concurso terá, no caso concreto, o limite mínimo de 1 ano e 6 meses de prisão e o limite máximo de 5 anos e 6 meses de prisão.
Dentro desta moldura da pena do concurso encontrada, nos termos do artigo 77, n.º 2, do C.P, cumpre determinar, agora, a pena única, considerando, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, como prescreve o artigo 77.º, n.º 1 do C.P..

Aqui chegados, e considerando:
 - O facto de todos os crimes terem sido cometidos com dolo directo e intenso (o que releva em desfavor do arguido);
 - Que os bens/valores subtraídos, na sua globalidade alcançam um valor mediano;
 - Que todos os crimes não foram perpetrados na mesma ocasião e lugar (o que releva em seu desfavor), embora tenham sido cometidos dentro de um período temporal relativamente limitado (entre 31-08-2020 e 11-12-2020);
- O número de crimes praticados pelo arguido no referido período (entre 31-08-2020 e 11-12-2020) é algo significativo, sendo certo que ele já tem antecedentes criminais registados, inclusivamente pela prática de crimes que protegem, além do mais, o património. Esta circunstância denuncia uma propensão, por parte do arguido, para a prática dos delitos que se encontram nestes autos em discussão;

Entende-se adequado e justo aplicar ao arguido a pena única de 3 anos de prisão.

Da suspensão da execução da pena de prisão.
Saliente-se agora que, nos termos do disposto no artigo 50.º do C.P. vigente o Tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
O pressuposto formal da aplicação desta medida é a que a medida da pena de prisão a aplicar não seja superior a 5 anos.
O pressuposto material é que o Tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do delinquente. Necessário é, pois, que se conclua que a simples censura do facto e a ameaça da pena – ainda que, porventura, acompanhadas de deveres e/ou regras de conduta – sejam suficientes para afastar o delinquente da criminalidade.
Como Figueiredo Dias in Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime -, Notícias Editorial, p. 344, entendemos que, existindo “razões sérias para duvidar da capacidade do agente de não repetir crimes, se for deixado em liberdade, o juízo de prognose deve ser desfavorável e a suspensão negada”.
Nesta sede e para estes efeitos, da globalidade da matéria de facto dada como assente, destaca-se, desde logo, o já algo extenso rol de crimes praticados pelo arguido.
Efectivamente o arguido AA conta no seu registo criminal  com um relativamente extenso rol de condenações pela prática, desde o ano de 2009 e até 2023 de vários crimes (No processo 192/09.3GAAMR foi condenado pela prática em 06-05-2009, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal; No processo no processo 167/13.8TABRG foi condenado pela prática em 11-01-2013, de um crime de detenção de arma proibida; No processo 668/12.5GAAMR foi condenado pela prática em 16-11-2012, de um crime de furto qualificado; No processo 133/17.4PFBRG, foi condenado pela prática em 21-12-2017, de três crimes de roubo e um crime de detenção de arma proibida; No processo 1105/18.7PBBRG, foi condenado pela prática em 18- 08-2018, de um crime de furto de uso de veículo; No processo 475/17.9PBBRG, foi condenado pela prática em 01-03-2017, de 3 crimes de roubo; No processo 1795/20.0PBBRG, foi condenado pela prática em 07-12-2020, de 3 crimes de furto qualificado; No processo 794/20.0GCBRG, foi condenado pela prática em 01-12-2020, de 1 crime de furto qualificado; Foi condenado por Tribunal Francês por sentença de 06-07-2023, transitada em julgado em 17-07-2023, pela prática, em 21-04-2023 de um crime de furto após violação de propriedade privada, em 30-04-2023, de um crime de furto após violação de propriedade privada, em 09-05-2023, de um crime de furto agravado e em 19-05-2023, de um crime de furto após violação de propriedade privada, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão; Por Tribunal Francês por sentença de 18-08-2023, transitada em julgado em 20-11-2023, foi condenado, pela prática, em 19-04-2023, de um crime de furto agravado, em pena de multa; O arguido foi condenado por Tribunal Francês por sentença de 13-10-2023, transitada em julgado em 03-11-2023, pela prática, em 10-10-2023, de um crime de furto apos violação de propriedade privada, na pena de 3 meses de prisão) sendo certo que as sucessivas penas não detentivas que lhe foram sendo aplicadas, manifestamente, não alcançaram o seu desiderato, dado que o arguido continuou na senda da prática dos actos criminalmente puníveis.
Observe-se, ainda nesta sede, que os crimes dos autos foram praticados durante o período da suspensão da execução da pena de prisão que lhe foi aplicada no processo n.º 133/17.4PFBRG.
Em face de todo o exposto, o Tribunal Colectivo entende não se mostrarem reunidas as condições para que se formule um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento futuro do arguido.
Na verdade, atendendo às ditas matrizes, não se poderá afirmar que as condutas do arguido em causa nos autos consubstanciaram um episódio meramente acidental, esporádico, ocasional, e que a ameaça da pena, como medida de reflexos sobre o seu comportamento futuro, evitará a repetição de condutas delitivas.
Com efeito, atendendo ao que se deixa exposto não se vê como se possa formular um juízo de prognose positivo relativamente á conduta do arguido.
Por essas razões, não se suspende a execução da pena de prisão aplicada ao arguido.

3- Apreciação do recurso
3.1- O arguido / recorrente AA pretende que se desconsidere o depoimento efetuado pela testemunha CC, militar da GNR, estando em causa apenas os factos relativos ao apenso C.
Vejamos.

