Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
229/23.3JAGRD.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: JOÃO ABRUNHOSA
Descritores: FALTA E DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA
NULIDADE
CONVICÇÃO DO TRIBUNAL
HOMICÍDIO QUALIFICADO
MOTIVO FÚTIL
CIÚME
ARMA PROIBIDA
PENA
Data do Acordão: 11/20/2025
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA - JUÍZO CENTRAL CRIMINAL E CÍVEL DA GUARDA - JUIZ 4
Texto Integral: N
Meio Processual: RECURSO DECIDIDO EM CONFERÊNCIA
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO
Legislação Nacional: ARTIGOS 70.º E 132.º, N.º 1 E 2, ALÍNEA E), DO CÓDIGO PENAL
ARTIGOS 127.º, 374.º, N.º 2, 379.º, N.º 1, ALÍNEA A), E N.º 2, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
Sumário: I - A deficiência da fundamentação da sentença só constitui nulidade quando for de tal forma relevante que impeça o conhecimento da razão para determinado facto ter sido dado como provado ou não provado, ou os raciocínios subjacentes à qualificação jurídica da conduta do arguido ou à determinação das medidas das penas.

II - Quando o tribunal forma a sua convicção com provas não proibidas por lei, prevalece a convicção do tribunal sobre as dos recorrentes.

III - O ciúme não pode, em geral, ser considerado um motivo fútil para qualificar o homicídio.

IV - Se nos casos de mera detenção de arma proibida se justifica, em princípio, a opção pela pena de multa, pois está em causa um crime de perigo abstracto, já nos casos em que a arma proibida é usada para praticar outro crime deve, em princípio, optar-se por pena de prisão, porque está em causa um perigo concretizado.

Decisão Texto Integral: Relator: João Abrunhosa
Adjuntos: Helena Lamas
Isabel Gaio Ferreira de Castro

*

Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

…, por acórdão de 03-12-2024, relativamente ao Arg.[1] , foi decidido o seguinte:

“...


*

Não se conformando, o Arg., interpôs recurso.

*

Em apreciação desse recurso, em 26-03-2025, proferimos acórdão que decidiu nos seguintes termos:

“... Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, anulamos o acórdão recorrido, que deve ser substituído por outro, que supra a apontada nulidade. ...”.


*

Em cumprimento desta decisão, em 04-06-2025, o tribunal recorrido proferiu novo acórdão, que decidiu, para além do mais, nos seguintes termos:

“... VI. Dispositivo

Pelo exposto, o tribunal julga a acusação parcialmente procedente e, em consequência, comunicada a alteração da qualificação jurídica dos factos:

a)         Condena o arguido … pela prática, em autoria material e na forma tentada, de um crime de homicídio qualificado, cometido com arma, previsto e punido pelos art.º 131.º, art.º 132.º, n.º 1 e n.º 2 alínea e), art.º 22.º e art.º 23.º, todos do Código Penal, e art.º 86.º, n.º 3 da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão;

b)         Condena o arguido …, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art.º 86.º, n.º 1, na alínea c) e alínea d), por referência ao art.º 3.º, n.º 4, alínea a), ambos da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro (Regime Jurídico das Armas e Munições), sendo punido, neste caso, pela alínea c) da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro de 2006, por ser a incriminação mais grave, na pena de 1 (anos) e 6 (seis) meses de prisão;

c)         Condena, o arguido …, em cúmulo jurídico, pela prática dos ilícitos criminais referidos em a), e b), na pena única de 6 (seis) anos de prisão;

d)         Condena o arguido … na pena acessória de interdição temporária de detenção, uso e porte de arma, nos termos do disposto no art.º 90.º, n.º 1, n.º 2, n.º 3, n.º 5 e n.º 6 da Lei n.º 5/2006, pelo período de 6 (seis) anos;

e)         Aplica ao arguido … a medida de segurança de cassação de licença de detenção, uso e porte de arma, nos termos do disposto no art.º 93.º, n.º 1, alínea a), n.º 2, n.º 3, e n.º 4 da Lei n.º 5/2006, pelo período de 6 (seis) anos;

f)          …


*

Declara perdido a favor do Estado a arma semiautomática transformada, de calibre 6.35mm, de marca TANFOGLIO, modelo GT28, respectivas munições de 6.35 mm e invólucros de 6.35 mm, …

*

Medidas de coacção

Em 08.08.2023 foi aplicada medida de coacção de prisão preventiva ao arguido, alterada, posteriormente, para a medida de coacção de obrigação de permanência na habitação, por referência à habitação sita …, fiscalizada por meios técnicos de controlo à distância, …, a qual foi mantida por despacho datado de 16.10.2024 (v. referência electrónica citius n.º 31711403), além do Termo de Identidade e Residência.

Analisado de novo o presente processo, entende este Tribunal que ocorreram alterações nos pressupostos de facto e de direito que determinaram a sujeição do arguido à medida de coacção acima identificada. …

A medida de coacção aplicada além do Termo de Identidade e Residência foi com fundamento na existência dos perigos de continuação da actividade criminosa e perturbação da tranquilidade e ordem pública. Todavia, considerando o que se expôs supra, entende o tribunal que os perigos acima referidos se encontram mitigados.

Assim, entende este Tribunal que não se justifica, na presente data, a sujeição do arguido à medida de coacção de obrigação de permanência na habitação, devendo a mesma ser substituída pelas medidas de coacção de obrigação de apresentações periódicas, três vezes por semana (segunda-feira, quarta-feira e sexta-feira) no Órgão de Polícia Criminal competente da área da sua residência e, ainda, a proibição de contactar com AA. ...”.


*

Ainda inconformado, o Arg., interpôs recurso, com os fundamentos constantes da motivação, com as seguintes conclusões:

“... A- O Tribunal Recorrido socorre-se de três suposições conclusivas para explicar a ilação de que o arguido teve intenção de matar:

1- A de que os membros inferiores do corpo têm artérias que, sendo atingidas, podem causar a morte,

2- A de que, atentos os empurrões mútuos da porta, o arguido não teria a destreza de fazer qualquer tipo de pontaria para as pernas, tendo os disparos sido feito indiscriminadamente,

3- A de que, sendo o ofendido, bem mais alto que o arguido, valeu-lhe para não ser atingido numa zona superior do corpo.

B- Se é certo que os membros inferiores têm artérias que, sendo atingidas, podem causar a morte, também é certo que as probabilidades de isso acontecer são pequenas e não fazem correr perigo de vida, bastando que, caso fosse atingida uma artéria, fosse feito um garrote para a vida não ficar em risco, além que é do senso comum que um tiro numa perna muitíssimo raramente causará a morte, precisamente porque não se trata de um órgão vital, e seguramente que o agressor não tem intenção de matar quando dispara para os membros inferiores, nem está a pensar que possa atingir vasos sanguíneos.

C- No que concerne ao alegado no ponto 2, o disparo para a perna não se trata de uma questão de fazer ou não pontaria, mas sim de ser feito de uma posição superior para uma inferior, sendo certo que, naquela contenda, se o arguido quisesse atingir um órgão vital, atiraria com segurança para a parte superior do corpo e não seria o empurrar a porta que determinaria o tiro ao acaso.

D- O argumento do ponto 3 é simplesmente um não argumento, porquanto o Tribunal não mediu a altura do ofendido, não mediu a altura do arguido, não mediu a altura do posicionamento dos braços, não sabe se o arguido levantou o braço para depois disparar para baixo, não sabe se disparou retilineamente, pelo que tal argumento é manifestamente falacioso e assente numa mera perceção não documentada nem certificada.

E) o arguido sempre pugnou pela NÃO INTENÇÃO DE MATAR, e o depoimento do ofendido não a provou, e muito menos qualquer outro depoimento, sendo certo que, existe uma prova científica no processo que constitui o relatório médico-legal datado de 27/02/2024 e que foi notificado ao arguido apenas em 20/08/2024, ou seja, muito depois de este ter produzido a sua contestação.

I)Foram assim incorretamente julgados os pontos 26, 27, 28 e 29 dos factos provados, os quais deveriam ter sido julgados não provados.

J)O ofendido, após ter sido atingido pelo disparo na perna, ao invés de se fazer deslocar ao hospital da ... para ser socorrido, primou pela exigência de se deslocar antes ao posto da GNR de ..., que não fica em caminho para aquele Hospital, com o intuito de apresentação da queixa, pelo que só após ter sido visto pelo Sr Agente da GNR, se deslocou ao hospital, significa isto que, não só não havia risco para a vida, como o ofendido teve forças e vontade de antes se deslocar ao posto da GNR de ..., podendo também por isso perguntar-se onde estaria a intenção de matar do arguido nestas circunstâncias!!!

