Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
168/09.0TBGVA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MOREIRA DO CARMO
Descritores: OBRIGAÇÕES PECUNIÁRIAS
REVELIA
INDEFERIMENTO LIMINAR
MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA
Data do Acordão: 02/23/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GOUVEIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART. 2º DO ANEXO AO DL Nº 269/98 DE 1/9
Sumário: I - Na acção declarativa com processo especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, nos termos do DL 269/98, de 1.9, o Juiz não pode conferir força executiva à petição inicial, se concluir que a pretensão é manifestamente improcedente em parte.

II - Impõe-se esse juízo conclusivo, quando sobre determinada questão colocada na petição inicial, foi, recentemente, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, Acórdão Uniformizador, em sentido contrário á pretensão da recorrente e que não se coaduna com a integral procedência dessa pretensão.

Decisão Texto Integral: I – Relatório

1.(…) S.A., sociedade anónima, com sede em ...., intentou a presente acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, nos termos do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1.09, contra B (…) e mulher C (…), residentes (…), em ...., pedindo a sua citação para contestarem sob pena de, não o fazendo, se conferir força executiva à petição.

Como fundamento da referida pretensão, alegou, em resumo, que, no exercício da sua actividade comercial, com destino à aquisição de um veículo automóvel, da marca ...., modelo .... G 3/5 P Diesel, com a matrícula 00-00-RB, por contrato constante de título particular datado de 23 de Novembro de 2004, concedeu ao réu crédito directo, sob a forma de um contrato de mútuo, emprestando-lhe a importância de €14.825,00, a ser paga em 72 prestações, mensais e sucessivas, de €309,71, cada, com vencimento a primeira em 10 de Janeiro de 2005 e, as seguintes, nos dias 10 dos meses subsequentes.

Acrescentou que o réu marido não pagou a 41.ª prestação, vencida em 10.5.2008, e seguintes, num total de 32 prestações, que totalizam a importância de €9.894,72, a que acrescem juros, à taxa de 17,25%, incluindo a cláusula penal de 4%, somando os vencidos, desde 10.5.2008 até 24.7.2009, a importância de €2.057,56.

Os réus citados não contestaram a acção.

*

Foi proferida sentença nos seguintes termos:

“Pelo exposto, julgo parcialmente provada e procedente a presente acção e, em consequência:

a) Condeno os réus a pagarem ao autor a quantia de €309,21 (trezentos e nove euros e vinte e um cêntimos), correspondente à quadragésima primeira prestação, acrescida de juros de mora calculados à taxa anual de 17,25% (dezassete vírgula vinte e cinco por cento), desde o dia dez de Maio de dois mil e oito até integral pagamento e do imposto de selo incidente sobre os juros, à taxa de quatro por cento.

b) Condeno os réus a pagar ao autor a quantia que vier a ser liquidada referente ao capital correspondente a cada uma das demais prestações (42.ª - quadragésima segunda - a 72.ª - septuagésima segunda), excluídos os juros remuneratórios e demais acréscimos contratualmente previstos, acrescida de juros de mora calculados à mesma taxa (dezassete vírgula vinte e cinco por cento) vencidos desde essa data (dez de Maio de dois mil e oito) e até integral pagamento, acrescida do respectivo imposto de selo incidente sobre tais juros, à taxa de quatro por cento.

c) Absolvo os réus do demais peticionado.”

*

2.A Autora interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões:

1.Atenta a natureza do processo em causa – processo especial – e o facto de os RR regularmente citados não terem contestado, deveria o Senhor Juiz a quo ter de imediato conferido força executiva à petição inicial, não havendo assim necessidade, sequer, de se pronunciar sobre quaisquer outras questões.

