Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1457/15.0T8ACB-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALBERTO RUÇO
Descritores: EXECUÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
CONTRATO DE ARRENDAMENTO
RENDA
FIADOR
Data do Acordão: 03/20/2018
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Tribunal Recurso:
TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - ALCOBAÇA - JUÍZO EXECUÇÃO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.14-4, 15 NRAU, 634 CC
Sumário:
I - O contrato de arrendamento (o documento), com fiança, acompanhado da notificação do arrendatário, prevista no artigo 14.º-A do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) – Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, na redação introduzida pela Lei n.º 31/2012 de 14 de Agosto –, não constituem título executivo contra o fiador (assim como não o constituiria a notificação, nos mesmos termos, feita ao fiador).
II - A notificação do arrendatário prevista no artigo 14.º-A do NRAU, além da função de liquidação (até àquele momento), ainda tem uma finalidade relevante que é a de constituir uma derradeira interpelação do arrendatário devedor para que proceda ao pagamento, sob pena de execução.
Decisão Texto Integral:
Recorrente G (…), melhor identificada nos autos.
Recorrido J (…) e V (…) , melhor identificados nos autos.
*
I. Relatório
a) O presente recurso insere-se numa ação executiva e respeita à decisão proferida na fase do despacho saneador, no apenso de oposição à execução.
Os opoentes, na qualidade de fiadores, vieram deduzir oposição à execução, porquanto sendo eles fiadores no contrato de locação subjacente ao título executivo, não foram interpelados pelo senhorio, ora exequente, exigindo-lhes o pagamento das rendas em dívida, as quais originaram a resolução do contrato de arrendamento, razão pela qual não se formou título executivo quanto aos fiadores, nos termos previstos no artigo 14º.- A do NRAU.
Na sentença recorrida deu-se razão aos fiadores e determinou-se o arquivamento da execução quanto a eles.
b) É desta decisão que recorre a exequente, tendo formulado as seguintes conclusões:
(…)
c) Os recorridos contra-alegaram, pugnando pela manutenção da decisão sob recurso.
(…)».
II. Objeto do recurso
Tendo em consideração que o âmbito objetivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (artigos 639.º, n.º 1, e 635.º, n.º 4, ambos do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, o presente recurso coloca apenas esta questão:
Verificar se os documentos juntos pela exequente, como título executivo da presente execução, têm valor de título executivo em relação aos executados fiadores – ao abrigo do disposto no artigo 14.º - A do N.R.A.U. – apesar destes não terem sido interpelados previamente à instauração da ação executiva, pelo senhorio exequente, para pagarem a dívida dos arrendatários relativa a rendas.
III. Fundamentação
a) Matéria de facto
1.º Nos autos de execução foi apresentado o documento denominado “contrato de arrendamento não habitacional” que se encontra a fls. 6 e segs. em que foi “primeiro contraente” a ora exequente, na qualidade de senhoria, e “segundo contraente” a sociedade executada A (…), Lda., na qualidade de arrendatária, mediante o qual a primeira declarou dar de “arrendamento” à segunda o imóvel aí identificado, pelo prazo de 10 anos, com início em 01/05/2013, pela renda mensal de 1.500 €.
2.º A exequente remeteu à sociedade A (…), Lda., e só a esta, a comunicação escrita datada de 25/08/2014, que se encontra a fls. 10 e segs. destes autos, que recebeu, da qual consta, designadamente:
«…venho por este meio comunicar a resolução do mesmo, com fundamento previsto no n.º 4 do artigo 1083.º do Código Civil, uma vez que a sociedade comercial A (…), Lda., constituiu-se em mora superior a oito dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes, interpoladas, nos últimos 12 meses (…)».
3.º A exequente remeteu à sociedade A (…), Lda., e só a esta, a comunicação escrita datada de 13/11/2014, que se encontra a fls. 14 e segs. dos autos de execução, que recebeu, da qual consta, como montante da dívida da arrendatária a quantia de EUR 12.000,00.
