Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
907/18.9T8GRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MOREIRA DO CARMO
Descritores: APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
PRAZO PARA A PROPOSITURA DE ACÇÃO DE DEFESA DOS DIREITOS INERENTES A BALDIO
MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO NA 1.ª INSTÂNCIA
DECISÃO NÃO FUNDAMETANDA OU DEFICIENTEMENTE FUNDAMETADA
BAIXA DOS AUTOS PARA FUNDAMENTAÇÃO
Data do Acordão: 05/02/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL E CRIMINAL DA GUARDA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE COM BAIXA À 1.ª INSTÂNCIA PARA FUNDAMENTAÇÃO
Legislação Nacional: ARTIGO 12.º, 2, DO CÓDIGO CIVIL
ARTIGOS 5.º, 1; 607.º, 4 E 662.º, 2, D), DO CPC
ARTIGOS 15.º, 1, O) E 21,º, H), DA LEI N.º 68/93, DE 4/9
ARTIGOS 24.º, 1, Q) E R) E 2 E 29.º, 1, H), DA LEI N.º 75/17, DE 17/8
Sumário: i) Se no âmbito da anterior Lei dos Baldios (Lei 68/93), o conselho directivo decidiu recorrer a juízo e constituir mandatário para defesa de direitos ou interesses legítimos da comunidade relativos ao correspondente baldio e submeteu tal decisão a ratificação da Assembleia de Compartes, o que aconteceu, a propositura da acção judicial pode ocorrer a qualquer momento, não estando sujeita a qualquer duração de validade temporal, nem ao regime dos pressupostos da nova Lei (a 75/17), e ainda que interposta já na vigência desta - como resulta do art. 12º, nº 2, 1ª parte, do CC;

ii) Os factos meramente conclusivos, quando constituam uma consequência lógica retirada de factos simples e apreensíveis podem ainda integrar o acervo factual, apenas devendo considerar-se não escritos se integrarem matéria de direito que constitua o thema decidendum;

iii) Os recursos ordinários são, entre nós, recursos de reponderação e não de reexame, visto que o tribunal superior não é chamado a apreciar de novo a acção e a julgá-la, como se fosse pela primeira vez, indo antes controlar a correcção da decisão proferida pelo tribunal recorrido, face aos elementos averiguados por este último;

iv) Será desejável que o julgador providencie uma motivação facto a facto, ou, sem grande inconveniente, uma motivação em conjunto quanto a um grupo de factos, mas desde que os mesmos se apresentem entre si ligados e sobre eles tenham incidido fundamentalmente os mesmos meios de prova; já a fundamentação em bloco, sem as devidas especificações, é desaconselhável, por potenciar dúvidas sobre quais os meios probatórios que serviram para explicar aquela determinada resposta de facto, podendo, mesmo, tornar-se imperceptível como é que o julgador, racional e criticamente, fez o caminho partindo dos meios de prova produzidos até ao resultado final, a resposta de facto dada;

v) É, assim, premente, perceber com clareza a motivação, já que a mesma, além de reforçar o auto-controlo do julgador, e ser, ainda, um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao acto jurisdicional, facilita o reexame da causa, permitindo, pois, estabelecer o fio condutor entre a decisão da matéria de facto (resultado) e os meios de prova que foram usados na aquisição da convicção (fundamentos), fazendo o julgador a respectiva apreciação crítica nos seus aspectos mais relevantes; 

vi) Se na motivação da matéria de facto não se especificar com clareza e suficiente transparência qual a parte concreta dos meios probatórios produzidos que permitiram dar por provado/não provado os factos essenciais impugnados, o poder de reapreciação conscienciosa da Relação fica comprometido; nesta situação impõe-se aplicar o art. 662º, nº 2, d), do NCPC, devendo a 1ª instância fundamentar devidamente os aludidos factos;

vii) Decisão de facto não devidamente fundamentada, tanto é aquela com total falta de fundamentação, como aquela em que a fundamentação é na prática quase ausente/patentemente insuficiente, como aquela que não é clara ou não é inteligível.

Decisão Texto Integral:
I – Relatório

 

1. Conselho Directivo dos Baldios da Serra do Pisco – Venda do Cepo (Trancoso), sito em Trancoso, e A..., Ldª, com sede em ..., interpuseram acção declarativa de condenação, contra União de Freguesias de Trancoso (São Pedro e Santa Maria) e Souto Maior, com sede em Trancoso, e B..., S.A., com sede em ..., pedindo que:

a) - Se declare por sentença que o autor é a única legítima titular do direito à posse, exploração e gestão dos Baldios da Serra do Pisco, declarando os respectivos limites, e condenar as Rés a reconhecerem-no;

consequentemente

b) - Se declare nulo e de nenhum efeito o Contrato de Cessão de Exploração junto sob o doc. 17;

c) - Se declare válido e plenamente eficaz o Contrato de Cessão de Exploração, bem como o Contrato de Cessão da Posição Contratual, juntos sob os docs. 14 e 25, respectivamente;

consequentemente,

d) - Se condene a 1ª ré a entregar ao autor todas as quantias que recebeu da 2ª ré como contrapartida da cessão de exploração dos terrenos que integram os Baldios da Serra do Pisco, acrescidas de juros desde a data da citação;

e) - Se condene a 2ª ré entregar de imediato à autora os terrenos que integram os Baldios da Serra do Pisco, livres de quaisquer pessoas e bens (construções, máquinas, equipamento, etc.), de forma a que esta possa exercer em pleno e sem perturbações e/ou limitações o seu direito de exploração dos mesmos;

f) - Se condene as rés no pagamento de uma indemnização ao autor a fixar de acordo com o prudente arbítrio do Tribunal, pela cessão/exploração ilegítima e ilegal dos referidos terrenos;

g) - Se condene a 2ª ré no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no valor de 5.000 € por cada dia de atraso no cumprimento da sentença que vier a julgar procedente o peticionado em e).

Caso assim não se entenda e subsidiariamente,

h) - Entendendo o Tribunal que a 2ª ré se deve manter nos referidos Baldios, condená-la a entregar a contrapartida financeira por tal exploração ao autor, a partir da data da prolação da sentença.

Para tanto, em síntese, alegaram que: os terrenos, que compõem o Baldio da Serra do Pisco não se encontram inscritos na matriz predial, encontram-se juntos à aldeia de Venda do Cepo e correspondem aos delimitados na planta junta como documento 1 e desde tempos imemoriais que são possuídos, geridos e utilizados, de forma contínua e ininterrupta, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, pela comunidade local da aldeia da Venda do Cepo – com exclusão de qualquer outra comunidade, ainda que limítrofe, ai desenvolvendo actividades de diversa natureza, nomeadamente agro-florestal e silvo-pastoril, os compartes da aldeia de Venda do Cepo; constituíram assembleia de Compartes em 2009; em Abril de 2015, a Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco, na sequência de deliberação, celebrou com a sociedade C..., Ldª. (que, em Março de 2018, cedeu a sua posição contratual à autora sociedade), um contrato de cessão de exploração que teve por objecto os terrenos Baldios da Serra do Pisco, e cuja finalidade foi a instalação e exploração, de aerogeradores para produção de energia eólica e sistema de ligação à rede eléctrica nacional, por um período de 20 anos com compensação anual de 2.000 € e posteriormente de 4.500 €; em Julho de 2015, nos Baldios da Serra do Pisco, a 2ª ré instalou vários aerogeradores com base num contrato de cessão de exploração celebrado em Abril de 2009 entre a D..., S.A. e a Junta de Freguesia antecessora da 1ª ré ( aquela cedeu, depois, a sua posição contratual à 2ª ré), sem que a 1ª ré tivesse quaisquer poderes de administração sobre os terrenos que compõem os Baldios da Serra do Pisco, facto do conhecimento das rés, nunca tendo o autor  autorizado a cedência de exploração dos terrenos à 2ª ré; na sequência da solicitação pela 2ª ré à Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco e da emissão de uma declaração, os responsáveis da mesma ré assumiram o compromisso de regressarem ao contacto com a Assembleia de Compartes, com vista à formalização do contrato de cessão de exploração, onde ficariam previstos quais os equipamentos a instalar, prazo de funcionamento do parque, quantidade de energia produzida e as respectivas contrapartidas, entre vários outros aspectos, mas não o fez. O contrato de cessão de exploração celebrado entre a 1ª ré e a 2ª ré é, por isso, nulo.

A ré B... contestou, alegando, em suma e além do mais, a falta de deliberação para a propositura da acção e a existência de título válido para ocupação dos Baldios, por a Junta de Freguesia de Santa Maria, por delegação de competência da Assembleia de Compartes dos Baldios de Santa Maria – Trancoso, ter celebrado contrato de cessão de exploração com a D.... Que, desde tempos imemoriais os habitantes de comunidades locais designadamente de Venda do Cepo da Freguesia de Santa Maria – Trancoso utilizam os terrenos baldios existentes na Serra do Pisco, e outros, e que se designam Baldios de Santa Maria, e cuja gestão corresponde aos Comparte de Santa Maria – Trancoso; que, em Abril de 2015 já se encontrava em plena execução os trabalhos de construção do Parque Eólico e as autoras tinham conhecimento do contrato de cessão de exploração celebrado, seis anos antes, entre a sociedade D... e a Junta de Freguesia de Santa Maria, não sendo necessário consentimento por parte da comunidade local representada em juízo pelo autor; a ré nunca aceitou os putativos direitos de exploração de que se arrogava titular a sociedade C..., e o autor nunca solicitou qualquer compensação pecuniária pela instalação do Parque Eólico; a C... não podia ceder a sua posição contratual para a 2ª autora, porque tinha celebrado um contrato que tinha um objeto impossível, dado que a comunidade local que surge como sua contraparte não tinha, nem a posse, nem a gestão dos terrenos baldios que deu em exploração, pelo que o contrato é nulo; a contestante é um terceiro de boa fé, e tem um parque eólico construído e em perfeito funcionamento e, à data da celebração do contrato entre o autor e a C..., os trabalhos já se encontravam numa fase avançada de execução, que terminou em Outubro de 2015, tendo-se iniciado a sua exploração nesse mês; fez benfeitorias e celebrou um contrato com a EDP, existindo o fornecimento de energia elétrica à rede, produzindo diariamente 15.510 € e o desmantelamento do Parque causaria prejuízos de proporções muito superiores, que seria equivalente ao custo do investimento efectuado no projecto, que estima em 60.000.000 € e, os prejuízos correspondente ao valor dos aerogeradores localizados nos baldios da Serra do Pisco, seriam de cerca de 10% daquele valor, mas como a subestação eléctrica está no Baldio e sem subestação o Parque Eólico não funciona, o prejuízo é de 60.000.000 €, pelo que deve o Tribunal ordenar a conversão do negócio nulo, alterando-se o contraente, uma vez que com esta conversão, o contrato realiza o fim pretendido pelo autor, sem pôr em crise o investimento efectuado pela ré. 

A 1ª ré contestou, alegando, em síntese e além do mais, que os terrenos do Baldio da Serra do Pisco se encontram na posse, exploração e administração da Assembleia de Compartes de Santa Maria, e situam-se na freguesia de Santa Maria, concelho de Trancoso, Baldio que abarca várias comunidades locais, designadamente a Venda do Cepo, em partes iguais decorrente dos usos ancestrais e consuetudinários tradicionalmente corporizados pelo pastoreio, recolha de lenhas, mato, pedra e carvão; no ano de 1953 os terrenos baldios da Serra do Pisco foram submetidos ao regime florestal, data em que o baldio da Serra do Pisco era usufruído não apenas pelas comunidade local de Venda do Cepo, como também por outras comunidades; o processo formal de constituição da Assembleia de Compartes de Santa Maria teve inicio em data anterior ao processo de constituição da Assembleia de Compartes da Serra do Pisco; os baldios de Santa Maria, onde se inclui o Baldio da Serra do Pisco, estão inscritos no Registo Nacional de Pessoas Colectivas; do caderno de recenseamento da Assembleia de Compartes de Santa Maria constam actualmente 267 compartes provenientes das várias comunidades, designadamente da Venda do Cepo ao contrário do caderno de recenseamento da 1ª autora onde apenas constam os compartes da comunidade local de Venda do Cepo; que a sociedade C... e a 1ª Autora, há muito que tinham conhecimento do contrato de cessão de exploração celebrado em Abril de 2009 entre a 1ª ré e a sociedade D... para instalação de um parque eólico no Baldio da Serra do Pisco; que se verificaram ilegalidades no processo de constituição da 1ª autora que consubstanciam o vicio da inexistência jurídica. Em reconvenção, alegou que lhe assiste legitimidade para possuir, usufruir e administrar o baldio da Serra do Pisco, sendo válido e eficaz o contrato de cessão de exploração celebrado em de Abril de 2009 entre ela e a sociedade D... para instalação do parque eólico do pisco em terreno do Baldio da Serra do Pisco, bem como o contrato de cessão da posição contratual celebrado entre esta sociedade e a 2ª ré e que é juridicamente inexistente o contrato de cessão de exploração celebrado entre a 1ª autora e a C... Lda., por ter sido celebrado por quem não tinha legitimidade representativa do Baldio da Serra do Pisco, sendo igualmente juridicamente inexistente o contrato de cessão da posição contratual a favor da 2ª autora. Pede que:

- se declare que a Assembleia de Compartes da Serra do Pisco – Venda do Cepo (Trancoso), aqui representada pela 1ª Autora, Conselho Directivo dos Baldios da Serra do Pisco, não representa a organização da comunidade local para o exercício dos actos de representação, disposição, gestão e fiscalização do baldio da Serra do Pisco com a área, limites, confrontações, composição e configuração descritas nos artigos 24.º a 30.º e plantas juntas como documentos n.º s 1 e 2 da contestação;

- Se declare a inexistência dos órgãos de administração da 1ª Autora.

Quando assim não se entenda:

- se declare a nulidade e ineficácia das deliberações que suportaram todo o processo de constituição da 1ª Autora.

- se declare a inexistência do Contrato de Cessão de Exploração, bem como o contrato de Cessão da Posição Contratual juntos como documentos n.º 14 e 25 com a petição inicial.

Quando assim não se entenda:

- se declare a nulidade e ineficácia dos aludidos contratos juntos como documentos n.º 14 e 25 com a petição inicial.

- se declare que a organização da comunidade local para o exercício dos actos de representação, disposição, gestão e fiscalização do baldio da Serra do Pisco com a área, limites, confrontações, composição e configuração descritas nos artigos 24.º a 30.º e plantas juntas como doc. n.º 1 e 2 da presente contestação, está consubstanciada e concretizada nos órgão de administração da Assembleia de Compartes de Santa Maria, respectivo Conselho Directivo e Comissão de Fiscalização eleitos na reunião de 12 de Março de 2009.

- se declare válida e eficaz a deliberação tomada pela Assembleia de Compartes de Santa Maria na sua reunião de 12 de Março de 2009 que delegou poderes de administração do Baldio da Serra do Pisco a favor da 1ª Ré, bem como a ratificação da referida deliberação tomada na sua reunião de 02 de Maio de 2009.

- se declare válido e eficaz o contrato de Cessão de Exploração celebrado em 1 de Abril de 2009 entre a 1ª Ré e a sociedade D... S.A., bem como o contrato de cessão da posição contratual celebrado entre esta sociedade e a 2ª Ré.

As autoras replicaram, deduzindo incidente de intervenção principal provocada do Conselho Directivo dos Baldios de Santa Maria – Trancoso e impugnaram os factos alegados na reconvenção. Alegaram que a aldeia da Venda do Cepo é a povoação que mais próxima se encontra dos terrenos do Baldio da Serra do Pisco; se alguns habitantes das outras comunidades locais ali se deslocaram e utilizaram os terrenos baldios fizeram-no apenas porque tinham relações familiares ou ligações aos habitantes da Venda do Cepo e estes não se opunham a que tal acontecesse ou foi sem conhecimento; a Assembleia de Compartes – e demais órgãos de gestão – da Venda do Cepo reúnem sempre que tal é necessário; são válidas as convocações e funcionamento das reuniões de 23.2.2009, 3.3.2009 e 12.3.2009, e, ainda que se entendesse diversamente, nunca tal consubstanciaria o vício de inexistência jurídica, mas de simples anulabilidade, sob pena de abuso de direito na invocação de meras irregularidades.

Foi admitida a intervenção principal provocada, passiva, do Conselho Directivo dos Baldios de Santa Maria – Trancoso. A interveniente contestou, fazendo sua a contestação da 1ª ré.

No saneador julgou-se improcedente a excepção de falta de deliberação para a propositura da acção por parte do autor.

*

A final foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, e a reconvenção improcedente, e, em consequência, decidiu:

A) Declarar que a 1ª A. Conselho Directivo dos Baldios da Serra do Pisco – Venda do Cepo (Trancoso) é a única legítima titular do direito à posse, exploração e gestão dos Baldios da Serra do Pisco;

B) Declarar que os limites dos Baldios da Serra do Pisco são os que constam do documento junto a fls. 199 dos autos;

C) Condenar as RR e a Interveniente Principal Conselho Directivo dos Baldios de Santa Maria – Trancoso a reconhecerem que a 1ª A. é a única legítima titular do direito à posse, exploração e gestão dos Baldios da Serra do Pisco e que os limites dos Baldios da Serra do Pisco são os constantes do documento junto a fls. 199 dos autos;

D) Declarar nulo e de nenhum efeito o Contrato de Cessão de Exploração junto a fls. 43/verso a 45;

E) Declarar válidos os Contratos de Cessão de Exploração e de Cessão da Posição Contratual, juntos a fls. 39 a 41 e 69, respectivamente;

F) Condenar a 1ª R. a entregar à 1ª A. todas as quantias que recebeu da 2ª R. como contrapartida da cessão de exploração dos terrenos que integram os Baldios da Serra do Pisco, acrescidas de juros desde a data da citação;

G) Condenar 2ª R. a entregar a contrapartida financeira pela exploração à 1ª A., a partir da data desta da sentença;

H) Absolver a 2ª R. dos pedidos de condenação em entregar de imediato à 2ª A. os terrenos que integram os Baldios da Serra do Pisco, livres de quaisquer pessoas e bens (construções, máquinas, equipamento, etc.), de forma a que esta possa exercer em pleno e sem perturbações e/ou limitações o seu direito de exploração dos mesmos;

I) Absolver as RR no pagamento de uma indemnização à 1ª A. a fixar de acordo com o prudente arbítrio do Tribunal, pela cessão/exploração ilegítima e ilegal dos referidos terrenos;

J) Absolver a 2ª R. do pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no valor de 5.000 €;

K) Absolver as AA dos pedidos reconvencionais formulados pela 1ª R.

*

2. A 2ª R. recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões:

I. A sentença recorrida padece das nulidades identificadas no artº 615º, nº 1, alínea c), do CPC, nos termos do qual se sanciona com este vício a decisão em que os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, na medida em que o julgamento sobre a matéria de facto:

(i) contém contradições irreconciliáveis, tanto dos factos provados entre si (pontos 48. E 143.; e 102., 150. e 151), como entre factos provados e não provados (pontos 107. provado e 5. não provado; 155. provado e 13. não provado; e 185. provado e 14. Não provado); (ii) inclui terminologia indefinida, conclusiva ou jurídica no elenco dos factos provados que distorce a factualidade assente (factos provados 57., 72., 77., 89., 97., 103, 104., 234., 246., 250., 263., 269., 270., 274., 275., 280., 288., 295., 298., 299., 302. e 305.); (iii) elenca um facto provado como alegado pela 2ª Ré que não o foi (facto provado 147.).

II. A dimensão dos erros, contradições, indefinições e locuções jurídico-conclusivas incluídos no elenco dos factos apresentados na sentença, impede o conhecimento e a compreensão pelas partes da fundamentação em que assenta a respetiva parte decisória, obrigando à sua retificação e clarificação.

III. A outorga de mandato forense e a propositura de ação judicial pelo Autor Conselho Diretivo, ocorridos respetivamente em 04-05-2018 e 17-05-2018, constituem efeitos jurídicos duradouros da deliberação da Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco, de 19-06-2016, aos quais, tendo emergido após a entrada em vigor de lei nova (Lei nº 75/2017 de 17 agosto), se aplicam as novas exigências (cfr. artºs 21º a 29º da referida Lei), conforme disposto na 2ª parte do artº 12º do Código Civil, medida em que, nos termos do artº 644º nº 3 do CPC, se impugna o despacho saneador de 06-01-2020, quanto ao segmento que julgou improcedente a exceção de falta de deliberação para a propositura da presente ação por parte do Autor Conselho Diretivo.

IV. Em face da falta de deliberação que respeite os requisitos de validade formal resultantes das alterações legislativas introduzidas em agosto de 2017, deverá concluir-se pela verificação da exceção dilatória prevista na alínea d) do artº 577º do CPC, o que impede o conhecimento de mérito da causa, impondo a absolvição das rés da instância.

V. A sentença recorrida julgou incorretamente os pontos de facto que abaixo se identificam, em face dos concretos meios probatórios constantes do processo que também se indicam, encontrando-se os segmentos das gravações nele realizadas em transcrição ou remissão supra, os quais impunham decisão inversa à tomada:

Pontos 43., 44., 48., 83., 86., 282 a 284. dos factos provados e nos pontos 13., 44., 45., 46. e 50. dos factos não provados – em face dos depoimentos de AA, BB e CC, e documentos exibidos e analisados neste âmbito;

Pontos 42. e 142. dos factos provados – em face dos depoimentos de DD e de CC, e documentos exibidos e analisados neste âmbito;

Pontos 7. a 9. dos factos provados, bem como nos pontos 7. e 8. dos factos não provados – em face dos depoimentos de EE; FF; GG; HH; II, inquiridos em 11-01-2022; e JJ; e II, inquiridos em 07-03-2022.

VI. Ainda que a matéria de facto tivesse sido corretamente julgada, sempre o Tribunal a quo havia incorrido em erro na apreciação do Direito ao julgar “válidos (..) mas já não plenamente eficazes” os contratos de cessão de exploração e de cessão de posição contratual acordados entre os Autores.

VII. A factualidade apurada permite concluir que, atento o conhecimento dos trabalhos em curso à data e à ausência de qualquer plano técnico nesse sentido, não existiu um propósito real de execução do objeto do contrato de cessão de exploração acordado entre os Autores, sendo que a impossibilidade originária daquele objeto era conhecida das partes intervenientes, incluindo na cessão de posição contratual.

VIII. Em suma, demonstrou-se o preenchimento dos pressupostos legais da simulação, previstos no artº 240º do Código Civil, existindo a divergência intencional e bilateral entre a vontade real e a declarada e o intuito de enganar e prejudicar terceiros, e concluindo-se pela nulidade dos contratos de fls. 43 verso a 45 e de fls. 69 dos autos, datados respetivamente de 15-04-2015 e de 14-03-2018.

IX. Ainda que assim não se entendesse, sempre as pretensões dos Autores fundadas

naqueles documentos deveriam ser integralmente desatendidas por ilegítimas, na medida em que consubstanciam o exercício de direitos em manifesto abuso dos limites impostos pela boa-fé e pelo fim económico e social desses direitos (cfr. artº 334º do CC).

X. Do pedido formulado na petição inicial sob a alínea h), infere-se a pretensão do Autor Conselho Diretivo de substituir a posição do cedente no contrato celebrado com a 2ª Ré, razão pela qual, subsidiariamente à total improcedência da ação, deverá o julgamento da matéria de Direito concluir pela conversão do contrato declarado nulo por falta de legitimidade do cedente, em negócio válido, mediante a substituição desta posição contratual pelo Autor Conselho Diretivo.

XI. Por todo o exposto, conclui-se que a sentença recorrida padece das nulidades apontadas, evidencia erro de julgamento da matéria de facto e uma incorreta apreciação do Direito no que respeita à interpretação e aplicação das normas identificadas, cuja correta ponderação imporia as soluções acima apontadas e conduzindo à absolvição da 2ª Ré dos pedidos contra ela formulados.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida, absolvendo-se a 2ª Ré, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!

3. A 1ª R. e a Interveniente Principal também recorreram, apresentando as seguintes conclusões:

1. A sentença recorrida limitou-se a julgar provados os factos alegados na petição inicial e na réplica sem o mínimo de rigor, sentido critico e apoio de qualquer meio de prova.

2. Prova inequívoca do que se acaba de afirmar é que o Tribunal a quo:

- Julgou o mesmo fato como provado e não provado;

- Julgou fatos provados contraditórios entre si;

- Julgou fatos provados que são conclusões de natureza jurídica ou matéria de direito;

- Julgou fatos provados inconclusivos ou desprovidos de sentido se não forem associados a outros;

- Olvidou julgar fatos alegados que não são irrelevantes ou repetidos, matéria conclusiva ou meramente de direito;

- Julgou fatos provados sem a produção de nenhum meio de prova para o efeito e sem que resulte da sentença recorrida a razão da sua prova. (como infra se demonstrará) - Formulou pré-juízos relativamente ao depoimento de testemunha indicada pelos recorrentes;

- Declarou que não atribuía qualquer valor às declarações de parte e depois fundamentou a prova de fatos com base neste meio de prova. (embora sem identificar quais).

3. O sucesso da ação interposta pelos AA., aqui recorridos, dependia de 4 temas da prova essenciais:

1.A identificação, nomeadamente em termos de localização, confrontações e área, dos terrenos em causa nos presentes autos.

2.Designadamente a sua correspondência com os que se encontram delimitados na planta junta pelos autores como documento n.º 1.

3.Os actos exercidos, em exclusivo, sobre tais terrenos pela comunidade local da Aldeia de Venda do Cepo.

4.O modo como tais actos foram sendo exercidos e o momento desde quando o foram.

4. Por sua vez, o sucesso da reconvenção deduzida pela 1.ª Ré, aqui recorrente, dependia igualmente de 3 temas da prova essenciais:

1. A localização dos terrenos do Baldio da Serra do Pisco, também junto das aldeias de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão.

2. A área, confrontações e localização do Baldio da Serra do Pisco.

3. Os actos praticados sobre o mesmo, por todas a referidas populações, o modo como o foram, e a data desde quando o foram.

5. A propósito da configuração, localização, confrontações e área do baldio “reclamado”, os AA., aqui recorridos alegaram no art. 6.º e 7.º da petição inicial o seguinte:

Art. 6.º: “Os terrenos que compõem o baldio da Serra do Pisco não se encontram inscritos na matriz predial.”

Art. 7.º: “No entanto, correspondem àqueles que vêm delimitados na planta que ora se junta como Doc. 1, dando-se o seu conteúdo opor integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.”

6. E juntaram o documento n.º 1 junto com a p.i. que corresponde a três plantas das quais resulta uma área total do baldio de 128 hectares e uma discrepância entre a configuração e limites do baldio entre o 1.º e 2.º mapa.

7. Só por esta discrepância, salvo melhor opinião, dificilmente os recorridos poderiam ter feito prova das configuração, área e limites do baldio que pretendiam “reclamar”.

8. A 1.ª Ré, aqui recorrente, impugnou na sua contestação o facto alegado no art. 7.º da p.i. (art. 19.º da contestação).

9. Mais alegou na sua contestação/reconvenção ( art. 24.º e 29.º da contestação) que o baldio da Serra do Pisco que se encontra na posse, exploração e administração da Assembleia de Compartes de Santa Maria tem uma área de aproximadamente 491hectares, tratando-se de uma mancha de terreno continua, em conformidade com a configuração que resulta da planta que se anexa como doc. n.º 1 e 2 junto com a presente contestação, sem quaisquer divisões ou demarcações no seu interior e deduziu pedido reconvencional em conformidade. (ponto 6 do pedido reconvencional)

10. O documento n.º 1 junto com a contestação da 1.ª Ré (doc. de fls. 199) corresponde ao mapa do Baldio da Serra do Pisco com a área total de 491 hectares.

11. O documento n.º 2 (doc. de fls. 200) corresponde a um mapa onde foram sobrepostos os mapas correspondentes à:

- Configuração, limite e área do baldio “reclamado” pelos recorrentes com 491 hectares;

- Configuração, limite e área do baldio “reclamado” pelos recorridos com 128 hectares;

- Configuração, limite e área cedida à 2.ª Ré para exploração do Parque Eólico com 23, 5 hectares.

12. Posteriormente e na sequência de um levantamento topográfico os recorrentes apresentaram uma planta (fls. 425, 425/verso, 426, 426/verso e 427 dos autos) do baldio com uma área ligeiramente corrigida para 492, 70 hectares.

13. Do exposto resulta que o baldio “reclamado” pelo 1.º A., aqui recorrido, tem uma área de 128 hectares e o baldio reclamado pelos RR., aqui recorrentes, tem uma área de 492, 70 hectare, ou seja, uma diferença de 364, 70 hectares!

14. Fica assim claro que, embora o baldio reclamado pelos recorridos esteja inserido no baldio reclamado pelos recorrentes, a configuração, limite e área do baldio alegada por ambas as partes eram substancialmente diferentes.

15. Sucede que os recorridos não produziram nenhuma prova quanto à localização, confrontações e área do baldio que identificaram no art. 7.º da sua p.i. e que alegaram corresponder aos mapas juntos como documento n.º 1 com a p.i.. (Doc. de fls. 17/verso)

16. Já os recorrentes juntaram aos autos as plantas de fls. 199, 200, 205, 425, 425/verso, 426, 426/verso e 427 dos autos e foi ouvida como testemunha o topógrafo que procedeu ao levantamento topográfico do baldio, KK, tendo este explicado que os limites lhe foram indicados por pessoas residentes nas diversas comunidades locais.

17. É em função da prova assim produzida (e não por acordo ou confissão como parece resultar da sentença recorrida), que os factos a seguir identificados foram julgados provados:

- Ponto 172: (…)

- Ponto 175: (…)

- Ponto 179: (…)

18. E julgou como não provado que os terrenos que compõem o baldio da Serra do Pisco “correspondem àqueles que vêm delimitados na planta junta a fls. 17/verso a 18/verso (artigo 7.º da petição inicial). (página 78 da sentença – numeração nossa)

19. Do exposto resulta que os AA., aqui recorridos, não provaram os factos que consubstanciam o 1.º e 2.º temas da prova:

1. A identificação, nomeadamente em termos de localização, confrontações e área, dos terrenos em causa nos presentes autos.

2. Designadamente a sua correspondência com os que se encontram delimitados na planta junta pelos autores como documento n.º 1.

20. Por sua vez, os RR., aqui recorrentes, provaram os factos que consubstanciam o 1.º e 2.º tema da prova:

1.A localização dos terrenos do Baldio da Serra do Pisco, também junto das aldeias de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão.

2.A área, confrontações e localização do Baldio da Serra do Pisco.

21.Os recorridos não fizeram assim a prova dos limites do baldio que reclamavam, nem consta, tão pouco, do elenco dos factos provados qual a área e o limite do baldio que os recorridos têm (de acordo com a sua alegação) na sua posse, gestão e exploração.

22. Apenas consta o facto provado em 172 que, por si só, é contraditório com o segmento decisória da sentença constante da al. A) e B) :

A) A 1.ª Autora Conselho Diretivo dos Baldios da Serra do Pisco – venda do Cepo (Trancoso) é a única legitima titular do direito à posse, exploração e gestão dos Baldios da Serra do Pisco.

B) Os limites dos Baldios da Serra do Pisco são os que constam dos documentos de fls. 199 dos autos.

23.Se a área reclamada pelos recorridos é de 128 hectares (Fato provado em 172 – doc. de fls. 17/verso dos autos), o Tribunal a quo não podia declarar que os limites do baldio sob a sua gestão correspondem aos documentos de fls. 199, no qual consta uma área total de 491 hectares.

24. Afirma o Tribunal a quo por três ocasiões (pág. 96, 121 e 149 da sentença recorrida – numeração nossa) que as partes aceitaram os limites do baldio constantes do mapa de fls. 199.

25. Como resulta do depoimento de parte de LL, nem esta, nem o seu ilustre mandatário confessaram tais factos, designadamente a área de 491 hectares. A parte disse claramente que não sabia.

26. Aliás, nem podia confessar que o mapa de fls 199 corresponde ao baldio gerido pela 1.ª A., aqui recorrido, porquanto não foi sequer confrontada com o mesmo.

27. O seu ilustre mandatário, por sua vez, disse que ia ser aceite.

28. Sucede que o ilustre mandatário dos recorridos nunca chegou a apresentar qualquer requerimento para confissão dos factos alegados nos artigos 24.º e 29.º da contestação da 1.º Ré, aqui recorrente.

29. Mesmo o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo quando foi perguntado pelo advogado signatário se tinha havido confissão, limitou-se a dizer: “Doutor, isso ser uma confissão é relativo. A confissão também resulta daquilo que é alegado pela parte contrária, nomeadamente aquilo que pertence ou não ao baldio que defende.”

30. Note-se que o meritíssimo do Tribunal a quo não deu cumprimento ao estabelecido no art. 463.º do Cód. Proc. Civil, o que bem demonstra que não houve confissão dos fatos alegados no art. 24.º e 29.º da contestação.

31. Mas ainda que assim não se entenda (o que não se aceita face ao exposto), ou seja que se entenda que a parte ou o seu mandatário confessaram os factos alegados no artigo 24.º e 29.º da contestação da 1.ª Ré e aceitaram os mapas juntos como documento n.º 1 e 2 ( doc. de fls. 199 e 200) juntos com este articulado, tais factos e documentos eram desfavoráveis aos AA.. (porque em oposição à sua alegação – art. 7.º da p.i. e planta de fls. 17/verso)

32. Para tomar as decisões constante da al A) e B) da sentença recorrida, o Tribunal a quo aproveitou os factos alegados pelos recorrentes (artigos 24.º e 29.º da contestação da 1.ª Ré) e a prova produzida pelos recorrentes (mapas de fls. 199) a favor dos recorridos.

33. Acontece que a confissão dos factos alegado no art. 24.º e 29.º da contestação da 1.ª Ré, apenas podia aproveitar aos RR., aqui recorrentes, e não aos AA., qui recorridos.

34. O Tribunal a quo utilizou os factos confessados pelos recorridos a favor dos mesmos, acabando por declarar que:

A) A 1.ª Autora Conselho Diretivo dos Baldios da Serra do Pisco – venda do Cepo (Trancoso) é a única legitima titular do direito à posse, exploração e gestão dos Baldios da Serra do Pisco.

B) Os limites dos Baldios da Serra do Pisco são os que constam dos documentos de fls. 199 dos autos.

35. Violando assim o disposto no art. 352.º do Código Civil.

36. Do exposto resulta que não tendo os recorridos feito a prova da configuração, limites e área do baldio que reclamam, os pedidos formulados na petição inicial teriam que ser julgados improcedentes.

37. No que diz respeito aos atos exercidos no baldio, os temas da prova para os recorridos eram os seguintes:

- Os atos exercidos, em exclusivo, sobre tais terrenos pela comunidade local da Aldeia de Venda do Cepo.

- O modo como tais atos foram sendo exercidos e o momento desde quando o foram.

38. E o tema da prova para os recorrentes era o seguinte:

- Os atos praticados sobre o mesmo, por todas a referidas populações, o modo como o foram, e a data desde quando o foram.

39. A este propósito o Tribunal a quo julgou provado os factos em 7, 8, 9, 11, 12, 18, 57, 58, 72, 77, 78, 90, 91, 104, 105, 243, 247, 248, 249, 252, 253, 254, 255, 256, 257, 258, 259, 260, 261 e 262.

40. E julgou não provado os factos alegados nos artigos 28, 41, 43, 44, 45, 46 e 58 da contestação apresentada pela 1.ª Ré, aqui recorrente.

41. Da sentença recorrida resulta que os meios de prova e os argumentos de que se socorreu para concluir que a comunidade local de Venda do Cepo exercia em exclusividade atos, sobre os terrenos dos baldios da Serra do Pisco foram os seguintes:

(pág. 121, 3.º parágrafo da sentença recorrida – numeração nossa)

a) O depoimento de parte;

b) As declarações de parte;

c) O depoimento das testemunhas;

d) A própria configuração do terreno;

e) A proximidade da aldeia em termos de acessibilidade, bastando analisar os

documentos juntos a fls. 199, 363/364 e 425 e seguintes para assim se concluir.

42. Do Depoimento de parte: Antes demais, o ilustre mandatário dos AA., aqui recorridos, prescindiu do depoimento de parte do Presidente da Junta de Freguesia de Trancoso e Souto Maior, 1.ª Ré.

43. O único depoimento de parte prestado, do qual poderia resultar uma confissão dos factos atinentes aos temas da prova referido no ponto 37 das presentes conclusões, foi do legal representante da interveniente principal, Conselho Diretivo dos baldios de Santa Maria, MM.

