Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
179/23.3T9TCS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ANA CAROLINA CARDOSO
Descritores: CASSAÇÃO DO TÍTULO DE CONDUÇÃO
OMISSÃO DO NÚMERO DE PONTOS NOS FACTOS
INCONSTITUCIONALIDADE
Data do Acordão: 04/10/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GUARDA (JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE TRANCOSO)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 148º, N.ºS 2 E 4, AL. C), DO CÓDIGO DA ESTRADA; 30º, N.º 4, E 32º, N.º 2, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA
Sumário: I. O número de pontos da carta de condução, por resultar diretamente da lei, constitui questão de direito que não necessita de ter reflexo na enunciação dos factos provados.
II. A carta de condução é uma licença administrativa que pode ser revogada caso o seu titular pratique um conjunto de atos reveladores de inidoneidade ou inaptidão para conduzir veículos automóveis ou um desrespeito grave pela proteção de terceiros, não ofendendo a sua cassação qualquer princípio constitucional.

Sumário elaborado pela Relatora
Decisão Texto Integral: *

Acórdão deliberado em conferência na 5ª seção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra


I.

Relatório


AA interpôs recurso da sentença proferida no processo de recurso de contraordenação n.º ..., do Juízo de Competência Genérica ..., Comarca da Guarda, que manteve a decisão proferida pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária que determinou a cassação do seu título de condução n.º ...92.

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1.1. Sentença recorrida

(transcrição da parte relevante para a apreciação do recurso):


“(…) Factos provados
1. Por sentença datada de 11.12.2017, proferida pelo Juízo de Competência Genérica ..., no âmbito do Proc. n.º 114/17...., já transitada em julgado, foi o Recorrente condenado, pela prática do crime de desobediência, entre o mais, na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de três meses e quinze dias.
2. Como consequência da condenação na referida pena acessória, foram subtraídos ao Recorrente 6 (seis) pontos.
3. Por sentença datada de 01.06.2021, proferida pelo Juízo de Competência Genérica ..., no âmbito do Proc. n.º 13/21...., já transitada em julgado, foi o Recorrente condenado, pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, entre o mais, na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de cinco meses.
4. Como consequência da condenação na referida pena acessória, foram subtraídos ao Recorrente 6 (seis) pontos.
5. Por sentença datada de 21.06.2022, proferida pelo Juízo de Competência Genérica ..., no âmbito do Proc. n.º 58/22..., já transitada em julgado, foi o Recorrente condenado, pela prática do crime de desobediência, entre o mais, na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de cinco meses.
6. Como consequência da condenação na referida pena acessória, foram subtraídos ao Recorrente 6 (seis) pontos.
7. O Recorrente exerce a profissão de taxista, auferindo um montante mensal compreendido entre os € 300,00 e os € 400,00.
8. Reside sozinho.
9. Suporta despesas mensais no valor de € 150,00.

(…)

Com a Impugnação Judicial apresentada, pretende o Impugnante reverter a decisão adotada pela A.N.S.R. de cassação do seu título de condução, por considerar que a mesma padece de determinados vícios que impõem a sua revogação.

Pese embora sejam algumas as questões suscitadas pelo Recorrente, em bom rigor, todas elas se reconduzem à questão de saber qual a natureza da cassação da carta de condução prevista no artigo 148.º do CE.

Como tal, importa fazer um breve enquadramento legal deste regime.

Nos termos do artigo 121.º do CE, a condução de veículo a motor na via pública só é permitida a quem for titular de carta de condução, a qual é emitida por entidade pública e mediante prova do preenchimento dos requisitos legais.

A obtenção e manutenção da faculdade de condução de veículos a motor na via pública está sujeita a um regime que se encontra previsto no Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir e no Código da Estrada, o qual inclui o mencionado sistema de pontos.

Deste modo, com a entrada em vigor da Lei n.º 116/2015, de 28 de agosto, o legislador estabeleceu um sistema de “carta por pontos”, atribuindo, ab initio, a cada condutor, 12 (doze) pontos, fixando igualmente um conjunto de circunstâncias que determinam a atribuição ou a perda de pontos e estabelecendo as respetivas consequências, nos termos conjugados dos artigos 121.º-A e 148.º, ambos do CE.

Do recorte do quadro legal introduzido pela Lei supra identificada resulta que o propósito do sistema de pontos foi precisamente o de incutir nos condutores uma melhor perceção das consequências associadas às infrações cometidas no contexto rodoviário, reforçando o sistema com uma reação, de natureza administrativa, que ultrapasse a pena acessória/sanção de proibição de conduzir, que se revelaram insuficientes para sensibilizar o infrator no sentido de adequar o exercício da condução às normas vigentes.

