Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1247/09.0TBLRA.A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARVALHO MARTINS
Descritores: OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
COMINAÇÃO
PRECLUSÃO
BASE INSTRUTÓRIA
Data do Acordão: 10/23/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: LEIRIA 4º J C
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS.342 CC, 264, 484, 511, 664, 784, 817 CPC
Sumário: 1.- Constituindo petição duma acção declarativa e não contestação duma acção executiva, a dedução da oposição à execução não representa a observância de qualquer dos ónus cominatórios (ónus da contestação, ónus da impugnação especificada) a cargo do réu na acção declarativa: nem a omissão de oposição produz a situação de revelia, nem a omissão de impugnação dum facto constitutivo da causa de pedir da execução produz qualquer efeito probatório, não fazendo sentido falar, a propósito, de prova de factos alegados pelo exequente ou de definição do direito decorrente do título executivo, o qual continua, após o decurso do prazo para a oposição como até aí, a incorporar a obrigação exequenda, com dispensa, em princípio, de qualquer indagação prévia sobre a sua real existência.

2.- Mas, na medida em que a oposição à execução é o meio idóneo à alegação dos factos que em processo declarativo constituiriam matéria de excepção, o termo do prazo para a sua dedução faz precludir o direito de os invocar no processo executivo, a exemplo do que acontece no processo declarativo.

3.- A não observância do ónus de excepcionar, diversamente da não observância do ónus de contestar ou do de impugnação especificada, não acarreta uma cominação, mas tão-só a preclusão dum direito processual cujo exercício se poderia revelar vantajoso.

4.- Por isso, o juiz, aqui também, ao fixar a base instrutória, tem de seleccionar a matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, que considere controvertida, conforme o art. 511.º do Cód. Proc. Civil.

5.- Neste campo, não tem o juiz que guiar-se por um critério meramente subjectivo, orientado pela qualificação jurídica, pelas normas e pela solução que tem em mente nesta fase processual, antes deve acautelar a prova de todos os factos que tenham alguma relevância para a correcta e, eventualmente, divergente, integração jurídica.

Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A Causa:

SM (…), SF (…), LC (…), FA (…) e mulher MI (…) vieram deduzir oposição à execução, alegando que na livrança dada à execução consta como subscritora J (…) & Netos, Lda e que nela consta que em 5/01/09 o exequente concedeu à subscritora um financiamento de €108.731,91 cujo vencimento ocorreria 10 dias depois.

Só que tal documento é rigorosamente falso, não constituindo título executivo, não correspondendo a qualquer financiamento efectuado;

A firma subscritora foi declarada insolvente em Julho de 2008 no processo que correu seus termos no 2.º Juízo do tribunal judicial da Comarca de Leiria com o n.º 3945/08.6 TBLRA;

Assim, tendo sido declarada a sua insolvência e aprovada a respectiva liquidação na Assembleia de credores que ocorreu em 18/09/2008, cessou por completo toda e qualquer actividade e, consequentemente, não se justificava a concessão de crédito em Janeiro de 2009, data em que a própria insolvente já era representada pela Ex.ma Administradora nomeada.

E não existindo essa responsabilidade da subscritora, também nada pode ser exigido aos executados FA (…) e mulher, como garantes hipotecários.

Notificada, a exequente não contestou.

*

Foi elaborado despacho saneador, onde se fixaram os factos assentes e foi organizada a base instrutória constante de fls. 30 e ss, o qual não sofreu qualquer reclamação.

*

Oportunamente, foi proferida decisão onde se consagrou que

No caso, o título executivo é uma livrança, documento particular, assinado pelos oponentes LC (…) e SM (…), como avalistas e que importa a constituição de uma obrigação pecuniária, cujo montante está bem determinado, e que resultou de um pacto de preenchimento em que os mesmos autorizaram o exequente a preencher a livrança, pelo montante que fosse devido.

Deste modo, forçoso será concluir que a presente oposição terá de soçobrar.

*

Pelo exposto, julgo improcedente a presente oposição à execução e, consequentemente, determino o prosseguimento da execução.

SM (…), SF (…), LC (…), FA (…) e mulher MI (…) , oponentes nos autos de OPOSIÇÃO à execução acima em epigrafe, tendo sido notificados de sentença que julgou improcedente a oposição à execução e com ela não concordando, vieram interpor o presente recurso de Apelação, alegando e concluindo que:

1- A douta sentença não fez uma correcta aplicação do direito aos factos carreados para os autos.

2- A douta sentença não poderia ter considerado improcedente a oposição à execução, com os fundamentos nela constantes, tendo aplicado de forma incorrecta o direito.

3- O inconformismo dos recorrentes decorre desde logo do facto do exequente não ter esclarecido quaisquer factos no seu requerimento executivo, tendo-se limitado a remeter os mesmos para os constantes do titulo dado à execução.

4- Os recorrentes deduziram oposição onde alegaram a inexistência do financiamento constante do titulo executivo;

5- Alegaram ainda que o referido documento é rigorosamente falso, não constituindo título executivo ;

6- Que a firma subscritora foi declarada insolvente em Julho de 2008 no processo que correu seus termos no 2.º Juízo do tribunal judicial da Comarca de Leiria com o n.º 3945/08.6 TBLRA e que com a respectiva liquidação na Assembleia de credores que ocorreu em 18/09/2008, cessou por completo toda e qualquer actividade;

7- -Livrança que só o é pelo aspecto formal já que não traduz qualquer transacção creditícia;

8- A livrança nunca foi assinada como tal pelos executados;

9- Não existindo tal responsabilidade, é evidente que também nada é exigível aos executados como garantes hipotecários como são o executado FC (...)e mulher,

10- Sem transacção também não existiu qualquer responsável

11- Devidamente notificado o exequente para contestar a oposição deduzida, com a cominação de se considerarem confessados os factos alegados pelos agora recorrentes, o exequente nada disse.

12- Nos termos do artigo 817º nº 3, do CPC, sempre deveriam ter sido considerados procedentes os factos alegados pelos recorrentes em sede de oposição à execução e sempre a oposição ser considerada procedente e a execução extinta.

13- Contudo, o Tribunal a quo nem verificou tal facto e os autos prosseguiram e perante a alegação efectuada pelos recorrentes de que a livrança não havia sido assinada pelos executados, e atenta a não contestação do exequente, não poderia sem mais, ter dado como provado no seu despacho saneador que no verso da livrança consta a expressão manuscrita “dou o meu aval à firma subscritora desta livrança”, situando-se logo a abaixo umas assinaturas apostas pelo punho de LC (…), SF (…) e SM (…)  ”.

14- Os recorrentes impugnaram a assinatura constante da livrança, no entanto o Tribunal a quo fez tábua rasa de tal alegação e mesmo perante a não contestação do exequente deu tal facto ab initio como provado.

15- Ora tal facto está diametralmente em oposição ao alegado pelos recorrentes em sede de oposição não contestada pelo exequente, quando alegaram que a livrança dada à execução não ter sido assinada por si, impendendo sobre a exequente a prova de tal situação, o que não aconteceu.

16- Realizada audiência de julgamento não se deu como provado que a insolvente à data do preenchimento da livrança, não tinha solicitado à exequente o financiamento nela constante e que nem a exequente lhe entregou o referido montante.

17- Constituindo jurisprudência unânime que da resposta negativa a um quesito da base instrutória nada se pode retirar, tudo se passando como tal facto não tivesse sido sequer quesitado, restou apenas a resposta positiva de que exequente não entregou tal montante à sociedade subscritora.

18- O Tribunal a quo socorreu-se de documentos juntos pelo exequente composto de garantia bancária nº 675/2004/S, onde este último se comprometeu e constituiu principal pagador de quaisquer importâncias até ao limite de 215.154,16€, que a firma subscritora viesse a dever à sociedade Poligreen, Sa.

