Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
749/15.3T8GRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA JOÃO AREIAS
Descritores: PROCEDIMENTO CAUTELAR DE ARRESTO
DIREITO DE CRÉDITO
HERDEIRO LEGITIMÁRIO
INABILITAÇÃO
Data do Acordão: 07/08/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DA GUARDA - GUARDA - INST. CENTRAL - SECÇÃO CÍVEL E CRIMINAL - J3
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 142 CC, 900 CPC
Sumário: 1. A instauração de qualquer procedimento cautelar em nome e em representação dos pais do requerente, com vista a acautelar ou a proteger o respetivo património, relativamente aos quais se encontram pendentes processos de inabilitação, terá de respeitar os procedimentos previstos nos arts. 900º, nº1 do CPC e 142º, do CC.

2. A qualidade de herdeiro legitimário em vida do autor da sucessão não lhe atribui qualquer direito subjetivo à quota-parte que constituirá a sua quota legitimária, configurando uma mera expetativa jurídica titulada à sua porção legitimária.

3. O facto de os requeridos se terem vindo ilegitimamente a apropriar de bens que fazem parte do património dos seus pais não atribui ao requerente qualquer direito de crédito a garantir mediante arresto a seu favor em bens dos requeridos.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção):

I – RELATÓRIO

FD (…) interpôs a presente providência cautelar de arresto, contra MD (…) JM (…), AR (…) e AE (..),

pedindo que seja decretado o arresto dos bens que identifica nas alínea A) a Z) de fls. 87/verso a 88/verso, propriedade dos requeridos.

Alegando, para tanto e em síntese:

o requerente é parente sucessível dos seus pais, tal como a primeira requerida;

esta tem atuado de forma regular e constante sobre o património dos pais de ambos, dispondo de quantias elevadas sempre em proveito próprio, lesando o património daqueles;

encontrando-se a correr ações de inabilitação em que aqueles são réus, o requerente entende que este é o único meio de que dispõe para defender o acervo patrimonial dos pais sob pena de ser destruído por completo sem forma de retorno, pretendendo, assim, acautelar o seu direito de vir a herdar e, pelo menos indiretamente, também é ofendido pela atuação dos requeridos.

Quanto à possibilidade séria da existência do direito de crédito invocado pela requerente, conclui nos artigos 944 a 946 do requerimento inicial:

“- pela demonstração do património e capital titulado em nome dos Pais do Requerente fruto do seu trabalho durante várias décadas;

- existência de um aproveitamento claro da fraca instrução e avançada idade para dispor dos bens sem que para isso se apercebam da realidade patrimonial em que se encontram;

- crescente instrumentalização dos procedimentos utilizados para aplicar os créditos retirados aos pais do Requerente em aquisições de património e aplicações financeiras nas esferas jurídicas dos Requeridos.”

Relativamente ao justo receio de perda de garantia patrimonial do seu crédito, alega que os requeridos já esgotaram todo o património dos pais do requerente e que se torna imprescindível para o Requerente recorrer aos meios cautelares para estancar a dissipação de quantias monetárias largamente excessivas dos rendimentos apresentados e arrestando as contas tituladas pelos ora Requeridos bem como os bens imóveis titulados por estes, é a única forma de impedir que continuem a alienar o património dos pais do requerentes em proveito próprio.

Notificado para esclarecer que tipo de ação (principal) pretende propor atendendo aos factos alegados no requerimento inicial, o requerente veio informar que pretende dar entrada de “uma ação de condenação onde se demonstrará que os requeridos tiveram um acréscimo patrimonial injustificado à custa do património dos seus pais, cujo se cifrará em montante superior a 500.00 €.

 Pelo juiz a quo foi proferido despacho a indeferir liminarmente o requerimento inicial por falta de fundamento legal.

Não se conformando com tal despacho, o requerente dele interpôs recurso de apelação, concluindo a respetiva motivação, com as seguintes conclusões:

A. O Recorrente tem legitimidade para intentar as ações necessárias para proteção do património dos seus progenitores, numa visão sistemática do ordenamento jurídico.

