Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
825/08.9TBMGR-K.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FALCÃO DE MAGALHÃES
Descritores: INSOLVÊNCIA
CONCURSO DE CREDORES
PRIVILÉGIO CREDITÓRIO
CRÉDITO LABORAL
PENHOR
Data do Acordão: 01/25/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: MARINHA GRANDE – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 666º, 733º E 745º DO C. CIVIL; 47º, Nº 4, AL. A), E 97º, Nº 1, AL. A), DO CIRE.
Sumário: I – De harmonia com o art.º 733º do Código Civil (CC) “privilégio creditório é a faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos credores, independentemente do registo, de serem pagos com preferência a outros”, podendo os privilégios ser mobiliários ou imobiliários, como se consigna no art.º 735ºdo CC.

II - Preceitua o artº 47º, nº 4, al. a), 2ª parte, do CIRE, que “créditos privilegiados são os que beneficiam de privilégios creditórios gerais sobre os bens integrados na massa insolvente e não se extingam por efeito da declaração de insolvência”.

III - A ordem segundo a qual são pagos é a que está estabelecida nos artºs 745º e ss do Código Civil.

IV - De acordo com o art.º 97º, nº 1, alínea a), do CIRE, com a declaração de insolvência extinguem-se os privilégios creditórios gerais que forem acessórios de créditos sobre a insolvência de que forem titulares o Estado, as autarquias locais e as instituições de segurança social constituídos mais de 12 meses antes da data do início do processo de insolvência.

V - De acordo com o art. 377º, nº 1, al. a), e nº 2, al. a), do Código do Trabalho - com correspondência no art.º 333º, nº 1, al. a), e nº 2, al. a), do CT, aprovado pela Lei nº Lei n.º 7/2009, de 12/2 -, os créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, pertencentes ao trabalhador, gozam de privilégio creditório mobiliário geral, graduado antes dos créditos referidos no nº 1 do art.º 747º do CC.

VI - O crédito do Fundo de Garantia Salarial goza de privilégio mobiliário geral quando tenha ficado sub-rogado nos direitos e privilégios creditórios dos trabalhadores.

VII - O penhor confere ao credor que dele beneficie o direito à satisfação do seu crédito e dos juros respectivos, com preferência sobre os demais credores, pelo valor de certa coisa móvel, ou pelo valor de créditos ou outros direitos não susceptíveis de hipoteca, pertencentes ao devedor ou a terceiro – artº 666º do CC.

VIII - Concorrendo sobre o produto da venda de determinados bens móveis, créditos dotados de privilégio mobiliário geral, emergentes de contrato de trabalho ou da sua violação, com créditos garantidos por penhor, devem estes últimos ser pagos preferentemente, conclusão esta que resulta da prioridade absoluta (preferência sobre os demais credores, sem qualquer reserva), que se estabelece no artº 666º do CC, conjugada com o disposto no artº 749º, nº 1, do CC, “segundo o qual o privilégio geral não vale contra terceiros, titulares de direitos que, recaindo sobre as coisas abrangidas pelo privilégio, sejam oponíveis ao exequente”.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A) - 1) - Por sentença de 30/4/2008, proferida ao abrigo do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas[1], transitada em julgado em 30/05/2008, foi declarada a insolvência da “C…, Lda.”, com sede...

2) - Foram apreendidos para a massa falida um imóvel (Parcela de terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … da freguesia da Marinha Grande e descrito na Conservatória do Registo Predial da Marinha Grande sob o nº …  – verba nº 1) e vários bens móveis, entre os quais se conta um “Forno de fabricação de vidro, com 7 toneladas produzido pela ... – Itália”, descrito sob a verba nº 26 do inventário de bens móveis.

3) - Aberto o prazo para a reclamação de créditos, efectuadas que foram as legais citações, veio reclamar a verificação dos seus créditos, entre outros, o Instituto da Segurança Social, I.P./Centro Distrital de ..., por dívidas de contribuições obrigatórias juros respectivos.