19- No entanto, não o poderia ter sido feito, uma vez que nunca foi alegada a existência de qualquer garantia bancária, sendo que o exequente apenas alegou um financiamento bancário datado de 5/1/2009,

20- A insolvência da subscritora da livrança impedia e demonstra à sociedade a impossibilidade da subscritora ser contratante de qualquer financiamento no período constante na livrança.

21- O Tribunal a quo ao socorrer-se dos documentos juntos pelo exequente que modificam o pedido do exequente, pronunciando-se sobre factos não alegados, violou o artigo 668º, nº 1, alínea d) do CPC.

22- Os elementos constantes no titulo executivo não são os que se vieram a provar em sede de julgamento,

23- Os executados não puderam defender-se de factos não alegados.

24- Contudo e sem conceder, sendo a garantia bancária uma operação de crédito, através da qual uma entidade bancária garante a execução de uma obrigação constituída por um seu cliente perante um terceiro, assumindo por isso o encargo da obrigação se o ordenador faltar ao seu cumprimento.

25- A declaração de insolvência da subscritora fez cessar todos os contratos por si celebrados, e

26- Apesar de nunca no requerimento executivo ter sido feita menção, ou posteriormente, porque não foi contestada a oposição, à imputação daquela livrança para pagamento da garantia bancária paga pelo exequente à beneficiária da mesma.

27- Verifica-se que a alegada garantia bancária apenas terá sido accionada após a declaração de insolvência.

28- Quando todas as obrigações da subscritora se encontravam já vencidas, e como tal as dos avalistas, que respondem na mesma medida que a avalizada.

29- A douta sentença enferma, também, de vicio de excesso de pronuncia e dá como provados factos que ou não foram alegados pelo exequente ou não foram por este contrariados.

30- Dos presentes autos, e da resposta dada aos quesitos restou apenas a resposta positiva de que exequente não entregou tal montante à sociedade subscritora.

31- Ora sendo certo que o exequente nada esclareceu no seu requerimento executivo quanto ao alegado financiamento,

32- E não contestou a oposição deduzida pelos recorrentes, tornou-se despiciendo para a apreciação da causa os factos dados como provados na douta sentença com base nos documentos juntos pelo exequente em sede de cumprimento do artigo 512º do CPC, e as conclusões deles extraídas.

33- O Tribunal não se poderia ter pronunciado quanto os teor dos documentos identificados no nº 8, 9º, 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 15º, da fundamentação da sentença todos relacionados com a garantia bancária.

34- Resultou como provado que a data do preenchimento da livrança, isto é, a data de emissão de 5/1/2009, não corresponde a qualquer financiamento efectuado a essa data nem solicitado a essa data pela subscritora uma vez que esta já se encontrava insolvente desde 8/7/2008.

35- A douta sentença faz menção à existência de pacto de preenchimento, contudo a data de emissão da livrança não poderia obedecer ao pacto de preenchimento a que se faz alusão na douta sentença.

36- À data da insolvência a aludida garantia bancária ainda não tinha sido accionada, pelo que o seu preenchimento sempre seria manifestamente abusivo.

37- A declaração de insolvência da subscritora determinou a incapacidade da mesma de contrair quaisquer créditos,

38- E tendo a garantia sido accionada após a declaração de insolvência da subscritora, em data em que esta já não tinha tal capacidade,

39- Nunca poderia a presente execução ter por base uma garantia bancária que apesar de não ter sido alegada, também sempre terá sido accionada posteriormente à data da declaração de insolvência,

40- Não sendo assim imputável a responsabilidade pelo pagamento à subscritora, também os avalistas que responderiam na mesma medida da subscritora da livrança, deixaram de ter quaisquer responsabilidades no pagamento de obrigações que ainda não se tivessem constituído, à data da insolvência.

41- É assim nula a sentença agora posta em crise, quer por omissão de pronuncia, nos termos do artigo 668, nº1 alínea d) por não ter conhecido das consequências de falta de contestação da oposição por parte do exequente,

42- É nula a sentença por excesso do pronuncia por conhecer de factos que não foram alegados pelo exequente no seu requerimento executivo, tudo nos termos do artigo 668º nº 1, alínea d) do CPC.

43- Por outro lado, viola ainda os artigos 817º, nº 3, 484º do CPC e 784º do CPC.

44- E como tal deve ser revogada por outra que considere a oposição totalmente procedente e determine a extinção da execução.

Não foram proferidas contra-alegações.

II. Os Fundamentos:

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

Matéria de Facto assente na 1ª Instância e que consta da sentença recorrida:

1) - O exequente é portador de uma livrança junta nos autos principais de execução a fls. 43, que titula a importância de 108.731,91€, tendo como data de emissão: 5/01/09, e como data de vencimento: 15/01/09, onde consta inscrito financiamento bancário e como subscritora a sociedade J (…) & Netos, SA.

2) - No verso da livrança consta a expressão manuscrita "Dou o aval à firma subscritora desta livrança", situando-se logo abaixo umas assinaturas apostas pelo punho de LC (…), SF (..:) e SM (…).

3) - Por escritura pública, outorgada no dia 24 de Julho de 2001, no Cartório Notarial de Marinha Grande, FA (…) e esposa MI (…), na qualidade de primeiros outorgantes e (…), na qualidade de segundos outorgantes e na qualidade de procuradores com poderes para o acto, em representação do Banco (...), SA, declararam os primeiros outorgantes que para garantia do bom pagamento e liquidação de todas e quaisquer obrigações ou responsabilidades assumidas e ou a assumir, individual e indistintamente, por qualquer uma das seguintes sociedades:

(…)

J (…) & Netos, Limitada (…) perante o Banco representado dos segundos outorgantes, por via de crédito bancário concedido e ou a conceder, por valores descontados e ou adiantados e ou por garantias bancárias prestadas e ou a prestar a solicitação de qualquer uma das supra referidas sociedades e emitidas pelo Banco em nome de qualquer uma das mesmas e designadamente para garantia de responsabilidades emergentes do desconto de letras e ou de livranças, de desconto comercial, de crédito por assinatura, de mútuos, de aberturas de crédito simples e ou em conta corrente, de descobertos na conta de depósitos à ordem, de créditos documentários à importação, da subscrição de cheques, da prestação de fianças, avales e ou quaisquer outras garantias e ainda de quaisquer pagamentos que o referido banco seja chamado a efectuar por força de quaisquer garantias bancárias prestadas e ou a prestar, até ao montante global de capital de cento e setenta mil contos.

(…)

Os primeiros outorgantes constituem a favor do Banco (...), SA, representados dos segundos outorgantes, hipoteca voluntária sobre o seguinte o imóvel:

- Um prédio urbano, composto de edifício de cave e rés-do-chão para armazém, sito no lugar de (...), concelho de Leiria, inscrito na respectiva matriz sob o artigo x (...), descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de Leiria, sob o número y (...)/940915/ (...), com aquisição registada a seu favor conforme inscrição G19940915027.

Que a presente hipoteca se rege pelas cláusulas e termos constantes do documento complementar, elaborado nos termos do nº 2 do artigo 64º do Código do Notariado (…).

4) - Do documento complementar consta (…) condições gerais da hipoteca constituída pelos Senhores FA (…) e mulher MI (…), daqui em diante designados abreviadamente por garantes, a favor do Banco (...), SA daqui em diante designado abreviadamente por Banco (...) para garantia da responsabilidades assumidas e/ou a assumir, individual e indistintamente por qualquer uma das sociedades abaixo identificadas, perante este Banco.