2.Aliás, neste sentido se pronunciou o Tribunal da Relação de Lisboa, no seu recente Acórdão da 2ª Secção, Processo 153/08.0TJLSB-L1 onde se refere que:

“Não tendo o Apelado (…) contestado, apesar de citado pessoalmente, o tribunal recorrido, deveria limitar-se a conferir força executiva à petição, nos termos do art. 2º, do Regime dos Procedimentos a que se refere o artigo 1º do diploma preambular do Decreto-Lei nº 269/98, de 01-09, e não a analisar, quanto a um dos réus, da viabilidade do pedido, uma vez que este não era manifestamente improcedente (isto é, ostensiva, indiscutível, irrefutável).

Concluindo, nos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações emergentes de contrato de valor não superior a € 15.000,00, se o réu citado pessoalmente, não contestar, o juiz apenas poderá deixar de conferir força executiva à petição, para além da verificação evidente de excepções dilatórias, quando a falta de fundamento do pedido for manifesta, por não ser possível nenhuma outra construção jurídica.

3.Termos em que deve conceder-se provimento ao presente recurso, e, por via dele, revogar-se a sentença recorrida, substituindo-se a mesma por acórdão que condene os RR., ora recorridos, na totalidade do pedido, como é de inteira,

J U S T I Ç A.

3.Não houve contra-alegações.

*

II – Factos Provados

1. O autor, no exercício da sua actividade comercial e por contrato constante de escrito particular datado de 23 de Novembro de 2004, concedeu ao réu marido um “empréstimo” do montante de €14.750,00, acrescido da importância de €75,00, referente a comissão de gestão, destinado à aquisição do veículo automóvel da marca ...., modelo .... G 3/5 P Diesel, com a matrícula 00-00-RB, nos termos constantes do escrito particular junto a fls. 13, denominado “contrato de mútuo”, que aqui se dá por integralmente reproduzido (fls. 13 e cl.ª 1.ª e 2.º).

2. No escrito particular referido no artigo anterior, autor e réu acordaram que o empréstimo vence juros à taxa de 13,25% ao ano, não variando ao longo do prazo do contrato, e que o empréstimo será reembolsado em 72 (setenta e duas) prestações mensais, iguais e sucessivas, no montante de €309,21 (trezentos e nove euros e vinte e um cêntimos) cada, vencendo-se a primeira em 10 de Janeiro de 2005 e as seguintes nos dias 10 dos meses subsequentes, através de transferência bancária, incluindo-se no valor das prestações os juros do empréstimo, o valor dos impostos devidos, bem como os prémios de seguro (fls. 13 e cl.ª 4.º e 5.ª).

3. Foi ainda clausulado que o mutuário ficará constituído em mora no caso de não efectuar, aquando do respectivo vencimento, o pagamento de qualquer prestação, e que a falta de pagamento de uma prestação, na data do respectivo vencimento, implica o vencimento imediato das restantes (cl.ª 8.ª, a) e b)).

4. Foi também clausulado que, em caso de mora, sem prejuízo do disposto no artigo anterior, incidirá sobre o montante em débito, e durante o tempo da mora, a título de cláusula penal, uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual acrescida de quatro pontos percentuais (cl.ª 8.º, c)).

5. O réu marido não pagou a 41.ª prestação vencida em 10 de Maio de 2008, bem como as prestações seguintes.

6. O veículo adquirido com o montante referido em 1) destinou-se ao património comum do casal dos réus.

III – Do Direito

1.Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas (arts.º 684º, nº 3 e 685º-A, do CPC).

Nesta conformidade a única questão a decidir é a seguinte.

-Consequências da não contestação.

2.Dispõe o artigo 2º, do Anexo ao DL 269/98, de 1.9, que se o réu, citado pessoalmente, não contestar, o juiz, com valor de decisão condenatória, limitar-se-á a conferir força executiva à petição, a não ser que ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias ou que o pedido seja manifestamente improcedente.

Não se trata de uma situação de cominatório pleno, mas de cominatório semi-pleno, embora com a feição especial que o texto legal lhe dá.