K)O Tribunal recorrido, fundando-se naquele relatório médico, não fez uma apreciação critica do mesmo e não o explicitou minimamente, como devia, nomeadamente por que razão não tendo o disparo provocado perigo para a vida do ofendido, se poderá concluir que o arguido tivesse intenção de o matar, sendo certo que estas duas conclusões teriam que ser explicadas e decididas, porque se encontram inexoravelmente interligadas.

L)O Tribunal Recorrido omitiu assim um dever de fundamentação da conclusão de intenção de matar, violando os princípios constitucionais da necessidade, da adequação e da proporcionalidade, consagrados nos artigos 18º, 27º e 28º nº 2 da Constituição da República Portuguesa

M) Acresce que o Tribunal Recorrido não julgou provado que o ofendido agrediu previamente o arguido com um murro entre a zona malar e o olho esquerdo do arguido, isto apesar de terem à sua disposição as fotografias  de fls 261, 262 e 318, e de tanto o arguido, como a testemunha BB o terem afirmado em julgamento.

P) Salvo o devido respeito, o Tribunal Recorrido, não dando por provado que o aqui arguido foi agredido previamente com um murro pelo aqui ofendido, quando as provas são evidentes, menoriza esta questão primordial ao afastamento do motivo fútil, mostrando insensibilidade decisória com o fim último de manter a pena que já aplicara.

Q) Impunha-se ao Tribunal recorrido, caso tivesse alguma dúvida, como no mínimo deveria ter, pelo menos reabrir a audiência e marcar uma sessão  de julgamento para inquirir novamente o arguido e o ofendido sobre esta temática, o que não fez.

R) Ao invés, para manter a pena aplicada, optou por tecer meras conclusões, sem produção de outro meio complementar de prova, nomeadamente que “em 07/08/2023, o arguido apresentava um ferimento na região periorbital, com cerca de 4 cm de comprimento, e que o ferimento ocorreu nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 4º, 5º e 6º”.

S) E aqui começa uma primeira contradição quando o Tribunal Recorrido reporta que o arguido apresentava esse ferimento em 07/08/2023, quando no ponto 4º dos factos provados refere ter sido no dia 06/08/2023, sendo certo que o arguido apresentava o ferimento no dia 06/08/2023 quando cerca das 22H30 se deslocou ao posto da GNR para apresentar queixa, …

T) E no ponto 6º o Tribunal Recorrido julgara provado laconicamente que “nesse momento, para evitar ser agredido, … empurrou o arguido com o objetivo de o colocar no exterior da respetiva propriedade, o que conseguiu após alguns atos recíprocos de contenda física”, sendo que, no processo 138/24...., quando ouvido pelo Sr Dr Juiz de Instrução, o …, algo estapafurdiamente, referiu que o aqui arguido ficou com a lesão na face decorrente de embate num portão, o que não logrou convencer ninguém …

U) E, no seu depoimento perante a Polícia Judiciária, é o próprio … que admite ter “dado uma lambada” ao aqui arguido, fazendo disso mesmo alarde numa entrevista a um canal de televisão cuja  gravação se encontra junta aos autos, …

X) O Tribunal Recorrido não deu apenas como provado que o … deu um empurrão ao arguido, mas também que ambos se envolveram em contenda física, sendo que, a verdade é que o ofendido não apresenta nenhuma marca de ferimento dessa contenda física, ao contrário do arguido que ficou com um corte na região periorbital, com cerca de 4 cm de comprimento.

Z) O Tribunal recorrido, buscando julgar não provado que o ofendido deu um murro na face ao arguido, até se contradiz (segunda contradição) quando a fls 14 refere que aquele empurrou o arguido “com o objetivo de o colocar fora da propriedade”, e a fls 20 justifica o empurrão acrescentando-lhe “para evitar ser agredido pelo arguido”.

AB) Padece assim o novo acórdão de errada fundamentação quanto à motivação do arguido no cometimento do crime que se continua a entender ser o de ofensa à integridade física agravada e já não o de homicídio qualificado na forma tentada porquanto factualmente nada resulta da atuação do arguido que o arguido tivesse a intenção de matar o ofendido.

AE)Antes e depois dos disparos, o arguido, se tivesse intenção de matar o ofendido, tê-lo-ia feito, primeiro porque o teve a cerca de 2 ou 3 metros, e  depois quando deixou de oferecer resistência com a porta, tendo o arguido acesso livre ao interior da cozinha, pelo que se tivesse tido a intenção de matar, como o Tribunal Recorrido concluiu, poderia tê-lo feito pois ainda dispunha de três balas na pistola, tendo-se, ao invés, ausentado do local.

AJ)No que ao crime de homicídio qualificado na forma tentada concerne, não se encontram preenchidos os suportes factuais e jurídicos para a condenação do arguido, …

AK) O crime de detenção de arma proibida do art.º 86 nº 1 al c) da Lei 5/2006 de 23/02 é punida com pena de prisão de 1 a 5 anos ou com pena de multa até 600 dias, sendo que, prevendo a lei uma pena não detentiva da liberdade em alternativa à pena de prisão, não se alcança a necessidade e a proporcionalidade de aplicação de uma pena de prisão efetiva …

AL)não devemos esquecer o precário estado de saúde do arguido, que o Tribunal Recorrido teve a oportunidade de percecionar, aliado ao facto de ter inúmeras doenças associadas como ansiedade, diabetes, hipertensão, …

AM)Tais doenças de que o arguido sofre, agravada agora pela doença psiquiátrica, têm especial relevância na escolha da medida da pena detentiva ou não da liberdade, na medida em que é seguro que se o arguido tivesse que cumprir pena de prisão no estabelecimento prisional, certamente que dali não sairia vivo.

AN)Não pode também o Tribunal deixar de considerar na escolha da medida da pena que o arguido é delinquente primário à data com 72 anos de idade, tendo levado uma vida em consonância com a lei, e, como o próprio Tribunal Recorrido reconhece, admitiu a maioria dos factos imputados, negando, contudo, e sempre o fez, faz e fará, que tivesse tido a intenção de matar o ofendido.


*

A Exm.ª Magistrada do MP[2] respondeu ao recurso, …

*

Neste tribunal, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, …

*

O tribunal recorrido fixou da seguinte forma a matéria de facto:

“...

1.1. Factos provados

Da acusação

1.º No princípio do mês de Agosto de 2023, existia um conflito latente entre o arguido … e …, derivado do facto de …, por vezes, conversar com …, ex-namorada do arguido;

2.º … era amigo e, por vezes, aconselhava e conversava com a ex-namorada do arguido, identificada em 1.º, o que lhe causava ciúmes;

3.º O arguido entendia que … falava mal de si à sua ex-namorada identificada em 1.º;

4.º No dia 06.08.2023, entre as 22h00m e as 22h30m, quando … se encontrava sozinho na respectiva moradia, sita …, a ver um programa na televisão sobre a Jornada Mundial da Juventude e o Papa, apercebeu-se que o arguido se dirigia para a sua residência, apeado, e enquanto fazia o trajecto, vindo do largo ali próximo, começou a chamar pelo seu nome e a dirigir-lhe palavras ofensivas, dizendo-lhe que ia ali para lhe “partir os cornos”;

5.º O arguido acabou por entrar para o interior da propriedade de …, sem ser convidado, ficando no alpendre junto à cozinha;

6.º Nesse momento, para evitar ser agredido, … empurrou o arguido com o objectivo de o colocar no exterior da respectiva propriedade, o que conseguiu após alguns actos recíprocos de contenda física;

7.º Algum tempo depois, cerca da 00h45m, já do dia 07.08.2023, o arguido passou novamente junto à moradia de …, fazendo-se transportar num veículo …, e estacionou-o em frente ao portão principal;

8.º O arguido levou consigo uma pistola de calibre 6.35mm, já devidamente municiada com cinco munições do mesmo calibre, tudo em bom estado de funcionamento e de utilização, sem que detivesse licença de uso e porte da arma e respectiva licença ou manifesto;

