Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
306/12.6JACBR-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: LUÍS RAMOS
Descritores: EXAME
POLÍCIA JUDICIÁRIA
PAGAMENTO
Data do Acordão: 05/24/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: LEIRIA (J C CRIMINAL –J1)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART. 1.º, N.º 1, DA PORTARIA N.º 175/2011, DE 28-04; ART. 2.º, N.º 1, DA LEI N.º 37/2008, DE 06-08; ART. 7.º, N.º 3, ALÍNEA H), DA LEI Nº 49/2008, DE 27-08
Sumário: I - Não são pagas as perícias ou exames feitos pela Polícia Judiciária no âmbito da prossecução das suas atribuições legais.

II - Só são pagas à Policia Judiciária as perícias ou exames que tiverem sido requisitados por entidade externa. É este o sentido da expressão “actividades ou serviços prestados”.

Decisão Texto Integral:

Acordam em conferência na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     

No âmbito do processo acima identificado, o tribunal proferiu o seguinte despacho:

“Fls. 646

Em processo a correr termos neste Tribunal, foi formulada promoção pelo Procurador da República, Dr. A..., no sentido que segue:

“Considerando que o exame realizado pela PJ foi solicitado em sede de inquérito crime e no âmbito da missão de coadjuvação do MP, e tendo em conta o disposto na Portaria n.º 175/2011 de 28 de Abril, conclui-se que as despesas aí representadas não deverão ser pagas.

Na verdade, o documento que antecede, tratando-se de nota de débito, é meramente representativo dos recursos utilizados e respectivos custos, como melhor se esclarece no ofício n.º 135, p. 580/2009, do Ministério da Justiça, remetido à PGR e constante do SIMP, onde se pode ler: “No âmbito da investigação criminal a realização de perícias e de exames levados a cabo pela Policia Judiciária, enquanto órgão que coadjuva as autoridades judiciárias, são actos praticados na prossecução das suas atribuições, destinando-se as notas de débito à demonstração dos recursos utilizados e respectivos custos para o erário público”.

Assim, p. que não se ordene o pagamento da quantia constante da nota de débito remetida pela PJ.”

Porque concordamos com tal perspectiva e com os argumentos avançados em seu abono, adere-

se ao exposto e indefere-se o pagamento da nota de fls. 646.”

Inconformado, o Ministério Público recorreu, terminando a motivação com as conclusões que passamos a transcrever:

“1ª -- Vem o presente recurso interposto pelo Ministério Público do douto despacho proferido no dia 3 de fevereiro de 2016, com a referência nº 80485546, a fls. 658 e 658 V., que indeferiu a promoção do Ministério Público, no sentido de que as despesas geradas na realização de perícias efectuadas pela Polícia Judiciária lhe fossem pagas, por serem receita própria, a reverter para a entidade oficiante, por serem decorrentes de encargos a que o arguido deu causa e a pagar por este, a final.

2ª -- Os custos resultantes de exames e perícias realizados pela Polícia Judiciária, solicitados em sede de inquérito crime e no âmbito da missão de coadjuvação do Ministério Público, não devem ser pagos, nos termos da Portaria nº 175/2011 de 28 de Abril, quando, findo o inquérito, o Ministério Público profere despacho de arquivamento.

3ª -- Quando o Ministério Público, findo o inquérito, profere despacho de acusação e é proferida Sentença/Acórdão condenatório, transitado em julgado, os custos resultantes de exames e perícias realizados pela Polícia Judiciária, devem ser pagos pelo arguido por a eles ter dado causa, nos termos da Portaria nº 175/2011 de 28 de Abril.

4ª -- Uma vez que tais custos/despesas constituem encargos processuais que devem reverter como receitas próprias para a Polícia Judiciária, a serem pagos, a final, pelo arguido.