44. Da leitura do seu depoimento facilmente se depreende que não confessou os referidos factos. (Ficheiro áudio n. 20220307150341_881705_2870895 de 0:00 minutos a 49:54 minutos – Sessão de julgamento de 07/03/2022)

45. Das declarações de parte: Embora a sentença recorrida não especifique quais as declarações de parte de que o Tribunal se socorreu, resulta manifesto das declarações de parte de LL (legal representante da 1.ª A.) e de MM (legal representante do interveniente principal) que ambos mantiveram o que haviam afirmado nos articulados sobre essa matéria e que apenas tomaram conhecimento por terceiros dos actos de posse exercidos no baldio.

Do Depoimento das testemunhas

46. As testemunhas indicadas pelos recorridos:

- A testemunha NN, 41 anos, prestou um depoimento indireto.

- A testemunha OO, com 90 anos e PP, com 80 anos, acabaram por reconhecer actos de posse das outras comunidades, designadamente Boco, Montes e Rio de Moinhos.

- A testemunha CC, 54 anos de idade, sabia o que ouviu dizer aos pais e avós, e estes nunca lhe disseram que as outras comunidades não tinham exercido atos de posse.

- A testemunha QQ, 60 anos, não viu habitantes das outras comunidades locais buscar lenha e pastorear no badio da Serra do Pisco.

47. As testemunhas indicadas pelos recorrentes tiveram conhecimento direto dos atos de posse dos habitantes nas comunidades locais de Miguel Choco, Rio de Moinhos, Boco, Montes e Sintrão.

48. Os depoimentos das referidas testemunhas constante das passagens da sua gravação e respetiva transcrição supra discriminadas demonstram, sem margem para dúvidas, que as referidas comunidades são compartes do Baldio da Serra do Pisco à semelhança da Venda do Cepo:

49. Do argumento da própria configuração do terreno: Ao contrário do que é afirmado na sentença recorrida, da configuração do terreno não é possível retirar qualquer conclusão a favor ou desfavor da titularidade do direito de posse, exploração e gestão do baldio da Serra do Piso.

50. Ainda assim, querendo utilizar a proximidade como argumento para atos de posse exclusivos a favor de uma determinada comunidade, então as comunidades mais próximas do baldio seriam Boco e Montes e não venda do Cepo.

51. A configuração, limites e área do terreno é aquela que resulta das plantas de fls. 199, 200, 205. (fato provado em 175 e 179), sendo que posteriormente, os recorrentes juntaram as plantas de fls. 425, 425/verso, 426 e 427, corrigindo a área para 492, 70 hectares na sequência de um novo levantamento topográfico.

52. As referidas plantas encontram-se todos à escala de 1:25000, pelo que cada centímetro equivale a 250 metros.

53. Se traçarmos nas referidas plantas uma linha reta desde o aglomerado urbano (maior concentração de casa) de cada uma das comunidades locais em causa, resultam as seguintes distâncias entre cada localidade e o limite mais próximo do baldio a essa localidade:

- Miguel Choco: 1535 metros.

- Venda do Cepo: 532 metros.

- Sintrão: 3207 metros.

- Rio de Moinhos: 1435 metros.

- Montes: 510 metros.

- Boco: 100 metros.

54. Por outro lado, se medirmos a distância dos caminhos que permitem o acesso das referidas comunidades ao ponto que lhes é mais próximo do baldio, resultam as seguintes distâncias: (planta de fls. 205 e 407)

- Miguel Choco: 1939 metros.

- Venda do Cepo: 729 metros.

- Sintrão: 4108 metros.

- Rio de Moinhos: 1789 metros.

- Montes: 712 metros.

- Boco: 196 metros.

55. São distâncias que podem ser obtidas com recurso a uma simples régua ou através de ferramentas online como “medir distâncias” do Google maps, entre outras, ou seja ao alcance do Tribunal a quo.

56. E dela resulta que as povoações mais próximas do baldio quer em termos de distância (linha reta), quer em termos de acessibilidade, são os Montes e o Boco.

57. Ainda assim, o Tribunal a quo julgou provado que:

- “11. (…)

- 243. (…)

- 248. (…)

- 249. (…)

- 255. (…)

- 256. (…)

- 259. (…)

58. Considerando a dimensão do baldio em causa (492, 70 hectares), as diferenças de distância entre as várias localidades ao baldio não permitem retirar qualquer argumento a favor da posse exclusiva da comunidade de Venda do Cepo, em detrimento das outras representadas pela interveniente principal aqui recorrente.

59. Do argumento da proximidade da aldeia em termos de acessibilidade, “bastando analisar os documentos juntos a fls. 199, 363/364 e 425 e seguintes para assim se concluir”: Nesta matéria, o Tribunal a quo julgou provados os factos em 11, 243, 244, 245, 246, 247, 248, 249, 253, 255, 256, 257, 258, 259, 260 e 262.

60. Sucede que não foram produzidos quaisquer meios de prova que sustentem os factos provados em 248, 253, 255, 256, 258 e 259.

61. Nenhuma testemunha sequer referiu que apenas recentemente foram construídas pontes sobre o rio – facto provado em 258. (Remete-se para a transcrição integral de todos os depoimentos em anexo)

62. Designadamente no que diz respeito aos factos provados em 258 e 259, a prova produzida vai, aliás, no sentido exatamente contrário.

63. As próprias testemunhas indicadas pelos recorridos OO e CC reconheceram que o rio não impedia os habitantes de Rio de Moinhos, Sintrão, Boco e Montes de acederem ao baldio.

64. Ademais, sobre a mesma matéria (proximidade da venda do Cepo ao Baldio) o Tribunal a quo julgou não provados os factos alegados no art. 23.º, 34.º, 35.º e 46.º da contestação da 1.ª Ré.

65. Ora, foram produzidos meios de prova que deveriam ter levado o Tribunal a quo a julgar os factos provados nos artigos 23.º, 34.º, 35.º e 46.º da contestação da 1.ª Ré.

66. Designadamente a planta de fls. 205 e 407 onde foram assinalados (em diferentes cores) os vários caminhos de acesso ao baldio a partir das comunidades locais aqui em causa, e o depoimento de QQ e KK. (Passagem das gravações e respetiva transcrição referidas nas alegações)

67. Depois de analisados todos os meios de prova (depoimento de parte, declarações de parte, depoimento das testemunhas, configuração do terreno e a proximidade da aldeia em termos de acessibilidade) que, de acordo, com a sentença recorrida, levaram a concluir que a comunidade local de Venda do Cepo exercia em exclusividade actos, sobre os terrenos do Baldio da Serra do Pisco, tal conclusão é simplesmente incompreensível.

68. Os meios de prova produzidos deveriam antes ter levado à conclusão que as comunidades locais de Venda do Cepo, Boco, Montes, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão exerceram em comum atos de posse sobre os terrenos do baldio.

69. Com base em tais meios de prova, o Tribunal a quo deveria ter julgado não provados os factos alegados nos artigos 12.º, 35.º, 37.º e 38.º da réplica e que deram origem aos factos provados em 248, 256, 258 e 259.

70. Mais deveriam ter sido julgados provados os factos alegados nos artigos 23.º, 34.º, 35.º e 45.º da contestação da 1.ª Ré, aqui recorrente.

71. Acresce que o Tribunal a quo também julgou provado os factos em 186 e 188:

- “186. (…)

- 188. (…)

72. No entanto, concluiu que tais atos de posse foram exercidos por mera tolerância dos habitantes da Venda do Cepo ou porque tinham familiares nesta localidade e de forma pontual e ocasional.

- “252. (…)

- “254. (…)

- 261. (…)

73. Sucede que não foi produzido qualquer meio de prova que sustente os factos provados em 252, 254 e 261.

74. É verdade que “nenhuma das testemunhas falou dos obstáculos existentes para se chegar ao talegre, ou sequer da necessidade de o fazerem, sabendo-se da existência de outros baldios nas aldeias onde residiam.” (pág. 121, último paragrafo da sentença – numeração nossa). E isto por três razões:

- Primeiro, porque não lhes foi perguntado se tinham necessidade de chegar ao talegre.

- Segundo, porque não existem quaisquer obstáculos para se chegar ao talegre, como todas as testemunhas confirmaram.

- E terceiro, porque o talegre (cumeada) representa uma área inferior a 5% da totalidade do baldio (factos provados em 181, 182 e 183), pelo que mesmo que houvesse dificuldades (que não havia) tal não era impeditivo de utilizarem a restante área do baldio para os fins pretendidos.

75. Dispõe o art. 1268.º do Cód. Civil que “O possuidor goza da presunção de titularidade do direito, exepto se existir a favor de outrem, presunção fundada em registo anterior ao início da posse.

76. Dos factos provados em 186 e 188 resulta uma presunção de titularidade do direito de que gozam as comunidades locais de Rio de Moinhos, Boco, Miguel Choco, Montes e Sintrão: O direito de posse, exploração e gestão do Baldio da Serra do Pisco, à semelhança da comunidade de Venda do Cepo.

77. Do exposto resulta que ao julgar provado os factos em 252 e 254, a sentença recorrida violou o disposto no art. 1268.º do Código Civil.

78. Mais resulta que, ao considerar nos factos provados em 7, 8, 9, 12, 16, 18, 72, 77, 90, 103 e 261 que apenas a comunidade local da venda do Cepo é titular do direito de posse, exploração e gestão do Baldio da Serra do Pisco, a sentença recorrida violou igualmente o disposto no art. 1268.º do Código Civil.

79. Ao invés o Tribunal a quo deveria ter julgado tais factos como provados, mas neles fazendo constar também, além dos aldeões de Venda do Cepo, os aldeões da Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão.

80. Não se descortinam, pois, razões e factos válidos na sentença recorrida para que a comunidade local da Venda do Cepo exerça atos de posse na qualidade de titulares do direito de posse, exploração e gestão e as comunidades de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão exerçam os mesmos actos de posse, no mesmo período e no mesmo baldio, por tolerância dos primeiros ou ligações familiares.

81. Os factos provados em 48, 53, 70, 83, 84, 85, 86, 97, 98, 102, 142, 263, 267, 270, 274, 275, 278, 279, 280, 281, 282, 283, 284, 285, 295, 296, 298, 299, 300, 301, 302, 304, 305 e 306, deveriam ter sido julgados não provados por total ausência de prova documental e testemunhal que os suporta e não terem sido admitidos por acordo.

82. Designadamente, os factos provados em 263, 267, 270, 274, 275, 282, 283, 284, 288, 291, 293, 294, 295, 296, 298, 299, 300, 301, 302, 304, 305 e 306 são mesmo a demonstração cabal de que o Tribunal a quo se limitou a elencar os factos alegados na petição e na réplica e dá-los como provado sem qualquer fundamentação e sem que tenha sido produzido um único meio de prova para o efeito. (transcrições em anexo)

83. Ademais, o Tribunal a quo julgou ainda provados os factos em 189, 190, 191, 192, 193, 194, 195 e 196.

84. A prova dos factos supra elencados resultou de prova documental junto com a contestação da 1.ª Ré, aqui recorrente, e que não foram impugnados pelos recorridos. (Doc. 5, 6, 7, 8 e 9 junto com a contestação – fls. 205/verso, 206, 207, 207/verso e 208 dos autos).

85. Estes factos, por si só (considerando que o Tribunal deveria ter julgado por não provado o ponto 263 dos fatos provados conforme supra alegado) e de acordo com a lógica e o senso comum, conjugados com os fatos provados em 186 e 188, mostram que já em 1953 a Câmara Municipal de Trancoso considerava que os compartes do baldio da Serra do Pisco não era apenas da Venda do Cepo, mas também de Miguel Choco, Rio de Moinhos, Boco, Montes e Sintrão.

86. Sucede que, na sua argumentação, o Tribunal a quo fez simplesmente tábua rasa dos factos provados em 189, 190, 191, 192, 193, 194, 195 e 196

87. Factos que, na perspetiva dos recorrentes, conjugados com os fatos provados em 186 e 188 e em conjugação com as regras da lógica e da experiência comum, permitem concluir pelo direito à posse, gestão e exploração do Baldio da Serra do Pisco das referidas comunidades locais.

88. Face ao exposto e, em resumo, os factos provados em 7, 8, 9, 11, 18, 19 (no segmento “conscientes dessa realidade”), 48, 53, 57, 58, 70, 72, 77, 78, 79, 83, 84, 85, 86 (no segmento “2.ª Ré”, pois trata-se da 2.ª A.) 90, 91, 97, 98, 102, 103, 104, 105, 142, 243, 246, 248, 249, 252, 253, 254, 255, 256, 258, 259, 261,267, 270, 274, 275, 282, 283, 284, 288, 291, 293, 294, 295, 296, 298, 299, 300, 301, 302, 304, 305 e 306 deveriam ter sido julgados não provados.

89. E os factos alegados nos artigos 23, 28, 34, 35, 41, 43, 44, 45, 46, 55, 56, 57, 58, 63, 117, 121, 123, 130, 146 e 161 da contestação da 1.ª Ré e nos artigos 7, 97, 114 (nos seguintes moldes: “Desde tempos imemoriais que os habitantes da comunidade local de Venda de Cepo, Miguel Choco, Montes, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo utilizam os terrenos baldios existentes na Serra do Pisco”), 120 e 153 da contestação da 2.ª Ré deveriam ter sido julgados provados.

90. Os factos provados em 263, 267, 270, 274, 275, 282, 283, 284, 288, 291, 293, 294, 295, 296, 298, 299, 300, 301, 302, 304, 305 e 306 não encontram suporte em qualquer meio de prova produzida ou argumento desenvolvido na sentença recorrida.

91. Por sua vez, o julgamento dos factos elencados no ponto 89 das presentes conclusões resulta:

a) Das regras da lógica e da experiência comum;

b) Das declarações de parte de MM, legal representante do interveniente principal;

c) Dos depoimentos das testemunhas OO (testemunha indicada pelos recorridos), PP (testemunha indicada pelos recorridos), EE, FF, GG, HH, II, JJ, II, RR e KK. (passagem da gravação dos seus depoimentos supra referidas);

d) Das plantas de fls. 199, 199/verso, 205, 425, 425/verso, 426 e 427 dos autos;

e) Dos documentos de fls. 205/verso, 206, 207, 207/verso e 208 dos autos. (como infra alegado).

92. Acresce que os factos provados em 186, 188 e 262 relativamente à proximidade e atos de posse dos aldeões de Boco (ainda que se aceite que atualmente no Boco não existem casas habitadas de forma permanente) são relevantes no julgamento da matéria de facto que não foi julgada provada ( e deveria ter sido), na medida em que contrariam todos os argumentos invocados na sentença recorrida para considerar que apenas a comunidade da Venda do Cepo é titular do direito de posse, gestão e exploração do baldio da Serra do Pisco.

93. Ao julgar de tal forma aqueles concretos pontos de facto enunciados, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de facto, porquanto não realizou, convenientemente, o exame critico das provas, relativamente à apreciação e valoração da prova produzida, cuja análise deve ser fundamentada segundo critérios de valoração racional e lógica do julgador, e atender às regras da experiência e da razoabilidade, violando o disposto no art. 607.º n.º 4 e art. 349.º do Código Civil.

Nestes termos e com o mui douto suprimento de Vossas Exas. deve o presente recurso de apelação ser julgado procedente e, em consequência, revogar-se a sentença recorrida, e em sua substituição:

A) Declarar que a Assembleia de Compartes da Serra do Pisco – Venda do Cepo (Trancoso), aqui representada pelo 1.ª Autor, Conselho Diretivo dos Baldios da Serra do Pisco, não representa a organização da comunidade local para o exercício dos atos de representação, disposição, gestão e fiscalização do baldio da Serra do Pisco com a área, limites, confrontações, composição e configuração descritas nos artigos 24.º

a 30.ºe plantas juntas como doc. n.º 1 e 2 da presente contestação

B) Declarar-se que a organização da comunidade local para o exercício dos atos de representação, disposição, gestão e fiscalização do baldio da Serra do Pisco com a área, limites, confrontações, composição e configuração descritas nos artigos 24.º a 30.º e plantas juntas como doc. n.º 1 e 2 da presente contestação, está consubstanciada e concretizada nos órgão de administração da Assembleia de Compartes de Santa Maria, respetivo Conselho Diretivo e Comissão de Fiscalização eleitos na reunião de 12 de Março de 2009.

C) Declarar-se válida e eficaz a deliberação tomada pela Assembleia de Compartes de Santa Maria na sua reunião de 12 de março de 2009 que delegou poderes de administração do Baldio da Serra do Pisco a favor da 1.ª Ré, bem como a ratificação da referida deliberação tomada na sua reunião de 02 de maio de 2009.

D) Declarar-se válido e eficaz o contrato de Cessão de Exploração celebrado em 01 de abril de 2009 entre a 1.ª Ré e a sociedade D... S.A., bem como o contrato de cessão da posição contratual celebrado entre esta sociedade e a 2.ª Ré.

E) Com custas e despesas de parte a cargo dos AA., aqui recorridos.

Assim se fazendo JUSTIÇA.

4. Os AA contra-alegaram, concluindo que:

A. A impugnacao da materia de facto, feita pelos Recorrentes, nao se destina a que o Tribunal ad quem reaprecie a prova valorada em primeira instancia e, formando a sua propria conviccao, confirme se existe um erro na apreciacao da mesma pelo Tribunal a quo, antes pretendem que se proceda a um verdadeiro novo julgamento de toda a causa – o que, como tem sido entendido pela

jurisprudencia e doutrina (vd. arestos e opinioes doutrinais citadas no corpo destas alegacoes), e inadmissivel –, assente apenas em parte da prova produzida que e aquela que lhes aproveita, ignorando o principio da livre apreciacao da prova, plasmado no n.o 5 do artigo 607.o do CPC.

B. O Tribunal a quo, ao julgar simultaneamente provado e não provado o mesmo facto, incorreu apenas num erro material – e não em erro de julgamento –, decorrente de lapso manifesto, como, aliás, decorre com clareza do próprio contexto da Sentença recorrida, erro esse facilmente rectificável em face da prova produzida, por simples despacho, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 614.º do CPC.

C. O ponto 107 dos factos provados deverá ser eliminado, devendo manter-se como não provado que “A 1.ª Autora, apesar de se terem organizado para gerir os desígnios dos terrenos baldios, em meados de 2009, nada fizeram, até à presente data, para impedir a instalação do Parque Eólico explorado pela 2.ª Ré. (artigo 7.º da contestação da 2.ª Ré).”.

D. A inclusão do ponto 107 no elenco dos factos provados resulta de manifesto lapso tendo em consideração, por um lado, os factos provados nos pontos 43 a 53 e, em especial, dos factos provados nos pontos 73 e 74 e 282 a 284, pois decorre de tais factos que a 1.ª Recorrida, apesar de ter tido conhecimento, em data não apurada, do contrato de cessão de exploração celebrado no dia 01 de Abril de 2009 entre a 1.ª Recorrente e a sociedade D... S.A., “sempre acreditaram, porque os responsáveis da 1.ª Ré sempre lho disseram, que acordariam numa solução a contento de ambas as partes” (282 dos factos provados), tendo a 1.ª Recorrida, face ao silêncio da 1.ª Recorrente, ficado convicta até 2015 que a instalação do Parque Eólico não iria ocorrer (283 e 284 66 dos factos provados), pelo que, de 2009 a Abril 2015, nada havia a fazer para impedir a instalação do Parque Eólico.

E. Por outro lado, em Abril de 2015 estavam a decorrer os trabalhos de construção do Parque Eólico (143 dos factos provados), tendo a 1.ª Recorrida informado de tal a C..., Lda., entidade a quem havia cedido a exploração dos terrenos baldios da Serra do Pisco, em regime de exclusividade (pontos 33 a 37 e 43 dos factos provados), após o que esta verificou in loco o que se passava (ponto 44 a 48 dos factos provados), e diligenciou (a) nos termos descritos nos pontos 49, 50 e 73 dos factos provados, (b) igualmente nos termos provados no ponto 77 dos factos provados, ou seja, através do envio das cartas de fls. 50/verso a 52 dos autos, (c) tendo, ainda, a C..., Lda., com base no direito à utilização e ao gozo dos terrenos que compõem os Baldios do Pisco por via do contrato de cessão de exploração identificado no ponto 33 dos factos provados, requerido contra a 2.º Ré (e igualmente Recorrente) B..., S.A. o Procedimento Cautelar Comum n.º 1781/15...., que correu termos pelo Tribunal Judicial da Comarca da Guarda, Juízo Central Cível e Criminal da Guarda - Juiz ..., com vista a que aquela fosse condenada a, entre outros, (i) abster-se de prosseguir com a instalação e/ou funcionamento do parque eólico nos terrenos do Baldio da Serra do Pisco, (ii) desocupar de imediato tais terrenos, retirando os equipamentos que lá se encontram, (iii) entregar de imediato à os terrenos que integram os Baldios da Serra do Pisco, de forma a que aquela possa exercer em pleno e sem perturbações e/ou limitações o seu direito de exploração dos mesmos (a referência ao referido procedimento cautelar consta da Acta n.º 8, de 19.06.2016, da Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco, junta aos autos a fls. 285 a 287 e nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 5.º e n.º 2 do artigo 412.º, ambos do CPC, sempre seria do conhecimento do Tribunal em virtude do exercício das suas funções, não carecendo, assim, de alegação ou de prova).

F. Neste sentido, deve a Sentença ora recorrida ser objecto de rectificação, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 614.º do CPC por parte do Tribunal a quo, mediante a eliminação do ponto 107 dos factos provados ou, caso tal não ocorra, deverá o Tribunal ad quem proceder a tal eliminação.

G. Inexiste qualquer erro do Tribunal a quo no que toca a materia provada nos pontos 186 e 188, nomeadamente no sentido de que essa materia – realizacao das actividades de corte e recolha de lenha e madeira das arvores, cultivo de produtos agricolas, pastoreio de animais e extracao de carvao utilizacao nos terrenos do baldio da Serra do Pisco por parte dos aldeoes dos Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrao – teria sido dado como provada nestes artigos e tambem incluida na materia nao provada.

H. A diferenca e tenue mas da maior importancia, pois, como resulta da transcrição dos factos provados e nao provados feita no corpo destas alegacoes de recurso, o Tribunal a quo usa o artigo definido, masculino, plural “os” quando da como provada a realizacao das actividades de corte e recolha de lenha e madeira das arvores, cultivo de produtos agricolas, pastoreio de animais e extracao de carvao dos baldios da Serra do Pisco, por parte dos aldeoes da Venda do Cepo, mas não usa o referido artigo quando da como provada a realizacao das referidas actividades por parte de aldeoes de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrao, voltando a usar esse mesmo artigo quando da como nao provada a realizacao das aludidas actividades por parte dos aldeoes de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrao.

I. Ora, apodictico sera dizer, porque melhor tera ja concluido este Venerando Tribunal ad quem, que essa subtil distincao feita pelo Tribunal a quo nao e fruto do acaso, antes tem um significado muito preciso, a saber, o Tribunal a quo entendeu – e bem – que ficou demonstrado que OS aldeões da Venda do Cepo, no sentido de todos os aldeões ou os compartes da Venda do Cepo realizavam as ditas actividades de corte e recolha de lenha e madeira das arvores, cultivo de produtos agricolas, pastoreio de animais e extracao de carvao dos baldios da Serra do Pisco, dai usar o artigo definido, masculino, singular OS”, mas apenas julgou provado que aldeões de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão, no sentido de ALGUNS aldeões das ditas localidades, tenham realizados tais actividades, razao pela qual nao usa o referido artigo definido, masculino, plural “os” quando da esta matéria como provada, mas ja usa o mencionado artigo quando da tal materia como não provada.

J. Com efeito, em face dos pontos 252 e 254 dos factos provados, ficou demonstrado que as actividades acima mencionadas, realizadas por alguns habitantes das provocacoes Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrao eram isso mesmo: realizadas por ALGUNS habitantes (nao por todos os compartes dessas localidades).

K. E tal so acontecia com ALGUNS porque esses tinham relacoes familiares ou ligacoes aos habitantes da Venda do Cepo e estes nao se opunham, naturalmente, a que tal acontecesse, bem como ocorriam de forma pontual ou ocasional, não continuada no tempo, tal como, alias, o Tribunal a quo justifica lapidarmente na fundamentacao da resposta a materia de facto.

L. Alias, isso e reforcado pelos pontos 243 a 262 dos factos provados, de onde resulta que a aldeia da Venda do Cepo e a povoacao que mais proxima se encontra dos terrenos do Baldio da Serra do Pisco, por ser geograficamente contigua aos mesmos (a outra provocacao mais proxima e Boco, a qual nao tinha autonomia em relacao a Venda do cepo e nao tem actualmente habitantes ou residentes), sendo que as restantes povoacoes (Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrao) estao afastadas de tais terrenos geograficamente e ao nivel de acessibilidade (entre a aldeia de Miguel Choco e os terrenos existe a aldeia de Venda do Cepo e, por sua vez, entre as aldeias de Montes, Rio de Moinhos e Sintrao e os terrenos fica o Rio Tavora, onde so recentemente foram construídas pontes).

M. Tal distancia, geografica e de acesso, impedia que os habitantes das provocações Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrao utilizassem os terrenos do Baldio da Serra do Pisco de forma permanente, com caracter de regularidade, continuidade e frequencia tal como ocorria com os habitantes da Venda do Cepo, até porque aqueles primeiros dispunham de terrenos baldios mais perto das respectivas povoações (ponto 261 dos factos provados).

N. Nao ha, assim, qualquer erro da parte do Tribunal a quo que tenha de ser corrigido, devendo a materia, provada e nao provada, acima transcrita, manterse tal como esta, pelo que as ilacoes retiradas pelos Recorrentes a proposito de uma alegada posse dos aldeoes da Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrao sobre os baldios da Serra do Pisco nao encontram qualquer suporte factual.

O. Os pontos 48 e 143 dos factos provados tambem nao sao contraditorios entre si pois “trabalhos de construcao” do Parque Eolico nao se confundem com “instalacao de equipamentos”, pelo que, sem que tenha sido apurada qualquer outra factualidade a este respeito, designadamente o cronograma da construção e instalacao do Parque Eolico do Pisco, nao se pode considerar a existencia da contradicao apontada aos aludidos factos provados nos pontos 48 e 143 pois os mesmos correspondem a realidades diferentes.

P. Os factos provados 102 e 150 nao sao igualmente contraditorios entre si pois a circunstancia de a Re B... ter conhecimento da existencia da Assembleia de Compartes da Serra do Pisco e reconhecer-lhe poderes de gestão dos Baldios da Serra do Pisco nao contraria a nao aceitacao, pela mesma, dos direitos de exploracao de que a C... se arrogava titular, provenientes da celebracao do Contrato junto a fls. 39 a 41.

Q. A Assembleia de Compartes da Serra do Pisco e a sociedade C..., Lda. nao sao confundem, sao entidades diferentes, sendo certo que o reconhecimento dos poderes de gestao de uma entidade nao e sinonimo de concordancia com toda a actuacao dessa mesma entidade ao abrigo de tais poderes, pelo que nao se verifica a contradicao apontada pelos Recorrentes.

R. Relativamente a critica apontada a sentenca no sentido de ha factos provados que consubstanciam materia conclusiva e ou de direito, tal ter-se-a ficado a dever a meros erros materiais da Sentenca, decorrentes de lapso manifesto, rectificaveis em face da prova produzida, por simples despacho, nos termos do disposto no n.o 2 do artigo 614.o do CPC, sugerindo-se, assim, a seguinte redaccao para os seguintes factos:

57. A Junta de Freguesia de Santa Maria não tinha poderes de administração sobre os terrenos que compõem os Baldios da Serra do Pisco. (artigo 59º da petição inicial)

72. A Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco tinha poderes para realizar ou autorizar tal cessão. (artigo 75º da petição inicial)

89. A cessão da posição contratual referida em 88. produziu os seus efeitos em 28 de Março de 2018. (artigo 96º da petição inicial)

103. A Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco tinha competência para deliberar a cessão de exploração dos terrenos baldios da Serra do Pisco. (artigo 116º da petição inicial)

104. A 1ª Ré não tinha competência para ceder a exploração dos terrenos baldios da Serra do Pisco, à D..., S.A..

267. A 1.ª Ré, e, pelo menos, o anterior Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria sabiam que os compartes da Venda do Cepo, e CC, em particular, tencionavam constituir os órgãos e administração dos baldios da Serra do Pisco. (artigo 53º da Réplica)

294. Para a elaboração e aprovação do caderno de recenseamento exigia-se que a iniciativa da sua elaboração, na falta da Assembleia de Compartes, como era o caso, competisse a grupos de 10 membros da comunidade local usualmente reconhecidos como compartes. (artigo 116.º da Réplica)

302. Na reuniao de 12 de Marco de 2009, compareceram e votaram 22 compartes

S. E a supressao dos seguintes:

77. A exploração foi concedida à 2ª Ré por quem não tinha poderes para o efeito (Junta de Freguesia de Santa Maria). (artigo 80º da petição inicial)

119. Para a informação e esclarecimento sobre a legislação dos baldios não seria necessário a existência de qualquer quórum. (artigo 115º da Réplica)

246. Pelo que o Boco nunca poderia possuir e gerir os Baldios da Serra do Pisco. (artigo 10º da Réplica)

298. A reunião foi, assim, convocada em conformidade com as normas legais que, à data, regiam tal acto. (artigo 123º da Réplica)

299. E reuniu o quórum necessário para deliberar validamente. (artigo 124º da Réplica)

T. Sem prejuizo do acima exposto, a alteracao ou a supressao dos factos em conformidade com o sugerido supra, em nada releva para a alteracao das conclusoes a que o Tribunal a quo chegou, sendo certo que, ainda que o Tribunal ad quem viesse a entender, na linha do defendido pelos Recorrentes, que todos os referidos factos correspondiam a materia conclusiva ou de direito, suprimindo-os todos, ao arrepio do que acima se disse – o que se admite por mera cautela de patrocinio, sem conceder – tal tambem em nada alteraria as referidas conclusoes.

U. Quanto aos alegados factos provados elencados pelos Recorrentes como alegadamente inconclusivos ou desprovidos de sentido, as expressoes utilizadas nos mesmos nao encerram um juizo ou conclusao, nem sao desprovidas de sentido, como se demonstra pelo que se alega supra no corpo destas alegacoes, em relacao a cada um deles, e nao colocam em causa a analise criteriosa e ponderada da prova produzida, nem beliscam o sentido da decisao.

V. Sobre a configuracao e os limites da area do Baldio da Serra do Pisco, também nao assite razao aos Recorrentes nas criticas que apontam a Sentenca recorrida a este respeito, pois (i) estes desconsideram o primeiro pedido formulado pelas Recorridas na peticao inicial que esta na base dos presentes autos, a saber: “a) Declarar por sentença que a 1ª Autora é a única legítima titular do direito à posse, exploração e gestão do Baldio da Serra do Pisco, declarando os respectivos limites, e condenar as Rés a reconhecerem-no;” (ii) em consonância com o peticionado, foi requerido pelas Recorridas, em sede de replica, a realizacao de prova pericial (levantamento topografico) por perito a nomear pelo Tribunal, para determinar a area dos Baldios e respectivos limites, (iii) tendo sido considerado provado, a final e em funcao de toda a prova produzida, quanto a tais limites e area eram aqueles que resultam dos 172. a 180.

W. As Recorrentes contestam a conclusao a que o Tribunal a quo chegou, de que apenas a comunidade de Vale do Cepo exercia, em exclusividade, actos de posse sobre os terrenos que compoem os Baldios da Serra do Pisco, mas importa salientar que os actos de posse concretamente exercidos pela comunidade de Vale do Cepo nao se mostram controvertidos, na medida em que nao foram impugnados pelas Recorrentes, tendo sido ate reconhecidos pela 1.a Recorrente (confissao essa aceite expressamente pelas Recorridas) – pontos 7, 8, 9, 11, 12, 18, 57, 58, 72, 77, 78, 90, 91, 104, 105, 243, 247, 248, 249, 252 a 262 dos factos provados.

X. O facto de o Mmo. Juiz a quo ter, durante o julgamento e em jeito de desabafo (como resulta das transcricoes que os Recorrentes fizeram questao de referir), referido que nao atribuia valor as declaracoes de parte, nao significa que, por um lado, aquele nao possa mudar de opiniao (desabafos, mesmo proferidos por quem exerce o poder judicial, nao sao lei) e, por outro, que em face da analise de toda a prova produzida no seu conjunto, nao possa ser atribuida as declaracoes de parte uma funcao integrativa e subsidiaria dos demais meios de prova, assumindo este meio de prova particular relevo em situacoes em que apenas as partes protagonizaram e tiveram conhecimento dos factos em discussao.

Y. Relativamente as criticas apontadas a valoracao pelo Tribunal a quo da prova testemunhal produzida em audiencia de julgamento impoe-se ressaltar, antes de mais, que, por um lado, quantidade [numero de testemunhas] não é sinónimo de qualidade e, por outro, que o facto de, no ano de 1953, os terrenos baldios da Serra do Pisco terem sido submetidos ao regime florestal (ponto 189 dos factos provados) nao e sinonimo, por si so, de ausencia ou impossibilidade de utilização dos terrenos apos tal data por parte dos habitantes de Vale do Cepo.

Z. Por um lado, nada resultou provado a respeito das eventuais consequencias da submissao daqueles terrenos ao regime florestal e, por outro, e absurda e sem sustento a afirmacao de que “É facto notório que o exercício da pastorícia é incompatível com a plantação e manutenção dos pinheiros”.

AA. Pelo que cai por terra o argumento de que apenas testemunhas com mais de 75 anos de idade poderiam falar com propriedade e conhecimento de causa sobre a utilizacao dos terrenos em apreco.

BB. O depoimento da testemunha QQ e lapidar quanto a exploracao dos terrenos em causa, sendo certo que tal exploracao unicamente pela comunidade de Vale do Cepo resultou, igualmente, dos depoimentos das testemunhas arroladas pelas Recorridas, OO, PP, CC, todos transcritos no corpo destas alegacoes.

CC. A valoracao do Tribunal a quo relativamente aos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pelos Recorrentes – depoimentos parciais e com falta de espontaneidade – nenhuma censura merece pois, da analise de tais depoimentos resulta de forma clara a antecipacao de resposta a perguntas não colocadas, a sintonia nas respostas e, ate mesmo, nas expressoes usadas, pelo que, como bem decidiu – e fundamentou – o Tribunal a quo tais depoimentos, confrontados com as restantes provas produzidas e analisados a luz das regras da experiencia, nao merecem credibilidade.

DD. No que toca a leitura a leitura que os Recorrentes fazem da prova documental, dir-se-a, desde logo, que a configuracao dos terrenos dos Baldios da Serra do Pisco assume relevancia, contrariamente ao que e alegado pelos mesmos, na medida em que, dessa configuracao, conjugada com a restante prova produzida, resulta que a povoacao mais proxima e a Venda do Cepo (e Boco, que nao assume relevancia atenta a inexistencia de residentes) – pontos 243, 244 e

256 dos factos provados.

EE. De todo o acima exposto resulta que, em face da prova produzida e tal como foi devidamente fundamentado pelo Tribunal a quo, esta correcta a conclusao de que, desde tempos imemoriais, que os terrenos dos Baldios são possuidos, geridos e utilizados, de forma continua e ininterrupta, a vista de toda a gente e sem oposicao de ninguem, pela comunidade local da aldeia da Venda do

Cepo, desenvolvendo esta actividades de diversa natureza, nomeadamente agroflorestal e silvo-pastoril, de forma continua e ininterrupta, explorando e usufruindo de tais terrenos e deles retirando os respectivos rendimentos e frutos, de forma continua e ininterrupta.

FF. Resulta, igualmente, com clareza da prova testemunhal produzida e acima indicada que a comunidade de Vale do Cepo considerava os terrenos dos Baldios da Serra de Pisco como “seus”, nomeadamente das testemunhas CC, OO, PP, NN e QQ e das declaracoes de parte de LL, os quais nao so confirmaram que os Baldios da

Serra do Pisco foram historicamente possuidos, geridos e explorados, com caracter de regularidade, continuidade, frequencia e permanencia pelos habitantes da Venda do Cepo, como confirmaram ainda a forma como surgiu e foi desenvolvida a ideia de constituicao da Assembleia de Compartes da Serra do Pisco.

GG. Ao inves, das declaracoes de parte prestadas pela 1.a Recorrida na pessoa do seu Presidente MM, resultou que desde 1990 nunca viu “ninguém na Serra nem a recolher matos, nem a pastorear animais, nem a ir buscar, buscar lenha.”, pois “sempre tive a ideia que aquilo era do Estado, serviços florestais” e que a “ideia de que aquilo era do Estado” ja vinha do tempo dos respectivos avos: “Aquilo foi retirado. Os meus avós sempre me disseram que aquilo tinha sido retirado, portanto, eu com essa história fiquei sempre convencido que aquilo era, era do Estado.”

HH. Nao existe, assim, qualquer violacao do disposto no artigo 1268.o do Codigo Civil em face da total ausencia de prova quanto ao animus necessario para o efeito.