9.º A pistola referida em 8.º era semiautomática transformada, de calibre 6.35mm, de marca TANFOGLIO, modelo GT28, de origem italiana, sem número de série, exibindo as falsas inscrições “Star – MADE IN SPAIN CAL 6.35”;

10.º Nessa altura, …  encontrava-se na cozinha da sua residência e ouviu o barulho de um carro no exterior da casa, e quando espreitou pelo portão, viu o arguido que vinha na sua direcção a empunhar uma pistola na mão;

11.º O arguido entrou pelo portão exterior da propriedade de …, sem ser convidado, e temendo pela sua vida, refugiou-se na cozinha, e tentou trancar a porta que dá para o exterior;

12.º Acontece que as chaves da porta da cozinha estavam na fechadura dessa porta, mas do lado de fora;

13.º O arguido ao se aperceber que … estava na cozinha, dirigiu-se para aí imediatamente;

14.º Como … não conseguia trancar a porta à chave, agarrou a maçaneta do lado interior da porta para tentar impedir a entrada do arguido;

15.º E do lado exterior, o arguido forçava a porta no sentido de a abrir, para entrar na residência …;

16.º Acto continuo, o arguido conseguiu abrir parcialmente a porta e introduziu um dos braços por essa fresta, e efectuou dois disparos com a arma de fogo que levava consigo, em direcção ao corpo de …;

17.º Seguidamente. o arguido, sem se certificar do estado de saúde de …, abandonou imediatamente o local;

18.º Um dos disparos efectuados pelo arguido acertou na perna esquerda, junto à anca, de …, e causou, de imediato, uma abundante hemorragia, o outro disparo atingiu a mesma vítima, de raspão, na nádega esquerda;

19.º … ficou prostrado no chão e gritou por socorro;

20.º Passados alguns minutos, um sobrinho de … (…), que passava no local, ouviu os gritos e socorreu-o, e chamou a mãe para o transportar para o hospital;

21.º Esta conduziu … ao posto da Guarda Nacional Republicana de …, e, posteriormente, foi transportado para o Hospital … por uma ambulância dos bombeiros de …, cuja tripulação lhe prestou os primeiros socorros;

22.º …, no dia 07.08.2023, cerca das 2h33m, deu entrada no Hospital …), apresentando “ferida perfurante por tiro face anterior coxa esq”;

23.º

24.º A conduta do arguido, causou a … dores e os  ferimentos provocados pelos projécteis disparados: no membro inferior esquerdo – “cicatriz circular com 7 mm na face antero lateral no 1/3 superior da coxa. Posteriormente na coxa e ligeiramente abaixo da referida cicatriz apresenta tumefação dura com 1,6cm (afastada 10 cm). Cicatriz com 1 X 0,5 cm de maior eixo horizontal na nádega. Edema do membro inferior.”;

25.º As lesões sofridas por … resultaram de traumatismo de origem corto-perfurante causado pelo arguido, e demandaram, directa e necessariamente, 240 dias para a cura, com um período de afectação da capacidade para o trabalho geral e profissional de 30 dias;

26.º O arguido não provocou a morte de …, conforme pretendia, pois este refugiou-se no interior da respectiva residência, o que não foi suficiente para impedir que o arguido o atingisse com dois disparos de arma de fogo;

27.º … , ao refugiar-se no interior da sua cozinha, sem que tivesse franqueado a porta ao arguido, impediu que os disparos efectuados pelo arguido fossem mais certeiros e atingissem órgãos ou outras partes vitais do seu corpo;

28.º Na região atingida – parte superior da coxa – existem vasos sanguíneos que, se atingidos, como podia ter acontecido, poderiam ter levado à morte de …;

29.º O arguido agiu consciente, livre e deliberadamente, com o firme propósito de provocar a morte de …, por ciúmes e em jeito de vingança pela proximidade deste com a sua ex-namorada, identificada em 1.º, e o resultado morte não se verificou por motivos alheios à vontade do arguido, designadamente por … se ter refugiado e impedido que o arguido entrasse na respetiva residência e, assim, impedindo que os tiros disparados fossem mais certeiros;

30.º

31.º

Da contestação (na parte fáctica não coincidente com a acusação)

32.º No dia 06.08.2024, o arguido deslocou-se ao posto da Guarda Nacional Republicana … com a intenção de apresentar queixa contra …, e foi-lhe dito pelo elemento da Guarda Nacional Republicana de serviço, que, por falta de disponibilidade de efectivos no posto, voltasse no dia seguinte;

33.º Em 07.08.2023, o arguido apresentava um ferimento na região infra periorbital, com cerca de 4 centímetros de comprimento;

34.º O ferimento referido em 33.º, ocorreu nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 4.º, 5.º, e 6.º;

35.º O arguido é bem considerado na comunidade onde se insere;

Mais resultou da audiência de discussão e julgamento,

36.º A data da consolidação médico-legal das lesões sofridas por … é fixável em 27.02.2024;

37.º As lesões sofridas por … determinaram 204 dias para a consolidação médico-legal, com afectação da capacidade de trabalho geral (30 dias) e com afectação da capacidade de trabalho profissional (30 dias);

38.º … ficou com consequências permanentes no seguimento das lesões sofridas traduzidas nas cicatrizes supra descritas e a tumefação;

39.º O relacionamento do arguido com …, terminou em dia não concretamente apurado do mês de Junho de 2023;

40.º

41.º

42.º

43.º

44.º

45.º

46.º

47.º

48.º

49.º

50.º

51.º


*

1.2. Factos não provados

Da acusação

a) …

Da contestação (na parte fáctica não coincidente com a acusação)

b) …

c) …

d) …


*

”.

*

Como dissemos, o art.º 374º/2 do CPP[3] determina que, na sentença, ao relatório se segue a fundamentação que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.

A redacção deste preceito inculca a ideia, que a obediência a regras de bom senso, clareza e precisão apoiam, de que a fundamentação da decisão se repartirá pela enumeração dos factos provados, depois dos não provados e, seguidamente, pela exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão com o exame crítico das provas.

Necessário e imprescindível é que o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência se possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado.

No cumprimento desse dever, o tribunal recorrido fundamentou a sua decisão de facto da seguinte forma:

“... O Tribunal fundou a sua convicção na conjugação da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento.

O tribunal considerou, além do mais, os exames periciais do Laboratório de Polícia Científica, com relatórios juntos a fls. 363, fls. 365, fls. 369, e fls. 372, dos quais resultam que a arma apreendida nos autos apresentava resíduos de disparo de armas de fogo, compatíveis com manipulação/proximidade do arguido, e nos elementos municiais da aludida arma, nos quais foi encontrado ADN do arguido na arma, a identificação da arma como uma pistola semiautomática transformada, de calibre 6.35mm, de marca TANFOGLIO, modelo GT28, de origem italiana, em boas condições de funcionamento, assim como, as munições enviadas e os invólucros deflagrados.

O tribunal ponderou, também, o teor do relatório do exame pericial do Instituto Nacional de Medicina Legal quanto ao arguido, do qual nada resultou, por ausência de lesões à data da perícia, conforme referido pelo médico perito (fls. 423 e ss.). E os relatórios dos exames periciais do Instituto Nacional de Medicina Legal quanto a … (fls. 413 e ss., e fls. 514 a 516 verso), e documentação médica/clínica (a fls. 41, fls. 103 a 104, fls. 183 a 184, fls. 308 a 309, fls. 360 a 361, fls. 378 a 380), tudo do qual resultam as lesões sofridas por … e respectivas consequências.

Atendeu-se às informações do Núcleo de Armas e Explosivos da Polícia de Segurança Pública …


*

O tribunal ponderou as declarações do arguido, o qual admitiu a maioria dos factos imputados, apresentando, no entanto, um contexto diverso para o início da altercação, e negou que fosse sua intenção provocar a morte ….

A testemunha … disse conhecer o arguido, referindo que eram amigos, e apesar dos factos em causa nos autos, não está zangado com o arguido.

Confirmou, em suma, os factos descritos na acusação, contextualizando que os factos ocorreram na altura em que o Papa estava em Portugal, confirmando que, num primeiro momento em que o arguido se deslocou a sua casa, pensou que era para lhe pagar o dinheiro que lhe tinha emprestado, mas o arguido dirigiu-se a ele dizendo que lhe ia “foder os cornos”.