São, assim, razões de natureza preventiva, de controlo e sinalização da perigosidade dos condutores e de índole pedagógica que estão na origem da criação deste regime, comum em vários países da Europa.

De forma sucinta, mas bastante assertiva, com a qual se concorda e sem necessidade de maiores considerações, conclui o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 260/2020 [disponível em www.tribunalconstitucional.pt], que “[o] regime tem, assim, um sentido essencialmente pedagógico e de prevenção, visando sinalizar, de uma forma facilmente percetível pelo público em geral e através de um registo centralizado, as infrações cometidas pelos condutores bem como os respetivos efeitos penais ou contraordenacionais. Deste modo, permite-se também à administração verificar se o titular da licença ou carta de condução reúne as condições legais para continuar a beneficiar da mesma. Com efeito, a atribuição de título de condução pela República Portuguesa não tem um caráter absoluto e temporalmente indeterminado. Existe, assim, como que uma avaliação permanente, através da adição ou subtração de pontos, da aptidão do condutor para conduzir veículos a motor na via pública. Ou seja, em rigor, num tal sistema, o título de condução nunca é definitivamente adquirido, antes está permanentemente sujeito a uma condição negativa referente ao comportamento rodoviário do seu titular. O direito de conduzir um veículo automobilizado não é incondicionado” (realce e sublinhado nossos).

Ora, para o que aqui interessa, dita o n.º 2 do artigo 148.º do CE que “a condenação em pena acessória de proibição de conduzir e o arquivamento do inquérito, nos termos do n.° 3 do artigo 282.°do Código de Processo Penal, quando tenha existido cumprimento da injunção a que alude o n.°3 do artigo 281.° do Código de Processo Penal, determinam a subtração de seis pontos ao condutor”.

Do cotejo da matéria provada resulta que, em virtude da condenação em diversas penas acessórias resultantes da prática de crimes, o Recorrente perdeu a totalidade dos pontos que lhe estavam atribuídos.

A perda da totalidade de pontos dá origem a processo autónomo onde é ordenada a cassação da carta de condução – cf. artigo 148.º, n.º 4, al. c) e n.º 10 do CE – pelo que a autoridade administrativa mais não fez do que aplicar o regime legal previsto, não lhe podendo ser assacada qualquer irregularidade neste campo.

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Debruçando-nos especificamente sobre os vícios invocados pelo Recorrente, surge desde logo a alegada violação do disposto no artigo 30.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa.

Dispõe o aludido preceito legal que “[n]enhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos”.

Significa esta proibição que a aplicação de uma pena não pode ser acrescida de forma automática, isto é, ope legis, sem intervenção de uma decisão, de uma outra pena que implique perder direitos civis, profissionais ou políticos.

Entende, então, o Recorrente que a cassação da carta de condução, decorrente da prática de crimes pelos quais foi condenado, se traduz na imposição automática da perda de direitos, nomeadamente da perda automática do direito de conduzir veículos, o que afeta o seu direito ao trabalho (porquanto exerce a profissão de taxista).

Mas, de facto, assim não é.

Conforme vem sido entendido pela jurisprudência dos nossos Tribunais superiores, “[o] que decorre da prática do crime é a aplicação da pena acessória de proibição de conduzir, a qual, sendo um efeito da prática do crime de condução em estado de embriaguez, não é automático no sentido legalmente proibido - porquanto não é um efeito estigmatizante, dessocializador e criminógeno da pena, que é o que verdadeiramente justifica o nº 4 do artigo 30º da CRP -, para além de ser sujeita na sua aplicação aos princípios da proporcionalidade e da culpa. Acresce que a aplicação da pena acessória é mais um efeito da prática do crime do que da aplicação de uma pena (veja-se a circunstância de poder não haver aplicação de uma pena - no caso de suspensão provisória do processo - e continuar a haver a imposição da pena acessória)[1].

Daqui resulta que o efeito automático que resulta da aplicação da pena acessória de proibição de conduzir é a subtração de pontos da carta de condução, a qual não configura, em si mesma, uma perda de direitos civis, profissionais ou políticos.

O que sucede posteriormente, quando a perda de pontos é total, é precisamente a cassação do título de condução, que emerge do sucessivo comportamento estradal que foi sendo adotado pelo condutor e que conduziu, progressivamente, à retirada de pontos, até à sua total inexistência.

Face ao exposto, conclui-se que inexiste qualquer violação do comando constitucional ínsito no artigo 30.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, indeferindo-se a alegação do Recorrente a este respeito.