Artigo primeiro

Que para garantia do bom pagamento e liquidação:

a) de todas e quaisquer obrigações ou responsabilidades assumidas e/ou a assumir

individual e indistintamente, por qualquer uma das seguintes sociedades;

(…)

Sociedade com a firma J (…) & Netos, Lda (…) perante o Banco (...), por crédito bancário concedido e/ou a conceder, por valores descontados e/ou adiantados, e/ou por garantias bancárias prestadas e/ou a prestar a solicitação de qualquer uma das identificadas sociedades e emitidas pelo Banco (...) em nome de qualquer uma das mesmas e designadamente, para garantia de responsabilidades emergentes do desconto de letras e(ou livranças, de desconto comercial, de crédito por assinatura, de mútuos de aberturas de crédito simples e/ou em conta corrente de descobertos na conta de depósitos à ordem, de créditos documentários à importação, da subscrição de cheques, da prestação de fianças, avales e/ou quaisquer outras garantias e ainda de quaisquer pagamentos que o Banco (...) seja chamado a efectuar por força de garantias bancárias prestadas e/ou a prestar, até ao montante máximo global de capital de cento e setenta milhos de escudos.

(…)

Os garantes constituem, a favor do Banco (...), hipoteca voluntária sobre o prédio urbano

já identificado na escritura de que o documento faz parte integrante.

5) - Por escritura pública, outorgada em 14 de Julho de 2005, no Cartório Notarial de Leiria, FA (…) e mulher MI (…), na qualidade de primeiros outorgantes e (…) na qualidade de segundos outorgantes e na qualidade de procuradores e em representação de Banco (...), SA, disseram os outorgantes que:

“ Por escritura de vinte e quatro de Julho de dois mil e um, lavrada a folhas sessenta e quatro verso e seguintes do Livro de Notas para escrituras Diversas dezasseis – H, do Cartório Notarial de marinha Grande, os primeiros outorgantes e o Banco Banco (...), SA, representado pelos segundos outorgantes, celebraram um contrato de hipoteca, pelo qual os primeiros deram de hipoteca ao banco o prédio urbano ali identificado (inscrito na matriz predial urbana da freguesia de (...) sob o artigo x (...)) para garantia:

a) de todas e quaisquer responsabilidades assumidas ou a assumir, individual e indistintamente, por qualquer uma das sociedades ( …) J (…) & Netos, Lda (…), perante o Banco (...), representado pelos segundos outorgantes, por via de crédito bancário concedido e/ou a conceder, por valores descontados e/ou adiantados e/ou por garantias bancárias prestadas e/ou a prestar em nome e a solicitação de qualquer uma das supra referidas sociedades e emitidas pelo Banco, em nome de qualquer uma das mesmas, e designadamente para garantia de responsabilidades emergentes do desconto de letras e/ou livranças, de desconto comercial, de crédito por assinatura, de mútuos, de aberturas de crédito simples e/ou em conta corrente, de descobertos na conta de depósitos à ordem, de créditos documentários à importação, da subscrição de cheques, da prestação de fianças, avales, e/ou quaisquer outras garantias e ainda de quaisquer pagamentos que o referido Banco seja chamado a efectuar por força de quaisquer garantias bancárias, prestadas e ou a prestar, até ao montante global de oitocentos e quarenta e sete mil novecentos e cinquenta e seis virgula quarenta e dois euros;

(…)

Que pela presente escritura, eles primeiros outorgantes reforçam aquela hipoteca, dando de garantia ao mesmo Banco, o prédio rústico composto de terra de cultura, sita em (...), freguesia de (...), concelho de Leiria, inscrito na matriz predial respectiva sob o art. w (...) e descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de Leiria sob o número dois mil trezentos e noventa e cinco / (...), e aí registado a favor deles primeiros outorgantes pela inscrição G apresentação treze de dezoito de Março de dois mil e dois.

6) - Por sentença datada de 8/07/08 foi decretada a insolvência de J (…) & Netos, Lda.

7) – A exequente não entregou à subscritora J (…) & Netos, Lda o montante referido A).

Por resultarem de documentos juntos aos autos e não impugnados, ao abrigo do

disposto nos arts. 264º, nº 2 e 659º, nº 3 do CPC, está ainda provado que:

8) – Em 23 de Junho de 2004, o Banco (...) emitiu um documento com o seguinte conteúdo:

“Garantia bancária nº (...)

Em nome e a pedido de J (…) & Netos, SA, (…), o Banco (...), SA (…) declara que oferece uma garantia bancária até ao montante máximo de €215.154.16 (…), através da qual se constitui principal pagador de quaisquer importâncias até ao referido montante máximo que J (...) & Netos, SA ( …) venha a dever a P (…), SA (…) para garantir o exacto e pontual cumprimento de todas as obrigações, incluindo, a boa execução das obras “Edifício (...)”,conforme disposto das clausulas 19º e 20º do contrato de empreitada celebrado em 28-01-2002.

Compromete-se o Banco (...), SA, na qualidade de principal pagador, a reembolsar, de forma incondicional e irrevogável, ao primeiro pedido formulado por escrito pela beneficiária e no prazo de oito dias de para tal ter sido notificado por essa por escrito, todas as importâncias que lhe sejam exigidas, até ao referido limite, sem necessidade de outra confirmação ou justificação.

(…).

9) – O Banco (...), é titular de um documento, datado de

18/06/04, onde consta:

“Pedido de emissão e garantia Bancária

Solícito (amos) que, em meu (nosso) nome e sob a minha (nossa) inteira e exclusiva responsabilidade emitam uma Garantia Bancária nos termos e condições abaixo indicadas:

Peticionário (Ordenador) J (…) & Netos, SA ;

(…)

Titular da Conta nº (...) Nº Fiscal de Contribuinte (...) Beneficiários da Garantia P (…), SA

(…)

Valor da Garantia 215.154.16 (…) prazo de validade 5 anos;

(…)

Finalidade - Garantir o exacto e pontual cumprimento de todas as obrigações, incluindo, a boa execução das obras – Edifício (...) – Conforme das clausulas 19 e 20º do contrato de empreitada celebrado em 28-01-2002.

(…)

Garantia de Liquidação

(…)

- Livrança em branco, subscrita pelo Ordenador e avalizada por SF (…), LC (…), SM (…).

O Banco, no caso de ser chamado a pagar qualquer valor coberto pela garantia prestada, fica desde já autorizado, de forma irrevogável, a completar a livrança com todos os restantes elementos, nomeadamente quanto à data de vencimento, local de pagamento (que será, à escolha do Banco, as suas agências do Porto, de Lisboa ou do domicilio do Ordenador em Portugal) e ao valor a pagar o qual corresponderá aos valores que forem devidos pelo Ordenador, aquando da sua eventual utilização, resultantes do valor que o Banco tenha pago, por força da Garantia prestada acrescido dos juros, comissões e demais despesas.

10) - O documento referido em 9) encontra-se assinado pela subscritora J (…) & Netos, SA.

11) - E na qualidade de avalistas: LC (…), SM (…), SF (…)

12) – Em 10 de Dezembro de 2008, P (…), enviou à exequente uma carta com o seguinte conteúdo: Reportando-nos ao assunto em referência, vimos pela presente solicitar a V. Exas. o reembolso imediato da quantia de € 107.577,03 (cento e sete mil, quinhentos e setenta e sete euros e três cêntimos), correspondente ao valor da garantia bancária prestada por V. Exas., porquanto a v/ afiançada J (…) Netos, Sa, não cumpriu em devido tempo e até à presente a obrigação a que se havia vinculado.

13) – Em 29/12/08 o Banco (...), SA emitiu a favor de P (…)um cheque no valor de €107.577,03;

14) – Em 23 de Dezembro de 2008 a P (…), SA emitiu uma declaração com o seguinte conteúdo: (….) , declara para os devidos efeitos ter recebido do Banco (...), cheque no valor de € 107.577,03 (cento e sete mil, quinhentos e setenta e sete euros e três cêntimos), relativo ao reembolso da Garantia Bancária nº 676/2004-S, emitida por aquela instituição em 23 de Junho de 2004, a nosso favor e a pedido de J (…) & Netos, S.A. a s/ afiançada não ter cumprido em devido tempo a obrigação a

que se havia vinculado.

