Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
224/05.4JACBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FERNANDO VENTURA
Descritores: TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTE
DIMINUIÇÃO DA CULPA
SUSPENSÃO
PRISÃO PREVENTIVA
Data do Acordão: 04/16/2008
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VARA DE COMPETÊNCIA MISTA E JUÍZOS CRIMINAIS DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: UNANIMIDADE
Legislação Nacional: ARTIGOS 40º, 70º, 71º E 50º DO CÓDIGO PENAL; ARTIGO 25º DO DECRETO-LEI 15/93, DE 15 DE JANEIRO.
Sumário: I. - Na avaliação da presença de ilicitude consideravelmente diminuída, inscrita no domínio do crime de tráfico de estupefacientes privilegiado, deve proceder-se à ponderação global dos factores apurados, valorando a interdependência dos índices fornecidos pelo legislador – meios utilizados, qualidade e quantidade –, em termos de concluir pela presença de pequeno tráfico.

II. - Nessa tarefa, não relevam as condutas marcadas pela indeterminação e pela generalidade, como acontece com a inscrição nos factos provados que o arguido se dedicou à venda de estupefacientes durante cerca de mês e meio, sem especificar o tipo de substância transaccionado e a periodicidade efectiva dessas vendas.

III. - Comete o crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo artº 25º, al. a), do D.L. 15/93, de 22/1, quem detém, com destino à venda, cinco pedaços de canabis (resina) com o peso de 1,098 grs; oito embalagens de heroína, perfazendo o total de 0,874 grs.; um saco de plástico com 4,943 grs, de heroína; e outras quatro embalagens com cocaína, com o peso de 0,286 grs.

IV – A escolha pela suspensão da execução da pena de prisão atende fundamentalmente à capacidade actual do arguido de se socializar em liberdade mas encontra, como limite, as exigências de prevenção geral positiva, balanceamento que encontra relação directa com a gravidade da pena de prisão imposta.

V. - Deve afastar-se a imposição dessa pena de substituição ao arguido que cometeu crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade apenas um ano decorrido sobre o trânsito em julgado por condenação pelo mesmo tipo penal, sem que se demonstre marcada inversão de postura.

VI. - O crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo artº 25º, al. a) do D.L. 15/93, de 22/1, não admite prisão preventiva.

** Sumário elaborado pelo Relator.

Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra
 Relatório
Nos presentes autos, com o nº 224/05.4 JACBR, da 1ª secção das Varas Mistas de Coimbra, em 28/11/2007 foi proferido acórdão, nos termos do qual:
- O arguido AA. foi condenado na pena de 6 anos de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes previsto e punido pelo artº 21º nº1 do Decreto-lei nº 15/93, com referência às tabelas I-A e I-B.
- A arguida BB. na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova, pela prática em co-autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL nº 15/93, de 22-1, com referência às tabelas I-A e I-B.
- O arguido CC. …. na pena de 5 anos e 6 meses de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes previsto e punido pelo artº 21º nº1 do Decreto-lei nº 15/93, com referência às tabelas I-A e I-B.
Inconformado, vem o arguido CC. …interpor recurso, extraindo das motivações as seguintes conclusões[1]:

1°) Os factos dados como provados pelo Tribunal a quo, deveriam ter sido subsumidos ao art. 25°, al. a) do DL 15/93 de 22/1 e não ao art. 21° daquele diploma legal.

2°) A moderna jurisprudência do STJ aponta no sentido de enquadrar no art. 25°, comportamentos que outrora integravam o art. 21° do DL 15/93 de 22/1 (vide acórdãos do STJ de 24/11/99 BMJ 491/88 de 22/10/98. BMJ 480/43 e de 23/09/88, BMJ 479/252, acórdão de 28/06/2000 no BMJ 498/59).

3°) O recorrente, não exercia a actividade de forma organizada, não tinha qualquer tipo de intermediário, nem sequer tinha uma balança para pesagem do produto estupefaciente.

4°) O contexto em que se verificaram as transacções implicou necessariamente para o arguido a obtenção de lucros próprios de um tráfico de menor gravidade, crime pelo qual o recorrente deveria ter sido condenado.

5°) A ter optado por integrar os comportamentos do recorrente naquele tipo legal de crime (art. 25°), o quantum penal não deveria extravasar os três anos e seis meses de prisão.

6°) O presente do recorrente justificaria a formulação por parte do Tribunal de um juízo de prognose favorável.

7°) Assim, inexistem circunstâncias que permitam concluir que a simples censura dos factos e a ameaça da pena não sejam idóneas para a realização das finalidades que a mesma visa prosseguir, pelo que a pena a aplicar ao arguido deverá ser suspensa na sua execução.

8°) Consideramos assim que se encontram incorrectamente julgados os seguintes pontos da matéria de facto constantes do acórdão:

- Fls. 4, par. 7 onde refere que o recorrente em troca das vendas recebia dinheiro, objectos em ouro, telemóveis e outros artigos de fácil revenda (vide auto de busca à residência do arguido, depoimento da testemunha DD. … constante da cas. 2/A, v. 318).

- FIs. 4, par. 8 quando se menciona que o recorrente contava com vários colaboradores que angariavam e revendiam os produtos estupefacientes aos consumidores que demandavam as imediações do Bairro do Ingote (cfr. depoimento dos senhores inspectores DD. .. EE… constantes das cas. 1/A, v. 437 e cas. 2/A, v. 42 onde em momento algum é feita qualquer referência a estes colaboradores).

9°) As provas por nós referidas impunham decisão diversa da recorrida.

10°) Foram assim violadas as seguintes disposições legais: Art. 25° do DL 15/93 de 22/1 Art. 40° e 50° do CP
O magistrado do Ministério Público junto do Tribunal recorrido apresentou resposta, a qual terminou da seguinte forma[2]:

O juízo da prova, na falta de uma fonte de constatação directa dos factos objecto dela, pode assentar na prova de outros factos que, segundo os princípios da razão e/ou as regras da experiência comum, atento o contexto em que ocorrem, permitam concluir pela prova, para além de qualquer dúvida razoável, daqueles outros.

2 E, posto que racionalmente defensável, não tem de revestir sempre a natureza do mais linear silogismo, mas deverá corresponder, salvo quando a Lei dispuser diferentemente, à livre convicção do julgador (art° 127° do CPP).

3 O concreto modo como se provou, com ou sem protesto do recorrente, que a sua actividade era levada a cabo, designadamente o seu prolongamento no tempo, por actos reiterados, como um negócio aberto ao público, ao longo de pelo menos um mês e 21 dias, quotidianamente, sem outro modo de subsistência, tudo são factos que permitem concluir em livre convicção que os telemóveis apreendidos em casa do arguido foram obtidos mediante o tráfico, directa ou indirectamente, e que ou arguido trocava droga por dinheiro e objectos de ouro, telemóveis ou outros objectos facilmente transaccionáveis.

4 Por outro lado, conjugadas com a experiência comum, tendo em conta as quantidades que lhe foram apreendidas e o observado em vigilâncias, permitem tais factos concluir que o recorrente também vendia droga através de intermediários.

5 Por fim, e independentemente das quantidades apreendidas ao recorrente — não menos de umas 5,817 gr. de heroína, para além de 0286 gr de Cocaína - tudo menos diminutas - o mesmo circunstancialismo não deixa margem alguma para esse juízo de culpa e/ou ilicitude diminutas que é elemento do tipo de crime de tráfico de menor gravidade definido no art° 25° do DL n° 15/93.

