Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1007/17.4T8VCT.G1
Relator: ALCIDES RODRIGUES
Descritores: PRÉDIO MISTO
CONTRATO DE COMPRA E VENDA
BEM DE CONSUMO
COISA DEFEITUOSA
DENÚNCIA
REDUÇÃO DO PREÇO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/04/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Não cumpre o ónus de indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados determinado pela al. a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC a simples indicação, pelo impugnante, do momento do início e do fim da gravação de certos depoimentos, sem que a tenha complementado com quaisquer outros elementos, designadamente a transcrição das passagens da gravação que considera relevantes para a alteração do decidido.
II - A circunstância de o imóvel adquirido se encontrar descrito no respetivo registo predial como um prédio misto (constituído por um prédio descrito na matriz predial como rústico e outro como urbano), não obsta à qualificação do contrato como compra e venda de bem de consumo, para efeitos do regime previsto no Dec. Lei n.º 67/2003, de 08.04.
III - Pelo citado diploma legal encontram-se abrangidos quaisquer bens imóveis ou móveis corpóreos, independentemente das suas características concretas, sendo que, quanto aos bens imóveis, o legislador não faz qualquer diferenciação entre a natureza urbana ou rústica do bem.
IV - O regime do Decreto-Lei n.º 67/03 prevalece sobre os arts. 913º, 916º e 917º do Cód. Civil no que se refere à matéria dos defeitos/conformidade da coisa vendida com o contrato e dos prazos de denúncia dos defeitos e caducidade de acção, dada a relação de especialidade, com tratamento mais favorável ao consumidor daquele primeiro diploma legal.
V - O consumidor pode exercer qualquer um dos direitos previstos no art. 4º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 67/2003 – reparação, substituição do bem, redução do preço ou resolução do contrato –, imediatamente, com o limite do abuso de direito.
VI - A redução do preço pode obter-se pela diminuição da quantia a pagar ou pela exigência de devolução do que foi pago a mais.
V - Estando em causa o apuramento do valor da redução do preço, a liquidar em incidente subsequente à sentença, impõe-se que o valor do preço do contrato que falta pagar fique condicionado por aquele, na medida em que dessa determinação resultará que, pelo menos, parte do preço em dívida deixe de ser devido, assim se reduzindo/diminuindo (ou, eventualmente, inutilizando) o crédito do vendedor.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

AA instaurou, no Juízo Central Cível ... - Juiz ... - do Tribunal Judicial da Comarca ..., a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra R..., Lda., BB, CC e DD, peticionando:

1. Ser declarado válido e eficaz o exercício do direito à redução do preço do contrato de compra e venda do imóvel por parte do autor, ao abrigo do disposto nos artigos 1.º-A, n.º 1, 1.º-B, 2.º, n.ºs 1 e 2, 3.º, n.ºs 1 e 2, e 4.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 7/2003, de 8 de Abril, assim se declarando a redução do mesmo na quantia já líquida de € 120.841,44 e na que vier ainda a ser liquidada nos termos referidos nas alíneas infra; a. Em consequência da procedência do pedido precedente, devem os 1.º a 3.º Réus ser condenados a pagar a quantia já líquida de € 28.841,44 (vinte e oito mil oitocentos e quarenta e um euros e quarenta e quatro cêntimos) ao autor, uma vez que o autor já pagou a quantia total de € 179.000,00 por conta do preço de venda do imóvel, que ascende a € 271.000,00 (€ 271.000,00 – € 120.841,44 = € 150.158,56; € 179.000,00 - € 150.158,56 = € 28.841,44), acrescida dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos quanto a essa quantia de capital já líquida, calculados à taxa de juros de mora comerciais sucessivamente em vigor, desde a data de vencimento de tal crédito indemnizatório, coincidente com a data da prática do facto ilícito (19.11.2014), até efectivo e integral pagamento, liquidando-se os vencidos até hoje em € 4.739,17 (quatro mil setecentos e trinta e nove euros e dezassete cêntimos) – devendo os 2.º e 3.º réus, quanto ao pagamento da quantia de € 28.841,44 (que excede a parte do preço do imóvel paga) e respectivos juros, ser condenados a título de indemnização por danos patrimoniais;
Ou, sem prescindir,
2. Caso assim não se entenda, devem os réus ser condenados a pagar ao autor a quantia já líquida e a que vier ainda a ser liquidada nos termos referidos nas alíneas infra necessárias para a reparação do imóvel, cifrando-se a já líquida em € 120.841,44 (cento e vinte mil euros oitocentos e quarenta e um euros e quarenta e quatro cêntimos), a título de danos patrimoniais causados pela venda de um bem defeituoso, nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 1 da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho (quanto ao 1.º, 2.º e 3.º réus) e 1225.º, n.º 1 do Código Civil (quanto ao 4.º réu), acrescida dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos, calculados à taxa de juros de mora comerciais sucessivamente em vigor, desde a data de vencimento de tal crédito indemnizatório, coincidente com a data da prática do facto ilícito (19/11/2014), até efectivo e integral pagamento, liquidando-se os vencidos até hoje relativos à quantia já líquida em € 19.856,40 (dezanove mil oitocentos e cinquenta e seis euros e quarenta cêntimos);
Ou, sem prescindir,
3. Caso assim não se entenda, deve ser declarado válido e eficaz o exercício do direito do autor à reparação dos defeitos, desconformidades e vícios ocultos do dito imóvel, ao abrigo do disposto nos artigos 1º-A, n.º 1, 1º-B, 2.º, nºs. 1 e 2, 3.º, nºs. 1 e 2, e 4.º, nº 1 do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril e nos artigos 1221º e 1225º, nº 1, do Código Civil, e, em consequência, devem os Réus ser condenados a realizar tal reparação, necessariamente através da contratação de uma entidade terceira com profissionais devidamente habilitados para o efeito, nomeadamente dispondo do alvará de empreiteiro concretamente necessário face às obras que se afiguram necessárias realizar, bem como a pagar ao autor os juros de mora vencidos e vincendos, calculados à taxa de juros de mora comerciais sucessivamente em vigor e sobre o valor de tal reparação, desde a data de vencimento de tal crédito indemnizatório, coincidente com a data da prática do facto ilícito (19.11.2014), até efectivo e integral pagamento, liquidando-se os vencidos até hoje relativos ao valor já liquidado da reparação (€ 120.841,44) em € 19.856,40 (dezanove mil oitocentos e cinquenta e seis euros e quarenta cêntimos);
Ou, sem prescindir,
4. Caso assim não se entenda, deve ser declarado válido e eficaz o exercício do direito à redução do preço do contrato de compra e venda do imóvel por parte do autor, ao abrigo do disposto nos artigos 913.º e 911.º do Código Civil, assim se declarando a redução do mesmo na quantia já líquida de € 120.841,44 e na que vier ainda a ser liquidada nos termos referidos nas alíneas infra; a. Em consequência da procedência do pedido precedente, devem os 1.º a 3.º réus ser condenados a pagar a quantia de € 28.841,44 (vinte e oito mil oitocentos e quarenta e um euros e quarenta e quatro cêntimos) ao autor, uma vez que o autor já pagou a quantia total de € 179.000,00 por conta do preço de venda do imóvel, que ascende a € 271.000,00 (€ 271.000,00 – € 120.841,44 = € 150.158,56; € 179.000,00 - € 150.158,56 = € 28.841,44), acrescida dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos quanto a essa quantia de capital já líquida, calculados à taxa de juros de mora comerciais sucessivamente em vigor, desde a data de vencimento de tal crédito indemnizatório, coincidente com a data da prática do facto ilícito (19.11.2014), até efectivo e integral pagamento, liquidando-se os vencidos até hoje em € 4.739,17 (quatro mil setecentos e trinta e nove euros e dezassete cêntimos) – devendo os 2.º e 3.º réus, quanto ao pagamento da quantia de € 28.841,44 (que excede a parte do preço do imóvel paga) e respectivos juros, ser condenados a título de indemnização por danos patrimoniais;
Ou, sem prescindir,
5. Caso assim não se entenda, devem os réus ser condenados a pagar ao autores a quantia já líquida e a que vier ainda a ser liquidada nos termos referidos nas alíneas infra, necessárias para a reparação do imóvel, cifrando-se a já líquida em € 120.841,44 (cento e vinte mil euros oitocentos e quarenta e um euros e quarenta e quatro cêntimos), a título de danos patrimoniais causados pela venda de um bem defeituoso que provocou danos no património do autor, ao abrigo do disposto nos artigos 483.º e seguintes, 798.º e seguintes, e 1225.º, n.º 1 do Código Civil, acrescida dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos, calculados à taxa de juros de mora comerciais sucessivamente em vigor, desde a data de vencimento de tal crédito indemnizatório, coincidente com a data da prática do facto ilícito (19.11.2014), até efectivo e integral pagamento, liquidando-se os vencidos até hoje em € 19.856,40 (dezanove mil oitocentos e cinquenta e seis euros e quarenta cêntimos);
Ou, sem prescindir,
6. Caso assim não se entenda, deve ser declarado válido e eficaz o exercício do direito do autor à reparação dos defeitos, desconformidades e vícios ocultos do imóvel acima referidos, ao abrigo do disposto nos artigos 913º, 914º, 1221º e 1225º, n.º 1 do Código Civil, e, em consequência, devem os réus ser condenados a realizar tal reparação, necessariamente através da contratação de uma entidade terceira com profissionais devidamente habilitados para o efeito, nomeadamente dispondo do alvará de empreiteiro concretamente necessário face às obras que se afiguram necessárias realizar, bem como a  pagar ao autor os juros de mora vencidos e vincendos, calculados à taxa de juros de mora comerciais sucessivamente em vigor e sobre o valor de tal reparação, desde a data de vencimento de tal crédito indemnizatório, coincidente com a data da prática do facto ilícito (19.11.2014), até efectivo e integral pagamento, liquidando-se os vencidos até hoje relativos ao valor já liquidado da reparação (€ 120.841,44) em € 19.856,40 (dezanove mil oitocentos e cinquenta e seis euros e quarenta cêntimos);
7. Deve ser declarado válido e eficaz o exercício do direito à redução do preço do contrato de compra e venda do imóvel por parte do autor relativo às consequências danosas dos defeitos indicados nos pontos (iii) a (viii) do artigo 111.º, da petição inicial e à desvalorização que venha a ser provocada por outros danos que, durante a tramitação da presente acção judicial, todos os defeitos, desconformidades e vícios ocultos acima referidos venham a provocar no imóvel, e, em consequência, devem os 1.º a 3.º réus ser condenados a pagar a quantia pecuniária (ainda ilíquida, neste momento) equivalente a tal desvalorização, ou, caso assim não se entenda e sem prescindir, devem todos os réus ser condenados a pagar ao autor a quantia total necessária para custear a reparação de tais danos, a título de danos patrimoniais (com base nas normas já referidas a este respeito nas alíneas antecedentes), em qualquer caso, a quantia devida a título de capital deverá ser acrescida dos respectivos juros de mora vincendos, calculados à taxa de juros de mora comerciais sucessivamente em vigor, até efectivo e integral pagamento, ao abrigo dos disposto nos artigos 556º, n.º 1, al. b), 1.ª parte do CPC, e nos artigos 569º do Código Civil e 556º, n.º 1, al. b), 2.ª parte do CPC;
Ou, sem prescindir,
8. Caso assim não se entenda, deve ser declarado válido e eficaz o exercício do direito do autor à reparação dos defeitos indicados nos pontos (iii) a (viii) do artigo 111º e de outros danos que, durante a tramitação da presente acção judicial, todos os defeitos, desconformidades e vícios ocultos acima referidos venham a provocar no imóvel, ao qual acrescerão os respectivos juros de mora vincendos, calculados à taxa de juros de mora comerciais sucessivamente em vigor e sobre o valor de tal reparação, até efectivo e integral pagamento, ao abrigo do disposto nos artigos 556º, n.º 1, al. b), 1.ª parte do CPC, e nos artigos 569º do Código Civil e 556º, n.º 1, al. b), 2.ª parte do CPC;
9. Independentemente de qualquer um dos pedidos acima referidos – e em cumulação com os mesmos, devem ainda os réus, em qualquer caso, ser condenados a pagar ao autor, em virtude de outros danos por este sofridos em consequência dos defeitos, desconformidades e vícios ocultos do imóvel supra  referidos, uma quantia nunca inferior a € 20.000,00 (vinte mil euros) a título de danos não patrimoniais, e a quantia de 7.389,47 (sete mil trezentos e oitenta e nove euros e quarenta e sete cêntimos) a título de danos patrimoniais já liquidados, acrescidas dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos, calculados à taxa de juros de mora comerciais sucessivamente em vigor, desde a data de vencimento de tais créditos indemnizatórios, coincidente com a data da prática do facto ilícito (19.11.2014), até efectivo e integral pagamento, liquidando-se os vencidos até hoje em € 3.286,36 (três mil duzentos e oitenta e seis euros e trinta e seis cêntimos) quanto à indemnização por danos não patrimoniais, e em € 1.214,23 (mil duzentos e catorze euros e vinte e três cêntimos) quanto à indemnização por danos patrimoniais já liquidada, bem como a quantia de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) por cada mês que o autor esteja privado do uso da casa em consequência da futura e necessária reparação da moradia acima referida, acrescida dos respectivos juros de mora vincendos, calculados à taxa de juros de mora comerciais sucessivamente em vigor, até efectivo e integral pagamento, ao abrigo do disposto nos artigos 556.º, n.º 1, al. b), 1.ª parte do CPC, e nos artigos 569º do Código Civil e 556º, n.º 1, al. b), 2.ª parte do Código de Processo Civil.
Alegou, para o efeito e em síntese, que celebrou com a 1ª Ré um contrato de compra e venda de um imóvel acabado, pelo preço de € 271.000,00, a pagar em prestações apesar de ter sido declarado o valor de € 150.000,00 a solicitação da Ré, que procedeu ao pagamento do valor total de € 179.000,00 por conta do preço; que o imóvel apresenta diversas anomalias e desconformidades, ocultos à data da venda; que reclamou das anomalias junto dos Réus e que incorreu e incorrerá em prejuízos e danos morais em consequência do aludido cumprimento defeituoso nos valores acima computados e a computar, sendo eventualmente responsáveis pelos aludidos defeitos os 2º e 3ºs réus, caso se venha a comprovar terem celebrado com a 1ª Ré um contrato de cessão de créditos conforme alegam na acção ora apensa e o 4º Réu, caso se venha a comprovar ter reconstruído o imóvel a solicitação da 2ª Ré.
*
Citados, os 1º a 3ºs. Réus apresentaram-se a contestar, e, para além de terem invocado as excepções dilatórias de nulidade de todo o processo com fundamento na ineptidão da petição inicial e de ilegitimidade dos 2ºs. a 4º Réus, impugnaram de forma motivada os factos alegados pelo Autor, dizendo que apenas lhe foi vendido um imóvel inacabado e em ruínas, não sendo da sua responsabilidade os danos invocados e que o autor apenas procedeu ao pagamento da quantia de € 150.000,00, tendo alegado ainda a caducidade do direito invocado pelo autor. Terminaram pedindo a procedência das excepções e a improcedência da acção e a 1ª Ré deduziu reconvenção pedindo a condenação do Autor a pagar-lhe a quantia de € 130.812,16, acrescida de juros vincendos a contar sobre o capital de € 121.000,00 e até efectivo pagamento (cfr. fls. 608 a 646).
Requereram, ainda, a intervenção acessória de EE e M..., Lda.
No requerimento probatório requereram, entre o mais, a realização de “inspeção judicial ao local no dia da audiência de discussão e julgamento”.
*
O Réu DD apresentou igualmente contestação e, para além de invocar as excepções já referidas, impugnou na generalidade os factos invocados pelo Autor, invocando igualmente a excepção de caducidade.
*
O Autor deduziu réplica, na qual pugnou pela improcedência das excepções invocadas pelos réus, mantendo o alegado na petição inicial e invocou as excepções de litispendência, compensação, excepção de não cumprimento e o pagamento parcial relativamente ao pedido reconvencional.
*
As Chamadas, admitida a sua intervenção a título acessório, apresentaram articulado próprio.
*
O Autor, através do articulado de 07.09.2018 (requerimento nº ...14), veio deduzir a ampliação do pedido, visando acrescentar aos montantes já peticionados e referentes aos orçamentos nos valores de € 114.411,00 e € 5.885,00, o valor de 23%, correspondente a IVA, ampliação que foi admitida por despacho proferido em sede de audiência prévia realizada em 12.09.2019 (referência nº ...81).
*
Em sede de audiência prévia, de fls. 981 a 988 (referência nº ...50), o Autor apresentou um articulado superveniente, ampliando a causa de pedir e requerendo a ampliação do pedido, alegando que após janeiro de 2019 detectou novos defeitos ocultos na casa vendida pela ré, pedindo que se considere os danos ora invocados abrangidos pelos pedidos genéricos deduzidos nos pontos 7. e 8. do petitório da petição inicial.
A Ré R... veio impugnar a factualidade alegada e pediu que o articulado superveniente fosse julgado improcedente.
Por despacho constante de fls. 1013 a 1015 (referência nº ...16) foram admitidos o articulado superveniente e a ampliação do pedido.
*
O pedido reconvencional foi admitido por despacho de fls. 1015 a 1017 (referência nº ...16).
*
Em sede de saneamento de processo, foram as excepções de nulidade de todo o processo com fundamento em ineptidão da petição inicial e de ilegitimidade 2ºs. a 4º Réus julgadas improcedentes, bem como improcedente foi julgada a excepção de litispendência invocada pelo Autor relativamente ao pedido reconvencional deduzido pela 1ª Ré.
*
Em 6 de março de 2019, o Tribunal “a quo” proferiu despacho, através do qual, entre o mais, apreciou os requerimentos probatórios apresentados pelas partes, tendo deferido a inspeção ao imóvel requerida pelos RR., determinando que a mesma se realizaria “no início da audiência final” (ref.ª ...16).
*
Por despacho de fls. 1001 (cfr. acta de audiência prévia de 12/02/ - ref.ª ...99), foi ordenada a apensação aos presentes autos do processo n.º 638/16.....
*
Nessa acção, BB e mulher, CC, proposta contra AA, peticionaram que este último fosse condenado a pagar-lhes a quantia de € 121.000,00, acrescida de juros de mora vencidos contados à taxa legal de 4% ao ano desde 12 de Novembro de 2015 até à respectiva propositura, no valor de € 3.816,96, e vincendos desde a data da propositura até efectivo e integral pagamento. Invocaram primordialmente, e em síntese, uma confissão de dívida e posteriormente uma cessão de créditos relativa ao valor em dívida no contrato de compra e venda celebrado entre o Autor, nesta acção Réu, e a R..., Lda..
*
Citado, contestou o ali Réu, e aqui Autor, defendendo-se por impugnação motivada e por excepção (peremptória, de direito material).
*
Foi proferido despacho saneador, definiu-se o objecto do processo e procedeu-se à selecção dos temas de prova.
*
Procedeu-se a julgamento conjunto com observância de todas as formalidades legais.
*
Em sede de audiência de julgamento, o Autor desistiu dos pedidos formulados contra o Réu DD, desistência esse homologada por sentença, de imediato, conforme consta da acta de fls. 1271 a 1277.
*
Em 9/05/2022, data em que se realizou a última sessão da audiência final, sem que tivesse sido, ainda, realizada a referida inspeção ao local e/ou designado data para a sua realização, nem proferido qualquer despacho, a 1ª R. apresentou o requerimento, onde alegou que “a requerida inspecção ao local é conveniente, e necessária, desde logo porque, demanda uma perceção ou observação direta dos factos pelo Tribunal para melhor obter a perceção da realidade material”, concluindo que, «a não realização de uma diligência probatória, já deferida e admitida, constitui uma nulidade processual, por omissão, a ex vi do disposto no artigo 195º nº 1 in fine, do Código de Processo Civil» (ref.ª ...03).
*
Na referida sessão de audiência de julgamento de 9/05/2022, e apreciando o referido requerimento, o Mm.º. Juiz “a quo” proferiu o seguinte despacho:

Aquando da prolação do despacho saneador admitiu-se a realização de uma inspecção judicial ao local dos factos, a saber, à casa que faz parte do objecto dos presentes autos.
No entanto, e após tal momento foi produzida a prova pericial e documental, incluindo-se aqui reproduções fotográficas. Acresce, que as questões que emergem ou que poderão emergir da observação da referida casa são questões eminentemente técnicas relativamente às quais o Juiz não dispõe de conhecimentos especiais para as interpretar convenientemente, tendo, por isso, sido produzida a prova pericial. Por fim, deve registar-se o lapso de tempo que mediou entre a construção da casa e o surgimento dos defeitos, por um lado, e a data actual, por outro lado, ou seja, o que o Juiz poderia observar hoje não é a realidade de há, pelo menos, cinco anos atrás.
Pelo exposto, e considerando que a admitida inspecção judicial ao local se tornou supervenientemente inútil, dou a mesma sem efeito. Consequentemente, considero prejudicado o conhecimento da pretensão processual consubstanciada no requerimento de fls. 1295”.
*
Posteriormente, o Mm. Julgador “a quo” proferiu sentença (cfr. fls. 1296 a 1318), nos termos da qual, decidiu:

«Em face do exposto, julgo a acção proposta por AA contra R..., Lda., BB e CC, em que são Intervenientes A... e M..., Lda., parcialmente procedente, por        parcialmente   provada, e, consequentemente condeno a Ré R..., Lda. a ver reduzido o valor sobrante do preço devido, de € 121.000,00, pela celebração do contrato mencionado na alínea a), do ponto II.1., em quantia a liquidar em execução de sentença, ao abrigo do disposto no artigo 608º, nº 2, do Código de Processo Civil, e que resultar a) da possibilidade de reparação, b) do custo da respectiva reparação e c) da eventual desvalorização do imóvel em face das seguintes patologias: (i) resistência do betão das vigas inferior à prevista no projecto (apenas 35,5%) atingindo a carbonatação 6,3 centímetros (quando o limite está fixado em 2 centímetros ao fim de 50 anos), apresentando as respectivas armaduras corrosão; (ii) uma resistência do betão da sapata inferior à prevista no projecto (90,5%); (iii) valores de resistência, rigidez de flexão, deformação de longo prazo, da laje instalada na sala inferiores aos previstos no projecto, conforme alíneas qq) e rr), do ponto II.1.; (iv) os pórticos 5 e 6 da laje do alpendre não têm resistência para suportar esta laje, uma vez que os pilares têm dimensões e estrutura diferentes das previstas no projecto e a disposição da laje foi modificada; (v) os pilares do alpendre estão previstos com a secção quadrada de 40x40 centímetros e foram construídos circularmente com o diâmetro de 20 centímetros, sendo a sua resistência inferior à prevista no projecto; (vi) a laje inclinada de cobertura tem uma espessura de 13 centímetros quando devia ter, de acordo com o projecto, uma espessura de 20 centímetros; (vi) ausência de elementos de ligação ente a viga do alpendre e a laje do alpendre, ao contrário do previsto no projecto; (vii) ausência de sapata para o pilar P6; (viii) execução deficiente e em violação do projecto da drenagem da fundação C2 (colocação do dreno 1 metro acima da cota do pavimento, impossibilitando a drenagem e colocando a parede em contacto com a humidade do solo); (ix) deficiente impermeabilização das paredes exteriores, não impedindo a entrada de água e humidade para o interior da casa; e (x) o pavimento da casa das máquinas executado com pendente contrária à grelha de drenagem, provocando a acumulação de água no seu interior.; acrescido de juros contados à taxa legal de 4% desde 04.10.2016 até integral e efectivo pagamento.
Condeno a Ré, R..., Lda., a pagar ao Autor a quantia líquida de € 7.500,00, acrescida de juros à taxa legal de 4%, contados a partir da data da presente decisão até integral e efectivo pagamento.
Absolvo a Ré do demais peticionado.
Absolvo os Réus BB e CC dos pedidos contra si deduzidos.
Julgo a reconvenção deduzida pela Ré sociedade parcialmente procedente, por parcialmente provada, e consequentemente, condeno o Autor a pagar à Ré reconvinte a quantia de € 121.000,00, deduzida do valor que se apurar em liquidação de sentença e que corresponder à redução do preço nos termos supra decididos, acrescida de juros à taxa legal de 4% contados da data da notificação da reconvenção ao Autor até integral e efectivo pagamento.
Custas da acção e reconvenção em partes iguais.
Mais julgo a acção proposta por BB e CC contra AA improcedente, por não provada, e, consequentemente absolvo este do pedido contra si deduzido por aqueles.
Custas pelos Autores.
(…)».
*
Inconformada com a sentença, dela interpôs recurso a Ré R..., Lda (cfr. fls. 1319 a 1347 - ref.ª Citius ...09) tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«1ª. Entende a Ré/Apelante, que no caso em apreço a requerida inspecção ao local era, como é de todo conveniente, e necessária a boa decisão da causa, desde logo porque a mesma, demanda uma perceção ou observação real e direta dos factos pelo Tribunal para melhor obter a perceção da realidade material;
2ª- Trata-se de um poder dever, que só poderia deixar de ser exercido no caso da diligência requerida, se mostrar de todo desnecessária ou inútil para a descoberta da verdade, o que não é verdadeiramente o caso;
3ª- Entende a Ré/Apelante que ao contrário do sufragado entendimento do Tribunal “a quo”, inexistem nos autos quaisquer documentos ou outra prova que, por si só, ou até no seu conjunto, tornem desnecessária a inspeção judicial;
4ª- O Tribunal teve apenas percepção parcial da realidade, e impunha-se ao Tribunal conhecer toda a realidade para depois sim decidir em consciência na posse de todos os elementos de prova.
5ª- A não realização de uma diligência probatória, deferida e admitida em sede de despacho saneador transitado em julgado, constitui uma nulidade processual, por omissão, a ex vi do disposto no artigo 195º nº 1 in fine, do Código de Processo Civil;
6ª- Sem todos os elementos que o meio probatório que de resto foi admitido em sede de despacho saneador – a inspeção judicial – é deficiente e obscura a resposta dada à matéria de facto, pelo que deve ser anulada a sentença recorrida e atos subsequentes e determinada a realização da inspeção judicial, nos termos dos nºs. 2 e 3 do artº 662º do Código de Processo Civil;
7ª- O Tribunal não atendeu nem valorou devidamente todos os elementos de prova constantes dos autos, na elaboração da douta decisão proferida, pelo que não pode a Ré/Apelante conformar-se com a mesma, nomeadamente, prova documental inserta nos autos, que impunha que fosse dada resposta positiva à matéria que foi articulada pela Ré/Apelante;
8ª- Na verdade, o Tribunal “a quo”, pura e simplesmente, ignorou a matéria de facto essencial e instrumental, alegada pela Ré/Apelante e vertida nos Artigos 28º, 29º, 30º, 31º, 32º, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 43º, 45º,  46º, do articulado de contestação/reconvenção da Ré/Apelante;
9ª. Esta matéria tinha, salvo o devido respeito, que ter resposta positiva, por existir nos autos, prova documental, veja-se docs. ... a ...4, juntos com a petição inicial,, documentos nº ...0, ...1, ...2 e ...3 juntos com o articulado de contestação/reconvenção, nas certidões emitidas pela Câmara Municipal ..., e insertas a nos autos nas seguintes datas, em 12 de Abril de 2019 – e comunicada à Ré/Apelante com a referência citius ...35 de 15 de Maio de 2019 (informação técnica- Anexo 3) e ainda com data de 21/05/2019 com a referência citius ...29 de 31/05/2019.
10ª- O mesmo tratamento omissivo, teve a matéria de facto vertida nos Artigos 71º, 72º, 73º, todos do articulado de contestação/reconvenção, essa matéria também tinha que ser dada como provada, uma vez que existem nos autos, prova documental para o efeito, nomeadamente, a, (Vide Doc. ... junto com o documento nº ...0 com a petição inicial) e ainda e principalmente o documento inserto nos autos apensos 638/16...., onde se encontra inserto com data de 21 de Setembro de 2018.
11ª- Obtiveram ainda o mesmo tratamento por parte do Tribunal “a quo”, a matéria dos artigos 97º, 98º, 99º, 103º, 122º, 129º, 174º, 181º, 182º, 203º, 226º, o que se impunha, face à prova documental, conforme documento nº ...4, com o articulado de contestação/reconvenção e certidão emitida pela Câmara Municipal ..., e insertas a nos autos nas seguintes datas, em 12 de Abril de 2019 – e comunicada à Ré/Apelante com a referência citius ...35 de 15 de Maio de 2019 (informação técnica- Anexo 3).
12ª- A matéria de facto supra aduzida, contém factos essenciais a boa decisão da causa, nomeadamente, para aplicação da alegada excepção de abuso de direito, sob a qual o Tribunal “a quo”, não se pronunciou, quando o devia ter feito;
13ª- O Tribunal “a quo”, ao deixar de fora matéria de facto com interesse e relevância, para aferir da alegada excepção de abuso de direito, nomeadamente no Arts. 180 a 182, do Articulado de Contestação/Reconvenção;
14ª- Nem curou o Tribunal “a quo” de demonstrar, ainda que sumariamente, em que argumentos e circunstâncias se baseou, para omitir esse facto essencial, à matéria que se discute nos presentes autos, o que desde logo configura causa de nulidade da sentença, nos termos do disposto no Artigo 615º nº 1 alínea b) do C.P.C. e que expressamente se invoca;
15ª- Não podia dar como provado sob a alínea a) que se trata de prédios (urbano e rústico) da freguesia ..., existindo desde logo manifesto erro na apreciação da matéria de facto, que carece de alteração, o que se deixa aqui vertido para os devidos e legais efeitos
16ª-Acresce que o Tribunal “a quo” deu como provados os factos constantes das alíneas II) a www), da matéria de facto dada como provada, fazendo uma aderência quase total, ao relatório pericial, e aos esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito em sede de audiência de discussão e julgamento;
17ª- Pelo que salvo o devido respeito, dar como provado que a resistência do betão das vigas, é de 35,50% da prevista no projecto, sem indicação da concreta viga e a sua localização concreta, é um verdadeiro tiro no escuro, uma vez que casa tem uma área de construção de 498,30 m2 e uma área de implantação de 263,40 m2, conforme melhor consta do Alvará de Licença de Construção nº ...9, emitido pela Câmara Municipal ..., e nessa área encontram-se centenas de vigas, que não foram objecto de qualquer ensaio.
18ª- Isto é tanto mais grave, quando se pode quer extrair, daquela deficiente resposta, que a resistência do betão de toda a estrutura da casa, tem apenas 35,5% da prevista no projecto.
19ª- Acresce que o Tribunal “a quo”, deu como provado o vertido na alínea cccc), quando salvo o devido respeito, não o podia fazer.
20ª-Uma vez que o A./Apelado não possui licença de utilização/habitabilidade, conforme melhor consta da certidão emitida pela Câmara Municipal ..., e inserta a nos autos nas seguintes data, em 12 de Abril de 2019 – e comunicada à Ré/Apelante com a referência citius ...35 de 15 de Maio de 2019 (informação técnica- Anexo 3).
21ª-De onde resulta sem margem para dúvidas, que em nome do A./Apelado, AA, foi averbado por despacho de 2015/01/29, o processo de obras ...8 e ...15 deu entrada ao pedido de alterações tendo sido atribuído o nº ...5, para o qual foi emitido o alvará de construção ...6 em 2016/05/16 com validade até 2017/05/16, encontrando-se caducado.
22ª- Ora salvo o devido respeito, o A/Apelado não pode usufruir de uma habitação de uma forma total e sem condicionamentos, se a mesma, não estiver concluída em termos legais, e ter a necessária licença de habitação/habitabilidade, sob pena de até incorrer em contra-ordenação prevista, no nº 1 alínea d) e 4 do artigo 98º do Decreto-Lei N.º 555/99, de 16 de Dezembro - Regime jurídico da urbanização e da edificação;
23ª- Deve, pois a matéria de facto, constante da alínea a), ser corrigida, assim como a matéria das alíneas ll) e mm), ser corrigida de acordo com o supra exposto, na sentença em crise, face à prova documental supra aduzida.
24ª- Atento o supra exposto, a decisão da matéria de facto, proferida pelo Tribunal “a quo”, tem que se alterada por essa Relação, uma vez que do processo constam elementos probatórios que impunham uma decisão/resposta diversa da que foi proferida conforme o disposto nos números 1, 2 e 3 do Artigo 662º do C.P.C., nomeadamente:
a)-nas certidões emitidas pela Câmara Municipal ..., e insertas a nos autos nas seguintes datas, em 12 de Abril de 2019 – e comunicada à Ré/Apelante com a referência citius ...35 de 15 de Maio de 2019 (informação técnica- Anexo 3) e ainda com data de 21/05/2019 com a referência citius ...29 de 31/05/2019;
b)- Depoimento de parte do R. BB e que se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 14h:08:54 a 14h.35.29;
c)- Doc. ... junto com o documento nº ...0 com a petição inicial) e ainda e principalmente o documento inserto nos autos apensos 638/16...., onde se encontra inserto com data de 21 de Setembro de 2018;
d)- certidão emitida pela Câmara Municipal ..., e insertas a nos autos nas seguintes datas, em 12 de Abril de 2019 – e comunicada à Ré/Apelante com a referência citius ...35 de 15 de Maio de 2019 (informação técnica- Anexo 3);
e)- O(s) prédio(s) são da freguesia ..., e não da freguesia .... (Conforme melhor resulta do documento nº ... junto com a petição inicial – Certidão Permanente com o código de acesso ...97);
f)- Depoimento da testemunha,         FF, constante da gravação no sistema Habilus Media Studio das 10h:14:55 a 10h.49.18;
h)- Depoimento da testemunhas, GG, Engenheiro Civil, cujo o depoimento se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 11h:37:05 a 12h.18.40;
i)- Depoimento da testemunha HH, cujo o depoimento se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 15h:54:47 a 15h.54.47;
h) Depoimento da testemunha, II, Eng. Civil e Professor de JJ, cujo o depoimento se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 14h:13:50 as 15h.02.56.
25ª- Deve o Tribunal “ad quem”, reapreciar a prova e, em conformidade, julgar inequivocamente que aos AA./Apelantes assiste razão, quanto a matéria supra aduzida.
26ª- Quanto à matéria dos Artigos vertida nos Artigos 28º, 29º, 30º, 31º, 32º, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 43º, 45º, 46º, 71º, 72º, 73º, 7º, 98º, 99º, 103º, 122º, 129º, 174º, 181º, 182º, 203º, 226º, do articulado de contestação/reconvenção da Ré/Apelante, deve a mesma ser objecto de ampliação e ser dada como provada, de acordo com o supra exposto;
27ª- Entende o A/Apelante que não são aplicáveis ao caso concreto, os prazo previstos na Lei da Defesa do Consumidor, Decreto-lei 67/03 de 8 de Abril com as alterações da Lei 84/08 de 21 de Maio, uma vez que como foi dado como provado sob alínea a) dos factos provados, encontramos perante um prédio misto, composto por artigo ...3º urbano e pelo         artigo ...59º rústico, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...97 da freguesia ...;
28ª-E como tal, não pode ser considerado de forma automática, um bem de consumo, como defende o Tribunal “a quo”.
29ª- Acresce que a Lei de Defesa do Consumidor LDC, não pode ser aplicada ao caso concreto, porque estamos perante um prédio inacabado, conforme se extrai com facilidade das alíneas o), a jj) da matéria de facto dada como provada.
30ª-A situação em que o prédio se encontrava (inacabado), era do perfeito conhecimento do A/Apelado, e era este que o tinha que acabar ou terminar a construção, conforme consta da alínea o) da matéria de facto dada como provada.
31ª-Salvo o devido respeito, a Lei de Defesa do Consumidor, não se aplica, nem pode aplicar de forma linear ao caso sub iudice, uma vez que esta foi pensada para prédios/bens imóveis ou fracções autónomas totalmente acabados, ou dito de outra forma, para bens imóveis prontos ou aptos a consumir, no caso concreto habitar.
32ª- Ora o prédio misto objecto do contrato de compra e venda celebrado entre o A./Apelado e a Ré/Apelante, não estava pronto a consumir, não tinha licença de habitabilidade, e faltavam executar todos os trabalhos mencionados nas alíneas o), a jj) da matéria de facto dada como provada.
33ª- Não é possível dar garantia legal, de um bem móvel ou imóvel, que se encontra inacabado, uma vez que existindo a intervenção de uma terceira pessoa no bem em causa, e no caso concreto foram até vários e diferentes intervenientes, como o próprio A./Apelado confirmou em sede de depoimento e declarações de parte que se encontram gravadas no sistema Habilus Media Studio das 15h:18:54 as 16h.45.47., onde refere expressamente, “Eu contratei distintas empresas Portuguesas. Eu administrei a obra directamente. Eu estava lá, não havia engenheiro. Foi a única maneira lógica para acabar a casa e poupar dinheiro.
34ª- No caso concreto dos autos, o A./Apelado sabia perfeitamente que o bem imóvel encontrava-se inacabado, pelo que não era um bem apto a consumir, no sentido que era necessário acabá-lo, e nesse sentido fazer alterações no bem imóvel, como de resto este veio a fazer, ao colocar-lhe nomeadamente piso radiante, e todas as outras alterações constantes das alínea p) a jj da matéria de facto dada como provada, tendo inclusivamente dado entrada na Câmara Municipal ... a um processo de alterações em seu nome, vide certidão emitida pela Câmara Municipal ..., e insertas a nos autos nas seguintes datas, em 12 de Abril de 2019 – e comunicada à Ré/Apelante com a referência citius ...35 de 15 de Maio de 2019 (informação técnica- Anexo 3).
35ª-É consabido e unanimemente aceite na doutrina e na jurisprudência, que qualquer consumidor, ao introduzir alterações no bem (móvel ou imóvel), perde a garantia, e nesse sentido, também afasta a aplicação da Lei do Consumidor.
36ª- Como estamos perante um contrato de compra e venda de bem imóvel- prédio misto, o regime aplicável, não pode ser outro que não o previsto no Artigos 916º e 917º do Código Civil, e o disposto no Artigo 1225º do Código Civil.
37ª-E nessa conformidade serem aplicáveis, os direitos que se acham estruturados de forma sequencial e escalonada bem como os prazos de caducidade.
38ª- O A./Apelado só procede à denúncia dos defeitos muito para além dos prazos, consignados no disposto no Artigo 917º do Código Civil.
39ª-Pelo que na data em que o A./Apelado intentou a presente acção, já tinham caducados os seus direitos, o que se deixa aqui alegado para os devidos e legais efeitos.
40ª- Decorre do supra exposto, que não sendo a aplicável a Lei da Defesa do Consumidor, não podia o A./Apelante, partir sem mais para a escolha de forma discricionária e arbitrária, da redução do preço, muito menos nos moldes e valores em que o fez.
41ª- Tinha sim que obedecer à ordem escalonada dos direitos previstos no Artigo 917º do Código Civil, conforme o supra exposto, o que não fez.
42ª-O Tribunal “a quo”, considerou aplicável o regime previsto na Lei da Defesa do Consumidor, e nessa conformidade, atendeu à escolha da redução do preço, olvidando-se contudo de aflorar e conhecer daa questão do abuso do direito, arguida pelo R./Apelante.
43ª- Falta essa que configura causa de nulidade da sentença, nos termos do disposto no Artigo 615º nº 1 alínea b) do C.P.C. e que expressamente se invoca.
44ª- Quanto ao valor arbitrado pelo Tribunal “a quo”, a titulo de danos não patrimoniais, salvo o devido respeito, o mesmo não é equitativo, mas antes exagerado e desproporcional.
45ª- Para além de não atender ao facto de ser o próprio ao A./Apelado, que não pagou o preço que devia à Ré/Apelante, como deve, no seu devido tempo, assim como não levou em consideração que este não possui licença de habitabilidade, conforme o supra alegado.
46ª- O Tribunal “a quo”, salvo o devido respeito, não devia condicionar o pagamento da quantia de 121.000,00 €, ao valor apurar em liquidação de sentença e que corresponder à redução do preço, por falta de fundamento legal para o efeito conforme o supra exposto.
47ª- Devendo, nesta parte o Tribunal “ad quem”, alterar a sentença, no sentido de o A./Apelado seja condenado no pagamento da quantia de 121.000,00 €, acrescida de juros de mora contados à taxa legal de 4% ao ano desde o dia .../.../2014, sem qualquer condição;
48ª- Decidindo, como decidiu a acção,        a douta sentença recorrida fez errada apreciação da prova e violou, designadamente, o disposto nos artigos 496º, 566º, nº1, nº 3,, 799º, 801º, 804º, 805º, 806º, 913º, 916º 917º e 1225º todos do Código Civil, e assim como o disposto nos Artigos 7º, 195º nº 1 in fine, 411º, 417º, 490º e seguintes, 607º Nº 4, 608º, 615º alínea d), 662º nº 2 e 3 do Código de Processo Civil e o artigo 205º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa, assim como os Artigos 2º e seguintes da Lei Defesa do Consumidor;
Pelo que, a sentença revidenda, deverá ser parcialmente revogada, nomeadamente, absolvendo a Ré/Apelante de todos os pedidos formulados pelo A/Apelado; e
No que respeita à reconvenção,       deve a mesma sentença, ser corrigida por douto acórdão no sentido de condenar o A./Apelado a pagar à Ré/Apelante a quantia de 121.000,00 €, acrescida de juros de mora contados à taxa legal de 4% ao ano, desde o dia .../.../2014, até efectivo e integral pagamento, e na ausência de qualquer condição ou dedução;
Tudo por douto acórdão a proferir, em conformidade com tudo o supra exposto, e com as legais consequências;

ASSIM DECIDINDO FARÃO VOSSAS EXCELÊNCIAS,
INTEIRA E SÃ JUSTIÇA.».
*
O Autor AA apresentou resposta à alegação da recorrente, que incluiu, a título subsidiário, um pedido de ampliação do âmbito do recurso e um pedido de apreciação de questões suscitadas pelo A./Recorrido junto do tribunal recorrido, apresentando as seguintes conclusões (que igualmente se transcrevem) – cfr. fls. 1355 a 1405):

«CONSIDERAÇÕES PRÉVIAS SOBRE A EVIDENTE IMPROCEDÊNCIA DO RECURSO INTERPOSTO PELA RÉ R...
1. A R./Recorrente apresenta umas alegações confusas e prolixas, nas quais (i) invoca diversos fundamentos pelos quais considera que a sentença recorrida padece de nulidade sem, no entanto, requerera sua anulação, (ii)não indica a concreta decisão que deve ser proferida sobre os factos que entende terem sido incorretamente julgados pelo Tribunal a quo, (iii) não esclarece, quanto aos factos nn) a www), se os pretende impugnar, (iv) não indica as concretas passagens das gravações em que funda as suas alegações, assim violando os ónus que lhe incumbiam ao abrigo do disposto no artigo 640.º do CPC, motivo pelo qual o presente recurso deve ser liminarmente rejeitado, o que se requer seja declarado.

