Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRC | ||
| Relator: | PAULA MARIA ROBERTO | ||
| Descritores: | MOBILIDADE FUNCIONAL COMUNICAÇÃO FUNDAMENTADA CATEGORIA PROFISSIONAL DIVERSA DIFERENÇAS SALARIAIS | ||
| Data do Acordão: | 11/20/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | JUÍZO DO TRABALHO DA COVILHÃ DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO | ||
| Texto Integral: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Legislação Nacional: | ARTIGOS 118.º, 120.º, 129.º E 314.º DO CÓDIGO DO TRABALHO | ||
| Sumário: | I – A mobilidade funcional, também apelidada de jus variandi tem como característica uma modificação temporária, consubstanciando-se numa ordem do empregador no sentido de o trabalhador passar, temporariamente, a exercer funções não compreendidas na atividade contratada.
II – No entanto, o facto de não se ter apurado a existência de uma comunicação fundamentada por parte do empregador com a indicação da duração previsível do exercício das funções não compreendidas na atividade contratada, não constitui obstáculo à aplicação do instituto da mobilidade funcional. III – Tendo a Autora passado também a exercer funções de técnica superior, ou seja, funções correspondentes a outra categoria profissional e não afins ou funcionalmente ligadas àquela atividade contratada e durante determinados meses do ano, deparamo-nos face a uma espécie de “mobilidade funcional atípica”. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam[1] na Secção Social (6.ª Secção) do Tribunal da Relação de Coimbra:
I - Relatório
AA, residente no ...
intentou a presente ação de processo comum, contra
Unidade Local de Saúde da Cova da Beira, EPE, com sede na Covilhã
alegando, em síntese que: A partir de janeiro de 2004 deixou de desempenhar as funções para as quais havia sido admitida ao serviço da Ré, de assistente técnica, e passou a desempenhar as funções de técnica superior; tinha e tem o direito de ser remunerada pela categoria funcional que exerceu e a que corresponde retribuição superior; a Ré deve-lhe a quantia global de 169.665,02 respeitante aos anos de 2004 a 2024; é aplicável à relação de trabalho o CCT celebrado entre o centro hospitalar Montijo EPE e o SNTFPS do qual a A. é associada, publicado no BTE n.º 23/2018. Termina formulando o seguinte pedindo: “Nestes termos, deve a presenta acção ser julgada procedente, por provada, e, por via disso: a) condenada a Ré a pagar à Autora a quantia de 169.665,02 € (cento e sessenta e nove mil seiscentos e sessenta e cinco euros e dois cêntimos) de diferenças salariais relativas ao vencimento base; b) pagar os juros à taxa legal de 4% ao ano vencidos e vincendos, que, nesta data, somam já a quantia de 75.629,37 € (setenta e cinco mil seiscentos e vinte e nove euros e trinta e sete cêntimos), tudo, de resto, com as demais consequências legais.” * A Ré contestou alegando, em sinopse, que: A A. exerceu e exerce funções de assistente administrativa, categoria que veio a ser redenominada de assistente técnica, a serviço da Ré; para além de não exercer funções de técnica superior desde 2004, a A. não dispunha desde então da licenciatura, requisito de elegibilidade para o ingresso na carreira de técnico superior e mesmo que a tenha obtido em 2010, o acesso a tal carreira ocorre mediante procedimento de recrutamento, o que a Ré não promoveu; o pedido da Autora é ilícito porque viola noma constitucional e o artigo 14.º do DL n.º 233/2005, de 29/12. Termina, dizendo que: “Nestes termos e nos demais de Direito, deve a presente ação ser julgada totalmente improcedente, por não provada, e, consequentemente, a Ré absolvida de todo o pedido, tudo com as demais consequências legais, nomeadamente quanto a custas processuais.” * Foi proferido despacho saneador e não foram enunciados o objeto do processo nem os temas da prova. * Procedeu-se a julgamento conforme resulta das respetivas atas. * Foi, depois, proferida sentença cujo dispositivo tem o seguinte teor: “Pelo exposto, julgando-se parcialmente procedente a presente ação condena-se a ré Unidade Local De Saúde Da Cova Da Beira, EPE a pagar à autora AA, o montante a apurar em incidente próprio, correspondente às diferenças entre o montante auferido por esta e o auferido por um técnico superior, ao serviço da ré, entre 2004 e o presente, nos meses em que esta realizou as tarefas de elaborar e submeter as candidaturas a fundos estruturais europeus para financiamento das ações de formação, como por exemplo o Programa Operacional Inclusão Social e Emprego (POISE) e o Programa Operacional Potencial Humano (POPH).” * A Ré, notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte: (…). * A Autora apresentou resposta concluindo que: (…). * O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer (…). * Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir. * II – Questões a decidir: Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 639.º do CPC) com exceção das de conhecimento oficioso. Cumpre, então, apreciar as questões suscitadas pela Ré recorrente, quais sejam: 1ª – Reapreciação da matéria de facto. 2ª – Se a Autora não exerceu funções correspondentes à categoria de técnico superior não lhe sendo devidas quaisquer quantias a título de diferenças salariais. * * III – Fundamentação a) Factos provados e não provados constantes da sentença recorrida: 1. A Ré desenvolve, como atividade principal, a prestação de serviços de cuidados de saúde. 2. A Ré é, também, uma entidade pública empresarial. 3. Sendo subscritora do Acordo Coletivo, celebrado entre o Centro Hospitalar do Barreiro, A... e a Federação Nacional do Sindicato dos Trabalhadores em funções públicas e Sociais, publicado no BTE nº 23 de 2018. 4. A autora é sindicalizada naquele sindicato com o nº ...24. 5. A Autora iniciou funções ao serviço da Ré, em 16 de setembro de 1996, ao abrigo do Programa de Atividades Ocupacional de 2 de dezembro de 1997 a 30 de setembro de 1999, foi contratada em regime de Contrato de Trabalho, a termo certo, e, de igual forma, de 1 de outubro de 1999 a 30 de setembro de 2001, de 7 de novembro de 2001 a 30 de junho de 2002, ao abrigo do POC, de 1 de julho de 2002 a 30 de 2003, foi contratada a termo certo, contrato este convertido, sem termo a 1 de julho de 2003. 6. Neste último contrato sem termo foi contratada com a categoria de assistente administrativa, mediante a retribuição de 661,59 €. 7. Auferindo a remuneração fixada para os trabalhadores a exercerem funções públicas na categoria de assistente técnica, remuneração esta que continua a ser-lhe paga. 8. Em janeiro de 2004, Dr.ª BB chefe de serviços e diretora do Serviços de Recursos Humanos, entregou à autora todo o serviço administrativo geral de formação e o processo de candidaturas ao Fundo Social Europeu. 9. Da sobredita declaração consta que a funcionária exerceu, com mérito e excelência, as funções que lhe foram cometidas e à qual ninguém foi capaz de se responsabilizar. – eliminado. 10. Mais aí se fez constar que, até esta data, ou seja o ano de 2022, a Autora se mantem no serviço de formação e continua a ser a única que resolve todos e qualquer problema sobre os sobreditos processos administrativos e candidaturas. – eliminado. 11. Desta declaração é dito que as funções são equiparadas à categoria de técnica superior. – eliminado. 