15) – Em 5/01/09, a exequente enviou a J (…) & Netos, Sa, LC (…), SM (…), SF (…)uma carta com o seguinte conteúdo: Não obstante os nossos insistentes pedidos, V.s Exas. não procederam à regularização dos valores em dívida no montante de € 108.731.91 (cento e oito mil, setecentos e trinta e um euros e noventa e um cêntimos) relativos ao saldo devedor que se regista na conta de Depósitos à Ordem n° (...) e respectivos juros de mora e impostos, titulada por V.s Exas, junto da nossa Instituição de Crédito, por força do accionamento da Garantia Bancária n ° 676/2004S, e encargos com a mesma.

Tais valores, como sabem, estão titulados pela livrança subscrita por V.s Exa.s, para garantia do montante referido, cujo pagamento deverá ser efectuado, até ao dia 15 de Janeiro de 2009, data do respectivo vencimento.

*

Das conclusões - 

 (das quais haverá de dizer-se - em nome do rigor que sempre há que colocar na hipótese de trabalho judiciário sub judice -, que desenvolvem - de forma profusa e tautológica pontos de apreciação, sem levar em devida conta que, justamente, por conclusões se entendem “as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação” (Alberto dos Reis, CPC Anot., 5.°-359). E, sobretudo, que «as conclusões consistem na enunciação, em forma abreviada, dos fundamentos ou razões jurídicas com que se pretende obter o provimento do recurso. Com mais frequência do que seria para desejar vê-se, na prática, os recorrentes indicarem como conclusões, o efeito jurídico que pretendem obter com o provimento do recurso, e, às vezes, até com a procedência da acção. Mas o erro é tão manifesto que não merece a pena insistir neste assunto. Se as conclusões se destinam a resumir, para o tribunal ad quem, o âmbito do recurso e os seus fundamentos, pela elaboração de um quadro sintético das questões a decidir e das razões porque devem ser decididas em determinado sentido, é claro que tudo o que fique para aquém ou para além deste objectivo é deficiente ou impertinente (Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, 30, 299), -

ressaltam as seguintes questões elencadas, na sua formulação originária, de parte, a considerar na sua própria matriz:

I.

39- Nunca poderia a presente execução ter por base uma garantia bancária que apesar de não ter sido alegada, também sempre terá sido accionada posteriormente à data da declaração de insolvência,

40- Não sendo assim imputável a responsabilidade pelo pagamento à subscritora, também os avalistas que responderiam na mesma medida da subscritora da livrança, deixaram de ter quaisquer responsabilidades no pagamento de obrigações que ainda não se tivessem constituído, à data da insolvência.

Apreciando, diga-se que a este respeito, incontornável é o disposto no art. 32º LU, ao prescrever, designadamente, que:

O dador de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada.

A sua obrigação mantém-se, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma.

Se o dador de aval paga a letra, fica sub-rogado nos direitos emergentes da letra contra a pessoa a favor de quem foi dado o aval e contra os obrigados para com esta em virtude da letra.

Em tais termos, a obrigação do avalista é subsidiária de outra obrigação cambiária, ou da obrigação de outro signatário. O art. 32º, assim, ao determinar que o dador de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada, consagra a natureza subsidiária ou acessória da obrigação do avalista (P. COELHO, Lições de Direito Comercial, 2º Vol., fasc.I, p. 5.; G. DIAS, Da Letra e da Livrança, 1º, 7.), vinculando ser o aval uma obrigação solidária (P. COELHO, Lições de Direito Comercial, 5º3 e 24); G. DIAS, loc. cit., 7º-365).

Em decorrência, pelo disposto no art. 32º da L. U., o avalista é considerado responsável talqualmente a pessoa que ele afiança, o que significa que, quanto à sua responsabilidade pelo pagamento da letra, aquele preceito não estabelece qualquer distinção entre aceitante e avalista (alvo se existir um vício de forma que torne nula a obrigação, pois não é de aplicar ao avalista o art. 852. do C. C. mesmo que de moratória se trate (Ac. R. Lx. de 31-3-954, in A. CUNHA, 1954-306.

Inexoravelmente, a obrigação do avalista manter-se-ia, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma (art. 32. II) (Abel Pereira Delgado, LEI UNIFORME SOBRE LETRAS E LIVRANÇAS, ANOTADA, 4.ª EDIÇÃO (actualizada), 1980, pp. 171-173).

Sendo que, a tal pretexto - sem mais - se observou em decisório:

“(…) O subscritor do título fica vinculado a partir do momento em que o entrega assinado.

Quanto propriamente à obrigação cambiária, isto é, a obrigação de pagar a soma constante do título, ela só se constitui através do preenchimento. O que existe antes do preenchimento para o emitente do titulo não é uma obrigação cambiária, mas apenas o estar ele sujeito ao exercício do direito potestativo do portador de preencher o título, sendo o preenchimento que marca o nascimento da obrigação cambiária.

O preenchimento da livrança em branco, condição imprescindível para que possam verificar-se os efeitos normalmente resultantes das livranças, faz-se, como é sabido, de harmonia com o chamado contrato de preenchimento.

O acordo de preenchimento (o denominado pacto de preenchimento) corresponde, assim, a um protocolo complementar ou acessório, nos termos do qual as partes ajustam os termos em que deverá definir-se a obrigação cambiária, tais como a fixação do seu montante, o vencimento, o local de pagamento e as especificações de juros.

Preenchido o título, o tomador da livrança pode exercer, em princípio, contra o subscritor e avalistas os direitos correspondentes ao título cambiário, tal como está. Tal como resulta dos factos provados, aquando da emissão da garantia bancária a sociedade J (…) & Netos, SA entregou ao exequente uma livrança em branco, subscrita por ela e avalizada pelos oponentes/executados LC (…)e SM (…).

Na mesma data, assinaram também um escrito, no qual autorizaram o exequente “a completar a livrança com todos os restantes elementos, nomeadamente quanto à data de vencimento, local de pagamento (que será, à escolha do Banco, as suas agências do Porto, de Lisboa ou do domicilio do Ordenador em Portugal) e ao valor a pagar o qual corresponderá aos valores que forem devedor pelo Ordenador, aquando da sua eventual utilização, resultantes do valor que o Banco tenha pago, por força da Garantia prestada acrescido dos juros, comissões e demais despesas”.

Assim, o título dado à execução foi assinado, acompanhado de um acordo de preenchimento (pacto de preenchimento), o que os executados, na qualidade de avalistas, subscreveram e aceitaram.

Nos termos desse pacto a livrança destinava-se a cobrir o montante que o banco exequente viesse a pagar à sociedade P (…) por força da garantia prestada.

Resulta da matéria de facto alinhada que o exequente, em cumprimento da garantia prestada, entregou em 29/12/08 à sociedade P (…) a quantia de €107.577,03.

A exequente cumpriu a garantia bancária prestada a favor da P (…), SA, no montante de €107.577,03 e, na sequência desse pagamento, procedeu ao preenchimento da livrança dada à execução, tendo disso dado conhecimento aos executados, através da comunicação referida em 15), com discriminação dos valores que integram o montante por que foi preenchida.

Deste modo, a livrança foi preenchida de acordo com o acordado.

Os oponentes alegam que a sociedade subscritora da livrança foi declarada insolvente em Julho de 2008 no processo que correu seus termos no 2 Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria com o n 3945/08.6TBLRA.

Porém, esse facto não exclui a responsabilidade dos avalistas. Na verdade, como já supra se aduziu, a obrigação do dador de aval mantém-se mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser materialmente nula (art. 32 § 2 da LULL). Esta é uma das consequências da natureza autónoma do aval, o mesmo é dizer, da não acessoriedade típica do aval em relação à operação avalizada (Paulo Sendim, “Letra de Câmbio”, Vol. II, pág. 784) “.

