Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
484/02.2TATMR.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: BRÍZIDA MARTINS
Descritores: DECLARAÇÕES DO CO-ARGUIDO
JOVEM DELINQUENTE
Data do Acordão: 03/30/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 1º J TRIBUNAL JUDICIAL DE TOMAR
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 133º, 140º, 343º E 345 CPP; DECRETO-LEI N.º 401/82, DE 23/9.
Sumário: I- As declarações do co-arguido são meio admissível de prova e, como tal, podem ser valoradas pelo tribunal para fundar a sua convicção acerca dos factos que dá como provados, desde que acautelada a possibilidade do seu contraditório.

II- O regime especial para jovens delinquentes criado pelo DL 401/82 de 23/9 não é de aplicação imediata, dependendo antes de um juízo de prognose favorável à reinserção social do jovem condenado feito perante situações concretas.

III – Nesse juízo de deve considerar-se tanto a globalidade da actuação do jovem, como a sua situação pessoal e social, o que implica o conhecimento da sua personalidade, das suas condições pessoais, da sua conduta anterior e posterior ao crime.

IV- Tendo um dos arguidos sido anteriormente condenado em pena de prisão suspensa, pela prática de um crime de homicídio tentado numa pena de prisão cuja execução lhe foi suspensa, e o outro em duas condenações por furto tendo mesmo cumprido pena de prisão, aliados à natureza dos ilícitos cometidos nos autos, fica excluído qualquer juízo de prognose favorável à sua reinserção social futura.

Decisão Texto Integral: I - Relatório.

1.1. Conjuntamente com outros demais arguidos, ora não recorrentes, RM...; CM...; HF...; RC... e OO…, todos já mais identificados nos autos, foram submetidos a julgamento, sob a aludida forma de processo comum colectivo, porquanto acusados pelo Ministério Público da prática indiciária de factos susceptíveis de eventualmente os instituir:

- O arguido RM..., na co-autoria material e concurso real (art.ºs 26.º e  30.º, n.º 1, ambos do Código Penal[1]), de 4 crimes de furto qualificado, previstos e punidos através das disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1; 204.º, n.º 2, alíneas e) e f) com referência ao art.º 202.º, alíneas c) e f); de dois crimes de furto qualificado, previstos e punidos pelas disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1; 204.º, n.º 2, alíneas a) e e) por referência ao art.º 202.º, alíneas b), d) e e); de um crime de furto qualificado, previsto e punido através das disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1; 204.º, n.º 1, alínea f); de um crime de falsificação de documentos, previsto e punido pelo art.º 256.º, n.ºs 1 al a) e 3; de um crime de furto na forma tentada, previsto e punido através das disposições conjugadas dos art.ºs 22.º; 23.º; 73.º e 203.º, n.º 1; e, por fim, de um crime de receptação, previsto e punido pelo art.º 231.º, n.º 1.

- O arguido CM..., na co-autoria material e concurso real de 7 crimes de furto qualificado, previstos e punidos através das disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1; e 204.º, n.º 2, alínea e), com referência ao art.º 202.º, alíneas e) e f); de 2 crimes de furto qualificado, previstos e punidos pelas disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea e); de 2 crimes de furto qualificado, previstos e punidos através das disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea f); de 2 crimes de furto qualificado, previstos e punidos pelas disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alíneas a) e e), por referência ao art.º 202.º, alíneas b), d) e e); de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo art.º 256.º, n.ºs 1, alínea c)  e 3; de um crime de receptação, previsto e punido pelo art.º 231.º, n.º 1; e, finalmente, de um crime previsto e punido pelo art.º 6.º, da Lei n.º 22/97,  de 27 de Junho, na redacção que lhe foi  introduzida  por intermédio da Lei n.º 98/01, de 25 de Agosto.

-  O arguido HF…, na co-autoria material e concurso real, de 5 crimes de furto qualificado, previstos e punidos através das disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1; 204.º, n.º 2, alínea c), por referência ao art.º 202.º, alíneas d) e  e); de 2 crimes de furto qualificado, previstos e punidos pelas disposições conjugadas dos art.ºs. 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea e); de 2 crimes de furto qualificado, previstos e punidos através das disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alíneas a) e e), com referência ao art.º 202.º, alíneas  b), d) e e); de 2 crimes de furto qualificado, previstos e punidos pelas disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea f); de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo art.º 256.º, n.ºs 1, alínea a) e 3.

- O arguido RC..., na co-autoria material e concurso real de 5 crimes de furto qualificado, previstos e punidos através das disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1; 204.º, n.º 2, alínea a), com referência ao art.º 202.º, alíneas e) e f); de 2 crimes de furto qualificado, previstos e punidos pelas disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1; 204.º, n.º 2, alíneas a) e c), com referência ao art.º 202.º, alíneas b) e) e f); de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos  art.ºs 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea f); de um crime de furto, mas este sob a forma tentada, previsto e punido através das disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1; 22.º, n.ºs 1 e 2; 23. n.º 3 e 73.º, n.º 1; de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo  art.º 256.º, n.ºs 1, alínea a) e 3; de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2 do  Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro.

- O arguido OO...,  na autoria, em concurso real de infracções, de 6 crimes de receptação, previstos e punidos pelo art.º 231.º, n.º 1; de um crime de abuso de confiança, previsto e punido através do art.º 205.º, n.º 1; e, na co-autoria material de um crime previsto e punido pelo art.º 6.º, da Lei n.º 22/97, de 27 de Junho, na redacção introduzida  pela Lei n.º 98/01, de 25 de Agosto.

1.2. Com base nos mesmos factos FM... (fls. 1.193) deduziu o pedido civil de pagamento da quantia de € 1.750, sendo € 500 respeitantes à perda de 10 dias de trabalho e € 1.250 referentes à reparação de um ciclomotor; S…f1.482) deduziu o pedido da quantia de € 16.510 contra os arguidos RM…, HF..., RC..., OO...(e outros), correspondente ao preço da totalidade dos bens que lhe foram furtados; JJ… (fls. 1.490) deduziu contra o demandado OO...o pedido da quantia de € 3.000 atinente a danos patrimioniais e não patrimoniais sofridos em virtude da conduta delitiva daquele; TX... (fls. 1.526) deduziu contra os demandados RM..., HF..., CM…, RC...e OO...(e outro) o pedido de pagamento da quantia de € 8.016,34 por eles devida a título de danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos com o furto que o vitimou.

1.3. Na sequência de aresto deste Tribunal da Relação, em cumprimento do estatuído pelo art.º 358.º do Código de Processo Penal, foi comunicado ao arguido OO...uma alteração não substancial dos factos, relacionada com o facto de o mesmo ter sido acusado de se apropriar de extensores em número e valor não determinado e o Tribunal a quo, após anterior produção da prova, ter obtido prova quanto ao número e valor destes sem que, então, lhe houvesse comunicado o facto.

Arguido que, reaberta a audiência e comunicada tal alteração, pese embora haja pedido o prazo de 10 dias para apresentar prova suplementar, certo é nenhuma ter junto aos autos.

1.4. Findo o contraditório, determinou o Acórdão prolatado ex novo na 1.ª instância (no que concerne aos mencionados arguidos recorrentes, e ao que ora pode relevar):

(parte criminal)

- Condenar o arguido RM... como co-autor material de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alíneas a) e e) [às instalações da S... e ponto XI da matéria de facto provada], na pena de 5 anos de prisão; como autor material, mas sob a mera forma tentada, de um crime de furto, previsto e punido através das disposições conjugadas dos art.ºs 203.º, n.º 1 e 73.º, n.ºs 1 e 2 [Opel Corsa  ... e ponto XIII da matéria de facto assente], na pena de 3 meses de prisão; como autor de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 1, alínea f) [à Fábrica … de TMR... e ponto ponto XIV da matéria de facto provada], na pena de 28 meses de prisão;  e, como autor de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo art.º 256.º, n.ºs 1, alínea a) e 3 [chapas de matrícula e ponto XI da factualidade provada], na pena de 18 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico logo operado relativamente a tais penas parcelares, ficou o arguido condenado na pena única de 6 anos de prisão.

- Condenar o arguido CM...como co-autor material de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 1, alínea f) [à residência de FG… e ponto III da matéria de facto provada], na pena de 30 meses de prisão; enquanto agente de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alínea e) [ao mini autodromo de TMR... e ponto V dos factos assentes], na pena de 36 meses de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alínea e) [aos pavilhões da ... e ponto VII dos factos provados], na pena de 25 meses de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alínea e) [à residência de TX... e ponto IX dos factos assentes], na pena de 4 anos de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alíneas a) e) [às instalações da S... L.da e ponto XI dos factos provados], na pena de 5 anos de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 1, alínea f) [às instalações da Fábrica … de TMR... L.da e ponto XIV dos factos provados], na pena de 28 meses de prisão; de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo art.º 256.º, n.ºs 1, alínea a) e 3 [chapas de matrícula e ponto XI da factualidade assente], na pena de 18 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico operado de imediato e relativamente a tais penas parcelares, acabou este arguido condenado na pena única de 10 anos de prisão.

- Condenar o arguido HF… como co-autor material de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alínea e) [à residência de FG… e ponto III da matéria de facto provada], na pena de 26 meses de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alínea e) [ao mini autódromo de TMR... e ponto V assente], na pena de 36 meses de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alínea e) [aos pavilhões da ... e ponto VII da matéria de facto provada], na pena de 25 meses de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alínea e) [à residência de TX... e ponto IX da matéria de facto provada], na pena de 4 anos de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 1, alínea f) [à garagem de XB… e ponto X dos factos assentes], na pena de 18 meses de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alíneas a) e e) [às instalações da S... L.da e ponto XI dos factos provados], na pena de 5 anos de prisão; de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo art.º 256.º, n.ºs 1, alínea a) e 3 [chapas de matrícula e ponto XI da factualidade acolhida], na pena de 18 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico destas penas parcelares, acabou tal arguido condenado na pena única de 8 anos de prisão.

- Condenar o RC... como co-autor material de um crime de furto simples, previsto e punido pelo art.º 203.º, n.º 1 [à Quinta … e ponto I dos factos provados], na pena de 4 meses de prisão; como autor de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alínea e) [à Quinta … e ponto IV dos factos provados], na pena de 30 meses de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alínea e) [ao mini autodromo de TMR... e ponto V dos factos assentes], na pena de 36 meses de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e pounido pelo art.º 204.º, n.º 2, alínea e) [à residência de TX... e ponto IX da matéria de facto provada], na pena de 4 anos de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, alíneas a) e e) [às instalações da S... L.da e ponto XI da factualidade acolhida], na pena de 5 anos de prisão; de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 1, alínea f) [à Fábrica ...de TMR... L.da e ponto XIV dos factos assentes], na pena de 28 meses de prisão; de um crime de furto simples, mas sob a a forma tentada, previsto e punido pelo art.º 203.º, n.ºs 1 e 2 e 73.º [do veículo Opel Corsa  ... e ponto XIII dos factos provados], na pena de 3 meses de prisão; de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo art.º 256.º, n.ºs 1, alínea a) e 3 [chapas de matrícula e ponto XI da factualidade provada], na pena de 18 meses de prisão; de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo art.º 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 2/98 [condução do Mitsubishi e ponto XI dos factos assentes], na pena de 2 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico de tais penas, vem o recorrente condenado na pena única de 9 anos de prisão.

- Condenar o arguido OO... como autor material de um crime de receptação, previsto e punido pelo art.º 231.º, n.º 1 [dos bens furtados na S... e ponto XII dos factos provados], na pena de 30 meses de prisão; de um crime de receptação, previso e punido pelo mesmo art.º 231.º, n.º 1 [dos bens furtados na Fábrica …TMR... e ponto XIV da matéria de facto provada], na pena de 18 meses de prisão; de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo art.º 205.º, n.º 1 [apropriação dos 20 extensores e ponto XV da factualidade provada], na pena de 18 meses de prisão e, de um crime de detenção ilegal de arma, previsto e punido pelo art.º 6.º da Lei n.º 22/97, de 27 de Junho, com as as alterações introduzidas pela Lei n.º 98/01, de 25 de Agosto [ponto XIX dos factos assentes], na pena de 8 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico imediato de tais penas parcelares, ficou o arguido condenado na pena única de 4 anos e 3 meses de prisão, contudo suspensa por igual período de tempo, sob condição de o arguido solver ao lesado JJ…, no prazo de 90 dias, a quantia indemnizatória de € 2.300.

(parte cível)

- Condenar os demandados RM..., CM…, HF..., (...) e RC...a pagarem à S... a quantia de € 15.458,96 acrescida de juros contados desde 29 de Outubro de 2007.

- Condenar os demandados civis CM…, HF..., (...) e RC...a pagarem a TX... a quantia de € 7.820,81 acrescida de juros desde 29 de Outubro de 2007.

- Condenar o demandado OO... a pagar a JJ… a aludida quantia de € 2.300.

1.5. É na irresignação com tal veredicto que vêm interpostos os recursos presentes, sendo que dos requerimentos com que minutaram as respectivas discórdias, extrairam os mencionados arguidos as seguintes conclusões:

(O arguido RM…)

1. O recorrente confessou em audiência de julgamento, espontaneamente e sem qualquer reserva, toda a sua participação criminal, só não confessando os factos que efectivamente não come­teu, como seja a autoria do crime de furto ocorrido nas instalações da ofendida S... e a falsificação da matrícula do veiculo Mitsubishi  ....

2. Na noite do crime, o recorrente estava a trabalhar na padaria de seu pai, para onde o Mitsubi­shi …, carregado de materiais furtados, foi levado, tendo ajudado a descarregar, mas é falso que tenha participado no furto do veículo e dos objectos, que ajudou a «esconder», com plena consciência de que eram de proveniência ilícita, mas não furtou.

3. Donde que, no que concerne, a sua conduta não configure a prática de um crime de furto qualificado, mas sim de um crime de receptação.

4. A própria acusação, no seu art.º 25.º, refere expressamente que o veículo Mitsubishi  ... foi conduzido pelo arguido RC....

5. Nenhuma prova se fez em julgamento de qualquer acordo prévio para comissão do crime de furto qualificado ou falsificação da matrícula do Mitsubishi  ....

6. Sobre a prova da falsificação, só o arguido CM… afirmou em resposta à pergunta «quem é que estava presente quando tiraram as matrículas?» «Estava lá eu, o RC..., o RM..., o CM… e acho que mais ninguém». Achar não chega para condenar.

7. As testemunhas CB... e LB... declararam terem visto o recorrente condu­zindo o Mitsubishi, mas isso apenas poderá ter sido mais tarde, não na madrugada do dia 29 para 30 de Julho de 2002, data em o furto ocorreu e nem sequer o local onde viram o arguido foi indicado na prova que sustentou a condenação.

8. Acresce que o arguido era na altura menor de 20 anos; consumia drogas; está reinserido socialmente e vive com os pais, com quem trabalha. Não existe objectivamente perigo de con­tinuação da actividade criminosa, visto que o recorrente se integrou socialmente por si pró­prio, com ajuda familiar.

Terminou pedindo que no provimento da impugnação seja decretada a absolvição relativamente aos dois indicados ilícitos por cuja autoria também vem condenado, ou, concedendo a subsistência dessas condenações, lhe seja aplicado o regime jurídico respeitante aos Jovens Adultos, com atenuação da pena e sus­pensão da sua execução, subordinada ao cumprimento de regras de conduta.

(O arguido  CM...)

1. Da audiência de julgamento não resultou prova de que o ora recorrente tenha tido qualquer participação no furto verificado em Dezembro de 2001, na residência de FG...e mulher, no ...- TMR....

Na verdade, a mera circunstância de bem mais tarde lhe terem sido apreendidos objectos que lhe foram doados, pelo arguido HF...como se provou, não é suficiente para ter sido dado como provado, ter aquele arguido agido com este, em execução de um plano previamente traçado, que também se não provou minimamente. O contrário resulta quer das declarações do prórpio recorrente, quer das prestadas pelos co-arguidos RC... e HF…, como se menciona na motivação do recurso.

2. Também da audiência de julgamento, e ao invés do que se deu como provado no Acórdão recorrido, não resultou qualquer prova de que o ora recorrente tenha intervido conjuntamente com os demais co-arguidos em execução de acordo prévio de comparticipação criminosa, nos crimes de furto verificados, entre os dias 12 e 18 de Maio de 2002, no Mini-Autódromo de TMR...; na noite de 29 para 30 de Junho de 2002, nas instalações da firma S..., Lda., e entre Agosto de 2001 e Agosto de 2002 nas instalações da Indústria …, S.A.

O contrário decorre tanto das declarações do ora recorrente, quanto dos co-arguidos HF..., CM... e RC... (Mini-Autódromo de TMR..., relativamente ao que concede haver anuido a que determinados objectos fossem depositados numa garagem sua e depois aí apreendidos); das suas declarações e das prestadas pelos co-arguidos RM… e RC... (furto nas instalações da firma S..., Lda e falsificação das chapas de matrícula do veículo Mitsubishi); das suas declarações e dos co-arguidos RM… e CM... (assaltos perpetrados nas instalações da Indústria ..., S.A.).

3. O simples facto de terem sido apreendidos ao ora recorrente alguns objectos relacionados com alguns dos crimes cometidos por outros co-arguidos, apenas poderiam integrar crimes de receptação, mas relativamente aos quais se não mostra ele acusado.

4. O simples apelo às regras da experiência comum feito pelo Acórdão recorrido para fundamentar a sua condenação enquanto agente do crime de falsificação das chapas de matrícula, não basta para decidir em seu desfavor.

5. Nenhuma prova permitia concluir a comparticipação do recorrente em qualquer desses ilícitos. E, mesmo concedendo-se a atribuição de qualquer actuação paralela, pelo simples facto de numa situação ter conduzido os demais co-arguidos e noutra ter ajudado a descarregar objectos de um veículo, ele só poderia ser responsabilizado por resultado a que a sua conduta individual desse lugar. Ora, o recorrente limitou-se nalgumas situações a guardar objectos resultantes de actividade delituosa de alguns outros co-arguidos nestes autos.

Tudo isto como corolário da teoria da causalidade adequada, expressamente consignada no art.º 10.º, n.º 1.

6. Decidindo como o fez relativamente a tais crimes, o Tribunal recorrido incorreu em erro notório na apreciação de prova e em preterição ao principio do in dúbio pro reo.

7. As penas parcelares respeitantes aos crimes cometidos pelo recorrente [pontos VII e IX da matéria de facto provada] quando cumuladas, não justificam a imposição de uma pena única superior a três anos de prisão.

8. Que, atentando-se nas condições pessoais e sociais do recorrente; na sua personalidade, e nas necessidades de prevenção especial e de ressocialização, impõem uma sua atenuação especial.

9. Com efeito, o recorrente é bastante novo; não é reincidente; está integrado no mercado de trabalho; tem vida familiar estável e, volvidos seis anos sobre o momento da prática dos factos, tem demonstrado bom comportamento.

10. Isto é, tudo conjugado, podemos concluir que a simples censura dos factos e a ameaça da pena são adequados e suficientes para prevenção de futuros crimes e demais finalidades da punição.

Terminou pedindo, consequentemente, o eximir da responsabilidade decretada quanto aos ilícitos que menciona, bem como a suspensão da execução da pena relativamente áqueles por cuja prática deve manter-se a respectiva condenação.

(O arguido HF…)

1. Da audiência de julgamento não resultou provado que o arguido tenha tido qualquer tipo de participação no furto às instalações da S..., pois que o mesmo negou tal envolvimento, sendo que confessou os crimes cometidos noutras situações, e, das declarações de outros co-arguidos, resulta provado que o recorrente nada teve a ver com a situação referida no ponto XI do Acórdão recorrido.

2. Também não resultou provada a execução de plano previamente traçado quer no que respeita ao furto supra referido quer no cometimento do subsequente crime de falsificação de documento. Aliás, resulta exactamente o contrário, quer das declarações do arguido quer da prova globalmente apreciada.

3. Da prova produzida apenas ficou provado que o ora recorrente viu o co-arguido RC...a conduzir o Jeep o que, por si só, não pode provar a sua (com) participação.

4. Ao contrario do que refere o Acórdão recorrido, também não ficou provado que o ora recorrente tenha tido, de qualquer forma, algum tipo de actuação que permita concluir, como sucedeu, ter o mesmo cometido um crime de falsificação de documento.

5. E, não basta recorrer às simples regras de experiencia comum para decidir e concluir pela participação do arguido, como fez o Acórdão recorrido, pois que tal postura, sem qualquer outro fundamento ou prova adicional, põe em causa os direitos dos arguidos, nomeadamente, a presunção de inocência em caso de dúvida.

6. Decidindo pela forma em que o fez, o Acórdão recorrido incorreu em erro notório na apreciação da prova e violou o princípio do in dúbio pro reo.

7. O recorrente confessou ter participado nos crimes descritos nessa peça processual sob os pontos III, V, VII, IX e X, tendo, contudo, negado qualquer tipo de envolvimento ou actuação no que concerne aos dois crimes do ponto XI.

8. Ao não TMR... em consideração várias circunstâncias atenuantes do comportamento do arguido, designadamente: o arrependimento; as suas condições socioculturais e económicas; e, à data da pratica dos factos, ter 18 anos de idade, dependendo absolutamente de terceiros, o mesmo Acórdão questionou o disposto nos art.ºs 71.º, n.º 2, alíneas c), d) e f); 72.º, n.º 2, alínea d) e 73.º.

9. A pena única cominada ao recorrente, mostra-se manifestamente excessiva e desadequada, pois que a simples censura dos factos e a ameaça da pena são adequados e suficientes para a prevenção de futuros crimes.

10. Considerando a actual situação arguido, que se encontra a trabalhar, sem dependências de qualquer espécie e perfeitamente inserido socialmente, jusitifica-se a aplicação do regime especial para jovens, previsto no art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro.

Terminou pedindo a revogação parcelar do Acórdão proferido e reduzido o quantum da pena de prisão, seja suspensa a sua execução.

(O arguido RC...)

1. Impunha-se a elaboração de relatório social sobre o recorrente, essencial no caso para numa correcta aplicação de qualquer medida sancionária.

2. A apreensão dos rolos de fita adesiva e da caixa de ferramentas, única prova concreta contra o recorrente, para além das declarações de co-­arguidos (e a sua própria confissão quanto ao crime de condução sem habilitação legal) legitimariam, quando muito, a sua condenação pelo crime de receptação.

3. Os depoimentos incriminatórios dos co-arguidos carecem de ser corroborados por outros elementos de prova, o que se não verificou em nenhuma das condenações do recorrente.

4. Nem a prova produzida legitima, nem a fundamentação da matéria de facto justifica a condenação do recorrente pelo crime a que se reportam os pontos I; IV; V; IX;  XI; XIV e XIII dos factos provados.

5. As penas aplicadas ao recorrente mostram-se manifestamente exageradas e não são conformes nem com a letra, nem com o espírito da lei nos seus objectivos de ressocialização e integração, sendo desnecessárias do ponto de vista da prevenção.

6. Foi, consequentemente, violado o preceituado no art.º 71.º

Terminou pedindo o provimento do recurso em conformidade com o mencionado.

(O arguido OO...)

1. O recorrente foi condenado por crime de detenção de arma proibida, ao abrigo de legislação já revogada na data da condenação, pelo artigo 118.º da Lei n.º 5/2006, concretamente o artigo 6.º da Lei n.º 22/97, que foi violado.

2. Pelo «Novo Regime Jurídico das Armas e suas Munições», aprovado através da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, cujo artigo 86.º pune agora o crime detenção de arma, esta deve ser devida­mente classificada, o que foi omitido no processo, desconhecendo-se que classe de arma se trata.

3. Se concorressem idealmente no caso os dois indicados regimes jurídicos, então haveria lugar à valoração prevista no n.º 4 do artigo 2.º, aplicando-se o regime concretamente mais favorável, o que foi também omitido no Acórdão sob recurso.

4. Mas ainda assim a arma estava licenciada e registada, com documentos apreendidos no pro­cesso, pelo nunca haveria lugar à aplicação de qualquer sanção penal pela sua posse.

5. Sobre o crime de abuso de confiança por alegada não devolução de vinte extensores, não constava da acusação qualquer quantidade como valor unitário, ainda que mero «valor jurado» ou resultante de avaliação, sujeita ao princípio do contraditório, princípio que não foi integralmente satisfeito com a repetição parcial do julgamento, porque o queixoso nada de novo trouxe aos autos, para comprovar a sua queixa, de que o acusado se pudesse efectiva­mente defender.

6. As quantidades e valores foram encontrados pelo Tribunal, no 1.º julgamento, sem possibili­dade de defesa do arguido, com manifesta alteração dos factos constantes da acusação e sem cumprimento do regime dos artigos 358.º e/ou 359.º, ambos do Código de Processo Penal, em afronta às regras do due process of law, agora suprido com inversão do ónus de prova, visto que se impôs ao acusado a prova da aquisição dos extensores, para demonstrar que eram seus e não do pretenso ofendido.