II. Quanto a alegada ausencia de meios de prova para os factos provados 48, 53, 70, 83, 84, 85, 86, 97, 98, 102, 142, 260, 263, 267, 270, 274, 275, 278, 279, 280, 281, 282, 283, 284, 285, 295, 296, 298, 299, 300, 301, 302, 304 E 305, a extensao da materia de facto que os Recorrentes pretendem ver alterada denuncia, por si so, que a pretensao das Recorrentes e a obter um novo julgamento da causa, de modo a que sejam eliminados da factualidade provada todos os factos que lhe são desfavoraveis e, em consequencia, apenas seja dada cobertura a sua versao.

JJ. Nao existindo actualmente habitantes ou residentes na povoacao de Boco, a luz do art.o 1o da Lei n.o 68/93, de 4 de Setembro31, nao existem compartes daquela localidade, pois compartes sao so os moradores de uma ou mais freguesias ou parte delas.

KK. Ja no que toca ao recurso interposto pela Recorrente B..., S.A., refuta-se a existencia de nulidade da sentenca na medida em que não se verificam as contradicoes de factos apontadas pela Recorrente quanto aos pontos 48 e 143 e entre os pontos 102 e 150, pelas razoes ja aduzidas supra quanto ao recurso interposto pelas Recorrentes Uniao de Freguesias de Trancoso (São Pedro E Santa Maria) e Souto Maior e Conselho Directivo dos Baldios de Santa Maria – Trancoso.

LL. Tambem nao se ve, nem tal e explicado, de que forma o ponto 151 podera ser contraditorio com os pontos 102 e 150, atenta a diferenca temporal entre a factualidade ali descrita.

MM. No que se refere à contradição entre factos provados e não provados invocada pelo Recorrente, e no que se refere ao ponto 107, remete-se igualmente para o já acima referido – estamos perante erros materiais da Sentença, decorrentes de lapso manifesto, facilmente rectificáveis em face da prova produzida, por simples despacho, o que se requer nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 614.º do CPC.

NN. Relativamente ao ponto 155 dos factos provados, nao existe a contradição apontada: do mesmo resulta provado que “À data da celebração do Contrato entre a 1ª Autora e a sociedade C... (ou seja, 15 de Abril de 2015), os trabalhos já se encontravam em execução.”, tendo sido considerado como nao provado que “À data da celebração do Contrato entre a 1ª Autora e a sociedade C... (ou seja, 15.04.2015), os trabalhos já se encontravam numa fase avançada de execução.”.

OO. No tocante a apontada contradicao entre o ponto 185 dos factos provados e o “facto nao provado 14”, nao se alcanca a mesma, pois do elenco da factualidade nao provada nao consta que “Os aldeões da Venda do Cepo cortaram e recolheram lenha/madeira das árvores existentes nos terrenos do baldio da Serra do Pisco. (artigo 37º da contestação da 1ª Ré).”.

PP. Para evitar repeticoes e novamente por economia processual, remete-se para o ja acima alegado no ambito do Recurso interposto pelas Recorrentes Uniao de Freguesias de Trancoso (Sao Pedro E Santa Maria) e Souto Maior e Conselho Directivo dos Baldios de Santa Maria – Trancoso.

QQ. Insurge-se a Recorrente contra o ponto 147 dos factos provados, alegando que o mesmo nao teve origem no artigo 135.o da sua contestacao mas resulta do alegado que a mencao ao ponto 147 se trata de lapso e que se pretende referir ao ponto 142 da factualidade provada, aceitando-se que a origem do facto em concreto nao resulta de materia alegada pela Recorrente mas antes no artigo 43.o da peticao inicial e esta demonstrado pelos documentos 15 e 16 junto a mesma.

RR. Em todo o caso, a divergencia apontada resulta de lapso manifesto, passivel de rectificacao nos termos do disposto no n.o 2 do artigo 614.o do CPC, o que se requer.

SS. Em face do acima exposto e verificada a rectificacao dos erros materiais da Sentenca nos termos requeridos, fica sem fundamento a apontada nulidade da Sentenca ora recorrida.

TT. Nao ocorre nenhuma excepcao dilatoria inominada de falta de deliberação para propositura da presente accao sendo que a questao em discussao, a este proposito, se resume, na pratica, (i) a analise do conteudo da deliberacao de 19.06.2016 (fls 285 a 287) e (ii) a analise do regime de aplicacao da lei no tempo previsto no artigo 12.o do Codigo Civil.

UU. A deliberacao da Assembleia de Compartes do Recorrido que decidiu o recurso a juizo para defesa dos interesses dos Baldios da Serra do Pisco foi adoptada, por unanimidade, em Assembleia de Compartes ocorrida em 19.06.2016, ou seja, durante a vigencia da Lei n.o 68/93, de 04 de Setembro, tendo a presente accao dado entrada em juizo em 17.05.2018, ja na vigencia da (actual) Lei dos Baldios – Lei n.o 75/2017, de 17 de Agosto, a qual entrou em vigor no dia 22.08.2017.

VV. Tal como se referiu no despacho saneador não poderá deixar de ter o Tribunal por assente a existência da reunião da Assembleia de Compartes e a deliberação pela mesmo tomada, unanimemente, de ratificação da decisão do Conselho Directivo de recorrer a juízo e constituir mandatário nos exactos termos que se encontram documentados na acta junta aos autos (…) – a deliberacao de 19.06.2016 (fls 285 a 287).

WW. Nao obstante a acta fazer referencia a ratificacao da decisao do Conselho Directivo a mesma faz igualmente referencia ao futuro recurso a juizo, referindose, nomeadamente, que o advogado pretendia agora intentar acção judicial, o que foi aprovado por unanimidade, bem como que se iria informar a C... da decisao da Assembleia de Compartes de recorrer a juizo (alinea a) do ponto 2), o que tambem foi aprovado por unanimidade.

XX. De onde decorre que na pratica e em bom rigor, a deliberacao tomada em 19.06.2016 pela Assembleia de Compartes do Recorrido constante de fls 285 a 287 nao se limitou a ratificar os actos ja praticados pelo Conselho Directivo tendo tambem deliberado o recurso futuro a juizo cumprindo assim, tambem, os requisitos da actual Lei dos Baldios – deliberacao da Assembleia de Compartes de recurso a juizo previa ao mesmo – o que decorre do proprio texto da acta – e por unanimidade - ou seja, com uma votacao favoravel superior aos dois tercos previstos na lei.

YY. Ainda que assim nao se entenda, o que por mera cautela de patrocinio se concebe, sem conceder, a validade dos actos juridicos praticados em cumprimento da deliberacao validamente tomada ao abrigo da Lei n.o 68/93, de 04 de Setembro nao depende dos requisitos da Lei n.o 75/2017, de 17 de Agosto nem existe qualquer obrigacao legal de renovacao de uma deliberacao

validamente tomada.

ZZ. Na pratica, a Recorrente entente que se impunha a existencia de uma nova deliberacao e precisamente com o mesmo sentido e conteudo – ou seja, a pratica de actos inuteis e desnecessarios dado que a Assembleia de Compartes do Recorrido ja deliberara, e por unanimidade, o recurso a tribunal.

AAA. Tal interpretacao e desconforme ao previsto no artigo 12.o do Codigo Civil, acerca da aplicacao das leis no tempo na medida em que os requisitos procedimentais para a deliberacao do recurso a juizo sao, sem qualquer duvida, condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, pois dizem respeito a validade da propria deliberacao e nao a sua execucao, pelo que, as novas condicoes de validade da deliberacao previstas na actual Lei dos Baldios apenas se aplicam as deliberacoes tomadas depois da sua entrada em vigor, nao tendo qualquer efeito invalidante das deliberações anteriores tomadas validamente ao abrigo da lei vigente na data da deliberacao.

BBB. Caso contrario, estariamos perante um efeito retroactivo – destruidor da validade da deliberacao tomada - que a lei nao pretende pois, de acordo com o artigo 12.o do Codigo Civil, a lei so dispoe para o futuro e a actual Lei dos Baldios nada preve em sentido diverso.

CCC. Em face do exposto nao merece qualquer reparo ou censura a decisao do despacho saneador na medida em que nao se verifica qualquer falta de falta de deliberacao para propositura da presente accao, pois, de outro modo, estaríamos perante uma violacao do disposto no artigo 12.o, n.o 2, do Codigo Civil.

DDD. Alega o Recorrente que os contratos declarados validos – alinea e) da decisao – foram celebrados com o intuito de enganar terceiros -, o que nao foi objecto de discussao no presente processo e, por isso, constitui uma questao nova sobre a qual nao foi, sequer, produzida qualquer prova - nem tao pouco são identificados os terceiros a enganar e prejudicar.

EEE. E falso que o Recorrido nada tenha feito para fazer valer os seus direitos pois, logo em 2015, lancou mao de um procedimento cautelar que foi indeferido, e ao qual se faz expressa referencia na reuniao de Assembleia de Compartes do Recorrido de 19.06.2016 (vd. fls 285 a 287).

FFF. Mais: foram os proprios compartes da Assembleia de Compartes do Recorrido que aprovaram por unanimidade o pagamento de 70% da contrapartida financeira a receber pela cessao da exploracao dos Baldios, como forma de compensacao pelos prejuizos causados a sociedade C..., nos termos e ao abrigo da clausula 11.a do contrato de cessao, cfr. decorre da acta de 19.06.2016 junta a fls 285 a 287.

GGG. Pelo que e forcoso concluir nao so que os Compartes que aprovaram, por unanimidade, o contrato de cessao e tal compensacao, nao sao terceiros como tambem que tao pouco foram enganados (por si proprios, note-se!).

HHH. A circunstancia de o tribunal a quo nao ter considerado provados os prejuizos sofridos pela C... nao permite considerar, per si, que que eles nao tenham existido.

III. Nada dos autos permite concluir que os contratos celebrados entre os Recorridos correspondam, como alega o Recorrente, a uma divergência intencional e bilateral entre a vontade real e a declarada nem que tenham o intuito de enganar e prejudicar terceiros, pelo que esta alegacao do Recorrido tem de improceder, principalmente, tendo em atencao os factos provados sob os pontos 35., 36., 37., 42., 73., 74., 83., 84., 85. e 86., os quais impoem que se afaste, por completo, o alegado intuito de enganar e prejudicar terceiros ou ate a existencia de uma vontade real nao declarara e desconforme aos contratos cuja nulidade o Recorrente agora argui.

JJJ. Sendo igualmente manifesto que nao decorre dos autos qualquer ausência de proposito real de execucao dos trabalhos por parte da C..., que, de facto, existiu, como decorre, nomeadamente, das cartas remetidas aos Recorrentes.

KKK. De onde decorre que nao existem quaisquer factos que permitissem ao tribunal declarar oficiosamente (pois a mesma nao foi requerida) a simulacao dos contratos celebrados entre os Recorridos e que foram validamente julgados e considerados validos.

LLL. Pelos mesmos motivos, nao se verifica qualquer abuso de direito por parte dos Recorridos que, como ficou bem patente dos factos provados, sempre se arrogaram o direito a utilizacao e exploracao dos Baldios da Serra do Pisco e que, desde 2016, deliberaram o recurso a juizo para fazer valer tais direitos.

MMM. Nao estamos perante o exercicio ilegitimo do direito do 1.o Recorrido a ver reconhecido que é a única e legítima titular do direito à posse, exploração e gestão dos Baldios da Serra do Pisco, com todas as legais consequencias que tal posse lhe confere, nas quais se inclui, nomeadamente, o direito a cessao de exploracao dos Baldios nos termos legalmente previstos e que foram exercidos nos termos dos contratos cuja nulidade o Recorrente invoca.

NNN. De igual forma, os pedidos formulados pelos Recorridos nao excedem, de modo algum, os limites impostos pela boa fe, pelos bons costumes ou pelo fim social ou economico do direito ao reconhecimento do direito a posse dos Baldios da Serra do Pisco com todas as legais consequencias que tal posse permite, nas quais se inclui, nomeadamente, o direito a exploracao dos Baldios nos termos acordados entre os Recorridos.

OOO. Nao estamos, por isso, perante qualquer situacao de abuso de direito pelo que uma decisao do tribunal ad quem nos termos requeridos pelo Recorrente consubstanciaria uma errada aplicacao do direito e violaria claramente o disposto no artigo 334.o do Codigo Civil e nao deve, por isso, ser atendida.

PPP. Alega ainda o Recorrente que a condenacao do contem um segmento indeterminado, com o que nao podemos concordar.

QQQ. A ausencia de fundamento e tal que o Recorrente nem quer retira consequencias juridicas desta alegada indeterminabilidade e nem sequer a menciona nas conclusoes de recurso, as quais, como e jurisprudencia unanime, delimitam o objecto do recurso.

RRR. Nem se compreende esta alegada incompletude ou indeterminabilidade na medida em que este segmento decisoes se insere numa extensa decisao judicial que permite identificar clara e concretamente o seu objecto, tal como o Recorrente fez.

SSS. O segmento decisorio em causa tem a seguinte redaccao: condenar 2ª Ré B..., S.A a entregar a contrapartida financeira pela exploração à 1ª Autora Conselho Directivo dos Baldios da Serra do Pisco – Venda do Cepo (Trancoso), a partir da data desta da sentença.

TTT. Este segmento decisorio vem no seguimento:

a) da declaracao de nulidade e de nenhum efeito do Contrato de Cessao de Exploracao junto a fls. 43/verso a 45 – alinea d) da decisao (e que e o contrato de que o Recorrente e parte); e

b) da condenacao da Recorrente Uniao de Freguesias de Trancoso (Sao Pedro e Santa Maria) e Souto Maior a entregar ao Recorrido Conselho Directivo dos Baldios da Serra do Pisco – Venda do Cepo (Trancoso), todas as quantias que recebeu do Recorrente B... como contrapartida da cessao de exploracao dos terrenos que integram os Baldios da Serra do Pisco, acrescidas de juros desde a data da citacao – alinea f) da decisao.

UUU. Pelo que e evidente que a contrapartida financeira a que se refere a alínea h) da decisao e a que se refere ao contrato declarado nulo e sem nenhum efeito, nao sendo, por isso, o seu objecto nem indeterminado nem incompleto pois decorre da decisao, na sua globalidade, que se trata da compensacao devida pela utilizacao e exploracao dos Baldios que o tribunal a quo permitiu que o

Recorrente mantivesse (ao absolver o Recorrente do pedido de entrega imediata dos Baldios – alinea h) da decisao).

VVV. Ou entendia o Recorrente que deveria continuar a sua exploracao dos Baldios sem pagar qualquer contrapartida????

WWW. E nao, ao contrario do referido pelo Recorrente, o Recorrido Conselho Directivo nao manifestou qualquer intencao ou proposito de assumir a posição contratual no contrato celebrado entre as Recorrentes. Pretende tao so receber o rendimento emergente da exploracao dos Baldios de cuja posse e legitimo e único titular.

XXX. Na verdade, alega o Recorrente que o contrato de cessao declarado nulo pelo tribunal a quo deveria ter sido convertido em contrato valido, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 293.o do Codigo Civil, pedido este que devera ser julgado improcedente pois, tal como se refere na sentenca ora em crise: (i) o Recorrido Conselho Directivo nao e parte no contrato declarado nulo e, por isso, nunca poderia ser parte no contrato “novo” e (ii) o Recorrente nao peticionou tal

conversao e apesar de a nulidade ser de conhecimento oficioso, a conversao do negocio nulo nao o e.

YYY. Na verdade, a conversao a que alude o artigo 293.o do Codigo Civil so pode operar entre as mesmas partes e nao abranger uma parte que nao celebrou o negocio que se pretende converter e, tal como referido no Acordao do Supremo Tribunal de Justica de 14/01/2010, processo n.o 541/09.4 YFLSB em cujo sumario se pode ler que como se decidiu nos Acórdãos de 16-12-1999 e de 25-11-2003 deste Supremo Tribunal, o Tribunal não pode conhecer oficiosamente da conversão, mas já a nulidade é do conhecimento oficioso ( respectivamente in BMJ 492º-437 e Col Jur/STJ 2003, 3º-161).

ZZZ. Mais a mais quando nao foi alegada nem feita qualquer prova sobre a real intencao das partes em causa (o Recorrido Conselho Directivo e o Recorrente) sendo certo que tal alegacao e prova seriam sempre essenciais para a eventual procedencia da conversao do negocio.

AAAA. Em face do exposto, a conversao agora pretendida pelo Recorrente nunca poderia ser declarada e caso se decidisse pela conversao nos termos pretendidos pelo Recorrente, ai sim, estariamos claramente perante uma condenacao para alem do pedido, a qual nao e consentida pelo direito por nao se enquadrar nos limites da condenacao previstos no artigo 609.o, n.o 1, do Codigo de Processo Civil, e consubstanciaria uma nulidade da sentenca, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 615.o, n.o 1, alinea b), do Codigo de Processo Civil, para alem de violar o disposto no artigo 293.o do Codigo Civil.

Nestes termos e nos melhores de Direito que V. exas. doutamente suprirão, deverão ser julgados improcedentes os recursos interpostos pelas Recorrentes, mantendo-se integralmente a sentença recorrida, assim se fazendo a acostumada Justiça!

II – Factos Provados

1. A 1ª Autora é o órgão executivo colegial eleito pela comunidade local de Venda do Cepo, freguesia de Santa Maria, concelho de Trancoso, distrito da Guarda, para a gestão de um conjunto de terrenos possuídos pela referida comunidade local. (artigo 1º da petição inicial)

2. A 2ª Autora é uma sociedade por quotas que se dedica produção e comercialização de energia solar, bem como quaisquer outras energias alternativas, exploração florestal, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim, arrendamentos e subarrendamentos, gestão de imóveis constante da certidão permanente com código de acesso n.º ...66. (artigo 2º da petição inicial)

3. A 1ª Ré é o órgão executivo colegial das freguesias de Trancoso (São Pedro e Santa Maria) e Souto Maior, concelho de Trancoso, distrito da Guarda, que tem como competência, além de outras, proceder à administração ou à utilização de baldios das freguesias sempre que não existam assembleias de compartes. (artigo 3º da petição inicial)

4. A 1ª Ré resulta da fusão das freguesias de São Pedro, Santa Maria e Souto Maior que até então eram autónomas, fusão resultante da recente reorganização administrativa. (artigo 4º da petição inicial)

5. A 2ª Ré é uma sociedade anónima que se dedica, entre outras actividades, à exploração de energia eólica. (artigo 5º da petição inicial)

6. Os terrenos que compõem o Baldio da Serra do Pisco não se encontram inscritos na matriz predial. (artigo 6º da petição inicial)

7. Desde tempos imemoriais que tais terrenos são possuídos, geridos e utilizados, de forma contínua e ininterrupta, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, pela comunidade local da aldeia da Venda do Cepo – com exclusão de qualquer outra comunidade, ainda que limítrofe. (artigo 8º da petição inicial)

8. Desde tempos imemoriais que a população da aldeia de Venda do Cepo – com exclusão de qualquer outra população, ainda que limítrofe – vem desenvolvendo actividades de diversa natureza, nomeadamente agro-florestal e silvo-pastoril, de forma contínua e ininterrupta, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém. (artigo 9º da petição inicial)

9. Desde tempos imemoriais, que os compartes da aldeia de Venda do Cepo – com exclusão de compartes de qualquer outra localidade, ainda que limítrofe – exploram e usufruem de tais terrenos, deles retirando os respectivos rendimentos e frutos, de forma contínua e ininterrupta, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém. (artigo 10º da petição inicial)

10. Os terrenos baldios da Serra do Pisco encontram-se juntos à aldeia de Venda do Cepo. (artigo 11º da petição inicial e 22 da contestação da 1ª Ré)

11. A aldeia de Venda do Cepo constitui o aglomerado populacional que mais próximo fica dos referidos terrenos. (artigo 12º da petição inicial)

12. Tais terrenos sempre foram explorados pelos habitantes da aldeia de Venda do Cepo. (artigo 13º da petição inicial)

13. Os habitantes da aldeia de Venda do Cepo sempre exerceram as suas actividades nos terrenos baldios da Serra do Pisco. (artigo 14º da petição inicial)

14. Os aldeões da Venda do Cepo sempre ali cortaram e recolheram lenha/madeira das árvores existentes nos ditos terrenos. (artigo 15º da petição inicial)

15. Os aldeões da Venda do Cepo sempre para ali levaram os animais que possuem para pastar. (artigo 16º da petição inicial)

16. Os aldeões da Venda do Cepo sempre ali cultivaram produtos agrícolas, em especial centeio. (artigo 17º da petição inicial)

17. Os aldeões da Venda do Cepo sempre ali extraíram carvão que igualmente vendiam em Trancoso. (artigo 18º da petição inicial)

18. Os terrenos que integram os Baldios da Serra do Pisco estiveram sempre na posse e foram sempre explorados e rentabilizados pelos habitantes da aldeia da Venda do Cepo. (artigo 19º da petição inicial)

19. Conscientes desta realidade, os compartes da Venda do Cepo resolveram organizar-se com vista à gestão institucionalizada dos Baldios da Serra do Pisco. (artigo 20º da petição inicial)

20. Nessa sequência, constituíram uma Comissão Ad Hoc dos compartes da Venda do Cepo. (artigo 21º da petição inicial)

21. Acto contínuo, a Comissão Ad Hoc dos compartes da Venda do cepo, através do seu representante, também ele comparte, CC, mediante Edital/Convocatória de 10 de Fevereiro de 2009, convocou todos os compartes da Venda do Cepo para uma reunião a realizar na casa do povo da Venda do Cepo no dia 23 de Fevereiro de 2009, com a seguinte ordem de trabalhos:

“1 – Informação e esclarecimento sobre legislação dos baldios;

2 – Aprovação do Caderno de Recenseamento dos compartes;

3 – Constituição da Assembleia de compartes e eleição dos órgãos que a representam;

4 – Forma de Administração dos Baldios;

5 – Apreciação de acções de gestão florestal levadas a cabo em todos os baldios da Venda do Cepo” (artigo 22º da petição inicial)

22. Em 23 de Fevereiro de 2009, pelas 20.00 horas, a referida Comissão reuniu-se no salão da casa do povo da Venda do Cepo, tendo os compartes da Venda do Cepo deliberado nos termos que constam da Acta n.º 1, datada de 23 de Fevereiro de 2019, pelas 20.00 horas: “Em relação ao primeiro ponto da ordem de trabalhos foi prestado esclarecimento, sobre a legislação dos baldios em vigor (Lei n.º68/93, de 04 de Setembro, actualizada pela Lei n.º89/97, de 30 de Julho), através da leitura e análise da mesma. Esta encontrar-se-á arquivada, para consultas posteriores, num dossier criado para o efeito, no salão da casa do povo.

Relativamente ao ponto dois e ponto três da ordem de trabalhos, os compartes presentes, acharam pertinentes estes assuntos serem tratados numa reunião posterior, devido à falta de documentação identificativa, por parte dos compartes e ter-se considerado necessário consolidar a informação existente, a fim de se proceder a uma fase posterior à constituição dos diferentes órgãos. Uma vez que se está numa fase embrionária do processo.

No que concerne ao ponto quatro e cinco da ordem de trabalhos, os presentes consideraram útil, a presença e colaboração de um técnico da Unidade de Gestão Florestal da Beira Interior Norte, tendo sido sugerida a Eng.ª SS, uma vez que já se tem vindo a manter contacto com a mesma. Tendo em conta que a presença desta, pode trazer benefícios na matéria em discussão.

A salientar a presença do Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria, TT, bem como do advogado UU, de referir que estes dois elementos saíram antes do final da reunião. Nada mais havendo a tratar deu-se como encerrada a reunião da qual, se lavrou a presente acta, que depois de lida e aprovada, vai ser assinada por todos os presentes: (…)”, encontrando-se assinada por 28 compartes (artigo 23º da petição inicial)

23. Esteve também presente na reunião o Presidente, à data, da Junta de Freguesia de Santa Maria, freguesia da qual a 1ª Ré é sucessora, TT, que, no entanto, se ausentou antes do final da reunião. (artigo 24º da petição inicial)

24. A 1ª Ré sabia que os compartes da Venda do Cepo pretendiam constituir os órgãos de representação, disposição, gestão e fiscalização dos terrenos baldios da Serra do Pisco, pelo menos desde 23 de Fevereiro de 2009. (artigo 25º da petição inicial)

25. Em face do decidido na reunião de 23 de Fevereiro de 2009, quanto aos pontos 2 a 4 da Ordem de Trabalhos, a Comissão Ad Hoc dos compartes da Venda do Cepo, através do seu representante CC, mediante Edital daquela mesma data, convocou todos os compartes da Venda do Cepo para uma nova reunião a realizar na casa do povo da Venda do Cepo no dia 3 de Março do mesmo ano, com a mesma ordem de trabalhos:

“1 – Informação e esclarecimento sobre legislação dos baldios;

2 – Aprovação do Caderno de Recenseamento dos compartes;

3 – Constituição da Assembleia de compartes e eleição dos órgãos que a representam;

4 – Forma de Administração dos Baldios;

5 – Apreciação de acções de gestão florestal levadas a cabo em todos os baldios da Venda do Cepo” (artigo 26º da petição inicial)

26. Na aludida reunião, realizada em 3 de Março de 2009, os compartes da Venda do Cepo deliberaram sobre os referidos pontos da ordem de trabalhos nos termos que constam da Acta respectiva:

Em relação ao primeiro ponto da ordem de trabalhos, foi feita uma análise mais pormenorizada da Lei (Lei n.º68/93, de 04 de Setembro, actualizada pela Lei n.º89/97, de 30 de Julho), por parte da Eng.ª SS, da Unidade de Gestão Florestal da Beira Interior Norte. Nomeadamente o art.16º, e seguintes, os quais dizem respeito à composição da mesa, conselho directivo e comissão de fiscalização, bem como das suas competências.

No que concerne ao ponto dois, procedeu-se à elaboração e aprovação do caderno de Recenseamento dos compartes.

Relativamente ao ponto três, procedeu-se à constituição da mesa da assembleia ad.hoc, através do sistema de votação, onde foi eleito para presidente CC VV e como vogais NN e WW.

A eleição dos órgãos da assembleia de compartes ficou agendada para a próxima reunião.

No que concerne ao ponto quatro e cinco da ordem de trabalhos, contámos com a presença da Eng.ª SS, a qual prestou esclarecimentos muito úteis relativamente aos assuntos em questão.

Nada mais havendo a tratar deu-se por encerrada a reunião, da qual, se lavrou a presente acta, que depois de lida e aprovada, vai ser assinada pelo presidente da mesa ad-hoc e por todos os presentes.”, encontrando-se assinada pelo presidente da mesa ad hoc e 27 compartes. (artigo 27º da petição inicial)

27. De imediato e porque ainda existiam alguns pormenores a aperfeiçoar, através de Edital daquela mesma data (3 de Março de 2009), foram os compartes da Venda do Cepo convocados para uma nova reunião a realizar no dia 12 de Março de 2009, com a mesma ordem de trabalhos. (artigo 28º da petição inicial)

28. No dia 12 de Março de 2009, pelas 21.00 horas, os compartes da Venda do Cepo reuniram novamente e deliberaram:

Em relação ao primeiro ponto da ordem de trabalhos, procedeu-se a uma interpretação menos aprofundada sobre o ponto em questão.

No que concerne ao ponto dois, procedeu-se à elaboração e aprovação do caderno de Recenseamento dos compartes, com a inclusão de alguns compartes, com a aprovação da assembleia presente.

Relativamente ao ponto três, procedeu-se à votação da única lista apresentada composta pelos seguintes compartes: Mesa da assembleia Presidente: CC Vice-presidente: XX 1º Vogal: YY 2º Vogal: ZZ Para o conselho directivo foram eleitos, AAA, LL, NN, BBB e CCC, foram eleitos para o conselho fiscal: WW, DDD, EEE, VV e FFF. Os respectivos órgãos do concelho directivo e conselho fiscal reunirão posteriormente para determinar quem ocupará os diferentes cargos.

As actas destes serão anexas a esta acta.

No que diz respeito ao ponto quatro e cinco da ordem de trabalhos, houve uma troca de ideias entre a assembleia presente, onde se chegou à conclusão de uma gestão própria.

Nada mais havendo a tratar deu-se por encerrada a reunião, da qual, se lavrou a presente acta, que depois de lida e aprovada, vai ser assinada pelo presidente da mesa da Assembleia e por todos os presentes.”, encontrando-se assinada pelo presidente da mesa e por 21 compartes. (artigo 29º da petição inicial)

29. Nessa reunião, procedeu-se à elaboração e aprovação definitiva do Caderno de Recenseamento dos Compartes da Venda do Cepo. (artigo 30º da petição inicial)

30. E foram eleitos os membros do Conselho Directivo e do Conselho Fiscal. (artigo 31º da petição inicial)

31. No dia seguinte, 13 de Março de 2009, realizaram-se as primeiras reuniões do Conselho Directivo e do Conselho Fiscal, tendo-se distribuído pelos membros eleitos para os referidos órgãos os cargos a assumir na estrutura dos mesmos. (artigo 32º da petição inicial)

32. Constituídos todos os órgãos previstos legalmente para a representação, disposição, gestão e fiscalização relativos aos terrenos baldios da Serra do Pisco, em 27 de Março de 2009 foi enviado para a Autoridade Florestal Nacional, que o recebeu em 30 de Março de 2009, o processo para o registo junto daquela entidade supervisora. (artigo 33º da petição inicial)

33. Em 15 de Abril de 2015, a Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco, na sequência de deliberação tomada em 17 de Março desse mesmo ano, celebrou com

a sociedade C..., Ldª, um contrato de cessão de exploração de terrenos baldios que teve por objecto os terrenos Baldios da Serra do Pisco, sitos no Lugar de Venda do Cepo. (artigo 34º da petição inicial)

34. Nos termos do Contrato, a referida Assembleia de Compartes cedeu à C..., em regime de exclusividade, livre de quaisquer ónus ou encargos, que assim os recebeu, a exploração dos terrenos baldios identificados na planta anexa ao mesmo. (artigo 35º da petição inicial)

35. A referida cessão teve como fim a instalação e exploração, pela C..., nos aludidos terrenos, de aerogeradores para produção de energia eólica e sistema de ligação à rede eléctrica nacional, com os respectivos dispositivos e equipamentos, nas formas e condições que para esse efeito viessem a constar do projecto definitivo a ser desenvolvido pela C... e aprovado pelas entidades administrativas competentes. (artigo 36º da petição inicial e 132º da contestação da 1ª Ré)

36. O Contrato entrou de imediato em vigor e foi celebrado por um período de 20 (vinte) anos. (artigo 37º da petição inicial)

37. Nos termos do Contrato, a Assembleia de Compartes autorizou a C... à prática de todos os actos necessários ou convenientes aos fins para os quais o contrato havia sido celebrado, designadamente à implantação de torres de medição, instalação dos aerogeradores de produção de energia eólica e respectivos transformadores e sistema de ligação à rede, à abertura e utilização de acessos e caminhos até ao local dos equipamentos e à instalação subterrânea ou aérea dos cabos

de ligação entre os aerogeradores e destes à subestação com ligação à rede pública de transportes de energia. (artigo 38º da petição inicial)

38. A título de compensação pela cessão para exploração eólica do Baldio, a C... comprometeu-se a pagar à Assembleia de Compartes anualmente a quantia de € 2.000,00 (dois mil euros) até à data da emissão da licença de exploração. (artigo 39º da petição inicial)

39. Esta renda passaria a ser de € 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros) por cada aerogerador instalado no Baldio a partir da data em que fosse emitida a licença de exploração. (artigo 40º da petição inicial)

40. Esta última renda vencer-se-ia na data de emissão da licença de exploração e as restantes na mesma data dos anos seguintes. (artigo 41º da petição inicial)

41. A Assembleia de Compartes declarou ainda no Contrato que “consente e aceita sem reservas que a Segunda Outorgante [a C...] ceda, querendo, a sua posição contratual, consentindo e aceitando deste e do mesmo modo a transmissão e a integração na esfera jurídica de um terceiro cessionário de todos os direitos e deveres de que a ora Segunda Outorgante é titular, reconhecendo-o como legítimo titular no complexo de direitos e deveres transmitidos, renunciando, por consequência, a opor-lhe quaisquer meios de defesa.”. (artigo 42º da petição inicial)

42. O Contrato foi celebrado na sequência negociações e, especificamente, após um levantamento topográfico realizado pela C... em Setembro de 2011 e após negociação entre esta sociedade e a Assembleia de compartes. (artigo 43º da petição inicial)

43. Em meados de Julho de 2015, a C..., na pessoa do seu representante legal, Prof. GGG e do seu trabalhador HHH, foi informada pelo Presidente da Mesa da Assembleia de Compartes, Sr. CC, de que estavam a instalar nos Baldios da Serra do Pisco vários aerogeradores, questionando se teria sido a C... a fazê-lo. (artigo 44º da petição inicial)

44. A C... foi totalmente apanhada de surpresa visto que ainda não tinha procedido à instalação de qualquer equipamento nos Baldios, informação que transmitiu à Assembleia de Compartes, na pessoa do aludido Presidente da Mesa. (artigo 45º da petição inicial)

45. Nessa sequência, ainda em Julho de 2015, os colaboradores da C... deslocaram-se aos Baldios para verificarem in loco o que estava a acontecer. (artigo 46º da petição inicial)

46. E constataram que, de facto, tinham ali já sido instalados vários equipamentos destinados à exploração e produção de energia eólica. (artigo 47º da petição inicial)

47. Verificaram, igualmente, que a entidade responsável por tal instalação seria uma sociedade denominada B..., S.A., aqui 2ª Ré. (artigo481º da petição inicial)

48. Aquando da celebração do Contrato, em Abril de 2015, não havia qualquer equipamento instalado nos Baldios. (artigo 49º da petição inicial)

49. A C... decidiu indagar, antes de contactar a 2ª Ré, com que legitimidade é que esta havia ali procedido à instalação de tais equipamentos. (artigo 50º da petição inicial)

50. Após algumas diligências, acabou por saber que aparentemente tal legitimidade radicava num contrato de cessão de exploração celebrado em 1 de Abril de 2009 entre a sociedade D..., S.A. e a Junta de Freguesia de Santa Maria. (artigo 51º da petição inicial)

51. Nos termos deste último contrato, a Junta de Freguesia de Santa Maria, antecessora da ora 1ª Ré, arrogava-se de ter “a seu cargo a administração do prédio rústico sito em Serra do Pisco, freguesia de Santa Maria, concelho de Trancoso, não inscrito na matriz predial rústica, o qual é baldio.”. (artigo 52º da petição inicial)

52. E, nessa qualidade, cedeu à referida D..., S.A. “a exploração de parte do terreno baldio assinalado na planta anexa e identificado no Considerando C do presente Contrato, aproximadamente com a área de 115 ha (cento e quinze hectares) (…).”. (artigo 53º da petição inicial)

53. Os terrenos cedidos pela Junta de Freguesia correspondem precisamente aos terrenos baldios da Serra do Pisco cedidos pela Assembleia de Compartes à C.... (artigo 54º da petição inicial)

54. Ficou estipulado no aludido contrato, além do mais, que “O Baldio objecto do presente Contrato destina-se à construção e exploração do Parque Eólico para produção e comercialização de energia eólica, assim como a realização de actividades relacionadas com a produção e comercialização de energias renováveis, nomeadamente a instalação, a montagem, exploração, conservação, reparação e modificação do conjunto de todos os componentes e de aerogeradores, instalações eléctricas, subestações, linhas de transporte de energia, etc., com o objectivo final de produção de energia através da acção do vento.”. (artigo 55º da petição inicial)

55. Mais prevê que “Ambas as partes reconhecem ser condição para a manutenção do interesse da D... [D..., S.A.] na celebração e vigência do presente Contrato a existência de parecer favorável de todas as entidades com competência para se pronunciarem sobre a instalação do Parque Eólico e a obtenção de todas as licenças e/ou autorizações necessários à instalação do Parque Eólico”. (artigo 56º da petição inicial)

56. A posição contratual da D..., S.A. no contrato teria depois sido cedida à 2ª Ré. (artigo 57º da petição inicial)

57. Ao invés do que declarou no contrato de cessão de exploração, a Junta de Freguesia de Santa Maria não tinha, como nunca teve, quaisquer poderes de administração sobre os terrenos que compõem os Baldios da Serra do Pisco. (artigo 59º da petição inicial) – eliminado.

58. Facto que sempre foi não só do conhecimento da referida Junta de Freguesia que actualmente corresponde à 1ª Ré, mas também da B..., S.A., aqui 2ª Ré. (artigo 60º da petição inicial)

59. Efectivamente, por carta datada de 19 de Maio de 2009, a então recentemente criada Assembleia de Compartes de Santa Maria, na pessoa do Presidente do Conselho Directivo, Sr. MM, dirigiu uma carta à Autoridade Florestal Nacional – Unidade de Gestão Florestal da Beira Interior Norte, onde, além do mais, fez constar o seguinte:

“Vem o Conselho Directivo dos Baldios da Serra do Pisco freguesia de Santa Maria concelho de Trancoso por este meio informar essa entidade do seguinte:

1 – Foi constituída em 12 de Março de 2009 a Assembleia de Compartes dos Baldios da Freguesia de Santa Maria concelho de Trancoso, que decorreu na sede da Junta de Freguesia de Santa Maria em Trancoso, ao abrigo da Lei 68/93 Lei dos Baldios” à vista de todos, sem oposição e devidamente divulgado pelo respectivo aviso convocatória.