Os factos considerados como provados no acórdão recorrido relativos ao apenso C são os seguintes:
 
“19. Por volta das 19h30, do dia 11 de Dezembro de 2020, o arguido AA abeirou-se do motociclo de matrícula ..-ZJ-.., marca ..., modelo ..., pertença de EMP04... SA, de valor não apurado, mas não inferior a € 1000,00, que se encontrava estacionado na Rua ..., em ..., ....
20. O arguido AA colocou-se em cima do mesmo e de forma não apurada, colocou-o em andamento, dali o levando conduzindo-o na via pública, apesar de não estar apetrechado com título legal bastante para o fazer.
21. O arguido AA fez seu o referido veículo, dando-lhe o destino que bem entendeu, em seu próprio proveito.
22. O veículo foi recuperado pela GNR, no dia seguinte, pelas 08h50, na Rua ... em ..., ....
23. O arguido AA agiu com o propósito concretizado de fazer seu o veículo em apreço, apesar de saber que este não lhe pertencia e que estava a agir contra a vontade e em prejuízo do respectivo proprietário.
24.Sabia o arguido carecer de habilitação para dirigir o dito veículo como suprarreferido; apesar de tal, não se coibiu de o tripular, como descrito.
25. Agiu o arguido AA, sempre, de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.”
No que concerne aos referidos factos, o tribunal recorrido fundamentou a sua convicção aduzindo o seguinte:
“- Quanto à matéria do apenso C: Auto de notícia de fls. 97; Resultados das pesquisas nas bases de dados inerentes ao motociclo de matricula ..-JZ-.. (cfr. fls. 65 e 77); Aditamento ao auto de noticia (cfr. fls. 105 a 106, atinente á recuperação do motociclo); auto de apreensão de fls. 107; Termo de entrega de fls. 108; Aditamento ao auto de notícia de fls. 109 e relatório fotográfico anexo; CD contendo imagens de videovigilância (fls. 116); Auto de visionamento e extracção de fotogramas de fls. 116 e ss.
Relativamente ao apenso C, considerou-se igualmente o testemunho de KK, militar da GNR que subscreveu o aditamento de fls. 105 do apenso C e, no essencial, confirmou o respectivo conteúdo. Assim, adiantou a testemunha que nesse dia foram avisados da existência de um motociclo abandonado, pelo que se deslocou ao local. Referiu que, uma vez chegada ao local, viu que o motociclo dos autos, estava no chão, encontrando-se a chave na respectiva ignição. Relatou que o motociclo apresentava danos, aparentando ter sido interveniente em acidente.  Através da matrícula, verificou que esse motociclo constava para apreensão, pelo que procedeu à respectiva apreensão. Acrescentou ter existido lapso na indicação da data da ocorrência constante do auto de notícia de fls. 105 e ss. do apenso C, pois que tal ocorreu no dia 12-12-2020
Ainda no que respeita à matéria do apenso C, atendeu-se ao testemunho de CC, militar da GNR, que subscreveu o aditamento ao auto de notícia de fls. 109 e ss. do apenso C, cujo teor confirmou.
Esta testemunha transmitiu que na altura em que se recuperou o motociclo dos autos pensaram que ele apresentava danos compatíveis com o facto de ele ter sido interveniente em acidente de viação. Assim, diligenciou junto do Hospital ... no sentido de obter informações acerca de pessoas que ali tivessem dado entrada com sinais de terem sido intervenientes em acidente de viação, tendo obtido notícia de que um individuo com tais sinais havia ali dado entrada. Nessa sequência, ainda segundo a testemunha, deslocou-se ao falado Hospital, onde chegou á fala com o arguido, que apresentava ferimentos consentâneos com a queda de uma viatura de duas rodas. Acrescentou que o arguido inicialmente negou os factos, mas posteriormente afirmou que tinha sofrido despiste com o motociclo que tinha “furtado”. Na altura tirou fotografias á roupa e sapatilhas de AA, que são as constantes de fls. 111 e 111 verso.
Os depoimentos de todas estas testemunhas mostraram-se firmes e seguros, sustentados em válida razão de ciência, coerentes com a demais prova constante dos autos, assim logrando obter total credibilidade probatória na parte em que foram concordantes com a matéria de facto dada como assente.
(…)
Passando agora á situação do apenso C, das imagens de videovigilância é possível extrair que o autor dos factos é um indivíduo alto, magro, de cabelo rapado que trajava blusão de ganga com gola branca, calças escuras e sapatilhas ... amarelas com riscas mais escuras e sola branca.
Além disso, o Tribunal sabe ainda que o motociclo subtraído foi encontrado, no dia 12-12-2020, pelas 8.50 horas da manhã, com sinais de ter sido interveniente em acidente de viação.
Ora, foi precisamente o arguido que, no dia 14-12-2020 ainda se encontrava no Hospital ..., internado no serviço de Ortopedia, com ferimentos no osso metatarso do dedo principal do pé direito e escoriações nas pernas e mãos os quais, em face das regras da experiência comum, são compatíveis com o facto de ter sido interveniente em acidente de veículo de duas rodas.
Ademais, o arguido, no Hospital, tinha umas sapatilhas de marca ..., amarelas, com riscas azuis e sola branca e um casaco da ganga com gola branca.
Todos estes factos e circunstâncias (destacando-se, entre o mais, as muito pouco comuns sapatilhas ..., de cor ..., riscas azuis e sola branca) conduzem à conclusão segura (até porque nada em contrário, sequer, se indiciou) de que foi o arguido AA, o autor da subtracção de que cura o apenso C.
Esta prova é bastante para que o Tribunal dê como provada essa autoria, por parte do arguido AA, dos factos atinentes ao apenso C.
Observe-se, neste conspecto, que ainda que tal não fosse necessário, a verdade é que o referido AA, antes de ser constituído como arguido, quando se encontrava no Hospital ..., veio a admitir perante a testemunha CC, militar da GNR, que foi ele o autor da subtracção em causa.
Ainda que para o efeito não fosse necessária, refira-se que não se vislumbra qualquer invalidade deste meio de prova, dado que não se observa qualquer má-fé do órgão de polícia criminal que, sabendo que o motociclo subtraído ao seu dono foi interveniente em acidente de viação, se desloca ao Hospital da localidade, procede á identificação de um cidadão que tinha sinais de ter sido interveniente em acidente de viação de veículo de duas rodas, tira fotografias da sua roupa e confronta esse cidadão com os factos, vindo ele a admitir a sua autoria.
Como foi bem observado no Ac. da RE de 04-06-2013 in www.dgsi.pt., proc. n.º 40/11-4GTPTG.E1, a “proibição de prova não abrange as declarações ouvidas pelos agentes policiais ao arguido, antes de este o ser ou haver obrigação de constituição, se não houver culpa das forças policiais no atrasar da formalização daquela constituição.(…) Face ao ordenamento português parece indubitável que o simples cidadão ou cidadão suspeito não goza do direito ao silêncio e, como tal, a prova produzida pelas suas declarações, melhor, depoimento, é válida se ainda não havia obrigação de constituição como arguido. (…) Se as entidades policiais agem dentro dos poderes concedidos pelas normas reguladoras da aquisição e notícia do crime (artigos 241º e 242º) e de medidas cautelares e de policia (artigos 248º e segs., designadamente o artigo 250º do C.P.P.) e, sem má fé ou atraso propositado na constituição de arguido, ouvem do cidadão ou suspeito a informação da prática de um crime, isso não constitui violação de lei ou fraude à lei, nem obtenção de prova proibida”.
(…) Por isso que a questão não se centra em saber se a proibição de “conversas informais” deve abranger afirmações anteriores ou posteriores à constituição de arguido, já que são sempre proibidas após a constituição como arguido. E nunca são antes da constituição como arguido, excepto se a má-fé policial tiver ilegalmente atrasado essa constituição.”.
Conclui assim, este Tribunal Colectivo, que, ainda que não necessária para a demonstração da autoria, esta prova é válida e vai no mesmo sentido da demais, a este propósito, produzida.”

