Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1450/17.9T8CVL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: COIMA
DECISÃO ADMINISTRATIVA QUE A APLICA
CONTEÚDO
TRABALHO EM DIAS FERIADOS
REMUNERAÇÃO
Data do Acordão: 11/28/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO – JUÍZO DO TRABALHO DA COVILHÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 58º, N.°1, AL. C), E 62º, Nº 1, DO DECRETO-LEI 433/82, DE 27/10; ARTº 25º, Nº 1 DA LEI Nº 107/2009, DE 14/09; 269º DO CTRABALHO.
Sumário: I – A decisão que aplica uma coima deve conter:
- a identificação do sujeito responsável pela infração;

- a descrição dos factos imputados e indicação das provas obtidas;

- a indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão e

- a coima – artigo 25.º, n.º 1, da Lei n.º 107/2009, de 14/09.

II - Uma decisão administrativa, quando impugnada, converte-se em acusação, passando o processo a assumir uma natureza judicial (art.° 62º/1 do DL 433/82, de 27/10).

III - Não faz, assim, qualquer sentido que a decisão administrativa - que em caso de impugnação se converte em acusação - tenha que obedecer aos requisitos da sentença penal, como se tal acusação tivesse que obedecer a um rigor de fundamentação igual ao da sentença penal.

IV - Conforme resulta do n.º 2 do artigo 269.º do CT, existe um regime próprio para as empresas não obrigadas a suspender o funcionamento em dia feriado, tendo o trabalhador que presta trabalho normal em dia feriado “direito a descanso compensatório de igual duração ou a acréscimo de 100% da retribuição correspondente, cabendo a escolha ao empregador”.

Decisão Texto Integral:








Acordam[1] na Secção Social (6ª secção) do Tribunal da Relação de Coimbra:

 I – Relatório

A arguida G..., SA, com sede em ..., veio impugnar a decisão administrativa que lhe aplicou uma coima única no montante de €17.340,00 (dezassete mil trezentos e quarenta euros) pela prática das contraordenações previstas e punidas pelo n.º 1 do artigo 29.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de fevereiro e na alínea e) do n.º 1 da Cláusula 17ª do CCT celebrado entre a ARESP - Associação da restauração e Similares de Portugal (ARESP) e a FESHOT - Federação dos Sindicatos da Hotelaria e Turismo de Portugal e outro, publicado no BTE n.º 36, de 29/08/1998, com Portaria de Extensão n.º 1/2001, publicada no BTE nº 1, de 08/01/2001 e, finalmente, no nº 1 da Cláusula 24.ª, conjugada com a Cláusula 17.ª e ainda o n.º 1 da Cláusula 37.ª, conjugada com a Cláusula 36.ª do citado CCT.

*

Recebido o recurso, procedeu-se a audiência de julgamento.

De seguida, foi proferida a sentença recorrida com o seguinte dispositivo:

“Porque assim, decido julgar parcialmente procedente a presente impugnação:

- Absolvendo a sociedade arguida da prática da contraordenação prevista e punível no nº 1 do artigo 29º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro

- Absolvendo a sociedade arguida da prática da contraordenação prevista e punível na alínea e) do nº 1 da Cláusula 17ª do Instrumento de Regulamentação Coletiva do Trabalho celebrado entre a ARESP - Associação da restauração e Similares de Portugal (ARESP) e a FESHOT - Federação dos Sindicatos da Hotelaria e Turismo de Portugal e outro (cantinas, refeitórios e fábricas de refeições), publicado no BTE nº 36, de 29/08/1998, com Portaria de Extensão nº 1/2001, publicada no BTE nº 1, de 08/01/2001 e

- Condenando a arguida pela prática da contraordenação prevista e punível no nº 1 da Clausula 24ª, conjugada com a Cláusula 17ª e ainda o nº 1 da Clausula 37ª, conjugada com a Clausula 36ª do IRCT aplicável aos trabalhadores sindicalizados, no pagamento de uma coima de €13.000,00 (treze mil euros).”

*

A arguida, notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte:

...

O Ministério Público contra alegou nos seguintes termos:

            ...                

O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer de fls. 939 e segs., no sentido de que deverá ser negado provimento ao recurso apresentado pela arguida.

A recorrente veio responder a este parecer com os fundamentos e nos termos já expostos nas alegações de recurso.

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

II – Saneamento

A instância mantém inteira regularidade por nada ter entretanto sobrevindo que a invalidasse.

III – A arguida suscita as seguintes questões:

1ª – Nulidade da decisão administrativa por falta de indicação do elemento subjectivo (violação dos artigos 2º e 32.º, n.º 5, ambos da CRP).

2ª – Se devia constar da matéria de facto julgada provada na sentença recorrida o IRC aplicável à relação laboral. 

3ª – Se a arguida, dispensada de encerrar aos domingos e feriados, não está obrigada a pagar o trabalho prestado nesses dias como trabalho suplementar com o acréscimo de 200%.

IV – Fundamentação

a) Matéria de facto provada:

1. A Arguida é uma pessoa coletiva com o NIPC ...;

2. A Arguida tem sede na Rua ... e local de trabalho a cozinha/refeitório do ..., C (...) ;

3. Exerce a atividade de “Outras atividades de serviço de refeições” com o CAE 56290;

4. É legalmente representada por J..., Administrador, com domicilio profissional na Rua ... e J..., Administrador, com residência na ...;

5. A Arguida apresentou um volume de negócios de 134.535.443,00 € € relativo ao ano de 2015;

6. Foram realizadas visitas inspetivas ao local de trabalho Cozinha/Refeitório do ... – C (...) nos dias:

- 10 de Dezembro de 2015 pelas 10 horas e 45 minutos;

- 14 de Janeiro de 2016 pelas 10 horas e 50 minutos;

- 2 de Fevereiro de 2016 pelas 11 horas e 15 minutos;

- 4 de Maio de 2016 10 horas e 45 minutos.

7. A Arguida praticou as seguintes infrações:

Processo Data da infração Tipo Dolo

Negligência

Coima Data da condenação
... 2013/09/01 Muito grave Negligência 9.282,00 2021/01/17

Participação n.º ... (Processo nº ...) e Auto de Notícia nº ... (Processo nº ...)

8. A trabalhadora A..., detém a categoria profissional de Empregada de Refeitório;

9. A trabalhadora A... desempenha as funções inerentes à categoria de profissional de Empregada de Refeitório há 14 anos;

10. As tarefas inerentes à categoria de emprega de refeitório são: preparação, disposição e higienização das salas de refeições, empacotamento e disposição dos talheres, distribuição e receção de todos os utensílios ao serviço, coloca nos balcões, mesas ou centro de convívio todos os géneros sólidos ou líquidos, que façam parte do serviço; receção e emissão de senhas de refeição, de extras ou dos centros de convívio, quer através de máquinas registadoras ou através de livros para o fim existentes; lava talheres, vidros, loiças, recipientes, arcas e câmaras frigoríficas e outros utensílios, podendo eventualmente ajudar a serviços de pré-preparação de alimentos destinados às refeições; executa serviços de limpeza e asseio dos diversos sectores que compõem a sala de refeições e a linha de empratamento.