2 – A assembleia foi constituída para a gestão dos baldios dos vários lugares da freguesia bem como os baldios da Serra do Pisco que são comuns a vários lugares da freguesia (…).

3 – A assembleia de compartes decidiu entre outros assuntos delegar na Junta de Freguesia a assinatura de cessação8 de contrato para a exploração de energia eólica, a instalar na Serra do Pisco, sem oposição e à vista de todos. (…) (artigo 61º da petição inicial)

60. Por carta datada de 25 de Maio de 2009, a Autoridade Florestal Nacional respondeu à missiva a que se alude no artigo precedente referindo, além do mais, que:

“Existindo uma Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco, com sede na Venda do Cepo, 6420-579 Trancoso, que abarca a mesma área referida no ofício de V. Exa.ª, recomenda-se que efectue contactos com a mesma no sentido de acordar a área a gerir.” (artigo 62º da petição inicial)

61. Pelo menos desde finais de Maio de 2009, a então Junta de Freguesia de Santa Maria sabia que havia uma entidade – Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco – que reivindicava a gestão dos terrenos que integravam esse baldio. (artigo 63º da petição inicial)

62. Em 19 de Abril de 2011, a Autoridade Florestal Nacional remeteu à E... – sociedade do mesmo grupo da D..., S.A., predecessora da 2ª Ré no contrato de exploração dos terrenos do Baldio da Serra do Pisco celebrado com a Junta de Freguesia de Santa Maria – uma carta onde, além do mais, consta:

“Dever-se-á acautelar o diferendo que subsiste entre os compartes da freguesia de Santa Maria e os compartes da Serra do Pisco dado que ambos reivindicam a posse dos terrenos baldios em questão, sugerindo-se que a receita gerada passe a ficar cativa na conta da AFN, o que aliás já está a acontecer com as receitas resultantes da venda de material lenhoso até à resolução do conflito.” (artigo 64º da petição inicial)

63. A 2ª Ré tinha conhecimento, pelo menos desde Abril de 2011, que havia uma outra entidade – os compartes dos Baldios da Serra do Pisco – que reivindicava a posse e a gestão dos terrenos Baldios da Serra do Pisco. (artigo 65º da petição inicial)

64. Em 22 de Agosto de 2014 um dos seus representantes, Senhor Eng.º AA, dirigiu um e-mail ao Presidente da Mesa da Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco referindo o seguinte:

“Estimado CC, bom dia, No seguimento da nossa troca de impressões de ontem, e pelos motivos que tive oportunidade de lhe dar a conhecer a propósito da instalação do Parque Eólico do Pisco, serve o presente para lhe pedir o favor de, com a maior brevidade possível, convocar os compartes dos baldios da Venda do Cepo de forma a colocar à consideração dos mesmos a assinatura da Declaração de autorização do abate de arvoredo no baldio da serra do Pisco, conforme minuta que se junta em anexo. No pressuposto de que possa existir acordos dos compartes relativamente ao agora solicitado, pedia-lhe o favor de preencher as partes que estão sublinhadas a amarelo na Declaração e de solicitar a quem de direito o favor de proceder à sua assinatura. (…)(artigo 66º da petição inicial)

65. Nesta sequência, em 24 de Outubro de 2014, reuniu-se o Conselho Directivo da Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco, com vista, nomeadamente, à discussão da proposta de autorização do corte de árvores onde está previsto a implementação do Parque Eólico do Pisco, sito na Serra de Almançor (Serra do Pisco). (artigo 67º da petição inicial)

66. Tendo sido decidido autorizar o corte das árvores localizadas na área onde se prevê instalar as infraestruturas que dizem parte ao Parque Eólico do Pisco. (artigo 68º da petição inicial e 129º e 141º da 1ª Ré)

67. Ficou também a constar da Acta que:

“No entanto, referiu-se que até á data não existe qualquer acordo, ou qualquer documento elaborado com a empresa em causa (B..., S.A.), para o efeito atrás mencionado. Apenas existiu uma conversa, sem qualquer valor legal, com o Senhor AA, agora representante da F....”. (artigo 69º da petição inicial)

68. E, mais adiante:

“Reservamos o direito do acordo monetário sobre a situação vigente, devendo este ter lugar numa reunião, ou reuniões, posteriores com a F..., com representante oficial ou com direcção.”. (artigo 70º da petição inicial)

69. Nesta sequência, a Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco emitiu a declaração solicitada em 5 de Novembro de 2014. (artigo 71º da petição inicial)

70. Tanto para as entidades públicas supervisoras, como para 2ª Ré, era imperativa a anuência, pelo menos, da Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco para que a exploração dos terrenos que integram estes Baldios pudesse ser cedida. (artigo 73º da petição inicial)

71. Nunca a Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco cedeu – ou qualquer outro órgão, designadamente a Autora –, autorizou ou consentiu na cedência de exploração dos referidos terrenos à 2ª Ré. (artigo 74º da petição inicial)

72. A Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco era a única entidade com exclusivos poderes para realizar ou autorizar tal cessão. (artigo 75º da petição inicial)

73. Isto mesmo foi transmitido pela sociedade C..., através dos seus advogados, à 2ª Ré por carta datada de 27 de Setembro de 2015, registada com aviso de recepção, onde consta o seguinte:

“Exmos. Senhores,

Dirigimo-nos a V. Exas. na qualidade de advogados da sociedade C..., Lda., sociedade por quotas, com sede em ..., ... .... Em 15 de Abril de 2015, a nossa Cliente celebrou com a Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco um contrato de cessão de exploração do referido Baldio para efeitos de exploração de energia eólica e exploração florestal, contratação essa devidamente deliberada e autorizada pela respectiva Assembleia de Compartes, órgão com competência exclusiva para o efeito. Fê-lo na sequência de um levantamento topográfico que realizou no decurso do ano de 2011.

Chegou agora ao conhecimento da nossa Cliente que V. Exas. se encontram a construir no referido Baldio um parque eólico com vista à posterior exploração de energia eólica. Tal construção viola frontalmente o direito de exploração do Baldio da Serra do Pisco de que a nossa Cliente é legítima titular. Neste sentido, vimos pela presente interpelar V. Exas. para suspender de imediato os trabalhos de instalação do parque eólico do Baldio da Serra do Pisco e/ou o funcionamento do mesmo.

Caso tal não aconteça, não nos restará alternativa senão o recurso às vias judiciais e comunicação às entidades administrativas competentes.

Mais informamos que vamos dar conhecimento desta carta à Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco para que adopte as diligências que entender convenientes.” (artigo 76º da petição inicial)

74. Missivas semelhantes foram enviadas pela Autora às Rés em 7 de Outubro de 2015. (artigo 77º da petição inicial)

75. As Rés, porém, não reconheceram o direito de exploração da, na altura, C... decorrente do Contrato. (artigo 78º da petição inicial)

76. E a 2ª Ré não suspendeu os trabalhos de instalação do parque eólico dos Baldios da Serra do Pisco e/ou o respectivo funcionamento, prosseguindo com os mesmos. (artigo 79º da petição inicial)

77. A exploração foi concedida à 2ª Ré por quem não tinha poderes para o efeito (Junta de Freguesia de Santa Maria). (artigo 80º da petição inicial) – eliminado.

78. A autorização ou o consentimento em tal cessão por parte da Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco sempre seria necessária, pelo menos enquanto não fosse definitivamente resolvido o diferendo entre ambas as Assembleias de Compartes. (artigo 81º da petição inicial)

79. Mas nem tal autorização ou consentimento existiu. (artigo 82º da petição inicial)

80. Como desde logo ficou ressalvado na Acta n.º 6, o acordo quanto à efectiva exploração de tais terrenos, mediante a instalação e funcionamento de um parque eólico, ficou relegado para momento posterior. (artigo 87º da petição inicial)

81. Ficou a constar da mencionada acta que “até à data não existe qualquer acordo, ou qualquer documento elaborado com a empresa em causa (B..., S.A.), para o efeito atrás mencionado [instalação de infraestruturas do Parque Eólico do Pisco]”. (artigo 88º da petição inicial)

82. Na declaração ora junta a fls. 49 consta apenas que a Requerida está a implementar um projecto de instalação de um parque eólico, e não o parque eólico propriamente dito. (artigo 89º da petição inicial)

83. Na sequência da solicitação efectuada pela 2ª Ré à Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco e da emissão por parte desta da declaração junta a fls. 49, os responsáveis da 2ª Ré assumiram o compromisso de regressarem brevemente ao contacto com os representantes desta Assembleia de Compartes, com vista à formalização do contrato de cessão de exploração propriamente dito, onde ficariam previstos quais os equipamentos a instalar, prazo de funcionamento do parque, quantidade de energia produzida e, claro, as respectivas contrapartidas, entre vários outros aspectos. (artigo 90º da petição inicial)

84. A 2ª Ré não mais contactou a Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco para a formalização do contrato de exploração, tal como se tinha comprometido. (artigo 91º da petição inicial)

85. O que levou os representantes da Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco a assumirem que a 2ª Ré havia desistido do projecto e, consequentemente, da exploração dos terrenos Baldios da Serra do Pisco. (artigo 92º da petição inicial)

86. E, uma vez que a Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco já vinha negociando com a 2ª Ré uma eventual cessão de exploração dos terrenos e perante o interesse firme desta em celebrar tal contrato de exploração, viria a formalizá-lo, efectivamente, no dia 15 de Abril de 2015, contrato esse que corresponde ao junto a fls. 39 a 41. (artigo 93º da petição inicial)

87. Em 14 de Março de 2018, a C..., Lda. cedeu a sua posição contratual à Autora Sociedade nos termos do Contrato de Cessão da Posição Contratual junto a fls. 69. (artigo 94º da petição inicial)

88. A referida cessão foi comunicada à Autora por carta datada de 28 desse mesmo mês e ano, através de carta registada com aviso de recepção. (artigo 95º da petição inicial)

89. Pelo que nessa data tal cessão produziu os seus efeitos. (artigo 96º da petição inicial)

90. A comunidade local que desde tempos imemoriais possui e gere o Baldio da Serra do Pisco de forma contínua e ininterrupta, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, é a comunidade local constituída pelo universo dos compartes de Venda do Cepo. (artigo 99º da petição inicial)

91. E não pelos compartes de Santa Maria. (artigo 100º da petição inicial)

92. Nessa qualidade, os compartes da Venda do Cepo iniciaram o processo formal de constituição dos órgãos de gestão dos Baldios da Serra do Pisco no início do ano 2009. (artigo 101º da petição inicial)

93. Após conversações com os responsáveis públicos com poder para o efeito, em 26 de Fevereiro de 2009, os compartes da Venda do Cepo requereram à Unidade de Gestão Florestal da Beira Interior Norte colaboração para efeitos de criação da Comissão de Compartes na Serra do Pisco. (artigo 102º da petição inicial)

94. Nessa sequência e após reunião para o efeito ocorrida em 3 de Março de 2009, os compartes da Venda do Cepo entregaram na Autoridade Florestal Nacional que o recebeu em 24 de Março de 2009, todo o processo referente à constituição da Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco. (artigo 104º da petição inicial)

95. A Autoridade Florestal Nacional, em 27 de Março de 2009, remeteu um ofício à Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco a solicitar o envio dos Editais referentes às actas apresentadas, a fim de completar o processo. (artigo 104º da petição inicial)

96. Nesse seguimento, em 30 de Março de 2009 foi entregue à Autoridade Florestal Nacional um novo processo completo, contendo os Editais solicitados, com vista a completar o processo de constituição da Assembleia de Compartes e dos demais órgãos (Conselho Directivo e Conselho Fiscal) de gestão dos Baldios da Serra do Pisco. (artigo 105º da petição inicial)

97. Após a constituição da Assembleia de Compartes, esta começou a praticar diversos actos enquanto tal tendo, em 12 de Maio de 2009, pedido ao Presidente da Câmara Municipal de Trancoso que lhe fosse cedida a utilização da Escola Primária da Venda do Cepo. (artigo 106º da petição inicial)

98. A constituição e existência legal da Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco foi reconhecida pela entidade pública com poderes de supervisão sobre os órgãos de gestão de Baldios - Autoridade Florestal Nacional (actualmente ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas). (artigo 107º da petição inicial)

99. O Ministério da Administração Interna, através da sua Unidade de Missão – SIRESP – Sistema Integrado de Tecnologia Digital para a Rede de Emergência e Segurança de Portugal, quando pretendeu instalar uma estação base com vista à cobertura do concelho de Trancoso na zona adjacente ao Marco Geodésico do Pisco, sito nos Baldios da Serra do Pisco, foi à Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco e não à Assembleia de Compartes de Santa Maria ou à respectiva Junta de Freguesia (ou a outra qualquer entidade) que, em 6 de Maio de 2009, se dirigiu dizendo, além do mais, “Tendo-nos sido comunicado pela Gestora da Unidade de Gestão Florestal da Beira Interior Norte, que este local está inserido na área do Baldio administrado por essa Assembleia de Compartes (…), vimos solicitar a V. Autorização para o efeito.”. (artigo 108º da petição inicial)

100. Autorização essa que a 1ª Autora concedeu. (artigo 109º da petição inicial)

101. Tendo, nessa sequência, sido elaborada uma minuta de protocolo entre ambas as entidades. (artigo 110º da petição inicial)

102. A 2ª Ré tinha conhecimento da existência da Assembleia de Compartes da Serra do Pisco e reconheceu-lhe poderes de gestão dos Baldios da Serra do Pisco. (artigo 113º da petição inicial)

103. A competência para deliberar a cessão de exploração dos terrenos baldios da Serra do Pisco pertence, em exclusivo, à Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco. (artigo 116º da petição inicial)

104. A 1ª Ré não tinha, como não tem, a seu cargo a administração dos terrenos baldios da Serra do Pisco, pelo que não podia ceder a exploração de tais terrenos à D..., S.A. nos termos do Contrato de Cessão de Exploração, cuja posição contratual foi depois cedida à 2ª Ré. (artigo 117º da petição inicial) – eliminado.

105. A Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco não autorizou, consentiu ou anuiu, para que a exploração dos terrenos baldios da Serra do Pisco fosse cedida à D..., S.A. e/ou à 2º Ré. (artigo 120º da petição inicial)

106. E não interveio no Contrato de Cessão de Exploração junto a fls. 43/verso a 45. (artigo 121º da petição inicial)

107. - A 1ª Autora, apesar de se terem organizado para gerir os desígnios dos terrenos baldios, em meados de 2009, nada fizeram, até à presente data, para impedir a instalação do Parque Eólico explorado pela 2ª Ré. (artigo 7º da contestação da 2ª Ré)

108. Acederam expressamente, ao pedido que, em 2014, a Sociedade Ré lhes dirigiu no sentido de proceder ao corte de árvores na área onde se instalaram parte das infraestruturas respeitantes ao Parque Eólico. (artigo 8º da contestação da 2ª Ré)

109. A 2ª Autora, tendo-se substituído na posição contratual que detinha a sociedade C..., não se dirigiu à 1ª Autora, que em sede de Contrato de Cessão de Exploração declarou ser “a entidade com legitimidade para assinar o presente contrato”, tendo de igual modo assumido “(…) total responsabilidade na eventualidade de terceiros se virem a arrogar direitos sobre a gestão, utilização e/ou exploração dos terrenos baldios objeto do presente contrato” para que se responsabilizasse por este imbróglio. (artigo 12º da contestação da 2ª Ré)

110. A C... conhecia perfeitamente o diferendo que opõe as duas comunidades locais, pela gestão dos terrenos baldios da Serra do Pisco. (artigo 13º da contestação da 2ª Ré)

111. À data em que foi celebrado o Contrato de Cessão de Exploração entre a D... e a Junta de Freguesia de Santa Maria - 01.04.2009 – já se encontrava constituída a Assembleia de Compartes dos Baldios de Santa Maria - Trancoso, (artigo 43º da contestação da 2ª Ré)

112. Tendo esta deliberado a delegação dos poderes para a celebração do Contrato de Cessão de Exploração com a sociedade D..., na Junta de Freguesia de Santa Maria. (artigo 44º da contestação da 2ª Ré)

113. Fruto das negociações que já se haviam encetado, em 23 de Janeiro de 2009, a então Junta de Freguesia de Santa Maria endereçou um ofício à então Autoridade Florestal Nacional, no qual lhe solicitou um parecer sobre a possibilidade de celebração de um contrato de cessão de exploração com a D.... (artigo 70º da contestação da 2ª Ré e 68º da 1ª Ré)

114. No ofício, a Junta de Freguesia de Santa Maria refere que “em conjunto com a Administração Florestal, tem a gestão do baldio da Serra do Pisco, em que quando existe a venda de material lenhoso revertem 60% do valor para a Junta de Freguesia e os restantes 40% para a Administração Florestal”. (artigo 71º da contestação da 2ª Ré)

115. Em resposta ao supra citado ofício, no dia 04 de Fevereiro de 2009, a AFN informou o seguinte:

"(.. ) nos termos da Lei dos Baldios (Lei n.º 68/93, de 4 de Setembro) a deliberação relativa à afectação de áreas submetidas a regime florestal a outros usos (como o caso de instalação de um parque eólico), compete à respectiva Assembleia de Compartas, mesmo quando não existe devolução de baldio ao uso, fruição e administração dos respectivos compartes. Não existindo Assembleia, sugere-se a criação de uma comissão ad hoc. (artigo 69º da contestação da 1ª Ré)

116. Mais informou:

"Assim, a decisão de instalação de parque eólico, deve ser tomada em reunião da referida assembleia, convocada nos termos do n.º 7 do art. 33º da referida Lei, da qual será lavada acta, sobre a deliberação de "Cessão de Exploração", referindo a área pretendida (de preferência anexando cartografia à acta) e deliberando poderes para outorga de contrato(s). Alerta-se para a necessidade de garantir o funcionamento da reunião de acordo com o disposto no art. 19º, respeitando o quórum previsto na lei e da acta ser assinada de acordo com o art. 13.º ". (artigo 72º da 2ª Ré e 70º da contestação da 1ª Ré)

117. E que:

da acta lavrada deverá ser remetida cópia a esta UGF, acompanhada da implantação da área do parque eólico em carta militar à escala 1:25.000, e formato de papel e shape file. Da análise dos procedimentos ocorridos e da proposta de instalação de parque eólico, será emitido parecer, com conhecimento à respectiva Assembleia de Compartes.” (artigo 71º da contestação da 1ª Ré)

118. Em consonância com o parecer recebido, a Junta de Freguesia de Santa Maria, através de edital afixado na sede da Junta, em 05 de Fevereiro de 2009, bem como nos locais destinados a afixação de editais de Boco, Castaíde, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo, fez saber que “se encontra em exposição, na sede desta junta, durante o prazo de dez dias, onde pode ser consultado por todos os interessados (…) o caderno de recenseamento de compartes desta freguesia, elaborado nos termos do Decreto-Lei n.º 68/93, de 4 de setembro”. (artigo 73º da contestação da 2ª Ré e 72º da contestação da 1ª Ré)

119. Mais se refere naquele Edital que, nos termos da Lei dos Baldios, seria necessária a constituição de uma comissão ad hoc, composta por 10 compartes, para efeitos de aprovação do caderno de recenseamento, ficando para esse efeito convocada uma reunião para o dia 16 de Fevereiro de 2009, pelas 20.00 horas, na sede da Junta de Freguesia. (artigo 74º da contestação da 2ª Ré)

120. No dia 16 de Fevereiro de 2009 reuniu a comissão ad hoc de Compartes dos Baldios de Santa Maria, no seguimento da recomendação da AFN. (artigo 75º da contestação da 2ª Ré e 74º da contestação da 1ª Ré)

121. Na referida reunião foi apresentado o caderno de recenseamento de Compartes dos Baldios de Santa Maria, o qual era composto com 1143 compartes com direito ao uso e fruição dos baldios de toda a área da freguesia, tendo sido deliberado, por unanimidade, aprovar provisoriamente o caderno de recenseamento apresentado. (artigo 76º da contestação da 2ª Ré e 77º da 1ª Ré)

122. Nessa mesma reunião, foi ainda deliberado solicitar a colaboração da Junta de Freguesia “para que seja convocada uma assembleia de compartes, para o dia dois do próximo mês de Março”, a qual teria a seguinte ordem de trabalhos:

1. Análise da nova lei dos baldios;

2. Eleição dos órgãos de administração (mesa da assembleia de compartes, conselho diretivo e comissão de fiscalização); e

3. Análise e aprovação definitiva do caderno de recenseamento de compartes elaborado pela Junta de Freguesia. (artigo 77º da contestação da 2ª Ré e 78º da 1ª Ré)

123. Em face desta deliberação, em 17 de Fevereiro de 2009 a Junta de Freguesia de Santa Maria convocou, para o dia 02 de Março de 2009, todos os compartes constantes do caderno de recenseamento para reunião a ter lugar na sua sede. (artigo 78º da contestação da 2ª Ré e 79º da 1ª Ré)

124. Na data agendada para a reunião, não se tendo reunido o quórum exigido, entendeu a comissão ad hoc solicitar, novamente, a colaboração da Junta de Freguesia de Santa Maria para que fosse efectuada uma segunda convocatória da Assembleia de Compartes, desta feita para o dia 12 de Março de 2009, que teria lugar na sede da Junta, com a mesma ordem de trabalhos, decorrendo a mesma com qualquer número de compartes presentes. (artigo 79º da contestação da 2ª Ré e 81º da 1ª Ré)

125. Chegados ao dia 12 de Março de 2009, teve lugar a reunião da Assembleia de Compartes, na qual foi elaborada e submetida a votação a lista (única) para os órgãos de administração dos baldios, tendo a mesma sido eleita por unanimidade dos presentes. (artigo 80º da contestação da 2ª Ré)

126. De igual modo, como resulta da acta, finda a discussão da ordem de trabalhos, foi apresentada uma proposta pelo conselho diretivo então eleito: “no sentido de ser cedida a exploração do Baldio da Serra do Pisco, sob a forma de contrato de cessão de exploração, para instalação de um parque eólico e de, para tal fim serem delegados, na Junta de Freguesia, poderes necessários (…) deixando à assembleia de compartes formalizar os termos e condições, bem como os direitos e deveres inerentes ao exercício dos poderes delegados”. (artigo 81º da contestação da 2ª Ré e 87º da 1ª Ré)

127. Prossegue esta mesma Ata, referindo que:

Apresentada tal proposta foi a mesma aceite pela mesa da assembleia de compartes, que decidiu, de imediato pô-la à consideração dos compartes presentes a fim de ser discutida e analisada.

Discutida e analisada a referida proposta pela Assembleia de Compartes, ficou por unanimidade decidido, delegar na Junta de Freguesia de Santa Maria os poderes necessários à boa administração dos baldios na área da Freguesia (…) devendo a Junta de Freguesia na administração dos poderes que ora lhe foram delegados, observar e cumprir as normas contidas na Lei dos Baldios e demais legislação em vigor respeitante aos mesmos, podendo, desde já, celebrar contrato de cessão de exploração para instalação de um parque eólico no Baldio da Serra do Pisco”. (artigo 82º da contestação da 2ª Ré e 4º e 88º da contestação da 1ª Ré)

128. Posteriormente, foi agendada nova reunião para o dia 27 de Abril de 2009, pelas 20.00 horas, na sede da Junta de Freguesia de Santa Maria, por convocatória datada de 19 de Abril de 2009, a qual tinha a seguinte ordem de trabalhos:

1. Informações;

2. Ratificação das deliberações tomadas sobre os pontos 2 e 3 da Ordem de Trabalhos da Assembleia de Compartes do dia 12 de março de 2009;

3. Análise, discussão e votação de delegação de competência a favor da Junta de Freguesia de Santa Maria e em concreto do baldio da Serra do Pisco, com poderes para assinar o contrato de cessão de exploração com a empresa D..., S.A., para produção de energia eólica, com consequente ratificação da celebração do contrato subscrito para esse efeito pela Junta de Freguesia de Santa Maria em 1 de abril de 2009;

4. Proposta do Conselho Diretivo para atualização do Caderno de Recenseamento dos Compartes. (artigo 83º da contestação da 2ª Ré)

129. Chegados à data agendada, verificou-se a impossibilidade de validamente delibera por falta de quórum, pelo que foi, desde logo, agendada para o dia 2 de Maio de 2009 pelo Vice-Presidente (por renúncia ao cargo do Presidente) uma nova reunião da Assembleia de Compartes. (artigo 84º da contestação da 2ª Ré e 91º da contestação da 1ª Ré)

130. No dia 02 de Maio de 2009, estando verificadas as condições necessárias, reuniu a Assembleia de Compartes com a ordem de trabalhos constante da convocatória datada de 19 de Abril de 2009. (artigo 85º da contestação da 2ª Ré)

131. Quanto ao vertido no ponto 2 da ordem de trabalhos, consta da acta desta reunião que:

“(…) Após aquelas explicações e não tendo os presentes levantado objeções à ratificação, o presidente da mesa colocou à votação pelos presentes este ponto, que de braço levantado por maioria com duas abstenções, aprovaram a ratificação das deliberações tomadas sobre os pontos dois e três da Ordem de Trabalhos da Assembleia de Compartes do dia doze de março de dois mil e nove”. (artigo 86º da contestação da 2ª Ré)

132. De salientar, ainda, a deliberação quanto ao ponto 4 da ordem de trabalhos:

“(…) O presidente do conselho diretivo esclareceu então que grande parte dos nomes inscritos no caderno de recenseamento não são de facto compartes pois não usufruem dos baldios de acordo com os usos e costumes de utilização dos baldios desde o tempo dos seus pais e avós, ou seja, desde tempos imemoriais, propondo assim que o caderno deveria conter apenas os nomes de todos os que por exercerem atividade e são moradores nas localidades rurais da freguesia de Santa Maria. Após estas explicações (…), a mesa colocou à aprovação este novo caderno que os presentes de braço levantado e por unanimidade o aprovaram, ficando assim o caderno de recenseamento dos compartes dos baldios da freguesia de Santa Maria a conter duzentos e setenta nomes de compartes do baldio”. (artigo 87º da contestação da 2ª Ré e 95º da 1ª Ré)

133. Da referida convocatória constou como ponto 3 da ordem de trabalhos, o seguinte:

Análise, discussão e votação de delegação de poderes a favor da Junta de Freguesia de Santa Maria e em concreto do baldio da Serra do Pisco, com poderes para assinar o contrato de cessão de exploração com a empresa D..., S.A, para produção de energia eólica, com a consequente ratificação da celebração do contrato subscrito para este efeito pela Junta de Freguesia de Santa Maria em 1 de Abril de 2009”. (artigo 93º da contestação da 1ª Ré)

134. Ficou deliberado o seguinte:

sobre o ponto três da ordem de trabalhos o presidente da mesa colocou do mesmo modo aos presentes a rectificação (pretendeu-se dizer ractificação tal como consta na convocatória) da deliberação tomada nas reuniões anteriores, bem como do acto de assinatura de contrato que a Junta de Freguesia realizou em um de Abril do ano de dois mil e nove.

Após a mesa explicar que as deliberações, tal como no ponto anterior, decorreram da vontade expressa dos presentes, o que foi de facto redigido não espelha e respeita fielmente a deliberação que publicamente e de boa fé todos praticaram, a mesa colocou à consideração dos presentes a possibilidade de intervir sobre este ponto, não tendo sido solicitado nenhum esclarecimento ou informação adicional, a mesa colocou à votação este ponto que os presentes de braço levantado e por unanimidade o aprovaram rectificando (pretendeu-se dizer, uma vez mais, ractificando) a decisão de delegar poderes na Junta de Freguesia de Santa Maria para praticar os actos que decorrem deste ponto.” (artigo 94º da contestação da 1ª Ré)

135. Desde a reunião de 02 de Maio de .2009, os baldios de Santa Maria passaram a ter o seu recenseamento de compartes atualizado. (artigo 88º da contestação da 2ª Ré e 96º da contestação da 1ª Ré)

136. Recenseamento este que tem vindo a ser atualizado, tendo sido a última atualização conhecida pela Sociedade Ré datada de abril de 2015, aquando da eleição dos órgãos de gestão dos baldios que teve lugar em 11 de Abril de 2015. (artigo 89º da contestação da 2ª Ré e 96º da contestação da 1ª Ré)

137. Os baldios de Santa Maria e, mais concretamente, o Conselho Directivo dos Baldios de Santa Maria - Trancoso, encontram-se inscritos no Registo Nacional de Pessoas Coletivas, desde 17 de Junho de 2009. (artigo 90º da contestação da 2ª Ré e artigo 97º da contestação da 1ª Ré)

138. À data em que a sociedade D... manifestou o seu interesse em explorar os baldios, não se encontrava constituída qualquer assembleia de compartes. (artigo 93º da contestação da 2ª Ré)

139. Tendo-se dirigido esta sociedade à Junta de Freguesia de Santa Maria -, entidade que espoletou a constituição da Assembleia de Compartes de Santa Maria. (artigo 94º da contestação da 2ª Ré)

140. Foi a Junta de Freguesia que publicou os editais nos “locais de estilo”. (artigo 95º da contestação da 2ª Ré)

141. Tendo sido o Presidente de Junta de Freguesia que, num primeiro momento, conduziu os trabalhos. (artigo 96º da contestação da 2ª Ré)

142. O levantamento topográfico encomendado à sociedade C... tinha em vista “uma eventual e posterior contratualização com entidades terceiras da exploração do Baldio da Serra do Pisco”. (artigo 135º da contestação da 2ª Ré)

143. Em Abril de 2015 já se encontrava em plena execução os trabalhos de construção do Parque Eólico. (artigo 143º da contestação da 2ª Ré)

144. Pelo e-mail do então representante da Sociedade Ré, o Sr. AA, datado de 22 de Agosto de 2014 e endereçado ao Presidente da Mesa da Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco, deu-lhe a conhecer o propósito da instalação do Parque Eólico por si gerido. (artigo 145º da contestação da 2ª Ré)

145. No seguimento deste e-mail, o Conselho Directivo da Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco, na reunião celebrada em 24 de Outubro de 2014, deliberou:

No que concerne ao ponto um da ordem de trabalhos (…), depois de reuniões anteriores efetuadas com os restantes compartes, desta Assembleia, (…) o Conselho Directivo autoriza assim o corte das árvores localizadas na área onde se prevê instalar as infraestruturas que dizem parte ao Parque Eólico do Pisco”. (artigo 146º da contestação da 2ª Ré)

146. O envio do email junto a fls. 47/verso, resulta das questões suscitadas no Ofício recebido por parte do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, datado de 10 de Julho de 2014, no qual esta entidade referia que:

1 - Os baldios de Sana Maria são administrados transitoriamente pelo ICNF, visto existirem dois órgãos que reclamam a gestão do baldio – Associação de compartes do baldio de Santa Maria e Associação de compartes do baldio da Serra do Pisco.

2 – Desconhece-se até à data que tenha existido qualquer acordo entre estas associações ou que tenha existido qualquer deliberação legal pelos tribunais competentes sobre a administração do baldio.” (artigo 156º da contestação da 2ª Ré)

147. Perante este Ofício a Sociedade Ré dirigiu-se à Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco, em ordem a tentar desbloquear o seu problema, naquela data - a necessidade de autorização para efetuar o corte de arvoredo. (artigo 157º da contestação da 2ª Ré)

148. A 2º Ré considerava, tal como era a D..., que o Contrato junto a fls. 43/verso a 45 foi valida e eficazmente celebrado com a entidade que, por delegação de poderes, tinha a gestão dos terrenos baldios onde se encontra instalado o Parque Eólico, (artigo 159º da contestação da 2ª Ré)

149. Não sendo, pois, necessário qualquer consentimento ou autorização por parte da comunidade local representada em juízo pela 1ª Autora. (artigo 160º da contestação da 2ª Ré)

150. A 2.ª Ré que nunca aceitou os putativos direitos de exploração de que se arrogava titular a sociedade C... provenientes da celebração do Contrato junto a fls. 39 a 41. (artigo 162º da contestação da 2ª Ré)

151. A 1ª Autora, pelo menos, até Outubro de 2015, nunca actuou, nem junto da sociedade D..., nem da 2.ª Ré, como se tal instalação estivesse a ser erigida em terrenos sobre os quais se arroga titular. (artigo 167º da contestação da 2ª Ré)

152. Nunca solicitou qualquer compensação pecuniária pela instalação do Parque Eólico até à presente demanda. (artigo 168º da contestação da 2ª Ré)

153. Entre o SIRESP e a comunidade local representada pela 1ª Autora nunca foi celebrado qualquer protocolo. (artigo 179º da contestação da 2ª Ré)

154. Na presente data a 2ª Ré tem um parque eólico construído e em perfeito funcionamento nos baldios aqui em disputa: o Parque Eólico do Pisco. (artigo 206º da contestação da 2ª Ré)

155. À data da celebração do Contrato entre a 1ª Autora e a sociedade C... (ou seja, 15 de Abril de 2015), os trabalhos já se encontravam em execução. (artigo 207º da contestação da 2ª Ré)

156. A construção do Parque Eólico do Pisco iniciou-se no último trimestre de 2014 (entre novembro e dezembro de 2014), (artigo 208º da contestação da 2ª Ré)

157. A construção do Parque Eólico terminou em Outubro de 2015, tendo-se iniciado a sua exploração nesse mesmo mês. (artigo 210º da contestação da 2ª Ré)

158. Foi celebrado um Contrato de Compra de Energia Elétrica a Produtores em Regimes Especial, celebrado entre a 2.ª Ré a EDP Serviço Universal, S.A., do qual resulta o efectivo fornecimento de energia elétrica à rede, conforme resulta do teor do n.º 2 da Cláusula 1.ª e da Cláusula 2.ª. (artigos 211º e 212º da contestação da 2ª Ré)

159. A energia ativa fornecida à rede elétrica, a denominada “Energia Activa Horária Fornecida [MWh]” correspondeu à seguinte, nos meses de outubro e novembro de 2015:

- Outubro de 2015: a energia fornecida à rede correspondeu a 1694,52 MWh;

- Novembro de 2015: a energia fornecida à rede correspondeu a 6897,27 MWh. (artigo 213º da contestação da 2ª Ré)

160. A tarifa aplicável à instalação do Parque Eólico do Pisco corresponde a € 74 / MWh. (artigo 214º da contestação da 2ª Ré)

161. De acordo com o disposto na Cláusula 9.ª do Contrato “A faturação da energia entregue pelo Produtor será efetuada nos termos legais em vigor e de acordo com o sistema de remuneração aplicável, em conformidade com a «Licença de Produção» mencionada na Cláusula 1.ª” (artigo 215º da contestação da 2ª Ré)

162. A valorização da energia fornecida à rede é feita pela multiplicação do seu valor total pelo preço unitário em vigor para este projeto: € 74 / MWh), (artigo 216º da contestação da 2ª Ré)

163. A produção diária é de € 15.510,00 correspondente a 1694,52 MWh + 6897,27 MWh = 8591,79 MWh; 8591,79 MWh x € 74 / MWh = € 635.793,00. (artigo 217º da contestação da 2ª Ré)

164. Para além do valor gerado pela implementação do Parque Eólico, o desmantelamento do Parque causaria prejuízos de proporções muito superiores. (artigo 218º da contestação da 2ª Ré)

165. O prejuízo seria equivalente ao custo do investimento efectuado no projecto no seu todo, o que se estima em € 60.000.000,00. (artigo 219º da contestação da 2ª Ré)

166. Circunscrevendo, apenas, os prejuízos ao valor dos aerogeradores localizados nos baldios da Serra do Pisco, os prejuízos seriam de cerca de 10% daquele valor, ou seja, de € 6.000.000,00. (artigo 220º da contestação da 2ª Ré)

167. Porque a subestação elétrica também está no baldio e que sem subestação o Parque Eólico não funciona, o prejuízo é de € 60.000.000,00. (artigo 221º da contestação da 2ª Ré)

168. Se for desmantelado o Parque Eólico, na esfera jurídica da 1ª Autora e, certamente, nas esferas jurídicas da Assembleia de Compartes de Santa Maria - Trancoso e da 1.ª Ré, nascerá uma obrigação de indemnização por valor de € 60.000.000,00. (artigo 228º da contestação da 2ª Ré)

169. A deliberação da Assembleia de Compartes de Santa Maria de 12 de Março de 2009 foi ractificada em reunião da Assembleia de Compartes de Santa Maria em 2 de Maio de 2009. (artigo 5º da contestação da 1ª Ré)

170. O processo de constituição da Assembleia de Compartes de Santa Maria teve inicio em momento anterior ao processo de constituição da Assembleia de Compartes de Serra do Pisco. (artigo 9º da contestação da 1ª Ré)

171. E, constituídos os seus órgãos representativos, delegou poderes na Junta de Freguesia de Santa Maria os poderes necessários à boa administração dos baldios na área da freguesia. (artigo 10º da contestação da 1ª Ré)

172. A área do baldio da Serra do Pisco cuja posse, exploração e administração é reclamada pela 1.ª Autora está incluída na área do baldio gerido pela Assembleia de Compartes de Santa Maria. (artigo 11º da contestação da 1ª Ré)

173. O parque eólico da Serra do Pisco, objecto do contrato de cessão de exploração entre a 1.ª Ré e a sociedade D... S.A., cuja posição contratual foi cedida para a 2.ª Ré, encontra-se implantado em terreno reclamado por ambas as Assembleias de Compartes. (artigo 12º da contestação da 1ª Ré)

174. Os terrenos baldios da Serra do Pisco também se situam junto do Boco. (artigo 23º da contestação da 1ª Ré)

175. O Baldio da Serra do Pisco tem uma área de aproximadamente 491 hectares. (artigo 24º da contestação da 1ª Ré)

176. Situa-se na freguesia de Santa Maria, concelho de Trancoso, a poente das povoações de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo. (artigo 25º da contestação da 1ª Ré)

177. As confrontações desse Baldio são as seguintes:

- Poente: Limite do concelho de Aguiar da Beira;

- Nascente: Prédios rústicos particulares inseridos nos limites da União freguesia Trancoso e Souto Maior, mais concretamente entre as localidades de Venda do Cepo e Boco.