Na sentença sob recurso escreveu-se como segue:

“Entre o autor e o réu marido foi celebrado um contrato de mútuo, pelo qual o autor (mutuante) se obrigou a entregar ao réu (mutuária) a quantia de €14.825,00, devendo este restituir essa importância, acrescida dos respectivos juros e encargos acordados. (…)

Está provado que o réu não pagou a 41.ª prestação e seguintes (art. 5.º dos factos provados). (…)

Na situação dos autos ficou provado, conforme expressamente acordado, que a falta de pagamento de qualquer das prestações na data do respectivo vencimento implicava o vencimento imediato das restantes (art.º 3.º dos factos provados) (…)

Deste modo encontram-se vencidas desde 10 de Maio de 2008 a 41ª prestação e as seguintes, no total de trinta e duas prestações.

Acontece que, as 32 prestações no montante total de €9.894,72 (32.309,21), que correspondem ao fraccionamento da obrigação do capital mutuado, compreendiam, nos termos acordados entre autor e réu, além do capital, juros do empréstimo, o valor dos impostos devidos, bem como os prémios de seguro (art.º 2.º dos factos provados).

Igualmente resultou apurado que, de acordo com o contrato celebrado, «em caso de mora, incidirá sobre o montante em débito, a título de cláusula penal, uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual acrescida de quatro pontos percentuais» (art.º 4.º dos factos provados). (…)

A questão que se coloca é a de saber se é aplicável aos autos a jurisprudência fixada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/2009 (Diário da República, 1.ª série — N.º 86 — 5 de Maio de 2009) que uniformizou a jurisprudência nos seguintes termos: «No contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao artigo 781.º do Código Civil não implica a obrigação de pagamento dos juros remuneratórios nelas incorporados.»

O autor defende que não é aplicável ao caso dos autos aquela jurisprudência por ter sido acordado entre autor e réu que: “A falta de pagamento de uma prestação na data do respectivo vencimento implica o imediato vencimento de todas as restantes” e que “no valor das prestações estão incluídos o capital, os juros do empréstimo, o valor dos impostos devidos, bem como os prémios das apólices de seguro a que se refere a Cláusula 13.ª das Condições Gerais” e como tal foi estipulado um regime diverso, o que é permitido no âmbito da sua liberdade contratual como é referido no mesmo Acórdão (cfr. art.º 7.º, da petição inicial). (…)

Na verdade, também no caso em que foi proferido àquele acórdão (numa acção interposta pelo autor) foi estipulado que a falta de pagamento de qualquer das prestações na data do seu vencimento implicava o imediato vencimento de todas as demais” (art.º 6.º dos factos apurados, pág. 2534) e, nos termos do n.º 4, alínea c), das «Condições gerais» do contrato, também se mencionava que no valor das prestações estão incluídos o capital, os juros do empréstimo, o valor dos impostos devidos, bem como os prémios das apólices de seguro (cfr. pág. 2535).

Uma das questões que foi resolvida foi a de como interpretar aquela cláusula, no sentido de saber se o vencimento imediato das prestações por pagar inclui ou não os juros remuneratórios convencionados, previamente calculados pelo mutuante e nelas incorporadas ou apenas a dívida do capital.

Como se diz a este respeito naquele Acórdão “a cláusula estabelecida no contrato de que a omissão do pagamento de uma das prestações levava ao vencimento das restantes segue o preceituado naquele artigo 781.º. Só que representando os juros, rectius, os juros remuneratórios, a contraprestação pela cedência do capital durante um período de tempo, assumindo mesmo carácter além de retributivo, sinalagmático (…), será então de concluir que a obrigação de juros só deve perdurar enquanto não houver vencimento antecipado das prestações vincendas e exigibilidade da dívida correspondente. (…)

Ou seja, vencida a obrigação de capital, deixa de haver lugar a remuneração pela indisponibilidade do mesmo capital. E, por isso, o vencimento automático estipulado no contrato aqui documentado não se aplica a prestações de juros e, logo, às que correspondem nas prestações do capital mutuado a esses mesmos juros, por estes, previamente calculados em proporção ao tempo que efectivamente tenha decorrido, deixariam de corresponder — sem o decurso do tempo à retribuição que por natureza, constituem (…)

Por conseguinte, sem necessidade de demais delongas, no caso em apreço o autor apenas tem direito a exigir dos réus os juros remuneratórios incluídos na prestação que se venceu até àquela que ficou por pagar (41.ª), ou seja, até 10 de Maio de 2008, não já os que estavam incluídos nas prestações seguintes até à 72.ª, pois com a antecipação da data do vencimento das restantes prestações deixou de haver motivo, legal ou contratual, para o autor exigir juros remuneratórios em relação às mesmas.