4) - O Sr. Administrador da Insolvência juntou aos autos a lista de todos os credores por si reconhecidos e a dos não reconhecidos, bem assim como as comunicações obrigatórias a que alude o artº 129º nº 4 do CIRE;

5) - A fls. 661 veio o Sr. Administrador da Insolvência rectificar a lista dos créditos reconhecidos e não reconhecidos, relativamente aos credores sob os nºs 100 e 104.

6) - Posteriormente, o Sr. Administrador da Insolvência veio apresentar lista rectificada com os créditos reconhecidos e não reconhecidos (fls. 1040 a 1068).

7) – Foram apresentadas várias reclamações para verificação ulterior de créditos.

8) - Entre os créditos reconhecidos na lista elaborada pelo Sr. Administrador (com a aludida rectificação de fls. 1040 a 1068), contam-se os créditos do Instituto da Segurança Social, I.P./Centro Distrital de ... (descritos sob o n.º 105), nos seguintes termos:

“Fundamento”: Contribuições Obrigatórias dos meses de Dezembro de 2002; Maio e Dezembro de 2003; Fevereiro a Julho e Dezembro de 2004; Janeiro de 2005 a Abril de 2008, no montante global de 1.388.737,76 € (1.168.135,00 € de capital e 220.602,76 € de juros), à taxa de juro de 1%/mês;

- “Natureza”: Garantido por penhor mercantil e privilegiado quanto aos créditos constituídos a partir de 2007, no montante de 387.681,20 €, nos termos da al. a), do nº 1, do Art.º 97º do C.I.R.E.;

- “Garantias Reais”: Penhor Mercantil sobre um Forno de fabricação de vidro, com 7 Toneladas, produzido pela ... – Itália, que consta sob a verba nºs 26 do Inventário de Bens Móveis elaborado nos termos do Artº 153º do C.I.R.E..

B) – Referindo não terem sofrido impugnação os créditos constantes dessa lista, na sentença que veio a ser proferida pela Mma. Juiz do Tribunal Judicial da Marinha Grande a fls. 1069 e ss. (em 15/07/2010) - posteriormente rectificada por despacho de 12/08/2010, quanto ao crédito nela descrito a fls. 1093, sob o nº 157 – foi homologada a lista de credores reconhecidos nos termos dos artºs 129º e 146º do CIRE, elaborada e rectificada pelo administrador da insolvência de fls. 1040 a 1068, tendo-se descriminado os créditos reconhecidos do modo que a seguir se transcreve:

C) – Subsequentemente, decidiu-se, no que à graduação de todos esses créditos reconhecidos concerne, o que ora se reproduz:

«(…) graduo os créditos reconhecidos e já verificados, os quais serão pagos nos moldes determinados na lei após a dedução das dívidas da massa e custas do processo, (artº 172º, nº 1 e 2 do CIRE), e relativamente a todos os bens apreendidos (um imóvel e bens móveis) da seguinte forma:

I.

A) Bem imóvel: Parcela de terreno para construção.: Confronta a Norte com…; Sul e Poente com acessos a A8; Nascente com caminho público. Inscrito na matriz predial urbana sob o artigo… da freguesia da Marinha Grande e descrito na Conservatória do Registo Predial da Marinha Grande sob o nº … da freguesia da Marinha Grande:

1º Créditos Privilegiados (privilégio imobiliário especial) dos trabalhadores constantes dos nºs 1 a 64, 66 a 88 e 217 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss e do Fundo de Garantia Salarial constante do nº 102 (privilegiado nos termos do disposto no artº 333º do CT) da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss e aqui se incluindo as verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos E, G, I e J.

2º Crédito Garantido constante do nº 91, da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss – Banco …, S.A. Sociedade Aberta, por hipoteca voluntária sobre o imóvel (até ao limite da respectiva hipoteca).

3º Crédito Privilegiado constantes do nº 105 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss - Instituto de Segurança Social, I.P. – centro Distrital de ... -relativamente aos créditos constituídos a partir de Abril de 2007.

4º Créditos Comuns constantes dos nºs 89, 90, 93, 95 a 99, 101, 103, 104, 106 a 116, da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss. e aqui se incluindo as verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos F e H.