- Sul: Estrada florestal n.º 1043, caminhos públicos e limite do concelho de Fornos de Algodres;

- Norte: Prédios rústicos particulares inseridos nos limites da freguesia de Rio de Mel, concelho de Trancoso e prédios rústicos particulares inseridos nos limites da União de freguesia Trancoso e Souto Maior, mais concretamente entre a localidade do Boco e lugar de Moita da Cabra. (artigo 26º da contestação da 1ª Ré)

178. É composto predominantemente por pinhais e árvores de outras espécies, entretanto integralmente ardidos em Outubro de 2017, pastagens, terra de mato, terra de cultivo e afloramentos rochosos. (artigo 27º da contestação da 1ª Ré)

179. Tratando-se de uma mancha de terreno contínua, em conformidade com a configuração que resulta da planta junta a fls. 199, sem quaisquer divisões ou demarcações no seu interior. (artigo 29º da contestação da 1ª Ré)

180. Configura-se ainda como uma serra com uma altitude máxima de 989 metros a partir do nível do mar. (artigo 30º da contestação da 1ª Ré)

181. O terreno onde foi implantado o parque eólico da Serra do pisco pela 2.ª Ré tinha uma área de 115 hectares à data da celebração do contrato de cessão de exploração com a 1.ª Ré. (artigo 31º da contestação da 1ª Ré)

182. Área que, entretanto, foi reduzida para 23,5 ha por aditamento ao contrato de cessão de exploração. (artigo 32º da contestação da 1ª Ré)

183. E situa-se na cumeada do Baldio da Serra do Pisco. (artigo 33º da contestação da 1ª Ré)

184. Existiam casas habitadas na aldeia do Boco com maior proximidade ao baldio da Serra do Pisco do que as casas na aldeia de Venda do Cepo. (artigo 36º da contestação da 1ª Ré)

185. Os aldeões da Venda do Cepo cortaram e recolheram lenha/madeira das árvores existentes nos terrenos do baldio da Serra do Pisco. (artigo 37º da contestação da 1ª Ré)

186. Aldeões dos Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão cortaram e recolheram lenha/madeira das árvores existentes nos terrenos do baldio da Serra do Pisco. (artigo 38º da contestação da 1ª Ré)

187. Os aldeões da Venda do Cepo sempre levaram animais para pastar, cultivavam produtos agrícolas, em especial centeio, bem como extraíam carvão que depois revendiam em Trancoso. (artigo 39º da contestação da 1ª Ré)

188. Aldeões dos Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão levaram animais para pastar, bem como extraíam carvão que depois revendiam em Trancoso. (artigo 40º da contestação da 1ª Ré)

189. No ano de 1953 os terrenos baldios da Serra do Pisco foram submetidos ao regime florestal. (artigo 48º da contestação da 1ª Ré)

190. A então Direcção Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas comunicou ao Município de Trancoso a vontade de proceder à arborização dos terrenos baldios situados, entre outras freguesias e concelhos, na freguesia de Santa Maria, onde se situa o Baldio da Serra do Pisco administrado pela Assembleia de Compartes de Santa Maria com a composição, área, limites e configuração alegados nos artigos 24.º a 30.º e doc. n.º 1 e 2 da presente contestação. (artigo 49º da contestação da 1ª Ré)

191. O Município de Trancoso colocou então editais e designou para o dia 23 de Agosto de 1953 um inquérito para “ conhecer os usos, costumes e regalias e regalias dos povos, relativamente ao trânsito, aproveitamento de águas, fruição de pastagens, utilização de lenhas, madeiras ou outros produtos florestais e exploração de minerais dos terrenos a arborizar; - e da forma de promover, tanto quanto possível, a conciliação destes interesses com o interesse geral da arborização, ficando assim convidados os interessados nesta arborização a comparecem no dia, hora e local acima indicados.”. (artigo 50º da contestação da 1ª Ré)

192. Mais notificou o então regedor da freguesia de Santa Maria e o Presidente da Junta de Santa Maria para colocar os referidos editais no local público do costume e comparecerem à reunião. (artigo 51º da contestação da 1ª Ré)

193. E mandou notificar o Pároco da Vila de Trancoso para o edital “ser lido durante a celebração das missas que precederem o citado dia, nesta vila de Trancoso e nas povoações de Miguel Choco, venda do Cepo e Rio de Moinhos, freguesia de Santa Maria.” (artigo 52º da contestação da 1ª Ré)

194. Os habitantes das aldeias do Boco e Sintrão frequentavam a missa nas aldeias de Miguel Choco, Venda do Cepo e Rio de Moinhos, porque não existia igreja ou capela nas localidades. (artigo 53º da contestação da 1ª Ré)

195. Enquanto que os habitantes da Aldeia de Montes apenas tinham missa muito ocasionalmente na sua localidade, frequentando regularmente a missa na aldeia de Miguel Choco, Venda do Cepo e Rio de Moinhos. (artigo 54º da contestação da 1ª Ré)

196. O Município de Trancoso solicitou ao pároco que o edital fosse lido nas aldeias de Miguel Choco, Venda do Cepo e Rio de Moinhos. (artigo 55º da contestação da 1ª Ré)

197. O então Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria, TT, acompanhado do mandatário signatário, estiveram presentes na reunião de 23 de Fevereiro de 2009. (artigo 60º da contestação da 1ª Ré)

198. A iniciativa para constituir a 1.ª Autora partiu de CC. (artigo 61º da contestação da 1ª Ré)

199. A presença do então Presidente da Junta e do mandatário signatário teve como único objectivo demover o referido CC de avançar com a constituição da 1.ª Autora. (artigo 62º da contestação da 1ª Ré)

200. O processo formal de constituição da Assembleia de Compartes de Santa Maria teve inicio em data anterior ao processo de constituição da Assembleia de Compartes da Serra do Pisco. (artigo 66º da contestação da 1ª Ré)

201. No ano de 2008, a 1.ª Ré foi contactada pela sociedade D... S.A. sobre a possibilidade de instalação de um parque eólico situada no Baldio da Serra do Pisco, mais concretamente na sua cumeada. (artigo 67º da contestação da 1ª Ré)

202. E, desde logo, foi convocada uma reunião de interessados, na sede da Junta, para o dia 16 de Fevereiro, com a finalidade de ser constituída uma comissão de compartes ad hoc, para efeito de aprovação do caderno de recenseamento. (artigo 73º da contestação da 1ª Ré)

203. Na reunião de 16 de Fevereiro de 2009 da comissão ad hoc de Compartes dos Baldios de Santa Maria, dos 23 compartes, 3 eram residentes em Venda do Cepo (ZZ, III e BBB) e assinaram, em conjunto com os restantes, a acta de 16 de Fevereiro de 2009. (artigo 75º da contestação da 1ª Ré)

204. Nesta reunião, embora não tivesse assinado a acta, esteve presente CC, alegado representante da Comissão Ad Hoc dos Baldios de Venda do Cepo (depois denominada Serra do Pisco) e alegado presidente da mesa eleito na reunião de 03 de Março de 2009. (artigo 76º da contestação da 1ª Ré)

205. A convocatória para a reunião de 16 de Fevereiro de 2019 foi efectuada através de edital afixado, na sede da Junta, bem como nos locais destinados à afixação de editais nas aldeias de Montes, Boco, Castaíde, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e, inclusive, Venda do Cepo. (artigo 80º da contestação da 1ª Ré)

206. A 2.ª convocatória foi efectuada através de edital afixado, na sede da Junta, bem como nos locais destinados à afixação de editais nas aldeias de Montes, Boco, Castaíde, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e, inclusive, Venda do Cepo. (artigo 84º da contestação da 1ª Ré)

207. No dia 12 de Março de 2009, pelas 20.00 horas, teve, então, lugar a reunião da assembleia de compartes de Santa Maria, na qual foram eleitos os órgãos de administração do baldio, mesa da Assembleia de Compartes, Conselho Directivo e Comissão de Fiscalização e foram distribuídos os vários cargos da mesa ad hoc da Assembleia de Compartes da seguinte forma:

- Presidente: MM;

- Como vice-Presidente: JJJ; e

- Como secretário os senhores: KKK e LLL. (artigos 82º e 85º da contestação da 1ª Ré)

208. Mais foi aprovado definitivamente o caderno de recenseamentos de compartes dos Baldios, elaborado pela Junta de Freguesia. (artigo 86º da contestação da 1ª Ré)

209. Após, em 19 de Abril de 2009, o presidente eleito da mesa da Assembleia de Compartes de Santa Maria convocou para o dia 27 de Abril de 2009, pelas 20.00 horas, todos os compartes dos Baldios de Santa Maria, onde se inclui o Baldio da Serra do Pisco, constantes do caderno de recenseamento. (artigo 89º da contestação da 1ª Ré)

210. A referida convocatória foi efectuada através de edital afixado, na sede da Junta, bem como nos locais destinados à afixação de editais nas aldeias de Montes, Boco, Castaíde, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e, inclusive, Venda do Cepo. (artigo 90º da contestação da 1ª Ré)

211. A convocatória para o dia 2 de Maio de 2009, foi efectuada através de edital afixado, na sede da Junta, bem como nos locais destinados à afixação de editais nas aldeias de Montes, Boco, Castaíde, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e, inclusive, Venda do Cepo. (artigo 92º da contestação da 1ª Ré)

212. Do caderno de recenseamento da Assembleia de Compartes de Santa Maria constam actualmente 267 compartes provenientes das comunidades de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão, Venda do Cepo e Castaíde. (artigo 98º da contestação da 1ª Ré)

213. O caderno de recenseamento da Assembleia de Compartes de Santa Maria inclui os compartes de Venda do Cepo que usufruem do Baldio da Serra do Pisco. (artigo 99º da contestação da 1ª Ré)

214. Já o caderno de recenseamento da Assembleia de Compartes da Serra do Pisco, aqui 1.ª Autores apenas constam os compartes da comunidade local de Venda do Cepo, pelo que não constam os compartes de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão. (artigo 100º da contestação da 1ª Ré)

215. O edital da Junta de Freguesia de Santa Maria para aprovação do recenseamento provisório data de 05 de Fevereiro de 2009 e a primeira assembleia de compartes para constituição da mesa ad hoc, nos termos do disposto no artigo 33.º da Lei n.º 68/93, de 04 de Setembro, ocorreu no dia 16 de Fevereiro de 2009. (artigo 102º da contestação da 1ª Ré)

216. O edital para aprovação do caderno de Recenseamento da 1.ª Autora tem data de 23 de Fevereiro de 2009 e a constituição da mesa ad hoc da Assembleia de Compartes dos baldios da Venda do Cepo ocorreu no dia 03 de Março de 2009. (artigo 103º da contestação da 1ª Ré)

217. Constituída a Assembleia de Compartes de Santa Maria, por carta datada de 19 de Maio de 2009, o presidente do seu Conselho Directivo, MM, informou a Autoridade Florestal Nacional desse facto. (artigo 104º da contestação da 1ª Ré)

218. Mais informou que havia sido delegada na 1.ª Ré “a assinatura de cessação (pretendendo dizer-se cessão) de contrato para exploração de energia eólica, a instalar na Serra do Pisco”. (artigo 105º da contestação da 1ª Ré)

219. Respondeu a Autoridade Florestal Nacional (AFN) solicitando o envio de documentos comprovativos da constituição dos órgãos Directivos dos Compartes de Santa Maria e informando que a cessão de exploração dos baldios, decorre nos termos do n.º 4 do artigo 10.º do diploma. (artigo 106º da contestação da 1ª Ré)

220. Mais alertou que “Existindo uma Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco, com sede na Venda do Cepo, 6420-579 Trancoso, que abarca a mesma área referida no oficio de V. Exa., recomenda-se que efectuar contactos com a mesma no sentido de acordar a área a gerir”. (artigo 107º da contestação da 1ª Ré)

221. Em conformidade, por carta datada de 05 de Junho de 2009, o presidente do seu Conselho Directivo enviou à AFN os documentos solicitados. (artigo 108º da contestação da 1ª Ré)

222. Por carta datada de 03 de Setembro de 2010, o Conselho Directivo da Assembleia de Compartes de Santa Maria apresentou uma exposição à AFN sobre a forma de constituição da Assembleia de Compartes da Serra do Pisco e irregularidades detectadas que não obteve resposta. (artigo 109º da contestação da 1ª Ré)

223. Por carta datada de 15 de Setembro de 2010, a AFN volta a solicitar a documentação que esteve na base da constituição da Assembleia de Compartes de Santa Maria, ao que esta responde que já foi enviada em Junho de 2009. (artigo 110º da contestação da 1ª Ré)

224. Finalmente, por carta datada de 11 de Outubro de 2010, a AFN informa que eventuais receitas que venham ser geradas a partir desta data no baldio da Serra do Pisco ficarão retidas até que se verifique um absoluto entendimento entres as partes envolvidas. (artigo 111º da contestação da 1ª Ré)

225. Desde a sua constituição a Assembleia de Compartes de Santa Maria tem funcionado regularmente, sendo sido convocadas as respectivas reuniões. (artigo 112º da contestação da 1ª Ré)

226. A 1.ª Ré, representado pelo Presidente da Junta de Freguesia, vai sempre às reuniões da Assembleia de Compartes de Santa Maria, onde apresenta as receitas resultantes do contrato de exploração. (artigo 113º da contestação da 1ª Ré)

227. Receitas estas que são aplicadas na execução de diversas obras, nomeadamente calçadas, limpeza de aquedutos e arranjo de caminhos nas localidades de Boco, Montes, Rio de Moinhos, Miguel Choco, Sintrão e Venda do Cepo. (artigo 114º da contestação da 1ª Ré)

228. CC é irmão da presidente do seu Conselho Directivo, LL. (artigo 122º da contestação da 1ª Ré)

229. No dia 01 de Julho de 2009, a Presidente do Conselho Directivo da 1.ª Autora, LL e o Presidente do Conselho Directivo de Assembleia de Compartes de

Santa Maria trocaram fotocópias dos respectivos processos de constituição das suas Assembleias de Compartes. (artigo 124º da contestação da 1ª Ré)

230. No dia 24 de Março de 2011, teve lugar na Câmara Municipal de Trancoso, uma reunião onde estiveram presentes o Presidente da Câmara e dois vereadores, o presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria, TT, O eng. G... da empresa D... S.A., MM presidente do Conselho Directivo da Assembleia de Compartes de Santa Maria e CC, presidente da mesa da 1.ª Autora. (artigo 126º da contestação da 1ª Ré)

231. A reunião destinou-se a tentar obter um entendimento entre a Assembleia de Compartes de Santa Maria e a Assembleia de Compartes da Serra do Pisco, aqui 1.ª Autora dado o diferendo que os separa sobre a gestão e exploração do Baldio da Serra do Pisco. (artigo 127º da contestação da 1ª Ré)

232. Entre outros assuntos, foi discutido nessa reunião o valor oferecido pela sociedade D... para a instalação de 3 torres eólicas com vista à produção de 13,5 mw, não tendo sido possível a obtenção de um acordo. (artigo 128º da contestação da 1ª Ré)

233. O contrato celebrado em 15 de Abril de 2015, foi celebrado sabendo que o terreno onde a C... Lda., pretendia instalar o seu parque eólico coincidia com o terreno onde a 2.ª Ré veio a instalar o seu parque. (artigo 133º da contestação da 1ª Ré)

234. Foi ao abrigo das referidas deliberações que a 1.ª Ré celebrou com a sociedade D... S.A o contrato de cessão de exploração para a exploração de parte do terreno baldio da Serra do Pisco. (artigos 6º e 135º da contestação da 1ª Ré)

235. No dia 14 de Janeiro de 2013, a sociedade D... S.A. cedeu para a 2.ª Ré a sua posição contratual no aludido contrato de cessão de exploração, tendo para o efeito notificado a 1.ª Ré. (artigos 7º e 136º da contestação da 1ª Ré)

236. Mais ficou a constar no Considerando (C) “Que a Junta de Freguesia tem a seu cargo a administração do prédio rústico sito em Serra do Pisco, na freguesia de Santa Maria, concelho de Trancoso, não inscrito na matriz predial rústica, o que é baldio””. (artigo 139º da contestação da 1ª Ré)

237. Consta do email de fls. 47/verso: “o conselho directivo autoriza o corte das árvores localizadas na área onde se prevê instalar as infraestruturas que dizem parte ao Parque Eólico do Pisco.” (artigo 143º da contestação da 1ª Ré)

238. Também no Considerando (b) do documento de fls. 49, ficou a constar “Que, para efeitos da instalação do parque eólico, é necessário proceder ao corte das árvores que estão localizadas na área onde se prevê proceder à instalação das infraestruturas projectadas (aerogeradores, acessos, subestação eléctrica e linha eléctricas) que são necessárias para a concretização do referido parque eólico (doravante designada como a” Área”. (artigo 144º da contestação da 1ª Ré)

239. E ainda, no seu ponto 2.: “Autorizar o abate do arvoredo no baldio que tem sob a sua gestão e que esteja localizado na área, e que comprovadamente se vier a verificar ser necessário para a instalação do parque eólico “. (artigo 145º da contestação da 1ª Ré)

240. O caderno de recenseamento da 1.ª Autora foi aprovado na reunião de 12 de Março de 2009. (artigo 152º da contestação da 1ª Ré)

241. Constam 28 assinaturas dos compartes, quando no recenseamento constam 58 compartes. (artigo 156º da contestação da 1ª Ré)

242. Na reunião de 12 de Março de 2009 constam 22 assinaturas dos compartes, quando no recenseamento constam 58 compartes. (artigo 158º da contestação da 1ª Ré)

243. A aldeia da Venda do Cepo é a povoação que mais próxima se encontra dos terrenos do Baldio da Serra do Pisco. (artigo 7º da Réplica)

244. A outra povoação mais próxima dos referidos terrenos é Boco. (artigo 8º da Réplica)

245. Mas como a 1ª Ré sabe, no Boco não há actualmente habitantes ou residentes permanentes. (artigo 9º da Réplica)

246. Pelo que o Boco nunca poderia possuir e gerir os Baldios da Serra do Pisco. (artigo 10º da Réplica)

247. A aldeia de Venda do Cepo está, como sempre esteve, encostada aos Baldios da Serra do Pisco. (artigo 11º da Réplica)

248. A aldeia de Venda do Cepo é a única povoação contígua aos mencionados Baldios. (artigo 12º da Réplica)

249. Todas as demais povoações a que a 1ª Ré alude, se situam mais afastadas dos referidos terrenos baldios. (artigo 13º da Réplica)

250. Os Baldios da Serra do Pisco se situam na freguesia de Santa Maria, concelho de Trancoso – assim como outros que, tanto quanto se julga saber, não são geridos, explorados ou administrados pela 1ª Ré, nomeadamente Castaíde. (artigo 20º da Réplica)

251. A Sul/Sudoeste confronta igualmente com terrenos particulares de residentes na Venda do Cepo. (artigo 22º da Réplica)

252. Se alguns habitantes das outras comunidades locais se deslocaram e utilizaram os terrenos baldios fizeram-no apenas porque tinham relações familiares ou ligações aos habitantes da Venda do Cepo e estes não se opunham, naturalmente, a que tal acontecesse. (artigo 26º da Réplica)

253. O Boco não sequer tinha autonomia em relação à Venda do Cepo, sendo no cemitério desta que os seus habitantes eram enterrados. (artigo 27º da Réplica)

254. Os Baldios da Serra do Pisco foram historicamente possuídos geridos e explorados com carácter de regularidade, continuidade, frequência e permanência, pelos habitantes da comunidade local da Venda do Cepo, por oposição aos demais habitantes das restantes povoações, maxime aquelas que a 1ª Ré identifica, que nunca os possuíram e geriram, e se alguns desses habitantes os exploraram fizeram-no apenas pelas ligações que mantinham aos habitantes da Venda do Cepo ou de forma pontual e ocasional, portanto não continuada no tempo. (artigo 29º da Réplica)

255. As únicas povoações contíguas aos Baldios da Serra do Pisco são Venda do Cepo e Boco, e esta última nunca teve autonomia relativamente a Venda do Cepo, foi sempre habitada por familiares de habitantes desta aldeia e, presentemente, não tem residentes. (artigo 30º da Réplica)

256. A aldeia da Venda do Cepo está, como sempre esteve, mais próxima dos terrenos Baldios da Serra do Pisco do que as aldeias dos Montes, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão, não só em função da distância, como também em função da acessibilidade. (artigo 35º da Réplica)

257. Como a 1ª Ré bem sabe, as aldeias de Montes, Rio de Moinhos e Sintrão – ficam para lá do Rio Távora, o que não acontece com Venda do Cepo. (artigo 36º da Réplica)

258. Entre as referidas aldeias/povoações que não Venda do Cepo, e os Baldios da Serra do Pisco há um rio que impedia o acesso aos mesmos, principalmente de inverno com a subida das águas e apenas recentemente foram construídas pontes sobre o mesmo para a passagem dos habitantes de Montes. (artigo 37º da Réplica)

259. Os habitantes das referidas povoações estavam, como sempre estiveram, naturalmente, pela geografia da própria zona, “afastadas” dos Baldios da Serra do Pisco, contrariamente ao que acontece, como sempre aconteceu, com a aldeia de Venda do Cepo. (artigo 38º da Réplica)

260. Os habitantes de Miguel Choco não necessitam de atravessar o rio, mas tais habitantes teriam de passar sempre por terrenos da Venda do Cepo para chegar aos Baldios da Serra do Pisco. (artigo 39º da Réplica)

261. Os habitantes de Montes, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão nunca possuíram, geriram ou usufruíram dos Baldios da Serra do Pisco, de acordo com os usos e costumes de utilização dos mesmos desde tempos imemoriais, também porque havia terrenos baldios mais perto das respectivas aldeias, esses sim explorados pelos seus habitantes. (artigo 40º da Réplica)

262. Ainda que algumas casas de Boco fiquem mais perto de uma parte dos Baldios da Serra do Pisco do que as casas da aldeia de Venda do Cepo, tais casas não estão habitadas com carácter de permanência. (artigo 41º da Réplica)

263. A notificação do Pároco para ler o edital nas missas das povoações de Miguel Choco e Rio de Moinhos teria tido como objectivo alertar estas povoações para a arborização de outros terrenos baldios da freguesia de Santa Maria - que não os Baldios da Serra do Pisco – esses sim possuídos, geridos e explorados por habitantes destas aldeias. (artigo 46º da Réplica)

264. Há terrenos baldios mais próximos de Rio de Moinhos e Miguel Choco, bem como de Sintrão e Montes, que são usufruídos pelos habitantes destas aldeias de acordo com os usos e costumes de utilização deste tipo de terrenos. (artigo 47º da Réplica)

265. Apesar de CC ter tido a iniciativa de constituir os órgãos de gestão dos Baldios da Serra do Pisco, entre os quais a 1ª Autora, tal iniciativa teve apenas como objectivo dar “corpo” e “forma” a uma realidade material há muito existente e mereceu, desde o início, o apoio incondicional e o entusiasmo dos compartes da Venda do Cepo. (artigo 48º da Réplica)

266. Em momento posterior à reunião de 23 de Fevereiro de 2009, o Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria referido Presidente (e outros responsáveis) tentaram demover o CC de avançar com a constituição da 1ª Autora. (artigo 50º da Réplica)

267. Como a 1ª Ré e, pelo menos, o anterior Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria bem sabe, os compartes da Venda do Cepo em geral, e CC, em particular, há muito que tencionavam constituir os órgãos de administração dos Baldios da Serra do Pisco. (artigo 53º da Réplica)

268. Antes do início do processo de constituição da Assembleia de Compartes de Santa Maria, os compartes da Venda do Cepo já discutiam essa possibilidade, e aquele último tinha inclusivamente feito alguns contactos com funcionários da Autoridade Florestal Nacional (actual ICNF) e falado com um Engenheiro Florestal (Eng.º MMM) para o efeito. (artigo 54º da Réplica)

269. O processo formal de constituição da Assembleia de Compartes de Santa Maria terá começado escassos dias antes do processo de constituição formal da Assembleia de Compartes da Venda do Cepo. (artigo 56º da Réplica)

270. O processo de constituição formal da Assembleia de Compartes da Venda do Cepo terá terminado antes do processo de constituição formal da Assembleia de Compartes de Santa Maria. (artigo 57º da Réplica)

271. O edital de 5 de Fevereiro de 2009 destinou-se a expor “o caderno de recenseamento de compartes desta freguesia”. (artigo 63º da Réplica)

272. Estando em causa toda a freguesia e fazendo a Venda do Cepo parte da mesma, natural seria que comparecessem habitantes desta aldeia. (artigo 64º da Réplica)

273. Estando em causa todos os baldios da freguesia de Santa Maria e sendo os baldios da Serra do Pisco um dos diversos baldios existentes na freguesia de Santa Maria é também natural que o caderno de recenseamento dos compartes de todos os baldios desta freguesia integre os compartes da Serra do Pisco – Venda do Cepo. (artigo 65º da Réplica)

274. Os compartes da Venda do Cepo compareceram à dita reunião pois julgavam que o que se ia discutir era precisamente a formalização da divisão e atribuição, então materialmente já existente, às povoações que integram a freguesia dos terrenos baldios que efectivamente possuíam, geriam e exploravam, sendo que no caso da Venda do Cepo seriam os Baldios da Serra do Pisco. (artigo 66º da Réplica)

275. Foi com surpresa que constataram que o que se pretendia era a união dos mesmos e a colocação da gestão dos mesmos sob a égide da Junta de Freguesia. (artigo 67º da Réplica)

276. O primeiro caderno de recenseamento dos compartes da freguesia de Santa Maria contava com um total de 1143 compartes inscritos e que depois tais compartes passaram a apenas 267 compartes, em virtude de, como consta da acta da Assembleia de Compartes dos Baldios de Santa Maria de 2 de Maio de 2009:

“Sobre o quarto ponto da ordem de trabalhos [Proposta do Conselho Directivo para a actualização do Caderno de Recenseamento dos Compartes] a mesa deu a palavra ao presidente do conselho directivo para fazer a apresentação da proposta de actualização do caderno de recenseamento dos compartes. O presidente do conselho directivo esclareceu então que grande parte dos nomes inscritos no caderno de recenseamento não são de facto compartes pois não usufruem dos baldios de acordo com os usos e costumes de utilização dos baldios desde o tempo dos seus pais e avós, ou seja, desde tempos imemoriais, propondo assim que o caderno deveria conter apenas os nomes de todos os que por exercem actividade e são moradores nas localidades rurais da freguesia de Santa Maria. Após estas explicações e dados os exemplos do que a lei considera ser um comparte, ou seja, aquele que segundo os usos e costumes tem direito a usufruição dos baldios, a mesa colocou à aprovação este novo caderno que os presentes de braço levantado e por unanimidade o aprovaram, ficando assim o caderno de recenseamento dos compartes dos baldios da freguesia de Santa Maria a conter duzentos e setenta nomes de compartes dos baldios.”. (artigo 69º da Réplica)

277. Os habitantes de Castaíde nunca possuíram, geriram ou exploraram os Baldios da Serra do Pisco. (artigo 77º da Réplica)

278. Sendo Castaíde uma aldeia que integra a freguesia de Santa Maria, os seus habitantes – que constam do caderno de recenseamento dos compartes de Santa Maria, também votaram, e poderão voltar a votar, na Assembleia de Compartes dos Baldios de Santa Maria sobre os destinos a dar aos Baldios da Serra do Pisco, apesar de não serem compartes dos mesmos. (artigo 78º da Réplica)

279. Na aldeia de Venda do Cepo, nem sequer saneamento básico (esgotos) tem, mas apenas fossas que têm de ser esvaziadas regularmente pelos próprios habitantes e a electricidade só foi colocada na década de 1980 e parte do dinheiro foi investido pelos próprios habitantes e/ou emigrantes da Venda do Cepo. (artigo 84º da Réplica)

280. A Assembleia de Compartes – e demais órgãos de gestão – da Venda do Cepo reúnem sempre que tal é necessário. (artigo 85º da Réplica)

281. Pelo menos desde Janeiro de 2009 – que a Autoridade Nacional Florestal, que precedeu o ICNF e que então tutelava a Unidade de Gestão Florestal da Beira Interior, havia sido informada da intenção e evolução do processo de formalização da Assembleia de Compartes (e demais órgãos) de Santa Maria. (artigo 89º da Réplica)

282. A 1ª Autora – que não a sociedade C..., Lda. – teve conhecimento da existência do contrato, mas não desde 1 de Abril de 2009, e os seus representantes CC e LL sempre acreditaram, porque os responsáveis da 1ª Ré sempre lho disseram, que acordariam numa solução a contento de ambas as partes. (artigo 92º da Réplica)

283. Os responsáveis da Rés não mais contactaram os representantes da 1ª Autora, apesar dos esforços realizados por este nesse sentido, com vista a que os compartes dos Baldios da Serra do Pisco e os próprios terrenos baldios pudessem de alguma forma beneficiar com a respectiva exploração. (artigo 94º da Réplica)

284. Criando na 1ª Autora a convicção de que não iriam levar por diante a instalação do Parque Eólico, até porque somente no decurso de 2015 é que as obras começaram. (artigo 95º da Réplica)

285. A 1ª Autora entendeu que podia diligenciar no sentido de rentabilizar da melhor forma os Baldios da Serra do Pisco, a benefício dos mesmos e da população da Venda do Cepo. (artigo 96º da Réplica)

286. Consta da acta de fls. 19/verso a assinatura dos compartes que deram início ao processo de formalização da 1ª Autora. (artigo 105º da Réplica)

287. Na reunião de 3 de Março de 2009, já se fazia referência à elaboração e aprovação do caderno de recenseamento dos compartes, sendo que na reunião de 12 de Março 2009 tal assunto voltou a ser discutido tendo sido elaborado e aprovado o caderno de recenseamento com inclusão de alguns outros compartes. (artigo 109º da Réplica)

288. Procedimento semelhante foi adoptado pela Assembleia de Compartes de Santa Maria. (artigo 110º da Réplica)

289. As actas números 1 e 2 juntas a fls. 19/verso a 21, dizem ainda respeito às reuniões da Comissão Ad-Hoc de Compartes da Venda do Cepo. (artigo 111º da Réplica)

290. À semelhança da acta da reunião da comissão de compartes da freguesia de Santa Maria junta como doc. 55/verso e 210. (artigo 112º da Réplica)

291. Apesar da errónea referência a “Assembleia” que ficou a constar por mero lapso de escrita do título daquelas actas, como resulta claro do respectivo conteúdo, nas reuniões a que tais actas dizem respeito foram apenas abordados os pontos um e dois da ordem de trabalhos relativos somente (i) à informação e esclarecimento sobre legislação dos baldios e (ii) à aprovação do caderno de recenseamento dos compartes. (artigo 113º da Réplica)

292. A discussão e deliberação sobre os restantes pontos das Ordens de Trabalhos das referidas reuniões – a saber, Ponto três: Constituição da Assembleia de Compartes e eleição dos órgãos que a representam; Ponto quatro: Forma de Administração dos baldios; Ponto cinco: Apreciação de acções de gestão florestal levadas a cabo em todos os baldios da Venda do Cepo – ficaram relegadas para momento posterior. (artigo 114º da Réplica)

293. Para a informação e esclarecimento sobre a legislação dos baldios não seria necessário a existência de qualquer quórum. (artigo 115º da Réplica)

294. E para a elaboração e aprovação do caderno de recenseamento exigia-se que a iniciativa da sua elaboração, na falta da Assembleia de Compartes, como era o caso, competisse a grupos de 10 membros da comunidade local usualmente reconhecidos como compartes. (artigo 116º da Réplica)

295. Os compartes que presidiram à elaboração e aprovação do caderno de recenseamento foram bastante mais do que 10 membros. (artigo 117º da Réplica)

296. Foram mais do que aqueles 10 membros que constituíram a comissão de compartes ad hoc da então freguesia de Santa Maria. (artigo 118º da Réplica)

297. Como resulta do edital de 3 de Março de 2009, a reunião de dia 12 de Março de 2009 foi convocada para as 20 horas, fazendo-se aí referência ao facto de “No caso de à hora marcada não estarem presentes a maioria dos compartes, reunirá a assembleia uma hora mais tarde, com qualquer número de compartes.” (artigo 122º da Réplica)

298. A reunião foi, assim, convocada em conformidade com as normas legais que, à data, regiam tal acto. (artigo 123º da Réplica) – eliminado.

299. E reuniu o quórum necessário para deliberar validamente. (artigo 124º da Réplica)

300. Com efeito, à hora agendada (20.00 horas) não se verificava a presença da maioria dos compartes, razão pela qual a Assembleia de Compartes reuniu 1 hora depois com os 22 compartes cuja assinatura consta da acta correspondente. (artigo 125º da Réplica)

301. Pelo que, exigindo-se a presença de um quinto dos compartes 1 hora depois da hora marcada no aviso convocatório e estando recenseados 58 compartes, tal significa que bastaria que estivessem presentes cerca de 12 compartes. (artigo 126º da Réplica)

302. Pelo que tendo comparecido e votado 22 compartes, estava reunido o quórum para deliberar validamente. (artigo 127º da Réplica)

303. Na acta respectiva ficou a constar que a reunião teve lugar pelas “vinte hora e trinta minutos”. (artigo 128º da Réplica)

304. Mas tal ficou-se apenas a dever a um lapso de escrita resultante do aproveitamento de uma minuta pois, na realidade, os compartes reuniram pelas 21.00 horas e discutiram e deliberaram sobre os pontos da ordem de trabalhos já depois dessa hora. (artigo 129º da Réplica)

305. Aliás, foram cometidos lapsos semelhantes no processo de constituição formal dos órgãos de gestão dos compartes dos baldios de Santa Maria. (artigo 130º da Réplica)

306. A 1ª Ré teve conhecimento das deliberações tomadas nas ditas reuniões logo em 1 de Julho de 2009, pois as actas respectivas faziam parte do processo de constituição formal da Assembleia de Compartes e demais órgãos de gestão dos Baldios da Serra do Pisco. (artigo 139º da Réplica)

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Factos Não Provados:

- Correspondem àqueles que vêm delimitados na planta junta a fls. 17/verso a 18/verso. (artigo 17 da petição inicial)

- Que depois revendiam em Trancoso. (artigo 17º da petição inicial)

- De extensas e prolongadas negociações (…) após vários anos de negociação. (artigo 43º da petição inicial)

- Há largos anos. (artigo 93º da petição inicial)

- A 1ª Autora, apesar de se terem organizado para gerir os desígnios dos terrenos baldios, em meados de 2009, nada fizeram, até à presente data, para impedir a instalação do Parque Eólico explorado pela 2ª Ré. (artigo 7º da contestação da 2ª Ré) - eliminado, por rectificação determinada pelo tribunal recorrido.

