Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
174/23.2YREVR
Relator: JORGE ANTUNES
Descritores: MANDADO DE DETENÇÃO EUROPEU
ESCÓCIA
PRISÃO PERPÉTUA
PRESTAÇÃO DE GARANTIAS
Data do Acordão: 01/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I – O requerido é cidadão escocês, encontra-se acusado do cometimento de crimes na Escócia, é aplicável a lei escocesa e, por essa via poderá o mesmo vir a ser condenado em prisão perpétua.
Essa circunstância, porém, não obsta à sua extradição.

É conforme à Constituição da República Portuguesa a permissão pela ordem jurídica portuguesa de uma semelhante pena de prisão, desde que seja executada de forma condicionada, sujeita à garantia dada, relativamente ao cidadão estrangeiro concreto.

O sistema jurídico escocês prevê uma revisão da pena decorrido o período mínimo de reclusão obrigatória e o mais tardar decorridos 20 anos (cfr. o Mandado de Detenção emitido) e também prevê a aplicação de medidas de clemência, com vista a que a pena não seja executada.

II - Resultando das garantias apresentadas que a Justiça da Escócia, caso venha a ser aplicada ao visado a prisão perpétua aplicará medidas visando a sua não execução, é de concluir que as garantias prestadas pelo Estado emissor mostram-se suficientes para alcançar o desiderato previsto na Constituição da República Portuguesa.

Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora
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I – RELATÓRIO

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

l. O Digno Magistrado do Ministério Público, junto deste Tribunal da Relação de Évora, nos termos do disposto na Lei 65/2003, de 23 de agosto, aplicável ex vi do estabelecido na Lei nº 87/2021, de 15 de dezembro, promoveu a audição do detido:

AA, nascido em …1984, natural da Escócia, residente em …, …, Escócia, titular do passaporte do Reino Unido, com o nº …,

nos termos seguintes e com os seguintes fundamentos:

“1º - Conforme comunicação do GNI (Gabinete Nacional da Interpol) o “Sheriff of Lothian and Borders de Edimburgo”, no âmbito do processo …, que corre termos no Edinburgh Sheriff Court, emitiu em 13.09.2023, um mandado de detenção internacional, relativo ao indivíduo acima identificado, com vista à sua detenção e extradição para o Reino Unido, com o objectivo de ser processado pelos crimes pelos quais foi acusado.

2º - O cidadão em causa – AA, está acusado da prática dos seguintes crimes:

- Secção 30(1)(a) da Lei da Justiça Criminal e Licenças da Escócia – 2010 relativa ao seu envolvimento no fornecimento de drogas controladas;

- Secção 28(1) da Lei da Justiça Criminal e Licenças da Escócia – 2010, relativa ao seu envolvimento em crime organizado grave;

- Secção 170(2) da Lei de Gestão de Alfândegas e Impostos Especiais de 1979, relativa ao seu envolvimento na evasão fraudulenta. Neste caso, os bens específicos a que se refere a proibição de importação são drogas controladas.

- Secção 4(3)(b) da Lei sobre o uso indevido de Drogas – 1971, neste caso envolve o fornecimento de droga, classe A, cocaína;

- Secção 4(3)(b) da Lei sobre o uso indevido de Drogas – 1971, neste caso envolve o fornecimento de droga, classe A, diamorfina (heroína);

- Secção 4(3)(b) da Lei sobre o uso indevido de Drogas – 1971, neste caso envolve o fornecimento de droga, classe B, cannabis;

Estes crimes são também previstos e punidos pela Lei portuguesa, mormente o disposto no artº 21 do Dec-Lei 15/93 de 22.01 (Lei da Droga).

- Tentativa de homicídio;

Este crime também é previsto e punido pela Lei portuguesa, mormente o disposto nos artsº 131, 22 e 23 todos do CP.

- Secção 2 da Lei rodoviária de 1988, refere-se à conduta do arguido que conduz perigosamente um veículo de propulsão mecânica numa estrada ou noutro local público. O perigo referido é o de ferimentos a qualquer pessoa ou de danos graves à propriedade.

Este crime também é previsto e punido pela Lei portuguesa, mormente o disposto no artº 289 do CP.

- Tentativa de obstrução da justiça, que ocorre quando a pessoa acusada faz esforços para evitar a detenção.

3º - Em face do pedido formulado pelas autoridades judiciárias / policiais inglesas, o aludido AA foi inserido na lista do GNI como pessoa a deter, tendo em vista a sua extradição para o Reino Unido.

4º - O referido AA veio a ser detido no dia 19.09.2023, pelas 11horas, em … – …, área desta Relação de Évora.

5º - Nos termos do disposto na Lei 87/2021 de 15.12, a extradição do cidadão (do Reino Unido) AA, rege-se pelas normas relativas ao MDE (Lei 65/2003 de 23.08).

6º - Porém e conforme consta do expediente “ cinco dos crimes com base nos quais este mandado foi emitido são passíveis de pena ou medida de segurança privativas de liberdade com carácter perpétuo”.

2. Procedeu-se à audição a que se reporta o artigo 18.º da Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, em 21.09.2023, pelas 09.50 horas, tendo o requerido AA, após ser esclarecido sobre a existência e o conteúdo do mandado de detenção com vista à sua extradição para a Escócia, bem como sobre o direito que lhe assiste de se opor à execução do pedido de entrega, os termos em que o pode fazer e as consequências de um eventual consentimento e sobre a faculdade de renunciar ao princípio da especialidade, declarou não renunciar a este princípio e não consentir na sua entrega ao Estado Requerente.

Na mesma diligência foi determinado que “o processo aguarde a junção das garantias previstas no artigo 78º-F da Lei nº 144/99”, ficando o Requerido sujeito apenas a termo de identidade e residência, sendo de imediato restituído à liberdade.

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3. Comunicada a decisão às Justiças da Escócia (Edinburgh Sheriff Court), veio a ser apresentada nos autos carta de garantias (“letter of assurance”) com o seguinte teor:

“Exmo. Sr./Sra.,

Mandado ao abrigo do Acordo de Comércio e Cooperação – AA, data de nascimento: …/…/1984

Remeto-me para o vosso pedido com data de 21 de setembro de 2023 relativo às garantias sobre penas de carácter perpétuo no caso de extradição de AA. Incluí a informação infra em resposta a este pedido.

Revisão das sentenças de carácter perpétuo

Numa sentença de prisão perpétua, a lei escocesa prevê a revisão em conformidade com o artigo 604, alínea a) do Acordo de Comércio e Cooperação entre a União Europeia e o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte.

Isto aplicar-se-ia a AA, na eventualidade de ser sentenciado a uma pena de prisão perpétua.

Como indicado na parte h) do mandado, a pena de carácter perpétuo só é obrigatória a respeito de condenações por homicídio. AA não é alvo de uma pena de carácter perpétuo obrigatória.

O tribunal pode impor penas de carácter perpétuo por alguns dos crimes a respeito dos quais AA deverá ser julgado. Estes crimes encontram-se indicados na parte h) do mandado.

Se o Sr. AA for condenado a uma sentença de prisão perpétua, o tribunal é obrigado a determinar uma sentença por um período fixo (determinate sentence) com uma “parte de castigo” (punishment part) específica. Este é o período de privação da liberdade que a pessoa é obrigada a cumprir antes do Parole Board (Comissão de Liberdade Condicional) considerar a possibilidade de ser libertada.

Após cumprir a “parte de castigo” da pena, o Sr. AA pode apresentar um Ministério Público Escocês pedido aos Ministros Escoceses para que remetam o seu processo para o Parole Board. Os Ministros também o podem fazer sem que ele tenha de apresentar tal pedido.

O Parole Board realiza uma revisão da pena de prisão do recluso. Realiza-se uma audiência oral para determinar se a detenção do recluso deve continuar. A decisão a ser tomada pelo Parole Board é se é necessário que a privação da liberdade do recluso continue, para a proteção do público. O recluso tem o direito a estar presente, e a fazer-se representar por mandatário legal, nesta audiência.

Se o Parole Board decidir que não é necessário que a sentença do recluso continue para a proteção do público, os Ministros Escoceses são obrigados a libertá-lo. Se for decidido que o recluso não deve ser libertado, uma segunda revisão é realizada dentro de 2 anos e a intervalos regulares após esse período.

Medidas de clemência

O sistema escocês prevê a aplicação de medidas de clemência, em conformidade com o artigo 604, alínea a) do Acordo de Comércio e Cooperação.

Se condenado e sentenciado a uma pena de prisão, o Sr. AA poderá ser libertado por motivos compassivos ou mediante a Prerrogativa Real de Perdão.

Em ambos estes casos, o Sr. AA pode apresentar um pedido a qualquer altura durante o período da sua sentença, independentemente de se tratar de uma pena de prisão de curta duração, de longa duração ou perpétua. Pode apresentar um pedido aos Ministros Escoceses, que tomam uma decisão a respeito do pedido.

Por conseguinte, esta revisão e libertação da pena encontra-se disponível a qualquer altura durante o período de prisão.

Libertação por Compaixão

O Sr. AA pode apresentar um pedido aos Ministros Escoceses a qualquer altura, para ser libertado por motivos compassivos, ao abrigo da secção 3 da Lei relativa aos Reclusos e Processo Criminal (Escócia) de 1993 (Prisoners and Criminal Proceedings (Scotland) Act 1993). Ao deliberar sobre o pedido de libertação por motivos compassivos de um recluso a cumprir uma pena de prisão de longa duração, os Ministros Escoceses são obrigados a consultar o Parole Board. Se o pedido for deferido, o recluso é libertado.

Embora a Lei não especifique quais são os motivos compassivos para a libertação, estes são amplos e, no passado, já incluíram:

1. pessoas com doenças terminais, em que seja provável que a morte ocorra dentro em breve. Não há prazos temporais fixos, mas a esperança de vida de menos de três meses pode ser considerada com um período apropriado;

2. se o recluso estiver gravemente incapacitado;

3. se a continuação da privação da liberdade do recluso, tendo em conta as condições em que o recluso se encontra detido, colocar a sua vida em perigo ou diminuir a sua esperança de vida;

4. se a libertação antecipada trouxer algum benefício significativo ao recluso e à sua família.

Ao tomar esta decisão, consideram-se todas as circunstâncias, e o recluso tem o direito a apresentar argumentos tanto aos Ministros Escoceses como ao Parole Board. Consideram-se os seguintes pontos, mas esta lista não é exaustiva:

1. o comportamento do recluso na prisão;

2. o historial criminal do recluso;

3. informação sobre a família do recluso, incluindo rede de apoio;

4. o contexto social do recluso;

5. os planos do recluso após ser libertado;

6. presta-se atenção especial ao facto de o recluso ter, ou não, tomado eventuais passos para lidar com assuntos ou problemas que possam ter contribuído para o seu comportamento criminoso;

7. a pena imposta pelo Tribunal;

8. as circunstâncias do crime.

A decisão de libertar ou de recusar a libertação é uma decisão administrativa. Por conseguinte, pode ser passível de recurso mediante revisão judicial.

A revisão judicial é um procedimento no Tribunal através do qual a pessoa pode solicitar uma revisão legal da decisão administrativa.

O exercício de todos os poderes estatutários dos Ministros escoceses encontra-se sujeito a revisão ou controlo por parte dos tribunais.

O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos determinou, no processo Hutchison v Reino Unido (Processo n.° 57592/08) que a revisão automática de uma sentença após um período mínimo especificado representa uma salvaguarda importante para o recluso contra o risco de detenção em violação do artigo 3.°, número 67. Na mesma decisão, o Tribunal determinou que “o requerente pode iniciar, a qualquer altura, uma revisão da sua detenção pelo Secretário de Estado” e, juntamente com o prazo mínimo de privação da liberdade claramente identificado, isto levou o tribunal a concluir que “uma sentença de carácter perpétuo pode agora ser considerada como reduzível, em conformidade com o artigo 3.° da Convenção.”

Na Escócia, a função do Secretário de Estado é desempenhada pelos Ministros Escoceses.

As disposições revistas na decisão do TEDH são similares às que se aplicam na Escócia e que se aplicariam ao Sr. AA.

A secção 3 da Lei relativa aos Reclusos e Processo Criminal (Escócia) de 1993 (Prisoners and Criminal Proceedings (Scotland) Act 1993) prevê que os Ministros Escoceses podem libertar qualquer pessoa a cumprir uma pena de prisão:

“Poder para libertar reclusos por motivos compassivos.

(1) O Secretário de Estado pode, a qualquer altura, se estiver convencido de que há motivos de compaixão para libertar uma pessoa a cumprir uma pena de prisão perpétua, libertar tal pessoa sob liberdade condicional.

(2) Antes de tal libertação de um recluso a cumprir uma pena de longa duração ou de carácter perpétuo, o Secretário de Estado deve consultar o Parole Board, a não ser que as circunstâncias não possibilitem tal consulta.”

Libertação mediante Prerrogativa Real

O recluso pode apresentar um pedido de libertação mediante Prerrogativa Real a qualquer altura durante o período de prisão. Se o Sr. AA apresentar um pedido de libertação com base na Prerrogativa Real de Perdão, o pedido é apresentado aos Ministros Escoceses. A Prerrogativa Real de Perdão permite alterações nas penas ou o perdão de condenações pelo crime. A Prerrogativa Real de Perdão é exercida por Sua Majestade o Rei, mediante recomendação do Primeiro Ministro da Escócia. O Sr. AA pode apresentar um pedido aos Ministros Escoceses a solicitar o exercício da Prerrogativa Real de Perdão. Os Ministros Escoceses consideram o pedido com base nos seus méritos e, se os Ministros Escoceses deferirem o pedido do Sr. AA, o Primeiro Ministro da Escócia apresenta uma recomendação a Sua Majestade o Rei, que pode conceder o perdão. Não há quadro estatutário para este pedido.

Fico ao vosso dispor, na eventualidade de necessitarem da minha assistência a respeito de fornecer mais informações ou clarificação. Agradecemos vivamente a vossa disponibilidade e cuidadosa consideração deste pedido de extradição.

Atenciosamente,

BB

Diretor de Assistência Mútua em Matéria Legal

Unidade de Cooperação Internacional”

4. O Requerido foi notificado para deduzir, querendo, oposição, no prazo de 10 (dez) dias, nos termos do artigo 21º da Lei nº 65/2003, de 23 de agosto, tendo apresentado articulado em que pugna pela prolação de decisão em que o Estado Português recuse a sua extradição, nos seguintes termos

“A. As Garantias dadas pela “CROWN OFFICE & PROCURATOR FISCAL SERVICE”.