A exclusão da responsabilidade do avalista só é reconhecida nos casos em que a obrigação que ele garante seja nula por vício de forma, isto é, por vício que diga respeito aos requisitos externos da obrigação cambiária, perceptíveis pelo simples exame do título, e que comprove um impedimento objectivo e absoluto de a operação concretizadora da obrigação do avalizado formar qualquer valor patrimonial para a livrança.

No caso, o título executivo é uma livrança, documento particular, assinado pelos oponentes LC (…) e SM (…) , como avalistas e que importa a constituição de uma obrigação pecuniária, cujo montante está bem determinado, e que resultou de um pacto de preenchimento em que os mesmos autorizaram o exequente a preencher a livrança, pelo montante que fosse devido”.

Inferindo - de novo, sem mais -, que:

“Deste modo, forçoso será concluir que a presente oposição terá de soçobrar”.

Em face, exactamente, do princípio da independência recíproca das obrigações cambiárias consagrado em termos genéricos no artigo 7º da Lei Uniforme e definido em termos especiais na alínea 2.°) do artigo 32.° desse mesmo diploma relativamente ao aval.

Segundo este preceito legal, a responsabilidade do dador de aval «mantém-se, mesmo no caso da obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma».

A excepção ao princípio consignado na primeira parte do referido preceito legal através da fórmula «vício de forma» justifica-se, como doutrina o Prof. Pinto Coelho Lições de Direito Comercial 2.° vol., Fasc. V - As Letras, 2.a parte, pág. 43) pelo facto de, sendo a obrigação do aval assumida com o fim directo de garantir a responsabilidade de outro signatário ou obrigado cambiário, «não parecer tão fácil como nos outros casos desligar a responsabilidade do novo obrigado da obrigação daquele a quem o aval era dado, precisamente por a obrigação do avalista ser a cobertura da do avalizado e ter nela a sua única razão de ser».

Daí o ter-se ressalvado o caso da nulidade da obrigação garantida provir de vício de forma, caso em que, sendo possível ao portador ou adquirente do título aperceber-se «ictu oculi» da irregularidade da obrigação principal e, consequentemente, da sua insubsistência, lhe estar vedado justificar a independência da obrigação assumida pelo avalista com a necessidade de acautelar e proteger os interesses de terceiros.

 O que, circunstancialmente, nos termos referenciados, assim se não pode - sem cuidar de outros factores - ainda desenhar.

Tal o que, necessariamente, no circunstancialismo invocado, cumpre responder às questões em I.

II.

41- É assim nula a sentença agora posta em crise, quer por omissão de pronuncia, nos termos do artigo 668, n°1 alínea d) por não ter conhecido das consequências de falta de contestação da oposição por parte do exequente,

42- É nula a sentença por excesso do pronuncia por conhecer de factos que não foram alegados pelo exequente no seu requerimento executivo, tudo nos termos do artigo 668° n° 1, alínea d) do CPC.

A este pretexto, haverá de dizer-se que uma sentença, ou um acórdão (cf. art. 716°- 1, é nulo «quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão», isto é, quando os fundamentos invocados devessem, logicamente, conduzir a uma decisão diferente da que a sentença ou acórdão expressa (A. dos Reis, Cód. Proc. Civ. Anot., 5°- 141; A. Varela, Manual, 1.ª ed., pág. 671). O que, circunstancialmente, se não configura.

Por sua vez, a nulidade prevista na 1.ª parte da al. d) do n.° 1 do art. 668.° está directamente relacionada com o comando fixado no n.° 2 do art. 660°, segundo o qual «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras».

Tal norma suscita, de há muito, o problema de saber qual o sentido exacto da expressão «questões» ali empregue, o qual é comummente resolvido através do recurso ao ensinamento clássico de Alberto dos Reis Cód, Proc. Civ. Anot., 5.°-54, que escreve: «... assim como a acção se indentifica pelos seus elementos essenciais (sujeitos, pedido e causa de pedir) (...), também as questões suscitadas pelas partes só podem ser devidamente individualizadas quando se souber não só quem põe a questão (sujeitos), qual o objecto dela (pedido), mas também qual o fundamento ou razão do pedido apresentado».

No âmbito lógico deste raciocínio, doutrina e jurisprudência distinguem, por um lado, «questões», e, por outro, «razões» ou «argumentos», e concluem que só a falta de apreciação das primeiras — das «questões» — integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das «razões» ou «argumentos» invocados para concluir sobre as questões (vid., assim, Alberto dos Reis, ob. e vol. cits., pág. 143; RT, 78.°-172, 89.°-456, e 90.°- -219; Acs. STJ, de 2.7.1974, de 6.1.1977, de 13.2.1985, de 5.6.1985, entre muitos outros). O que, também, não inquina a decisão proferida.

Vale isto por dizer que a alínea d) do n.° 1 do art. 668.° do Cód. Proc. Civil conjuga-se com o art. 660.° do mesmo Código, sendo certo que o n.° 2 deste último normativo se reporta a causas de pedir e a pedidos o que não é confundível com argumentos, considerações ou razões (Ac. RE, de 5.5.1988: BMJ, 377.°-574).

Serve tal tessitura institucional de protecção para dizer que o próprio art. 264° (princípio dispositivo), para que o art. 664º CPC (relação entre a actividade das partes e a do juiz) remete, começa por prescrever que «às partes cabe alegar os factos que integra, a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções» (n.° 1), acrescentando o n.° 2 que «o juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do disposto nos arts. 514.° e 665° e da consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa». Por seu turno, o n° 3 acrescenta que «serão considerados na decisão os factos essenciais à procedência das pretensões formuladas ou das excepções deduzidas que sejam complemento ou concretização de outros que as partes hajam oportunamente alegado e resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultada o exercício do contraditório».

«Daqui resulta — escreveu A. PAIS DE SOUSA e J. CARDONA FERREIRA, Processo Civil, 1997, pág. 31 — que, à luz do princípio da boa decisão da causa, o Tribunal pode (leia-se: deve, porque se o Tribunal pode utilizar-se de certos meios para bem julgar, não pode ignorá-los!) basear-se, designadamente, em:

a) factos alegados pelas partes;

b) factos notórios;

c)

d)

e) factos instrumentais que resultam da instrução e discussão da causa;

factos essenciais à procedência das pretensões formuladas ou das excepções deduzidas que sejam complemento ou concretização de outros que as partes hajam, oportunamente, alegado e resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de, deles, se aproveitar e, à parte contrária, tenha sido facultada o exercício do contraditório».

Na conformidade de que “os factos instrumentais” isto é, aqueles que clarificam ou esclarecem os essenciais, resultantes da instrução e discussão da causa, podem ser referidos na decisão sobre a matéria de facto, sendo-lhes inaplicável a regra do n.° 3 do art. 264°. Em qualquer circunstância, levando em consideração que o tribunal só é livre na qualificação jurídica dos factos desde que não altere a causa de pedir. Assim, o juiz, ao suprir as deficiências ou inexactidões das partes no tocante à qualificação jurídica dos factos ou à interpretação ou individuação das normas, tem de manter-se dentro do limite fundamental que lhe marca a acção, não podendo alterar as afirmações que identificam a razão e justificam as conclusões (A. dos Reis, CPC Anot., 5.°-93).

Do mesmo modo, pelo que respeita ao direito, o juiz move-se livremente. Não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras do direito. Pode ir buscar regras diferentes daquelas que as partes invocaram (indagação); pode atribuir às regras invocadas pelas partes sentido diferente do que estas lhes deram (interpretação); pode fazer derivar das regras de que as partes se serviram efeitos e consequências diversas das que estas tiraram (aplicação) (A. dos Reis, CPC Anot.. 5.°-453).

