Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
712/18.2T8GRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FALCÃO DE MAGALHÃES
Descritores: CONTRATO DE ARRENDAMENTO RURAL
CADUCIDADE
MORTE DO SENHORIO
VENDA DO PRÉDIO A TERCEIRO
HERANÇA
CABEÇA DE CASAL
CONTRATO DE ARRENDAMENTO RURAL CELEBRADO PELO CABEÇA DE CASAL DA HERANÇA
CADUCIDADE DO CONTRATO
Data do Acordão: 02/23/2021
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA – J.L. CÍVEL DA GUARDA – JUIZ 2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 20º, Nº 1 DO DEC. LEI Nº 294/2009.
Sumário: I – Segundo o que dispõe o artº 20º, nº 1, do DL 294/2009, “O arrendamento rural não caduca por morte do senhorio nem pela transmissão do prédio.”.

II - A lei pretendeu, em nítida proteção da posição dos inquilinos, que estes não vissem cessado o contrato com a transmissão da coisa locada, v.g. mediante a venda da mesma a terceiro, fazendo antes com que o adquirente da coisa sucedesse “ex lege” na posição contratual do senhorio.

III - No caso de o arrendamento rural ter sido celebrado pela herança indivisa, enquanto senhoria, representada pelo cabeça de casal, não sucede a caducidade de tal contrato quando a cessação dos poderes de administração deste só vem a ocorrer, antes da partilha, por via da venda do locado, que a herança, representada por aquele e pelos restantes herdeiros, faz a terceiro, antes sucedendo que, por via dessa transmissão, o adquirente assume “ex lege”, no contrato - que se mantém -, a posição de senhorio.

Decisão Texto Integral:








Acordam  no Tribunal da Relação de Coimbra (1):

I - A) - 1) - (2)«[...] A..., Lda., pessoa colectiva n.º ..., com sede na ..., Vem intentar Ação de Despejo contra os Réus:

M... e J..., casados entre si, com residência na ...;