1. Na sequência do douto de despacho de 21 de setembro de 2023, decidiu o Venerando Tribunal da Relação de Évora, que os autos de extradição do não poderiam prosseguir, e convocou, no que concerne ao mérito, o seguinte discurso fundamentador essencial, que se transcreve: “Quando a infracção que determina a emissão for punível com pena de carácter perpétuo, a execução do MDE fica sujeita à prestação das garantias estabelecidas na al. a) do art°. 604° do Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido.

“Considerando que o requerido não consente na entrega ao Estado requerente, não resta senão concluir que estes autos, não estão, por ora, em condições de prosseguir a sua regular tramitação”, (cf. página 3 do Auto de Audição de Detido).

2. Foi remetido ao Gabinete Nacional da Interpol a cópia o auto de audição de detido por “ordem da Exmª. Juíza Desembargadora Relatora deste Tribunal da Relação e, para os fins tidos por conveniente” pela notificação com a referência CITIUS …, e em simultâneo ao Edinburgh Sherif Court, pela notificação com a referência ….

3. No dia 26 de setembro de 2023 foi junto aos autos com a referência CITIUS n.º … cópia da carta preparada por BB Director de Assistência Mútua em Matéria Legal - Unidade de Cooperação Internacional que pretende dar em nome do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, as garantias exigidas pelo disposto na alínea a) do artigo 604.º do ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro.

4. Na sequência do email acima referenciado e rececionado com a referência CITIUS n.º … é reenviado sob a referência … pelo Exmo. Senhor Inspetor CC do Gabinete Nacional de Interpol, e o Digníssimo Ministério Público promoveu que fosse dado conhecimento ao mandatário do ARGUIDO.

5. É assim, neste contexto que o ora ARGUIDO se pronuncia sobre o expediente enviado pelo Gabinete Nacional da Interpol (referência CITIUS …) que corresponde ao mesmo expediente já presente ao tribunal directamente pela “Crown Office & Procurator Fiscal Service” (referências CITIUS …, …, …), sem que se saiba se a mesma corresponde à Autoridade Central prevista pelo disposto no artigo 605.º do ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro.

a) A questão da vinculação do Estado-Membro.

6. As garantias prestadas pelo Reino Unido, consubstanciam-se numa carta assinada pelo senhor BB Director de Assistência Mútua em Matéria Legal Unidade de Cooperação Internacional, e na qual confirma que ao ARGUIDO AA, pode ser aplicada penas com carácter perpétuo, como aliás, o Digníssimo Ministério Público em douto despacho (cf. referência CITIUS …) reconhece e confirma.

7. A primeira nota que convém sublinhar é que o senhor BB Director de Assistência Mútua em Matéria Legal Unidade de Cooperação Internacional, não representa nem vincula o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, nem o Governo da Escócia, ou por maioria de razão os Tribunais Escoceses, pelo que nunca se poderá considerar que a carta junta sob a referência CITIUS n.º … está apta a corresponder à emissão de garantia dada pelo Estado de Emissão, conforme exige o disposto na alínea a) do artigo 604.º do ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro.

8. A segunda nota, para referir que conforme decorre da carta enviada por BB Director de Assistência Mútua em Matéria Legal Unidade de Cooperação Internacional os crimes em causa são punidos com prisão perpétua, e o Governo da Escócia apenas admite a possibilidade dessa pena poder ser revista depois da sua aplicação, tanto que, reafirma que o “tribunal pode impor penas de caracter perpétuo por alguns dos crimes a respeito dos quais AA deverá ser julgado”.

9. Prevendo depois a Lei Escocesa, a possibilidade de, após um período indeterminado e a ser fixado pelo tribunal, proceder a uma revisão da medida da pena. Sublinhe-se que essa revisão da pena, não decorre de nenhum prazo judiciário ou judicial, mas meramente administrativo fixado pela denominada comissão Parole Board.

10. De qualquer modo, e ao contrário do afirmado na carta informativa enviada por BB Director de Assistência Mútua em Matéria Legal Unidade de Cooperação Internacional, se a “a Parole Board entender que se mantém a necessidade da imposição da pena de prisão, o recluso poderá manter-se sob custódia prisional para o resto da sua vida. Se, por outro lado, a Parole Board entender que o recluso pode ser libertado, o recluso mantém-se em liberdade condicional de forma perpétua. Neste último caso, caso este não cumpra as condições da libertação ou cometa novas ofensas, pode ser obrigado a cumprir o resto da pena na prisão. O período de cumprimento da pena de prisão mínimo a impor aos arguidos, antes da libertação, é da discricionariedade do juiz, com base nas diretrizes estabelecidas para os diferentes tipos de crime”.

11. Subsequentemente, a Lei Escocesa prevê a possibilidade de medidas de clemência, naturalmente discricionárias, como a libertação por compaixão, ou o indulto real. Nenhuma das garantias prestadas corresponde às exigências estabelecidas pelo Direito Português e pelo ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro.

B. A jurisprudência portuguesa. O disposto no artigo 13.º da Lei n.º 65/2009 de 23 de agosto e a sua interpretação conforme a constituição, artigo 33.º n.º 4 da Constituição da Républica Portuguesa.

12. A extradição constitui o mais antigo e emblemático instrumento de cooperação internacional, surgindo já referenciado na Bíblia e foi no antigo Egipto que teve lugar a celebração do que se pode considerar o primeiro caso histórico de tratado de extradição, o Tratado de Kadesh, por volta do ano 1291 a. c. Em Portugal, não obstante o primeiro tratado de extradição ter sido celebrado com Castela no ano de 1360, a primeira Lei de extradição data de 1975.

13. O sistema atual de extradição estrutura-se em três níveis hierarquizados: no topo, a Constituição da República Portuguesa (cf. artigo 33.º da CRP ), num plano intermédio, o direito internacional, abrangendo um conjunto alargado de convenções internacionais a que Portugal está vinculado, seja no quadro do Conselho da Europa, seja no quadro da União Europeia, e num plano inferior o denominado direito interno, em particular, a Lei de Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal, aprovada pelo citado DL n.º 144/99, de 31/08, e que entrou em vigor em 01/10/1999 e a Lei do Mandato de Detenção Europeia aprovada pela Lei 65/2003 de 23 de Agosto.

14. Após a saída do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte da União Europeia e da Comunidade Europeia da Energia Atómica, foi celebrado o ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro, que regula as condições de tornou extensiva a aplicação o regime de extradição entre, por um lado, os Estados-Membros, e um mandado de detenção nos termos do título VII do mencionado Acordo.

15. A Lei n.º 65/2003 de 23 de agosto, dispõe no artigo 13.º, sob a epigrafe “Garantias a fornecer pelo Estado-Membro de emissão em casos especiais” que a execução do mandado de detenção europeu só terá lugar se o Estado-Membro de emissão prestar uma das seguintes garantias: a) quando a infração que motiva a emissão do mandado de detenção europeu for punível com pena ou medida de segurança privativas da liberdade com carácter perpétuo, só será proferida decisão de entrega se estiver prevista no sistema jurídico do Estado-Membro de emissão uma revisão da pena aplicada, a pedido ou o mais tardar no prazo de 20 anos, ou a aplicação das medidas de clemência a que a pessoa procurada tenha direito nos termos do direito ou da prática do Estado-Membro de emissão, com vista a que tal pena ou medida não seja executada; b) quando a pessoa procurada para efeitos de procedimento penal for nacional ou residente no Estado-Membro de execução, a decisão de entrega pode ficar sujeita à condição de que a pessoa procurada, após ter sido ouvida, seja devolvida ao Estado-Membro de execução para nele cumprir a pena ou a medida de segurança privativas da liberdade a que foi condenada no Estado-Membro de emissão.

16. Disposição que é reproduzida no artigo 604.º alínea a) do ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro.

17. Dispõe, todavia, o n.º 4 do artigo 33.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) que só “é admitida a extradição por crimes a que corresponda, segundo o direito do Estado requisitante, pena ou medida de segurança privativa ou restritiva da liberdade com carácter perpétuo ou de duração indefinida, em condições de reciprocidade estabelecidas em convenção internacional e desde que o Estado requisitante ofereça garantias de que tal pena ou medida de segurança não será aplicada ou executada”.

18. Daqui decorre que o disposto no artigo 13.º n.º 1 alínea a) da Lei 65/2003 de 23 de agosto, e o disposto na alínea a) do artigo 604.º do ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro têm de ser interpretados em conformidade com o texto constitucional, o que significa que a extradição só será admissível, “perante garantias oferecidas pelo Estado requisitante de que tal pena não será aplicada ou executada”.

19. Isto porque, o Estado requisitante decidiu converter a pena ou a medida de segurança de duração indefinida ou porque aceitou a conversão dessas penas ou medidas por um Tribunal Português, segundo a Lei Portuguesa. É a consagração do “critério da punibilidade em concreto” – cf. J. J. Gomes Canotilho, Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa, Anotada, Volume I, 4.ª Edição, Revista, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, 533.

20. O Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte não assegura de forma inequívoca e com grau de certeza que a pena perpétua a que o ARGUIDO está sujeito seja comutada noutra pena não degradante e não indeterminada, pelo contrário, conforme resulta da declaração emitida pelo BB Director de Assistência Mútua em Matéria Legal - Unidade de Cooperação Internacional, aquilo que o senhor AA melhor pode aspirar é uma sentença indeterminada, apesar de sujeita a uma avaliação administrativa, durante o período do seu cumprimento.

21. Para que as garantias oferecidas fossem consideradas, teriam de ser prestadas por quem pode vincular internacionalmente o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, que não é o senhor BB Director de Assistência Mútua em Matéria Legal - Unidade de Cooperação Internacional.

22. Seria necessário para que o Estado Português aceitasse as garantias exigidas pelo 13.º n.º 1 alínea a) da Lei 65/2003 de 23 de agosto, e o disposto na alínea a) do artigo 604.º do ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro, que fosse assumido pela entidade com competência para vincular o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte que não pediria a condenação do ARGUIDO em prisão perpétua pelos crimes de que vem acusado, e seria ainda, necessário que o Juiz titular do processo assumisse o compromisso que a pena máxima seria concretamente determinada.

23. A comunicação efetuada pelo “Crown Office & Procurator Fiscal Service” não só não é vinculativa para o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, como é o Juiz titular do processo não se compromete a aplicar uma concreta pena de prisão, sendo que a jurisprudência do Reino Unido considera para a aplicação da pena de prisão perpétua o número de crimes pelos quais o ARGUIDO está acusado, o que torna muito provável a sua aplicação.

24. Veja-se neste sentido, a Jurisprudência constante do Colendo Supremo Tribunal de Justiça, para quem só pode haver extradição se o país que a pede tiver demonstrado que a pena a aplicar não é a pena perpétua ou indeterminada – cf. Acórdão do STJ, 07-07-1994, processo 000025, Amado Gomes (unanimidade); Acórdão do STJ, 15-05-1996, processo 969464, Lopes Rocha (unanimidade); Acórdão do STJ, 24-02-2022, processo 127/21.5YRCBR.S1, Cid Geraldo (unanimidade); Acórdão do STJ, 29-06-2023, processo 3726/22.YRLSB.B1, Pedro Branquinho Dias (unanimidade), todos in www.dgsi.pt.

25. Decorre, igualmente do disposto nos artigos 4.º e 53.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que ninguém “pode ser submetido a tortura, nem a tratos ou penas desumanos ou degradantes” nem é admissível a “interpretação de nenhuma disposição no sentido de restringir ou lesar os direitos do Homem e as liberdades fundamentais reconhecidos, nos respetivos âmbitos de aplicação, pelo direito da União, o direito internacional e as Convenções internacionais em que são Partes a União ou todos os Estados-Membros, nomeadamente a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, bem como pelas Constituições dos Estados-Membros”.

26. Nos termos do disposto no artigo 13.º, n.º 1 alínea a) da Lei 65/2003, de 23 de Agosto e do alínea a) do artigo 604.º do ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro não foi apresentada uma garantia de que o estado de Emissão que irá rever a pena ou medida imposta, mediante apresentação de pedido ou, o mais tardar, no prazo de 20 anos, ou de que irá encorajar a aplicação das medidas de clemência a que a pessoa tenha direito nos termos do direito ou da prática do Estado de emissão, com vista a que aquela pena ou medida não seja executada.

27. Deve por isso, o Estado português recusar a extradição do ARGUIDO AA como consequência do disposto nos citados preceitos.”

5. Notificada da oposição, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta promoveu que se oficiasse ao Tribunal de Sheriff de Stirling – Processo … e solicitassem esclarecimentos, o que foi deferido, tendo sido obtida a seguinte informação adicional:

“Diz a presente respeito à carta de V. Exª. com data de 20 de outubro de 2023. Tomei nota de tudo o que V. Exª. indicou e a etapa a que o pedido de execução do Mandado de Detenção do Sr. AA, acima indicado, chegou. Agradeço pela oportunidade de poder esclarecer a matéria relativa ao tribunal.

Em primeiro lugar, quero apresentar-me. Sou a responsável pela cooperação Internacional do Crown Office and Procurator Fiscal Service (Ministério Público Escocês).

Sou uma jurista habilitada e funcionária pública sénior do governo escocês. Escrevo a presente na minha capacidade de representante do Lord Advocate da Escócia, que é um ministro escocês e representa os Ministros Escoceses em matéria relacionada com extradição.

Vou responder individualmente às perguntas colocadas pelo Procurador Geral Adjunto.

1 - “Se o Crown Office & Procurator Fiscal Service corresponde à Autoridade Central prevista pelo disposto no artigo 605° do ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, por outro;

Notificações enviadas pelo Reino Unido à União Europeia ao abrigo da Parte Terceira do Acordo de Comércio e Cooperação UE-Reino Unido:-

O artigo 605.°, n° 1, prevê que a autoridade responsável pela transmissão e receção administrativa dos mandados de detenção, bem como por toda a outra correspondência oficial relacionada com a transmissão e receção administrativa, é: UK International Crime Bureau National Crime Agency Olympic House, Olympic Park, Longbarn Boulevard, Woolston Grange, Warrington, Cheshire WA20XA +… – Número principal no Reino Unido do International Crime Bureau E-mail – manchester@...