A testemunha …, militar da Guarda Nacional Republicana, …

Confirmou que no dia dos factos em apreço nos autos, entrava ao atendimento à 00h00m, e perto dessa hora o arguido entrou no posto, recordando-se que este tinha uma marca de sangue do lado esquerdo. …

Quanto à testemunha …, inspector da Polícia Judiciária, …, afirmou que participou nas buscas efectuadas a casa do arguido, e confirmou que aí encontraram uma caçadeira, e uma arma transformada 6.35mm (esta última estava escondida), …

A testemunha …, afirmou que reside em … há cerca de 1 ano e 2/3 meses. … Esclareceu que conheceu o arguido em 2018, através da rede social “Facebook”, e em Março de 2023, quando veio para Portugal, manteve um relacionamento com o arguido, com quem residiu até 27 de Junho 2024, data em que saiu de casa. Referiu que tal ocorreu no seguimento de o arguido ter adoptado um comportamento agressivo para com a mesma.

Questionada nesse sentido, afirmou que … este nunca lhe falou mal do arguido, nem nunca manifestou interesse em si ou tentou qualquer avanço nesse sentido.

Afirmou que nos seus dias de folga costumava limpar o carro do arguido, e nunca viu nenhuma arma de fogo guardada no veículo.

No mais, verbalizou que só teve conhecimento do sucedido entre o arguido e AA no dia seguinte, através de terceiros.

Já a testemunha …, médico de família, afirmou ser amigo do arguido, e que ficou surpreso quando soube o que tinha acontecido, pois tem o arguido como uma pessoa séria. Acrescentou que o arguido é uma pessoa doente, padecendo de diabetes, hipertensão, e ansiedade, fazendo toma de medicação. …


*


*


*

Isto posto, é pacífica a jurisprudência do STJ[4] no sentido de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação[5], sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso.

Da leitura dessas conclusões e tendo em conta as questões de conhecimento oficioso, afigura-se-nos que as questões fundamentais a decidir no recurso são as seguintes:

I - Falta de fundamentação da decisão recorrida;

II - Impugnação da matéria de facto;

III – Vício de contradição insanável;

IV – Tipificação da conduta do Arg.;

V – Reapreciação da escolha e das medidas das penas.


*

Cumpre decidir.

I – Imputa o Arg. o vício de falta de fundamentação ao acórdão recorrido, porque não fundamentou suficientemente por que deu como provada a intenção de matar (conclusões L e AB).

A falta de fundamentação da sentença constitui nulidade (art.ºs 374º/2 e 379º/1-a) do CPP).

Esta nulidade deve ser arguida e conhecida em sede de recurso (art.º 379º/2 do CPP).

A falta de fundamentação ocorre quando o tribunal não indica os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência se possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento da matéria de facto, sobre o enquadramento e consequências jurídicas dessa matéria de facto e, sendo caso disso, sobre a escolha e a determinação das medidas das penas.

A deficiência da fundamentação só constitui esta nulidade, quando for de tal forma relevante que impeça o conhecimento da razão para determinado facto ter sido dado como provado ou não provado, ou os raciocínios subjacentes à qualificação jurídica da conduta do Arg., ou à determinação das medidas das penas.

Quanto à intenção de matar, como vimos, o tribunal recorrido fundamentou a sua decisão de facto, nos termos supra transcritos.

Já na nossa anterior decisão considerámos que o facto de o relatório médico-legal  consignar que “... Do evento resultaram para o(a) Examinado(a)as consequências permanentes descritas, as quais, sob o ponto de vista médico-legal, se traduzem em as cicatrizes descritas e a tumefação as quais não se enquadram no Art 144º do CP. ...”,  não impede que se conclua, como o tribunal recorrido, pela intenção de matar.

Entendemos, pois, que a conclusão pela intenção de matar, apesar daquele relatório, está suficientemente fundamentada[6], pelo que a decisão recorrida, nesta parte, não padece do apontado vício.

Quanto e à prévia agressão pelo Ofendido, o tribunal recorrido fundamentou a sua decisão de facto, como vimos, para além do mais, nos seguintes termos:

“... Quanto ao facto não provado c), também não se fez prova que AA tenha dado um murro ao arguido. De facto, da prova produzida resultou como provado que … empurrou o arguido com o objectivo de o colocar no exterior da respectiva propriedade, conforme as declarações da referida testemunha, as quais mereceram credibilidade pelo tribunal, em contraposição com as do arguido, pelas razões acima referidas.

Relativamente ao facto não provado em d), tendo considerado como não provado que … desferiu um murro no rosto do arguido, tem necessariamente este facto de ser dado como não provado. ...”.

Consideramos tal fundamentação é suficiente para dar cumprimento à obrigação da fundamentação de facto, uma vez que permite controlar a razoabilidade da convicção de facto do tribunal recorrido.

Pode não se estar de acordo com essa fundamentação, como é o caso do Recorrente, mas isso não implica a existência de falta de fundamentação.

Não padece, pois, a decisão recorrida dos apontados vícios de falta de fundamentação.


*

II - Entende o Recorrente que o tribunal recorrido não devia ter dado como provados os factos provados 26 a 29 e devia ter dado como provados os factos não provados c) e d), pelo menos por aplicação do princípio in dubio pro reo, porque não foi produzida prova em audiência de que tivesse agido com intenção de matar e foi produzida prova de que o Ofendido deu antes um murro no Arg..

Uma vez que entende que foi mal julgada a matéria de facto, o que invoca é a existência de erro na avaliação dos depoimentos e declarações dos intervenientes, bem como da restante prova produzida em audiência ou constante dos autos.

A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação da prova pelo juiz.

Este princípio da livre apreciação da prova está consagrado no art. 127º do CPP nos seguintes termos «... a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente».

E embora este Tribunal da Relação tenha poderes de intromissão em aspectos fácticos (art.ºs 428º e 431º/b) do CPP), não pode sindicar a valoração das provas feitas pelo tribunal em termos de o criticar por ter dado prevalência a uma em detrimento de outra, salvo se houver erros de julgamento e as provas produzidas impuserem outras conclusões de facto[7],[8],[9].

A garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência[10] - visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto[11].

Na formação da convicção do juiz não intervêm apenas factores racionalmente demonstráveis, referindo-se a relevância que têm para a formação da convicção do julgador «elementos intraduzíveis e subtis», tais como «a mímica e todo o aspecto exterior do depoente» e «as próprias reacções, por vezes quase imperceptíveis, do auditório» que vão agitando o espírito de quem julga (no mesmo sentido Castro Mendes, Direito Processual Civil, 1980, vol. III, pág. 211, para acrescentar depois, a págs. 271, que «existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percebidos, apreendidos, interiorizados ou valorizados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores»)[12].

O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique «os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado».

E convém referir que quando o tribunal recorrido forma a sua convicção com provas não proibidas por lei, prevalece a convicção do tribunal sobre aquelas que formulem os Recorrentes.

Normalmente, os erros de julgamento capazes de conduzir à modificação da matéria de facto pelo tribunal de recurso consistem no seguinte: dar-se como provado um facto com base no depoimento de uma testemunha que nada disse sobre o assunto; dar-se como provado um facto sem que tenha sido produzida qualquer prova sobre o mesmo; dar-se como provado um facto com base no depoimento de testemunha, sem razão de ciência da mesma que permita a referida prova; dar-se como provado um facto com base em prova que se valorou com violação das regras sobre a sua força legal[13]; dar-se como provado um facto com base em depoimento ou declaração, em que a testemunha, o arguido ou o declarante não afirmaram aquilo que na fundamentação se diz que afirmaram[14]; dar-se como provado um facto com base num documento do qual não consta o que se deu como provado; dar-se como não provado um facto por se não ter valorado um depoimento ou outro meio de prova que se devia ter valorado; dar-se como provado ou não provado um facto com base em presunção judicial erradamente aplicada.

Antes do mais, o Recorrente não deu cumprimento ao disposto no art.º 412º/3/4 do CPP, não fazendo nas conclusões, nem no corpo da motivação, as especificações impostas por esta norma.

Importa realçar que a especificação prevista no art.º 412º/3-b)/4 do CPP não se basta com a transcrição integral[15] dos depoimentos ou declarações, nem com a remessa para a totalidade de qualquer documento que, no entender do Recorrente, impõem decisão diversa, devendo os erros ser indicados ponto por ponto e com a menção das provas, nomeadamente, das passagens em que funda o seu entendimento, que demonstram esses erros[16].