3.2- Como resulta da fundamentação do acórdão recorrido acima transcrito, o depoimento efetuado pela testemunha CC, militar da GNR, na parte em que relatou o que lhe foi dito pelo ora arguido AA, não foi considerada necessária para a prova da autoria dos factos. Nessa parte, o depoimento efetuado pela referida testemunha apenas serviu para confirmar o resultado da investigação. Ou seja, de que o arguido efetivamente foi o autor dos factos.
Apesar disso, porque a questão foi suscitada pelo recorrente no presente recurso e apreciada no acórdão recorrido, impõe-se que nos pronunciemos, com referência ao caso concreto, sobre a questão da   validade das chamadas “declarações informais” prestadas perante órgão de policia criminal pelo suspeito ou arguido.
Como é sabido, esta questão não é nova, sendo que a jurisprudência encontra-se dividida relativamente ao valor probatório das referidas declarações informais, entre aqueles que afastam, por forma irredutível, a sua validade[3], e aqueles que admitem a sua validade somente em determinadas situações[4].
Segundo aqueles que defendem aquela primeira posição ““O princípio da legalidade do processo e o estatuto do arguido (cf., v.g., os arts. 2º, 56º e ss., 262º e ss., 275º, 355º a 357º, com especial destaque para o nº 7 do art. 356º e nº 2 do art. 357º), impedem que sejam consideradas como prova depoimentos de órgãos de polícia criminal, encarregados de actos de investigação, referindo declarações do arguido (ou de alguém que devesse ser constituído como tal - cf. arts. 58º e 59º do C.P.P.), mesmo que sob a forma de conversas informais, a esses órgãos de polícia criminal encarregados de actos de investigação, quando essas declarações não forem reduzidas a auto.
Entendimento contrário implicaria que pudessem ser tomadas em conta, para efeitos de prova, declarações do arguido que não o poderiam ser se constantes de auto cuja leitura não fosse permitida em audiência nos termos dos art. 357º, conjugado com os arts. 355º e 356º, nº 7. Constituiria manifesta ofensa do fim prosseguido pela lei com estas disposições, revelado pelo seu espírito, designadamente a salvaguarda dos princípios da oralidade, da imediação, da publicidade, do contraditório, da concentração.”, cfr. Ac. STJ de 09.07.2003, processo nº 03P615, disponível em www.dgsi.pt.
Em reforço do sobredito entendimento, pode ler-se no ac. STJ de 30.11.2022, processo nº 417/14.3TACBR.C3.S1, também disponível em www.dgsi.pt “(…) mesmo que se entenda que o direito ao silêncio nasce apenas quando o arguido é constituído nessa qualidade (assim, Adriana Ristori, Sobre o silêncio do Arguido no Interrogatório no Processo Penal Português, p. 104), o seu exercício em concreto – pelo arguido, como arguido – não pode deixar de silenciar, apagando, tudo o que fora por ele declarado anteriormente no processo.
Estão em causa as declarações como meio de prova, e não outros contributos probatórios do arguido, que convocam outras noções e soluções, e estão fora do objecto do recurso. Declarações que o sejam materialmente, independentemente da forma que assumam no processo: transcritas em auto de declarações ou incorporadas em auto de ocorrência elaborado por um opc que regista o que ouviu de testemunhas, suspeitas ou não. E se a testemunha vem posteriormente a adquirir a posição de arguido e, nessa qualidade, exerce o direito ao silêncio, verifica-se então como que um efeito expansivo do exercício do silêncio.”
No acórdão recorrido, como vimos, foi seguida a segunda orientação segundo a qual não constitui fraude á lei, nem obtenção de prova proibida, designadamente, quando as entidades policiais agem dentro dos poderes concedidos pelas normas reguladoras da aquisição e notícia do crime (artigos 241º e 242º do CPP) e de medidas cautelares e de policia (artigos 248º e segs., designadamente o artigo 250º do CPP) e, sem má fé ou atraso propositado na constituição de arguido, ouvem do cidadão ou suspeito a informação da prática de um crime.
Assim, segundo aqueles que defendem esta posição, de que é exemplo o Ac. RE de 26.09.2023, processo 25/17.7GBRDD.E1, disponível em www.dgsi.pt   “A qualidade de agente policial e os deveres que lhe incumbem de formalização em atos processuais das declarações do arguido, assim como a necessidade de evitar que na pendência do inquérito se pratiquem atos que sejam impeditivos do direito de defesa dos arguidos levou o legislador a estabelecer uma barreira de proibição de produção e valoração de prova, a resultante do regime decorrente dos artigos 356º, nº 7 e 357º, nsº 2 e 3 do Código de Processo Penal. É óbvio que essa barreira se concretiza na proibição da sua produção e valoração em audiência de julgamento, mas daí decorre a proibição da sua prática em inquérito.
O que o legislador pretende é instituir a exclusividade de produção (realização) do meio de prova “declarações do arguido” através de uma forma vinculada, taxativa, típica, prevista ao pormenor nos artigos 140 a 144º do Código de Processo Penal, com o nome “interrogatório de arguido”, com exclusão de qualquer outra forma.
Há, portanto, uma vinculação formal, uma taxatividade, uma tipicidade de forma nos interrogatórios de arguido, detido ou não. O meio de prova “declarações de arguido” tem que ser veiculado através de um “interrogatório” previsto nos artigos 140 a 144 do C.P.P.. O meio de prova “declarações de arguido” não pode ser veiculado por “conversas informais” ou qualquer outra forma presumindo-se que, não se seguindo a forma indicada, há fraude à lei.
Portanto o que se pretende é evitar que as forças policiais consigam introduzir em audiência de julgamento um elemento de prova cujo cumprimento normativo é inexistente e, consequentemente, cuja falta de fiabilidade é patente e potenciadora da violação de direitos do cidadão.
Assim, as “conversas informais” são uma informalidade afrontosa, fraudulenta, que permite a violação desses direitos que se pretendem acautelar. E surgem nos processos como forma de tornear a previsão dos artigos 140 a 144º e 356º e 357º do Código de Processo Penal. E surgem temporalmente muito cedo, pouco após a entrada em vigor deste código, uma forma ínvia de tentar a “revogação” prática do C.P.P..
Ou seja, uma forma de tornear direitos e, assim, negá-los, em nome de uma suposta verdade “descoberta” pelo investigador policial que, dessa forma, pretende determinar o resultado do julgamento. São, portanto, um expediente de má polícia. Um abuso. Uma fraude à lei e ao Direito. E incumbe a qualquer tribunal impedir essa fraude ao Direito.
Por outro lado, a sua consideração como prova válida conduziria ao abuso policial como sistema, ao descrédito da Justiça e à violação de direitos do arguido em inquérito – “declarações” não controladas (se é que o são pois que podem ser simulações ou falsidades) – que se podem refletir em audiência de julgamento (“Direito ao Silêncio” ali exercido).”
(…)
Mas  ainda segundo o mesmo aresto “(… ) não há conversas informais quando as forças policiais se limitam a cumprir os preceitos legais, quer pela necessidade de «documentar» a prática do ilícito e suas sequelas, designadamente providenciar os atos cautelares que se imponham (v. g. artigos 243.º, 248.º a 250.º CPP), quer quando atuam por imposição legal ao detetarem a prática de um ilícito e o arguido decide – por sua iniciativa e sem atuação criticável das forças policiais – fazer afirmações não sugeridas, provocadas ou imaginadas por aqueles OPC.”
No caso em apreço, aquando das alegadas declarações perante o OPC, já existia um inquérito pendente, o recorrente já era um suspeito da prática do crime, visto existirem imagens de videovigilância dos factos, o OPC já tinha identificado as suas roupas e os seus ferimentos compatíveis com o acidente do motociclo que havia já sido apreendido e recuperado com danos, daí o interrogar e questionar sobre o ocorrido, o qual após insistência do OPC, terá confessado a prática dos factos.
Por isso, mesmo para quem defenda a validade das chamadas declarações informais em determinadas situações, não se vislumbra como é que, no caso vertente, se possa defender a validade das referidas declarações em face do disposto nos artigos 356º, nº 6 e 357º, nº 3, ambos do CPP. No caso não estamos perante uma situação enquadrável nos artigos 243º, 248º a 250º do CPP. O que se impunha, nos termos legais, nas sobreditas circunstâncias, era a constituição do suspeito como arguido e o seu interrogatório formal.
Assim, somos levados a concluir no sentido de que, no caso concreto destes autos, não podem ser valoradas as declarações informais prestadas pelo arguido AA ao militar CC, as quais foram por este relatadas, na qualidade de testemunha, em audiência de julgamento.
Porém, daí não decorre qualquer consequência, designadamente o efeito pretendido pelo recorrente, ou seja, a consideração dos factos como não provados e a absolvição do arguido da prática dos crimes relativos ao apenso C. Na verdade, como foi salientado no acórdão recorrido, as referidas declarações informais do arguido não foram consideradas necessárias para a prova dos factos, em face dos demais elementos probatórios constantes dos autos e referidos na fundamentação da matéria de facto do acórdão, os quais, aliás, não foram impugnados pelo recorrente.
 Nesta conformidade, pese embora não possam ser consideradas as declarações informais prestadas pelo arguido AA perante Órgão de Polícia Criminal, improcede este segmento do recurso.