Por conseguinte, a Autoridade Competente pela transmissão e receção dos mandados de detenção na Escócia, que faz parte do Reino Unido, é a National Crime Agency. Toda a correspondência relacionada com o mandado ao abrigo do Acordo de Comércio e Cooperação em nome do Sr. AA foi transmitida através da National Crime Agency.

Para além disso, a minha Unidade de Cooperação Internacional (International Cooperation Unit) neste processo comunicou diretamente com o vosso Tribunal na correspondência que se seguiu ao pedido inicial relativo ao mandado.

2 - Se o Sr. BB, Diretor de Assistência Mútua em Matéria Legal Unidade de Cooperação Internacional representa ou vincula o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, o Governo da Escócia ou os Tribunais Escoceses.

O Sr. BB é o Responsável pela Assistência Mútua em Matéria Legal na Escócia. É um jurista habilitado. Encontra-se contratado pelo The Crown Office and Procurator Fiscal Service (Ministério Público Escocês) como jurista, na capacidade de Responsável pela Assistência Mútua em Matéria Legal na Escócia. Representa o Lord Advocate, que é um Ministro Escocês e que representa os Ministros Escoceses em matéria de Extradição na Escócia. O Sr. BB não tem o poder de vincular o governo ou os tribunais na Escócia. Na Escócia, o sistema judicial é independente. O Sr. BB, na garantia apresentada ao vosso Tribunal datada de 26 de setembro de 2023, indicou a lei escocesa que vincula tanto os Tribunais, como o governo.

3 - Se a carta assinada pelo Sr. BB, Director de Assistência Mútua em Matéria Legal Unidade de Cooperação Internacional consubstancia a emissão de garantia exigida pela alínea a) do artigo 604 do ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, por outro;

SIM.

O artigo 604, alínea a) do Acordo de Comércio e Cooperação prevê 2 requisitos alternativos, se a pena de prisão perpétua for aplicável aos crimes: -

Ou

Rever a Pena a pedido ou dentro de 20 anos.

Ou

Encorajar a aplicação de medidas de clemência às quais a pessoa tenha direito de se candidatar ao abrigo da lei ou práticas do estado emissor, com o objetivo da não execução de tal pena ou medida.

Vou abordar cada uma destas alternativas separadamente.

“REVER A PENA A PEDIDO OU O MAIS TARDAR NO PRAZO DE 20 ANOS.”

As penas relevantes aqui a respeito das acusações indicadas na parte H do Pedido do Mandado dizem respeito à prisão perpétua DISCRICIONÁRIA. Isto significa que o período máximo da sentença a ser imposta não se encontra limitado por lei. A decisão de impor uma pena de carácter perpétuo é à discrição do juiz. A pena de carácter perpétuo não é obrigatória. Mesmo que uma pena de carácter perpétuo seja proferida, isto não significa que o Sr. AA possa ser condenado à prisão perpétua sem revisão. A aplicação da prisão perpétua é à discrição do Juiz. A sentença de prisão perpétua só seria proferida pelo Juiz em circunstâncias excecionais, para crimes passíveis de uma pena perpétua discricionária.

Por conseguinte, o Juiz tem a opção de:

(a) proferir uma pena fixa de prisão que reflita a gravidade do crime, sendo que o Sr. AA seria libertado após tal período.

Ou

b) em casos excecionalmente graves, impor uma pena perpétua discricionária. Se o Sr. AA for condenado e sentenciado a uma pena de prisão perpétua discricionária, o tribunal é obrigado a indicar uma sentença fixa, com uma “parte punitiva” (punishment part) que é o período que o Sr. AA deve cumprir na prisão antes de o Parole Board considerar se o recluso é elegível para ser libertado da prisão: Isto encontra-se previsto estatutariamente na Escócia, na secção 2, n. 2, da Lei de Reclusos e Processo Penal (Escócia) de 1993 (Prisoners and Criminal Proceedings (Scotland) Act 1993). Ao identificar a parte punitiva de uma pena perpétua discricionária, o Tribunal Superior (High Court) determina a parte punitiva como correspondendo a metade da pena que satisfaz os requisitos de retribuição e dissuasão.

Para além disso, o processo de condenação na Escócia é supervisionado pelos Tribunais de Recurso (Appeal Courts), para garantir a equidade e consistência das sentenças. Na altura em que for condenado, o Sr. AA tem o direito de recorrer de tal pena para uma revisão por parte do Tribunal Superior (High Court). A determinação do período fixo da sentença ou a parte punitiva da sentença é da responsabilidade absoluta do Juiz do Processo Criminal. Na Escócia, o procurador não faz parte do sistema judiciário. Os juízes e procuradores são totalmente independentes uns dos outros. O mesmo acontece em todas as outras jurisdições legais do Reino Unido, sendo que há três. Por conseguinte, não é possível ao procurador emitir uma garantia de uma futura sentença. Um Juiz também não pode emitir uma garantia de uma sentença.

As estatísticas mais recentes de sentenças registadas na Escócia no ano 2020/2022 mostram que nenhuma sentença perpétua foi imposta a respeito de qualquer acusação, em casos em que uma sentença perpétua era possível. Ou seja, em todas as acusações passíveis de uma sentença perpétua discricionária na Escócia no ano de 21/22, não foi imposta uma sentença de prisão perpétua para nenhuma delas. Em vez disso, foi proferido um período fixo de prisão, após o qual o recluso deve ser libertado.

Por conseguinte, o Sr. AA será automaticamente libertado aquando da conclusão do período determinado, se for essa a sentença imposta. Na eventualidade de imposição de uma sentença perpétua, aquando da conclusão da parte punitiva da sentença, o Sr. AA será elegível para pedir liberdade condicional. Assinalo abaixo o papel do Parole Board (Comissão de Liberdade Condicional)

O Parole Board da Escócia age em nome dos Ministros Escoceses na administração de pedidos de liberdade condicional.

O Parole Board é independente e age em nome nos Ministros Escoceses. Realiza uma revisão da sentença do recluso conforme descrito acima. O Presidente do painel do Parole Board é licenciado em direito. Uma audiência oral é realizada para determinar se a detenção do prisioneiro deve continuar. O Parole Board deve decidir se é necessário que o recluso continue detido para a proteção do público. O recluso tem o direito a estar presente, e a fazer-se representar por mandatário legal, nesta audiência. Também tem o direito de recorrer da decisão do Parole Board.

O Parole Board pode ordenar a libertação do recluso. Se decidir que o recluso não deve ser libertado, uma segunda audiência é realizada dentro de dois anos para rever a detenção do recluso, e subsequentemente a períodos regulares de não mais de 2 anos.

“ENCORAJAR A APLICAÇÃO DE MEDIDAS DE CLEMÊNCIA PARA AS QUAIS O SR. BYRNE TENHA O DIREITO DE SE CANDIDATAR AO ABRIGO DA LEI ODA ESCÓCIA, COM O OBJETIVO DA NÃO EXECUÇÃO DE TAL PENA OU MEDIDA.”

O Sr. AA pode apresentar um pedido aos Ministros Escoceses a qualquer altura, para ser libertado por motivos compassivos, ao abrigo da secção 3 da Lei relativa aos Reclusos e Processo Criminal (Escócia) de 1993 (Prisoners and Criminal Proceedings (Scotland) Act 1993).

Ao deliberar sobre o pedido de libertação por motivos compassivos de um recluso a cumprir uma pena de prisão de longa duração, os Ministros Escoceses são obrigados a consultar o Parole Board da Escócia. Se o pedido for deferido, a pessoa é libertada.

Embora a Lei não especifique quais são os motivos compassivos para a libertação, estes são amplos e, no passado, incluíram:

1. pessoas com doenças terminais, em que seja provável que a morte ocorra dentro em breve. Não há prazos temporais fixos, mas a esperança de vida de menos de três meses pode ser considerada como sendo um período apropriado.

2. se o recluso estiver gravemente incapacitado; ou

3. se a continuação da privação da liberdade do recluso for, tendo em conta as condições em que o recluso se encontra detido, colocar a sua vida em perigo ou diminuir a sua esperança de vida.

4. se a libertação antecipada trouxer algum benefício significativo ao recluso e à sua família.

É evidente que os motivos para a libertação por compaixão são amplos. Consideram-se todas as circunstâncias, e o recluso tem o direito a apresentar argumentos tanto aos Ministros Escoceses como ao Parole Board. As seguintes considerações adicionais são tidas em consideração, mas esta lista não é exaustiva:

1. O comportamento do recluso na prisão.

2. O historial criminal do recluso.

3. Informação sobre a família do recluso, incluindo rede de apoio.

4. O contexto social do recluso.

5. Os planos do recluso após ser libertado.

6. Presta-se especial atenção ao facto de o recluso ter, ou não, tomado quaisquer passos para lidar com assuntos ou problemas que possam ter contribuído para o seu comportamento criminoso.

7. A pena imposta pelo Tribunal.

8. As circunstâncias do crime.

A decisão do Parole Board é de natureza administrativa. Por conseguinte, pode ser passível de recurso judicial.

A revisão judicial é um procedimento no Tribunal através do qual o recluso pode solicitar uma revisão legal da decisão administrativa feita ao abrigo da lei. O exercício de todos os poderes estatutários dos Ministros Escoceses encontra-se sujeito a revisão ou controlo por parte dos tribunais.

O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos determinou, no processo Hutchison v Reino Unido (Processo n.° 57592/08) que a revisão automática de uma sentença após um período mínimo especificado representa uma salvaguarda importante para o recluso contra o risco de detenção em violação do artigo 3.°, número 67.

Na mesma decisão, o Tribunal determinou que “o requerente pode iniciar, a qualquer altura, uma revisão da sua detenção pelo Secretário de Estado” e, juntamente com o prazo mínimo de privação da liberdade claramente identificado, isto levou o tribunal a concluir que “uma sentença de carácter perpétuo pode agora ser considerada como reduzível, em conformidade com o artigo 3.° da Convenção.”

Na Escócia, a função do Secretário de Estado é desempenhada pelos Ministros Escoceses.

Libertação mediante Prerrogativa Real

O recluso pode apresentar um pedido de libertação mediante Prerrogativa Real a qualquer altura durante o período da sentença de prisão.

Se o Sr. AA apresentar um pedido de libertação com base na Prerrogativa Real de Perdão, o pedido é apresentado aos Ministros Escoceses. A Prerrogativa Real de Perdão permite alterações nas penas ou mesmo o perdão de condenações pelo crime. A Prerrogativa Real de Perdão é exercida por Sua Majestade o Rei, mediante recomendação do Primeiro Ministro da Escócia. O Sr. AA pode apresentar um pedido aos Ministros Escoceses a solicitar o exercício da Prerrogativa Real de Perdão. Os Ministros Escoceses consideram o pedido com base nos seus méritos e, se os Ministros Escoceses deferirem o pedido do Sr. AA, o Primeiro Ministro da Escócia apresenta uma recomendação a Sua Majestade o Rei, que pode conceder o perdão. Não há quadro estatutário para este pedido.

4 - Aquando da revisão da medida da pena pela denominada comissão Parole Board se entender ser de manter a pena de prisão, o recluso pode manter-se sob custódia prisional para o resto da vida? Se a comissão Parole Board entender ser de libertar o recluso, a liberdade condicional manter-se-á em liberdade condicional de forma perpétua.

Não. Como indicado acima na resposta à pergunta número 3, se a revisão do Parole Board for indeferida aquando do primeiro pedido, fica sujeita a subsequentes revisões a cada 2 anos. Para além disso, como assinalado acima, o Sr. AA teria direito a fazer-se representar na audiência perante o Parole Board e a decisão do Parole Board pode ser revista pelo processo de revisão judicial.

O Parole Board é que decide quais as condições, se alguma, deve impor quando da libertação do Sr. AA. Somente as restrições necessárias para a segurança do público devem ser impostas. O Sr. AA ficaria “sob licença” para o resto da vida, e poderia ser convocado pelo Parole Board para revisão da sua libertação caso cometa um crime após ser libertado.

5 - Se pode assegurar-se que o cidadão AA contra quem foi deduzida Acusação no Processo n° …, do Tribunal de SHERIFF de STIRLING de forma inequívoca e com grau de certeza não seja condenado em pena de prisão perpétua e que a pena aplicada não será comutada em pena degradante ou indeterminada.

Nenhuma garantia pode ser dada que o Tribuna não venha a proferir uma sentença perpétua, aquando da condenação pelas acusações relevantes. O Sistema Judiciário na Escócia, como acontece em Portugal, é independente e não pode ser limitado pelas condições impostas por outro Estado.

Essa sentença de prisão perpétua é discricionária, ou seja, é uma sentença ao dispor do Juiz e utilizada somente quando a criminalidade requer que seja imposta. Como assinalado acima na resposta à pergunta 3, no ano transato de 2021 a 2022 nenhum Juiz escocês proferiu uma pena perpétua discricionária.

Na eventualidade de ser imposta uma pena perpétua, ficaria sujeita a revisão por parte dos Tribunais de Recurso da Escócia. Requer que o Juiz imponha um período determinado, como parte punitiva, aquando da conclusão da qual o Sr. AA teria direito a pedir liberdade condicional. O Sr. AA tem subsequentemente o direito a renovar esse pedido de liberdade condicional a cada 2 anos, até que seja deferido. O Sr. AA também fica com a possibilidade de que a sua sentença seja revista para libertação por compaixão e libertação ao abrigo da Prerrogativa Real, como acima indicado.

Fico ao vosso dispor, caso necessitem de mais esclarecimentos.

Atenciosamente,

DD

Responsável pela Cooperação Internacional

Crown Office and Procurator Fiscal Office (Ministério Público Escocês)”.

6. Notificada dos esclarecimentos prestados, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se, fazendo uma resenha dos autos e enunciando a seguinte posição do Ministério Público:

“(…)

23º

O Requerido AA nos vinte e seis PONTOS da sua OPOSIÇÃO – cf. nº 18 deste documento – coloca cinco questões – cf. nº 19 deste documento –concluindo que «não foi apresentada uma garantia de que o estado de Emissão que irá rever a pena ou medida imposta, mediante apresentação de pedido ou, o mais tardar, no prazo de 20 anos, ou de que irá encorajar a aplicação das medidas de clemência a que a pessoa tenha direito nos termos do direito ou da prática do Estado de emissão, com vista a que aquela pena ou medida não seja executada »

PELO QUE «Deve por isso, o Estado português recusar a extradição do ARGUIDO AA»

24º

As questões foram colocadas ao Tribunal de SHERIFF DE STIRLING - Processo nº …, em que foi deduzida Acusação contra o cidadão AA, …

25º

DD, Responsável pela Cooperação Internacional do Crown Office and Procurator Fiscal Service (Ministério Público Escocês) «representante do Lord Advocate da Escócia, que é um ministro escocês e representa os Ministros Escoceses em matéria relacionada com extradição» prestou os pertinentes esclarecimentos, em missiva datada de 3 de Novembro pp, cujo teor se dá por integramente reproduzido para todos os legais efeitos.