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Na Impugnação apresentada, o Impugnante alega igualmente a inobservância do princípio da proporcionalidade, também com assento constitucional, no artigo 18.º, n.º 2 da C.R.P.

Em concreto, invoca o Impugnante o seguinte: (i) por um lado, não foi ponderada a necessidade prática de aplicação, no caso concreto, da cassação da carta de condução, não havendo valoração da prevenção especial e (ii) por outro lado, a sanção aplicada afigura-se demasiado gravosa, não tendo sido tomados em consideração na decisão proferida fatores relativos à pessoa do Impugnante e às suas necessidades, nomeadamente profissionais.

Cumpre apreciar e decidir.

Conforme já supra enunciado, o sistema da carta por pontos foi instituído com vista a avaliar a idoneidade de uma determinada pessoa para a prática da condução e, desse modo, controlar a perigosidade associada à atividade desenvolvida.

Bem se compreende o sistema instituído pelo legislador: ao longo do tempo, afigura-se necessário avaliar a manutenção da idoneidade do condutor, por forma a preservar a segurança rodoviária (e, reflexamente, a vida, a integridade física e, também, o património), motivo pelo qual foi estabelecido tal mecanismo de atribuição de pontos (e da respetiva subtração em caso de prática de infrações).

Não basta, assim, condicionar o exercício da condução à obtenção de uma licença especificamente dirigida ao efeito, após ser ministrado um curso tendente à aquisição dos necessários conhecimentos teóricos e práticos, mas também garantir que, continuadamente, o condutor mantém capacidade para a prática de tal atividade.

Só assim é possível ao Estado garantir a preservação dos bens jurídicos envolvidos no exercício da condução e, dessa forma, tentar diminuir os elevados índices de sinistralidade rodoviária existentes.

Tendo em conta as finalidades para que foi concebido, o sistema em causa afigura-se adequado e proporcional, no sentido de que são valorados pela entidade decisora os fatores considerados relevantes para efeitos de subtração de pontos, como sejam a natureza da infração cometida, o número de infrações, o número de pontos subtraídos pela prática de cada infração, bem como o período de tempo em que as mesmas foram cometidas.

Daqui resulta que o sistema não é arbitrário e tem um racional subjacente, que respeita os critérios de proporcionalidade: uma vez preenchidas as condições prescritas na lei, são subtraídos determinados pontos ao condutor, até ao limite da subtração da totalidade dos pontos atribuídos, conduzindo forçosamente à cassação da licença de condução.

Ademais, o Tribunal Constitucional já se pronunciou igualmente quanto à conformidade constitucional da fixação do período de dois anos para a interdição de obtenção de novo título de condução, subsequente à decisão de cassação[2].

Assim sendo, resulta claro que a cassação da carta de condução não assume natureza sancionatória, antes constituindo um mero efeito automático do preenchimento dos fatores supra elencados.

Não tendo a natureza de pena acessória ou de injunção imposta no âmbito da suspensão provisória de um processo-crime, não haveria que equacionar, no âmbito do processo de cassação do título de condução, a culpa do agente e, bem assim, as necessidades de prevenção geral e especial, que já foram tidas em consideração aquando da aplicação das aludidas sanções criminais.

Conclui-se, assim, que bem andou a autoridade administrativa ao determinar a cassação do título de condução do Impugnante, praticando um ato de natureza vinculada, não havendo qualquer margem de discricionariedade para adotar decisão distinta, com base nas condições sociais, pessoais ou económicas do condutor.

Assim sendo, não relevaram – precisamente porque não podiam relevar – as concretas condições pessoais do Recorrente, como sejam as motivações que o conduziram à prática dos crimes pelos quais foi condenado ou a sua situação profissional e a necessidade sentida, neste contexto, de exercer a condução.

Por todo o exposto, improcede a invocada inconstitucionalidade por violação do princípio da proporcionalidade.

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Por fim, sustenta o Recorrente que, assumindo a natureza de uma pena, a decisão de cassação da carta de condução poderia ser suspensa na sua execução, substituída pela prestação de trabalho a favor da comunidade ou, ainda, especialmente atenuada.

Uma vez mais, entende o Tribunal não assistir qualquer razão ao Recorrente.

Conforme já sobejamente referido, a cassação da carta de condução consubstancia a consequência legalmente prevista da perda total de pontos, de natureza administrativa, não se tratando de uma pena acessória ou medida de segurança.

Em termos práticos, traduz-se na circunstância de uma pessoa anteriormente habilitada deixar de ser titular de título de condução.