Alegando, em síntese, ser dona e legítima possuidora dos prédios melhor identificados nos artigos 1º e 2º da petição (um rústico e um urbano), prédios esses que adquiriu  à herança indivisa por morte de J..., por escritura pública de compra e venda outorgada em 22.12.2017 na Conservatória do Registo Predial de ... Mais invoca que em 20.03.2008 havia sido celebrado um contrato de arrendamento rural, nos termos do qual os anteriores proprietários deram de arrendamento aos réus o prédio rústico supra identificado, tendo ficado especificamente clausulado que o mesmo caducaria quando cessassem os poderes legais do cabeça-de-casal que administra e representa a herança o que sucedeu com a formalização da venda do prédio à aqui autora. Todavia, os réus permanecem a ocupar não só o prédio rústico, como também o urbano, sem qualquer título que os legitime. Pede, em conformidade, a condenação dos réus no reconhecimento da extinção do contrato de arrendamento rural, por caducidade, e na restituição dos prédios rústico e urbano, propriedade da autora, livres e devolutos  de pessoas e bens.
Os réus deduziram contestação, defendendo-se por impugnação e por exceção, sustentando, por um lado, que residem no locado desde 20 de Março de 1994, tendo celebrado previamente a 20.03.2008 dois outros contratos de arrendamento rural com a então proprietária, J..., outorgados respetivamente em Março de 1994 e em Março de 2001; e, por outro lado, que os contratos de arrendamento têm por objecto tanto a parte rústica como a parte urbana do prédio denominado “Quinta de ...”. Mais alegam que o contrato celebrado em 20.03.2008 com a herança indivisa de J... é nulo, por violação de norma imperativa, mantendo-se plenamente válido e eficaz o contrato anterior celebrado em Março de 2001, cuja posição contratual foi transmitida da falecida senhoria para a herança indivisa, e desta para a autora, uma vez que aquele contrato de arrendamento rural e não foi objecto de denúncia ou oposição de nenhuma das partes, tendo os réus sempre cumprido pontualmente com a sua obrigação de pagamento de renda. Ainda que assim não se entenda, defendem igualmente os réus que o contrato outorgado em 20.03.2008 não caducou na medida em que ainda não foram efetuadas as partilhas da  herança indivisa em que o locado se integra, sendo que apenas com elas cessariam os poderes de administração em cujo âmbito o cabeça-de-casal celebrou o mencionado contrato.
Os réus deduziram ainda pedido reconvencional, tendo em vista, no caso da ação ser julgada procedente, a condenação da autora no pagamento de uma indemnização referente às benfeitorias (que classifica de úteis e necessárias) que foram realizadas no locado  com  o  consentimento  da  falecida  senhoria,  e  cujo  valor  global  ascende a €4.922,02, as quais não podem ser retiradas sem a sua utilização. Os réus peticionam igualmente o direito a ser indemnizados pelo valor global dos subsídios agrícolas que deixaram de auferir no parcelário da “Quinta de ...”, indemnização essa a liquidar em execução de sentença, nos termos do art. 556.º, n.º 1, b) do Código de Processo Civil (CPC), com todas as consequências legais.---
Na réplica, a autora pugnou pela improcedência das exceções deduzidas, bem como do pedido reconvencional, requerendo ainda a ampliação do pedido nos termos e para os efeitos do art. 265.º, n.º 2 do CPC, passando o mesmo a consistir no reconhecimento da extinção do contrato de arrendamento rural celebrado em 20.03.2008 por caducidade, tendo aquele por objeto os prédios urbano e rústico ali identificados, sendo os réus condenados a entregá-los livre e devolutos de pessoas e bens; e, no caso de se entender  que o prédio urbano não se encontra abrangido por aquele contrato de arrendamento rural, então que sejam os réus condenados a restituir o mesmo livre e devoluto de  pessoas e bens por se encontrar cessado o contrato de comodato.
Os réus aceitaram expressamente a requerida ampliação do pedido, concluindo nos precisos termos da contestação.
Deferida a ampliação do pedido pelo Tribunal, teve então lugar a realização de audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador, que fixou o valor da causa, bem como o despacho de enunciação de objeto do litígio e fixação dos temas da prova.[...]».
2) – À causa foi fixado o valor de €14 922.02 (despacho de 6/11/2018).
B) - Realizada a audiência final, foi proferida sentença pelo Juízo Local Cível da Guarda (Juiz 2), no dispositivo da qual, assim se consignou:
«[] decide-se julgar totalmente procedente o pedido deduzido pela Autora e, consequentemente:---
i. Declarar que o contrato de arrendamento rural outorgado em 20 de Março 2008, melhor identificado no ponto 4) da factualidade provada, tem por objeto os prédios melhor descritos nos pontos 1) e 2) dos factos provados, abrangendo as partes rústica e urbana do prédio denominado “Quinta de ...”;
ii. Reconhecer que o contrato de arrendamento rural outorgado em 20 de Março 2008, melhor identificado no ponto 4) da factualidade provada, se encontra extinto, por caducidade, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 18.º, n.º 1, b) do NRAR e 1051.º, c) do CC.
iii. Condenar os Réus a entregar o locado à Autora livre e devolutos de pessoas e bens;
iv. Absolver os Réus do demais peticionado;
Relativamente ao pedido reconvencional, decide-se julgar o mesmo parcialmente procedente, e, consequentemente:

v. Condenar a Autora a pagar aos Réus as benfeitorias úteis por si realizadas no locado, as quais correspondem à instalação subterrânea de tubagem para a rega, a qual dispõe de duas polegadas de diâmetro e um comprimento de aproximadamente 2200 metros, melhor descrita no ponto 20)-f) da factualidade provada, na estrita medida em que aquela obra represente um enriquecimento para a Autora à custa dos Réus, a calcular em sede de liquidação de sentença, para a qual expressamente se remete ao abrigo do art. 609.º, n.º 2 do CPC;
vi. Absolver a Autora do demais peticionado;
Custas da ação a cargo de Autora e Réus, na proporção que resultar a final (após o incidente de liquidação) para cada uma das partes art. 527.º, n.º 1 e 2 do CPC.---. []».
C) - Tendo a Autora interposto recurso desta sentença - recurso esse que foi recebido como apelação, a subir de imediato, nos próprios autos, e no efeito meramente devolutivo -, também os RR vieram interpor recurso dessa decisão, recurso esse igualmente admitido, como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo, tendo o ora relator, porém, alterado para o efeito suspensivo o efeito atribuído ao recurso dos RR (artº 654º do novo Código de Processo Civil3 - doravante NCPC, para se distinguir daquele que o antecedeu e que se  designará como CPC – despacho de 2/12/2020).
D) A Autora, a terminar a alegação do respectivo recurso, ofereceu as seguintes conclusões:
...
E) Os Réus, a findar a respectiva alegação de recurso, ofereceram as seguintes conclusões (4):
...
F) - Questões a resolver:
Em face do disposto nos art.ºs 635º, nºs 3 e 4, 639º, nº 1, ambos do NCPC, o objeto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 608º, n.º 2, ex vido art.º 663º, nº 2, do mesmo diploma legal.
Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada  pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que “questões”, para efeito do disposto no n.º 2 do artº 608º  do  NCPC, são apenas as que se reconduzem aos  pedidos  deduzidos,  às  causas  de pedir, às excepções invocadas e às excepções de que oficiosamente cumpra conhecer, não podendo merecer tal classificação o que meramente são invocações, considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes5   e que o Tribunal, embora possa abordar para um maior esclarecimento das partes, não está obrigado a  apreciar.
Assim, as questões a solucionar, consistem em saber se deve ser alterada a matéria de facto em que se fundou tal decisão e se, em face da factualidade que seja de ter como assente, se se mostra acertado o decidido na sentença e, em caso negativo, se, e em que medida, é de conceder procedência à ação e/ou à reconvenção.
II - A) - Na sentença da 1.ª Instância consignou-se o seguinte no que respeita à decisão da matéria de facto provada e não provada:
...
III - B) - Apreciemos, então, as questões que delimitam o objeto do presente recurso, sendo que, primeiramente, importa aferir do acerto da decisão quanto à não subsistência do arrendamento, v.g., em função da respetiva caducidade, pois que só concluindo pelo acerto da afirmação dessa insubsistência, ganha sentido útil discorrer, de facto e de direito, quanto à questão das benfeitorias, ou seja, quanto ao pedido reconvencional dos RR.
Diz-se, entre o mais, na sentença recorrida:
«[…] em 2 de Agosto de 2007 (antes de se completarem os sete anos de vigência do contrato), faleceu a senhoria e primeira outorgante J...o cf. ponto 17) da factualidade provada. Também neste ponto assiste razão aos réus ao defenderem que a morte do senhorio não fez caducar o contrato de arrendamento rural, transmitindo-se, ao invés, a posição contratual da primeira outorgante para a herança indivisa por óbito de J..., representada naturalmente pelo cabeça-de-casal, R..., tudo nos termos das disposições conjugadas do art. 22.º, n.º 1 do DL n.º 385/88, de 25/10, e 1057.º do CC.
Assim sendo, o contrato melhor descrito em 16) manteve a sua vigência nos seus precisos termos, verificando-se apenas uma modificação subjetiva das partes, sucedendo a herança indivisa na posição de J... em todos direitos e deveres contratuais que para si resultavam do contrato.
Contudo, também este contrato não chegou a ser objeto de qualquer renovação automática, porquanto, em 20 de Março de 2008, as mesmas partes convencionaram a celebração de um novo contrato de arrendamento rural, in casu, o contrato descrito no ponto 4), o qual teve como efeito a extinção, por revogação, do contrato outorgado em 28 de Fevereiro de 2001, nos precisos termos e pelos fundamentos subjacentes à extinção do contrato outorgado a 20 de Março de 1994. Com efeito, também aqui temos um  novo contrato de arrendamento rural celebrado pelas mesmas partes contratantes, tendo por objeto o mesmo bem imóvel, e de conteúdo manifestamente idêntico, pelo que nenhum outro sentido pode ser atribuído à vontade manifestada pelas partes que não o de terem pretendido substituir o contrato antigo pelo novo assim pondo fim, de comum acordo, à vigência do contrato anterior, e respetivos efeitos jurídicos.
Não se alcança, nestes termos, em que se funda a invocada nulidade, pelos réus, do contrato melhor descrito em 4) cf. artigos 38º a 40º da contestação com a consequente conclusão de que se mantém, à data de hoje, plenamente válido e eficaz o contrato de arrendamento outorgado entre os réus e J... em Fevereiro de 2001, sobretudo quando são os próprios que vêm defender que aquele contrato é válido e eficaz porque foi celebrado ex novo e, portanto, substituiu o primitivo contrato de arrendamento rural celebrado em Março de 1994.