26º

Aliás, na questão colocada quanto às «garantias sobre penas de carácter perpétuo no caso de extradição de AA» remeteu para a missiva datada de 26-09-2023, via Gabinete Nacional de Interpol (GNI), documentação assinada por BB - Director de Assistência Mútua em Matéria Legal - Unidade de Cooperação Internacional, em nome do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, nesse documento «indicou a lei escocesa que vincula tanto os Tribunais como o governo» - cf. resposta ao ponto 2 da Resposta de DD, transcrita, no essencial, no nº 16 desta RESPOSTA à OPOSIÇÃO, ou seja:

27º

REVISÃO da SENTENÇA de CARÁCTER PERPÉTUO

MEDIDAS de CLEMÊNCIA

LIBERTAÇÃO por COMPAIXÃO

LIBERTAÇÃO MEDIANTE PRERROGATIVA REAL, devidamente discriminadas na missiva datada de 26-09-2023, assinada por BB

28º

Da análise documentação remetida pelas Justiças da Escócia resulta, como bem se decidiu o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos determinou, no processo Hutchlson v Reino Unido (Processo n° 57592/08) «uma sentença de carácter perpétuo pode agora ser considerada como reduzível, em conformidade com o artigo 3.° da Convenção.

29º

No documento de 26 de Setembro de 2023 e ratificado no documento de 3 de Novembro imediato refere-se expressamente «As disposições revistas na decisão do TEDH são similares às que se aplicam na Escócia e que se aplicariam ao Sr. AA.»

30º

Efectivamente, numa sentença de prisão perpétua, a lei escocesa prevê a imposição de pena fixa a cumprir e contempla mecanismos de redução e mesmo extinção da pena, que ainda que por decisões de carácter a administrativo são sujeitos a controlo e pelos tribunais, sendo passíveis de recurso judicial.

31º

Falta apurar se as garantias prestadas pelas Justiças da Escócia se mostram suficientes devendo ser deferida a solicitada entrega, ou se pelo contrário, deferindo a OPOSIÇÃO deve ser indeferida a entrega.

32º

Como bem refere o Requerido no PONTO 13 da OPOSIÇÃO, o sistema da Extradição, ou melhor da Cooperação Judiciária Penal Internacional PORTUGUÊS (não olvidar que o Regime do M.D.E. não é Extradição), estrutura-se em três níveis:

- Constituição da República Portuguesa;

- Direito Internacional, in casu, ACORDO DE COMÉRCIO E COOPERAÇÃO entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro, na versão publicada no Jornal Oficial da União Europeia L 149, de 30 de abril de 2021, doravante designado Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido.

- Lei da Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal, aprovada pela Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto

- Regime jurídico do Mandado de Detenção Europeu, aprovado pela Lei nº 65/2003, de 23 de Agosto

33º

Quanto à Constituição há a considerar o artº 33º:

«4. Só é admitida a extradição por crimes a que corresponda, segundo o direito do Estado requisitante, pena ou medida de segurança privativa ou restritiva da liberdade com carácter perpétuo ou de duração indefinida, se, nesse domínio, o Estado requisitante for parte de convenção internacional a que Portugal esteja vinculado e oferecer garantias de que tal pena ou medida de segurança não será aplicada ou executada.

5. O disposto nos números anteriores não prejudica a aplicação das normas de cooperação judiciária penal estabelecidas no âmbito da União Europeia.

6. Não é admitida a extradição, nem a entrega a qualquer título, por motivos políticos ou por crimes a que corresponda, segundo o direito do Estado requisitante, pena de morte ou outra de que resulte lesão irreversível da integridade física.

7. A extradição só pode ser determinada por autoridade judicial»

34º

OU SEJA, a mesmo que ao crime seja aplicável «pena ou medida de segurança privativa ou restritiva da liberdade com carácter perpétuo ou de duração indefinida» as garantias a prestar pelo «Estado requisitante» reduzem-se à «não execução da pena»

35º

Quanto ao Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido, no caso presente só há a considerar a al a) do artº Artigo 604º - Garantias que o Estado de emissão deve fornecer em casos especiais,

a) - Quando a infração em que se baseia o mandado de detenção for punível com pena ou medida de segurança privativas da liberdade com caráter perpétuo no Estado de emissão, o Estado de execução pode sujeitar a execução do mandado de detenção à condição de o Estado de emissão dar uma garantia, considerada suficiente pelo Estado de execução, de que irá rever a pena ou medida imposta, mediante apresentação de pedido ou, o mais tardar, no prazo de 20 anos, ou de que irá encorajar a aplicação das medidas de clemência a que a pessoa tenha direito nos termos do direito ou da prática do Estado de emissão, com vista a que aquela pena ou medida não seja executada

Quanto à al b) nada a referir, porquanto não se trata de nacional Português, nem invocou ser residente em Portugal, tendo a morada indicada no TIR que apresentou quando detido localiza-se na ESCÓCIA

36º

Já no Direito Português há considerar os artºs 78º -A a 78º - G, da Lei nº 144/99, de 31 de Agosto, Aditados pela Lei n.º 87/2021, de 15 de Dezembro, que «Regulamenta as disposições do Acordo entre a União Europeia e a República da Islândia e o Reino da Noruega sobre os processos de entrega entre os Estados-Membros da União Europeia e a Islândia e a Noruega, assinado em Viena em 28 de junho de 2006 e publicado no Jornal Oficial da União Europeia L 292, de 21 de outubro de 2006, doravante designado Acordo entre a União Europeia e a Islândia e a Noruega, e do Acordo de Comércio e Cooperação entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por outro, feito em Bruxelas e em Londres em 30 de dezembro de 2020, na versão publicada no Jornal Oficial da União Europeia L 149, de 30 de abril de 2021, doravante designado Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido.» - cf. artº 78º - A

«Aos procedimentos de emissão e aos processos de execução dos mandados de detenção decorrentes da aplicação dos acordos a que se refere o artigo anterior é aplicável, com as devidas adaptações, o regime jurídico do mandado de detenção europeu, aprovado pela Lei nº 65/2003, de 23 de agosto» - cf. artº 78º - B

« Quando a infração que determina a emissão for punível com pena ou medida de segurança privativa da liberdade com caráter perpétuo, a execução do mandado de detenção fica sujeita à prestação das garantias estabelecidas no n.º 2 do artigo 8.º do Acordo entre a União Europeia e a Islândia e a Noruega ou na alínea a) do artigo 604.º do Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido»- cf. artº 78º - F

37º

Preceitua o artº 13º da Lei nº 65/2003, de 23 de Agosto sob a epígrafe «Garantias a fornecer pelo Estado-Membro de emissão em casos especiais»

«1 - A execução do mandado de detenção europeu só terá lugar se o Estado-Membro de emissão prestar uma das seguintes garantias:

a) Quando a infração que motiva a emissão do mandado de detenção europeu for punível com pena ou medida de segurança privativas da liberdade com carácter perpétuo, só será proferida decisão de entrega se estiver prevista no sistema jurídico do Estado-Membro de emissão uma revisão da pena aplicada, a pedido ou o mais tardar no prazo de 20 anos, ou a aplicação das medidas de clemência a que a pessoa procurada tenha direito nos termos do direito ou da prática do Estado-Membro de emissão, com vista a que tal pena ou medida não seja executada;

38º

Analisado o regime do Reino Unido quanto à denominada aplicação de «penas com carácter perpétuo», verificamos ter semelhanças com dois institutos Penais Portugueses: Liberdade Condicional e imposição de pena relativamente indeterminada

39º

Por outro lado, como decidiu o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos determinou, no processo Hutchlson v Reino Unido (Processo n° 57592/08). «’uma sentença de carácter perpétuo pode agora ser considerada como reduzível, em conformidade com o artigo 3.° da Convenção» uma vez que « o requerente pode Iniciar, a qualquer altura, uma revisão da sua detenção pelo Secretário de Estado” e, juntamente com o prazo mínimo de privação da liberdade claramente Identificado»

40º

Como resulta da documentação, «Na Escócia, a função do Secretário de Estado é desempenhada pelos Ministros Escoceses» sendo a s suas decisões

41º

As decisões dos Ministros Escoceses, bem como as do Parole Board, são passíveis de revisão ou Controlo pelos Tribunais.

42º

E não se diga, como afirma o Requerido, (Ponto 10 da OPOSIÇÂO) que, aquando da revisão da pena perpétua a Parole Board, entender ser de manter a pena de prisão, o recluso pode manter-se sob custódia prisional para o resto da sua vida, uma vez que, a lei prevê que:

43º

Se a Parole Board (Comissão de Liberdade Condicional) entender não ser de libertar o recluso, a liberdade condicional manter-se-á de forma perpétua, porquanto a Lei Escocesa determina uma segunda revisão em dois anos e novas revisões, «a intervalos regulares, após esse período»

44º

Por outro lado, desde a entrada em vigor do Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido, publicada no Jornal Oficial da União Europeia L 149, de 30 de abril de 2021, doravante designado Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido, «nenhuma sentença perpétua foi imposta a respeito de qualquer acusação, em casos em que uma sentença perpétua era possível …foi proferido um período fixo de prisão, após o qual o recluso deve ser libertado.»

45º

Quanto à Jurisprudência citada do Supremo Tribunal de Justiça, referidos no PONTO 24 da OPOSIÇÃO, temos a referir:

Acórdãos de 07-07-1994, processo 000025, e de 15-05-1996, processo 969464) foram publicados na vigência do Diploma anterior à Lei nº 144/99, de 31 de Agosto, mais concretamente ao Decreto-Lei 43/91, de 22 de Janeiro, bem como da Lei Constitucional nº 1/89, de 8 de Julho, que procedeu à SEGUNDA REVISÃO da CONSTITUIÇÃO.

Só pela Lei Constitucional nº 1/97, de 20 de Setembro, que procedeu à Quarta revisão constitucional é que no artº 33º se preceituou:

«5. Só é admitida a extradição por crimes a que corresponda, segundo o direito do Estado requisitante, pena ou medida de segurança privativa ou restritiva da liberdade com carácter perpétuo ou de duração indefinida, em condições de reciprocidade estabelecidas em convenção internacional e desde que o Estado requisitante ofereça garantias de que tal pena ou medida de segurança não será aplicada ou executada»

Nas versões anteriores não se referia pena perpétua

Assim, os citados arestos não podem considerar-se na decisão a proferir

46º

Quanto aos Acórdãos de 24-02-2022, processo 127/21.5YRCBR.S1 e de 29-06-2023, processo 3726/22.YRLSB.B1, reportam-se a situações em que foram prestadas garantias pelos Estados que formularam os pedidos de penas ou medida de segurança privativas de liberdade não seriam aplicadas, nada se referindo quanto à sua não execução.

47º

A jurisprudência na Escócia, desde a publicação do Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido, não impôs qualquer pena perpétua, antes fixou período de cumprimento de pena

48º

Por outro lado, a legislação do mesmo país, prevê mecanismos para revisão e diminuição da pena, no sentido de não ser executada pena de prisão perpétua, como imposto no nº 4 do artº 33º da Constituição

49º

As garantias da não execução da pena perpétua resultam da lei, sendo irrelevante quem as presta

50º

Não se verificam os Motivos de não execução obrigatória do Mandado de Detenção referidos no artº 78º-D da já referida Lei nº 144/99

51º

Assim, entendemos inverificados os fundamentos da OPOSIÇÃO deduzida

52º

DEVE A OPOSIÇÃO deduzida pelo cidadão AA ser julgada improcedente, pela falência dos factos e argumentos apresentados e, a final, ser proferida decisão que defira a requerida entrega.”.

7. Cumprido o contraditório (com a notificação à defesa do Requerido de todos os esclarecimentos prestados e da posição do Ministério Público), não foi apresentada resposta.

8. Colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre decidir.

****

II. Circunstâncias relevantes e Transcrição do Mandado de Detenção emitido pelas Justiças da Escócia:

Para a apreciação do caso relevam as circunstâncias documentadas nos autos e que supra foram relatadas e, ainda, a circunstância de constar do Mandado de Detenção Internacional emitido pelas Justiças da Escócia, com vista à Extradição do cidadão escocês AA (em tradução para português) o seguinte:

“O presente mandado foi emitido por uma autoridade judiciária competente. Solicita-se a detenção do indivíduo abaixo indicado e a sua entrega às autoridades judiciárias para efeitos de procedimento penal ou de cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas da liberdade.

a) Informações relativas à identidade da pessoa procurada:

Apelido: AA

Nome(s) próprio(s): AA

(…)

b) Decisão que fundamenta o mandado de detenção:

1. Mandado de detenção ou decisão judicial com a mesma força executiva: UM MANDADO DE DETENÇÃO NO CASO … FOI EMITIDO EM 25 DE AGOSTO DE 2023 NO TRIBUNAL DE SHERIFF DE STIRLING.

ESTA GARANTIA PERMANECE VÁLIDA E EXEQUÍVEL.

UMA CÓPIA CERTIFICADA É TRANSMITIDA AQUI.

UM MANDADO DE DETENÇÃO NO CASO … FOI EMITIDO EM 12 DE SETEMBRO DE 2023 NO TRIBUNAL DE SHERIFF DE STIRLING.

ESTA GARANTIA PERMANECE VÁLIDA E EXEQUÍVEL.

UMA CÓPIA CERTIFICADA É TRANSMITIDA AQUI.