O que se intensifica com a circunstância de, sem prejuízo de às partes caber a formação da matéria de facto, mediante a alegação, nos articulados, dos factos principais que integram a causa de pedir, a reforma do processo civil atribuiu ao Tribunal a assunção de uma posição muito mais activa, de forma a aproximar-se da verdade material e alcançar uma posição mais justa do processo. Reconhecendo-se agora ao Juiz, para além da atendibilidade dos factos que não carecem de alegação e de prova a possibilidade de considerar, mesmo oficiosamente, os factos instrumentais, bem como os essenciais à procedência da pretensão formulada, que sejam complemento ou concretização de outros que a parte haja oportunamente alegado e de os utilizar quando resultem da instrução e da discussão da causa e desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório (Ac. RC, de 9.3.2004: Proc. 4070/03.dgsi.Net). Sendo que, para os factos serem instrumentais é necessário que tenham uma relação com os factos principais, de tal maneira que, a partir daqueles, se possa chegar a estes. Podendo ser factos instrumentais, pela sua natureza e potencial relação com outros factos, podem, também, ser tomados em conta, nos termos do disposto no art. 264°, n.° 2, do CPC, se estes — os principais — tiverem sido alegados (Ac. RC, de 27.4.2004: Proc. 204/04.dgsi.Net).

Sempre no referencial igualmente vinculador, como ensinava já Fernando Olavo, nas suas lições de Direito Comercial, vol. lI, 1963, pg. 114, edição policopiada pela AAFDL, datada de 1963, e que no tocante a esta matéria se encontra ainda actualizada, de que:

“(...) O título de crédito abstracto (leia-se aqui, a livrança) tem necessariamente não uma mas duas causas — uma causa próxima e uma causa remota: Causa remota é o negócio jurídico fundamental, subjacente ou causal, isto é, aquele negócio que dá lugar à emissão do título de crédito. Causa próxima é a convenção executiva, a qual muitas vezes se encontra implícita (...) Pode definir-se a condição executiva como sendo a convenção pela qual as partes do negócio jurídico fundamental concordam em que se emita um título de crédito.(...) Nos títulos abstractos os direitos neles integrados vivem independentemente da causa o que não quer dizer que esta jamais possa ser invocada. O negócio jurídico causal pode ser invocado nos mesmos termos em que entre as mesmas partes podem ser invocados os direitos decorrentes de vários negócios que tenham celebrado.”(sublinhado nosso)

Deriva daí que os intervenientes originários num título de crédito podem opor entre si qualquer excepção que tenha como suporte a relação jurídica subjacente.

No entanto, quando introduzidos no comércio jurídico e em poder de terceiros, isto é, quando à relação cartular deixe de corresponder a relação causal que lhe serviu de fonte, os dizeres do título tornam-se válidos por si mesmos, e a sua razão de ser executiva é a de impedir que os obrigados na relação cartular possam opor ao portador legítimo qualquer excepção de direito material fundadas em relações pessoais delas com o sacador ou portador anterior que visasse exonerá-los. A única excepção admitida na lei, é apenas a de que, ao tornar-se portador do título, esse novo portador tivesse actuado conscientemente em detrimento do devedor. E isso mesmo que se estabelece no art. 17.° da LULL, aplicável às livranças, de acordo com o disposto no art. 77 da mesma Lei Uniforme.

(…)

Na verdade, o portador legítimo de uma livrança tanto pode ser aquele que nela tem o lugar de beneficiário da mesma, como aquele que estando na posse dela, justifica a sua posse, através de uma série interrupta de endossos.- art. 16.° da LULL.

Se o portador da livrança for o beneficiário originário e o avalista for o da relação causal, está-se no domínio das relações imediatas, tornando possível a discussão das excepções que poderiam opor-se ao devedor avalizado, porque não se saiu da relação jurídica subjacente que deu origem ao título.

Se no entanto o portador da livrança for já um terceiro interveniente (a quem a livrança foi endossada directamente pelo anterior beneficiário ou que se mostre justificada a respectiva posse por uma série ininterrupta de endossos), não poderá ser deduzida qualquer excepção de direito material assente nas relações pessoais dos obrigados com os anteriores sacadores ou portadores, porque, deixando de haver correspondência entre a relação causal e a relação cartular, torna-se essencial para segurança do comércio jurídico, assegurar a validade do título, nas suas dimensões de completa literalidade, abstracção e autonomia. E aí que assenta a ratio legis do art. 17.° da LULL.

É certo que por vezes se vê escrito, como na decisão recorrida, que entre o portador da Livrança e o avalista do subscritor, a relação existente é uma relação mediata, por se intrometer formalmente o avalizado. A primeira parte dessa afirmação até pode ser verdade, como acima deixamos ressalvado, quando, por exemplo, o portador da livrança não é o originário beneficiário desta, e resolveu endossá-la, mas já não será assim quando o portador da livrança continua a ser o tomador originário ou retomou a livrança depois de uma série ininterrupta de endossos.

O que não pode aceitar-se é que, não saindo o título das relações dos primitivos intervenientes, não possa o avalista do subscritor (que é responsável da mesma maneira que o afiançado, nos termos do art. 32º parte da LULL), opor ao primitivo credor qualquer excepção de direito material, fundada sobre as relações pessoais que este pudesse opor no negócio subjacente.

Em face do exposto, e salvo o devido respeito, não se mostra sempre correcta a afirmação de que, pelo facto de entre o avalista do subscritor de uma livrança e o tomador desta existir na relação cartular o avalizado subscritor que se esteja, por esse simples facto, no domínio das relações mediatas entre aqueles:

Vale aqui o sustentado, por exemplo, no Ac. do STJ de 3 de Julho de 2000, Col. Jur. Acs. STJ, ano VIII, tomo ll-2000, pg. 140, Ribeiro Coelho, Garcia Marques e Ferreira Ramos, onde se escreveu que cabe no domínio das relações imediatas de uma livrança a relação “entre o subscritor da promessa de pagamento e o respectivo beneficiário, ou entre este e a pessoa a quem a endosse, ou entre esta e o subsequente endossado. serão igualmente imediatas as relacões entre (... o avalista do subscritor e o beneficiário, visto que as suas obrigações, independentemente dos avalizados. têm como primeiro credor o interveniente cambiário que assim se lhes opõe (sublinhado nosso) (Ac.RP de 27.06.2006 - Processo 0623005, Relator Mário Cruz, in www.dgsi.pt).

Razões conjugadas que - tudo visto - não podem, no condicionalismo dos Autos, só por si, ainda, determinar que os Recorrentes carecem de razão.

Mesmo continuando a insistir-se que a obrigação do avalista é autónoma, não podendo defender-se com as excepções do avalizado, salvo no que concerne ao pagamento (entre outros, os acórdãos de 27 de Abril de 1999, na CoI.Jur. S.T.J., VII, 2°, pág.68 e de 1 de Julho de 2003, revista n°1942/03). Não podendo os Recorrentes, assim, invocar a nulidade do contrato para se eximirem aos efeitos do aval.

Ou como em consagração paralela se estipula:

“a obrigação do avalista é autónoma, não podendo defender-se com as excepções do avalizado, salvo no que concerne ao pagamento; sendo que os vícios de forma a que alude o segundo parágrafo do artigo 32° da L.U.L.L., na origem da nulidade da obrigação da pessoa que o aval garante, e que excluem a responsabilidade do avalista, são apenas os que respeitam aos requisitos externos da obrigação cambiária, perceptíveis pelo simples exame do título (Ac. STJ de 14/10/2004, no proc. nº 04B2904 - Relator Moitinho de Almeida em www.dgsi.pt)”.

Sendo este o teor (possível, neste momento) da resposta  - nesta sequência de alegações - às questões em II. configuradas.

III.    