11. A trabalhadora esteve de baixa, por gravidez de risco, desde 24 de Fevereiro de 2014 a 13 de Janeiro de 2015, incluindo-se nesse período a licença de maternidade e o gozo de férias;

12. A trabalhadora antes de iniciar a baixa médica desenvolvia as suas tarefas no piso 0 do Hospital ..., correspondente à secção do refeitório;

13. A trabalhadora no regresso ao trabalho após a licença de maternidade foi colocada a desenvolver tarefas no piso -1 do Hospital, correspondente à secção da cozinha;

14. No dia 7 de março de 2016 a trabalhadora enviou à Arguida carta a solicitar que fosse colocada na secção do refeitório;

15. No dia 14 de janeiro de 2016, pelas 10 horas e 50 minutos, aquando da visita inspetiva a trabalhadora encontrava-se na secção cozinha do Hospital a desempenhar a tarefa de preparação de salada e fruta para o refeitório;

16. No dia 2 de fevereiro de 2016, pelas 11 horas e 15 minutos, aquando da segunda visita inspetiva a trabalhadora encontrava-se na secção cozinha a desempenhar a tarefa de limpeza da zona da salada e da fruta;

17. A Arguida é associada da ARESP – Associação da Restauração e Similares de Portugal de acordo com o Relatório Único, subscritora do referido CCT, publicado no BTE nº 36, de 29 de Setembro de 1998, com Portarias de Extensão;

18. A trabalhadora A... é sindicalizada no Sindicato dos Trabalhadores da Industria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Centro;

Auto de Notícia n.º ... (Processo nº ...)

19. A arguida, na data e local da visita inspetiva, tinha ao seu serviço os trabalhadores com categoria e retribuição respetivas:

 20. No dia 1 de janeiro de 2015, feriado, os trabalhadores ... estiveram ao serviço;

21. No dia 17 de fevereiro de 2015, feriado, os trabalhadores ... estiveram ao serviço;

22. No dia 3 de abril de 2015, feriado, os trabalhadores ... estiveram ao serviço;

23. No dia 5 de abril de 2015, feriado, os trabalhadores ... estiveram ao serviço;

24. No dia 25 de abril de 2015, feriado, os trabalhadores ... estiveram ao serviço;

25. No dia 1 de maio de 2015, feriado, os trabalhadores ... estiveram ao serviço;

26. No dia 10 de junho de 2015, feriado, os trabalhadores ... estiveram ao serviço;

27. No dia 15 de agosto de 2015, feriado, os trabalhadores ... estiveram ao serviço;

...

49. A Arguida não procedeu com o cuidado a que, segundo as circunstâncias, estava obrigada e de que era capaz;

Mais se provou que

50. A Recorrente paga o dia feriado na remuneração mensal, mais pagando acréscimo de 100% .

51. A Recorrente é empresa legalmente dispensada de encerrar aos feriados.

52. A Recorrente serve refeições, entre o mais, em hospitais, prisões e outros estabelecimentos (aeroportos por exemplo) que não encerram, nem podem encerrar nos feriados.

53. A trabalhadora A...  esteve de baixa médica e licença parental, tendo regressado ao trabalho (em janeiro de 2015) no âmbito já do gozo da licença de amamentação.

54. A trabalhadora gozou a sua licença de amamentação, ausentando-se mais cedo do trabalho precisamente por causa disso.

55. Paralelamente ao direito à licença de amamentação, a trabalhadora mais solicitou trabalhar com regime de flexibilidade.

56. A trabalhadora, que até à parentalidade estava integrada em regime de turnos rotativos e fazia 40 horas por semana, passou, depois disso, a prestar trabalho com horário fixo e com regime de flexibilidade, passando a prestar trabalho das 9h30 às 14 e das 15 às 15h30, perfazendo 5 horas por dia e 25 horas por semana.

57. Atenta a escala normal de serviço a Recorrente não teve como acomodar o regime de horário flexível (fixo) com descontos por conta das licenças no demais rito e esquema de funcionamento do resto da equipa.

58. À trabalhadora em causa, quando regressou ao trabalho e solicitou licença de amamentação e trabalho em regime de flexibilidade, foi proposto que, dada a incompatibilidade de horário com a demais equipa, prestasse as suas funções no apoio à cozinha.

59. A trabalhadora anuiu com a proposta da empresa.

60. A trabalhadora em causa não trabalha fins-de-semana, feriados, nem trabalha para além das 15h30.

61. O serviço de confeção de refeições termina às 21 horas, todos os dias.

b) - Discussão

1ª questão

Nulidade da decisão administrativa por falta de indicação do elemento subjetivo (violação dos artigos 2º e 32.º, n.º 5, ambos da CRP).

Alega a recorrente que no auto de notícia inexiste uma construção fáctica que permita atribuir à recorrente a comissão da alegada infração; a CRP não admite presunções de culpa e, nessa medida, o elemento subjectivo não pode resultar como efeito lógico do conjunto dos factos objectivos que são imputados ao arguido na acusação; cabia à autuante descrever a atuação da recorrente em sede de acusação demonstrando o preenchimento dos respectivos critérios, o que não aconteceu;  a circunstância de a ACT imputar à recorrente, no auto de notícia, o cometimento da infracção a título de negligência não cumpre os requisitos legais e, ainda, que o preenchimentos dos elementos subjectivos do tipo em sede de decisão final constitui uma alteração substancial dos factos, na medida em que resulta do aditamento à acusação de factos susceptíveis de integrar aqueles elementos subjectivos do tipo, o que determina a nulidade da acusação por violação dos artigos 2º e 32º, n.º 5 da CRP.

A este propósito consta da decisão recorrida, além do mais, o seguinte:

“Por outro lado, porque aquela decisão administrativa, quando impugnada, converte-se em acusação, passando o processo a assumir uma natureza judicial (art.° 62º/1 do DL 433/82, de 27/10).

Não faz, assim, qualquer sentido que a decisão administrativa - que em caso de impugnação se converte em acusação - tenha que obedecer aos requisitos da sentença penal, como se tal acusação tivesse que obedecer a um rigor de fundamentação igual ao da sentença penal.

Por fim, seria incongruente e destituído de sentido que a fundamentação estabelecida no art.° 58 n.° 1 al. c) do Decreto-Lei 433/82 tivesse a amplitude prevista no art.° 374º, n.° 2 do Código de Processo Penal, no que à fundamentação da sentença respeita, quando naquele se estabelecem outros elementos que deve conter a decisão administrativa - essa exigência não faria sentido se ao dever de fundamentar que aí se prevê se atribuísse o alcance que resulta do art.° 374º, n.° 2 do CPP, retirando sentido à exigência contida nas als. b) e c) daquele art.° 58º.

No fundo, essa fundamentação, tal como é estabelecida no art.° 58º do RGCO, será suficiente desde que se justifique as razões pelas quais é aplicada esta ou aquela sanção ao arguido, de modo que este, lendo a decisão, se possa aperceber, de acordo com os critérios da normalidade de entendimento, das razões pelas quais é condenado e, consequentemente, impugnar tais fundamentos.

No caso, a decisão administrativa começa por um relatório, minucioso, diga-se, onde, para além do mais, se identifica a arguida (a ora impugnante), se descrevem expressamente os factos relatados no auto de notícia e se reproduz o teor da defesa apresentada pela arguida, dando, ainda conta, de todas diligências efetuadas em sede de inquérito, reproduzindo o teor dos depoimentos prestado pelas várias testemunhas inquiridas; segue-se-lhe a parte relativa aos «Factos Provados», seguindo-se o enquadramento jurídico, com indicação das normas que considerou aplicáveis e dos demais preceitos do Cód. Trabalho de que resulta o montante da coima aplicável e proposta.