4.º Consta no “contrato” referido em 1.º, entre o mais, o seguinte:
Cláusula Décima Quarta (Fiadores)
Os antes identificados representantes da Arrendatária, Senhores J (…) e V (…) (…), assumem-se como fiadores a título pessoal da sua representada, a sociedade comercial A (…), Lda., ora Arrendatária, respondendo como principais devedores perante a Senhoria por todas as obrigações da Arrendatária, renunciando ao benefício de excussão prévia.
5.º Consta no registo comercial da sociedade A (…) a inscrição da renúncia à gerência dos executados/opoentes (Ap. 3 de 23/07/2014 e Ap. 4 de 24/07/2014).
b) Apreciação da questão objeto do recurso.
A disposição legal que prevê a constituição do título executivo em questão nestes autos é o artigo 14.º-A (Título para pagamento de rendas, encargos ou despesas) da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro (que aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano, na redação introduzida pela Lei n.º 31/2012 de 14 de Agosto), cujo teor é o seguinte:
«O contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário».
Vejamos então se o contrato de arrendamento e o comprovativo da notificação do arrendatário, nos termos previstos nesta norma, constituem título executivo relativamente aos fiadores.
Em sentido negativo pode argumentar-se do seguinte modo:
(I) Se o artigo 14.º-A da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, exige a notificação do arrendatário para que se constitua em relação a ele o título executivo, então por identidade de razão e enquanto condição de exequibilidade do título, a mesma notificação deve ser exigida e feita também aos fiadores ( Neste sentido Acórdão do S.T.J. de 26-11-2014, no processo 1442/12.4TCLRS-B (Granja da Fonseca), mas no domínio do artigo 15.º, n.º 2, da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, na redação anterior à alteração introduzida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto, cujo texto era o seguinte: «O contrato de arrendamento é título executivo para a ação de pagamento de renda quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida».
No mesmo sentido Laurinda Gemas, Albertina Pedroso e João Caldeira Jorge. Arrendamento Urbano - Novo Regime Anotado e Legislação Complementar, 3.ª Edição (revista, atualizada e aumentada), Lisboa, 2007, pág. 30.
Delgado Carvalho, Acção executiva para pagamento de quantia certa, Quid Iuris, 2016, pág. 511.







).
(II) A criação do título executivo prevista no mencionado artigo 14.º-A foi pensada apenas para o arrendatário.
Invoca-se o risco da fiança;
O eventual desconhecimento pelo fiador da situação de mora;
A especial fragilidade da posição do garante (fiador) e a possibilidade de multiplicação de ações noutros casos previstos no NRAU.
O n.º 2 do artigo 15.º do NRAU insere-se num normativo destinado, essencialmente, a proteger os interesses do senhorio perante o arrendatário, sendo esse o contexto da lei, expresso no amplo leque de casos do n.º 1 ( Neste sentido, Fernando de Gravato Morais. Cadernos de Direito Privado, Julho/Setembro 2009, n.º 27, CEJUR, pág. 57 e Falta de Pagamento da Renda no Arrendamento Urbano, Almedina, Coimbra, 2010, pág. 76.).
(III) Considerando que as normas que preveem a criação dos títulos executivos dispensam a existência de processo judicial prévio, então devem ser interpretadas restritivamente, não se podendo ir além da sua literalidade ( Neste sentido Rui Pinto. Manual de Execução de Despejo, a páginas 1164 a 1165, que apenas admite a formação de título executivo em relação ao arrendatário, mas não quanto ao fiador, mesmo que seja notificado.
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 24-04-2014, no processo 869/13.9YYPRT (Aristides Rodrigues de Almeida), «I - O título executivo previsto no artigo 14.º-A do NRAU, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27.02, com as alterações da Lei n.º 31/2012, de 14.08, é restrito ao arrendatário, não se estendendo ao respectivo fiador ainda que tenha intervindo no contrato de arrendamento e renunciado ao benefício da excussão prévia.