7. No que concerne às condenações por dois crimes de receptação, não se demonstra que o recorrente tivesse conhecimento de que se cometeu algum crime contra o património ou que se tenha aproveitado dos efeitos da comissão de tal crime, pelo que mal andou o Acórdão em causa ao condenar por crime de receptação dolosa, sem provas desse conhecimento e aproveita­mento, por mera presumptio iuris de que estando objectos em propriedade sua o recorrente os conhecia e receptava.

8. A condenação cível deve improceder, por se não verificarem no caso os elementos previstos nos artigos 483.º e seguintes do Código Civil, nomeadamente nexo de causalidade entre factos delituosos e danos, nem sequer pedido do demandante restrito ao objecto da acu­sação e julgamento, completamente alheio a questões de «ofensas corporais ou morais».

Terminou pedindo o eximir de toda a responsabilidade criminal e cível decretada, ou, caso assim não se entenda, seja determinada a suspensão de execução da pena cominada, sem qualquer condição de pagamento indemnizatório.

1.6. Cumprido o disposto pelo artigo 413.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, seguiram-se respostas do Ministério Público pugnando pela manutenção do decidido e, logo, pelo improvimento dos recursos.

1.7. Proferido despacho admitindo-os, foram os autos remetidos a esta instância.

1.8. Aqui, com vista respectiva, nos termos do artigo 416.º, do Código de Processo Penal, o Ex.mo Procurador-geral Adjunto emitiu parecer conducente a idêntica manutenção do veredicto da 1.ª instância.

Deu-se cumprimento ao estatuído no n.º 2 do subsequente artigo 417.º.

1.9. Por sua vez, no exame preliminar a que alude o n.º 6 deste mesmo inciso, consignou-se não ocorrerem pressupostos conducentes à apreciação sumária das impugnações, além de nada obstar ao seu conhecimento de meritis.

Daí que fosse ordenado o respectivo prosseguimento, com recolha de vistos e submissão à presente conferência.

Urge, pois, ponderar e decidir.


*

II – Fundamentação de facto.

2.1. É a seguinte a mencionada na decisão recorrida (saliente-se que atentando-se na economia da sua reprodução apenas aos ora recorrentes, isto tanto quanto possível fôr):

a) Factos provados.


I

Em dia não apurado do mês de Janeiro de 2000, o arguido RC... entrou numa arrecadação anexa à Quinta ..., sita em ..., TMR....

Previamente, abriu a porta daquela arrecadação.

Do interior retirou uma espingarda de caça, marca Luigi Franchi, calibre 12mm, de um cano, n.º 627614.

Da qual se apoderou no intuito de fazer coisa sua, bem sabendo que não lhe pertencia e que agia contra a vontade do dono.

A descrita espingarda pertencia a X...

Encontrava-se guardada num armário da referida arrecadação.

Foi apreendida, no dia 15 de Outubro de 2002, na residência do arguido OX... ... que a detinha sabendo da sua proveniência.    

Agiu o arguido com o propósito de auferir para si um benefício que lhe não era devido ao mesmo tempo que prejudicou o proprietário daquela arma.

À data foi avaliada em € 25.

(...)


III

Em dia  e hora não apurados, mas durante o mês de Dezembro de 2001, o arguido HF..., na execução de um plano previamente traçado com o arguido CM…, introduziu-se na residência de FG...e de RX… .

Para tanto, partiu os vidros de uma janela das traseiras.

Do interior daquela residência retirou:

 - Um (1) relógio de parede, com caixa de madeira, marca Reguladora, com porta frontal e inscrição 336/45, NOV 1997 na parte traseira do relógio, avaliado em € 500;

- Um (1) Buda em porcelana, com 30 Cm de altura, de cor beije e grená e base de cor preta, avaliado em € 50;

- Um pote em porcelana, redondo , com 30 cm de altura, com flores de cor azul, castanho e branco, com os dizeres “Século XVIII – Hand Painted –Portugal 101, avaliado em € 80.

De tudo os arguidos se apoderaram no intuito de fazer coisa sua, bem sabendo que não lhes pertencia e que agiam contra a vontade do dono.

Aqueles bens tinham um valor global de pelo menos € 630.

Os objectos acima descritos foram encontrados na residência do arguido CM....

Os arguidos agiram em comunhão de esforços e na execução de um plano previamente traçado.


IV

Em dia não apurado, no período compreendido entre 1 de Dezembro de 2001 e 5 de Janeiro de 2002, os arguidos (...), RC... e (...), entretanto falecido, introduziram-se numa das residências situadas na Quinta ..., ..., TMR....

Para tanto, rebentaram com as fechaduras das respectivas portas, utilizando um instrumento tipo pé de cabra e partiram a janela da cozinha por onde entraram.

Do seu interior retiraram:

a) uma mala, em matéria plástica, cor verde garrafa, com referência “ZAC” contendo diversos parafusos e porcas, avaliada em € 30;

b) um monitor de computador  marca “compaq” avaliado em € 50;

c) um teclado de computador, sem marca, de cor creme, avaliado em € 5;

d) uma bicicleta, de cor amarela, avaliada em € 80.

De tudo os arguidos se apoderaram, no intuito de fazer coisa, sua, bem sabendo que não lhes pertencia e que agiam contra a vontade do dono.

Num valor global de € 165.

Os descritos objectos pertenciam a JL… .

Os bens referidos nas alíneas b) e c) foram encontrados na residência do arguido (...); o bem referidos na alínea a) foi encontrada na residência do arguido RC... e a bicicleta referida  na alínea d) foi encontrada na residência de (...).

Os arguidos agiram em conjugação de esforços e execução de plano previamente traçado.


V

No período compreendido entre 00.00, do dia 12 de Maio de 2002 e as 23.00, do dia 18 de Maio do mesmo ano, a hora não apurada, mas durante a noite, os arguidos RC... e HF... dirigiram-se às instalações do “Mini-Autódromo de TMR...”, sito em …, Quinta …, TMR....

Ali chegados, o arguido RC... ficou de vigia nas imediações.

O arguido HF... trepou a vedação circundante.

Seguidamente com uma pedra arrombaram a porta daquelas instalações, que se encontrava fechada á chave.

Entrou no imóvel.

Do seu interior retirou:

- Um carro de Modelismo marca TAMYA, com rádio control ACORS e carroçaria de cor cinzenta, marca “Mercedes C.L.K.”, avaliado em € 400;

- Dois (2)  carros de Modelismo SST, eléctricos, avaliados em € 200, cada um;

- Um carro de Modelismo, marca “Serpente Impulse”, a gasolina, avaliado em € 330;

- Um Carregador, marca Kyohso, avaliado em € 50;

- Uma (1) caixa arrancador marca Serpent, avaliada em € 75;

- Dois (2) boiões reabastecedores de combustível, avaliadas em € 5, cada um;

- Um (1) comando controle Granpner, com bolsa azul e preta, marca “Team Orin”, avaliado em € 95;

- Uma (1) mala de ferramentas, de cor verde e creme, com quatro (4) gavetas, contendo diversos acessórios de carros de modelismo e ferramentas de percussão avaliada em € 150.

Tudo no valor global de € 1.505.

Na posse dos descritos objectos  o arguido HF... foi ao encontro do arguido RC....

Após o que  telefonou ao arguido CM...a quem relatou o ocorrido.

Pediu-lhe que se deslocasse às imediações do autódromo, com a sua carrinha marca Citroen, modelo Berlingo, matricula…, a fim de transportar o descrito material de Modelismo.

Ao que o arguido CM...anuiu.

Nessa sequência, pouco tempo depois apareceu no local acompanhado do arguido (...).

Retiraram ainda do interior do mesmo:

- Um (1) carregador, marca “Shumacher”, avaliado em € 60;

- Um motor eléctrico para carro de modelismo, marca CS, avaliado em € 25;

- Uma bateria, de 12 Volts, avaliada em € 50;

- Uma mala de tecido de cor preta e roxa, com a inscrição ”Serpent Motorsport”, contendo diversos acessórios de Modelismo, avaliada em € 500;

- Um carro de Modelismo, a gasolina, marca “Serpent”, no valor de € 300;

- Uma caixa de cartão, de cor preta, com a inscrição” Mission”, contendo rodas e jantes  de carro de modelismo, tudo avaliado em € 30;

- Um carro de Modelismo, marca “Mission”, eléctrico avaliado em € 300;

- Um rádio controle, marca Granpner,  avaliado em € 75;

- Duas carroçarias, uma “BMW” de cor verde e amarela e outra “Subaru”, cor azul e amarela, avaliadas em € 60 e diversos acessórios para modelismo, cujo valor não foi possível apurar;

De tudo se apoderaram, no intuito de fazer coisa sua, bem sabendo que não lhes pertencia e que agiam contra a vontade do dono.

Num valor global de € 1.400.

Todos os arguidos carregaram os objectos acima descritos para a identificada carrinha.

Dos quais se apoderaram, no intuito de fazer coisa sua, bem sabendo que não lhe pertencia e que  agiam contra a vontade do dono.

Os arguidos agiram em comunhão de esforços e execução de plano previamente traçado.

Os quatro arguidos actuaram em conjugação de esforços e execução de plano previamente traçado.

O material de Modelismo pertencia a FC…, proprietário do Mini-Autódromo de TMR....

Posteriormente, em dia, hora e local não apurados, o arguido HF... ofereceu ao arguido (...) um dos carros de modelismo com comando retirado do autódromo.

O arguido (...) sabia da proveniência do carro de modelismo porque o HF... lhe disse.

(...)


VII

No dia 4 de Junho de 2002, a hora não apurada, mas durante a noite, os arguidos HF..., CM...e (...), dirigiram-se para os Pavilhões da ... sitos na cidade de TMR....

Para onde se fizeram transportar na carrinha marca Citroen, modelo Berlingo, matricula …, conduzida pelo arguido CM…, utilizada na distribuição do pão.

Ali chegados, deixaram o arguido HF...junto dos referidos Pavilhões e o CM...e o (...) foram distribuir o pão.

O arguido HF...entrou na Secção de Obras, pela porta principal que estava aberta.

Seguidamente, rebentou o cadeado que fechava uma vitrina destinada ao atendimento.

Local por onde entrou para o respectivo gabinete.

De onde retirou várias chaves das portas das demais Secções.

Bem como vários cartões de combustível.

Após o que, ainda na Secção de Obras o arguido HF...partiu o vidro da porta de acesso a outro gabinete.

Entretanto, os arguidos CM...e (...) aguardavam junto à entrada.

Do interior do gabinete o arguido HF... retirou:

- Um rádio emissor-receptor, marca YAESU, de cor preta, com o n.º de Série 71180234, com a respectiva pilha, ao qual não foi atribuído qualquer valor;

- Um carregador de cor preta, marca YAESU-Rapi Chenger – NC50, referência SA14N10007138 ao qual não foi atribuído qualquer valor;

- Um monitor de computador marca Gatewaw –Mod.EV500A, número de série 15017C009938. de cor beije, avaliado em € 75;

- Um teclado, marca Gatewaw, mod 69900, com o n.º J328382, avaliado em € 5;

De tudo os arguidos se apoderaram, no intuito de fazer coisa sua, bem sabendo que não lhes pertencia e que agiam contra a vontade do dono.

Num valor global de € 80.

Os descritos objectos pertenciam à Câmara Municipal de TMR....

Os arguidos actuaram em conjugação de esforços e execução de plano previamente traçado.

Posteriormente, em dia e hora e local não apurados, mas nesta cidade de TMR..., o arguido HF... deixou por esquecimento o rádio emissor receptor, marca YAESU, em casa do arguido DM… .

O qual aí se manteve, local onde no dia 23 de Agosto de 2002, foi apreendido pelo Subcomissário da P.S.P. VK… e pelo chefe da P.S.P. RC... BW… .

No  mesmo dia, na residência do arguido CM..., foram apreendidos os demais artigos, com excepção do carregador.

(...)


IX

No dia 18 de Junho de 2002, a  hora não apurada, mas durante a noite, os arguidos (...), HF..., RC... e CM...dirigiram-se à residência de TX... e de IJ…. .

Fizeram-se transportar na carrinha marca Citroen, modelo Berlingo, matricula …, conduzida pelo arguido CM...,

Ali chegados, este arguido aguardou no interior do identificado veiculo.

Os demais, introduziram-se naquela residência através de uma janela com portadas de madeira.

Previamente, rebentaram as portadas e partiram o vidro da janela com um objecto não identificado.

Do interior daquela residência  retiraram:

- Uma boneca, em porcelana, com cabelos compridos, de cor castanha, avaliada em € 15;

- Duas embalagens de 6 copos cada, marca Cristal D’Arques, n.º 3, avaliadas em € 26.90 cada uma;

- Duas (2) embalagens de seis copos cada, marca Cristal D’Arques, n.º 5, avaliadas em € 24.63 cada uma;

- Uma (1) embalagem de 6 copos, marca Cristal D’Arques, avaliada em € 26.90;

- Três (3) jarras, tipo solitário, marca Cristal D’Arques, avaliadas em € 10 cada uma;

- Doze (12) colheres de sopa, em material tipo inox, com uma flor em relevo no cabo, avaliadas em € 5.20;

- Duas colheres de sopa antigas, tipo cobre, às quais não foi atribuído qualquer valor;

- Vinte e quatro (24) garfos, tipo inox, com flor em relevo no cabo, avaliados em € 10.40;

- Doze (12) colheres de sobremesa, tipo inox, com flor em relevo no cabo avaliados em € 2.68;

- Doze (12) facas de carne, com a inscrição inox France, avaliadas em € 4.60;

- Uma caixa de papelão, de cor vermelha, com a inscrição “Carning Set”, com cabos em  material plástico, de cor castanha, com a inscrição “Stainler-Steel (Japan)” avaliados em € 3.50;

- Um aparelho de soldar, marca “Sea “Mod.125165, avaliado em € 75;

- Uma (1) rebarbadora, com disco de corte para aço, marca “Agojama”, cor azul, referência 8E230EN50144SN-NO, avaliada em € 50;

- Uma (1) batedeira, marca Moulinex, tipo 274-Code 201-220Vol-80W, de cor creme, com duas varas, à qual não foi atribuído qualquer valor;

- Uma (1) tenda de campismo, de cor azul, cinzenta e branca, marca Winner, avaliada em € 30;    

- Uma (1) tenda de campismo para quatro pessoas, com avançado, marca Walles BTH 180 Wehcke, cor verde, avaliada em € 30;

- Uma tenda de campismo grande, completa, com divisões marca Messager Confou 280, cor verde, avaliada em € 75;

- Um colchão insuflável, de casal, em matéria plástica, de cor azul escuro, marca Intex, com dois metros de comprimento por 1,80 metros  de largura, ao qual não foi atribuído qualquer valor;

Bem como:

- Diversos discos de diamante, no valor global de € 229;

- Uma (1) serra eléctrica, no valor de € 50;

- Duas machadas no valor global de € 40;

- Uma bicha, com chuveiro incluído, de cor amarelo metalizada, no valor de € 17.50;

- Diversas brocas para betão e para ferro, no valor global de € 15;

- Dois (2) pares de sapatos para homem, no valor global de € 25;

- Vinte (20) lâmpadas, no valor global de € 20;

- Um rádio com leitor de cassetes, no valor de € 15;

- Três (3) sacos cama, dois encarnados e um preto, no valor global de € 69;

- Uma (1) mala plastificada, de cor castanho claro, no valor de € 12;

- Seis (6) copos de cristal, no valor de € 37.50;

- Duas garrafas para água, de cristal, no valor global de € 75;

- Uma (1) garrafa para vinho, de cristal, no valor de € 35;

- Um (1) ferro de engomar, marca “Kenwood”, no valor de € 40;

- Uma (1) cafeteira, marca “Philips”, de cor branca e azul, no valor de €30;

- Uma (1) máquina de café, marca Krups, de cor preta, no valor de € 38;

- Uma (1) máquina trituradora, no valor de € 30;

- Uma (1) batedeira eléctrica, marca Moulinex, no valor de € 23;

- Duas (2) garrafas de Whisky Shivas, no valor global de € 46;

- Duas (2) garrafas de champanhe no valor global de € 45;

- Uma bicicleta VTT, de senhora, cor de laranja e cinzenta, no valor de € 75;

- Uma aliança em ouro, de homem, no valor de € 300;

- Três (3) colchas de retalhos, uma com barra vermelha, às quais não foi atribuído qualquer valor;

- Um conjunto de toalhas de casa de banho, no valor de € 38;

- Diversas peças de vestuário, no valor global de € 1.350.

Tudo no valor global de € 3.044,81.

De tudo os arguidos se apoderaram, no intuito de fazer coisa sua, bem sabendo que não lhe pertencia e que agiam contra a vontade do dono.

Os descrito objectos pertenciam a TX... e IJ…, tendo sido recuperados e entregues a estes um colchão em plástico, uma tenda de campismo de tamanho grande e seus acessórios, uma tenda de campismo de 3 lugares e uma tenda de campismo de 2 lugares e ainda 7 embalagens de várias medidas de 6 copos de pé alto marca Cristal D’Arques, 3 vasos para flores marca Cristal D’Arques, uma batedeira marca Moulinex, 14 colheres de sopa, doze em inox e duas em metal branco, 12 facas em inox de Sevilha, 11 colheres de sobremesa, 24 garfos, um conjunto faca e garfo de trinchar Carving Set, um aparelho de soldar marca Cea Industrie modelo RS 165 cor azul e uma rebarbadora marca Agojama série 703.181/1998 cor azul.

Foram transportados  por todos os arguidos na já identificada carrinha, marca Citroen, modelo Berlingo, conduzida pelo arguido CM....

Os arguidos (...), HF..., RC... e CM...actuaram em conjugação de esforços e execução de plano previamente traçado.

No dia 23 de Agosto de 2002, na residência do arguido (...), sita no Bairro …, TMR... foram apreendidos os seguintes objectos: duas embalagens de 6 copos cada, marca Cristal D’Arques, n.º 3, avaliadas em € 26.90 cada uma; duas (2) embalagens de seis copos cada, marca Cristal D’Arques, n.º 5, avaliadas em € 24.63 cada uma; uma (1) embalagem de 6 copos, marca “Cristal D’Arques”, avaliada em € 26.90; três (3) jarras, tipo solitário, marca “Cristal D’Arques”, avaliadas em € 10 cada uma; doze (12) colheres de sopa, em material tipo inox, com uma flor em relevo no cabo, avaliadas em € 5.20; duas colheres de sopa antigas, tipo cobre, às quais não foi atribuído qualquer valor; vinte e quatro (24) garfos, tipo inox, com flor em relevo no cabo, avaliados em € 10.40; doze (12) colheres de sobremesa, tipo inox, com flor em relevo no cabo avaliados em € 2.68; doze (12) facas de carne, com a inscrição “inox France”, avaliadas em € 4.60; uma(1) batedeira, marca Moulinex, tipo 274-Code 201-220Vol-80W, de cor creme, com duas varas, à qual não foi atribuído qualquer valor.

O aparelho de soldar marca CEA Industria e a rebarbadora marca Agojama foram encontradas, naquele dia 23 de Agosto, na garagem da residência do arguido CM..., sita em …, TMR..., conforme auto de fls 26.

As tendas de campismo, uma de cor azul e outra tipo iglo de cor cinzenta foram apreendidas, no dia 16 de Outubro de 2002, (auto de fls 560) na garagem ocupada por CM....


X

Na noite de 20 para 21 de Junho de 2002, os arguidos (...) e HF…, dirigiram-se a ... a fim de se encontrarem com duas raparigas.

Fizeram-se transportar na carrinha marca Citroen, modelo Berlingo, matricula  ..., conduzida pelo arguido CM....

Como tivessem ficado sem meio de transporte para o regresso, dirigiram-se à residência de XB... sita em ..., n.º ... em TMR... e de uma garagem anexa aquela residência retiraram:

- uma bicicleta de montanha, marca Kona, cor azul e branca, com 27 velocidades, amortecedor central, suspensão à frente e travões de disco, avaliada em € 500;

-uma bicicleta, marca “BH Coronas Team” com os dizeres “Oficie Bike”, de cor vermelha e branca, suspensões SR Suntour Volante Ritchey, avaliada em € 198.

Os arguidos (...) e HF… apoderaram-se das descritas bicicletas, no intuito de as fazer coisa sua, bem sabendo que não lhes pertenciam e que agiam contra a vontade do dono.

Bicicletas que pertenciam a XB....

Sendo certo que o portão da referida garagem apenas se encontrava fechado  no trinco.

Posteriormente, em dia, hora e local não apurados, o arguido HF... emprestou as descritas bicicletas, ao arguido (...).

O qual as recebeu ciente da  respectiva proveniência.

Bicicletas que lhe foram apreendidas nos dias 26 de Agosto de 2002 e 5 de Setembro do mesmo ano.


XI

Na noite de 29 para 30 de Junho de 2002, na Padaria …, os arguidos CM..., RM…, HF…, (...) e RC..., na sequência de um plano a que todos aderiram, combinaram apoderar-se dos bens que encontrassem nas instalações da firma “S... Ldª”, sita na Estrada …, TMR....

Para tanto, em execução do plano previamente traçado, e pelas 3.00, daquele dia 30 de Junho de 2002, os arguidos RM... e RC..., introduziram-se nas referidas instalações.

Previamente, treparam a vedação circundante e partiram o vidro da porta da frente, que se encontrava fechada à chave.

Local por onde entraram.

Do interior daquelas instalações retiraram:

- Três (3) pneus “Yokohama” – 165/65 R14-78T, com as respectivas jantes,  Med.51/5JX14-ET49-Ronal avaliados em € 80;

- Um (1) farolim pisca, marca Carello, transparente, referência   46402658, avaliado em   € 20;

- Dois (2) faróis, marca “Hella”, de origem Fiat, ref.ª 142853-00LI, e 142854-00RE,   avaliado em € 50 cada um;

- Um (1) farolim pisca lateral, amarelo ref. 02-100-02, avaliado em € 5;

- Uma embalagem de fusíveis, marca “Wurth”, ref.ª 731-300.30, avaliada em € 2;

- Quatro (4) embalagens de fusíveis, marca “Wurth”, ref.ª 731.25, avaliadas em € 2 cada uma.                   

- Uma embalagem de fusíveis, ref.ª 0731-0075, avaliada em € 2;

- Uma embalagem de fusíveis, ref.ª 0731-010, avaliada em € 2;

- Uma embalagem de fusíveis, ref.ª 0731020, avaliada em € 2;

- Uma embalagem de fusíveis, ref.ª 0731-025, avaliada em € 2;

- Quatro filtros de óleo, marca Opel, ref.ª 93156-300, avaliados em € 2 cada um;

- Dois filtros de óleo, marca Fican, ref.ª FT505 3A, avaliados em € 3 cada um;

- Dois filtros de óleo, marca Purflux ref.ª LS867B, avaliados em € 3 cada um;

- Uma caixa de velas “NGK-BPR6ES” com (8) oito velas, avaliada em € 6;

- Uma (1) caixa de velas NGK-BPR5ES, com 10 velas, avaliada em € 5;

- Seis (6) lâmpadas de halogéneo, H1, ref.ª 50310/1, avaliadas em € 5 cada uma;

- Cinco (5) lâmpadas de halogéneo, marca Flosser, ref.ª 13020, avaliadas em € 5 cada uma;

- Quatro (4) lâmpadas, marca Astra-art.2032, avaliadas em € 4 cada uma;

- Uma (1) lâmpada marca “Osram”, de halogéneo, 24 Volts – ref.ª 64196, avaliada em € 6;

- Duas (2) lâmpadas, marca “Osram”, de halogéneo, 24 volts, avaliadas em € 5 cada uma;

- Uma (1) lâmpada H4 – P43T avaliada em € 5;

- Uma (1) lâmpada “Astra” 12 Volts-100 W, art.º 2515PK 225 S, avaliada em € 8;

- Uma (1) lâmpada, marca Astra, 12 Volts, art. 2512.55 avaliada em € 4;

- Uma (1) caixa em cartão, contendo oito (8) isqueiros, todos metalizados, com os dizeres “S...- Telf. ...-TMR...”, acondicionados numa bolsa de napa da cor preta, avaliados em € 2,5 cada um;

- Dois (2) farolins traseiros de Fiat Punto, ref.ª 4640110820 e A 281-464010830, avaliados em € 60 cada um;

- Uma (1) rebarbadora, marca Ruper de cor preta, Mod. BR215, n.º 97100160, avaliada em € 70;

- Um (1) aparelho de diagnóstico para carros, marca “Facon.”, modelo X800, de cor vermelha avaliado em € 800;

- Duas (2) baterias, marca “Supera”, n.ºs 13383 e 13384, avaliados em € 50 cada uma;

- Seis (6) rolos  de fita adesiva, marca “Wurth”, art.º n.º 09856, avaliados em € 1,5 cada um;

- Um (1) saco plástico, contendo braçadeiras próprias para electricista,  marca  “Helermann” avaliado em € 2;

- Um (1) carregador de baterias marca “Power Jumbo Profissional”, 12 volts, cor cinzento  escuro  mod. 747, ref. 201180, avaliado em € 150;

- Um CPU, com leitor de CDS, cor branca e azul, linha branca, ref.ª L9A02600675, avaliado em € 250;

- Uma (1) caixa em plástico, de cor preta, porta cassetes, ref.ª 504PP-T20240757, à qual não foi atribuído qualquer valor;                                 

- Um (1) leitor de códigos, no valor de € 628,49;

- Uma (1)  pistola avanço, no valor de € 244,41;

- Uma (1)  máquina de testes, no valor de € 3.451,68;

- Doze (12) disquetes de módulos electrónicos, no valor de € 1.482,70;

- Oito (8) cabos de módulos electrónicos, no valor de  € 716,42;

- Oito (8)  baterias, no valor de € 474,14;

- Um (1) compressor de molas, no valor de € 521,29;

- Um (1) voltímetro, no valor de € 149,09;

- Uma (1) chave dinanométrica grande, no valor de € 255,95;

- Uma (1)  chave dinanométrica pequena no valor de € 87,29;

- Uma (1)  pistola pneumática, no valor de € 39,90;

- Uma (1)  pistola de ar, no valor de € 4;

- Três (3) sacas, no valor de € 317,21;

- Um (1) carregador baterias, no valor de € 175,08;

- Várias chaves de ferramentas, alicates grifes e alicates universais, no valor global de € 1.030,72;

- Cento e cinquenta (150) velas de ignição, no valor de € 487,15;

- Um (1) comutador de luzes e um tensor, tudo marca Renault, no valor global de € 181,12;

- Uma (1)  máquina de escrever, no valor de € 124,70;

- Uma calculadora, no valor de € 97,76;         

- Um (1) farolim, no valor de € 45;

- Um (1) jogo de pastilhas de travão , no valor de € 231,15;

- Uma (1) chave HSP Prot. no valor de € 74,28;

- Vários filtros de ar e óleo, no valor de € 433,34;

- Uma (1)  máquina de Sangrar, no valor de € 685,85;

- Dois (2) pneus e respectivas jantes, Opel Corsa, no valor global de € 363,16;

- Quatro (4) jantes e respectivos pneus, Fiat Punto, no valor global de € 1.248,00;

- Dois (2)  espelhos retrovisores no valor global de € 241,52;

- Uma (1) embaladeira, no valor de € 23,62;

- Uma (1) haste e limpa vidros traseiro, no valor de € 17,19;

- Dois (2)  interruptores de vidro, no valor global de € 88,60;

- Duas (2)  matrículas no valor de € 16,00;

- € 700, em notas e moedas do Banco Europeu;

- Dois (2) guarda-lamas, Fiat Punto, no valor de € 92,60;

- Um (1)  triângulo, no valor de € 26,00;

- Um (1) macaco valor de € 32,83;

- Uma bobine de ignição Opel, no valor de € 172,84;

- Um (1)  Kit de fios, vela e ignição Opel, no valor de € 82,88;

- Uma (1) chave de veículo ligeiro, marca Mitsubishi, modelo Strada, matrícula  ...;

- Uma (1)  chave  do veículo marca Fiat, modelo Punto, matricula ....