2. Tipo: ACUSAÇÃO

Sentença com força executiva: N/A

Referência: N/A

c) Indicações relativas à duração da pena:

1. Duração máxima da pena ou medida de segurança privativas de liberdade que pode ser aplicável à(s) infração(ções):

(01) Secção 30(l)(a) da Lei da Justiça Criminal e Licenças (Escócia) 2010 — 14 anos de prisão efetiva

(02) Secção 28(1) da Lei da Justiça Criminal e Licenças (Escócia) 2010 — IO anos de prisão efetiva

(04) Secção 170(2) da Lei de Gestão de Alfândegas e Impostos Especiais de 1979 prisão perpétua

(05) Secção 4(3)(b) da Lei sobre o Uso Indevido de Drogas de 1971— prisão perpétua

(06) Secção 4(3)(b) da Lei sobre o Uso Indevido de Drogas de 1971— prisão perpétua

(07) Secção 4(3)(b) da Lei sobre o Uso Indevido de Drogas de 1971— 14 anos de prisão

(01) Tentativa de Homicídio— Prisão Perpétua

(02) Secção 2 da Lei Rodoviária 1988 — 2 anos de prisão efetiva

(03) Tentativa de Obstrução da Justiça — prisão perpétua

(…)

e) Infrações:

O presente mandado de detenção refere-se a um total de 9 infrações.

Descrição das circunstâncias em que a(s) infração/infrações foi/foram cometidas(s), incluindo o momento (a data e a hora), o local e o grau de participação da pessoa procurada:

(01)

Entre 26 de março de 2020 e 22 de junho de 2020, ambas as datas inclusive, em …., e em outros lugares na Escócia, Holanda e em outros lugares, AA instruiu duas pessoas citadas e outras cujas identidades são entretanto desconhecidas do promotor, a cometerem uma infração grave, nomeadamente estarem envolvidos na importação e fornecimento de drogas controladas, incluindo cocaína e diamorfina, ambas drogas de Classe A, conforme especificado na Parte I do Anexo 2 da Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, e cannabis, uma droga de Classe B conforme especificado na Parte 2 do Anexo 2 da Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, em violação da Seção 4(3)(b) da Lei do Uso Indevido de Drogas Lei de 1971, coletar e possuir bens criminosos, nomeadamente dinheiro, em violação da Seção 329(l)(c) da Lei de Produtos do Crime de 2002 e possuir, sem ter um certificado de posse de arma de fogo em vigor, uma arma de fogo à qual a Seção 1(1 )(b) da Lei de Posse de Armas de Fogo de 1968 se aplica, na medida em que ele, ao usar dispositivos de comunicação criptografados e outros dispositivos de comunicação, instruiu e dirige as duas pessoas mencionadas, e outras, a tomar posse, transportar, adulterar, armazenar e fornecer drogas controladas, nomeadamente cocaína, diamorfina e cannabis, colecionar e possuir propriedade criminal, nomeadamente dinheiro, e possui uma arma de fogo, tudo para seu ganho financeiro; CONTRÁRIO à Seção 30(l)(a) da Lei de Justiça Criminal e Licenças (Escócia) de 2010

(02)

Entre 26 de março de 2020 e 22 de junho de 2020, em … e em outros lugares na Escócia, Holanda e outros lugares, AA esteve envolvido em crime organizado grave e concordou com duas pessoas citadas e outras em fazer algo que ele sabia ou suspeitava, ou deveria razoavelmente ter conhecido ou suspeitado, que permitiria ou promoveria o cometimento de crime organizado grave, na medida em que o fez, enquanto usava dispositivos de comunicação criptografados, concordou em se envolver na importação, venda e fornecimento de drogas controladas, incluindo cocaína e diamorfina, ambas drogas de Classe A, conforme especificado na Parte I do Anexo 2 da Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, e cannabis, uma droga de Classe B, conforme especificado na Parte 2 do Anexo 2 da Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, tudo em violação da Seção 4(3)(b) da Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, para possuir e coletar bens criminosos, ou seja, dinheiro, em violação da Seção 329(1)(c) da Lei de Produtos do Crime de 2002, e possuir, sem ter um certificado de posse de arma de fogo em vigor, uma arma de fogo à qual se aplica a Seção l(l)(b) da Lei de Posse de Armas de Fogo de 1968; CONTRÁRIO à Seção 28 (l) da Lei de Justiça Criminal e Licença (Escócia) de 2010.

(04)

Entre 26 de março de 2020 e 22 de junho de 2020, em …, e em outros lugares na Escócia, Holanda e outros lugares, AA foi, em em relação a mercadorias, nomeadamente uma quantidade de drogas controladas, incluindo cocaína e diamorfina, ambas drogas de Classe A, conforme especificado na Parte 1 do Anexo 2 da Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, e cannabis, uma droga de Classe B, conforme especificado na Parte 2 do Anexo 2 da Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, conscientemente envolvido na evasão fraudulenta da proibição de importação de drogas controladas imposta pela Seção 3(l)(a) da Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971 ; CONTRÁRIO à Lei de Gestão de Alfândegas e Impostos Especiais de 1979, Seção 1 70(2), e será provado nos termos da Seção 29 da Lei de Justiça Criminal e Licenças (Escócia) de 2010 que o delito acima mencionado foi agravado por uma conexão com crime organizado grave.

(05)

Entre 26 de março de 2020 e 22 de junho de 2020, em … e em outros lugares na Escócia, Holanda e outros lugares, AA e outro foram envolvido no fornecimento de uma droga controlada, nomeadamente cocaína, uma droga de Classe A especificada na Parte I do Anexo 2 da Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, a outra ou outras pessoas, em violação da Secção 4(1) da Lei supramencionada; CONTRÁRIO à Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, Seção 4(3)(b), e será provado nos termos da Seção 29 da Lei de Justiça Criminal e Licenças (Escócia) de 2010 que o delito acima mencionado foi agravado por uma conexão com Crime Organizado Grave.

(06)

Entre 26 de março de 2020 e 22 de junho de 2020, em …, e em outros lugares na Escócia, na Holanda e em outros lugares, AA e outro estavam envolvidos no fornecimento de uma droga controlada, a saber, diamorfina, um medicamento de Classe A especificado na Parte 1 do Anexo 2 da Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, para outro ou outros, em violação da Seção 4 (l) da Lei acima mencionada; CONTRÁRIO à Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, Seção 4(3)(b), e será provado nos termos da Seção 29 da Lei de Justiça Criminal e Licenças (Escócia) de 2010 que o delito acima mencionado foi agravado por uma conexão com crime organizado grave.

(07)

Entre 26 de março de 2020 e 22 de junho de 2020, em … e em outros lugares na Escócia, Holanda e outros lugares, AA e outros estavam envolvidos no fornecimento de uma droga controlada, nomeadamente cannabis, uma droga de Classe B especificada na Parte 2 do Anexo 2 da Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971 , a outro ou outros, em violação da Secção 4(1) da Lei supramencionada; CONTRÁRIO à Lei do Uso Indevido de Drogas de 1971, Seção 4(3)(b), e será provado nos termos da Seção 29 da Lei de Justiça Criminal e Licenças (Escócia) de 2010 que o delito acima mencionado foi agravado por uma conexão com graves Crime organizado.

(01)

Em 25 de agosto de 2023, nas traseiras de …, AA agrediu EE, detetive policial dos Serviços Policiais da Escócia, e conduziu repetidamente um veículo motorizado, com a matrícula … em velocidade excessiva, em direção a EE, por meio do qual atingiu o corpo do dito EE, com o referido veículo motorizado e tentou assassinar o dito EE

(02)

Em 25 de agosto de 2023, numa estrada ou outro local público, nomeadamente nas traseiras de … e outros locais, AA conduziu um veículo de propulsão mecânica, nomeadamente um carro motorizado, com a matrícula …, perigosamente e conduziu em velocidade excessiva diretamente em direção ao Detetive EE, oficial dos Serviços Policiais da Escócia, e atingiu EE no corpo com o referido veículo motorizado e, a partir de então, continuou a conduzir em velocidade excessiva; CONTRÁRIO à Lei Rodoviária de 1988, seção 2 conforme alterada.

(03)

Em 25 de agosto de 2023, nas traseiras de … e outros lugares, AA, sabendo ou acreditando que estava prestes a ser preso por policiais dos Serviços Policiais da Escócia, conduziu perigosamente um veículo motorizado de propulsão mecânica, nomeadamente um automóvel com matrícula …, e conduziu em velocidade excessiva diretamente em direção ao Detetive EE, agente dos Serviços Policiais da Escócia, e atingiu o referido EE no corpo com o referido veículo motorizado e depois disso continuou a conduzir em velocidade excessiva para conseguir escapar e evitar ser preso pelos policiais, e fê-lo com a intenção de perverter o curso da justiça e, de fato, uma tentativa de obstrução da justiça

Natureza e qualificação jurídica da(s) infração/infrações e disposição legal/código aplicável:

(01) Esta é uma acusação formal, contrária à Secção 30(l)(a) da Lei de Justiça Criminal e Licenças (Escócia) 2010

(02) Esta é uma acusação formal, contrária à Secção 28(1) da Lei da Justiça Criminal e Licenças (Escócia) 2010

(04) Esta é uma acusação formal, contrária à Secção 170(2) da Lei de Gestão de Alfândegas e Impostos Especiais de 1979 — A acusação contém um agravamento legal ao abrigo da Secção 29 da Lei de Justiça Criminal e Licenças (Escócia) de 2010.

(05) Esta é uma acusação formal, contrária à Secção 4(3)(b) da Lei sobre o Uso Indevido de Drogas de 1971— A acusação contém um agravamento legal ao abrigo da Secção 29 da Lei de Justiça Criminal e Licenças (Escócia) de 2010.

(06) Esta é uma acusação formal, contrária à Secção 4(3)(b) da Lei sobre o Uso Indevido de Drogas de 1971— A acusação contém um agravamento legal ao abrigo da Secção 29 da Lei de Justiça Criminal e Licenças (Escócia) de 2010.

(07) Esta é uma acusação formal, contrária à Secção 4(3)(b) da Lei sobre o Uso Indevido de Drogas de 1971 — A acusação contém um agravamento legal ao abrigo da Secção 29 da Lei de Justiça Criminal e Licenças (Escócia) de 2010.

(01) Esta é uma acusação de direito consuetudinário de Tentativa de Homicídio.

(02) Esta é uma acusação formal, contrária à Secção 2 da Lei Rodoviária 1988.

(03) Esta é uma acusação de direito consuetudinário de Tentativa de Obstrução da Justiça.

Certificado e Declaração, ao abrigo da Seção 142 da Lei de Extradição de 2003 no Reino Unido:

A pessoa relativamente à qual este mandado é emitido é acusada no Reino Unido da prática dos crimes de extradição detalhados no mandado. O mandado é emitido com vista à detenção e extradição da pessoa para o Reino Unido, com o objetivo de ser processada por este ou por estes crimes.

E:

Fica através desta estabelecido que o mandado satisfaz as condições da Seção 142(6) da Lei de Extradição de 2003, na medida em que:

- Os crimes estão listados na Lista de Acordos de Comércio e Cooperação estabelecida no Anexo 2 da Lei de Extradição de 2003;

- Os crimes no processo no C022000413 são crimes parcialmente extraterritoriais; os crimes previstos no ST23001606 não são crimes extraterritoriais;

- A punição máxima para as infrações está definida na seção (c) acima.

I. Apenas nos casos em que o Estado de emissão e o Estado de execução tiverem procedido a uma notificação no âmbito do artigo 599(4), do Acordo, é aplicável o seguinte: indicar, se for caso disso, se se trata de urna ou mais das infrações que se seguem, puníveis no Estado de emissão com pena ou medida de segurança privativas de liberdade de duração máxima não inferior a três anos e tal como definidas pela legislação do Estado de emissão:

(…)

II. Descrição completa da(s) infração/infrações que não se encontrem previstas no ponto I acima:

(01) Secção 30(1)(a) da Lei da Justiça Criminal e Licenças (Escócia) 2010 — Esta ofensa envolve instruir outra pessoa a cometer uma ofensa grave. Uma infração grave é uma infração acusável cometida com a intenção de obter um benefício material. Neste caso, o crime grave é o envolvimento no fornecimento de drogas controladas.

(02) Secção 28(1) da Lei da Justiça Criminal e Licenças (Escócia) 2010 — Este delito envolve uma pessoa que concorda, com pelo menos outra pessoa, em envolver-se em crime organizado grave. Uma pessoa deve concordar em fazer algo, mesmo que isso constitua ou não uma ofensa. A pessoa também deve saber ou suspeitar (ou deveria ter sabido ou suspeitado razoavelmente) que sua ação permitiria ou promoveria o cometimento de crime organizado grave. Neste caso, o crime organizado grave com o qual a pessoa procurada aceitou envolver-se foi o fornecimento de drogas controladas.

(04) Secção 170(2) da Lei de Gestão de Alfândegas e Impostos Especiais de 1979 Este delito envolve uma pessoa conscientemente envolvida na evasão fraudulenta, ou na tentativa de evasão fraudulenta, da proibição de importação de mercadorias específicas. Neste caso, os bens específicos a que se refere a proibição de importação são drogas controladas. A agravação legal desta acusação acrescenta-se às infrações em que a pessoa que comete a infração é motivada pelo objetivo de cometer crime organizado grave.

(05) Secção 4(3)(b) da Lei sobre o Uso Indevido de Drogas de 1971— Este delito envolve o envolvimento de uma pessoa, a qualquer título, no fornecimento de uma droga controlada a outra pessoa. A acusação 5, neste caso, envolve o fornecimento da droga Classe A, cocaína. A agravação legal desta acusação acrescenta-se às infrações em que a pessoa que comete a infração é motivada pelo objetivo de cometer crime organizado grave.

(06) Secção 4(3)(b) da Lei sobre o Uso Indevido de Drogas de 1971— Este delito envolve o envolvimento de uma pessoa, a qualquer título, no fornecimento de uma droga controlada a outra pessoa. A acusação 6, neste caso, envolve o fornecimento da droga de Classe A, diamorfina (heroína). A agravação legal desta acusação acrescenta-se às infrações em que a pessoa que comete a infração é motivada pelo objetivo de cometer crime organizado grave.

(07) Secção 4(3)(b) da Lei sobre o Uso Indevido de Drogas de 1971— Este delito envolve o envolvimento de uma pessoa, a qualquer título, no fornecimento de uma droga controlada a outra pessoa. A acusação 7, neste caso, envolve o fornecimento da droga Cannabis Classe B. A agravação legal desta acusação acrescenta-se às infrações em que a pessoa que comete a infração é motivada pelo objetivo de cometer crime organizado grave.

