Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1473/22.6T8VCT-C.G1
Relator: VERA SOTTOMAYOR
Descritores: EMBARGOS DE TERCEIRO PREVENTIVOS
INADMISSIBILIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/14/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
I – Os embargos de terceiro são utilizados para reagir à diligência de penhora considerada ilegal, podendo ser definidos como o incidente pelo qual quem não é parte no processo pede a extinção da penhora, apreensão ou entrega judicial ofensiva da posse ou direitos seus.
II Os embargos de terceiro preventivos destinam-se a evitar a efetivação da diligência suscetível de causar ofensa na posse ou em outro direito incompatível de terceiro, mas não podem ser deduzidos quando não haja justo receio de esbulho, nem quando o esbulho já ocorreu. Ocorrida a ofensa deixa de ser possível preveni-la.
III – No âmbito da ação executiva para pagamento de quantia certa são inadmissíveis os embargos de terceiro preventivos para impedir o levantamento dos bens ao adquirente a quem foram transmitidos.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO

Por apenso à execução de sentença, nos próprios autos, para pagamento de quantia certa, com o n.º1473/22.... que se encontra a correr os seus termos no Juízo do Trabalho ..., em que é exequente AA e executada EMP01..., LDA., veio EMP02..., LDA. deduzir embargos de terceiro contra a executada e contra EMP03..., UNIPESSOAL, LDA, embargos esses que foram indeferidos liminarmente por serem legalmente inadmissíveis (art.º 345.º do Cód. de Processo Civil), tendo o tribunal a quo a este respeito proferido a seguinte decisão que agora se transcreve:

“Os embargos de terceiro são um meio de reacção tutelar da posse dirigido contra diligência judiciais que a ofendam – vide A. Varela RLJ 119ºp. 244-245.
Como refere Salvador da Costa, Os Incidentes da Instância, 5ª ed., pg. 225 «(…) A estrutura dos embargos de terceiro é essencialmente caracterizada, não tanto pela particularidade de se consubstanciarem numa acção declarativa que corre por apenso à acção ou ao procedimento de tipo executivo, com a especificidade de inserirem uma sub-fase introdutória de apreciação sumária da sua viabilidade, mas, sobretudo, por a pretensão do embargante se inserir num processo pendente entre outras partes e visar a efectivação de um direito incompatível com a subsistência dos efeitos de algum acto judicial de afectação ilegal de um direito patrimonial do embargante. Apesar de regulados em sede de incidentes da instância, configuram-se como uma verdadeira acção declarativa, autónoma e especial, conexa com determinado procedimento de tipo executivo. Através deles, agora relativamente desvinculados da posse, pode o embargante efectivar ou defender, para além da posse, qualquer direito de conteúdo patrimonial ilegalmente afectado pela diligência judicial de tipo executivo.»
Os embargos podem ser repressivos ou preventivos.
Os embargos repressivos são uma reacção contra diligência já materializada e os preventivos têm como objectivo «evitar o esbulho» tendo «por fundamento o justo receio» - vide A. Reis, «Processos Especiais, vol. I, reimpressão, Coimbra Editora, Coimbra, 1982, pág. 436.
Conforme a sua natureza, assim difere o conteúdo da circunstância despoletadora da reacção – no primeiro caso, conhecimento da concretização de diligência ou dos contornos da ofensa materializada (vd. n.º 2 do art. 344.º do Código de Processo Civil), no segundo, perspetivação de penhora ou qualquer acto «judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bem», por ter sido determinada mas ainda não executada a injunção judicial de realização da diligência entrevista como atentatória de direitos constituídos nos termos previstos na lei (vd. n.º 1 do art. 350 e n.º 1 do art. 342.º, ambos do encadeado normativo referido).
O n.º 1 deste artigo manda aplicar aos embargos preventivos as regras dos embargos repressivos, com as devidas adaptações.
Ora, nos termos do art. 344º, do CPC:
«1 - Os embargos são processados por apenso à causa em que haja sido ordenado o ato ofensivo do direito do embargante.
 2 - O embargante deduz a sua pretensão, mediante petição, nos 30 dias subsequentes àquele em que a diligência foi efetuada ou em que o embargante teve conhecimento da ofensa, mas nunca depois de os respetivos bens terem sido judicialmente vendidos ou adjudicados, oferecendo logo as provas.»
Conforme se extrai do nº 2 deste último preceito, é claro que apenas poderem ser deduzidos embargos de terceiro em relação ao primeiro acto ofensivo da posse, pois afectaria a intenção de obter a segurança jurídica que está ínsita no estabelecimento de um prazo de caducidade, manter em aberto a possibilidade de embargar qualquer acto consequente do acto ofensivo, a título preventivo – cfr. Acórdão da R.E. de 11/04/2019, in www.dgsi.pt.
Não faz sentido que numa situação de não dedução tempestiva de embargos de terceiro relativamente a um acto de penhora incompatível com o direito do embargante, se admitisse a sua dedução, a título preventivo, relativamente ao subsequente acto posterior de tomada de posse ou venda executiva que aquele acto de penhora tem em vista possibilitar.
 Só faz sentido a dedução de embargos de terceiro em relação ao primeiro acto ofensivo do direito do embargante que chega ao seu conhecimento, que no caso é a penhora.
 De resto, neste alinhamento, a lei é expressa quando exclui totalmente a possibilidade de recurso aos embargos depois de os respetivos bens terem sido judicialmente vendidos ou adjudicados, como sucede no caso.
Assim, atenta a proibição que resulta da 2ª parte do nº 2, do art. 344º, atrás citado, isto é em razão de os bens penhorados já terem sido vendidos e emitido o respectivo instrumento de venda, não pode o embargante lançar mão dos presentes embargos.
Por conseguinte, sem prejuízo da instauração das acções que visem reivindicar o direito alegado, indefere-se a petição de embargos, por legalmente inadmissível (art. 345º, do CPC).
Custas pelo embargante.
Registe e notifique.”