Por tudo o exposto far-se-á Justiça confirmando-se em tudo o acórdão recorrido.
Neste Tribunal, o Srº Procurador-Geral adjunto emitiu douto parecer, no sentido da improcedência do recurso.
Cumprido o disposto no artº 417º, nº2 do CPP, não houve resposta.
Foram colhidos os vistos e realizou-se conferência.
Fundamentação
Âmbito do recurso
É pacífica a doutrina e jurisprudência[3] no sentido de que o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso[4].
Assim, as questões colocadas no recurso, com expressão nas conclusões[5], prendem-se com a impugnação alargada da decisão em matéria de facto, com referência à indicação como provado que o arguido CC. … em troca de vendas de estupefacientes recebia dinheiro, objectos em ouro, telemóveis e outros artigos de fácil revenda e que, para o efeito, contava com vários colaboradores, os quais angariavam e revendiam os produtos aos consumidores. No plano do direito, o recorrente suscita o preenchimento do tipo privilegiado do artº 25º, al. a) do D.L. 15/93, de 22/1, a redução da pena para não mais de três anos e seis meses de prisão e a verificação dos pressupostos da suspensão da execução dessa pena de prisão.
Da decisão recorrida
Vejamos, antes de mais, a decisão recorrida, nos seus elementos mais relevantes para as questões suscitadas no domínio dos fundamentos de facto, a saber, factos provados, não provados e respectiva fundamentação[6]:

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Da audiência de julgamento resultaram provados os seguintes factos:

O Bairro do Ingote é um local onde desde há vários anos se vende droga em Coimbra, facto que é público e notório.

Em finais do ano de 2005, a Polícia Judiciária foi recebendo informações de que os arguidos AA. …e BB. … estariam dedicar-se à venda de produtos de natureza estupefaciente a partir da sua residência no Bairro do Ingote, em Coimbra, particularmente cocaína e heroína, sendo fornecedor desse tipo de produtos estupefacientes um indivíduo da zona norte do País.

A essa actividade de venda de estupefacientes se dedicavam os arguidos AA. … BB. … aí residentes, o que vinham fazendo, de forma regular e reiterada, pelo menos desde Dezembro de 2005, no intuito de angariarem meios económicos.

Dela retiravam a maioria dos proveitos económicos que auferiam, pois para além do que recebiam, a título de rendimento social de inserção, escassos rendimentos lícitos angariavam, já que não desempenhavam qualquer actividade profissional regular, sendo que apenas esporadicamente vendiam tecido a metro.

Na venda de droga, os arguidos utilizavam, sobretudo, a residência que habitavam, onde os consumidores se dirigiam e lhes compravam as doses de heroína e de cocaína que comercializavam, mas também escoavam o produtos através de vários indivíduos que assim colaboravam com aqueles dois arguidos na venda dos produtos estupefacientes, contactando directamente os vários consumidores que se acercavam do Bairro do Ingote à procura de droga, a quem vendiam tal produto que recebiam dos arguidos AA. … BB. … a troco de droga para eles próprios consumirem.

Para o efeito, aqueles dois arguidos dividiam e refundiam a cocaína e a heroína, utilizando produtos de “corte”, em doses individuais, que posteriormente distribuíam por aqueles seus revendedores.

Por vezes, também vendiam directamente aos consumidores que os procurassem para o efeito na sua residência no Bairro do Ingote, recebendo em troca dessas vendas dinheiro, objectos em ouro, telemóveis e outros artigos de fácil revenda.

O preço das doses variava de acordo com o peso de produto nelas contido, mas, em regra, oscilava entre os € 10 e os € 20 a unidade.

Foi, então, ordenada judicialmente a realização de busca à residência dos arguidos AA. … BB. … no Bairro do Ingote, Lote K, R/chão Dtº, Coimbra, busca efectuada no dia 22 de Novembro de 2006, e no decurso da qual foi encontrado e apreendido o seguinte (v. fls. 347 e 348):

na cozinha, dentro de uma carteira que se encontrava em cima do frigorífico:

7 pequenas embalagens plásticas (“panfletos”) com o peso bruto total de 1,616 gramas, que continham no seu interior um produto que, após exame efectuado pelo LPC da PJ, revelou tratar-se de cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 1,056 gramas – v. fls. 776;

27 pequenas embalagens plásticas (“panfletos”), com o peso bruto total de 6,650 gramas, que continham no seu interior um produto que, após exame efectuado pelo LPC da PJ, revelou tratar-se de heroína, com o peso líquido de 3,837 gramas – v. fls. 776;

3 embalagens plásticas com o peso bruto total de 15,959 gramas, que continham no seu interior uma substância que, após exame efectuado pelo LPC, revelou tratar-se de heroína, com o peso líquido de 14,828 gramas – v. fls. 776;

a quantia de € 30,00 em notas do Banco Central Europeu.

em dois quartos e na sala da residência, um telemóvel de marca Nokia 3330, duas pulseiras em metal pobre, com o peso de 53 gramas, sem valor comercial, uma aliança de prata lisa com o peso de 3,5 gramas, no valor de e 1,50, uma libra em ouro “Rainha Vitória” com o peso de 10,8 gramas, no valor de € 120,00, um crucifixo em ouro com o peso de 1,3 gramas, no valor de € 10,00, três anéis de colecção em metal com o peso de 16,7 gramas, um anel em metal pobre com pedras amarelas com o peso de 13 gramas, sem valor comercial, um anel em metal pobre com pedras brancas com o peso de 9,3 gramas, sem valor comercial, um par de brincos em metal pobre com o peso de 30 gramas, sem valor comercial, 10 brincos isolados em metal pobre e pedras falsas com o peso de 40 gramas, sem valor comercial, um órgão electrónico de marca Tech, modelo KN1500, três blisters de comprimidos Noostan contendo cada um deles 10 comprimidos desta marca, habitualmente utilizados como substâncias de “corte” dos produtos estupefacientes, dois blisters de cápsulas Utrogestan, num total de 22 cápsulas, dois blisters de comprimidos Magnespasmil com um total de 20 comprimidos desta marca, um telemóvel de marca Motorola, modelo V360; um televisor de plasma de marca LG, modelo R2-42PX11, um telemóvel de marca Motorola, modelo C118, dois telemóveis de marca Sharp, um do modelo GX20 e outro do modelo GX17, um telemóvel de marca Nokia, modelo 6600, quatro cartuchos de caçadeira de calibre 12, uma máquina de filmar digital de marca JVC, modelo MX7000, € 50,00 em notas do Banco Central Europeu, quatro espadas e um punhal de decoração.

Na sequência da busca efectuada, foram ainda apreendidos ao arguido AA. … os veículos automóveis de marca Renault 19, com a matrícula ??-??-KK, e de marca Peugeot, matrícula !!-!!-XX, àquele pertencentes e por ele habitualmente utilizados nos contactos efectuados com vista à aquisição e venda de produtos de natureza estupefaciente.

Nessa mesma ocasião, foram efectuadas revistas pessoais aos arguidos AA. BB., tendo sido encontrado e apreendido:

- na posse do arguido AA., um telemóvel de marca LG e uma pulseira em ouro amarelo com o peso de 87,9 gramas, no valor de  1.000,00 (v. fls. 379);

- na posse da arguida BB., uma embalagem plástica com o peso bruto de 5,389 gramas, que guardava na copa do lado direito do soutien e que continha no seu interior uma substância que, após exame efectuado pelo LPC, revelou tratar-se de heroína, com o peso líquido de 5,009 gramas, e um papel manuscrito com os dizeres: ”48 ilásticas” (v. fls. 382 e 776).

Também o arguido Joel se dedicava à venda de estupefacientes, de forma regular e reiterada, pelo menos desde 11-12-2006, no intuito de angariar meios económicos, de que sobrevivia, pois não desempenhava qualquer actividade profissional lícita de forma regular.