(01) Tentativa de Homicídio — Homicídio é definido como qualquer ato intencional que cause a destruição de vidas, seja com a intenção de matar ou exibindo uma imprudência tão perversa que implique uma disposição depravada o suficiente para ser independente das consequências. Uma tentativa de cometer este crime é um crime em si. Neste caso, o ato intencional não resultou em morte, mas constituiu uma tentativa.

(02) Secção 2 da Lei Rodoviária 1988 — Este delito é cometido quando o arguido conduz perigosamente um veículo de propulsão mecânica numa estrada ou outro local público. Uma pessoa deve ser considerada como dirigindo perigosamente se a maneira de conduzir estiver muito abaixo do que seria esperado de um motorista competente e cuidadoso, e seria óbvio para um motorista competente e cuidadoso que conduzir dessa forma seria perigoso. O perigo referido é o de ferimentos a qualquer pessoa ou de danos graves à propriedade.

(03) Tentativa de Obstrução da Justiça — Uma tentativa de perverter o curso da justiça ocorre quando uma pessoa acusada faz esforços para evitar a deteção, interferir numa investigação ou de outra forma impedir o prosseguimento do curso da justiça. Este delito ocorre assim que o curso da justiça é iniciado, geralmente quando a polícia é alertada sobre a ocorrência de um crime ou tem motivos para suspeitar dele.

(…)

h) Cinco dos crimes com base nos quais este mandado foi emitido são passíveis de pena ou medida de segurança privativas de liberdade com carácter perpétuo. As infrações relevantes são as acusações 4, 5 e 6 do Caso … e as acusações 1 e 3 do caso ….

Existem três categorias de penas privativas de liberdade na Escócia:

1. Curto prazo: é quando a pessoa é condenada a menos de quatro anos de prisão. Esta categoria de reclusos tem direito a ser libertada após cumprir metade da pena.

2. Prisão de longa duração: aqui a pessoa é condenada a quatro anos ou mais prisão. Caso o tribunal tenha ordenado supervisão adicional para esta categoria de reclusos, estes não terão direito à libertação antecipada automática. Outros reclusos que recebam penas de 4 anos ou mais sem qualquer supervisão adicional imposta pelo tribunal têm direito à liberdade automática quando lhes faltam 6 meses para cumprir a pena. O prisioneiro pode apresentar um pedido de liberdade ao Conselho de Liberdade Condicional independente depois de cumprir metade da pena.

3. Prisão perpétua: aqui a pessoa é condenada a prisão perpétua. O prisioneiro pode apresentar um pedido de libertação ao Conselho de Liberdade Condicional independente após cumprir a parte da pena da pena.

Na Escócia, a pena de prisão perpétua é obrigatória quando a pessoa é condenada por homicídio.

A pena de prisão perpétua é discricionária quando prevista por lei ou em relação a crimes de direito consuetudinário excecionalmente graves.

Se a pessoa for condenada à prisão perpétua, o juiz sentenciador deve impor uma "parte da punição", cujo período deve ser cumprido antes que o preso possa solicitar liberdade condicional.

Qualquer sentença imposta por um tribunal na Escócia está sujeita a recurso.

Um Conselho de Liberdade Condicional independente conduz uma revisão da sentença do prisioneiro assim que a parte da punição for cumprida. Um juiz preside este painel. Uma audiência oral é realizada para determinar se a detenção do prisioneiro deve continuar. O painel deve decidir se é necessário, para a proteção do público, que a detenção do prisioneiro continue. Nesta audiência o preso está presente.

O Conselho de Liberdade Condicional pode instruir os ministros escoceses a libertar o prisioneiro. Se for decidido que o prisioneiro não deve ser libertado, será realizada uma nova audiência dentro de dois anos para rever a detenção do prisioneiro.

Se estiverem convencidos de que existem motivos compassivos que justificam a libertação de uma pessoa que cumpre uma pena de prisão, os ministros escoceses podem libertá-la mediante licença. A Prerrogativa Real da Misericórdia (Clemência) pode excecionalmente estar disponível.

O Estado de emissão, mediante pedido do Estado de execução, dará garantia de que:

- rever a pena ou medida imposta - a pedido ou pelo menos após 20 anos,

e/ou

- incentivar a aplicação de medidas de clemência a que a pessoa tem direito de requerer nos termos da lei ou da prática do Estado de emissão, visando a não execução de tal pena ou medida.

i) Autoridade judiciária que emitiu o mandado:

Designação oficial: Sheriff Court of Lothian and Borders, em Edimburgo

Nome do seu representante: FF

Função (título/grau): Sheriff

Referência do processo: …

Endereço: Edinburgh Sheriff Court, …, Edinburgo, Escócia, …

Telefone: (indicativo do país) (indicativo regional): (…) (…) …Fax: (indicativo do país) (indicativo regional): ..) (…) … Endereço eletrónico:

Contacto da pessoa indicada para tratar dos necessários aspetos práticos inerentes à entrega:

Extradition Team, International Cooperation Unit, ….

Caso tenha sido designada uma autoridade central para a transmissão e a receção administrativas dos mandados de detenção:

Nome da autoridade central: National Crime Agency (NCA)

Pessoa eventualmente a contactar (título/grau e nome): Gestor dos Fugitivos

Endereço: Fugitives Unit, NCA, …, London, …

Tel. No.: (…) (…) … Fax No. …

E-mail: manchester@...

Assinatura da autoridade judiciária de emissão e/ou do seu representante:

(Assinatura)

Nome: FF

Função (título/grau): Sheriff of Lothian and Borders, em Edimburgo

Data: 13 SETMBRO 2023

Carimbo oficial (eventualmente):”.

*

III. Fundamentação.

Os presentes autos têm por objeto a apreciação do pedido de cooperação internacional plasmado no Mandado de Detenção Internacional emitido pelas Justiças da Escócia, com vista à Extradição do cidadão escocês AA.

Para produzir efeitos após a saída do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte da União Europeia foi firmado um Acordo Internacional, feito em Bruxelas e em Londres em 30 de dezembro de 2020 (publicado no Jornal Oficial da União Europeia L 149, de 30 de abril de 2021, doravante designado Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido), sobre os processos de entrega entre os Estados-Membros da União Europeia e o Reino Unido.

Na sequência desse acordo, veio, por via da Lei nº 87/2021, de 15 de dezembro, a ser alterada a Lei nº 144/99, de 31 de agosto, tendo nesta sido introduzidos diversos preceitos específicos para tais processos de entrega.

Desse modo, passou a dispor a Lei nº 144/99, de 31 de agosto, designadamente o seguinte:

“Artigo 78.º-B

Aplicação do regime do mandado de detenção europeu

Aos procedimentos de emissão e aos processos de execução dos mandados de detenção decorrentes da aplicação dos acordos a que se refere o artigo anterior é aplicável, com as devidas adaptações, o regime jurídico do mandado de detenção europeu, aprovado pela Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto.

(…)

Artigo 78.º-D

Motivos de não execução obrigatória do mandado de detenção

A autoridade judiciária de execução recusa a execução do mandado de detenção:

a) Nos casos previstos no artigo 4.º do Acordo entre a União Europeia e a Islândia e a Noruega ou no artigo 600.º do Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido;

b) Se, nos casos não mencionados no artigo anterior e sem prejuízo do disposto na segunda parte da alínea a) do n.º 1 do artigo 5.º do Acordo entre a União Europeia e a Islândia e a Noruega ou do disposto na segunda parte da alínea a) do n.º 1 do artigo 601.º do Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido, o facto que determina a emissão do mandado de detenção não constituir uma infração nos termos da lei portuguesa;

c) Se o mandado de detenção tiver sido emitido para cumprimento de pena ou medida de segurança privativas da liberdade, nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 5.º do Acordo entre a União Europeia e a Islândia e a Noruega ou nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 601.º do Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido, quando a pessoa procurada tiver nacionalidade portuguesa ou for residente em território nacional, mediante prévia decisão de revisão e confirmação da sentença condenatória.

(…)

Artigo 78.º-F

Garantias a fornecer pelo Estado de emissão em casos especiais

Quando a infração que determina a emissão for punível com pena ou medida de segurança privativa da liberdade com caráter perpétuo, a execução do mandado de detenção fica sujeita à prestação das garantias estabelecidas no n.º 2 do artigo 8.º do Acordo entre a União Europeia e a Islândia e a Noruega ou na alínea a) do artigo 604.º do Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido.”.

No Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido, e precisamente na al a) do respetivo artigo 604º, sob a epígrafe “Garantias que o Estado de emissão deve fornecer em casos especiais”, estabelece-se:

“a) Quando a infração em que se baseia o mandado de detenção for punível com pena ou medida de segurança privativas da liberdade com caráter perpétuo no Estado de emissão, o Estado de execução pode sujeitar a execução do mandado de detenção à condição de o Estado de emissão dar uma garantia, considerada suficiente pelo Estado de execução, de que irá rever a pena ou medida imposta, mediante apresentação de pedido ou, o mais tardar, no prazo de 20 anos, ou de que irá encorajar a aplicação das medidas de clemência a que a pessoa tenha direito nos termos do direito ou da prática do Estado de emissão, com vista a que aquela pena ou medida não seja executada”.

Em consonância, preceitua o artº 13º da Lei nº 65/2003, de 23 de agosto, sob a epígrafe «Garantias a fornecer pelo Estado-Membro de emissão em casos especiais»

«1 - A execução do mandado de detenção europeu só terá lugar se o Estado-Membro de emissão prestar uma das seguintes garantias:

a) Quando a infração que motiva a emissão do mandado de detenção europeu for punível com pena ou medida de segurança privativas da liberdade com carácter perpétuo, só será proferida decisão de entrega se estiver prevista no sistema jurídico do Estado-Membro de emissão uma revisão da pena aplicada, a pedido ou o mais tardar no prazo de 20 anos, ou a aplicação das medidas de clemência a que a pessoa procurada tenha direito nos termos do direito ou da prática do Estado-Membro de emissão, com vista a que tal pena ou medida não seja executada;

(…)”.

Importa não olvidar que o regime jurídico do Mandado de Detenção Europeu (MDE), fixado na Lei n.0 65/2003, de 23 de agosto, assenta no princípio do reconhecimento mútuo, o qual impõe às autoridades de um Estado que aceitem reconhecer os mesmos efeitos às decisões estrangeiras que reconhecem às decisões nacionais, apesar das diferenças que oponham as ordens jurídicas de cada estado. O princípio assenta na confiança mútua recíproca entre os Estados membros, designadamente no que respeita à conformação das decisões judiciais com as normas consagradas nos respectivos sistemas legais. (1)

O MDE é uma decisão judiciária emitida por um Estado membro com vista à detenção e entrega por outro Estado membro de uma pessoa procurada para 'efeitos de procedimento criminal ou para cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas da liberdade — artigo 1º, nº 1, da Lei nº 65/2003, de 23 de agosto.

Trata-se de um processo simplificado que "é executado com base no princípio do reconhecimento mútuo em conformidade com o disposto na presente lei e na Decisão Quadro nº 2002/584/JAI, do Conselho, de 13 de junho" - no 2.

O que implica que a autoridade de execução não se envolva na avaliação da substância da decisão, senão nos aspetos que possam integrar um motivo de recusa de execução, obrigatória ou facultativa.

Como expressamente indica o artigo 1º da Decisão Quadro 2002/584, o MDE é a própria decisão a executar e não a decisão ordenadora do procedimento criminal ou a decisão condenatória, em que necessariamente assenta.

Por esse motivo, o legislador europeu adotou um formulário cuja função é constituir a base objetiva da decisão a executar e que, por isso, vale por si, sem necessidade de ser acompanhado da decisão proferida pela autoridade competente do Estado de emissão.

Sendo o MDE uma decisão, que deverá conter as indicações previstas no artigo 8º, nº 1, vale por si, sem necessidade de ser integrado por outras informações.

Nos termos da Lei e da Decisão-Quadro, o mandado de detenção europeu direciona-se quer ao cumprimento da decisão final do processo criminal "cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas da liberdade", quer ao cumprimento de um procedimento processual no decurso do processo - "efeitos de procedimento criminal".

À autoridade judiciária do país da execução compete, pois, verificar se o mandado contém as informações constantes do artigo 3º da Lei nº 65/2003, bem como analisar se ocorre qualquer causa de recusa obrigatória (artigo 11º) ou facultativa (artigo 12º) de execução.

Como se escreveu no mencionado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Junho de 2009: “a sindicância judicial a exercer no Estado receptor é muito limitada, perfunctória, sem abandono, contudo, pese embora a sua celeridade, do respeito por aqueles direitos fundamentais, produzindo a decisão no Estado emitente efeitos pelo menos equivalentes a uma decisão tomada pela autoridade judiciária nacional (...)”.

Todas estas considerações, nas quais muito de perto seguimos o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 1 de junho de 2021 (2), são transponíveis para o procedimento de que nos ocupamos, por via do disposto no artigo 78º-B da Lei nº 144/99, de 31 de agosto.

Nos termos do nº 1 do artigo 21º da Lei 65/2003, de 23 de agosto, a pessoa procurada pode não consentir na sua entrega ao Estado membro de emissão (circunstância que se verifica no caso), mas a oposição só pode ter por fundamentos o erro na identidade do detido ou a existência de causa de recusa de execução do mandado de detenção europeu.

O Requerido AA não invocou erro na identidade da pessoa procurada, reconhecendo, assim, ser o destinatário do mandado de detenção internacional emitido pela Escócia. Igualmente não invocou causa de recusa obrigatória (artigo 11º da Lei 65/2003, de 23 de agosto).

O Requerido, AA, deduziu oposição à execução do Mandado de Detenção emitido pelas Autoridades Judiciárias Escocesas, para procedimento criminal, invocando muito em suma duas ordens de razões: que, estando prevista a pena de prisão perpétua para parte das infrações criminais imputadas, por um lado, as garantias apresentadas não são fidedignas, não foram subscritas por quem de direito e, por isso, não vinculam o Estado Emissor e, por outro lado, que mesmo a poderem ser consideradas válidas, tais garantias não são suficientes, pelo seu conteúdo, para que a entrega solicitada ocorra sem violação das normas da Constituição da República Portuguesa.

Vejamos cada uma dessas ordens de razões.

*

Comecemos pelas questões que se prendem fundamentalmente com a validade/regularidade/fidedignidade das garantias apresentadas.