12. A Autora é responsável, por determinação da Ré, por: a. - elaborar e enviar os pedidos de saldo referentes aos projetos; b. - emitir certificados de candidaturas de formação interna e de formação de serviço; c. - preencher bases de dados relativos a todas as ações de formação; d. - elabora e submete as candidaturas a fundos estruturais europeus para financiamento das ações de formação, como por exemplo o Programa Operacional Inclusão Social e Emprego (POISE) e o Programa Operacional Potencial Humano (POPH). e. - elabora e envia participações individuais; f. - imprime e divulga os Programas das ações de formação por todos os serviços do Hospital ..., Hospital ... e Departamento ...; g. - organiza o dossier pedagógico de cada ação de formação, folhas de custo, notas de lançamento e dossier contabilístico. h. - prepara a lista dos participantes selecionados para cada ação de formação e divulgação da mesma pelos serviços; i. - elabora a folha de participantes para entrega nos serviços de contabilidade e Recursos Humanos; j. - apoia logisticamente as ações de formação que decorrem no serviço de ensino e formação bem como as ações de formação que correm nos serviços; k. – afixa os placares informativos e arquiva os panfletos das ações de formação de outras instituições; l. - reúne e recolhe os dados para a realização do balanço social; m. - acompanha a receção de novos estagiários (emite o cartão de identificação, envia as comunicações do centro hospitalar à Escola, reproduz impressos, recolhe ficha de identificação e de avaliação dos estagiários, regista os alunos e controla a devolução dos cartões de identificação e impressos; n. - regista a assiduidade referente às ações de formação (recursos Humanos e Vencimentos) o. - realiza requisições e levanta o material necessário para as ações de formação aos serviços de aprovisionamento; p. - trata o expediente geral dos serviços de ensino e formação; q. - efetua atendimento presencial ao público interno. 13. A Autora, em 20 de setembro de 2010, concluiu a sua licenciatura em gestão de recursos humanos. 14. A Autora, a partir de janeiro de 2004, deixou de desempenhar as funções para as quais havia sido admitida ao serviço da Ré e passou a desempenhar as funções acima descritas e identificadas, por determinação da Ré. 15. A autora percecionou da Ré, a partir de janeiro de 2004, o valor de 605,14 € (seiscentos e cinco euros e catorze cêntimos) de retribuição base; 16. A partir de maio de 2004 passou a auferir 705,78 € (setecentos e cinco euros e setenta e oito cêntimos) de retribuição base; 17. A partir de fevereiro de 2005 a autora passou a auferir o vencimento base de 721,31 € (setecentos e vinte e um euros e trinta e um cêntimos); 18. A partir de março 2006 foram pagos mensalmente à autora € 732,14 (setecentos e trinta e dois euros e catorze cêntimos) de remuneração base; 19. Situação que se manteve até fevereiro de 2007 data em que a autora passou a auferir €743,12 € (setecentos e quarenta e três euros e doze cêntimos) de remuneração base; 20. A partir de fevereiro de 2008 a autora passou a auferir 758,72 € (setecentos e cinquenta e oito euros e setenta e dois cêntimos) de remuneração base; 21. Em fevereiro de 2009 a retribuição da autora foi aumentada para 780,72 € (setecentos e oitenta euros e setenta e dois cêntimos) de retribuição base; 22. Situação que se manteve até dezembro de 2019, data em que a autora passou a auferir 837,60€ (oitocentos e trinta e sete euros e sessenta cêntimos) de retribuição base. 23. Em maio de 2019 a retribuição da autora foi aumentada para 840,11 € (oitocentos e quarenta euros e onze cêntimos) de remuneração base; 24. No ano subsequente, a Ré pagou à Autora a partir de janeiro de 2022, o valor de 847,67 € (oitocentos e quarenta e sete euros e sessenta e sete cêntimos) de retribuição base; 25. Em junho desse ano a retribuição da autora foi aumentada para 903,77 € (novecentos e três euros e setenta e sete cêntimos) de retribuição base 26. Em janeiro de 2023, a Autora recebeu ao invocado título, o valor de 1.007,49 € (mil e sete euros e quarenta e nove cêntimos) a título de remuneração base; 27. Em fevereiro 1.007,49 € (mil e sete euros e quarenta e nove cêntimos) a título de remuneração base; 28. Em maio desse ano a autora passou a auferir 1.017,56 € (mil e dezassete euros e cinquenta e seis cêntimos) a título de remuneração base; 29. Em janeiro de 2024 foi paga a retribuição de 1.070,19 € mil e setenta euros e dezanove cêntimos). 30. A Autora esteve de baixa, no ano de 2017, de 21 de fevereiro a 24 de Abril. 31. No ano de 2019, A Autora esteve, ainda, de baixa de 17 de junho a 19 de setembro. 32. No ano de 2021, a Autora esteve, também de baixa no período de 21 de junho a 14 de setembro. 33. No ano de 2022, a Autora esteve na situação, baixa médica, de 15 de junho a 2 de setembro. Factos não provado: A. A Autora é responsável, por determinação da Ré, por: . avaliar e elaborar protocolos de convenção de estágios; . gerir as verbas atribuídas pelas instituições privadas nos Serviços de Enfermagem; . gerir as salas de serviços e ensino e formação destinadas à ação de formação bem como para outros fins necessários; “Fundamentação – Dos Factos (…). * * b) - Discussão Apreciando as questões suscitadas pela Ré recorrente: 1ª questão Reapreciação da matéria de facto Conforme resulta do disposto no artigo 640.º, do C.P.C.: <<1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; (…)>>. Acresce que, a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação nos casos previstos no artigo 662.º, do CPC. A Ré recorrente pretende, e fê-lo constar das conclusões do seu recurso, que sejam dados como não provados os factos que enuncia, com base nas declarações de parte, no depoimento das testemunhas e nos documentos que identifica, indicando as passagens da gravação em que funda o seu recurso. Assim sendo, a recorrente cumpriu na totalidade o ónus a seu cargo que se encontra previsto nas citadas alíneas a) a c) do n.º 1 e no n.º 2, b), do artigo 640.º, do C.P.C., pelo que, este tribunal pode proceder à reapreciação da matéria de facto. Apreciando: Este tribunal procedeu à audição de toda a prova produzida e analisou todos os documentos juntos aos autos. Vejamos, então, se assiste razão à recorrente seguindo as suas alegações. Alega a recorrente, além do mais, que: - A declaração que motivou a prova dos factos números 9, 10 e 11 do segmento II - Motivação da Sentença, referente ao Documento n.º 6 junto com a petição inicial, representa um documento emitido pela testemunha BB quando já se encontrava aposentada do exercício das funções que desempenhou ao serviço da Ré, não podendo, pois, àquela data, ser detentora de qualquer conhecimento acerca do desempenho funcional da Autora, visto que, a partir da data em que se aposentou (em 2015), deixou de comparecer nos serviços da Ré, cessando a relação profissional que mantinha com as partes; - Das declarações prestadas pela sobredita testemunha BB, arrolada pela Autora, em sede de audiência de discussão e julgamento, decorre que emitiu o sobredito documento a título de apreciação pessoal face à Autora, atendendo à relação próxima que demonstrou existir entre ambas nas declarações que prestou no início do seu depoimento – que o próprio Tribunal a quo reconheceu, declarando a própria testemunha comprometer o seu depoimento a um concreto resultado da lide a favor da Autora, não podia o Tribunal a quo dar como provada a matéria de facto constante dos números 9, 10 e 11 da II - Motivação da Sentença, na medida em que se funda na declaração de índole inteiramente pessoal emitida pela testemunha, sem conhecimento direto e presencial da factualidade controvertida, a que acresce o cariz nitidamente tendencioso do depoimento por si prestado; - Assim, o Tribunal recorrido comete erro notório na apreciação da prova, devendo o sentido a conferir à factualidade vertida nos números 9, 10 e 11, ser o de não provado. Por outro lado, resulta dos pontos 9, 10 e 11 da matéria de facto provada: 9. Da sobredita declaração consta que a funcionária exerceu, com mérito e excelência, as funções que lhe foram cometidas e à qual ninguém foi capaz de se responsabilizar. 10. Mais aí se fez constar que, até esta data, ou seja o ano de 2022, a Autora se mantem no serviço de formação e continua a ser a única que resolve todos e qualquer problema sobre os sobreditos processos administrativos e candidaturas. 11. Desta declaração é dito que as funções são equiparadas à categoria de técnica superior. Vejamos: Resulta destes pontos da matéria de facto parte do que consta da declaração curricular junta aos autos com a petição inicial (doc. n.