Ora, na nossa situação, constam da decisão administrativa todos os elementos exigidos pelo artigo 58º/1, sendo clara a razão pela qual veio a ser a arguida condenada com uma coima (constando também na parte decisória as normas jurídicas que pela mesma foram violadas e o montante da coima em que foi condenada, por violação das normas que ali são indicadas, e a forma como foram cometidas, ou seja, todos os elementos necessários para que a arguida pudesse exercer, como exerceu, o seu direito de defesa).

O que se pretende é que o arguido saiba as razões de facto e de direito que levaram à sua condenação, possibilitando-lhe um juízo de oportunidade sobre a sua impugnação por meio de recurso e, já na fase judicial, ao tribunal de recurso conhecer o processo de formação da decisão recorrida.

No que concerne á necessidade da verificação da imputação de culpa na decisão administrativa, comece por referir-se que, a afirmação de um juízo censório de culpa, nas modalidades de dolo ou de mera negligência de que pode revestir-se e necessário à integração do tipo subjetivo de um determinado ilícito, não pode ser levado a efeito em termos factuais diretos, pois que o que aí está em causa é verdadeiramente uma questão de direito, não uma questão de facto.

A afirmação daquele juízo de censura há-de extrair-se da globalidade dos factos descritos como sendo integradores da prática daquele ilícito, designadamente na sua dimensão objetiva.

Por outras palavras, a culpa não pode ser objeto de prova judicial, a qual deve incidir exclusivamente sobre os factos com base nos quais se deve sustentar o juízo de censura em que aquela assenta.

Na verdade, como vem sendo entendido, os elementos subjetivos dos tipos de ilícito pertencem ao foro interno do agente, sendo insuscetíveis de apreensão direta, e por isso, na ausência de confissão, têm de ser inferidos dos factos materiais que, provados, apreciados segundo a livre convicção do julgador e em conjugação com as regras da experiência comum, apontam para a sua existência.

Os atos interiores ou factos internos, que respeitam à vida psíquica, raramente se provam diretamente. Na ausência de confissão, a prova dos elementos subjetivos dos tipos de ilícito terá de fazer-se indiretamente por ilações, a partir de outros factos provados, através de uma leitura do comportamento exterior e visível do agente .

Ora, lida a decisão em questão, dela se extrai, à evidência, e na parte com relevo para o tema ora em questão, uma descrição dos factos que constituem as contraordenações aqui em causa, como, atrás, se deixou expresso.

Tanto basta para concluir, claramente, que a autoridade administrativa identificou implicitamente o elemento subjetivo do tipo de contraordenação que imputava à recorrente, que considerou preenchido na sua forma negligente.

Acresce que, lendo a decisão administrativa vemos que, no segmento em que se refere à matéria de facto provada, esta refere que a arguida não atuou com a diligência a que estava obrigada e de que era capaz, quando podia e devia proceder de modo diverso.

Pelo que se se conclui pela improcedência da presente alegação.” – fim de transcrição.

Acompanhamos a decisão recorrida, pouco mais se impondo dizer.

Na verdade, a decisão que aplica a coima deve conter:

- a identificação do sujeito responsável pela infração;

- a descrição dos factos imputados e indicação das provas obtidas;

- a indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão e

- a coima – artigo 25.º, n.º 1, da Lei n.º 107/2009 de 14/09.

Este artigo tem um conteúdo idêntico ao do artigo 58.º do RGCC.

A este propósito já se pronunciaram vários arestos dos Tribunais da Relação[2], no sentido de que, pese embora, a decisão administrativa deva conter as indicações previstas no citado artigo 25.º, as exigências de fundamentação que presidem a uma decisão desta natureza não são as mesmas quando estamos perante uma decisão de natureza criminal.

Assim, ponderando o conteúdo da decisão administrativa proferida nos autos a fls. 718 e segs., facilmente se conclui que, ao contrário do alegado pela recorrente, a mesma contém todos os elementos a que alude o artigo 25.º da Lei n.º 107/2009 de 14/09 e, consequentemente, não sofre da nulidade invocada.

Refere-se expressamente ao elemento subjetivo nos termos supra descritos (refere na enunciação dos factos provados que a arguida não procedeu com o cuidado a que, segundo as circunstâncias, estava obrigada e de que era capaz, quando podia e devia proceder de modo diverso), contém fundamentação de facto com a descrição dos factos imputados à arguida e respetiva motivação de facto e de direito, em suma, não sofre da nulidade prevista no artigo 379.º, n.1, a), do C.P.P., sendo certo que a fundamentação da decisão pode consistir em mera declaração de concordância com fundamentos de anterior proposta elaborada no âmbito do respetivo processo de contraordenação (n.º 5, do citado artigo 25.º).

Por fim, cumpre dizer que como referem Oliveira Mendes e Santos Cabral[3], <<importa, porém, salientar que nos encontramos no domínio de uma fase administrativa, sujeita às características da celeridade e simplicidade processual, pelo que o dever de fundamentação deverá assumir uma dimensão qualitativamente menos intensa em relação à sentença penal. O que de qualquer forma deverá ser patente para o arguido são as razões de facto e direito que levaram à sua condenação, possibilitando ao arguido um juízo de oportunidade sobre a conveniência da impugnação judicial e, simultaneamente, e já em sede de impugnação judicial permitir ao tribunal conhecer o processo lógico de formação da decisão administrativa. Tal percepção poderá resultar do teor da própria decisão ou da remissão por esta elaborada>>.

Ora, basta ler a impugnação judicial para se concluir que a arguida entendeu quais os factos e as infrações que lhe foram imputadas bem como as razões de facto e de direito que levaram à sua condenação, relativamente à qual manifesta a sua discordância.

Por outro lado, como se vê da sentença recorrida, a fundamentação constante da decisão administrativa permitiu ao tribunal, em sede de impugnação judicial, apreender o processo lógico de formação desta decisão.

Resta dizer que não vislumbramos qualquer violação dos artigos 2º e 32.º, n.º 5, ambos da CRP, posto que, além do mais, não houve qualquer violação do princípio do contraditório.

Pelo exposto, improcede a invocada nulidade da decisão administrativa.

2ª questão

Se devia constar da matéria de facto julgada provada na sentença recorrida o IRC aplicável à relação laboral

Alega a recorrente que a decisão recorrida é omissa no que respeita ao IRCT aplicável e à filiação dos trabalhadores num sindicato, factos essenciais com vista a determinar qual o IRCT aplicável; o julgador decidiu aplicar sem dar como provado que aquele IRCT é o outorgado entre a ARESP e a FETESE publicado no BTE n.º 25 de 08/07/2009, com PE n.º 1146/2010.

Da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida consta que:

 17. A Arguida é associada da ARESP – Associação da Restauração e Similares de Portugal de acordo com o Relatório Único, subscritora do referido CCT, publicado no BTE nº 36, de 29 de Setembro de 1998, com Portarias de Extensão;

18. A trabalhadora A... é sindicalizada no Sindicato dos Trabalhadores da Industria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Centro.

Por outro lado, na sentença recorrida julgou-se ser aplicável as relações laborais entre a arguida e os seus trabalhadores, o IRCT ora supra mencionado e o celebrado entre a AHRESP e a FETESE, publicado no BTE n.º 25 de 08/07/2009, com PE n.º 1146/2010.