5ª -- Sendo esta, aliás, a jurisprudência já sedimentada no sentido do ora sustentado nesta sede recursiva,

6ª -- De que é exemplo, para além de toda a demais acima citada, a constante do douto Ac. da R.E. de 20/10/2015, Proc. 31/11.5TAMTL-A.E1, in www.dgsi.pt/jtre:

“I -- A Polícia Judiciária tem direito ao pagamento da quantia correspondente ao custo dos exames e das perícias elaborados pelo seu Laboratório de Polícia Científica (como é o caso de uma perícia grafológica).

II -- Tais exames e perícias são pagos, diretamente a essa entidade, pelos tribunais, e o custo respetivo é considerado para efeitos de “pagamento antecipado do processo o que equivale a dizer que esse custo entrará a final na regra de custas.”

7ª -- Ao ter decidido de forma diversa da ora sustentada violou-se o douto despacho a quo o disposto no artigo 46°, nº 3, ais. b) e c), da Lei nº 37/2008, de 6 de Agosto, o disposto nos artigos 1°, nº 1, 2°, nº 3, ambos da Portaria nº 175/2011, de 28 de Abril, os artigos 16°, nº 1, ais. c), d) e nº 2 e 30°, nº 3, aI. c), todos do Regulamento das Custas Processuais e 514°, nº 1, do Código de Processo Penal.

8ª -- Em face ao exposto deverá o presente recurso ser julgado procedente, devendo vaso Exas. ordenar ao Mm”. Juiz a quo que substitua o despacho recorrido por outro, no qual ordene o deferimento do requerido pelo Ministério Público.”

O recurso foi admitido.

Não houve resposta.

O Meritíssimo Juiz sustentou a decisão nos seguintes termos:

“1. Pelas razões já expostas no despacho de fls. 658 dos autos principais e nos precisos termos aí enunciados, mantenho a decisão objecto do presente recurso nos termos e para os efeitos do n.º 4 do artigo 414.º do Código de Processo Penal. Efectivamente, não nos parece que as razões mobilizadas pelo Ministério Público sejam aptas afastar a bondade que divisamos na solução ora posta em crise e que é, assim, reafirmada.

Importa, nesta senda, sublinhar que se afigura que o sobredito despacho se apresenta como o mais consentâneo com a coerência do sistema. Afirma-se, nesse sentido, paradoxal que a Policia Judiciária assista ao pagamento de perícias e exames por si materializados enquanto desenvolve a sua actividade de Órgão de Policia Criminal e actua, como tal, na prossecução das suas funções.

Isto tanto mais quando o artigo 47.º da Lei n.º 37/2008, de 6 de Agosto, estabelece expressamente que “constituem despesas da PJ as que resultem de encargos decorrentes da prossecução das atribuições que lhe são cometidas”.

Note-se, aliás e para tal efeito, que a nota de débito de fls. 646 dos autos principais diz respeito à perícia realizada a fls. 233, a qual foi espontaneamente materializada pela Policia Judiciária em virtude de tal entidade lhe ter divisado interesse para a investigação. Não tratamos, assim e em bom rigor, de perícia que haja sido requerida à Policia Judiciária ou que esta haja deferido a entidade pública ou privada. Efectivamente, foi a própria Policia Judiciária que - ainda que é certo, na decorrência das suas competências delegadas em matéria de investigação mas sem fundamentar uma sua relevância ou necessidade impulsionou tal acto no âmbito de uma investigação aos crimes objecto do inquérito.