Tudo no valor de € 16865,96.

Munidos da chave do veiculo matricula  ..., os arguidos RM… e (...), dirigiram-se para  o exterior das instalações da firma “S..., Lda.”.

Ali, usando a referida chave, abriram o veiculo marca Mitsubishi, matricula  ....

No interior do qual acondicionaram parte dos objectos descritos.

Seguidamente, com um serrote de cortar ferro, cortaram o cadeado em aço que fechava o portão de acesso aquelas instalações.

Por onde  saíram, fazendo-se transportar no Mitsubishi matricula  ....

O Mitsubishi era conduzido pelo arguido RC… .

O qual não é titular de licença de condução ou de outro documento que o habilite a conduzir veículos ligeiros na via pública.

Em execução do plano previamente acordado, dirigiram-se para a Padaria do ..., onde os aguardavam os arguidos CM..., HF... e (...).

Ali, todos os arguidos descarregaram os objectos trazidos no Mitsubishi.

Posteriormente, ainda na madrugada daquele dia 30 de Junho de 2002, os arguidos CM..., HF..., RM…, (...) e RC..., regressaram às instalações da firma “S... –Comercio e Reparações de Automóveis L.da”

Para onde se fizeram transportar nos veículos Mitsubishi, matricula  ... e Fiat Punto, de cor branca, propriedade do arguido CM....

Previamente, um dos arguidos que não foi possível determinar retirou as duas chapas da matricula do Mitsubishi.

Em substituição das mesmas, colocou naquela viatura duas chapas com a matricula W....

Tudo em execução de plano a que todos tinham aderido e previamente acordado com os demais arguidos que o acompanhavam.

Os arguidos entraram no recinto das instalações da firma “S...” pelo portão que anteriormente havia sido aberto.

Ali, abriram a porta do veiculo marca Fiat, modelo  Punto, de cor cinzenta, matricula ....

Usaram a chave da qual previamente se haviam apoderado.

Naquele veiculo, acondicionaram parte dos objectos anteriormente referidos.

Após o que abandonaram o local, fazendo-se transportar naquelas três viaturas.

Peças que transportaram para a Padaria do … .

O veículo  … pertencia a  JS… .

Valia € 5.800,00.

Encontrava-se nas instalações da firma “S... L.da” para reparação.

Os arguidos CM..., HF..., RM..., (...) e RC…, apoderaram-se dos objectos acima descritos e dos veículos matriculas ... e  ..., no intuito de os fazerem coisa sua, bem sabendo que não lhes pertenciam e que agiam contra a vontade do dono.

Na garagem da residência do arguido CM..., no dia 23 de Agosto de 2002, foram apreendidos  os seguintes objectos.

- Uma (1) grelha dianteira, marca Mitsubuishi L200, cor cromada;

- Os quatro (4) pneus ref.195/50 R15, marca Bridegstone, mod. Potenza RE 720, com as respectivas jantes, em alumínio, marca ENKEI SPORT;

-  Os dois (2) farois traseiros do Fiat Punto A 281, ref.ª 464010830 e 464010820;

- O farolim frontal, marca Carello, ref.ª 46402658;

- O farolim pisca lateral amarelo, Fiat Punto, ref.ª 02-100-02;

- As duas ópticas, marca Hella, de origem Fiat. ref.ª 142853-00LI e 142854-00RE;

- A rebarbadora pequena, marca Rupes, mod.BR 215, n.º 97100160;

- A caixa em plástico, de cor preta, porta cassetes;

- O C.P.U., de linha branca, cor branca e azul.

No mesmo dia 23 de Agosto de 2002, na residência do arguido (...), foram aprendidos os oito (8) isqueiros, acondicionados em bolsas de cabedal, com as inscrições “S...- Telf ... –TMR...”.

No período compreendido entre o dia 30 de Junho de 2002 e o dia 18 de Julho do mesmo ano, os arguidos CM..., HF..., RM..., (...) e RC... circularam com o veiculo marca Mitsubishi, modelo Strada L-200.

Designadamente, deslocaram-se até à W....

O veiculo ostentava a matricula … .

Veiculo que abandonaram junto à antiga cerâmica, em ..., com a chave na ignição.

Previamente desmontaram:

- As quatro (4) rodas e respectivas jantes;

- O pára-choque (grelha frontal) “Mitsubishi L-200, cromado, avaliado em € 150;

- O auto-rádio.

Aquele pára-choque foi apreendido na residência do arguido  CM....

O veiculo marca Mitsubishi, modelo Strada L 200, matricula  ... pertencia à firma “ …”, com sede na Av.ª …, em TMR....

Valia € 15.000,00.

Encontrava-se nas instalações da firma “S...,  Comércio e Reparação de Automóveis, L.da”, para reparação.


XII

Na residência do arguido OO..., também naquele dia 23 de Agosto de 2002, foram apreendidos:

- As quatro (4) embalagens de fusíveis, marca Wurth, ref.ª 73.25;

- A embalagem de fusíveis, marca Wurth. ref .ª 731300.30;

- A embalagem de fusíveis, ref.ª 0731010;

- A embalagem de fusíveis, ref.ª 0731020;

 - A embalagem de fusíveis, ref.ª 0731025;

- As cinco (5) lâmpadas de halógeneo, marca Flosser. ref.ª 13020;

- As quatro (4)  lâmpadas, marca Astra, ref.ª art.º 2032;

- A lâmpada, marca Osram de 24 Volts, halógeneo;

- As duas (2) lâmpadas, marca Osram, de 12 Volts, halógemneo, ref.ª 64193CB;

- A lâmpada, marca H4, halógeno, ref.ª P43T;

- A embalagem de dez velas NGK, BP5ES;

- A embalagem com oito (8) velas NGK BPR6ES;

- As seis (6) lâmpadas de halogéneo H1 TUN OSRAM;

- Os quatro (4) filtros de óleo, marca Opel;

- Os dois (2) filtros de óleo, marca PURFLUZ, ref.ª L5867B;

- Os dois (2) filtros de óleo, marca FIAMM, ref.ª FT 5053A;

- A lâmpada marca Astra, ref.ª Art 2515;

- A lâmpada, marca Astra, ref.ª Art 2512;

- O carregador de baterias, marca Power Jumbo, mod MP-747, n.º 204180;

- Os seis (6) rolos de fita adesiva, marca Wurth, ref.ª art.º 09856;

- O saco com várias anilhas em cobre de 16mm;

- As duas baterias, marca SUPREMA, ref.ª 544059033;

- O aparelho de diagnóstico, marca FACON X800, com várias disquetes e um cabo, bens estes no valor de € 1.298.

O arguido OO...  guardou o descrito material, na sua residência, bem sabendo da respectiva proveniência.


XIII

 No dia 30 de Julho de 2002, pelas 3.30, na Rua …, os arguidos RC... e RM... abeiraram-se do veiculo marca Opel, modelo Corsa, de cor preta, matricula  ..., que ali se encontrava estacionado.

Munidos de um  macaco próprio para viaturas ligeira, elevaram o  ....

Seguidamente, desmontaram as quatro rodas.

Na sequência do que estragaram o tubo de óleo localizado junto daquela roda.

Começaram a desmontar a suspensão do lado esquerdo.

Altura em que foram surpreendidos pelos agentes da P.S.P, VD… .

Perante o que fugiram do local.

Os arguidos agiram em comunhão de esforços e execução de plano previamente traçado.

No intuito de se apoderarem e fazerem coisa sua, as referidas rodas e suspensão, bem sabendo que não lhes pertenciam e que agiam contra a vontade do dono.

Propósito que não concretizaram porque foram atempadamente surpreendidos pelos agentes da P.S.P.

Os arguidos deslocaram-se para o ... no ciclomotor matricula …  propriedade do arguido RC....

No qual transportaram o macaco próprio para veículos ligeiros.

O veiculo matricula … pertencia a EF... .

As quatro rodas valiam pelo menos € 100.


XIV

Em dia não apurado, mas no período compreendido entre inícios do mês de Agosto de 2001, e Agosto de 2002, os  arguidos RM..., CM..., (...) e RC..., dirigiram-se às instalações da “Industria … de TMR... S.A.”, sita em  ...,  TMR....

Ali chegados entraram pela porta que estava aberta.

Do interior daquelas instalações retiraram:

- Um porta paletes, de cor vermelha, com os dizeres “BT LIFERS”, no valor de € 50;

- Um fax, marca Xerox, modelo 70/20, no valor de € 10;

- Uma fotocopiadora, modelo HC 8E, no valor de € 10;

- Um lote de restos de cabos eléctricos, de várias espessuras e comprimentos, no valor global de € 50;

- Uma fotocopiadora a cores, marca Xerox, modelo 5799, série K3P3107587488,  avaliada em € 1.000;

- Uma fotocopiadora, marca Xerox, com mesa de cassete mod. 5018,  número de   série 2117154486, avaliada em € 600;

- Uma fotocopiadora, marca Ricohet-4522, n.º de série A3725700419, avaliada em € 450;

- Uma caixa de papelão, com os dizeres “Companhia …, Lda” com seis tinteiros, para impressão de fotocopiadora a cores (dois pretos, dois amarelos, um azul e um laranja), aos quais não foi atribuído qualquer valor;

- Três (3) filtros para fotocopiadora a cores, aos quais não foi atribuído qualquer valor;

- Três (3) tampas de impressora, aos quais não foi atribuído qualquer valor;

- Um (1) cartucho tonner, para fotocopiadora, de cor preta, sem valor;

- Um (1) cabo, de cor creme, ref. 10331036, para tomada Fierry, sem valor; 

- Um (1) aparelho de ar condicionado, marca Selonghi, modelo Pinguino, ref.ª 021995 avaliado em € 75;

- Uma (1) tampa de impressora, de cor cinzenta, à qual não foi atribuído qualquer valor;

- Um (1) scanner-HPSCANJET 3400, ref.ª NT065B11GC, avaliado em € 60;

- Uma impressora HP, 695C, ref. C4562B, avaliada em € 40;

- Uma impressora, marca Brother modelo M41018, cor creme, ref.ª EO-1404834, à qual não foi atribuído qualquer   valor;

- Um tonner preto para fotocopiadora 5028, ao qual não foi atribuído qualquer  valor;

- Cinco caixas de papelão contendo eléctrodos, marca Castolin Eustectic, cada caixa com 5 kgs, no valor global de € 50;

- Uma caixa de plástico, contendo eléctrodos, marca Castolin Eustectic, aos quais não foi atribuído qualquer valor;

- Uma embalagem plástica contendo 51 eléctrodos;

- 2 caixas de cartão contendo 5 limas triangulares;

- Uma embalagem plástica com várias braçadeiras;

- Uma caixa plástica com vedantes e borrachas;

- 23 rolamentos de diversas medidas;

- 17 embalagens de rolamentos marca INA;

- 12 embalagens de rolamentos 7 de marca NTN, 3 de marca STEYR e 2 de marca FAG;

- 3 rolamentos cada um da marca Nadela, NSK e NHP;

- 5 fichas trifásicas;

- Um capacete de protecção;

- Um obliterador;

- Cinco rolos de fita adesiva, de cor castanha, avaliados em € 10;

- Um CPU, marca “MTEK”, ao qual não foi atribuído qualquer valor;

- Um monitor de computador, marca Sperry, n.º 511288, ao qual não foi atribuído qualquer valor;

- Um CPU, marca Sperry, com duas entradas de disquetes, ref.ª 613387, ao qual não foi atribuído qualquer valor;

- Uma (1) impressora, marca Sperry, ref. 54358, à qual não foi atribuído qualquer valor;

- Uma (1) fotocopiadora, com móvel multifunções, marca “Xerox”, mod. Document Centre 230 DC, número de série 2137697753, avaliada em € 700;

Os cinco rolos de fita adesiva  foram apreendidos, no dia  23 de Agosto de 2002, na residência do arguído RC.... (auto fls. 54 v.º)

Naquele dia 23 de Agosto de 2002, foram encontrados, na residência de (...):

- O C.P.U. marca MTEK, cor creme;

- O monitor de computador, marca Sperry, ref.ª S/N 511288;

- O C.P.U., marca Sperry, ref.ª S/N 613382;

- A impressora, marca Sperry sem  tampa n.º 54358. (auto fls. 59 verso)

No mesmo dia, na residência do arguído CM..., foi apreendida a fotocopiadora, com móvel multifunções, marca Xerox, mod. Document Centre 230 DC, Série 2137697753. (fls. 26 verso)

Ainda naquele dia 23 de Agosto de 2002, e na residência do arguído OO..., foram apreendidos os demais objectos acima descritos. (auto de entraga fls. 148)

Sendo certo que posteriormente ao mesmo arguído, e no dia 28 de Janeiro de 2003, foi apreendido o porta-paletes , com os dizeres “BT Lifers”. (fls. 901)

O arguído OO..., guardou na sua residência, o porta-paletes e demais artigos referidos no auto de reconhecimento e entrega de fls 148, bem sabendo da respectiva proveniência.

Do interior daquelas instalações foram ainda retirados:

- Dois telefones fixos, marca Ericson,

- Um telefone fixo, marca Challenger;

- Oito (8) cabos para ligações de aparelhos informáticos e outros;

- O tambor de tonner, marca Xerox, ref.ª GR90127;

- A caixa eléctrica (interruptor) de cor branca, marca  Sistime.

Tudo no valor de € 3.105.

No dia 23 de Agosto de 2002, na residência do arguído (...), foram apreendidos:

- Os dois telefones fixos, marca Ericson;

- O telefone fixo, marca Challenger.

Naquele dia 23 de Agosto de 2002, na residência do arguído CM..., foram apreendidos:

- Os oito (8) cabos para ligações de aparelhos informáticos e outros;

- O tambor de tonner, marca Xerox, ref.ª GR90127;

- A caixa eléctrica (interruptor) de cor branca, marca  Sistime.

Posteriormente no dia 16 de Outubro de 2002, e na residência daquele arguído, foram apreendidas algumas das cadeiras marca Handy pertencentes à Fábrica de  .... (auto de busca de fls. 560, auto de reconhecimento de fls. 818 e 819 e fotografia de fls. 924)

Os arguídos RM..., CM..., e RC..., apoderaram-se dos objectos  acima descritos no intuito de os fazer coisa sua, bem sabendo que não lhes pertenciam e que agiam contra a vontade dos donos.

Actuaram em conjugação de esforços e execução de plano previamente traçado.


XV

Nos princípios de Abril de 2001, JJ… efectuou trabalho de pedreiro na residência do arguído OO... sita em …,  TMR....

Para o efeito, transportou para aquele local um número indeterminado de extensores IT.

Os quais usou na obra que realizou.

Terminada a obra, o arguído OO...  recusou devolver-lhe 20 daqueles extensores.

O que sabia ser sua obrigação.

Apoderou-se dos mesmos no intuito de os fazer coisa sua, bem sabendo que não lhe pertenciam e que agia contra a vontade do dono.

Os extensores IT pertenciam a JJ… .

Os extensores têm o valor de € 300.

(...)


XIX

No dia 16 de Outubro de 2002, o arguido OO… guardava na sua residência em …, uma caçadeira de dois canos, de 70 cm, lisos, marca Félix Sarraquesta, ;

O arguido bem sabia destes factos e não é titular de licença de uso e porte de arma.

(...)


*

Todos os arguídos agiram, sempre, livre, deliberada e conscientemente.

Os arguídos CM..., HF…, RM..., (...) e RC..., ao colocarem no veículo marca Mitsubishi, matrícula  ..., uma chapa com a matrícula …, conforme se refere no ponto XI, agiram com o intuito de iludirem, a actividade fiscalizadora das entidades policiais.

O que conseguiram.

Com o mesmo desígnio circulavam na referida viatura.

Actuaram bem sabendo que punham em crise a credibilidade e a fé pública de que gozam aqueles elementos identificadores dos veículos.

Actuaram, sempre com o propósito de auferirem, como auferiram um benefício que não lhes era devido.

Simultaneamente prejudicando como prejudicaram o proprietário daquela viatura.

(...)

O arguído OO... recebeu e guardou na sua residência os bens referidos no ponto XII (furtados nas instalações da S...), os bens referidos no ponto XIV, (furtados na Fábrica ...de TMR...) com o intuito de auferir para si um benefício que não lhe era devido, ao mesmo tempo que prejudicou o proprietário daqueles bens.

Todos os arguídos agiram, sempre, bem sabendo serem proibidas por lei as suas condutas.

Mais se provou que o arguido RM... vive com uma companheira numa dependência por cima da habitação dos seus pais.

Diz ganhar por mês € 480.

Tem uma filha de uma outra relação.

Tem o 6.º ano de escolaridade.

A companheira não trabalha.

Do seu RC consta uma condenação no pcs n.º 24/04.9 PBTMR do 2.º Juízo por crime de homicídio na forma tentada praticado em 31/5/05 tendo sido condenado na pena de 2 anos de prisão suspensos por 2 anos; uma condenação no pcs n.º 235/06.2 TAVNO por crime de falsidade de testemunho praticado em 8/3/06 tendo sido condenado em 180 dias de multa.

O arguido CM… diz ganhar mensalmente € 500.

Vive com uma companheira.

Tem a frequência do 8.º ano de escolaridade.

Do seu RC consta uma condenação no pcs n.º 493/02.1 PBTMR por crime de ofensas à integridade física simples praticado em 17/7/02 tendo sido condenado em 180 dias de multa, pena extinta pelo pagamento; uma condenação no pcs n.º 24/04.9 PBTMR por detenção ilegal de arma praticado em 31/5/05 tendo sido condenado em 2 anos e 2 meses de prisão suspensos por 2 anos.

O arguido HF... exerce a profissão de jardineiro no ... onde diz auferir € 400 mês.

Vive na mesma residência de duas amigas suas.

Paga de renda € 100.

Tem a 4.ª classe.

Do seu RC consta uma condenação no pcc n.º 225/01.1 PBTMR por crimes de furto praticados em 8/4/01 tendo sido condenado em 3 anos de prisão suspensa por 4 anos, suspensão que lhe foi revogada; uma condenação no pcs n.º 708/01.3 PBLRA por crime de furto qualificado tendo sido condenado em 2 anos e 6 meses de prisão suspensos por 3 anos e posteriormente alterada a suspensão para 2 anos e 6 meses.

(...)

O arguido RC... neste momento cumpre pena de prisão.

Vive com a mãe e os irmãos.

Tem a 4.ª classe que obteve no Estabelecimento Prisional.

Do seu RC constam duas condenações nos pcs n.º 11/01 e 253/02.0 PBTMR ambos do Tribunal de TMR... por crimes de condução sem habilitação legal praticados em 6/9/00 e 17/4/02 tendo em ambos sido condenado em multa; uma condenação no pcs n.º 24/04.9 PBTMR por crime de detenção ilegal de arma praticado em 12/1/04 tendo sido condenado em 6 meses de prisão suspensos por 2 anos.

(...)

O arguido OO...está reformado e recebe de reforma € 286 mensais.

Sua mulher é doméstica.

Vive em casa própria.

Tem 3 filhos, dois deles aqui arguidos.

Tem a frequência do 4.º ano de escolaridade.

Do seu RC consta uma condenação no pcc n.º 510/99.0 PBTMR por crime de receptação tendo sido condenado em multa que pagou.

Quanto aos pedidos de indemnização civis:

Provou-se que os bens furtados na S... ascendem ao valor de € 16.865,96 (ponto XI) que os mesmos foram furtados pelos arguidos CM..., RM..., HF…, (...) e RC... e que parte deles  no valor de € 1.298 se encontravam guardados na residência do arguido OO...sabendo este da sua proveniência.

Os 20 extensores do demandante civil AS…, dos quais o arguido OO...se apropriou valiam € 300.

O demandante civil AS… esteve privado deles desde meados do ano de 2001 até ao presente.

Os bens furtados pelos arguidos CM…, HF…, RC... e (...) na residência de AS… e não entregues foram avaliados em € 3.044,81.

Acresce que os mesmos arguidos danificaram as portadas das janelas e seis portas em madeira no valor de € 2.400.

Os demandados civis TX… e mulher IJ... sentiram um enorme desgosto com a devassa da sua casa pelos demandados civis, sofreram incómodos para reporem a casa na situação em que se encontrava, ficaram traumatisados com o sucedido e com medo de novas situações.

b) Factos não provados.

Relativamente ao furto no autódromo não se provou que em casa do arguido (...) se encontrasse diverso material propriedade do FC... que ele arguido guardou e foi apreendido no dia 23 de Agosto de 2002, pelo Chefe da P.S.P. RC... BW… e pelo Sub-Comissário da P.S.P.,VK…, a saber: a mala de tecido de cor preta e roxa, com a inscrição ”Serpent Motorsport”, contendo diversos acessórios de Modelismo; a caixa de cartão, de cor preta,  contendo diversas   jantes e rodas; o carro eléctrico, marca “Mission”; o control de modelismo, marca Granpner; as carroçarias para carros de Modelismo, marca BMW e Subaru; o diverso material de  modelismo, que se continha  numa mochila  marca “Feilong” isto porque não foi reconhecido como sendo do FC...;

Não se provou que da ... tenha sido retirada uma ventoinha de pé alto, marca Sónico, de cor branca, avaliada em € 20, uma vez que não foi reconhecida por FS… como sendo da Câmara;

Não se provou que da S... tenham sido retirados:

- Uma (1)  antena no valor de € 10,25;

- Várias ferramentas, cujo valor não foi possível apurar;

- Um (1) rádio e respectiva instalação eléctrica, cujo valor não foi possível apurar;

- Um (1)  tampão de combustível no valor de € 7,23;

- Um (1)  amortecedor de mala, no valor de € 31,07; 

- Um (1) isqueiro, no valor de € 13,50;

- Um (1)  apoio de motor, no valor de € 20,67;

- Uma (1) chave de rodas, no valor de € 7,10;

- Dezasseis (16) pernes , no valor global de € 21,44;

Igualmente se não provou que após abandonarem as intalações da S... os arguidos se tenham deslocado para Z..., tenham imobilizado os veículos no ..., que do Fiat Punto matricula ... tenham retirado:

- Os quatro (4) pneus 195/50 R15 “Bridgestone”, modelo Potenza RE 720 e respectivas jantes, em alumínio de cor branca, marca “Enkei-Sport”, avaliados em € 75 cada um, num total de € 800;

- O extintor, no valor de € 80;

- A prateleira do porta-bagagens, no valor de € 42,20;

- Um (1) alarme, marca Fiat, no valor de € 384,00;

- Um (1) rádio, Fiat, no valor de € 199,47;

- Um (1) par de colunas Fiat, no valor de € 320,19;

- Um (1) amplificador de 200 Wats, cujo valor não foi possível apurar;

- Um (1) elevador de porta, cujo valor não foi possível apurar;

- Uma (1) bola de reboque, cujo valor não foi possível apurar.