O Juiz escocês FF, Magistrado Judicial que exerce funções no Tribunal denominado Sheriff Court of Lothian and Borders (3), sedeado em Edimburgo, emitiu e assinou em 13 de setembro de 2023, um mandado de detenção internacional para detenção e entrega do requerido às autoridades judiciárias da Escócia, para efeitos de procedimento criminal no âmbito dos casos … e ….

Desde logo, no Mandado de Detenção Internacional emitido, o Juiz do Estado Emissor consignou que “Cinco dos crimes com base nos quais este mandado foi emitido são passíveis de pena ou medida de segurança privativas de liberdade com carácter perpétuo. As infrações relevantes são as acusações 4, 5 e 6 do Caso … e as acusações 1 e 3 do caso …”.

Mais consignou que, na Escócia, se “a pessoa for condenada à prisão perpétua, o juiz sentenciador deve impor uma "parte da punição", cujo período deve ser cumprido antes que o preso possa solicitar liberdade condicional”, que “Qualquer sentença imposta por um tribunal na Escócia está sujeita a recurso” e que “Um Conselho de Liberdade Condicional independente conduz uma revisão da sentença do prisioneiro assim que a parte da punição for cumprida. Um juiz preside este painel. Uma audiência oral é realizada para determinar se a detenção do prisioneiro deve continuar. O painel deve decidir se é necessário, para a proteção do público, que a detenção do prisioneiro continue. Nesta audiência o preso está presente. O Conselho de Liberdade Condicional pode instruir os ministros escoceses a libertar o prisioneiro. Se for decidido que o prisioneiro não deve ser libertado, será realizada uma nova audiência dentro de dois anos para rever a detenção do prisioneiro. Se estiverem convencidos de que existem motivos compassivos que justificam a libertação de uma pessoa que cumpre uma pena de prisão, os ministros escoceses podem libertá-la mediante licença. A Prerrogativa Real da Misericórdia (Clemência) pode excecionalmente estar disponível.”

O Juiz do Estado emissor fez, ainda, consignar no Mandado de Detenção o seguinte:

“O Estado de emissão, mediante pedido do Estado de execução, dará garantia de que:

- rever a pena ou medida imposta - a pedido ou pelo menos após 20 anos, e/ou

- incentivar a aplicação de medidas de clemência a que a pessoa tem direito de requerer nos termos da lei ou da prática do Estado de emissão, visando a não execução de tal pena ou medida”.

Na sequência da decisão emitida neste Tribunal da Relação de Évora, após audição do detido, foi determinado que “o processo aguarde a junção das garantias previstas no artigo 78º-F da Lei nº 144/99”, decisão essa que foi comunicada às Justiças da Escócia, vindo a ser apresentada nos autos carta de garantias (“letter of assurance”), com o teor que no relatório supra se transcreveu, e do qual resulta expressamente que ao visado AA, pessoalmente, são garantidas:

- a revisão da eventual sentença de carácter perpétuo de que venha a ser alvo, em conformidade com o artigo 604, alínea a) do Acordo entre a União Europeia e o Reino Unido, esclarecendo que “Se o Sr. AA for condenado a uma sentença de prisão perpétua, o tribunal é obrigado a determinar uma sentença por um período fixo (determinate sentence) com uma “parte de castigo” (punishment part) específica. Este é o período de privação da liberdade que a pessoa é obrigada a cumprir antes do Parole Board (Comissão de Liberdade Condicional) considerar a possibilidade de ser libertada” e que “Após cumprir a “parte de castigo” da pena, o Sr. AA pode apresentar um Ministério Público Escocês pedido aos Ministros Escoceses para que remetam o seu processo para o Parole Board. Os Ministros também o podem fazer sem que ele tenha de apresentar tal pedido”, sendo que “Se o Parole Board decidir que não é necessário que a sentença do recluso continue para a proteção do público, os Ministros Escoceses são obrigados a libertá-lo. Se for decidido que o recluso não deve ser libertado, uma segunda revisão é realizada dentro de 2 anos e a intervalos regulares após esse período”;

- medidas de clemência, esclarecendo que “O sistema escocês prevê a aplicação de medidas de clemência, em conformidade com o artigo 604, alínea a) do Acordo de Comércio e Cooperação. Se condenado e sentenciado a uma pena de prisão, o Sr. AA poderá ser libertado por motivos compassivos ou mediante a Prerrogativa Real de Perdão. Em ambos estes casos, o Sr. AA pode apresentar um pedido a qualquer altura durante o período da sua sentença, independentemente de se tratar de uma pena de prisão de curta duração, de longa duração ou perpétua. Pode apresentar um pedido aos Ministros Escoceses, que tomam uma decisão a respeito do pedido”;

- libertação por Compaixão, esclarecendo que “o Sr. AA pode apresentar um pedido aos Ministros Escoceses a qualquer altura, para ser libertado por motivos compassivos, ao abrigo da secção 3 da Lei relativa aos Reclusos e Processo Criminal (Escócia) de 1993 (Prisoners and Criminal Proceedings (Scotland) Act 1993). Ao deliberar sobre o pedido de libertação por motivos compassivos de um recluso a cumprir uma pena de prisão de longa duração, os Ministros Escoceses são obrigados a consultar o Parole Board. Se o pedido for deferido, o recluso é libertado”.

- libertação mediante Prerrogativa Real, esclarecendo que “O recluso pode apresentar um pedido de libertação mediante Prerrogativa Real a qualquer altura durante o período de prisão. Se o Sr. AA apresentar um pedido de libertação com base na Prerrogativa Real de Perdão, o pedido é apresentado aos Ministros Escoceses. A Prerrogativa Real de Perdão permite alterações nas penas ou o perdão de condenações pelo crime. A Prerrogativa Real de Perdão é exercida por Sua Majestade o Rei, mediante recomendação do Primeiro Ministro da Escócia”.

Todos estes esclarecimentos foram trazidos aos autos em comunicação subscrita por BB, Responsável pela Assistência Mútua em Matéria Legal na Escócia. Como veio a ser informado nos autos, o mesmo encontra-se contratado pelo The Crown Office and Procurator Fiscal Service (Ministério Público Escocês), como jurista. Representa o Lord Advocate, que é um Ministro Escocês e que representa os Ministros Escoceses em matéria de Extradição na Escócia.

Como foi explicitado nos autos, o Sr. BB, subscritor da “letter of assurance”, não tem o poder de vincular o governo ou os tribunais na Escócia. Na Escócia, o sistema judicial é, como em Portugal, independente. O que o subscritor da carta de garantias fez foi indicar a lei escocesa que vincula tanto os Tribunais, como o governo.

Aqui chegados, somos levados a concluir que as garantias apresentadas se mostram válidas, regulares e fidedignas, não sendo exigível a apresentação de ulteriores garantias pelo Estado emissor.

Na perspetiva que foi acolhida no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de julho de 2021, aliás, mostrar-se-iam suficientes os termos constantes do Mandado de Detençao emitido pelo Tribunal Escocês. (4) Nesse douto Acórdão, tirado num caso em que o MDE fora emitido pelas autoridades judiciárias italianas, o STJ concordou com o entendimento da Relação de Lisboa, no sentido de que:

«no Mandado de Detenção Europeu emitido pelas autoridades judiciárias italianas, ora em apreço, em II. h), já estão prestadas tais garantias, porquanto aí se faz constar a condenação em "prisão perpétua em isolamento diurno" e expressamente se diz que:

- o sistema judiciário do Estado Membro de emissão prevê a revisão da pena infringida - caso esta seja solicitada, ou bem dentro de um prazo máximo de 20 anos - com vista ao'não cumprimento de tal pena ou medida.

e/ou

- o sistema judiciário do Estado Membro de emissão prevê a aplicação de medidas de clemência, a que a pessoa tenha direito ou a praxe do Estado Membro de emissão, com vista ao não cumprimento de tal pena ou medida", conforme tradução de fls. 9 e 10.

O mandado de detenção europeu emitido pela autoridade judiciária italiana satisfaz, assim, as exigências exigidas à luz da referida Decisão Quadro e do art. 13°, nº 1, a), da nossa Lei 65/2003.

De resto, também é sabido que o sistema penal italiano, em matéria de execução não prevê o cumprimento de uma pena perpétua.

Não há, pois, que solicitar ao Estado emissor a prestação de garantias, como pretende o requerido, ou mesmo solicitar pedidos de esclarecimento sobre esta matéria.

É, pois, perante as garantias prestadas pelo Estado de emissão do presente MDE, de autorizar a entrega da pessoa procurada ao Estado Italiano, nos, termos da condição prevista na alínea a) do n° 1 do art. 13° da Lei n° 65/2003, de 23.8, por não existir obstáculo à entrega do requerido».

Perfilhando a mesma perspetiva, poder-se-ia dizer que, considerando os elementos constantes do Mandado de Detenção Internacional dos autos, acima referidos, desse instrumento emitido pela autoridade judiciária escocesa decorreria já a satisfação das exigências previstas no artigo 13°, nº 1, al. a), da Lei 65/2003.

Esse preceito, recordamos, preceitua que a execução do mandado de detenção europeu só terá lugar se o Estado-Membro de emissão prestar designadamente a seguinte garantia:

“a) Quando a infração que motiva a emissão do mandado de detenção europeu for punível com pena ou medida de segurança privativas da liberdade com carácter perpétuo, só será proferida decisão de entrega se estiver prevista no sistema jurídico do Estado-Membro de emissão uma revisão da pena aplicada, a pedido ou o mais tardar no prazo de 20 anos, ou a aplicação das medidas de clemência a que a pessoa procurada tenha direito nos termos do direito ou da prática do Estado-Membro de emissão, com vista a que tal pena ou medida não seja executada” (destacado nosso).

No Mandado de Detenção emitido no caso concreto, o Juiz subscritor, expressamente mencionou que o sistema jurídico vigente na Escócia prevê:

“Se a pessoa for condenada à prisão perpétua, o juiz sentenciador deve impor uma "parte da punição", cujo período deve ser cumprido antes que o preso possa solicitar liberdade condicional.

Qualquer sentença imposta por um tribunal na Escócia está sujeita a recurso.

Um Conselho de Liberdade Condicional independente conduz uma revisão da sentença do prisioneiro assim que a parte da punição for cumprida. Um juiz preside este painel. Uma audiência oral é realizada para determinar se a detenção do prisioneiro deve continuar. O painel deve decidir se é necessário, para a proteção do público, que a detenção do prisioneiro continue. Nesta audiência o preso está presente.

O Conselho de Liberdade Condicional pode instruir os ministros escoceses a libertar o prisioneiro. Se for decidido que o prisioneiro não deve ser libertado, será realizada uma nova audiência dentro de dois anos para rever a detenção do prisioneiro.

Se estiverem convencidos de que existem motivos compassivos que justificam a libertação de uma pessoa que cumpre uma pena de prisão, os ministros escoceses podem libertá-la mediante licença. A Prerrogativa Real da Misericórdia (Clemência) pode excecionalmente estar disponível.

O Estado de emissão, mediante pedido do Estado de execução, dará garantia de que:

- rever a pena ou medida imposta - a pedido ou pelo menos após 20 anos,

e/ou

- incentivar a aplicação de medidas de clemência a que a pessoa tem direito de requerer nos termos da lei ou da prática do Estado de emissão, visando a não execução de tal pena ou medida”.

Entendeu este Tribunal da Relação de Évora dever ser mais cauteloso quanto à definição das garantias e, nessa medida, foi suscitada a apresentação da “letter of assurance” que, ultrapassando a previsão genérica e abstrata do sistema jurídico vigente na Escócia, viesse trazer aos autos a informação das garantias prestadas no caso pessoal e concreto do cidadão AA.

Essa exigência foi transmitida por este Tribunal às Justiças da Escócia e, nessa sequência, veio a ser apresentada a “letter of assurance” subscrita por BB, Responsável pela Assistência Mútua em Matéria Legal na Escócia.

Tendo presente o conteúdo da carta de garantias apresentada e a qualidade do seu subscritor, não pode deixar de constatar-se que foi junta aos autos uma Garantia Solene prestada perante o Estado Português – o seu subscritor, que exerce funções como jurista no The Crown Office and Procurator Fiscal Service (Ministério Público Escocês), representa o Lord Advocate, que é o Ministro Escocês que representa o Estado emissor em matéria de Extradição na Escócia. A garantia prestada é a de que o visado AA, no caso de ser condenado a prisão perpétua, não irá cumprir reclusão pelo tempo correspondente à sua vida, beneficiando, em concreto, das medidas previstas no sistema jurídico escocês e mencionadas em termos genéricos no Mandado de Detenção.

Com tal garantia, o Estado emissor assegura ao Estado requerido (o Estado Português) que usará dos poderes que lhe são atribuídos pela lei escocesa para que o aqui requerido, ainda que venha a ser condenado a prisão perpétua, venha a beneficiar de uma revisão da pena aplicada, a pedido ou o mais tardar no prazo de 20 anos, ou da aplicação das medidas de clemência a que tenha direito nos termos previstos pelo sistema jurídico escocês, com vista a que tal pena não seja integralmente executada.

Como se considerou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de junho de 2023 (5) (que a defesa do visado AA citou, embora não nesta particular partição), não é necessária a prestação de garantia pelas próprias autoridades judiciais escocesas.

À objeção do visado de que “o senhor BB Diretorr de Assistência Mútua em Matéria Legal Unidade de Cooperação Internacional, não representa nem vincula o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, nem o Governo da Escócia, ou por maioria de razão os Tribunais Escoceses, pelo que nunca se poderá considerar que a carta junta sob a referência CITIUS n.º … está apta a corresponder à emissão de garantia dada pelo Estado de Emissão”, deve responder-se como no referido Acórdão de 29.06.2023 se respondeu quanto à vinculação do Estado da Índia:

“Nestes termos, entendemos ser suficiente a garantia prestada nos termos em que o foi.

Por outro lado, invoca o requerido a incompetência da entidade emissora da garantia, por ser prestada por elemento exterior ao poder judicial.

Contudo, sempre ressalvado o devido respeito por opinião contrária, não se alcança como seria de exigir que a garantia fosse prestada pela autoridade judicial indiana, o que, para além de contrariar o disposto nas normas legais indianas que permitem a comutação de penas ao Governo Indiano, consubstanciaria uma intromissão no poder judicial a quem caberá a função de julgar e de aplicar a pena que reputar como legalmente imposta pelo seu ordenamento jurídico.”.