43- Por outro lado, viola ainda os artigos 817°, n°3, 484° do CPC e 784° do CPC.

44- E como tal deve ser revogada por outra que considere a oposição totalmente procedente e determine a extinção da execução.

Os embargos de executado ou a oposição à execução assumem a estrutura de contra acção declarativa tendente a obstar aos efeitos da execução por via da afectação dos efeitos normais do título executivo em que o executado pode invocar factos de impugnação ou de excepção, regendo-se o ónus de prova pelo disposto no art. 342.° do Cód. Civil (Ac. STJ. de 25.3.2004: Proc. 04B954.dgsi.Net). Ou seja, o regime do ónus da alegação e da prova dos factos extintivos ou modificativos da obrigação exequenda cabe ao executado (Ac. STJ, de 9.5.2002. Rev. n.° 533/02-1.: Sumários, 5/2002). Inferência que, na situação sub judice, não pode - ainda - dizer-se que foi  lograda, exactamente porque não é possível, neste momento processual, discernir.

O que decorre directamente de o ónus consistir - na referência do aer. 342°,1, do CCivil - na necessidade de observância de determinado comportamento, não para satisfação do interesse de outrem, mas como pressuposto da obtenção de uma vantagem para o próprio, a qual pode inclusivamente cifrar-se em evitar a perda de um beneficio antes adquirido (A. Varela, Obrigações, 35): traduz- se, para a parte a quem compete, no encargo de fornecer a prova do facto visado, incorrendo nas desvantajosas consequências de se ter como liquido o facto contrário, quando omitiu ou não logrou realizar essa prova: ou na necessidade de, em todo o caso, sofrer tais consequências se os autos não contiverem prova bastante desse facto (trazida ou não pela mesma parte) (Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1956, pág. 184).

O ónus da prova traduz-se, pois, para a parte a quem compete, no dever de fornecer a prova do facto visado, sob pena de sofrer as desvantajosas consequências da sua falta (Ac. RC, 17-11-1987: CJ 1987, 50-80).

Como principal corolário dos princípios dispositivos da auto-responsabilidade das partes e do contraditório (e a pretexto particular do que se consagra no art. 484º CPC - efeitos da revelia), o réu fica constituído no ónus de contestar ou de responder, ou seja, no de comparecer em juízo e contestar e cada uma das partes de responder aos articulados apresentados pela outra. A consequência do incumprimento do ónus de contestar é, de acordo com o principio da auto-responsabilidade das partes e como regra entre nós, no processo ordinário, o da admissão como confessados dos factos alinhados na petição inicial — cominação semi-plena — (art. 484.°), e, nos processos sumário e sumaríssimo, o da admissão do próprio pedido como válido — cominação plena — (arts, 784.° e 795°), ficando apenas ressalvados, além das excepções consignadas dos cits. artigos, as referidas no art. 485°. As apontadas consequências da revelia verdadeira e própria, fazendo saltar a lide da fase dos articulados para a do julgamento nos processos sumário e sumaríssimo ou para a da discussão, no processo ordinário, também se justifica através dos princípios da celeridade e da economia processuais (cf. A. B. Coelho, em RT, 92.°-394 e ss.).

Por último, invocado que foi o disposto no art. 784° do CPC (julgamento das acções não contestadas), o princípio de que as decisões judiciais devem não só vencer como convencer as partes sofre a excepção deste normativo. Assim, em caso de revelia do réu, tendo ele sido citado ou devendo considerar-se citado pessoalmente, pode o juiz na sentença limitar-se a aderir aos fundamentos invocados pelo autor (Ac. RC, de 20.6.2000: BMJ, 498 .°-286).

Tanto assim que a revelia absoluta, no Código de Processo Civil, com a redacção do Dec.-Lei n.° 329-A/95, de 12-12, conduz à admissão dos factos, alegados pelo impetrante, que devem ser apreciados pelo juiz (arts. 784.° e 795°) (Ac. RE, de 21.10.2004: Proc. 78/04-3.dgsi.Net).

-

O que, a tal pretexto, determina que a conclusão firmada em probatório se configura, processualmente, como um impossível categórico.

Para tanto inferir, leve-se em consideração o que vem alegado, designadamente, nos itens 11º a 20º do articulado de oposição:

11.º - Até porque nem pode existir quaisquer valores a crédito como seria o resultante do financiamento alegado, o mesmo teria de ser afecto á massa insolvente,

12.° - De verdade, apenas, que não existiu qualquer financiamento conforme o exequente pretende justificar com a livrança exequenda;

13.° - Sendo pura fantasia tal operação;

14.° - Que não passa de um expediente utilizado pelo Banco (...) para inventar activos;

15.° - Mas que sabe não existirem,

16.° - É rigorosamente falso que tenha sido solicitado ou concedido o crédito titulado pela livrança exequenda;

17.° - Livrança que só o é pelo aspecto formal já que não traduz qualquer transacção creditícia;

18.° - Nem nunca foi assinada como tal executados;

19.° - Que a ignoram completamente, nem jamais foram interpelados para o respectivo pagamento;

20.° - A menos que a Sr. Administradora Judicial tivesse solicitado aquele crédito, caso em que só ela poderia representar a subscritora;

Com particular destaque para

18.° - Nem nunca foi assinada como tal executados;

Circunstancialismo em que - justificadamente - se voltou a insistir, em particular e compreensivelmente, no seguinte segmento das alegações de recurso:

8- A livrança nunca foi assinada como tal pelos executados;

9- Não existindo tal responsabilidade, é evidente que também nada é exigível aos executados como garantes hipotecários como são o executado FC (...) e mulher,

10- Sem transacção também não existiu qualquer responsável

11- Devidamente notificado o exequente para contestar a oposição deduzida, com a cominação de se considerarem confessados os factos alegados pelos agora recorrentes, o exequente nada disse.

12- Nos termos do artigo 817º nº 3, do CPC, sempre deveriam ter sido considerados procedentes os factos alegados pelos recorrentes em sede de oposição à execução e sempre a oposição ser considerada procedente e a execução extinta.

13- Contudo, o Tribunal a quo nem verificou tal facto e os autos prosseguiram e perante a alegação efectuada pelos recorrentes de que a livrança não havia sido assinada pelos executados, e atenta a não contestação do exequente, não poderia sem mais, ter dado como provado no seu despacho saneador que no verso da livrança consta a expressão manuscrita “dou o meu aval à firma subscritora desta livrança”, situando-se logo a abaixo umas assinaturas apostas pelo punho de LC (…), SF (..) e SM (…) ,”.

14- Os recorrentes impugnaram a assinatura constante da livrança, no entanto o Tribunal a quo fez tábua rasa de tal alegação e mesmo perante a não contestação do exequente deu tal facto ab initio como provado.

15- Ora tal facto está diametralmente em oposição ao alegado pelos recorrentes em sede de oposição não contestada pelo exequente, quando alegaram que a livrança dada à execução não ter sido assinada por si, impendendo sobre a exequente a prova de tal situação, o que não aconteceu.

O que impõe a reformulação - a tal respeito - da matéria dada por assente - levando-se à base instrutória a matéria tida por indispensável a tal se apurar, mais desenvolvidamente, em particular, como foi alegado no articulado inicial e em alegações de recurso, designadamente, por adequação, se:

- A livrança foi assinada como tal pelos executados?

Isto porque o juiz, ao fixar a base instrutória, tem de seleccionar a matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, que considere controvertida, conforme o art. 511.º do Cód. Proc. Civil (Ac. STJ, de 21.5.1998: BMJ, 477.°- 482). Depois porque a especificação, tenha ou não havido reclamações, tenha ou não havido impugnação do despacho que as decidiu, pode ser sempre alterada, mesmo na ausência de causas supervenientes, até ao trânsito em julgado da decisão final do litígio (Ac. STJ, de 10.2.2000: Col. Jur./STJ, 2000, 1.°-76). Ou como já se vinha considerando, a organização da especificação e do questionário é insusceptível de produzir caso julgado implícito (Ac. STJ, de 28.5.2002, Rev. n.° 1506I02-2. Sumários, 5/2002).