5º Créditos Subordinados constantes dos nºs 65, 117 e 118, da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

II.

B) Bens móveis sobre os quais não recai nenhuma garantia real:

1º Créditos Privilegiados (privilégio mobiliário geral) dos trabalhadores constantes dos nºs 1 a 64, 66 a 88 e 217 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss e do Fundo de Garantia Salarial constante do nº 102 (privilegiado nos termos do disposto no artº 333º do CT) da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss. e aqui se incluindo as verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos E, G, I e J.

2º Créditos Privilegiados constante dos nºs 100 (privilégio mobiliário geral – artº 97º nº 1 al. a) do CIRE a contrario sensu) da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

3º Créditos Garantidos constantes dos nºs, 92, 94 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

4º Créditos Comuns constantes dos nºs 89, 90, 93 ,95 a 99, 101, 103, 104, 106 a 116, da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss. e aqui se incluindo as verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos F e H.

5º Créditos Subordinados constantes dos nºs 65, 117 e 118, da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

III.

C) Bem móvel: Forno de fabricação de vidro, com 7 toneladas produzido pela ... – Itália que consta sob a verba nº 26 do inventário de bens móveis.

1º Crédito Garantido por penhor mercantil constante do nº 105 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss, - Instituto de Segurança Social, I.P. – Centro Distrital de ... - relativamente ao seguinte bem móvel: Forno de fabricação de vidro, com 7 toneladas produzido pela ... – Itália que consta sob a verba nº 26 do inventário de bens móveis.

2º Créditos Privilegiados (privilégio mobiliário geral) dos trabalhadores constantes dos nºs 1 a 64, 66 a 88 e 217 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss e do Fundo de Garantia Salarial constante do nº 102 (privilegiado nos termos do disposto no artº 333º do CT) da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss. e aqui se incluindo as verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos E, G, I e J.

3º Créditos Privilegiados constante dos nºs 100 (privilégio mobiliário geral – artº 97º nº 1 al. a) do CIRE a contrario sensu) da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

4º Créditos Garantidos constantes dos nºs, 92, 94 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

5º Créditos Comuns constantes dos nºs 89, 90, 93 ,95 a 99, 101, 103, 104, 106 a 116, da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss. e aqui se incluindo as verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos F e H.

6º Créditos Subordinados constantes dos nºs 65, 117 e 118, da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.».

D) - O Instituto da Segurança Social, I.P/Centro Distrital de ..., interpôs recurso dessa sentença, que veio a ser recebido como apelação, com subida imediata, em separado e com efeito meramente devolutivo.

II - O Apelante, nas alegações de recurso que ofereceu, apresentou as seguintes conclusões:

Terminou requerendo que a sentença fosse revogada e substituída por outra que graduasse no lugar que lhe competisse, o crédito privilegiado por privilégio creditório mobiliário geral da Segurança Social, constituído nos doze meses anteriores à declaração da insolvência, quanto aos bens identificados nas alínea b) e c) daquela decisão.


III - Em face do disposto nos art.ºs 684º, n.º 3 e 685-Aº, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil (CPC)[2], o objecto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões de que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 660, n.º 2., “ex vi” do art.º 713, nº 2, do mesmo diploma legal.

Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, com as “questões” a resolver se não confundem os argumentos que as partes esgrimam nas respectivas alegações e que, podendo, para benefício da decisão a tomar, ser abordados pelo Tribunal, não constituem verdadeiras questões que a este cumpra solucionar (Cfr., entre outros, Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B35862[3]).

Assim, as questões a solucionar consistem em saber se a sentença enferma de alguma das nulidades que se lhe apontam e, em caso afirmativo, qual o lugar que o crédito reconhecido ao ora Apelante deverá ocupar na graduação dos créditos reconhecidos.

IV - O circunstancialismo processual e a factualidade assente a considerar na decisão a proferir, são os enunciados em I supra.