RESPOSTA À ALEGAÇÃO DA R./RECORRENTE
2. AR./Recorrente alega que a douta sentença recorrida é nula, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 195.º do CPC, por não ter sido realizada a inspeção judicial. No entanto, a nulidade deve improceder porquanto:
a) Nem a lei exigia, no presente caso, a realização da referida diligência (entre o mais, porque o n.º 1 do artigo 490.º do CPC reserva a realização da dita diligência para os casos em que o tribunal o julgue conveniente”, e quando a mesma se destine a “esclarecer sobre qualquer facto que interesse à decisão da causa”, e in casu existe nos autos prova bastante referente aos factos que da mesma se pretendia retirar);
b) Nem a R./Recorrente reagiu, em tempo (seja por via da arguição de nulidade, nos termos conjugados do disposto nos artigos 195.º e 199.º, n.º 1 do CPC, seja por via de recurso imediato, nos termos do disposto nos artigos 644.º, n.º 2, alínea b) e artigo 638.º, n.º 1 do CPC), ao despacho que rejeitou a realização da referida diligência, tendo-se assim precludido qualquer direito que eventualmente coubesse à R./Recorrente de sindicar a decisão proferida a este respeito pelo Tribunal a quo, não sendo o recurso o momento processual adequado para invocar a dita nulidade.
3. A R./Recorrente invoca ainda que a sentença é nula, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, por falta de fundamentação de facto, pois que terá dado tratamento omissivo aos factos invocados pela R./Recorrente nos artigos 28.º a 39.º, 43.º, 45º, 46.º, 71.º, 72.º, 97.º a 99.º, 103.º, 122.º, 129.º, 174.º, 181.º, 182.º, 203.º e 226.º da contestação.
4. No entanto, é entendimento unânime no seio da doutrina e da jurisprudência que tal nulidade apenas se verifica nos casos de total falta de fundamentação (cf. a título de exemplo, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2/06/2016, Processo n.º 781/11....; Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 14/05/2015, Processo n.º 414/13....) ou, pelo menos, quando a mesma não permita, de todo, a perceção das razões de facto e de direito da decisão judicial (cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 2/11/2017, Processo n.º 42/14....), o que não sucedeu in casu, devendo, por isso, também esta nulidade improceder.
5. A R./Recorrente requereu a inclusão, no elenco dos factos provados, dos factos alegados nos artigos da contestação mencionados na conclusão precedente. No entanto, a R./Recorrente não indicou (nem o processo contém) elementos que imponham decisão diversa da recorrida, motivo pela qual deve improceder a sua pretensão.
6. Adicionalmente, em concreto quanto aos factos vertidos nos artigos 28.º a 39.º, 97.º a 99.º, 129.º e 226.º da contestação, é matéria manifestamente inútil à apreciação do mérito causa e redundante face à matéria já dada como provada pelo douto Tribunal a quo a este respeito, designadamente nos factos provados o), p) a kk), xxx) e bbbb).
7. Quanto à matéria do artigo 122.º da contestação, a prova produzida nos autos foi cabal, vasta e convergente no sentido de demonstrar precisamente o contrário, ou seja, que a chaminé não consta do projeto de estruturas e não pode, por isso, ser considerada um elemento estrutural (cf. factos provados uu) a ww, Documento n.º ...4 junto com a petição inicial; relatório pericial consolidado junto aos autos em 11/10/2021, com a ref.ª Citius ...33 e esclarecimentos prestados pelo sr. Perito em sede de audiência de julgamento constantes da gravação digital, do dia 20/04/2022, entre as 10:01:12 e as 10:51:07, entre os minutos 36:17 e 39:40).
8. Quanto aos artigos 181.º e 182.º da contestação, os mesmos dizem respeito a um alegado abuso do direito que a R./Recorrente não fundamentou nem provou, e que se enquadram numa suposta “exceção de abuso do direito” que não se encontra, sequer, incluída, nem no objeto do litígio, nem nos temas da prova, motivo pelo qual não poderia o Tribunal a quo dela conhecer.
Acresce que:
9. Quanto ao facto provado a), resulta evidente que a alusão à freguesia ..., quando, anteriormente, se havia corretamente referido à freguesia ..., constitui um mero erro de escrita ou, quando muito, uma mera inexatidão devida a lapso manifesto, revelada no próprio contexto da declaração, os quais, nos termos conjugados do disposto no artigo 249.º do CC e no n.º 1 do artigo 614.º do CPC, dão lugar à sua retificação “por simples despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz”, devendo, por isso, o referido erro/inexatidão ser corrigido, passando o facto provado a) da douta sentença recorrida ter a seguinte redação: Por acordo redigido a escrito em 19 de Novembro de 2014, e autenticado por termo, a sociedade R..., Lda., representada pela sócia-gerente CC, declarou vender, e AA declarou comprar, pelo preço de 150.000,00, o prédio misto, composto por casa de rés-do-chão, com dependência, coberto aberto, rossio, espigueiro, eira e terreno de pastagem, sito em ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...97-..., registado a favor da parte vendedora, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...3º, da freguesia ..., e na matriz predial rústica sob o artigo ...59º, da mesma freguesia, conforme se retira da cópia junta aos autos de fls. 53v a 57 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
10. Sobre os factos provados ll) e mm) da sentença recorrida, a prova produzida nos autos foi vasta e convergente no sentido de confirmar a matéria neles vertida, ou seja, que “A resistência do betão das vigas é de 35,5% da prevista no projecto” e que “A resistência do betão da sapata é de 90,5%” (cf. relatório pericial consolidado, junto aos autos em 11/10/2021, com a ref.ª Citius ...33; relatório e respetivo boletim de ensaio elaborado pela empresa S..., Lda., junto aos autos com o relatório pericial consolidado; pontos 5.1, 6.2 e 7 do relatório elaborado pela E..., S.A. junto aos autos como Documento n.º ...2 com a petição inicial), não tendo a R./Recorrente conseguido invocar elementos que a permitissem infirmar, devendo, por isso, rejeitar-se a pretensão da R./Recorrente e manter-se, a este respeito, a decisão recorrida.
11. Adicionalmente, o documento junto aos autos pela R./Recorrente a este respeito, com as suas alegações, não só nada demonstra, como a sua junção é manifestamente inadmissível, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 651.º do CPC, uma vez que nem a suposta necessidade da sua junção se revelou apenas com o julgamento, e muito menos com a sentença recorrida (que não se baseou num meio de prova que não constasse já, há muito, dos autos), nem a R./Recorrente alegou qualquer impossibilidade objetiva ou subjetiva para a sua junção anterior.
12. Sem prescindir, por se tratar de um documento com expressões manuscritas, cuja autoria e proveniência o A./Recorrido desconhece, vai o mesmo impugnado, quer quanto à sua genuinidade, quer quanto à exatidão da sua reprodução mecânica, quer quanto à veracidade da sua letra e assinatura (cf. artigo 444.º do CPC).
13. Relativamente aos factos provados nn) a www), a R./Recorrente incumpriu o ónus que sobre si impendia, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC, de indicar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnada diversa da recorrida, devendo, nesta parte, rejeitar- se a pretensão da R./Recorrente.
14. Sobre o facto provado cccc), improcede a argumentação da R./Recorrente, uma vez que, da prova produzida, resultou cristalino que, quer o faça com ou sem a respetiva licença de habitação – o que não é, de resto, matéria para os presentes autos –, o A./Recorrido efetivamente e na prática destina o imóvel à sua habitação pessoal (cf. facto provado l), não contestado pela R./Recorrente), e dele não consegue fruir, não porque não disponha da licença administrativa para o efeito, mas sim em virtude dos defeitos de que o mesmo padece (da responsabilidade da R./Recorrente).
15. Ainda que assim não se entenda, no que não se concede, a verdade é que (i) a R./Recorrente não demonstrou nem que a licença de utilização era necessária in casu, nem que o A./Recorrido não a possui e (ii) o argumento por si aduzido configura um flagrante abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium (que aqui se deixa expressamente invocado para todos os devidos e legais efeitos), na medida em que se, efetivamente, o imóvel em causa não tem licença de utilização, tal facto sempre seria imputável à R./Recorrente, uma vez que, para a mesma ser emitida, é necessário demonstrar a conformidade da obra realizada/construída com os projetos aprovados pelas entidades competentes (cf. artigo 62.º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação aprovado pelo Decreto- Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro), o que não se verifica porque a R./Recorrente vendeu ao A./Recorrido um imóvel cujas obras, realizadas por aquela, não estão em conformidade com os projetos aprovados pelas entidades competentes, pelo que só apôs o trânsito em julgado e cumprimento, por parte da R./Recorrente, da decisão proferida nos presentes autos – o que implicará a realização de obras de reparação dos defeitos e desconformidades detetadas e demonstradas – estará o A./Recorrido em condições de demonstrar a conformidade da obra realizada/construída com os projetos aprovados pelas entidades competentes.
16. Quanto ao facto provado sob a alínea dddd) na douta sentença recorrida: por um lado, resultou demonstrado em face da prova produzida em juízo (cf. a título de exemplo o depoimento da testemunha KK, registado na gravação digital do dia 19/04/2022, entre as 10:12:23 e as 11:15:11, entre os minutos 25:20 e 26:20), que a R./Recorrente não conseguiu infirmar; e, por outro lado, a R./Recorrente não incluiu qualquer consideração a este respeito nas suas conclusões, pelo que fica tal questão excluída do presente recurso (cf. artigo 635.º, n.ºs 2 e 4 do CPC).
17. Adicionalmente, diga-se que o esvaziamento do imóvel apenas pressupõe que exista uma ocupação, pelo que, ainda que inexistisse licença de utilização, a verdade é que o imóvel se encontra efetivamente a ser ocupado – rectius, habitado
– pelo A./Recorrido, concluindo-se, portanto, como consequência lógica, que, para que se possam reparar e corrigir os defeitos e desconformidades de que o imóvel padece, terá o A./Recorrido de deixar (pelo período em que durem as reparações) de o ocupar/habitar, o que constitui, aliás, um facto notório ou, ao menos, do conhecimento geral e, portanto, não necessita sequer de prova ou alegação (cf. artigo 412.º do CPC), o que aqui se deixa invocado para todos os devidos e legais efeitos.
18. Por fim, também quanto a este ponto, a R./Recorrente (i) age em manifesto abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium (que aqui se deixa expressamente invocado para todos os devidos e legais efeitos), uma vez que, inexistindo licença de utilização, foi a R./Recorrente que lhe deu causa; e (ii) não indicou, conforme lhe cumpria, qual o concreto resultado probatório que deveria ter tido lugar, o que não fez, motivo pelo qual se deverá rejeitar a sua pretensão.
Em consequência:
19. A sentença ora recorrida deve manter-se inalterada quanto a toda a matéria de facto invocada pela R./Recorrente, à exceção do facto provado a), que deverá ser corrigido, por simples despacho, nos termos da conclusão 9. supra.
Por fim, quanto à matéria de Direito:
20. A qualificação do imóvel adquirido pelo A./Recorrido como um prédio misto não obsta à sua qualificação como bem de consumo, seja porque tal não decorre da legislação aplicável, seja porque a parte rústica não apresenta in casu qualquer relevância autónoma, correspondendo ao jardim da moradia do A./Recorrido, parte integrante da referida moradia, não tendo qualquer autonomia em relação àquela, nem lhe dando o A./Recorrido finalidade distinta, e, portanto, não prevalecendo sobre a parte urbana – cf., a este respeito, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/02/2008, Processo n.º 08....
21. Não é verdade que o facto de o imóvel ter sido vendido ao A./Recorrido no estado de inacabado obste à aplicação do regime previsto no Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, desde logo porque o imóvel não deixa de preencher os critérios legalmente previstos para ser considerado um bem de consumo (cf. artigos 1.º-A, n.ºs 1 e 2 e 1.º-B do DL 67/2003, de 8 de abril e artigo 2.º, n.º 1 da Lei 24/96, de 31 de junho).
22. A tese defendida pela R./Recorrente, segundo a qual “existindo a intervenção de terceiros, sob o objecto, entenda-se bem móvel ou imóvel, perde-se a garantia”, além de não ter o mínimo de suporte legal, doutrinal ou jurisprudencial, é manifestamente descabida, até de um ponto de vista da justiça material, desde logo porque a dita “intervenção de terceiros” invocada pela R./Recorrente, consistiu, única e exclusivamente, na realização dos acabamentos no imóvel que não são, de todo, aptos a afetar o nexo de causalidade estabelecido entre a conduta da R./Recorrente  (realização das obras) e a verificação dos danos sofridos pelo A./Recorrido decorrentes das patologias verificadas no imóvel, sendo todos os defeitos e consequentes danos verificados no imóvel em discussão nos presentes autos (cf. factos provados ll) a www)) verdadeiros defeitos estruturais, diretamente decorrentes da obra realizada pela R./Recorrente e, portanto, apenas a esta imputáveis(e que sempre existiram, ainda que tivesse sido a R./Recorrente, e não o A./Recorrido, a realizar os acabamentos).
Sem prescindir,
23. Ainda que assim não se entenda, no que de forma alguma se concede e apenas por mera cautela e dever de patrocínio aqui se concebe, ou seja, ainda que o regime aplicável ao contrato de compra e venda celebrado entre o A./Recorrido e a R./Recorrente fosse, não o previsto no Decreto-Lei n.º67/2003, de 8 de abril, mas antes o “previsto no Artigos 916º e 917º do Código Civil”, ainda assim, (i) não deixaria o imóvel de padecer de defeitos, vícios e desconformidades que preenchem, igualmente, qualquer uma das hipóteses previstas no n.º 1 do artigo 913.º do Código Civil e (ii) não deixariam esses defeitos, vícios e desconformidades de ser da responsabilidade e imputáveis à R./Recorrente.
24. Adicionalmente, também nesse caso, que apenas por mera hipótese de raciocínio se equaciona, não é verdade que o A./Recorrido só tenha procedido “à denúncia dos defeitos muito para além dos prazos, consignados no disposto no Artigo 917º do Código Civil.”, nem tampouco, que “na data em que o A./Apelado intentou a presente acção, já tinham caducados os seus direitos”, porquanto, quanto à denúncia, refere o n.º 2 do artigo 916.º do Código Civil que a mesma deverá ser feita “até trinta dias depois de conhecido o defeito e dentro de seis meses após a entrega da coisa”, norma que é completada pelo teor do seu n.º 3, que dispõe que “Os prazos referidos no número anterior são, respetivamente, de um e de cinco anos, caso a coisa vendida seja um imóvel”.
25. Assim sendo, tendo o contrato de compra e venda do imóvel sido celebrado em 19 de novembro de 2014 (cf. facto provado a) e Documento n.º ... junto com a petição inicial), e tendo o A./Recorrido tido conhecimento dos defeitos através do relatório pericial que encomendou à E... que se encontra junto aos autos como Documento n.º ...2 junto com a petição inicial, que lhe foi comunicado em 14de dezembro de 2015, significa isto que o A./Recorrido teria, pelo menos, até ao dia 14 de dezembro de 2016 para denunciar os defeitos (um ano desde o conhecimento), não o podendo, nunca, fazer, depois de 14 de dezembro de 2020 (5 anos desde a entrega da coisa).
26. Ora, resultou demonstrado que o A./Recorrido denunciou os referidos defeitos à R./Recorrente por carta datada de 29 de setembro de 2016 e pela R./Recorrente recebida em 4 de outubro de 2016(cf. Documentos n.ºs ...8, ...9 e ...0 juntos com a petição inicial e factos provados d) e)), o que significa que o A./Recorrido os denunciou tempestivamente.
27. Adicionalmente, dispõe o artigo 917.º do Código Civil que “A acção de anulação por simples erro caduca, findo qualquer dos prazos fixados no artigo anterior sem o comprador ter feito a denúncia, ou decorridos sobre esta seis meses, sem prejuízo, neste último caso, do disposto no n.º 2 do artigo 287.º”, o que significa que, na data em que o A./Recorrido interpôs a presente ação (22 de março de 2017), também tal prazo não tinha, ainda, terminado.
Por fim:
28. Sendo legítima a redução do preço peticionada pelo A./Recorrido, cai por terra a pretensão da R./Recorrente de ver alterada a sentença, no sentido de o A./Recorrido ser condenado no pagamento da “quantia de 121.000,00 €, acrescida de juros de mora contados à taxa legal de 4% ao ano desde o dia .../.../2014”, sem condicionar tal pagamento ao valor da redução do preço, devendo, por isso, tal pretensão improceder, o que se requer seja declarado.

AMPLIAÇÃO DO ÂMBITO DO RECURSO A REQUERIMENTO DO RECORRIDO
29. Acautelando a hipótese de este Venerando Tribunal vir a reconhecer razão aos fundamentos invocados no recurso interposto pela R./Recorrente, no que não se concede e apenas por mera cautela de patrocínio concebe, a ampliação do âmbito do recurso é o meio processual próprio para impugnar a decisão proferida sobre determinados pontos da matéria de facto não dados como provados na sentença recorrida.
30. A este respeito, o douto Tribunal a quo, certamente por lapso, não incluiu no elenco dos factos provados o momento em que o A./Recorrido tomou conhecimento dos defeitos ocultos do imóvel, facto esse importante para demonstrar a improcedência do argumento levantado pela R./Recorrente de que o direito do A./Recorrido caducou.
31. A prova produzida nos autos foi clara no sentido de demonstrar que foi através do relatório pericial que encomendou à E... que se encontra junto aos autos como Documento n.º ...2 junto com a petição inicial, que lhe foi comunicado em 14 de dezembro de 2015, que o A./Recorrido teve conhecimento dos defeitos (cf. depoimento e declarações de parte do A./Recorrido, gravação digital do dia 19/04/2022, entre as 15:18:54 e as 16:45:47, minutos 13:59 a 14:42 e minutos 16:43 a 20:15; depoimento da testemunha LL, gravação digital do dia 20/04/2022, entre as 10:52:31 e as 11:10:02, minutos 05:44 a 06:22; depoimento da testemunha KK, gravação digital do dia 19/04/2022, entre as 10:12:23 e as 11:15:11, minutos 04:52 a 09:00 e 15:33 a 17:14; Documento n.º ...2 junto com a petição inicial).
32. Assim, deve ser proferida decisão que inclua no elenco dos factos provado o seguinte ponto de facto: “O A./Recorrido teve conhecimento de que o imóvel padecia de vícios, desconformidades e defeitos ocultos em 14/12/2015, através do relatório pericial realizado pela sociedade E..., S.A.”

PEDIDO DE APRECIAÇÃO DE QUESTÕES SUSCITADAS PELO A./RECORRIDO JUNTO DO TRIBUNAL RECORRIDO
33. Nos termos do n.º 2 do artigo 665.º do CPC, se o tribunal recorrido tiver deixado de conhecer certas questões, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, a Relação, se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquelas, delas conhece no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha dos elementos necessários.
34. Atento o exposto, acautelando a hipótese de este Venerando Tribunal vir a considerar procedente a apelação da R./Recorrente, no que não se concede e apenas por mera cautela de patrocínio concebe, desde já se requer a V. Exas., nos termos do n.º 2 do artigo 665.º do CPC, que conheçam dos seguintes pedidos, formulados pelo A./Recorrido na petição inicial:
a) Pedido 2 (cf. artigos186.º e 187.º da petição inicial, para os quais, por questões de economia processual, se remete);
b) Pedido 3 (cf. artigos 188.º a 192.º da petição inicial, para os quais, por questões de economia processual, se remete);
c) Pedido 4 (cf. artigos 193.º a 207.º da petição inicial, para os quais, por questões de economia processual, se remete);
d) Pedido 5 (cf. artigos 193.º a 207.º da petição inicial, para os quais, por questões de economia processual, se remete);
e) Pedido 6 (cf. artigos 208.º a 212.º da petição inicial, para os quais, por questões de economia processual, se remete).
Sem prescindir,
35. Caso V. Exas. entendam que o meio próprio processual próprio para requerer a apreciação dos pedidos identificados na Conclusão antecedente, não apreciados pelo tribunal recorrido, designadamente por os considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, é a ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido, desde já se requer a V. Exas. que, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 193.º do CPC, corrijam oficiosamente tal erro na qualificação do meio processual utilizado, determinando que se sigam os termos processuais adequados.
*          *           *
Nestes termos, e nos melhores de direito aplicáveis, que
V. Exa. mui doutamente suprirão:

a) Deve ser julgado totalmente improcedente o presente recurso de apelação, negando-se-lhe o provimento, designadamente pelas razões e no sentido da resposta e das conclusões acima apresentadas, mantendo-se, na parte que foi objeto de recurso e impugnação pela R./Recorrente, a douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo;

Sem prescindir:
b) Acautelando a hipótese de este Venerando Tribunal vir a reconhecer razão aos fundamentos invocados no recurso interposto pela R./Recorrente, deve ser admitida a ampliação do âmbito do recurso e, em consequência, deve ser proferida decisão que inclua no elenco dos factos provado o seguinte ponto de facto: “O A./Recorrido teve conhecimento de que o imóvel padecia de vícios, desconformidades e defeitos ocultos em 14/12/2015, através do relatório pericial realizado pela sociedade E..., S.A.”
Sempre sem prescindir:
c) Acautelando a hipótese de este Venerando Tribunal vir a considerar procedente a apelação da R./Recorrente, desde já se requer, nos termos do n.º 2 do artigo 665.º do CPC, que sejam conhecidos os seguintes pedidos formulados pelo A./Recorrido na petição inicial:
(i) Pedido 2 (cf. artigos186.º e 187.º da petição inicial, para os quais, por questões de economia processual, se remete);
(ii) Pedido 3 (cf. artigos 188.º a 192.º da petição inicial, para os quais, por questões de economia processual, se remete);
(iii)Pedido 4 (cf. artigos 193.º a 207.º da petição inicial, para os quais, por questões de economia processual, se remete);
(iv)Pedido 5 (cf. artigos 193.º a 207.º da petição inicial, para os quais, por questões de economia processual, se remete);
(v) Pedido 6 (cf. artigos 208.º a 212.º da petição inicial, para os quais, por questões de economia processual, se remete).
d) Caso se entenda que o meio próprio processual próprio para requerer a apreciação das questões identificadas na alínea c) antecedente, é a ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido, desde já se requer a V. Exas. que, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 193.º do CPC, corrijam oficiosamente tal erro na qualificação do meio processual utilizado, determinando que se sigam os termos processuais adequados.

Com o que V. Exas. farão, como sempre, inteira e sã
JUSTIÇA!».
*
O Autor AA apresentou também recurso subordinado relativo à parte dispositiva da sentença que lhe foi desfavorável, tendo rematado as alegações com as seguintes conclusões (que igualmente se transcrevem) – cfr. fls. 1408 a 1451):
«CONCLUSÕES

1. Pese embora o douto Tribunal a quo tenha julgado procedente o primeiro dos pedidos formulados pelo A./Recorrente, a verdade é que (i) apenas o fez parcialmente, tendo determinado que o mesmo era admissível, “mas não com a extensão, nem nos valores pretendidos”, e (ii) não deu provimento aos restantes pedidos deduzidos cumulativamente pelo A./Recorrente, pelo que, pelo menos, quanto aos pedidos 1-a), 7 e 9 da petição inicial, o A./Recorrente é parte vencida, assistindo-lhe, por isso, o direito de recorrer subordinadamente, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 633.º do Código de Processo Civil.

Isto posto,
2. Em face da prova produzida nos autos, deveriam ter sido incluídos no elenco dos factos provados os defeitos, vícios e desconformidades invocados sob os pontos xii., xiii., xiv. do artigo 59.º da petição inicial da petição inicial, bem como nas alíneas (iii) e (v) do artigo 111.º da petição inicial, devendo, neste âmbito, em face da prova produzida  (máxime o relatório pericial consolidado junto aos autos em 11/10/2021, com a ref.ª
Citius ...33 ), ser proferida decisão que inclua no elenco dos factos provados os seguintes pontos de facto (até para que possam ser igualmente tidos em conta para efeitos de determinação do valor da redução do preço):
eeee) Nem no acabamento, nem na soleira foi aplicado o isolamento térmico previsto no projeto, uma vez que o projeto previa a colocação de isolamento térmico de 5cm entre as duas paredes, mas não se verifica a colocação desse isolamento em obra. (cf. artigo 59.º, ponto xii. da petição inicial e quesito 59.º, ponto xii., página 28 do relatório pericial)
ffff) No projeto estava prevista uma piscina em betão armado, mas foi construída uma piscina em betão simples. (cf artigo 59.º, ponto xiii da petição inicial, quesito 59.º, ponto xiii., página 29 do relatório pericial, quesito 84.º, páginas 37 e 38 do relatório pericial, e, ainda, página 61 do relatório pericial)
gggg) O muro que delimita o prédio referido em a) não possui drenos de drenagem de águas infiltradas.(cf. artigo 59.º, ponto xiv. da petição inicial, quesito 59.º, ponto xiv., páginas 30 e 31 do relatório pericial, e quesito 59.º, ponto xiv., página 32 do relatório pericial)
hhhh) O muro que delimita o prédio referido em a) a nascente apresenta um aspecto muito tosco com pouca confiança quanto à sua estabilidade.(cf. artigo 59.º, ponto xiv. da petição inicial, quesito 59.º, ponto xiv., páginas 30 e 31 do relatório
pericial, e quesito 59.º, ponto xiv., página 32 do relatório pericial)
iiii) A bordadura do telhado do rés-do-chão está mal isolada e escorre água pelas telhas quando chove, o que provoca humidade na parede, que acaba por passar para o interior da casa. (cf. artigo 111.º, alínea (iii) da petição inicial, Documento n.º ...9...) junto com a petição inicial, e quesito 111.º, ponto (iii), páginas 44 a 46 do relatório pericial)
jjjj) No terraço da parte superior da casa que comunica com a cozinha, a divisão não está bem isolada, o que provoca infiltrações de água e humidade.  (cf. artigo 111.º, alínea (v) da petição inicial, Documento n.º ...9 – D) e), e quesito 11.º, ponto (v), página 47 do relatório pericial)
3. Por outro lado, existem, igualmente, nos autos, meios probatórios que impunham que alguns dos danos que não foram incluídos pelo Tribunal a quo no elenco dos factos provados fossem, efetivamente, dados como provados, conforme sucede com: (i) os danos que os elevados níveis de humidade provocam nos móveis, objetos e roupa, que impedem o A./Recorrente de colocar na casa móveis para arrumação, estantes, ou quadros, tendo que guardar os seus pertences em caixas de cartão / de mudanças colocadas na divisão que tem menos humidade e (ii) a necessidade do A./Recorrente de ter vários desumidificadores ligados na casa 24h por dia.
4. Assim, por encontrarem os mesmos sustento, designadamente, nas declarações de parte do A. (cf. gravação digital do dia 19/04/2022, entre as 15:18:54 e as 16:45:47, minutos 01:21:39 a 01:22:27) e no depoimento da testemunha LL (cf. gravação digital do dia 20/04/2022, entre as 10:52:31 e as 11:10:02, minutos 06:30 a 07:48) deve ser proferida decisão que inclua no elenco dos factos provados os seguintes pontos de facto (até para que possam ser igualmente tidos em conta para efeitos de determinação do valor da redução do preço):
kkkk)   Os elevados níveis de humidade na casa provocam danos nos móveis, objetos e roupa.
llll) O A./Recorrente tem de ter desumidificadores na casa ligados 24h por dia.
Adicionalmente:
5. Quanto ao momento do conhecimento dos defeitos do imóvel pelo A./Recorrente, que, certamente por lapso, não foi incluído pelo douto Tribunal a quo no elenco dos factos provados constante da sentença recorrida (caso se entenda que o meio processual próprio para requerer a sua inclusão em tal elenco não é a ampliação do âmbito do recurso, requerida pelo aqui A./Recorrente no capítulo 3 da resposta às alegações de recurso que apresentou na presente data), a prova produzida em juízo é inequívoca e convergente no sentido de demonstrar que o A./Recorrente teve conhecimento dos defeitos em 14/12/2015, conforme se retira do depoimento de parte do A./Recorrente (cf. gravação digital do dia 19/04/2022, entre as 15:18:54 e as 16:45:47, minutos 13:59 a 14:42 e minutos 16:43 a 20:15); do depoimento da testemunha LL (cf. gravação digital do dia 20/04/2022, entre as 10:52:31 e as 11:10:02, minutos 05:44 a 06:22); do depoimento da testemunha KK (cf. gravação digital do dia 19/04/2022, entre as 10:12:23 e as 11:15:11, minutos 04:52 a 09:00 e 15:33 a 17:14) e do Documento n.º ...2 junto com a petição inicial. Em consequência, deve ser proferida decisão que inclua no elenco dos factos provado o seguinte ponto de facto:
mmmm) o A./Recorrente teve conhecimento de que o imóvel padecia de vícios, desconformidades e defeitos ocultos em 14/12/2015, através do relatório pericial realizado pela sociedade E..., S.A.

Acresce que:
6. As patologias mencionadas no segmento decisório da sentença recorrida não correspondem, na sua totalidade, aos defeitos, vícios e desconformidades incluídos no elenco dos factos dado como provados pelo douto Tribunal a quo, uma vez que o Tribunal a quo, equivocadamente, limitou tal elenco apenas a alguns dos referidos vícios e desconformidades que deu como provados. Como é evidente, todos os defeitos, vícios e desconformidades incluídos no elenco dos factos dado como provados pelo douto Tribunal a quo deverão ser tidos em conta para efeitos de determinação do valor correspondente à redução do preço do imóvel.
7. Em consequência, deverá a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que declare que a determinação do montante correspondente à redução do preço do imóvel seja realizada em função (i)de todas as patologias elencadas nos factos provados ll) a www) da sentença recorrida, bem como (ii) dos demais defeitos e danos cuja inclusão da matéria de facto acima se requereu (cf., em especial, Conclusões 2. e 4.), nos seguintes termos:
 “Em face do exposto, julgo a acção proposta por AA contra R..., Lda., BB e CC, em que são Intervenientes A... e M..., Lda., parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente condeno a Ré R..., Lda. a ver reduzido o valor sobrante do preço devido, de € 121.000,00, pela celebração do contrato mencionado na alínea a), do ponto II.1., em quantia a liquidar em execução de sentença, (…) em face das patologias elencadas nos factos provados ll) a www) e eeee) a llll), acrescido de juros contados à taxa legal de 4% desde 04.10.2016 até integral e efectivo pagamento.”
Acresce, ainda, que:
8. Pese embora o Tribunal a quo apenas tenha dado como não provada a factualidade invocada na primeira parte do artigo 56.º da petição inicial, a verdade é que não incluiu, expressamente, no elenco dos factos provados, qualquer dos restantes factos incluídos nos referidos artigos 56.º a 58.º da petição inicial, que resultaram cabalmente demonstrados pela prova documental e testemunhal produzida nos autos.
9. Com efeito, resultou, do teor dos Documentos n.ºs ...2 e ...3 da petição inicial, bem como do depoimento da testemunha KK (cf. gravação digital do dia 19/04/2022, entre as 10:12:23 e as 11:15:11, minutos 04:52 a 09:00 e 15:33 a 17:14) que os teor, contexto e preço referentes ao relatório elaborado pela sociedade E... correspondem aos referidos nos artigos 56.º a 58.º da petição inicial, tendo resultado igualmente demonstrado que o valor constante da fatura junta aos autos como documento n.º ...3 da petição inicial corresponde ao preço pago pelo A./Recorrente pela elaboração do relatório em questão, pelo que deverá ser proferida decisão que inclua no elenco dos factos provados os seguintes pontos de facto:
nnnn) O Autor solicitou à “E..., S.A.” que analisasse o estado da construção da moradia que adquiriu à Ré R... para verificar se a mesma padecia de algum vício de construção ou qualquer outro defeito e que elaborasse o relatório pericial correspondente.
oooo) A “E..., S.A.” elaborou o relatório pericial junto como Documento n.º ...2 da petição inicial.
pppp)   O custo do relatório referido em oooo) ascendeu a € 7.389,47.
10. Ainda a este respeito, resulta evidente que o custo do relatório junto como Documento n.º ...2 da petição inicial (v. documento n.º ...3 da petição inicial) constitui um dano emergente que surgiu no património do A./Recorrente em consequência direta do incumprimentos da R./Recorrida R..., pelo que, nos termos do artigo 562.º do Código Civil e do artigo 12.º, n.º 1 da Lei n.º 24/96, de 31 de julho (conjugados com o artigo 799.º, n.º 1 do Código Civil e o artigo 12.º, n.º 2 da Lei n.º 24/96, de 31 de julho), o A./Recorrente tem direito a ser indemnizado pela R./Recorrida R... em quantia equivalente a esse custo que suportou, pelo que deve a decisão proferida pelo Tribunal a quo ser parcialmente revogada e alterada por outra que julgue parcialmente procedente o pedido n.º 9 da petição inicial (seja por erro de julgamento, seja por nulidade fundada em omissão de pronúncia –cf. artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC) e que, em consequência, condene a R./Recorrida R... a pagar ao A./Recorrente a quantia de € 7.389,47, correspondente ao preço cobrado pela E... ao A./Recorrente pela elaboração do relatório junto como Documento n.º ...2 da petição inicial, a título de danos patrimoniais, acrescida dos respetivos juros de mora, desde a data de vencimento de tal crédito indemnizatório (coincidente com a data da prática do facto ilícito –19/11/2014) até efetivo e integral pagamento.
Acresce, igualmente, que:
11. O douto Tribunal a quo deu provimento parcial ao primeiro dos pedidos deduzidos pelo A./Recorrente na petição inicial: a redução do preço devido pela aquisição do imóvel à R./Recorrida, em virtude dos defeitos de que o mesmo padece, e que a esta última são
 imputáveis. No entanto, quanto ao concreto valor de tal redução, o douto Tribunal a quo, entendeu não dispor dos elementos necessários e suficientes para a sua determinação, e remeteu a respetiva quantificação para execução de sentença, nos termos do disposto no artigo 609.º, n.º 2 do CPC.
12. Sucede, no entanto, que, quanto aos critérios de referência para a referia quantificação, o douto Tribunal a quo determinou que a mesma ficasse dependente, entre o mais, da possibilidade de reparação dos defeitos, o que não só não decorre do pedido formulado pelo A./Recorrente, como não decorre de qualquer norma jurídica que ao caso seja aplicável e contraria manifestamente a fundamentação apresentada, a esterespeito, pelo douto Tribunal a quo.
13. Com efeito, ao considerar que “a escolha pela forma como o adquirente da obra pretende ser ressarcido da falta de conformidade do bem com o contrato é livre, estando apenas limitada pela respectiva possibilidade prática e técnica e pelo respeito pelos princípios da boa fé e dos bons costumes e pela finalidade económico-social do direito escolhido enquanto corolários intrínsecos do abuso de direito, logo, inexistindo hierarquia no uso do meio que se tem por adequado o adquirente pode exigir logo a redução do preço em vez da redução dos defeitos”, o douto Tribunal a quo entendeu que a mesma não se encontrava limitada por qualquer impossibilidade prática e/ou técnica e, bem assim, que não violava os princípios da boa fé ou dos bons costumes, ou se desenquadrava da finalidade económico-social do direito em questão.
14. No entanto, acabou, afinal, por ser o próprio Tribunal a quo a impor-lhe uma limitação, fazendo-a depender da possibilidade de reparação dos defeitos de que padece o imóvel, contrariando, assim, a decisão proferida, de forma direta e manifesta, a fundamentação exposta pelo douto Tribunal a quo na sentença recorrida, pelo que padece a mesmade nulidade, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, motivo pelo qual deverá ser revogada e substituída por outra que não condicione a redução do preço à possibilidade de reparação do imóvel, nos seguintes termos:
 “Em face do exposto, julgo a acção proposta por AA contra R..., Lda., BB e CC, em que são Intervenientes A... e M..., Lda., parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente condeno a Ré R..., Lda. a ver reduzido o valor sobrante do preço devido, de € 121.000,00, pela celebração do contrato mencionado na alínea a), do ponto II.1., em quantia a liquidar em execução de sentença, (…), e que resultar (…) do custo da respectiva reparação e da eventual desvalorização do imóvel (…) acrescido de juros contados à taxa legal de 4% desde 04.10.2016 até integral e efectivo pagamento.”
15. Ainda que assim não se entenda, isto é, ainda que se considere não padecer a sentença recorrida de qualquer nulidade, no que não se concede, a verdade é que sempre padecerá, neste âmbito, pelo menos de erro de julgamento (resultante da equivocada aplicação do Direito, por violação do disposto no artigo 4.º do DL n.º 67/2003, de 8 de abril, bem como nos artigos 884.º e 911.º do Código Civil.), devendo, em consequência, ser parcialmente revogada a sentença recorrida e proferida outra nos termos e com a redação da Conclusão 14. supra.
Acresce, ainda, que:
16. O A./Recorrente requereu, na sua petição inicial, que (i) fosse declarado válido e eficaz o direito do A./Recorrente à redução do preço, (ii) os Réus fossem condenados a pagar ao A./Recorrente a quantia, já líquida, de € 56.509,52 (cinquenta e seis mil quinhentos e nove Euros e cinquenta e dois cêntimos), e que (iii) os Réus fossem condenados a pagar ao A./Recorrente a quantia pecuniária, ainda ilíquida, equivalente à desvalorização causada no imóvel pelos defeitos elencados no artigo 111.º, pontos (iii) a (viii) da petição inicial (cf. pedidos 1, 1-a, 8 e 9 da petição inicial), pretendendo, com tais pedidos, ver o preço acordado pela venda do imóvel reduzido e ver a R./Recorrida condenada a pagar-lhe a diferença entre o valor da referida redução e o valor ainda em dívida pelo A./Recorrente, uma vez que o primeiro dos valores era consideravelmente superior ao segundo.
17. Sucede, no entanto, que na sentença recorrida, o douto Tribunal a quo entendeu, por um lado, não dispor dos elementos necessários para concretizar o valor correspondente à redução do preço, remetendo a sua concretização para execução de sentença e, por outro lado, não acautelou a hipótese de o valor que vier a ser determinado seja superior ao valor que o A./Recorrente foi condenado a pagar à R./Recorrida, e não condenou a R./Recorrida a pagar tal excesso, caso exista.
18. Assim, ao referir, por um lado, que não dispõe de elementos para a concretização de um valor concreto de redução do preço e ao limitar, por outro lado, tal preço ao valor que o A./Recorrente foi condenado a pagar à R./Recorrida por força da procedência do pedido reconvencional, a sentença recorrida está, nesta parte, está ferida de nulidade, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, devendo, por isso, ser revogada e substituída por outra que:

a) Condene a R./Recorrida R... a ver reduzido o preço devido pela celebração do contrato mencionado na alínea a), do ponto II.1, em quantia a liquidar a execução de sentença e que resultar do custo da respetiva reparação e da eventual desvalorização do imóvel em função das patologias dadas como provadas na sentença;
b) Caso o valor que venha ser apurado em execução de sentença seja superior ao valor da parte do preço ainda não pago pelo A./Recorrente à R./Recorrida R... (€ 121.000), condene a R./Recorrida R... a devolver/pagar ao A./Recorrente o excedente.
19. Sem prescindir, ainda que assim não se entenda, no que não se concede, sempre estará a sentença recorrida, neste âmbito, ferida de erro de julgamento (resultante de uma distorção da realidade factual e na equivocada aplicação do Direito, por violação do disposto nos artigos 1.º-A, n.º 1, 1.º-B, 2.º, n.ºs 1 e 2, 3.º, n.ºs 1 e 2, e 4.º, n.º 1 do DL 67/2003, de 8 de abril, no artigo 12.º da Lei 24/96, de 31 de julho, e nos artigos 884.º, 911.º e 913.º do Código Civil), devendo, em consequência, ser revogada e substituída por outra que decida nos exatos termos referidos na Conclusão 18.
Adicionalmente:
20. Em face da prova produzida, o douto Tribunal a quo deu como provado (e bem) que “Para preparar e corrigir as situações elencadas de ll) a www), a casa deverá ser esvaziada e durante as obras não poderá ser habitada” (cf. facto provado dddd)), no entanto, equivocadamente, não retirou qualquer consequência prática da impossibilidade de habitação do Imóvel durante o período em que durarem as obras  (ou seja, do facto provado dddd)), nem se pronunciou sobre a parte final do pedido n.º 10 formulado na petição inicial, em que o A./Recorrente peticionou que os Réus fossem condenados a pagar-lhe a quantia de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) por cada mês que o A./Recorrente estivesse privado do uso do Imóvel em consequência da sua futura e necessária reparação, pelo que, nessa parte, a sentença se encontra ferida de nulidade, seja por oposição entre os fundamentos e decisão, seja por omissão de pronúncia (cf. artigo 615.º, n.º 1, alíneas c) e d)), ou, ao menos, incorreu em erro de julgamento (por violação dos artigos 562.º e 799.º, n.º 1 do Código Civil e dos artigos 12.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 24/96, de 31 de julho).
21. Com efeito, ainda que o Tribunal a quo tivesse entendido que não dispunha dos elementos necessários para determinar o montante da condenação peticionada na parte final do pedido n.º 10 da petição inicial, impunha-se, em face da factualidade dada como provada, que julgasse o pedido indemnizatório procedente, remetendo a respetiva quantificação para liquidação de sentença, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 609.º do CPC.
22. Assim, deve a douta sentença recorrida ser parcialmente revogada e substituída por outra que considere parcialmente procedente a parte final do pedido n.º 10 formulado na petição inicial e, em consequência, condene a R./Recorrida R... a pagar ao A./Recorrente, por cada mês que o A./Recorrente esteja privado do uso do imóvel de que é proprietário e durante todo período em que durar a reparação dos defeitos de que o mesmo padece, uma quantia a liquidar em execução de sentença, nos termos do disposto no artigo 609.º, n.º 2 do CPC.
Por fim:
23. No âmbito do processo n.º 638/16...., entretanto apensado aos presentes autos e correspondente ao atual apenso A, o aqui A./Recorrente (aí Réu) deduziu, na respetiva contestação, um pedido indemnizatório contra os aí Autores BB e CC (aqui Réus), tendo requerido que os mesmos fossem condenados, “como litigantes de má fé, em multa e a indemnizar o R. em quantia nunca inferior a € 10.000,00”, tendo arguido, para o efeito, entre o mais, que os aí Autores deduziram uma pretensão baseada em factos que não são verdadeiros, já que nunca entregaram ao R. (aqui A./Recorrente) a quantia pecuniária cuja restituição reclamaram (nem qualquer outra) e, por isso, conheciam bem a falta de fundamento dessa mesma pretensão, conduta que preenche os pressupostos previstos no disposto no artigo 542.º do CPC.
24. Sucede, no entanto, que, pese embora os próprios Autores (aqui Réus) tenham admitido nunca ter emprestado qualquer quantia ao A./Recorrente, (cf. depoimento de parte do o Autor BB, gravação digital do dia 19/04/2022, entre as 11:21:35 e as 12:24:29, minutos 10:04 a 12:25; depoimento de parte da Autora CC, gravação digital do dia 19/04/2022, entre as 14:36:50 e as 15:12:28, minutos 05:35 a 07:25), e pese embora toda a factualidade dada como provada sob as alíneas g), h), i), j) e k) do elenco dos factos provados da sentença recorrida, e demais fundamentação aí vertida a este respeito, e a consequente improcedência do pedido formulado pelos Autores no âmbito do referido apenso, o douto Tribunal a quo não se pronunciou na sentença recorrida, sobre o pedido de condenação como litigantes de má-fé dos Autores, cuja procedência era uma consequência lógica quer da improcedência dos pedidos formulados pelos Autores, quer dos factos provados acima elencados, padecendo, por isso, nessa parte, de nulidade a sentença recorrida, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo
25. Em consequência, deve ser parcialmente revogada e substituída por outra que julgue o pedido indemnizatório deduzido pelo A./Recorrente na contestação apresentada no âmbito do Processo n.º 638/16.... (entretanto apensado aos presentes autos como Apenso A), com fundamento em litigância de má-fé, totalmente provado e procedente, nos termos do disposto nos artigos 542.º e 543.º do CPC, e, em consequência, condene os aí Autores como litigantes de má fé, em multa e a indemnizar o Réu (aqui A./Recorrente) em quantia nunca inferior a € 10.000,00 (dez mil Euros).
Face ao exposto:
26. A sentença recorrida violou, por errónea interpretação e aplicação, o disposto, nomeadamente, nos artigos 562.º, 799.º, n.º 1, 884.º, 911.º, 913.º do Código Civil, no artigo 12.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 24/96, de 31 de julho, nos artigos 1.º-A, n.º 1, 1.º-B, 2.º, n.ºs 1 e 2, 3.º, n.ºs 1 e 2,e4.º do DL n.º 67/2003, de 8 de abril, e nos artigos 542.º, 543.º, e 615.º, n.º 1, alíneas c) e d), do CPC, sendo que tais normas deveriam ter sido interpretadas e aplicadas no sentido propugnado pelo A./Recorrente na presente alegação e respetivas conclusões supra.
*          *           *
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. muito doutamente suprirão, deve o presente recurso subordinado de apelação ser recebido e conhecido, e, subsequentemente, ser julgado totalmente procedente no sentido das conclusões supra e, em consequência de tal provimento, (i) ser parcialmente modificada a matéria de facto provada nos autos, nos termos supra requeridos; e (ii) ser parcialmente revogada a sentença recorrida e substituída por outra, igualmente nos termos supra requeridos,

Com o que V. Exas. farão, como sempre, inteira e sã
JUSTIÇA!»
*
Não consta que tenham sido apresentadas contra-alegações relativamente ao pedido de ampliação do âmbito do recurso e ao recurso subordinado apresentados pelo Autor.
*
Os recursos (principal e subordinado) foram admitidos como de apelação, a subirem imediatamente, nos próprios autos, com efeito devolutivo (fls. 1453).
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II. Delimitação do objeto do recurso             

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do(a) recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber:              
 
No caso, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal consistem em saber:         

I - Quanto ao recurso independente apresentado pela Ré, R..., Lda:
i) - Questão Prévia: (in)admissibilidade do documento junto pela Ré/apelante, R..., com as alegações de recurso;
ii) - Da nulidade processual e/ou nulidade da sentença por falta de realização da deferida inspecção judicial ao local;
iii) - Nulidade da sentença com fundamento na al. b) do n.º 1 do art. 615º do CPC;
iv) - Da impugnação da decisão da matéria de facto;
v) - Da reapreciação de direito;
v-a) Da qualificação do contrato e do regime jurídico aplicável;
v-b) Da caducidade dos direitos do A./recorrido;
v-c) Do abuso de direito;
v-d) Inadequação (por excesso) do valor compensatório arbitrado para ressarcimento dos danos não patrimoniais;
v-e) Do indevido condicionamento do pagamento da quantia de 121.000,00 € ao valor a apurar em liquidação de sentença e que corresponder à redução do preço;
II - Da ampliação do objeto do recurso deduzida pelo Autor (em consequência da procedência da apelação da Ré/apelante);
III - Quanto ao recurso subordinado interposto pelo Autor AA:
vi) - Da impugnação da decisão da matéria de facto;
vii) - Da reapreciação de direito.
vii-a) - Da revogação da sentença, por erro de julgamento, em consequência da modificação da matéria de facto atinente aos defeitos, desconformidades, vícios ocultos e danos;
vii-b) - Dos danos referentes ao valor pago pelo A./recorrente à E... (seja por erro de julgamento, seja por nulidade fundada em omissão de pronúncia - cf. art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC).
vii-c) - Da nulidade/erro de julgamento da sentença por condicionar a determinação da redução do preço à possibilidade de reparação dos defeitos;
vii-d) - Da nulidade/erro de julgamento da sentença referente ao pedido 1-a da petição inicial;
vii-e) - Da nulidade/erro de julgamento da sentença em virtude do valor devido pela R./recorrida ao A./recorrente pelo período em que se encontre privado de usar o imóvel em virtude da realização dos trabalhos de reparação;
vii-f) - Da nulidade da sentença referente ao pedido de litigância de má-fé formulado pelo A./recorrente no apenso A.; e, em caso de procedência,
vii-g) - Da verificação dos pressupostos da condenação como litigantes de má-fé dos AA. no processo n.º 638/16...., apensado aos presentes autos.
*
2. Fundamentos

2.1) A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:
a) Por acordo redigido a escrito em 19 de Novembro de 2014, e autenticado por termo, a sociedade R..., Lda., representada pela sócia-gerente CC, declarou vender, e AA declarou comprar, pelo preço de 150.000,00, o prédio misto, composto por casa de rés-do-chão, com dependência, coberto aberto, rossio, espigueiro, eira e terreno de pastagem, sito em ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...97-..., registado a favor da parte vendedora, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...3º, da freguesia ..., e na matriz predial rústica sob o artigo ...59º, da mesma freguesia, conforme se retira da cópia junta aos autos de fls. 53v a 57 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
b) BB e CC, como primeiros outorgantes, e AA, como segundo outorgante, celebraram, por escrito, em 19 de Novembro de 2014, o acordo que apelidaram de contrato de confissão de dívida, nos termos do qual este se confessou devedor àqueles da quantia de € 121.000,00, cuja cópia se encontra junta aos autos de fls. 58v a 59 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
c) Em 09.12.2015, o Autor recebeu a missiva, enviada pelos Réus BB e CC, cuja cópia se encontra junta aos autos de fls. 9v a 12 do apenso A e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido
d) Em 04.10.2016, a Ré R..., Lda. recebeu a missiva, enviada pelo Autor, AA, cuja cópia se encontra junta aos autos de fls. 212v a 215 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
e) Em 04.10.2016, os Réus BB e CC receberam a missiva, enviada pelo Autor, AA, cuja cópia se encontra junta aos autos de fls. 216 a 219 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
f) Os Réus BB e CC são sócios da sociedade R..., Lda., dedicando-se esta à actividade de compra, reconstrução e venda de bens imobiliários, conforme se retira da cópia da certidão permanente junta aos autos de fls. 46v a 47 e da informação com a referência nº ...26, cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos;
g) Apesar de terem declarado no título referido em a) que o preço a pagar pela venda do imóvel aí descrito seria de € 150.000,00, as partes contratantes – AA e R... - acordaram que o preço a pagar seria de € 271.000,00;
h) E, por isso, celebraram e assinaram o acordo descrito em b);
i) Não tendo os Réus BB e CC entregado ao Autor a quantia que surge mencionada no título descrito em b);
j)  Pretendendo as partes, com tal acordo, descrito em b), acordar quanto ao valor do preço que faltava pagar, a forma e o tempo de pagamento, tendo  por referência o valor global acordado de compra e venda do imóvel descrito em a) de € 271.000,00;
k) E, declarando o que declararam no título descrito em a), evitar o pagamento de imposto devido à Fazenda Nacional, sobre a parcela do valor acordado para lá do declarado;
l) O Autor AA pretendeu e utiliza o imóvel descrito em a) como sua residência;
m) A negociação entre as partes e que antecedeu a celebração dos acordos descritos em a) e b) durou cerca de um ano;
n) Tendo o Autor AA visitado o imóvel várias vezes;
o) O prédio foi vendido com a casa no estado em que se encontrava, sem condições de habitabilidade, com paredes, telhado, estrutura de betão construída pela Ré, R..., e outros elementos que infra se aludirão, tendo o preço acordado reflectido essa circunstância, ou seja, a necessidade de o comprador de terminar a sua construção;
p) Quando foi celebrado o acordo descrito em a), a casa de habitação existente no prédio aí descrito, não tinha janelas, portas, isolamento térmico e sistema de aquecimento de águas de banho;
q) Faltava colocar as caleiras e o rufo em volta da chaminé;
r) Faltava impermeabilizar pelo interior as paredes exteriores (por serem de pedra seca);
s) Faltava colocar toda a caixilharia exterior, nomeadamente, aros, portas e janelas;
t) Faltava colocar os dois portões de entrada exteriores;
u) Faltava executar a carpintaria interior e exterior, nomeadamente, aros guarnições, portas, contras em madeira, apainelados, roupeiros, soalho e rodapés;
v) Faltava colocar os móveis de cozinha e os móveis das casas de banho; w)    Faltava acabar e revestir as escadas a madeira;
x) Faltava executar partes de pichelaria, nomeadamente, o esgoto no interior dos wc e faltava instalar as redes de água quente, rede de água fria, aplicação de louças e torneiras;
y) Faltava instalar as máquinas terminais do aquecimento central;
z) Faltava revestir o piso e as paredes das casas-de-banho;
aa) Faltava revestir o piso da cozinha, sendo que as paredes estavam rebocadas com cal e cimento;
bb) As restantes paredes da casa estavam rebocadas com cal e cimento;
cc) Faltava fazer todos os tectos;
dd) Quanto à parte eléctrica já estavam instalados os tubos onde posteriormente seriam colocados os cabos eléctricos, sendo que estes não estavam instalados;
ee) No pavimento do rés-do-chão faltava o revestimento final pois só tinha a caixa e a betonilha;
ff) As escadas encontravam-se em betão;
gg) O pavimento do primeiro andar encontrava-se em cimento;
hh) Encontrava-se construída/escavada uma cavidade destinada a piscina em betão;
ii) Faltava a pintura interior;
jj) Faltava executar a calçada exterior em cubo;
kk) Na data referida em a), a estrutura em betão da casa existente no prédio aí mencionado já estava construída;
ll) A resistência do betão das vigas é de 35,5% da prevista no projecto;
mm) A resistência do betão da sapata é de 90,5% da prevista no projecto;
nn) Para a presente estrutura, o betão deve ter uma classificação de classe de exposição ambiental no mínimo de XC1 (Quadro 1 da norma NP EN 206-1), e esta classificação obriga e um recobrimento mínimo de 2 cm (recobrimento é a distância da armadura à superfície de betão), sendo que este recobrimento é a profundidade máxima aceitável que a carbonatação deve atingir ao fim dos 50 anos previsto na norma;
oo) No caso do betão utilizado na construção em causa, a carbonatação atinge a profundidade de 6,3 centímetros (o limite é de 2 centímetros);
pp) E as armaduras apresentam corrosão devido à carbonatação do betão, corrosão que não deveria acontecer até aos 50 anos previstos na norma supra-referida;
qq) A laje existente e instalada na sala apresenta os seguintes valores quando comparados com os valores previstos no projecto:

Previsto no projecto   Instalada em obra Unidades
Resistência aos momentos flectores (Msd)  83,15   45,8     KN.m
Resistência ao esforço transverso (Vsd)      47,62   44,4     KN
Momento de formação de fendas (Mfctk)    60,70   25,7     KN.m
Rigidez de flexão (EI) 26971  13635  KN.m2
Deformação de longo prazo  2,6       4,5       Cm
Número de ferros inferiores da vigota          6          4        
 
rr) Em face destes valores, a laje não cumpre os coeficientes de segurança exigidos pelas normas aplicáveis;
ss) A direcção da vigota na laje do alpendre não corresponde à prevista no projecto, uma vez que no projecto a laje do alpendre apoia-se no pórtico 3 e na parede de pedra da casa, enquanto que a laje existente em obra foi rodada, passando a apoiar-se nos pórticos 5 e 6, conforme imagem 3 da  página 9, do relatório pericial junto aos autos de fls. 1214 a 1253 (referência nº ...33);
tt) Os pórticos 5 e 6 não têm resistência para suportar esta laje, uma vez que não foram dimensionados para uma função de suporte, mas para travamento da laje;
uu) A chaminé existente no meio da sala está prevista no projecto de arquitectura, mas não está prevista no projecto de estruturas, pelo que em projecto não foi considerada como elemento de suporte da laje do tecto da sala;
vv) Como a chaminé está construída até à laje do tecto da sala e a deformação a longo prazo da laje construída é de cerca de 4, 5 cm, a chaminé vai acabar por dar apoio à laje, porque esta não está livre de se deformar;
ww) No entanto, como a chaminé não possui fundação (cimentação) para transmitir a carga ao solo, deveria ser um mero elemento decorativo, e não estrutural, porque em projecto não foi considerada como elemento de suporte da laje do tecto da sala;
xx) No projecto, a laje inclinada de cobertura tem uma espessura de 20 cm e em obra tem uma espessura de 13 cm;
yy) No projecto os pilares do alpendre estão previstos com a secção quadrada de 40x40cm, e em obra um dos pilares (P6) é circular com o diâmetro de 20 cm;
zz) A resistência do betão do pilar P6 é de 7,1 MPa, sendo este um valor de resistência inferior ao valor de resistência prevista no projecto que é de 20 MPa;
aaa) No projecto a viga do alpendre tem dimensões 20x45, correspondendo a 20cm de largura e 45cm de altura, sendo que em obra a viga tem a dimensão de 20x40cm, tendo a viga, portanto, menos 5 cm de altura em obra do que o previsto no projecto;
bbb) A viga e a laje foram fundidas em alturas distintas e pelas fissuras inclinadas na junta (fissuras de esforço de corte) verifica-se que não existem elementos de ligação entre a viga e a laje, originando a fissura entre os dois elementos, verificando-se, igualmente, que não foi executada conforme o projecto, uma vez que estava prevista a sua execução monolítica;
ccc) A carbonatação nas vigas do alpendre atinge a profundidade máxima de 6,3 cm, sendo que o recobrimento para esta estrutura não devia ir para além de 2 cm;
ddd) A viga “V+1” (pórtico 5 do projecto) tem uma armadura inferior com dois ferros de 10 mm;
eee) No entanto, como no projecto o pórtico 5 foi dimensionado sem a função de suporte da laje e neste momento está a suportar a laje, as armaduras são insuficientes para a nova função (deveriam ter sido objecto de redimensionamento, necessitando de, pelo menos, dois ferros de 16mm e de um de 12mm), não cumprindo as exigências de segurança;
fff) O projecto prevê para o pilar P6 uma sapata com 0.6mx1,3m e 60 cm de altura, para o pilar P5 uma sapata com 0.95x0.95 com 60 cm de altura, e uma viga de fundação entre as sapatas dos pilares P5 e P6, sendo que no projecto, estes elementos têm armaduras;
ggg) Em obra, apenas se observa um bolbo de betão com cerca de 1,1m, a fundação do pilar não existe conforme previsto no projecto e não tem armaduras, sendo que a resistência do betão utilizada ascende a 18,1 MPa, enquanto que no projecto se prevê uma resistência de 20 MPa;
hhh) Relativamente à fundação C2, no projecto a drenagem está prevista abaixo da cota do piso de rés-do-chão, de modo a recolher as águas que surjam do solo, prevendo-se, igualmente, uma caixa de brita envolvida em geotêxtil de modo a encaminhar as águas do solo rapidamente para o dreno para que a água nunca fique numa cota superior à cota do dreno, mantendo a parede sem humidade;
iii) Em obra, o dreno foi instalado a cerca de 1 metro acima da cota do pavimento, levando a que o solo abaixo da cota do dreno não seja drenado e colocando a parede em contacto com a humidade do solo;
jjj) Como a parede não foi impermeabilizada, não existe nenhum elemento a impedir a água de entrar na parede de pedra;
kkk) Consequentemente, verifica-se a existência de humidade na parede, infiltrações de água no interior da habitação sob a forma de eflorescências e danos no reboco e nos rodapés;
lll) Bem como a existência de um teor elevado de humidade no ar dentro da habitação e alguns fungos nas zonas interiores da parede de pedra;
mmm) A estrutura exterior da casa (paredes) foi construída com uma parede de pedra no lado exterior, uma caixa de ar e uma parede de tijolo pelo lado interior;
nnn) Foi colocado um plástico transparente sob a base da parede de tijolo e um plástico preto sob o pavimento térreo;
ooo) O tipo e a forma como os elementos estão colocados não é eficaz para isolar as paredes de humidades porque se trata de materiais frágeis, pouco duráveis e sem estanqueidade nas juntas de sobreposição
ppp) Também não existe qualquer isolamento para impedir a passagem da humidade da parede exterior em pedra para a parede interior em tijolo, porque como o tijolo é um material poroso, transmite essa humidade para o ar interior da sala;
qqq) No prédio existem dois muros exteriores: um que delimita a propriedade da via pública; outro que delimita o prédio do Autor com a prédio do vizinho a nascente;
rrr) Estes muros estão previstos no projecto de arranjos exteriores, onde está prevista a sua reconstrução em alvenaria de granito;
sss) À data referida em a), os referidos muros não tinham sido objecto de qualquer intervenção;
ttt) A supra-referida corrosão das armaduras implica uma diminuição da capacidade de resistência dos elementos, uma menor durabilidade e a necessidade de realização de uma reparação a curto prazo de forma a repor a segurança;
uuu) No tecto do primeiro piso existem dois pontos de humidade com origem no telhado: um no tecto do quarto; outro, no tecto do corredor;
vvv) O pavimento da casa das máquinas tem pendente contrária à grelha de drenagem, acumulando água no seu interior;
www) Existe infiltração de água no tecto da casa das máquinas;
xxx) A reconstrução da estrutura da casa, realizada antes da data referida em a), foi executada por HH, contratado pela Ré R..., tendo aquele iniciado as obras sem a orientação de qualquer projecto, e ao abrigo do processo de licenciamento de obras nº ...8, ao abrigo do qual foi emitido o Alvará de Licença de Construção nº ...9, em 01.09.2009, registado na Câmara Municipal ... em nome da Ré, R..., Lda.;
yyy) O Réu DD não teve qualquer intervenção na construção da casa existente no prédio referido em a);
zzz) O Réu DD emprestou o seu alvará de empreiteiro à Ré R... para que esta procedesse às obras na casa existente no prédio supra-referido;
aaaa) A casa existente no prédio referido em a), esteve sem janelas e portas, cerca de um ano antes data do negócio aí referido;
bbbb) O Autor continuou as obras de construção da casa cerca de 3 meses depois da data referida em a);
cccc) O Autor tem sofrido transtornos e desgosto por ter humidades, acumulações de água e fungos em casa, não conseguindo usufruir da habitação de forma total e sem condicionamentos;
dddd) Para reparar e corrigir as situações elencadas de ll) a www), a casa deverá ser esvaziada e durante as obras não poderá ser habitada.
2 – Factos não provados (com exclusão dos enunciados fácticos já provados por acordo, dos enunciados fácticos que apenas podem ser provados por documentos, dos enunciados de carácter conclusivo, dos enunciados fácticos irrelevantes e dos enunciados descritores de matéria de direito)
Da petição inicial da Autor (autos principais): artigos 14º a 20º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea m), 21º a 26º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas a) e b) e g) a k), 28º a 33º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas a) e b) e g) a k), 36º a 40º, 41º e 42º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas ll) a www), 56º, primeira parte, 59º a 69º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas ll) a www), 77º e 78º, 83º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea bbbb), 85º a 87º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea cccc), 88º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea ll) a www), 88º a 92º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea cccc), 93º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea dddd), 94º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea cccc), 95º a 100º, 101º a 104º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas kk) a www), 111º a 112º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas ll) a www), 112º a 114º, quanto ao nexo causal naturalístico, ou seja, que o dispêndio fosse necessário para manter a salubridade da casa e da cozinha, 120º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas ss), tt), e yy) a ggg), 146º, 154º, segunda parte.
Da contestação dos Réus R..., Lda., BB e mulher, CC: artigos 18º-B, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas ll) a www), 25º e 26º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea o), 27º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas p) a kk), 42º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea m), 43º a 49º, 51º a 62º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas g) a k), 69º, 94º, segunda parte, 100º a 102º, 108º, 122º a 125º, 130º, 140º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea hh), 153º, 154º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea bbbb), 155º a 159º, 203º, 235º a 239º, 240º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea m).
Da contestação do Réu DD: artigos 2º a 8º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas yyy) a zzz).
Da réplica do Autor: artigos 80º, 176º e 206º a 208º, 216º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas p) a kk).
Do articulado dos Intervenientes Acessórios: inexiste matéria a que cumpra responder atento o objecto da causa e a posição processual das Chamadas.
Do articulado superveniente apresentado pelo Autor constante fls. 981 a 988 (referência nº ...50): artigos 10º a 12º, sem prejuízo do disposto nos artigos ll) a www).
Do apenso A:
Da petição inicial dos ali Autores e aqui Réus (BB e CC): artigos 2º a 5º, 9º a 16º e 19º.
Da contestação do alí réu e aqui Autor (AA): artigos 17º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas p) a kk), 20º a 43º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas a), b) e g) a k), 52º a 55º, 63º a 66º, 70º a 76º, primeira parte, 76º, segunda parte, a 77º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas ll) a www), 136º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas p) a kk), 146º a 152º, 158º a 160º, 190º e 191º.
Articulado (requerimento nº ...23 do referido apenso A) de resposta à contestação do aqui Réus e ali Autores (BB e CC): artigos 8º a 23º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas a), b) e g) a k), 31º e 32º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas p) a kk).
*
V. Fundamentação de direito.

1. Questão Prévia: (in)admissibilidade de documento junto pela Ré/apelante, R..., com as alegações de recurso.
Com as alegações de recurso a Ré/recorrente juntou um documento intitulado “Ensaios de Caracterização de Betão[1].
O referido documento foi apresentado na sequência da explanação da impugnação das als. II) e mm) dos factos provados, visando essencialmente questionar e infirmar a credibilidade probatória do relatório pericial e dos esclarecimentos prestados pelo perito em audiência de julgamento, já que, na versão da R./recorrente, não foi atendida, como devia, a restante prova testemunhal, nomeadamente os depoimentos das testemunhas FF, GG e HH e, principalmente, de II, sendo que este último terá mencionado que para se registar o índice esclorométrico, tendo em conta os vários factores, que influenciam os resultados, está legalmente previsto usar no mínimo 9 (nove) leituras para obter um valor fiável nas área de ensaios e que a avaliação para cada zona de ensaio deve ser baseada em pelo menos 15 áreas de ensaio, o que não foi efectuado na peritagem, que utilizou tão só quatro áreas de ensaio, todas elas pré-escolhidas pelo A./Apelado.
Nas contra-alegações, o A./recorrido pugna pelo desentranhamento da motivação do recurso do referido documento, por ser legalmente inadmissível.
Vejamos, então, se tal admissão se mostra legalmente possível.
Os documentos são meios de prova, tendo como finalidade a demonstração da realidade dos factos [art. 341º do Código Civil (CC)], daí que a sua junção se deva contemplar essencialmente numa fase instrutória da causa.
Por essa razão, em princípio, a junção de documentos deve ser feita com o articulado em que se alegam os factos que constituem fundamento da ação ou da defesa (art. 423.º, n.º 1, do CPC). A lei permite, também, que a junção seja feita até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas neste caso a parte é condenada em multa, excepto se alegar e provar que não os pôde oferecer com o articulado (n.º 2 do mesmo art. 423.º). No entanto, para além desses casos, permite ainda a lei, após o limite temporal estabelecido naquele n.º 2, a junção de documentos até ao encerramento da discussão em 1ª instância (art. 425º do CPC), mas restringida àqueles cuja “apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior” (n.º 3 do mesmo art. 423.º).
Por seu lado, o art. 425.º do CPC, relativo ainda à prova documental, dispõe que “[d]epois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento[2].
Em consonância com estes princípios, o n.º 1 do art. 651.º do CPC estabelece que “[a]s partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância”.
Da conjugação destas disposições resulta, pois, que a regra é a junção de documentos na 1.ª instância, com a amplitude permitida no art. 423.º do CPC.
A junção de prova documental deve ocorrer preferencialmente na 1ª instância, regime que se compreende, porquanto os documentos visam demonstrar certos factos, antes de o tribunal proceder à sua integração jurídica[3].
Como se sabe, a fase de recurso não é naturalmente ajustada à apresentação ou produção de novos meios de prova, antes à reapreciação dos anteriormente apresentados.
Assim, a apresentação de documentos em sede recursória é considerada admissível em situações excecionais[4], estando dependente da (alegação e) demonstração pelo interessado na sua junção de que não foi possível a sua apresentação até esse momento (superveniência objetiva ou subjetiva) ou, numa segunda ordem de casos, quando a sua junção se tenha revelado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância.
Tais documentos são habitualmente designados de documentos supervenientes, sendo que a sua superveniência pode ser objetiva, nos casos em que o documento ainda não se tinha produzido até ao encerramento da discussão em primeira instância, ou subjetiva, quando o documento, apesar de já existir, só chegou ao conhecimento da parte depois desse momento[5].
No caso, com vista a legitimar a sua junção com as alegações de recurso, a R./recorrente não invoca quer a superveniência objetiva, quer subjetiva do documento, mas sim, segundo podemos depreender, o facto dessa junção só se ter revelado necessária na decorrência do julgamento proferido na 1.ª instância, alegação esta que releva para efeitos da invocação da parte final do n.º 1 do art. 651.º do CPC.
Este último citado segmento normativo admite a junção de documentos com as alegações de recurso nos casos em que o julgamento proferido em 1ª instância torne necessária a consideração desse documento.
É, porém, entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência que a junção com esse fundamento deve ser recusada quando os documentos visem «provar factos que já antes da sentença a parte sabia estarem sujeitos a prova, não podendo servir de pretexto a mera surpresa quanto ao resultado»[6].
No mesmo sentido, reportando-se a pretérito CPC (mas com pertinência atual), observam Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora[7], ser «(…) evidente que (...) a lei não abrange a hipótese de a parte se afirmar surpreendida com o desfecho da acção (ter perdido, quando esperava obter ganho de causa) e pretender, com tal fundamento, juntar à alegação documento que já poderia e deveria ter apresentado em 1.ª instância. O legislador quis manifestamente cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes da decisão proferida».
Assim, a possibilidade da junção de documentos com as alegações da apelação, não se tratando de documento ou facto superveniente, só poderá ter lugar naqueles casos em que a necessidade de tal junção foi criada, pela primeira vez, pela sentença da 1ª instância, quer quando se tenha baseado em meio probatório não oferecido pelas partes, quer quando se tenha fundado em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação as partes, justificadamente, não contavam[8].
Ora, nada disso ocorre na situação sub júdice, pois que a eventual necessidade da apresentação do referido documento não surgiu apenas na decorrência do julgamento proferido na 1.ª instância ou, mais propriamente, da prolação da sentença recorrida.
De facto, é patente que a junção do dito documento não se tornou necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância, isto é, por a fundamentação da sentença, ou o objeto da absolvição e/ou condenação terem exigido a prova de factos com cuja relevância a parte não poderia razoavelmente contar antes daquela decisão ter sido proferida.
De facto, não foi a sentença proferida em primeira instância que tornou necessária a consideração desse documento.
Veja-se que, através da junção do referido documento, o que a R./recorrente pretende é infirmar a matéria fáctica que veio a ser dada como provada [essencialmente sob as als. II) a www) dos factos provados] e cuja alegação consta da petição inicial, pretendendo, sobretudo, questionar a credibilidade probatória do relatório pericial junto aos autos e dos esclarecimentos prestados pelo perito em audiência de julgamento, os quais serviram de arrimo à demonstração daquela factualidade. 
Ora, considerando que a versão definitiva do relatório pericial consta dos autos desde 11/10/2021, não foi apresentada qualquer razão para que o referido documento não tivesse sido junto aos autos antes do encerramento da discussão da audiência em 1ª instância.
Se a R./recorrente entendia que o referido documento era relevante para a discussão da causa e o apuramento dos factos controvertidos, deveria tê-lo junto o mais tardar antes do encerramento da discussão da audiência,
No caso, tratando-se da demonstração/infirmação de factos controvertidos, submetidos à produção de prova, podia e devia a recorrente ter atempadamente providenciado pela sua junção aos autos até para que pudesse ser contraditado e valorado pelo Mm.º Juiz da 1ª instância, e não omitido essa junção.
Neste quadro, a justificação que se depreende pela R./apelante para só agora juntar o documento em causa não pode ser atendida, pois, como deixámos dito, a junção de documentos deve ser recusada quando através da mesma a parte vise provar factos que já antes da decisão sabia estarem sujeitos a prova e que só por culpa ou inércia sua não providenciou pela sua atempada junção.
Tendo-se abstido de juntar o referido documento antes do encerramento da discussão, não pode vir agora, na decorrência da prolação da sentença recorrida, pretender socorrer-se do disposto no art. 651º do CPC para a junção do referido documento
De facto, está vedado à R./recorrente juntar agora os referidos documentos, pois a sentença impugnada não contém a este propósito elementos de novidade, no sentido de ter sido surpreendente e inesperado em face dos elementos constantes do processo, ainda que a recorrente possa não concordar com a apreciação efetuada e a decisão proferida.   
Pelo exposto, inexistindo demonstrada qualquer circunstância impeditiva ou impossibilitadora da apresentação desse documento até ao encerramento da discussão se tivesse agido com a diligência devida, o decurso desta fase processual é preclusivo da possibilidade de junção do documento em recurso.
Nesta conformidade, à luz da disciplina enunciada, mormente as disposições conjugadas dos arts. 425.º e 651.º do CPC, impõe-se rejeitar a admissão do documento requerido pela apelante (constante de fls. 1347 v.º a 1353), dada a sua manifesta extemporaneidade e, consequentemente, ordena-se o seu desentranhamento e devolução à apresentante, após trânsito em julgado deste acórdão.
Dado o indeferimento da junção de tal documento, deverá a apresentante/recorrente ser condenada numa multa equivalente a 1 (uma) UC – art. 443º, n.º 1, do CPC e art. 27.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais.
*
2. Da nulidade processual e/ou nulidade da sentença por falta de realização da deferida inspecção judicial ao local.
Embora sob o item A) do corpo das alegações a Ré/recorrente catalogue o eventual vício como nulidade da sentença, certo é que no âmbito das conclusões classifica-o como nulidade processual, referindo para o efeito que a não realização de uma diligência probatória, deferida e admitida em sede de despacho saneador transitado em julgado, constitui uma nulidade processual, por omissão, “ex vi” do disposto no artigo 195º, n.º 1, in fine, do CPC[9].
Em resumo, defende a Ré/recorrente que, no caso em apreço, a requerida inspecção ao local era de todo conveniente e necessária à boa decisão da causa, por a mesma demandar uma percepção ou observação real e direta dos factos pelo Tribunal para melhor obter a perceção da realidade material, tratando-se de um poder dever, que só poderia deixar de ser exercido no caso da diligência requerida, se mostrar de todo desnecessária ou inútil para a descoberta da verdade, o que não é o caso.
Acrescenta que, sem todos os elementos – sendo que a inspeção judicial foi admitida em sede de despacho saneador –, é deficiente e obscura a resposta dada à matéria de facto, pelo que deve ser anulada a sentença recorrida e actos subsequentes e determinada a realização daquele meio probatório, nos termos dos nºs. 2 e 3 do art. 662º do CPC.
Delineadas tais considerações e analisando os autos constata-se que, no final da contestação, na indicação do requerimento probatório, a Ré/recorrente requereu a realização de “inspeção judicial ao local no dia da audiência de discussão e julgamento”.
Por despacho de 6/03/2019, o Tribunal “a quo” deferiu a requerida inspecção ao imóvel, determinando que a mesma se realizaria “no início da audiência final”.
Em 9/05/2022, data em que se realizou a última sessão da audiência final, sem que tivesse sido realizada ainda a referida inspeção ao local e/ou designado data para a sua realização, nem proferido qualquer despacho, a R./recorrente apresentou requerimento onde alegou a conveniência e necessidade da realização da requerida inspecção ao local, concluindo que «a não realização de uma diligência probatória, já deferida e admitida, constitui uma nulidade processual, por omissão, a ex vi do disposto no artigo 195º nº 1 in fine, do Código de Processo Civil».
Sucede que, na referida sessão de audiência de julgamento, o Mm.º Juiz “a quo”, apreciando o referido requerimento, proferiu despacho em que, “considerando que a admitida inspecção judicial ao local se tornou supervenientemente inútil”, deu a mesma sem efeito, tendo esse despacho sido imediatamente notificado às partes, na pessoa dos seus mandatários.
Mais do que apreciar e decidir se a decisão que determinou a dispensa da realização da referida diligência probatória se revelava, ou não, fundamentada e legítima, a verdade é que o que está efetivamente em causa é a rejeição de um meio de prova.