- A Junta de Freguesia de Santa Maria apenas celebrou o Contrato de Cessão de Exploração ao abrigo da delegação de competências devidamente efectuada pela Assembleia de Compartes de Santa Maria - Trancoso. (artigo 97º da contestação da 2ª Ré)

- É Sociedade Ré, desde tempos imemoriais que os habitantes da comunidade local de Boco, Castaíde, Miguel Choco, Montes, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo da Freguesia de Santa Maria – Trancoso utilizam os terrenos baldios existentes na Serra do Pisco, Seixal, Damandalqueira, no Vale do Vinagre e nas Cabeceiras. (artigo 114º da contestação da 2ª Ré)

- Dado que tais terrenos não se encontram apenas na Serra do Pisco, mas nos lugares acima identificados, todos eles pertencentes à anteriormente denominada freguesia de Santa Maria, estes baldios designam-se como Baldios de Santa Maria. (artigo 115º da contestação da 2ª Ré)

- A gestão dos denominados Baldios de Santa Maria, onde se integram os terrenos nos quais foi implantado o Parque Eólico gerido pela Sociedade Ré, corresponde aos Compartes de Santa Maria - Trancoso. (artigo 120º da contestação da 2ª Ré)

- A Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco – a par da sociedade C... – tinham perfeito conhecimento do Contrato de Cessão de Exploração celebrado, seis anos antes, entre a sociedade D... e a Junta de Freguesia de Santa Maria, (artigo 144º da contestação da 2ª Ré)

- A entidade com quem a sociedade D... celebrou, em 01.04.2009, o Contrato encontrava-se legitimada para ceder a exploração dos terrenos baldios onde veio a ser instalado o Parque Eólico da Sociedade Ré. (artigo 153º da contestação da 2ª Ré)

- As reuniões de 3 e 12 de Março de 2009 estavam convocadas para as 20,00 horas e começaram às 20,30 horas. (artigo 161º da contestação da 1ª Ré)

- À data da celebração do Contrato entre a 1ª Autora e a sociedade C... (ou seja, 15.04.2015), os trabalhos já se encontravam numa fase avançada de execução. (artigo 207º da contestação da 2ª Ré) - eliminado, por rectificação determinada pelo tribunal recorrido.

- Como é igualmente verdade que se situam junto das aldeias dos Montes, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão. (artigo 23º da contestação da 1ª Ré)

- O Baldio da Serra do pisco corresponde ao logradouro comum possuído, explorado e administrado pelos habitantes das comunidades locais de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo, em partes iguais e historicamente indivisível, decorrente dos usos ancestrais e consuetudinários tradicionalmente corporizados pelo pastoreio, recolha de lenhas, mato, pedra e carvão. (artigo 28º da contestação da 1ª Ré)

- Dada a sua dimensão e configuração, a maior ou menor proximidade do Baldio da Serra do Pisco às aldeias dos Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo depende do lugar em concreto para o qual se queira aceder. (artigo 34º da contestação da 1ª Ré)

- A aldeia de Venda do Cepo não constitui o aglomerado populacional que mais próximo fica dos referidos terrenos. (artigo 35º da contestação da 1ª Ré)

- Como é igualmente verdade que os aldeões dos Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão cortaram e recolheram lenha/madeira das árvores existentes nos terrenos do baldio da Serra do Pisco. (artigo 38º da contestação da 1ª Ré)

- Como verdade é que os aldeões dos Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos e Sintrão também sempre levaram animais para pastar, cultivavam produtos agrícolas, em especial centeio, bem como extraíam carvão que depois revendiam em Trancoso. (artigo 40º da contestação da 1ª Ré)

- Desde tempos imemoriais que os terrenos do Baldio da Serra do Pisco são possuídos, geridos e utilizados, de forma contínua e ininterrupta, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, pelas comunidades locais de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo. (artigo 41º da contestação da 1ª Ré)

- Desde tempos imemoriais que as populações de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo, com exclusão de outras populações, vêm desenvolvendo actividades de diversa natureza, nomeadamente agro-florestal e silvo-pastoril, de forma continua e ininterrupta, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém no baldio da Serra do Pisco. (artigo 43º da contestação da 1ª Ré)

- Que os compartes das aldeias de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo exploram e usufruem tais terrenos, deles retirando os respectivos rendimentos e frutos, de forma contínua, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém. (artigo 44º da contestação da 1ª Ré)

- Desde tempos imemoriais que a generalidade dos moradores das referidas povoações, apascentam gados, sobretudo ovelhas e cabras, roçam matos destinados a produzir fertilizante orgânico, vulgo estrume, cortam lenha, agricultam centeio e extraem carvão e pedra nos terrenos baldios da Serra do Pisco. (artigo 45º da contestação da 1ª Ré)

- Para tanto, os habitantes das aldeias de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo sempre acederam aos terrenos baldios da Serra do Pisco através de caminhos de terra batida (alguns deles actualmente alcatroados) abertos para o efeito. (artigo 46º da contestação da 1ª Ré)

- O Município de Trancoso solicitou ao pároco que o edital fosse lido nas aldeias de Miguel Choco, Venda do Cepo e Rio de Moinhos porque era do conhecimento da generalidade dos habitantes da freguesia de Santa Maria e dos próprios representantes do Município que os habitantes destas aldeias usufruíam do Baldio da Serra do Pisco. (artigo 55º da contestação da 1ª Ré)

- E como tal poderiam ser directamente afectados pela reflorestação do Baldio da Serra do Pisco. (artigo 56º da contestação da 1ª Ré)

- Daí o cuidado no sentido de ser divulgada informação sobre a arborização do Baldio da Serra do Pisco nas aldeias de Miguel Choco, Rio de Moinhos e não apenas em Venda do Cepo. (artigo 57º da contestação da 1ª Ré)

- Já em 1953 o baldio da Serra do Pisco era usufruído não apenas pela comunidade local de Venda do Cepo, como também pela comunidade local de Montes, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Boco e Sintrão. (artigo 58º da contestação da 1ª Ré)

- Os compartes da Venda do Cepo então presentes na reunião de 23 de Fevereiro de 2009 foram informados que a 1.ª Ré já tinha dado inicio ao processo de constituição da Assembleia de Compartes de Santa Maria no passado dia 05 de Fevereiro de 2009 e que juridicamente não se reconhecia legitimidade aos compartes de Venda do Cepo para, por si só, constituir uma assembleia de compartes. (artigo 63º da contestação da 1ª Ré)

- O CC só avançou para a formalização da 1.ª Autora porque teve conhecimento que a 2.ª Ré e um conjunto de compartes do Baldio da Serra do Pisco das localidades de Montes, Boco, Miguel Choco, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo tinham dado inicio ao processo de constituição da Assembleia de Compartes de Santa Maria. (artigo 64º da contestação da 1ª Ré)

- Não fosse a iniciativa da 1.ª Ré e de um conjunto de compartes, CC não teriam iniciado o processo formal de constituição da 1.ª Autora. (artigo 65º da contestação da 1ª Ré)

- Já no que diz respeito à alegada Assembleia de Comparte não lhe é conhecida qualquer actividade ou se reúne, sequer, regularmente. (artigo 115º da contestação da 1ª Ré)

- Tendo-se devido certamente ao facto da referida unidade de Missão desconhecer a existência da Assembleia de Compartes de Santa Maria e delegação da administração do baldio da Serra do Pisco a favor da 1.ª Ré. (artigo 117º da contestação da 1ª Ré)

- A 1.ª Autora teve conhecimento da celebração do aludido contrato no próprio dia 01 de Abril de 2009 através do seu alegado presidente da mesa da Assembleia de Compartes, CC. (artigo 121º da contestação da 1ª Ré)

- No dia 01 de Abril de 2009, CC foi informado pelo então presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria, TT, da assinatura do aludido contrato. (artigo 123º da contestação da 1ª Ré)

- A 1.ª Autora tinha assim conhecimento do aludido contrato de cessão de exploração desde o dia da sua celebração, 1 de Abril de 2009. (artigo 130º da contestação da 1ª Ré)

- Era seu dever, que certamente cumpriu, de informar a 2.ª Autora da existência do referido contrato. (artigo 4º da contestação da 131ª Ré)

- Bem sabendo que o aludido terreno é parte integrante do Baldio da Serra do Pisco, possuído, explorado e administrado pela 1.ª Ré em virtude da delegação de poderes de administração conferida pela Assembleia de Compartes de Santa Maria aprovado e ratificado nas suas reuniões de 12 de Março e 19 de Abril de 2009. (artigo 134º da contestação da 1ª Ré)

- Não corresponde à verdade que a referida autorização se destinou a implementar um projecto de instalação de um parque eólico, e não o parque eólico propriamente dito. (artigo 142º da contestação da 1ª Ré)

- A 1.ª Autora tinha perfeito conhecimento que a autorização do corte das árvores destinava-se à instalação do parque eólico, até porque também já tinha conhecimento do contrato de cessão de exploração celebrado entre a 1.ª Ré e a D... S.A. a 1 de Abril de 2009. (artigo 146º da contestação da 1ª Ré)

- Não havia quórum para a reunião de 23 de Fevereiro de 2009 deliberar validamente. (artigo 153º da contestação da 1ª Ré)

- Também não havia quórum para a reunião de 03 de Março de 2009 deliberar validamente. (artigo 155º da contestação da 1ª Ré)

- A reunião de 23/02/2009 estava convocada para as 20,30 horas e teve inicio às 20 horas. (artigo 160º da contestação da 1ª Ré)

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III – Do Direito

1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (arts. 635º, nº 4, e 639º, do NCPC), apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas.

Nesta conformidade, as questões a resolver são as seguintes:

- Falta de deliberação para a propositura da acção por parte do 1º A.

- Nulidade da sentença.

- Alteração da matéria de facto.

- Se a Assembleia de Compartes da Serra do Pisco – Venda do Cepo (Trancoso), representada pelo 1º A., não representa a organização da comunidade local para o exercício dos actos de representação, disposição, gestão e fiscalização do baldio da Serra do Pisco com a área, limites, confrontações, composição e configuração descritas nos arts. 24º a 30º e plantas juntas como doc. nº 1 e 2 da contestação, declarando-se, antes, que a mesma está consubstanciada e concretizada nos órgãos de administração da Assembleia de Compartes de Santa Maria, respetivo Conselho Diretivo e Comissão de Fiscalização eleitos na reunião de 12 de Março de 2009.

- Declarar-se válida e eficaz a deliberação tomada pela Assembleia de Compartes de Santa Maria na sua reunião de 12 de Março de 2009 que delegou poderes de administração do Baldio da Serra do Pisco a favor da 1ª R., bem como a ratificação da referida deliberação tomada na sua reunião de 2 de Maio de 2009.

- Declarar-se válido e eficaz o contrato de Cessão de Exploração celebrado em 1 de Abril de 2009 entre a 1. R. e a sociedade D... S.A., bem como o contrato de cessão da posição contratual celebrado entre esta sociedade e a 2ª R.

- Nulidade dos contratos de cessão de exploração e cessão de posição contratual, celebrados pelos AA., por simulação.

- A não se entender assim, manifesto abuso de direito pelos AA.

- Conversão do negócio nulo de cessão da posição contratual para a 2ª A., alterando-se o contraente cedente, que passará a ser o 1º A.

2. No despacho saneador, no qual se julgou improcedente a excepção de falta de deliberação para a propositura da acção por parte do A., deduzida pela 2ª R. B..., S.A, escreveu-se que:

“Importa começar por referir que a presente acção foi instaurada pelo Conselho Directivo dos Baldios da Serra do Pisco- Venda do Cepo, em 17/05/2018, sendo certo que, como vimos, a ré B..., S.A., veio alegar que inexistiu a deliberação legalmente exigida, da Assembleia de Compartes, nos termos do artigo 24º da Lei 75/2017 ou ratificação pela mesma, apenas em caso de urgência, tal como previsto na alínea h) do artigo 29º.

Como também já referimos, foi junta aos autos pelos AA., a denominada “Ata número oito”, da qual consta que, no dia 19 de Junho de 2016, reuniu-se a Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco, com a seguinte ordem de trabalhos: Ponto 1- “Ratificar a Decisão do Conselho Directivo de recorrer a juízo e constituir mandatário para defesa dos direitos e interesses legítimos da comunidade da Venda do Cepo, relativos aos Baldio da Serra do Pisco, nomeadamente para defesa dos respectivos domínios, posse e fruição contra atos de ocupação, demarcação e aproveitamento ilegais levados a cabo pela Assembleia de Compartes e Junta de Freguesia de Santa Maria e pela sociedade B..., S.A.”.

Mais se refere que, entrando na apreciação do ponto 1 da ordem de trabalhos, o Presidente da Mesa da Assembleia de Compartes, fez a exposição nos termos constantes de tal acta, designadamente a propósito da motivação que levou a que o Conselho Directivo constituísse mandatário e que este resolvesse instaurar acção judicial.

Consta também da mesma, que o Conselho Directivo solicitou à Assembleia de Compartes a ratificação da sua decisão de constituir mandatário, outorgando a necessária procuração e conferindo-lhe poderes, designadamente para recorrer a juízo para a defesa dos interesses legítimos da comunidade da Venda do Cepo.

Finalmente, pode-se ler na mesma acta que, colocada à votação, foi o referido ponto da ordem de trabalhos (ractificação da constituição de mandatário para recurso a juízo) aprovado por unanimidade, tendo a Assembleia de Compartes ratificado a decisão do Conselho Directivo de constituir mandatário, delegando no Presidente do Conselho Directivo a assinatura da competente procuração, conferindo-lhe poderes para, além do mais, recorrer a juízo.

Resulta, pois, do documento que vimos de analisar, sem que qualquer dúvida possa subsistir a este propósito, que existiu a ratificação da decisão do Conselho Directivo de constituir mandatário para recorrer a juízo e, por outro lado, que foi aprovada por unanimidade tal ratificação.

Assim, é nosso entendimento que não pode proceder o alegado pela 2ª R. quando refere que desconhece, nem tem obrigação de conhecer, se a deliberação cumpre os requisitos de validade, mesmo em face da anterior Lei dos Baldio, o que equivale a impugnação de tal deliberação, ou que desconhece e não tem obrigação de conhecer se a convocação da Assembleia cumpriu as formalidade legais previstas no artigo 18º, ou se o seu funcionamento cumpriu os preceitos do artigo 19º.

Com efeito, importa não olvidar que foi a 2ª R. que deduziu a excepção em causa, pelo que, obviamente, incumbia-lhe demonstrar que o Conselho Directivo não tinha autorização, ou deliberação que lhe permitisse instaurar a presente acção e constituir mandatário.

Ora, tendo os AA. vindo juntar a acta em causa, diremos também que, não tendo sido invocada e demonstrada pela 2ª R. a sua falsidade, não basta esta dizer que não sabe como decorreu a reunião, ou se foi feita a convocação nos termos legalmente previstos, mas antes deveria demonstrar que tal não aconteceu, caso pretendesse, com sucesso, pôr em causa a validade da deliberação da Assembleia de Compartes, o que não fez.

Assim, neste conspecto, não poderá proceder a sua pretensão, quando se limita a dizer que não sabe, nem tem de saber, se na convocatória da Assembleia e no seu funcionamento foram cumpridas as formalidades legalmente previstas, dado que, repetimos, teria de ser ela a alegar e provar que tal não aconteceu, ou que o documento em causa e as declarações do mesmo constante são falsas, alegação e prova que não fez.

Deste modo, entendemos que não poderá deixar de ter o Tribunal por assente a existência da reunião da Assembleia de Compartes e a deliberação pela mesmo tomada, unanimemente, de ratificação da decisão do Conselho Directivo de recorrer a juízo e constituir mandatário nos exactos termos que se encontram documentados na acta junta aos autos e a cujo conteúdo já nos reportámos.

Aqui chegados, importa analisar e decidir se tal ratificação, nos termos em que se encontra expressa na acta da reunião da Assembleia dos Compartes do Baldio da Serra do Pisco-Venda do Cepo, permite a instauração da presente acção e a constituição de mandatário pelo Conselho Directivo dos Baldios da Serra do Pisco Venda do Cepo, sendo certo que, efectivamente, na deliberação de ratificação nada se refere acerca da urgência da tomada de decisão por parte deste.

A este propósito, e para a decisão desta questão, tal como, aliás, também é referido pela 2ª ré, releva o regime legal aplicável, na medida em que o actual regime dos Baldios se encontra plasmado na lei 755/2017 de 17 de Agosto, que revogou, por força do seu artigo 58º, a Lei 68/93 de 4 de Setembro.

No anterior regime, ou seja, nos termos previstos no artigo 15º nº1 o) da Lei 68/93, competia à assembleia de compartes “Ratificar o recurso a juízo pelo conselho diretivo, bem como a respetiva representação judicial, para defesa de direitos ou legítimos interesses da comunidade relativos ao correspondente baldio, nomeadamente para defesa dos respetivos domínios, posse e fruição contra atos de ocupação, demarcação e aproveitamento ilegais ou contrários aos usos e costumes por que o baldio se rege”.

Por seu turno, previa o artigo 21º h) que compete ao Conselho Directivo “Recorrer a juízo e constituir mandatário para defesa de direitos ou interesses legítimos da comunidade relativos ao correspondente baldio e submeter estes atos a ratificação da assembleia de compartes”.

Resulta, pois, dos preceitos legais acabados de citar que era competência do Conselho Directivo, sem qualquer necessidade de justificação de urgência, recorrer a juízo e constituir mandatário, apenas devendo tal decisão ser ratificada pela Assembleia de Compartes (sem exigência de qualquer maioria qualificada).

Já em face do actual regime dos Baldios, introduzido, como vimos pela Lei 75/2017, tal matéria é regida pelos artigos 24º e 29º.

Prevê-se no primeiro que “1 - Compete à assembleia de compartes: (...) q) Deliberar o recurso a juízo pelo conselho diretivo para defesa de todos os direitos e interesses da comunidade local relativos aos correspondentes imóveis comunitários, bem como dos direitos da comunidade de compartes decorrentes dos atos de gestão dos imóveis comunitários; r) Ratificar os atos da sua competência reservada se o conselho diretivo os tiver praticado sem autorização com fundamento em urgência;

Por seu turno, nos termos do nº2 do mesmo artigo “A eficácia das deliberações da assembleia de compartes relativas às matérias previstas nas alíneas f), g), m), n), q), r) e s) do número anterior depende de aprovação por maioria qualificada de dois terços dos membros presentes”.

Já o artigo artigo 29.º da mesma lei, estatui que: “1-Compete ao conselho diretivo: (…) Em caso de urgência, recorrer a juízo e constituir mandatário para defesa de direitos ou interesses legítimos da comunidade relativos ao correspondente baldio ou baldios e submeter estes actos a ratificação da assembleia de compartes.

Resulta, pois, do actual regime legal que a competência para deliberar o recurso a juízo e a constituição de mandatário pertence à Assembleia de Compartes, sendo necessária uma maioria qualificada de dois terços; e, por outro lado, que apenas em caso de urgência pode o Conselho Directivo recorrer a juízo e constituir mandatário, mas, verificando-se este circunstancialismo, tem de submeter tais actos a deliberação da Assembleia.

Resulta, assim, do cotejo dos dois regimes legais que as competências nesta matéria (de recurso a juízo e constituição de mandatário) por parte da Assembleia de Compartes e do Conselho Directivo, são distintos, sendo que tais diferenças relevam no caso em apreço.

Isto porque, resulta do documento (acta de reunião da Assembleia de Compartes a que já aludimos) que foi o Conselho Directivo que decidiu o recurso a juízo e a constituição de mandatário, apenas tendo submetido tal decisão a ratificação da Assembleia e sem que tenha sido invocada qualquer situação de urgência, o que cumpria as formalidades previstas na Lei 68/93 de 4 de Setembro, mas não na lei 755/2017 de 17 de Agosto, dado que nesta, como vimos, sendo tal competência da Assembleia de Compartes, o Conselho Directivo apenas pode decidir em situação de urgência.

Ora, in casu, e desde já adiantando o nosso entendimento, não poderá deixar de ser aplicável, neste conspecto, o regime anterior, ou seja, a Lei 68/93.

Não obstante o artigo 58º da lei 755/2017 prever no seu nº1 que “É revogada a Lei n.º 68/93, de 4 de setembro, alterada pelas Leis n.os 89/97, de 30 de julho, e 72/2014, de 2 de setembro, bem como a regulamentação dela decorrente”, de tal não decorre que a lei nova tenha efeitos retroactivos e, muito menos, poderá ter a virtualidade de destruir os efeitos já produzidos, o que decorre, para além do mais, do disposto no artigo 12º do CC, aliás também citado pela 2ª ré.

Com efeito, na presente situação, a deliberação da Assembleia de Compartes que ratificou a decisão do Conselho Directivo de recurso a juízo e constituição de mandatário, data de 19/06/2016, ou seja, momento temporal em que estava ainda em vigor a Lei 68/93, sendo que, nos termos da mesma, como vimos, o procedimento previsto era precisamente aquele que foi seguido.

Assim, não vislumbramos que outro procedimento, nessa data, para nós a única relevante neste conspecto, pudesse ser seguido, em face do regime legal em vigor.

Nem se diga, como o faz a 2ª ré, que se deverá aplicar a Lei 75/2017, dado que a acção foi instaurada em 17/05/2018, ou seja, já após a sua entrada em vigor e a deliberação não se pode considerar como constituindo um “facto de efeito imediato”.

Cremos que, efectivamente, não lhe assiste razão, dado que, salvo devido respeito por opinião contrária, não estamos perante uma relação ou situação jurídica duradoura, que se prolonga para além da entrada em vigor da lei nova, mas antes uma deliberação, cuja validade e efeitos se produzem de imediato e não podem ser eliminados ou destruídos pela lei nova.

Deste modo, a validade da deliberação e a sua conformidade com a lei, não poderá deixar de se aferir em face da lei vigente, precisamente no momento em que a mesma foi tomada e, nessa altura, repetimos, foram cumpridas as exigências legais, pelo que a partir daí, poderia ser intentada acção judicial.

Não releva, pois, em nosso entender, a circunstância de, à data da instauração da acção, se encontrar já em vigor a lei nova, dado que, independentemente do momento em que a acção fosse intentada, o certo é que o Conselho Directivo dos Baldios da Serra do Pisco-Venda do Cepo, tinha uma deliberação válida, que preenchia os requisitos legais exigidos ao tempo em que foi tomada e que permitia instaurar a presente acção, como fez.”.

A recorrente Parque Eólico discorda, porquanto a outorga de mandato forense e a propositura de ação judicial pelo A., ocorridos respetivamente em 4.5.2018 e 17.5.2018, constituem efeitos jurídicos duradouros da deliberação da Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco, de 19.6.2016, aos quais, tendo emergido após a entrada em vigor de lei nova (Lei 75/2017 de 17 Agosto), se aplicam as novas exigências (dos arts. 21º a 29º da referida Lei), conforme disposto na 2ª parte do art. 12º do Código Civil, pelo que em face da falta de deliberação que respeite os requisitos de validade formal resultantes das alterações legislativas introduzidas em Agosto de 2017, deverá concluir-se pela verificação da exceção dilatória prevista na d) do art. 577º do NCPC, impondo a absolvição das rés da instância (cfr. conclusões III. e IV. de recurso).

Desde já adiantamos que não se acompanha a recorrente, antes se concorda inteiramente com o despacho recorrido, que pelo seu acerto jurídico, importa chancelar.

O que está em jogo é a aplicação da lei no tempo. Ora, o art. 12º, nº 2, do CC, dispõe que “Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.”.

Nesta perspectiva, tendo a referida Lei 75/17 disposto sobre as condições de validade substancial de determinados factos e respectivos efeitos, como decorre dos citados arts. 24º, nº1, q) e r), e 2, e 29º, 1, h), e não sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, então só se aplica aos factos novos. Assim, ao contrário do defendido pela recorrente, não se aplica, a 2ª parte do nº 2 do apontado art. 12º do CC, mas sim o estatuído na 1ª parte.  

Daí que não se aplicando a lei nova, ao nosso caso em apreciação, permaneçam intocáveis, nos termos da anterior Lei 68/93, seus arts. 15º, nº1, o) e 21º h), a validade da decisão do Conselho Directivo e concomitante ratificação pela Assembleia de Compartes. Ambas não só existem como são perfeitamente válidas.

Ambas produziram efeitos jurídicos imediatos que perduram no tempo – isto é, não têm prazo de duração de validade -, pelo que a acção judicial interposta poderia ocorrer a qualquer momento – a lei também não fixou nenhum prazo de caducidade desse exercício -, seja ainda no tempo da Lei 68/93 ou posteriormente na emergência de uma nova Lei (a 75/17), salvo se esta tivesse determinado expressamente, nas disposições transitórias, ou implicitamente, noutro sentido diverso, o que não aconteceu.

Daí que improceda esta parte do recurso da recorrente 2ª R.    

3.  A 2ª R. acusou a sentença recorrida de padecer das nulidades identificadas no art. 615º, nº 1, c), do NCPC, por os fundamentos estarem em oposição com a decisão e por ocorrer ambiguidade/obscuridade/ininteligibilidade, na medida em que o julgamento sobre a matéria de facto: (i) contém contradições irreconciliáveis, tanto dos factos provados entre si (pontos 48. e 143.; e 102., 150. e 151), como entre factos provados e não provados (155. provado e 13. não provado; e 185. provado e 14. não provado); (ii) incluir terminologia indefinida, conclusiva ou jurídica no elenco dos factos provados que distorce a factualidade assente (factos provados 57., 72., 77., 89., 97., 103, 104., 234., 246., 250., 263., 269., 270., 274., 275., 280., 288., 295., 298., 299., 302. e 305.); (iii) elencar um facto provado como alegado pela 2ª R. que não o foi (facto provado 147.). Assim, a dimensão dos erros, contradições, indefinições e locuções jurídico-conclusivas incluídos no elenco dos factos apresentados na sentença, impede o conhecimento e a compreensão pelas partes da fundamentação em que assenta a respetiva parte decisória, obrigando à sua retificação e clarificação (cfr. conclusões do seu recurso I. e II). A recorrente está enganada.

Quando a lei, no referido artigo e alínea prevê a dita nulidade, por ambiguidade/obscuridade/ininteligibilidade, refere-se à decisão, e não a quaisquer factos. Ora o segmento decisório da sentença recorrida nada de ambíguo, obscuro ou ininteligível tem, sendo bastante claro o que o tribunal a quo sentenciou.

E também inexiste a apontada contradição. Esta só se verifica entre os fundamentos e a decisão. Ou seja, entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador segue determinada linha de raciocínopo, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decide noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição é causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica, ou muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade, mas já se o raciocínio expresso na fundamentação apontar para determinada consequência jurídica e na conclusão for tirada outra consequência, ainda que esta seja juridicamente correcta, a nulidade verifica-se (vide Lebre de Freitas, A Ação Declarativa Comum, À Luz do CPC de 2013, 3ª Ed., pág. 333).

No nosso caso, lida a sentença, verifica-se que entre a fundamentação de direito e a decisão nenhuma oposição existe, antes sendo coerente. Na fundamentação de direito o juiz apontou para determinadas consequências jurídicas e expressou-as na decisão.

Inexiste, pois, a acusada nulidade. O que se verifica é uma confusão da recorrente entre nulidade da sentença e eventuais vícios da decisão da matéria de facto, nos termos do art. 662º, nº 2, c), do NCPC. Que infra (em 4.1., 4.2. e 4.3.) serão apreciados.      

4.1. Em relação a possível alteração da decisão da matéria de facto, começa a mencionada recorrente por alegar que a mesma contém contradições irreconciliáveis, tanto dos factos provados entre si (pontos 48. e 143.; e 102., 150. e 151), como entre factos provados e não provados (107. provado e 5. não provado; 155. provado e 13. não provado; e 185. provado e 14. não provado). Não acompanhamos a apelante. 

No que respeita à alegação de que a sentença contém contradições irreconciliáveis dos factos provados entre si (pontos 48. e 143.; e 102., 150. e 151.), assinale-se desde logo que a recorrente nem apresenta justificação para a mesma, ficando-se pela mera alegação.

De qualquer maneira, entende-se que não se verifica a alegada contradição, pois o facto provado 48. - Aquando da celebração do Contrato, em Abril de 2015, não havia qualquer equipamento instalado nos Baldios. (artigo 49º da petição inicial), não está de modo algum em contradição com o facto 143. - Em Abril de 2015 já se encontrava em plena execução os trabalhos de construção do Parque Eólico. (artigo 143º da contestação da 2ª Ré), por se reportarem a realidades não coincidentes.  Não tem o mesmo significado a existência de qualquer equipamento instalado nos baldios com a execução dos trabalhos de construção, já que é diferente estarem os equipamentos instalados da execução dos trabalhos de construção.

O mesmo se diga em relação à alegada contradição irreconciliável entre os factos 102., 150. e o 151. É diferente a 2ª Ré ter conhecimento da existência da Assembleia de Compartes da Serra do Pisco e reconhecer-lhe poderes de gestão dos Baldios da Serra do Pisco, do facto de não ter aceite os putativos direitos de exploração de que se arrogava titular a sociedade C... provenientes da celebração do contrato de cessão de exploração (junto a fls. 39 a 41) e de a 1ª A., pelo menos, até Outubro de 2015, nunca ter actuado junto da sociedade D..., nem da 2ª R., como se tal instalação estivesse a ser erigida em terrenos sobre os quais se arroga titular. Outra vez, realidades não coincidentes. Não se verifica, assim, contrariamente ao sustentado, contradição irreconciliável entre os factos citados.

Relativamente à contradição entre os factos provados e não provados (ponto 107. provado e 5. não provado; 155. provado e 13. não provado), nada há a referir, visto que o tribunal a quo já efectuou correcção, com base em lapso, eliminando os apontados 2 factos não provados. E as partes não reagiram sobre esse aspecto.

Em relação ao facto provado 185. - Os aldeões da Venda do Cepo cortaram e recolheram lenha/madeira das árvores existentes nos terrenos do baldio da Serra do Pisco. (artigo 37º da contestação da 1ª Ré), e suposta contradição com o facto não provado 14., ela também não se verifica. Nem se entendendo bem esta alegação, visto que entre ambos os factos apontados não há relação, nem o dito facto provado consta no elenco dos factos não provados, contrariamente ao afirmado.

Em suma, nesta parte é de indeferir o alegado.

4.2. No que respeita à situação da decisão da matéria de facto incluir terminologia indefinida, conclusiva ou jurídica no elenco dos factos provados que distorce a factualidade assente - factos provados 57., 72., 77., 89., 97., 103, 104., 234., 246., 250., 263., 269., 270., 274., 275., 280., 288., 295., 298., 299., 302. e 305.

Expendeu-se no recente Ac. do STJ, de 19.1.2023, Proc.15229/18.7T8PRT, em www.dgsi.pt, que:

…saber se um concreto facto integra um conceito de direito ou assume feição conclusiva ou valorativa constitui questão de direito, porquanto não envolve um juízo sobre a idoneidade da prova produzida para a demonstração ou não desse mesmo facto enquanto realidade da vida.

Assim, v.g., o Ac. deste Supremo Tribunal de 10.01.2017 (proc. 761/13.7TVPRT.P1.S1), que entendeu que neste caso este Tribunal não está a interferir na apreciação dos factos, não está a corrigir, indevidamente, um eventual erro na apreciação das instâncias; está, sim, e apenas, a proceder à sua qualificação como tal de acordo com as regras de direito aplicáveis[2].

Como refere MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, o que está em causa é avaliar se matéria considerada como um facto provado reflecte, indevidamente, uma apreciação de direito por envolver uma “qualquer valoração segundo a interpretação ou aplicação da lei, ou qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica”[3].

A intervenção do Supremo justifica-se, portanto, pois que, por imperativo do estatuído no artigo 607º nº 4 do CPC, devem constar da fundamentação da sentença os factos – e apenas os factos – julgados provados e não provados, o que significa que deve ser suprimida toda a matéria deles constante susceptível de ser qualificada como questão de direito, conceito que, como vem sendo pacificamente aceite, engloba, por analogia, juízos de valor ou conclusivos.

(…)
Antes de mais, o que deve entender-se por
facto conclusivo?

Como refere ANSELMO DE CASTRO[4], “…a linha divisória entre facto e direito não tem carácter fixo, dependendo em considerável medida não só da estrutura da norma, como dos termos da causa: o que é facto ou juízo de facto num caso, poderá ser direito ou juízo de direito noutro. Os limites entre um e outro são, assim, flutuantes.

E como em observa o Ac. do STJ, de 13.11.2007 (in www.dgsi.pt), “torna-se patente que o julgamento da matéria de facto implica quase sempre que o julgador formule juízos conclusivos, obrigando-o a sintetizar ou a separar os materiais que lhe são apresentados através das provas. Insiste-se: o que a lei veda ao julgador da matéria de facto é a formulação de juízos sobre questões de direito, sancionando a infração desta proibição com o considerar tal tipo de juízos como não escritos.

Aliás, não pode perder-se de vista que é praticamente impossível formular questões rigorosamente simples, que não tragam em si implicados, o mais das vezes, juízos conclusivos sobre outros elementos de facto; e assim, desde que se trate de realidades apreensíveis e compreensíveis pelos sentidos e pelo inteleto dos homens, não deve aceitar-se que uma pretensa ortodoxia na organização da base instrutória impeça a sua quesitação, sob pena de a resolução judicial dos litígios ir perdendo progressivamente o contacto com a realidade da vida e assentar cada vez mais em abstrações (e subtilezas jurídicas) distantes dos interesses legítimos que o direito e os tribunais têm o dever de proteger. E quem diz quesitação diz também, logicamente, estabelecimento da resposta, isto é, incorporação do correspondente facto no processo através da exteriorização da convicção do julgador, formada sobre a livre apreciação das provas produzidas”.

Conforme bem refere ALBERTO VICENTE RUÇO[5] "quando aludimos a factos, o senso comum, diz-nos que nos referimos a algo que aconteceu ou está acontecendo na realidade que nos envolve e percecionamos".

De igual modo, referem ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO e NORA[6] que os factos "abrangem as ocorrências concretas da vida real", tecendo ainda as seguintes considerações sobre este tema:

Dentro da vasta categoria dos factos (processualmente relevantes), cabem não apenas os acontecimentos do mundo exterior (da realidade empírico-sensível, diretamente captável pelas perceções do homem - ex propiis sensibus, visus et audictus), mas também os eventos do foro interno, da vida psíquica, sensorial ou emocional do individuo (v.g. vontade real do declarante (...); o conhecimento dessa vontade pelo declaratário; (...) o conhecimento por alguém de determinado evento concreto (...); as dores fisicas ou morais provocadas por uma agressão corporal ou por uma injúria. [...]

Anote-se, por fim, que a área dos factos (selecionáveis para o questionário) cobre, principalmente, os eventos reais, as ocorrências verificadas; mas pode abranger também as ocorrências virtuais (os factos hipotéticos), que são, em bom rigor, não factos, mas verdadeiros juízos de facto. [...]

São realidades de uma zona empírica que se inscreve ainda na área da instrução da causa [...]. Mas trata-se da zona imediatamente contígua à dos juízos de valor e à dos juízos significativo-normativos, que, integrando a esfera do direito, embora estritamente ligados ao circunstancialismo concreto pertencem já a uma outra jurisdição.

Deste modo, os factos meramente conclusivos, quando constituam "uma consequência lógica retirada de factos simples e apreensíveis[7]" podem ainda integrar o acervo factual, "apenas devendo considerar-se não escritos se integrarem matéria de direito que constitua o thema decidendum".

Tudo o que for de excluir da matéria factual deverá ser eliminado ou ter-se como não escrito.”.

Aqui chegados, vejamos o que decidir, perante a plêiade de factos que a apelante considera conclusivos/jurídicos/indefinidos:

Entendemos que os factos provados 57., 77., 104., 298. apresentam pendor conclusivo de juízos de valor ou jurídico.

Os remanescentes factos não têm essa característica, ou são factos ou são factos com pendor conclusivo de juízos de facto. Embora se possa apontar que a redacção dos factos 263., 269. e 270., ao adoptar o futuro do indicativo, tenham uma vertente de incerteza e na prática acabem por ser factos inócuos. Já do facto 305., pode dizer-se que a característica é ser irrelevante.   

Cremos, porém, que o que neles remanescentes factos se retrata, como dissemos, ou são factos, ou realidades facilmente extraíveis de factos facilmente apreensíveis. E, como tal, podem ainda integrar o acervo factual.

E como se sublinhou no mencionado aresto do STJ, esta questão do Facto versus Direito situa-se numa zona um tanto cinzenta, por vezes bem difícil de clarificar. Não pode, com efeito, olvidar-se que os juízos ou conclusões de facto situam-se numa zona intermédia ou campo intermédio entre os puros factos e as questões ou matéria de direito, encontrando-se incluídos na legislação como parte integrante ou constituinte da hipótese legal de várias normas jurídicas. Tais juízos ou conclusões de facto numas situações aproximam-se mais de uma verdadeira questão de facto, enquanto que noutros a proximidade é com uma questão de direito.

Ou seja, aquilo que é matéria de facto ou matéria de direito não é estanque ou fixo, mas antes volátil, dependendo dos termos em que a lide controvertida se apresenta ou modela. Daí que o mesmo juízo ou conclusão de facto pode ser, numa situação facto ou juízo de facto e, noutra, juízo de direito.

Parece que apenas são proibidos os juízos de facto conclusivos que impliquem e apreciem determinados acontecimentos à luz de uma norma jurídica. O que se nos afigura não ser o caso nos aludidos pontos de factos que ressalvámos.