Não há aqui, pois, a aplicação de qualquer inibição de conduzir.

Findo o período de dois anos fixado para a interdição de obtenção de novo título de condução, o agente não pode simplesmente retomar o exercício da atividade de condução, estando obrigado a submeter-se a novas provas (teóricas e práticas) para a obtenção do título (como se nunca o tivesse tido).

Conforme é igualmente consabido, a cassação da carta de condução é uma consequência automática da perda da totalidade de pontos, sendo a decisão que a determina proferida pela entidade administrativa, o Presidente da ANSR, num ato vinculado, sem qualquer margem de discricionariedade administrativa na ponderação das circunstâncias do caso concreto.

Assim sendo, tratando-se de uma medida de natureza administrativa – e não, repita-se, de uma pena – não lhe é, naturalmente, aplicável o regime dos artigos 40.º e seguintes do Código Penal, e em concreto, desde a invocada suspensão da execução da pena, substituição por trabalho a favor da comunidade ou, ainda, a sua atenuação especial.

No mais, mesmo no âmbito do Código da Estrada, o legislador não previu norma idêntica ao artigo 141.º do CE, que permita a suspensão da cassação da carta de condução.

Pelo contrário, no caso dos autos, mostra-se provado que o Recorrente perdeu a totalidade dos pontos da sua carta de condução, donde decorre, necessariamente, a determinação da cassação do respetivo título, inexistindo margem de ponderação das circunstâncias concretas, por falta de fundamento legal, ou fundamento legal para aplicar à cassação da carta de condução o regime das penas substitutivas em direito penal.

Sufragando idêntico entendimento, veja-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18.01.2023[3], que refere perentoriamente o seguinte:

“I – A cassação de título de condução ocorre como efeito automático e necessário da perda total de pontos.

II – Não constitui uma nova condenação pela prática dos mesmos factos - crimes de condução em estado de embriaguez -, pelo que não se mostra violado o princípio ne bis in idem.

III – Não sendo uma pena, mas uma mera decisão administrativa, não é possível a sua suspensão, atenuação ou substituição, que carecem de suporte legal”.

Face ao que antecede, improcede também, por falta de fundamento legal, a argumentação do Recorrente a este respeito. (…)»

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1.2. Recurso do arguido

(conclusões que se transcrevem integralmente):

1) Ao não apurar a pontuação existente na licença de condução do Arguido, antes e depois de cada decisão judicial de condenação, o que era fundamental para a decisão de mérito, o Tribunal a quo incorreu no vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos termos do disposto do artigo 410.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal.
2) É inconstitucional a norma constante do artigo 148.º, n.º 4, alínea c), do Código da Estrada, na interpretação segundo a qual a subtração na licença de condução de seis pontos em três ocasiões distintas no período de cinco anos tem como efeito necessário e automático a cassação do título de condução, por violação do disposto nos artigos 18.º, n.º 2, 30.º, n.º 4, e 32.º, n.º 2, todos da Constituição da República Portuguesa.

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1.3. Resposta do Ministério Público: pugna pela total improcedência do recurso.

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1.4. No parecer a que alude o art. 416º, n.º 1, do Código de Processo Penal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta nesta Relação conclui pelo não provimento do recurso do arguido, invocando arestos desta Relação, da Relação de Guimarães e do Tribunal Constitucional no sentido defendido.

 


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II.

Questões a decidir no recurso


O objeto do recurso encontra-se limitado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, sem prejuízo da necessidade de conhecer oficiosamente a eventual ocorrência de qualquer um dos vícios referidos no artigo 410º do Código de Processo Penal (jurisprudência fixada pelo Acórdão do STJ n.º 7/95, publicado no DR, I Série-A, de 28.12.1995).
São as conclusões da motivação que delimitam o âmbito do recurso, pelo que se ficam aquém, a parte da motivação que não consta das conclusões não é considerada, e se forem além também não são consideradas, porque a motivação das mesmas é inexistente ([4]).

Atendendo às conclusões recursivas apresentadas, cumpre conhecer das seguintes questões:
- Vício de insuficiência da matéria de facto; e
- Violação de vários princípios com assento constitucional,


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III.

Conhecimento do recurso



1.

A Lei n.º 116/2015, de 28 de agosto, que alterou o Código da Estrada, instituiu o denominado sistema de carta de condução por pontos, dispondo o art. 121º-Aº do referido Código, sob a epígrafe “Atribuição de pontos”:

“1 - A cada condutor são atribuídos doze pontos.