Por outro lado, “O recorrente não impugna de modo processualmente válido a decisão proferida sobre matéria de facto se se limita a procurar abalar a convicção assumida pelo tribunal recorrido, questionando a relevância dada aos depoimentos prestados em audiência. …[17], [18].

Também não é processualmente válida a impugnação que se faz invocando toda a prova produzida[19].

No presente caso, na verdade, o Recorrente faz uma interpretação alternativa da prova produzida em audiência, o que sendo compreensível e legítimo, não é relevante como impugnação da matéria de facto, porque, por um lado, nada na prova por si referida na motivação do seu recurso impõe a alteração da matéria de facto fixada (…), por outro, essa alteração só poderia decorrer da reapreciação global da prova produzida, o que, como vimos, não é admissível em sede de recurso, e, por outro ainda, corresponde à mera contraposição da sua convicção à do tribunal recorrido.

[20].

Quanto à violação do princípio in dubio pro reo[21], dir-se-á, em síntese que o que resulta do princípio citado é que quando o tribunal fica na dúvida quanto à ocorrência de determinado facto, deve daí retirar a consequência jurídica que mais beneficie o arguido. Mas para que a dúvida seja relevante para este efeito, há-de ser uma dúvida razoável, uma dúvida fundada em razões adequadas e não qualquer dúvida (Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, I, p. 205)[22].

Ora, não vislumbramos na decisão recorrida, quer na matéria de facto fixada, quer na sua fundamentação, que, ao fazer esta opção fáctica, o tribunal tenha tido qualquer hesitação quanto à valoração da prova, tal como não fixou qualquer facto que pudesse colocar em questão tais factos, ou seja, não teve qualquer dúvida e também não vemos que devesse ter tido. O tribunal retirou directamente tais conclusões da prova produzida em audiência. Não deveria/poderia, em consequência, fazer uso de tal princípio.

É, pois, improcedente, nesta parte, o recurso.


*

III – Imputa o Arg. à decisão recorrida dois vícios de contradição, porque, “... contradição quando o Tribunal Recorrido reporta que o arguido apresentava esse ferimento em 07/08/2023, quando no ponto 4º dos factos provados refere ter sido no dia 06/08/2023, sendo certo que o arguido apresentava o ferimento no dia 06/08/2023 quando cerca das 22H30 se deslocou ao posto da GNR para apresentar queixa, e ali ter sido recebido pelo cabo …, que lhe referiu não poder fazê-lo atenta a hora, recomendando-lhe que se deslocasse ao posto no dia seguinte. ... O Tribunal recorrido, buscando julgar não provado que o ofendido deu um murro na face ao arguido, até se contradiz (segunda contradição) quando a fls 14 refere que aquele empurrou o arguido “com o objetivo de o colocar fora da propriedade”, e a fls 20 justifica o empurrão acrescentando-lhe “para evitar ser agredido pelo arguido”. ...” (conclusões S e Z).

“… contradição insanável da fundamentação quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou, quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face à colisão entre os fundamentos invocados; há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos quando os provados e os não provados se contradigam entre si ou por forma a excluírem-se mutuamente.[23].

“....”[24].

Não vemos qualquer contradição entre os factos provados 4, 5, 6, 33 e 34.

Na verdade, o que resulta da sua conjugação é que o Arg. apresentava, em 07-08-2023, um ferimento na região infra periorbital, que resultou dos “ ... actos recíprocos de contenda física ...” ocorridos na noite de 06-08-2023, o que não é contraditório.

Por outro lado, para o que aqui está em causa, é irrelevante se o empurrão que o Ofendido deu ao Arg. foi dado com o objetivo de colocar este fora da propriedade ou para evitar ser por ele agredido.
Não existem, pois, as apontadas contradições e também não vislumbramos na decisão recorrida qualquer outra.


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Não vislumbramos na decisão recorrida qualquer outro dos vícios previstos no art.º 410º/2 do CPP, que são de conhecimento oficioso[25] e têm que resultar do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugado com as regras da experiência comum[26].

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IV – entende o Arg. que a sua conduta deve ser tipificada não como homicídio qualificado tentado, mas sim como como ofensa à integridade física agravada, p. e p. pelo art.º 145/1-a) do CP.

O tribunal recorrido fundamentou a tipificação que fez da conduta do Arg., neste particular, para além do mais, da seguinte forma:

“... Volvendo ao casos dos autos, provou-se que, no princípio do mês de Agosto de 2023, existia um conflito latente entre o arguido e …, então com 80 anos de idade, derivada do facto de …, por vezes, conversar com …, ex-namorada do arguido, o qual, por vezes, aconselhava e conversava com a ex-namorada do arguido. E que esta circunstância causava ciúmes ao arguido, achando este que … falava mal de si à sua ex-namorada.

No mais, resultou que o arguido agiu com o firme propósito de provocar a morte de …, motivado por ciúmes e em jeito de vingança pela proximidade deste com a sua ex-namorada, e que o resultado morte só não se verificou por motivos alheios à vontade do arguido, porque … se refugiou e impediu que o arguido entrasse na respectiva residência e, assim, impediu que os tiros disparados fossem mais certeiros.

O arguido agiu contra … por achar que este falava mal de si a …, sua ex-namorada, e aconselhava e conversava com a mesma, o que lhe causava ciúmes. Não há dúvidas que a actuação do arguido foi motivada unicamente por ciúmes que este sentia da sua ex-companheira …. A actuação do arguido nada teve que ver com o ferimento que sofreu no rosto.

Este comportamento foi uma actuação incompreensível à luz do modo de agir do homem médio, ofendendo a moralidade média sobremaneira, e foi impulsionada por um motivo de importância superficial e leviano – o arguido tentou matar …, porque tinha ciúmes da sua ex-namorada … –, que revela de forma notória a desproporcionalidade e inadequação entre a actuação do arguido e o motivo que impeliu à acção, revelando a especial censurabilidade e perversidade que o art.º 132.º, n.º 1 e n.º 2, alínea e), do Código Penal, exige. ...”.

Uma vez que o agiu com intenção de matar, fica liminarmente afastada a hipótese de a sua conduta ser tipificada como ofensa à integridade física.

Vejamos se se justifica a tipificação como homicídio qualificado, por motivo fútil.

Como se afirma no sumário do acórdão do STJ de 23/10/2008, relatado por Santos Carvalho, in www.dgsi.pt, processo 08P2856, importa ter em conta que: “I - Tem o STJ entendido que o homicídio qualificado atípico «há-de ser levado a cabo com alguma parcimónia, pois, no fim de contas, “é de facto uma ousadia criar homicídios qualificados...”». II - O M.º P.º na 1ª instância entende que “o arguido manifestou um profundo desprezo pelo valor da vida humana, movido por motivos de vingança, afirmação no interior do seu grupo e vaidade criminal. O facto de existir um clima de confronto dentro da discoteca, não torna compreensível o comportamento do arguido nem muito menos o justifica.” III - Mas, o tipo especial de culpa, característico do homicídio qualificado, não se define pela negativa, como faz o M.º P.º ao constatar que o clima de confronto “não torna compreensível” o homicídio e “muito menos o justifica”, pois se o homicídio fosse “compreensível” seria, eventualmente, um homicídio privilegiado e se fosse justificado, possivelmente não seria punível. IV - É preciso recordar que o crime base neste domínio é o de homicídio simples, no qual o agente manifesta, quase sempre, o tal “profundo desprezo pela vida humana”, já que, por definição, age com dolo (na maioria das vezes directo, isto é, pretende e tem o desejo de matar) e fá-lo por um motivo qualquer, que quase nunca se pode avaliar positivamente, por exemplo, por vingança, por vaidade ou por afirmação de grupo. O homicídio qualificado há-de ter, por isso, algo que se deva acrescentar a essa culpa já intensa, que a torne especialmente censurável.” (sublinhado nosso).

Está provado que o Arg. agiu “... por ciúmes e em jeito de vingança pela proximidade deste com a sua ex-namorada, ...”.

Motivo fútil “… significa que o motivo da actuação, avaliado segundo as concepções éticas e morais ancoradas na comunidade, deve ser considerado pesadamente repugnante, baixo ou gratuito (…) de tal modo que o facto surge como produto de um profundo desprezo pelo valor da vida humana.[27], “… é o motivo de importância mínima. Será também o motivo frívolo, leviano, a ninharia que leva o agente à prática desse grave crime, na inteira desproporção entre o motivo e a extrema reacção homicida, o que se apresenta notoriamente inadequado do ponto de vista do homem médio em relação ao crime de que se trate, o que traduz uma desconformidade manifesta entre a gravidade e as consequências da acção cometida e o que impeliu o agente a essa comissão, que acentua o desvalor da conduta por via do desvalor daquilo que impulsionou a sua prática. …”[28].