Igualmente se não provou que tenham abandonado o veiculo marca Fiat, modelo Punto GT, matricula … em ... e que o mesmo naquele dia 30 de Junho de 2002, tenha sido recuperado por guardas da G.N.R. da ....

(...)

Não se provou que tenham sido apreendidas tendas de campisto do ofendido TX… em casa do arguido OO...e na parte ocupada por este.

Não se provou que o CM… tenha participado no furto das bicicletas.

Não se provou que da fábrica de  ... tenham sido retiradas várias resmas de papel, no valor total de € 1.633,85 uma vez que AS... não os reconheceu como pertença daquela.

Igualmente se não provou que os arguidos [RM..., CM…, HF..., (...), RC...e (...)] tenham entrado na residência de AS... e que de lá tenham retirado os bens referidos no ponto 194 da acusação.

(...)


*

c) Fundamentação da matéria de facto.

Os factos acima provados tiveram por fundamento os seguintes meios de prova:

Ponto I: O arguido OX… viu a arma no carro do arguido RC...na ... junto ao rio; o RC...disse-lhe que a tinha ido buscar à Quinta ...; o RC...já tinha trabalhado na Quinta ..., donde conhecer aquela; a arma foi apreendida na residência do OX... que sabia da sua proveniêncioa conforme auto de fls. 542.

(...)

Ponto III: Confissão feita pelo arguido HF... de ter sido co-autor do furto; depoimento de FG…, disse como entraram na sua casa, o que levaram e o valor dos bens; estes objectos foram encontrados em casa do arguido CM…, sem justificação para tal, uma vez que a explicação que deu de lhe terem sido oferecidos pelo HF... não tem qualquer sentido dada a sua natureza, pelo que tudo isto conjugado com as regras da experiência da vida nos diz que o arguido CM... foi co-autor deste furto; os bens foram reconhecidos e entregues conforme autos de fls. 678 e 592.

Ponto IV: Depoimento de CH… disse o que lhe furtaram, o modo como entraram em casa, os bens furtados foram encontrados em casa dos arguidos (...), do RC... e do falecido (...), não tendo aqueles dois primeiros justificado a sua posse, pelo que tudo isto conjugado com as regras da experiência da vida nos diz que os arguidos (...) e RC... foram co-autores deste furto; os bens foram reconhecidos e entregues ao seu dono pelo auto de fls. 696 o seu valor consta de fls. 162.

Ponto V: Declarações e confissão dos arguidos HF... e (...); os bens aqui referidos foram encontrados, o carro de modelismo modelo Tamya em casa do RC...e os restantes em casa do CM…, sem que este justificasse porque motivo aí se encontravam conforme auto de entrega de fls. 102; quando o CM… e o (...) se dirigiram para as instalações do Mini Autódromo sabiam para o que iam em virtude do telefonema que lhes havia sido feito; foi ainda elemento de prova o depoimento de FC... disse que foram ao autódromo por duas vezes, referiu o modo como lá entraram, disse o valor do seu prejuízo; o valor dos bens pelo auto de fls. 162; uma vez que quer o HF... quer o (...) referiram terem ido ao autódromo apenas uma vez, na dúvida imputa-se aos arguidos apenas uma ida àquelas instalações.

(...)

Ponto VII: Depoimentos de JCS… disseram como quem foi às instalações da ... lá entrou; confissão dos três arguidos, o HF... disse que foi às instalações da ... com intenção de furtar o que encontrasse e os dois restantes disseram que sabiam e passaram por lá para trazerem o produto do furto, após combinação entre todos; foi ainda elemento de prova o auto de entrega de fls. 144 onde FS… reconhece e recebe os bens aí referidos.

Não se provou que a ventoinha encontrada em casa do OO...fosse da Câmara uma vez que o FS… não a reconhece como tal.

(...)

Ponto IX: os arguidos (...), HF…, RC... e CM… confessam os factos aqui mencionados; são também elemento de prova o depoimento de TX..., disse como lá entraram, o valor dos bens furtados, que lhe danificaram as portadas e as portas e o valor que teve de suportar para repor as mesmas, a relação de todos os bens furtados conforme fls. 77 a 80 e 520 a 522; fotografia de fls. 925; auto de reconhecimento e entrega de fls. 963 e 964; os bens apreendidos a CM… e constantes do auto de fls. 59 e os bens apreendidos a CM… e constantes dos autos de fls. 26 e 560.

Não se provou que tenham sido apreendidas tendas de campismo do ofendido TX...em casa do arguido OO...na parte por ele ocupada.

Ponto X: Depoimentos dos arguidos (...) e HF... que disseram como se apoderaram das bicicletas do XB…; depoimento de XB...disse onde estavam as bicicletas e que o portão da garagem apenas se encontrava fechado no trinco; auto de entraga das bicicletas de fls. 84, auto de apreensão, auto de reconhecimento e fotografias de fls. 70, 71 e 72 respectivamente.

Não se provou que o CM… tenha participado no furto das bicicletas.

Ponto XI: A prova dos factos mencionados neste ponto resultou da conjugação das declarações dos arguidos RM..., HF..., (...), RC...e das testemunhas LB... e CB..., estes dois últimos donos da S…; o RM... diz que o RC...e o (...) participaram no furto à S..., o HF... viu o RC...a conduzir o jeep da S… na noite em que ocorreu o furto, o (...) diz ter visto o RC...a conduzir o jeep da S..., diz ainda que o RM... e o RC...saíram de junto da padaria no Fiat Punto da padaria e foram para a S..., o RC...diz que o (...) conduziu o jeep da S...; as testemunhas LB... e CB... vêm o RM... a conduzir o Mitsubishi da S...; as testemunhas MC... e BD... identificaram os veículos que lhes foram furtados; pelo auto de apreensão das chapas de matrícula de fls. 343; a enterga do Mistubichi pelo auto de fls. 373; a alteração das matrículas no Mistubichi pelas declarações do arguido HF... e pelo auto de fls. 342 onde este veículo é encontrado com as chapas de matrícula W...; os bens furtados na S... pelo auto de reconhecimento de fls. 122 e aditamento de fls. 352 e 353; parte dos bens entregues através do auto de fls. 125 e propriedade da S..., encontravam-se na área de residência do CM..., não tendo este justificado porque aí se encontravam; quer pelo que dizem os arguidos, atribuindo mutuamente a ida à S..., quer porque parte dos bens se encontravam na posse do CM…, pelas regras da experiência se conclui que os cinco arguidos de comum acordo praticaram estes factos; foram ainda elementos de prova quanto ao valor dos bens o auto de avaliação de fls. 162 e seguintes; a substituição da matrícula pelo depoimento do CM…; que o RC...não tinha carta de condução pela sua confissão; foi ainda elemento de prova o auto de busca de fls. 26.

Ponto XII: Auto de busca de 23.8.02 de fls. 45 e auto de entrega de fls. 125, o arguido tinha forçosamente de saber da proveniência daqueles bens, dada a quantidade, o facto de ninguém que vivia com o arguido ter aquele ramo de actividade e as regras da experiência da vida, o valor dos bens pelo auto de fls. 162 e ss.

Ponto XIII: O arguido RM... confessa que juntamente com o RC...estiveram na Rua … e fizeram-se transportar para aí no ciclomotor  … que se encontrava naquele local; o agente da autoridade VD… viu-os a fugir mas não os reconheceu; o ciclomotor estava perto do veículo  ...; não há explicação para o ciclomotor estar ali junto ao veículo automóvel; o automóvel estava já sem os quatro pneus e o agente da autoridade avisou a proprietária do veículo; esta ficou à espera que viessem buscar o ciclomotor; quando tal aconteceu a EF... reconheceu o RM...; o ciclomotor era do RC...; as regras da experiência dizem que os dois estavam a furtar as rodas do carro, quando se aperceberam do agente da PSP fugiram, deixaram o seu meio de transporte no local e mais tarde vieram buscá-lo e foram vistos pela EF... e sua mãe GX..., que viu o carro sem os quatro pneus; o valor dos pneus pelo auto de fls. 162 e ss.

Ponto XIV: O arguido RM... confessou ter ido por duas vezes às instalações da Fábrica de  ...s com intenção de furtar e de lá refere ter trazido três impressoras e um porta paletes de fls. 888 a apreendido a fls. 901, mas apenas trouxe bens da primeira vez que lá foi; dos restantes objectos, reconhecidos como sendo da Fábrica, 5 rolos de fita adesiva foram apreendidos no dia 23/8/02 ao RC...na sua residência (fls. 148), o CPU marca MTEK, o monitor de computador marca Sperry, o CPU marca Sperry, e a impressora Sperry tudo bens furtados na firma  ... foram encontrados na residência do CM… (fls. 148 v.º); a fotocopiadora móvel multifunções marca Xerox furtada no mesmo local, foi encontrada na residência do (...); os restantes bens foram encontrados em casa do OO...tudo conforme auto de fls. 148, bens que foram reconhecidos e recebidos por AS... por serem da fábrica de  ...; o valor dos bens pelos autos de fls. 162 e  577; foram ainda elementos de prova o auto de busca de fls. 54 à casa do RC..., auto de busca de fls. 59 e 59 verso à casa do (...); auto de busca à casa do CM… de fls. 26 verso; auto de busca à casa do OO...de fls. 45, o reconhecimento das cadeiras pelos autos de fls. 818 e 819; tendo sido encontrados bens da Fábrica de  ... na posse dos arguidos RC..., (...) e CM… sem que qualquer um destes arguidos tenha justificado porque os possuia, tudo isto conjugado com as regras da experiência da vida nos diz que estes arguidos juntamente com o RM... TMR...am parte activa neste furto, ficando cada um deles com bens que de lá trouxe; porque não há provas de que os bens encontrados nas residências do RC..., (...) e CM… tenham sido furtados por duas vezes, na dúvida os arguidos responderão apenas por um furto.

Não se provou que da fábrica de  ... tenham sido retiradas várias resmas de papel, no valor total de € 1.633,85 uma vez que AS... não os reconheceu como pertença daquela.

Igualmente se não provou que os arguidos tenham entrado na residência de AS... e que de lá tenham retirado os bens referidos no ponto 194 da acusação.

(...)

Ponto XV:  O OO...disse que o BD... levou para a obra que estava a realizar cerca de 90 extensores e que não os deixou tirar da obra porque estavam a suportar uma placa; isto aconteceu em 2001 e pelas regras da experiência a placa por certo já secou, ou seja os extensores podem ser devolvidos ao seu dono; o JS… diz que não recebeu 20 extensores; referiu ainda o valor de cada um e o tempo que esteve sem eles referindo que lhe fazem falta para os seus trabalhos.

(...)

Ponto XIX: auto de busca e apreensão de fls. 553 verso, documentos de fls. 585 e declarações do OO...que disse não ser titular de licença de uso e porte de arma.

(...)

Foram ainda elementos de prova os RC de fls. 1917, 1.918 e 1.952 a 1.987.

Os não provados, porque sobre eles nenhum depoimento oral credível incidiu e não há nos autos qualquer outro elemento de prova que permita resposta diferente.


*

III. Fundamentação de Direito.

3.1. Tendo sido documentada a prova produzida em audiência de julgamento, os poderes de cognição deste tribunal abrangem a matéria de facto e de direito (art.º 428.º do Código de Processo Penal).

No entanto, o âmbito do recurso é delimitado através das conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar (art.º 412.º, n.º 1, do mesmo diploma), mas isto sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente os vícios indicados no art.º 410.º, n.º 2, ainda do Código de Processo Penal (cfr., também, o Acórdão do STJ n.º 7/95, em interpretação obrigatória).

In casu, não emerge dos autos qualquer fundamento acarretando esta intervenção oficiosa (afirmação que se faz, desde já, sem prejuízo da ponderação que abaixo faremos àcerca da alegação dos co-recorrentes CM… e HF...quanto à verificação de pretenso vício de erro notório na apreciação da prova).

Donde que o thema decidendum, a fixar-se únicamente em função das conclusões dos recorrentes, consista em verificarmos se:

(Recorrente M…)

- Do decurso da audiência não resultou prova bastante  à sua condenação pela co-autoria de crime de furto do veículo Mitsubishi e de falsisficação da respectiva chapa de matrícula?

- Concorrem os pressupostos conducentes a que lhe seja aplicado o regime resultante do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro, isto é, para jovens delinquentes?

(Recorrente CM…)

- Não foi produzida prova em audiência de julgamento susceptível de suportar a sua comparticipação nas situações de facto elencadas por provadas no aresto recorrido sob os itens n.ºs III) – furto à residência de FG...-; V) – furto cometido no Mini Autódromo de TMR... -; XI) – furto do veículo Mitsubishi e falsificação da respectiva chapa de matrícula – e XIV) – furto ocorrido na fábrica ...de TMR... -, donde que haja de absolver-se no que concerne?

- Concedendo a subsistência da condenação quanto aos demais factos provados relativamente a si, a pena correspectiva deve fixar-se no limite máximo de três anos de prisão e, após, ser suspensa na respectiva execução?

(Recorrente HF…)

- Igualmente não resultou do decurso da audiência de julgamento prova cabal para suportar a sua condenação enquanto co-autor dos crime de furto do veículo Mitsubishi e de falsisficação da respectiva chapa de matrícula?

- Também concorriam os pressupostos exigíveis para que lhe fosse aplicado o regime previsto para os jovens delinquentes?

(Recorrente RC...)

- Impunha-se a realização de Relatório Social sobre o recorrente?

- Da audiência de julgamento não resultou prova bastante à sua condenação enquanto co-autor da factualidade respeitante aos pontos de facto provados sob os n.ºs I) – furto de uma espingarda de caça -; V) – furto às instalações do “Mini-Autódromo de TMR...”-; IX) – furto à residência de TX... e esposa -; XI) – furto do veículo Mitsubishi e falsificação das respectivas chapas de matrícula -; XIII) – furto tentado do veículo Opel, modelo Corsa, de matricula  ... -, e, XIV) – furto às instalações da fábrica “Indústria ...de TMR... S.A.”?

- A medida da pena que lhe foi imposta mostra-se em quantum excessivo?

(Recorrente OO...)

- A detenção da arma apreendida não se mostra actualmente punível, pois desconhece-se a “classe” a que pertence?

- A repetição do julgamento relativamente aos extensores nada trouxe de novo aos autos, devendo decretar-se a sua absolvição no que concerne?

- Também nada comprova a sua participação nos factos que ditaram a condenação pelos dois crimes de receptação dolosa?

- Por último, nenhum fundamento acarretava a sua condenção no pedido cível?

Vejamos de todas elas, pela ordem seguinte:

- Das atinentes à matéria de facto;

- Da respeitante à preterição de relatório social sobre o recorrente RC...;

- Da que contende com a actual não punibilidade da detenção da arma pelo co-arguido O...;

- Da referente à inverificação dos pressupostos conducentes à condenação do demanadado OO...no pedido cível;

- Das condizentes com as medidas das penas devidas aos 4 primeiros recorrentes (sendo que quanto aos recorrentes RM... e HF...se verificam os pressupostos exigíveis à aplicação do regime para jovens adultos) e da sua eventual suspensão (recorrentes CM… e HF…).

3.2. Mostra-se consabido que a matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no citado art.º 410.º, n.º 2, no que se convencionou chamar de “revista alargada”; ou, através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o subsequente artigo 412.º, n.ºs 3, 4 e 6.

No primeiro caso, estamos perante a arguição dos vícios decisórios previstos nas diversas alíneas do n.º 2 do referido artigo 410.º, cuja indagação, como resulta do preceito, tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para a fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento.

No segundo caso, a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos aludidos n.ºs 3 e 4 do art.º 412.º.

Nos casos de impugnação ampla, o recurso da matéria de facto não visa a realização de um segundo julgamento sobre aquela matéria, agora com base na audição de gravações, antes constituindo um mero remédio para obviar a eventuais erros ou incorrecções da decisão recorrida na forma como apreciou a prova, na perspectiva dos concretos pontos de facto identificados pelo recorrente. O recurso que impugne (amplamente) a decisão sobre a matéria de facto não pressupõe, por conseguinte, a reapreciação total do acervo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, mas antes uma reapreciação autónoma sobre a razoabilidade da decisão do tribunal a quo quanto aos «concretos pontos de facto» que o recorrente especifique como incorrectamente julgados. Para esse efeito, deve o tribunal de recurso verificar se os pontos de facto questionados têm suporte na fundamentação da decisão recorrida, avaliando e comparando especificadamente os meios de prova indicados nessa decisão e os meios de prova indicados pelo recorrente e que este considera imporem decisão diversa.

Precisamente porque o recurso em que se impugne (amplamente) a decisão sobre a matéria de facto não constitui um novo julgamento do objecto do processo, mas antes um remédio jurídico que se destina a despistar e corrigir, cirurgicamente, erros in judicando ou in procedendo, que o recorrente deverá expressamente indicar, impõe-se a este o ónus de proceder a uma tríplice especificação, estabelecendo o artigo 412.º, n.º 3:

«3. Quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve especificar:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;

c) As provas que devem ser renovadas.»

A especificação dos «concretos pontos de facto» traduz-se na indicação dos factos individualizados que constam da sentença recorrida e que se consideram incorrectamente julgados.

A especificação das «concretas provas» só se satisfaz com a indicação do conteúdo especifico do meio de prova ou de obtenção de prova e com a explicitação da razão pela qual essas «provas» impõem decisão diversa da recorrida.
Finalmente, a especificação das provas que devem ser renovadas implica a indicação dos meios de prova produzidos na audiência de julgamento em 1.ª instância cuja renovação se pretenda e das razões para crer que aquela permitirá evitar o reenvio do processo (cfr. artigo 430.º do Código de Processo Penal).

Relativamente às duas últimas especificações recai ainda sobre o recorrente uma outra exigência: havendo gravação das provas, essas especificações devem ser feitas com referência ao consignado na acta, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens (das gravações) em que se funda a impugnação, pois são essas que devem ser ouvidas ou visualizadas pelo tribunal, sem prejuízo de outras relevantes (n.ºs 4 e 6 do mencionado art.º 412.º).

Alíás, é nesta exigência que se justifica, materialmente, o alargamento do prazo de recurso de 20 para 30 dias, nos termos do artigo 411.º, n.º 4.

Como realçou o S.T.J., em acórdão de 12 de Junho de 2008, a sindicância da matéria de facto, na impugnação ampla, ainda que debruçando-se sobre a prova produzida em audiência de julgamento, sofre quatro tipos de limitações:

- a que decorre da necessidade de observância pelo recorrente do mencionado ónus de especificação, pelo que a reapreciação é restrita aos concretos pontos de facto que o recorrente entende incorrectamente julgados e às concretas razões de discordância, sendo necessário que se especifiquem as provas que imponham decisão diversa da recorrida e não apenas a permitam;

- a que decorre da natural falta de oralidade e de imediação com as provas produzidas em audiência, circunscrevendo-se o “contacto” com as provas ao que consta das gravações;

- a que resulta da circunstância de a reponderação de facto pela Relação não constituir um segundo/novo julgamento, cingindo-se a uma intervenção cirúrgica, no sentido de restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção se for caso disso;

- a que tem a ver com o facto de ao tribunal de 2.ª instância, no recurso da matéria de facto, só ser possível alterar o decidido pela 1.ª instância se as provas indicadas pelo recorrente impuserem decisão diversa da proferida [al. b) do n.º 3 do citado artigo 412.º].

Como se constata da leitura quer das motivações, quer das conclusões dos recursos, os recorrentes não observaram o regime prescrito nos n.ºs 3 e 4 do citado preceito legal.

Com efeito, limitaram-se a manifestar a sua discordância sobre a matéria de facto dada como provada, sem apresentar razões válidas de tal discordância e sem indicar as provas que não só demonstram a possível incorrecção decisória, mas que permitam configurar uma alternativa decisória, no sentido de imporem uma decisão diversa.

Acresce que a motivação é completamente omissa quanto ao estabelecido no n.º 4 do citado artigo 412.º.

Tudo porquanto tendo a audiência de julgamento sido objecto de gravação áudio, se impunha que especificassem os pontos que têm como incorrectamente julgados e indicassem as provas que justificam a decisão que preconizam, diversa da recorrida, fazendo para tanto referência aos respectivos suportes técnicos.

Como anotava Maia Gonçalves, no art.º 412.º - versão anterior à introduzida pela Lei n.º 48/07 -, estabelecem-se os requisitos da motivação, sendo patente que a lei é aqui particularmente exigente quanto à estruturação das alegações. E esta tomada de posição da lei através deste artigo é secundada por outras disposições, determinando a não admissão ou a rejeição do recurso, não só quando falte a motivação mas ainda quando esta for manifestamente improcedente ou quando, versando o recurso matéria de facto não contenha as indicações das als. a), b) e c) do n.º 3. É, portanto, matéria a que haverá que prestar particular cuidado, pois o Código denota o intuito de não deixar prosseguir recursos inviáveis ou em que os recorrentes não exponham com clareza o sentido das suas pretensões. O sentido da exigência da lei, esse, é manifesto, pois sanciona o seu incumprimento com a rejeição do recurso, como claramente resulta da sua letra e como uniformemente tem entendido a jurisprudência.

Como se afirmava no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 259/2002, de 18.06.2002, publicado no D.R., II.ª Série, de 13-12-2002, referindo-se à versão anterior à introduzida pela Lei n.º 48/07, quando a deficiência de não se ter concretizado as especificações previstas nas alíneas a), b) e c), do n.º 3 do art.º 412.º, reside tanto na motivação como nas conclusões - como é o caso dos autos -, não assiste ao recorrente o direito de apresentar uma segunda motivação, quando na primeira não indicou os fundamentos do recurso, ou a completar a primeira, caso neste não tivesse indicado todos os seus possíveis fundamentos.

Ora, tanto da leitura das motivações como das conclusões resulta cristalinamente que os presentes recursos em matéria de facto se limitam a procurar abalar a convicção formada pelo tribunal a quo. Ou seja, os recorrentes não põem em causa a existência das declarações e dos depoimentos que fundamentam a convicção do tribunal recorrido. O que questionam é a relevância que aí lhes foi conferida e que, em sua opinião, é insuficiente, ainda que conjugada com apelo às regras da experiência comum.

Assim, a discordância dos recorrentes limita-se a questionar a valoração da prova pelo Tribunal, valoração essa, livremente formada e fundamentada.

Vem-se sustentando que “a censura quanto à forma de formação da convicção do tribunal não pode assentar, de forma simplista, no ataque da fase final da formação de tal convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade de formação da convicção. Doutra forma seria uma inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão.”

No mesmo sentido vai a jurisprudência uniforme dos tribunais superiores:

“Quando a atribuição de credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear numa opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum.”

Consequentemente, a crítica à convicção do tribunal a quo sustentada na livre apreciação da prova e nas regras da experiência não pode ter sucesso se se alicerçar apenas na diferente convicção do recorrente sobre a prova produzida.

Efectivamente, o julgador é livre, ao apreciar as provas, embora tal apreciação seja “vinculada aos princípios em que se consubstancia o direito probatório e às normas da experiência comum, da lógica, regras de natureza científica que se devem incluir no âmbito do direito probatório.”

No caso presente, e como fica patente da análise da motivação de facto supra transcrita, o tribunal a quo alicerçou a sua convicção fundamentalmente nas declarações do co-arguidos, conjugadas com o recurso às regras de experiência. 3.2.1. O que acarreta uma prévia dilucidação sobre a admissibilidade daquelas e, sendo afirmativa a resposta, das ilações que poderiam extrair-se no caso concreto.

Assim, escreveu-se já em dois arestos do STJ, que acompanharemos:

(num primeiro, datado de 7 de Maio de 2009, relatado pelo Ex.mo Conselheiro Arménio Sottomayor, e acessível no site www.dgsi.pt, sob o n.º 08P1213)

“(...) Quanto ao valor das declarações do co-arguido.

Dispõe o art.º 133.º do CPP:

«1. Estão impedidos de depor como testemunhas:

a) O arguido e os co-arguidos no mesmo processo ou em processos conexos, enquanto mantiverem aquela qualidade;

b) As pessoas que se tiverem constituído assistentes, a partir do momento da constituição;

c) As partes civis.

2. Em caso de separação de processos, os arguidos de um mesmo crime ou de um crime conexo podem depor como testemunhas, se nisso expressamente consentirem.»

Face a este preceito, designadamente à al. a) do n.º 1, tem sido questionado se o arguido está absolutamente impedido de testemunhar no próprio processo em que figure com essa qualidade.