2 - Aos pontos atribuídos nos termos do número anterior podem ser acrescidos três pontos, até ao limite máximo de quinze pontos, nas situações previstas no n.º 5 do artigo 148.º

3 - Aos pontos atribuídos nos termos dos números anteriores pode ser acrescido um ponto, até ao limite máximo de dezasseis pontos, nas situações previstas no n.º 7 do artigo 148.º”

Por sua vez, o art. 148º dispõe o seguinte:
1 - A prática de contraordenação grave ou muito grave, prevista e punida nos termos do Código da Estrada e legislação complementar, determina a subtração de pontos ao condutor na data do caráter definitivo da decisão condenatória ou do trânsito em julgado da sentença, nos seguintes termos:

a) A prática de contraordenação grave implica a subtração de três pontos, se esta se referir a condução sob influência do álcool, excesso de velocidade dentro das zonas de coexistência ou ultrapassagem efetuada imediatamente antes e nas passagens assinaladas para a travessia de peões ou velocípedes, e de dois pontos nas demais contraordenações graves;

b) A prática de contraordenação muito grave implica a subtração de cinco pontos, se esta se referir a condução sob influência do álcool, condução sob influência de substâncias psicotrópicas ou excesso de velocidade dentro das zonas de coexistência, e de quatro pontos nas demais contraordenações muito graves.

2 - A condenação em pena acessória de proibição de conduzir e o arquivamento do inquérito, nos termos do n.º 3 do artigo 282.º do Código de Processo Penal, quando tenha existido cumprimento da injunção a que alude o n.º 3 do artigo 281.º do Código de Processo Penal, determinam a subtração de seis pontos ao condutor.

3 - Quando tiver lugar a condenação a que se refere o n.º 1, em cúmulo, por contraordenações graves e muito graves praticadas no mesmo dia, a subtração a efetuar não pode ultrapassar os seis pontos, exceto quando esteja em causa condenação por contraordenações relativas a condução sob influência do álcool ou sob influência de substâncias psicotrópicas, cuja subtração de pontos se verifica em qualquer circunstância.

4 - A subtração de pontos ao condutor tem os seguintes efeitos:

a) Obrigação de o infrator frequentar uma ação de formação de segurança rodoviária, de acordo com as regras fixadas em regulamento, quando o condutor tenha cinco ou menos pontos, sem prejuízo do disposto nas alíneas seguintes;

b) Obrigação de o infrator realizar a prova teórica do exame de condução, de acordo com as regras fixadas em regulamento, quando o condutor tenha três ou menos pontos;

c) A cassação do título de condução do infrator, sempre que se encontrem subtraídos todos os pontos ao condutor.

5 - No final de cada período de três anos, sem que exista registo de contraordenações graves ou muito graves ou crimes de natureza rodoviária no registo de infrações, são atribuídos três pontos ao condutor, não podendo ser ultrapassado o limite máximo de quinze pontos, nos termos do n.º 2 do artigo 121.º-A.

6 - Para efeitos do número anterior, o período temporal de referência sem registo de contraordenações graves ou muito graves no registo de infrações é de dois anos para as contraordenações cometidas por condutores de veículos de socorro ou de serviço urgente, de transportes coletivo de crianças e jovens até aos 16 anos, de táxis, de automóveis pesados de passageiros ou de mercadorias ou de transporte de mercadorias perigosas, no exercício das suas funções profissionais.

7 - A cada período correspondente à revalidação da carta de condução, sem que exista registo de crimes de natureza rodoviária, é atribuído um ponto ao condutor, não podendo ser ultrapassado o limite máximo de dezasseis pontos, sempre que o condutor de forma voluntária proceda à frequência de ação de formação, de acordo com as regras fixadas em regulamento.

8 - A falta não justificada à ação de formação de segurança rodoviária ou à prova teórica do exame de condução, bem como a sua reprovação, de acordo com as regras fixadas em regulamento, tem como efeito necessário a cassação do título de condução do condutor.

9 - Os encargos decorrentes da frequência de ações de formação e da submissão às provas teóricas do exame de condução são suportados pelo infrator.

10 - A cassação do título de condução a que se refere a alínea c) do n.º 4 é ordenada em processo autónomo, iniciado após a ocorrência da perda total de pontos atribuídos ao título de condução.

11 – A que, tenha sido cassado o título de condução não é concedido novo título de condução de veículos a motor a qualquer categoria antes de decorridos dois anos sobre a efetivação da cassação.

12 – A efetivação da cassação do título de condução ocorre com a notificação da cassação (…)”

                        2.

Em primeiro lugar, invoca o recorrente padecer a sentença do vício de insuficiência da matéria de facto para a decisão, por não constar dos factos provados quantos pontos existiam na licença de condução do arguido antes da subtração operada.