V - O inconformismo do Instituto da Segurança Social, I.P./Centro Distrital de ..., centra-se, essencialmente, na circunstância de a graduação efectuada na sentença recorrida não ter contemplado, nomeadamente quanto aos bens referidos sob as alíneas B) e C), o crédito de 387.681,20 €, que sustenta gozar do privilégio conferido pelo artº 10º do DL n.º 103/80, de 9/5.

Vejamos.

De harmonia com o art.º 733º do Código Civil (CC) “privilégio creditório é a faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos credores, independentemente do registo, de serem pagos com preferência a outros”, podendo os privilégios ser mobiliários ou imobiliários, como se consigna no art.º 735ºdo CC.

Por seu turno, preceitua o artº 47º, nº 4, al. a), 2ª parte, do CIRE, que “créditos privilegiados” são os que beneficiam de privilégios creditórios gerais sobre os bens integrados na massa insolvente e não se extingam por efeito da declaração de insolvência.

A ordem segundo a qual são pagos é a que está estabelecida nos artºs 745º e ss do Código Civil.

De acordo com o art.º 97º, nº 1, alínea a) do CIRE, com a declaração de insolvência extinguem-se os privilégios creditórios gerais que forem acessórios de créditos sobre a insolvência de que forem titulares o Estado, as autarquias locais e as instituições de segurança social constituídos mais de 12 meses antes da data do início do processo de insolvência.

Face ao disposto no artigo 736º do CC, o Estado e as autarquias locais têm privilégio mobiliário geral para garantia dos créditos por impostos indirectos, e também pelos impostos directos inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora, ou acto equivalente, e nos dois anos anteriores.

Os créditos da Segurança Social e respectivos juros de mora, gozam, de harmonia com o disposto no n.º 1 do art.º 10º do DL n.º 103/80, de 9/5, de privilégio mobiliário geral, graduando-se logo após os créditos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 747.º do Código Civil.

O Tribunal Constitucional já se pronunciou pela não inconstitucionalidade do nº 1 do artigo 10º do Decreto-Lei nº 103/80, concluindo que o privilégio mobiliário geral de que gozam os créditos da Segurança Social por contribuições e os respectivos juros de mora possui justificação do ponto de vista jurídico-constitucional[4].

Conforme se consignou na sentença, de acordo com o art. 377º, nº 1, al. a) e nº 2, al. a) do Código do Trabalho - com correspondência no art.º 333º nº 1, al. a) e nº 2, al. a), do CT, aprovado pela Lei nº Lei n.º 7/2009, de 12/2 -, os créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, pertencentes ao trabalhador, gozam de privilégio creditório mobiliário geral, graduado antes dos créditos referidos no nº 1 do art.º 747º do CC.

O crédito do Fundo de Garantia Salarial goza de privilégio mobiliário geral em resultado de ter ficado sub-rogado nos direitos e privilégios creditórios dos trabalhadores

O penhor confere ao credor que dele beneficie o direito à satisfação do seu crédito e dos juros respectivos, com preferência sobre os demais credores, pelo valor de certa coisa móvel, ou pelo valor de créditos ou outros direitos não susceptíveis de hipoteca, pertencentes ao devedor ou a terceiro – artº 666º do CC.

Conforme foi entendido por esta Relação no Acórdão de 10/11/2005, (Apelação nº 2239/05)[5], relatado pelo ora 2º Adjunto, concorrendo sobre o produto da venda de determinados bens móveis, créditos dotados de privilégio mobiliário geral, emergentes de contrato de trabalho ou da sua violação, com créditos garantidos por penhor, devem estes últimos ser pagos preferentemente, conclusão esta que resulta da prioridade absoluta (preferência sobre os demais credores, sem qualquer reserva), que se estabelece no artº 666º do CC, conjugada com o disposto no artº 749º, nº 1, do CC, “segundo o qual o privilégio geral não vale contra terceiros, titulares de direitos que, recaindo sobre as coisas abrangidas pelo privilégio, sejam oponíveis ao exequente”.