Ora, se bem percebemos o alegado pela recorrente, no seu entendimento devia constar da matéria de facto provada que o IRCT aplicável é este de 2009 que na sentença recorrida se decidiu aplicar.

Não acompanhamos a recorrente.

Devem constar da matéria de facto apurada os factos dos quais se possa extrair a aplicação de um IRCT, tais como a filiação mas já não qual o instrumento aplicável.

Aquando da fundamentação de direito se apreciará e decidirá, face à matéria de facto provada, qual o IRCT aplicável às relações laborais em causa e se for caso disso.

Improcedem, por isso, estas conclusões da recorrente.

3ª questão

Se a arguida, dispensada de encerrar aos domingos e feriados, não está obrigada a pagar o trabalho prestado nesses dias como trabalho suplementar com o acréscimo de 200%.

Alega a recorrente que a doutrina tem entendido que nas empresas dispensadas de encerrar aos domingos e feriados, o trabalhador apenas tem direito a um acréscimo de 100% ou a um dia de descanso compensatório, relativamente ao trabalho prestado naqueles dias, o qual não é trabalho suplementar; o trabalho em dia feriado que não coincida com o dia de descanso semanal, nas empresas de laboração contínua, não integra o conceito de trabalho suplementar uma vez que sendo o funcionamento ininterrupto terá de ser considerado como normal; a interpretação das cláusulas convencionais dos IRCT não pode ser feita com a postergação dos preceitos do CT (artigo 269.º), sob pena de os mesmos se tornarem inócuos para o setor em apreço; a dupla majoração convencional só tem aplicação se o trabalho prestado em dia feriado ocorrer numa empresa não dispensada de encerrar nos dias feriados, ou estando-o, se o trabalho prestado no dia feriado tiver lugar fora do horário de trabalho; a jurisprudência que invoca tem sido a bússola norteadora da sua atuação, não tendo sido confrontada com decisões judiciais em sentido diverso, pelo que, por ter atuado com fundamento numa decisão judicial, não merece qualquer censura, encontrando-se excluída a ilicitude do facto e, ainda, que não pode ser censurada por cumprir decisões judiciais que lhe impõem que proceda ao pagamento de apenas 100% aos trabalhadores que prestem serviço em dia feriado (que não seria dia de descanso) e durante o horário de trabalho.

Na sentença recorrida decidiu-se:

Da contraordenação prevista e punível no nº 1, da Clausula 24ª, conjugada com a Cláusula 17ª e ainda o nº 1, da Clausula 37ª, conjugada com a Clausula 36ª do IRCT aplicável aos trabalhadores sindicalizados.

Como já deixou explicito à relação laboral em causa é aplicável o Instrumento de Regulamentação celebrado entre a AHRESP – Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal e a FETESE – Federação dos Sindicatos dos trabalhadores de Serviços e outro, publicado no BTE nº 25 de 08/07/2009, com PE nº 1146/2010.

O Instrumento de Regulamentação Coletiva aplicável à Arguida para os restantes trabalhadores é o celebrado entre a AHRESP – Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal e a FETESE – Federação dos Sindicatos dos trabalhadores de Serviços e outro, publicado no BTE nº 25 de 08/07/2009, com PE nº 1146/2010.

Os IRCT´s, em causa, especificam a forma de pagamento do trabalho em dia feriado e havido como suplementar, ou seja, que acréscimo remunerativo deve ser aplicado.

Vejamos em concreto:

Para os trabalhadores sindicalizados, o IRCT aplicável diz no nº 1, da cláusula 37ª:

“1—O trabalho prestado em dias feriados quer obrigatórios, quer concedidos pela entidade patronal, será havido como suplementar e pago nos termos dos n.ºs 2 e 3 da cláusula anterior, sendo R a remuneração do trabalho prestado em dia de feriado que igualmente acrescerá a retribuição mensal do trabalhador.”

Por sua vez, o nº 2, da cláusula 36ª define a forma de pagamento:

0“2—O trabalho prestado em dias de descanso semanal será havido como suplem0entar e remunerado, em função do número de horas realizadas, de acordo com a fórmula seguinte, acrescendo o respectivo valor à retribuição mensal do trabalha0dor:

R=(RH×N)×2

sendo:

R=remuneração do trabalho prestado em dia de descanso semanal;

RH=remuneração da hora normal;

N=número de horas trabalhadas.”

Para trabalhadores não sindicalizados o IRCT aplicável dispõe de norma idêntica, conforme o previsto no nº 1, da cláusula 24ª:

“1 — O trabalho prestado em dias de feriado será havido como suplementar e pago nos termos dos n.ºs 2 e 3 da cláusula 17.ª, sendo R igual à remuneração do trabalho prestado em cada dia feriado, que igualmente acrescerá à retribuição mensal do trabalhador.”

Identicamente ao referido no IRCT para trabalhadores sindicalizados relativo à forma de pagamento dispõe o nº 2 e nº 3, da cláusula 17ª:

“2 — A retribuição da hora suplementar será igual à retribuição horária efetiva, acrescida de 100 %.

3 — O cálculo da remuneração normal deve ser feito de acordo com a seguinte fórmula:

R = Rm × 12

52 × N

sendo:

Rm = valor da retribuição mensal;

N = período normal de trabalho semanal.”

Entende a ACT que, da análise dos IRCT,s aplicáveis ao caso concreto, quer para trabalhadores sindicalizados, quer não sindicalizados, o trabalho em dia feriado, que deve ser havido como suplementar, sendo pago com um acréscimo de 200% sobre a retribuição horária efetiva.

Contra tal entendimento se insurge a arguida por entender que, estando a Recorrente empresa legalmente dispensada de encerrar aos feriados, tem o empregador apenas que proceder ao pagamento do acréscimo remuneratório (50% do valor hora – ou 100% de taxa convencional, se aplicável) pelas horas prestadas.

Apreciando e decidindo,

(…)

No Código do Trabalho de 2003 a prestação de trabalho em dias feriados consta regulada no artigo 259.º, importando notar que então foi introduzida uma inovação relativamente ao regime anterior, ao criar-se um regime especial aplicável às empresas dispensadas de suspensão da laboração nesses dias, nomeadamente no n.º 2 desse artigo. No seu todo, dispunha o artigo o seguinte:

[1] O trabalhador tem direito à retribuição correspondente aos feriados, sem que o trabalhador os possa compensar com trabalho suplementar.

[2] O trabalhador que realiza a prestação em empresa legalmente dispensada de suspender o trabalho em dia feriado obrigatório tem direito a um descanso compensatório de igual duração ou ao acréscimo de 100% da retribuição pelo trabalho presado nesse dia, cabendo a escolha ao empregador.

Portanto, o trabalho prestado em dia feriado passou a estar sujeito a dois regimes distintos: um aplicável às empresas legalmente não dispensadas de suspenderem o trabalho em dia feriado, isto é, o regime regra (n.º1); um outro aplicável às empresas legalmente dispensadas de suspender o trabalho em dia feriado obrigatório, ou seja, o regime especial (n.º2).