º 6), emitida pela testemunha BB e datada de 11/04/2022. Como alega a Ré recorrente, e resulta do depoimento da própria testemunha BB, a mesma exerceu as funções de DSRH e formação da Ré até 2015, data em que se aposentou. Assim sendo, o que consta da mesma não consubstancia qualquer declaração emitida por um diretor de serviço da Ré mas antes uma declaração pessoal da respetiva autora, testemunha que prestou depoimento em audiência de julgamento, sendo este que releva em termos probatórios e não aquela que mais não é do que um depoimento escrito legalmente inadmissível. Na verdade, as testemunhas depõem na audiência final, presencialmente ou através de teleconferência, exceto nas situações previstas no artigo 500.º do CPC, o que não ocorre no caso em apreciação. Pelo exposto, é nosso entendimento que não pode constar da matéria de facto provada o conteúdo de tal declaração e, por isso, eliminam-se da mesma matéria os pontos 9, 10 e 11. * Mais alega a recorrente que: - A respeito da elaboração e submissão, pela Autora, de candidaturas aos fundos estruturais europeus para financiamento das ações de formação – factualidade dada como provada nos números 12 e 14da II - Motivação da Sentença -, o sentido decisório a atribuir a tal matéria de facto só pode ser o de não provado – impondo-se a respetiva alteração -, visto que, verdadeiramente, o papel da Autora nesta atividade revela-se meramente complementar, prestando auxílio aos coordenadores de serviço, nunca atuando autonomamente – como sucede das declarações de parte prestadas pela mesma em sede de audiência de discussão e julgamento. - Tal circunstância é ainda corroborada pelo depoimento da testemunha CC, arrolada por ambas as partes. - Adicionalmente, o Tribunal a quo menciona que a testemunha DD, arrolada pela Autora, «(…) explicou que trabalhou com a autora, quando era o responsável pelo departamento de formação da parte médica, entre 2000/2004, explicou que a autora dava apoio nas candidaturas (…)» - outro meio probatório que corrobora a característica de apoio prestado pela Autora na tarefa respeitante às candidaturas. - Por oposição ao sentido decisório determinado pelo Tribunal recorrido quanto aos pontos 12 e 14 da matéria de facto dada como provada, cabe ainda atender aos seguintes excertos de transcrição das declarações prestadas pela testemunha EE: (…) - Acresce que, quanto à tarefa de submissão das sobreditas candidaturas, a testemunha EE - coordenadora do serviço de formação - e a testemunha CC - diretora do serviço de formação -, declararam ser uma incumbência do departamento de contabilidade, responsável pela gestão dos custos financeiros e previsão dos custos afetos a cada candidatura, e não da Autora; - Assim, incontestavelmente, se denota que a atuação da Autora no domínio do desenvolvimento de candidaturas aos fundos europeus é elementar, correspondendo à recolha de informação e respetiva inserção nas minutas pré-definidas das plataformas eletrónicas disponibilizadas, traduzindo-se num suporte ao trabalho executado pelos coordenadores de serviço, após a tomada de decisão e definição por estes últimos das diretrizes a seguir – conforme relatado pela própria Autora e restantes testemunhas; - Pelo que, a simples colaboração e participação na tarefa de elaboração e submissão de candidaturas aos fundos estruturais europeus para financiamento das ações de formação, não é, evidentemente, subsumível à complexidade inerente à responsabilidade das tomadas de decisão que antecedem a submissão e à própria submissão das candidaturas - sendo tal tarefa desempenhada pelos seus superiores hierárquicos, enquanto técnicos superiores – pois, afinal, a prova produzida demonstra que a Autora não elabora completamente, nem sequer submete as candidaturas aos fundos estruturais europeus para financiamento das ações de formação. - Por falta de prova de facto constitutivo do direito a que o titular se arroga – cujo ónus sobre si recai, nunca poderia o Tribunal a quo decidir a matéria de facto controvertida como decidiu, constituindo um clamoroso erro na apreciação da prova o sentido decisório atribuído aos factos respeitantes aos números 12 e 14 da sentença recorrida, importando que, em ambos, o mesmo seja revertido e alterado para não provado. (…).
2ª questão Se a Autora não exerceu funções correspondentes à categoria de técnico superior não lhe sendo devidas quaisquer quantias a título de diferenças salariais. Alega a recorrente que: - Retira-se da decisão judicial recorrida que a categoria de um trabalhador resulta das tarefas que este efetivamente executa e do “núcleo essencial” das funções que exerce, devendo verificar-se o princípio da efetividade entre a atividade exercida e a categoria contratual do trabalhador – garantindo que as tarefas por si desempenhadas correspondem ao núcleo essencial das funções integrantes da categoria a que se vinculou contratualmente; - Considera, ainda, o Tribunal a quo que “(…) a grande maioria das atividades realizadas diariamente pela Autora têm cariz administrativo e, como tal subsumíveis à categoria de assistente técnico (…)”; - Admitindo-se que a Autora executa a atividade de elaboração e desenvolvimento de candidaturas, prontamente se constata que tal função possui carácter pontual e ocasional, conforme reconhece o próprio Tribunal a quo: “(…) a apresentação de candidaturas a fundos estruturais é, por sua natureza, uma atividade que não se enquadra no quotidiano de uma organização. Diferentemente das tarefas diárias ou rotinas operacionais, que estão integradas no fluxo contínuo de trabalho, as candidaturas a fundos estruturais têm características que as tornam um evento pontual e esporádico.”; - Motivo pelo qual, resultando da sentença recorrida que “Exercendo o trabalhador diversas atividades enquadráveis em diferentes categorias profissionais, como é o caso, a sua classificação deve fazer-se tendo em conta o núcleo essencial das funções por ele desempenhadas ou a atividade predominante (…)”, improcedeu (bem) o pedido de requalificação para a categoria de técnico superior; - Mas, também por esta razão, não se entende como pode o Tribunal recorrido condenar a Ré a remunerar a Autora mensalmente - ou seja, por períodos de meses completos - por tarefas que, porventura, a mesma desempenhou ocasional e esporadicamente, apenas em algumas horas ou alguns dias de alguma(s) semana(s) do mês, nos períodos dispersos em que abriram as supracitadas candidaturas. - É absolutamente desproporcional e desprovido de razoabilidade, por falta de coerência lógica, a decisão do Tribunal a quo de condenação da Ré na remuneração à Autora, a título mensal, pelo desempenho de funções que, equacionando-se, por mera cautela de patrocínio, executadas, tê-lo-ão sido em momentos completamente ocasionais e dispersos, nunca ocupando, em exclusividade e ininterruptamente, um mês completo de trabalho; - Assim, a sentença recorrida apresenta erro patente de Direito por violação do princípio da proporcionalidade que subjaz à decisão de condenação judicial aplicada à Ré, devendo, assim, ser revogada; - Ademais, a fundamentação da sobredita condenação da Ré ao abrigo da aplicação do instituto da mobilidade funcional, mostra-se, igualmente, errónea, porquanto – para além de resultar da prova gravada que a Autora apenas prestava apoio na elaboração das candidaturas a fundos estruturais europeus para financiamento das ações de formação - não se encontram reunidos os pressupostos cumulativos legalmente previstos no artigo 120.º do Código do Trabalho, a saber: existência de um interesse legítimo do empregador na modificação, transitoriedade da necessidade que determina a modificação, inexistência de uma alteração substancial da posição do trabalhador; - Em suma: não estão preenchidos os pressupostos legalmente previstos para a aplicação do regime da mobilidade funcional, concretamente, carência de imposição, por parte da Ré, da colaboração da Autora em tarefas para as quais não fora contratada, justificada nos interesses empresariais daquela, durante um período temporal limitado até ao máximo de dois anos; - Sendo o conteúdo funcional da categoria profissional de técnico superior caracterizado por um maior grau de complexidade, autonomia técnica e responsabilidade – como se conclui da descrição presente no anexo I do ACT publicado no BTE n.