E tais razões levaram-nos a ser particularmente sensíveis aos méritos da posição inequivocamente assumida - pois que o suposto [E dizemos suposto pois que nos parece algo desajustada a imputação de omissão concretizada em sede de recurso. É que este Tribunal não conhece, naturalmente - na medida em que se trata de rede de uso exclusivo de Magistrados do Ministério Público -, o teor das decisões ou recomendações constantes do SIMP, tendo o signatário aceite, nessa medida - e tal como se teve o cuidado de referenciar -, a bondade do que havia sido veiculado por Procurador da República numa promoção materializada num outro processo. Assim como aceitamos como correcta, por exemplo, a referência materializada nas alegações do Ministério Público no recurso que deu origem ao Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 20 de Outubro de 2015 - in www.dgsi.pt - no sentido que a posição genericamente assumida pela Procuradora-Geral Distrital de Lisboa defende, identicamente, que “(...) as disposiões da Portaria (nº 1785/2011) não são aplicáveis a actos que se enquadrem na missão de coadjuvação das autoridades judiciárias, legalmmte cometida à Polícia Judiciária (cfr. SIMP/Actualidades (19-12-2011)”] considerando omitido tal como referenciado pelo Recorrente não desvirtua a substância da posição de fundo assumida em tal circular - pelo Ministério Público em sede superior ou noutros processos que correm termos nesta Instância Central.

2. Estas razões haviam-nos levado a inferir que o pagamento de perícias ou de outras diligências à Policia Judiciária apenas seria justificado quando aquelas houvessem sido expressamente peticionadas e não se enquadrassem na própria actividade investigatória desenvolvida por tal Órgão de Policia Criminal. O que, obviamente, excluiria a liquidação da nota de débito em apreço nos autos…

Não nos parece, por outra via, que os argumentos oferecidos pelo Recorrente se achem aptos a rebater a bondade de tal perspectiva. Note-se que o artigo 16.°, n.º 1, alínea c) do Regulamento das Custas Processuais se acha normativo de pendor claramente cível - mencionando, aliás, o termo «partes» e não «sujeitos processuais» -, reporta-se, genericamente, a diligências - o que pode abarcar desde actos de notificação ao cumprimento de mandados de detenção - e alude a “portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da administração interna e da justiça”. Com o que se mostra óbvio que tal normativo não aspira a disciplinar a feitura de perícias pela Polícia Judiciária ou os actos e valores descriminados na Portaria 175/2011, de 28 de Abril, da exclusiva responsabilidade do Ministério da Justiça.

Também em matéria jurisprudencial, não nos parece ser correcta a afirmação que existe uma correspondente ampla e firmada sobre tal assunto. É que não obstante a existência de pontos de contactos, afigura-se que a temática em discussão nos presentes autos não se apresenta equivalente ou idêntica à dos encargos do INML ou da DGRSP. Na verdade, nem estas entidades praticam actos ou diligências no processo por sua iniciativa ou discricionariedade, nem as perícias que aquelas concretizam para os autos se apresentam absolutamente essenciais ou indissociáveis da única ou principal actividade por si exclusivamente desenvolvida. Parece-nos, pois, que os Acórdãos produzidos por referência a tais entidades não podem ser, acriticamente, transpostos para a questão das perícias materializadas pela Polícia Judiciária no âmbito da investigação desenvolvida por tal OPC em inquérito.

Somos, assim, da perspectiva que, de entre os arestos referenciados nas alegações, apenas os Acórdãos do Tribunal da Relação de Évora de 20 de Outubro de 2015 proferidos nos processos 31/11.5TAMTL-A.E1 e 43/13.4GAMTL-A.E1 assumem posição verdadeiramente contrária à por nós perfilhada. E sem prejuízo da clara bondade dos argumentos ali preconizados, não conseguimos considerá-los decisivos ao ponto de reverter a nossa perspectiva.

3. Já no que se refere ao último argumento centrado nos artigos 46.°, n.º 3, alínea c) da Lei Orgânica da Policia Judiciária eLo, n.º 1 da Portaria n.º 175/2011, de 28 de Abril, consideramos que os mesmos são também passíveis de interpretação conforme ao nosso entendimento. Na verdade, o correspondente teor literal acha-se equívoco ao ponto de suportar quer a orientação preconizada no recurso apresentado, quer a perspectiva assumida a fls. 658 dos autos principais.