No regime regra, na medida em que a prestação de trabalho em dia feriado consubstancia a prestação de trabalho suplementar, o trabalhador tinha “direito a um descanso compensatório remunerado, correspondente a 25% das horas de trabalho suplementar realizado” o qual vencia-se quando se perfizessem “um número de horas igual ao período normal de trabalho diário” devendo ser gozado nos 90 dias seguintes (art.º 202.º n.ºs 1 e 2, CT 03). Concomitantemente, o trabalhador tinha direito «a um acréscimo de 100% da retribuição, por cada hora de trabalho efectuado” [art.º 258.º 2, CT 03).

Diferentemente, no regime especial, isto é, em empresa dispensada de suspender a laboração em dia feriado, o direito do trabalhador dependia da opção do empregador e, consoante fosse essa, traduzir-se-ia no seguinte: i) pagamento das horas de trabalho prestado com acréscimo de 100%; ou, em descanso compensatório de igual duração igual ao trabalho prestado no dia feriado.

O Código do Trabalho aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, acolheu aqueles regimes - o regra e o especial – relativamente à prestação de trabalho em dia feriado. Em suma, em caso de prestação de trabalho em dia feriado (art.º 269.º/CT) o trabalhador tinha direito a ser pago pelo valor da retribuição horária com o acréscimo de 100 % por cada hora ou fracção (art.º 268.º 1/al. b) CT), bem como a descanso compensatório remunerado, correspondente a 25 % das horas de trabalho suplementar realizadas, vencendo-se este quando se perfizessem um número de horas igual ao período normal de trabalho diário e devendo ser gozado nos 90 dias seguintes (art.º 229.º 1/CT).

Mas se o trabalho em dia feriado fosse prestado por trabalhador em empresa não obrigada a suspender o funcionamento nesse dia, então teria direito a descanso compensatório de igual duração ou a acréscimo de 100 % da retribuição correspondente, cabendo a escolha ao empregador (art.º 269.º 2/CT).

Não resultando destas normas, nomeadamente do art.º 269.º, o contrário, as mesmas podem ser afastadas por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho (art.º 3.º /1 do CT 09), o que nos leva às cláusulas 36ª e 37ª atrás transcritas.

Como se pode constatar pela leitura das ditas cláusulas, no que respeita ao trabalho prestado em dia feriado, quer obrigatório, quer concedidos pela entidade patronal, será havido como suplementar e pago nos termos dos n.ºs 2 e 3 da cláusula anterior, sendo R a remuneração do trabalho prestado em dia de feriado que igualmente acrescerá a retribuição mensal do trabalhador.

Não é, por conseguinte, estabelecida qualquer distinção entre empresas dispensadas e não dispensadas de encerrar nos dias feriados, sendo havido como suplementar o trabalho prestado em dia feriado, quer para trabalhadores sindicalizados, quer não sindicalizados.

Por outro lado, resulta das cláusulas 37ª e 24ª dos dois IRCT, s referidos anteriormente, que o trabalho prestado em dias de feriado, será havido como trabalho suplementar, sendo ainda definido nas mesmas clausulas os respetivos feriados.

Decorre da matéria de facto provada que a arguida não remunerou os trabalhadores pelo trabalho prestado em dias feriados como trabalho suplementar, aplicando apenas o acréscimo decorrente do trabalho em dia feriado, isto é, a Recorrente paga o dia feriado na remuneração mensal, mais o acréscimo de 100%.

A argumentação da impugnante radica na análise dos preceitos do Código do Trabalho a tal respeito em vigor, mormente os artigos 202 e 259º do Código do Trabalho.

Contudo, no caso dos autos, como se viu, regem os artigos dos IRCT´s em vigor, sendo que os mesmos determinam que o trabalho prestado em dias feriado seja remunerado como trabalho suplementar, ou seja, ao acréscimo de 100% por se tratar de feriado, acrescem mais 100%, por imposta remuneração como como trabalho suplementar.

Em suma, de acordo com os IRCT,s aplicáveis ao caso concreto, quer para trabalhadores sindicalizados, quer não sindicalizados, o trabalho em dia feriado, deve ser pago com um acréscimo de 200% sobre a retribuição horária efetiva.

Assim, a Arguida não tendo cumprido com a obrigação que sobre si impende, de pagar aos seus trabalhadores de acordo com os valores constantes nos normativos legais, incorreu na prática da contraordenação prevista no n.º 2, conjugado com o nº 3, ambos do artigo 521º da Lei nº 7/2009 de 12 de Fevereiro, o que conduz a que o elemento objetivo do tipo se encontre preenchido.

Importa, agora aferir se se mostra, também, preenchido o elemento subjetivo que integra a contraordenação em causa,

Invoca a impugnante que não pode ser sancionada, uma vez que agiu convicta da legalidade da sua atuação e em cumprimento de decisões proferidas por outros tribunais.

Invoca para o efeito o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, de 28 de Fevereiro de 2005, com o número de documento RP200502280415681.

Sucede que, também, tal Acórdão aborda tal temática sob a égide do artigo 259º do Código do Trabalho, que como vimos, pressupõe como elemento principal para a definição do pagamento do trabalho prestado nos feriados, a circunstância de se tratar, ou não, de empresa obrigada a encerrar nesses dias.

A impugnante parte assim de um pressuposto errado, pois que no caso, as cláusulas do IRC aplicável, atrás referidas e transcritas, determinam o pagamento do trabalho prestado em dias feriado como trabalho suplementar, sem fazer qualquer distinção entre empresas que encerrem, ou não, obrigatoriamente neste dia.

Embora não se concorde com a interpretação preconizada pela impugnante, não podemos deixar de questionar a verificação do elemento subjetivo integrante da infração em causa.

Falamos, pois de uma situação de erro,

Impondo a lei determinada conduta e provando-se que um agente não a adotou, verifica-se, desde logo, a contraordenação imputável a título de negligência.

Na verdade, a culpa nas contraordenações não se baseia em qualquer censura ético-penal, mas tão só na violação de certo procedimento imposto ao agente, bastando-se por isso com a imputação do facto ao agente, sendo certo que, nos termos do art. 550.º do Código do Trabalho de 2009, a negligência nas contraordenações laborais é sempre punível.

Importa, todavia, trazer aqui à colação o erro sobre a proibição também conhecida por erro sobre a ilicitude ou sobre a punibilidade, o qual ocorre quando o agente, muito embora tenha conhecimento do tipo objetivo, isto é, do facto na sua materialidade, não o tem relativamente ao seu desvalor jurídico, por falta de conhecimento/consciência da proibição.

Conforme salienta António de Oliveira Mendes e, José dos Santos Cabral6,, ao agente falta a consciência da ilicitude por pensar que o facto é permitido em virtude de um erro, isto é, o agente devido a erro não tem conhecimento/consciência da punibilidade do facto, ou seja, da norma proibitiva que contraordenacionaliza o facto.

Mais referem tais autores que, ocorrerá, ainda, erro sobre a proibição quando o agente muito embora não ignore a norma proibitiva, julga que a mesma se não encontra em vigor, ou a tenha interpretado incorretamente e por esta razão a considere inaplicável, que é a situação que ora nos ocupa.

Por outro lado, quando estão em causa incriminações com evidente ressonância ética, o artigo 17.º do Código Penal apenas admite excluir a responsabilidade se a falta de consciência da ilicitude não for censurável ao agente (vide, o art. 9.º do Regime Geral das Contraordenações e Coimas).

Cremos assim que a arguida incorreu no denominado erro sobre a proibição.