A Doutrina já respondeu que os arguidos não estão impedidos de produzir prova “por declarações do arguido no decurso do julgamento, nos termos dos art.º 140.º e seguintes, como decorre, entre outros, do disposto nos art.ºs 343.º e 345.º, todos do CPP, mas que essas declarações – na decorrência de co-arguição – não podem validamente ser assumidas como meio de prova relativamente aos outros arguidos. Rodrigo Santiago, (Reflexões sobre as “Declarações do Arguido” como Meio de Prova no CPP de 1987) conclui deste jeito:

“1. os co-arguidos estão impedidos de ser testemunhas relativamente uns aos outros, adentro do mesmo processo, em caso de co-arguição e nos limites desta, como decorre do disposto na al. a) do n.º 1 do art.º 133.º do CPP;

2. não estão, todavia, impedidos de produzir prova “por declarações do arguido no decurso do julgamento, nos termos dos art.ºs 140.º e seguintes, como decorre, entre outros, do disposto nos art.ºs 343.º e 345.º, todos do CPP. Porém;

3. as declarações assim prestadas por um ou mais dos co-arguidos - na decorrência, repete-se, de co-arguição - não podem validamente ser assumidas como meio de prova relativamente aos outros;

4. servindo tais declarações, únca e exclusivamente, como meio de defesa do arguido ou arguidos que as tiverem prestado - art.º 343.º, n.º 2 do CPP. Logo, se

5. da motivação da sentença, nos termos do art.º 574.º, n.º 2, in fine, do CPP constar que as declarações dos co-arguidos contribuíram irrestritamente para a formação da convicção do Tribunal, verifica-se uma nulidade do julgamento, por assunção de um meio de prova proibido.”

Mas a propósito da mesma questão do depoimento de co-arguido, enquanto meio proibido ou não de prova, também se concluiu pela não proibição, lembrando, no entanto, que se trata de um meio de prova frágil, que impõe o controle pela defesa do co-arguido e prefere a corroboração por outras provas.

Teresa Beleza conclui assim (Rev. Min. Públ., Ano 19, 58 e 59):

“O depoimento de co-arguido, não sendo, em abstracto, uma prova proibida em Direito português, é no entanto um meio de prova particularmente frágil, que não deve ser considerado suficiente para basear uma pronúncia; muito menos para sustentar uma acusação.

Não tendo esse depoimento sido controlado pela defesa do co-arguido atingido nem corroborado por outras provas, a sua credibilidade é nula.

Na medida em que esteja totalmente subtraído ao contraditório, o depoimento de co-arguido não deve constituir prova atendível contra o(s) co-arguido(s) por ele afectado(s).

A sua valoração seria ilegal e inconstitucional.”

Entendeu o Tribunal Constitucional que é inconstitucional, por violação do art.º 32,º, n.º 5, da CRP, a norma extraída com referência aos art.ºs 133.º, 343.º e 345.º do CPP, no sentido em que confere valor de prova às declarações proferidas por um co-arguido em prejuízo do outro co-arguido quando, a instâncias deste outro co-arguido, o primeiro se recusa a responder, no exercício do direito ao silêncio (Ac. n.º 524/97, de 97/07/14, DR II S de 97-11-27).

No mesmo sentido o Ac. do STJ de 25-2-99 (Acs STJ VII, 1, 229), “está vedado ao tribunal valorar as declarações de um co-arguido, proferidas em prejuízo de outro co-arguido quando, a instâncias deste, o primeiro se recusa a responder, no exercício do direito ao silêncio, sob pena de violação do art.º 32.º, n.º 5 da CRP.” Cfr. ainda o Ac. do STJ de 7-2-01 (proc. n.º 4/00-3): “As declarações que os arguidos prestem estão tuteladas na sua produção e no seu âmbito pelo estatuto próprio do arguido, devendo ser sujeitas ao princípio do contraditório na medida em que afectem o co-arguido, não valendo contra este se esse contraditório não puder ser estabelecido, mormente pela oposição do arguido produtor da prova.”

No sentido de os cuidados que se impõem ao Tribunal deverem redobrar quando as circunstâncias ou direito ao silêncio impediram ou limitaram o exercício do contraditório pelo co-arguido, mas que não impede a livre apreciação por parte do tribunal, cfr. Simas Santos e Leal-Henriques (CPP Anotado, I, pág. 727).

E conclui-se igualmente que é a posição interessada do arguido, a par de outros intervenientes citados nesse art.º 133.º, que dita o impedimento, o que significa que nada obsta a que preste declarações, nomeadamente para se desonerar ou atenuar a sua responsabilidade, o que acarreta que, não sendo meio proibido de prova, as declarações do co-arguido podem e devem ser valoradas no processo, não esquecendo o tribunal a posição que ocupa quem as prestou e as razões que ditaram o impedimento deste artigo.

Com referem aqueles autores (pág. 726-7):

“Parece-nos, contudo, que a interpretação correcta deverá repousar na consideração de que o arguido, só porque o é, não estará sem mais impedido de prestar declarações no próprio processo em que se encontra envolvido. O legislador pretendeu, em primeira linha, constRC...r no Código a figura do arguido, assegurando-lhe todos os meios de defesa mesmo através de si próprio, pelo que, se o entender necessário à sua defesa, poderá usar o amplo direito que lhe assiste a ser ouvido. E a defesa desta posição leva a que o arguido ou co-arguido não possam ser ouvidos no mesmo processo ou processos conexos como testemunhas, ou seja como intervenientes que não só são obrigados a prestar declarações, como a fazê-lo com verdade (art.º 91.º) por tal ser incompatível com a sua posição de interessados no desfecho do processo e com o seu direito ao silêncio. De notar que no mesmo n.º 1 deste artigo, nas als. b) e c), e por identidade (parcial) de razões, também os assistentes e as partes civis estão impedidos de depor como testemunhas, interessados que também são no mesmo desfecho.

É, pois, esta posição interessada que dita o impedimento, posição reforçada no caso do arguido, dado o seu estatuto especial. Isso mesmo entendeu o STJ ao decidir que este artigo visa proteger próprio impedindo-o de depor contra si, nada porém obstando a que preste declarações, nomeadamente para se desonerar ou atenuar a sua responsabilidade (Ac. de 96-10-17, BMJ, 460-399).

Daqui decorre também que, não sendo meio proibido de prova, as declarações do co-arguido nele podem e devem ser valoradas no processo, não esquecendo o tribunal a posição que ocupa quem as prestou e as razões que ditaram o impedimento deste artigo.

Cuidado que deve redobrar quando as circunstâncias ou direito ao silêncio impediram ou limitaram o exercício do contraditório, mas que não impede, a nosso ver, a livre apreciação por parte do tribunal.”

Este Tribunal afirmou, impressivamente (Ac. de 3-5-00, Acs STJ VIII, 2, 180): “não há qualquer impedimento legal em que as declarações dos co-arguidos sejam valoradas, segundo o prudente critério do tribunal, em conjunto com os outros meios de prova.”

E tem sido neste último sentido que se tem formado a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça.

Com efeito decidiu-se que “(1) a crítica feita no sentido de que não seria lícita a utilização das declarações dos arguidos como meio de prova contra os outros, não tem razão de ser em face do art.º 125.º, do CPP; (2) na verdade, este artigo estabelece o princípio da admissibilidade de quaisquer provas no processo penal, estabelecendo o art.º 126.º, aquelas que são proibidas, não constando deste elenco o caso das declarações dos co-arguidos. Estas são perfeitamente possíveis como meios de prova do ponto de vista da sua legalidade, como o são as declarações do assistente, das partes civis, etc.; (3) o que acontece é que a Lei Processual ao proibir que o arguido seja ouvido como testemunha, pretende, tão só, protegê-lo e impedi-lo, por exemplo, que venha a ser condenado por perjúrio” (Ac. do STJ de 03-06-1993, proc. n.º 44347).

E que “o art.º 133.º do CPP apenas proíbe que os arguidos sejam ouvidos como testemunhas uns dos outros, ou seja, que lhes seja tomado depoimento sob juramento, mas não impede que os arguidos de uma mesma infracção possam prestar declarações no exercício do direito, que lhes assiste, de o fazerem em qualquer momento do processo” (Ac. do STJ de 04-05-1994, proc. n.º 44383).

“Nada impede que o arguido preste declarações sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto da prova, ou seja, tanto sobre factos que só ele digam directamente respeito, como sobre factos que respeitem a outros arguidos. O art.º 344.º, n.º 3 do CPP não prevê qualquer limitação ao exercício do direito de livre apreciação da prova, resultante das declarações do arguido” (Ac. do STJ de 30-05-1996, proc. n.º 498/96). No mesmo sentido o Ac. de 30-5-97 (proc. n.º 498/96): “(1) - Nada impede que um arguido preste declarações sobre factos de que possua conhecimento e que constituam objecto de prova, quer de factos que só a ele digam directamente respeito, como sobre factos que também respeitem a outros arguidos. (2) - O n.º 3 do art. 344.º do CPP não prevê qualquer limitação ao exercício do direito de livre apreciação da prova resultante das declarações do arguido, mas apenas que, nesses casos, as declarações do arguido não têm o valor de força probatória pleníssima que deve ser atribuída aos casos do n.º 2.”

Claramente no sentido sustentado pelos últimos autores referidos, entendeu o Supremo Tribunal de Justiça que a proibição constante do art.º 133.º do CPP, tem um objectivo muito próprio: o de garantir ao arguido o seu direito de defesa, que facilmente se mostraria incompatível com o dever de responder, e com verdade, ao que lhe fosse perguntado, com as sanções inerentes à recusa de resposta ou à resposta falsa. Porém, apesar do seu regime específico, as declarações de um co-arguido não deixam de ser um meio de prova, cujas limitações o não privam da virtualidade de influenciarem relevantemente, ou até fundamental ou exclusivamente, a convicção dos julgadores (Ac. do STJ de 10-12-1996, proc. n.º 48697).

“O sentido da norma do art.º 133.º, n.º 1, al. a), do CPP é o de que com ela se intenta proteger o próprio arguido, impedindo-o de depor contra si próprio, nada obstando a que preste declarações, nomeadamente para se defender de uma acusação ou aligeirar a sua responsabilidade nela.” (Ac. do STJ de 31-01-2001, proc. n.º 3574/00-3). No mesmo sentido o Ac. de 29-3-00 (proc. n.º 1134/99): “(1) - O que o art.º 133.º, do CPP, pretende evitar é que o arguido ou co-arguidos prestem declarações que sejam incriminatórias de si próprios. (2) - Um arguido que decide prestar declarações, ao indicar factos ou circunstâncias que excluam ou diminuam a ilicitude ou a sua culpa, relevando para a minoração da medida da pena, pode directa ou indirectamente contribuir para a prova incriminatória de outros arguidos. (3) - A lei processual, com todas as garantias a que o arguido tem direito - entre as quais se destaca a de guardar silêncio quanto aos factos de que é acusado - não vai ao ponto de impedir a prestação de declarações, de forma livre e espontânea, sejam elas ou não incriminatórias ou agravatórias da responsabilidade de outros intervenientes nos factos criminosos. (4) - De molde a evitar que os co-arguidos possam usar de reivindicta ou se desresponsabilizem recíproca ou multilateralmente, mandam as regras da experiência comum que se use de cautela na valoração de tais declarações.”

“Se é certo que os arguidos no mesmo processo ou em processos conexos não podem depor como testemunhas, não é menos verdade que sempre podem prestar declarações, que o tribunal valorizará dentro das balizas do art.º 127.º do CPP.” (Ac. do STJ de 30-11-2000, proc. n.º 2828/00-5). Cfr. ainda o Ac. do STJ de 26-3-98 (proc. n.º 44/98): “Não existe qualquer disposição legal que proíba que as declarações de co-arguido possam valer como meio de prova, pelo que as mesmas poderão ser objecto de valoração por parte do tribunal, para fundamentar a sua convicção sobre os factos que dá como provados, dentro da regra da livre apreciação da prova.”

“As declarações de co-arguido são meios admissíveis de prova e, como tal, podem ser valoradas pelo tribunal para fundar a sua convicção acerca dos factos que dá como provados. O art.º 133.º do CPP, o que proíbe é que os co-arguidos sejam ouvidos como testemunhas, mas não impede que os arguidos da mesma infracção possam prestar declarações (cuja credibilidade é, naturalmente, mais diluída), no exercício do direito, que lhes assiste, de o fazerem em qualquer momento do processo (art.º 343, n.º 1, do CPP) (Ac. do STJ de 23-10-1997, proc. n.º 679/97)

Deve, assim, entender-se, em síntese, que é a posição interessado do arguido, a par de outros intervenientes citados no art.º 133.º do CPP, que dita o seu impedimento para depor como testemunha, o que significa que nada obsta a que preste declarações, nomeadamente para se desonerar ou atenuar a sua responsabilidade, o que acarreta que, não sendo meio proibido de prova, as declarações do co-arguido podem e devem ser valoradas no processo, não esquecendo o tribunal a posição que ocupa quem as prestou e as razões que ditaram o impedimento deste artigo.

A crítica feita no sentido de que não ser lícita a utilização das declarações dos arguidos como meio de prova contra os outros, não tem razão de ser em face do art.º 125°, do CPP, pois este artigo estabelece o princípio da admissibilidade de quaisquer provas no processo penal, e do elenco das provas proibidas estabelecido no art.º 126.º do CPP não consta o caso das declarações dos co-arguidos, que são perfeitamente possíveis como meios de prova do ponto de vista da sua legalidade, como o são as declarações do assistente, das partes civis, etc.

Pode, assim, afirmar-se que o art.º 133.º do CPP apenas proíbe que os arguidos sejam ouvidos como testemunhas uns dos outros, ou seja, que lhes seja tomado depoimento sob juramento, mas não impede que os arguidos de uma mesma infracção possam prestar declarações no exercício do direito, que lhes assiste, de o fazerem em qualquer momento do processo, nada impedindo que o arguido preste declarações sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto da prova, ou seja, tanto sobre factos que só ele digam directamente respeito, como sobre factos que respeitem a outros arguidos.

O art.º 344.º, n.º 3 do CPP não prevê qualquer limitação ao exercício do direito de livre apreciação da prova, resultante das declarações do arguido.

Tem entendido o Supremo Tribunal de Justiça que a proibição constante do art.º 133.º do CPP, tem um objectivo muito próprio: garantir ao arguido o seu direito de defesa, que facilmente se mostraria incompatível com o dever de responder, e com verdade, ao que lhe fosse perguntado, com as sanções inerentes à recusa de resposta ou à resposta falsa, mas, apesar do seu regime específico, as declarações de um co-arguido não deixam de ser um meio de prova, cujas limitações o não privam da virtualidade de influenciarem relevantemente, ou até fundamental ou exclusivamente, a convicção dos julgadores (Cfr. neste sentido os Acs. do STJ de 28-6-01, proc. n.º 1552/01-5, de 5.6.03, proc. n.º 976/03, de 22/06/2006, proc. n.º 1426/06-5 e de 8-2-2007, proc. 28/07-5, com o mesmo Relator).

No mesmo sentido já se pronunciou o Tribunal Constitucional, no aresto citado e com a limitação indicada, hoje normativizada na nova redacção do art. 345.º, n.º 4 do CPP dada pela Lei n.º 48/2007 de 29 de Agosto.

Assim, não merece censura a posição das instâncias de que podiam valorar as declarações prestadas pelos co-arguidos.”

(num segundo, relatado pelo Ex.mo Conselheiro Santos Cabral, a 3 de Setembro de 2008, igualmente acessível naquele site, sob o n.º 08P2044)

“(...) Lateralmente os recorrentes... vêm renovar a decantada questão do depoimento do co- arguido sujeitando-o à necessidade de uma conjugação com outros meios de prova.

Reafirma-se sobre a questão o que oportunamente se referiu no Acórdão desta 3.ª secção de 12 de Março de 2008 nomeadamente no sentido de que não se desconhece o teor de algum posicionamento doutrinal que se suscitou anteriormente à Lei 48/84 sobre o valor das declarações do arguido como meio de prova.

Arrancava tal assunção opinativa de um eixo fundamental: - a consideração de que o silêncio do arguido não poderia, em circunstância alguma, desfavorecê-lo.

Todavia, o mesmo silêncio acabaria por prejudicar tal sujeito processual de forma efectiva, caso se aceitassem, como meio de prova as declarações do co-arguido, porquanto se o mesmo estivesse disposto a declarar, bem poderia ter abalado a eficácia da convicção atribuída a quem, com verdade, ou contra a verdade, concordou em prestar declarações. Na mesma lógica argumentativa se referia que o silêncio nunca podia desfavorecer o arguido sendo o exercício do direito ao silêncio a concretização do princípio da presunção de inocência ligado agora directamente ao princípio da preservação da dignidade pessoal.

A culminar tal raciocínio afirmava-se que, atribuindo a lei a faculdade do arguido não estar presente em julgamento, a prestação de declarações por parte dos co-arguidos presentes não poderia ser contraditada pelos ausentes. Assim, concluíam os defensores de tal posição pela validade das seguintes regras processuais em relação aos depoimentos dos arguidos:

1 - Os co-arguidos estão reciprocamente impedidos de ser testemunhas, adentro do mesmo processo, em caso de co-arguição e nos limites desta, como decorre do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 133.º do Código de Processo Penal;

2 - Não estão, todavia, impedidos de produzir prova - a chamada prova por declarações do arguido - mesmo no decurso da audiência de julgamento, nos termos dos artigos 140.º e seguintes, como decorre, entre outros, do disposto nos artigos 343.º e 345.º, todos do Código de Processo Pena. Porém,

3 - As declarações assim prestadas, maxime as que o forem em audiência de julgamento, por um ou mais dos co-arguidos - na recorrência, repete-se, de coarguição - não podem validamente ser assumidas como meio de prova relativamente aos outros,

4 - Servindo tais declarações, no âmbito da coarguição, única e exclusivamente como meio de defesa pessoal do arguido ou arguidos que as tiverem prestado artigo 343.º, n º 2 do Código de Processo Penal. Logo,

5 - Se da motivação da sentença, nos termos do artigo 374.º, n.º 2, in fine, do referido diploma, constar que as declarações dos co-arguidos - verificados os supostos premonidos nas conclusões 1.ª e 3.ª, isto é, a circunstância da coarguição - contribuíram irrestritamente para a formação da convicção do Tribunal, verifica-se uma situação de nulidade do julgamento, por violação do disposto nos artigos 323.º, alínea j) e 327.º, n.° 2, entre outros, todos do Código de Processo Penal. (Confrontar por todos R. Santiago R.P.D.C).

Numa outra linha de orientação, menos assertiva, se situavam aqueles que integram as declarações do arguido num tertium genus, admitindo a sua valoração, desde que acompanhada por outros meios de prova.

A este propósito, Teresa Beleza refere que “o depoimento do co-arguido, não sendo, em abstracto, uma prova proibida em Direito Português, é no entanto um meio de prova particularmente frágil, que não deve ser considerado suficiente para basear uma pronúncia; muito menos para sustentar uma condenação”, in Rev. Min. Publico, n.º 74, pág.58.

Outros autores entendiam que as declarações do co-réu deviam ser corroboradas, isto é o julgador teria de se socorrer de outros meios de prova que lhe permitam confirmar a credibilidade das mesmas (Medina de Seiça, in O conhecimento probatório do co-arguido, págs 212 e segs.) concluindo, também, que, quando as declarações dos réus, referentes a co-réus não se encontravam corroboradas por qualquer outra prova o tribunal deveria ser entendido que não constituíam prova suficiente dos factos relatados, dando-os como não provados (conf. José Luis Vasquez Sotelo, in Presuncion de Inocencia del Imputado e Intima Conviccion del Tribunal pág 134).”

Relativamente à evolução da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça em relação a esta matéria nos dá noticia o Acórdão de 27 de Novembro de 2007.

O eixo do posicionamento jurisprudencial do Supremo Tribunal de Justiça radica na ideia de que, fundamentalmente, o que está em causa é a posição interessada do arguido, que, assumido o seu impedimento para depor como testemunha, não obsta a que preste declarações, nomeadamente para esclarecer o tribunal sobre a sua responsabilidade criminal numa postura de colaboração na procura da verdade material. Sendo um meio de prova legal cuja admissibilidade se inscreve no artigo 125.º do Código de Processo Penal as declarações do co-arguido podem, e devem, ser valoradas no processo.

Como referem Leal Henriques e Simas Santos, “Parece-nos, contudo, que a interpretação correcta deverá repousar na consideração de que o arguido, só porque o é, não estará sem mais impedido de prestar declarações no próprio processo em que se encontra envolvido. O legislador pretendeu, em primeira linha, constRC...r no Código a figura do arguido, assegurando-lhe todos os meios de defesa mesmo através de si próprio, pelo que, se o entender necessário à sua defesa, poderá usar o amplo direito que lhe assiste a ser ouvido. E a defesa desta posição leva a que o arguido ou co-arguido não possam ser ouvidos no mesmo processo ou processos conexos como testemunhas, ou seja como intervenientes que não só são obrigados a prestar declarações, como a fazê-lo com verdade (art.º 91.º) por tal ser incompatível com a sua posição de interessados no desfecho do processo e com o seu direito ao silêncio. De notar que no mesmo n.º 1 deste artigo, nas als. b) e c), e por identidade (parcial) de razões, também os assistentes e as partes civis estão impedidos de depor como testemunhas, interessados que também são no mesmo desfecho.

É assim a especial posição do arguido que dita o impedimento do mesmo a depor como testemunha dado o seu estatuto especial, nada porém obstando a que preste declarações, nomeadamente para se desonerar ou atenuar a sua responsabilidade.”

Subscrevemos tal entendimento adiantando ainda que, em nosso entender, importa precisar alguma confusão que está subjacente à cruzada empreendida contra o arguido que produz depoimento incriminatório. Na verdade uma coisa são proibições de prova que são verdadeiros limites à descoberta da verdade, barreiras colocadas à determinação dos factos que constituem objecto do processo e outra, totalmente distinta a valoração da prova. Nesta ultima está implícita uma apreciação da credibilidade da prova produzida em termos legais.

Portanto a questão que se coloca é tão só, e singelamente, saber se é válida processualmente a admissibilidade do depoimento do arguido que incrimina os restantes coarguidos. A resposta é, quanto a nós, frontalmente afirmativa e dimana desde logo da regra do artigo 125.º do Código Penal que dispõe que são admitidas as provas que não forem proibidas por lei; por outro lado não se sente qualquer apoio numa interpretação rebuscada da Constituição que aponte a inconstitucionalidade de uma tal interpretação.

Bem pelo contrário, a consideração de que o depoimento do arguido que é, antes do mais, um cidadão no pleno uso dos seus direitos, reveste à partida de uma capitis diminutio só pelo facto de ser arguido ofende o principio da igualdade dos cidadãos. Portanto a questão que se coloca neste caso é, como em relação a todos os meios de prova, uma questão de credibilidade do depoimento do co-arguido.

Esta credibilidade, como adiante precisaremos, só pode ser apreciada em concreto face às circunstâncias em que é produzida. O que não é admissível é a criação de regras abstractas de apreciação da credibilidade retornando ao sistema da prova tarifada, opção desejada pelo sistema inquisitorial. Assim, dizer em abstracto e genericamente que o depoimento do co-arguido só é válido se for acompanhado de outro meio de prova é uma subversão das regras da produção de prova sem qualquer apoio na letra ou no espírito da lei.

Na verdade, conforme refere o Prof. Figueiredo Dias, o processo penal não pode existir validamente se não for presidido por uma directa intenção ou aspiração de justiça e de verdade. O que é tanto mais evidente quanto se recorde que por detrás da imposição de uma pena está uma finalidade de prevenção geral de integração e, portanto, uma exigência de verdade e de justiça na aplicação da sanção.

Por outro lado, não obstante a descoberta da verdade material ser uma finalidade do processo penal não pode ela ser admitida a todo o custo, antes havendo que exigir da decisão que ela tenha sido lograda de modo processual válido e admissível e, portanto, com o integral respeito dos direitos fundamentais das pessoas que no processo se vêem envolvidas. A protecção perante o Estado dos direitos fundamentais das pessoas surge, assim, também ela, como finalidade do processo penal. Afirmá-lo é também proteger o interesse da comunidade de que o processo penal decorra segundo as regras do Estado de Direito. São precisamente estas regras do Estado de Direito - que se prendem com os direitos fundamentais das pessoas e que exigem que a decisão final tenha sido lograda de um modo processualmente válido - que vão impedir, em certas situações, a obtenção da verdade material. Isto pode ocorrer, em concreto e p. ex., com a proibição da valoração das provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em gera/, ofensa da integridade física ou moral das pessoas.

Se isto é assim, também é, no entanto, verdade que aquela que foi historicamente a arma do Estado de Direito a persistência na convicção de que, em todas as circunstancias, os direitos de cada pessoa de vem ser defendidos e a sua liberdade salvaguardada - tem vindo a ser relativizada: o Estado de Direito não exige apenas a tutela dos interesses das pessoas e o reconhecimento dos limites inultrapassáveis, dali decorrentes, à prossecução do interesse oficial na perseguição e punição dos criminosos. Ele exige também a protecção das suas instituições e a viabilização de uma eficaz administração da justiça pena, já que pretende ir ao encontro da verdade material.