Em troca dessas vendas, o arguido CC. … recebia dinheiro, objectos em ouro, telemóveis e outros artigos de fácil revenda.

Nessa actividade, contava também ele com vários colaboradores que angariavam e revendiam os produtos estupefacientes aos consumidores que demandavam as imediações do Bairro do Ingote.

Foi na sequência da busca efectuada a casa do arguido AA., que ficou em regime de prisão preventiva, que o arguido CC. …  passou a assumir um papel mais relevante na venda de produtos estupefacientes, pois que os consumidores passaram a afluir em maior número à sua residência na procura de droga.

Foi, então, ordenada judicialmente a realização de uma busca àquela residência dos arguidos CC. …  e FF. … busca efectuada no dia 30 de Janeiro de 2007, e no decurso da qual foi encontrado e apreendido o seguinte (v. fls. 554 e 555):

na sala, um telemóvel de marca Nokia, modelo 6680, um telemóvel de marca Motorola e um pedaço plástico circular recortado, tipicamente utilizado para embalagem de produto estupefaciente, e um saco plástico contendo bicarbonato de sódio, com o peso bruto de 37,740 gramas, utilizado normalmente como substância de “corte” do produto estupefaciente;

no quarto de casal, um telemóvel de marca Nokia, modelo 7210, um telemóvel de marca Samsung, modelo SGH-E800, um telemóvel de marca Samsung, modelo SGH-X480 – v. fls. 554 e 555.

Nessa mesma ocasião, foi efectuada uma revista pessoal ao arguido AA., tendo sido encontrado e apreendido na sua posse:

- cinco pequenos pedaços de Canabis (Resina), com o peso líquido de 1,098 gramas;

- oito pequenas embalagens plásticas (“panfletos”), com o peso bruto total de 1,953 gramas, que continham no seu interior um produto que, após exame efectuado pelo LPC da PJ, revelou tratar-se de heroína, com o peso líquido de 0,874 gramas – v. fls. 789;

- um saco plástico com o peso bruto de 5,251 gramas, que continha no seu interior um produto que, após exame efectuado pelo LPC da PJ, revelou tratar-se de heroína, com o peso líquido de 4,943 gramas – v. fls. 789;

- quatro pequenas embalagens plásticas (“panfletos”), com o peso bruto total de 0,755 gramas, que continham no seu interior um produto que, após exame efectuado pelo LPC da PJ, revelou tratar-se de cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 0,286 gramas – v. fls. 789.

Os arguidos AA. …, BB. …, e CC…. conheciam a natureza, características e propriedades dos produtos que detinham nas suas residências e destinavam tais substâncias à cedência a terceiros consumidores que os procurassem para o efeito, mediante contrapartidas de natureza económica, directamente ou por intermédio de terceiros que com eles colaboravam.

Os telemóveis apreendidos e demais objectos referidos, nomeadamente a televisão de plasma e a máquina de filmar acima descritos, tinham sido adquiridos pelos arguidos com o produto da venda de droga a terceiros, sendo os telemóveis por eles utilizados nos contactos que estabeleciam com vista ao exercício da actividade de venda de substâncias estupefacientes.

As aludidas quantias em dinheiro e os demais objectos em ouro provinham das várias vendas de cocaína e de heroína que os arguidos tinham efectuado a diversos consumidores.

O arguido GG. … era consumidor de heroína e cocaína.

Os arguidos AA. …,CC…. e BB. … agiram conscientes e livremente com perfeito conhecimento de que a detenção e cedência a terceiros de substâncias de natureza estupefaciente era proibida e punida pela Lei Penal.

A arguida BB. ..  não tem antecedentes criminais. É doente do foro psiquiátrico há vários anos. Tem apoio familiar.

O CC. … , a FF. , o GG. … e o AA.  têm os antecedentes criminais que resultam dos seus certificados de registo criminal, respectivamente a fls 753, 757, 760 e 763.

O CC. … e a FF. .. têm três filhos menores a seu cargo. A FF. … conta com o apoio do pai que é comerciante em Lamego. Recebe o RSI mensal de 360 euros. E vendia perfumes na Baixa de Coimbra. À data da prática dos factos o arguido CC. … era toxicodependente.

O GG. … vive com a mãe, trabalhava na ERSUC onde recebia 325 euros mensais.

*

Não se provou que:

A – Os arguidos CC…. … e FF…  colaboravam com os arguidos AA. … BB. …. na venda de produtos estupefacientes, guardando por vezes na sua própria casa, situada no Bairro do Ingote, Lote KK., parte da droga que o AA. …e a BB. …. adquiriam.

B - A arguida FF. …  procedia a venda de estupefacientes e em troca dessas vendas, recebia dinheiro, objectos em ouro, telemóveis e outros artigos de fácil revenda.

C – Um dos colaboradores do CC. …  e da FF. …. era o arguido GG. … que todos os dias, a partir das 18h00m, durante os meses de Dezembro de 2006 e de Janeiro de 2007, se dirigia ao Bairro do Ingote, a casa daqueles arguidos, a quem estes forneciam algumas doses de produto estupefaciente, normalmente cinco panfletos de cocaína e de heroína, para que ele vendesse aos consumidores que ali se deslocassem para adquirirem droga.

Assim, o arguido, ao aperceber-se de que algum consumidor de droga se encontrava na zona do Bairro do Ingote à procura de droga, abordava-os e vendia-lhes a droga que pretendiam comprar, a troco de dinheiro, droga essa que lhe tinha sido previamente fornecida pelos arguidos CC … .FF. …, como referido.

Vendidos estes cinco panfletos, o arguido GG. … voltava à casa dos arguidos CC. … e FF. … , a quem entregava o dinheiro arrecadado com a venda da droga e de quem recebia outros cinco panfletos de cocaína e de heroína para vender novamente, o que ele fazia.

Como contrapartida, os arguidos CC …FF. … davam de comer ao arguido GG. … e forneciam-lhe gratuitamente a quantidade de droga que necessitava para satisfazer a sua toxicodependência.

D – O arguido GG. … conhecia igualmente a natureza, características e propriedades dos produtos que o CC …FF. … lhe entregavam, para venda a terceiros consumidores que o procurassem para o efeito, mediante contrapartidas de natureza económica.

Visava, sobretudo, com esta sua actividade conseguir obter substâncias da natureza estupefaciente para ele próprio consumir, que lhe eram assim fornecidas pelos arguidos CC … FF. …..

E) - Os arguidos FF. …. e GG. …  agiram conscientes e livremente com perfeito conhecimento de que a detenção e cedência a terceiros de substâncias de natureza estupefaciente era proibida e punida pela Lei Penal.

*

A convicção do Tribunal assenta numa apreciação crítica e global de toda a prova produzida no seu conjunto, principalmente quanto aos factos provados:

- na confissão do arguido AA. … r, que assumiu a venda de estupefacientes, nomeadamente de cocaína e heroína, após ter sido confrontado com as declarações inicialmente prestadas, contraditórias com as prestadas no TIC, nos termos das disposições conjugadas dos artºs 355, nº 2, e 357, nº 1 al. b), do CPP). Confessou que pelo menos uma vez por mês comprava cerca de 600 euros de heroína ao seu fornecedor, que não identificou.

- No depoimento sério e objectivo das testemunhas de acusação:

-EE. … , Inspector da PJ, na Directoria de Coimbra, participou em vigilâncias, em que se aperceberam da dinâmica da comunidade toxicodependente no Bairro do Ingote – entram, abastecem-se e saem em dois minutos. O Bairro da Rosa e do Ingote são pólos de venda de droga há muitos anos.