Em consonância, defere-se parcialmente a alegação da 2ª R., e eliminando-se dos factos provados os referidos factos 57., 77., 104., 298.

4.3. Relativamente à situação de a decisão de facto elencar um facto provado, o 147., como alegado pela 2ª R., mas que não o foi, também não se entende esta afirmação.

Efectivamente o facto 147. foi alegado pela 2ª Ré, no artigo 157º da sua contestação, e que se cita: “157.º

Perante este Ofício é perfeitamente compreensível que a Sociedade Ré se tivesse dirigido à ASSEMBLEIA DE COMPARTES DO BALDIO DA SERRA DO PISCO, em ordem a tentar desbloquear o seu problema, naquela data, a saber: a eventual necessidade de autorização para efetuar o corte de arvoredo.”.

Indefere-se, por isso, o alegado pela recorrente 2º R.

4.4. A 2ª R. impugnou a decisão da matéria de facto quantos aos:

- pontos 43., 44., 48., 83., 86., 282 a 284. dos factos provados e nos pontos 13., 44., 45., 46. e 50. dos factos não provados – em face dos depoimentos de AA, BB e CC, e documentos exibidos e analisados neste âmbito;

- Pontos 42. e 142. dos factos provados – em face dos depoimentos de DD e de CC, e documentos exibidos e analisados neste âmbito;

- Pontos 7. a 9. dos factos provados, bem como nos pontos 7. e 8. dos factos não provados – em face dos depoimentos de EE; FF; GG; HH; II, JJ e II (cfr. conclusão de recurso V.).

Por sua vez, a 1ª R. impugnou tal decisão quanto:

- aos factos provados em 7, 8, 9, 11, 18, 19 (no segmento “conscientes dessa realidade”), 48, 53, 57, 58, 70, 72, 77, 78, 79, 83, 84, 85, 86 (no segmento “2.ª Ré”, pois trata-se da 2.ª A.) 90, 91, 97, 98, 102, 103, 104, 105, 142, 243, 246, 248, 249, 252, 253, 254, 255, 256, 258, 259, 261, 263, 267, 270, 274, 275, 282, 283, 284, 288, 291, 293, 294, 295, 296, 298, 299, 300, 301, 302, 304, 305 e 306;

- e aos factos alegados nos artigos 23, 28, 34, 35, 41, 43, 44, 45, 46, 55, 56, 57, 58, 63, 117, 121, 123, 130, 146 e 161 da contestação da 1ª R. e nos artigos 7, 97, 114 (nos seguintes moldes: “Desde tempos imemoriais que os habitantes da comunidade local de Venda de Cepo, Miguel Choco, Montes, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo utilizam os terrenos baldios existentes na Serra do Pisco”), 120 e 153 da contestação da 2ª R., baseado em depoimento e declarações de parte, prova testemunhal e documental que indica (cfr. conclusões de recurso 1. a 93.).

Na motivação da decisão da matéria de facto exarou-se que:

“O tribunal formou a sua convicção com base no acordo das partes nos articulados, conjugação e análise dos documentos juntos aos autos com os depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas e com o depoimento e as declarações de parte prestados, tendo presentes as regras da experiência e da normalidade do acontecer.

Considerou, relativamente à factualidade objectiva alegada pelas partes, os documentos comprovativos de tal prova, sendo relevantes os seguintes:

- Fls. 17 e 18 – localização do baldio de Vale Cepo, em carta militar, elaborado em Setembro de 2011 por DD; e localização em ortofotomapa de fls. 18/verso, elaborado pelo mesmo, em Setembro de 2015;

- Convocatórias e actas da comissão had oc da Assembleia de Compartes dos Baldios de Venda do Cepo, de fls. 19 a 23;

- Caderno de Recenseamento da Assembleia de Compartes do Baldio da Serra do Pisco de fls. 23/verso a 26;

- Actas das reuniões do Conselho Directivo e do Conselho Fiscal da Comissão de Compartes do Baldio da Serra do Pisco, de fls. 26/verso e 27;

- Fls. 27/verso a 37 – documentos enviados à Autoridade Florestal Nacional, entregues em 30 de Março de 2009, constando do requerimento que se refere à junção de documentos em falta, relativo ao ofício de 24 de Março de 2009;

- Fls. 37/verso – convocatória datada de 9 de Março de 2015 para reunião a realizar na casa do povo de Venda do Cepo no dia 17 de Março de 2015, pelas 20.30 horas, tendo como ordem de trabalhos a eleição do quinto elemento da Comissão de Fiscalização; deliberar sobre a proposta do direito de exploração de energia eólica e florestal do Baldio da Serra do Pisco à sociedade C..., apresentada pelo Conselho Directivo; e deliberar a delegação de poderes no conselho directivo para assinatura do contrato de cessão do direito de exploração de energia eólica e florestal do baldio àquela sociedade – constando a fls. 38 a acta número sete, relativa à convocatória mencionada, constando, com relevância que “na sequência das negociações que têm vindo a ser realizadas com esta sociedade há já largos anos e do levantamento topográfico que a mesma realizou ao Baldio da Serra do Pisco, a Assembleia de Compartes deliberou por unanimidade dos presentes aprovar a contratação da cessão do direito de exploração de energia eólica e florestal (…), por entender que tal contratação se afigura positiva como forma de rentabilizar os terrenos do Baldio e de permitir, com os rendimentos decorrentes do contrato a celebrar, investir no Baldio da Serra do Pisco, assim como em equipamentos, estruturas e dinamização social, cultural e recreativa da comunidade local de Veda do Cepo.”, constando a fls. 39 a 41 contrato de cessão de exploração outorgado em 15 de Abril de 2015;

- Fls. 41/verso – cópia da acta n.º 5, datada de 1 de Julho de 2011, tendo como único ponto, deliberar sobre o levantamento topográfico a realizar sobre a sociedade C... (estando juntos a fls. 42 a 43 cópia dos documentos juntos a fls. 17 e 18);

- Fls. 43/verso a 45 – contrato de cessão de exploração celebrado em 1 de Abril de 2009, com o prazo de 20 anos, sucessiva e automaticamente prorrogáveis por igual período, entre a D..., S.A. e a Junta de Freguesia de Trancoso, representada por TT, na qualidade de Presidente da Junta de Freguesia, tendo como objecto a cedência pela Junta de Freguesia a exploração de parte do terreno baldio assinalado na planta anexa e identificado no considerando C do contrato, aproximadamente com a área de 115 há, o qual constitui, nos termos da Lei dos Baldios, um terreno baldio sob a sua administração e o fim do contrato destina-se à construção e exploração do Parque Eólico para produção e comercialização de energia eólica e realização de actividades relacionadas com a produção e comercialização de energias renováveis (instalação, montagem, exploração, conservação, reparação e modificação do conjunto de todos os componentes e de aerogeradores, instalações eléctricas, linha de transporte de energia) com o objectivo final de produção de energia através da acção do vento; tal fim não prejudica a utilização do baldio para pastoreio de gado e aproveitamento de mato e floresta ((desenvolvidas fora da zona de protecção contante do ponto 4).

Mais constam as seguintes contrapartidas: pagamento à Junta de Freguesia a partir da celebração do contrato e até à data de ligação do parque eólico à rede, de 5.000,00 euros anuais; após a ligação à rede, a contrapartida anual tendo por referência 3.500,00 euros por MW de potência – quantias actualizáveis em função do índice de preços ao consumidor estabelecidos pelo INE, para o ano anterior.

Consta ainda do contrato que a Junta de Freguesia autoriza a D... a proceder à realização de todas e quaisquer obras e à colocação de equipamentos no baldio necessários à prossecução das finalidades do contrato. São obrigações da Junta de Freguesia as constantes do ponto 5, entre as quais promover e diligenciar todos os actos que se mostrem necessários e adequados junto das entidades do poder local, nomeadamente municípios, freguesias, comunidades locais e as outras que eventualmente existam, compartes, habitantes de freguesia, empresas e comunicação social.

Ficou ainda autorizada a cessão da posição contratual por parte da D....

- Comunicação de fls. 45/verso e 219/verso a 221, da constituição da Assembleia de Compartes de Baldios, enviada pela Assembleia de Compartes de Santa Maria à Autoridade Florestal Nacional, datada de 19 de Maio de 2009, constando da mesma que foi constituída em 12 de Março de 2009 a Assembleia de Compartes de Santa Maria, que ocorreu à vista de todos, sem oposição e devidamente divulgado e que foi constituída para a gestão dos baldios de vários lugares da freguesia bem como os baldios da Serra do Pisco “que são comuns a vários lugares da freguesia em parte igual e historicamente indivisível decorrente dos usos ancestrais e consuetudinários tradicionalmente corporizados pelo pastoreio, recolha de lenhas, pedra, mato” e que decidiu delegar na Junta de Freguesia a assinatura da cessão contrato para exploração da energia eólica, a instalar na Serra do Pisco, sem oposição e à vista de todos; mais consta pretenderem saber o que vai ser abatido, por verificarem estarem vários pinheiros marcados, advertindo de abuso de poder e de dano patrimonial decorrente do abate de árvores e pretenderem ainda conhecer o plano do corte e por quem foi elaborado e aprovado – tendo recebido a resposta da Autoridade Florestal Nacional, dirigida MM, junta a fls. 46: solicitam o envio de documento comprovativos da constituição dos órgãos directivos dos compartes de Santa Maria, informam da competência do Estado pela aplicação do regime florestal, estando os baldios da Serra do Pisco submetidos a regime florestal e recomendam que efectue contactos com a Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco, com sede na Venda do Cepo, 6420-579 Trancoso, que abarca a mesma área referida no ofício a que responde, a fim de acordarem a área a gerir;

- Ofício datado de 19 de Abril de 2011, remetido à D... pela Autoridade Florestal Nacional, tendo como assunto o Parque Eólico do Picoto – Núcleo do Pisco, cujo teor foi dado a conhecer às Assembleias de Compartes de Santa Maria e Assembleia de Compartes da Serra do Pisco, em que, relativamente ao pedido de parecer motivo alteração de localização de aerogeradores, alertam “Dever-se-á acautelar o diferendo que subsiste entre os compartes da freguesia de Santa maria e os compartes da Serra do Pisco dado que ambos reivindicam a posse dos terrenos baldios em questão, sugerindo-se que a receita gerada passe a ficar cativa na conta da AFN, o que aliás já está a acontecer com as receitas resultantes da venda de material lenhoso até à resolução do conflito.”.

- Email datado de 17 de Julho de 2014, enviado por AA, gestor de projectos (F...), enviado a CC, e onde se refere que o email é no seguimento da troca de impressões no dia anterior entre ambos e “pelos motivos que tive a oportunidade de lhe dar a conhecer a propósito da instalação do Parque Eólico, serve o presente para lhe pedir o favor de, com a maior brevidade que for possível, convocar os comparte dos baldios da Venda do Cepo de forma a colocar à consideração dos mesmos a assinatura da Declaração de autorização do abate de arvoredo no baldio da serra do Pisco, conforme minuta que se junta em anexo.” e indica, caso aja acordo dos compartes, onde deve ser assinado e junta cópia do ofício recebido do ICNF ao pedido de parecer efectuado a propósito do corte de arvoredo na área dos baldios sujeita ao regime florestal;

- Fls. 48 – acta número 6, datada de 24 de Outubro de 2014, tendo como ordem de trabalhos, entre outro, a discussão da proposta de autorização do corte de árvores na área onde está prevista a implementação do Parque Eólico do Pisco, sito na Serra de Almançor (Serra do Pisco).

O Conselho Directivo autoriza o corte das árvores e referiu-se ainda que, até à data, ainda não existe qualquer acordo, ou qualquer documento elaborado com a empresa em causa (B..., S.A.), para feito mas apenas uma conversa, sem qualquer valor legal, com o Sr. AA, representante da F...; referem-se ainda à marcação à machadada das árvores a abater para passagem da linha eléctrica, que foi feita sem autorização, reservando-se o direito do acordo monetário após reunião com aquela sociedade ou representante legal – a fls. 4, está junta cópia da declaração a autorizar o abate das árvores, datada de 5 de Novembro de 2014 – de referir que nesta declaração consta que a B..., “está a implementar um projecto de instalação de um parque eólico, sendo necessário proceder ao corte das árvores na área onde se prevê a instalação das infraestruturas projectadas e que a Assembleia de Comparte é o órgão com poderes legalmente necessários para a emissão da declaração.

- Carta de fls. 49/verso e 50, enviada pela C... à B..., datada de 27 de Setembro de 2015 e, a fls. 50/verso a 52, cartas enviadas pelo Advogada da Autora, datadas de 7 de Outubro de 2015 à B... e à Junta de Freguesia de Trancoso (São Pedro e Santa Maria) e Souto Maior e carta remetida ao Advogado da Autora, datada de 18 de Outubro do mesmo ano, pelo Advogado da 1ª Ré, junta a fls. 52/verso a 54 e documentos de fls. 55 a 67 (informação sobre baldios remetida pela Autoridade Florestal Nacional ao Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria – datada de 2 de Fevereiro de 2009 (também junto a fls. 116 e 209); acta da reunião da comissão de compartes de 16 de Fevereiro de 2009 (também junto a fls. 120 e 210); 1ª convocatória, datada de 17 de Fevereiro de 2009 (também junto a fls. 122 e 211); acta da reunião da comissão de compartes de 9 de Março de 2009 (também junto a fls. 128 a 130 e 213 a 215); acta da Assembleia de compartes de 27 de Abril de 2009 (também junto a fls. 134 e 216 verso); convocatória com a mesma data (também junto a fls. 132 e 215/verso); parte de acta de fls. 59/verso; caderno de recenseamento dos compartes de Boco, Castaíde, Miguel Choco, Montes, Rio de Moinhos, Sintrão e Venda do Cepo (também junto a fls. 141 a 146; cadernetas prediais e mapa de implantação dos baldios da Serra do Pisco (também junto a fls. 152); convocatória de 1 de Março de 2013 e acta da Assembleia de Compartes e acta 1/2011).

- Cartas enviadas pela Mandatária da 1ª Autora;

- Acordo de cessão de posição contratual entre C... e A..., datado de 14 de Março de 2018 de fls. 69 e comunicação à 1ª Autora, datada de 28 de Março de 2018, junta a fls. 71;

- Carta de fls. 72, datada de 26 de Fevereiro de 2009, assinada por CC, enviada à Unidade de Gestão Florestal da Beira Interior Norte a solicitar a colaboração para a criação de uma comissão de compartes da Serra do Pisco; remessa do processo à Autoridade Florestal, datado de 24 de Março de 2009 de fls. 72/verso e solicitação do envio dos editai referentes às actas apresentadas, a fim de ser completado o processo, de fls. 73;

- Fls. 73/verso – pedido dirigido ao Presidente da Câmara Municipal de Trancoso de cedência do edifício e logradouro da Escola Primária de Venda do Cepo;

- Fls. 74 a 78 – autorização solicitada pelo SIREP para instalação de uma estação base, autorização dada e protocolo celebrado entre a 1ª Autora e a Direcção-Geral de Infraestruturas e Equipamentos do Ministério da Administração Interna.

- Fls. 114 – ofício datado de 23 de Janeiro de 2009 endereçado pela Junta de Freguesia de Santa Maria à Autoridade Nacional Florestal;

- Fls. 118 e 209/verso - Edital e convocatória da Junta de Freguesia de Santa Maria datado de 5 de Fevereiro de 2009,

- Fls. 124 e 211/verso e 212 – acta da comissão de compartes had oc dos Baldios de Santa Maria de 2 de Março de 2009;

- Fls. 126 e 212/verso- 2ª convocatória, datada de 2 de Março de 2009;

- Fls. 136 e 217 - convocatória, datada de 27 de Abril de 2009 – por incumprimento do artigo 19º, n.º s 1 e 2 da Lei 68/93 e cumprimento do n.º 3;

- Fls. 138 e 139 e 217/verso a 218 – acta da assembleia de compartes dos Baldios de Santa Maria – Rio de Moinhos - de 2 de Maio de 2009;

- Fls. 148 - convocatória, datada de 3 de Abril de 2015;

- Registo Nacional de Pessoas Colectivas de fls. 150 e 219;

- fls. 154 – ofício do ICNF tendo como assunto o parque eólico em causa nos autos, remetido ao cuidado do Engª AA, datada de 10 de Julho de 2014, pela qual se refere que os baldios de Santa Maria são administrados transitoriamente pelo ICNF porque existem dois órgãos que reclamam a gestão dos baldios e se desconhecer que tenha existido algum acordo entre eles ou deliberação legal pelos tribunais competentes sobre a administração do baldio e que é competência da assembleia de compartes (e não do conselho directivo) deliberar sobre a cessão de exploração do baldio ou de partes do mesmo e que, nas plantas enviadas se depreende a existência de outro aerogerador que não consta do processo enviado e que se localiza no baldio de queiriz, Fornos de Algodres, pertencente ao mesmo perímetro florestal; solicitam o envio dos seguintes documentos, sem os quais não será possível dar seguimento ao processo (no que interessa nos autos em análise): actas das duas assembleias de compartes (baldio de Santa maria) nas quais conste a cessação de exploração de partes do baldio ou apenas de uma desde que exista um documento que evidencie o acordo entre as assembleias ou tribunal competente;

- Fls. 156 a 159 – relatório semanal de trabalhos, datado de 28 de Abril a 29 de Abril de 2015;

- Fls. 163 a 167 – Nota justificativa emitida pela REN com indicação da energia fornecida em Outubro de 2015;

- Fls. 170 a 174 – contrato celebrado entre a 2ª Ré e a EDP Serviço Universal, S.A., datado de 10 de Novembro de 2015;

- Emails datados de 6 e 7 de Outubro relativos ao regime remuneratório aplicável ao Parque Eólico do Pisco;

- Mapas do Baldio da Serra do Pisco, onde constam as áreas “reclamadas” pela 1ª Autora e 1ª Ré e área cedida para exploração do Parque Eólico – de fls. 199;

- Fls. 200 – aditamento ao contrato de cessão de exploração, datado de 29 de Agosto de 2017; fls. 201 a 203 – contrato de cessão de exploração (também junto a fls. 43 a 45) e planta de fls. 204 a 205, onde facilmente de apercebe que a Venda do Cepo é a localidade mais próxima do baldio (e também o Boco);

- Ofício remetido à Câmara Municipal de Trancoso pela 2ª Circunscrição Florestal, datado de 17 de Julho de 1953 e edital datado de 27 de Julho do mesmo ano e pedidos de afixação, juntos a fls. 205/verso e 206 a 208;

- Ofício remetido pela Junta de Freguesia de Santa Maria à Autoridade Nacional Florestal, datado de 23 de Janeiro de 2009);

- Fls. 216 – pedido de demissão do cargo de Presidente da Assembleia de Compartes dos Baldios de Santa Maria por parte de NNN, datado de 27 de Abril de 2009;

- Fls. 221/verso – ofício remetido pela Autoridade Florestal Nacional, a MM, datado de 25 de Maio de 2009 (em resposta à carta de 19 de Maio de 2009), a solicitar o envio de documentos comprovativos da constituição dos órgãos directivos e recomendação para contactarem a Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco para acordarem a área a gerir; a fls. 222, consta a resposta, datada de 5 de Junho de 2009 – onde a Assembleia de Compartes de Santa Maria refere que só teve conhecimento de outra assembleia através do ofício a que responde; e a fls. 223 a 224 – nova carta – onde referem levantar algumas questões que merece análise por poder constituir embuste: terem-se realizado reuniões na venda do Cepo para falar de baldios por vontade de um morador, com a presença da Engª SS; a suposta convocatória de 10 de Fevereiro de 2009, não tem validade legal por ser assinada por um representante, embora fora da lei e a acta que deveria corresponder à convocatória enferma de actos que sofrem de ilegalidade formal e de conteúdo e, sobre a reunião seguinte, também está inviabilizada – em resposta a Autoridade Florestal Nacional – cfr. fls. 225 – reitera o envio da documentação que esteve na base da constituição da 2ª Ré – tendo esta respondido com o ofício de fls. 225/verso – e, novamente a Autoridade Florestal Nacional respondeu no sentido de os litígios deverem ser resolvidos pelos tribunais e que as receitas, nomeadamente, de material lenhoso, ficarão retidas até que se verifique absoluto entendimento entre as partes envolvidas – cfr. fls. 226/verso;

- Convocatória datada de 10 de Fevereiro de 2009 da Comissão had oc dos Baldios da Venda do Cepo – de fls. 227;

- Acta do Município de Trancoso de 24 de Fevereiro de 2011 – de fls. 227/verso e 228, onde consta a tentativa de obtenção de acordo entre ambas as assembleias de compartes em aceitar as condições da D... para iniciar a construção do Parque, acordo que não foi obtido porque o representante da 1ª Autora não se sentia legitimado em aceitar o acordo, necessitando e 15 dias para reunir com os compartes;

- Fls. 228/verso – comunicação de cessão da posição contratual pela D... à Junta de Freguesia de Santa Maria, datado de 4 de Fevereiro de 2013;

- Fls. 285 a 287 – acta de 19 de Junho de 2016 da assembleia de compartes da 1ª Autora;

- Delimitação em cartografia do Perímetro Florestal da Serra do Pisco de fls. 363/364 e 368 e levantamento topográfico de fls. 425 a 427.

Relativamente aos depoimentos e declarações de parte:

a) LL, residente na Venda do Cepo, Presidente do Conselho Directivo dos Baldios da Serra do Pisco, prestou depoimento de parte aos factos alegados nos artigos 22º a 58º e 60º a 161º da Contestação da 1ª Ré e também declarações de parte.

Em depoimento de parte (e que não deixaram de configurar também declarações de parte) confessa o artigo 22º, e relativamente ao 23º e que ficam mais longe, explicando que vive na Venda do Cepo e tem conhecimento da realidade do local; confessa os artigos 24º (esclareceu que são cerca de 400 ha, não sabendo explicar o que consta da área constante da petição inicial – onde constam 100 e tal ha, o que a Autora, segundo o seu Mandatário aceita), 25º; relativamente às confrontações, confessa os artigos 26º, 27º, quanto ao 28º, apenas a Venda do Cepo, 29º, 30º, 33º, não confessa o 34º, porque a Venda do Cepo é aldeia a que fica mais perto do sopé, 36º (mas Boco pertencia à venda do Cepo e já não há moradores), 37º, 39º (é verdade, até são conhecidos por carvoeiros, explicando que a sua mãe tinha lavoiras e fazia carvão com o avô), 53º, 54º, 60º, 61º (referindo que a iniciativa foi “fermentando” em casa dos pais mas o problema era como o fazer; foi o irmão da testemunha que teve o maior impulso), 122º, 124º, não confessa o 129º porque apenas autorizaram o abate e quanto à instalação iriam falar depois, 132º e 133º.

Referiu ainda que informaram a C..., de quem tinha feito o abate e que nunca mais foram contactados pela 1ª Autora.

b) MM, legal representante do Interveniente Principal Conselho Directivo dos Baldios de Santa Maria, prestou declarações de parte.

Referiu que desde 2009 que é o Presidente do Conselho Directivo e que é natural de ..., que sempre teve uma ligação aos avós do Boco e que o avô sempre contou as histórias da serra; que também ouviu conversas de outras pessoas idosas; que nunca viu alguém na serra e sempre teve ideia que era do Estado porque os avós sempre disseram que tinha sido retirado;

Decidiram constituir os baldios para fazer regressar às populações o que tinha sido retirado nos anos 60 e que não estavam a poder usufruir porque não estavam organizados de maneira a fazer regressar os baldios aos compartes; os rendimentos do material lenhoso estão retidos; e os do parque eólico, porque a assembleia delegou na junta de freguesia é esta que recebe esses rendimentos e plica-os de acordo com as informações e orientações da assembleia de compartes;

Confirmou os artigos da contestação 22º, 23º, 24º, 25º (excepto Montes que está a Norte), 26º, 27º, 28º (até à década de 60), 29º, 30º, 31º, 32º, 33º, 34º (a povoação que está num lado está mais perto desse lado, mas em termos de acessos há um caminho direito, Sintrão tem que passar pelos Montes e que as casas mais perto é o Boco e os Montes fica tão perto como as casas da Venda do Cepo); do que ouviu dizer, é verdade 37º a 40º, 42º a 47º; mais se referiu aos editais a que acedeu na Câmara Municipal de Trancoso (artigos 48º a 57º), o processo formal de constituição terá sido primeiro formalizado pela 1ª ré, e até trocaram os processos em Julho de 2009; esteve presente na reunião de 16 de Fevereiro em que também estiveram presentes três habitantes de Venda do Cepo e também CC e se informou da necessidade de constituir a assembleia de compartes para gerir os baldios, material lenhoso e que a D... queria constituir a comissão de compartes; o capital está a ser aplicado nas aldeias; confirmou o procedimento; que a assembleia de compartes tem funcionado regularmente; esclareceu que não têm conta bancária e que as reuniões do conselho directivo são na junta de freguesia e as de compartes nas casas do povo; confirmou o artigo 114º; nunca mais ouviu falar da realização da actividade da 1ª Autora; esteve presente na reunião de 24 de Março de 2011, confirmando o teor da mesma e que seria para tentarem um acordo por causa do parque eólico; com a 1ª Ré havia contrato mas também fizeram uma declaração/autorização para o abate das árvores tal como a 1ª Autora;

O mapa junto com a contestação foi feito pela testemunha (explicando quem colaborou), e fez uma sobreposição com o mapa dos autores onde é possível identificar que entra dentro da área que a 1ª Ré reivindica;

Foi confrontado com o documento 24 junto com a contestação – relativamente aos baldios – referiu não estar recordado de fazer diferenças entre vários baldios – há mais baldios irrelevantes nas aldeias, de meios hectares e “coisas assim” junto a Miguel Choco.

Quanto aos depoimentos das testemunhas:

1. OO, 90 anos de idade, residente no Casal do Monte, Fornos de Algodres, que referiu ter nascido na Venda do Cepo, foi pastor desde os 7 até aos 20 anos na Serra do Pisco. referiu conhecer os baldios, não sabe os hectares (mas que poderão ser 150 ha) mas conhece as partilhas e que sempre foram da Venda do Cepo; sempre viveu da Serra do Pisco; a testemunha tinha um terreno e uma casa que pegava com os baldios; as pessoas tinham uns “maninhos” (pedaços de terra na serra onde cultivavam centeio e batatas) onde colhiam o centeio, faziam carvão que iam vender a Trancoso, há uns 50 anos; começou a andar na Serra do Pisco com as cabras aos 7 anos – havia muita gente na Venda do Cepo e cada um tinha uma “sorte”, todos iam aos baldios, centeio, iam buscar os matos, lenhas, pastoreavam ovelhas e cabras; a Serra do Pisco era a principal fonte de rendimento das gentes de Serra do Pisco;

Para além da Venda do Cepo, havia Miguel Choco e Rio de Moinhos próximo dos baldios; Miguel Choco, dista cerca de 3 a 4 Km; no Boco e Montes tinham a serra deles onde levavam os gados; não iam para o baldio. Esclareceu que viviam, há muitos anos, 4 ou 5 moradores no Boco, mas que, há cerca de 30 anos que já não tem habitantes e que as pessoas do Boco “pertenciam” à Venda do Cepo; os dos Montes a Rio de Moinhos;

Relativamente a Sintrão referiu que nada tem a ver com a Serra do Pisco, fica longe.

Miguel Choco, Montes e Rio de Moinhos, têm uns baldios, mas não os conhece e que existe um rio que dificultava a passagem dos habitantes dos Montes e Rio de Moinho para os baldios;

A casa mais próxima do baldio era a casa da testemunha, a cerca de 1 km, e esclareceu que a casa do guarda florestal está dentro do baldio; o cruzamento da estrada florestal para serra e posto de vigia e a outra estrada vai para Queiriz, ficando tal cruzamento dentro do Baldio, na Serra da Venda do Cepo e que a casa da OOO ainda está mais perto do baldio do que a casa que era da testemunha;

Relativamente às torres eólicas, que estarão 4 torres dentro do baldio, mas que uma delas deverá estará no Carapito;

Identificou as pessoas que tiravam o carvão, todas já falecida (o Alexandre que era da Venda do Cepo e o PPP, esteve a viver nos Montes, mas não ia tirar carvão, mas andou com umas cabras pois esteve a servir no Boco porque o patrão era dos Montes, mas a mulher era do Boco – ele ia para o talegre, perto das eólicas); referiu ainda que a serra não tinha partilhas e que os da Venda do Cepo podiam ir para o lado dos Montes e estes para o lado da Venda do Cepo;

O Boco e os Montes tinham a sua serra, do outro lado do rio, eram terrenos particulares e também havia terrenos baldios, mas que não se confundem com a serra do Pisco;

Confirmou a existência de duas pontes nos Montes ao pé do Boco e nesta localidade também, podiam passar para a Serra do Pisco, mas tinham que passar pelo Boco;

Nem os de Miguel Choco ou de Rio de Moinho iam à serra do Pisco.

2. PP, 80 anos de idade, residente na Venda do Cepo, nasceu e viveu na Venda do Cepo até aos 24 anos, idade com que emigrou para ..., tendo regressando no ano de 1999;

Referiu que desde que se recorde nem Miguel Choco nem Rio de Moinhos foram para os baldios da Serra do Pisco e estes ficam junto à Venda do Cepo; Esclareceu que até aos 24 anos andava a trabalhar na Serra do Pisco, a cavar, semear pinheiros, plantar hortas; também havia pessoas da Venda do Cepo que faziam lavoeiras para cultivarem o centeio; que um tal de Alexandre fazia carvão; mais referiu que havia mais de 100 casais na Venda do Cepo e que muitos, os que não tinham ada ou o suficiente para viver, sobreviviam dos baldios; iam para lá com os animais;

Esclareceu que não iam pessoas de outras aldeias;

Os de Miguel Choco e Rio de Moinhos não iam para os baldios.

Esclareceu o que são as lavoeiras e que havia algumas perto do talegre, a cerca de 200/300 metros, mas não havia pessoas de Rio de Moinhos, Montes e Boco que tratassem de lavoeiras nesse local;

Relativamente à casa do guarda florestal, confirmou que está dentro do baldio e que existe um cruzamento que está também dentro do baldio e que a casa de uma tal de OOO fica situada a cerca de 100 metros do baldio; que Rio de Moinhos tem 2 baldios, Miguel Choco 1 baldio e que o Boco pertencia à Venda do Cepo, iam para o baldio, mas já não vive lá ninguém (esclarecendo quem foram as últimas pessoas a viver no Boco);

Referiu-se ainda à Serra do Carapito, e que antes era a serra mais guardada.

Relativamente ao carvão, referiu-se a 2 irmãos da quinta de Vila Curta, mas onde já não vive ninguém, situada a cerca de 1 km da venda do Cepo, a caminho dos Montes.

3. CC, 54 anos de idade, natural da Venda do Cepo, esclareceu conhecer os Baldios da Serra do Pisco por fazer parte da constituição do Conselho Directivo e viver na localidade da Venda do Cepo desde os 10 anos de idade. Foi confrontado com o teor dos documentos 2 a 14, juntos com a PI.

Referiu que a constituição vem dos pais e avós da testemunha e tomou a iniciativa porque seria uma das formas de legalizar os baldios; referiu que os baldios terão cerca de 622 há, mas que seria maior, existindo registos de 1000 e tal há;

Referiu-se à Serra do Pisco, como sendo em parte composta de terrenos baldios e parte serem propriedade de particulares e que é necessário passar pela Venda do Cepo para se ir para a serra; que a mesma esteve sujeita ao regime florestal e que até ser implementado esse regime os habitantes da localidade cultivavam, faziam carvão (sendo até conhecidos por carvoeiros), pastoreavam – actividades que eram exercidas desde sempre, o que sabe do que as pessoas iam falando, incluindo os pais da testemunha;

Havia pessoas do Boco que também utilizavam os baldios, mas já não residem ali pessoas há muitos anos, e que, actualmente, apenas uma casa é frequentada nas férias por familiares da testemunha;

Referiu-se ainda aos incêndios ocorridos na Serra do Pisco; e a população da Venda do Cepo acorria aos incêndios;

Relativamente à constituição da Assembleia de Compartes, referiu que a parte formal ocorreu em 2009 e que ninguém fazia nada, em 2006, decidiu avançar, pediu ajuda, nomeadamente a uma Engª Florestal (QQQ), que apresentou o marido, também Engª Florestal (MMM) e explicou o que teriam que fazer, acabando por contactarem com a Engª SS e INF para constituírem a Assembleia de Compartes, acabando por ser constituída, tendo descrito os passos dados; foi confrontado com os documentos juntos à petição inicial – documentos 2 a 11 – cujo teor confirmou; relativamente ao documento 3 (fls. 19/verso), faz referência ao Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria, que terá ido à reunião porque soube da existência da mesma; confirmou ter sido celebrado o contrato com a C... junto a fls. 39 a 41, não sabendo se antes terá sido feito levantamento topográfico, mas que terá sido feito depois e que já tinham levantamentos feitos pelo INF; que o processo de constituição da assembleia de compartes foi entregue junto da INF, que foram contactados pela Administração Interna para colocação de antena do Siresp, tendo reunido no local onde veio a ser colocada;

Esclareceu que apenas teve conhecimento da instalação das eólicas no baldio depois de ter sido celebrado o contrato com a C...; e que para a execução pediram autorização para abate de árvores para passarem linhas eléctricas (média tensão) e essa autorização foi pedida a e concedida apenas para aquele efeito – tal pedido foi feito por um engenheiro da D... – não tendo falado da exploração de eólicas e que se lembre não se falou da possibilidade de colocação de parque eólico – a construção deste foi uma surpresa, tendo falado com a C... e que apenas tiveram conhecimento quando subiram e viram umas placas da empresa que lá estava;

Esclareceu que entre Montes e Rio de Moinho e Sintrão e os terrenos do baldio existe um rio, que antes apenas tinha uma ponte no boco, umas pedras e que no inverno não era possível atravessar (sendo possível no verão); aquelas aldeias e Miguel Choco têm outros terrenos baldios, jogam lá à bola, explicando que existem 2 baldios; e que, do que lhe foi transmitido por pais e avós, as pessoas daquelas aldeias não exploravam os baldios da Serra do Pisco, apenas do Boco e de Vila Curta, mas estes eram baptizados e sepultados na Venda do Cepo, mas já não vive lá ninguém. Confirmou que é Presidente da Assembleia Geral desde 2009 e que é comparte; e que foi quem teve a iniciativa para avançarem com a constituição formal da assembleia; que a área dos baldios foi com base em cartografia militar cedida pelo ICNF, confirmando as confrontações, e que a casado guarda florestal estará dentro dos baldios, tal como o cruzamento que vai para Casal de Monte e que a casa de OOO e RRR está fora do baldio a cerca de 30 metros da extrema mais próxima do baldio e que um pinhal que ardeu mais próximo da Venda do Cepo também está dentro do baldio mas que uma parte será de um particular e a casa mais próxima da Venda do Cepo é de cerca de 30 metros – foi confrontado com o mapa/carta militar junto a fls. 17/verso – e que a área em causa terá sido a cedida; foi confrontado com fls. 199; no início não sabia os limites concretos do baldio e que estes não correspondem ao que consta no documento de fls. 17/verso;

Relativamente à presença do prof. TT na referida reunião, referiu que ele presenciou a reunião, tal como o Mandatário da 1ª Ré, mas não houve oposição da parte dele ou de qualquer pessoa ao que se estava a fazer, nem informaram que estava a ser constituída outra assembleia de compartes;

Relativamente ao contrato celebrado entre a Junta de Freguesia de Santa Maria e a D..., teve conhecimento muito tempo depois de ter sido celebrado – confirmou ter estado presente numa reunião na Câmara Municipal de Trancoso em Março de 2011 (fls. 222); referiu-se ainda ao email enviado por AA;

4. SS, engenheira florestal, mestre em Gestão e Conservação da Natureza, que esclareceu conhecer os Baldios da Serra do Pisco e outros baldios desta região no âmbito da sua actividade. Referiu-se ao litigio entre compartes diferentes dos baldios existentes; relativamente ao baldio de Venda do Cepo, não sabe precisar a área porque os limites cartográficos no regime florestal podiam abarcar baldios e terrenos particulares dentro do perímetro daquele regime; muitas pessoas deixaram de ter noção dos limites e as vendas dos materiais lenhosos levou a que fosse necessária a constituição das assembleias de compartes.

Referiu-se à cartografia e à falta de rigor, bem como às dificuldades de delimitação, dando alguns exemplos e que não fez esse trabalho na Serra do Pisco.

Confirmou ter estado em algumas reuniões para constituição da Assembleia de Compartes da Venda do Cepo; e a finalidade era para a distribuição do rendimento do material lenhoso porque não podia ser entregue às juntas de freguesia – a única questão era ser ou não comparte;

Apenas depois de constituída a assembleia de compartes é que se iriam pronunciar sobre os limites do baldio.