Ora, como bem refere o A./apelado nas contra-alegações, confrontada com o referido despacho proferido na audiência final, a R./Recorrente:
a) Ou reagia arguindo a alegada nulidade, para o que dispunha dos prazos previstos no n.º 1 do art. 199.º do CPC; ou
b) Apresentava recurso de apelação autónomo imediato, a intentar no prazo de 15 dias, nos termos do disposto nos arts.  644º, n.º 2, al. d)[10], 645º, n.º 3 e 638º, n.º 1, 2ª parte do CPC.
De todo o modo, atento o decurso do prazo legal para reagir contra tal decisão, o recurso da sentença final não é o momento processualmente adequado para suscitar a referida questão e ver sindicada aquela decisão.
Isto porque, não o tendo feito atempadamente, ficou precludida a faculdade ou o direito de ver apreciada a bondade (ou falta dela) da decisão que dispensou a realização daquele meio probatório,
Julga-se, por isso, improcedente a invocada nulidade processual e/ou nulidade da sentença.
*
3. Nulidade da sentença com fundamento na al. b) do n.º 1 do art. 615º do CPC.
3.1. Sob a denominação “Da Falta da Devida Fundamentação Da Matéria De Facto” – item B) das alegações – a R./Recorrente defende que:
a) “o Tribunal “a quo”, pura e simplesmente, ignorou a matéria de facto essencial e instrumental, alegada pela Ré/Apelante e vertida nos Artigos 28º, 29º, 30º, 31º, 32º, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 43º, 45º, 46º, do articulado de contestação/reconvenção da Ré/Apelante[11];
b) «O mesmo tratamento omissivo, teve a matéria de facto vertida nos Artigos 71º, 72º, 73º, todos do articulado de contestação/reconvenção, essa matéria também tinha que ser dada como provada[12], e
c) “Obtiveram ainda o mesmo tratamento por parte do Tribunal “a quo”, à “matéria dos artigos 97º, 98º, 99º, 103º, 122º, 129º, 174º, 181º, 182º, 203º, 226º (…)[13].
Mais invoca a R./Recorrente que a sentença recorrida enferma de nulidade, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, por falta da devida fundamentação de facto e que a matéria vertida nos referidos artigos da contestação deverá ser dada como provada.
Vejamos como decidir.
Como é sabido, é através da sentença, conhecendo das pretensões das partes – pedido e causa de pedir –, que o juiz diz o direito do caso concreto (arts. 152º, n.º 2 e 607º, ambos do CPC).
Pode, porém, a sentença estar viciada em termos que obstem à eficácia ou validade do pretendido dizer do direito.
Assim, por um lado, nos casos em que ocorra erro no julgamento dos factos e do direito, do que decorrerá como consequência a sua revogação, e, por outro, enquanto acto jurisdicional que é, se atentar contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou ainda contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada, caso este em que se torna, então sim, passível do vício da nulidade nos termos do artigo 615.º do CPC[14].
As nulidades de decisão são, pois, vícios intrínsecos (quanto à estrutura, limites e inteligibilidade) da peça processual que é a própria decisão (trata-se, pois, de um error in procedendo), nada tendo a ver com os erros de julgamento (error in iudicando), seja em matéria de facto, seja em matéria de direito[15].
As causas de nulidade da sentença ou de qualquer decisão (art. 613º, n.º 3, do CPC) são as que vêm taxativamente enumeradas no n.º 1 do art. 615º do CPC.
Nos termos do n.º 1 do art. 615º do CPC, a sentença é nula (entre o mais) quando:
«b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão».
A apontada nulidade está relacionada com o dever de fundamentação que decorre do princípio enunciado no art. 205.º, n.º 1, da Constituição da República, nos termos do qual as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei, reiterando-se o referido princípio no art. 154.º, n.º 1, do CPC, onde se diz que as «decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas», não podendo essa justificação/fundamentação «consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade» (n.º 2 do art. 154º).
Acresce que, nos termos do art. 607.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, na fundamentação da sentença o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados (n.º 4), mas só relativamente aos provados manda que o juiz os discrimine (n.º 3). A referência aos factos não provados pode, assim, ser feita por remissão.
Relativamente aos fundamentos de direito, o julgador não tem de analisar um por um todos os argumentos ou razões que cada uma das partes invoque em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões suscitadas pelas partes; por outro lado, não se lhe impõe, conquanto seja de toda a conveniência, que na sentença indique, uma por uma, todas as disposições legais que fundamentam a decisão, sendo suficiente que faça menção aos princípios, às regras e normas em que a sentença se apoia.
A falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (enquanto causa de nulidade e vício de natureza processual) não pode confundir-se com a eventual ou imputável falta de adequação ou lógica jurídica entre a fundamentação apresentada e a decisão. Como salientam Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio Nora[16], «não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, e não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário».
Por outro lado, como tem sido reiteradamente apontado pela doutrina [17] e jurisprudência[18], só integra o apontado vício a falta absoluta de fundamentação da sentença, que não uma fundamentação simplesmente escassa, deficiente, incompleta, medíocre, não convincente ou mesmo errada.
De facto, o vício da alínea b) do n.º 1 do art 615.º do CPC supõe o silenciar dos seus fundamentos de facto e de direito da questão “sub judicio”, não ocorrendo perante uma motivação aligeirada, não exaustiva, menos eivada de erudição ou tirada com menor minúcia e cuidado formal[19].
Desde já se dirá que, no caso, se tem por inverificada a aludida causa de nulidade da sentença.
Efetivamente, analisada a sentença proferida nos autos verifica-se que, no que à fundamentação da matéria de facto diz respeito, dela constam identificados os factos (essenciais) que considera provados e os que considera não provados, explicitando ainda a motivação (crítica) de um tal juízo, ancorada nos diversos meios de prova produzidos em sede de produção de prova.
Logo, constando da sentença recorrida os factos a que a decisão fez aplicação do direito (independentemente da R./recorrente dela discordar), bem como a indicação dos meios probatórios que, no entender do Ex.mo Juiz “a quo”, alicerçaram a decisão quanto à matéria de facto, o que permite controlar a razoabilidade da sua convicção, não falta a fundamentação de facto, nem a sentença é nula.
A verificar-se a apontada falta de fundamentação da decisão da matéria de facto, o vício em causa não se reconduziria à nulidade da sentença prevista no art. 615º, n.º 1, al. b) do CPC, mas sim eventualmente subsumível ao regime específico previsto no art. 662º, n.º 2, al. d) do CPC, do qual resulta que a Relação deve, mesmo oficiosamente, determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
Com efeito, o alegado vício da decisão da matéria de facto poderá, quando muito, reconduzir-se à previsão especial do art. 662º do CPC, mas não constitui, em caso algum, causa de nulidade da sentença, considerado além do mais o carácter taxativo da enumeração das situações de nulidade deste último ato decisório.
Mas mesmo que eventualmente se pudesse dizer que a fundamentação, nomeadamente ao nível da motivação da matéria de facto, é escassa, diminuta e incompleta – o que se concebe unicamente para efeitos argumentativos, entenda-se –, a verdade é que não poderá dizer-se que ocorre completa ausência ou falta de fundamentação, o que sempre nos reconduziria à inverificação da invocada nulidade da sentença. Como se disse, só a absoluta falta de fundamentação – e não a sua insuficiência, mediocridade ou erroneidade – integra a previsão da al. b) do n.º 1 do art. 615.º do CPC[20].
Se o faz de forma correcta ou não é matéria que pode revestir a forma de erro de julgamento, mas não integra qualquer deficiência processual.
Denota-se, aliás, que o verdadeiro motivo do vício apontado pela R./recorrente à sentença recorrida não consubstancia a referida nulidade, tendo antes a ver com um eventual erro de julgamento quer da matéria de facto, quer da matéria de direito[21]. Isto porque a R./recorrente dirige essencialmente a sua crítica ao concreto resultado probatório apurado na sentença recorrida, dissentindo quanto a alguns dos factos que o Tribunal “a quo” deu como provados e/ou não provados – impugnável nos termos do disposto nos arts. 640º e 662º do CPC, o que foi feito pelo R./recorrente. Acresce que a valoração, fáctica e jurídica, feita na sentença recorrida poderá comportar uma errada subsunção dos factos ao direito, bem como uma errada interpretação e aplicação das normas jurídicas – impugnável nos termos do disposto no art. 639º do CPC, o que (também) foi feito pelo R./recorrente.
Podendo estar-se, portanto, perante um erro de julgamento (error in judicando), mas não é possível surpreender e, consequentemente, reconhecer, nessa sede, a comissão de qualquer vício gerador de nulidade da sentença (error in procedendo).
Trata-se, contudo, de circunstâncias, de vício e de regime completamente diversos do da nulidade da sentença.
Nesta conformidade, conclui-se pela improcedência da invocada nulidade da sentença com fundamento na al. b) do n.º 1 do art. 615º do CPC.
*
3.2. No tocante à segunda objecção apontada pela R./recorrente – inclusão (por aditamento/ampliação) dos factos supra invocados no rol dos factos provados – importa ter presente que, nos termos do disposto no art. 607.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, na fundamentação da sentença o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, devendo indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.
Igualmente há que ter presente a regra geral enunciada no art. 5º do CPC, donde resulta que o tribunal deverá considerar os factos articulados pelas partes que sejam essenciais, sendo que estes tanto podem constituir a causa de pedir e ter sido alegados pelo autor, como dizerem respeito a exceções invocadas pelo réu.
Assim, na enunciação dos factos provados como dos não provados cabe necessariamente uma pronúncia (positiva, negativa, restritiva ou explicativa) sobre os factos essenciais (nucleares) que foram alegados para sustentar a causa de pedir ou para fundar as exceções, e de outros factos, também essenciais, ainda que de natureza complementar que, de acordo com o tipo legal, se revelem necessários para que a ação ou a exceção proceda[22].
Acontece que, como refere Abrantes Geraldes[23], a decisão da matéria de facto pode apresentar patologias que não correspondem verdadeiramente a erros de apreciação ou de julgamento, podendo – e devendo – algumas delas ser solucionadas de imediato pela Relação, ao passo que outras poderão determinar a anulação total ou parcial do julgamento.
Como concretização de tais patologias enuncia o citado autor que as decisões sob recurso “podem revelar-se total ou parcialmente deficientes”, “resultante da falta de pronúncia sobre factos essenciais ou complementares”, “de modo que conjugadamente se mostre impedido o estabelecimento de uma plataforma sólida para a integração jurídica do caso”.
Verificado esse vício, para além de o mesmo ser sujeito a apreciação oficiosa da Relação, poderá esta supri-lo a partir dos elementos que constam do processo ou da gravação.
Pode, assim, “revelar-se uma situação que exija a ampliação da matéria de facto, por ter sido omitida dos temas da prova matéria de facto alegada pelas partes que se revele essencial para a resolução do litígio, na medida em que assegurem enquadramento jurídico diverso do suposto pelo tribunal a quo”, faculdade esta que nem sequer está dependente da iniciativa do recorrente, bastando que a Relação se confronte com uma omissão objetiva de factos relevantes”; nesse caso, ao invés de anular a decisão da 1ª instância, se estiverem acessíveis todos os elementos probatórios relevantes, “a Relação deve proceder à sua apreciação e introduzir na decisão da matéria de facto as modificações que forem consideradas oportunas”.
O vício em causa será eventualmente subsumível ao regime específico previsto no art. 662º, n.º 2, al. c) do CPC, do qual resulta que a Relação deve, mesmo oficiosamente anular “a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta”.
Com efeito, a deficiência da decisão da matéria de facto poderá decorrer da omissão de pronúncia quanto a algum facto controvertido, sendo de destacar que todos os factos controvertidos devem ser apreciados pelo tribunal, sem que entre eles possa ser estabelecida qualquer relação de prejudicialidade que dispense a pronúncia sobre outros[24].
Nesta conformidade, a aludida objeção – inclusão dos factos invocados pela R./Recorrente no elenco dos factos provados –, não consubstanciando uma nulidade da sentença, será, sim, ulteriormente analisada aquando da pronúncia sobre a impugnação da decisão da matéria de facto[25].
*
4. – Da impugnação da decisão da matéria de facto (recurso independente e recurso subordinado).
4.1. Em sede de recurso, os apelantes (quer a recorrente principal, quer o recorrente subordinado) impugnam a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de 1.ª instância.
Para que o conhecimento da matéria de facto se consuma, deve(m) previamente o(s) recorrente(s), que impugne(m) a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o (triplo) ónus de impugnação a seu cargo, previsto no art. 640º do CPC, o qual dispõe que:
1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.».
Por sua vez, determina o art. 639º do CPC (ónus de alegar e formular conclusões):

«1 - O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
2 - Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a) As normas jurídicas violadas;
b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;
c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.
3 - Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada.
4 - O recorrido pode responder ao aditamento ou esclarecimento no prazo de cinco dias.
5 – (…)».
A exigência que o legislador consagrou no art. 607º, n.º 4, do CPC, quanto à decisão da matéria de facto, impondo ao Tribunal o dever de fundamentação e de análise crítica da prova, tem como contraponto a exigência imposta às partes, que pretendam impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, de cumprirem os ónus estabelecidos nos arts. 639º e 640º, ambos do CPC[26].

À luz do citado art. 640º, e seguindo a lição de Abrantes Geraldes[27], sempre que o recurso de apelação envolva a impugnação da decisão sobre a matéria de facto deve o recorrente observar as seguintes regras:

«a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente tem de indicar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;
d) (…);
e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente;
 (…)».

Esse ónus tripartido encontra a sua razão de ser nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa-fé processuais, visando garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão[28].
Segundo a regra geral estabelecida no art. 635º do CPC, são as conclusões que delimitam o objeto do recurso, de modo que a exigência da especificação dos concretos pontos de facto cuja modificação é pretendida pelo recorrente não poderá deixar de ser enunciada nas conclusões[29].
Como se salienta no Ac. do STJ de 22/10/2015 (relator Manuel Tomé Soares Gomes), in www.dgsi.pt., no domínio do regime recursal cível importa ter presente, em primeiro lugar, que a finalidade do recurso não é proferir um novo julgamento da ação, mas julgar a própria decisão recorrida.
E, em segundo lugar, no que respeita à impugnação da decisão de facto, esta decisão tem por objeto os juízos probatórios parcelares, positivos ou negativos, sobre cada um dos factos relevantes, embora com o alcance da respetiva fundamentação ou motivação.
Neste quadro, a apreciação do erro de julgamento da decisão de facto é circunscrita aos pontos impugnados, até porque o sistema consagrado não admite recursos genéricos contra a decisão da matéria de facto, embora, quanto à latitude da investigação probatória, o tribunal de recurso tenha um amplo poder inquisitório sobre a prova produzida que imponha decisão diversa, como decorre do preceituado no art. 662.º, n.º 1, do CPC.
São, portanto, as referidas condicionantes da economia do julgamento do recurso e da natureza da decisão de facto que postulam o ónus, a cargo da parte impugnante, de delimitar com precisão o objeto do recurso, ou seja, de definir as questões a reapreciar pelo tribunal “ad quem”, especificando os concretos pontos de facto ou juízos probatórios, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art.º 640.º do CPC.

Debruçando-se especificamente sobre o (in)cumprimento dos requisitos formais de impugnação da decisão da matéria de facto previstos no n.º 1 do art.º 640.º do CPC, refere Abrantes Geraldes[30]:

A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em algumas das seguintes situações: (…)
a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (arts. 635º, n.º 4, e 641º, n.º 2, al. b)); (…)
b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art. 640º, n.º 1, al. a)); (…)
c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.); (…)
d) Falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda; (…)
e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação.
(…)
Recorrendo uma vez mais ao ensinamento do autor que vimos citando[31], dir-se-á que as “referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor. Trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo”.
Não desconhecemos que a orientação predominante no Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a revelar-se mais flexível e mais maleável, no que respeita ao cumprimento dos mencionados ónus estabelecidos no art. 640º do CPC, principalmente em relação aos de natureza essencialmente formal ou secundária, devendo ser feita uma interpretação dessa norma mais consentânea com as exigências dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade[32].
Sobre estes ónus e sobre as consequências do seu não cumprimento total ou parcial, é possível distinguir um ónus primário ou fundamental de delimitação do objeto e de fundamentação concludente da impugnação – que consta atualmente do n.º 1 do art. 640º do CPC – e um ónus secundário – tendente, não propriamente a fundamentar e delimitar o recurso, mas a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes (previsto presentemente no art. 640º, n.º 2, al. a), do CPC). Ora, sendo a inobservância do ónus primário sancionada com a rejeição imediata do recurso na parte afetada, dada a sua indispensabilidade, já em relação ao incumprimento do ónus secundário “justifica-se alguma maleabilidade, em função das especificidades do caso, da maior ou menor dificuldade que ofereça, com relevo, designadamente, para a extensão dos depoimentos e das matérias em discussão”, posto que “se a falta de indicação exata das passagens da gravação não dificulta, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório, nem o exame pelo tribunal, a rejeição do recurso, com este fundamento, afigura-se uma solução excessivamente formal, rigorosa e sem justificação razoável[33].
Na mesma linha se entende que as conclusões não têm de reproduzir todos os elementos do corpo das alegações; mais concretamente, a especificação dos meios de prova, a indicação das passagens das gravações e mesmo as respostas pretendidas não têm de constar, formalmente, das conclusões recursórias, bastando incluí-las no corpo alegatório, diversamente do que sucede, por razões de objetividade e certeza, com os concretos pontos de facto impugnados[34].
Importará ter presente que o ónus de indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, pelo que a falta de indicação com exactidão das passagens da gravação onde se funda o recurso só será idónea a fundamentar a rejeição liminar do mesmo se dificultar, de forma substancial, o exercício do contraditório, ou o exame pelo tribunal, sob pena de ser uma solução excessivamente formal, rigorosa e sem justificação razoável[35].
Cumpre o ónus do art. 640.º, n.º 2, do C.P.C. quando não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento, como ocorre nos casos em que, para além de o apelante referenciar, em função do conteúdo da acta, os momentos temporais em que foi prestado o depoimento tal indicação é complementada com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objecto do recurso[36]; ou quando o recorrente identificou as testemunhas EE, FF e GG, assim como a matéria sobre a qual foram ouvidas, referenciou as datas em que tais depoimentos foram prestados e o CD onde se encontra a respectiva gravação, indicando o seu tempo de duração, e, para além disso, transcreveu e destacou a negrito as passagens da gravação tidas por relevantes e que, em seu entender, relevavam para a alteração do decidido[37].
Contudo, a apresentação das transcrições globais dos depoimentos das testemunhas não satisfaz a exigência determinada pela al. a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC[38]; nem o faz o recorrente que procede a uma referência genérica aos depoimentos das testemunhas considerados relevantes pelo tribunal para a prova de quesitos, sem uma única alusão às passagens dos depoimentos de onde é depreendida a insuficiência dos mesmos para formar a convicção do juiz[39]; e igualmente não cumpre a exigência legal a simples indicação do momento do início e do fim da gravação de um certo depoimento[40].
Em resumo, quando não for cumprido o ónus “primário” ou “fundamental” de delimitação do objeto e de fundamentação concludente da impugnação constante nas alíneas do n.º 1 do art. 640º do CPC há lugar à rejeição do recurso, total ou parcial.

Aplicando tais critérios ao caso, importa fazer as seguintes considerações:

i) a recorrente R..., no tocante às als. a), II) a www) e cccc) dos factos provados[41] indica quais os factos que pretende que sejam decididos de modo diverso, inferindo-se por contraponto a redação que deve ser dada quanto à factualidade que entende estar mal julgada, como ainda o(s) meio(s) probatório(s), constantes do processo ou nele registados, que, na sua óptica, impunham uma decisão diversa quanto aos factos impugnados.
ii) no tocante à facticidade objeto da al. dddd) dos factos provados, não obstante lhe fazer menção no corpo das alegações, omite a sua pronúncia nas conclusões, pelo que, por não ter cumprido o ónus de especificação nas conclusões, é de rejeitar a impugnação desse concreto ponto fáctico.
iii) Quanto aos meios de prova gravados, a R./recorrente não indica com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso e que permitam a sua identificação e localização, tão pouco procedeu à transcrição dos excertos que considera relevantes (se bem que essa transcrição não era obrigatória, mas sim meramente facultativa[42]).
De facto, quanto à matéria constante das alíneas. II) a www) dos factos provados, a recorrente tece críticas ao Tribunal “a quo” sob o pretexto deste ter feito uma aderência quase total ao relatório pericial e aos esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito em sede de audiência de discussão e julgamento, desatendendo a restante prova testemunhal, «nomeadamente, ao depoimento de FF, industrial de betão, constante da gravação no sistema Habilus Media Studio das 10h:14:55 a 10h.49.18», bem como das «testemunhas, GG, Engenheiro Civil, cujo o depoimento se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 11h:37:05 a 12h.18.40 e ainda a testemunha HH, cujo o depoimento se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 15h:54:47 a 15h.54.47», e, «principalmente a testemunha, II, Eng. Civil e Professor de JJ, cujo o depoimento se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 14h:13:50 as 15h.02.56»; e, mais adiante, propugnando pela alteração da decisão da matéria de facto, por do processo constarem elementos probatórios que impunham uma decisão/resposta diversa da que foi proferida, indica, no que concerne aos meios de prova objecto de gravação:
«(…)
b)- Depoimento de parte do R. BB e que se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 14h:08:54 a 14h.35.29;
(…)
f)- Depoimento da testemunha, FF, constante da gravação no sistema Habilus Media Studio das 10h:14:55 a 10h.49.18;
h)- Depoimento da testemunhas, GG, Engenheiro Civil, cujo o depoimento se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 11h:37:05 a 12h.18.40;
i)- Depoimento da testemunha HH, cujo o depoimento se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 15h:54:47 a 15h.54.47;
h) Depoimento da testemunha, II, Eng. Civil e Professor de JJ, cujo o depoimento se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 14h:13:50 as 15h.02.56».
Como é fácil de ver, relativamente a tais meios probatórios gravados, a R./recorrente não cuidou de indicar, como podia e devia, com exactidão as passagens da gravação em que se baseia para demonstrar o invocado erro de julgamento da decisão de facto. Tão pouco apresentou a respetiva transcrição, da qual conste, relativamente a cada depoimento (testemunhal ou depoimento de parte), a sua localização no instrumento técnico que incorporou a gravação da audiência; e quando dizemos com exatidão não pretendemos significar a necessidade de indicação do minuto e do segundo da gravação em que se encontra a passagem que funda o recurso, mas pelo menos uma delimitação mínima e precisa que facilmente nos permita localizar a parcela ou segmento do depoimento fundante do recurso, não sendo forma válida de cumprimento desse ónus a mera indicação do início e termo dos respetivos depoimentos prestados.
Se não se exige a transcrição dos excertos da gravação que se considere importantes, já se nos afigura necessário que a apelante indique com exatidão as passagens da gravação que considera relevantes ou pertinentes para que o tribunal de recurso possa reapreciar todas e cada uma das decisões de facto com que não concorda[43].
É, por conseguinte, manifesto que a R./recorrente incumpriu, relativamente à prova gravada, o ónus secundário da indicação com exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, pelo que, operando a sanção cominada pelo disposto no art. 640º, n.º 2, al. a), do CPC, impõe-se nessa parte a imediata rejeição do recurso (alicerçada na prova gravada, dada a sua imprestabilidade).
Ressalve-se, no entanto, ser admissível a impugnação da decisão da matéria de facto na parte em que não se baseie na prova gravada, como seja no caso a prova documental[44].
Acresce que, como vem entendendo a doutrina e a jurisprudência dominante do STJ, no âmbito do recurso de impugnação da decisão da matéria de facto não cabe despacho de convite ao seu esclarecimento ou aperfeiçoamento das respetivas alegações, sendo este tipo de despacho reservado apenas e só para os recursos em matéria de direito[45].
iv) No tocante ao recorrente subordinado, AA, cumpriu este integralmente o ónus primário e o ónus secundário da impugnação da matéria de facto – pois indica os factos que pretende que sejam decididos de modo diverso, a redacção que deve ser dada quanto à factualidade que entende estar mal julgada, como ainda o(s) meio(s) probatório(s) que na sua óptica o impõe(m), incluindo, no que se refere à prova gravada em que fazem assentar a sua discordância, a indicação dos elementos que permitem a sua identificação e localização, procedendo inclusivamente à respectiva transcrição de excertos dos depoimentos testemunhais e depoimentos de parte que considera relevantes para o efeito –, pelo que podemos concluir que cumpriu suficientemente o triplo ónus de impugnação estabelecido no citado art. 640º. 
*
4.2. Sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, preceitua o art. 662.º, n.º 1, do CPC, que «a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa».

Por referência às suas conclusões, extrai-se que a R./recorrente pretende:

i) - A alteração/modificação da al. a) dos factos provados da sentença recorrida;
ii) - A alteração da resposta positiva para negativa das als. II) a www) e cccc) dos factos provados da sentença recorrida;
iii) - A alteração da resposta negativa para positiva dos pontos 28º, 29º, 30º, 31º, 32º, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 43º, 45º, 46º, 71º, 72º, 73º, 7º, 98º, 99º, 103º, 122º, 129º, 174º, 181º, 182º, 203º, 226º do articulado de contestação/reconvenção da Ré/Apelante.

Vejamos, circunstanciadamente, cada um dos factos impugnados.
- Al. a) dos factos provados.
Sob a alínea a) dos factos provados constantes da sentença recorrida o Tribunal “a quo” deu como provado que:
«a) Por acordo redigido a escrito em 19 de Novembro de 2014, e autenticado por termo, a sociedade R..., Lda., representada pela sócia-gerente CC, declarou vender, e AA declarou comprar, pelo preço de 150.000,00, o prédio misto, composto por casa de rés-do-chão, com dependência, coberto aberto, rossio, espigueiro, eira e terreno de pastagem, sito em ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...97-..., registado a favor da parte vendedora, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...3º, da freguesia ..., e na matriz predial rústica sob o artigo ...59º, da mesma freguesia, conforme se retira da cópia junta aos autos de fls. 53v a 57 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido».
Ora, por referência ao teor do documento n.º ... junto com a petição inicial (cfr. fls. 48 e 48 vº), constata-se que a facticidade apurada contém um lapso de escrita no tocante à descrição predial do prédio, já que o mesmo pertence à freguesia ..., e não, como por lapso se indicou, à freguesia ... (se bem que no contrato promessa é igualmente feita menção a esta última freguesia - cfr. fls. 53v a 57).
Assim sendo, corrigindo o referido erro de escrita, altera-se a redação do referido ponto fáctico, que passará a vigorar com a seguinte redacção:
«a) Por acordo redigido a escrito em 19 de Novembro de 2014, e autenticado por termo, a sociedade R..., Lda., representada pela sócia-gerente CC, declarou vender, e AA declarou comprar, pelo preço de 150.000,00, o prédio misto, composto por casa de rés-do-chão, com dependência, coberto aberto, rossio, espigueiro, eira e terreno de pastagem, sito em ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...97-..., registado a favor da parte vendedora, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...3º, da freguesia ..., e na matriz predial rústica sob o artigo ...59º, da mesma freguesia, conforme se retira da cópia junta aos autos de fls. 53v a 57 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido».
*
- Als. LL) e MM) dos factos provados.
Os indicados pontos fácticos impugnados têm o seguinte teor:
- «ll) A resistência do betão das vigas é de 35,5% da prevista no projecto;»
- «mm) A resistência do betão da sapata é de 90,5% da prevista no projecto;».
Para alicerçar a sua convicção, o Mm.º Juiz “a quo”, na “motivação fundamentadora da decisão de facto”, indicou ter-se baseado, “fundamental e essencialmente, no relatório pericial junto aos autos, e nos esclarecimentos do Sr. Perito prestados em sede de audiência de julgamento”.
No tocante ao relatório final pericial, junto aos autos em 11/10/2021 (ref.ª Citius ...33 - fls. 1221 a 1253), o sr. Perito indicou o seguinte:
 “Quesito 59[46]
i. O betão da estrutura tem uma capacidade de resistência de cerca de metade da prevista no projeto;
Resposta: O betão previsto no projeto é da classe de resistência C20/25, conforme indicado no projeto na Câmara Municipal.
(…)
O betão previsto em projeto deve apresentar uma resistência à compressão mínima de 20 MPA em provetes cilíndricos e de 25 MPA em provetes cúbicos, conforme Quadro 7 da norma NP EN 206-1.
(…)
Foram efetuados carotes nas vigas e ensaiados os carotes cilíndricos, e verifica- se que apresentam uma resistência de 7.1 MPa e 7.6 MPa respetivamente CV1 e CV2, in Quadro I do relatório Nº ...89.001.21 da empresa S....
Verifica-se assim, que deveriam ter uma resistência de 20 MPA e apresentam uma resistência de 7.1 MPa. Assim, a resistência do betão das vigas é de 35.5% da prevista no projecto ( 100 x 7.1/20=35.5%).
Relativamente ao betão da sapata o ensaio apresenta uma resistência de 18.1 MPa, e deveria ter uma resistência de 20 MPA, o que corresponde a 90.5% da resistência prevista no projecto. (100 x 18.1 /20)”.
Mais esclareceu o sr. Perito, no referido relatório, em face das dúvidas suscitadas de como teria obtido tais resultados, que para a obtenção dos valores em questão “Foram efetuados os ensaios “in situ[47].
Em complemento ao referido relatório pericial o sr. Perito juntou aos autos o relatório e respetivo boletim de ensaio[48], elaborado pela empresa S..., Lda., a pedido do autor, no qual se refere que realizou ensaios, entre o mais, de resistência à compressão do betão “em 3 carotes extraídas: 2 em vigas e uma numa sapata de fundação”, onde se concluiu que “Os resultados obtidos no ensaio das carotes permitem verificar que se obtiveram valores de resistência à compressão muito baixos” e ainda que “Os valores obtidos nas vogas VS1 e VS2 são muito próximos e de tal forma reduzidos que não permitem o enquadramento em termos de classe de betão”;
Releva, também, a documentação junta pelo Sr. Perito, através de email, em 21/04/2022 (ref.ª Citius ...69 – fls. 1278 a 1285), respeitante à certificação da empresa S... e aos certificados de calibração, documentação essa cuja junção aos autos foi admitida pelo despacho proferido na sessão da audiência de julgamento de 22/04/2022[49], não tendo nenhuma das partes emitido qualquer pronúncia sobre os referidos documentos, apesar de expressamente notificadas para o efeito.

Acresce que a empresa E..., S.A., contratada pelo A./Recorrido para avaliar as causas das patologias detectadas na moradia em causa, em relatório pericial elaborado em dezembro de 2015[50], e junto aos autos como Documento n.º ...2, concluiu, quanto à qualidade do betão, que[51] (cf. pontos 5.1, 6.2 e 7 do relatório):

a) O betão da estrutura tem uma capacidade de resistência consideravelmente inferior à prevista no projeto;
b) O betão encontra-se incorretamente doseado, o que provoca que o mesmo se encontre mais poroso, com menor resistência e, consequentemente, que apresente um estado de corrosão avançado nas armaduras (impróprio de elementos estruturais com tão pouca antiguidade).

Por fim, a testemunha KK, engenheiro técnico industrial, chefe do departamento de verificação da E..., que participou na elaboração do relatório, referiu, em audiência de julgamento, recordar-se das conclusões a que havia chegado após a realização dos ensaios no imóvel do A./Recorrido, de entre as quais se salienta o facto de o betão apresentar uma resistência de cerca de metade da prevista no projeto.
Relativamente à indicada prova testemunhal erigida pela R./recorrente como legitimadora duma resposta diversa da proferida na sentença, mostra-se a mesma imprestável ou infrutuosa, uma vez que, como se disse, aquela impugnante não cumpriu o ónus de localização previsto na al. a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC que sobre si impendia, o que determinou, nessa parte, a impugnação da decisão da matéria de facto fundada naquele meio de prova.
Por outro lado, a argumentação expandida pela R./Recorrente no sentido de o relatório pericial junto aos autos padecer de deficiência, obscuridade e carecer de “fundamentação válida” – sob o pretexto de a avaliação para cada zona de ensaio dever “ser baseada em pelo menos 15 áreas de ensaio”, o que não foi efectuado na peritagem, que utilizou tão só quatro áreas – mostra-se destituída de validade, visto tal premissa (a indispensabilidade da realização de, pelo menos, 15 áreas de ensaio) não se mostrar comprovada nos autos. E nenhum argumento se poderá retirar do documento cuja apresentação foi feita com a apelação, visto ter-se concluído pela inadmissibilidade da sua junção.

Quanto à precisão dos ensaios, importa dizer o seguinte:
i) - Inquirido em audiência de julgamento, nos termos e para os fins do disposto no art. 486º do CPC, o sr. Perito esclareceu que, para a aferição dos dados da resposta ao quesito 59, foi observada a norma NPEN 12390-3:2011, tendo também esclarecido os testes que foram realizados e os equipamentos utilizados, tendo-se disponibilizado para disponibilizar a creditação da empresa que realizou os testes e respetivo relatório, em como da máquina de compressão utilizada.
Tais elementos foram, ulteriormente, juntos aos autos pelo sr. Perito em 21/04/2022 (cf. ref.ª Citius ...69 - fls. 1278 a 1285), reportando-se à certificação da empresa S... e aos certificados de calibração, nos termos já anteriormente explicitados.
ii) – a testemunha MM, a respeito do relatório realizado pela E..., questionado sobre quantas provetes de betão havia recolhido e se, para ser idóneo, um ensaio deste tipo precisar de, pelo menos, 9 provetes, indicou que, diversamente do que sucede com o betão fresco, quando se trata de betão em estrutura, ou seja, já edificado/construído (há cerca de 10 anos, no caso) não é necessário um número tão grande de amostras.
Pois bem, não obstante a força probatória da prova pericial ser fixada livremente pelo Tribunal (art. 389º do Cód. Civil), importará não olvidar que o exame pericial em causa tendente a indagar do estado do imóvel em causa, nomeadamente da resistência à compressão do betão, envolveu matéria de particular complexidade, que exige ou pressupõe especiais conhecimentos técnicos, que o julgador não possui.
Assim, considerando a profissionalidade do perito que interveio na perícia realizada nos autos, a especialização do perito na matéria objeto da perícia, a sua abrangência e o seu cariz técnico, a suficiência dos factos e elementos em que se baseou (documentando-o com as fotografias que dele constam em anexo), a inteligibilidade do laudo, com a descrição dos procedimentos levados a cabo para se chegar ao resultado alcançado, a observância, na sua elaboração, de parâmetros científicos ou técnicos (que não estão minimamente colocados em crise), assim como a coerência, motivação e racionalidade das suas conclusões, complementado com os esclarecimentos prestados às questões suscitadas, é de concluir que o seu resultado (sem embargo da conjugação com a demais prova produzida) se afigura como decisivo na formação da convicção do Tribunal quanto à(s) questões controvertidas concreta(s). E, pelas razões já indicadas, é inegável que a sua valia e credibilidade probatória se deve sobrepor aos argumentos invocados pela R./recorrente.
Em suma, não possuindo os meios probatórios indicados pela R./recorrente a credibilidade probatória que esta lhes pretende conferir, é de confirmar o juízo da 1ª Instância que se alicerçou, primacialmente, no resultado do relatório pericial.
Donde se conclui pela inexistência nos autos de elementos capazes de colocar em causa a fiabilidade do relatório e dos ensaios periciais realizados.
Consequentemente, são de manter e secundar as respostas às alíneas ll) e mm) dos factos provados.
*
Dos factos provados constantes das alíneas NN) a WWW).
 Nas suas alegações, a R./Recorrente refere, de forma sucinta e enxuta, que “[d]a mesma deficiência, padece[m] as respostas as alíneas nn), a www) dos factos dados como provados”.
Por referência à afirmação que a antecede, depreende-se que queira dizer que as respostas aos aludidos pontos fácticos impugnados são deficientes e obscuras e sem qualquer fundamentação válida.
Temos de convir que, como bem salienta o A./recorrido nas contra-alegações, a R./Recorrente não desenvolve de que deficiência padecem os factos provados incluídos nas als. nn) a www).
Tão pouco indica os concretos meios probatórios que impunham, quanto aos pontos em questão, decisão diversa da recorrida.
Tais omissões determinam por si a rejeição da pretensão impugnatória deduzida ela R./recorrente.
Sempre se dirá quanto aos factos impugnados em apreço, e à semelhança do expendido a respeito das respostas às als. LL) e MM) dos factos provados, que a convicção do Tribunal recorrido se mostra essencialmente fundada no relatório pericial junto aos autos, convicção essa que merece confirmação por parte deste Tribunal nos termos supra expostos.
Nesta conformidade, julga-se improcedente a impugnação fáctica em apreço.
*
Alínea CCCC) dos factos provados
A mencionada alínea tem o seguinte teor:
“cccc) O Autor tem sofrido transtornos e desgosto por ter humidades, acumulações de água e fungos em casa, não conseguindo usufruir da habitação de forma total e sem condicionamentos”.
Refere a R./Recorrente que o Tribunal “a quo” não devia ter dado como provada essa facticidade, “uma vez que o A./Apelado não possui licença de utilização/habitabilidade”, pelo que  “não pode usufruir de uma habitação de uma forma total e sem condicionamentos, se a mesma, não estiver concluída em termos legais, e ter a necessária licença de habitação/habitabilidade, sob pena de até incorrer em contra-ordenação prevista, no nº 1 alínea d) e 4 do artigo 98º do Decreto-Lei N.º 555/99, de 16 de Dezembro – Regime jurídico da urbanização e da edificação”.
Conclui, por isso, que “não podia, como não pode o A./Apelado, usufruir da habitação, porque a mesma padece do maior dos condicionalismos, que é a inexistência de licença de habitabilidade”.
A esse respeito, na motivação da sentença impugnada, o Exmo Juiz “a quo” aduziu que a “convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto constante da alínea cccc) assentou nas declarações da testemunha NN, do Autor e dos resultados da prova pericial produzida que sustentou as declarações dos referidos”.
Sucintamente, afirmar-se-á que o argumento usado pela R./Recorrente para pugnar pela impugnação do facto em apreço é carecido de fundamento.
A facticidade em causa reporta-se genericamente à matéria alegada nos arts. 90º a 93º da petição inicial,
Ora, à demonstração da referida facticidade é irrelevante a questão de saber se o A./Apelado possui, ou não, licença de utilização/habitabilidade.
Ao apuramento dessa materialidade fáctica importava, sim, que o A./Recorrido habite no imóvel, o imóvel padeça de defeitos e tais defeitos provoquem no A./Recorrido transtornos e desgosto, por não conseguir usufruir da sua habitação de forma total e sem condicionamentos.
O primeiro pressuposto enunciado resulta da al. l) dos factos provados – o Autor AA pretendeu e utiliza o imóvel descrito em a) como sua residência; o segundo pressuposto decorre, entre o mais, da facticidade incluída nas als. iii) a lll), uuu) e www) dos factos provados; por fim, o terceiro pressuposto resulta dos supra indicados meios de prova aludidos na motivação da sentença recorrida, não esgrimindo a R./recorrente qualquer elemento apto a questionar a credibilidade probatória que lhes foi conferida.
Termos em que, sem mais considerações, julga-se improcedente a impugnação quanto ao ponto fáctico em apreço.
*
Da inclusão dos factos invocados pela R./Recorrente no elenco dos factos provados[52].
Está em causa a matéria alegada nos arts. 28º, 29º, 30º, 31º, 32º, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 43º, 45º, 46º, 71º, 72º, 73º, 97º, 98º, 99º, 103º, 122º, 129º, 174º, 180º, 181º, 182º, 203º e 226º do articulado de contestação/reconvenção da Ré/Apelante.

Quanto à matéria alegada nos arts. 28º, 29º, 30º, 31º, 32º, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 43º, 45º e 46º da contestação, a R./Recorrente pretende vê-la considerada como provada com base nos seguintes elementos de prova:

a) Documentos n.ºs ... a ...4, juntos com a petição inicial;
b) Documentos n.ºs ...0 a ...3 juntos com a contestação com reconvenção;
c) “certidões emitidas pela Câmara Municipal ..., e insertas (…) nos autos nas seguintes datas, em 12 de Abril de 2019 – e comunicada à Ré/Apelante com a referência citius ...35 de 15 de Maio de 2019 (informação técnica – Anexo 3) e ainda com data de 21/05/2019 com a referência citius ...29 de 31/05/2019”;
d) Depoimento de parte do R. BB “e que se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio das 14h:08:54 a 14h.35.29”.

Relativamente a este último meio probatório, conclui-se pela sua ineficácia, na medida em que, pelas razões supra explicitadas, a recorrente não observou o ónus de localização das passagens gravadas erigidas como relevantes para fundar a alteração das respostas em apreço.