Temos, assim e desde logo, que os artigos 46.° e 47.° da Lei Orgânica da Policia Judiciária nâo devem ser lidos separadamente. E tais preceitos acautelam expressamente que

Artigo 46.° Receitas

1 - A PJ dispõe das receitas provenientes de dotações que lhe forem atribuídas no Orçamento do Estado.

2 - A PJ dispõe das receitas provenientes das transferências do Instituto de Gestão Financeira e de Infra-Estruturas da Justiça, L P. (IGFIJ, LP.).

3 - A PJ é responsável pela arrecadação das seguintes receitas próprias resultantes da sua actividade:

a) As importâncias cobradas pela venda de publicações e de artigos de promoção institucional;

b) As quantias cobradas por actividades ou serviços prestados, designadamente acções de formação, realização de perícias e exames, extracção de certidões e cópias em suporte de papel ou digital;

c) Quaisquer outras receitas que lhe sejam atribuídas por lei, contrato ou a outro título.

4 - As quantias cobradas ao abrigo do disposto no número anterior são pagas à PJ de acordo com a tabela aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área da Justiça.

5 - As receitas referidas nos n.ºs 2 e 3 sâo consignadas à realização de despesas da PJ durante a execução do orçamento do ano a que respeitam, podendo os saldos não utilizados transitar para o ano seguinte.

Artigo 47.° Despesas

Constituem despesas da PJ as que resultem de encargos decorrentes da prossecução das atribuições que lhe são cometidas.

Já o artigo n.º 1 do artigo 1.° da Portaria n.º 175/2011, de 28 de Abril) define que

“A presente portaria aprova a tabela de preços a cobrar pela Direcção-Geral de Reinserção Social, pelo Instituto Nacional de Medicina Legal, L P., e pela Polícia Judiciária por perícias e exames, relatórios, informações sociais audições e outras diligências ou documentos que lhes forem requeridos ou que por estes venham a ser deferidos a entidades públicas ou privadas.”

Parece-nos, pois, que tais normativos não contrariam a asserção que as perícias apenas deverão ser pagas conquanto hajam sido expressamente peticionadas à Policia Judiciária e não se mostrem conaturais à actividade de investigação. Ou seja, os actos materializados pela Policia Judiciária na prossecução das atribuições que lhe são legalmente confiadas serão despesas próprias de tal OPC (artigo 47.° da Lei Orgânica). Já a tratarmos de “actividades ou serviços prestado (…) (artigo 46.°, n.º 3 da Lei Orgânica) que “lhe forem requeridos ou que por estes venham a ser diferidos a entidades públicas ou privadas”, então, sim, estaremos em face de receitas próprias resultantes da actividade da Policia Judiciária. Tratamos, para tal efeito e a título de exemplo, de perícias à letra e assinatura concretizadas pelo Laboratório de Policia Científica na decorrência de solicitação endereçada por processo cível.

Esta é, em nossa perspectiva, a leitura legítima a retirar da interpretação conjugada dos preceitos postos em relevo. E parece-nos que o oficio emanado do Ministério da Justiça em 13 de Janeiro de 2012 se apresenta como elemento adicional que permite reconstruir o pensamento do legislador por ocasião da feitura da Portaria n.º 175/2011. Note-se que o Ministério da Justiça veio a esclarecer que “no âmbito da investigarão criminal a realização de perícias e exames levados a cabo pela Polícia Judiciária, enquanto órgão que coadjuva as autoridades judiciárias, são actos praticados na prossecução das suas atribuições, destinando-se as notas de débito emitidas à demonstração dos recursos utilizados e respectivos custos para o erário público”. E este apresenta-se, naturalmente, como elemento que não pode deixar de ser tomado em consideração pelo aplicador na actividade hermenêutica que lhe compete, sendo que o mesmo, a ser aceite, nos obriga a rejeitar in limine a posição que o Recorrente agora defende.

4. São, pois, estes os motivos que nos levam a sustentar a decisão posta em crise no sentido que os custos da perícia concretizada pela Polícia Judiciária a fls. 233 não podem ser projectados no processo (…)”.