Com efeito, do cotejo dos factos acima dados por provados, extrai-se que, a arguida/impugnante não deu cumprimento ao previsto no nº 1, da Clausula 24ª, conjugada com a Cláusula 17ª e ainda o nº 1, da Clausula 37ª, conjugada com a Clausula 36ª do IRCT aplicável, por estar convicta que o trabalho prestado dentro do horário de trabalho em dia feriado obrigatório (que não coincida com os dias de descanso semanal do trabalhador) em empresa dispensada de encerrar nesses dias não constitui trabalho suplementar normal, mas sim especial e com um regime remuneratório igualmente especial, tendo, o empregador, apenas que proceder ao pagamento do acréscimo remuneratório (50% do valor hora – ou 100% de taxa convencional, se aplicável) pelas horas prestadas.

Conforme decorre expressamente do número 1.º do art. 9.º do Regime Geral das Contraordenações e Coimas, quando não censurável, certo é que, o erro exclui a culpa.

Seguindo de perto as lições de Cavaleiro Ferreira, in Lições de direito penal parte geral (3.ª edição-1992), pág. 343.º, tal mestre entende que só a consciência errónea, mas certa e segura, do agente (porque devida a erro desculpável) exclui a culpabilidade e a responsabilidade penal, pelo que em caso de dúvida sobre a ilicitude, tem o agente o dever de se informar, sendo que se não o fizer o erro é censurável.

A censurabilidade do erro está dependente de se apurar se face às circunstâncias concretas, o agente tinha ou não que conhecer o erro.

Ora, na concreta situação dos autos, este juízo de censurabilidade, no nosso entender, está dependente do cumprimento ou não do dever de informação que recaía sobre a arguida enquanto empregadora, sobre a legislação e regulamentação coletiva que tinha que aplicar ao universo dos seus trabalhadores.

E, perante os elementos que resultam dos autos, julgamos que a arguida não cumpriu esse dever.

Ora, da análise dos IRCT,s aplicáveis ao caso concreto, verifica-se que quer para trabalhadores sindicalizados, quer não sindicalizados, o trabalho em dia feriado, que é havido como suplementar, é pago com um acréscimo de 200% sobre a retribuição horária efetiva, o que resulta expressamente das respetivas cláusulas 36ª e 24ª.

As decisões citadas assentam a fundamentação em preceito diversos, cuja aplicabilidade está afastada no caso, em prol das disposições convencionais.

Destarte, entendemos que o erro sobre a proibição é censurável à impugnante, que não observou o dever de cuidado que lhe era exigível, pois deveria ter cuidado de informar-se adequadamente acerca da questão jurídica em causa, o que, tendo em conta a sua dimensão, poderia ter levado a cabo através dos serviços jurídicos competentes.

Pelo exposto, também, o elemento subjetivo integrador da contraordenação em causa de há-de ter por verificado. – fim de transcrição.

Vejamos:

Toda a argumentação da ora recorrente assenta, em termos jurídicos, nas disposições do Código do Trabalho.

Na verdade, conforme resulta do n.º 2 do artigo 269.º do CT, existe um regime próprio para as empresas não obrigadas a suspender o funcionamento em dia feriado, tendo o trabalhador que presta trabalho normal em dia feriado “direito a descanso compensatório de igual duração ou a acréscimo de 100% da retribuição correspondente, cabendo a escolha ao empregador”.

Acresce que, a quase totalidade das decisões judiciais citadas pela recorrente, como por exemplo o acórdão da RP, fazem apelo apenas ao disposto no n.º 2 do artigo 259.º do CT de 2003 (artigo 269.º do CT de 2009).

Acontece que, no caso dos autos é aplicável à relação laboral existente entre a arguida e os seus trabalhadores o citado CCT de 1998, com alterações em 2000 e 2003 (subscrito pela arguida que é associada da ARESP) e o CCT de 2009 (ambos com Portarias de Extensão publicadas nos BTE n.ºs 38, de 15/10/2003 e 3, de 22/01/2010, respetivamente[4]) que, como se refere na sentença recorrida, determinam nas respetivas cláusulas 36ª e 37ª e 17ª e 24ª que o trabalho prestado em dias de feriado será havido como suplementar e pago como tal, com o acréscimo de mais 100%, ou seja, com um acréscimo de 200% sobre a retribuição horária efetiva.

E, não resultando do Código do Trabalho, nomeadamente do seu artigo 269.º, qualquer proibição, esta norma pode ser afastada por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho[5], conforme dispõe o n.º 1 do artigo 3.º do CT, sendo certo que os citados IRCT não fazem qualquer ressalva relativamente às empresas dispensadas de encerrar aos feriados[6].

Na verdade, este tribunal já se pronunciou sobre a questão ora em análise no acórdão de 21/02/2018, proferido no processo n.º 735/17.9T8CBR.C1[7], nos seguintes termos:

Da remuneração do trabalho prestado em dias feriados:

Vejamos, antes de mais, qual o quadro legal em causa:

- Artº 269º nº 2 do CT/09:

“O trabalhador que presta trabalho normal em dia feriado em empresa não obrigada a suspender o funcionamento nesse dia tem direito a descanso compensatório com duração de metade do número de horas prestadas ou a acréscimo de 50 % da retribuição correspondente, cabendo a escolha ao empregador”[8].

- Cláusulas 37ª e 36ª do Contrato Colectivo de Trabalho celebrado entre a ARESP – Associação da Restauração e Similares de Portugal – e a FESAHT – Federação dos Sindicatos da Hotelaria e Turismo de Portugal e outros (cantinas, refeitórios e fábricas de refeições), publicado no BTE n.º36 de 29.09.1998, com as alterações constantes nos BTEs n.º30 de 15.08.2000 e n.º5 de 08.02.2003, com Portaria de Extensão publicada no BTE n.º38 de 15/10/2003, que têm a seguinte redacção:

Clª 37ª nº 1 :“o trabalho prestado em dias feriados quer obrigatórios, quer concedidos pela entidade patronal, será havido como suplementar e pago nos termos dos n’s 2 e 3 da cláusula anterior, sendo R a remuneração do trabalho prestado em dia de feriado que igualmente acrescerá a retribuição mensal do trabalhador”.

Clª 36ª nºs 1 e 2 :“o trabalho prestado em dias de descanso semanal será havido como suplementar e remunerado, em função do número de horas realizadas, de acordo com a fórmula seguinte, acrescendo o respectivo valor à retribuição mensal do trabalhador:   R = (RH x N) x 2 Sendo:  R = remuneração do trabalho prestado em dia de descanso semanal;  RH= remuneração da hora normal;

N= número de horas trabalhadas”.

Quando o trabalhador realize pelo menos quatro horas de trabalho em dia de descanso semanal, o pagamento será feito por todo o período diário, sem prejuízo de maior remuneração, quando este seja excedido”.

A aplicação do regime decorrente deste CCT, que se mantém em vigor por a sua vigência não ter cessado fosse através de revogação por acordo das parte ou por denúncia (cfr artº 502º do CT) deixou, temporariamente, de poder ser aplicado por efeito da Lei 23/12 publicada no seguimento da concessão da assistência financeira prestada a Portugal pela denominada Troika que suspendeu a sua vigência.

Finda esta suspensão o CCT em questão voltou a vigorar na sua totalidade.