Na sentença recorrida, conforme resulta do acima dito, reconheceu-se que o Instituto da Segurança Social, I.P/Centro Distrital de ..., possuía “…crédito garantido e privilegiado, derivado da não entrega de Contribuições Obrigatórias dos meses de Dezembro de 2002; Maio e Dezembro de 2003; Fevereiro a Julho e Dezembro de 2004; Janeiro de 2005 a Abril de 2008, pelo montante de 1.388.737,76 €, à taxa de juro de 1% ao mês, sem quaisquer garantias pessoais, garantido por Penhor Mercantil sobre um Forno de fabricação de vidro, Lda., com 7 Toneladas, produzido pela ...- Itália e privilegiado (privilégio creditório mobiliário e imobiliário), quanto aos créditos constituídos a partir de Abril de 2007, nos termos do disposto na alínea a) do Art.º 97º do C.I.R.E., no montante de 387.681,20€”.

Contudo, na parte dispositiva da sentença não se procedeu à graduação desse crédito de 387.681,20€, nomeadamente no que concerne aos bens móveis referidos sob as alíneas B) e C), não se vislumbrando outra razão para tal omissão senão a de esta ter resultado de lapso.

Efectivamente, tendo sido reconhecido pelo Sr. Administrador na lista de fls. 1040 e ss (concretamente, na pág. 22 dessa lista - fls. 1061) não se descortina que motivo levou a não proceder à graduação do crédito de 387.681,20 €, do Instituto da Segurança Social, I.P., em função do privilégio consignado no art.º 10º do DL n.º 103/80, sendo certo que respeita a contribuições e juros abrangidos por esta norma e que a esse procedimento não obsta a restrição contemplada no art.º 97º, nº 1, do CIRE.

Como é sabido a sanção prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC, para a omissão de pronúncia, tem a ver com a inobservância do que se preceitua no n.º 2 do art. 660º, na parte que impõe ao juiz o dever de “...resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras...”. 

Ora, sustenta o Apelante - nisso vendo a apontada nulidade -, que a sentença recorrida não abordou a questão da graduação do crédito privilegiado de 387.681,20€, não obstante o ter considerado como reconhecido.

Do acima exposto já se pode constatar que se reconhece razão ao Apelante quanto à verificação da omissão que aponta, sendo a sentença nula, na parte que, não obstante ter reconhecido o crédito em causa, omitiu a respectiva graduação, questão esta que lhe cumpria decidir.

A consequência desta constatação é a de que este Tribunal terá de suprir a nulidade em causa, procedendo à graduação omitida (art.º 715º, nº 1, do CPC), o que se fará.

Cumpre salientar que, não tendo sido posto em causa, no presente recurso, o reconhecimento que na sentença impugnada mereceram os créditos que assim se consideraram, nem, tão-pouco, as preferências de pagamento que se afirmaram quanto a eles, a validade de tal sentença, no que concerne a essas matérias, permanecerá intacta, pois que a verificada nulidade não afecta a apreciação que delas se fez.

Deste modo, a graduação efectuada na decisão impugnada apenas deverá ser alterada na medida em que a inclusão do crédito do ora apelante assim o determine.

Assim, importará considerar, também, na graduação que se fez quanto ao produto dos móveis referidos sob as alíneas B) e C) esses créditos do Instituto da Segurança Social, I.P., constituídos a partir de 2007, no montante global de € 387.681,20.

Na verdade, reconhecido o privilégio mobiliário do apelante sobre o crédito em causa, nos termos do art.° 10° do Decreto-Lei n.° 103/80, de 9 de Maio, dúvidas não restam de que se impõe a graduação de tal crédito, no que respeita ao produto da venda dos móveis referidos sob a alínea B), logo abaixo dos créditos dos trabalhadores, do Fundo de Garantia Salarial e da Fazenda Nacional (bem como dos relativos às verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos E, G, I e J), ora graduados em 1º e 2º lugares, bem assim como a graduação desse mesmo crédito, no que concerne ao produto da venda do móvel referido sob a alínea C), logo abaixo do crédito garantido pelo penhor mercantil, dos créditos dos trabalhadores, do Fundo de Garantia Salarial, da Fazenda Nacional (bem como dos relativos às verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos E, G, I e J), ora graduados em 1º, 2º e 3º, lugares.