Nesta instância o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer que passamos a transcrever nas partes que relevam (transcrição):

“Acompanhamos a motivação de recurso apresentada pelo recorrente Ministério Público.

Na verdade, e não obstante considerar-se que esta questão poderá ser considerada controversa. isto é, saber se um exame realizado pela PJ, no âmbito da investigação de um processo crime lhe deve ser pago, entendemos existir fundamento legal para ordenar o seu pagamento, através da Portaria n. ° 175/2011, de 28 de Abril.

Com efeito, a Lei n.º 37/2008, de 6 de Agosto, que aprovou a Lei Orgânica da Polícia Judiciária, enuncia no art. seu 46°, n.º 3, al. b), que a Polícia Judiciária é responsável pela arrecadação de receitas próprias, resultantes das quantias cobradas por actividade ou serviços prestados, designadamente, pela realização de perícias e exames, a serem pagos de acordo com a tabela aprovada por Portaria do membro do Governo responsável pela área da Justiça -_ cfr. o n.º 4, do citado art. 46°.

Assim sendo, e porque o art. 2°, n.º 3 e n.º 4, desta Portaria n.º 175/2011, refere que os exames e perícias realizados pela PJ são “pagos diretamente a essas entidades pelos tribunais” e que o custo de tais perícias e exames “são considerados para efeitos de pagamento antecipado do processo”, poder-se-á concluir-se que os mesmos entrarão, a final, em regra de custas.

Face ao exposto, entendemos que o recurso interposto pelo Ministério Público merece provimento subscrevendo, no demais, a motivação apresentada.”

No âmbito do art.º 417.º, n.º 2 do Código Penal não houve resposta.

Os autos tiveram os legais vistos após o que se realizou a conferência.

Cumpre conhecer do recurso

Constitui entendimento pacífico que é pelas conclusões das alegações dos recursos que se afere e delimita o objecto e o âmbito dos mesmos, excepto quanto àqueles casos que sejam de conhecimento oficioso.

É dentro de tal âmbito que o tribunal deve resolver as questões que lhe sejam submetidas a apreciação (excepto aquelas cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras)[[1]].

Cumpre ainda referir que é também entendimento pacífico que o termo “questões” a quer se refere o art.º 379º, nº 1, alínea c., do Código de Processo Penal, não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entende-se por “questões” a resolver, as concretas controvérsias centrais a dirimir[[2]].

Questão a decidir: interpretação no despacho recorrido, do disposto no artigo 1º, nº 1 da Portaria nº 175/2011, de 28 de Abril, relativamente ao pagamento do exame realizado pela Polícia Judiciária.

Não tem razão o recorrente.

Vejamos:

Diz-nos o artigo 2º, nº 1, da Lei n.º 37/2008, de 06 de Agosto (Missão e atribuições) que

“A PJ tem por missão coadjuvar as autoridades judiciárias na investigação, desenvolver e promover as acções de prevenção, detecção e investigação da sua competência ou que lhe sejam cometidas pelas autoridades judiciárias competentes”,

o artigo 3.º, nº 1 (Coadjuvação das autoridades judiciárias) que

“A PJ coadjuva as autoridades judiciárias em processos relativos a crimes cuja detecção ou investigação lhe incumba realizar ou quando se afigure necessária a prática de actos que antecedem o julgamento e que requerem conhecimentos ou meios técnicos especiais”,

o artigo 7º, nº 3, alínea h. da Lei nº 49/2008, de 27 de Agosto (Competência da Polícia Judiciária em matéria de investigação criminal) que

“3 - É ainda da competência reservada da Polícia Judiciária a investigação dos seguintes crimes (…):

(…)

h) Executados com (…) armas de fogo (…)”,

o artigo 46.º (Receitas) que

“1 - A PJ dispõe das receitas provenientes de dotações que lhe forem atribuídas no Orçamento do Estado.