Presidiu às buscas efectuadas às residências do AA. …  e BB. …  e do CC …e confirmou as apreensões.

No que se reporta ao AA. … e BB. …, confirmou o teor dos relatos de diligência externa e a movimentação de toxicodependentes rumo a casa destes arguidos e/ou seus angariadores. O que vieram, ao longo do tempo, a verificar que persistia e se mantinha. Perceberam pela circulação contínua do AA. … pelo Bairro, nas suas viaturas, que este realizava actividade de vigilância de forma a assegurar-se que não havia entidades policiais na zona. Não assistiu à venda por parte do GG. … .

-Inspector EE. …, titular do inquérito, participou em inúmeras diligências externas, desde Dezembro de 2005, e verificaram que era um “corropio” diário de consumidores para casa do AA…  e BB. …  e mais tarde para casa do CC,… assim como para os indivíduos que com eles colaboravam.

Contactos que fotografou e cujas fotos juntou aos autos.

Esclareceu que a venda se intensificava à noite e que o AA. … saía de casa para em movimentações pelo bairro, na sua viatura, fiscalizar a eventual presença da polícia, enquanto em sua casa continuava a processar-se a venda de estupefacientes.

- Depoimento sério e credível de HH. … , que foi toxicodependente e declarou que por várias vezes – cinco ou seis - se deslocou à residência do AA. …, a quem adquiriu heroína, que fumava.

Na revista pessoal efectuada à BB. …foi-lhe encontrado no soutien que trazia vestido 1 embalagem de 5,3 gr de heroína.

Na revista pessoal ao arguido CC … foi-lhe encontrado e apreendido na sua posse cinco pequenos pedaços de Canabis (Resina), com o peso líquido de 1,098 gramas, oito pequenas embalagens plásticas (“panfletos”),de heroína, com o peso líquido de 0,874 gramas e um saco plástico de heroína, com o peso líquido de 4,943 gramas, e quatro pequenas embalagens plásticas (“panfletos”), que continham cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 0,286 gramas.

Confirmou o teor dos RDEs - vigilâncias e autos de busca em que participou.

Depoimentos esses conjugados com os relatos de diligências externas: fls 11 a 13, 19, 43 a 45, 79, 85, 129 e 130 – fotos de 131 a 135 – 139 e 140, 143 a 150 – fotos de 152 a 179, 206 a 214, fotos de fls 215 a 238, 282 a 284, 306 a 307, 340 e 341, 494 a 496, 499 a 501 e 503 e 504.

- e com os autos de busca a fls 347 e 348, - fotos fls 349 e 350 – e fls 554 e 555.

- depoimento de HH. … , que foi toxicodependente e declarou que por várias vezes – cinco ou seis - se deslocou à residência do AA. …, a quem adquiriu heroína, que fumava.

- Confrontação das declarações do arguido CC … com as prestadas ao Juiz de Instrução Criminal sobre as discrepâncias detectadas.

- no exame laboratorial de fls. 776, 777, 789 e 790.

- Auto de Apreensão de fls. 347, 348, 554, 555.

- II…., comerciante, vizinha do AA…. e da BB. …., declarou ao tribunal que por mais de uma vez vendeu lotes de tecido ao arguido AA. …, e estando ele já preso, vendeu à BB. … , para que os revendessem. Afirmou que o AA….  é bom rapaz, não trata mal ninguém e é respeitado.

-JJ. … , vizinho do AA. …., que declarou que este é uma pessoa educada, respeitador, bom vizinho.

-LL. … , pai do AA., que assegurou que este era toxicodependente.