B. O Recorrente é interessado no desfecho da causa, não só como herdeiro legitimário, mas como filho cujos deveres de assistência e alimentos são exigidos por lei, sob pena de ser suscetível de ser deserdado caso recuse essa mesma assistência.

C. Reconstituindo o Recorrente através da prova oferecida aos autos, que os seus pais não só tinham a correr contra si, as competentes ações de inabilitação, como careciam do entendimento e raciocínio necessários para se aperceberem da realidade que viviam.

D. Concorda o Recorrente com o Mmo. Juiz de 1.a instância que o propósito dos procedimentos cautelares é o de numa ação a instaurar a situação de facto se altere de modo que a sentença a ser favorável, perca toda a sua eficácia.

E. Entende por isso o Recorrente que a justiça a aplicar ao caso  concreto, é muito mais do que uma conceção teleológica, reforçando o carácter material e prático que é visado num procedimento urgente como é o cautelar.

F. Favorecendo nesse sentido que a perda de chance na defesa de um direito possa constituir em si um prejuízo irreparável, ou seja, que o direito de crédito pelo desapossamento indevido do património da esfera dos seus pais para os Recorridos, venha a forçar a efetivação desse mesmo prejuízo irreparável.

G. Deste modo, a apreensão preventiva dos bens dos Recorridos são o único garante de que o direito de crédito dos seus pais, será efetivamente protegido e suscetível de vir a ser confirmado por quem venha a ser nomeado como curador na ação de inabilitação, sob pena de se perder o efeito útil do procedimento cautelar em toda a sua dimensão.

H. O receio de perda de garantia patrimonial é verificado muito além da probabilidade séria, reconstituindo essa mesma realidade com um rigor matemático e probatório digno de uma ação principal.

I. O Fumus Bonus Iuris e o Periculum in Mora foram pelo Recorrente preenchidos e fundamentados sobre a urgência no decretamento desta providência.

J. Na mesma esteira o desapossamento do património dos pais do Recorrente, assume uma verdadeira natureza cautelar de proteção da propriedade privada, enquanto interesse constitucionalmente consagrado, e cuja capacidade do seu titular se encontra afetada de forma inequívoca.

K. Fundamentando o seu direito em mais do que uma mera expectativa de herdar, e bem assim um verdadeiro dever de assistência e proteção da subsistência dos seus progenitores, evitando que o dano sofrido por estes, onere o Recorrente injustificadamente.

L. Facto que fica demonstrado pela instrumentalização dos procedimentos utilizados pelos Recorridos a apropriação indevida do património dos pais do Recorrente.

M. Sendo de facto o Recorrente o único com capacidade e legitimidade de agir em juízo.

N. Razão pela qual se concluir não carecer de qualquer fundamento legal sob pena de vir a efetivar-se um prejuízo irreparável pela dissipação do património dos Recorridos, único garante do ressarcimento do direito de crédito dos seus pais.

Conclui pela revogação do Despacho recorrido, determinando-se o prosseguimento da providência cautelar.