Estabelece o art. 410º, n.º 2, al. c), do Código de Processo Penal: “Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, a insuficiência para a decisão da matéria de facto” - ou seja, que a matéria de facto se apresente como insuficiente para a decisão proferida, por se verificar lacuna no apuramento dos factos (e não da prova) necessários à decisão de direito.

O número de pontos da carta de condução é atribuído de forma automática pela lei, o que sucedeu no caso do recorrente, tendo sido considerado que tinha o máximo de pontos legalmente previsto – a saber, 12 pontos.

Ora, a subtração de pontos da carta de condução opera de forma automática, por mera aplicação da lei, sem necessidade de notificação ao condutor ([5]), constituindo um efeito imediato do trânsito em julgado da decisão administrativa que condene o condutor pela prática de contraordenação grave ou muito grave ou da sentença que aplique ao condutor a pena acessória de proibição de conduzir, prevista no art. 69º do Código Penal.

Na verdade, o art. 149º, n.º 1, do Código da Estrada estabelece que: “Do registo de infrações relativas ao exercício da condução, organizado nos termos de diploma próprio, devem constar: a) Os crimes praticados no exercício da condução de veículos a motor a respetivas penas e medidas de segurança; c) A pontuação atualizada do título de condução”; acrescentando o n.º 3 que “A Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária assegura o acesso dos condutores ao registo de infrações” (sublinhado nosso) – encontrando-se o registo individual do condutor regulado pelo Dec.- Lei n.º 317/94, de 24.12, na versão revista pelo Dec.-Lei n.º 86/2016, de 28.11.

Resultando a subtração de 6 pontos automaticamente da lei, concretamente do art. 148º, n.º 2, do Código da Estrada, a operar a partir do transito em julgado da sentença crime que aplicou a pena acessória prevista no art. 69º do Código Penal, não necessitava tal realidade de constar do acervo de factos provados na sentença, como sucede com os factos provados sob os pontos 2 e 4 da sentença sob recurso (transcritos da decisão administrativa).

A operação de cálculo dos pontos da carta de condução, por resultar diretamente da lei, através de critérios gerais e objetivos (quer no que toca à subtração, quer à adição de pontos), constituindo questão de direito que não necessita de ter reflexo na enunciação dos factos provados.

Assim, provadas que se encontrem as infrações no exercício da condução praticadas pelo condutor, a subtração de pontos opera de forma automática; como o decurso do prazo de 3 anos sem que o condutor cometa qualquer contraordenação ou crime estradal resulta na atribuição de 3 pontos, que nunca poderá exceder os 15 pontos.

Tanto basta para concluir pela não verificação do vício invocado, pois são os factos declarados como provados manifestamente suficientes para que sobre eles o julgador faça incidir a lei e extraia a consequência jurídica em causa.

            3.

Alega depois o recorrente que o art. 148º, n.º 4, al. c), do Código da Estrada, ao ser interpretada no sentido que a subtração da totalidade dos pontos da carta de condução tem como efeito necessário e automático a cassação do título de condução, viola os preceitos constitucionais plasmados nos arts. 30º, n.º 4, 18º, n.º 2 e 32º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, por prever uma responsabilidade objetiva e prescindir de uma avaliação da culpa do agente.

Não mais vem desenvolvida a fundamentação da, ou das invocadas inconstitucionalidades

Vejamos:

           

            4.

Em 28.5.2015 deu entrada na Assembleia da República a Proposta de Lei do Governo nº 336/XII/4, que viria a ser aprovada por unanimidade. Na sua apresentação ao Plenário da Assembleia da República, a Exma. Ministra da Administração Interna, Anabela Miranda Rodrigues, justificou a alteração legislativa efetuada da seguinte forma ([6]):

Propõe-se a atribuição inicial de 12 pontos aos condutores, sendo que os condutores perdem dois ou quatro pontos pela prática, respetivamente, de contraordenações graves ou muito graves.

A condução sob o efeito de álcool, acima dos limites legais, ou de substância psicotrópica tem um regime diferenciado pela particular e muito negativa contribuição para a sinistralidade rodoviária. Lembro, Sr.as e Srs. Deputados, que, em 2013, cerca de 1/3 dos condutores vítimas mortais em acidentes rodoviários apresentou uma taxa de álcool no sangue superior ao legalmente admitido.  As contraordenações rodoviárias desta natureza, graves ou muito graves, implicam a perda de três ou cinco pontos, respetivamente.