º 23, de 23/06/2018, que o Tribunal identifica no segmento “2 – O Direito” da sentença recorrida -, não coincidente com as funções colaborativas desempenhadas pela Autora, não tem de ser esta remunerada em função do nível remuneratório devido a um trabalhador com a categoria profissional de técnico superior, razão pela qual, não poderia o Tribunal a quo subsumir as funções desempenhadas pela Autora ao regime de remuneração previsto para a categoria profissional de técnico superior, incorrendo, notoriamente, em erro de Direito, e desobediência ao artigo 59.º, n.º 1, alínea a) da Lei Fundamental, cabendo, por conseguinte, ao Tribunal ad quem revogar a decisão recorrida. Por outro lado, a este propósito consta da sentença recorrida, além do mais, o seguinte: “Não é objeto de controvérsia a aplicação à relação laboral sub judice do ACT sob análise, pois nenhuma das partes o contesta, tendo a autora logrado provar a sua filiação sindical no Sindicato dos Trabalhadores em funções públicas e Sociais. (…) * Depois destas breves considerações, avancemos para a apreciação do mérito da pretensão da autora, Como sabemos, a autora pretende ser integrada na categoria de técnica superior, sendo a ré condenada pagar-lhe as diferenças salariais correspondentes aos valores que tinha direito a receber pelo seu trabalho e os que efetivamente recebeu. É ponto assente que a reclassificação da autora na carreira, deve limitar-se às carreiras gerais, elencadas no anexo a que se refere o n.º 2 do artigo 88.º da Lei n.º 35/2014 de 20 de junho (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas – LGTFP). Ora, dispõe a cláusula 32.ª do ACT temos vindo a aplicar, que: 1- Os trabalhadores filiados nas estruturas sindicais outorgantes do presente AC, contratados pelos estabelecimentos de saúde igualmente outorgantes, em regime de contrato de trabalho, para o exercício de funções correspondentes ao conteúdo funcional das carreiras reguladas no presente AC, transitam para a categoria e carreira correspondente, ficando por ele abrangidos. 2- Com prejuízo do disposto no número anterior, a aplicação da cláusula 11.ª do presente AC, circunscreve-se aos trabalhadores cujo valor hora da respetiva remuneração base não exceda, na sequência da alteração do período normal de trabalho aqui previsto, o dos correspondentes trabalhadores com contrato de trabalho em funções públicas. 3- Para efeitos do disposto no número anterior, deve reconstituir-se a situação do correspondente trabalhador à data em que foi contratado pela entidade pública empresarial para o exercício do conteúdo funcional que o mesmo assegure à data da entrada em vigor do presente AC e apurar qual seria o seu posicionamento remuneratório, caso o mesmo tivesse celebrado um contrato de trabalho em funções públicas com um salário base igual ao da primeira posição remuneratória, e calcular a proporção face ao salário com que este trabalhador foi contratado. 4- Nos casos em que os trabalhadores aufiram remuneração superior à que corresponderia a idênticos trabalhadores com contrato de trabalho em funções públicas, podem os mesmos, ainda assim, mediante declaração escrita, optar pelo de período normal de trabalho previsto na cláusula 11.ª, sendo a remuneração a auferir ajustada, aplicando a proporção calculada nos termos previstos no número 3 da presente cláusula ao salário base correspondente à sua posição atual na carreira, produzindo efeitos no dia 1 do mês seguinte ao da apresentação daquela declaração. 5- Todas as situações não abrangidas pelos números 2 a 4 da presente cláusula dependem de acordo entre o trabalhador e a entidade empregadora, a materializar em adenda ao correspondente contrato de trabalho. Desde já se adianta que, independentemente da reclassificação da categoria da Autora, a ré está obrigada a pagar a remuneração correspondente à categoria em que se inserem as funções por aquela exercidas, em condições idênticas às dos demais trabalhadores que essas exercem, em conformidade aliás, como se viu, com o estabelecido no Código do Trabalho, sob pena de violação de elementares princípios gerais como o da igualdade e da justiça, com repercussão também no âmbito laboral, assim desde logo o primado legal e constitucional de salário igual trabalho igual (al. a), do n.º 1, do artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa). Vejamos então se a autora vem a exercer funções correspondentes ao conteúdo funcional da carreira de técnico superior. Importa, desde logo partir do princípio que “compete ao trabalhador invocar e provar os factos que podem ser conducentes a que se conclua que o trabalho efetivamente prestado é merecedor de ser incluído numa categoria distinta”, podendo o conceito de categoria profissional, sumariamente ser definido como a posição do trabalhador na organização produtiva em que se integra pelo contrato de trabalho definida através do conjunto de serviços e tarefas que formam o objeto da prestação laboral. Neste contrato a categoria profissional atribuída à autora é a de assistente técnica, contudo a categoria de um trabalhador não é a da definição que lhe foi atribuída, mas a que resulta das tarefas que executa ou funções efetivamente exercidas. A categoria profissional deve corresponder ao núcleo essencial das funções a que o trabalhador se vinculou legal ou contratualmente[2]. O descritivo da categoria vem no Anexo I do ACT a que nos vimos referindo o assistente técnico exerce “Funções de natureza executiva, de aplicação de métodos e processos, com base em diretivas bem definidas e instruções gerais, de grau médio de complexidade, nas áreas de atuação comuns e instrumentais e nos vários domínios de atuação dos órgãos e serviços.” Assim dado por assente que, no âmbito desse contrato, a autora efetuou as tarefas acima elencadas, a questão que se coloca é saber se as mesmas estão compreendidas na caracterização da categoria de técnica superior, como aquela pretende. As funções de técnico superior, estão descritas no anexo I do ACT citado, nos seguintes termos: “Funções consultivas, de estudo, planeamento, programação, avaliação e aplicação de métodos e processos de natureza técnica e/ou científica, que fundamentam e preparam a decisão. Elaboração, autonomamente ou em grupo, de pareceres e projetos, com diversos graus de complexidade, e execução de outras atividades de apoio geral ou especializado nas áreas de atuação comuns, instrumentais e operativas dos órgãos e serviços. Funções exercidas com responsabilidade e autonomia técnica, ainda que com enquadramento superior qualificado. Representação do órgão ou serviço em assuntos da sua especialidade, tomando opções de índole técnica, enquadradas por diretivas ou orientações superiores.” Relembremos pois, o conteúdo funcional da atividade que a autora, remuneradamente e sob a autoridade da ré, desenvolve: a. - elaborar e enviar os pedidos de saldo referentes aos projetos; b. - emitir certificados de candidaturas de formação interna e de formação de serviço; c. - preencher bases de dados relativos a todas as ações de formação; d. - elaborar e submeter as candidaturas a fundos estruturais europeus para financiamento das ações de formação, como o Programa Operacional Inclusão Social e Emprego (POISE) e o Programa Operacional Potencial Humano (POPH). e. - elabora e envia participações individuais; f. - imprime e divulga os Programas das ações de formação por todos os serviços do Hospital ..., Hospital ... e Departamento ...; g. - organiza o dossier pedagógico de cada ação de formação, folhas de custo, notas de lançamento e dossier contabilístico. h. - prepara a lista dos participantes selecionados para cada ação de formação e divulgação da mesma pelos serviços; i. - elabora a folha de participantes para entrega nos serviços de contabilidade e Recursos Humanos; j. - apoia logisticamente as ações de formação que decorrem no serviço de ensino