*

Já quanto aos factos não provados, a decisão emerge quer da inexistência de prova, quer da sua insuficiência, salientando-se que a prova produzida em audiência, relativa ao GG. … foi bastante escassa, sendo certo que pelo menos em dois relatos de diligências externas se faz alusão à sua pessoa, tendo apenas sido visto nas imediações do lote 18 – cfr fls 503 – e referido em termos de probabilidade a fls 495.
Importa ainda, para maior clareza, referir o que consta do registo criminal do arguido C C… para o qual remete o acórdão:
Por sentença proferida em 09/10/2002, no processo nº 996/02.4 GBILH do 2º Juízo do T.J. de Ílhavo, foi o arguido condenado pela prática em 08/10/2002 de um crime de condução sem habilitação legal p. e p. pelo artº 2º do D.L. 2/98, de 3/1, na pena de 40 dias de multa, à taxa diária de 3,00€, perfazendo a multa global de 120,00€, extinta pelo pagamento em 13/03/2006;
Por sentença proferida em 14/04/2005, no processo nº 256/03.7 GAAMR do T.J. de Amares, foi o arguido condenado pela prática em 25/06/2003 de um crime de condução sem habilitação legal p. e p. pelo artº 3º, nºs 1 e 2 do D.L. 2/98, de 3/1, na pena de 90 dias de multa, e de um crime de falsificação de documento p. e p. pelo artº 256º do CP, na pena de 220 dias de multa. Em cúmulo, foi o arguido condenado na pena única de 270 dias de multa, à taxa diária de 3,50€, extinta pelo pagamento em 09/03/2006.
Finalmente, por acórdão proferido em 24/11/2005, transitado em julgado em 09/12/2005, foi o arguido condenado pela prática em Agosto de 2005 de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo artº 25º do D.L. 15/93, de 22/1, na pena de 2 anos e 8 meses de prisão, suspensa na sua execução por 4 anos.
Apreciação
Da impugnação da decisão em matéria de facto
Nos termos do artº 428º do CPP, as relações conhecem de facto e de direito, podendo modificar a decisão de facto quando a decisão tiver sido impugnada nos termos do artº 412º, nº3 do mesmo código. Para tanto, deve o recorrente especificar os pontos de facto que considera incorrectamente julgados e as provas que impõem decisão diversa da recorrida. Face ao nº4, a especificação relativas às provas faz-se por referência ao consignado na acta de julgamento, devendo o recorrente indicar as concretas passagens em que se funda a impugnação.
As condições em que decorre o recurso em matéria de facto encontram-se realçadas, com clareza, pelo Supremo Tribunal de Justiça[7]:
É de fulcral importância para salvaguarda dos direitos constitucionais de defesa que as relações façam um efectivo controlo da matéria de facto provada na 1ª instância, por confronto desta com a documentação em acta da prova produzida oralmente na audiência;
O recurso da matéria de facto não é um novo julgamento, antes um remédio jurídico que se destina a despistar e corrigir erros in judicando ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente;
Porém, se é certo que assim se impõe um limite ao recorrente, o tribunal de recurso não está impedido de oficiosamente conhecer de todos os erros que não impliquem reformatio in pejus, mesmo os não especificados, visto que no processo penal rege o princípio da verdade material e, quando está em jogo a liberdade do cidadão cuja inocência é protegida constitucionalmente até ao trânsito em julgado da condenação, não há que impor entraves formais para evitar o erro judiciário;
No controle da matéria de facto, não se devem descurar os princípios da livre apreciação da prova e da imediação, que estão na essência da decisão da 1ª instância, mas tais princípios não são um obstáculo inultrapassável, antes um dos muitos factores que o tribunal de recurso tem de ponderar na altura de modificar ou não a matéria de facto provada;
O tribunal de recurso tem poderes para modificar a matéria de facto, desde que se esteja perante alguma das hipóteses previstas no art.º 431.º;
Mesmo quando se verifica algum dos vícios do art.º 410.º, n.º 2, o reenvio só deve ser ordenado se não for possível decidir da causa (cfr. art.º 426.º, n.º 1), isto é, se do processo não constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão ou se não for possível a renovação da prova (art.º 431.º).
Tomando as motivações e as conclusões que dela extraiu a recorrente, verifica-se que o recorrente dirige a impugnação a dois segmentos dos factos provados, com referência especificada aos parágrafos 7 e 8 da folha 4 da decisão. Sustenta que ninguém aludiu a esses aspectos e que da busca realizada não se podem inferir tais factos e remete para a apreciação das declarações do arguido e para o depoimento dos inspectores da P.J. EE. DD. …, em conjunto com o resultado da busca domiciliária efectuada à residência do arguido CC …. E, como decorre da transcrição supra, a decisão recorrida estribou-se precisamente na conjugação desses contributos probatórios.
Da impugnação dirigida ao parágrafo 7 (conclusão 8ª, 1ª parte)
A primeira vertente da impugnação incide sobre o parágrafo dos factos provados em que se refere que «Em troca dessas vendas, o arguido C C … recebia dinheiro, objectos em ouro, telemóveis e outros artigos de fácil revenda». O recorrente é claro a esse propósito, como emerge da conclusão 8ª, o que significa aceitação da matéria constante do parágrafo precedente, designadamente que o arguido dedicou-se à venda de estupefacientes, de forma regular e reiterada, desde 11-12-2006, no intuito de angariar meios económicos, de que sobrevivia, pois não desempenhava qualquer actividade profissional lícita de forma regular. O mesmo acontece quanto ao facto de terem sido apreendidos na sua residência cinco telemóveis (cfr. 2º e 3º parágrafo de fls. 1041) e também quanto à indicação como provado que esses telemóveis tinham sido «adquiridos com o produto da venda de droga a terceiros, sendo os telemóveis por eles utilizados nos contactos que estabeleciam com vista ao exercício da actividade de venda de substâncias estupefacientes» (cfr. último parágrafo de fls. 1041).
Assim, assente que o arguido adquiriu os telemóveis com o produto da venda de estupefacientes, encontra-se adquirido que essa venda lhe determinou proventos pecuniários, o que, aliás, corresponde igualmente à indicação de que todas as despesas eram suportadas com meios económicos obtidos com aquele comércio. Então, a questão reduz-se a saber se, conjuntamente com dinheiro, o arguido CC … recebeu, em pagamento, objectos em ouro, telemóveis e artigos de fácil revenda.
O primeiro elemento de análise prende-se com a busca e apreensão realizada no dia 30 de Janeiro de 2007. Como decorre do auto de fls. 554 e 555, não foram detectados e apreendidos objectos em ouro nem bens armazenados e fora de uso doméstico, permitindo inferir que tinham como destino a revenda. Foram, é certo, apreendidos cinco telemóveis, mas esses são os mesmos aparelhos relativamente aos quais ficou provado terem sido adquiridos com produto de anteriores vendas, removendo, sob pena de contradição, a possibilidade de terem sido entregues em pagamento da compra e venda de estupefaciente.
Por outro lado, ouvidos os depoimentos dos inspectores DD. … EE. …, verifica-se que não aludiram ao pagamento de qualquer transacção com objectos em ouro ou outros bens. Apenas o inspector EE. … foi questionado sobre objectos em ouro, limitando-se a remeter para o auto de apreensão.
Nessa medida, impõe-se concluir pela procedência da impugnação efectuada pelo arguido e na ausência de qualquer suporte probatório quanto à indicação como provado que, em troca das vendas, o arguido CC … recebia objectos em ouro, telemóveis e outros artigos de fácil revenda. Será, então, modificado o parágrafo impugnado, do qual passará a constar que «Como pagamento dessas vendas, o arguido CC … recebia dinheiro», passando o restante para os factos não provados.
Da impugnação dirigida ao parágrafo 8 (conclusão 8ª, 2ª parte)
O segundo segmento dos factos provados colocado em crise pelo recorrente prende-se com a indicação de que o arguido  CC … agiu em concertação com terceiros na actividade de venda de estupefacientes. Deu-se como provado que: «Nessa actividade, contava também ele com vários colaboradores que angariavam e revendiam os produtos estupefacientes aos consumidores que demandavam as imediações do Bairro do Ingote». Refere o recorrente que em momento algum do depoimento das testemunhas EE. … e DD. … é feita referência a esses colaboradores.
A ponderação dessa dimensão do objecto do processo conduz à conclusão de que o recorte das condutas constante da acusação ficou, em boa medida, por provar. Não se provou que os dois casais – CC …e FF. …, por um lado, e AA. … e BB. …, por outro – colaboravam na venda, como ficou igualmente por provar que o arguido GG. …era «um dos colaboradores que angariavam e revendiam os produtos estupefacientes». Sobre as razões para essa decisão, ou seja, para a remessa da conduta imputada ao arguido GG. … , lê-se na decisão recorrida que a prova a esse respeito foi «bastante escassa», o que encontra explicitação na indicação de      que a sua presença nas imediações do lote KK é mencionada num dos autos de vigilância enquanto noutro auto a alusão é efectuada tão-somente «em termos de probabilidade».
Ora, se a prova apreciada pelo Tribunal Colectivo quanto ao único colaborador identificado na acusação foi valorada como «bastante escassa», em termos de conduzir à sua remessa para os factos provados, então o que permitiu, ainda assim, afirmar que outros colaboradores existiam e definir a respectiva actuação? A resposta, nos termos da fundamentação, circunscreve-se à referência a que o inspector EE. …verificou que existia um «corrupio» diário de consumidores para casa dos arguidos AA. …e BB. … e mais tarde para casa do arguido CC …assim como para os indivíduos que com eles colaboravam.