Em conformidade como o exposto, procede a Apelação do Instituto da Segurança Social, I.P., alterando-se, nessa parte, a graduação que foi elaborada na sentença impugnada, pela seguinte:

II.

B) Bens móveis sobre os quais não recai nenhuma garantia real:

1º Créditos Privilegiados (privilégio mobiliário geral) dos trabalhadores constantes dos nºs 1 a 64, 66 a 88 e 217 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss e do Fundo de Garantia Salarial constante do nº 102 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss. e aqui se incluindo as verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos E, G, I e J.

2º Créditos Privilegiados constante dos nºs 100 (privilégio mobiliário geral – artº 97º nº 1 al. a) do CIRE a contrario sensu) da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

3º Crédito Privilegiado do Instituto da Segurança Social, I.P, no montante de € 387.681,20 e juros respectivos, constante do nº 105 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

4º Créditos Garantidos constantes dos nºs, 92, 94 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

5º Créditos Comuns constantes dos nºs 89, 90, 93 ,95 a 99, 101, 103, 104, 106 a 116, da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss. e aqui se incluindo as verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos F e H.

6º Créditos Subordinados constantes dos nºs 65, 117 e 118, da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

III.

C) Bem móvel: Forno de fabricação de vidro, com 7 toneladas produzido pela ... – Itália que consta sob a verba nº 26 do inventário de bens móveis.

1º Crédito Garantido por penhor mercantil constante do nº 105 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss, - Instituto de Segurança Social, I.P. – Centro Distrital de ... - relativamente ao seguinte bem móvel: Forno de fabricação de vidro, com 7 toneladas produzido pela ... – Itália que consta sob a verba nº 26 do inventário de bens móveis.

2º Créditos Privilegiados (privilégio mobiliário geral) dos trabalhadores constantes dos nºs 1 a 64, 66 a 88 e 217 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss e do Fundo de Garantia Salarial constante do nº 102 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss. e aqui se incluindo as verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos E, G, I e J.

3º Créditos Privilegiados constante dos nºs 100 (privilégio mobiliário geral – artº 97º nº 1 al. a) do CIRE a contrario sensu) da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

4º Crédito Privilegiado do Instituto da Segurança Social, I.P, no montante de € 387.681,20 e juros respectivos, constante do nº 105 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

5º Créditos Garantidos constantes dos nºs, 92, 94 da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

6º Créditos Comuns constantes dos nºs 89, 90, 93 ,95 a 99, 101, 103, 104, 106 a 116, da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss. e aqui se incluindo as verificações ulteriores de créditos constantes dos apensos F e H.

7º Créditos Subordinados constantes dos nºs 65, 117 e 118, da lista dos credores reconhecidos de fls. 1040 e ss.

VI - Em face de tudo o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em, julgando procedente a Apelação do Instituto da Segurança Social, I.P./Centro Distrital de ..., suprir a nulidade que se reconhece na sentença impugnada no que concerne à graduação de créditos que dela consta quanto ao produto dos bens móveis descritos sob as alíneas B) e C), passando a valer, quanto a estes, a graduação que acima se discriminou, em tudo o mais se mantendo a sentença impugnada.

Custas pela massa insolvente.


 Falcão de Magalhães (Relator)
 Regina Rosa
Artur Dias


[1] Código este aprovado pelo Decreto-Lei nº 53/2004, de 18/3, doravante designado por CIRE.
[2] Código este a considerar na redacção que lhe foi dada pelo DL n.º 303/07, de 24/08.
[3] Consultáveis na Internet, através do endereço http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/, tal como todos os Acórdãos do STJ ou os respectivos sumários que adiante se citarem sem referência de publicação.
[4] Acórdão nº 688/98, disponível, tal como os restantes Acórdãos do TC que vierem a ser citados sem referência de publicação, em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos.
[5] Consultável em “http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf?OpenDatabase”.