3.2- O recorrente insurge-se contra a pena efetiva de prisão em que foi condenado em primeira instância, pugnando pela suspensão da sua execução, ainda que condicionada ao cumprimento de condições, regras de conduta ou a regime de prova, com fundamento, em síntese, que os bens subtraídos revestem um valor diminuto e todos foram recuperados pelas autoridades policias, com exceção do combustível, pelo que a gravidade e a ilicitude dos factos é reduzida, concluindo no sentido de que a suspensão da execução da pena satisfaz as finalidades da punição.
  Vejamos.
Nos termos do disposto no nº 1 do artigo 50º do C. Penal “O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”
Em face do que dispõe esta norma, a suspensão da execução da pena de prisão depende da verificação de dois pressupostos: um formal e outro material.
O pressuposto de ordem formal exige que a pena aplicada não exceda cinco anos.
 Quanto ao pressuposto material - “que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”, entendidas estas de acordo com o disposto no artigo 40º, nº 1 do CP , segundo o qual a aplicação das penas visa a “proteção de bens jurídicos e reintegração do agente na sociedade” - convirá referir que a suspensão da execução da pena, como qualquer pena de substituição, não pode ser vista como forma de clemência legislativa, mas como autêntica medida de tratamento bem definido com sentido pedagógico e educativo.[5]
Acresce que, não podemos olvidar, que a pena de prisão suspensa, sujeita ou não  a certas condições ou obrigações, é a reação penal por excelência que exprime um juízo de desvalor ético – social e que não só antevê, como propicia ao condenado, a sua reintegração na sociedade, que é um dos vetores dos fins das penas.
Porém, um dos seus vetores é a proteção dos bens jurídicos violados e, naturalmente, a proteção da própria vítima e da sociedade em relação aos agentes do crime, de modo que, responsabilizando suficientemente estes últimos, se possa esperar que os mesmos não venham a adotar novas condutas desviantes.
Com ensina Figueiredo Dias, in As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 344, “Apesar da conclusão do tribunal por um prognóstico favorável – à luz, consequentemente, de considerações exclusivas de prevenção especial de socialização -, a suspensão da execução da prisão não deverá ser decretada se a ela se opuserem «as necessidades de reprovação e prevenção do crime»(…) estão aqui em questão não quaisquer considerações relativas à culpa, mas exclusivamente considerações de prevenção geral sob a forma de exigência mínimas e irrenunciáveis do ordenamento jurídico. Só por estas exigências se limita – mas por elas limita sempre - o valor da socialização em liberdade que ilumina o instituto em análise”.
No mesmo sentido, vide Maria João Antunes, in Penas e Medidas de Segurança, Almedina, 2018, pág. 77, para quem “A afirmação de que são finalidades exclusivamente preventivas as que justificam e impõem a preferência por uma pena não privativa da liberdade não invalida que a finalidade preventiva primordial seja a de proteção de bens jurídicos. A defesa da ordem jurídica e da paz social – o conteúdo mínimo da prevenção geral positiva – atua como limite às exigências de prevenção especial”.  
Na mesma linha, vem sendo decidido na jurisprudência. Assim, v.g. no Acórdão RE, de 24.04.2007, CJ, Ano XXXII, Volume 1, p. 258 e segs., pode ler-se “Desde que as exigências de prevenção especial fiquem asseguradas, a pena de prisão só não deve ser suspensa na sua execução se a esta decisão se opuserem as exigências mínimas de prevenção geral constituído pela defesa irrenunciável do ordenamento jurídico”; e o ac. RC de 27.09.2017, processo 147/15.9GTCTB.C1, disponível em www.dgsi.pt, segundo o qual “As finalidades da punição são a protecção dos bens jurídicos e, na medida do possível, a reintegração do agente na comunidade (arts. 40º, nº 1, e 71º, nº 1, do CP) sendo portanto, razões de prevenção, geral e especial, e não considerações relativas à culpa (como sucede aliás, com todas as operações de escolha das penas de substituição), que fundam o instituto da suspensão da execução da pena de prisão.” No mesmo sentido vide ainda, v.g., o Ac. STJ de 18.12.2008, processo 08P2837, também disponível em www.dgsi.pt.
Será, pois, na aludida dupla perspetiva que deverá incidir um juízo de prognose favorável à suspensão da correspondente pena de prisão, sendo certo que o ponto de partida para essa ponderação será sempre o momento desta decisão e não o momento da prática do crime[6].
Tal como refere Jescheqck[7] na base da decisão de suspensão da pena de prisão deverá estar uma prognose social favorável ao arguido, ou seja, a esperança de que o arguido sentirá a sua condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum crime. O Tribunal deverá correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza, mas se tem dúvidas sobre a capacidade do arguido para compreender a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, a prognose deve ser negativa, cfr. Leal Henriques e Simas Santos, C. Penal Anotado, 1º Vol., 2ª Edição, 1995, Rei dos Livros, pág. 444 e Figueiredo Dias, ob. cit., pág. 344.
Nessa prognose deve atender-se à personalidade do arguido, às suas condições de vida, à conduta anterior e posterior ao facto punível, às circunstâncias deste, ou seja, devem ser valoradas todas as circunstâncias que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido, sendo certo que agora e em último termo somente poderão ser atendidas razões de prevenção especial.
No caso vertente, o tribunal recorrido fundamentou a necessidade de execução da pena de prisão, em face dos antecedentes criminais do arguido, ou seja, por razões de prevenção especial, nos seguintes termos:
“Saliente-se agora que, nos termos do disposto no artigo 50.º do C.P. vigente o Tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
O pressuposto formal da aplicação desta medida é a que a medida da pena de prisão a aplicar não seja superior a 5 anos.
O pressuposto material é que o Tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do delinquente. Necessário é, pois, que se conclua que a simples censura do facto e a ameaça da pena – ainda que, porventura, acompanhadas de deveres e/ou regras de conduta – sejam suficientes para afastar o delinquente da criminalidade.
Como Figueiredo Dias in Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime -, Notícias Editorial, p. 344, entendemos que, existindo “razões sérias para duvidar da capacidade do agente de não repetir crimes, se for deixado em liberdade, o juízo de prognose deve ser desfavorável e a suspensão negada”.
Nesta sede e para estes efeitos, da globalidade da matéria de facto dada como assente, destaca-se, desde logo, o já algo extenso rol de crimes praticados pelo arguido.
Efectivamente o arguido AA conta no seu registo criminal  com um relativamente extenso rol de condenações pela prática, desde o ano de 2009 e até 2023 de vários crimes (No processo 192/09.3GAAMR foi condenado pela prática em 06-05-2009, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal; No processo no processo 167/13.8TABRG foi condenado pela prática em 11-01-2013, de um crime de detenção de arma proibida; No processo 668/12.5GAAMR foi condenado pela prática em 16-11-2012, de um crime de furto qualificado; No processo 133/17.4PFBRG, foi condenado pela prática em 21-12-2017, de três crimes de roubo e um crime de detenção de arma proibida; No processo 1105/18.7PBBRG, foi condenado pela prática em 18- 08-2018, de um crime de furto de uso de veículo; No processo 475/17.9PBBRG, foi condenado pela prática em 01-03-2017, de 3 crimes de roubo; No processo 1795/20.0PBBRG, foi condenado pela prática em 07-12-2020, de 3 crimes de furto qualificado; No processo 794/20.0GCBRG, foi condenado pela prática em 01-12-2020, de 1 crime de furto qualificado; Foi condenado por Tribunal Francês por sentença de 06-07-2023, transitada em julgado em 17-07-2023, pela prática, em 21-04-2023 de um crime de furto após violação de propriedade privada, em 30-04-2023, de um crime de furto após violação de propriedade privada, em 09-05-2023, de um crime de furto agravado e em 19-05-2023, de um crime de furto após violação de propriedade privada, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão; Por Tribunal Francês por sentença de 18-08-2023, transitada em julgado em 20-11-2023, foi condenado, pela prática, em 19-04-2023, de um crime de furto agravado, em pena de multa; O arguido foi condenado por Tribunal Francês por sentença de 13-10-2023, transitada em julgado em 03-11-2023, pela prática, em 10-10-2023, de um crime de furto apos violação de propriedade privada, na pena de 3 meses de prisão) sendo certo que as sucessivas penas não detentivas que lhe foram sendo aplicadas, manifestamente, não alcançaram o seu desiderato, dado que o arguido continuou na senda da prática dos actos criminalmente puníveis.
Observe-se, ainda nesta sede, que os crimes dos autos foram praticados durante o período da suspensão da execução da pena de prisão que lhe foi aplicada no processo n.º 133/17.4PFBRG.
Em face de todo o exposto, o Tribunal Colectivo entende não se mostrarem reunidas as condições para que se formule um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento futuro do arguido.
Na verdade, atendendo às ditas matrizes, não se poderá afirmar que as condutas do arguido em causa nos autos consubstanciaram um episódio meramente acidental, esporádico, ocasional, e que a ameaça da pena, como medida de reflexos sobre o seu comportamento futuro, evitará a repetição de condutas delitivas.
Com efeito, atendendo ao que se deixa exposto não se vê como se possa formular um juízo de prognose positivo relativamente á conduta do arguido.
Por essas razões, não se suspende a execução da pena de prisão aplicada ao arguido.