Quanto ao mais, dir-se-á:
i) Quanto ao teor dos arts. 28.º a 39.º da contestação/reconvenção:
A matéria alegada em tais artigos – como bem refere, nas contra-alegações, o A./recorrido – diz respeito ao conhecimento, por parte do A./Recorrido, do estado em que o imóvel se encontrava na data em que o adquiriu à R./Recorrente, nomeadamente “no estado de inacabado e totalmente em bruto”.
Sucede que a matéria em questão mostra-se já refletida na factualidade dada como provada, nomeadamente:
a) Dos factos provados sob as als. o) a kk), resulta a descrição circunstanciada sobre o estado em que o imóvel se encontrava à data da sua venda, referindo, entre o mais, a este respeito, que o mesmo “se encontrava, sem condições de habitabilidade, com paredes, telhado, estrutura de betão construída pela Ré, R...”, “tendo o preço acordado reflectido essa circunstância, ou seja, a necessidade de o comprador de terminar a sua construção”;
b) Do facto provado sob a al. xxx) foi considerado demonstrado que as obras de reconstrução da estrutura da casa, realizadas antes de 19/11/2014, foram executadas a mando da Ré/recorrente, sem a orientação de qualquer projecto, e ao abrigo do processo de licenciamento de obras nº ...8, ao abrigo do qual foi emitido o Alvará de Licença de Construção n.º ...9, em 01.09.2009, registado na Câmara Municipal ... em nome da Ré, R..., Lda;
c) Do facto provado sob a al. bbbb) decorre que, cerca de 3 meses após a dita aquisição, o A./Recorrido continuou as obras de construção da casa;
d) O facto de a construção do imóvel não se encontrar finalizada, faltando-lhe realizar alguns acabamentos, foi, aliás, expressamente reconhecido pelo A./Recorrido no art. 9.º da petição inicial;
É, por isso de secundar a conclusão produzida pelo A./recorrido no sentido de a referida facticidade ser “matéria manifestamente redundante, repetitiva e inútil à boa decisão da causa”, donde seja de excluir a sua inclusão no elenco dos factos provados.
ii) Matéria alegada nos arts. 43.º, 45.º e 46.º da contestação/reconvenção:
Trata-se de matéria atinente ao preço pelo qual a R./Recorrente anunciou a venda do imóvel.
Nesta parte, ao contrário do propugnado pela R./recorrente, o Tribunal “a quo” foi categórico ao incluí-los no elenco de factos não provados (arts. “43.º a 49.º” da contestação apresentada pela R./Recorrente).
Sucede que a R./Recorrente não indica quais os meios probatórios produzidos nos autos que impunham a sua inclusão no rol dos factos provados, acrescentando-se que o indicado doc. ...4 junto com a petição inicial não permite de modo algum alicerçar a demonstração da facticidade incluída naquelas alíneas.
Donde seja de manter inalterada a resposta de não provado conferida pelo Tribunal “a quo” a tais pontos fácticos impugnados.
iii) Matéria alegada nos arts. 71º, 72º e 73º da contestação/reconvenção:
A mencionada factualidade relaciona-se com o crédito contraído pelo A./Recorrido junto do Banco 1..., S.A., para a construção do dito imóvel, destinado à habitação própria permanente[53].
Sucede, porém, que a referida facticidade é totalmente irrelevante e inútil para a discussão da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, sendo certo tratar-se de mera matéria impugnatória, pelo que é de manter a decisão do Tribunal recorrido no sentido de não incluir a matéria alegada nos artigos 71.º, 72.º e 73.º da contestação no elenco dos factos provados.
iv) Matéria alegada nos arts. 97.º, 98.º, 99.º, 103.º, 122.º, 129.º, 174.º, 181.º, 182.º, 203.º e 226.º da contestação:
Quanto aos arts. 97.º a 99.º e 129.º da contestação, tratando-se de matéria referente às intervenções realizadas pelo A./Recorrido no imóvel após a sua aquisição, o que releva é a matéria vertida na al. xxx) dos factos provados [remete-se para as considerações expendidas no item i) a respeito dos arts. 28.º a 39.º da contestação/reconvenção].
O art. 103.º da contestação corporiza um mero juízo opinativo/especulativo, sendo certo que a R./recorrente tão pouco invoca qualquer elemento probatório que permita fundar a sua inclusão no elenco dos factos provados.
A materialidade inserta no art. 122.º da contestação/reconvenção – “Quanto a chaminé da sala do primeiro piso, cumpre dizer que ela se encontra prevista no aditamento ao projecto inicial, e é um tipo de chaminé estrutural, como era utilizado naquele tipo de casas seculares” – não foi objeto de omissão de pronúncia pelo Tribunal “a quo”, tendo antes merecido a resposta de não provado (arts. “122º a 125º”)
Também nesta parte, a R./recorrente não indica quais os concretos meios probatórios que, na sua óptica, imponham decisão sobre aquele ponto da matéria de facto impugnado diversa da recorrida.
De todo o modo, do relatório pericial junto aos autos, a respeito do quesito 59, ponto iv., resulta que[54]:
A chaminé existente no meio da sala está prevista no projeto de arquitetura, mas não está prevista no projeto de estruturas, pelo que em projeto não foi considerado como elemento de suporte da laje de teto da sala.
Como a chaminé está construída até à laje de teto da sala, e a deformação a longo prazo da laje construída é de cerca de 4,5cm (tabela 1), a chaminé vai acabar por dar apoio à laje, porque a laje não é livre de se deformar.
Assim, é verdadeira a afirmação do quesito que a resistência deveria ser assegurada exclusivamente pela laje e a chaminé deveria ser um mero elemento decorativo”.
Acrescenta o relatório pericial[55]: “Qualquer elemento estrutural tem de estar especificado no projeto de estruturas, e o termo de responsabilidade do projetista tem de o englobar, cumprindo-se assim a legislação em vigor. Como a chaminé não está no projeto de estruturas não é considerado como elemento estrutural. A consideração de uma chaminé em pedra como elemento estrutural teria de ter a aprovação do projetista de estruturas, teria de haver registo da alteração no livro de obra, teria de haver desenhos do projetista a evidenciar a alteração, e teriam de ser entregues na Câmara Municipal. Relativamente à necessidade de fundação (cimentação) teria de ser o projetista a definir essa necessidade. Relativamente a “Uma vez que o solo é pedra não tem deformação”, a questão é que não se pode colocar a chaminé em pedra sobre o solo de rocha e dizer que é um elemento estrutural, desprezando toda a regulamentação existente”.
E, no âmbito dos esclarecimentos prestados pelo sr. Perito em sede de audiência de julgamento, confirmou este que a chaminé “não faz parte do projeto de estruturas atual, portanto a chaminé não é um elemento estrutural no projeto de estruturas que está na Câmara (…) o projeto de estruturas não contempla esse elemento chaminé como elemento estrutural, que é aquilo que eu digo, qualquer elemento estrutural tem de estar especificado no projeto de estruturas (…) como não faz parte do projeto de estruturas, não é um elemento estrutural até à data”.
Termos em que se conclui pela improcedência da impugnação deduzida quanto ao referido ponto fáctico, sendo, em contrapartida, de confirmar a resposta à matéria constante dos factos provados sob as als. uu) a ww).
Art. 174.º da contestação/reconvenção:
Trata-se de um mero juízo valorativo/opinativo, que deve estar excluído da selecção da matéria de facto, quer provada, como não provada.
Arts. 180.º a 182.º da contestação/reconvenção:
Afora a materialidade objeto do art. 180º, a restante traduz matéria meramente valorativa/opinativa, pelo que é de excluir a sua inclusão no elenco dos factos provados (bem como do rol dos factos não provados).
Por referência ao doc. ...3 junto com a petição inicial, e no tocante ao art. 180.º da contestação/reconvenção, adita-se à matéria de facto provada o seguinte facto:
e-A) A Ré R..., Lda respondeu à missiva aludida na al. d) através da carta datada de 14/10/2016, cuja cópia consta de fls. 228 v.º a 230.
*
 Art. 203.º da contestação/reconvenção:
- O referido facto consta do elenco dos factos não provados constante da sentença recorrida, inexistindo, por conseguinte, omissão de pronúncia quanto à referida facticidade.
- A referida matéria (o preço não foi exorbitante) é manifestamente conclusiva e valorativa, o que exclui desde logo a sua inclusão no rol dos factos provados;
- A R./Recorrente não indicou qualquer meio probatório que fundamente a impugnação do facto em questão e a imposição de uma interpretação distinta da firmada pelo Tribunal recorrido.
Termos em que improcede a referida pretensão impugnatória.
Art. 226.º da contestação/reconvenção:
Releva tão só a matéria constante das als. o) a kk) dos factos provados.
*
5. Da impugnação da decisão da matéria de facto deduzida pelo recorrente subordinado, AA.
i) - Da inclusão no elenco dos factos provados dos defeitos, vícios e desconformidades invocados sob os pontos xii., xiii., xiv. do art. 59.º da petição inicial, bem como nas alíneas (iii) e (v) do art. 111.º da petição inicial[56].
Ao quesito 59/xii “nem no acabamento, nem na soleira foi aplicado o isolamento térmico previsto no projeto”, o relatório pericial respondeu afirmando que o “projeto previa a colocação de isolamento térmico de 5cm entre as duas paredes (imagem 9), mas não se verifica a colocação desse isolamento em obra [57].
Decorre igualmente do relatório pericial que “No projeto estava prevista uma piscina em betão armado conforme imagem 10 e 11[58].
E que, “[n]o documento ...6 observa-se a montagem de uma piscina em betão armado sobre uma parede de betão com skimmers já incorporados na 1º parede em betão simples. De facto, a parede em betão simples não serviria para estrutura da piscina, dai ser necessário a execução de uma parede com armaduras de modo a ter a resistência necessária”, sendo que a “escavação em rocha não altera a necessidade de existir um elemento com capacidade resistente para absorver as forças. A necessidade da estrutura em betão armado em legislação e estava prevista no projeto conforme extrato na imagem 11”[59].
Mais consta do relatório pericial que, “[p]ela foto 17, (foto do documento ...6 da Petição inicial) observa-se que os skimmers já se encontravam instalados na primeira parede em simples, o que denuncia que esta parede seria a parede estrutural final, porque se estivesse previsto a execução de uma segunda parede em betão armado, os skimmers seriam instalados na segunda parede e não na primeira. Na foto 27 observam-se os segundos skimmers instalados à face do segundo muro em betão armado”[60].
Resulta também do relatório pericial que “existem dois muros exteriores distintos, o muro exterior que delimita a propriedade e a via pública e o muro exterior que delimita a propriedade do autor e o vizinho a nascente.
O muro que delimita a propriedade do Autor e a via pública é um muro de pedra que apresenta escorrimento de água vinda do lado do solo suportado (foto 13), pelo que não deverá ter um dreno de drenagem de águas infiltradas.
Aparentemente o muro tem um especto normal, mas não podemos desprezar o escorrimento de água que com o tempo será um problema. Porque com os anos, a percolação da água acaba por arrastar partículas de solo para muro, tornando-o impermeável. Quando isso acontecer o muro terá que suportar o impulso das terras e o impulso da água no solo. Nessa altura o muro não vai ter capacidade resistente de suporte e inevitavelmente cairá[61].
Mais se refere que, “[r]elativamente ao muro exterior que delimita a propriedade do Autor e o vizinho a nascente, este apresenta um especto muito tosco com pouca confiança quanto à sua estabilidade (foto 16)[62].
Sendo assim, e considerando que tais danos e desconformidades têm relevância para a decisão da causa – segundo os possíveis enquadramentos jurídicos do objeto da acção –, mormente para que possam ser igualmente tidos em conta para efeitos de determinação do valor da redução do preço, com base no teor do aludido relatório pericial – atribuindo-lhe para o efeito a mesma relevância e credibilidade probatória conferida pelo Exmo. Julgador da 1ª Instância –, dão-se como provados os seguintes factos:
- eeee) Nem no acabamento, nem na soleira foi aplicado o isolamento térmico previsto no projeto.
- ffff) No projeto estava prevista uma piscina em betão armado, mas foi construída uma piscina em betão simples.
- gggg) O muro que delimita o prédio referido em a) não possui drenos de drenagem de águas infiltradas.
- hhhh) O muro que delimita o prédio referido em a) a nascente apresenta um aspecto tosco com pouca confiança quanto à sua estabilidade.
*
ii) - Da inclusão no elenco dos factos provados de alguns dos defeitos, desconformidades e vícios[63]:
a) Diversamente do propugnado pelo A./recorrente, o defeito invocado no art. 111.º, alínea (iii) da petição inicial – “A bordadura do telhado do rés-do-chão está mal isolada e filtra água pelas telhas quando chove, o que provoca humidade na parede, que acaba por passar para o interior da casa – cf. Documento n.º 29 - ...) que adiante se junta e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos” – não se mostra demonstrado nos precisos termos alegados, resultando tão só demonstrada a verificação do “escorrimento de água pelo beirado (foto 18 a 20)[64].
b) O defeito invocado no art. 111.º, alínea (v) da petição inicial – “No terraço da parte superior da casa que comunica com a cozinha, constata-se que a divisão não está bem isolada, o que provoca infiltrações de água e sinais claros de humidade – cf. Documento n.º ...9 – D) e) que adiante se junta e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos” –, resulta demonstrado no relatório pericial, no qual se atestou: “Verifica-se que o problema se mantém (foto 22 e 23)”[65].
Pelo exposto, porque com relevância para a decisão da causa, nomeadamente para que possam ser igualmente tidos em conta para efeitos de determinação do valor da redução do preço, ao elenco dos factos provados aditam-se os seguintes pontos de facto:
iiii) Verifica-se o escorrimento de água pelo beirado.
jjjj) No terraço da parte superior da casa que comunica com a cozinha a divisão não está bem isolada, o que provoca infiltrações de água e humidade.
*
iii) - arts. 85.º a 88.º da petição inicial.
A materialidade fáctica alegada nos referidos artigos reporta-se às consequências danosas dos defeitos e desconformidades de que padece o imóvel adquirido à ré.
Embora alguns dos referidos danos tenham sido dados como provados [cfr. alíneas cccc) e lll) a www) dos factos provados], defende o A./recorrente que existem meios probatórios que impunham que alguns dos danos que não foram incluídos pelo Tribunal “a quo” no elenco dos factos provados fossem, efetivamente, dados como provados.
Tais factos foram, de facto, objeto de confirmação pelo A./Recorrente, em sede de declarações de parte, que referiu não ter quaisquer móveis no salão, uma vez que tudo o que seja têxtil (por ex., roupa) e/ou de madeira se estraga, face aos elevados níveis de humidade.
Mais referiu que os rodapés estão completamente destruídos/despegados e com fungos e que os desumidificadores estão ligados praticamente todos os dias do ano (embora delimitado ao inverno), 24 horas por dia.
Essa situação foi confirmada pela testemunha LL, que vive em união de facto com o A./recorrente e reside no imóvel objeto dos autos desde finais de 2015, que referiu que a humidade que se faz sentir na casa provoca variados danos na roupa, bem como nos demais móveis, nas paredes da casa, nos rodapés e nos sofás.
Pelo exposto, por referência aos indicados meios de prova impõe-se a alteração das respostas de não provado aos mencionados pontos fácticos, dando-se como provado que:
kkkk) Os níveis de humidade na casa provocam danos nos móveis e roupa.
llll) No inverno, o A./Recorrente tem de ter desumidificadores na casa ligados 24h por dia.
*
iv) - Sustenta o A./recorrente que, relativamente ainda aos defeitos, vícios e desconformidades, o Tribunal “a quo”, certamente por lapso, não fez referência, no elenco da factualidade dada como provada, ao momento em que o A./Recorrente tomou conhecimento da existência dos mesmos, acrescentado que tal matéria resultou manifestamente demonstrada, em virtude da prova produzida nos autos.
Por referência aos arts. 56.º a 61.º da petição inicial constata-se que o A./Recorrente alegou que, não tendo qualquer formação ou experiência na área da construção civil, começou a suspeitar da existência de defeitos, desconformidades e vícios no imóvel adquirido, pelo que resolveu solicitar a uma empresa especializada na área de construção civil (a E...) que analisasse o estado da construção da moradia que adquiriu à R./Recorrida, verificando se a mesma padecia de algum vício de construção ou qualquer outro defeito e que elaborasse o relatório pericial correspondente, o que veio a ser confirmado no referido relatório pericial, que corresponde ao doc. ...2 junto com a petição inicial[66].
E, na réplica, em resposta à exceção de caducidade dos direitos invocados pelo A./recorrido, alegou que, conforme resultado teor do doc. ...2 junto com a petição inicial, apenas teve conhecimento do teor do referido relatório pericial em 14/12/2015, data em que tomou efetivamente conhecimento das desconformidades existentes na moradia (art. 80.º desse articulado).
Observado que se mostra o ónus de alegação, vejamos agora se o A./recorrente cumpriu o ónus probatório dessa facticidade.
Com relevo, resulta dos autos que:
i) O referido relatório elaborado pela E... foi junto aos autos como Documento n.º ...2 da petição inicial, estando datado de 14/12/2015[67].
ii) Em sede de depoimento e declarações de parte do A./Recorrente, referiu este que começou a habitar o imóvel (“a casa”) em meados/finais do ano de 2015 e que nessa altura começou a aperceber-se de que o mesmo padecia de defeitos, em consequência das humidades que começavam a ser visíveis (a piscina não estava impermeabilizada). De seguida, contratou técnicos especializados para avaliarem a qualidade da construção, tendo sido esses técnicos que o informaram de que a casa padecia de defeitos, desconformidades e vícios ocultos, o que ocorreu ainda em finais de 2015 (depois de já lá estar a viver).
iii) A testemunha LL, que vive em união de facto com o A./recorrente, com quem reside no mencionado imóvel, referiu que foi viver para a casa em finais de 2015 e que só depois de aí começar a viver é que teve conhecimento dos defeitos;
iv) A testemunha KK, engenheiro técnico industrial, chefe do departamento de verificação da E..., confirmou ter participado na realização dos ensaios, bem como na elaboração do relatório de 14/12/2015 sobre esta moradia (Documento n.º ...2 da petição inicial), a pedido do A./Recorrente.
v) Por fim, a R./Recorrida, nas alegações do recurso de apelação que apresentou nos presentes autos[68], afirma especificamente que, “como se pode verificar pelo Documento n.º ...2 junto com a petição inicial, o A/Apelado tinha na sua posse o relatório pericial da empresa E..., pelo menos desde o dia .../.../2015, como de resto foi confirmado sem sede de julgamento pela testemunha KK– Conforme se estrai do seu depoimento que se encontra gravado no sistema Habilus Media Studio com início as 10h12:13 e términs às 11:15:10”.
Tendo, pois, como suporte os indicados meios probatórios e a própria posição assumida pela R./Recorrida, resulta demonstrado que o A./Recorrente apenas teve efectivo conhecimento de que o imóvel que adquiriu à R./Recorrida padecia de vícios, desconformidades e defeitos ocultos através do relatório elaborado pela E..., em 14/12/2015.
Nesta conformidade, deferindo a apontada impugnação, adita-se ao elenco dos factos provados o seguinte ponto de facto:
mmmm) O A./Recorrente teve conhecimento de que o imóvel padecia de vícios, desconformidades e defeitos ocultos em 14/12/2015, através do relatório pericial realizado pela sociedade E..., S.A.
*
v) - Da inclusão no elenco dos factos provados dos factos incluídos nos artigos 56.º a 58.º da petição inicial.
Como já vimos, na petição inicial o A./Recorrente alegou que, após ter começado a suspeitar da existência de defeitos, desconformidades e vícios no imóvel adquirido, “resolveu solicitar a uma empresa especializada na área de construção civil (a “E..., S.A.”) que analisasse o estado da construção da moradia que adquiriu à R..., verificando se a mesma padecia de algum vício de construção ou qualquer outro defeito e que elaborasse o relatório pericial correspondente”, “relatório pericial esse que foi efetivamente elaborado pela E...” e que  corresponde ao Documento n.º ...2 junto com a petição inicial (arts. 56.º e 57.º da petição inicial).
Mais alegou, no art. 58.º da petição inicial, que o “custo dessa análise e relatório periciais ascendeu a € 7.389,47, como se constata pela fatura que adiante se junta como documento n.º ...3 e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos”.

Da prova documental e testemunhal produzida nos autos resulta que:
i) O relatório elaborado pela sociedade E... foi junto aos autos, correspondendo ao Documento n.º ...2 anexo à petição inicial[69];
ii) A testemunha KK, engenheiro técnico industrial, chefe do departamento de verificação da E..., confirmou ter participado na realização dos ensaios, bem como na elaboração do relatório, a pedido do A./Recorrente;
iii) Como documento n.º ...3 junto com a petição inicial foi junta aos autos a fatura emitida pela E... ao A./Recorrente, pela elaboração do dito relatório (de estudo de viabilidade estrutural em vivenda unifamiliar ..., freguesia ..., concelho ..., Portugal), no valor de € 7.389,47[70].
Os referidos elementos probatórios são aptos à procedência da impugnação da matéria de facto deduzida, motivo por que se dá como provado que:
nnnn) O Autor solicitou à “E..., S.A.” que analisasse o estado da construção da moradia que adquiriu à Ré R..., para verificar se a mesma padecia de algum vício de construção ou qualquer outro defeito e que elaborasse o relatório pericial correspondente.
oooo) A “E..., S.A.” elaborou o relatório pericial junto como Documento n.º ...2 da petição inicial.
pppp) O custo do relatório referido em oooo) ascendeu a € 7.389,47.
*
6. Face às alterações introduzidas na decisão relativa à matéria de facto, é a seguinte a factualidade (provada) a atender para efeito da decisão a proferir:
a) Por acordo redigido a escrito em 19 de Novembro de 2014, e autenticado por termo, a sociedade R..., Lda., representada pela sócia-gerente CC, declarou vender, e AA declarou comprar, pelo preço de 150.000,00, o prédio misto, composto por casa de rés-do-chão, com dependência, coberto aberto, rossio, espigueiro, eira e terreno de pastagem, sito em ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...97-..., registado a favor da parte vendedora, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...3º, da freguesia ..., e na matriz predial rústica sob o artigo ...59º, da mesma freguesia, conforme se retira da cópia junta aos autos de fls. 53v a 57 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
b) BB e CC, como primeiros outorgantes, e AA, como segundo outorgante, celebraram, por escrito, em 19 de Novembro de 2014, o acordo que apelidaram de contrato de confissão de dívida, nos termos do qual este se confessou devedor àqueles da quantia de € 121.000,00, cuja cópia se encontra junta aos autos de fls. 58v a 59 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
c) Em 09.12.2015, o Autor recebeu a missiva, enviada pelos Réus BB e CC, cuja cópia se encontra junta aos autos de fls. 9v a 12 do apenso A e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido
d) Em 04.10.2016, a Ré R..., Lda. recebeu a missiva, enviada pelo Autor, AA, cuja cópia se encontra junta aos autos de fls. 212v a 215 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
e) Em 04.10.2016, os Réus BB e CC receberam a missiva, enviada pelo Autor, AA, cuja cópia se encontra junta aos autos de fls. 216 a 219 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
e-A) A Ré R..., Lda respondeu à missiva aludida na al. d) através da carta datada de 14/10/2016, cuja cópia consta de fls. 228 v.º a 230.
f) Os Réus BB e CC são sócios da sociedade R..., Lda., dedicando-se esta à actividade de compra, reconstrução e venda de bens imobiliários, conforme se retira da cópia da certidão permanente junta aos autos de fls. 46v a 47 e da informação com a referência nº ...26, cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos;
g) Apesar de terem declarado no título referido em a) que o preço a pagar pela venda do imóvel aí descrito seria de € 150.000,00, as partes contratantes – AA e R... - acordaram que o preço a pagar seria de € 271.000,00;
h) E, por isso, celebraram e assinaram o acordo descrito em b);
i) Não tendo os Réus BB e CC entregado ao Autor a quantia que surge mencionada no título descrito em b);
j)  Pretendendo as partes, com tal acordo, descrito em b), acordar quanto ao valor do preço que faltava pagar, a forma e o tempo de pagamento, tendo  por referência o valor global acordado de compra e venda do imóvel descrito em a) de € 271.000,00;
k) E, declarando o que declararam no título descrito em a), evitar o pagamento de imposto devido à Fazenda Nacional, sobre a parcela do valor acordado para lá do declarado;
l) O Autor AA pretendeu e utiliza o imóvel descrito em a) como sua residência;
m) A negociação entre as partes e que antecedeu a celebração dos acordos descritos em a) e b) durou cerca de um ano;
n) Tendo o Autor AA visitado o imóvel várias vezes;
o) O prédio foi vendido com a casa no estado em que se encontrava, sem condições de habitabilidade, com paredes, telhado, estrutura de betão construída pela Ré, R..., e outros elementos que infra se aludirão, tendo o preço acordado reflectido essa circunstância, ou seja, a necessidade de o comprador de terminar a sua construção;
p) Quando foi celebrado o acordo descrito em a), a casa de habitação existente no prédio aí descrito, não tinha janelas, portas, isolamento térmico e sistema de aquecimento de águas de banho;
q) Faltava colocar as caleiras e o rufo em volta da chaminé;
r) Faltava impermeabilizar pelo interior as paredes exteriores (por serem de pedra seca);
s) Faltava colocar toda a caixilharia exterior, nomeadamente, aros, portas e janelas;
t) Faltava colocar os dois portões de entrada exteriores;
u) Faltava executar a carpintaria interior e exterior, nomeadamente, aros guarnições, portas, contras em madeira, apainelados, roupeiros, soalho e rodapés;
v) Faltava colocar os móveis de cozinha e os móveis das casas de banho; w)    Faltava acabar e revestir as escadas a madeira;
x) Faltava executar partes de pichelaria, nomeadamente, o esgoto no interior dos wc e faltava instalar as redes de água quente, rede de água fria, aplicação de louças e torneiras;
y) Faltava instalar as máquinas terminais do aquecimento central;
z) Faltava revestir o piso e as paredes das casas-de-banho;
aa) Faltava revestir o piso da cozinha, sendo que as paredes estavam rebocadas com cal e cimento;
bb) As restantes paredes da casa estavam rebocadas com cal e cimento;
cc) Faltava fazer todos os tectos;
dd) Quanto à parte eléctrica já estavam instalados os tubos onde posteriormente seriam colocados os cabos eléctricos, sendo que estes não estavam instalados;
ee) No pavimento do rés-do-chão faltava o revestimento final pois só tinha a caixa e a betonilha;
ff) As escadas encontravam-se em betão;
gg) O pavimento do primeiro andar encontrava-se em cimento;
hh) Encontrava-se construída/escavada uma cavidade destinada a piscina em betão;
ii) Faltava a pintura interior;
jj) Faltava executar a calçada exterior em cubo;
kk) Na data referida em a), a estrutura em betão da casa existente no prédio aí mencionado já estava construída;
ll) A resistência do betão das vigas é de 35,5% da prevista no projecto;
mm) A resistência do betão da sapata é de 90,5% da prevista no projecto;
nn) Para a presente estrutura, o betão deve ter uma classificação de classe de exposição ambiental no mínimo de XC1 (Quadro 1 da norma NP EN 206-1), e esta classificação obriga e um recobrimento mínimo de 2 cm (recobrimento é a distância da armadura à superfície de betão), sendo que este recobrimento é a profundidade máxima aceitável que a carbonatação deve atingir ao fim dos 50 anos previsto na norma;
oo) No caso do betão utilizado na construção em causa, a carbonatação atinge a profundidade de 6,3 centímetros (o limite é de 2 centímetros);
pp) E as armaduras apresentam corrosão devido à carbonatação do betão, corrosão que não deveria acontecer até aos 50 anos previstos na norma supra-referida;
qq) A laje existente e instalada na sala apresenta os seguintes valores quando comparados com os valores previstos no projecto:

Previsto no projecto   Instalada em obra      Unidades
Resistência aos momentos flectores (Msd)  83,15   45,8     KN.m
Resistência ao esforço transverso (Vsd)      47,62   44,4     KN
Momento de formação de fendas (Mfctk)    60,70   25,7     KN.m
Rigidez de flexão (EI) 26971  13635  KN.m2
Deformação de longo prazo  2,6       4,5       Cm
Número de ferros inferiores da vigota          6          4         
rr) Em face destes valores, a laje não cumpre os coeficientes de segurança exigidos pelas normas aplicáveis;
ss) A direcção da vigota na laje do alpendre não corresponde à prevista no projecto, uma vez que no projecto a laje do alpendre apoia-se no pórtico 3 e na parede de pedra da casa, enquanto que a laje existente em obra foi rodada, passando a apoiar-se nos pórticos 5 e 6, conforme imagem 3 da  página 9, do relatório pericial junto aos autos de fls. 1214 a 1253 (referência nº ...33);
tt) Os pórticos 5 e 6 não têm resistência para suportar esta laje, uma vez que não foram dimensionados para uma função de suporte, mas para travamento da laje;
uu) A chaminé existente no meio da sala está prevista no projecto de arquitectura, mas não está prevista no projecto de estruturas, pelo que em projecto não foi considerada como elemento de suporte da laje do tecto da sala;
vv) Como a chaminé está construída até à laje do tecto da sala e a deformação a longo prazo da laje construída é de cerca de 4, 5 cm, a chaminé vai acabar por dar apoio à laje, porque esta não está livre de se deformar;
ww) No entanto, como a chaminé não possui fundação (cimentação) para transmitir a carga ao solo, deveria ser um mero elemento decorativo, e não estrutural, porque em projecto não foi considerada como elemento de suporte da laje do tecto da sala;
xx) No projecto, a laje inclinada de cobertura tem uma espessura de 20 cm e em obra tem uma espessura de 13 cm;
yy) No projecto os pilares do alpendre estão previstos com a secção quadrada de 40x40cm, e em obra um dos pilares (P6) é circular com o diâmetro de 20 cm;
zz) A resistência do betão do pilar P6 é de 7,1 MPa, sendo este um valor de resistência inferior ao valor de resistência prevista no projecto que é de 20 MPa;
aaa) No projecto a viga do alpendre tem dimensões 20x45, correspondendo a 20cm de largura e 45cm de altura, sendo que em obra a viga tem a dimensão de 20x40cm, tendo a viga, portanto, menos 5 cm de altura em obra do que o previsto no projecto;
bbb) A viga e a laje foram fundidas em alturas distintas e pelas fissuras inclinadas na junta (fissuras de esforço de corte) verifica-se que não existem elementos de ligação entre a viga e a laje, originando a fissura entre os dois elementos, verificando-se, igualmente, que não foi executada conforme o projecto, uma vez que estava prevista a sua execução monolítica;
ccc) A carbonatação nas vigas do alpendre atinge a profundidade máxima de 6,3 cm, sendo que o recobrimento para esta estrutura não devia ir para além de 2 cm;
ddd) A viga “V+1” (pórtico 5 do projecto) tem uma armadura inferior com dois ferros de 10 mm;
eee) No entanto, como no projecto o pórtico 5 foi dimensionado sem a função de suporte da laje e neste momento está a suportar a laje, as armaduras são insuficientes para a nova função (deveriam ter sido objecto de redimensionamento, necessitando de, pelo menos, dois ferros de 16mm e de um de 12mm), não cumprindo as exigências de segurança;
fff) O projecto prevê para o pilar P6 uma sapata com 0.6mx1,3m e 60 cm de altura, para o pilar P5 uma sapata com 0.95x0.95 com 60 cm de altura, e uma viga de fundação entre as sapatas dos pilares P5 e P6, sendo que no projecto, estes elementos têm armaduras;
ggg) Em obra, apenas se observa um bolbo de betão com cerca de 1,1m, a fundação do pilar não existe conforme previsto no projecto e não tem armaduras, sendo que a resistência do betão utilizada ascende a 18,1 MPa, enquanto que no projecto se prevê uma resistência de 20 MPa;
hhh) Relativamente à fundação C2, no projecto a drenagem está prevista abaixo da cota do piso de rés-do-chão, de modo a recolher as águas que surjam do solo, prevendo-se, igualmente, uma caixa de brita envolvida em geotêxtil de modo a encaminhar as águas do solo rapidamente para o dreno para que a água nunca fique numa cota superior à cota do dreno, mantendo a parede sem humidade;
iii) Em obra, o dreno foi instalado a cerca de 1 metro acima da cota do pavimento, levando a que o solo abaixo da cota do dreno não seja drenado e colocando a parede em contacto com a humidade do solo;
jjj) Como a parede não foi impermeabilizada, não existe nenhum elemento a impedir a água de entrar na parede de pedra;
kkk) Consequentemente, verifica-se a existência de humidade na parede, infiltrações de água no interior da habitação sob a forma de eflorescências e danos no reboco e nos rodapés;
lll) Bem como a existência de um teor elevado de humidade no ar dentro da habitação e alguns fungos nas zonas interiores da parede de pedra;
mmm) A estrutura exterior da casa (paredes) foi construída com uma parede de pedra no lado exterior, uma caixa de ar e uma parede de tijolo pelo lado interior;
nnn) Foi colocado um plástico transparente sob a base da parede de tijolo e um plástico preto sob o pavimento térreo;
ooo) O tipo e a forma como os elementos estão colocados não é eficaz para isolar as paredes de humidades porque se trata de materiais frágeis, pouco duráveis e sem estanqueidade nas juntas de sobreposição
ppp) Também não existe qualquer isolamento para impedir a passagem da humidade da parede exterior em pedra para a parede interior em tijolo, porque como o tijolo é um material poroso, transmite essa humidade para o ar interior da sala;
qqq) No prédio existem dois muros exteriores: um que delimita a propriedade da via pública; outro que delimita o prédio do Autor com a prédio do vizinho a nascente;
rrr) Estes muros estão previstos no projecto de arranjos exteriores, onde está prevista a sua reconstrução em alvenaria de granito;
sss) À data referida em a), os referidos muros não tinham sido objecto de qualquer intervenção;
ttt) A supra-referida corrosão das armaduras implica uma diminuição da capacidade de resistência dos elementos, uma menor durabilidade e a necessidade de realização de uma reparação a curto prazo de forma a repor a segurança;
uuu) No tecto do primeiro piso existem dois pontos de humidade com origem no telhado: um no tecto do quarto; outro, no tecto do corredor;
vvv) O pavimento da casa das máquinas tem pendente contrária à grelha de drenagem, acumulando água no seu interior;
www) Existe infiltração de água no tecto da casa das máquinas;
xxx) A reconstrução da estrutura da casa, realizada antes da data referida em a), foi executada por HH, contratado pela Ré R..., tendo aquele iniciado as obras sem a orientação de qualquer projecto, e ao abrigo do processo de licenciamento de obras nº ...8, ao abrigo do qual foi emitido o Alvará de Licença de Construção nº ...9, em 01.09.2009, registado na Câmara Municipal ... em nome da Ré, R..., Lda.;
yyy) O Réu DD não teve qualquer intervenção na construção da casa existente no prédio referido em a);
zzz) O Réu DD emprestou o seu alvará de empreiteiro à Ré R... para que esta procedesse às obras na casa existente no prédio supra-referido;
aaaa) A casa existente no prédio referido em a), esteve sem janelas e portas, cerca de um ano antes data do negócio aí referido;
bbbb) O Autor continuou as obras de construção da casa cerca de 3 meses depois da data referida em a);
cccc) O Autor tem sofrido transtornos e desgosto por ter humidades, acumulações de água e fungos em casa, não conseguindo usufruir da habitação de forma total e sem condicionamentos;
dddd) Para reparar e corrigir as situações elencadas de ll) a www), a casa deverá ser esvaziada e durante as obras não poderá ser habitada.
- eeee) Nem no acabamento, nem na soleira foi aplicado o isolamento térmico previsto no projeto.
- ffff) No projeto estava prevista uma piscina em betão armado, mas foi construída uma piscina em betão simples.
- gggg) O muro que delimita o prédio referido em a) não possui drenos de drenagem de águas infiltradas.
- hhhh) O muro que delimita o prédio referido em a) a nascente apresenta um aspecto tosco com pouca confiança quanto à sua estabilidade.
iiii) Verifica-se o escorrimento de água pelo beirado.
jjjj) No terraço da parte superior da casa que comunica com a cozinha a divisão não está bem isolada, o que provoca infiltrações de água e humidade.
kkkk) Os níveis de humidade na casa provocam danos nos móveis e roupa.
llll) No inverno, o A./Recorrente tem de ter desumidificadores na casa ligados 24h por dia.
mmmm) O A./Recorrente teve conhecimento de que o imóvel padecia de vícios, desconformidades e defeitos ocultos em 14/12/2015, através do relatório pericial realizado pela sociedade E..., S.A.
nnnn) O Autor solicitou à “E..., S.A.” que analisasse o estado da construção da moradia que adquiriu à Ré R..., para verificar se a mesma padecia de algum vício de construção ou qualquer outro defeito e que elaborasse o relatório pericial correspondente.
oooo) A “E..., S.A.” elaborou o relatório pericial junto como Documento n.º ...2 da petição inicial.
pppp) O custo do relatório referido em oooo) ascendeu a € 7.389,47.

2 – Factos não provados

Dá-se como reproduzido o teor da menção enunciada na sentença recorrida, ressalvando-se os pontos fácticos impugnados cuja inclusão nos factos provados resultou da procedência da impugnação deduzida.
*
7. – Da reapreciação da matéria de direito.
7.1. Do recurso independente.
7.1.1. Da qualificação do contrato e do regime jurídico aplicável.