O recorrente entende que só é de remunerar o trabalho prestado nos dias feriados de acordo com o CCT quando este trabalho coincida com o dia de descanso do respectivo trabalhador ou quando seja ultrapassado o horário definido para esse dia.

Fora destes casos, o trabalho prestado em dia feriado deve ser remunerado como trabalho normal em dia feriado e, como tal, com a aplicação do nº 2 do artº 239º do CT.

Como acima ficou dito o CCT encontra-se em vigor pelo que a questão que se controverte deve, no nosso entender, ser decida apelando às regras de interpretação das cláusulas ínsitas em IRCT que constituem uma das fontes do direito do trabalho (artº 1º do CT).

Ora, é pacificamente aceite que “a interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções colectivas de trabalho deve obedecer às regras próprias da interpretação da lei. Assim, haverá que atender ao enunciado linguístico da norma, por representar o ponto de partida da actividade interpretativa, na medida em que esta deve procurar reconstituir, a partir dele, o pensamento das partes outorgantes da convenção – tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada –, sendo que o texto da norma exerce também a função de um limite, porquanto não pode ser considerado entre os seus possíveis sentidos aquele pensamento que não tenha na sua letra um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. Para a correcta fixação do sentido e alcance da norma, há-de, outrossim, presumir-se que os outorgantes souberam exprimir o seu pensamento em termos adequados e consagraram a solução mais acertada, do que decorre que o texto da norma exerce uma outra função: a de dar um mais forte apoio àquela das interpretações possíveis que melhor condiga com o significado natural e correcto das expressões utilizadas” –AC. STJ de 09.07.2006, procº 3976/06.0TTLSB:L1:S1 in www.dgsi.pt/jstj .

Mais recentemente o STJ no acórdão de 12.05.16 procº 1607714.4TTLSB.L1.S1, consultável no mesmo sítio da internet lê-se o seguinte “como se refere no acórdão nº 7/2010, proc. 3976/06.0TTLSB.L1.S1 (Cons. Vasques Dinis), publicado no DR, Iª série de 9/07/2010, “na interpretação das cláusulas das convenções colectivas de trabalho de conteúdo normativo, ou regulativo – como é o caso -, há que ter presente, por um lado, que elas consubstanciam verdadeiras normas jurídicas e, por outro, que provêm de acordo de vontades de sujeitos privados”, havendo, por conseguinte, que obedecer às regras próprias de interpretação da lei (cfr. no mesmo sentido o acórdão do STJ de 28/09/2005 – Cons. Sousa Peixoto – publicado no DR, Iª série de 10/11/2005) e de 30/04/2014, proc.3230/11.6TTLSB.S1 (Cons. Melo Lima)[9].

Também a doutrina assim o entende, ainda que, porventura, de uma forma mitigada, tendo em conta o vertente negociável das convenções colectivas.

Refere Maria do Rosário Palma Ramalho[10] : “A doutrina nacional tem esgrimido vários argumentos nesta matéria, para concluir ou no sentido da sujeição da convenção colectiva às regras de interpretação da lei, ou para sustentar uma interpretação dualista, sujeitando as cláusulas obrigacionais da convenção às regras do art. 236º do CC e as cláusulas normativas às regras do art. 9º do CC. Por seu turno, a jurisprudência tem-se inclinado preferencialmente, mas não de forma unânime para a sujeição das convenções colectivas às regras da interpretação da lei… A interpretação da convenção colectiva e a integração das suas lacunas deve sujeitar-se globalmente aos critérios de interpretação e de integração da lei (arts. 9º e 10º do CC), pela seguinte ordem de razões: razões de coerência interna das duas parcelas do conteúdo deste instrumento; razões de substancialidade; razões formais e de segurança jurídica; e razões de harmonia intra-sistemática… Além disso, é a natureza parcialmente (mas predominantemente) normativa da convenção colectiva que justifica a sua interpretação de acordo com os parâmetros de interpretação da lei… E, obviamente, é ainda esta natureza normativa que justifica a admissibilidade do controlo da constitucionalidade das cláusulas das convenções, recentemente sufragada pelo Tribunal Constitucional, em inflexão acertada da tendência jurisprudencial anterior”.

Também António Menezes Cordeiro defende que “a interpretação e a integração das convenções colectivas seguem as regras próprias de interpretação e de integração da lei, com cedências subjectivistas quando estejam em causa aspectos que apenas respeitem às partes que as hajam celebrado”[11].

Na mesma senda, para Pedro Romano Martinez, na interpretação das convenções colectivas de trabalho deve aplicar-se o disposto nos artigos 236º do CC e seguintes no que toca à parte obrigacional e o disposto no artigo 9º do CC à parte regulativa ou normativa, não perdendo, todavia, de vista que a convenção é decorrente de negociações entre as partes e, nessa medida, se distingue da lei, fornecendo aquelas negociações elementos relevantes para a interpretação nas respectivas cláusulas[12].

Considerando o carácter normativo da Cláusula (…..), como referido, afigura-se-nos inquestionável que, na respectiva interpretação, se deverá aplicar os critérios estabelecidos nos arts. 9º e 10º do CC, sem todavia perder de vista as “circunstâncias em que as partes fundamentaram a decisão de contratar”, como estipulado no art. 520º, nº 2 do CT e, bem assim, que se trata de um instrumento que é decorrente de negociações entre as partes e, nessa medida, se distingue da lei, fornecendo aquelas negociações elementos relevantes para a interpretação nas respectivas cláusulas.

Estabelece o art. 9º do CC:

“1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”

Interpretar a lei consiste em fixar, de entre os sentidos possíveis da lei, o seu sentido e alcance decisivos[13]. Para alcançar tal desiderato, «o primeiro passo consiste na sua interpretação literal, isto é, na apreensão do sentido puramente gramatical ou textual da lei; uma vez operada essa interpretação da letra da lei, e de acordo com o nº 1 do artigo 9º do CC, o intérprete deve recorrer a elementos extraliterais, que lhe permitam “reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo”»[14]

O elemento gramatical ou textual (“letra da lei “) constitui apenas o ponto de partida, cabendo-lhe, desde logo uma função negativa: eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio ou, pelo menos, qualquer correspondência ou ressonância nas palavras da lei.

O elemento gramatical ou textual tem sempre que ser utilizado em conjunto com o elemento lógico (que por sua vez se subdivide em três: o elemento racional ou teleológico, o elemento sistemático e o elemento histórico). Não pode haver uma interpretação gramatical e outra lógica.

O elemento sistemático (“a unidade do sistema jurídico“) compreende a consideração das outras disposições legais que formam o quadro legislativo em que se insere a norma em causa, bem como as disposições que regulam situações paralelas (unidade do sistema jurídico). O elemento racional ou teleológico (“o pensamento legislativo”), consiste na “ratio legis”, no fim prosseguido pelo legislador ao elaborar a norma, a sua razão de ser. Finalmente o elemento histórico (“as circunstâncias em que a lei foi elaborada”) compreende o contexto em que foi elaborada, a evolução histórica do preceito, as suas fontes[15]([16]).

A interpretação tem também que ser actualista (“tendo… as condições específicas do tempo em que é aplicada”)”.

No caso que nos ocupa, o elemento literal da cláusula 37ª do CCT aplicável aponta de forma expressa e inequívoca para que o trabalho prestado em dias feriados seja considerado trabalho suplementar independentemente desse trabalho ser prestado em dia de descanso ou ultrapasse as horas definidas no horário de trabalho para esse dia.