Como facilmente se pode constatar, não assiste razão ao recorrente relativamente à questão em análise. Na verdade, na decisão recorrida foram devidamente ponderadas as exigências de prevenção sentidas no caso concreto
A invocada falta de gravidade dos factos praticados não afasta, por si mesma, a necessidade de execução da pena de prisão. Isto pese embora, como diz Jescheck[8], “a crescente gravidade do facto confere uma maior importância ao interesse na execução da pena que possui uma orientação preventivo – geral”. No caso, a pena de prisão suspensa, nos moldes propostos pelo recorrente não seria proporcionalmente adequada e suficiente para que a comunidade sentisse como válidas as normas jurídicas violadas, ou seja, para satisfazer as sentidas razões de prevenção geral, derivadas das exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico.
Outrossim, a referida pena de substituição não seria bastante para que o arguido pudesse tomar consciência da gravidade do seu comportamento, por forma a que inverter o sentido da sua vida com respeito pelos bens jurídicos ofendidos. O mesmo é dizer, para que fossem garantidas as exigências de prevenção especial.    
 Efetivamente, a multiplicidade de crimes anteriormente cometidos pelo arguido (alguns deles de idêntica natureza aos aqui em causa) pelos quais foi condenado em penas não privativas da liberdade, tendo os factos dos presentes autos sido praticados no decurso de anterior pena de prisão suspensa ( o que foi considerado no acórdão recorrido ) evidenciam à saciedade que o arguido não se deixa influenciar pelas penas alternativas à pena de prisão, não sendo as mesmas suficientes para fazer inverter o arguido o sentido da sua vida no que se refere à prática de crimes, designadamente de furto e de condução sem habilitação legal.
Nesta conformidade, tendo em conta as aludidas circunstâncias, os elementos apurados relativos à personalidade do arguido revelada nos factos praticados e na falta de demonstração de fatores de proteção do arguido relativamente à sua propensão para a prática de crimes, designadamente do tipo por ele praticados, somos levados a concluir pela insuficiência da pena de prisão suspensa, ainda que condicionada ao cumprimento de condições, regras de conduta ou a regime de prova para satisfazer as finalidades (preventivas) da punição.
De forma que nenhum reparo nos merece o acórdão recorrido relativamente à denegação de um juízo de prognose favorável quanto à reinserção social do arguido em liberdade, sendo que somente com o cumprimento da pena de prisão em meio prisional ficam garantidas as exigências de prevenção (geral e especial) sentidas no caso concreto.
Assim sendo, o recurso improcede também quanto a este ponto.