e formação bem como as ações de formação que correm nos serviços; k. – afixa os placares informativos e arquiva os panfletos das ações de formação de outras instituições; l. - reúne e recolhe os dados para a realização do balanço social; m. - acompanha a receção de novos estagiários (emite o cartão de identificação, envia as comunicações do centro hospitalar à Escola, reproduz impressos, recolhe ficha de identificação e de avaliação dos estagiários, regista os alunos e controla a devolução dos cartões de identificação e impressos; n. - regista a assiduidade referente às ações de formação (recursos Humanos e Vencimentos) o. - realiza requisições e levanta o material necessário para as ações de formação aos serviços de aprovisionamento; p. - trata o expediente geral dos serviços de ensino e formação; q. - efetua atendimento presencial ao público interno. Da panóplia de funções elencadas, dúvidas não restam de que a autora realiza funções de cariz administrativo integráveis na categoria de assistente técnica – cfr. alíneas a., b., c., e., f., g., h., i., j., k., l., m., n., o., p. e q. Maiores reservas se nos apresentam as funções de: - elaborar e submeter as candidaturas a fundos estruturais europeus para financiamento das ações de formação, como o Programa Operacional Inclusão Social e Emprego (POISE) e o Programa Operacional Potencial Humano (POPH). Os programas de financiamento europeus, como os disponibilizados pela União Europeia através de fundos estruturais (como o Programa Operacional Inclusão Social e Emprego (POISE) e o Programa Operacional Potencial Humano (POPH)) ou outros instrumentos, seguem regulamentos específicos e exigem análise rigorosa de informações, alinhamento com prioridades estratégicas e fundamentação técnica sólida. O POPH é o programa que concretiza a agenda temática para o potencial humano inscrita no Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN), documento programático que enquadra a aplicação da política comunitária de coesão económica e social em Portugal no período 2007-2013. O POISE (Programa Operacional Inclusão Social e Emprego) é um programa operacional cofinanciado pelo Fundo Social Europeu (FSE), no âmbito do período de programação dos fundos europeus 2014-2020, que visa promover a inclusão social, combater a pobreza e melhorar o acesso ao emprego e à qualificação em Portugal[3]. Da análise do dos guias dos programas operacionais em causa POISE e POPH[4], resulta que o processo de candidatura a fundos estruturais europeus, implica, necessariamente a análise de documentos e do regulamento europeu que define regras para a aplicação de fundos estruturai o que pressupõe, necessariamente, conhecimento especializado, formação superior e autonomia técnica do promocional que procede a essa análise. É pressuposto lógico da apresentação de tais candidaturas, que o profissional leve a cabo a avaliação da elegibilidade e a identificação de necessidades institucionais, o que implica uma atividade de diagnóstico e planeamento estratégico. Também estas características integram as competências do técnico superior, nos termos em que tal categoria profissional se encontra atrás definida. O profissional deve identificar as oportunidades de financiamento, interpretar os requisitos dos programas e avaliar a elegibilidade da entidade candidata, o que, naturalmente envolve o estudo de regulamentos europeus, documentos técnicos e diretrizes de aplicação. A construção de candidaturas exige necessariamente uma análise detalhada das necessidades da organização, projeção de impacto do projeto proposto e adequação às normas de avaliação do financiador. É inerente à função em causa, a interpretação de diretrizes normativas – as regras específicas do programa- e a escolha de metodologias e estratégias, não se tratando, ao contrário do que a ré quis fazer passar, de uma mera introdução de dados objetivos numa plataforma digital ou preenchimento de formulários. Essas tarefas só podem refletir a aplicação de métodos e processos técnicos e/ou científicos, que são pilares das funções de um técnico superior. A própria elaboração técnica da candidatura, implica a apresentação de fundamentação técnica o uso de plataformas digitais, como o Balcão 2020, e a interação com como resulta da análise dos guias disponíveis para consulta on line, atrás mencionados, implicando que o autor da candidatura detenha conhecimento das normas dos planos operacionais, capacidade de gestão de projetos, ao nível do planeamento e controle financeiro, capacidades analíticas, para interpretar dados, e, finalmente, o domínio das plataformas digitais. Também podemos concluir, com um elevado grau de certeza, que o grau de responsabilidade da autora, ao apresentar as candidaturas aos fundos estruturais é elevado, pois, um erro na candidatura pode resultar na rejeição do projeto e perda de financiamento, e, pelo contrário, o sucesso da proposta pode garantir milhares de euros para a execução dos projetos estratégicos. Assim sendo, entende este tribunal, s.m.o., que a elaboração e submissão de candidaturas aos fundos estruturais europeus, como o POISE e o POPH, é uma função que exige competências técnicas avançadas, autonomia e responsabilidade, apenas harmonizável com o conteúdo funcional e formação académica de um técnico superior, extravasando amplamente a competência de um assistente técnico, que detém funções meramente administrativas. O impacto estratégico dos projetos reforça a relevância desse enquadramento, devendo o profissional que desempenha essas atividades ser integrado na categoria profissional de técnico superior. Ora, desta materialidade, resulta, sem dúvida, o exercício, pela autora de funções de técnico superior, considerando que as tarefas em causa materializam funções de estudo, de aplicação de métodos e processos de natureza científica a elaboração de projetos, com diversos graus de complexidade, e execução de outras atividades de apoio geral ou especializado nas áreas de atuação comuns, instrumentais e operativas dos órgãos e serviços, tomando opções de índole técnica, ainda que, enquadradas por diretivas ou orientações superiores. Funções que, naturalmente, pressupõem responsabilidade e autonomia técnica, ainda que com enquadramento superior qualificado, sendo enquadráveis nas funções de técnico superior nos termos em que a categoria é definida no Anexo I. ao ACT aplicável. _ Como já foi referido, pretendendo a autora que se lhe reconheça uma dada categoria-estatuto ou normativa prevista em IRCT aplicável à relação de trabalho entre ele e a ré, a mesma tinha o ónus de alegar e provar as funções que efetivamente exercia no desempenho quotidiano da sua atividade funcional, por forma a poder concluir-se no sentido de que esse desempenho funcional deveria integrar-se no núcleo essencial da categoria normativa a que se arroga. Avançando, De acordo com a matéria de facto apurada, e com o enquadramento atrás realizado, a autora exerce no âmbito da relação laboral em apreço, funções compreendidas, quer na categoria de assistente técnica, quer de técnica superior. Exercendo o trabalhador diversas atividades enquadráveis em diferentes categorias profissionais, como é o caso, a sua classificação deve fazer-se tendo em consideração o núcleo essencial das funções por ele desempenhadas ou a atividade predominante e, sendo tal diversidade indistinta, deve o trabalhador ser classificado na categoria mais elevada que se aproxima das funções efetivamente exercidas, ou seja, em caso de dúvida quanto à categoria profissional, a atração deve fazer-se para a categoria profissional mais favorável ao trabalhador[5]. Ao invés, se o trabalhador exerce funções que não se enquadram exatamente nas categorias institucionalizadas, deve ser integrado na categoria que, tendo em conta as tarefas nucleares de cada uma delas, mais se aproxima daquelas funções efetivamente exercidas sendo que também aqui, em caso de dúvida, a atração deve fazer-se para a categoria profissional mais favorável ao trabalhador[6]. Flui de tudo quanto vem de