Relativamente ao Parque Eólico, está dentro do perímetro florestal.

5. SSS, engenheiro florestal, residente na Guarda, esclareceu conhecer os Baldios da Serra do Pisco por ter feito um trabalho realizado nesse local, para identificar os baldios, mas que não concluiu. A testemunha foi confrontada com o Doc.1 junto com a Contestação a fls. 199.

Referiu que foi contactado para fazer um levantamento dos limites do baldio, tendo iniciado pelos aerogeradores e identificado marcos, tendo esse trabalho ficado incompleto; foi confrontado com fls. 199;

6. MMM, engenheiro florestal, trabalha na Federação Portuguesa de Caça, residente em ..., que referiu conhecer os Baldios da Serra do Pisco por ter trabalhado para a Associação Florestal Pisco Távora de Trancoso, trabalho público orientado pelo ICNF.A testemunha foi confrontada com o Doc.1 junto com a Contestação a fls. 199.

Referiu-se ao perímetro florestal existente na zona, onde existem vários baldios, conhecidos como os baldios da Serra do Pisco, Aldeia Velha e de Rio de Mel;

A aldeia mais próxima dos baldios da Serra do Pisco é a Venda do Cepo por estar na base; tendo contactado com pessoas que ali iam buscar castanhas e lenhas e iam a pé para a serra;

Relativamente ao Parque Eólico, a maior parte das torres estão nos baldios da Serra do Pisco;

Esclareceu que começou a conhecer as pessoas da Venda do Cepo, porque a sua mulher trabalhava no mesmo gabinete da mulher da testemunha de CC e esta foi fazendo perguntas sobre a possibilidade de constituição da assembleia de compartes para gerir o baldio; descrevendo aquilo que fez para auxiliar na constituição da assembleia de compartes;

Referiu que foi quem indicou GGG à testemunha CC, porque aquele trabalhava nas energias renováveis.

Relativamente aos limites, conhece o limite superior por terem feito limpezas para o ICNF e para lá desse limite eram terrenos privados e viu cruzes na parte mais à esquerda do baldio; relativamente ao documento de fls. 199, referiu que mancha mais clara seria o limite do baldio e, foi ainda confrontado com o documento de fls. 17/verso, referindo que o baldio terá cerca de 400 ha.

Mais se referiu a outros baldios e que o baldio de Castaíde poderia confrontar com o baldio da serra do Pisco.

Segundo a testemunha a terra mais próxima de um dos limites do baldio é a Venda do Cepo. Outra próxima seria o Boco, mas tem umas ruínas.

7. NN, 41 anos, avicultor, residente na Venda do Pisco, que referiu conhecer os Baldios da Serra do Pisco.

Referiu-se apenas ao que ouviu falar.

8. DD, engenheiro florestal, residente em ..., esclareceu conhecer os Baldios da Serra do Pisco, por ter efectuado trabalhos no terreno, marcação e delimitação de prédios rústicos para a “C...”.

Fez o levantamento dos prédios rústicos do espaço potencial para a construção do parque eólico, tendo-se limitado a identificar pontos referidos pelas pessoas, cruzes e marcas, tendo sido confrontado com o documento de fls. 17/verso.

9. QQ, 60 anos de idade, técnico de turismo, residente em ..., ..., que esclareceu ter nascido e sido criado na Serra do Pisco, onde o pai foi Guarda Florestal e que a casa onde habitavam distava cerca de 2 Km da Venda do Cepo, aí viveu até aos 12 anos de idade. Referiu que via as pessoas na serra do Pisco a apanhar lenha e mato para os animais e a pastorear (mas eram poucos e da Venda do Cepo não tendo visto alguém de outros lados), mas eram dos anexos de Venda do Seco e nenhuma de Rio de Moinhos, Trancoso …

Referiu que o pai não era da Venda do Cepo, foi para lá como Guarda Florestal em 1960 e esteve lá até 1988/89 e foi quem praticamente abriu todas as estradas que existem na serra;

Não sabe a área do baldio, mas conhece a serra melhor que as mãos e que há áreas do baldio mais próximas do Boco e de Rio de Moinhos do que da Venda do Cepo, mas apenas estes é que utilizavam o baldio, porque nos Montes quase não havia habitantes e não utilizavam a serra para tirar algo, ou sequer trabalhado lá, tal como as pessoas de Rio de Moinhos.

Esclareceu que há 3 casas do Guarda Florestal na serra do Pisco, tendo vivido na casa de Venda do Cepo que está dentro do baldio.

Nas testemunhas arroladas pela 1ª Ré e pela Interveniente Principal:

10. TT, professor em ..., residente em Trancoso, que esclareceu ter sido Presidente da Junta de Freguesia da Venda do Pisco de 1997 a 2013.

Referiu que quando se iniciou o “processo” era Presidente da Junta de Freguesia – esclareceu que a Câmara Municipal informou a Junta de Freguesia que estava previsto a construção de um parque eólico e que o local ideal seria na Serra do Pisco e reuniram e propuseram a junta iniciar o processo de constituição de uma associação de compartes por ser mais fácil do que serem as pessoas a fazê-lo; antes das reuniões, preocupou-se em ir aos domingos às localidades onde havia missa e iam à casa do povo e dizia o que estava pensado para a serra e todas as pessoas manifestaram vontade e deram essa iniciativa à junta de freguesia: foi a todas as localidades – Miguel Choupo, Venda do Cepo e Rio de Moinhos – foi várias vezes à venda do Cepo e falava com pessoas quando as encontrava; nos contactos que fez, nenhum habitante levantou objecção a que se reunissem estas povoações na associação – na reunião formal estiveram presentes pessoas de Venda do Cepo (16 de Fevereiro de 2009), tendo até assinado a acta o BBB, o III e o ZZ; relativamente a esta localidade, quem despoletou o processo foi o CC e previamente não esteve nas reuniões mas apenas na de 16 de Fevereiro;

Relativamente ao contrato com a D... para instalação do parque eólico – 1 de Abril de 2009 – o CC teve conhecimento quando estiveram na Câmara Municipal em 23 de Fevereiro de 2011, a ver se podia haver entendimento entre as partes, estando também um representante daquela empresa – engº G...; quando foram assinar o contrato, o CC perguntou se iam assinar o contrato e também na troca de processos das assembleias de compartes terá tido conhecimento do contrato;

Antes de 1997 e até à constituição das assembleias de compartes nunca houve desentendimentos em relação à utilização dos baldios.

Relativamente às receitas do parque eólico, são geridas em obras a favor da comunidade; a obra mais avultada foi a ligação em alcatrão entre Miguel Choupo e Venda do Cepo e entre esta e Rio de Moinhos; a gestão é separada da gestão autárquica;

Relativamente ao artigo 62º da contestação, reunião na casa do povo de Venda do Cepo – 23 de Fevereiro de 2009 – foi lá para evitar a ruptura de amizade entre as pessoas porque as pessoas começaram a desconfiar umas das outras e porque se houvesse duas assembleias de compartes o processo ia atrasar-se e queria que eles integrassem a “nossa” assembleia – ia lá para demover o CC de constituição da assembleia de compartes;

Apesar da situação, como a assembleia de comparte de Santa Maria começou antes, não hesitou em assinar o contrato.

Foram um bocadinho “forçados” pela Câmara, não podiam desperdiçar. Iniciado o processo não é pessoa de desistir das “coisas”.

Não se recorda de ter conhecimento da carta enviada pelo AFN a MM a alertar para a existência de outra assembleia de compartes.

11. EE, 88 anos de idade, natural e residente em Sintrão, Trancoso, que referiu que, quando tinha 15 anos foi à Serra do Pisco fazer uma “lavoeira” com o pai para semear o centeio e ia por vezes à serra apanhar “giestas e sargaços” – o pai foi lá 2 anos.

Referiu que passavam pela Venda do Cepo, o pai ia à taberna e nunca ninguém lhes “ralhou”.

Cultivavam apenas o centeio na lavoeira, e a mesma ficava a cerca de 100 metros do talegre (onde a testemunha e outras raparigas foram ver o talegre – ponto mais alto da serra).

Referiu que outras pessoas do Sintrão iam para lá com as ovelhas, incluindo o pai e os irmãos da testemunha – ouvia dizer que o UU também tinha ido;

Os pastores que via iam do Sintrão, Rio de Moinhos, do Boco, dos Montes. Também havia cabradas da Venda do Cepo. As pessoas de Rio de Moinhos, do Boco, iam buscar lenha e fazer carvão para vender em Trancoso (não as via lá, mas em Trancoso).

Ia com uma tia buscar a bolota e as abróticas para os porcos;

Não sabe se Sintrão tinha outros baldios perto;

Para irem para a serra do Pisco tinham que passar pela Venda do Cepo. E também de Rio de Moinhos.

Referiu ainda ter andado à resina, no Boco e Vila Curta e na Quinta dos Gravelhos, que era a única do Sintrão e que havia mais raparigas da Venda do Cepo.

12. FF, 76 anos de idade, natural da ..., que pertence à freguesia de São Pedro em Trancoso, residente em Benfica ..., ..., esclareceu que viveu até aos 18 anos na Quinta da Sobreira, perto da Serra do Pisco.

Referiu que a quinta dos pais partia com o baldio e viam tudo para a serra e que não iam para o baldio porque não tinham necessidade, mas chegaram a ir para o baldio familiares, que nomeou -TTT e UUU, que vivam em Miguel Choco, com rebanho e vacas porque não tinham possibilidades de as pastorear e também iam buscar lenha;

Via aquelas pessoas a irem ao topo da serra.

Um tal de VVV, também ia para o topo com um rebanho.

A aldeia que fica junto à Serra do Pisco, mais próxima, é a Venda do Cepo.

13. GG, 82 anos de idade, agricultor reformado, residente em Rio de Moinhos, que esclareceu que desde sempre viveu em Rio de Moinhos, a cerca de 2 Km da Serra do Pisco, onde ia pastorear as ovelhas dos pais mais os irmãos, e onde iam buscar lenha para o forno para cozer o pão.

Rio de Moinhos à Venda do Cepo são cerca de meia hora;

Iam buscar lenha para o forno à serra do Pisco, porque tinham pouca lenha; esclareceu que foi pastor até aos 20 e poucos anos, também acompanhou os irmãos para o baldio, para onde lhes apetecesse pois faziam de conta que fosse “deles”; levavam o rebanho quase todos os dias para perto do talegre; iam vários pastores de Rio de Moinhos, nomeadamente o WWW, o XXX, o YYY, o filho do tio II e também apanhavam lenha; também iam pastores de Miguel Choco (segundo ouvia dizer), da Venda Cepo mas estes eram mais cabras; dos Montes, ia o UU;

Referiu ainda que um tal de ZZZ ia buscar abróteas para os animais, tal como os pais da testemunha;

Que também iam pessoas, mais pobres, fazer carvão (AAAA, o PPP e o BBBB de Rio de Moinhos) para venderem em Trancoso. Mas não sabe se iam pessoas fazer carvão de Venda do Cepo pois não andavam a ver quem andava lá … e desta aldeia nunca lhes disseram para saírem do baldio nem houve discussões.

Segundo a testemunha o baldio tem 400 ou 500 ha.

Mais referiu que não tinham que passar pela Venda do Cepo pois passavam junto à quinta do Vale das Gralhas, onde existia uma ponte estreita sobre o rio, e os animais passavam pela água, mas quando chovesse muito não iam para lá. Na primavera iam todos os dias. Ia ao baldio quem queria das aldeias do Monte, Boco, Rio de Moinhos, Venda do Cepo e Miguel Choco (mas menos) e de Sintrão.

Esclareceu que Rio de Moinhos é uma aldeia pequena e quando iam para o baldio eram umas 100 pessoas.

Na Venda do Cepo seriam também 100 pessoas.

A aldeia mais perto da serra é o Boco e Vila Curta, mas não vive lá ninguém. Os Montes também ficam perto.

14. HH, 81 anos de idade, agricultor reformado, natural de ..., residente em ..., que disse que dos 11 aos 14 anos foi servir para a Venda do Cepo como pastor e ia para a Serra do Pisco pastorear as ovelhas.

Enquanto esteve na Venda do Cepo andava com as ovelhas no baldio, subia até ao talegre (onde estão as eólicas) e encontrava-se com pastores dos Montes (PPP, II, CCCC), Rio de Moinhos ((DDDD, WWW, EEEE e FFFF), do Boco (GGGG e o HHHH) e de Venda do Cepo; não iam de Sintrão e de Miguel Choco (IIII e o XXX) mas estes subiam à casa do Guarda Florestal; da Venda do Cepo havia muitos (JJJJ, KK, PP, KKKK), esclarecendo que quem não tinha baldios ia para ali …

Referiu-se ainda que jogavam à bola numa direita grande “arrumada” ao talegre.

Mais referiu que pessoas de Rio de Moinhos iam buscar sargaço para fazer borralho para as braseiras e lenha (PPP, LLLL, MMMM e NNNN) e também alguns da Venda do Cepo (OOOO e XXX); Nunca ouviu dizer que os baldios não eram dele, ou para tirarem as ovelhas. Não havia agricultura lá.

Quanto plantaram a floresta deixaram de andar os rebanhos na serra.

Deixou de ir para o baldio a partir dos 23 anos de idade.

Das pessoas que viviam em Rio de Moinhos apenas as que nomeou é que iam para o baldio.

15. II, 74 anos de idade, reformado de agricultor/carpinteiro, nascido no ..., residente em Rio de Mel há 40 anos, que disse que nasceu e viveu no Boco até aos 21 anos, perto da localidade dos Montes e conhecer bem a Serra do Pisco (iam lá fazer carvão e buscar abróticas e feno).

Esclareceu que tem que passar pela Venda do Cepo para ir para o Boco e antes de chegar, vai-se para Vila Novinha, Montes.

No Boco vai uma senhora com os filhos passar lá uns dias, férias, mas já não vive ninguém em permanência há 15 anos.

Referiu conhecer o baldio, começa a 100 metros do Boco, casa onde nasceu, existindo no local uma cruz florestal, ficando mais perto do que a Venda do Cepo do baldio.

Que conhecia bem as pessoas dos Montes (fica a cerca de 700/800 metros do Boco) e iam, tal como as pessoas do Boco ao baldio buscar a lenha, semeavam o centeio nas lavoeiras e carvão, cortavam feno no alto da serra perto do posto de vigia, que fica a cerca de 100 metros do talegre. Também iam buscar abróticas para darem de comer aos porcos. Havia pastoreio, mas já não chegavam ao cimo porque estava o pinhal semeado, tendo nomeado os seguintes pastores: CCCC, GGGG, CCCC, QQ, PPPP, QQQQ e RRRR; da Vila Curta também iam pessoas ao baldio; de Rio de Moinhos o WWW;

16. AA (testemunha comum à Ré B...), engenheiro / gestor de projetos, residente em ..., que esclareceu ter feito um projecto para instalação das eólicas na Serra do Pisco.

Na qualidade de gestor do projecto contactou com as duas assembleias de compartes para celebração do contrato de cessão de exploração e avançarem com a obra de instalação de aerogeradores. Confirmou o email, a solicitar autorização para o corte de árvores para a instalação do projecto – o CC seria o interlocutor da 1ª Autora; explicou a finalidade, várias vezes, o que aquele percebeu, mas foi difícil de obter a declaração, tendo demorado alguns meses;

Relativamente às obras, iniciaram-se no último trimestre de 2014, com a abertura dos acessos.

Esclareceu que os primeiros contactos com as autoridades foram a partir de 2009, com a Câmara Municipal de Trancoso, tendo sido celebrado um contrato; tentaram perceber quem eram os proprietários daquela área e quanto aos baldios, tinha um colega de campo que soube da assembleia de partes constituída com quem terá contactado a fim de ser celebrado o contrato de exploração; a construção do parque durou cerca de 1 ano, tendo terminado no último trimestre de 2015.

Mais se referiu ao estudo económico, retorno do investimento, vida útil, que será de 25/30 anos e retorno do investimento em 7/8 anos, sendo o valor do investimento de 55.000.000,00 euros. Relativamente à D..., o contrato teria sido celebrado com a Assembleia de Compartes de Santa Maria representada pela Junta de Freguesia e a contrapartida era paga a esta (entidade gestora do negócio) – foi apresentada documentação suficiente de a assembleia estar constituída e necessitaram de autorização da 1ª Autora, por estar sujeita ao regime florestal, necessitando de autorização expressa da AFN que lhes referiu o diferendo existente e necessidade de autorização das duas assembleias; autorização para o corte para instalar o parque – e que a minuta foi feita pelos advogados da B... – doc 23 junto à petição inicial; a contrapartida pela exploração do Parque Eólico é feita à única entidade com quem celebraram o contrato – Junta de Freguesia de Santa Maria;

Relativamente às cartas de Maio de 2009 enviada a MM e à D... de 19 de Junho de 2011 – referiu conhecer esta, mas continuaram a pagar.

17. JJ, 82 anos, residente em Trancoso, que disse ter sido pastor na Serra do Pisco na década de 50 a 60 e mais tarde Guarda Florestal em Gouveia e em Trancoso.

Relativamente ao baldio, referiu que apascentava um rebanho de cabras e de ovelhas do pai e do avô, residente nos Montes; andou sempre à vontade, na parte norte onde estão as torres eólicas, no talegre, marco geodésico; andavam lá mais uns 7 ou 8 (SSSS, HHHH e o LLLL, TTTT e UUUU, todos dos Montes), do Boco (GGGG, VVVV), do Rio de Moinhos (GG, WWW), de Sintrão, de Miguel Choco e de Venda do Cepo também iam pastores;

Faziam lavoeiras, incluindo os pais da testemunha, também pessoas de Rio de Moinhos e não sabe de Miguel Choupo e os de Sintrão iam de vez em quando, não se lembrando dos nomes; havia lavoeiras perto do talegre, nomeadamente um UUUU que era dos Montes;

Iam cortar mato, fazer borralho e arrancar raízes para carvão (HHHH e o CCCC; o PPP de Rio de Moinhos); lenha havia pouca; também iam da Venda do Cepo e nunca houve reclamação.

Relativamente aos limites do baldio, referiu cruzes e marcos, referiu que tem cerca de 400/500 ha.

A aldeia mais próxima é a Venda do Cepo, depois a Vila Curta, Montes e Boco; a Venda do Cepo tem mais pessoas que os Montes, mais ou menos igual que Rio de Moinhos e Miguel Choco; e iam pessoas das aldeias consoantes as necessidades;

Rio de Moinhos e Miguel Choco ficam mais afastados e têm outro terreno baldio, os que iam ao baldio eram os mais necessitados.

A casa do guarda, cruzamento para a estrada da serra, ficam no baldio.

18. II, 80 anos, residente na Guarda, disse ter nascido em ..., numa quinta, onde viveu até aos 25 anos.

Referiu que o baldio era de todos, não era só da Venda do Cepo, que até ia lá fazer as lavoeiras, semear centeio, buscar lenha. Iam os vizinhos de Vila Curta e iam dos Montes e de mais lados, o UUUU, LLLL, WWWW, XXXX; da Venda do Cepo o YYYY, ZZZZ, AAAAA, LLLL; de Rio de Moinhos iam com os gados: GG e BBBBB; de Sintrão e de Miguel Choco, o IIII e iam até ao talegre. Faziam carvão e borralho;

Cruzavam-se com pessoas da Venda do Cepo, mas nunca ninguém disse nada. Mais falou dos limites do baldio, não sabendo a área. A venda Cepo é a nascente, mais próxima do baldio e do lado poente o Casal do Monte (perto do Carapito).

As outras mais perto do baldio são Boco e Vila Curta.

A povoação mais perto de Vila Curta é o Boco e depois a Venda Cepo.

No Boco não vive ninguém.

19. KK, engenheiro topográfico, residente na ..., que esclareceu que fez um levantamento topográfico a pedido do legal representante da Ré União de Freguesias de Trancoso e do engº MM. A testemunha foi confrontada com os documentos/plantas juntos a fls. 18, 199 e 200.

Confirmou ter sido indicado como perito, tendo ido ao local durante 1 dia a fazer um levantamento e foi por indicação das pessoas de idade de Venda do Cepo e de Rio de Moinhos e Vila Curta, que lhes indicaram as cruzes numeradas. Também havia o caminho florestal e a cumeada. Assinalou as cruzes no mapa de fls. 199, cujo teor confirmou.

Fez um primeiro levantamento da zona do talegre até à estrada, no local onde estão as antenas;

Necessitou no total de 3 dias para fazerem o perímetro.

Relativamente aos documentos de fls. 17 e 18, referiu que a mancha tem o mesmo formato e está bem transposta no de fls. 199.

Relativamente à casa do Guarda Florestal, cruzamento e casa da dona OOO ficam fora do mapa, fora do baldio a fls. 17 a cerca de 200 metros. A Venda do Cepo ao Baldio fica mais perto, a cerca de 500 metros; Miguel Choco não está no mapa; Rio de Moinhos a 1.500 metros tal como os Montes.

20. RR, 59 anos, técnico administrativo desempregado, residente no distrito de Santarém, disse ter dado apoio na constituição da Assembleia de Compartes dos Baldios de Santa Maria em 2009 a pedido do Engº MM, legal representante da Ré União de Freguesias de Trancoso, por quem foi contratado.

Teve conhecimento que haveria a intenção de se constituir uma outra assembleia de compartes na mesma localidade. Referiu-se à florestação na 2ª metade da década de 50, tendo sido um processo moroso, controlado pelo Estado que penalizou os agricultores e pastores que seriam multados se fossem apanhados no perímetro. Mais se referiu às utilidades dos baldios, antes e depois da reflorestação.

Não sabe se os baldios estão a ser utilizados.

21. BB, (testemunha da 2ª Ré) topógrafo, residente em ..., também trabalhou na contratação de terrenos, contacto de proprietários para promotores, cessões de exploração.

Relativamente ao Parque Eólico do Pisco, acompanhou desde que se iniciou a construção desde o final de 2014 a 2015 – tendo começado a funcionar no final deste ano, por fases enquanto os geradores foram feitos.

No período inicial, contactou com os proprietários, nos baldios e com privados – anteriores a 2014, mas mais intenso nesse ano. Receberam a posição no contrato, tendo sido tratado pela D..., e os contactos que a testemunha teve a ver com autorizações, ao ICNF, cortar árvores, mas relativamente às autorizações foi tratado pelo engº AA;

Referiu que na construção tiveram que utilizar explosivos porque havia muita rocha pelo que as populações tinham evidências que estava a ser construída alguma coisa (Novembro/Dezembro de 2014).

*

Da análise da prova produzida e que fundou a convicção do Tribunal, há que dizer, relativamente aos factos provados, que assim foram julgados com base na análise conjunta de toda a prova produzida, acabando por se recolherem da prova elementos coincidentes que permitiram concluir pela dinâmica dos factos nos termos provados e que resultou da conjugação dos factos articulados pelas partes com os documentos juntos aos autos.

Quanto aos demais factos que não resultaram provados, tal aconteceu em virtude de a prova documental não ter sido suficiente e idónea para prova de tais factos, ou encontrarem-se os mesmos em contradição com os factos julgados provados.

Ora, quanto à identificação, nomeadamente em termos de localização, confrontações e área, dos terrenos em causa nos presentes autos, designadamente a sua correspondência com os que se encontram delimitados na planta junta pelos autores como documento nº 1, verifica-se que tal planta não engloba a totalidade dos terrenos que compõem o baldio, mas apenas a parte dos terrenos e localização necessárias à implementação do parque eólico. De facto, também aceite pelas Autoras, a área do baldio é a constante do mapa junto a fls.199, pela 1ª Ré, bastando, até, sobrepor ambos os mapas para verificar que a planta junta com a petição inicial corresponde à área inicialmente afecta ao futuro parque eólico.

A diferença de áreas, não impede a conclusão de que os terrenos baldios em causa nos autos têm, em termos de localização, confrontações e área, alegados pela 1ª Ré, pois, o mapa junto com a petição inicial tem a ver com a área pretendida para ser cedida à 2ª Autor e que se inclui nos terrenos baldios, cuja área é muito superior.

Por outro lado, da conjugação dos meios de prova, com maior relevância, o depoimento de parte, declarações de parte e depoimentos das testemunhas, apenas se pode concluir que a comunidade local da de Venda do Cepo exercia em exclusividade actos, sobre tais terrenos, o que resulta da própria configuração do terreno e proximidade da aldeia, que é a mais próxima dos baldios em termos de acessibilidade, bastando analisar os documentos juntos a fls. 199, 363/364 e 425 e seguintes para assim se concluir. E que o outro lugar mais próximo é o Boco, mas não tem residentes com carácter de permanência.

É verdade que foram inquiridas várias testemunhas, indicadas pela primeira ré, cujos depoimentos se descreveram, mas foram parciais nos depoimentos que prestaram. Basta relê-los para se concluir que tentaram “apagar” a existência de Venda do Cepo e dos seus habitantes como sendo os residentes na aldeia que utilizava permanentemente os baldios para as suas actividades agrícolas e de pastorícia e nenhuma das testemunhas falou dos obstáculos existentes para se chegar ao talegre, ou sequer da necessidade de o fazerem, sabendo-se da existência de outros baldios nas aldeias onde residiam. E preocuparam-se em dizer que nunca lhes foi dito para não utilizarem os baldios – essa “preocupação” e até a falta de espontaneidade, faz concluir que, se utilizavam os baldios, era por mera tolerância dos habitantes de Venda do Cepo ou porque tinham familiares nesta localidade.

Não há, assim, dúvidas, de que os habitantes de Venda do Cepo, desde tempos imemoriais possuíram, geriram e utilizaram tais terrenos tal como descrito na petição inicial, admitindo-se, no entanto, que alguns habitantes de outras localidades também se servissem dos terrenos, mas com permissão da comunidade local de Venda do Cepo.

Ora, dos depoimentos prestados, e também dos documentos (actas e contratos), verifica-se o interesse da D... em instalar um parque eólico cuja localização coincidia com parte dos baldios em causa nos autos e que, após contacto com a Câmara Municipal de Trancoso, foi transmitido à 1ª Ré, na pessoa do seu presidente, em funções à data, que procedeu como descrito nas contestações.

Mas qual foi a intenção?

Como referido pelo próprio – repete-se - estava previsto a construção de um parque eólico e o local ideal seria na Serra do Pisco, reuniram e a junta propôs-se em iniciar o processo de constituição de uma associação de compartes por ser mais fácil do que serem as pessoas a fazê-lo - preocupou-se no depoimento em realçar que até foram pessoas de Venda do Cepo e das 4 que estiveram presentes 3 assinaram, mas não obstante saber que os compartes de Venda do Cepo pretendiam constituir assembleia de compartes, procurou demovê-los de o fazer, e não o conseguindo, não deixou de assinar o contrato com a D... para instalação do parque eólico em 1 de Abril de 2009 – ou seja, “afastaram” a comunidade de Venda do Cepo de todo o processo e, como disse o mesmo – “foram um bocadinho “forçados” pela Câmara, não podiam desperdiçar. Iniciado o processo não é pessoa de desistir das “coisas””. Mas a verdade é que já estava constituída a Assembleia de Compartes da Venda do Cepo, tendo a constituição dos órgãos de gestão dos baldios pelos compartes de Venda do Cepo cumprido o formalismo legal, contrariamente ao alegado pela 1ª Ré, tendo a Assembleia de Compartes dos Baldios da Serra do Pisco sido validamente constituída e reconhecida pela entidade pública com poderes de supervisão.

Factos que não podem ser desconhecidos das Rés. Até porque foi necessária a autorização para o abate das árvores – se não estivesse validamente constituída, a autoridade de supervisão não exigiria a autorização e se não fosse aquela autorização, ainda hoje não tinha sido construído o parque eólico.

Conseguida a autorização, a “barreira” que permitiria a construção do parque eólico foi ultrapassada, já não sendo necessário preocuparem-se com a 1ª Autora, não obstante a mesma ter poder de gestão sobre os terrenos baldios em causa nos autos e não ter dado acordo à cessão da exploração à 2ª Ré (facto que não podiam desconhecer atenta a existência dos dois Conselhos Directivos arrogando-se legitimidade e conhecimento dado pela autoridade de supervisão).

E tendo a 1ª Autora aqueles poderes, só pode considerar-se válido o contrato celebrado com a antecessora da 2ª Autora.

Por outro lado, dos elementos de prova, resulta claro que, com o abate de árvores, iniciou-se a execução dos trabalhos de construção do Parque Eólico, tendo durado cerca de 1 ano – e que o valor gerado pela implementação do parque eólico e os prejuízos causados pelo seu desmantelamento é o alegado pela 2ª ré na contestação, mas a 1ª Autora, que deveria ser a beneficiária das rendas estabelecidas, até hoje ainda não recebeu qualquer contrapartida pela utilização do espaço onde foi implantado o parque eólico – situação que deve ser reparada. No entanto, considerando os prejuízos resultantes ou previsíveis do desmantelamento do parque eólico e não tendo as Autoras se oposto, nomeadamente, paralisando a construção do parque em tempo útil, ou seja, antes de estar concluído o processo de investimento, não podem pretender que a 2ª Ré entregue o terreno, live e devoluto de construções, ou seja, do parque.”.

Note-se, em primeiro lugar, que a 2ª R. impugna os factos não provados 44., 45., 46. e 50., mas eles não existem ! só existem 43 factos não provados.

Note-se, em segundo lugar, que ambos os recorrentes impugnam 2 factos que foram eliminados, por via de rectificação, por decisão da 1ª instância – os factos não provados 13. e artigo 7 da contestação da 2ª R. -, sem reacção dos apelantes.

Note-se, em terceiro lugar, que a 1ª recorrente impugna 4 factos – os factos provados 57., 77., 104. e 298. -, que atrás (ponto 4.2.), já foram por nós eliminados, e que, por isso não cabe apreciar.

Quanto à restante factualidade, é hora de relembrar que os recursos ordinários são, entre nós, recursos de reponderação e não de reexame, visto que o tribunal superior não é chamado a apreciar de novo a acção e a julgá-la, como se fosse pela primeira vez, indo antes controlar a correcção da decisão proferida pelo tribunal recorrido, face aos elementos averiguados por este último.

É, por isso, constante a jurisprudência no sentido de que aos tribunais de recurso cabe apenas reapreciar a decisão do tribunal a quo, com vista a confirmá-la ou revogá-la. Ou seja, não cabe ao tribunal ad quem, fundamentar as decisões sob recurso, xcomo se fosse a primeira vez. 

Dizemos isto, pois está em jogo a apreciação de, salvo erro, 86 factos. Nessa apreciação estão envolvidas, além de 2 pessoas em depoimento e declarações de parte, 17 testemunhas, 14 indicadas pela 1ª R./recorrente, algumas delas comuns à 2ª R., mais 3 diferentes indicadas pela 2ª R./recorrente E, ainda, inúmeros documentos.

A fundamentação da decisão de facto incidiu sobre 349 factos (provados e não provados).

Na mesma, o julgador indica os docs. tidos em consideração, mas simplesmente narrando o seu teor.

Quanto às 21 testemunhas ouvidas, também se fica pela narração dos seus depoimentos.

Mas quando atinge o momento de realizar a análise crítica das provas, indicar as eventuais ilações tiradas dos factos instrumentais e especificar os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, tomando, ainda, em consideração os factos eventualmente admitidos por acordo, provados documentalmente ou confessados, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo da matéria apurada as presunções impostas por regras de experiência (art. 607º, nº 4, do NCPC), efectiva uma resenha crítica mais ou menos sumária e nalgumas partes genérica.

Os apontados factos que cabe apreciar (provados e não provados) são na sua larga maioria essenciais, porquanto serviram, como consta expressamente da sentença recorrida, para julgar a acção parcialmente procedente e a reconvenção improcedente.  

Repetimos. Na decisão de facto o juiz declara quais os factos provados e não provados de acordo com a sua convicção; esta convicção tem de ser fundamentada, devendo o julgador especificar as razões que o levaram à decisão tomada sobre a verificação de cada facto (art. 607º, nºs 4, 1ª parte, e 5, 1ª parte, do NCPC).

Será desejável que o julgador providencie uma motivação facto a facto, mas pode dar-se o caso, sem grande inconveniente, de haver uma motivação em conjunto quanto a um grupo de factos, desde que os mesmos se apresentem entre si ligados e sobre eles tenham incidido fundamentalmente os mesmos meios de prova. Já a fundamentação em bloco, sem as devidas especificações, é desaconselhável, por potenciar dúvidas sobre quais os meios probatórios que serviram para explicar aquela determinada resposta de facto. Podendo, mesmo, tornar-se imperceptível como é que o julgador, racional e criticamente, fez o caminho partindo dos meios de prova produzidos até ao resultado final, a resposta dada à factualidade elencada.

Torna-se, pois, imperioso, perceber com clareza a motivação, já que a mesma, além de reforçar o auto-controlo do julgador, facilita o reexame da causa, sendo, ainda, um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao acto jurisdicional (cfr. L. Freitas, CPC Anotado, Vol. 2º, 2ª Ed., nota 3. ao anterior artigo 653º do CPC, pág. 660/661).

Ou noutra formulação, a dita exigência legal impõe, que de acordo com as circunstâncias, se estabeleça o fio condutor entre a decisão da matéria de facto (resultado) e os meios de prova que foram usados na aquisição da convicção (fundamentos), fazendo o julgador a respectiva apreciação crítica nos seus aspectos mais relevantes (vide A. Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2ª Ed., nota 8. ao anterior artigo 712º do CPC, pág.289).  

No nosso caso, temos, do julgador de facto, uma motivação em bloco, como atrás salientámos. Uma resenha crítica mais ou menos sumária e em algumas partes genérica.

Ressalta da análise da motivação da sentença recorrida, que o julgador de facto para a sua decisão se estribou em acordo das partes nos articulados e em 3 meios de prova, que afirmou ter conjugado: os diversos documentos referidos; os depoimento e declarações de parte; os diversos depoimentos das testemunhas ouvidas.

Cabe, contudo, lançar a seguinte interrogação. Mas em concreto, do manancial de elementos probatórios, quais são os documentos em concreto, quais as testemunhas individualizadas, que permitiram dar por provado os aludidos factos - facto a facto, ou em conjunto ?

Essa especificação não se mostra feita, ou pelo menos não se mostra captável e/ou compreensível com suficiente transparência. E essa clareza ou isenção de dúvidas é exigível, porquanto tendo a referida matéria sido impugnada o poder de reapreciação desta Relação só será conscienciosamente exercitado se ficar claro o caminho traçado pelo julgador desde a aquisição da convicção até às respostas de facto concretamente dadas.

Impõe-se, pois, aplicar o art. 662º, nº 2, d), do NCPC, relativamente a tais factos essenciais, pois a decisão de facto não está devidamente fundamentada, neste devidamente tanto se compreendendo a total falta de fundamentação, como a fundamentação na prática quase ausente/patentemente insuficiente, ou a não clara ou não inteligível.

E é importante relembrar que só com tal motivação mais concreta, que alicerçou a decisão da matéria de facto, a Relação tem à mão os elementos de prova de que se socorreu o tribunal de 1ª instância, estando, assim, habilitada a exercer censura sobre tal decisão, apreciando a prova produzida e modificando, se for caso disso, as respostas (nos termos dos arts. 640º e 662º do NCPC). 

Sendo uma asserção válida e judiciosa, já se compreende bem melhor a importância de uma motivação de facto que estabeleça o tal fio condutor entre a decisão da matéria de facto (resultado) e os meios de prova que foram usados na aquisição da convicção (fundamentos), fazendo o julgador a respectiva apreciação crítica nos seus aspectos mais relevantes.

O mesmo é dizer no nosso caso, que se impõe que se clarifique quais foram em concreto os depoimentos testemunhais, os documentos que contribuíram/convenceram o julgador a dar os aludidos factos como provados, se pertinente em grupos ou conjuntos de factos.

Desta sorte, ao abrigo do art. 662º, nº 2, d), do NCPC, importa determinar a remessa dos autos à 1ª instância a fim de fundamentar devidamente os referidos factos (provados e não provados) essenciais.   

5. Face ao que se explanou e vai decidir, as questões de recurso 4ª a 9ª, acima elencadas, ficam prejudicadas no seu conhecimento.

(…)

 

IV - Decisão

Pelo exposto, julga-se o seguinte:

- improcedente o recurso da 2ª R., quanto à excepção dilatória invocada e nulidade da sentença:

- procedente tal recurso, mas apenas parcialmente, quanto aos vícios da decisão da matéria de facto, nos precisos termos exarados;

- determina-se, oficiosamente, que o tribunal recorrido efectue a devida fundamentação a que se aludiu, nos termos do enumerado art. 662º, nº 2, d), do NCPC. 

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Custas conforme o que vier a ser decidido a final.

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                                                                          Coimbra, 2.5.2023

                                                                          Moreira do Carmo

                                                                          Fonte Ramos

                                                                          Alberto Ruço