3.3- O recorrente, para a hipótese de não ser declarada suspensa a execução da pena única de prisão em que foi condenado em primeira instância, o que é o caso, pugna pela redução da sua duração para medida nunca superior a um ano.
Vejamos.
Não podemos deixar de salientar - quanto aos limites de controlabilidade da determinação da pena em sede de recurso  - que entendemos ser de seguir o entendimento da doutrina[9] e da jurisprudência[10] de que é suscetível de revista a correção das operações de determinação ou do procedimento, a indicação de fatores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, a falta de indicação de fatores relevantes, o desconhecimento pelo tribunal ou a errada aplicação dos princípios gerais de determinação, mas a determinação do quantum exato de pena só pode ser objeto de alteração perante a violação das regras da experiência ou a desproporção da quantificação efetuada[11].
No caso vertente cumpre notar que antes do mais, que o recorrente foi condenado na pena única de três anos de prisão, tendo sido declarado perdoado um ano ao abrigo da Lei n.º 38-A/2023, de 02-08, e não, como seguramente por lapso refere o recorrente, na pena única de dois anos de prisão.
Por outro lado, nunca a pena única de prisão poderia ser reduzida para medida não inferior a um ano de prisão, porquanto o limite mínimo legal da moldura abstrata do cúmulo jurídico efetuado, que corresponde à pena parcelar mais elevada que o integra, é  superior a um ano de prisão, ou seja, é de 1 ano e 6 meses de prisão, cfr. nº 2 do artigo 77º do CP.  
O recorrente sustenta que a referida pena única de prisão na qual foi condenado  “mostra-se manifestamente exagerada”, mas para além de considerações genéricas, com referência ao caso concreto e como fundamento da pretendia redução da pena aplicada, apenas refere que “Conforme supramencionado, os bens subtraídos pelo arguido apresentam um valor diminuto e, além do mais, todos eles foram passíveis de serem recuperados pelas autoridades, com exceção do combustível”.
No acórdão recorrido encontra-se fundamentada a medida da pena única de prisão nos seguintes termos:
 “Como supra se referiu, o arguido AA cometeu vários crimes, tendo já sido fixada a pena parcelar de cada um deles.
Exige-se agora que, em cumprimento do disposto no artigo 77.º, n.º 1 do C.P., o Tribunal fixe uma pena única.
A este propósito e antes de mais, diga-se que a pena aplicável ao concurso terá, no caso concreto, o limite mínimo de 1 ano e 6 meses de prisão e o limite máximo de 5 anos e 6 meses de prisão.
Dentro desta moldura da pena do concurso encontrada, nos termos do artigo 77, n.º 2, do C.P, cumpre determinar, agora, a pena única, considerando, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, como prescreve o artigo 77.º, n.º 1 do C.P..