Nestes termos, impõe-se concluir que as garantias prestadas são válidas, regulares e fidedignas, tendo sido prestadas quanto ao cidadão concretamente visado pelo pedido do Estado emissor e relativamente às específicas infrações que admitem a possibilidade de condenação em pena de prisão perpétua.

Improcede, pois, a primeira linha de objeções da defesa.

*

Enfrentemos, então, a questão de saber se as garantias efetivamente prestadas não são suficientes, pelo seu conteúdo, para que a entrega solicitada ocorra sem violação das normas da Constituição da República Portuguesa.

Em Portugal, a pena de prisão tem a duração máxima de 20 anos, podendo chegar aos 25 anos nos caso previstos na lei, sendo que, em caso algum, pode ser excedido este limite máximo — artigo 41º, nrs. 1, 2 e 3 do Código Penal.

Estabelece o artigo 33º, no 3 da Constituição da República Portuguesa que:

"A extradição de cidadãos portugueses do território nacional só é admitida, em condições de reciprocidade estabelecidas em convenção internacional, nos casos de terrorismo e de criminalidade internacional organizada, e desde que a ordem jurídica do Estado requisitante consagre garantias de um processo justo e equitativo”.

Por sua vez o no 4 do mesmo preceito constitucional determina que: "Só é admitida a extradição por crimes a que corresponda, segundo o direito do Estado requisitante, pena ou medida de segurança privativa ou restritiva da liberdade com carácter perpétuo ou de duração indefinida, se nesse domínio, o Estado requisitante for parte de convenção internacional a que Portugal esteja vinculado e oferecer garantias de que tal pena ou medida de segurança não será aplicada ou executada.”.

O nº 5 também do mesmo preceito da Lei Fundamental refere que: "O disposto nos números anteriores não prejudica a aplicação das normas de cooperação judiciária penal estabelecidas no âmbito da União Europeia.”

Em termos de proibição absoluta de extradição ou de entrega de pessoas procuradas, estabelece o no 6 do artigo 33º da Constituição da República Portuguesa que: "Não é admitida a extradição, nem a entrega a qualquer título, por motivos políticos ou por crimes a que corresponda, segundo o direito do Estado requisitante, pena de morte ou outra de que resulte lesão irreversível da integridade fisica.

A exigência constitucional de que sejam oferecidas garantias de que a pena ou medida de segurança com carácter perpétuo ou de duração indefinida não será aplicada ou executada foi vertida no regime legal do MDE, mais precisamente no artigo 13º da Lei no 65/2003, de 23 de agosto, que refere:

"l. A execução o mandado de detenção europeu só terá lugar se o Estado membro de emissão prestar uma das seguintes garantias:

a) Quando a infração que motiva a emissão do mandado de detenção europeu for punível com ena ou medida de segurança privativas da liberdade com carácter perpétuo, so será proferida decisão de entrega se estiver prevista no sistema jurídico do Estado membro de emissão uma revisão da pena aplicada, a pedido ou o mais tardar no prazo, de 20 anos, ou a aplicação das medidas de clemência a que a pessoa procurada tenha direito nos termos do direito ou da prática do Estado membro de emissão, com vista a que tal pena ou medida não seja executada;

b) Quando a pessoa procurada para efeitos de procedimento penal for nacional ou residente no Estado membro de execução, a decisão de entrega pode ficar sujeita à condição de que a pessoa procurada, após ter sido ouvida, seja devolvida ao Estado membro de execução para nele cumprir a pena ou a medida de segurança privativas da liberdade a que foi condenada no Estado membro de emissão”.

No caso concreto, as garantias prestadas pelo Estado emissor mostram-se suficientes para alcançar o desiderato previsto na Constituição. Das garantias apresentadas resulta que a Justiça da Escócia, caso venha a ser aplicada ao visado a prisão perpétua aplicará medidas visando a sua não execução.

A semelhante conclusão se chegou no Acórdão desta Relação de Évora de 21 de maio de 2019, num caso em que o Estado emissor era a França:

“Ora, tendo-se feito constar do MDE ora em execução que “o sistema jurídico francês aplica medidas de clemência previstas pela lei para o não cumprimento da pena, nomeadamente medidas de libertação condicional”, a emissão de tal declaração pela autoridade judiciária emitente do MDE satisfaz a condição exigida pelo citado art. 13º nº 1 a) da lei 65/2003, correspondente ao art. 5º nº2 da Decisão-quadro do Conselho, 2002/584/JAI, de 13 de Junho de 2002, quer porque nada obsta a que declaração exigida conste do MDE a executar (assim, Ac STJ de 25.02.2010, rel. Pereira Madeira), quer porque estes normativos bastam-se com a garantia de que o Estado de emissão aplique medida visando a não execução da pena perpétua, sem exigirem garantia da verificação do resultado visado por aquelas normas, ou seja, sem exigirem a garantia da não aplicação efetiva da prisão perpétua.

Esta solução só aparentemente contraria a parte final do art.º 33º nº4 da Constituição da República Portuguesa (introduzida na Revisão de 1997 com numeração diversa), que exige a prestação de garantias de que a pena ou medida de segurança com caráter perpétuo não será aplicada ou executada, pois desde a revisão operada pela Lei 1/2001 que o artigo 33º nº5 da CRP ressalva expressamente a aplicação das normas de cooperação judiciária penal estabelecidas no âmbito da União Europeia. Ou seja, a CRP admite expressamente que estas últimas normas estabeleçam regime mais permissivo que o previsto genericamente para a extradição no referido nº4 do seu art. 33º, o que sucede, precisamente, com o citado art. 5º nº2 da DQ 2002/584/JAI, que deu origem ao art. 13º nº1 a) da Lei 65/2003, que são inequivocamente normas de cooperação judiciária penal estabelecidas no âmbito da EU.

Assim sendo, a declaração das autoridades judiciárias francesas inserida no MDE de que o sistema jurídico francês aplica medidas de clemência previstas pela lei para o não cumprimento da pena, nomeadamente medidas de libertação condicional, é conforme com estas últimas disposições normativas, que, por sua vez, respeitam a CRP por força da ressalva contida no seu art. 33º nº5, pelo que o caráter perpétuo da pena aplicável não obsta à entrega da pessoa procurada e agora detida à autoridade judiciária francesa emitente do presente MDE.”.

Neste mesmo sentido se pronunciara já o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 13 de julho de 2016 (6), onde se poderá ler:

«Quanto à pena de prisão perpétua, tendo sido abolida em Portugal há mais de 125 anos, pela Lei de 4 de Junho de 1884, encontra-se a mesma proscrita pela nossa Constituição da República em virtude de a sua aplicação repugnar à consciência jurídica que enforma o nosso ordenamento, tendo em conta a prevalência da dignidade da pessoa humana e do seu reflexo na ponderação dos fins das penas, onde necessariamente avulta a recuperação e a reintegração social do delinquente.

Mas como já anotava Gomes Canotilho, a propósito da extradição - in Revista de Legislação e Jurisprudência nº 3857, p. 249 e segs -, só em casos de proibição absoluta de extraditar “a ordem jurídico-constitucional portuguesa se autoconstitui em reduto inexpugnável de protecção dos bens da vida e da liberdade. Nos outros casos devem ser tomadas em conta as exigências do direito internacional (...) Só em casos de violação da ordem pública jurídico-constitucional e da inexistência de standards mínimos de justiça procedimental na ordem jurídica do Estado requisitante se exige um comportamento mais vigilantemente amigo dos direitos fundamentais”.

E, mais adiante: “é razoável admitir uma solução menos drástica quando esteja em causa a extradição por crime a que corresponda pena de prisão perpétua. Aqui o critério da punibilidade em concreto é o que melhor se adapta às necessidades de cooperação judiciária internacional em matéria penal, sem que com isso se possa acusar o legislador ou os tribunais de estarem a violar normas constitucionais.”

Também Figueiredo Dias, Extradição e Non Bis in Idem, Parecer, in Direito e Justiça, IX, 1995, p. 216, defendia que “não basta ser presumível a não aplicação da pena de prisão perpétua. Pelo contrário, tem que existir uma garantia efectiva da não aplicação dessa pena, por via do instituto da comutação “em face do disposto no artigo 6º do diploma sobre cooperação judiciária internacional em matéria penal,”,

Em idêntico sentido sintetizava Marques Vidal - Os Tratados Comunitários e o Acordo e Convenção de Schengen - génese e correlação -in Documentação e Direito Comparado - Boletim do Ministério da Justiça nº 69/70, p.20: -“Deste modo, a cooperação judiciária não será recusada se o Estado parte que a solicita, nos casos puníveis com pena perpétua, der garantias de aplicação concreta de sanções alternativas. Se essas garantias não forem fornecidas pelo Estado parte que solicita a cooperação, esta deve ser-lhe recusada.”

Como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira in CRP, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4.ª edição, Coimbra Editora, p. 533. em anotação ao artº 33º da Constituição:

“Diferentemente do que se previa na lei (DL n 43/91), em que se equiparava a extradição por crime a que correspondesse pena de morte, o texto constitucional estabelece aqui garantias menos enérgicas das que impõe para o caso da pena de morte. A proibição de extradição cede, nestes casos, perante garantias oferecidas pelo Estado requisitante de que tal pena não será aplicada ou executada – porque o Estado requerente decidiu converter a pena ou medida de segurança de duração indefinida ou porque aceitou a conversão dessas penas ou medidas por um tribunal português segundo a lei portuguesa -, o que aponta para a consagração do critério de punibilidade em concreto.”

A alínea c) do artº 13º da Lei nº 65/2003 delimita o modo de cooperação internacional, ao conceder potestas ao Estado nacional, salvaguardando a sua soberania como Estado membro da execução, na protecção dos seus nacionais ou residentes, para cumprimento de pena ou de medida de segurança privativas de liberdade a que foi condenada a pessoa procurada no estado membro de emissão.

Este entendimento enraizava-se já nos valores humanistas da ordem pública nacional, testemunhados pelo ordenamento jurídico, de que a abolição da pena de morte o constituiu pioneiro, e tem-se mantido ao longo do tempo, de que os actuais artsº 1º, 2º 9º b), 13º e 30º da Constituição da República são paradigma.

Aliás, nessa óptica, a título de exemplo, Portugal formulou - como Parte Contratante na Convenção Europeia de Extradição, estabelecida com base no artigo k.3 do Tratado da União Europeia, Relativa à Extradição entre os Estados membros da União Europeia, a seguinte Declaração:

“Tendo formulado uma reserva à Convenção Europeia de Extradição de 1957, segundo a qual não concederá a extradição de pessoas reclamadas por um crime a que corresponda uma pena ou uma medida de segurança com carácter perpétuo, Portugal declara que, nos casos em que o pedido de extradição se baseie numa infracção a que corresponda tal pena ou medida de segurança, apenas concederá a extradição, respeitadas as disposições pertinentes da sua Constituição, conforme interpretadas pelo seu Tribunal Constitucional, se considerar suficientes as garantias prestadas pelo Estado-membro requerente de que aplicará, de acordo com a sua legislação e a sua prática em matéria de execução de penas, as medidas de alteração de que a pessoa reclamada possa beneficiar”».

AA é cidadão escocês, encontra-se acusado do cometimento de crimes na Escócia, é aplicável a lei escocesa e, por essa via poderá o mesmo vir a ser condenado em prisão perpétua.

Essa circunstância, porém, não obsta à sua extradição.

É conforme à Constituição da república portuguesa a permissão pela ordem jurídica portuguesa de uma semelhante pena de prisão, desde que seja executada de forma condicionada, sujeita à garantia dada, relativamente ao cidadão estrangeiro concreto.

O sistema jurídico escocês prevê uma revisão da pena decorrido o período mínimo de reclusão obrigatória e o mais tardar decorridos 20 anos (cfr. o Mandado de Detenção emitido) e também prevê a aplicação de medidas de clemência, com vista a que a pena não seja executada.

Por tudo o que exposto foi considera-se suficiente a garantia prestada e improcedente a oposição do visado AA.

*

IV. DECISÃO.

Em face do exposto, acordam os Juízes neste Tribunal da Relação de Évora, em:

1. Julgar improcedente a oposição apresentada pelo requerido AA;

2. Autorizar a detenção e entrega do requerido à Escócia para procedimento criminal, conforme pedido no Mandado de Detenção Europeu emitido pelas autoridades judiciárias escocesas, no âmbito dos casos … e …, consignando-se que o cidadão visado não renunciou ao princípio da especialidade.

*

Proceda-se às necessárias notificações ao Digno Magistrado do Ministério Público, à Autoridade Judiciária de emissão, ao requerido, ao seu Ilustre mandatário.

Comunique de imediato à PGR e ao Gabinete Nacional da Interpol.

Oportunamente, transitado este acórdão, proceder-se-á à emissão de mandados de captura e posteriormente de entrega do requerido.

Sem tributação.

D.N.

*

O presente acórdão foi elaborado pelo Relator e por si integralmente revisto (art. 94º, n.º 2 do C.P.P.).

Évora, 23 de janeiro de 2024

Jorge Antunes (Relator)

Maria Filomena Valido Viegas de Paula Soares (1ª Adjunta)

António Condesso (2º Adjunto)

1 Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Junho de 2009, processo n.0 1087/09.6YRLSB.S1, acessível em www.dgsi.pt.

2 Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 1 de junho de 2021 - Processo nº 926/21.8YRLSB – Relator: Cid Geraldo.

3 Na Escócia, o sistema judicial está organizado em seis dividões territoriais, denominadas “sheriffdoms”, funcionando em cada uma delas um diferente Tribunal de Sheriff. Essas seis divisões territoriais (sheriffdoms) são: 1 - Glasgow & Strathkelvin; 2 - Grampian, Highland & Islands; 3 - Lothian & Borders; 4 - North Strathclyde; 5 - South Strathclyde, Dumfries & Galloway; e 6 -Tayside, Central & Fife.

4 Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de julho de 2021, proferido no processo 926/21.8YRLSB.S1 – Relatora: Conselheira Maria da Conceição Simão Gomes - acessível em: http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/459804ed046b2de78025874900573c07?OpenDocument

5 Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de junho de 2023 – Relator: Conselheiro Pedro Branquinho Dias – proferido no Processo 3726/22.YRLSB http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b41666f7e119f73b802589de002fb176?OpenDocument

6 Cfr. Ac. do STJ de 13 de julho de 2016 – Relator: Conselheiro Raúl Borges – acessível em: http://www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/37ff232a321b299a802580030053d756?OpenDocument