*
Dispensados que foram os vistos legais, cumpre decidir do objeto do recurso.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º, e 639º, do Novo Código de Processo Civil –, a questão a decidir é uma só:
1. Titularidade de um crédito sobre os requeridos.
III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
1. Titularidade de um direito de crédito sobre os requeridos.
Encontrando-nos perante a instauração de um procedimento cautelar de arresto, que só pode ser decretado quando se verifique “fundado receio de perda da garantia patrimonial do crédito”, apenas se encontra em causa a verificação (ou não) do primeiro dos requisitos - titularidade de um direito de crédito.
Com efeito, o tribunal recorrido veio a indeferir liminarmente o requerimento inicial, com base na seguinte argumentação, que aqui se reproduz:
“Probabilidade de existência do Crédito:
Esta providência apenas é admissível relativamente a direitos de crédito, na medida em que se destina a garantir o cumprimento por parte dos devedores.
Não depende de uma fonte específica geradora desse direito de crédito (relação contratual/negocial) e justifica-se no caso de incumprimento ou mora do devedor.
No caso em análise desde logo se conclui pela não verificação deste primeiro requisito - probabilidade séria da existência do seu crédito.
Na verdade, conforme atrás se referiu, o próprio requerente refere a “crescente instrumentalização dos procedimentos utilizados para retirar os créditos retirados aos pais do requerente…”, ou seja, a existir algum crédito os titulares do mesmo serão os pais do requerente, contra os quais o mesmo intentou ação de inabilitação, e não o requerente, quem até afirma que “Como é bom de ver, a presumível herança pecuniária do requerente foi verdadeiramente delapidada.”.
Não há, assim, a probabilidade séria da existência do crédito, pois, como o próprio ao longo do requerimento inicial vai referindo, os requeridos têm vindo a delapidar o património dos pais do requerente e da primeira requerida, existindo em relação ao requerido, não um direito de crédito mas uma mera expectativa de algum dia ver a herdar em herança aberta por óbito dos pais, que ainda estão vivos, sendo estes os únicos titulares de um verdadeiro interesse em agir e, até, legitimidade para requerer o presente procedimento cautelar de arresto.
Ora, não se vislumbrando a verificação do primeiro requisito - existência de um crédito na esfera do requerente – é de indeferir liminarmente o presente procedimento cautelar de arresto por falta de fundamento legal, ficando prejudicado o conhecimento do segundo requisito - Justo receio de perda da garantia patrimonial.”
O requerente/Apelante insurge-se contra tal decisão, fazendo assentar a sua discordância na sua alegada legitimidade para intentar as ações necessárias para proteção do património dos seus progenitores: a apreensão preventiva dos bens dos requeridos, seria o único garante de que “o direito de crédito dos seus pais será efetivamente protegido e suscetível de vir a ser confirmado por quem venha a ser nomeado como curador na ação de inabilitação”.
Não podemos, contudo, dar razão ao apelante.
Invocando o requerente um direito de crédito dos seus pais sobre os requeridos (pelo facto de estes se terem vindo ilegitimamente a apropriar do patrimónios daqueles), e encontrando-se a correr um processo de inabilitação relativamente a cada um dos seus pais, o modo de assegurar a sua representação e a defesa dos seus interesses patrimoniais encontra-se expressamente previsto nos artigos 900º do CPC e 142º do Código Civil (aplicável à inabilitação por força do artigo 156º do Código Civil).
Com efeito, segundo o nº1 do artigo 900º do CPC, “em qualquer altura do processo, pode o juiz, oficiosamente ou a requerimento do autor ou do representante do requerido, proferir decisão provisória, nos próprios autos, nos termos previstos no artigo 142º do Código Civil”.
E dispõe artigo 142º do Código Civil, sob a epígrafe “Providências Provisórias[1]”:
1. Em qualquer altura do processo pode ser nomeado um tutor provisório que celebre em nome do interditando, com autorização do tribunal, os atos cujo adiamento possa causar-lhe prejuízo.
2. Pode também ser decretada a interdição provisória, se houver que providenciar quanto à pessoa ou bens do interditando.

 Assim sendo, a instauração de qualquer providência em nome e em representação dos inabilitandos teria de respeitar os procedimentos previstos nas citadas normas, incumbindo ao juiz do processo aferir da probabilidade séria de existência de uma incapacidade de facto capaz de fundar uma incapacidade judicial, bem como da alegada urgência em providenciar quanto à administração dos bens do inabilitando e da necessidade de nomeação de um curador para o efeito.

As providências previstas nos ns. 1 e 2 do artigo 142º do CC – tutela provisória e interdição provisória – apresentam caraterísticas típicas de uma providência cautelar, visando acautelar o efeito útil da ação, nos termos do artigo 2º, nº2 do CPC[2].

Alega o apelante que o facto de estarem a correr ações de inabilitação contra os seus pais e não tendo ainda sido fixado um representante legal para o efeito até à presente data, impõe ao apelante uma verdadeira obrigação de defender os direitos creditórios dos seus pais, incapazes de se protegerem a eles mesmos. Contudo, tal argumento não colhe, quando a lei lhe concede um meio expedito de nomeação de um tutor/curador provisório, que possa assegurar a prática de atos tendentes a providenciar quanto aos bens do interdito/inabilitando, podendo as providências provisórias ser decretadas em qualquer altura do processo (e até mesmo antes da sua instauração, desde que proponha a correspondente ação no prazo de 30 dias).