Aqui chegados, e considerando:
 - O facto de todos os crimes terem sido cometidos com dolo directo e intenso (o que releva em desfavor do arguido);
 - Que os bens/valores subtraídos, na sua globalidade alcançam um valor mediano;
 - Que todos os crimes não foram perpetrados na mesma ocasião e lugar (o que releva em seu desfavor), embora tenham sido cometidos dentro de um período temporal relativamente limitado (entre 31-08-2020 e 11-12-2020);
- O número de crimes praticados pelo arguido no referido período (entre 31-08-2020 e 11-12-2020) é algo significativo, sendo certo que ele já tem antecedentes criminais registados, inclusivamente pela prática de crimes que protegem, além do mais, o património.

Esta circunstância denuncia uma propensão, por parte do arguido, para a prática dos delitos que se encontram nestes autos em discussão;
Entende-se adequado e justo aplicar ao arguido a pena única de 3 anos de prisão.”

Para a determinação da pena única atender-se-á aos factos no seu conjunto, em conformidade com o disposto no nº 1 do artigo 77º do CP, designadamente, ao número de crimes cometidos pelo arguido, à natureza dos mesmos e suas consequências. Atender-se-á também à idade do arguido, à sua personalidade, evidenciada nos crimes que cometeu, conjugada as suas condições pessoais de vida (anteriores e posteriores aos crimes perpetrados).
Como refere Figueiredo Dias[12], “Tudo deve passar-se (…) como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade - unitária – do agente revelará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência ( ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta”.
No mesmo sentido refere Rodrigues da Costa[13], “À visão atomística inerente à determinação da medida das penas singulares, sucede uma visão de conjunto, em que se consideram os factos na sua totalidade, como se de um facto global se tratasse, de modo a detetar a gravidade desse ilícito global, enquanto referida à personalidade unitária do agente. Do que se trata agora é de ver os factos em relação uns com os outros, de modo a detetar a possível conexão e o tipo de conexão que intercede entre eles (“conexão autoris causa”), tendo em vista a totalidade da atuação do arguido como unidade de sentido, que há-de possibilitar uma avaliação do ilícito global e a “culpa pelos factos em relação”, a que se refere CRISTINA LÍBANO MONTEIRO em anotação ao acórdão do STJ de 12/07/05. Ou, como diz FIGUEIREDO DIAS: «Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique.»”.
No caso vertente, no essencial, estão em causa quatro crimes de furto simples e de quatro crimes de condução sem habilitação legal perpetrados num período de cerca de quatro meses. Ou seja, em síntese, o furto de um veículo automóvel e de um motociclo em diferentes ocasiões, bem assim o furto de combustível em dois momentos (abastecimento em postos de combustíveis sem suportar o respetivo preço) e a condução dos referidos veículos sem habilitação legal aquando da perpetração dos furtos. Ambos os veículos foram recuperados, encontrando-se o motociclo, aquando da sua recuperação, acidentado, ou seja, com danos.
Quanto aos referidos crimes, considerando os antecedentes criminais do arguido, nomeadamente, pelo mesmo tipo de crimes, os factos praticados e a personalidade do arguido permitem concluir pela verificação de uma tendência criminosa que fundamente uma maior reprovação.
Não foram sobrelevadas as exigências de prevenção geral, tendo em conta as fortes exigências de prevenção especial sentidas no caso concreto, pelo que julgamos que não ocorre violação das regras da experiência ou desproporção da quantificação efetuada da pena única cominada de três anos de prisão, fixada na parte inferior da média do intervalo da respetiva moldura abstrata, que é de 1 ano e 6 meses a 5 anos e 6 meses de prisão.
O quantum da pena única de prisão respeita a medida da culpa, os princípios da necessidade, proibição de excesso ou proporcionalidade das penas, observando o preceituado no artigo 18º, nº 2, da CRP, sendo adequado à reposição da validade das normas infringidas.
Assim, considerando a personalidade do arguido e os factos no seu conjunto, temos como adequada, proporcional e justa a pena única de três anos de prisão na qual foi condenado o recorrente, não nos merecendo nenhum reparo a fundamentação aduzida pelo tribunal recorrido quando justifica especificamente a medida da pena única.
Por conseguinte, decide-se manter a medida da pena única de prisão determinada no acórdão recorrido, improcedendo o recurso também nesta parte.