Ouvidos os depoimentos das testemunhas EE. … e DD. … verifica-se que nem um nem outro forneceram em audiência tais indicações. O primeiro, sublinhando que não viu actos de venda, discorreu genericamente sobre o perfil dos arguidos, dos quais não seria esperado que vendessem directamente aos toxicodependentes, assim evitando a detecção policial. Porém, e algo contraditoriamente com o esperado controlo à distância, descreveu a observação de entradas e saídas rápidas nas residências dos arguidos CC …e AA. …, que interpretou como correspondentes a vendas de estupefacientes. O segundo, aludiu tão-somente a «angariadores» de outro arguido[8], circunscrevendo a indicação de repartição de tarefas relativamente ao comércio desenvolvido pelo arguido CC …a ele próprio, à companheira FF. ….[9] e ao arguido GG. …. Em nenhum momento do seu depoimento referiu qualquer outra pessoa.
É certo que a decisão recorrida ponderou igualmente às vigilâncias e fotos recolhidas, documentadas nos autos e oferecidas como prova na acusação. Porém, e como aconteceu em relação à conduta do arguido GG. …, esses elementos carecem de ser esclarecidos em audiência, de forma a obter adequada percepção do que foi observado. Em todo o caso, percorrendo os diversos autos lavrados, encontra-se a fls. 494 alusão a angariadores do arguido AA. …, não do arguido CC …., e por indicação de pessoa não identificada, não olvidando que essas referências dão sequência ao constante de fls. 282, ou seja, a que o arguido CC …colaborava com o arguido AA. …, matéria que, recorde-se, foi remetida para os factos não provados. Só a fls. 499, e em termos desprovidos de qualquer concretização, surge menção à existência de indivíduos que desempenhavam o papel de «angariadores» e «sentinelas», a qual encontra conexão com a diligência de fls. 503, votada exactamente à identificação desses indivíduos. Ora, nesse auto refere-se unicamente o arguido GG. …, sem que se detectem nos autos quaisquer elementos fotográficos demonstrativos da actuação de outros indivíduos.
Assim, o panorama probatório indicado denota a total ausência de prova minimamente convincente no sentido de que o arguido CC … «Nessa actividade, contava também ele com vários colaboradores que angariavam e revendiam os produtos estupefacientes aos consumidores que demandavam as imediações do Bairro do Ingote» pelo que cumpre, também aqui, modificar a decisão em matéria de facto, expurga-a desse segmento, o qual passará para os factos não provados.
Mostra-se, assim, sedimentada a decisão em matéria de facto, pois não se vislumbra que padeça de qualquer dos vícios contemplados no artº 410º, nº2, do CPP. Tomando em particular o vício decorrente da al. a) do referido preceito, importa referir que o objecto do processo, tal como delimitado na acusação, foi inteiramente abordado, na medida em que dela não decorre qualquer indicação sobre o número de vendas e estupefaciente transaccionado em cada uma. Nessas circunstâncias, a investigação e afirmação desses elementos, no caso patentemente inatingíveis, levaria o Tribunal a exceder a ilicitude comportada no impulso acusatório deduzido e sobre o qual foi possibilitado ao arguido o exercício do direito de defesa[10]. Mas, concomitantemente, também a imputação genérica de uma actividade de venda de quantidade não determinada de droga nunca poderá ser valorada num sentido não compreendido pelo objecto do processo[11].
Da subsunção jurídico-penal: crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo artº 25º, al. a) do D.L. 15/93, de 22/1.
Nos termos expostos supra, a decisão recorrida afirmou, como a acusação, a prática pelo arguido CC …do crime de tráfico de estupefacientes «simples», tipificado no artº 21º, nº1, do D.L. 15/93, de 22/1. Pretende o recorrente que incorreu na forma privilegiada do tipo, prevista no artº 25º, al. a) do mesmo decreto-lei, enquanto o Ministério Público, em ambas as instâncias, propugna pela manutenção do decidido.
Comete o crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º do D.L. 15/93, de 22/1 quem “sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver” produtos estupefacientes. Nota-se a tipificação de uma plêiade de acções e não apenas o tráfico em sentido estrito, pois estamos perante crime de perigo abstracto, em que se procurou tipificar todas as formas de contacto com produtos estupefacientes desde o produtor até ao consumidor final e potencialmente lesivas do bem jurídico tutelado – saúde pública[12]. Entre nós, como noutros países[13], foi intenção do legislador punir todo o comportamento capaz de contribuir para o consumo, por mais leve que seja, pois a saúde pública sofre de forma idêntica com a transmissão onerosa ou com a gratuita de estupefaciente[14]. A previsão de crimes deste tipo justifica-se pela necessidade, imposta pela natureza complexa de certos domínios sociais, de promover, através da tutela penal, o que se estabelece como um certo grau de «estandartização de comportamentos» e legitima-se pela presença, nesses mesmos domínios sociais, de condutas que ultrapassam «âmbitos privados (internos)» e assumem danosidade social, ao ponto de fundarem uma antecipação da tutela, através da construção de um tipo de perigo[15].
Perante a prova de que o arguido CC …utilizou como única fonte de rendimento a venda de estupefacientes, actividade a que se dedicou de forma regular e reiterada desde 11/12/2006 até à sua detenção, em 30/01/2007, dia em que tinha em seu poder, com destino à venda, cinco pedaços de canabis (resina), com o peso de 1,098 grs; oito pequenas embalagens com heroína, perfazendo o total de 0,874 grs; um saco plástico contendo 4,943 grs. de heroína; e outras quatro pequenas embalagens, contendo cocaína, sob a apresentação de cloridrato de cocaína, com o peso de 0,286 grs., dúvidas não restam de que desenvolveu conduta – venda e detenção para venda – inscrita na previsão do tipo do artº 21º, nº1, do D.L. 15/83, de 22/1. Todavia, corresponderá o quadro supra indicado a ilicitude consideravelmente diminuída?
Nos termos do disposto no artº 25º al. a) do D.L. 15/93, de 22/1, tratando-se de heroína e cocaína, se … a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações, a pena é de 1 a 5 anos de prisão. Este preceito teve como referência o inciso nº 5 do artº 73º do D.P.R. italiano[16], sendo certo que a jurisprudência desse país evoluiu claramente no sentido de considerar essa previsão como circunstância atenuante especial, e não como nova fattispecie, porquanto pressupõe um crime já integralmente preenchido nos seus elementos essenciais[17].
Entre nós, vem o Supremo Tribunal de Justiça convergindo no entendimento de que, para que se possa entender haver ilicitude consideravelmente diminuída no domínio do tráfico de estupefacientes, o que se não confunde com ilicitude diminuta, necessário se torna que estejam revelados factos dignos de consideração, notáveis, grandes, importantes ou avultados, designadamente quanto à qualidade e quantidade da droga em questão[18]. Essa avaliação envolve a ponderação global dos factores em presença, valorando a interdependência dos índices fornecidos pelo legislador, em termos exemplificativos – meios utilizados, qualidade e quantidade -, em termos de concluir, no respeito pelo programa politico-criminal vigente, mas também de acordo com o princípio da proporcionalidade, pela presença de pequeno tráfico. Como se diz no Ac. do STJ de 15/12/99, «A tipificação do art. 25.º do DL 15/93 parece significar o objectivo de permitir ao julgador que, sem prejuízo do natural rigor da concretização da intenção penal relativamente a crimes desta natureza, encontre a medida justa de punição desses casos que, embora porventura de gravidade ainda significativa, ficam aquém da gravidade do ilícito justificativo da tipificação do art. 21.º e têm suporte adequado dentro da moldura penal prevista na norma indicada em primeiro lugar»[19].
No caso em presença, entendemos que a actividade desenvolvida pelo arguido CC … corresponde, na estrutura progressiva com que o legislador procurou abarcar a multiplicidade de condutas englobadas no tráfico de estupefaciente[20], a ilicitude no plano do tráfico menor, preenchendo a exigência legal de considerável diminuição da ilicitude.
Emerge dos factos provados que o arguido dedicou-se à venda durante cerca de um mês e meio e que utilizou os rendimentos assim obtidos para a sua sobrevivência mas, como demasiadas vezes, a delimitação das condutas não ultrapassou a generalização, sem mesmo se concretizar a tipologia das substâncias estupefacientes transaccionadas nesse período. É certo que ficou provado que tais vendas assumiram carácter regular e reiterado, mas persiste absoluta indeterminação sobre a periodicidade. Vendia todos os dias? Vendia uma vez por semana? Quinzenalmente? Em qualquer desses distintos planos comportamentais têm aplicação os conceitos de regularidade e reiteração. Acresce a ausência de sinais de sofisticação, afastada que ficou a direcção de uma estrutura organizativa, consubstanciada na utilização de colaboradores.