2 - A PJ dispõe das receitas provenientes das transferências do Instituto de Gestão Financeira e de Infra-Estruturas da Justiça, I. P. (IGFIJ, I. P.).

3 - A PJ é responsável pela arrecadação das seguintes receitas próprias resultantes da sua actividade:

a) (…)

b) As quantias cobradas por actividades ou serviços prestados, designadamente (…) realização de perícias e exames (…);

c) (…).

4 - As quantias cobradas ao abrigo do disposto no número anterior são pagas à PJ de acordo com a tabela aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área da Justiça.

5 – (…).”,

o artigo 47.º (Despesas) que

“Constituem despesas da PJ as que resultem de encargos decorrentes da prossecução das atribuições que lhe são cometidas.”,

o artigo 7º, nº 3, alínea h. da Lei nº 49/2008, de 27 de Agosto (Competência da Polícia Judiciária em matéria de investigação criminal) que

“3 - É ainda da competência reservada da Polícia Judiciária a investigação dos seguintes crimes (…):

(…)

h) Executados com (…) armas de fogo (…)”

e o artigo 1º, nº 1 da Portaria 175/2011, de 28 de Abril (Objecto) que

“A presente portaria aprova a tabela de preços a cobrar pela Direcção-Geral de Reinserção Social, pelo Instituto Nacional de Medicina Legal, I. P., e pela Polícia Judiciária por perícias e exames, relatórios, informações sociais, audições e outras diligências ou documentos que lhes forem requeridos ou que por estes venham a ser deferidos a entidades públicas ou privadas.”

Ora, resultando do artigo 47º da Lei n.º 37/2008, de 6 de Agosto que “constituem despesas da Polícia Judiciária as que resultem de encargos decorrentes da prossecução das atribuições que lhe são cometidas” e que a Polícia Judiciária realizou o exame por iniciativa própria e no âmbito da investigação de crime (artigos 2º, nº 1 e 3º, nº 1, da Lei n.º 37/2008, de 06 de Agosto), para o qual tinha, nos termos do artigo 7º, nº 3, alínea h. da Lei nº 49/2008, de 27 de Agosto, competência reservada (v. fls. 10 dos presentes autos), não podem restar dúvidas de que estamos perante uma despesa própria da Polícia Judiciária uma vez que esta a realizou no âmbito da prossecução das suas atribuições legais.

Só assim não seria se estivesse em causa, por exemplo, a realização de perícias ou exames prestados pela Polícia Judiciária, ou seja, a realização de perícias ou exames que lhe tivessem sido requisitados por entidade externa. É este o sentido da expressão “actividades ou serviços prestados”.

Aliás, a própria portaria é muito clara neste mesmo sentido quando refere “que aprova a tabela de preços a cobrar (…) pela Polícia Judiciária por perícias e exames (…) que lhes forem requeridos.

E são apenas estes e não os que a Polícia Judiciária realiza por iniciativa própria no âmbito da prossecução das suas atribuições legais.

Cumpre ainda referir que a jurisprudência indicada na motivação não contraria este nosso entendimento, antes o confirma o entendimento uma vez que todos os acórdãos respeitam a situações em que estão em causa “serviços prestados” ou seja, serviços requisitados pelo tribunal à Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais e à Polícia Judiciária.

Assim sendo, e sem necessidade de outros considerandos, mais não há do que confirmar a decisão recorrida.

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Face ao exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso

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Sem tributação.

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Coimbra, 24 de Maio de 2017

(Luís Ramos – relator)

(Olga Maurício – adjunta)


[1] Neste sentido, v.g., Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 23 de Maio de 2012 (acessível in www.dgsi.pt).
[2] “(…) quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista. O que importa é que o tribunal decida a questão posta, não lhe incumbindo apreciar todos os fundamentos ou razões em que as partes se apoiam para sustentar a sua pretensão” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Maio de 2011 (acessível in www.dgsi.pt).