Uma vez decretada a interdição/inabilitação provisória, caberá ao tutor ou poderá ser atribuído ao curador nomeado a guarda, manutenção e conservação dos bens do interditando, podendo o tribunal autorizar a prática de atos cujo adiamento possa causar prejuízo ao interditando/inabilitando ou para instaurar as providências necessárias a acautelar o seu património.

Por outro lado, haverá ainda que atentar em que, nunca, durante extensíssimo requerimento inicial (cujo articulado se estende por 961 artigos), o requerente alegou instaurar o presente procedimento cautelar em representação dos seus pais, fazendo-o em nome próprio, ora invocando um interesse em agir em defender o património dos seus progenitores, ora fazendo assentar a sua legitimidade na qualidade de parente sucessível[3].

E daí a afirmação, por parte do juiz a quo de que existe “em relação ao requerente, não um direito de crédito, mas uma mera expetativa de algum dia vir a herdar em herança aberta por óbito dos pais, que ainda estão vivos”.

Embora haja uma porção dos seus bens de que o testador não pode dispor, por ser legalmente destinada aos seus herdeiros legitimários (artigo 2156º), daqui não se pode retirar, como afirma Rabindranath Capelo de Sousa[4], que os sucessíveis legitimários tenham em vida do autor da sucessão um direito subjetivo à quota-parte que constitui a sua porção legitimária ou, muito menos, um direito subjetivo aos bens em concreto do património hereditário que possam integrar a sua quota: em face dos concretos poderes ou faculdades jurídicas atribuídas pela lei a tais sucessíveis, estes têm em vida do autor da sucessão uma expetativa juridicamente titulada à sua porção legitimária.

Nas palavras de Maria Raquel Aleixo Antunes Rei[5], o sucessível legitimário não tem qualquer direito subjetivo sobre os bens do autor da sucessão nem sequer qualquer direito a suceder, sendo um mero potencial sucessor do autor da sucessão.

A doutrina dominante qualifica tal situação como uma verdadeira expetativa jurídica[6], apontando, em geral, como manifestação da tutela dos sucessíveis legitimários em vida do autor da sucessão, a legitimidade atribuída aos herdeiros legitimários para arguirem a existência da simulação em vida do autor da sucessão, relativamente os negócios por ele simuladamente feitos com o intuito de os prejudicar (nº2 do artigo 242º, do CC).

Já quanto ao grande instituto de proteção dos sucessíveis legitimários – redução por inoficiosidade das liberalidades – embora tenha reflexos em vida do autor da sucessão, por impor ao autor da sucessão o dever de não dispor da porção (quota) de bens destinada aos herdeiros legitimários, o meio concedido por lei para dar efetividade a tal dever opera somente após a abertura da sucessão: uma vez que a quota disponível e os sucessíveis legitimários só se fixam à data da abertura da sucessão, diferiu-se para esse momento a possibilidade de redução de liberalidades inoficiosas[7].

Sendo vivo o autor da sucessão, a expetativa jurídica do sucessível legitimário só será objeto de tutela nos casos especificamente previstos na lei[8], não se lhe negando que, nos casos em que tal situação jurídica seja expressamente reconhecida, a tal direito corresponderá uma ação adequada a defendê-lo em juízo, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da ação, nos termos do nº2 do artigo 2º do CPC.

 Quanto ao caso em apreço, não configurando os factos alegados (consistentes na delapidação, por parte da requerida, do património dos seus pais) a titularidade de algum direito de crédito por parte do requerente – enquanto os seus pais forem vivos, serão eles os titulares do direito de crédito resultante da alegada apropriação ilícita do seu património por parte dos requeridos – o pedido de decretamento de arresto a seu favor, em bens dos requeridos, encontra-se destituído de qualquer fundamento.