II - No caso de se entender que aquela norma permite a formação de título executivo contra o fiador do arrendatário, dever-se-á exigir, por imposição das regras da boa fé e por maioria de razão, que o contrato de arrendamento seja acompanhado de comprovativo da comunicação ao fiador do montante da rendas em dívida, em termos similares ao que a norma exige relativamente ao arrendatário».
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13-11-2014, no processo 7211/13.7YYLSB-B (Carlos Marinho), «Ainda que se entenda que o princípio da tipicidade dos títulos executivos e as demais razões invocáveis no sentido da exclusão da formação de título contra os fiadores em contrato de arrendamento não afastam a possibilidade de tal formação, sempre se impõe concluir - particularmente face à natureza complexa ou composta do aludido título - que, sem comunicação aos fiadores, nunca se constitui contra estes o titulo executivo referido no n.º 2 do art. 15.º do Novo Regime do Arrendamento Urbano e no artigo artigo 14.º-A aditado ao referido NRAU pela Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto».).
Em sentido afirmativo, argumenta-se do seguinte modo:
(I) O legislador ao dispor que «O contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário», previu um modo de formação do título executivo.
Ao não dizer contra quem podia ser acionado este título executivo assim formado, tem de se entender que ele pode ser acionado contra todos aqueles que nos termos do contrato de locação se obrigaram perante o senhorio a pagar as rendas, incluindo, portanto o fiador.
A lei não exigiu igual notificação em relação ao fiador, por não ser necessária.
Por conseguinte, onde a lei não distingue também não deve distinguir o intérprete, salvo se existirem boas razões para distinguir, o que não é o caso. Não é o caso porque a exigência da notificação do senhorio quanto às rendas em dívida tem por finalidade a liquidação extrajudicial da dívida que será objeto de execução.
Ora, é o arrendatário quem está melhor posicionado para controlar esta liquidação, já que sendo este o devedor deve saber se aquilo que o senhorio alega estar em dívida foi ou não foi efetivamente pago por si.
Já o fiador não terá o conhecimento preciso desta situação porque não é ele quem paga a renda.
Por ser esta a situação real, a lei só exigiu e exige a notificação do arrendatário, não se mostrando necessária a interpelação do fiador ( Neste sentido: Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 16-05-2011, no processo 515/10.2TBMAI-A (Rui Moura), «Demandando-se em acção executiva por falta de pagamento de renda o arrendatário e o fiador deste, é título executivo bastante também contra o fiador, o contrato de arrendamento e ainda o comprovativo da comunicação ao arrendatário do montante em dívida, perante a redacção do artigo 15º, nº 2 do RAU».
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-03-2013, no processo 8676/09.7TBMAI-A (Anabela Dias da Silva), «O contrato de arrendamento e comprovativo da comunicação ao arrendatário do montante das rendas em dívida constituem título executivo tanto contra o arrendatário como contra os seus fiadores».).
(II) O artigo 634.º do Código Civil determina que «A fiança tem o conteúdo da obrigação principal e cobre as consequências legais e contratuais da mora ou culpa do devedor».
Face a esta disposição legal, a notificação ao fiador da dívida do devedor não cumpre qualquer finalidade relevante e, por isso, não se deve exigir tal notificação como condição de exequibilidade do título ( Neste sentido, com voto de vencido, acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-03-2016, no processo 16777/13.0T2SNT-A (Maria Teresa Pardal), «O título executivo para acção de pagamento de rendas de um contrato de arrendamento, constituído pelo contrato de arrendamento e pela comunicação da quantia em dívida ao arrendatário, é também título executivo contra o fiador, sem que seja necessário comunicar-lhe previamente o montante em dívida como acontece com o arrendatário», onde são citados no mesmo sentido os seguintes acórdãos: «RL 22/10/2015, p. 4156/13 e decisão individual RL de 12/12/2008, p. 10790/2008 e acs RP 21/03/2013, p. 8676/09, 18/10/2011, p. 8436/09, 4/05/2010, p. 3913/08, 6/10/2009, p. 2789/09, 23/06/2009, p. 2378/07, 12/05/2009, p. 1358/07, todos em www.dgsi.pt)».).
Vejamos então que posição tomar face aos argumentos invocados.