Não nos parece que, em geral, o ciúme possa ser considerado um motivo fútil[29], havendo até quem defenda que privilegia o homicídio[30], e no caso concreto, em que sobressai a escassez de factos (não conhecemos a intensidade dos sentimentos afectivos que o Arg. nutre pela senhora em causa, nem há outros elementos que permitam caracterizar esses sentimentos), entendemos que se não pode considerar o ciúme que motivou a tentativa de homicídio como motivo fútil.

Concluímos, pois, que a conduta do Arg. deve ser tipificada como homicídio simples, agravado, por ter sido praticado com arma, tentado (art.ºs 131º, 22º, 23º e 73º do CP e 86º/3 da Lei 5/2006, de 23/02).


*

V – Entende o Arg. que a pena pelo crime de detenção de arma proibida deve ser a de multa e que, em qualquer dos casos, as penas que lhe foram aplicadas devem ser reduzidas e que a execução da pena única deve ser suspensa.

O tribunal recorrido fundamentou a escolha e as medidas concretas das penas que aplicou, para além do mais, nos seguintes termos:

“... Uma vez que o crime de detenção de arma proibida prevê, em alternativa, duas penas principais, é necessário, antes de mais, determinar a espécie de pena a aplicar, isto é, pena de prisão ou a pena de multa.

Isto significa que a opção pela pena de prisão só deverá ser feita quando a sua execução “se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias” (cf. Dias, Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime. Coimbra: Coimbra Editora. 2005. p. 333).

No caso concreto dos autos, as exigências de prevenção geral são elevadas, porquanto, com referência ao crime em questão, constata-se um número relevante e crescente de verificação deste tipo de crime, que, além de perturbarem a paz individual e comunitária, causam alarme social.

As necessidades de prevenção especial são médias altas, porque, apesar de o arguido não ter antecedentes criminais, e estar familiar e socialmente inserido, este não assumiu a autoria dos factos por si praticados na parte que agrava a sua responsabilidade criminal, tentou justificar a sua actuação, e não demonstrou arrependimento, o que demonstra que não interiorizou o desvalor das suas condutas, revelando a sua actuação uma desconformidade com o dever ser jurídico e uma personalidade desprovida de princípios éticos e sociais, denotando um comportamento desconforme aos valores essenciais da sociedade, o que justifica maiores exigências de prevenção especial.

Atentas as considerações supra expostas, entende o tribunal que as condutas imputadas ao arguido assumem gravidade suficiente para desencadear a aplicação de uma pena detentiva da liberdade…

Assim, justifica-se a aplicação de uma pena de detentiva quanto ao crime de detenção de arma proibida.

...

Como referido, as exigências de prevenção geral são elevadíssimas, porquanto, relativamente ao crime de homicídio qualificado, na forma tentada, cometido com arma, atenta a verificação crescente do cometimento deste tipo de ilícito, a danosidade, insegurança e alarme social que gera na comunidade, a perturbação da paz individual e comunitária, e o sentimento de frustração por parte de todos aqueles que adoptam comportamentos devidos, sendo premente a necessidade de estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma em apreço, valendo o mesmo para as exigências de prevenção geral quanto ao crime de detenção de arma proibida, conforme se expendeu supra.

Quanto às necessidades de prevenção especial, conforme referido supra, são as mesmas médias altas, porque apesar de o arguido não ter antecedentes criminais, estar familiar e socialmente inserido, o arguido negou parte dos factos que lhe são imputados, na parte que agravam a sua responsabilidade criminal, apresentou uma versão alternativa na tentativa de justificar a sua actuação, e não demonstrou arrependimento, o que revela que não interiorizou o desvalor das suas condutas, e revela uma actuação desconforme ao dever ser jurídico. O arguido demonstrou premeditação na sua actuação ao dirigir-se uma segunda vez à residência de …, momentos após a primeira altercação, levando consigo uma arma de fogo, devidamente municiada, com a intenção de disparar a mesma e atingir …, como atingiu, e só não lhe provocou a morte por motivos alheios à sua vontade. E agiu impulsionado por ciúmes da sua ex-namorada …, um motivo leviano e frívolo, que gera incompreensão no homem médio, e revela uma actuação sobremaneira desproporcional e inadequada. A actuação do arguido demonstra que tem uma personalidade desprovida de princípios éticos e sociais, denotando um comportamento desconforme aos valores essenciais da sociedade, o que justifica maiores exigências de prevenção especial.


*

Quanto ao crime de detenção de arma proibida, entendemos, como o tribunal recorrido, que é de manter a opção pela pena de prisão.

Na verdade, sendo aplicáveis alternativamente penas privativas e não privativas da liberdade, nos termos art.º 70º do CP, há que proceder à escolha da pena, devendo dar-se preferência fundamentada às segundas[31], [32].

“... A pena de prisão, deve ser reservada para situações de maior gravidade e alarme social, devendo dar-se preferência à pena de multa, desde que essa pena não detentiva de liberdade se afigure como suficiente "para promover a reintegração do delinquente na vida social e dar satisfação aos fins da retribuição e da prevenção das penas ..."[33].

O critério geral de escolha e de substituição da pena deve ser o seguinte: “... o tribunal deve preferir á pena privativa de liberdade uma pena alternativa ou de substituição, sempre que verificados os respectivos pressupostos de aplicação, a pena alternativa ou de substituição se revelem adequadas e suficientes à realização das finalidades da punição. O que vale logo por dizer que são finalidades exclusivamente preventivas, de prevenção especial e de prevenção geral, não finalidades de compensação da culpa, que justificam (e impõem) a preferência por uma pena alternativa ou por uma pena de substituição e a sua efectiva aplicação. ...”[34].

Na presente situação, o Arg. não só detinha uma arma proibida, como a usou para praticar um crime de homicídio tentado.

Se entendemos que, nos casos de mera detenção, em que está em causa um crime de perigo abstracto, se justifica, em princípio, a opção pela pena de multa, já nos parece que nos casos em que a arma é usada para praticar outro crime, porque está em causa um perigo concretizado, se deve, em princípio, optar pela pena de prisão.

É o que acontece no caso dos autos.

Quanto à reapreciação da medida dessa, entendemos que a intervenção dos tribunais de 2ª instância na apreciação das penas fixadas pela 1ª instância deve ser parcimoniosa e cingir-se à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não deve sindicar a determinação, dentro daqueles parâmetros da medida concreta da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, ou a desproporção da quantificação efectuada[35].

Verificamos que o tribunal recorrido aplicou correctamente os princípios gerais de determinação das penas, não ultrapassou os limites da moldura da culpa, e teve em conta os fins das penas no quadro da prevenção. Por outro lado, em face da matéria de facto apurada, entendemos que não estamos perante qualquer desproporção da quantificação efectuada desta pena, nem face a violação de regras da experiência comum, pelo que não se justifica intervenção correctiva deste Tribunal pelo que, nesta parte, o recurso é improcedente.

Já quanto ao crime de homicídio, uma vez que o tipificamos de forma diferente, há que determinar a respectiva pena.

O crime de homicídio simples é punível com pena de 8 a 16 anos de prisão (art.º 131º do CP).

Esta pena é agravada por ter sido cometida com arma (art.º 86º/3[36] da L 5/2006, de 23/02), pelo que os limites passam a ser de 10 anos e 8 meses a 21 anos e 4 meses.

Uma vez que o crime assume a forma tentada, os limites da pena passam a ser de 2 anos 1 mês e 18 dias a 14 anos 2 meses e 20 dias de prisão (art.ºs 23º/2 e 73º do CP)

A determinação da medida concreta da pena, nos termos do art.º 71º do CP, deve ser feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo às circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor ou contra o agente[37].

Tendo em conta as circunstâncias consideradas pelo tribunal recorrido, que subscrevemos e aqui damos por reproduzidas, consideramos ajustada a pena de 5 anos de prisão.

Uma vez que se alteraram os respectivos limites mínimo e máximo da pena única, há que refazer o cúmulo destas penas parcelares.

Na determinação da medida da pena do cúmulo devem ser considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente (art.º 77º/1 do CP)[38],[39].