Com efeito, só em relação a direitos de crédito é possível deduzir esta providência[9], já que ela visa precisamente a garantia do seu cumprimento, não sendo adequada ao perigo de insatisfação de direitos de diversa natureza, como direitos reais[10].

Não sendo necessário que o crédito respeite a uma obrigação certa, exigível e líquida, ou sequer indicação rigorosa e exata do respetivo montante, a titularidade do crédito terá de ser inequívoca, no sentido de ser o requerente o credor efetivo do requerido[11].

Confirmamos assim o juízo proferido na primeira instância no sentido de que, dos factos por si alegados no requerimento inicial, não resulta que o requerente disponha de qualquer crédito suscetível de tutela por via de arresto, o que acarreta a improcedência necessária do presente procedimento.

  Impõe-se, assim, a improcedência da apelação.

IV – DECISÃO

 Pelo exposto, acordam os juízes deste tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas a suportar pelo Apelante.                    

Coimbra, 8 de julho de 2015

Maria João Areias ( Relatora )

Fernando Monteiro

Luís Cravo



V – Sumário elaborado nos termos do art. 663º, nº7 do CPC.
1. A instauração de qualquer procedimento cautelar em nome e em representação dos pais do requerente, com vista a acautelar ou a proteger o respetivo património, relativamente aos quais se encontram pendentes processos de inabilitação, terá de respeitar os procedimentos previstos nos arts. 900º, nº1 do CPC e 142º, do CC.
2. A qualidade de herdeiro legitimário em vida do autor da sucessão não lhe atribui qualquer direito subjetivo à quota-parte que constituirá a sua quota legitimária, configurando uma mera expetativa jurídica titulada à sua porção legitimária.
3. O facto de os requeridos se terem vindo ilegitimamente a apropriar de bens que fazem parte do património dos seus pais não atribui ao requerente qualquer direito de crédito a garantir mediante arresto a seu favor em bens dos requeridos.
 