Afigura-se que exigindo a lei apenas a notificação do arrendatário, a interpretação mais adequada ao texto da lei é aquela que entende que o título executivo se forma apenas em relação ao arrendatário.
Em primeiro lugar, pela razão invocada por Rui Pinto, acima mencionada, relativa à interpretação restritiva das normas que preveem a formação de títulos executivos, na medida em que estes permitem ultrapassar a fase do processo declarativo e com isto subtrair ao executado meios de defesa.
E isto é tanto mais relevante quando é certo que na forma sumária do processo executivo se procede à penhora antes da citação do executado – cfr. n.º 3 do artigo 855.º e n.º 2 e 3 do artigo 550.º, ambos do Código de Processo Civil.
E a generalidade dos processos executivos para cobrança de rendas seguirá esta forma processual.
É certo que, como ponderou o Prof. Alberto dos Reis, «Quando as circunstâncias são de molde a fazer crer que o direito de crédito existe realmente, quando o instrumento de obrigação se encontra revestido de formalidades que dão a garantia de que a execução movida com base nele não será injusta, atribui-se ao título eficácia executiva e poupa-se ao credor o dispêndio de actividade, tempo e dinheiro que representa o exercício da acção declarativa» ( Processo de Execução, I, 3.ª Edição, pág. 82.
).
Será este o caso, pois na generalidade das hipóteses não há qualquer dificuldade em verificar se a renda foi ou não foi paga pelo arrendatário, principalmente quando é paga por transferência bancária.
As dúvidas relevantes existirão somente nos casos em que a renda não é paga por motivos que o arrendatário considera justificados.
Porém, como resulta do artigo 14.º-A do NRAU, o contrato de arrendamento e a fiança não constituem só por si título executivo, sendo ainda necessária a notificação do arrendatário com a comunicação das rendas em dívida.
Ora, repugna que o título executivo se forme em relação ao fiador sem que, após o contrato, exista em relação a ele algum outro facto que mostre ter-lhe sido exigido o pagamento, podendo partir-se logo para a penhora.
Com efeito, a notificação prevista no artigo 14.º-A do NRAU, além da função de liquidação (até àquele momento), ainda tem uma finalidade relevante que é a de constituir uma derradeira interpelação do arrendatário devedor para que proceda ao pagamento, sob pena de execução.
Por conseguinte, justifica-se que não se constitua título executivo contra o fiador porquanto este, após o contrato, não teve qualquer relação com o senhorio, pelo que seria injustificado confrontá-lo com a existência de uma penhora – na execução sob a forma de processo sumário – sem que, após o contrato, tenha tido qualquer intervenção na formação do título executivo.
Sendo também de excluir que se forme título executivo contra o fiador se porventura o senhorio também o notificou nos mesmos termos em que notificou o arrendatário.
Com efeito, a notificação ao fiador não está prevista na lei e não estando prevista na lei não pode o tribunal criá-la ou atribuir-lhe valor jurídico, pois estaria a construir uma norma fora dos casos em que o pode fazer.
Estaria a reconstruir (aumentando-lhe o alcance) a norma do artigo 14.º-A por interpretação extensiva ou a construir uma nova norma por analogia.
Na interpretação extensiva o intérprete pode ir até ao limite do sentido literal ( «Em nossa opinião deveria chamar-se restritiva a uma interpretação que limite rigorosamente o significado duma expressão ao núcleo da representação – que, por exemplo, entenda por “filhos” apenas os filhos naturais –, e “extensiva” a uma interpretação que, para além disso, se estenda até ao limite do sentido literal possível, até ao “domínio marginal” – que, por exemplo, inclua também os filhos adoptivos, os pupilos, os enteados e talvez até (assim se alcançaria, decerto, o limite) os cônjuges dos filhos. Ir além do domínio marginal mais latamente concebido só é, então, possível por via da analogia» - Karl Larenz, Metodologia da Ciência do Direito. Edição da Fundação Calouste Gulbenkian,1978, pág. 399.).