Asssim, e vendo agora as coisas sob um outro prisma, em certas circunstâncias, para que os interesses assinalados se concretizem, necessário se torna pôr em causa direitos fundamentais das pessoas. O remédio para esta impossibilidade de harmonização integral das finalidades do processo penal, adianta o referido Mestre, estará numa tarefa – infinitamente penosa e delicada - de operar a concordância prática das finalidades em conflito. Tal tarefa implica, relativamente a cada problema concreto uma mútua compressão das finalidades em conflito, de forma a atribuir a cada uma a máxima eficácia possível: de cada finalidade há-de salvar-se, em cada situação, o máximo conteúdo possível, optimizando-se os ganhos e minimizando-se as perdas axiológicas e funcionais.

Se o critério geral reside assim, não na validação da finalidade preponderante à custa da de menor hierarquia ao estilo da teoria do direito de necessidade jurídico-penal - mas sim numa optimização das finalidades em conflito, situações há no entanto em que se torna necessário eleger uma só das finalidades, por nelas estar em causa a intocável dignidade da pessoa humana.

Do que se trata então é do princípio axiológico que preside à ordem jurídica de um Estado de Direito material: o principio da dignidade do homem, da sua intocabilidade e da consequente obrigação de a respeitar e proteger.

Mas será que tal núcleo fundamental estará por alguma forma violado quando se admite como válido o depoimento incriminatório do arguido e em relação aos restantes arguidos. Será que os direitos de defesa dos seus companheiros no banco dos arguidos são minimamente atingidos se forem observadas as regras processuais de produção de prova? Será que o arguido que opta pelo direito ao silêncio adquire ope legis um direito de veto à produção de outra prova que não aquela que lhe convém? O direito de não se auto incriminar do arguido é conflitual como a colaboração do co-arguido na procura da verdade material?

Estamos em crer que a resposta tem de ser necessariamente negativa.

A admissibilidade do depoimento do arguido como meio de prova em relação aos demais co-arguidos não colide minimamente com o catálogo de direitos que integram o estatuto inerente àquela situação e está adequada á prossecução de legítimos e relevantes objectivos de política criminal nomeadamente no que toca á luta contra criminalidade organizada.

Como refere o Professor Costa Andrade é evidente que ninguém coloca em causa o principio do nemo tenetur se ipsum accusare que deriva desde logo da tutela jurídico constitucional de valores ou direitos fundamentais como a dignidade humana, a liberdade de acção e a presunção de inocência em geral referenciados como a matriz jurídico constitucional do principio. A lei processual penal portuguesa contém uma malha desenvolvida e articulada de normas através das quais se assegura acolhimento expresso às mais significativas exigências do princípio nemo tenetur. A começar e em se tratando de factos pertinentes à culpabilidade ou medida da pena, o Código de Processo Penal garante ao arguido um total e absoluto direito ao silêncio (art.º 61.º, n.º 1, al. c). Um direito em relação ao qual o legislador quis deliberadamente prevenir a possibilidade de se converter num indesejável e perverso privilegium odiosum, proibindo a sua valorado contra o arguido. E tanto em se tratando de silêncio total (art.º 343.º, n.º 1) como em se tratando de silêncio parcial (art.º 345.º, n.º 1).

Para garantir a eficácia e reforçar a consistência do conteúdo material do princípio nemo tenetur a lei impõe às autoridades judiciárias ou órgãos de polícia criminal, perante os quais o arguido é chamado a prestar declarações, o dever de esclarecimento ou advertência sobre os direitos decorrentes daquele principio (conf., v. g., art.ºs 58.º, n.º 2; 61.º, n.º 1, al. a); 141.º, n.º 4 e 343.º, n.º 1).

A eficácia de tais normas é contrafacticamente assegurada através da sanção da proibição de valoração. Porém, a proibição de valoração incide sobre o silêncio que o arguido adoptou como a melhor estratégia processual e, como é evidente, não poderá repercutir-se na prova produzida por qualquer meio legal e que venha a precisar e demonstrar a responsabilizar criminalmente o arguido.

Seria necessária uma visão fundamentalista, e unilateral do processo penal, defender que o exercício do direito ao silêncio tivesse potencialidade para inquinar todo o meio de prova que, não obstante a sua regularidade, viesse a demonstrar a falência de tal estratégia de silêncio.

É evidente que tal argumentação não é aceite para quem, nos processos de grande criminalidade organizada, aposta a defesa dos arguidos no seu silêncio conjunto por uma questão de estratégia processual. Porém, não são tais visões parcelares e parciais que irão contribuir para elucidar a questão em apreço. Bem ao contrário daquela perspectiva, estamos em crer que o eixo fundamental da mesma questão reside no facto de o depoimento incriminatório estar sujeito ás mesmas regras de outro e qualquer meio de prova, ou seja, a sua sujeição á regra da investigação; da livre apreciação e do princípio in dubio pro reo.

Assegurado que esteja o funcionamento de tais princípios e o exercício do contraditório, nos termos preconizados pelo artigo 32.º da Constituição nenhum argumento subsiste á validade de tal meio de prova.

Aliás, a partir do momento em que o arguido depõe no exercício do seu direito de defesa é evidente que as suas palavras têm uma dupla conotação: sendo emergentes de um inviolável direito de defesa elas são também um meio de prova. Não é possível, em termos práticos, separar aquela realidade concreta que é o depoimento do arguido considerando ora como um exercício legítimo de um direito ora como meio de prova. Tal visão, para além de um inequívoco maniqueísmo, esquece que o processo penal visa a descoberta da verdade material e não de tantas realidades quanto aquelas que interessam aos diversos sujeitos processuais.

Um dos eixos argumentativos aduzidos em favor da inadmissibilidade do referido depoimento situa-se num eventual direito á mentira que constaria da colectânea de direitos dos arguidos.

Assim, argumenta-se, como credibilizar um depoimento produzido por alguém que tem o direito de mentir?

A respeito de tal argumentação é importante esclarecer que uma mentira não é verdade pelo facto de ser repetida até á exaustão e que tal pressuposto é agora, como sempre foi, falso.

Nenhum Estado de Direito digno desse nome outorga aos seus cidadãos o direito de mentir em qualquer circunstância e muito menos num processo penal.

Já em 1974 Figueiredo Dias se pronunciava sobre um invocado direito a mentir repudiando-o decididamente. Afirmava o mesmo Professor que nada existe na lei, com efeito, que possa fazer supor o reconhecimento de um tal direito. As soluções legais em matéria de silêncio e de cessação do dever de colaboração explicam-se perfeitamente pela oposição que assim, se quer fazer à velha e odiosa ideia inquisitória, segundo a qual o arguido, enquanto meio de prova, poderia ser obrigado, inclusivamente através de meios de coacção física e psíquica, sem excluir a própria tortura, à prestação de declarações que o incriminassem. E sabe-se como todo o processo penal reformado fez de uma tal oposição um dos seus propósitos mais salientes.

Mas sendo assim, poderia pensar-se (e não faltam autores a lançarem-se, mais ou menos profundamente, nesta via de compreensão das soluções legais) que, podendo o arguido optar livremente entre o silêncio ou o prestar declarações, caso escolhesse esta segunda possibilidade continuaria a recair sobre ele um dever de verdade, ou como mero dever moral, ou mesmo como verdadeiro dever jurídico. A verdade, porém, é que do reconhecimento de um tal dever não ressaltam quaisquer consequências práticas para o arguido que minta, uma vez que tal mentira não deve ser valorada contra ele, quer ao nível substantivo autónomo das falsas declarações, quer ao nível dos direitos processuais daquele.

Conclui-se, então, que não existe, por certo, um direito a mentir que sirva como causa justificativa da falsidade. O que sucede simplesmente é ter a lei entendido, ser inexigível dos arguidos o cumprimento do dever de verdade, razão por que renunciou nestes casos a impô-lo.

Porém, uma coisa é a inexigibilidade do cumprimento do dever de verdade pelo arguido, reconduzindo-o a uma mero dever moral, e outra, totalmente distinta, é a inscrição de um direito a mentir do arguido que é inadmissível num Estado de Direito. Mas sendo assim não existe fundamento legal para a menorização do depoimento do arguido a qual, na realidade, não é mais do que uma intolerável presunção de não cidadania ou seja de que colocado perante a possibilidade de escolha o arguido mente.

É evidente que, tal como em relação ao depoimento da vítima, é preciso ser muito cauteloso no momento de pronunciar uma condenação baseado somente na declaração do co-arguido porque este pode ser impulsionado por razões aparentemente suspeitas tal como o anseio de obter um trato policial ou judicial favorável, o animo de vingança, ódio ou ressentimento ou o interesse em auto- exculpar-se mediante a incriminação de outro ou outros acusados. Para dissipar qualquer dessas suspeitas objectivas é razoável que o co-arguido transmita algum dado externo que corrobore objectivamente a sua manifestação incriminatória com o que deixará de ser uma imputação meramente verbal e se converte numa declaração objectivada e superadora de uma eventual suspeita inicial que pesa contra a mesma. Assim, estamos em crer que é importante, em sede de credibilização do depoimento que o mesmo seja corroborado objectivamente.

Não se trata de criar, à partida, e em termos abstractos, uma exigência adicional ao depoimento do co-arguido incriminatório dos restantes arguidos em termos de admissibilidade como meio de prova, entrando, como já se afirmou, num zona de uma inadmissível prova tarifada, mas sim de uma questão de credibilidade daquele depoimento em concreto. Não se pode deixar de referir que numa posição de menor exigência se situa Viegas Torres quando, em relação ao sistema judicial espanhol, refere que o valor probatório da declaração incriminatória de um coimputado tem sido discutido alegando-se que estes testemunhos são, em geral interessados e pouco ou nada objectivos. Frente a tais afirmações, afirma, a jurisprudência afirmou, com carácter geral a validade probatória das declarações de coimputados.A jurisprudência parece considerar que não é regra geral a presença de factores que tirem a necessária objectividade ao testemunho do coimputado pelo que não há razões para negar valor probatório ao dito testemunho.A excepcional concorrência de circunstâncias que podem afectar a fiabilidade da declaração incriminatória de um coimputado terá de apreciar-se caso por caso O depoimento do co-arguido pode destRC...r a presunção de inocência dos restantes desde que o tribunal se convença de que o mesmo é credível.

Será, pois, a nível de valoração em concreto do depoimento produzido que se coloca a questão da relevância do depoimento do arguido. Como refere Carlos Clement Duran a imputação que um coacusado realiza contra outro coacusado tem o grande atractivo de que a faz quem aparece como um directo conhecedor do facto em juízo e incluso nada perde ou ganha ao incriminar o coacusado porque, assim, está a assumir a sua própria responsabilidade penal. Porém, pelo seu próprio peso específico, já que as possibilidades defensivas do incriminado são reduzidas, importa um juízo crítico rigoroso sobre o valor de tal imputação e que permita concluir que a incriminação que a mesma contem não corresponde a um interesse espúrio.

Compreende-se, assim, a importância que se atribui ao facto de tais manifestações incriminatórias estarem acompanhadas de algum dado ou elemento de carácter objectivo que lhes dê credibilidade e devam ser uniformes e reiteradas, evidenciando a credibilidade do acusado que as realiza.

Na esteira do Autor citado entendemos que a credibilidade do depoimento incriminatório do co-arguido está na razão directa da ausência de motivos de incredibilidade subjectiva o que, na maioria dos casos, se reconduz á inexistência de motivos espúrios e á existência de uma auto inculpação.

Igualmente assume uma real importância a concorrência de corroborações periféricas objectivas que demonstrem a verosimilhança da incriminação.”

3.2.2. Na posse desta perspectiva, que perfilhamos [ou seja, e em síntese, da admissibilidade das declarações de co-arguido, desde que acautelada mormente a possibilidade do seu contraditório, tudo redundando depois na mera credibilidade que a sua valoração possa permitir], indaguemos concretamente da prova produzida sobre os ilícitos cuja (co) autoria os arguidos controvertem.

Assim:


Factos de I)

Traduzem-se os mesmos em data não apurada do mês de Janeiro de 2000, o arguido RC... haver furtado de uma arrecadação, cuja porta abriu, anexa à Quinta …, sita em ..., TMR..., uma espingarda de caça, marca Luigi Franchi, calibre 12mm, de um cano, n.º 627614.

Estribou-se a conviccção do Tribunal a quo, conforme motivação, na circunstância de o co-arguido OX... ter visto a arma no carro (um Fiat Uno vermelho) do arguido RC...na ... junto ao rio, ao açude de pedra; o mesmo lhe haver afirmado que a tinha ido buscar a tal Quinta, local em que já trabalhara, e daí saber da sua existência; arma entretanto transportada para a residência deste OX..., onde, aliás, veio a ser apreendida, conforme auto de fls. 547, e co-arguido este assim com conhecimento da sua origem ilícita.

Ouvindo-se as declarações produzidas em audiência, constata-se que o recorrente RC... se eximiu a prestar declarações sobre tais factos.

Todavia, já o arguido OX..., seu primo, e então de boas relações com ele, depôs nos termos mencionados, ou seja, explicitando que foi o primeiro quem lhe exibiu a dita arma, cuja proveniência precisou, mencionando conhecer o local por lá ter trabalhado, e que depois levaram para casa do segundo, onde este a guardou no sótão.

Atentas as regras acima mencionadas norteadoras aos critérios de apreciçaõ da prova, nada pois a opôr ao decidido, improcedendo a pretensão do recorrente RC... no sentido em que se altere o acervo fáctico em causa.


Factos de III)

Em causa neste item um pretenso furto de vários bens perpetrados, em dia  e hora não apurados, mas durante o mês de Dezembro de 2001, pelos co-arguidos HF... em conjugação com o arguido CM..., sendo que para tanto o primeiro se introduziu na residência de FG...e de RX…, e tais bens acabaram por ser encontrados na residência do segundo.

Estibou o Tribunal recorrido a sua convicção no que concerne, fundando-se na confissão feita pelo arguido HF... de ter sido co-autor da subtracção; no depoimento de FG…, mencionando a forma pela qual o(s) agente(s) entrou/aram na sua casa, o que levaram e o valor dos bens; acrecendo a circunstância de os bens terem sido encontrados em casa do segundo arguido, sem que justificasse, com verosimilhança, o facto.

O arguido HF...assumiu em audiência a subtracção dos bens indicados e moldes em que se processou. Mencionou, porém, ter agido desacompanhado.

Assumiu ter entregue o relógio de parede directamente ao arguido CM… como reconhecimento da ajuda que este lhe prestava. Esclareceu que este lhe facultara viver em sua casa, mesmo antes de lhe dar emprego na padaria de seu pai, e daí tal reconhecimento.

Já o arguido CM... ( P...) negou ter ido à casa em questão. Reconheceu ter recebido os bens em causa: o relógio directamente do HF...e o pote e o bule por intermédio de seu irmão RM..., também co-arguido, mencionando este que procedeu a tal entrega após instrução dada pelo HF....

A prova não pode, nem deve, ser apreciada atomistícamente, quase que fazendo intervir um balanço de ónus que são alheios à busca da verdade material, norteada, todavia, pelos princípios estruturantes do processo penal.

Esta afirmação colhe na justa medida em que vendo-se a totalidade das declarações dos ora recorrentes, bem como, p.ex., do co-arguido CM… (o CM... Desdentado, como aceitou ser comummente apelidado), o que se nos depara é a actuação de um grupo heterogéneo de agentes, dividido entre os que até se mostravam económicamente enquadrados (os irmãos RM... e CM…) e aqueles que não logravam deter tal estatuto (arguidos HF...e RC...), e por cujo intermédio os primeiros, através do auxílio que disponibilizaram aos segundos (permitindo-lhes trabalhar na padaria) e pela disponibilização de uma viatura (em geral, a Berlingo), acabavam por ser os “receptores” imediatos das condutas delitivas perpetradas pelos segundos, mas em termos que as regras da normalidade e da experiência comum, por forma alguma podem infirmar como não sendo de comum acordo, embora em forma de participação distinta.

Aliás, sintomáticamente, sendo o HF...um mero empregado da padaria que devia acompanhar o CM… na ronda de distribuição do pão, certo é que ele se ausentava do local do trabalho para perpetrar furtos, e depois era aquele CM… quem disponibilizava o veículo para recolherem o produto respectivo que, ademais, recolheu de forma relevante, em sua própria casa, como nos dão nota as apreensões entretanto conseguidas. CM... que atravessava um período conturbado da sua vida pessoal, ao que afirmou, e se movia então pelo desejo da “aventura”.

Ora, é assim que tudo conjugado assume sentido e justifica o juízo conclusivo do Tribunal a quo, que urge manter.

Sja, improcedente a pretensão do recorrente CM…, em ser eximido da actuação descrita neste ponto III:


Factos de IV)

Mais uma vez em causa actuação do co-arguido RC... que, em dia não apurado, mas no período compreendido entre 1 de Dezembro de 2001 e 5 de Janeiro de 2002, conjuntamente com dois demais agentes (CM... e ACM…, este entretanto falecido), se teriam introduzido numa residência situada na Quinta …, TMR..., para tanto rebentando com as fechaduras das respectivas portas, utilizando um instrumento tipo pé de cabra e partido a janela da cozinha, por onde entraram, daí subtraindo diversos bens móveis, posteriormente aprendidos parte em casa do CM... e uma mala, em matéria plástica, cor verde garrafa, com referência “ZAC” contendo diversos parafusos e porcas, avaliada em € 30, na residência deste recorrente RC....

Como se extrai da correspondente motivação, prevaleceram como meios de prova, o depoimento do ofendido CH… dizendo o que lhe furtaram, e a falta de justificação plausível pelos arguidos CM... e RC...àcerca da origem dos bens apreendidos nas suas residências.

Em audiência o arguido RC...usou do silêncio no que contende com esta factualidade.

O arguido CM… negou haver participado neste furto.

Ora, além do depoimento do lesado, explicitando da forma de introdução do(s) agente(s) na sua residência, resta pois o recurso às normas da experiência. E segundo estas quem detém algo em sua casa, há de saber da sua origem. Não o explicitando, assumindo o silêncio, funciona este em seu desfavor, pois que infirmada uma comum regra da experiência, só deve essa omissão interpretar-se como de alguém que não quer assumir a proveniência ilegítima do bem.

Donde que cabal a dedução do Tribunal sindicado, e a improcedência desta pretensão do recorrente RC....


Factos de V)

Reporta-se este segmento do acervo fáctico acolhido, a um furto perpetrado no período compreendido entre 00.00 horas, do dia 12 de Maio de 2002 e as 23.00 horas, do dia 18 de Maio do mesmo ano, a hora também não apurada, mas durante a noite, pelos arguidos HF... ... e RC..., no Mini Autódromo de TMR.... O primeiro, após se haver apossado de diversos bens móveis, foi ao encontro do segundo, após o que este telefonou ao arguido CM...a quem relatou o ocorrido, e pedindo-lhe para que se deslocasse às imediações do autódromo, com a sua carrinha marca Citroen, modelo Berlingo, matricula …, a fim de transportar o material subtraído. Anuindo, fê-lo tal arguido CM... que, entretanto fazendo-se já acompanhar pelo arguido CM…, e, conjuntamente com os dois demais, retirou do local todos os bens referidos.

Fundamentou a convicção do Tribunal a quo, as declarações e confissão dos arguidos HF... e CM…; a circunstância de um dos bens retirados - o carro de modelismo modelo Tamya – haver sido encontrado em casa do RC... e os restantes em casa do CM…, sem que justificassem tal detenção. Ainda determinantes o depoimento de FC..., proprietário dos bens furtados que explicitou o modo pelo qual os agentes aí se introduziram.

Auscultada a prova produzida, resulta mostrar-se a decisão recorrida a coberto de qualquer censura neste concreto ponto.

Com efeito, o arguido HF...assumiu a sua participação no sucedido, de início apenas acompanhado pelo arguido RC.... Já na posse dos bens, disse terem telefonado ao arguido CM… a fim de este passar pelo local na sua carrinha Berlingo, o que veio a suceder, e após o que dividiram os bens subtraídos pelos três (o próprio; o RC...e o CM…). Não se recordava se o CM… terá acompanhado o CM…, como descrito.

O arguido CM… reconheceu que enquanto andava a fazer a ronda do pão com o CM…, terão recebido um telefonema alertando-os para passarem junto às instalações do Mini Autódromo. Fizeram-no, aí se encontrando os arguidos HF...e RC.... Trouxeram os bens para a casa do arguido CM…, sem que o CM… haja ficado com algum produto da subtracção, e assumindo que nada fora préviamente combinado ao recebimento do telefonema.

O arguido RC... mencionou que nesse dia, cerca das 2 horas da manhã, encontrando-se em sua casa, foi abordado pelo arguido HF...no sentido de lhe dar uma boleia até à padaria do pai dos arguidos RM... e CM… .

Anuindo, deslocaram-se nessa direcção, e ao passarem nas proximidades das instalações do Mini Autódromo, o HF...pediu-lhe para parar o velocípede em que se deslocavam. Fê-lo, sendo que o HF...se retirou uns metros e uns instantes, após o que lhe apareceu transportando um saco plático preto, desconhecendo o RC...qual o conteúdo. Por instância do HF...telefonou ao CM..., pedindo-lhe que ali passasse, o que veio a verificar-se. Acto contínuo, transportou o saco para a padaria do pai do CM.... Desconhece o conteúdo do saco aludido. Mais tarde alguém, que não recorda, lhe ofereceu um carro telecomandado, que veio a ofertar a um sobrinho seu (filho da AP...).

Já o recorrente CM... apenas admitiu ter recebido uma chamada telefónica, quando fazia a ronda do pão, pedindo-lhe o RC... que passasse pelas instalações do Mini Autódromo. Deslocando-se para o local, permaneceu na carrinha, em cujo interior foram depositados vários artigos, transportados para o que designou padaria velha. Guardou alguns dos bens em questão na sua residência.

O cotejo crítico de todas estas declarações acoberta a opção e versão dos factos acolhida. Com efeito, e mais uma vez, depara-se-nos uma primitiva actuação do arguido HF..., qual peão de brega que primeiramente subtraía os bens, e, depois, uma concertação dos demais intervenientes – o RC..., transportando-o ao local e telefonando reclamando a presença do CM... no local, sempre com o veículo Berlingo, capaz de recolher o produto da actividade delituosa, a que procedeu -, bem como subsequente recolha em casa do mesmo, com diminuto partilhar pelos demais.

A prova devendo fazer-se esgotantemente, também não pode menosprezar que em determinadas situações a própria lógica da actuação dos intervenientes, reclama a dedução de juízos valorativos com arrimo essencial em regras da exepriência, critério adoptado com parcimónia e que importa ressalvar.

Em conclusão, a da improcedência das arguições opostas pelos recorrentes CM... e RC....


Factos de IX)

Alude-se neste ponto a um furto perpetrado no dia 18 de Junho de 2002, a  hora não apurada, mas durante a noite, pelos arguidos HF..., RC... e CM...numa residência de TX... e de IJ… .

Como motivação probatória, indicam-se as declarações dos arguidos CM..., HF..., RC... e  CM... que confessaram os factos mencionados; o depoimento de TX..., explicitando a forma pela qual lá entraram, o valor dos bens furtados, que lhe danificaram as portadas e as portas e o valor que teve de suportar para repor as mesmas, a relação de todos os bens furtados conforme fls. 77 a 80 e 520 a 522; fotografia de fls. 925; auto de reconhecimento e entrega de fls. 963 e 964; os bens apreendidos a CM... e constantes do auto de fls. 59 e os bens apreendidos a  CM... e constantes dos autos de fls. 26 e 560.

Ponto que cabe precisar o de que, em audiência, o recorrente RC... não assumiu a comparticipação neste ilícito. Na verdade, antes se limitou a declarar não querer falar sobre o mesmo.

Em contrário, porém, os demais intervenientes assumiram a sua comparticipação, embora discrimando a concreta conduta. Assim: o arguido HF...admitiu a sua comparticipação, pois que, disse, os bens apareceram em casa do CM...; o arguido CM..., embora referindo não se recordar de “ter ido assaltar”, relembra-se contudo de ter ido buscar os bens conjuntamente com o HF..., e de no local terem encontrado presente o RC...; por fim, o arguido CM... se assumiu algum dos comprtamentos cominados, este foi um deles, pois que afirmou ser verdade o descrito no libelo acusatório no que concerne.

Ora, tudo conjugado, mais uma vez se mostra assertivo o juízo conclusivo do tribunal a quo.


Factos de XI)

Controvertida aqui pelos recorrentes RM...; CM...; HF...e RC..., a factualidade que contende com o furto de que foi alvo a firma “S... Ldª”, sita na Estrada de ..., TMR..., bem como a falsificação que terão operado relativamente às chapas de matrícula de um dos bens daí retirado, mais precisamente das respeitantes ao veículo de matrícula  ....