A esses elementos de ilicitude, marcados pela generalidade, o que lhes subtrai relevância em termos de qualificar a actuação do arguido como integrando o crime p. e p. no art. 21.º do DL 15/93, junta-se a quantidade apreendida em poder do arguido, com destino à venda, a saber, recorde-se, 1,098 grs. de canabis, 5,817 grs. de heroína e 0,286 grs. de cocaína. Trata-se de quantidade seguramente não diminuta, porque susceptível de satisfazer o consumo diário de dezenas de consumidores e preenchida na sua maioria por estupefacientes com elevada toxicidade e potencial aditivo, como acontece com a heroína e cocaína. Não obstante, ausentes marcas de sofisticação do tráfico, como se disse, essa quantidade ainda tem enquadramento no tráfico menor, embora, diga-se, muito próximo do limite superior de aplicação do tipo privilegiado.
Face ao exposto, procede o recurso igualmente quando o preenchimento pela conduta do arguido CC … de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo artº 25º, al. a) do D.L. 15/93, de 22/1, a que corresponde prisão de 1 a 5 anos.
Da medida da pena
Afirmada a medida abstracta distinta daquela ponderada pela decisão recorrida, passemos à definição do quantum da pena. Na ponderação concreta da pena, tendo em atenção os critérios do artº 71º do C.P., cumpre determinar a medida da sanção tendo como limite e suporte axiológico a culpa do agente e em função das exigências da prevenção de futuros crimes, sem esquecer que a finalidade última da intervenção penal é a reinserção social do delinquente, sendo incompatível com o Estado de direito democrático finalidade retributiva[21]. No modelo que enforma o regime penal vigente, norteado, como decorre do artº 40º do CP, pelo binómio prevenção-culpa, cumpre encontrar primeiro uma moldura de prevenção geral positiva, determinada em função da necessidade de tutela das expectativas comunitárias na manutenção e reforço da validade da norma violada[22]. Fixada esta, correspondendo nos seus limites inferior e superior à protecção óptima e protecção mínima do bem jurídico afectado, deve o julgador encontrar a medida concreta da pena em conjugação com as exigências de prevenção especial de socialização do agente, sem ultrapassar a culpa revelada na conduta antijurídica. Nesta tarefa, os critérios do artº 71º do CP «têm a função de fornecer ao juiz módulos de vinculação na escolha e medida da pena; tais elementos e critérios devem contribuir tanto para determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação de valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento, ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente)»[23].
Como se referiu, a ilicitude presente na conduta remete, na esfera de punição do tipo privilegiado, para plano muito elevado. Acrescem, como se acentuou na decisão recorrida as fortíssimas exigências preventivas gerais deste tipo de crime, pois é unânime a afirmação de que a toxicodependência constitui um dos mais importantes desafios sociais dos nossos dias, cumprindo contrariar, sem hesitação, todo o circuito que alimenta o padecimento das vítimas dos crimes induzidos pela toxicodependência e o sofrimento das famílias daqueles que fenecem diariamente no consumo de estupefacientes. Por outro lado, o arguido suscita preocupação acrescida no plano da prevenção especial de socialização, na medida em que cometeu os factos no decurso do período de suspensão de execução da pena imposta pelo mesmo crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 25º, al. a) do D.L. 15/93, de 22/1[24], e, quando foi detido, a dedicação à venda de estupefacientes durava há mês e meio. Não vem dada como provada reflexão sobre o significado anti-social da conduta desenvolvida, indutora de arrependimento.
Perante tais factores, a medida concreta da reacção penal deve situar-se próximo do limite superior da moldura do tipo privilegiado, mostrando-se adequado às exigências preventivas, sem exceder a culpa do arguido, fixar a pena em 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão.
Da suspensão de execução da pena de prisão
Perante esta pena, coloca-se o poder-dever de aplicação de pena de substituição, de acordo com o disposto no artº 50º do CP, na redacção agora em vigor. A esse propósito, sustenta o arguido que a simples censura dos factos e a ameaça da prisão realizariam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição e refere o seu comportamento posterior ao crime, as circunstâncias de toxicodependência em que foi praticado e os esforços, coroados de êxito, em obter colocação profissional como sinais de que encontra-se empenhado em reintegrar-se socialmente.
Nos termos do artº 50º, nº1, do CP, na conformação vigente à data, o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida; à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. A revisão operada pela Lei 59/2007, de 4/9, elevou o limite de aplicação dessa pena de substituição para 5 anos de prisão, o que, face a evidente favorecimento, determina a sua ponderação, por força do artº 2º, nº4, do CP.
A propósito deste instituto, escreve-se no Ac. do STJ de 30/6/93, citando Jescheck: «na base da decisão de suspensão da execução da pena deverá estar uma prognose favorável ao agente, baseada num risco prudencial. A suspensão da pena funciona como um instituto em que se une o juízo de desvalor ético-social contido na sentença com o apelo, fortalecido pela ameaça de executar no futuro a pena, à vontade do condenado em se integrar na sociedade. O tribunal deve estar disposto a assumir um risco prudente; mas se existirem sérias dúvidas sobre a capacidade do condenado para compreender a oportunidade de ressocialização que se oferece, a prognose deve ser negativa»[25].
Porém, ainda que centrada na pessoa do arguido no momento actual e na avaliação da respectiva capacidade de socialização em liberdade, ou seja, em considerações radicadas na prevenção especial, a decisão que aprecie a propriedade de escolha por esta, ou outra, pena de substituição, deve atender igualmente às exigências de ponderação geral positiva, para que a reacção penal responda adequadamente às expectativas comunitárias na manutenção (e reforço) da validade da norma violada e assegure a protecção do bem jurídico afectado. Esse necessário balanceamento entre as finalidades de prevenção geral positiva e de prevenção especial de socialização, em que a primeira exerce função limitadora da segunda, encontra relação directa com a gravidade da pena. Como se escreve em aresto do STJ «A suspensão da mesma pena deve afigurar-se como compreensível e admissível perante o sentido jurídico da comunidade. A lei não o diz, mas é uma questão de razoabilidade e lógica jurídica, dimanada dos princípios, a afirmação de que, em termos de prevenção especial, não tem o mesmo significado na aferição na possibilidade de suspensão de execução da pena uma pena de seis meses de prisão ou uma pena de cinco anos de prisão»[26]. Tal valoração emerge reforçada pela globalização dos fenómenos criminais, particularmente no domínio do tráfico de estupefacientes, negócio altamente lucrativo e que, como acontece generalizadamente no domínio económico multinacional, tenderá a escolher os ordenamentos que imponham custos de contexto mitigados, neste caso medidos em função das reacções criminais comparadas[27].
Ora, no caso em apreço, impõe-se ponderar, como forte índice de insuficiência pedagógico-reeducativa através da advertência contida na suspensão da execução, a circunstância do arguido ter beneficiado do juízo de prognose favorável quando à sua capacidade de se afastar do crime, mas incorrido na mesma conduta que vira censurada – tráfico de estupefacientes - apenas um ano decorrido sobre o trânsito em julgado da condenação[28]. Nessas circunstâncias, só uma marcada inversão de postura poderia justificar novo juízo de prognose favorável quanto à capacidade de manter conduta conforme ao Direito. Tal não acontece, mormente quanto à obtenção de colocação profissional, pois os factos provados não comportam esse facto.
Face ao exposto, decide-se afastar a aplicação da pena de substituição prevista no artº 50º do CP.
Não obstante a decisão impor ao arguido pena de prisão efectiva, o crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade não admite a imposição de prisão preventiva[29], o que determina, por imperativo dos artsº 202º, nº1, als. a) e b), a contrario, e 212º, nº1, al. a) do CPP, a sua imediata revogação.
Dispositivo
Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal desta Relação em:
Julgar parcialmente procedente o recurso;
Modificar a decisão em matéria de facto, da seguinte forma:
- Onde consta dos factos provados «Em troca dessas vendas, o arguido AA recebia dinheiro, objectos em ouro, telemóveis e outros artigos de fácil revenda», passará a constar «Como pagamento dessas vendas, o arguido CC … recebia dinheiro»;
- Dos factos não provados passará a constar «Em troca dessas vendas, o arguido CC …recebia ainda objectos em ouro, telemóveis e outros artigos de fácil revenda»;
- Eliminar dos factos provados o segmento «Nessa actividade, contava também ele com vários colaboradores que angariavam e revendiam os produtos estupefacientes aos consumidores que demandavam as imediações do Bairro do Ingote», o qual passará a integrar os factos não provados.
Condenar o arguido CC …como autor de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo artº 25º, al. a) do D.L. 15/93, de 22/1, com referência às tabelas anexas I-A e I-B, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão.
Confirmar, no restante, o acórdão recorrido;
Condenar o recorrente nas custas criminais, fixando a taxa de justiça pelo decaimento parcial no recurso em 6 (seis) Ucs (artºs. 515º, nº1, al. b) do CPP, 82º e 87º, nºs 1, al. b) do CCJ).
Revogar a prisão preventiva do arguido CC …e determinar a emissão de mandados de soltura, sem prejuízo da execução da decisão, após trânsito em julgado.
Notifique.