referir-se que no caso em apreço independentemente da qualificação formal que a autora e a ré tenham atribuído ao “conjunto funcional” a desempenhar pela primeira em benefício da segunda, o que realmente releva é: i) determinar o “conteúdo funcional” efetivamente desempenhado pela autora ao serviço da ré; ii) saber se esse “conteúdo funcional” efetivo correspondente ao núcleo essencial da categoria normativa prevista no IRCT aplicável e a que o autor se arroga, Revertendo, agora, para a materialidade dos autos, vemos que a grande maioria das atividades realizadas diariamente pela autora têm cariz administrativo e, como tal subsumíveis à categoria de assistente técnico, uma vez que as funções supra descritas nas alíneas a., b., c., e., f., g., h., i., j., k., l., m., n., o., p. e q., que constituem a larga maioria das funções a que a autora está afeta, se traduzem na organização processos administrativos (elaborar documentos, tratar correspondência e assegurar o arquivo de informações relevantes), atendimento ao público (prestando informações e esclarecendo dúvidas de utentes), receção, triagem, registo e tramitação de documentos. Já a elaboração de candidaturas a fundos estruturais europeus, para a o financiamento da formação, revestem uma natureza mais complexa e integrável na categoria de técnico superior, como atrás vimos Contudo, a apresentação de candidaturas a fundos estruturais é, por sua natureza, uma atividade que não se enquadra no quotidiano de uma organização. Diferentemente das tarefas diárias ou rotinas operacionais, que estão integradas no fluxo contínuo de trabalho, as candidaturas a fundos estruturais têm características que as tornam um evento pontual e esporádico. Desde logo, os fundos estruturais, como os oferecidos pela União Europeia, são disponibilizados em ciclos de programação plurianuais e dentro deste período, existem janelas de oportunidade específicas para submissão de candidaturas. Essas janelas não são constantes, mas sim programadas em intervalos que dependem da disponibilidade de fundos e das prioridades políticas da entidade financiadora, pelo que, a natureza intermitente das oportunidades de financiamento impede que este tipo de atividade seja uma tarefa diária. Como vimos, preparar uma candidatura a fundos estruturais requer um elevado nível de esforço, planeamento e conhecimento técnico que deve ser encarada como uma atividade extraordinária. Na verdade, presume-se que o volume de trabalho exigido para uma candidatura a fundos estruturais deve ser significativo, mas está, naturalmente, concentrado em períodos específicos. A apresentação de candidaturas a fundos estruturais afigura-se-nos uma atividade esporádica devido à sua natureza complexa, intermitente e projectual, diferindo das atividades diárias que sustentam o funcionamento rotineiro de uma organização, pois exige planeamento estratégico, alocação intensiva de recursos e um elevado grau de especialização. Além disso, a periodicidade dos programas de financiamento e os riscos associados ao processo reforçam o seu caráter extraordinário. Por estas razões, estas candidaturas devem ser entendidas como eventos estratégicos pontuais, não tendo a autora alegado ou logrado provar que esta atividade integra a sua rotina normal de trabalho. As atividades diárias são previsíveis e repetitivas, como o expediente geral dos serviços de ensino e formação e o atendimento presencial ao público interno, já a apresentação de candidaturas a fundos estruturais, é pontual mas intensiva. O nível de incerteza envolvido na apresentação de candidaturas a fundos estruturais permite concluir pela natureza esporádica desta atividade. Na verdade, não há garantias de que a proposta será aprovada, mesmo após um trabalho significativo. Isto torna inviável tratar essa atividade como uma parte regular do trabalho organizacional, já que o retorno sobre o investimento em tempo e recursos é incerto. Assim sendo, sabendo que núcleo essencial das funções desenvolvidas pela autora integra o conteúdo da carreira de assistente técnica, deve improceder o seu pedido de requalificação. Mas isto não significa que a sua pretensão deva improceder in totum. A mudança de categoria, a que não corresponda a uma normal progressão ou promoção na carreira equivale a uma modificação substancial do contrato que só pode produzir efeitos se for aceite pelo trabalhador, ainda que as novas funções correspondam a uma categoria do mesmo nível, com identidade de estatutos retributivos. O princípio geral da correspondência entre a atividade exercida e a categoria contratual do trabalhador (com a inerente garantia da invariabilidade da prestação relativamente às funções para que o trabalhador foi contratado), pressupõe um princípio de efetividade, ou seja, a categoria profissional corresponde ao conjunto de tarefas que efetivamente o trabalhador realiza e não a uma determinada designação formal, sendo que, em caso de divergência, é a função efetiva que deve prevalecer. Este princípio encontrava-se consagrado no art. 22º, n.º 1 do Decreto-Lei n.° 49.408, de 24 de Novembro de 1969 (LCT), na redação da Lei n.º 21/96, de 23 de Julho No Código do Trabalho de 2003, o princípio da invariabilidade da prestação encontrou arrimo no artigo 151.º, n.º s 1 e 5, embora aí referindo a “atividade contratada” em vez da referência à categoria profissional. No Código do Trabalho 2009, o mesmo princípio, encontra expressão no artigo 118.º, n.º s 1 e 5[7]. A denominada mobilidade funcional (correspondente ao ius variandi) permite ao empregador exigir ao trabalhador uma prestação de trabalho mais vasta ou complexa, sem limite de tempo e sem direito a reclassificação pelo desempenho das funções acessórias quando as mesmas correspondam a uma categoria profissional superior. Assim, pode o trabalhador ser chamado a desempenhar temporariamente funções não compreendidas na função que lhe foi atribuída nas situações limitadas da mobilidade funcional regulada no Código do Trabalho. Cremos que a situação da trabalhadora deve ser, analogicamente solucionada por esta via, do instituto da mobilidade funcional: Artigo 120.º do Código do Trabalho de 2009, Mobilidade funcional 1 - O empregador pode, quando o interesse da empresa o exija, encarregar o trabalhador de exercer temporariamente funções não compreendidas na atividade contratada, desde que tal não implique modificação substancial da posição do trabalhador. 2 - As partes podem alargar ou restringir a faculdade conferida no número anterior, mediante acordo que caduca ao fim de dois anos se não tiver sido aplicado. 3 - A ordem de alteração deve ser justificada, mencionando se for caso disso o acordo a que se refere o número anterior, e indicar a duração previsível da mesma, que não deve ultrapassar dois anos. 4 - O disposto no n.º 1 não pode implicar diminuição da retribuição, tendo o trabalhador direito às condições de trabalho mais favoráveis que sejam inerentes às funções exercidas. 5 - Salvo disposição em contrário, o trabalhador não adquire a categoria correspondente às funções temporariamente exercidas. 6 - O disposto nos números anteriores pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho. 7 - Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.ºs 1, 3 ou 4. Com base neste normativo, cremos, s.m.o, que a autora deveria ter sido remunerada como técnica superior, nos períodos decorridos desde 2004, cfr. numero 4 do artigo supra transcrito e n.