Na sentença recorrida foi, resumidamente, entendido que:
i) Entre o Autor e a Ré R..., Lda foi celebrado um contrato de compra e venda do prédio misto identificado nos autos, encontrando-se o mesmo sujeito à disciplina dos artigos 874º e seguintes do Código Civil;
ii) O Autor surge, na relação material controvertida, como um consumidor;
iii) A Ré/recorrente é, nos termos do disposto no artigo 1º - B, alínea c), do Decreto-Lei nº 67/2003, um vendedor;
iv) A relação estabelecida entre o Autor e a Ré sociedade é uma relação de consumo;
v) A tal conclusão não obsta a circunstância de a unidade predial adquirida pelo Autor, e descrita na Conservatória do Registo Predial competente como um prédio misto, ser constituída por um prédio inscrito na matriz predial como um artigo rústico e por um prédio inscrito nessa matriz como um artigo urbano, porquanto o Autor adquiriu a unidade predial em causa, toda ela, para nela habitar, sendo que a parte qualificada matricialmente como rústica está funcionalmente adstrita à moradia, como logradouro e espaço de lazer e, portanto, funcionalmente adstrita à parte qualificada como urbana;
vi) Aplicando-se o regime da venda de bens de consumo, designadamente o disposto nos arts. 5º, n.º 1, e 5º-A, do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, o adquirente beneficia (i) de um prazo de cinco anos para o conhecimento da desconformidade do objecto a contar da entrega, (ii) do prazo de um ano, a contar do conhecimento do defeito, para exercer o direito de denúncia e (iii) de um prazo de três anos, subsequente à denúncia, dentro do qual terá de ser instaurada a acção destinada a exercitar o direito à reparação ou eliminação dos defeitos.
vii) Tendo a transmissão ocorrido em 19.11.2014, a denúncia dos defeitos em 04.10.2016 e a propositura da acção em 22.03.2017, não resultou demonstrado o decurso de nenhum dos prazos assinalados, improcedendo a invocada excepção de caducidade.
viii) O art. 4.º do referido Dec. Lei n.º 67/2003, consagra os direitos conferidos ao consumidor que se depara com a falta de conformidade do bem com o contrato (bem defeituoso), sendo que, “a escolha pela forma como o adquirente da obra pretende ser ressarcido da falta de conformidade do bem com o contrato é livre, estando apenas limitada pela respectiva possibilidade prática e técnica e pelo respeito pelos princípios da boa fé e dos bons costumes e pela finalidade económico-social do direito escolhido enquanto corolários intrínsecos do abuso de direito, logo, inexistindo hierarquia no uso do meio que se tem por adequado o adquirente pode exigir logo a redução do preço em vez da redução dos defeitos”.
viii) “No nosso caso, a factualidade dada por provada permite satisfazer a primeira das pretensões formuladas pelo Autor – a redução do preço –, mas não com a extensão, nem nos valores pretendidos”;
g) A concretização do valor da redução do preço, para que possa ser formulado um juízo equitativo,  deverá fazer-se em razão da ponderação de  elementos como a possibilidade de reparação das patologias, o custo da respetiva reparação, a eventual desvalorização do imóvel em face dessas patologias, elementos esses relativamente aos quais o Tribunal “a quo” entendeu ser a matéria de facto escassa e que, por isso, remeteu para liquidação de sentença, nos termos do art. 609º, n.º 2, do CPC, com a advertência de que o valor da redução do preço daí resultante sempre deverá ser limitado “pelo valor do pedido concreto”.
Discordando do assim decidido, a R./recorrente aduz, em síntese, os seguintes argumentos:
a) Não “são aplicáveis ao caso concreto, os prazo[s] previstos na Lei da Defesa do Consumidor, Decreto-Lei 67/03, de 8 de Abril com as alterações da Lei 84/08 de 21 de Maio”, uma vez que estamos perante “um prédio misto, composto por artigo ...3º urbano e pelo artigo ...59º rústico, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...97 da freguesia ...”, e, “como tal, não pode ser considerado de forma automática, um bem de consumo”;
b) “Acresce que a Lei de Defesa do Consumidor, não pode ser aplicada ao caso concreto, porque estamos perante um prédio inacabado (…)”.
c) Estando-se “perante um contrato de compra e venda de bem imóvel - prédio misto -, o regime aplicável, não pode ser outro que não o previsto no Artigos 916º e 917º do Código Civil, e o disposto no Artigo 1225º do Código Civil”.
d) Consequentemente, o “A./Apelado só procede[u] à denúncia dos defeitos muito para além dos prazos, consignados no disposto no Artigo 917º do Código Civil”, pelo que, “na data em que o A./Apelado intentou a presente acção, já tinham caducados os seus direitos”, e;
e) Não “sendo a aplicável a Lei da Defesa do Consumidor, não podia o A./Apelante, partir sem mais para a escolha de forma discricionária e arbitrária, da redução do preço, muito menos nos moldes e valores em que o fez”, tendo, “sim, que obedecer à ordem escalonada dos direitos previstos no Artigo 917º do Código Civil, (…), o que não fez”.
f) O Tribunal “a quo” considerou aplicável o regime previsto na Lei da Defesa do Consumidor e, nessa conformidade, atendeu à escolha da redução do preço, olvidando-se, contudo, de aflorar e conhecer da questão do abuso do direito, arguida pelo R./Apelante.
Disto isto, vejamos o caso concreto.
Não está em causa a qualificação jurídica do contrato celebrado entre o A. e a Ré R..., Lda ao tipo legal do contrato de compra e venda, cujo regime vem legalmente consagrado e regulado nos arts. 874º e seguintes do CC.
De facto, mostra-se provado que, por acordo redigido a escrito em 19 de Novembro de 2014 e autenticado por termo, a sociedade R... declarou vender e AA declarou comprar, pelo preço de 150.000,00€, o prédio misto, composto por casa de rés-do-chão, com dependência, coberto aberto, rossio, espigueiro, eira e terreno de pastagem, sito em ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...97-..., registado a favor da parte vendedora, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...3º, da freguesia ..., e na matriz predial rústica sob o artigo ...59º, da mesma freguesia.
Tal como é definido pelo art. 874º do CC, “compra e venda é o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço”.
A realização deste tipo de negócio jurídico gera, “como efeitos essenciais”, a obrigação do vendedor transmitir a propriedade da coisa ou a titularidade do direito, a obrigação de entregar a coisa e a obrigação do comprador de pagar o preço (cfr. arts. 879º, 882º e 883º, todos do CC).  
O contrato de compra e venda, independentemente da sua natureza civil ou comercial, é, assim, um contrato translativo ou de efeito real imediato (transfere, só por si, a propriedade de uma coisa ou de um direito), bem como de efeitos obrigacionais (por criar obrigações entre as partes: obrigação que recai sobre o vendedor de entregar a coisa vendida e de o comprador pagar o respetivo preço), consensual (em regra, basta o acordo das partes para a perfeição do contrato), bilateral ou sinalagmático (criando obrigações recíprocas a cargo do vendedor e do comprador: aquele, de entregar a coisa vendida; este, de pagar o preço), oneroso (pressupõe atribuições patrimoniais de ambos os contraentes, verificando-se entre tais atribuições um nexo ou relação de equivalência), comutativo (as duas prestações patrimoniais são certas e tendencialmente equivalentes) e instantâneo (em regra a sua execução é imediata, embora nada impedindo que as partes renunciem à execução única e dividam a prestação no tempo, situação em que o contrato se torna de duração ou de execução continuada)[71].
Discute-se, sim, se a relação estabelecida entre o Autor e a Ré/R... é uma relação de consumo e se lhe é aplicável, ou não, o regime da venda de bens de consumo, em causa o estabelecido no Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08.04, e na Lei n.º 24/96, de 31/07.
Em termos normativos, o Autor fundamentou o seu direito no regime prescrito no citado Decreto-Lei n.º 67/2003 (relativa à venda de bens de consumo) e na Lei n.º 24/96 (“Lei da Defesa do Consumidor”), atinente à venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas.
Esse entendimento veio a ser acolhido na sentença recorrida.
A Ré/recorrente insurge-se contra esse entendimento, propugnando, por um lado, que a circunstância de o imóvel adquirido pelo A./Recorrido se encontrar descrito no respetivo registo predial como um prédio misto (constituído por um prédio descrito na matriz predial como rústico e outro como urbano) obsta à qualificação do mesmo como bem de consumo.
E, por outro lado, constituindo o referido imóvel “um prédio inacabado”, e competindo ao A./Recorrido terminar a construção, entende a Ré/recorrente que tal impede igualmente a aplicação das normas previstas para as relações de consumo.
Desta forma, impõe-se apreciar se estamos (ou não) perante uma compra e venda de bem de consumo, o que determina que se proceda à densificação dos respetivos requisitos desse figurino contratual.
Como subtipo do contrato de compra e venda, surge o contrato de compra e venda para consumo. A este aplica-se, além das regras gerais do Código Civil, da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho (que estabelece o regime legal aplicável à defesa dos consumidores), e de outros diplomas de proteção dos consumidores, o Dec. Lei n.º 67/2003, de 08.04, alterado posteriormente pelo Dec. Lei. n.º 84/2008, de 21.05, pelo Dec. Lei n.º 9/2021, de 29/01 e pelo Dec. Lei n.º 84/2021, de 18/10[72], que «procede à transposição para o direito interno da Directiva n.º 1999/44/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Maio, relativa a certos aspectos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, com vista a assegurar a protecção dos interesses dos consumidores» (cfr. art. 1º deste Dec. Lei).
A razão de ser da introdução desta regulamentação, específica, mais protectora do comprador consumidor consiste em haver o legislador considerado o comprador – que seja consumidor – a parte mais fraca no respetivo negócio de compra e venda[73], e, por isso, carecido de uma maior proteção legal.
Designa-se por compra e venda de bens de consumo o contrato de compra e venda celebrado entre um empresário/profissional e um consumidor que tenha por objecto um bem imóvel ou móvel corpóreo[74].
Quanto aos requisitos subjetivos dessa figura contratual, estão aqui abrangidos os contratos celebrados entre empresário/profissionais e consumidores, ou seja, os contratos pelos quais uma pessoa singular ou colectiva (“vendedora”), no exercício da profissional da respetiva actividade económica e lucrativa vende bens (ou celebra outros negócios equiparados) a outra pessoa (“consumidor”) para uso privado ou não profissional desta última (art. 1º-B, a) e c) do Dec. Lei n.º 67/2003). Excluídas estão assim as compras e vendas puramente civis (entre consumidores: vg. venda de um bem usado entre meros particulares), puramente comerciais (venda entre comerciantes ou empresas) ou de venda de bens de consumo invertidas (em que um profissional compra um objeto a um consumidor).
Já quanto aos seus requisitos objetivos, a delimitação é mais complexa, envolvendo a consideração simultânea de objetos relevantes, excluídos e equiparados. Entre os objetos relevantes, a lei considera aqui abrangidos os bens imóveis - v.g., prédios rústicos, prédios urbanos, as respetivas partes integrantes - e os bens móveis corpóreos - incluindo todo o tipo de bens materiais, duradouros ou consumíveis (v.g., mobiliário, alimentos, etc.), sujeitos ou não a registo (v.g., automóveis, navios, etc.), fontes de energia (v.g., contratos de fornecimento de eletricidade, de gás, etc.) -, independentemente de se tratar de bens novos ou em segunda mão (arts. 1º-B, b) e 5º, n.º 2, do Dec. Lei n.º 67/2003) e independentemente de o bem ser posteriormente transmitido a um terceiro (art. 6º, n.º 4, do Dec. Lei n.º 67/2003). São de considerar como objetos excluídos ou irrelevantes para estes efeitos todos os demais, incluindo os bens incorpóreos (v.g., obras literárias e artísticas, criações de aplicação industrial, etc.), os serviços (ressalvadas as exceções previstas na lei: cf. art, 1º-A, n.º 2, do Dec. Lei n.º 67/2003, art. 34º, n.º 3, do Dec. Lei n.º 10/2015[75], de 16 de Janeiro), e os direitos. Por fim, alargando consideravelmente o âmbito de aplicação do regime legal, foram ainda considerados como equiparados os contratos de empreitada de consumo (art. 1º-A, n.º 2 do Dec. Lei n.º 67/2003) de prestação de serviços em que sejam fornecidos bens de consumo (art. 1º-A, nº 2 do Dec. Lei n.º 67/2003) e de serviços regulados pelo Dec. Lei n.º 10/2015 ( 34º, n.º 3), e ainda de locação de bens de consumo, v.g., arrendamento, aluguer, "leasing", ALD (art. 1º-A, n.º 2 do Dec. Lei n.º 67/2003), devendo também ter-se por implicitamente abrangidos certos contratos mistos de compra e venda de bens de consumo, v.g., bens com serviços de instalação pelo vendedor (art. 2º, nº 4 do Dec. Lei n.º 67/2003), e outros contratos onerosos transmissão de bens de consumo, "maxime", troca de bens de consumo ("ex vi" do art. 939º do CC).
Por fim, dizer que cabe ao interessado em beneficiar das disposições de tutela do consumidor fazer a prova dos factos constitutivos que sustentam a sua qualidade de consumidor (art. 342º, n.º 1, do CC), sem embargo de recair sobre o réu-fornecedor do bem ou prestador do serviço o encargo de demonstrar que não reveste a qualidade de empresário ou profissional[76].
Não se pode perder de vista que a razão de ser da consagração do regime normativo do direito do consumo “reside na constatação de que, nas modernas sociedades de consumo, os destinatários ordinários dos bens e serviços constituem a parte economicamente mais débil ou tecnicamente leiga ou profana das relações juseconómicas estabelecidas com os empresários e profissionais dotados de superior capacidade financeira e conhecimentos técnicos[77].
Como se refere na fundamentação do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência (AUJ) n.º 4/2019, de 12.02.2019, in D.R., n.º 141/2019, Série I, de 25/07/2019, no quadro normativo das relações jurídico-económicas de consumo o legislador não deixou a composição dos interesses das partes no puro domínio da liberdade contratual (art. 405º, n.º 1, do CC). Estabeleceu (antes) “regras de tutela de um dos contratantes - aquele que tiver a qualidade de consumidor - tomando como padrão o adquirente médio e atendendo à típica inferioridade do seu poder negocial, decorrente da inferioridade económica, informacional ou técnica, bem como à tipicamente menor experiência contratual”, dessa forma reequilibrando as posições negociais e tendo em vista “também um funcionamento mais saudável, porque menos litigioso, das relações contratuais em geral”.
Enfrentando a primeira questão colocada pela R./recorrente – a circunstância de o imóvel adquirido pelo A./Recorrido se encontrar descrito no respetivo registo predial como um prédio misto (constituído por um prédio descrito na matriz predial como rústico e outro como urbano) –, diremos ser de sufragar e manter a solução jurídica acolhida na sentença recorrida que entendeu que tal circunstância não obstava à qualificação do contrato como compra e venda de bem de consumo.
Como aí (bem) se explicitou, no «nosso caso, analisando o título mencionado na alínea a), do ponto II.1., e as características da unidade predial transmitida – e descrita como um prédio único na Conservatória do Registo Predial –, consideramos que o facto de a mesma estar decomposta em dois artigos matriciais (um urbano e outro rústico) para efeitos administrativos e fiscais, não obsta à aplicação do regime próprio de uma relação de consumo. Já sabemos, por tal decorrer da matéria de facto dada por provada, que o Autor adquiriu a unidade predial em causa, toda ela, para nela habitar, sendo evidente, da matéria de facto dada por provada, que a parte qualificada matricialmente como rústica está funcionalmente adstrita à moradia, como logradouro e espaço de lazer e, portanto, funcionalmente adstrita à parte qualificada como urbana. Só não seria assim, ou seja, só não seria de aplicar o regime de venda de bens de consumo se aquela parte rústica descaracterizasse a parte urbana e a finalidade habitacional da unidade predial vista como um todo. Mas tal não se retira da matéria de facto dada por provada».
De facto, encontram-se abrangidos pelo Dec. Lei n.º 67/2003 quaisquer bens imóveis – prédios rústicos, prédios urbanos, as respetivas partes integrantes [art. 204º, n.º 1, als. a) e) do CC] – ou móveis corpóreos, independentemente das suas caraterísticas concretas[78], sendo que, no que concerne aos bens imóveis, o legislador não faz qualquer diferenciação entre a natureza urbana ou rústica do bem, pelo que carece de fundamento a alegação de pretender excluir os prédios mistos daquele regime.
Ora, no caso resultou provado que as partes – AA e R..., Lda – celebraram entre si um contrato de compra e venda incidente sobre o prédio identificado nos autos, sendo que a ré (vendedora) dedica-se à actividade de compra, reconstrução e venda de bens imobiliários, ao passo que o Autor (comprador) pretendeu e utiliza o referido imóvel como sua residência (destinado a uso não profissional).
Tanto basta para dar como demonstrados os requisitos, subjetivos e objetivos, de que depende a demonstração da outorga de um contrato de compra e venda de bem de consumo.
Tão pouco colhe o facto de se tratar de um prédio inacabado, posto que essa circunstância não obsta à aplicação do regime legal de Defesa do Consumidor.
Para o efeito a R./recorrente defende que o referido diploma legal não se aplica ao caso sub iudice, uma vez que a lei de defesa do consumidor foi pensada para prédios/bens imóveis ou fracções autónomas totalmente acabados, ou seja, para bens imóveis prontos ou aptos a consumir, no caso concreto a habitar.
Não é essa a situação do prédio misto objecto do contrato de compra e venda em discussão nos autos, porquanto o mesmo não estava pronto a consumir, não tinha licença de habitabilidade, e faltavam executar todos os trabalhos mencionados nas alíneas o) a jj) da matéria de facto dada como provada.
Acrescenta que não pode o vendedor de um prédio inacabado ser responsável como se de um prédio acabado se tratasse, por não ser “possível dar garantia legal, de um bem móvel ou imóvel, que se encontra inacabado”, além de que existindo a intervenção de uma terceira pessoa no bem em causa, perde-se a garantia.
Mais conclui que, por não ter sido a R./recorrente a concluir a obra, não pode ser responsabilizada «a dar garantia legal», à luz da lei da Defesa do Consumidor, por defeitos entretanto apurados.
Como já se disse – e reitera – o regime previsto no Dec. Lei n.º 67/2003 contempla quaisquer bens corpóreos, independentemente das suas caraterísticas concretas, sejam eles novos ou usados, duradouros ou não duradouros.
Por outro lado, a R./recorrente parece olvidar que, na sentença recorrida, o Exmo Juiz “a quo” teve na devida consideração apenas os defeitos exclusivamente imputáveis à R./recorrente e pelos quais esta é responsável, tendo para o efeito procedido a um exercício de comparação entre a matéria de facto dada por provada nas alíneas o) a kk), por um lado, com a matéria de facto dada por provada nas alíneas ll) a www).
Para esse efeito explicitou a seguinte fundamentação:
«No nosso caso, temos (i) uma resistência do betão das vigas inferior à prevista no projecto (apenas 35,5%) atingindo a carbonatação 6,3 centímetros (quando o limite está fixado em 2 centímetros ao fim de 50 anos), apresentando as respectivas armaduras corrosão, (ii) uma resistência do betão da sapata inferior à prevista no projecto (90,5%), (iii) valores de resistência, rigidez de flexão, deformação de longo prazo, da laje instalada na sala inferiores aos previstos no projecto, conforme alíneas qq) e rr), do ponto II.1., (iv) os pórticos 5 e 6 da laje do alpendre não têm resistência para suportar esta laje, uma vez que os pilares têm dimensões e estrutura diferentes das previstas no projecto e a disposição da laje foi modificada, (v) os pilares do alpendre estão previstos com a secção quadrada de 40x40 centímetros e foram construídos circularmente com o diâmetro de 20 centímetros, sendo a sua resistência inferior à prevista no projecto (vi) a laje inclinada de cobertura tem uma espessura de 13 centímetros quando devia ter, de acordo com o projecto, uma espessura de 20 centímetros, (vi) ausência de elementos de ligação ente a viga do alpendre e a laje do alpendre, ao contrário do previsto no projecto, (vii) ausência de sapata para o pilar P6, (viii) execução deficiente e em violação do projecto da drenagem da fundação C2 (colocação do dreno 1 metro acima da cota do pavimento, impossibilitando a drenagem e colocando a parede em contacto com a humidade do solo), (ix) deficiente impermeabilização das paredes exteriores, não impedindo a entrada de água e humidade para o interior da casa, e (x) o pavimento da casa das máquinas executado com pendente contrária à grelha de drenagem, provocando a acumulação de água no seu interior».
Concluiu, por fim, serem essas as patologias que podem ser imputadas à Ré, porque resultaram de obra por si executada, além de que configuram defeitos ocultos e só quanto a estes é que existe responsabilidade emergente da prestação de coisas defeituosas.
Ora, como bem refere o A./recorrido nas contra-alegações, todos os defeitos/desconformidades e consequentes danos que resultam dos factos provados sob as als. ll) a www) são defeitos estruturais, diretamente decorrentes da obra executada pela R./Recorrente, sendo que a «existência de posteriores intervenções [por parte do A./Recorrido] em nada afeta o nexo de causalidade estabelecido entre a conduta da R./Recorrente (realização das obras) e a verificação dos danos sofridos pelo A./Recorrido decorrentes das patologias verificadas no imóvel».
Tão pouco é ajustada a afirmação de que o imóvel vendido ao A./Recorrido “não era um bem apto a consumir”.
Essa ocorrência deu-se porque o imóvel padecia de defeitos (ocultos e estruturais) que são da única e exclusiva responsabilidade da R./Recorrente.
 Por fim, carece de fundamento a afirmação de que “qualquer consumidor, ao introduzir alterações no bem (móvel ou imóvel), perde a garantia”.
Para tanto teria sido indispensável que a R./recorrente tivesse demonstrado que os defeitos, patologias e desconformidades existentes no imóvel vendido não lhe eram imputáveis, nomeadamente por advirem dos acabamentos entretanto realizados por outrem, condição esta que não se verifica.
Cingindo-se os defeitos, patologias ou vícios imputados à R./recorrente aos que resultaram de obra por esta executada, não se antevê como possa a mesma eximir-se da responsabilidade que lhe compete.
É, por conseguinte, de concluir que o facto de o imóvel ter sido vendido ao A./recorrido sem os respectivos acabamentos em nada prejudica a sua qualificação como bem de consumo, porquanto a R./Recorrente/vendedora continua a assumir a veste de profissional, o A./recorrido/comprador a de consumidor, destinando-se o imóvel a uso não profissional, qual seja a residência do comprador.
Subscreve-se, por isso, a qualificação jurídica feita na sentença recorrida no sentido de estarmos perante uma compra e venda de bem de consumo, justificando-se a concessão da protecção devida aos consumidores conferida pelo citado Dec. Lei n.º 67/2003.
Termos em que improcede este fundamento da apelação.
*
7.1.2. Da caducidade dos direitos do A./recorrido.

Como decorre já do ponto antecedente, a compra e venda em apreço e relativamente aos alegados defeitos reger-se-á pela Lei de Defesa do Consumidor – Lei n.º 24/96, de 31/07 – e pelo Dec. Lei n.º 67/2003, de 8/04.
Não será aqui, consequentemente, aplicado o regime da compra e venda de coisa defeituosa prevista nos arts. 913º e segs. do CC que se mantém em vigor para a compra e venda de coisa defeituosa em que não seja aplicada a protecção do consumidor, por o respectivo negócio não se poder considerar como celebrado por consumidor com empresário profissional, nos termos do art. 2º, n.º 1, da Lei n.º 24/96 e do art. 1º-A, n.º 1, do Dec. Lei n.º 67/2003.
Isto porque, como bem refere a R./recorrente, as normas contidas na Lei de Defesa dos Consumidores constituem normas especiais relativamente às regras gerais do Código Civil, derrogando estas com as quais se revelem incompatíveis no seu campo de aplicação, que é a da relação de consumo.
Consequentemente, improcede a pretensão recursória no sentido de não serem aplicáveis os prazos previstos no Dec. Lei n.º 67/2003.

Importa, por isso, atentar no regime dos arts. 5.º, n.º 1 e 5.º-A do Dec. Lei n.º 67/2003, que dispõem:
«Artigo 5.º
Prazo da garantia
1 - O consumidor pode exercer os direitos previstos no artigo anterior quando a falta de conformidade se manifestar dentro de um prazo de dois ou de cinco anos a contar da entrega do bem, consoante se trate, respectivamente, de coisa móvel ou imóvel.
(…).
Artigo 5.º-A
Prazo para exercício de direitos
1 - Os direitos atribuídos ao consumidor nos termos do artigo 4.º caducam no termo de qualquer dos prazos referidos no artigo anterior e na ausência de denúncia da desconformidade pelo consumidor, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
2 - Para exercer os seus direitos, o consumidor deve denunciar ao vendedor a falta de conformidade num prazo de dois meses, caso se trate de bem móvel, ou de um ano, se se tratar de bem imóvel, a contar da data em que a tenha detectado.
3 - Caso o consumidor tenha efectuado a denúncia da desconformidade, tratando-se de bem móvel, os direitos atribuídos ao consumidor nos termos do artigo 4.º caducam decorridos dois anos a contar da data da denúncia e, tratando-se de bem imóvel, no prazo de três anos a contar desta mesma data.
(…)».
Sabido que a caducidade dos direitos atribuídos ao consumidor aproveita ao vendedor, incumbirá a este o respetivo ónus de alegação e prova, enquanto facto extintivo do direito invocado pelo consumidor, conforme decorre do disposto no art. 342.º, n.º 2, do CC.
Em síntese, por força da aplicação do regime da venda de bens de consumo ao caso dos autos, temos que:
i) - O vendedor é apenas responsável pelos defeitos que se verifiquem no prazo de cinco anos, tratando-se de coisa imóvel, após a entrega do bem (art. 5º, n.º 1);
Ou seja, em caso de coisa imóvel, a garantia legal de conformidade tem a duração de cinco anos a contar da entrega do bem, presumindo-se que quaisquer desconformidades manifestadas durante esse período existiam já na data da entrega, salvo quando tal for incompatível com a natureza da coisa ou com as características da falta de conformidade (art. 3º, n.º 2).
Sob pena de caducidade dos direitos que lhe assistem (art. 5º-A, n.º 1), no caso de imóveis:
ii) impõe-se que o comprador proceda à denúncia ao vendedor da falta de conformidade (existência do defeito) do bem vendido no prazo de um ano a contar da data em que a tenha detectado (art. 5º-A, n.º 2), e
iii) que exerça, judicial ou extrajudicialmente, os direitos de reparação ou substituição, redução do preço ou resolução do contrato, dentro do prazo de três anos a contar da data da denúncia (art. 5º-A, n.º 3).
Assim, considerando que a transmissão do imóvel ocorreu a 19/11/2014, o comprador teve conhecimento dos defeitos em 14/12/2015, denunciou-os por carta recebida (pelo vendedor) em 04.10.2016 e propôs a presente ação em 22/03/2017, não resultou demonstrado o decurso de qualquer um dos prazos assinalados, bem tendo a excepção da caducidade do direito sido julgada improcedente.
*
7.1.3. Do regime aplicável (o previsto nos arts. 916º, 917º e 1225º do CC) e do abuso de direito.
Quanto à questão de saber qual o regime aplicável – o do Código Civil ou o previsto no Dec. Lei n.º 67/2003 –, a resposta emerge já do ponto antecedente, pelo que, a fim de obviar a repetições inúteis e fastidiosas, dispensamo-nos de considerações complementares, dando-se aquela fundamentação aqui por reproduzida.
Perante um objeto defeituoso sobre que incide um contrato de compra e venda integrado numa relação de consumo, o consumidor tem um leque de meios de reacção previstos no art. 4º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 67/2003.
Este preceito prescreve que, “em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato”.
E, o seu n.º 5 estipula que “o consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais”.
Como é sabido, a questão de saber se o regime do Dec. Lei n.º 67/2003 estabelece, ou não, uma ordem de hierarquia entre os vários direitos do consumidor em caso de falta de conformidade não é unívoca.
Contudo, a jurisprudência maioritária vai no sentido de que o consumidor pode exercer qualquer um dos direitos imediatamente com o limite do abuso de direito, ou seja, no sentido da inexistência de hierarquia[79].
De facto, a lei actual parece clara, não só no sentido de não existir uma ordem entre os direitos, mas também no sentido de a escolha caber ao consumidor[80]. O resultado da coordenação entre os n.ºs 1 e 5 do art. 4º do Dec. Lei n.º 67/2003 está em que a relação entre os quatro direitos – reparação, substituição do bem, redução do preço ou resolução do contrato – é uma relação de alternatividade. O vendedor que não cumpre à primeira pode não ter a oportunidade de cumprir à segunda[81]
De facto, por força do art. 4º, n.º 5, do Dec. Lei n.º 67/2003, o princípio geral é o de que o consumidor é livre de exercer em alternativa um qualquer desses direitos, escolhendo aquele que melhor serve os seus interesses, salvo com os limites decorrentes da natureza das coisas ou do abuso do direito (fundamental para prevenir exercícios arbitrários e desproporcionados por parte do comprador, em ostensiva lesão dos legítimos interesses do vendedor)[82].
O abuso do direito constitui, assim, um limite da escolha (do exercício dos direitos) feita pelo consumidor.
Preceitua o art. 334º do Cód. Civil que “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
Para Manuel de Andrade, “há abuso do direito quando o direito, legítimo (razoável) em princípio, é exercido, em determinado caso, de maneira a constituir clamorosa ofensa do sentimento jurídico dominante; e a consequência é a de o titular do direito ser tratado como se não tivesse tal direito ou a de contra ele se admitir um direito de indemnização baseado em facto ilícito extracontratual[83].
No entendimento de Vaz Serra, o acto abusivo é, em regra, o exercício de um direito que, intencionalmente, causa danos a outrem, por forma contrária à consciência jurídica dominante na coletividade social. Só excepcionalmente se prescindindo da intenção de prejudicar terceiros quando a contraditoriedade àquela consciência, isto é, à boa fé e aos bons costumes, for clamorosa ou quando o direito for exercido para fim diverso daquele para que a lei o concede[84].
Nas palavras de Antunes Varela, “para que haja lugar ao abuso de direito, é necessária a existência de uma contradição entre o modo ou fim com que o titular exerce o seu direito e o interesse ou interesses a que o poder nele consubstanciado se encontra adstrito[85].
Daí que, segundo Pires de Lima e Antunes Varela[86], o exercício de um direito só poderá haver-se por abusivo quando exceda manifesta e intoleravelmente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social ou económico do direito, ou seja, quando esse direito seja exercido “em termos clamorosamente ofensivos da justiça” ou “do sentimento jurídico socialmente dominante”.
Como refere Almeida Costa[87], o princípio do abuso do direito constitui um dos expedientes técnicos ditados pela consciência jurídica para obtemperar, em algumas situações particularmente clamorosas, às consequências da rígida estrutura das normas legais.
O abuso do direito surge, pois, como uma forma de adaptação do direito à evolução da vida, funcionando, por um lado, “como válvula de escape a situações que os limites apertados na lei não regulam por forma considerada justa pela consciência social em determinado momento histórico”, e obstando, por outro, a que, “observada a estrutura formal do poder que a lei confere, se exceda manifestamente os limites que se devem observar, tendo em conta a boa fé e o sentimento de justiça em si mesmo[88].
Ressalve-se, no entanto, que “a utilização do abuso do direito não deve constituir panaceia fácil de toda e qualquer situação de exercício excessivo de um direito, em que o respectivo excesso não seja manifesto ou que só aparentemente se apresente como manifestamente excessivo[89]. Importa evitar a todo o custo «a utilização da boa fé como um “nevoeiro” que serve para tudo»[90].
O abuso do direito pressupõe logicamente que o direito existe, embora o seu titular se exceda no exercício dos seus poderes.
A fórmula adotada no actual Código Civil não se delimita tão só ao acto de emulação, entendido como o exercício de um direito sem utilidade própria e só para prejudicar outrem. Numa visão bem mais abrangente e ampla, o citado preceito normativo abrange o exercício de qualquer direito por forma anormal, quanto à sua intensidade ou à sua execução, de modo a poder comprometer o gozo dos direitos de terceiro e a criar uma desproporção objetiva entre a utilidade do exercício do direito por parte do seu titular, e as consequências que outros têm de suportar[91].
Segundo o legislador, a determinação da legitimidade ou ilegitimidade do exercício do direito, ou seja, da existência ou não de abuso do direito, afere-se a partir de três conceitos: a boa fé, os bons costumes e o fim social ou económico do direito[92].
A manifestação mais clara do abuso do direito é a chamada conduta contraditória (“venire contra factum proprium”) em combinação com o princípio da tutela da confiança - exercício dum direito em contradição com uma conduta anterior em que a outra parte tenha confiado, vindo esta com base na confiança gerada e de boa fé a programar a sua vida e a tomar decisões[93].
A caracterização da proibição do comportamento contraditório, nos seus elementos fundamentais, mostra-se feita no Ac. do STJ de 12/11/13 (relator Nuno Cameira), in www.dgsi.pt., nos seguintes termos:
«Assim, há desde logo um primeiro e fundamental pressuposto a considerar: a existência de um comportamento anterior do agente (o factum proprium) que seja susceptível de fundar uma situação objectiva de confiança. Em segundo lugar exige-se que, quer a conduta anterior (factum proprium), quer a actual (em contradição com aquela) sejam imputáveis ao agente. Em terceiro lugar, que a pessoa atingida com o comportamento contraditório esteja de boa fé, vale por dizer, que tenha confiado na situação criada pelo acto anterior, ignorando sem culpa a eventual intenção contrária do agente. Em quarto lugar, que haja um “investimento de confiança”, traduzido no facto de o confiante ter desenvolvido uma actividade com base no factum proprium, de modo tal que a destruição dessa actividade pela conduta posterior, contraditória, do agente (o venire) traduzam uma injustiça clara, evidente. Por último, exige-se que o referido “investimento de confiança” seja causado por uma confiança subjectiva objectivamente fundada; terá que existir, por conseguinte, causalidade entre, por um lado, a situação objectiva de confiança e a confiança da contraparte, e, por outro, entre esta e a “disposição” ou “investimento” levado a cabo que deu origem ao dano. Os pressupostos enumerados não podem em caso algum ser aplicados automaticamente pois, (…), o venire contra factum proprium é, em última análise, “uma técnica que não dispensa, e antes pressupõe, um controlo da adequação material da solução, com uma valoração global de todos os elementos à luz do ponto de vista da tutela da confiança legítima”; por isso, todos aqueles pressupostos “deverão ser globalmente ponderados, em concreto, para se averiguar se existe efectivamente uma “necessidade ético-jurídica” de impedir a conduta contraditória, designadamente, por não se poder evitar ou remover de outra forma o prejuízo do confiante, e por a situação conflituar com as exigências de conduta de uma contraparte leal, correcta e honesta – com os ditames da boa fé em sentido objectivo».
Pretendendo ver dirimida a questão do abuso do direito, a verdade é que a R./recorrente não indica circunstanciadamente – na apelação – qualquer facticidade ou argumento jurídico que fundamente tal excepção perentória.
Essa falha alegatória advém já dos articulados, pois aquela litigante não cuidou sequer de alegar factos essenciais em que se baseia essa excepção, tão pouco a tendo especificado separadamente, como impõe o art. 572º, al. c), do CPC.
Aliás, se atentarmos no despacho de 6/03/2019[94], que procedeu à identificação do objeto do litígio e enunciou os temas da prova, nenhuma referência é feita quanto à alegada excepção do abuso do direito, sem que tal tenha merecido reclamação por parte da R./Recorrente.
E, analisando a contestação/reconvenção[95], limitou-se a ré a referir que a acção à qual contestava se resume “a historieta orquestrada pelo A., a meras desculpas de muito maus pagador”, “representando também um verdadeiro hino ao abuso do direito” (cfr. arts 3.º e 4.º), “a pretensão do Autor, configura abuso de direito, o que aqui também se deixa expressamente alegado” (cfr. art. 182.º), e “[n]ão se aceitam, os valores aduzidos nos Artigos 146º, 147º, 148º, e 149º, 150º, nem se aceita a redução do preço, por ser manifestamente desproporcional” e “constituir um caso manifesto de abuso de direito” (cfr. arts. 224.º e 225.º).
Lançando mão da argumentação aduzida pelo A./recorrido, «[q]uestiona-se, portanto: abuso de direito porquê? Com base em que factos? Com fundamento em que normas jurídicas? Em que modalidade? Quais as consequências?».
À míngua de factos concretamente alegados e da explicitação das razões jurídicas consubstanciadoras de uma alegada situação de abuso do direito, não é de estranhar pois que Tribunal “a quo” não se tenha expressamente pronunciado sobre o referido instituto jurídico, posto que, em bom rigor, essa excepção não foi devidamente invocada.
Não se deixa de ter presente que o abuso do direito é uma exceção de direito material de conhecimento oficioso[96].
Todavia, a aplicação do abuso do direito terá de depender, sempre, de terem sido invocados e demonstrados os competentes factos constitutivos e formulado um pedido correspondente. Sendo esse o caso, o abuso do direito é constatado pelo tribunal, mesmo quando o interessado não o tenha, expressamente, mencionado: surge (neste sentido), de conhecimento oficioso[97].
Malgrado o conhecimento oficioso da excepção do abuso de direito, o tribunal não tem que se pronunciar, em cada caso, sobre todas as questões que sejam do conhecimento oficioso, mas apenas sobre aquelas em que se justifique a sua análise, especialmente quando a mesma deva proceder ou quando a dúvida sobre a sua eventual procedência legitime o exame dos seus pressupostos, maxime em função dos factos provados. É a afirmação da regra da utilidade em processo civil. É proibida a prática de atos inúteis no processo (art. 130° do CPC).
Se assim não fosse, estariam os tribunais ocupados mesmo com absurdos jurídicos ou construindo quezílias desnecessárias, com elevado prejuízo para o serviço e sem o senso a que a inteligência obriga.
Seja como for, como salienta o A./recorrido, a questão em apreço não deixou de ser apreciada e rejeitada na sentença recorrida, posto que, de outro modo, não teria julgado procedente a(s) pretensão(ões) do A./Recorrido.
Reportamo-nos em concreto ao segmento da fundamentação da sentença na qual se refere[98]:
“Nos termos do regime legal aplicável ao caso dos autos a escolha pela forma como o adquirente da obra pretende ser ressarcido da falta de conformidade do bem com o contrato é livre, estando apenas limitada pela respetiva possibilidade prática e técnica e pelo respeito dos princípios da boa fé e dos bons costumes e pela finalidade económico-social do direito escolhido, enquanto corolários intrínsecos do abuso de direito (…).
No nosso caso, a factualidade dada por provada permite satisfazer a primeira das pretensões formuladas pelo Autor (…)”.
Inexiste, portanto, omissão de pronúncia legitimadora da nulidade da sentença (art. 615º, n.º 1, al. d) do CPC)[99].
 Quanto ao mais, concisamente dir-se-á que, no caso em apreço, tratando-se de um imóvel que padece de variados defeitos estruturais – estando, por conseguinte, demonstrada a falta de conformidade do bem com o contrato –  não se vislumbra em que termos a pretensão do consumidor em exercer o direito de redução do preço possa traduzir um exercício abusivo ou excessivo do direito.
Ínsito ao exercício desse direito está a vontade do consumidor de ficar com o imóvel, mesmo desconforme. E essa pretensão é usual, atento o seu efeito útil, nos casos em que o preço ainda não foi (total ou parcialmente) pago.
Por sua vez, a redução do preço deverá corresponder ao valor da desvalorização do bem, competindo ao vendedor restituir montante correspondente na consequência do exercício do direito pelo consumidor, reequilibrando-se por esta via as prestações[100].
Acresce que o direito de redução do preço (bem como o de resolução do contrato) não está apenas reservado para a hipótese de incumprimento definitivo ou impossibilidade de cumprimento dos deveres de reparação ou substituição do bem ou da obra, podendo outras circunstâncias justificarem o recurso prioritário ao exercício deste(s) direito(s)[101].
Por fim, o consumidor não está a exercer cumulativamente dois ou mais direitos conferidos por lei – exceptuando o pedido de indemnização, cuja cumulação é legítima[102] –, pelo que a sua pretensão nada tem de ilícito ou de abusivo.
 No contexto fáctico apurado é de concluir que a utilização do meio legal de redução do preço pela A./Recorrido, atentas as circunstâncias do caso concreto, não envolve a violação da boa-fé, dos bons costumes ou do fim social ou económico do direito em causa.
Não deixa de se assinalar que não resulta dos autos que o A./Recorrido em momento algum agiu de modo não condizente com a conduta que anteriormente assumira, atuando, sim, de acordo com os ditames da boa fé. O mesmo é dizer que não se evidencia que o A./recorrido/consumidor tenha incorrido no exercício ilegítimo do direito de opção que a lei lhe confere.
De resto, em regra (e o caso em apreço não foge a essa regra), a não reposição da conformidade do bem com o contrato por parte do vendedor, nomeadamente através da reparação (ou de substituição), afasta a qualificação como abusiva da escolha pelo consumidor de outro direito[103], como seja a redução do preço.
Julga-se, por isso, improcedente este fundamento da apelação.
*
7.1.4. Inadequação (por excesso) do valor compensatório arbitrado para ressarcimento dos danos não patrimoniais.
Na sentença recorrida, fixou-se, a este título, a quantia de 7.500,00€, a cargo da R./recorrente.
Segundo a R./recorrente, esse valor arbitrado a título de danos não patrimoniais não é equitativo, antes exagerado e desproporcional, porquanto, para além de não atender ao facto de ser o próprio ao A./Apelado que não pagou o preço que devia à Ré/Apelante, como deve, no seu devido tempo, não levou em consideração que este não possui licença de habitabilidade.
Haverá, pois, tão só de averiguar se estão, ou não, corretamente fixados os questionados danos não patrimoniais sofridos pelo A./recorrido.
Na sua vertente não patrimonial, o dano abrange os prejuízos (como, por exemplo, as dores físicas, os desgostos morais ou por perda de capacidades físicas ou intelectuais, os vexames, sentimentos de vergonha, estados de angústia, a perda de prestígio ou de reputação, os complexos de ordem estética) que, sendo insuscetíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a perfeição física, a honra ou o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização[104].
A nossa lei, no art. 496º do CC, não determina quais os danos não patrimoniais que são compensáveis, limitando-se a fixar um critério geral que é o da gravidade desses danos.
Segundo o n.º 1 do citado normativo, «[n]a fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito».
Como escrevem Pires de Lima e Antunes Varela[105], «a gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objetivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjetivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada)». O mesmo é dizer que a gravidade deve ser apreciada em termos objetivos, evitando estados de especial sensibilidade[106].
Já os simples incómodos ou as meras contrariedades não serão, em regra, suficientes para justificar uma indemnização.
Por conseguinte, para serem indemnizáveis exige-se que os danos não patrimoniais sejam graves e que mereçam, por essa gravidade, a tutela do direito.
Reconhece-se não ser fácil avaliar na prática os danos não patrimoniais. Na maioria das vezes não existe uma evidência física dos prejuízos e, mesmo quando ela exista, torna-se difícil conhecer as suas reais consequências.
Segundo o n.º 4 do art. 496º do CC, o cálculo do montante da compensação monetária por danos não patrimoniais deve obedecer a um juízo equitativo – não podendo, por definição, ser feita através da fórmula ou da teoria da diferença[107] –, tendo em atenção a natureza e intensidade dos danos causados, o grau de culpabilidade do lesante, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias atendíveis, nomeadamente, as lesões sofridas e os correspondentes sofrimentos, as flutuações do valor da moeda, não devendo perder-se de vista os padrões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, de modo a procurar alcançar, até por uma questão de justiça relativa, uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, como aliás impõe o n.º 3 do artigo 8.º do CC[108].
Como ensina o Prof. Antunes Varela[109], e como vem sendo seguido pela jurisprudência dos nossos tribunais, o juízo de equidade requer do julgador que tome «em conta todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida», sem esquecer que a sobredita “indemnização” tem natureza mista, já que visa não só compensar o dano sofrido, mas também reprovar, de algum modo, a conduta lesiva.
Daí que se entenda que, sem embargo da função punitiva que outrossim reveste, a compensação por danos não patrimoniais “tem por fim facultar ao lesado meios económicos que, de alguma sorte, o compensem da lesão sofrida, por tal via reparando, indirectamente, os preditos danos, por serem hábeis a proporcionar-lhe alegrias e satisfações, porventura de ordem puramente espiritual, que consubstanciam um lenitivo com a virtualidade de o fazer esquecer ou, pelo menos, mitigar o havido sofrimento moral[110].
Em suma, firmado o critério da gravidade (art. 496º, n.º 1 do Cód. Civil), são essencialmente três os princípios relativos à indemnização dos danos não patrimoniais[111]:
1º - A compensação dos danos não patrimoniais deve fazer-se em espécie (arts. 70º, n.º 2 e 566º, n.º 1, do CC);
2º - A compensação em dinheiro dos danos não patrimoniais será fixada equitativamente pelo tribunal (art. 496º, n.º 4 do CC);
3º - A compensação em dinheiro dos danos não patrimoniais será fixada equitativamente pelo tribunal, “tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º” (art. 496º, n.º 4, do CC).
Para responder atualizadamente ao comando do art. 496.º do CC e constituir uma efetiva possibilidade compensatória, deverá ter-se ainda presente que a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores em matéria de danos não patrimoniais tem evoluído no sentido de considerar que a compensação tem de ser significativa, e não miserabilista ou meramente simbólica, de modo a viabilizar um lenitivo para os danos suportados e, porventura, a suportar[112]; o que não significa, em contraponto, que deva ser uma indemnização arbitrária. Na verdade, a actividade do juiz no domínio do julgamento à luz da equidade, não obstante se veja enformada por uma importante componente subjetiva, não se pode reconduzir ao puro arbítrio[113].
Diga-se, por fim, que o juízo de equidade da 1ª instância, essencial à determinação do montante indemnizatório por danos não patrimoniais, assente numa ponderação, prudencial e casuística, das circunstâncias do caso – e não na aplicação de critérios normativos – deverá ser mantido sempre que, situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida, se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que, numa perspectiva actualística, generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade[114].
Na sentença recorrida aduziu-se para o efeito que «em face das consequências que resultaram para a habitação do Autor, patentes na deterioração da qualidade do ar no interior da residência e, em face do que consta da alínea cccc), do ponto II.1., consideramos justo, adequado e equitativo atribuir ao Autor, a este título uma indemnização líquida de € 7.500,00».
Os danos a ter em conta são, na verdade, os descritos na al. cccc) dos factos provados, ou seja:
-  O Autor tem sofrido transtornos e desgosto por ter humidades, acumulações de água e fungos em casa, não conseguindo usufruir da habitação de forma total e sem condicionamentos.
É indiscutível, face ao critério acima exposto, que estes danos são indemnizáveis, constituindo um verdadeiro prejuízo o facto de o A./recorrido não poder fruir, em condições de normalidade, a casa que serve de sua habitação.
O lar é visto como o “último refúgio” de uma pessoa/família, almejando-se que no mesmo se tenham condições de conforto e de bem estar que permitam o seu uso tranquilo e conferindo uma verdadeira situação de tranquilidade[115], o que, de todo, não se verifica, visto estarmos em presença de um imóvel em que se denota a existência de um teor elevado de humidade no ar dentro da habitação e alguns fungos nas zonas interiores da parede de pedra, infiltrações de água no interior da habitação sob a forma de eflorescências e danos no reboco e nos rodapés [cfr. als. lll), kkk), vvv) e www) dos factos provados], com todas as conhecidas e notórias consequências que daí advêm.
Para o efeito pretendido é, por fim, irrelevante o facto de o A./recorrido não ter pago a totalidade do preço da compra e de o imóvel não possuir licença de habitabilidade.
Tudo ponderado e tendo presentes os valores habitualmente atribuídos pela jurisprudência e em especial os atribuídos a situações similares à ora em apreço[116], não vemos razões para considerar desajustada ou proporcional por excesso (como entende a ré/recorrente) a compensação fixada pela 1ª instância a título de danos não patrimoniais. Na verdade, tendo em conta o circunstancialismo concreto, os danos não patrimoniais apurados não apresentam a diminuta ou escassa gravidade com que a ré os cataloga, afigurando-se-nos equitativamente justa e adequada a compensação arbitrada.
Improcede, por conseguinte, este fundamento da apelação.
*
7.1.5. Do indevido condicionamento do pagamento da quantia de 121.000,00 € ao valor apurar em liquidação de sentença e que corresponder à redução do preço.
Sustenta a R./recorrente que o Tribunal “a quo” não devia condicionar o pagamento da quantia de 121.000,00 € ao valor a apurar em liquidação de sentença e que corresponder à redução do preço, por falta de fundamento legal para o efeito, posto que não pode, nem deve, ser aceite de forma discricionária, a redução do preço.
Pugna, por isso, pela alteração da sentença, no sentido de o A./Apelado ser condenado no pagamento da quantia de 121.000,00 €, acrescida de juros de mora contados à taxa legal de 4% ao ano, desde o dia .../.../2014, sem a referida condição.
Sem quebra do devido respeito, a pretensão em apreço carece de fundamento legal.
Como é sabido, a redução do preço pode obter-se pela diminuição da quantia paga ou a pagar ou pela exigência de devolução do que foi pago a mais[117].
Logo, no caso de o comprador ainda não ter (total ou parcialmente) pago o preço – como é o caso dos autos –, a parte do preço a reduzir não será devida, por o valor do bem ser inferior ao acordado; mas se o consumidor já tiver saldado o preço na íntegra, apesar de indevida, a quantia paga em excesso corresponderá a um crédito que o consumidor deterá sobre o vendedor, podendo aquele exigir-lhe a correspectiva devolução de parte do preço pago. 
Consequentemente, estando em causa o apuramento do valor da redução do preço, impõe-se que o valor do preço do contrato que falta pagar fique condicionado por aquele, na medida em que dessa determinação resultará que, pelo menos, parte do preço em dívida deixe de ser devido, assim se reduzindo/diminuindo (ou, quiçá, inutilizando) o crédito do vendedor.
Termos em que se julga improcedente este fundamento da apelação.
*
7.2. Da ampliação do objecto do recurso deduzida nas contra-alegações (arts. 636º, n.ºs 1 e 2, e 640º, n.º 3, do CPC[118]) e do pedido de apreciação de questões/pedidos deduzidos pelo A./recorrido junto do tribunal recorrido (arts. 665.º CPC)[119].
Mercê da total improcedência da apelação principal, considero prejudicada a apreciação da ampliação do âmbito do recurso subsidariamente deduzida pelo A./recorrido[120] [121], bem como do pedido de apreciação de questões/pedidos deduzidos pelo A./recorrido, também subsidariamente formulado[122].
*
7.3. Do recurso subordinado (interposto pelo AA).
7.3.1. Da revogação da sentença, por erro de julgamento, em consequência da modificação da matéria de facto atinente aos defeitos, desconformidades, vícios ocultos e danos.
No segmento decisório da sentença recorrida, o Mm.º Juiz “a quo” determinou que «a quantia a liquidar em execução de sentença», para efeitos de redução do preço do imóvel, deverá ter por referência certas e determinadas patologias que especificamente enunciou.
Sucede, porém, que as mencionadas patologias no segmento decisório da sentença recorrida não correspondem, na sua totalidade, aos defeitos, vícios e desconformidades incluídos no elenco dos factos dado como provados.
Por outro lado, por força da procedência da impugnação da decisão da matéria de facto deduzida pelo A./recorrente/subordinado resultaram apurados outros defeitos, vícios e desconformidades de que o imóvel padece, os quais terão também de ser tomados em consideração para o apontado efeito.
Ora, todos os defeitos, vícios e desconformidades incluídos no elenco dos factos dado como provados e que sejam imputáveis à R./recorrente deverão ser tidos em conta para efeitos de determinação do valor correspondente à redução do preço do imóvel.
Assim, impõe-se a revogação da sentença recorrida e a substituição por outra que declare que a determinação do montante correspondente à redução do preço do imóvel seja realizada em função de todas as patologias elencadas nos factos provados sob as als. ll) a www) da sentença recorrida, bem como dos demais defeitos, vícios e desconformidades cuja inclusão no rol dos factos provados decorreu da procedência da impugnação da decisão da matéria de facto [no caso, as als. eeee) a llll)].
Procede, por isso, este fundamento da apelação.
*
7.3.2. Dos danos referentes ao valor pago pelo A./recorrente à E... (seja por nulidade fundada em omissão de pronúncia, seja por erro de julgamento - cfr. art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC)[123].
O pedido formulado na petição inicial sob o item 9, na parte que ora releva, tem o seguinte teor:
«9. Independentemente de qualquer um dos pedidos acima referidos – e em cumulação com os mesmos, devem ainda os réus, em qualquer caso, ser condenados a pagar ao autor, em virtude de outros danos por este sofridos em consequência dos defeitos, desconformidades e vícios ocultos do imóvel supra  referidos, (…) a quantia de 7.389,47 (…) a título de danos patrimoniais já liquidados, acrescidas dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos, (…), ao abrigo do disposto nos artigos 556.º, n.º 1, al. b), 1.ª parte do CPC, e nos artigos 569º do Código Civil e 556º, n.º 1, al. b), 2.ª parte do Código de Processo Civil».
 Aduz para o efeito o A./recorrente que o custo do relatório junto como Documento n.º ...2 da petição inicial (v. documento n.º ...3 da petição inicial) constitui um dano emergente que surgiu no património do A./Recorrente em consequência directa dos incumprimentos da R./Recorrida R..., pelo que, nos termos do art. 562.º do CC e do art. 12.º, n.º 1, da Lei n.º 24/96, de 31 de julho (conjugados com o art. 799.º, n.º 1 do CC e o art. 12.º, n.º 2, da Lei n.º 24/96, de 31/07), tem direito a ser indemnizado pela R./Recorrida em quantia equivalente a esse custo que suportou.
Assim, em função das requeridas alterações à matéria de facto, propugna pela parcial revogação da decisão recorrida e alteração por outra que julgue parcialmente procedente o pedido n.º 9 da petição inicial (seja por nulidade fundada em omissão de pronúncia, seja por erro de julgamento - cf. art. 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC) e que, em consequência, condene a R./Recorrida R... a pagar-lhe a quantia de € 7.389,47, correspondente ao preço cobrado pela E... ao A./Recorrente pela elaboração do relatório junto como Documento n.º ...2 da petição inicial, a título de danos patrimoniais, acrescida dos respetivos juros de mora, desde a data de vencimento de tal crédito indemnizatório (coincidente com a data da prática do facto ilícito – 19/11/2014) até efetivo e integral pagamento.
Desde já se dirá que, ao contrário do pugnado pelo A./recorrente, a sentença recorrida não enferma de nulidade por omissão de pronúncia, visto que o Exmo Juiz “a quo” não deixou de se pronunciar sobre a pretensão em apreço, ao concluir, ainda que reportado à globalidade dos pedidos formulados, que “[o]s pedidos de indemnização por danos patrimoniais improcedem por ausência de factualidade que os sustentem”.
Afastada a invocada nulidade da sentença, resta apreciar e decidir se a sentença recorrida não enfermará de erro de julgamento ao ter decidido nos termos em que o fez.
Como é sabido, só são indemnizáveis os danos que resultem do incumprimento do contrato.
Não basta, pois, que a parte sofra dano, é preciso que esta lesão passe a existir a partir do acto do devedor para que haja o dever de reparação. É imprescindível o estabelecimento duma relação causal entre o acto omissivo ou comissivo do agente – no caso o incumprimento do contrato – e o dano de tal forma que aquele acto seja considerado como causa jurídica do dano.
Não há que ressarcir todos os danos que sobrevenham ao facto ilícito (ao cumprimento defeituoso), mas tão só os que se possam considerar-se pelo mesmo produzidos. O requisito do nexo de causalidade entre o facto e o dano desempenha, consequentemente, a dupla função de pressuposto da responsabilidade civil contratual e de medida da obrigação de indemnizar[124].
Dispõe o art. 563º do CC que a “obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.
É entendimento quase unânime na doutrina que o citado normativo acolhe a teoria da causalidade adequada.
Esta pode assumir duas formulações: i) a formulação positiva, mais restrita, cuja verificação pressupõe que se responda afirmativamente a duas questões: a ação efetivamente produziu o evento dano e é normal, segundo as regras da experiência comum, que aquele tipo de ação, naquelas circunstâncias, produza aquele tipo de resultado. O que está em causa é um juízo de prognose póstuma ou posterior, mediante o qual se averigua da possibilidade do dano, tendo em conta as circunstâncias concretas conhecidas do agente e cognoscíveis por um homem médio; ii) a formulação negativa, mais abrangente do que a positiva, que considera existir nexo de causalidade “desde que a ação/inação imputável ao agente se tenha posto como sua condição sine qua non (…) a menos que a lesão se haja concretizado por circunstâncias manifestamente excecionais[125].
É preciso demonstrar que foi o facto ilícito (incumprimento) que provocou o dano e que, em abstracto, ele era adequado a esse resultado.
Como fundamentou o Ac. do STJ de 11/05/2000[126], “para que um facto seja causa de um dano é necessário, antes do mais, que no plano naturalístico, ele seja condição sem o qual o dano não se tem verificado”, sendo ainda necessário que, “em abstracto ou em geral, seja causa adequada do mesmo”.
O facto deixa, pois, de ser causa adequada do dano sempre que, “segundo a natureza geral, era de todo indiferente para a produção do dano e só se tornou condição dele em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, sendo portanto inadequado para esse dano[127].
Tendo presente estas asserções, havemos de convir que o relatório pericial solicitado pelo A. à “E..., S.A.” só foi pedido a fim de analisar o estado da construção da moradia que adquiriu à Ré R..., para verificar se a mesma padecia de algum vício de construção ou qualquer outro defeito, ou seja, como instrumental ou preparatório para instruir acção judicial a intentar (como é o caso da presente). Portanto, o nexo de causalidade estabelece-se com a acção e só mais remotamente com o incumprimento do contrato.
Admite-se que o relatório pericial terá permitido ao demandante delinear a pretensão que deduziu nestes autos, de forma devidamente sustentada naquele meio de prova.
Trata-se, porém, de um custo suportado em função da pretensão indemnizatória deduzida. É, pois, despesa contraída para obtenção de prova destinada a preparar e instruir a presente ação. Portanto, o nexo de causalidade estabelece-se com a instauração da acção e só remotamente com o cumprimento defeituoso do contrato.
Acresce que, de acordo com o disposto no art. 529º, n.º 4 e no art. 553º, n.º 2, al. b) do CPC, tais despesas poderão caber no conceito de “custas de parte”, que “compreendem o que cada parte haja despendido com o processo”.
Afastado, assim, o nexo de causalidade, nesta parte, entre o facto (cumprimento defeituoso) e o pretendido “dano” (custo do relatório pericial), excluída resulta a condenação da R./Recorrida R... a pagar, a título de danos patrimoniais, a quantia de € 7.389,47, correspondente ao preço cobrado pela E... ao A./Recorrente pela elaboração do dito relatório, acrescida dos respetivos juros de mora, sendo de confirmar e manter a sentença impugnada que julgou improcedente essa pretensão.
*
7.3.3. Da nulidade/erro de julgamento da sentença por condicionar a determinação da redução do preço à possibilidade de reparação dos defeitos.
Defende o A./recorrente/subordinado que a sentença impugnada, ao impor uma limitação à redução do preço, fazendo-a depender da possibilidade de reparação dos defeitos de que padece o imóvel, contrariando a fundamentação nela exposta, enferma de nulidade nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1, alínea c), do CPC, ou, assim não se entendendo, sempre padecerá pelo menos de erro de julgamento (resultante da equivocada aplicação do direito, por violação do disposto no art. 4.º do Dec. Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, bem como nos arts. 884.º e 911.º do CC).