A possibilidade de extinguir contraordenações rodoviárias permite, e permitirá no futuro, orientar o sistema da carta por pontos para penalizar, em especial, aqueles comportamentos que mais contribuem para a sinistralidade rodoviária, permitindo também, desta forma, a maior consciencialização dos condutores para os perigos na estrada.

É importante também salientar que, em termos da proposta, os crimes rodoviários passam a ter relevância para o regime da cassação da carta e implicam a perda de seis pontos. Ainda no que se refere à perda de pontos, prevê-se um limite de seis pontos para as contraordenações praticadas em cúmulo, exceto quando esteja em causa a condução sob o efeito do álcool ou substância psicotrópica.

A subtração de pontos ao condutor tem consequências, mas, ao contrário do regime vigente, não se trata apenas da cassação da carta. Existe uma aposta clara na reabilitação do condutor através da frequência de ações de formação rodoviária e na realização do novo exame teórico de condução.

Por último, gostaria ainda de sinalizar que os condutores têm a possibilidade de recuperar os pontos perdidos: por cada período de três anos sem que exista registo de contraordenações graves, muito graves ou crimes de natureza rodoviária são atribuídos três pontos ao condutor e é importante notar que os condutores poderão recuperar pontos até ao limite de 15, mais três do que os iniciais. O regime proposto não só penaliza o mau comportamento na estrada, como beneficia e, portanto, incentiva o bom comportamento…”

Ou seja, recorreu o legislador à distinta gravidade das condutas e sua repetição como fundamento para a diferenciação quer dos pontos a retirar, quer dos pontos a recuperar, quer à sua recuperação, através da frequência pelo condutor de ações de formação rodoviária ou da realização de novo exame teórico de condução.

Por outro lado, a perda de 6 pontos estipulada para quem pratica crimes rodoviários sob o efeito do álcool ou de substâncias psicotrópicas constituiu uma opção legislativa clara, tendo em conta a gravidade das consequências da prática de tais ilícitos, o que foi logo anunciado na exposição de motivos da citada Proposta de Lei nº 336/XII/4:

A carta por pontos constitui uma das ações chave da Estratégia Nacional de Segurança Rodoviária, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 54/2009, de 14 de maio. Pretende-se, com a sua implementação, aumentar o grau de perceção e de responsabilização dos condutores, face aos seus comportamentos, adotando-se um sistema sancionatório mais transparente e de fácil compreensão. A análise comparada com outros países europeus demonstra que é expetável que a introdução do regime da carta por pontos venha a ter um impacto positivo significativo no comportamento dos condutores, contribuindo, assim, para a redução da sinistralidade rodoviária e melhoria da saúde pública.”

Resulta assim manifesta a aplicação do princípio da proporcionalidade às restrições dos direitos individuais, quer na retirada de pontos da carta de condução, consoante a gravidade e efetuada uma graduação dos riscos para outros bens constitucionalmente protegidos, quer do direito de exercer a condução automóvel, que é subtraído ao cidadão através da cassação da carta de condução.

A compressão do direito de um cidadão ser titular de carta de condução, prevista no art. 148º, n.º 4, al. c), do Código da Estrada, tem na sua base o confronto deste direito com o direito dos outros cidadãos em circularem na vida pública com segurança, assumindo aqui particular relevo as medidas legislativas adotadas para prevenção e combate à sinistralidade rodoviária, nomeadamente o combate às atividades suscetíveis de elevar o perigo na condução e, em consequência, a sinistralidade – como sucede com a condução sob o efeito do álcool ou de substâncias psicotrópicas (conforme prevê o art. 148º, n.º 1, do Código da Estrada).

Resultando da sinistralidade rodoviária a ameaça dos direitos à vida e à saúde, o direito do recorrente a ser titular da carta de condução cede perante aquele, que constitui o direito supremo de qualquer pessoa.

     5.

O processo para cassação do título de condução apenas se inicia verificada que se encontre a perda total de pontos, conforme decorre dos n.ºs 4 do art. 148º do Código da Estrada, sendo ordenada em processo autónomo da competência do Presidente da Autoridade Nacional da Segurança Rodoviária – arts. 148º, n.º 10, e 169º, n.º 4, do CE. Neste processo autónomo não é admissível qualquer margem de discricionariedade administrativa na ponderação das circunstâncias do caso concreto, o que já sucedeu nos processos, de natureza contraordenacional ou criminal, que estiveram na origem da aplicação das sanções que determinaram legalmente a perda de pontos: verificados os factos donde decorre a perda de todos os pontos do condutor, a cassação é decretada de forma automática, sem qualquer margem de subjetividade da autoridade administrativa.