III – DISPOSITIVO

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente o recurso interposto pelo arguido e, consequentemente, confirmar o acórdão recorrido.
Custas pelo arguido / recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 3 Ucs por cada um dos recursos – artigos 513º, nº 1 e 514º, nº 1 do C.P.P. e artigo 8º, nº 9 do R.C.P. e tabela III anexa a este último diploma legal.
Texto integralmente elaborado pelo seu relator e revisto pelos seus signatários – artigo 94º, nº 2 do CPP, encontrando-se assinado eletronicamente na 1ª página, nos termos do disposto no artigo 19º da Portaria nº 280/2013, de 26.08, revista pela Portaria nº 267/2018, de 20.09.
Notifique.
Guimarães, 10 de julho de 2025

Armando Azevedo (Relator)
Pedro Cunha Lopes – 1º Adjunto
Fátima Furtado – 2ª Adjunta


[1] Nas transcrições de peças processuais irá reproduzir-se a ortografia segundo o texto original, sem prejuízo da correção de erros ou lapsos manifestos e da formatação do texto, da responsabilidade do relator.
[2] De entre as questões de conhecimento oficioso do tribunal estão os vícios da sentença do nº 2 do artigo 410º do C.P.P., cfr.  Ac. do STJ nº 7/95, de 19.10, in DR, I-A, de 28.12.1995, as nulidades da sentença do artigo 379º, nº 1 e nº 2 do CPP, irregularidades no caso no nº 2 do artigo 123º do CPP e as nulidades insanáveis do artigo 119º do C.P.P..
[3] Assim são representativos desta orientação, v.g., acórdão STJ de 30.11.2022, processo nº 417/14.3TACBR.C3.S1; acórdãos RP de 12.10. 2011, proc. n.º 2/08.9GCVPA.P1, de 21.10.2012, proc. n.º 628/11.3GAMA.P1, de 13.06.2012, proc. n.º 1222/11.4JAPRT.P1,de 1.07. 2015, proc. n.º 425/11.6GFPNT.P2, de 22.04.2015, proc. n.º 616/14.3GBILH.P1; e de 25.01. 2023, proc. n.º 999/20.OPVPRT.P1; os acórdãos RL de 29.04.2010, proc. n.º 1670/09.0YRLSB-9; e de 3.05.2011, proc. n.º 146/99.0PHOER.L1-5; os acórdãos RC de 29.05.2013, proc. n.º 379/11.9GAVNO.C1; de 4.02.2015, proc. n.º 53/13.1GDVFND.C1; e os acórdãos da RG de 31.05.2010, proc. n.º 670/07.PBGMR.G1, e de 08.10.2024, processo nº 239/21.5GBCHV.G1 todos acessíveis in www.dgsi.pt. 
[4] Defendem esta orientação, entre outros, os acórdãos STJ de 12.12.2013, processo 292/11.0JAFAR.E1.S1, e de 15.02.2017, proc. n.º 0690593; os acórdãos da RL de 22.06.2017, proc. n.º 320/14.7GCMTJ. L1-9; de 8.05. 2018, proc. n.º 74/16.2SRLSB. L1-5; de 11.11. 2020, proc. n.º 141/19.0SILSB.L1-3; de 27.06. 2023, proc. n.º 143/21.7PTO.ER; de 19.11.2024, processo 81/20.0GDMTJ.L2-5; os acórdãos RP de 21.03.2013, proc. n.º 189/10.1GTVRL.P1; e de 17.06. 2015, proc. n.º 543/12.3PDPRT.P1; os acórdãos RC de 11.09.2013, proc. n.º 71/11.4GCCALD.C1; de 8.05.2019, proc. n.º 109/15.6GBFND.C2; e de 21.06. 2023, proc. n.º 16/23.9GBCLD.C1; e os acórdãos RE de 7.04.2015, proc. n.º 79/14.8PFSTB.E1; de 14.07.2020, proc. n.º 146/18.9T9STB.E1; de 27.04. 2021, proc. n.º 301/19.OPAPM.E1; e de 25.01.2022, proc. n.º 53/19.8PAABT.E2; de 26.09.2023, processo 25/17.7GBRDD.E1; de 25.02.2025, processo 27/22.1PESTR.E1 todos acessíveis in www.dgsi.pt.
[5] cfr. Leal Henriques e Simas Santos, C. Penal Anotado, Vol. 1, 1986, pág. 289.
[6] Neste  sentido, cfr. F. Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 342 e seguintes e Ac. STJ de 24.05.2001, CJ, II, 201.
[7] Jeschecck, Tratado de Derecho Penal, Parte General, p. 898 e segs.
[8] Ob. e loc. cit.
[9] Vide Figuiredo Dias, Direito Penal Português, As consequências do crime, pág. 196 e segs.
[10] Vide, entre outros, Ac. STJ de 29.03.2007, proc. 07P1034, relator Simas Santos, Ac. STJ de 19.04.2007, processo 07P445, relator Carmona da Mota, e Ac. RE 22.04.2014, proc 291/13.7GEPTM.E1, relatora Ana Barata Brito, todos acessíveis em www.dgsi.pt
[11] Vide, por todos, o Ac. STJ de 31.10.2024, processo 545/20.6GFSTB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[12] In Direito Penal Português, As Consequência do Crime, Editorial Notícias, pág. 291.
[13] In O Cúmulo Jurídico Na Doutrina e na Jurisprudência do STJ, disponível em www.sjt.pt