A cláusula não faz qualquer distinção. E onde a lei não distingue não é legítimo ao intérprete distinguir. Assim como nessa cláusula não se faz qualquer distinção entre empresas que estão ou não obrigadas a suspender o seu funcionamento nos dias feriados.

Diz-nos a referida cláusula que o trabalho prestado em dias feriados quer obrigatórios, quer concedidos pela entidade patronal, será havido como suplementar e pago de acordo com o definido no IRCT.

A expressão “será havido como” não deixa, quanto a nós, margem para qualquer outra interpretação que não seja a de que o trabalho prestado em qualquer circunstância em dia feriado é trabalho suplementar devendo ser remunerado de acordo com o acordado convencionalmente.

Acresce que isso mesmo vinha a ser entendido pela recorrente até à suspensão da aplicação das referidas cláusulas por efeito da entrada em vigor da Lei 23/12 ao proceder ao pagamento do trabalho prestado em dia feriado com o acréscimo de 200% fosse esse trabalho prestado ou não como trabalho normal.

Por outro lado, não deixa de ser significativo, que do depoimento da pessoa que teve intervenção nas negociações que estiveram na base do acordo que levou à celebração da convenção, e que fornece elementos relevantes para a interpretação das cláusulas em questão, se pode concluir no sentido que nessas cláusulas se pretendeu consignar que a remuneração do trabalho prestado em dia feriado tout court deva ser feita de acordo com o estabelecido na convenção.

Diga-se, ainda, que as normas legais reguladoras de contrato de trabalho podem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, salvo quando delas resultar o contrário (artº 3º nº 1 do CT); e, o modo ou forma de pagamento do trabalho suplementar prevista no CT pode ser afastada por regulamentação colectiva de trabalho (artº 268º nº 3 do CT).” – fim de transcrição.

A decisão ora transcrita foi mantida pelo STJ no acórdão de 12/07/2018, disponível em www.dgsi.pt, constando do seu sumário que:

1. Nas relações contratuais laborais em que seja aplicável o CCT celebrado entre a ARESP – Associação da Restauração e Similares de Portugal e a FESAHT – Federação dos Sindicatos da Hotelaria E Turismo de Portugal e outros (cantinas, refeitórios e fábricas de refeições), publicado no BTE n.º 36 de 29.09.1998, devem ser aplicadas as cláusulas 37ª e 36ª à remuneração do trabalho prestado em dia feriado, seja obrigatório seja concedido pelo empregador, (...)

3. A norma do artigo 269º, do CT, não é imperativa e nem afasta a aplicação de IRCT`s, dada a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral da norma do artigo 7º, n.º 5, da Lei n.º 23/2012, de 25 de junho pelo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 602/2013, de 24 de outubro, e sua posterior revogação pelo artigo 3º, da lei n.º 48-A/2014, de 31 de julho.

4. A cláusula 37ª consagra um regime único e uniforme para o trabalho normal prestado nos dias feriados nas empresas, não fazendo qualquer distinção entre os feriados que coincidem e os que não coincidem com o dia de descanso do trabalhador, e nem entre as empresas, se dispensadas ou se obrigadas a suspender o seu funcionamento nesses dias.

5. O trabalho assim prestado é sempre havido como trabalho suplementar e deve ser remunerado com um acréscimo de 200%, pois ao montante que resultar da fórmula de cálculo estabelecida no n.º 2, da cláusula 36ª, para o qual remete a cláusula 37ª, acresce, ainda, “a retribuição mensal do trabalhador”.

Assim sendo, não assiste qualquer razão à recorrente quando alega que o trabalho em dia feriado nas empresas de laboração contínua não integra o conceito de trabalho suplementar, não tendo os trabalhadores direito a qualquer outro acréscimo além do que já foi pago nem no seu entendimento de que a dupla majoração convencional só tem aplicação no caso de empresa não dispensada de encerrar nos dias de feriado.

E, por fim, ao contrário do que alega, o erro em que se considerou que a arguida incorreu, tal como consta da sentença recorrida que acompanhamos e nos abstemos de repetir, é-lhe censurável, desde logo, porque as decisões judiciais que invoca, como já referimos, aplicaram na sua quase totalidade somente as normas do CT e, por isso, não agiu com o cuidado que podia e devia no sentido de se informar sobre a legislação aplicável, sendo certo que é dever da arguida, como de qualquer empresa, diligenciar por se informar e esclarecer sobre as normas que regem a sua atividade, nomeadamente, as relações laborais.

Pelo exposto, encontram-se preenchidos os elementos objetivo e subjetivo do tipo legal de contraordenação imputado à arguida e, consequentemente, a recorrente encontra-se incursa na prática da mesma.

  V – DECISÃO

  Nestes termos, sem outras considerações, acorda-se, em conferência, na improcedência do recurso, em manter a sentença recorrida

  Custas a cargo da arguida recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC`s.

                                                                         Coimbra, 2018/11/28

                                                                                                (Paula Maria Roberto)

                                                                                                      (Felizardo Paiva)

                                                                                                                                                                                                                                                                 

                                         ***


[1] Relatora – Paula Maria Roberto
   Adjunto – Felizardo Paiva
[2] Cfr. os acórdão da R.E. de 09/07/2009, da R.C. de 21/09/2011 e de 12/07/2011 e da R.G. de 04/06/2013, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[3] Notas ao Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, 3ª edição, Almedina, pág. 194.
[4] Existindo PE, o princípio da filiação que determina o âmbito pessoal da convenção coletiva deixa de funcionar como o único requisito de aplicação daquele IRCT, passando este a ser aplicável por força daquela.
[5] A este propósito, cfr. o acórdão da RP, de 20/06/2016, disponível em www.dgsi.pt.
[6] Neste sentido, cfr. o acórdão do STJ, de 25/02/2009, disponível em www.dgsi.pt.
[7] Relatado pelo ora adjunto e subscrito pela ora relatora como 2ª adjunta.
[8] No CT/03 o preceito correspondente (nº 2 do artº 259) tinha a seguinte redacção “O trabalhador que realiza a prestação em empresa legalmente dispensada de suspender o trabalho em dia feriado obrigatório tem direito a um descanso compensatório de igual duração ou ao acréscimo de 100% da retribuição pelo trabalho prestado nesse dia, cabendo a escolha ao empregador”.
2 In www.dgsi.pt«1 – A interpretação das cláusulas de instrumentos de regulamentação colectiva obedece às regras atinentes à interpretação da lei, consignadas, em particular, no artigo 9º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstracção e serem susceptíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros…».
[10] Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte III, 2ª edição, pág. 286 a287 e 350.
[11] António Menezes Cordeiro, ibidem, a fls. 140 dos autos (pág. 58 do parecer) e in Manual de Direito do Trabalho, pág. 307. No mesmo sentido Convenções Colectivas de Trabalho e Alteração de Circunstâncias, Lisboa, Lex, 1995, págs. 51 a 53
[12] Direito do Trabalho, 2ª edição, págs. 212 a 214 e 1085
[13] Manuel de Andrade, Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, pág. 21 e 26
[14] Ana Prata, Dicionário Jurídico, 2ª edição, pág. 661
[15] Baptista Machado, Introdução ao direito e ao Discurso Legitimador, 12ª reimpressão, págs. 175 e seg.