No caso, arrimo probatório acolhido na decisão recorrida, além do mais, a conjugação das declarações dos arguidos RM..., HF..., CM..., RC...e das testemunhas LB..., CB..., MC... e BD..., estes dois últimos donos da S...; o RM... diz que o RC...e o CM... participaram no furto à S...; o HF...viu o RC...a conduzir o jeep da S... na noite em que ocorreu o furto; o CM... diz ter visto o RC...a conduzir o jeep da S..., diz ainda que o RM... e o RC...saíram de junto da padaria no Fiat Punto (do CM...) e foram para a S...; o RC...diz que o CM... conduziu o jeep da S...; as testemunhas LB... e CB... vêm o RM... a conduzir o Mitsubishi da S...; as testemunhas MC... e BD... identificaram os veículos que lhes foram furtados; a alteração das matrículas no Mistubichi pelas declarações do arguido HF... e pelo auto de fls. 342 onde este veículo é encontrado com as chapas de matrícula …; parte dos bens entregues através do auto de fls. 125 e propriedade da S..., encontravam-se na área de residência do CM..., não tendo este justificado porque aí se encontravam; quer pelo que dizem os arguidos, atribuindo mutuamente a ida à S..., quer porque parte dos bens se encontravam na posse do  CM..., pelas regras da experiência se conclui que os cinco arguidos de comum acordo praticaram estes factos.

A impugnação deste ponto é a que mais congrega o dissídio dos recorrentes.

Tal como se discrimina na motivação da decisão recorrida, todos eles acabam por se atribuir ao menos a condução e/ou o transporte do/no veículo Mitsubishi, retirado das instalações da S.... Na verdade, issso mesmo resulta das declarações que prestaram, sendo que apenas não é referido o CM..., embora não menos verdade seja que ele próprio admite tê-lo conduzido em direcção à W... onde acabaram por o abandonar.

Precisando:

O arguido RM... negou haver participado neste furto. Mencionou que na data em causa se encontrava na padaria de seu pai, conjuntamente com seu irmão (CM...), a AP..., e o HF..., quando lá apareceram os arguidos RC... e CM..., fazendo-se transportar numa moto 4 que aquele seu irmão (CM...) lhes tinha emprestado, e com isqueiros, esferográficas, porta-chaves com publicidade da S.... Daqui deduziu que ambos já lá se tinham deslocado, o que aliás corroborou pois que esses dois arguidos pediram-lhes que se deslocassem conjuntamente com eles à S... para transportarem bens que aí se encontravam. Perante a recusa do RM... e do CM... em o fazerem, o RC... e o CM... abandonaram a padaria mas, volvido algum tempo, apareceram ali de novo fazendo-se transportar na Mitsubishi e com diverso material furtado.

Instado sobre a circunstância de a maioria dos bens subtraídos ter sido encontrada na residência de seu irmão CM..., afirmou que este ainda hesitou, mas acabou por aceder ao pedido que lhe foi feito pelos recorrentes RC... e HF...no sentido em que ali fossem recolhidos.

O arguido CM... depôs corroborando tais factos, acrescendo apenas a menção de que os bens transportados ficaram recolhidos num reboque que lhe pertencia, sendo que destes levou um CPU para a sua residência.

Já o arguido RC... precisou relativamente a esta factualidade que no dia mencionado se encontrava em sua casa quando, cerca das 2 da manhã, aí apareceu o arguido CM..., fazendo-se transportar na Mitsubishi, perguntando-lhe se queria ir à padaria. O recorrente anuiu, desconhecendo o que se terá passado eventualmente com o veículo e relativamente às instalações da S.... Alguns dias depois, deslocou-se à W..., conduzindo ele próprio o Fiat do CM..., enquanto este seguiu na Mitsubishi. Deixaram este veículo naquela praia e regressaram a casa.

O arguido HF...mencionou que uma noite se encontrava a trabalhar na padaria com o CM... quando ali apareceu o RC... sózinho, conduzindo a Mitsubishi vazia que disse ter furtado na S.... Afirmou desconhecer algo mais relativamente a esta situação.

O arguido CM... afirmou que não se deslocou à S... em qualquer uma das duas ocasiões relatadas na acusação. Encontrava-se na padaria quando lá chegaram o RM... fazendo-se transportar numa moto 4 e o RC... na Mitsubishi. Depoia abalaram ambos (o RM... e o RC...) agora conjuntamente com o CM... e volvido algum tempo regressaram à padaria, sendo o RC... conduzindo o Fiat subtraído na S....

Recorda-se de terem sido substituído as chapas de matrícula da Mitsubishi, estando presentes o próprio CM... e ademais o RM... e o RC.... Aliás, mais tarde o CM... mostrou-lhe o livrete e o título de registo de propriedade da Mitsubishi e o depoente conclui que “não batiam certo” – isto a instância do Ministério Público -.

Pese embora as afirmações aparentemente desconexas de alguns dos recorrentes, atribuindo-se recíprocamente uma (co) participação mais ou menos relevante no que contende com a subtracção e falsificação em questão, certo é que a conjugação de todos os elementos não pode menosprezar que na actuação conjunta de todos eles em situações que acabavam por se lhes deparar, atentas as relações que então os ligavam, apenas podem conduzir à asserção acolhida na 1.ª instância. Com efeito, a padaria era o local de encontro de todos eles e a disponibilidade e conhecimento que a todos advinha do sucedido foi circunstância a que nenhum se opôs. Por isso que se tenha adequada e fundamentada a conclusão da coparticipação de todos eles no furto e falsificação impugnadas.    

Mas, acresce ponderar vista a oposição do recorrente HF..., padece a decisão recorrida neste segmento do vício de notório na apreciação da prova e de preterição ao princípio do in dúbio pro reo?

Ocorre aquele vício tipificado pela alínea c), do n.º 2 do art.º 410.º do Código de Processo Penal, quando o tribunal valoriza a prova contra as regras da experiência comum ou contra critérios legalmente fixados, aferindo-se o requisito da notoriedade pela circunstância de não passar o erro despercebido ao cidadão comum ou, talvez melhor dito, ao juiz “normal”, ao juiz dotado da cultura e experiência que são supostas existir em quem exerce a função de julgar, devido à sua forma grosseira, ostensiva ou evidente[2]. Trata-se de um vício de raciocínio na apreciação das provas que se evidencia aos olhos do homem médio pela simples leitura da decisão, e que consiste basicamente, em decidir-se contra o que se provou ou não provou ou dar-se como provado o que não pode ter acontecido.

Ora, ressalvado o devido respeito, in casu o recorrente confunde o vício do erro notório processualmente definível como um erro evidente que se surpreende na análise do texto da sentença à luz das regras da experiência com um erro de julgamento considerado como a incorrecta apreciação da prova produzida que determina que os factos sejam indevidamente julgados provados ou não provados.
Efectivamente, o recurso baseia-se apenas naquilo que, na perspectiva do recorrente consubstancia uma errada apreciação da prova produzida e, sobre esse aspecto já nos pronunciámos.

Analisando a decisão recorrida à luz das regras da experiência verifica-se pois que a mesma não padece no segmento apontado do vício que tal recorrente lhe aponta.

A jurisprudência tem-se apresentado uniforme e constante sobre o entendimento que deve atribuir-se ao princípio in dúbio pro reo. Na verdade, afirma-se,  impõe-se o seu funcionamento quando, após a produção e apreciação exaustiva de todos os meios de prova relevantes, o julgador se defronte com a existência de uma dúvida razoável sobre a verificação dos factos. Não se trata de uma dúvida hipotética ou abstrata, sugerida pela apreciação da prova que a recorrente faz. Trata-se de uma dúvida assumida pelo próprio julgador: por isso que só há violação deste princípio quando for manifesto que o julgador, perante uma dúvida relevante, decidiu contra o arguido, acolhendo a versão que o desfavorece[3].

A título meramente exemplificativo, refira-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 10 de Janeiro de 2008, no processo n.º 07P4198[4], o qual explica cabalmente do alcance que deve atribiur-se a tal princípio: “De todo o modo, não haverá, na aplicação da regra processual da «livre apreciação da prova» (art.º 127.º do CPP), que lançar mão, limitando-a, do princípio «in dubio pro reo» exigido pela constitucional presunção de inocência do acusado, se a prova produzida [ainda que «indirecta»], depois de avaliada segundo as regras da experiência e a liberdade de apreciação da prova, não conduzir «à subsistência no espírito do tribunal de uma dúvida positiva e invencível sobre a existência ou inexistência do facto». O “in dubio pro reo”, com efeito, «parte da dúvida, supõe a dúvida e destina-se a permitir uma decisão judicial que veja ameaçada a concretização por carência de uma firme certeza do julgador» (cfr. AP... Líbano Monteiro, «In Dubio Pro Reo», Coimbra, 1997).

Ademais, «são admissíveis [em processo penal] as provas que não forem proibidas por lei» (art.º 125.º do CPP), nelas incluídas as presunções judiciais (ou seja, «as ilações que o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido»: art.º 349.º do CC).

Daí que a circunstância de a presunção judicial não constituir «prova directa» não contrarie o princípio da livre apreciação da prova, que permite ao julgador apreciar a «prova» (qualquer que ela seja, desde que não proibida por lei) segundo as regras da experiência e a sua livre convicção (art.º 127.º do CPP).

Não estaria por isso vedado às instâncias, ante factos conhecidos, a extracção – por presunção judicial – de ilações capazes de «firmar um facto desconhecido».

Donde que «não seja qualquer dúvida sobre os factos que autoriza sem mais uma solução favorável ao arguido», mas apenas a chamada dúvida razoável (“a doubt for which reasons can be given”)». Pois que «nos actos humanos nunca se dá uma certeza contra a qual não militem alguns motivos de dúvida». «Pedir uma certeza absoluta para orientar a actuação seria, por conseguinte, o mesmo que exigir o impossível e, em termos práticos, paralisar as decisões morais». Enfim, «a dúvida que há-de levar o tribunal a decidir pro reo tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária, ou, por outras palavras ainda, uma dúvida que impeça a convicção do tribunal» (ibidem).”

Desta forma, a invocação do recorrente é errada e significa uma compreensão deficiente das regras de apreciação da prova. Apesar de todos os meios de prova terem, ab initio, a mesma possibilidade de convencer o Tribunal, no momento de apreciar a prova produzida essa igualdade já não existe. Nesse momento é preciso sopesar devidamente o valor da prova produzida já que, como é uso dizer, “as testemunhas não se contam, pesam-se”. E se, fundamentadamente, na sua convicção, o juiz considerar que determinado depoimento é credível e outro não é, a decisão mantém-se.

Ora, auscultada a prova produzida em audiência e sopesada com os demais meios de prova coligidos, a decisão impugnada não revela, em momento algum, que o tribunal recorrido tenha experimentado uma hesitação ou indecisão em relação aos factos em análise. Bem pelo contrário, afirma convictamente a matéria dada como provada e acertadamente, também ponderámos.

O que tudo redunda na improcedência de mais este fundamento do recurso interposto pelo dito co-arguido HF....

E, depreende-se igual alcance relativamente à arguição que em idênticos moldes fez o arguido CM..., isto contudo quanto à totalidade dos ilícitos que controverte.


Factos de XIII)

Reporta-se esta alínea ao furto tentado do veiculo marca Opel, modelo Corsa, de cor preta, matricula  ..., no dia 30 de Julho de 2002, pelas 3.30, na Rua …, e cuja prática vinha assacada aos arguidos RC... e RM....

A motivação probatória explicita neste ponto que se alicerçou nas circunstâncias seguintes: o arguido RM... confessou que juntamente com o RC...estiveram na Rua … e se fizeram transportar para aí no ciclomotor  …que se encontrava naquele local; o agente da autoridade VD… viu duas pessoas a fugir mas não as reconheceu; o ciclomotor estava perto do veículo  ...; não há explicação para o ciclomotor estar ali junto ao veículo automóvel; o automóvel estava já sem os quatro pneus e o agente da autoridade avisou a proprietária do veículo; esta ficou à espera que viessem buscar o ciclomotor; quando tal aconteceu a EF... reconheceu o RM...; o ciclomotor era do RC..; as regras da experiência dizem que os dois estavam a furtar as rodas do carro, quando se aperceberam do agente da PSP fugiram, deixaram o seu meio de transporte no local e mais tarde vieram buscá-lo e foram vistos pela EF... e sua mãe GX..., que viu o carro sem os quatro pneus.

Mais uma vez, a aduição da prova orlamente produzida corrobora o expendido pelo Tribunal a quo. Acresce que fazendo-se depois apelo às mencionadas regras da experiência comum, tudo conflui no sentido decidido, que por isso se manterá.


Factos de XIV)

Aqui controvertem os recorrentes CM... e RC... a sua comparticipação num furto ocorrido em dia não apurado, mas no período compreendido entre inícios do mês de Agosto de 2001, e Agosto de 2002, nas instalações da “Industria ….”, sita TMR....

Arrimo do Tribunal a quo, nomeadamente, o facto de vários dos objectos subtraídos e reconhecidos como sendo da Fábrica, 5 rolos de fita adesiva terem sido apreendidos no dia 23/8/02 ao RC... na sua residência (fls. 148); a fotocopiadora móvel multifunções marca Xerox furtada no mesmo local, na residência do CM…, sem que qualquer um deles tenha justificado porque os possuía, tudo isto conjugado com as regras da experiência da vida corroborando no sentido da respectiva comparticipação neste furto.

Em audiência e relativamente a este ponto, o recorrente RC...escusou-se a prestar declarações.

Por sua vez, o recorrente CM... negou alguma vez ter-se deslocado a tais instalações e de lá haver subtraído quaisquer bens. Confrontado com a detenção de bens daí provindos, esclareceu que tinha sido seu irmão RM... quem os de lá trouxera. Este, com efeito, confessou ter subtraído do local, sózinho, transportando numa moto 4, três impressoras e um monta cargas que guardou e acabaram por ser apreendidos em casa de seu pai.

Relativamente ao primeiro arguido, mais uma vez apenas o silêncio assumido redundou em seu desfavor. Na verdade, detendo bens ilegitimamente subtraídos das instalações aludidas, sem justificar a sua posse, apenas faz funcionar a regra comum da experiência segundo a qual eles se mostravam indevidamente em seu poder por deles se haver assim apoderado.

Relativamente ao arguido CM... também não colhe a defesa oposta pois que o bem apreendido não era um daqueles de que seu irmão reconheceu ter-se apropriado. Por isso que com funcionamento de igual regra, se tenha como incurso na factualidade descrita.


Factos de XV)

Controverte o recorrente OO...que sequer na nova audiência haja sido apurado o valor dos extensores em causa, donde que se mostrasse impossibilitado de exercer o eventual contraditório.

Claudica manifestamente esta alegação, pois que olvida ele o prazo que lhe foi concedido para apresentar defesa no que concerne, além de que tendo o ofendido mencionado o valor de tais bens, sempre em audiência pode exercer o correspectivo contraditório.

Igualmente impugna que houvesse existido produção de prova para que fossem tidos em consideração os actos de “receptação” consignados em XII) e XIV) dos factos provados.

Mera afirmação genérica esta. A objectividade das apreensões do diverso material não é controvertida. Depois, ateve-se o Tribunal a quo, de forma motivada (como, aliás, na demais factualidade), a explicitar num processo lógico e racional da ponderação realizada, por forma alguma ilógica, arbitrária ou notoriamente violadora das regras da experiência comum, da não jstificação da origem lícita de tais bens. Antes, beneficiando dos princípios da oralidade e da imediação, fez criteriosa aplicação do aludido princípio de livre apreciação da prova, socorrendo-se na opção acolhida, de acordo com o critério de um homem médio suposto pela ordem jurídica, por aquela possível e explicável pelas ditas regras da experiência comum.

O que tudo determina a improcedência da totalidade dos recusos interpostos relativamente à matéria de facto.

3.3. Nos termos do art.º 370.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, “O tribunal pode em qualquer altura do julgamento, logo que, em função da prova para o efeito produzida em audiência, o considerar necessário à correcta determinação da sanção que eventualmente possa vir a ser aplicada, solicitar a elaboração de relatório social ou de informação dos serviços de reinserção social, ou  a respectiva actualização quando aqueles já constarem do processo.”

A versão inicial do CPP previa a obrigatoriedade de realização deste relatório quando o agente era menor de 21 anos à data da prática do crime. O TC considerou então que relativamente aos demais arguidos, a não obrigatoriedade de realização desse relatório não violava as garantias de defesa, nem o princípio da livre apreciação da prova.[5]

A Lei n.º 59/98, de 29 de Agosto, suprimiu a obrigatoriedade nesse caso e consagrou a vigente regra do carácter facultativo do relatório social.

Tal carácter não redunda porém em discricionariedade do tribunal, pois que este se encontra vinculado ao critério da sua “necessidade”, devendo fundamentar o despacho que o ordena, defere ou indefere (art.º 97.º, n.º 5, do Código de Processo Penal), sendo tal despacho recorrível, subindo o recurso nos próprios autos e com o que vier a ser interposto da decisão que puser termo à causa (art.ºs 399.º; 406.º, n.º 1 e 407.º, n.º 3, todos do mesmo diploma adjectivo).

A omissão de relatório social constitui uma irregularidade prevista no art.º 123.º, do  Código de Processo Penal, por se tratar de uma diligência “necessária” de prova (cfr. art.º 340.º do mesmo conjunto de normas).

O recorrente RC... obtempera com a falta de realização deste género de relatório quanto à sua pessoa.

Compulsando-se os autos, em ponto algum se vislumbra que ele o tenha requerido. Por ouro lado, nada resulta do decurso da audiência que comprove a sua “necessidade”. Prestando declarações, o arguido depôs quanto a determinados factos que lhe eram imputados, e esmoreceu a colaboração com o tribunal reservando o silêncio quanto a outros. Sempre todavia por forma espontânea. A final, esclareceu ainda o tribunal àcerca de elementos respeitantes à sua situação pessoal e que foram acolhidos na decisão recorrida.

Tudo a congregar a conclusão da não verificação da irregularidade alegada.

3.4. Ponto seguinte a reclamar solução o de averiguarmos se a detenção da arma apreendida ao arguido OO...se não mostra actualmente punível, dado não se ter apurado da “classe” a que pertence.

A matéria de facto conducente ao sancionamento do recorrente neste concreto item foi a seguinte:


XIX)

No dia 16 de Outubro de 2002, o arguido OO... guardava na sua residência em …, uma caçadeira de dois canos, de 70 cm, lisos, marca Félix Sarraquesta, n.º 52 472 manifestada pelo livrete n.º 66 892 da Província de Angola datado de 8/4/1960 e registada em nome de YT…. (fls. 585).

O arguido bem sabia destes factos e não é titular de licença de uso e porte de arma.

Por outro lado, em termos de enquadramento jurídico-penal de tal conduta, discretou a decisão recorrida como segue:

“Estabelece o art.º 6 n.º 1 da Lei 22/97 de 27/6 com as alterações introduzidas pela Lei 98/01 de 25/8 que pratica o crime de detenção ilegal de arma “quem detiver, usar ou trouxer consigo arma de defesa ou de fogo de caça não manifestada ou registada ou sem a necessária licença nos termos da presente lei”.

A lei não nos dá a noção de arma de caça. A sua definição poderá retirar-se da noção de arma de fogo conjugada com a finalidade definida, qual seja a caça.

Para efeitos penais arma é qualquer instrumento, ainda que de aplicação definida, que seja ou possa ser utilizado como meio de agressão. – art.º 4 do DL 48/95 de 15/3.

Com a entrada em vigor da Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro que alterou a Lei 22/97, as armas passaram a ser classificadas de acordo com o grau de perigosidade, o fim a que se destinam e a sua utilização. – art.º 3 da cit lei.

De acordo com o art.º 86 n.º 1 al c) da Lei 5/06 “quem sem se encontrar autorizado, fora das condições legais, ou em contrário das prescrições da autoridade competente, detiver, transportar, importar, guardar, comprar, adquirir a qualquer título ou por qualquer meio ou obtiver por fabrico, transformação, importação ou exportação, usar ou trouxer consigo, arma das classes B, B1, C e D espingarda ou carabina facilmente desmontável, em componentes de reduzida dimensão com vista à sua dissimulaçãoespingarda não modificada de cano de alma lisa não inferior a 46 cm, arma de fogo dissimulada sob a forma de outro objecto ou arma de fogo transformada ou modificada, pratica o crime de detenção de arma proibida.

Os proprietários de armas manifestadas nos países que estiveram sob administração portuguesa têm o prazo de 180 dias após a entrada em vigor da presente lei para substituir o documento do manifesto. – art.º 112 da cit lei.

A presente lei entrou em vigor em 26 de Agosto de 2006. – art.º 120.

O arguido OO…, ao guardar na sua residência em …., uma caçadeira marca Félix Sarraquesta, n.º 52 472 proveniente de Angola e não regularizada de acordo com o art.º 112 da Lei 5/06 praticou um crime de detenção ilegal de arma.”

E, assim, convenhamos, sem reparo a fazer-se. Isto porquanto:

A detenção, uso e porte de uma arma permitida, quando não manifestada nem registada, conheceu diversos enquadramentos desde o DL 207-A/75, de 17-04, discutindo-se mais tarde, na vigência do CP aprovado pelo DL 400/82, de 23-09, se por falta do manifesto e do registo se deveriam considerar como proibidas as armas em tais condições e, pois, inclusas no art.º 260.º do mesmo Código.

O DL 207-A/75, de 17-04, nos art.ºs 4.º e 5.º, n.º 1, al. a), estabelecia punições diferentes para as armas proibidas e para as permitidas, mas não registadas.

Tais preceitos vieram a ser expressamente revogados pelo art.º 6.º, n.º 2, do citado DL 400/82, passando o art.º 260.º do CP a referir apenas armas proibidas.

A questão foi debatida e no Assento de 05-04-1989, DR-I Série, de 12-05-1989, foi resolvido o conflito de jurisprudência, embora não de forma totalmente consensual, com a seguinte formulação: «A detenção, uso ou porte de uma pistola de calibre 6,35 mm, não manifestada nem registada, constitui o crime previsto e punível pelo artigo 260.º do Código Penal».

Porém, a distinção feita pelo DL 207-A/75, de 17-04, entre os conceitos de armas permitidas e armas proibidas manteve-se, não sendo estes redefinidos pela legislação penal posterior, inclusive na abordagem feita na 3.ª alteração do CP, introduzida pelo DL 48/95, de 15-03, designadamente no art.º 4.º, onde se dá uma definição geral de arma.

Aquando dessa revisão defendia-se que a indocumentação das armas permitidas deveria receber uma protecção contra-ordenacional e não penal, sendo alvo de reacções criminais apenas as armas proibidas[6].

Com a entrada em vigor do CP95, mais concretamente do seu art.º 275.º, veio a caducar o Assento de 05-04-1989.

Em 06-02-1997, o STJ, no Acórdão n.º 3/97, DR I-A, de 06-03-1997, estabeleceu a seguinte jurisprudência: «A detenção, uso ou porte de uma pistola de calibre 6,35 mm não manifestada nem registada não constitui o crime previsto e punível pelo artigo 275.º, n.º 2, do Código Penal revisto pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, norma que fez caducar o assento do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Abril de 1989».

A Lei 22/97, de 27-06, veio alterar o regime de uso e porte de arma, definindo no art.º 1.º, n.º 1, o que se consideravam armas de defesa, e regulando-se no n.º 2 as condições de concessão para fins de defesa de licença de uso e porte dessa arma.

Prevendo o caso de detenção ilegal de arma de defesa, dispunha o art.º 6.º do referido diploma: «Quem detiver, usar ou trouxer consigo arma de defesa não manifestada ou registada, ou sem a necessária licença nos termos da presente lei, é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias».

Com a 3.ª alteração a tal Lei 22/97, de 27-06, operada pela Lei 98/2001, de 25-08, foi modificado o citado art.º 6.º, cujo n.º 1 passou a dispor: «Quem detiver, usar ou trouxer consigo arma de defesa ou de fogo de caça não manifestada ou registada, ou sem a necessária licença nos termos da presente lei, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias», ou seja, submeteram-se ao regime, a par das armas de defesa, as armas de fogo de caça.

Novo regime jurídico das armas e suas munições foi implementado com a publicação da Lei 5/2006, de 23-02, apresentando no art.º 2.º uma longa lista de definições respeitantes a tipos de armas, partes das armas de fogo, munições das armas de fogo e seus componentes, funcionamento das armas de fogo e outras definições.

Em sede de responsabilidade criminal, sob a epígrafe «detenção de arma proibida», o art.º 86.º, n.º 2, passou a dispor que: «2 - A detenção de arma não registada ou manifestada, quando obrigatório, constitui, para efeitos do número anterior, detenção de arma fora das condições legais».

O seu art.º 118.º revogou vários diplomas reguladores da matéria, incluindo os supra-referidos, maxime a Lei 22/97, de 27-06 [al. h]).

A Lei 5/2006, de 23-02, entrou em vigor em 22-08-2006, de acordo com o disposto no seu art.º 120.º.

E, dentre as disposições transitórias e finais do seu Capítulo XI, e do regime transitório constante da secção I, figura o art.º 112.º, estabelecendo “Os proprietários das armas manifestadas nos países que estiveram sob a administração portuguesa têm o prazo de 180 dias após a entrada em vigor da presente lei para substituir o documento de manifesto concedido pelas autoridades portuguesas de então pelo livrete de manifesto concedido pelo director nacional da PSP e livro de registo de munições.”

Ora, sendo certo que a conduta objecto de apreciação nos autos ocorreu em 16 de Outubro de 2002, ou seja quando estava ainda a decorrer o prazo concedido pelo último inciso citado, certo é que por forma alguma o recorrente demonstrou até à data da prolação da decisão recorrida, encontrarem-se desencadeados os procedimentos conducentes à regularização da arma em causa.

