Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
659/21.5T8VRL-A.G1
Relator: ALEXANDRA ROLIM MENDES
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
SUBSTITUIÇÃO DE PATRONO NOMEADO
INTERRUPÇÃO DO PRAZO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/26/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
- O art. 32º da Lei nº 34/2004 de 29/7, permite que o beneficiário do apoio judiciário possa requerer à O. A. a substituição de patrono nomeado.
- O prazo que esteja em curso aquando do pedido do requerente no sentido da substituição apenas se interrompe aquando do deferimento do pedido de substituição e não no momento em que a substituição é pedida.
- A interrupção do prazo inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir da cessação do facto com eficácia interruptiva.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

Relatório:

No âmbito do processo de inventário acima identificado, para partilha dos bens do casal constituído por L. M. e M. C., veio esta recorrer do seguinte despacho:

“A interessada foi citada para os termos do presente inventário no dia 27 de Setembro de 2021.
No dia 4 de Outubro de 2021 juntou aos autos comprovativo do pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono.
A nomeação de Patrona Oficiosa ocorreu no dia 11 de Novembro de 2021 e nessa mesma data foi-lhe remetida a notificação da sua designação nessa qualidade.
O prazo para apresentar reclamação contra a relação de bens interrompeu-se no dia 4 de Outubro, nos termos do art.º 24.º, n.º 4, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho e iniciou-se a partir da notificação da ilustre Patrona Oficiosa então nomeada, Dra. M. S., da sua designação (cf. art.º 24.º, n.º 5, alínea a), da citada Lei), presumindo-se a mesma notificada no dia 15 de Novembro.
O termo do prazo de trinta dias para a interessada reclamar da relação de bens ocorreu no dia 15 de Dezembro de 2021.
Apenas a 11 de Janeiro de 2022 a interessada apresentou a sua reclamação.
O pedido de substituição de patrono nomeado que a mesma formulou a 19 de Novembro de 2021 não é causa interruptiva do prazo em questão.
Com efeito, só com a nomeação de novo patrono cessa o patrocínio oficioso conferido ao anterior, inexistindo qualquer interrupção de prazo processual em curso pela apresentação do requerimento de substituição (ao contrário do que se prevê no art.º 24.º, n.º 4, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, para a nomeação inicial de patrono, e no art.º 34.º, n.º 2 do mesmo diploma legal, para a escusa).
Em face do exposto, por intempestivo, determina-se o desentranhamento da reclamação apresentada pela interessada e a sua remessa à apresentante.
Custas deste incidente pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia – cf. art.º 7.º, n.º 4, do RCP.
Notifique. Transitado, cumpra.”

A Recorrente concluiu as suas alegações da seguinte forma:

1.ª – Nos termos do nº 4 do Artº 34º, por remissão do nº 2 do Artº 32º da Lei 34/2004, em caso de substituição de advogado no âmbito do apoio judiciário, o prazo processual em curso interrompe-se a partir do deferimento da substituição pela Ordem dos Advogados.
2.ª – Tendo o primeiro patrono oficioso sido nomeado no dia 15 de novembro de 2021 e tendo a Ordem dos Advogados deferido o pedido de substituição de patrono em 30 de novembro de 2021, o prazo de 30 dias para deduzir reclamação à relação de bens encontrava-se em vigor no dia 11 de janeiro de 2022 (atento o período de férias judiciais de Natal), data em que tal reclamação foi efetivamente apresentada.

Termos em que, dando-se provimento ao presente recurso, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que admita, por tempestiva, a reclamação contra a relação de bens, assim se fazendo inteira e sã Justiça
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Nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
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Temos como assentes os factos que resultam do relatório desta decisão e ainda os seguintes:

- Em 24/9/21 à ora Recorrente foi enviada carta para citação para os termos do inventário e, nomeadamente para apresentar reclamação à relação de bens no prazo de 30 dias.
- Em 27/9/21 a carta para citação foi recebida por pessoa diversa da citanda.
- Em 4/10/21 a ora Recorrente informou o Tribunal que tinha requerido apoio judiciário, juntando comprovativo.
- Em 11/11/21, na sequência do deferimento do pedido de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e pagamento da compensação de patrono, foi nomeada patrona à Requerente.
- Em 19/11/21 a Requerente veio informar o processo de que tinha pedido à O.A. a substituição da patrona que lhe tinha sido nomeada.
- Em 29/11/21 a O. A. nomeou outra patrona à Requerente.
- A nova patrona da Requerente apresentou reclamação à relação de bens em 11/1/22.
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O Direito:

O apoio judiciário compreende diversas modalidades, entre elas, a nomeação e compensação de patrono (v. art. 16º, nº 1, alíneas b) da Lei nº 34/2004 de 29/7).
O art. 24º, nº 4 e 5 da mencionada Lei prescreve que, quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de ação judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo e inicia-se, nomeadamente a partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação.

Por outro lado, dispõe o art. 32º do mesmo diploma, nos seus nºs 1 e 2, que o beneficiário do apoio judiciário pode requerer à O. A. a substituição de patrono nomeado e que, deferido o pedido de substituição, aplicam-se, com as devidas adaptações, os termos dos arts. 34º e seguintes.
Assim, a interrupção do prazo em curso, no caso de substituição de patrono a pedido do/a requerente, apenas se interrompe aquando do deferimento do pedido de substituição e não no momento em que a substituição é pedida.
Compreende-se que assim seja, pois de outra forma o beneficiário de apoio judiciário poderia utilizar o(s) pedido(s) de substituição de patrono como forma de atrasar injustificadamente o processo. Assim, a interrupção do prazo apenas ocorre quando o pedido de substituição é considerado justificado pela Ordem dos Advogados.
Conforme se refere no Acórdão da Relação de Coimbra de 3/11/20 in www.dgsi.pt (citado ipsis verbis na decisão recorrida, sem que no entanto, se indique a respetiva fonte) “Só com a nomeação de novo patrono cessa o patrocínio oficioso antes conferido a anterior, inexistindo qualquer interrupção de prazo processual em curso pela apresentação do requerimento de substituição”.
No entanto, como decorre do preceituado no art. 326º do Cód. Civil, a interrupção inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir da cessação do facto com eficácia interruptiva.
Com efeito, enquanto na suspensão os prazos são contados até à data do facto suspensivo e quando voltam a correr a contagem é retomada onde parou, na interrupção os prazos são contados até à data em que ocorre o facto interruptivo e depois a contagem começa do início, inutilizando-se o prazo já decorrido.
Deste modo, estando o prazo para reclamar da relação de bens a correr no dia 29/11/21, data em que a O. A. nomeou nova patrona à Requerente e tendo este evento efeito interruptivo do prazo, da data da notificação desta nomeação à nova patrona e à Requerente se iniciou a contagem de novo prazo para apresentação de reclamação à relação de bens.
Deste modo, e tendo em conta que de 22/12 a 3/1 o prazo em causa ficou suspenso por virtude das férias judiciais, no dia 11/1/22, esse prazo ainda se encontrava a decorrer, razão pela qual a apresentação da reclamação à relação de bens é tempestiva.

Pelo exposto, há que julgar procedente o recurso, devendo o Tribunal recorrido admitir a reclamação e dar seguimento ao respetivo incidente.
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Decisão:

Pelo exposto, acorda-se nesta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão que não admitiu a reclamação de bens.

Custas a cargo do Recorrido.
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Guimarães, 26 de maio de 2020

Alexandra Rolim Mendes
Maria dos Anjos Melo Nogueira
José Cravo