Porém, onde se diz «notificação do arrendatário» não é possível inserir aí o fiador, porque o «fiador» não cabe na extensão do conceito «arrendatário», ou entender-se como «notificação do fiador», porque esta também não cabe no conceito «notificação do arrendatário».
Quanto à analogia, seria necessário mostrar a existência de uma lacuna e não se vê que exista lacuna alguma, pois não há no caso dos autos qualquer «litígio» ( Karl Larenz, Ob. Cit., pág. 428.) carecido de resolução entre o senhorio e o fiador, que demande uma solução jurídica só alcançável através da aplicação de uma norma, por analogia, que prevê a criação de um título executivo.
Com efeito, no caso, o senhorio pode obter título executivo contra o fiador através do recurso à ação declarativa, a qual lhe permitirá obter uma sentença condenatória.
É certo que o legislador poderia ter facilitado a tarefa do senhorio se tivesse acrescentado no artigo 14.º-A do NRAU a notificação ao fiador, mas não o fez.
Por conseguinte, o tribunal não pode por si mesmo determinar que havendo notificação do fiador passa a existir título executivo contra este.
Assim, ou a notificação feita ao arrendatário passa a constituir título executivo contra arrendatário e fiador ou então só pode valer contra o arrendatário.
Pelas razões já indicadas, entende-se que a notificação prevista no artigo 14.º-A do NRAU só permite formar título executivo contra o arrendatário.
Concluiu-se, por conseguinte, que no presente caso não há título executivo em relação ao fiador.
Improcede, por conseguinte, o recurso.
IV. Decisão
Considerando o exposto, julga-se o recurso improcedente e mantém-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente
*
Alberto Ruço ( Relator )
Vítor Amaral ( com declaração )
Luís Cravo

Declaração.
Votei a decisão por, no caso, faltar a notificação dos fiadores, apenas tendo ocorrido a notificação do arrendatário a que alude o art.º 14.º-A do NRAU (Lei n.º 6/2006, de 27-02, na redação introduzida pela Lei n.º 31/2012 de 14-08).
Assim, parece-me, em geral e com todo o respeito pela posição contrária, que o contrato de arrendamento, com fiança, se acompanhado do comprovativo da notificação do arrendatário nos termos previstos naquela norma e, bem assim, da notificação dos fiadores, constituiria, em paridade, título executivo também relativamente aos fiadores.
Como refere Luís Menezes Leitão, em Arrendamento Urbano, 8.ª ed., Almedina, Coimbra, 2017, ps. 220 e seg., “o fiador é igualmente parte no contrato de arrendamento, assumindo obrigação idêntica à do arrendatário relativamente ao pagamento da renda, e cobre as consequências da mora deste independentemente de interpelação (art. 634.º CC). Por outro lado, a lei não exige, para formação do título, que a comunicação seja efectuada igualmente ao fiador, pelo que naturalmente não estará o senhorio impedido de instaurar a acção executiva contra ambos”.
Parece, pois, não haver motivo de justiça substancial que permita/justifique dissociar, por regra, a posição dos fiadores relativamente ao arrendatário com fiança.
A tese contrária pareceria dificultar a posição do credor/senhorio (quando um tal título executivo de formação extrajudicial rápida serviria para facilitar a sua posição, uma vez privado do locado e das rendas), por ficar ele na posição de (ter de) intentar duas diversas ações judiciais, uma executiva contra o inquilino e outra declarativa condenatória contra o fiador (isto é, com base na mesma dívida, um obrigado pode estar a ser executado e o outro andar a discutir a obrigação em ação declarativa).
O que, de algum modo, pareceria estranho em termos de lógica/coerência do sistema.
A exigência de notificação também aos fiadores prende-se, a meu ver, com imperativos de boa-fé, a demandar informação e proporcionalidade (em paridade), sem deficit face à posição do arrendatário, previamente à execução, atento o gravoso efeito intrusivo patrimonial desta (os fiadores, uma vez conhecedores da situação, poderão pagar para evitar a execução ou, não o fazendo, defender-se adequadamente em sede de oposição à execução).
Vítor Amaral

Coimbra, 20 de março de 2018