Daí que, o pedido é parcial e manifestamente improcedente.” – fim de transcrição.

A Autora com o presente recurso, indirectamente, volta à carga com a mesma questão, que colocou em inúmeros processos, e que se coloca assim “ Num contrato de mútuo oneroso comercial e no âmbito do crédito ao consumo, vencidas todas as prestações em razão da falta de alguma delas, por accionamento da respectiva cláusula pelo mutuante, são ou não devidos, além do capital em divida, os juros remuneratórios que estavam incluídos nas mesmas prestações, respeitantes a prazo que ainda não tenha decorrido no momento do vencimento antecipado?”

A esta questão posta pela A., designadamente no processo que deu origem ao Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 7/2009, publicado no D.R., 1ª série, de 5.5.2009, pág. 2530/2538, o STJ expressamente articulou os seguintes pontos ou premissas nucleares que suportaram o entendimento sobre a questão objecto daquele recurso de revista ampliada (vide fls.2538):

1) A obrigação de capital constitui nos contratos de mútuo oneroso, comercial ou bancário, liquidável em prestações, uma obrigação de prestação fraccionada ou repartida, efectuando-se o seu cumprimento por partes, em momentos temporais diferentes, mas sem deixar de ter por objecto uma só prestação inicialmente estipulada, a realizar em fracções;

2) Diversamente, os juros remuneratórios enquanto rendimento de uma obrigação de capital, proporcional ao valor desse mesmo capital e ao tempo pelo qual o mutuante dele está privado, cumpre a sua função na medida em que exista e enquanto exista a obrigação de capital;

3) A obrigação de juros remuneratórios só se vai vencendo à medida em que o tempo a faz nascer pela disponibilidade do capital;

4) Se o mutuante, face ao não pagamento de uma prestação, encurta o período de tempo pelo qual disponibilizou o capital e pretende recuperá-lo, de imediato e na totalidade o que subsistir, só receberá o capital emprestado e a remuneração desse empréstimo através dos juros, até ao momento em que o recuperar, por via do accionamento do mecanismo previsto no art.º 781.º do C. Civil;
5) Não pode assim, ver-se o mutuante investido no direito a receber juros remuneratórios do mutuário faltoso, porque tais juros se não venceram e, consequentemente, não existem;

6) O mutuante, caso opte pela percepção dos juros remuneratórios convencionados, terá de aguardar pelo decurso do tempo previsto para a duração do contrato e como tal, abster-se de fazer uso da faculdade prevista no art.º 781º do Código Civil, por directa referência à lei ou a cláusula de teor idêntico inserida no contrato;

7) Prevalecendo-se do vencimento imediato, o ressarcimento do mutuante ficará confinado aos juros moratórios, conforme as taxas acordadas e com respeito ao seu limite legal e à cláusula penal que haja sido convencionada;
8) O art.º 781º do Código Civil e logo a cláusula que para ele remeta ou o reproduza tem apenas que ver com a capital emprestado, não com os juros remuneratórios, ainda que incorporados estes nas sucessivas prestações;
9) A razão de ser do mencionado preceito legal prende-se com a perda de confiança que se produz no mutuante/credor quanto ao cumprimento futuro da restituição do capital, face ao incumprimento da obrigação de pagamento das respectivas prestações;

10) As partes no âmbito da sua liberdade contratual podem convencionar, contudo, regime diferente do que resulta da mera aplicação do princípio definido no art.º 781º do C. Civil.

Tendo depois rematado do seguinte modo “No contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao artigo 781º do Código Civil não implica a obrigação de pagamento dos juros remuneratórios nela incorporados.”