Na sentença recorrida foi decidido, na parte que ora releva, que:

Em face do exposto, julgo a acção proposta por AA contra R..., Lda., BB e CC (…), parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente condeno a Ré R..., Lda. a ver reduzido o valor sobrante do preço devido, de € 121.000,00, pela celebração do contrato mencionado na alínea a), do ponto II.1., em quantia a liquidar em execução de sentença, ao abrigo do disposto no artigo 608º, nº 2, do Código de Processo Civil, e que resultar a) da possibilidade de reparação, b) do custo da respectiva reparação e c) da eventual desvalorização do imóvel em face das seguintes patologias: (…)”.

O Tribunal “a quo”, em face da matéria fáctica apurada demonstrativa da existência dos defeitos de que o imóvel adquirido padecia e que são imputáveis à vendedora, deu assim provimento, ainda que parcial, à primeira das pretensões formuladas pelo A., consistente na redução do preço.

Sob a epígrafe “Direitos do consumidor”, estipula o art. 4º do Dec. Lei n.º 67/2003:

1 - Em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato.
(…)
4 - Os direitos de resolução do contrato e de redução do preço podem ser exercidos mesmo que a coisa tenha perecido ou se tenha deteriorado por motivo não imputável ao comprador.
5 - O consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais.
(…)».

Se o bem de consumo entregue não for conforme ao contrato, ao consumidor são reconhecidos os direitos de reparação ou substituição do bem, redução do preço ou resolução do contrato, independentemente de culpa do vendedor no cumprimento inexacto da obrigação de entregar o bem devido, conforme ao contrato (art. 3º).
São estes os remédios de que o comprador pode lançar mão quando o vendedor lhe entrega uma coisa não conforme, vale dizer, uma coisa não livre de defeitos no momento da entrega e não no momento da transferência do risco[128].
Como já anteriormente explicitámos, é de acolher o entendimento maioritário que defende a inexistência de hierarquia entre os vários direitos de que o consumidor dispõe em caso de desconformidade (sem prejuízo da limitação pela impossibilidade ou pelo abuso de direito).
Esse entendimento foi também o acolhido na sentença recorrida, na parte em que se menciona que “a escolha pela forma como o adquirente da obra pretende ser ressarcido da falta de conformidade do bem com o contrato é livre, estando apenas limitada pela respectiva possibilidade prática e técnica e pelo respeito pelos princípios da boa fé e dos bons costumes e pela finalidade económico-social do direito escolhido enquanto corolários intrínsecos do abuso de direito, logo, inexistindo hierarquia no uso do meio que se tem por adequado o adquirente pode exigir logo a redução do preço em vez da redução dos defeitos”.
O exercício do direito de redução do preço pressupõe que se mantém um interesse do consumidor de ficar com o bem, apesar dos defeitos verificados, resignando-se com a sua existência.
Mais do que visar o ressarcimento de um prejuízo, o direito de redução procura o restabelecimento do equilíbrio das prestações. Perante a má realização de uma das prestações, procura-se manter o contrato através da possibilidade de reajustamento da prestação correspectiva.
A redução do preço pode obter-se pela diminuição da quantia paga ou a pagar ou pela exigência de devolução do que foi pago a mais[129].
A redução deve ser equivalente à desvalorização do bem, ou à sua menor rentabilidade, provocada pelo vício ou desconformidade existente[130].
Como refere Jorge Morais Carvalho[131], “o diploma não contém qualquer elemento para a determinação do valor da redução, mas este deve ser apurado com recurso a critérios objetivos, não estando na dependência de uma avaliação subjetiva do valor da falta de conformidade pelo consumidor. Na falta de outros critérios, podem ser aplicadas as normas do CC que regulam a redução do preço no caso de venda que fica limitada a parte do seu objeto (art. 884.º), de venda de bens onerados (art. 911.º) e de empreitada defeituosa (art. 1222.º)”.
Ora, ao estabelecer como parâmetro de referência para a determinação do valor da redução do preço a possibilidade de reparação dos defeitos, o Exmo Juiz “a quo” acaba por introduzir uma limitação ao exercício daquele direito que não resulta da lei e que tão pouco foi peticionada por qualquer uma das partes.
Sufraga-se, portanto, a posição do A./recorrente quando conclui que, «dos vários critérios e/ou apontados para a determinação do valor da redução do preço em caso de vício e/ou desconformidade do bem, a possibilidade de reparação não é um deles».
Não enfermando da nulidade prevista na al. c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, a sentença nessa parte padece, sim, de erro de julgamento, impondo-se, em consequência, a sua revogação e substituição por outra que não condicione a redução do preço à possibilidade de reparação dos defeitos do imóvel.
*
7.3.4. Da nulidade/erro de julgamento da sentença referente ao pedido 1-a da petição inicial.
No pedido que formulou, em sede de ampliação do pedido, o A./Recorrente peticionou, em primeiro lugar, que fosse “declarado válido e eficaz o exercício do direito à redução do preço do contrato de compra e venda do imóvel por parte do A., ao abrigo do disposto nos artigos 1.º-A, n.º 1, 1.º-B, 2.º, n.ºs 1 e 2, 3.º, n.ºs 1 e 2, e 4.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, assim se declarando a redução do mesmo na quantia já líquida de € 148.509,52 e na que vier ainda a ser liquidada nos termos referidos nas alíneas infra[132].
Isto porque, segundo o por si alegado, o valor que o A./Recorrente considerava estar ainda em dívida, em virtude do contrato de compra e venda celebrado com a R./Recorrida, era apenas de € 92.000,00, alegando ter já pago o restante (€ 179.000,00); uma vez que o valor que considerava corresponder à redução do preço superava esse montante, o A./Recorrente conclui não só nada ter  a pagar à R./Recorrida, como ainda que deveria esta ser condenada, em decorrência do pedido de redução do preço, no pagamento ao A./Recorrente da quantia de € 56.509,52, «correspondente à diferença, a favor do A./Recorrente, entre o valor da redução do peço e o valor em dívida pelo A./Recorrente à R./Recorrida»[133].
Mais refere o A./recorrente que ao «peticionar que (i) fosse declarado válido e eficaz o direito do A./Recorrente à redução do preço, (ii) os Réus fossem condenados a pagar ao A./Recorrente a quantia, já líquida, de € 56.509,52 (…), e que (iii) os Réus fossem condenados a pagar ao A./Recorrente a quantia pecuniária, ainda ilíquida, equivalente à desvalorização causada no imóvel pelos defeitos elencados no artigo 111.º, pontos (iii) a (viii) da petição inicial (…), aquilo que o A./Recorrente pretendia era, portanto, ver o preço acordado pela venda do imóvel reduzido e ver a R./Recorrida condenada a pagar-lhe a diferença entre o valor da referida redução e o valor ainda em dívida pelo A./Recorrente, uma vez que o primeiro dos valores era consideravelmente superior ao segundo».
Cotejando a sentença recorrida verificamos que o Tribunal “a quo” entendeu não dispor dos elementos necessários para concretizar o valor correspondente à redução do preço, elementos esses que “dizem respeito à possibilidade de reparação das patologias, ao custo da respectiva reparação, à eventual desvalorização do imóvel em face dessas patologias, etc..”, pelo que, apesar de julgar procedente a redução do preço em função das patologias anteriormente elencadas, remeteu para liquidação de sentença, ao abrigo do disposto no art. 609º, n.º 2, do CPC, a concretização do referido valor a reduzir, acrescentando, “e sempre limitados pelo valor do pedido concreto”.
E, no segmento decisório, decidiu julgar a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente, condenou a Ré R... “a ver reduzido o valor sobrante do preço devido, de € 121.000,00, pela celebração do contrato mencionado na alínea a), do ponto II.1., em quantia a liquidar em execução de sentença, ao abrigo do disposto no artigo 609º, nº 2, do Código de Processo Civil, e que resultar a) da possibilidade de reparação, b) do custo da respectiva reparação e c) da eventual desvalorização do imóvel em face das seguintes patologias (…)” (sublinhado nosso).
Sucede que, ao restringir a redução do preço ao “valor sobrante do preço devido, de € 121.000,00”, o Exmo Juiz a quo” não atendeu à hipótese de o valor dessa redução do preço poder vir a ser superior ao valor a que o A./Recorrente foi condenado (em virtude da procedência do pedido reconvencional) a pagar à R./Recorrida [de € 121.000,00].
Ou seja, ainda que haja relegado para liquidação de sentença o apuramento concreto da redução do preço, ao limitar a redução do preço do contrato ao valor sobrante do preço devido, de € 121.000,00, fica excluída a hipótese de a R./Recorrida vir a ser condenada a pagar ao A./Recorrente o valor que porventura exceda (em função do que se vier a apurar em liquidação de sentença) o valor ainda em dívida pelo A./Recorrente à R./Recorrida.
Como já anteriormente explicitámos, a redução do preço pode obter-se pela diminuição do quantum a pagar ou pela exigência de devolução do que foi pago a mais[134]. Assim, no caso de o comprador ainda não ter pago o preço, a parte do preço a reduzir não será devida, por o valor do bem ser inferior ao acordado; mas se já tiver saldado o preço, apesar de indevida, a quantia paga em excesso corresponderá a um crédito que o consumidor detém sobre o vendedor, podendo exigir-lhe a correspectiva devolução de parte do preço pago.
Pois bem, ao condenar a R./Recorrida a ver reduzido “o valor sobrante do preço devido, de € 121.000,00”, pela celebração do contrato de compra e venda, e ao condenar o A./Recorrente a pagar esse mesmo valor à R./Recorrida, deduzido do valor que se apurar corresponder à redução do preço, o Tribunal “a quo” limitou o valor da redução do preço ao montante de € 121.000,00, sem ter atentado que o valor do pedido, na parte liquidada pelo A./recorrente, ascende a € 148.509,52.
O remédio da redução do preço sendo especialmente útil nos casos em que o preço ainda não foi (total ou parcialmente) pago, não é de excluir nas situações em que o preço já foi integralmente pago. Nestes casos, não tem oferecido dúvidas que o comprador, em função dos defeitos do bem adquirido, tem o direito a requer a redução do preço, materializado mediante a condenação do vendedor na devolução do montante correspondente.
Ora, embora no caso dos autos esteja comprovado que o A./recorrente não pagou a totalidade do preço da aquisição do imóvel, certo é que não é ainda seguro (por carecer de liquidação) o montante correspondente à redução do preço do contrato, o qual poderá ser superior, igual ou inferior ao valor ainda em dívida pelo A./Recorrente à R./Recorrida.
Serve isto para dizer que o critério acolhido na sentença recorrida para estabelecer, como limite da redução do preço, a quantia correspondente ao preço não pago pelo A./Recorrente carece de fundamento legal.
Salvo o devido respeito, não se trata de um causa de nulidade da sentença (art. 615º, n.º 1, al. c), do CPC), mas antes de um erro de julgamento.
Consequentemente, impõe-se, nessa parte a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que expurgue a referida limitação.
*
7.3.5. Da nulidade/erro de julgamento da sentença em virtude do valor devido pela R./recorrida ao A./recorrente pelo período em que se encontre privado de usar o imóvel em virtude da realização dos trabalhos de reparação.
Está em causa o segmento final do pedido formulado na petição inicial sob o item 9, no qual foi peticionado a condenação dos réus a pagar ao autor «(…) a quantia de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) por cada mês que o autor esteja privado do uso da casa em consequência da futura e necessária reparação da moradia acima referida (…)».
Antes de mais, e de um modo conciso, importa referir que, contrariamente ao propugnado pelo A./recorrido, quanto à pretensão em apreço não se verificam as apontadas nulidades da sentença (als. c) e d) do n.º 1 do art. 615º do CPC), visto o Tribunal recorrido ter sido explícito ao concluir pela improcedência dos pedidos de indemnização por danos patrimoniais, por ausência de factualidade que os sustentem.
Diverso é saber se não terá ocorrido erro de julgamento, mercê de uma errada subsunção dos factos ao direito aplicável ou de uma errada interpretação e aplicação das normas jurídicas, o que nos propomos apreciar de seguida.
Com relevo, resulta demonstrado que, para reparar e corrigir as situações elencadas de ll) a www) [patologias, defeitos, vícios e desconformidades], a casa deverá ser esvaziada e durante as obras não poderá ser habitada (cfr. al. dddd) dos factos provados).
Mais se provou que o Autor pretendeu e utiliza o referido imóvel como sua residência (cfr. al. l) dos factos provados).
Estamos perante um dano patrimonial futuro, consistente na privação do uso do imóvel, decorrente da impossibilidade temporária, a fim de proceder à reparação e correcção dos defeitos, por acto de outrem, de alguém dispor e fruir de um bem que lhe pertence.
Como se explicitou no Ac. do STJ de 17/11/2021 (relator António Barateiro Martins), in www.dgsi.pt., quando falamos da “privação do uso” – e do “dano da privação do uso” – estamos a falar do prejuízo resultante da falta de utilização de um bem (da impossibilidade temporária de usar um bem) que integra o património do lesado; estamos a falar da privação do uso, só por si, como um dano autónomo e patrimonial suscetível de avaliação; estamos a falar daquelas situações em que a privação do uso não origina uma verdadeira diferença patrimonial.
Dúvidas não há de que a privação injustificada do uso de uma coisa pelo respetivo titular constitui um ilícito suscetível de gerar a obrigação de indemnizar, uma vez que, na normalidade dos casos, impedirá o seu proprietário do exercício dos direitos inerentes à propriedade, isto é, impede-o de usar a coisa, de fruir as utilidades que ela normalmente lhe proporcionaria, enfim, impede-o de dela dispor como melhor lhe aprouver (art. 1305º do C.C.)[135].
Como tem sido defendido[136], nos casos em que a privação do uso dos bens imóveis derive da prática de acto ilícito, pode ser formulado o pedido de indemnização, como forma de repor a situação anterior e de reparar os prejuízos decorrentes da privação.
Nestes casos, se se provar que a indisponibilidade foi causa direta de prejuízos resultantes da redução ou perda de receitas, da perda de oportunidades de negócio ou da desvalorização do bem, não se questiona o direito de indemnização atinente aos lucros cessantes.
Mas mesmo que nada se prove a respeito da utilização ou do destino que seria dado ao bem, o lesado deve ser compensado monetariamente pelo período correspondente ao impedimento dos poderes de fruição ou de disposição.
Não é imprescindível que o lesado invariavelmente alegue e prove a existência de danos efetivos, por exemplo, os derivados da perda de rendas ou do aumento das despesas.
Decerto tais danos podem ser invocados. E, uma vez provados, podem servir para, com mais rigor, quantificar a indemnização ou permitir a atribuição de um quantitativo superior.
Porém, a simples falta de prova (ou de alegação) desses danos concretos não conduz necessariamente à denegação da pretensão indemnizatória. Sem embargo da prova que possa ser feita da total ausência de danos, não deve descartar-se o recurso à equidade para encontrar, no balanceamento dos factos e das regras de experiência, um valor razoável e justo.
Continuando a socorrer-nos do citado estudo de Abrantes Geraldes[137], afirma este autor que: "Exigem frequentemente os tribunais aquilo que, em termos de razoabilidade, não é exigível ou não ê materialmente comprovável. Ou elevam a tal nível a fasquia em matéria de formação da convicção que o ónus da prova se transfigura em prova diabólica, deixando por reconhecer situações que o senso comum francamente admite.
Em suma, parte-se da excepção para afirmar a regra. Pretende-se que determinadas actuações ou intenções que a experiência revela serem excepcionais sirvam para integrar os comportamentos regra. Olvida-se, além do mais, que, recaindo sobre o credor o ónus da prova da ocorrência dos danos, a lei não trata com total indiferença o devedor, onerando-o com a prova dos factos impeditivos ou com a contraprova de factos susceptíveis de gerar uma situação de dúvida (art°s 342°, n° 2, e 346° CC).
Por detrás deste "manto diáfano da fantasia", a verdade que se evidencia quando os tribunais, como a sociedade o exige, se pautam por critérios de normalidade, revela-nos que, por regra, não é indiferente que um bem entre na posse efectiva do adquirente na data acertada ou apenas 2 ou 5 anos depois, tal como não é inócuo que a aquisição do direito de propriedade, acompanhado da fruição, se concretize na data ajustada ou muito mais tarde (...).
É a esta normalidade da vida que deve atender-se quando se trata de apreciar as situações, em vez de aferir o critério valorativo a partir de situações excepcionais, supondo, por exemplo, sem a necessária confirmação, que o proprietário, ao assumir a vontade de adquirir, pretendeu tão só aumentar o seu património imobilizado ou alcançar mais valias unicamente derivadas da valorização do imóvel.
Pode dizer-se, pois, que nas situações assinaladas, uma dilação excessiva na aquisição da propriedade e na consequente disponibilidade material e jurídica do bem não deixará de constituir uma perturbação da relação entre o credor e o seu património, privando-o do seu uso normal e das correspondentes utilidades que poderiam ser proporcionadas, que, em regra, não pode deixar de ser monetariamente compensado[138].
Tal como exposto, entende-se que a privação do uso e fruição de um bem sofrida pelo seu titular ou detentor, em consequência de um facto ilícito de outrem, exprime o próprio evento danoso que se projecta sobre o património do lesado – que se vê impossibilitado de retirar as utilidades económicas que entender de um bem que lhe pertence – e que é gerador da obrigação de indemnizar (arts. 562º, 566º e 1305º, do CC).
Saliente-se, contudo, que a regra geral do art. 566º, n.º 2, do CC – teoria da diferença – não pode ser aplicável ao dano de privação de uso, na medida em que “a comparação entre a situação patrimonial real e a situação patrimonial hipotética do lesado, na data mais recente que puder ser atendida [se] adequa a privações definitivas e não a privações limitadas no tempo[139].
Deste modo, a indemnização pelo dano de privação de uso terá de ser fixada de acordo com a equidade (art. 566º, n.º 3 do CC)[140].
 Contudo, no caso em apreço, a facticidade apurada é escassa, posto não resultarem dos autos os elementos necessários para determinar, com segurança e objetividade, o montante do dano da privação do uso.
Sendo assim, impondo-se a procedência do pedido indemnizatório em apreço atinente à privação do uso do imóvel em virtude da realização dos trabalhos de reparação, é de remeter a respetiva quantificação para liquidação de sentença, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 609.º do CPC.
Procede, assim, este fundamento da apelação subordinada.
*
7.3.6. Da nulidade da sentença referente ao pedido de litigância de má-fé formulado pelo A./recorrente no apenso A.
No âmbito do processo n.º 638/16...., entretanto apensado aos presentes autos[141] e correspondente ao atual apenso A, o aqui A./Recorrente (aí Réu) deduziu, na respetiva contestação, um pedido indemnizatório contra os aí Autores, BB e CC (aqui Réus), tendo requerido a sua condenação “como litigantes de má fé, em multa e a indemnizar o R. em quantia nunca inferior a € 10.000,00”.
Alegou para o efeito que os aí Autores deduziram uma pretensão baseada em factos que não são verdadeiros, já que nunca entregaram ao R. a quantia pecuniária cuja restituição reclamaram (nem qualquer outra) e, por isso, conheciam bem a falta de fundamento dessa mesma pretensão (arts. 194.º a 197.º da respetiva contestação).

Na sentença recorrida resultou provado que:

- Apesar de terem declarado no título referido em a) que o preço a pagar pela venda do imóvel aí descrito seria de € 150.000,00, as partes contratantes – AA e R... - acordaram que o preço a pagar seria de € 271.000,00 [al. g) dos factos provados];
- E, por isso, celebraram e assinaram o acordo descrito em b) [al. h) dos factos provados];
- Não tendo os Réus BB e CC entregado ao Autor a quantia que surge mencionada no título descrito em b) [al. i) dos factos provados];
-  Pretendendo as partes, com tal acordo, descrito em b), acordar quanto ao valor do preço que faltava pagar, a forma e o tempo de pagamento, tendo  por referência o valor global acordado de compra e venda do imóvel descrito em a) de € 271.000,00 [al. j) dos factos provados];
- E, declarando o que declararam no título descrito em a), evitar o pagamento de imposto devido à Fazenda Nacional, sobre a parcela do valor acordado para lá do declarado [al. k) dos factos provados];

E, atentando na motivação fundamentadora da decisão de facto da sentença recorrida, dela consta, entre o mais, que:
 “A convicção do Tribunal relativamente à factualidade constante das alíneas j) e k) assentou na valoração dos depoimentos dos Réus BB e CC e do Autor, tendo estes assumido que o valor acordado ascendeu a € 271.000,00, sendo certo que a Ré CC admitiu que o valor formalmente declarado se destinou a obter benefícios fiscais, furtando a outra parcela do valor ao cálculo dos impostos a pagar pela transmissão”;
E, no tocante à concretização da convicção formada quanto à matéria de facto dada como não provada, o Tribunal “a quo” explicitou, na parte que ora releva, que:
«Em quinto lugar, para referir da total falta de credibilidade dos elementos de prova juntos autos para fundamentarem a alegada e apelidada pelos Réus de cessão de créditos, alegadamente celebrada entre a sociedade Ré e os seus sócios, também aqui Réus, consubstanciada numa mera cópia de acta, sem qualquer certificação e sem a companhia de qualquer elemento contabilístico credível e evidente que descrevesse a situação alegada (suprimentos à sociedade feitos pelos sócios), já para não falar da contradição que a dedução da reconvenção pela Ré sociedade consubstanciou, s.m.o., de forma insanável».
E, em sede de enquadramento jurídico, aduziu a seguinte fundamentação:
«Quanto ao acordo descrito na alínea b), do ponto II.1., estamos perante uma simulação absoluta, uma vez que as partes nenhum negócio quiseram celebrar – cfr. artigo 240º, nº 1, do Código Civil. Com efeito, o que as partes quiseram celebrar foi uma compra e venda pelo valor de € 271.000,00, não tendo querido o Autor confessar qualquer dívida ou a Ré emprestar qualquer quantia ao Autor, como não emprestou. Estamos, pois, perante um negócio nulo. A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo Tribunal – cfr. artigo 286º, do Código Civil. O negócio nulo não produz, ab initio, os efeitos a que tendia e uma vez que nada foi prestado no âmbito deste acordo – o da alínea b), do ponto II.1. -, nada há para restituir – cfr. artigo 289º, do Código Civil».
Por isso, quanto à pretensão deduzida no apenso A., considerando que a causa de pedir em que assentava o peticionado pelos Autores BB e CC, aqui Réus, na acção apensa, foi já declarado nulo e de nenhum efeito, julgou a acção totalmente improcedente.
Sucede que, no tocante ao pedido de condenação como litigantes de má-fé dos Autores que ali havia sido formulado pelo Réu, a sentença recorrida não se pronunciou.
Independentemente da decisão tomada quanto ao mérito da causa, impunha-se o conhecimento daquela questão incidental.
Não o tendo feito, a sentença recorrida enferma, nessa parte, de nulidade, por omissão de pronúncia [art. 615º, n.º 1, al. d), 1ª parte, do CPC].
Procedendo a nulidade arguida pelo A./recorrente, nada obsta a que este Tribunal de recurso, substituindo-se ao tribunal recorrido (art. 665º do CPC), se pronuncie sobre a pretensão em apreço que faz parte do objeto do recurso, sendo certo que as partes tiveram já oportunidade de exercer o direito ao contraditório [uma vez que a questão foi colocada em sede de alegações de recurso pelo A./recorrente, que, ao argui-la, não podia deixar de integrar (como, de resto, não deixou), de forma imediata, os fundamentos dessa impugnação, sendo que os recorridos tiveram oportunidade de quanto a essa matéria se pronunciar nas contra-alegações a apresentar, o que não fizeram por razões a si imputáveis), razão por que decide-se pela não observância da audição enunciada no n.º 3 do art. 665º[142].
*
7.3.7. – Da verificação dos pressupostos da condenação como litigantes de má-fé dos AA. no processo n.º 638/16...., apensado aos presentes autos.