º 3 do artigo 314º do Código do Trabalho de 2003, em que realizou funções compreendidas na categoria de técnica superior, a saber, elaborar e submete as candidaturas a fundos estruturais europeus para financiamento das ações de formação, como o Programa Operacional Inclusão Social e Emprego (POISE) e o Programa Operacional Potencial Humano (POPH), pelo que as diferenças salariais que lhe são devidas devem ser liquidadas em incidente próprio.” – fim de transcrição. * Regressando ao caso dos autos, tendo em conta a matéria de facto provada, desde já avançamos que acompanhamos a sentença recorrida. Antes de mais cumpre dizer que na improcedência da alteração da matéria de facto, a matéria descrita nos pontos 12 e 14 manteve-se como provada. Por outro lado, ao contrário do alegado pela recorrente, a sentença recorrida não condenou a Ré a remunerar a Autora mensalmente por tarefas que porventura a mesma desempenhou ocasional e esporadicamente, apenas em algumas horas ou alguns dias de algumas semanas do mês. A Ré foi condenada a pagar à Autora “o montante a apurar em incidente próprio, correspondente às diferenças entre o montante auferido por esta e o auferido por um técnico superior, ao serviço da ré, entre 2004 e o presente, nos meses em que esta realizou as tarefas de elaborar e submeter as candidaturas a fundos estruturais europeus para financiamento das ações de formação, como por exemplo o Programa Operacional Inclusão Social e Emprego (POISE) e o Programa Operacional Potencial Humano (POPH)”, inexistindo qualquer violação do princípio da proporcionalidade. Alega a recorrente que a sua condenação ao abrigo da aplicação do instituto da mobilidade funcional se mostra igualmente errónea, por não se encontrarem reunidos os pressupostos cumulativos previstos no artigo 120.º do CT. Vejamos: Conforme resulta do disposto no artigo 314.º do CT de 2003 (aplicável tendo em conta que a partir de janeiro de 2004, deixou de desempenhar as funções para as quais havia sido admitida ao serviço da Ré e passou a desempenhar as funções acima descritas e identificadas, por determinação da Ré), sob a epígrafe “Mobilidade funcional”: <<1 - O empregador pode, quando o interesse da empresa o exija, encarregar temporariamente o trabalhador de funções não compreendidas na atividade contratada, desde que tal não implique modificação substancial da posição do trabalhador. 2 – Por estipulação contratual as partes podem alargar ou restringir a faculdade conferida no número anterior. 3 – O disposto no n.º 1 não pode implicar diminuição da retribuição, tendo o trabalhador direito a auferir das vantagens inerentes à atividade temporariamente desempenhada. 4 – A ordem de alteração deve ser justificada, com indicação do tempo previsível.>> Hoje a mobilidade funcional encontra-se prevista no artigo 120.º do CT, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 7/2009, de 12/02, nos termos já supratranscritos. A mobilidade funcional, também apelidada de jus variandi tem como característica uma modificação temporária, consubstanciando-se numa ordem do empregador no sentido de o trabalhador passar, temporariamente, a exercer funções não compreendidas na atividade contratada. Na verdade, “para que o empregador possa recorrer à mobilidade funcional, ou jus variandi, exige-se a verificação, cumulativa, dos seguintes requisitos: a) a existência de um interesse da empresa que justifique a ordem de alteração; b) as funções a exercer não se encontrarem compreendidas na atividade contratada; c) o exercício das novas funções ser temporário; d) a insusceptibilidade de modificação substancial da posição do trabalhador. (…) Nada impede, não obstante a mobilidade funcional ter carácter temporário, que esta seja parcial, em sentido do trabalhador exercer funções não compreendidas na atividade contratada durante apenas uma parte do período normal de trabalho, cfr. artigo 198.º, diário ou semanal, ou apenas durante um período de tempo anual, em detrimento de ser total, ocupando todo o tempo de trabalho do trabalhador, enquanto subsistir a mobilidade funcional. (…) A falta de observância destes requisitos não tem por efeito operar a conversão da alteração de funções temporária em alteração definitiva. Contudo, verificando-se uma preterição destes requisitos, o trabalhador poderá desobedecer à ordem que vise a alteração de funções, sem que tal configure ilicitude. Significa isto que o incumprimento dos requisitos procedimentais se consubstancia numa ordem do empregador de alteração e funções que é ineficaz, podendo o trabalhador permanecer a exercer as funções compreendidas na atividade contratada. (…) O disposto no n.º 3 visa essencialmente permitir a apreciação judicial dos motivos ou fundamentos invocados para a mobilidade funcional. Na hipótese de um tribunal vir a sindicar a fundamentação aduzida, este encontra-se circunscrito aos fundamentos invocados pelo empregador que determinaram o exercício das funções não compreendidas na atividade contratada, não sendo considerados os motivos que o empregador venha a apresentar em sede judicial que extrapolem a comunicação realizada. (…) O n.º 4 determina expressamente que a mobilidade funcional não pode envolver a diminuição da retribuição, em obediência ao princípio da irredutibilidade da retribuição, previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 129.º, em sentido de que não pode ser diminuída a retribuição do trabalhador, salvo nas hipóteses previstas neste Código do Trabalho, e nos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho. Mas estabelece ainda mais o n.º 4, ao determinar que o trabalhador tem direito às condições de trabalho mais favoráveis, próprias das funções exercidas. Entre as condições de trabalho encontra-se a retribuição, pelo que se esta for mais elevada nas novas funções temporárias, é esta que deve ser paga ao trabalhador, enquanto perdurar o exercício das funções não compreendidas na atividade contratada”[8]. Ora, tendo em conta o que ficou dito, é nosso entendimento que o facto de não se ter apurado a existência de uma comunicação fundamentada por parte do empregador com a indicação da duração previsível do exercício das funções não compreendidas na atividade contratada, não constitui obstáculo à aplicação do instituto da mobilidade funcional. Na verdade, como se decidiu no acórdão da RP, de 07/07/2016, disponível em www.dgsi.pt, no qual a ora relatora também interveio como relatora: “Resulta do artigo 118.º, do C.T. que o trabalhador deve exercer funções correspondentes à atividade para que foi contratado e que compreende as funções que lhe sejam afins ou funcionalmente ligadas e para as quais o trabalhador tenha qualificação adequada e que não impliquem desvalorização profissional, sendo aquelas segundas, designadamente, as compreendidas no mesmo grupo ou carreira profissional. Por outro lado, conforme resulta do artigo 120.º, do C.T., sob a epígrafe mobilidade funcional: <<1. O empregador pode, quando o interesse da empresa o exija, encarregar o trabalhador de exercer temporariamente funções não compreendidas na actividade contratada, desde que tal não implique modificação substancial da posição do trabalhador. (…) 3. A ordem de alteração deve ser justificada, (…) e indicar a duração previsível da mesma, que não deve ultrapassar dois anos. 4. O disposto no n.º 1 não pode implicar diminuição da retribuição, tendo o trabalhador direito às condições de trabalho mais favoráveis que sejam inerentes às funções exercidas. 5. Salvo disposição em contrário, o trabalhador não adquire a categoria correspondente às funções temporariamente exercidas. (…)>>. Este normativo consagra o denominado jus variandi “que constitui um desvio ao princípio geral pacta sunt servanda”[2]. <<Trata-se da faculdade reconhecida ao empregador de impor temporariamente ao trabalhador funções que extravasam do objecto do contrato, funções, pois, “não compreendidas na actividade contratada”>>[3]. Acresce que, exercendo o trabalhador, por imposição do empregador, temporariamente, funções não compreendidas na atividade contratada, dúvidas não existem de que terá direito às condições mais favoráveis inerentes às funções exercidas, nomeadamente, à correspondente retribuição (n.º 4, do artigo 120.º, do CT). Acontece que, da matéria de facto apurada resulta que o A. foi contratado em 01/03/2007 para desempenhar as funções de assistente comercial, funções que desempenhou até ao final do contrato, em 05/09/2014. Mais se apurou que: 11. Em 2011, face à redução drástica do volume de negócios, houve a necessidade de redução do pessoal bem como de concentrar em determinados trabalhadores outras tarefas para além das que lhe estavam atribuídas. 