Assim, e salvo melhor opinião, nenhuma norma de carácter imperativo foi violada com a celebração, pela segunda vez, de um novo contrato de arrendamento rural, nem foi alegado e muito menos provada a existência de um qualquer vício na formação do contrato ou qualquer outra causa de nulidade do mesmo. Como tal, o contrato outorgado  em  Fevereiro  de  2001  extinguiu-se,  não  por  denúncia,  mas  sim por revogação (tácita) das partes, tal como sucedera com o contrato outorgado em Março de 1994.
Em síntese, temos pois que:
i. Em 20 de Março de 1994 tem início a vigência do contrato de arrendamento rural outorgado entre os réus e J..., melhor descrito em 11);
ii. Em 20 de Março de 2001 extingue-se aquele contrato, por revogação (tácita) das partes, passando a vigorar o contrato de arrendamento rural outorgado entre as mesmas partes, melhor descrito em 16);
iii. Em 2 de Agosto de 2007, e em face do falecimento da senhoria J..., a posição contratual daquela transferiu-se para a herança indivisa por óbito de J..., mantendo-se, em tudo o mais, o contrato referido em 16) plenamente válido e eficaz;
iv. Em 20 de Março de 2008 extingue-se aquele contrato, por revogação (tácita) das partes, passando a vigorar o contrato de arrendamento rural outorgado entre as mesmas partes, melhor descrito em 4); […]».
Não vemos qualquer incorreção neste entendimento, que, por isso, corroboramos. O contrato de arrendamento rural em causa, de 20 de Março de 2008, firmado entre os RR e R... na qualidade de cabeça-de-casal da herança indivisa deixada por J... -, foi outorgado por um período de sete anos, mediante o pagamento de uma renda anual, sendo no início, integralmente regulado pelo regulado pelo DL n.º 385/88, de 25 de Outubro e respetivas alterações e, subsequentemente, no fim do prazo acordado (20/3/2015), pelo Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13/10, já vigente desde 11/01/2010 (artºs 39º nº 2, a) e 44º, nº 1 desse DL).
Nesse contrato, recorda-se, existia a seguinte cláusula: “o presente arrendamento é celebrado pelo prazo mínimo legal de 7 (sete) anos com início em 20 (vinte) de Março  de 2008, embora aqui se estabeleça que o arrendamento caduca automaticamente quando cessarem os poderes legais do cabeça-de-casal que administra e aqui representa a herança”.
Recorda-se na sentença: «[…] resultou provado que na data de 22 de Dezembro de 2017, na Conservatória do Registo Predial do ..., a autora declarou comprar os prédios melhor identificados em 1) e 2) aos vendedores ..., todos na qualidade de herdeiros e legais representantes da herança por morte de J..., que o declararam vender […]».
Concluiu-se na sentença que, em resultado desta venda à Autora, cessaram, em 22.12.2017, data dessa transmissão, os poderes legais de administração do cabeça-de- casal, pelo que, por força da referida cláusula, caducou o contrato na aludida data, ficando os RR destituídos de título que permita a permanência destes no locado.
Ora, salvo o devido respeito, não concordamos com este entendimento, que, ao que nos parece, inverte o raciocínio que é de fazer no caso.
Como se sabe, segundo o que dispõe o artº 20, nº 1, do DL 294/2009, “O  arrendamento rural não caduca por morte do senhorio nem pela transmissão do prédio.”.
A lei pretendeu, portanto, em nítida proteção da posição dos inquilinos, que estes não vissem cessado o contrato com a transmissão da coisa locada, v.g. mediante a venda da mesma a terceiro, fazendo antes com que o adquirente da coisa, sucedesse “ex lege” na posição contratual do senhorio.
Assim, se é evidente que os poderes legais de administração do cabeça-de-casal que firmou o contrato de arrendamento cessaram com a venda do prédio à Autora, essa cessação - quando o regime de administração já nada contava para a primitiva senhoria, dado o direito sobre a coisa locada ter deixado de fazer parte da sua esfera jurídica - já não releva depois dessa transmissão, que coloca o adquirente na posição de senhorio.
Assim, embora com a compra e venda de 22.12.2017 tenham cessado os poderes legais de administração do cabeça-de-casal que firmou o contrato de arrendamento em representação da herança, tal cessação não fez caducar esse contrato, cuja posição de senhoria se transmitiu à Autora, permanecendo na posição de inquilinos, agora desta última, os RR, que até demonstraram o seu interesse nisso, pois que em 24 de Janeiro  de 2018 remeteram uma missiva à autora, por esta recepcionada em 25 de Janeiro de 2018, nos termos do qual lhe comunicaram a sua pretensão de manterem a sua posição contratual.
Não ocorrendo, pois, a invocada caducidade, mantém-se o arrendamento e o “status quo” daí resultante, pelo que inexiste fundamento de despejo, tendo os RR. título que legitima a respetiva permanência nos prédios em causa.
Daqui resulta que a ação improcede, salvo na declaração do âmbito do objeto do contrato de arrendamento rural outorgado em 20 de Março 2008, e que, consequentemente, havendo que revogar parcialmente a sentença recorrida, já  não ocorre a determinada entrega dos prédios em causa por parte dos RR, pelo que fica prejudicado o conhecimento do recurso destes quanto ao pedido reconvencional (incluindo, pois, no que se reporta à impugnação da matéria de facto), improcedendo, por outro lado, o recurso da Autora.
Do exposto poder-se-á, assim, sintetizar:

“No caso de o arrendamento rural ter sido celebrado pela herança indivisa, enquanto senhoria, representada pelo cabeça de casal, não sucede a caducidade de tal contrato quando a cessação dos poderes de administração deste só vem a ocorrer, antes da partilha, por via da venda do locado, que a herança, representada por aquele e pelos restantes herdeiros, faz a terceiro, antes sucedendo que, por via dessa transmissão, o adquirente assume “ex lege”, no contrato - que se mantém -, a posição de senhorio.”.
III - Decisão:
De acordo com o exposto, e de harmonia com os preceitos legais supra citados,  acordam os Juízes desta Relação de Coimbra em, na procedência da Apelação dos RR. e na improcedência do recurso da Autora, julgar parcialmente procedente a ação e, consequentemente, revogando parcialmente a sentença recorrida:
1- Declarar que o contrato de arrendamento rural outorgado em 20 de Março 2008, melhor identificado no ponto 4) da factualidade provada, tem por objeto os prédios melhor descritos nos pontos 1) e 2) dos factos provados, abrangendo as partes rústica e urbana do prédio denominado “Quinta de ...”;
2- No mais, absolver os RR dos pedidos;
3- Julgar prejudicado o conhecimento da reconvenção e, consequentemente, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto;
4- Condenar a Autora nas custas de ambos os Recursos e condenar Autora e Réus nas custas da 1ª Instância, na proporção de 95% e 5 %, respectivamente (artºs 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6, 663º, nº 2, “in fine”, todos do NCPC).
23/2/2021

Luiz José Falcão de Magalhães (relator)
António Domingos Pires Robalo
Sílvia Maria Pereira Pires

1 Utilizar-se-á a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, respeitando-se, em caso de transcrição, a grafia do texto original.

2 Transcrição de extrato do relatório da sentença recorrida.

3 Aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho.

4 As que ora se transcrevem são já as oferecidas na sequência de convite do Relator.

5 Cfr. Acórdão do STJ, de 06 de Julho de 2004, Revista nº 04A2070, embora versando a norma correspondente da legislação processual civil pretérita, à semelhança do que se pode constatar, entre outros, no Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e no Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B3586, todos estes arestos consultáveis em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabase, tal como aqueles que, desse Tribunal e sem referência de publicação, ou com uma outra, vierem a ser citados adiante.