Inconformada com esta decisão veio a Recorrente/Embargante interpor recurso, pugnando pela revogação da decisão recorrida finalizando as suas alegações com as seguintes conclusões:

“1. Por despacho proferido em 07 de Julho de 2023, a 1ª Instância indeferiu liminarmente os identificados embargos;
2. A Embargante veio deduzir Embargos de Terceiro Preventivos, com a finalidade de evitar que o alegado comprador dos bens adjudicados, procedesse ao levantamento dos bens;
3. Até porque o levantamento dos bens pelo comprador, lesa gravemente os direitos de um terceiro, que nunca teve direito ao contraditório nem foi ouvido como interessado direto na causa;
4. A que acresce o receio da embargante, ora recorrente, que a entrega dos bens é idónea a lesar a posição da recorrente, e a posse dos bens móveis, que são seus;
5. Tendo os presentes embargos de terceiro natureza preventiva, à data da entrada em juízo da petição inicial e, inclusivamente, do indeferimento liminar dos embargos, ainda não se encontrava concretizado o levantamento dos bens, contra o qual pretende reagir;
6. A venda ainda não foi totalmente concretizada e, por isso, a lesão da posse do embargante sobre o bem que dela será objeto, ou o direito que aquele se arroga titular sobre esse bem ainda não foram lesados, o embargante deduz embargos preventivos, precisamente para impedir que a diligência se concretize e que a lesão da sua posse ou direito se venha igualmente a concretizar;
7. Atentas as finalidades prosseguidas pelos embargos de terceiro de natureza preventiva, compreende-se que o n.º 1 do art.º 350º do CPC, seja expresso em estatuir que estes têm de ser requeridos antes de realizada a diligência (levantamento dos bens);
8. Deste modo, “o terminus a quo da dedução dos embargos de terceiro é a data em que forem levantados os bens e assim afetante do direito do embargante, e não aquele em que foram adquiridos os bens por via do depósito do preço”, enquanto “o terminus ad quem da dedução dos embargos vai até ao momento em que o referido levantamento seja executado;
9. Pelo que, deveria o tribunal a quo ter considerado os embargos, admitido os mesmos seguindo-se a tramitação dos mesmos.
10. Tendo os embargos função preventiva, visando evitar o acto ofensivo do direito, podem ser deduzidos antes do levantamento dos bens (art.º 350º, nº 1 do CPC), o que sucede in casu;
11. Na situação dos autos, os embargos deduzidos têm função preventiva – visam obstar à realização da entrega dos bens já adquiridos pelo comprador;
12. Os embargos de terceiro são o modo processual de reagir por quem, não sendo parte na causa, veja ofendida, através de penhora ou qualquer ato judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência;
13. Não nos parece curial a prolação da decisão ora recorrida, pois que a mesma só se justificaria se, de forma evidente, resultasse essa extemporaneidade dos embargos, isto é, desde que da petição inicial constassem os factos que demonstrassem de forma inequívoca em que data o embargante teve conhecimento da diligência ofensiva da sua posse ou do seu direito, e sobre essa data já tivessem decorridos 30 dias. O que, salvo o devido respeito, não é manifestamente o caso;
14. Assim que a embargante tomou conhecimento que o comprador adquiriu os bens e que iria proceder ao seu levantamento, apresentou o requerimento inicial de embargos;
15. Parece-nos incontestável que a decisão não teve em devida conta todos os factos trazidos aos autos;
16. Só existiria fundamento para o despacho proferido se, com segurança, se pudesse concluir pela falta de fundamento legal dos embargos o que não é o caso;
17. Devendo por isso, ser proferido, douto acórdão, que considere que a sentença recorrida incorreu em erros de julgamento, violando, designadamente, os artigos 342.º, 344.º, 345.º, 350.º, 609.º e 723.º, todos do CPC e que, consequentemente anule tal sentença (artigo 639.º-1-in fine, do CPC), e admita liminarmente os embargos de terceiro em causa, determinando que eles prossigam os ulteriores termos processuais dos mesmos, mantendo-se entretanto suspensa a diligência de levantamento e entrega dos bens em causa.”