Donde que o acerto, reafirma-se do sentenciado em 1.ª instância.

3.5. Esgrime o recorrente OO...no sentido em, ao invés do sustentado na decisão recorrida, não se mostrarem comprovados os requisitos impostos pelo art.º 483.º e segs. do Código Civil para que fosse civilemnte responsabilizado para com o lesado JJ....

Argumenta, se bem interpretamos o alegado, não existir nexo de causalidade entre o facto ilícito praticado pelo recorrente e o dano sofrido pelo mesmo lesado, visto que o dano sofrido teve origem em factos anteriores à actuação do recorrente. Também que o facto praticado pelo receptador ( O...) não era idóneo para provocar o dano sofrido pela vítima, tudo porque quando o receptador actuou a vítima já estava desapossada da coisa, já tinha sofrido o dano, isto é, não existe nexo de causalidade imediata entre o facto da receptação e o prejuízo da vítima.

Concreta questão que urge então delimitar a de sabermos se os factos praticados pelo recorrente são idóneos para provocar a lesão referida e se existe nexo de causalidade entre a actuação do recorrente e a perda dos valores pelo lesado.

O STJ já expendeu[7] num caso similar, consignando:

“O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 13/07/1994, publicado no BMJ, 439, 260, já teve a oportunidade de decidir o seguinte:

«É verdade que actualmente o crime de receptação é um crime autónomo e não uma forma de comparticipação criminosa. Mas daí não resulta que o receptador, por não ter participado na actividade de subtracção da coisa ao seu proprietário não seja, por isso, responsável pelo pagamento da indemnização que visa restituir o prejuízo desta, antes pelo contrário. A indemnização de perdas e danos emergentes de um crime é, dispõe o artigo 128.º, do Código Penal - regulada pela Lei Civil. E o artigo 483.º do Código Civil dispõe que “aquele que, como dolo ou mera culpa violar ilicitamente o direito de outrem fica obrigado a indemnizar o lesado pelos prejuízos resultantes da violação”, dispondo o artigo 490.º que se forem vários os autores, instigadores ou auxiliares do acto ilícito, todos eles respondem pelos danos que hajam causado e o artigo 497.º que se foram várias as pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade - ver acórdão de 29 de Março de 1992, in Boletim do Ministério da Justiça 348 - 296».

E também nos Acs. do STJ de 13/09/2006, proc. 1712/06-3 e 18/06/1985, BMJ, 348, 296), se diz que «...o crime de receptação é um facto que acarreta a manutenção, consolidação ou perpetuação de uma situação patrimonial anormal, decorrente de um crime anteriormente praticado por outrem, pelo que o seu agente viola também o direito de propriedade ou detenção do dono ou detentor da coisa deslocada».”

Nada obsta à manutenção deste entendimento, sendo que estamos no domínio de um julgamento criminal por crime de receptação em que a imputação do dano, terá de ser suportada por um vínculo normativo de responsabilidade e de culpa no desencadear finalizador dos acontecimentos. Isto é, tem de ser provada a culpa do arguido conformada ao resultado. Nesta medida, não há qualquer distinção entre a culpa criminal e a culpa cível e, se não há dúvidas sobre a culpa criminal do demandado, necessariamente, teremos de ter em conta o mesmo raciocínio sobre a presença de uma culpa cível nesta causa. Dada a indissociável natureza normativa da culpa cível e da culpa criminal, uma vez posta em causa a culpa têm de ser questionados todos os factos necessários para a enformar de molde a o tribunal poder concluir com segurança pela condenação ou absolvição.

Conforme o art.º 129.º, “a indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil”, remetendo, como tal, para as regras da responsabilidade civil extracontratual previstas nos mencionados art.ºs. 483.° e seguintes. Isto, quantitativamente e nos seus pressupostos, já que, processualmente, é a mesma regulada pela lei processual penal.

Ora, assim sendo, como é, contráriamente ao sustentado pelo recorrente, confluem nos autos todos os pressupostos exigíveis ao emergir da sua responsabilidade extra-contratual, a saber: um facto voluntário do agente; a ilicitude desse facto, face à violação do direito do lesado e da tutela de interesses alheios; a culpa ou nexo de imputação do facto ao agente; o dano; e, por fim, o nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido.

Isto é, improcedente se deve considerar este fundamento do recurso[8].

3.6. Tempo de inadagarmos das questões atinentes às medidas das penas e seu regime.

A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade – art.º 40.º, n.º 1 -.

O art.º 71.º estabelece o critério da determinação da medida concreta da pena, dispondo que a determinacão da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.

Na lição de Figueiredo Dias[9], “1) Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial. 2) A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa. 3) Dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico. 4) Dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais.”

Mais ensina o mesmo Ilustre Professor[10] que “Só finalidades relativas de prevenção geral e especial, e não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem justificar a intervenção do sistema penal e conferir fundamento e sentido às suas reacções específicas. A prevenção geral assume, com isto, o primeiro lugar como finalidade da pena. Prevenção geral, porém, não como prevenção geral negativa, de intimidação do delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva ou de integração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida: em suma, como estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma infringida.”

Todavia, em caso algum pode haver pena sem culpa ou acima da culpa (ultrapassar a medida da culpa), pois que o princípio da culpa, como salienta o mesmo Insigne Professor[11], “não vai buscar o seu fundamento axiológico a uma qualquer concepção retributiva da pena, antes sim ao princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal. A culpa é condição necessária, mas não suficiente, da aplicação da pena; e é precisamente esta circunstância que permite uma correcta incidência da ideia de prevenção especial positiva ou de socialização.”

Ou, e, em síntese: “A verdadeira função da culpa no sistema punitivo reside efectivamente numa incondicional proibição de excesso; a culpa não é fundamento de pena, mas constitui o seu limite inultrapassável: o limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações ou exigências preventivas – sejam de prevenção geral positiva de integração ou antes negativa de intimidação, sejam de prevenção especial positiva de socialização ou antes negativa de segurança ou de neutralização. A função da culpa, deste modo inscrita na vertente liberal do Estado de Direito, é por outras palavras, a de estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade nos quadros próprios de um Estado de Direito democrático. E a de, por esta via, constituir uma barreira intransponível ao intervencionismo punitivo estatal e um veto incondicional aos apetites abusivos que ele possa suscitar.”[12]

É no âmbito do exposto que o Supremo Tribunal de Justiça vem interpretando sobre as finalidades e limites da pena de harmonia com a actual dogmática legal.

Assim, como resulta, v. g.,  do seu Acórdão prolatado a 15 de Novembro de 2006, no processo n.º 3135/06 - 3.ª Secção, “o modelo de prevenção acolhido pelo CP - porque de protecção de bens jurídicos - determina que a pena deva ser encontrada numa moldura de prevenção geral positiva e que seja definida e concretamente estabelecida também em função das exigências de prevenção especial ou de socialização, não podendo, porém, na feição utilitarista preventiva, ultrapassar em caso algum a medida da culpa.

Dentro desta medida de prevenção (protecção óptima e protecção mínima - limite superior e limite inferior da moldura penal), o juiz, face à ponderação do caso concreto e em função das necessidades que se lhe apresentem, fixará o quantum concretamente adequado de protecção, conjugando-o a partir daí com as exigências de prevenção especial em relação ao agente (prevenção da reincidência), sem poder ultrapassar a medida da culpa.

O n.º 2 do artigo 71.º do Código Penal, estabelece:

Na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou, contra ele, considerando nomeadamente:

a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;

b) A intensidade do dolo ou da negligência;

c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;

d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;

e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;

f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.

As circunstâncias e critérios do art.º 71.º do CP devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.

As imposições de prevenção geral devem, pois, ser determinantes na fixação da medida das penas, em função de reafirmação da validade das normas e dos valores que protegem, para fortalecer as bases da coesão comunitária e para aquietação dos sentimentos afectados na perturbação difusa dos pressupostos em que assenta a normalidade da vivência do quotidiano.

Porém tais valores determinantes têm de ser coordenados, em concordância prática, com outras exigências, quer de prevenção especial de reincidência, quer para confrontar alguma responsabilidade comunitária no reencaminhamento para o direito do agente do facto, reintroduzindo o sentimento de pertença na vivência social e no respeito pela essencialidade dos valores afectados.

Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa – n.º 2 do art.º 40.º -.”

Porque dois dos recorrentes convocam a aplicação do regime penal punitivo especial para menores com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, façamos uma breve incursão sobre as condições impostas ao efeito e respectiva ratio, acompanhando para tanto o vertido num aresto do STJ[13].

Consagrado tal regime no estatuído pelo art.º 4.º , do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23/9, «é apresentado com um sentido mais “reeducador do que sancionador” sem esquecer que a reinserção social não poderá ser conseguida a todo o transe, descurando os interesses fundamentais da comunidade e assim sem afastar a aplicação da pena de prisão “quando isso se torne necessária para uma adequada e firme defesa da sociedade e prevenção da criminalidade , e esse será o caso de a pena aplicada ser a de prisão superior a dois anos”, sublinha-se , iluminando-se o espírito do regime, no preâmbulo daquele diploma.

Em regra todas as legislações consagram um regime de favor , de compaixão relativamente a uma juventude transviada, que se manifesta de uma forma pluriofensiva, mercê de uma personalidade imatura, em desenvolvimento, que importa, por isso mesmo, não punir com excessivo rigor, dando-lhe oportunidade de mudança, de recuperação.

O regime penal de jovens delinquentes afasta uma concepção fatalista e cede, assim, a um património de feição humanitarista, favoravelmente evolucionista do jovem, universalmente aceite, sem deixar de ter presente o concretismo da situação, imprimindo ao julgador um poder–dever de indagar se se justifica benevolência de tratamento jurídico–penal, ou se, pelo contrário, é de excluir, em vista de uma desejável, e de outro modo não conseguida, meta de recuperação individual.

O regime de atenuação especial parte desde logo da valoração da idade do jovem, seu pressuposto primeiro, em remissão para uma valoração global e unitária da conduta do jovem delinquente, fazendo apelo à sua personalidade, seu enquadramento familiar, profissional e passado, como resulta do aludido art.º 4.º, sempre que houver razões sérias para crer que daquela atenuação resultem vantagens, comprovadas objectivamente, em factos percepcionados pelo julgador, e não em subjectivismos seus.

Atenuação do rigor legal sim, mas nunca passagem ao limbo do esquecimento dos factos, símbolo de amostra de enfraquecimento do sistema punitivo, potencial de mais gravosas recidivas.

Do que se trata é, em derradeira análise, em puro juízo prudencial, lograr atingir uma solução conciliatória, como ponto óptimo, entre a exigência colectiva de perseguibilidade penal e a de desenvolvimento sem marcas inultrapassáveis à vida futura do jovem delinquente.

Fruto de uma sociedade e da conformação estruturante que ela lhe dá, seu espelho claro, de ordem tal que os comportamentos do jovem se apresentam na razão directa da desagregação da sociedade dos ditos mais adultos, cessa aquela postura de favor se ponderosos e inultrapassáveis interesses comunitários o impuserem.

Como vem sendo, também, repetidamente, decidido pelo STJ, de acordo com o próprio pensamento do legislador, expresso no preâmbulo daquele diploma, a aplicação do regime não pode manter-se à margem da consideração das exigências de prevenção geral, assentando em preocupações exclusivas ou sequer predominantes, de ressocialização do agente jovem, de prevenção especial, sobrepondo-se-lhe, já que não se pode abdicar de considerações de prevenção geral, sob a forma de “ exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico” (nas palavras do Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Ed. Notícias, § 519, embora a propósito de temática diferente) de garantia mínima de protecção dos bens jurídicos de mínima observância comunitária – cfr . Acs de 8. 4. 87, 13.7.94, 12.4.97, 26.5.94, 19.10.94, 30.1.96, 15.10.97 e 17.9.97, in BMJ 366, 450, P.ºs n.ºs 46.169, 46.245, 46 . 601, 47.027, 48. 274, 48.661 e CJ, STJ, Ano V, TIII, 175, respectivamente, e, na doutrina, Leal Henriques e Simas Santos, CP, anotado, 151.

Quer isto significar que, não obstante, a emissão de um juízo de prognose favorável a propósito do arguido jovem pode este revelar-se insuficiente se esbarrar com a “última barreira” (cfr. Ac. deste STJ, de 12.2.2004, in CJ, STJ, Ano XII, TI, 203) da defesa da sociedade , aqui incontornável bastião.

O direito penal dos jovens surge como “categoria própria, envolvendo um ciclo de vida”, referente a um período de “latência social”, de descompromisso com a relação escolar, familiar e profissional, com um “potencial de delinquência”,  em moldes efémeros, como se escreveu no Ac. deste STJ, de 27.10.2004, in CJ, STJ, ano XII, TIII, 213, sob o signo de capacidade de mutação e regressão na fase de mais avançada idade.»

3.6.1. Atenta a de cometimento do último dos delitos (2002), apenas os arguidos RM... e HF...com, respectivamente, 20 e 18 anos de idade, eram passíveis de poder beneficiar deste regime.

Da matéria de facto provada resulta que o primeiro tem uma condenação em pena de prisão suspensa é certo, pela prática, em 31 de Maio de 2005, e sob a forma tentada, de um crime de homicídio. Já o segundo tem duas condenações por furto tendo mesmo cumprido pena de prisão.

Os jovens delinquentes, em abstracto, justificam um regime de brandura punitiva pois aquele que, em princípio, mais contribuirá à sua reinserção social. A questão todavia redunda em sabermos se, em concreto, o é.

Ora, pese embora a postura assumida em audiência pelos arguidos, confessando o RM... (uma parte diminuta, concede-se) e o HF...a quase totalidade dos ilícitos perpetrados, certo é que, atenta a natureza dos ilícitos antes cometidos e sua gravidade, o reiterar da prática delituosa de que estes autos nos dão nota, não permite vislumbrar razões para acreditarmos que a atenuação especial da pena contribuirá, decisivamente, à sua almejada reinserção social futura.

Isto também na consideração de que um tratamento de maior benignidade, perante comportamentos indiscutivelmente graves, como são os descritos – anota-se a prática reiterada de crimes e as suas consequências para os lesados, pese embora a recuperação de muitos dos bens subtraídos -, repugnaria ao sentimento de justiça reinante, não acautelando sobejamente interesses comunitários relevantes, de protecção do património alheio, reiteradamente posto em crise, e que impõe acarreta uma cada vez mais reclamada prevenção geral.

Um tratamento de favor penal no caso concreto não faz prever um percurso vital sem afrontamento futuro à lei e, por isso, bem ajuizou o tribunal recorrido, porque o fez prudencialmente, não optando por tal solução.

3.6.2. No que tange às penas concretamente cominadas, relembram os recorrentes as suas situações sociais e económicas simples, no intuito de minorarem as medidas correspectivas.

Ora, como bem fundamentou o Acórdão sob censura, a culpa assumiu a sua forma mais gravosa, porque traduzida em dolo directo; o grau de ilicitude dos factos mostra-se elevado, já que questionou diversos bens jurídicos; agiram os arguidos em total menosprezo pelos bens alheios, uma vez que nos bens subtraídos até não se descortina em alguns casos qual a sua utilidade imediata; já se mostram todos eles com condenações anteriores; são prementes por isso as razões de prevenção especial, e, manifestamente patentes as de prevenção geral, atentando-se no proliferar de delitos contra o património; foi reiterada a conduta delitiva.

Tudo sopesado, atentando-se nas molduras abstractamente aplicáveis, sem mera repetição do expendido, relativamente a cada um dos crimes, porque mera redundância traduziria, com o Acórdão sindicado, somos a entender da manutenção do sentenciado, no que concerne.

3.6.3. Tarefa subsequente, a da determinação da pena única.

Nos termos do artigo 77.º, n.º 1, o agente do concurso de crimes [“quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles”] é condenado numa única pena, em cuja medida “são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.”[14]

A pena única do concurso, formada no sistema de pena conjunta e que parte das várias penas parcelares aplicadas pelos vários crimes (princípio da acumulação), deve ser, pois, fixada, dentro da moldura do cúmulo estabelecido pelo artigo 78.º, tendo em conta os factos e a personalidade do agente.

Na consideração dos factos (do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso) está, pois, ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, que deve ter em conta as conexões e o tipo de conexão entre os factos em concurso.

Na consideração da personalidade (da personalidade, dir-se-ia estrutural, que se manifesta e tal como se manifesta na totalidade dos factos) deve ser ponderado o modo como a personalidade se projecta nos factos ou é por estes revelada, ou seja, aferir se os factos traduzem uma tendência desvaliosa, ou antes se reconduzem apenas a uma pluriocasionalidade que não tem raízes na personalidade do agente.

O modelo de fixação da pena no concurso de crimes rejeita, pois, uma visão atomística dos vários crimes e obriga a olhar para o conjunto - para a possível conexão dos factos entre si e para a necessária relação de todo esse pedaço de vida criminosa com a personalidade do seu agente. Por isso que, determinadas definitivamente as penas parcelares correspondentes a cada um dos singulares crimes, cabe ao tribunal, na moldura do concurso definida em função das penas parcelares, encontrar e justificar a pena conjunta cujos critérios legais de determinação são diferentes dos que determinam as penas parcelares por cada crime. Nesta segunda fase, «quem julga há-de descer da ficção, da visão compartimentada que [esteve] na base da construção da moldura e atentar na unicidade do sujeito em julgamento. A perspectiva nova, conjunta, não apaga a pluralidade de ilícitos, antes a converte numa nova conexão de sentido».

Aqui, o todo não equivale à mera soma das partes e, além disso, os mesmos tipos legais de crime são passíveis de «relações existenciais diversíssimas», a reclamar uma valoração que não se repete de caso para caso. A este conjunto – a esta «massa de ilícito que aparente uma particular unidade de relação» – corresponderá uma nova culpa (que continuará a ser culpa pelo facto) mas, agora, culpa pelos factos em relação, isto é, a avaliação conjunta dos factos e da personalidade.

Fundamental na formação da pena do concurso é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação desse espaço de vida com a personalidade.

Como referem Maurach, Gossel e Zipf a pena conjunta deve formar-se mediante uma valoração completa da personalidade do autor e das diversas penas parcelares.

Para a determinação da dimensão da pena conjunta o decisivo é que, antes do mais, se obtenha uma visão conjunta dos factos (Schonke-Schrôder-Stree), «a relação dos diversos factos entre si em especial o seu contexto; a maior ou menor autonomia a frequência da comissão dos delitos; a diversidade ou igualdade dos bens jurídicos protegidos violados e a forma de comissão bem como o peso conjunto das circunstâncias de facto sujeitas a julgamento mas também o receptividade à pena pelo agente deve ser objecto de nova discussão perante o concurso ou seja a culpa com referência ao acontecer conjunto da mesma forma que circunstâncias pessoais, como por exemplo uma eventual possível tendência criminosa».

«Também Jeschek pensa no mesmo registo referindo que a pena global se determina como acto autónomo de determinação penal com referência a princípios valorativos próprios. Deverão equacionar-se em conjunto a pessoa do autor e os delitos individuais o que requer uma especial fundamentação da pena global. Por esta forma pretende significar-se que a formação da pena global não é uma elevação esquemática ou arbitrária da pena disponível mas deve reflectir a personalidade do autor e os factos individuais num plano de conexão e frequência. Por isso na valoração da personalidade do autor deve atender-se antes de tudo a saber se os factos são expressão de uma inclinação criminosa ou só constituem delitos ocasionais sem relação entre si».[15]

Assim, o conjunto dos factos indica a gravidade do ilícito global, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que se verifique entre os factos concorrentes.

Na avaliação da personalidade – unitária – do agente importa, sobretudo, verificar se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta.

Mas tendo na devida consideração as exigências de prevenção geral, e especialmente na pena do concurso os efeitos previsíveis da pena única sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).
O primeiro critério é, pois, como se salientou, a consideração do conjunto dos factos, isto é, da medida e da gravidade do «ilícito global».

As circunstâncias do caso apresentam um acentuado grau de ilicitude global, manifestado na diversidade dos bens jurídicos violados, acrescendo o modo fútil até, diremos, como parte dos crimes foram cometidos.

Malgré tout, os factos provados não permitem formular um juízo específico sobre as personalidades dos arguidos que vá além da avaliação que se manifesta pela própria natureza dos factos praticados; não se prova, pois, personalidades de tendência, ficando apenas a expressão de pruli-ocasionalidade procurada até ao presente.

As invocadas situações pessoais, nada acrescentam ou mitigam relativamente a tal conclusão.

Nesta medida, as penas únicas a arbitrar devem reflectir a razão de proporcionalidade entre as penas parcelares e a dimensão global dos ilícitos, na ponderação e valoração comparativas com outras situações comummente objecto de apreciação judicial, nas quais a dimensão global do ilícito se apresenta mais intensa.

Tudo conjugado, consideram-se adequadas as penas únicas impostas em 1.ª instância e, como assim, improcedente também este fundamento dos diversos recursos.

Uma nota ainda para referirmos não colher a pretensão do recorrente no sentido em que a suspensão de execução da pena não se mostre condicionada ao pagamento, no prazo de 90 dias, da indemnização que ficou obrigado a solver ao lesado AS… .

Com efeito, o regime consignado no art.º 51.º, n.º 1, alínea a), com base no qual foi decretado, tem por finalidade principal acautelar a reparação do mal do crime. Ora, este desiderato não deve por forma alguma ser menosprezado, antes se reclama.


*

V – Decisão.

São termos em que pelos fundamentos expostos, se nega provimento a todos os recursos interpostos.

Custas pelos recorrentes, fixando-se as taxas de justiça individualmente devidas em 6 Ucs (arguidos RM... e CM...); 5 Ucs (arguido O...) e 4 Ucs (arguidos HF...e RC...).

Notifique.


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Brízida Martins (Relator)
Belmiro Andrade


[1] E diploma de que serão os preceitos legais doravante a citar, quando sem menção expressa da origem.

[2] Germando Marques da Silva, in Curso de Processo Penal, III, 2.ª edição, págs. 341 3 segs, e acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de Outubro de 1996, in processo n.º 045267, www.dgsi.pt.
[3] Nesse sentido, v.g., o Ac.STJ, de 15-07-2008, in processo n.º 1787/08 - 5.ª Secção, assim sumariado: “I - A invocação do princípio in dúbio pro reo só tem razão de ser se, depois do tribunal a quo reconhecer ter caído num estado de dúvida, contornasse um non licet decidindo-se, sem mais, no sentido mais desfavorável para o arguido. Mas já não assim se, depois de ultrapassadas as dúvidas que o pudessem ter assaltado, perfilhasse uma determinada convicção e decidisse coerentemente” – in Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça - Secções Criminais, disponível em www.stj.pt.
[4] Acessível in www.dgsi.pt
[5] Acórdão n.º 182/99 incidente, exactamente, sobre a primitiva redacção deste art.º 370.º, n.º 1.

[6] Cfr. Maia Gonçalves, Código Penal Português Anotado, 12.ª edição, pág. 790.

[7] In Acórdão datado de 29 de Maio de 2008, e relatado pelo Ex.mo Conslheiro Santos Carvalho, acessível em www.dgsi.pt, sob o n.º 08P1665.
[8] Na senda do expendido, nota ainda para dois outros arestos:
- Um primeiro, proferido no TRP, a 4 de Abril de 1990, sendo relator o Ex.mo Desembargador Luciano Cruz, e em cujos termos (sumariados) “(...) V – O receptador responde civilmente na medida em que assgura ou aproveita as vantagens ou o produto do crime cometido por outrém, colocando-se o problema da causalidade na receptação “... tão só dentro do círculo de interesses que ela atinge, que são ainda interesses do ofendido pelo crime principal, mas através do modo específico por que os atinge ou agride...”.
- Um outro, prolatado no TRL, em 8 de Abril de 1997, relatado pelo Ex.mo Desembargador Sousa Nogueira, e segundo o qual “I – A partir do CP de 82, o receptador é considerado autor de um crime autónomo e não mero encobridor, sendo por isso irrelevante que ele possa ter nas circunstâncias em que foi cometido o crime de que tira vantagem económica.”, ambos acessíveis in www.dgsi.pt.
[9] In Direito Penal – Questões fundamentais – A doutrina geral do crime - Universidade de Coimbra – Faculdade de Direito, 1996, pág. 121.
[10] In As Consequências Jurídicas do Crime, § 55.
[11] In ob. cit. § 56.
[12] Cfr. Figueiredo Dias, in Temas Básicos da Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, págs. 109 e ss.



[13] Relatado pelo Ex.mo Conselheiro Armindo Monteiro, a 25 de Outubro de 2006, e acessível no sítio www.dgsi.pt, sob o n.º 06P2795.
[14] Seguiremos nestas breves considerações o expendido no Acórdão do STJ, elaborado pelo Ex.mo Sr. Conselheiro H. Gaspar, a 16 de Dezembro de 2010, no âmbito do processo n.º 893/05.5 GASXL.L1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[15]  Cfr., v. g., o acórdão do STJ, in processo n.º 333/07, de 28 de Março de 2007, e AP... Líbano Monteiro, anotação ao acórdão do STJ de 12 de Julho de 2005, na Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 16.º, págs. 155 e segs.