12. Assim, em julho de 2011, o A., continuando a prestar apoio administrativo aos consultores comerciais, passou também a desenvolver contactos comerciais por si próprio junto dos proprietários dos veículos/potenciais compradores para que estes tentem vender os seus veículos ou comprar outros através da prestação de serviços de leilões. 13. Passando a ter a si afeto uma carteira de clientes (maioritariamente stands). Significa isto que o A., a partir de julho de 2011, além das funções de assistente comercial passou também a desempenhar funções de consultor comercial, o que ocorreu até à denúncia do contrato em setembro de 2014. Desta forma, impõe-se concluir que não estamos perante uma situação de mobilidade funcional temporária (típica) tal como se encontra prevista no citado normativo, uma vez que, desde logo, a Ré não estabeleceu a duração previsível da alteração que, como se apurou, perdurou de 2011 até 2014. No entanto, também não estamos perante o exercício de funções compreendidas na atividade contratada, tal como se encontra definida no artigo 118.º, n.º 1, do C.T.[4], pois as funções de consultor comercial não são afins ou funcionalmente ligadas às de assistente comercial, antes consubstanciam uma categoria profissional distinta. Deparamo-nos, assim, face a uma espécie de “mobilidade funcional atípica”, posto que o A. passou também a exercer funções de consultor comercial, ou seja, funções correspondentes a outra categoria profissional e não afins ou funcionalmente ligadas àquela atividade contratada, sendo certo que, na ausência de IRCT aplicável nem podemos afirmar que tais categorias estão compreendidas no mesmo grupo ou carreira profissional. Como refere Romano Martinez[5], <<a alteração fundada em ius variandi pode ser total, passando o trabalhador a exercer a tempo inteiro uma nova actividade, ou parcial. Neste último caso, o trabalhador, em parte, continua a desenvolver a actividade correspondente à sua categoria. (…)>>. Acresce que, face à ausência daquele requisito de transitoriedade, cumpre questionar se o trabalhador não adquire o direito a aceder à categoria de consultor comercial, “a partir do momento em que o exercício de funções, ao abrigo do ius variandi, perde a natureza transitória”[6]. Ora, como já referimos, o A. foi contratado para desempenhar as funções de assistente comercial e, no exercício das mesmas, era responsável por dar o devido seguimento administrativo aos contactos efetuados pelos consultores comerciais da empresa, elaborando a documentação necessária ao leiloamento de viaturas dos clientes da Ré, como seja a introdução dos elementos relativos às viaturas a levar a leilão, no sistema informático, envio dos resultados do leilão para os proprietários dos veículos leiloados e envio do catálogo para a base de dados. E, em julho de 2011, o A., continuando a prestar apoio administrativo aos consultores comerciais, passou também a desenvolver contactos comerciais por si próprio junto dos proprietários dos veículos/potenciais compradores para que estes tentem vender os seus veículos ou comprar outros através da prestação de serviços de leilões, passando a ter a si afeto uma carteira de clientes (maioritariamente stands). Mais se apurou que a Ré paga aos trabalhadores a que atribui a categoria profissional de consultores comerciais e exercem as funções inerentes a esse cargo um vencimento mensal de € 748,00. Já o A., à data da cessação do contrato de trabalho, auferia a retribuição base mensal de € 495,00, acrescida de subsídio de alimentação de € 116,11 e de comissões de valor variável. Desta forma, e tendo em conta a previsão contida no n.º 4, do artigo 120.º, do C.T., exercendo o A. também outras funções não compreendidas na atividade contratada, tem direito a auferir a retribuição correspondente a tais funções, ou seja, a retribuição base mensal de 748,00 que a Ré paga aos consultores comerciais, correspondente à respetiva categoria profissional. Assiste ao A. o direito a auferir a retribuição correspondente às funções de consultor comercial que exerceu de 2011 até 2014 por força do disposto no n.º 4, do artigo 120.º, do C.T. e não do disposto no artigo 267.º do mesmo Código, uma vez que este respeita ao exercício de funções a que alude o n.º 2, do artigo 118.º, ou seja, a funções que estão compreendidas na atividade contratada (as que lhe são afins ou funcionalmente ligadas), sendo que, como já referimos, as desempenhadas pelo A. não revestem esta natureza.” Em suma, tendo em conta a matéria de facto provada e fazendo a transposição para o caso em análise, também aqui nos encontramos face a uma espécie de “mobilidade funcional atípica”. Acresce que o alegado pela Ré no sentido de que não promoveu qualquer procedimento concursal necessário à seleção de técnicos superiores, não belisca em nada o que ficou dito, desde logo porque nem sequer foi atribuída à Autora a categoria de técnica superior. Como já ficou dito, ao contrário do alegado pela recorrente, resultou provado que a Autora, a partir de janeiro de 2004, deixou de desempenhar as funções para as quais havia sido admitida ao serviço da Ré e passou a desempenhar as funções acima descritas e identificadas, por determinação da Ré. E, como já referimos, também não assiste qualquer razão à recorrente quando alega que resultou provado que as tarefas esporadicamente desempenhadas pela Autora que exorbitam o núcleo essencial subsumível ao conteúdo funcional da categoria de assistente técnica, não encerram elevado grau de complexidade, autonomia e responsabilidade, por serem condizentes com funções de apoio e auxílio ao trabalho desenvolvido pelos coordenadores de serviço, passando a solução jurídica pela qualificação ou subsunção de que tais tarefas são compatíveis com as correspondentes ao conteúdo funcional de um trabalhador com a categoria de assistente técnico. Tal como se refere na sentença recorrida, “a elaboração e submissão de candidaturas aos fundos estruturais europeus, como o POISE e o POPH, é uma função que exige competências técnicas avançadas, autonomia e responsabilidade, apenas harmonizável com o conteúdo funcional e formação académica de um técnico superior, extravasando amplamente a competência de um assistente técnico, que detém funções meramente administrativas. O impacto estratégico dos projetos reforça a relevância desse enquadramento, devendo o profissional que desempenha essas atividades ser integrado na categoria profissional de técnico superior. Ora, desta materialidade, resulta, sem dúvida, o exercício, pela autora de funções de técnico superior, considerando que as tarefas em causa materializam funções de estudo, de aplicação de métodos e processos de natureza científica a elaboração de projetos, com diversos graus de complexidade, e execução de outras atividades de apoio geral ou especializado nas áreas de atuação comuns, instrumentais e operativas dos órgãos e serviços, tomando opções de índole técnica, ainda que, enquadradas por diretivas ou orientações superiores. Funções que, naturalmente, pressupõem responsabilidade e autonomia técnica, ainda que com enquadramento superior qualificado, sendo enquadráveis nas funções de técnico superior nos termos em que a categoria é definida no Anexo I. ao ACT aplicável”. Por fim, não vislumbramos qualquer “desobediência” ao artigo 59.º, n.º 1, a), da CRP, ou seja, que a sentença recorrida tenha violado o princípio de que para trabalho igual salário igual. Improcedem, por isso, as conclusões da recorrente. * Na improcedência das conclusões formuladas pela Ré recorrente, impõe-se a manutenção da sentença recorrida em conformidade. * * IV – Sumário[9] (…). * * V - DECISÃO Nestes termos, sem outras considerações, na improcedência do recurso, acorda-se em manter a sentença recorrida * * Custas a cargo da Ré recorrente. * * Coimbra, 2025/11/20 _____________________ (Paula Maria Roberto) ____________________ (Bernardino Tavares) _____________________ (Mário Rodrigues da Silva)
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