Não foi apresentada contra-alegação.
O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.
Neste Tribunal foram os autos presentes ao Exma. Procuradora-Geral Adjunta, para efeitos do artigo 87.º n.º 3 do CPT, que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Cumprido o disposto na 1ª parte do n.º 2 do artigo 657º do CPC foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões do Recorrente (artigos 608º n.º 2, 635º, nº 4, 637º n.º 2 e 639º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil), a questão que se coloca à apreciação deste Tribunal da Relação é a de apurar do indeferimento liminar dos embargos.

III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos relevantes são os que constam do relatório que antecede, a que acrescem os seguintes:
- Os presentes embargos de terceiro deram entrada em juízo em 4.07.2023.
- No âmbito da execução foram vendidos, no dia 3.07.2023, os seguintes bens:
- Central de areia e acessórios correspondentes e central de britagem e acessórios correspondentes (documento com a referência ...66)
- Os bens em causa alegadamente pertencem ao embargante

IV – APRECIAÇÃO DO RECURSO

Do indeferimento liminar dos embargos

Insurge-se a Recorrente quanto ao facto de o Tribunal a quo ter indeferido liminarmente os embargos de terceiro preventivos por estes terem sido interpostos depois dos bens já terem sido judicialmente vendidos ou adjudicados (cfr. art.º 344.º n.º 2 do CPC.) e defende a admissibilidade dos embargos, porque os mesmos foram deduzidos a título preventivo, como forma de evitar que o comprador dos bens adjudicados proceda ao seu levantamento, o que lesaria gravemente os seus direitos.
Preceitua o art.º 342.º n.º 1 do CPC. no que respeita à oposição mediante embargos de terceiro, que:

“Se a penhora, ou qualquer ato judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa, pode o lesado fazê-lo valer, deduzindo embargos de terceiro.”
Os embargos são processados por apenso à causa em que haja sido ordenado o ato ofensivo do direito do embargante - cfr. art.º 344.º, n.º 1 do CPC.
Por seu turno, prescreve o n.º 2 do art.º 344.º do CPC. que “o embargante deduz a sua pretensão, mediante petição, nos 30 dias subsequentes àquele em que a diligência foi efetuada ou em que o embargante teve conhecimento da ofensa, mas nunca depois de os respetivos bens terem sido judicialmente vendidos ou adjudicados, oferecendo logo as provas.” (sublinhado nosso).
Ora, sendo apresentados em tempo e não havendo outras razões para o imediato indeferimento da petição de embargos, realizam-se as diligências probatórias necessárias, sendo os embargos recebidos ou rejeitados conforme haja ou não probabilidade séria da existência do direito invocado pelo embargante (art.º 345º).
Em conformidade com o prescrito no art.º 346.º do CPC. a rejeição dos embargos, não obsta a que o embargante proponha ação em que peça a declaração da titularidade do direito que obsta à realização ou ao âmbito da diligência, ou reivindique a coisa apreendida.
De tudo isto resulta que os embargos de terceiro são utilizados para reagir a diligência de penhora considerada ilegal, podendo ser definidos como o incidente pelo qual quem não é parte no processo pede a extinção da penhora, apreensão ou entrega judicial ofensiva da posse ou direitos seus. – cfr. Ac. RC de 26.09.2023, proc. n.º 1886/10.6TBMGR-D.C1, acessível em www.dgsi.pt.
Acresce ainda dizer que o que ofende o direito de terceiro não é a venda executiva, mas sim a penhora – cfr. Ac. da RP de 17.6.1997, proc. 9720694, com o seguinte sumário: «A penhora é que pode constituir o acto de ofensa da posse de terceiro. Os factos sucessivamente praticados após a penhora nenhuma ofensa podem acrescentar à decorrente daquela.», acessível em www.dgsi.pt.
Alega a Recorrente que os Embargos foram deduzidos em tempo, pois têm a função preventiva de obstar à realização da entrega dos bens já adquiridos pelo comprador. Defende, assim, a recorrente estarmos perante embargos preventivos, deduzidos ao abrigo do disposto no art.º 350.º do C. P. Civil.
Como é sabido os embargos de terceiro podem ser deduzidos, a título preventivo, antes de realizada, mas depois de ordenada, a diligência a que se refere o art.º 342º (penhora), observando-se o disposto nos artigos anteriores, com as necessárias adaptações (art.º 350º, n.º 1, sob a epígrafe “embargos de terceiro com função preventiva”). A diligência não será efetuada antes de proferida decisão na fase introdutória dos embargos e, sendo estes recebidos, continuará suspensa até à decisão final, podendo o juiz determinar que o embargante preste caução (n.º 2).  
Os embargos de terceiro preventivos destinam-se a evitar a efetivação da diligência suscetível de causar ofensa na posse ou em outro direito incompatível de terceiro, mas não podem ser deduzidos quando não haja justo receio de esbulho, nem quando o esbulho já ocorreu. Ocorrida a ofensa deixa de ser possível preveni-la.
À dedução de embargos com função preventiva previsto no art.º 350.º do CPC, é aplicável o prescrito na 2ª parte do n.º 2 do art.º 344º do CPC, o que significa, que este tipo de embargos de terceiro não pode ser deduzido depois dos bens terem sido judicialmente vendidos ou adjudicados. Assim tratando-se de bem que já foi vendido no processo executivo, está vedada a faculdade de dedução de embargos de terceiro.
No processo de execução para pagamento de quantia certa, o ato ofensivo da posse é a penhora e não a venda ou a adjudicação ou o levantamento dos bens.
Ora, o legislador ao restringir a dedução dos embargos ao período antecedente à ocorrência da venda judicial ou adjudicação visou no essencial “a estabilidade das vendas em execução, a obtenção de um maior número de interessados e a proteção dos possíveis compradores” impondo nessa medida “interesse público ao interesse particular do embargante” (v. Ana Pinto de Sousa in Embargos de Terceiro no Processo Tributário, FDUP, 2011, 7, acessível em https://www.cije.up.pt; Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, III volume, anotação 6ª ao art. 167.º, pág. 157).