Diz-se litigante de má-fé, segundo o disposto pelo art. 542º, n.º 2 do CPC, «quem, com dolo ou negligência grave:

a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente, reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão».

Tendo litigado de má-fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização, a favor da parte contrária, se esta a pedir, nos termos do disposto no artigo 542º, n.º 1, do CPC.
Para não caírem no âmbito de aplicação dos normativos ora acabados de transcrever e nas correlativas sanções previstas para o efeito, as partes deverão litigar com a devida correção, ou seja, no respeito dos princípios da boa-fé e da verdade material e, ainda, na observância dos deveres de probidade e cooperação expressamente previstos nos arts. 7º e 8º do CPC, para assim ser obtida, com eficácia e brevidade, a realização do direito e da justiça no caso concreto que constitui objeto do litígio.
A má-fé representa uma modalidade de dolo processual que consiste na utilização maliciosa e abusiva do processo. É o dolo processual unilateral (sem conluio entre as partes), distinguindo-se do dolo processual bilateral, que corresponde à figura do processo simulado (art. 612º do CPC)[143].
A má-fé traduz-se, em última análise, na violação do dever de cooperação e de boa-fé que os arts. 7º, 8º, e 542º, n.º 2, al. c) do CPC impõem às partes.
Aliás, no intuito de moralizar a atividade judiciária, o art. 542º, n.º 2, do citado diploma legal, oriundo da revisão de 1995, alargou o conceito de má fé à negligência grave, posto que, enquanto anteriormente a condenação como litigante de má-fé pressupunha uma atuação dolosa, isto é, com consciência de se não ter razão, a conduta processual da parte está, hoje, sancionada, civilmente, desde que se evidencie, por manifestações dolosas ou caracterizadoras de negligência grave (lides temerárias e comportamentos processuais gravemente negligentes).
Explica António Geraldes[144] que “é neste contexto, concerteza fruto da degradação dos padrões de actuação processual e do uso dos respectivos instrumentos que, a par do realce dado ao princípio da cooperação e aos deveres da boa fé e de lealdade processuais, surge a necessidade de ampliar o âmbito de aplicação do instituto, assumindo-se claramente que a negligência grave também é causa de condenação como litigante de má fé”.
O elemento subjetivo da litigância de má-fé foi, por conseguinte, ampliado pelo legislador, passando a sancionar não apenas o comportamento intencional, mas também aquele que, de modo gravemente negligente, não obedece aos deveres de cuidado impostos pelo dever de correção processual, acabando por não tomar consciência de factos que, de outro modo, teria conhecimento.
Portanto, passou a exigir-se dos litigantes, para que sejam considerados de boa-fé, não apenas que declarem aquilo que subjetivamente consideram verdade, mas aquilo que considerem verdadeiro após cumprirem os mais elementares deveres de prudência e cuidado, impostos pelo princípio da boa-fé processual.
Sobre as partes passa a recair um dever de pré-indagação da realidade em que fundam a sua pretensão ou defesa. Tal dever não se apresenta, porém, como um dever de indagação total, um dever de escrutínio absoluto, mas sim como uma indagação que tome em conta os mais elementares deveres de cuidado, isto é, aqueles que só podem ser desrespeitados por um sujeito que atue de modo gravemente negligente, e que não obedeça a qualquer regra de prudência ou ponderação antes de recorrer ao processo.
Desta feita, poderá – e deverá - ser responsabilizado como litigante de má-fé não só aquele que profere declarações contrárias ao que subjetivamente sabe ser verdade, mas também aquele que apenas se encontra subjetivamente convencido da verdade de um facto inexistente ou inveracidade de um facto verdadeiro, porque desrespeitou o mínimo de diligência que lhe era exigido, recorrendo ao processo de modo totalmente leviano e imprudente. Do mesmo modo, tanto poderá ser considerado de má-fé aquele que oculta um facto essencial do qual tem perfeito conhecimento, como aquele que não podia deixar de o conhecer caso tivesse empregado o mínimo de diligência exigível a quem atua em juízo. Com efeito, se uma certa incerteza é característica do próprio processo, essa incerteza não poderá ser tal que resulte apenas de uma atuação gravemente negligente na recolha do material fáctico da causa[145].
A má-fé, de que trata o n.º 2 do art. 542º do CPC, pode ser substancial (ou material) ou instrumental (ou processual). A má-fé substancial diz respeito ao fundo da causa e abrange os casos de dedução do pedido ou de oposição cuja falta de fundamento se conhece [al. a)] e a alteração consciente da verdade dos factos ou omissão de factos essenciais [al. b)]; será má-fé instrumental se a sua atuação se reconduzir a omissão grave do dever de cooperação [al. c)] ou se disser respeito ao uso reprovável do processo, ou de meios processuais para conseguir um fim ilegal, para entorpecer a ação da justiça, impedir a descoberta da verdade ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão [al. d)] e, ainda, nos termos do n.º 1 do art. 670º, se a parte «com determinado requerimento, obstar ao cumprimento do julgado ou à baixa do processo ou à sua remessa para o tribunal competente».
Com a enunciação legal dos comportamentos de má-fé o legislador procurou, quanto aos elementos objetivos, ser o mais exaustivo possível, dando origem a que qualquer violação do dever de boa-fé se possa subsumir, sem margem para dúvidas, a pelo menos mais do que uma das categorias elencadas[146].
Não deve, porém, confundir-se a litigância de má-fé com[147]:
- a dedução de pretensão ou oposição cujo decaimento sobreveio por mera fragilidade da sua prova, por a parte não ter logrado convencer da realidade por si trazida a julgamento;
- a eventual dificuldade de apurar os factos e de os interpretar;
- a discordância na interpretação e aplicação da lei aos factos, a diversidade de versões sobre certos e determinados factos ou até na defesa convicta e séria de uma posição, sem contudo a lograr convencer.
Para efeitos da escolha da forma de ressarcimento mais ajustada ao caso concreto a lei limita o juiz a ponderar a gravidade da conduta do litigante, sendo indiferente, para o caso, a condição económica das partes (nomeadamente se litigam ou não com apoio judiciário), os efeitos da litigância de má-fé, a natureza ou o valor da ação[148].     
A conclusão pela actuação da parte como litigante de má-fé será sempre casuística, variando consoante o meio e objecto processuais e a conduta concreta das partes no desenrolar do processo[149], não se deduzindo mecanicamente da previsibilidade legal das alíneas do nº 2 do art. 542º.
De acordo com a interpretação que se vem fazendo do citado preceito, a responsabilização e condenação da parte como litigante de má-fé só deverá ocorrer quando se demonstre nos autos, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu, conscientemente, de forma manifestamente reprovável, com vista a impedir ou a entorpecer a acção da justiça.
Para a condenação como litigante de má-fé exige-se, por conseguinte, que se esteja perante uma situação donde não possam surgir dúvidas sobre a actuação dolosa ou gravemente negligente da parte.
Por isso, o tipo subjectivo da litigância de má-fé apenas se preenche em caso de dolo ou culpa grave.
Revertendo ao caso dos autos, e para além dos supra enunciados elementos relevantes para a decisão sobre o peticionado incidente de litigância de má-fé, há que ter também presente que, no âmbito do articulado da resposta deduzida no processo n.º 638/16...., os aí Autores prontamente esclareceram que o peticionado montante de 121.000,00 se reportava ao remanescente do preço que faltava por liquidar do contrato de compra e venda ajustado entre o aí R. (comprador) e a R..., posto que a venda havia sido feita pelo montante de 271.000,00 € e aquele, na data da outorga do respetivo contrato, apenas procedeu ao pagamento da quantia de 150.000,00 €.
Portanto, logo aí os Autores do processo n.º 638/16.... reconheceram não ter entregue ao aí R. a quantia de 121.000,00 que surge mencionada no apelidado contrato de confissão de dívida outorgado em 19/11/2014 e que consta de fls. 58v a 59.
Isso mesmo foi reiterado pelos Autores, BB e CC, em sede de depoimentos de parte prestados em audiência de julgamento, onde expressamente referiram que nunca emprestaram dinheiro ao Réu, mantendo e reiterando a posição já reconhecida naquele articulado da resposta.
Reconhece-se que, ao intentarem o processo n.º 638/16...., podiam e deviam os AA. desde logo ter relatado circunstanciadamente os factos, alegando todas as circunstâncias e vicissitudes contratuais inerentes à origem e formação do crédito de que se arrogavam sobre o ali Réu, o que não fizeram.
Contudo, não obstante essa censura que lhes pode ser dirigida, não menos certo é que, posteriormente, ainda no âmbito do processo n.º 638/16...., os AA. cuidaram de esclarecer, na sua óptica, os factos concretamente vivenciados, postura processual essa que reiteraram em audiência de julgamento, ao invés de persistirem na defesa de uma versão factual que bem sabiam não corresponder à verdade dos factos.
Sendo assim, malgrado terem incorrido numa lide imprudente, prestes a raiar a negligência grave, sobrelevando-se aquela postura processual activa subsequente no sentido do acertamento ou aproximação à verdade dos factos, ao invés de terem persistido na adulteração dos factos trazidos a juízo, entende-se que os elementos disponíveis nos autos não permitem sancionar civilmente o recorridos BB e CC como litigantes de má-fé.
Nesta conformidade, não se mostrando ultrapassados no caso sub júdice os limites da “litigiosidade séria[150], assim se inverificando os pressupostos da condenação dos AA. do processo apenso n.º 638/16...., nos termos e para os efeitos dos art. 542º do CPC, julga-se improcedente a pretensão de litigância de má-fé deduzida naquele processo pelo A./Recorrente (aí Réu).
*
7.3.8. Das custas.
De acordo com o disposto no art. 527º, n.º 1 do CPC, a decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito., acrescentando o n.º 2 que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
Como o recurso independente foi julgado improcedente, as respetivas custas são integralmente da responsabilidade da ré/recorrente.
Como o recurso subordinado foi julgada parcialmente procedente, quer o recorrente AA, quer a recorrida R..., Lda ficaram parcialmente vencidas no recurso.
Na parte líquida, tendo havido decaimento integral, são as mesmas da responsabilidade do autor.
Na parte ilíquida, impõe-se ter presente que, relativamente aos pedidos líquidos formulados, pelo recorrente subordinado, sendo a condenação genérica, o Autor e a ré R..., ao ficarem vencidos por decaimento, são responsáveis pelo pagamento das custas, provisoriamente e em partes iguais, em conformidade com a regra da causalidade consagrada no art. 527.º, n.º s 1 e 2, do CPC[151].
*
*
VI. DECISÃO

Perante o exposto acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em:

i) rejeitar a junção do documento apresentado pela Ré/recorrente com as alegações de recurso;
ii) condenar a Ré/recorrente numa multa equivalente a 1 (uma) UC – art. 443º, n.º 1, do CPC e art. 27.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais;
iii) - Julgar improcedente o recurso de apelação independente interposto pela ré;
iv) - Julgar parcialmente procedente o recurso subordinado interposto pelo Autor e, em consequência, revogando parcialmente a sentença recorrida, decidem:
a) Julgar a acção proposta por AA contra R..., Lda., BB e CC, parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente, condena-se a Ré R..., Lda a ver reduzido o preço do contrato de compra e venda do imóvel por parte do autor, em quantia a liquidar em incidente póstumo à sentença, ao abrigo do disposto no artigo 609º, nº 2, do Código de Processo Civil, e que resultar do custo da respectiva reparação e da eventual desvalorização do imóvel em face das patologias elencadas nos factos provados sob as als. ll) a www) e als. eeee) a llll) da sentença recorrida, acrescido de juros contados à taxa legal de 4% desde 04.10.2016 até integral e efectivo pagamento[152].
b) Julgar parcialmente procedente a parte final do pedido n.º 9 formulado na petição inicial e, em consequência, condena-se a R./Recorrida R... a pagar ao A./Recorrente, por cada mês que o A./Recorrente esteja privado do uso do imóvel de que é proprietário e durante o período em que durar a reparação dos defeitos de que o mesmo padece, uma quantia a liquidar em incidente subsequente à sentença, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 609.º do CPC.
c) Julgar improcedente o pedido de condenação como litigantes de má-fé dos AA. do processo apenso n.º 638/16....;
iv) - Quanto ao mais, confirmar a sentença recorrida.
*
Custas do recurso independente a cargo da Ré/recorrente.
Custas do recurso subordinado (quanto à parte líquida) a cargo do Autor; quanto à parte ilíquida, fixam-se as mesmas, provisoriamente, em partes iguais, a cargo do Autor e da Ré, a corrigir em função do que resultar da posterior liquidação.
*
Guimarães, 4 de maio de 2023

Alcides Rodrigues (relator)
Joaquim Boavida (1º adjunto)
Paulo Reis (2º adjunto)



[1] Cfr. fls. 1347 v.º a 1353 dos autos.
[2] Segundo Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, constituem exemplos de impossibilidade de apresentação o de o documento se encontrar em poder da parte ou de terceiro, que, apesar de lhe ser feita a notificação, nos termos do artigo 429.º ou 432.º do CPC só posteriormente o disponibiliza, ou quando a certidão de documento arquivado em notário ou outra repartição pública, atempadamente requerida, só posteriormente é emitida ou no caso de a parte só posteriormente ter conhecimento da existência do documento [cfr. Código de Processo Civil Anotado, vol. 2.º - Artigos 362.º a 626.º, Almedina, 3.ª ed., 2017, p. 243].
[3] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª ed., Almedina, p. 229.
[4] Cfr. Ac. do STJ de 17/06/2021 (relatora Maria do Rosário Morgado) e Acs. da RP de 02.03.2017 (relatora Paula Leal de Carvalho), de 15/05/2017 (relator Jerónimo Freitas), de 10/10/2016 (relator Jerónimo Freitas), de 13/03/2017 (relator Nelson Fernandes), todos in www.dgsi.pt., e Jaime Octávio Cardona Ferreira, Guia de Recursos em Processo Civil, Atualizado à luz do CPC de 2013, 6ª ed., Coimbra Editora, p. 177.
[5] Cfr. João Espírito Santo, O Documento Superveniente para efeito de recurso ordinário e extraordinário, Almedina, pág. 47.
[6] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, obra citada, pp. 229/230, António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I - Parte Geral e Processo de Declaração, Almedina, 2018, p. 786, Alberto dos Reis, Código Processo Civil Anotado, vol. IV, p. 10 e Antunes Varela, R.L.J., ano 115, p. 94; Acórdãos do STJ de 27/06/2000, in CJ/STJ, ano VIII, T. II, p. 131 e de 18/02/2003, in CJ/STJ, ano XI, T. I, p. 103, Ac. da RG de 13/06/2019 (relatora Raquel Tavares), in www.dgsi.pt.
[7] Cfr. Manual de Processo Civil, 2.ª Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora, 1985, pp. 531 a 534.
[8] Cfr. Ac do STJ de 26/09/2012 (relator Gonçalves Rocha), in www.dgsi.pt.,           
[9] Cfr. conclusão 5ª da apelação.
[10] Que é o caso quando se pretende sindicar a admissão ou rejeição de um meio de prova.
[11] Cfr. conclusão 8ª do recurso independente.
[12] Cfr. conclusão 10ª do recurso independente.
[13] Cfr. conclusão 11ª do recurso independente.
[14] Cfr. Ac. da RP de 24/01/2018 (relator Nélson Fernandes), in www.dgsi.pt. e Paulo Ramos Faria e Ana Luísa Loureiro, in Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, vol. I, 2ª ed., 2014, Almedina, pp. 598/601.
[15] Cfr. Ac. do STJ de 17/10/2017 (relator Alexandre Reis), Acs. da RG de 4/10/2018 (relatora Eugénia Cunha) e de 5/04/2018 (relatora Eugénia Cunha), todos disponíveis in www.dgsi.pt. e Ac. do STJ de 1/4/2014 (relator Alves Velho), Processo 360/09, Sumários, Abril/2014, p. 215, https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/sumarios-civel-2014.pdf.
[16] Cfr. Manual de Processo Civil, 2.ª Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora, 1985, p. 686.
[17] Cfr., entre outros, Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 1984, Coimbra Editora, p. 140, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª ed., Almedina, p. 736, Paulo Ramos Faria e Ana Luísa Loureiro, obra citada, p. 603.
[18] Cfr. Acs. da RP de 28/10/2013 (relator Oliveira Abreu) e de 2/05/2016 (relator Correia Pinto), ambos disponíveis in www.dgsi.pt.
[19] Cfr. Ac. do STJ de 16/02/2016 (relator Sebastião Póvoas), in www.dgsi.pt.
[20] Cfr. Ac. do STJ de 2/06/2016 (relatora Fernanda Isabel Pereira), in www.dgsi.pt.
[21] Como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, é frequente a “confusão entre nulidade da decisão e discordância quanto ao resultado, entre a falta de fundamentação e uma fundamentação insuficiente ou divergente da pretendida ou mesmo entre a omissão de pronúncia (relativamente a alguma questão ou pretensão) e a falta de resposta a algum argumento dos muitos que florescem nas alegações de recurso” (cfr. Código de Processo Civil Anotado, Vol. I (…), p. 737).
[22] Cfr., António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I - Parte Geral e Processo de Declaração, Almedina, p. 718.
[23] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª ed., Almedina, pp. 291/293.
[24]  Cfr. Henrique Antunes, “Recurso de apelação e controlo da questão de facto”, Colóquio (sobre o novo CPC), acessível através de www.stj.pt.
[25] No sentido de que no processo civil a insuficiência da decisão de facto, quando isso faz com que esta, por essa razão, seja "deficiente", se enquadra no disposto no art. 662.º, n.º 2, al. c) do CPC [cfr. Ac. do STJ de 22/03/2018 (relator Tomé Soares Gomes), Ac. RC de 20/01/2015 (relator Henrique Antunes), Ac. RP de 16/12/2015 (relator Manuel Domingos Fernandes), Ac. RL de 16/03/2016 (relator António Alves Duarte) e Ac. da RG de 13/05/2021 (relator Beça Pereira), todos in www.dgsi.pt.], conhecendo logo o tribunal “ad quem” a matéria de facto em causa se o processo já reunir os elementos necessários para esse efeito; tal vício não se traduz, assim, na nulidade da sentença prevista na al. d) [nem na al. b)] do n.º 1 do art. 615.º do CPC.
[26] Cfr. Ac. do STJ de 06/06/2018 (relator Ferreira Pinto), in www.dgsi.pt.
[27] Cfr. Abrantes Geraldes, Recursos (…), pp. 155/156.
[28] Cfr. Ac. do STJ de 3/03/2016 (relatora Ana Luísa Geraldes), in www.dgsi.pt. e Lopes do Rego, in Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. I, 2ª ed., 2004, Almedina, p. 465.
[29] Cfr. Acs. do STJ de 19/02/2015 (relator Manuel Tomé Soares Gomes) e de 3/03/2016 (relatora Ana Luísa Geraldes), ambos consultáveis in www.dgsi.pt.
[30] Cfr. Recursos (…), pp. 158/159.
[31] Cfr. Recursos (…),pp. 158/159.
[32] Cfr. Acs. do STJ de 12/09/2019 (relatora Rosa Ribeiro Coelho), de 8/02/2018 (relatora Maria da Graça Trigo) e de 28/04/2016 (relator Abrantes Geraldes), in www.dgsi.pt
[33] Cfr. Ac. do STJ de 29/10/2015 (relator Lopes do Rego), in www.dgsi.pt. e o Ac. do STJ de 22.09.2015, processo n.º 29/12.6TBFAF.G1.S1, relator Pinto de Almeida, Sumários de Acórdãos Cíveis, ano de 2015, https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/Civel2015.pdf.
[34] Cfr., neste sentido, Acs do STJ de 31/05/2016 (relator Garcia Calejo), de 28/04/16 (relator Abrantes Geraldes), de 21/04/2016 (relatora Ana Luísa Geraldes), de 18/02/2016 (relator António Leones Dantas), de 1/10/2015 (relatora Ana Luísa Geraldes), de 9/07/2015 (relatora Maria dos Prazeres Beleza), de 19/02/2015 (relator Manuel Tomé Soares Gomes), todos consultáveis in www.dgsi.pt.; em idêntico sentido, na doutrina, António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo (…), Vol. I (…), p. 771.
[35] Cfr., neste sentido, Acs. do STJ de 03/10/2019 (relatora Maria Rosa Tching), de 15/02/2018 (relator Tomé Gomes), de 26/05/2015 (relator Hélder Roque), de 22/09/2015 (relator Pinto de Almeida), de 29/10/2015 (relator Lopes do Rego) e de 19/01/2016 (relator Sebastião Póvoas), in www.dgsi.pt., onde se lê que o ónus em causa estará cumprido desde que o recorrente se reporte à fixação electrónica/digital e transcreva os excertos que entenda relevantes, de forma a permitir a reanálise dos factos e o contraditório.
[36] Cfr. Acs. do STJ de 15/02/2018 (relator Tomé Gomes), e de 29/10/2015 (relator Lopes do Rego) e de 19/01/2016 (relator Sebastião Póvoas), in www.dgsi.pt.
[37] Cfr., neste sentido, Ac. do STJ de 18/02/2016 (relator Mário Belo Morgado), in www.dgsi.pt.
[38] Cfr., neste sentido, Ac. do STJ de 19/02/2015 (relatora Maria dos Prazeres Beleza), in www.dgsi.pt.
[39] Cfr. Acs. do STJ de 28/05/2015 (relator Granja da Fonseca), in www.dgsi.pt.
[40] Cfr., Acs. do STJ de 05/09/2018 (relator Gonçalves Rocha), de 18/09/2018 (relator José Rainho), de 03/10/2019 (relatora Maria Rosa Tching) e Acs. da RG de 15/12/2016 (relatora Maria João Matos) e de 22/10/2020 (relatora Maria João Matos), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[41] Cfr. Conclusões 16ª e 19ª da apelação.
[42] De todo o modo, a mera junção da transcrição global dos depoimentos das testemunhas também não seria forma adequada do cumprimento do ónus ínsito na al. a) do n.º 2 do art. 640º do CPC, visto que nem é incumbência do tribunal de recurso ler a totalidade das gravações, como não é ouvir a totalidade dos depoimentos, pois, na prática, era como se estivesse a levar cabo um segundo julgamento (cfr. Acs. do STJ de 19/02/2015 (relatora Maria dos Prazeres Beleza) e de 14/07/2021 (relator Fernando Baptista), in www.dgsi.pt.).
[43] Cfr. Ac. do STJ de 14/07/2021 (relator Fernando Baptista), in www.dgsi.pt.
[44] Conclusão 24ª da apelação - (…):
a)-nas certidões emitidas pela Câmara Municipal ..., e insertas a nos autos nas seguintes datas, em 12 de Abril de 2019 – e comunicada à Ré/Apelante com a referência citius ...35 de 15 de Maio de 2019 (informação técnica- Anexo 3) e ainda com data de 21/05/2019 com a referência citius ...29 de 31/05/2019;
(…):
c)- Doc. ... junto com o documento nº ...0 com a petição inicial) e ainda e principalmente o documento inserto nos autos apensos 638/16...., onde se encontra inserto com data de 21 de Setembro de 2018;
d)- certidão emitida pela Câmara Municipal ..., e insertas a nos autos nas seguintes datas, em 12 de Abril de 2019 – e comunicada à Ré/Apelante com a referência citius ...35 de 15 de Maio de 2019 (informação técnica- Anexo 3);
e)- O(s) prédio(s) são da freguesia ..., e não da freguesia .... (Conforme melhor resulta do documento nº ... junto com a petição inicial – Certidão Permanente com o código de acesso ...97);
(…)».
[45] Cfr., na doutrina: Abrantes Geraldes, Recursos (…), p. 157; António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, obra citada, p. 770, Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, Almedina p. 462, Luís Correia de Mendonça/Henriques Antunes, Dos Recursos (regime do Dec. Lei n.º 303/2007), Quid Iuris, 2009, p. 254; na jurisprudência: Acs. do STJ de 09/02/2021 (relator Fernando Jorge Dias), de 24/05/2018 (relatora Fernanda Isabel Pereira), de 14/07/2016 (relator António Piçarra) e de 27/10/2016 (relator Ribeiro Cardoso) e Ac. RG de 19/10/2017 (relator Pedro Damião e Cunha), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[46] Cfr. páginas 4 e 5 – fls. 1252 e 1251 vº.
[47] Cfr. página 5 do relatório - fls. 1251 vº.
[48] Cfr. fls. 1214 v.º a 1219 – Doc. ... (ref.ª Citius - de 11/10/2021).
[49] Cfr. ref.ª Citius ...01 - fls. 1288.
[50] Cfr. Documento n.º ...2 - fls. 158 a 197 - ref.ª Citius ...14.
[51] Cfr. pontos 5.1, 6.2 e 7 do relatório.
[52] Cfr. conclusões 8ª, 10ª e 11ª do recurso independente.
[53] Cfr. documento constante de fls. 127 a 134 dos autos.
[54] Cfr. páginas 11 e 12 do relatório pericial, fls. 1248 v.º e 1248 dos autos.
[55] Cfr. página 12 do relatório pericial, fls. 1248 dos autos);
[56] Cfr. conclusão 2ª do recurso subordinado.
[57] Cfr. quesito 59.º, ponto xii., página 28 do relatório pericial, fls. 1240 dos autos);
[58] Cfr. quesito 59.º, ponto xiii., página 29 do relatório pericial, fls. 1239 v.º dos autos);
[59] Cfr. quesito 84.º, páginas 37 e 38 do relatório pericial, fls. 1235 v.º e 1235 dos autos);
[60] Cfr. quesito 27.º, página 61 do relatório pericial, fls. 1223 v.º dos autos);
[61] Cfr. quesito 59.º, ponto xiv., páginas 30 a 32 do relatório pericial, fls. 1239, 1238º, v.º e 1238 dos autos);
[62] Cfr. quesito 59.º, ponto xiv., página 32 do relatório pericial, fls. 1238 dos autos);
[63] Cfr. conclusões 3ª e 4ª do recurso subordinado.
[64] Cfr. quesito 111.º, ponto (iii), páginas 44 a 46 do relatório pericial, fls. 1231 e 1232 dos autos).
[65] Cfr. quesito 11.º, ponto (v), página 47 do relatório pericial, fls. 1230 v.º dos autos).
[66] Constante de fls. 158 a 197 dos autos.
[67] Cfr. fls. 171 dos autos.
[68] Cfr. fls. 1319 a 1347 - ref.ª Citius ...09; concretamente página 43 da apelação e fls. 1341 dos autos.
[69] Cfr. fls. 158 a 197 dos autos.
[70] Cfr. fls. 199 e 199 v.º dos autos.
[71] Cfr., A. Santos Justo, Manual de Contratos Civis, Vertentes Romana e Portuguesa, Petrony, pp. 7/19, que cita diversa doutrina e jurisprudência.
[72] Cfr. Jorge Morais de Carvalho, Manuel de Direito de Consumo, 5ª ed., 2018, Almedina, p. 262.
[73] Cfr. Ac. do STJ de 05/05/2015 (relator João Camilo), in www.dgsi.pt.
[74] Cfr. José Engrácia Antunes, Direito do Consumo, Almedina, p. 155, cuja fundamentação seguiremos de perto na explanação que segue (pp. 156 a 158).
[75] Que aprova o regime de acesso e de exercício de diversas atividades de comércio, serviços e restauração.
[76] Cfr. Jorge Morais de Carvalho, obra citada, p. 36, e José Engrácia Antunes, obra citada, p. 51.
[77] Cfr. José Engrácia Antunes, obra citada, p. 67.
[78] Cfr. Jorge Morais de Carvalho, Manuel de Direito de Consumo, 5ª ed., 2018, Almedina, p. 263.
[79] Cfr., neste sentido, Ac. do STJ de 5/05/2015 (relator João Camilo), Ac. da RP de 16/05/2015 (relator Manuel Domingos Fernandes), Ac. da RG de 14/04/2016 (relatora Purificação Carvalho) e Ac. da RC de 16/02/2016 (relator Arlindo Oliveira), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[80] Cfr. Jorge Morais de Carvalho, obra citada, p. 314/315.
[81] Cfr. Nuno Manuel Pinto de Oliveira, Princípios de Direito dos Contratos, Coimbra Editora, 2011, p. 875.
[82] Cfr. José Engrácia Antunes, obra citada, p. 162.
[83] Cfr. Teoria Geral das Obrigações, 3ª ed., Almedina, pp. 63-64.
[84] Cfr. Abuso de Direito, BMJ n.º 85, p. 253.
[85] Cfr. Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª edição, Almedina, p. 546.
[86] Cfr. Código Civil Anotado, Vol. 1, 2ª ed., Coimbra Editora, p. 299.
[87] Cfr. Direito das Obrigações, 6ª ed., Almedina, p. 64.
[88] Cfr. Acs. do STJ de 13/03/2008 (relator Santos Bernardino) e de 8/10/2009 (relator Serra Baptista), disponíveis em www.dgsi.pt.
[89] Cfr. Ac. do STJ de 24/01/2002, CJSTJ, 2002, T. I, pp. 53/54
[90] Cfr. Paulo Mota Pinto, Sobre a Proibição do Comportamento Contraditório (Venire Contra Factum Proprium) no Direito Civil, BFDUC, Volume Comemorativo (2003), p. 302.
[91] Cfr. neste sentido, entre outros, J. Rodrigues Bastos, Notas ao Código Civil, Vol. II, p. 102, Antunes Varela, RLJ, ano 114º, p. 75 e Das obrigações Em Geral Vol. I, 10ª ed., Almedina, p. 545 e o Ac. do STJ de 28.11.1996, CJSTJ, 1996, T. III, p. 118.
[92] O agir de boa fé envolve, além do mais, no quadro das relações jurídicas, a atuação honesta e conscienciosa, isto é, numa linha de correção e probidade, não procedendo de modo a alcançar resultados opostos aos que uma consciência razoável tolera.
Os bons costumes, por seu turno, são, grosso modo, o conjunto de regras de comportamento relacional acolhidas pelo direito, variáveis no tempo e, por isso, mutáveis, conforme as conceções ético-jurídicas dominantes na coletividade.
Por fim, o fim económico e social de um direito traduz-se, essencialmente, na satisfação do interesse do respetivo titular no âmbito dos limites legalmente previstos. – cfr. Acs. do STJ de 25 de Junho de 2009 (relator Salvador da Costa) e de 8/10/2009 (relator Serra Baptista), disponíveis em www.dgsi.pt.
[93] Cfr. Vaz Serra, RLJ, 111º, p. 296.
[94] Sob a ref.ª Citius ...16 (fls. 1024 a 1028 v.º).
[95] Fls. 613 a 646.
[96] Cfr., neste sentido, entre outros, Acs. do STJ de 4/12/2014 (Relatora Fernanda Isabel Pereira) e de 17/11/2015 (relator Fonseca Ramos), in www.dgsi.pt.
[97] Cfr. António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, Tomo I, 2ª ed., Almedina, 2000, p. 247.
[98] Fls. 1314.
[99] Embora a R./Recorrente faça menção à nulidade prevista na al. b) do n.º 1 do art. 615º do CPC quer-nos parecer tratar-se de um mero lapso de escrita, pois, na tese da impugnante, o que está em causa é de uma não pronúncia - olvidou-se “de aflorar e conhecer da questão do abuso do direito, arguida pelo R./Apelante” - e não de uma falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
A insistir a impugnante na efetiva invocação da nulidade estabelecida na al. b) do citado normativo, vale a mesma argumentação expandida para aqueloutra para a julgar inverificada.
[100] Cfr. Jorge Morais de Carvalho, obra citada, p. 326.
[101] Cfr. João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Almedina, 7ª ed., p. 287.
[102] Aos mencionados direitos acresce ainda a indemnização, nos termos estabelecidos no art. 12º da Lei n.º 24/96, de 31/07 - cfr. Luis Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações - contratos em especial, Vol. III, 13ª ed., , p. 155, Cura Mariano,  Responsabilidade Contratual (…), p. 288.
[103] Cfr. Jorge Morais de Carvalho, obra citada, p. 317.
[104] Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações (…), Vol. I, 10ª ed., (…),p. 601.
[105] Cfr. Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora, p. 499.
[106] Cfr. Ana Mafalda Castanheira Neves de Miranda Barbosa, Lições de Responsabilidade Civil, Principia, p. 304.
[107] Cfr. Ac. do STJ de 16/03/2017 (relatora Maria da Graça Trigo), in www.dgsi.pt.
[108] Cfr., Ac. do STJ de 13/07/2017 (relator Manuel Tomé Soares Gomes), in www.dgsi.pt.
[109] Cfr. obra citada., pp. 607/608; em sentido convergente, Inocêncio Galvão Teles, Direito das Obrigações, 7.ª edição, p. 387, e Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol. I, 2ª ed., Almedina, 2002, p. 318.
[110] Cfr. Ac. do STJ de 24.04.2013 (relator Pereira da Silva), in www.dgsi.pt.
[111] Cfr. Nuno Manuel Pinto Oliveira Pinto, obra citada, p. 697.
[112] Cf. Acórdão para uniformização da jurisprudência n.º 4/2002, Diário da República, I série-A, n.º 146, de 27 de Junho de 2002 (Revista ampliada n.º 1508/2001 da 1ª Secção).
[113] Cfr. Ac. do STJ de 25/06/2002, CJSTJ, Ano XX, T. II – 2002, pp. 128/135.
[114] Cfr. Ac. do STJ de 22/02/2017 (relator Lopes do Rego) e de 29/06/2017 (relator Lopes do Rego), in www.dgsi.pt.
[115] Cfr. Ac. da RC de 20/05/2014 (relator Arlindo Oliveira), in www.dgsi.pt.
[116] Cfr. Acs. do STJ de 24/01/2012 (relator Martins de Sousa), de 21/05/2009 (relatora Maria Pizarro Beleza) e Ac. da RC de 20/05/2014 (relator Arlindo Oliveira), in www.dgsi.pt.
[117] Cfr. Pedro Romano Martinez, Cumprimento Defeituoso, em especial na compra e venda e na empreitada, Colecção Teses, Almedina, 1994, p. 407.
[118] Conclusões 29ª a 32ª.
[119] Conclusões 33ª a 35ª.
[120] «Sem prescindir:
“b) Acautelando a hipótese de este Venerando Tribunal vir a reconhecer razão aos fundamentos invocados no recurso interposto pela R./Recorrente, deve ser admitida a ampliação do âmbito do recurso (…)» (sublinhado nosso).
[121] Como refere António Santos Abrantes Geraldes, “[o]utra das possibilidades de ampliação do âmbito do recurso respeita à matéria de facto considerada provada ou não provada e que se mostre relevante para a defesa dos interesses do recorrido, caso sejam acolhidos os fundamentos de facto ou de direito apresentados pelo recorrente para sustentar o seu recurso.
Com efeito, apesar de a parte ter conseguido vencimento na ação, pode ter interesse em acautelar-se contra a eventual procedência das questões suscitadas pelo recorrente, mediante a modificação da decisão da matéria de facto no sentido que lhe seja mais favorável, a fim de continuar a beneficiar do mesmo resultado na primeira decisão, na eventualidade de serem acolhidos os argumentos arrolados pelo recorrente” (cfr. Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017 – 4ª ed., Almedina, p. 111)
Acrescenta o citado autor que “apenas fará sentido apreciar as questões suscitadas em sede de ampliação do objeto do recurso se, porventura, forem acolhidos os argumentos arrolados pelo recorrente (ou de que oficiosamente forem conhecidos) com repercussão na modificação da decisão recorrida” (p. 118).
[122] «Sempre sem prescindir:
c) Acautelando a hipótese de este Venerando Tribunal vir a considerar procedente a apelação da R./Recorrente, desde já se requer, nos termos do n.º 2 do artigo 665.º do CPC, que sejam conhecidos os seguintes pedidos (…)» (sublinhado nosso).

[123] Cfr. conclusão 10ª do recurso subordinado.
[124] Cfr. Mário Almeida Costa, Direito das Obrigações, 6ª edição, Almedina, p. 507.
[125] Cfr. Elsa Vaz de Sequeira, Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações/Das Obrigações em Geral, Universidade Católica, p. 280, José Alberto Gonzalez, Direito da Responsabilidade Civil, pp. 212/219; Acórdãos do STJ de 15/04/93, in CJSTJ, Ano I, T. 2, p. 59 e de 20.06.2006, in CJSTJ, Ano XIV, T. II, 2006, p. 119.
[126] Cfr., B.M.J., n.º 497 – Junho de 2000 – p. 354.
[127] Cfr., Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª ed., Almedina, 2018, p. 891, nota 1.
[128] Cfr. João Calvão da Silva, Venda de Bens de Consumo, 4ª ed., Almedina, p. 104.
[129] Cfr. Pedro Romano Martinez, Cumprimento Defeituoso, em especial na compra e venda e na empreitada, Colecção Teses, Almedina, 1994, p. 407.
[130] Cfr. João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual (…), pp. 124/125, cuja fundamentação explicitada a respeito da empreitada de consumo é, com as devidas adaptações, aplicável à venda de bens de consumo.
[131] Cfr. obra citada, p. 326.
[132] Cfr. ref.ª Citius ...14, de 7/09/2018 - fls. 814 a 819 dos autos.
[133] € 148.509,52 – € 92.000,00 = € 56.509,52
[134] Cfr. Pedro Romano Martinez, Cumprimento Defeituoso, em especial na compra (…), p. 407.
[135] Cfr. Ac. do STJ de 26/05/2009 (relator Moreira Alves), in www.dgsi.pt.
[136] Cfr. Abrantes Geraldes, Indemnização do Dano da Privação do Uso, Almedina, 2001, pp. 55, 61 e 62.
[137] Cfr. obra citada, pp. 63/64.
[138] Sobre o tema, ver também os Acs. do STJ de 17/11/2021 (relator Barateiro Martins), de 29/10/2020 (relator Tomé Gomes) e de 20/01/2022 (relator Tibério Nunes da Silva), in www.dgsi.pt.
[139] Cfr. Maria da Graça Trigo, Dano de privação de uso de veículo automóvel, in Responsabilidade Civil – Temas Especiais, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2015, p. 58.
[140] Cfr. Ac. do STJ de 13/07/2017 (relatora Maria da Graça Trigo), in www.dgsi.pt.
[141] Despacho datado de 12/02/2019, proferido em sede de audiência prévia – fls. 1001.
[142] Como refere Abrantes Geraldes, obra citada, p. 322, «a anulação da decisão (v.g por contradição de fundamentos ou por omissão de pronúncia) não tem como efeito invariável a remessa imediata do processo para o tribunal a quo, devendo a Relação proceder à apreciação do objeto do recurso, salvo se não dispuser dos elementos necessários. Só nesta eventualidade se justifica a devolução do processo para o tribunal a quo».
[143] Cfr. Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado. 4ª ed. revista e ampliada, Março/2017, Ediforum, p. 701
[144] Cfr. Temas Judiciários, Vol. I, Almedina, pág. 313.
[145] Cfr. Marta Alexandra Frias Borges, Algumas Reflexões em Matéria de Litigância de Má-Fé, disponível in www.google.pt.
[146] Cfr., António Júlio Cunha, obra citada, p. 74.
[147] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, obra citada, p.593.
[148] Cfr., nesse sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Temas judiciários, I Vol., p. 313.
[149] Cfr. Francisco Manuel Luas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. I, 2ª ed., Almedina, p.131.
[150] Recorrendo a uma terminologia de Fernando Luso Soares, A Responsabilidade Processual Civil, Coimbra, 1987, p. 26.
[151] Cfr. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, vol. I, (…), p. 580, Abrantes Geraldes, Temas Judiciários, I Vol. (1 - Citações e notificações em processo Civil 2 – Custas judiciais e multas cíveis), Almedina, 1998, p. 238 – 242, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª ed., Almedina, p. 419 e Ac. do STJ de 13/07/2017 (relator Olindo Geraldes), in www.dgs.pt.
[152] A manutenção do segmento dos juros de mora deve-se ao facto de constar da sentença recorrida e de não fazer parte do objeto dos recursos interpostos, o que inviabiliza o seu conhecimento, sob pena de nulidade do acórdão com fundamento no art. 615º, n.º 1, al. d), 2ª parte, do CPC.