Recorrendo, de novo, aos parâmetros já levados em conta pelo tribunal recorrido, consideramos ajustada a pena única de 5 anos e 6 meses de prisão.

Esta pena não é passível de substituição.


*****

Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, julgamos parcialmente procedente o recurso e, consequentemente, decidimos:

a) absolver o Arg. do crime de homicídio qualificado agravado tentado, p. e p. pelos art.ºs º 131º, 132º/1/2-e), 22.º e 23.º do CP, e 86.º/3 da Lei n.º 5/2006, de 23/02;

b) condenar o Arg. pela prática de 1 (um) crime de homicídio agravado tentado, p. e p. pelos art.ºs º 131º, 22.º e 23.º do CP, e 86.º/3 da Lei n.º 5/2006, de 23/02, na pena de 5 (cinco) anos de prisão;

c) fazendo o cúmulo jurídico da pena aplicada em b) com a pena aplicada pelo crime de detenção de arma proibida, que mantemos, condenar o Arg. na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão;

d) no mais, manter o decidido na decisão recorrida.


*

Sem custas.

*

Notifique.

D.N..


*****

(Elaborado em computador e integralmente revisto pelo subscritor (art.º 94º/2 do CPP).

*****


Voto de vencida:

Entendo que os factos praticados pelo arguido integram o crime de homicídio qualificado (tentado) previsto no artigo 132º, nº 1, al. e) do C.P., ao ter actuado por motivo fútil :

Em concreto, o arguido já não namorava com CC desde há cerca de dois meses, pelo que se tratava de uma ex-namorada; não estava em causa a sua mulher, companheira, ou sequer namorada.

Depois, o ofendido apenas falava/conversava com ela.

Ou seja, é socialmente inadmissível e extremamente censurável a conduta do arguido, tanto mais que se dirigiu duas vezes a casa do ofendido para o confrontar, verificando-se uma grande desproporção entre a gravidade da sua actuação e o que o impeliu a agir .

Assim, manteria a decisão recorrida na íntegra.

Helena Lamas


[1] Arguido/a/s.
[2] Ministério Público.
[3] Código de Processo Penal.
[4] Supremo Tribunal de Justiça.
[5]Cfr. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 05.12.2007; proferido no proc. nº 1378/07, disponível in Sumários do Supremo Tribunal de Justiça; www.stj.pt. …
[6] Relativamente à fundamentação de facto, cf. a jurisprudência plasmada no Ac. STJ de 17/11/1999, relatado por Martins Ramires, in CJSTJ, III, p. 200 e ss., …
Também neste sentido, ver Maria do Carmo Silva Dias, in “Particularidades da Prova em Processo Penal. Algumas Questões Ligadas à Prova Pericial”, Revista do CEJ, 2º Semestre de 2005, pp. 178 e ss., bem como a doutrina e a jurisprudência constitucional citadas. No mesmo sentido, cf. Sérgio Gonçalves Poças, in “Da sentença penal – Fundamentação de facto”, revista “Julgar”, n.º 3, Coimbra Editora, p. 21 e ss..
Ver ainda José I. M. Rainho, in “Decisão da matéria de facto – exame crítico das provas”, Revista do CEJ, 1º Semestre de 2006, pp. 145 e ss. …
Cf. o acórdão da RE de 13/05/2014, relatado por Clemente Lima, no proc. 368/12.6GBLLE.E1, in www.dgsi.pt, …
Sobre o tema é indispensável a consulta da obra “A fundamentação da sentença no sistema penal português …”, de José António Mouraz Lopes, Ed. Almedina, 2011.
[7] Importa considerar que, como se afirma no Ac. do STJ de 17/02/2005, relatado por Simas Santos, in www.dgsi.pt, processo 04P4324, “1 - O recurso em matéria de facto para a Relação não constitui um novo julgamento em que toda a prova documentada é reapreciada pelo Tribunal Superior que, como se não tivesse havido o julgamento em 1.ª Instância…
E no Ac. do STJ de 12/06/2008, relatado por Raul Borges, in www.dgsi.pt, processo 07P4375, de cujo sumário citamos: …
[8] Neste sentido, cf. ainda o Ac. do STJ de 25/03/1998, in BMJ 475/502, com anotação de que neste sentido se vinham orientando a doutrina e a jurisprudência.
[9] Neste sentido, ver também o Ac. RL, de 10/10/2007, relatado por Carlos Almeida, in www.dgsi.pt, processo 8428/2007-3, de cujo sumário citamos: “…XVII – No caso, embora a prova produzida e examinada na audiência permitisse, eventualmente, uma decisão em sentido diferente, ela não impunha decisão diversa da proferida, razão pela qual o recurso não pode ter provimento.”.
[10] Cfr., entre outros, Damião Cunha, «O caso Julgado Parcial», 2002, pág. 37; Paulo Saragoça da Matta, «A Livre Apreciação da Prova e o Dever de Fundamentação da Sentença - Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais», pág. 253.
[11] No mesmo sentido, cf. o Ac. do STJ de 20/11/2008, relatado por Santos Carvalho, in www.dgsi.pt, processo 08P3269, de cujo sumário citamos…
[12] Neste sentido, veja-se o acórdão da RG de 16/05/2016, relatado por João Lee Ferreira, no proc. 732/11.8JABRG.G1, com o seguinte sumário: …
[13] Neste sentido, ver o acórdão da RP de 04/02/2016, relatado por Antero Luís, no proc. 23/14.2PCOER.L1-9, in www.dgsi.pt.
[14] Veja-se, a este propósito, o acórdão da RC de 25/10/2017, relatado por Inácio Monteiro, no proc. 444/14.0JACBR.C1, in www.dgsi.pt, de cujo sumário citamos: “I - A reapreciação da prova, por erro de julgamento, é ouvir as pessoas nas passagens concretas do seu depoimento, em que no entender do recorrente está inquinado, para saber se disseram ou não o que se mostra vertido na decisão da matéria de facto e não se destina a apurar uma interpretação diferente do tribunal a quo....”.
[15] Nem com a remissão para a totalidade dos mesmos.
[16] Nesse sentido, cf. o acórdão da RP de 02/12/2015, relatado por Artur Oliveira, no proc. 253/06.0GCSTS.P1, n www.degsi.pt, com o seguinte sumário: …
No mesmo sentido, veja-se o acórdão da RC de 16/11/2016, relatado por Vasques Osório, no proc. 208/14.1JACBR.C1, in www.dgsi.pt, de cujo sumário citamos: …
[17] Acórdão da RP de 06/10/2010, relatado por Eduarda Lobo, in www.gde.mj.pt, processo 463/09.9JELSB.P1.

[18] No mesmo sentido, cf. o acórdão da RG de 28/06/2004, relatado por Heitor Gonçalves, in www.gde.mj.pt, processo 575/04-1, …
[19] Nesse sentido, cf. o acórdão da RC de 16/12/2015, relatado por Inácio Monteiro, no proc. 76/14.3JACBR.C1, n www.degsi.pt, de cujo sumário citamos: …

[20] Neste sentido, cf. o acórdão da RP de 10/05/2006, relatado por Paulo Valério, in www.gde.mj.pt, processo 0315948, …

[21]A presunção de inocência é identificada por muitos autores como princípio in dubio pro reo, no sentido de que um non liquet na questão da prova tem de ser sempre valorado a favor do arguido. A dúvida sobre a responsabilidade é a razão de ser do processo. O processo nasce porque uma dúvida está na sua base e uma certeza deveria ser o seu fim. Dados, porém, os limites do conhecimento humano, sucede frequentemente que a dúvida inicial permanece dúvida a final, malgrado todo o esforço para a superar. Em tal situação, o princípio político-jurídico da presunção de inocência imporá a absolvição do acusado já que a condenação significaria a consagração de um ónus de prova a seu cargo, baseado na prévia admissão da sua responsabilidade, ou seja, o princípio contrário ao da presunção de inocência.” (Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, I, 5ª ed., 2008, p. 83 e 84).