           


[1] Transcrição.
[2] Transcrição.
[3] Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, 2ª ed., Ed. Verbo, pág. 335 e Ac. do STJ de 99/03/24, in CJ (STJ), ano VII, tº 1, pág. 247.
[4] Artsº 119.º, n.º 1, 123.º, n.º 2, 410.º, n.º 2, alíneas a), b) e c), do CPP e acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/95, publicado sob o n.º 7/95 em DR, I-A, de 28/12/95.
[5] Observe-se que a motivação alude ainda a que o acórdão recorrido padece do vício previsto no artº 410º, nº2, al. a) do CPP, mas sem expressão nas conclusões.
[6] Transcrição.
[7] Ac. do S.T.J. de 17/05/2007, Pº 071397, relatado por Santos Carvalho, acessível em www.dgsi.pt. Cfr., ainda, dentre a jurisprudência mais recente do nosso mais Alto Tribunal, acessível no mesmo sítio internet, os Acs. de 23/05/2007, Pº 07P1498 (relator Henriques Gaspar), 14/03/2007, Pº 07P21 (relator Santos Cabral) e de 15/03/2007, Pº 07P610 (relator Pereira Madeira).
[8] O arguido Artur.
[9] Actuação inteiramente remetida para os factos não provados.
[10] Diferentemente dos presentes autos, na situação tratada no Ac. do STJ de 15/03/2007, P 07P648, de que foi relator o Sr. Conselheiro Pereira Madeira, citado pelo recorrente nas motivações, o número de transacções vinha identificado assim como a quantidade envolvida em duas das 51 vendas.
[11] Ac. do STJ de 04/07/2007, Pº 07P2303, relator Cons. Santos Cabral, www.dgsi.pt.
[12] Numa perspectiva mais ampla, configura-se no preceito tutela da própria humanidade, perante a destruição envolvida na adição de substâncias toxicodependentes. Nesse sentido, Ac. do STJ de 26/01/2007, Pº2900/05 - 5.ª Secção, relator Cons. Quintas Gomes, www.stj.pt.
[13] Carmona Salgado, Curso de Derecho Penal Español, Parte Especial, Marcial Pons, 1997, vol II, pag. 157.
[14] Lourenço Martins, Droga e Direito, Aequitas, 1994, pág. 123 e Claus Roxin, Derecho Penal – Parte General, Tomo I, Ed. Civitas, 1997, pág. 89.
[15] Gunter Jakobs, Derecho Penal, Parte General, Fundamentos y teoría de la imputation, Ed. Marcial Pons, Madrid, 1995, pág.212. Sobre a conformidade constitucional deste modelo, cf. o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 426/91, Sub Judice, nº3, Maio/Agosto, pág. 155.
[16] Testo Unico, de 9/10/90, nº309.  Diz o inciso nº5 do artº 73º «que, quando, pelos meios, pela modalidade ou circunstâncias da acção ou ainda pela qualidade ou quantidade da substância, os factos previstos no presente artigo sejam de leve gravidade [lieve entita’], aplica-se a pena de reclusão de um a seis anos e multa de €3000 a €26000», considerando já a alteração introduzida pelo Decreto Lei de 30/12/2005, nº272, convertido em lei , com modificações, pela Lei de 21/02/2006, nº49  (tradução do relator). 
[17] Cfr. C. Cassazione, 11 Julho de 1991, C.E.D., Cass nº 188920 e  R. Ricciotti e M Ricciotti, Gli Stupefacenti, 3ª ed. Cedam, 2000, págs. 135 e 180.
[18] A questão constitui seguramente uma das mais frequentemente revisitadas pela jurisprudência penal pelo que, tomando apenas os anos de 2006 e 2007, cfr. os arestos do STJ de 25/01/2007, Pº 07P4638, relator Cons. Pires da Graça, 25/01/2007, Pº 06P3839, relator Cons. Carmona da Mota, 15/02/2007, Pº 06P4339, Cons. Carmona da Mota, 29/03/2007, Pº 07P1020, 19/04/2007, Pº 07P449, relator Cons. Rodrigues Costa, 29/03/2007, Pº 07P149, Cons. Rodrigues Costa, 04/07/2007 (já referido na nota 11), 12/07/2007, Pº 07P2084, Cons. Santos Carvalho e de 16/01/2008, Pº 07P4638, Cons. Pires da Graça, todos em www.dgsi.pt..
[19] Proferido no proc. 912/99, 3ª secção, relator Cons. Armando Leandro, www.dgsi.pt
[20] Ac. do STJ de 12/07/2007, identificado na nota anterior.
[21] Figueiredo Dias, Fundamento, sentido e finalidades da pena criminal, Coimbra Ed., 2001, pág. 104 e segs.
[22] Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, Ed. Aequitas, 1993, pág. 227.
[23] Ac. do STJ de 28/09/2005, Pº 05P2537, relator Cons. Henriques Gaspar, www.dgsi.pt.
[24] Considerando-se aqui o período de dois anos e oito meses, atento o disposto nos artºs. 2º, nº4 e 50º, nº5, do CP, na redacção decorrente da Lei 59/2007, de 4/9.
[25] BMJ 428, pág. 353.
[26] Ac. do STJ de 05/12/2007, Pº 07P3396, relator Cons. Santos Cabral, www.dgsi.pt.
[27] Refere-se no Ac. do STJ de 06/02/2008, Pº 08P101, relator Cons. Oliveira Mendes, que na Alemanha a suspensão é obrigatória para penas inferiores a 6 meses de prisão caso se verifique certo condicionalismo, sendo aplicada a penas entre 6 meses e 1 ano de prisão caso se não oponham razões atinentes à defesa da ordem jurídica, podendo ser aplicada às penas entre 1 e 2 anos de prisão, quando se verifiquem especiais circunstâncias. Na Áustria vigora um regime semelhante; na Suíça a suspensão é possível para penas até 3 anos de prisão; na Itália o limite é de 2 ou 3 anos de prisão consoante se trate de um condenado adulto ou jovem até 18 anos; na Espanha só as penas inferiores a 2 anos são susceptíveis de suspensão de execução; na França a possibilidade de suspensão estende-se às penas até 5 anos de prisão e na Inglaterra às penas até 2 anos de prisão; no Brasil só as penas não superiores a 2 anos de prisão podem ser suspensas na sua execução, a menos que o condenado tenha mais de 70 anos de idade ou que por razões de saúde se justifique a suspensão, casos em que é admissível a suspensão da execução de penas não superiores a 4 anos de prisão.
[28] A condenação por tráfico de menor gravidade transitou em julgado em 9/12/2005 e, nos termos provados, o arguido iniciou a actividade de venda censurada nestes autos em 11/12/2006.
[29] Uma vez que a moldura penal não ultrapassa os cinco anos de prisão e o crime cometido não integra a categoria de criminalidade violenta ou altamente organizada. Nesse sentido, Ac. do STJ de 10/10/2007, Pº 07P3780, relator Cons. Raul Borges, www.dgsi.pt.