[1] Segundo Emídio Santos, as providências provisórias a que se refere este preceito são fundamentalmente duas: i) a nomeação de um tutor provisório que celebre em nome do interditando, com autorização do tribunal, os atos cujo adiamento possa causar-lhe prejuízo, ou a nomeação de curador provisório que assista o inabilitando na prática de atos que lhe possam causar prejuízo; ii) o próprio decretamento da interdição provisória, se houver necessidade urgente de providenciar quanto à pessoa e bens do interditando, ou a inabilitação provisória, se houver necessidade urgente de providenciar quanto à administração dos bens do inabilitando. Ainda tal autor, as providências provisórias admitidas não se esgotam nas previstas no art. 142º do Código Civil, podendo ainda ser decretado o arrolamento dos bens do requerido – “Das Interdições e Inabilitações”, QUID IURIS, pág. 101.
[2] Geraldo Rocha Ribeiro, “A Protecção do Incapaz adulto no Direito Português”, FDUC, Centro de Direito da Família, Coimbra Editora, págs. 229 e 230.
[3] Cfr., nomeadamente, os arts. 1º a 3º do requerimento inicial:
“1. O requerente é filho de (…) e (…).
2. É o requerente, parente sucessível dos seus pais, para os efeitos do disposto no art.2157º, do Código Civil.
3. Tem assim o requerente legitimidade para intentar a presente ação.
(…)
6. Tendo interesse em agir em defender o património dos seus progenitores, bem como defender a sua condição de sucessível enquanto herdeiro legitimário.
(…)
11. Motivo pelo qual deram lugar à presente ação como legitimo herdeiro e como único meio de acautelar o seu direito de vir a herdar (…)
[4] “Lições de Direito das Sucessões”, Vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora 2000, págs. 140 e 141, em especial nota 284, e pág. 160, nota 335. Segundo tal autor, o facto de a redução de liberalidades operar retroativamente, abrangendo as liberalidades feitas em vida do autor da sucessão e lhe parecer que a lei não outorgou tais meios em vida do de cuius apenas porque só no momento da sua morte se pode avaliar a quota dos legitimários e porque, correspondentemente, não lhe pareceu desejável cercear exageradamente os poderes de disposição do autor, levam-no a concluir que a morte do de cuius funciona como uma condição suspensiva de um direito ou faculdade jurídica pré-existente, enquadrável na ideia de uma expetativa juridicamente tutelada à sucessão.
[5] “Da Expetativa Jurídica”, pág. 155, artigo disponível in http://www.estig.ipbeja.pt/~ac_direito/RRei94.pdf.
[6] Entre outros, Luís A. Carvalho Fernandes, “Lições de Direito das Sucessões”, Quid Iuris, 2ª ed., pág. 379, que considera ainda uma forma de tutela do legitimário, embora mais difusa, em vida do de cuius, as limitações a este impostas em sede de livre disposição dos seus bens a título gratuito, seja por atos inter vivos ou mortis causa, reconhecendo embora que esse direito – de redução por inoficiosidade – só se torna efetivo após a morte do autor da sucessão. José de Oliveira Ascensão refere que se os legitimários têm uma segura expetativa jurídica logo que designados, para a generalidade dos efeitos, porém, a proteção é diferida – “Direito Civil Sucessões”, Coimbra Editora 1987, pág. 345.
[7] Neste sentido, Maria Raquel Rei, artigo citado, pág. 158. Por se tratar de uma mera expectativa, também os nossos tribunais têm vindo a negar a possibilidade de, em vida dos doadores, ser peticionada a declaração de nulidade de uma doação, por inoficiosidade (Ac. do TRP de 26-01-2004, relatado por Pinto Ferreira), ou a negar legitimidade ao herdeiro legitimário para pedir a anulabilidade de uma doação, em vida da autora, com fundamento na incapacidade acidental desta (Ac. do TRL de 12-12-2013, relatado por Fátima Galante), negando-lhe ainda a legitimidade para impugnar em vida do pai, a escritura de justificação feita por um terceiro, para inscrição da aquisição de um prédio alegadamente pertencente ao património do seu pai (Acórdão do TRC de 18.05.2004, relatado por Coelho de Matos).
[8] Para além do já referido poder potestativo de invocar a nulidade de um negócio simulado que o prejudique, Maria Raquel Rei salienta que a posição jurídica do sucessível legitimário em vida do autor da sucessão é composta ainda por uma série de situações jurídicas: poder de autorizar a venda a filhos ou netos pelos pais ou avós e de pedir a anulação da venda caso não hajam prestado o seu consentimento (artigo 877º CC); proteção reflexa decorrente do dever do autor da sucessão de não dispor gratuitamente da legítima objetiva (artigo 2156º CC); poder de dar o seu consentimento para qualquer partilha em vida (artigo 2029º CC); poder de exigir dos outros sucessíveis legitimários a composição da sua quota em dinheiro quando a sua qualidade de sucessível legitimário não existisse ou fosse desconhecida à data da partilha (artigo 2029, nº2); dever de compor em dinheiro a quota legitimária de qualquer sucessível legitimário superveniente em relação a uma partilha em vida (art. 2029º, nº2) – artigo citado, págs. 158 e 159.
[9] Neste sentido, António Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, IV Vol. 2ª ed., Almedina, pág. 179.
[10] O Arrolamento será o procedimento adequado a, em caso de justo receio de extravio ou dissipação de bens, obter a sua descrição, avaliação e depósito, podendo ser intentado por aquele que tenha, ou fundadamente espere vir a ter, direito a que lhe venha a ser entregue um certo número bens (cfr., no sentido da possibilidade de dedução de uma providência cautelar de arrolamento a intentar pelos herdeiros legitimários na pendencia de uma ação em que se invocasse a prodigalidade, se pronunciou António Abrantes Geraldes – Temas da Reforma do Processo Civil, IV Vol., pág. 268 e 269, nota 502 –, e ainda Acórdão do STJ de 13.10.1993, relatado por Folque de Gouveia, disponível in www.dgsi.pt.
[11] Marco Carvalho Gonçalves, “Providências Cautelares”, Almedina 2015, págs. 226 a 229.