Deste modo, pois que a fixação da base instrutória, restrita à matéria de facto que deva considerar-se controvertida, deve terem linha de conta, tal como já sucedia com a organização do questionário, toda a matéria de facto articulada, «relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito».

Assim, se a questão de direito suscitada entre as partes admitir, na doutrina e/ou na jurisprudência, mais do que uma solução, a base instrutória deve adaptar-se às necessidades de todas elas quanto à matéria de facto — constante dos autos e que permaneça controvertida — em lugar de se cingir apenas a uma determinada solução, designadamente à perfilhada pelo juiz, o que bem se compreende: nem sempre o juiz que elabora a base instrutória será aquele que vem a proferir a sentença, e, mesmo que seja, não pode nem deve fazer, desde logo, um pré-julgamento, e, depois, o tribunal de recurso pode seguir doutrina diversa do tribunal a quo e tem de encontrar-se habilitado com a matéria de facto que lhe permita aplicar o direito nos termos que lhe pareçam os mais adequados.

«Neste campo, não tem o juiz que guiar-se por um critério meramente subjectivo, orientado pela qualificação jurídica, pelas normas e pela solução que tem em mente nesta fase processual, antes deve acautelar a prova de todos os factos que tenham alguma relevância para a correcta e, eventualmente, divergente, integração jurídica» (A. S. ABRANTES GERALDES, Temas da Reforma do Processo Civil, vol. II, 2. cd., 1999, pág. 151).

De resto - como se observa em JOSÉ LEBRE DE FREITAS, A ACÇAO EXECUTIVA DEPOIS DA REFORMA, 4ª EDIÇÃO, 2004, pp. 190-191):

“ constituindo petição duma acção declarativa e não contestação duma acção executiva, a dedução da oposição à execução não representa a observância de qualquer dos ónus cominatórios (ónus da contestação, ónus da impugnação especificada) a cargo do réu na acção declarativa: nem a omissão de oposição produz a situação de revelia nem a omissão de impugnação dum facto constitutivo da causa de pedir da execução produz qualquer efeito probatório, não fazendo sentido falar, a propósito, de prova de factos alegados pelo exequente ou de definição do direito decorrente do título executivo, o qual continua, após o decurso do prazo para a oposição como até aí, a incorporar a obrigação exequenda, com dispensa, em princípio, de qualquer indagação prévia sobre a sua real existência.

Mas, na medida em que a oposição à execução é o meio idóneo à alegação dos factos que em processo declarativo constituiriam matéria de excepção (LOPES CARDOSO, Manual cit., p. 275. Para além de servirem fins de impugnação), o termo do prazo para a sua dedução faz precludir o direito de os invocar no processo executivo, a exemplo do que acontece no processo declarativo. A não observância do ónus de excepcionar, diversamente da não observância do ónus de contestar ou do de impugnação especificada, não acarreta uma cominação, mas tão-só a preclusão dum direito processual cujo exercício se poderia revelar vantajoso (A noção de ónus tem sido encarada na doutrina segundo duas perspectivas distintas: enquanto para uns a actividade do respectivo titular visa evitar uma desvantagem, para outros tem como escopo conseguir uma utilidade ou uma vantagem (maiores precisões em LEBRE DE FREITAS, A confissão, p. 487 (69)). A consideração das consequências da falta de contestação ou de impugnação nos sistemas de contestação ficta (como o italiano ou o francês), em que o autor continua a ter o ónus de provar os factos constitutivos do seu direito, leva a configurar os ónus de contestar e de impugnar no segundo sentido, enquanto nos sistemas de confissão ficta (como o nosso, o alemão ou o inglês) eles se configuram antes na primeira acepção (GIANOZZl, La contumacia nel processo civile, Milano, 1963, p. 155); mas o ónus de excepcionar só pode ser entendido naquele segundo sentido. A noção de ónus, com a ambivalência decorrente do completamento recíproco das duas perspectivas, liga-se intimamente à de auto-responsabilidade - LEBRE DE FREITAS. Introdução cit, II, 7)).

Com uma diferença, porém, relativamente ao processo declarativo: enquanto neste o efeito preclusivo se dissolve, com a sentença, no efeito geral do caso julgado (supra, nota 19), tal não acontece no processo executivo, em que não há caso julgado (infra, 20.1.4), pelo que nada impede a invocação duma excepção não deduzida (que não respeite à configuração da relação processual executiva) em outro processo. A decisão neste subsequentemente proferida não tem eficácia no processo executivo (54), mas pode conduzir à restituição ao executado da quantia conseguida na execução, pelo mecanismo da restituição do indevido (55)”.

Termos em que se revoga a decisão proferida, impondo-se a baixa dos Autos ao tribunal a quo para que, a pretexto de nova e indispensável elaboração da base instrutória, se apure, desde logo, se:

- A livrança em causa foi assinada como tal pelos executados?

e quaisquer outros elementos adjuvantes, confluentes e afluentes, no referencial supra estipulado que vem controvertido, tidos por indispensáveis a tal ou tais precisões.

Sendo, deste modo, afirmativa, mas com o alcance que, assim, se precisa, a resposta às questões em III.

Pode, assim, concluir-se, sumariando, que:

1.

Constituindo petição duma acção declarativa e não contestação duma acção executiva, a dedução da oposição à execução não representa a observância de qualquer dos ónus cominatórios (ónus da contestação, ónus da impugnação especificada) a cargo do réu na acção declarativa: nem a omissão de oposição produz a situação de revelia nem a omissão de impugnação dum facto constitutivo da causa de pedir da execução produz qualquer efeito probatório, não fazendo sentido falar, a propósito, de prova de factos alegados pelo exequente ou de definição do direito decorrente do título executivo, o qual continua, após o decurso do prazo para a oposição como até aí, a incorporar a obrigação exequenda, com dispensa, em princípio, de qualquer indagação prévia sobre a sua real existência.

2.

Mas, na medida em que a oposição à execução é o meio idóneo à alegação dos factos que em processo declarativo constituiriam matéria de excepção, o termo do prazo para a sua dedução faz precludir o direito de os invocar no processo executivo, a exemplo do que acontece no processo declarativo. A não observância do ónus de excepcionar, diversamente da não observância do ónus de contestar ou do de impugnação especificada, não acarreta uma cominação, mas tão-só a preclusão dum direito processual cujo exercício se poderia revelar vantajoso.

3.

Por isso, o juiz, aqui também, ao fixar a base instrutória, tem de seleccionar a matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, que considere controvertida, conforme o art. 511.º do Cód. Proc. Civil.

4.

 Neste campo, não tem o juiz que guiar-se por um critério meramente subjectivo, orientado pela qualificação jurídica, pelas normas e pela solução que tem em mente nesta fase processual, antes deve acautelar a prova de todos os factos que tenham alguma relevância para a correcta e, eventualmente, divergente, integração jurídica. O que, na circunstância não foi feito na dimensão revelada indispensável para a correcta e adequada resolução da causa.

III A Decisão:

Pelas razões expostas, revoga-se a decisão proferida, impondo-se a baixa dos Autos ao tribunal a quo para que, designadamente, a pretexto de nova e indispensável elaboração da base instrutória, se apure, desde logo, se:

- A livrança em causa foi assinada como tal pelos executados?

e quaisquer outros elementos adjuvantes, confluentes e afluentes, no referencial estipulado, que vem controvertido, tidos por indispensáveis a tal ou tais precisões, indispensáveis para uma adequada e correcta decisão da causa.

Sem Custas.

António Carvalho Martins (Relator)

Carlos Moreira

João Moreira do Carmo