Em suma, nos embargos de terceiro preventivos, o terceiro quer evitar a ofensa do seu direito ou da sua posse, sendo a revogação do despacho ou ato de penhora ou apreensão solicitada antes da consumação da diligência, mas depois de ordenada, não havendo assim lugar a embargos de terceiro preventivos se a diligência já tiver tido inicio, ainda que não concluída.
Nos embargos de terceiro repressivos, com função de remédio, tal incidente não é mais do que uma reação contra diligência já materializada, uma vez que a revogação é pedida depois da consumação da penhora.
No caso não podemos concordar com a embargante ao entender que estamos perante uns embargos preventivos destinados a evitar o levantamento dos bens vendidos.
Com efeito, o bem em causa foi penhorado e vendido, sendo certo que em relação aos atos posteriores à penhora os embargos são repressivos, pois o ato ofensivo do pretenso direito da embargante é a penhora e não a entrega efetiva do bem que é só um reflexo do primeiro ato - cfr. Ac. RE de 11/04/09 e RG de 30-09-2021(ambos acessíveis em www.dgsi.pt), no qual se sumariou o seguinte:
“- Os embargos de terceiro em relação a ato posterior à penhora são embargos repressivos, pois o ato ofensivo do pretenso direito do embargante é a penhora e não a entrega do bem.”
A este propósito refere também o Ac. do STJ de 30/03/17 “Na verdade, o campo de aplicação do art. 350º, nº 1, é limitado aos actos de penhora, apreensão ou entrega de bens ordenados em qualquer processo judicial, mas não se confundem com a operação de entrega do bem cuja venda ou adjudicação a favor de terceiro seja realizada no âmbito de processo de executivo.
Tal meio de defesa pode ser deduzido antes de ser realizada a entrega de bem no âmbito de acção para entrega de coisa certa (como ocorreu no caso que foi apreciado no Ac. do STJ, de 9-2-06, em www.dgsi.pt, referido pelo recorrente), mas não existe motivo algum para equiparar a essa diligência o acto de entrega do bem cuja propriedade tenha sido transmitida ao exequente ou a terceiro no âmbito de acção executiva para pagamento de quantia certa, depois de ter sido realizada a penhora do bem.”
De tudo isto resulta que no âmbito da ação executiva para pagamento de quantia certa são inadmissíveis os embargos de terceiro preventivos para impedir o levantamento dos bens ao adquirente a quem foram transmitidos.
Acresce ainda dizer que, em face do prescrito nos artigos 824.º n.º 1 e 879.º al. a) ambos do Código Civil, a venda em execução transfere para o adquirente os direitos do executado sobre a coisa vendida, ou seja, transfere a propriedade da coisa, não estando tal transmissão dependente da respetiva entrega.
No caso em apreço, foi efetuada a penhora dos bens móveis que foram vendidos judicialmente e adjudicados ao seu comprador, sendo por isso os presentes os embargos de terceiro preventivos inadmissíveis, por terem sido requeridos após a venda judicial dos bens sobre os quais recai a eventual propriedade que a penhora ameaçava ofender.
Em suma, tendo os embargos por objeto impedir o levantamento de bens vendidos judicialmente, deverão os mesmos ser rejeitados liminarmente, já que por força do prescrito no n.º 2 do art.º 344.º do CPC está vedada a faculdade de deduzir embargos de terceiro preventivos, uma vez que já foi concretizada a transmissão do bem penhorado, através da sua adjudicação ao adquirente.
Neste sentido, entre outros, veja-se os acórdãos do STJ de 30.03.2017, proc. n.º 149/09.4TBGLG-E.E1-A.S1, de 07.09.2021, proc. n.º 956/04.4TCSNT-C.L1.S1; do Tribunal da Relação de Lisboa de 6/12/2017, proc.º n.º 23387-10.2T2SNT-A.L1-6, 8/3/2018, proc.º n.º 2942/14T8SNT-A.L1-8; do Tribunal da Relação de Coimbra de 26.09.2023, proc.º n.º 1886/10.6TBMGR-D.C1; do Tribunal da Relação de Évora de 28.03.2019, proc.º n.º 805/05.6TBTMR-H.E1; do Tribunal da Relação de Guimarães de 30.09.2021, proc.º n.º 935/09.5TBCHV-B. e de 21.04.2022, proc.º n.º 799/21.0T8VNF-A.G1, todos acessíveis em www.dgsi.pt.
Este entendimento como já acima deixámos expresso não significa que a Embargante não possa defender os direitos que entendem ter sobre o bem adjudicado, apenas não o poderá fazer no âmbito do processo de execução.
Improcede o recurso, sendo de confirmar a decisão recorrida.

V - DECISÃO

Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social deste Tribunal da Relação em julgar totalmente improcedente a apelação e consequentemente é de manter a decisão recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Notifique.
Guimarães, 14 de março de 2024

Vera Maria Sottomayor (relatora)
Antero Dinis Ramos Veiga
Francisco Sousa Pereira