Apesar do decidido pelo STJ, a Autora vem, agora, introduzir uma nuance. Como não houve contestação dos réus, tem direito a tais juros remuneratórios.

Entendemos, contudo que não lhe assiste razão.

Nos autos, os RR foram citados pessoalmente e não contestaram. Não se julgaram verificadas excepções dilatórias. Assim sendo, a não «atribuição de força executiva» à petição apenas se poderia alicerçar em ser o pedido manifestamente improcedente.

A manifesta improcedência reconduzir-se-á a casos em que a tese propugnada pelo autor não tenha possibilidade de ser acolhida face à lei em vigor e à interpretação que dela façam a doutrina e a jurisprudência (Vide Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Vol. III, 2ª Ed., pág. 162).

Salvador da Costa, em A Injunção e as Conexas Acção e Execução, 6ª Ed., pág. 105, refere que a pretensão formulada pelo autor é manifestamente improcedente ou manifestamente inviável porque a lei a não comporta ou porque os factos apurados, face ao direito a não justificam, acrescentando que a ideia de manifesta improcedência corresponde à de ostensiva inviabilidade o que raro se verifica, pelo que o juiz tem de ser muito prudente na formulação do juízo de insucesso.

A decisão da 1ª instância, como vimos, apoiou-se no referido AUJ nº 7/2009, para concluir não assistir à Autora o direito aos juros remuneratórios incluídos nas prestações posteriores a 10.5.2008.

Sendo verdade que a jurisprudência uniformizada não é obrigatória, ela estabelece, contudo, um precedente judicial persuasivo (Castro Mendes, Recursos, Ed. de 1980 da AAFDL, pág. 114), contribuindo tal decisão para «a unidade da ordem jurídica, face à autoridade que normalmente anda ligada às decisões dos supremos tribunais, designadamente quando eles se reúnem em pleno ou em plenário de secções para solucionar divergências jurisprudenciais» (Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª Ed., pág. 304).

Não sendo o acórdão proferido na revista ampliada vinculativo para os tribunais judiciais, estes podem afastar-se, na apreciação de uma questão concreta, da jurisprudência uniformizada, mas, nessa hipótese, é sempre admissível recurso da decisão proferida contra a orientação jurisprudencial (art.º 678º, nº 2, c), do CPC), pelo que, assim, o Supremo é necessariamente chamado a reponderar a jurisprudência uniformizada, sempre que a Relação tenha proferido uma decisão com orientação divergente.

Ora, sendo este o modelo em que se desenha a uniformização de jurisprudência, teremos que concluir que, pese embora a anterior divergência jurisprudencial sobre a questão, tendo sido proferido AUJ, muito recentemente, no sentido supra apontado, ele é tendencialmente vinculativo para a interpretação a levar a cabo pelos tribunais sobre tal questão.

Não vendo razões para nos desviarmos do rumo traçado por tal AUJ, o peticionado pela A., nos precisos termos pretendidos, no que concerne aos juros remuneratórios que integravam as prestações posteriores a 10.5.2008, manifestamente não poderia proceder.

Foi, por isso, acertada a decisão recorrida, ao julgar nos precisos termos em que o fez (vide em sentido semelhante os Acds. da Relação de Lisboa, de 21.1.10, Proc.1353/09.0TJLSB, e de 16.7.09, Proc.1256/08.6TBAGH, in www.dgsi.pt).

3.Sumaria-se o Acórdão nos seguintes termos:

i)Na acção declarativa com processo especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, nos termos do DL 269/98, de 1.9, o Juiz não pode conferir força executiva à petição inicial, se concluir que a pretensão é manifestamente improcedente em parte;

ii)Impõe-se esse juízo conclusivo, quando sobre determinada questão colocada na petição inicial, foi, recentemente, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, Acórdão Uniformizador, em sentido contrário á pretensão da recorrente e que não se coaduna com a integral procedência dessa pretensão.


IV – Decisão

Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

*

Custas pela A./recorrente