Foi o legislador quem fixou, de forma objetiva, a perda das condições para a concessão do título de condução ou, dito de outra forma, para a cessação da licença administrativa concedida.

Na verdade, a carta de condução é uma licença administrativa que pode ser revogada caso o seu titular pratique um conjunto de atos reveladores de inidoneidade ou inaptidão para conduzir veículos automóveis ou um desrespeito grave pela proteção de terceiros, obrigação inerente ao exercício da condução. Para além de revogado, o titular de carta de condução pode ser sujeito (como é) à verificação periódica da subsistência das condições físicas e psíquicas que o habilitem a conduzir, ou caducar, nos casos previstos na lei.

Não se mostra, pois, violado o princípio constitucional a que se refere o art. 30º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.

A culpa do agente foi considerada nas decisões individuais que determinaram, em cada caso, a subtração de pontos – não ferindo, pois, os princípios constitucionais ínsitos nos arts. 18º, n.º 2, e 32º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, nos termos preconizados pelo recorrente.

     6.

Relativamente à(s) invocada(s) inconstitucionalidade(s), já se pronunciou o Tribunal Constitucional sobre as mesmas, nomeadamente o Ac. do Tribunal Constitucional n.º 260/2020 ([7]), no sentido da constitucionalidade do novo regime instituído pela Lei n.º 116/2015: “a atribuição de título de condução pela República Portuguesa não tem um caráter absoluto e temporalmente indeterminado. Existe, assim, como que uma avaliação permanente, através da adição ou subtração de pontos, da aptidão do condutor para conduzir veículos a motor na via pública. Ou seja, em rigor, num tal sistema, o título de condução nunca é definitivamente adquirido, antes está permanentemente sujeito a uma condição negativa referente ao comportamento rodoviário do seu titular. O direito de conduzir um veículo automobilizado não é incondicionado” (sublinhado nosso).

Tendo em consideração que o sistema de carta de condução por pontos prevê, em função da gravidade da infração do condutor, a retirada de pontos, em número variável; e considera o período temporal sem registo de infrações a favor do condutor, acrescentando-lhe pontos e permitindo, desse modo, que recupere os eventualmente perdidos; impõe-se concluir que respeita os princípios da necessidade, da proporcionalidade e, por fim, o princípio geral da igualdade – desde logo por tratar de forma igual situações iguais, e de forma distinta o que é distinto ([8]).


*


Conclui-se, pelas razões expostas, pela conformidade do procedimento seguido nos autos com os princípios e imposições constitucionais vigentes, nomeadamente com os princípios e normas constitucionais invocadas pelo arguido.


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IV.

Decisão

Pelas razões expostas, acordam as Juízas Desembargadoras do Tribunal da Relação de Coimbra em negar provimento ao recurso, e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo do recorrente, fixando em 4 UC’s a taxa de justiça (arts. 513º, n.º 1, do CPP, e tabela III anexa ao RCP).

Coimbra, 10 de abril de 2024

Ana Carolina Cardoso (relatora – processei e revi)

Alcina da Costa Ribeiro (1ª adjunta)

Maria Alexandra Guiné (2ª adjunta)


[1] Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 12.04.2021, proferido no âmbito do Proc. n.º 55/20.1T8VLN.G1, disponível em www.dgsi.pt.
[2] Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 260/2020, proferido no âmbito do Proc. n.º 315/2019 – 1ª secção de 13.5.2020.
[3] Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18.01.2023, proferido no âmbito do Proc. n.º 2629/22.7T8VFR.P1, disponível em www.dgsi.pt .
[4] v. Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, vol. 3, 2015, págs. 335-336.
[5] Cf. os Acórdãos da Relação de Évora de 26.4.2022, proc. 2257/21.4T8ENT.E1, da Relação do Porto de 11.1.2023, proc. 3682/21.6T9MAI.P1, em www.dgsi.pt, e da Relação de Lisboa de 8.3.2022, na CJ, ano XLVII, tomo 2, pág. 139.
[6] Em DAR, I série, n.º 102, 2015.06.25, da 4.ª SL da XII Leg (pág. 15-20).
[7] DR n.º 147/2020, II Série, de 30.7.2020.
[8] Cf., entre outros, os Acórdãos desta Relação de 6.11.2019, rel. Maria José Nogueira, de 13.11.2019, rel. Vasques Osório, de 8.3.2023, rel. Luís Ramos, de 7.6.2023, rel. Helena Bolieiro, de 7.6.2023, por mim relatado, entre muitos outros dos Tribunais da Relação disponíveis em www.dgsi.pt