Ou, como dizem Jorge Miranda e Rui Medeiros, in “Constituição Portuguesa Anotada”, Tomo I, Coimbra Editora, 2005, p. 356, …

[22] Sobre as possibilidades de aplicação do princípio in dubio pro reo, ver o importante Ac. do STJ de 27/05/2009, relatado por Raul Borges, in www.gde.mj.pt, Proc. 09P0484, …
[23] Simas Santos/Leal-Henriques, in “Recursos em Processo Penal”, 7ª edição, 2008, p. 75.
[24] Luís Lemos Triunfante, in “Comentário Judiciário do CPP”, Tomo V, Almedina, 2024, a pág. 196.
[25] Cf. Ac. 7/95 do STJ, de 19/10/1995, relatado por Sá Nogueira, in DR 1ª Série A, de 28/12/1995, que fixou jurisprudência no sentido de que é oficioso o conhecimento, pelo tribunal de recurso, dos vícios indicados no art.º 410.º/2 CPP, nos seguintes termos: “É oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito.”.
[26] Assim, o acórdão do STJ de 19/12/1990, proc. 413271/3.ª Secção, in BMJ 402, pág. 232, do qual citamos: " I - Como resulta expressis verbis do art. 410.° do C.P.Penal, os vícios nele referidos têm que resultar da própria decisão recorrida, na sua globalidade, mas sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos, designadamente declarações ou depoimentos exarados no processo durante o inquérito ou a instrução ou até mesmo no julgamento (...). IV É portanto inoperante alegar o que os declarantes afirmaram no inquérito, na instrução ou no julgamento em motivação de recursos interpostos".
No sentido da constitucionalidade deste entendimento, cf. o acórdão do TC n.º 573/98, relatado por Messias Bento, que decidiu, para além do mais, nos seguintes termos: “... (a). não julgar inconstitucionais as normas resultantes da conjugação do artigo 433º do Código de Processo Penal com o corpo do n.º 2 do artigo 410º do mesmo Código, na medida em que limitam os fundamentos do recurso a que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum ...”.
[27] Jorge de Figueiredo Dias, in “Comentário Conimbricense do Código Penal - Parte Especial — Tomo 1”, pág.. 32 e 33.
[28] Acórdão do STJ de 27/05/2010, relatado por Santos Cabral, in www.gde.mj.pt, processo 58/08.4JAGRD.C1.S1.
[29] Nesse sentido, cf. Acórdão do STJ de 27/05/2010, relatado por Souto de Moura, in www.gde.mj.pt, processo 517/08.9JACBR.C1.S1, de cujo sumário citamos: “ …XII - Quanto à qualificativa da al. e) do n.º 2 deste dispositivo, para se avaliar se um motivo é fútil tem de se relacionar a gravidade do comportamento com o móbil do crime. E então, se nenhum motivo justifica causar a morte de outrem (daí ser crime), a grande desproporção entre o que se elege como motivo da acção e aquilo em que esta se analisa, transforma a conduta, não só em algo intolerável, como também em algo absurdo, sem explicação, à luz das concepções éticas correntes, da sociedade. A razão do cometimento do crime tem um valor irrisório para o normal dos cidadãos, comparado com o mal que se provoca com este. XIII - Não se verifica esta qualificativa quando o que esteve por detrás da conduta altamente censurável do arguido foi a sua revolta, perante a nova situação para-conjugal da ex-mulher, que se propusera conviver com o novo companheiro e com os filhos do arguido, e na casa que foi a sua. Esta conduta revela baixeza de carácter. No entanto, se o homicídio por motivo fútil pressupõe sempre baixeza de carácter, esta pode muito bem revelar-se noutro contexto, que não o da acção por motivo fútil. …” (sublinhado nosso).
[30] A este propósito veja-se a notícia dada no acórdão do STJ de 05/05/2010, relatado por Armindo Monteiro, in www.gde.mj.pt, processo 90/08.8CCNT.C1: “…De sublinhar que o que torna privilegiado o homicídio é , desde logo , a emoção violenta , que as circunstâncias do caso tornam compreensível .
A emoção é compreensível , afirmam alguns autores , quando o acto de resposta do agente é dominado por sentido de justiça , outros autores sublinham que não basta que a emoção seja justificada , psicologicamente , de um ponto de vista subjectivo , antes devendo sê-lo também objectivamente , de acordo com circunstâncias exteriores , apresentando-se ao autor o facto da vítima como algo de injusto e não ter como causa motivos egoístas ou moralmente baixos
Os tribunais suíços têm aderido a esta concepção ético-objectiva; mas já a jurisprudência austríaca intenta a concretização da compreensibilidade da emoção pelo recurso aos elementos que definem o conceito de culpa , própria, do “ homem normal “ ou seja “ ligado aos valores do direito “ , aproximando-a da “ compreensibilidade geral “ –cfr. Homicídio Privilegiado , Amadeu Ferreira , pág. 51-52 .
O art.º 133 .º do nosso CP consigna que o fundamento e a razão de ser do privilégio é a diminuição sensível da culpa , o que afasta o tipo incriminatório de uma concepção objectiva procurando o fundamento numa espécie de compensação entre as violências do provocador e a resposta do provocado, concepção que tem contra si o facto de nunca poder existir “ proporcionalidade “ entre uma qualquer emoção e a morte dolosa de outra pessoa” –cfr. Comentário Conimbricense do Código Penal , Prof. Figueiredo Dias , pág. 51
Entre nós o homicídio privilegiado, na sua forma de comissão sob o signo de compreensível emoção violenta, assume o sentido de reacção que o homem médio colocado na situação concreta podia representar, ou seja cair em tal estado de ânimo, sendo sensível ao “ conflito espiritual “ que foi criado ao agente
A figura do homicídio privilegiado, doutrina o Prof. Figueiredo Dias, consagra, ao cabo e ao resto, uma cláusula de exigibilidade diminuída quanto ao facto praticado pelo agente, quer dizer, a diminuição da culpa deste não pode ficar a dever-se nem a uma imputabilidade diminuída, nem a uma diminuída consciência do ilícito, mas unicamente a uma exigibilidade diminuída de comportamento diferente, implicando a verificação de um estado de afecto no agente , operando sobre a culpa ao nível da exigibilidade (“Comentário Conimbricense do Código Penal” e tomo I citado, pág. 47).
Tal como sempre sucede com a ideia de exigibilidade como componente da culpa jurídico-penal, o efeito diminuidor da culpa ficar-se-á a dever ao reconhecimento de que, naquela situação (endógena e exógena), também o agente normalmente fiel ao direito, conformado com a ordem jurídico-penal, teria sido sensível àquele conflito opor ele afectado na sua decisão, no sentido de lhe ter sido estorvado o normal cumprimento das suas intenções- Prof. Jorge de Figueiredo Dias, op.cit , I , 48 .
Esse estado deve ser iluminado, pois, por um juízo de culpa, sensivelmente diminuída, aferido a partir de um critério objectivo de compreensão; é preciso que o homem médio possa rever-se e aceitar a situação, aproximando-se o art.º 133.º, de forma patente do art.º 134.º, 3, do Projecto do CP alemão, – cfr. Prof. Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense do Código Penal, I, anotação 36, Teresa Quintela de Brito, Liber Discipulorum, 911, Fernando Silva; Direito Penal , Parte Especial , 2008 , 103 e Paulo Pinto de Albuquerque , in Comentário ao Código Penal , 357 .
A emoção violenta tem que nascer de circunstâncias estranhas ou exógenas à pessoa do agente, criando depois, a um prudente observador externo, a normal e ponderada convicção de que aquelas mesmas circunstâncias exógenas fizeram diminuir (mas não desaparecer), de forma sensível, a exigibilidade de um comportamento conforme aos ditames do direito por parte do agente (a propósito, cfr. Dra. Teresa Quintela de Brito, “Homicídio privilegiado: algumas notas”, in “Liber Discipulorum para Jorge de Figueiredo Dias”, Coimbra, 2003, págs. 905 e 906).
Já para Amadeu Ferreira, op ci ., a compreensível emoção violenta , in op. cit . pág. 63 , repercute um estado psicológico que não corresponde ao normal do agente , afectando-lhe a inteligência e a vontade , bem como as resistências éticas , a sua capacidade para se conformar com a norma ; há uma excitação de molde a obscurecer-lhe a inteligência e arrebatar-lhe a vontade.
No plano doutrinário e sobre a invocação do desespero , outro dos invocados fundamentos do homicídio privilegiado, aquele é concebido como fruto de uma situação que se arrasta no tempo , com origem em pequenos ou grandes conflitos , que acabam por levar o agente a considerar-se numa situação sem saída , deixando de acreditar , de ter esperança , tudo limitando a opção psicológica do agente desesperado, nele se englobando os casos de suicídios alargados ou de humilhações reiteradas , com origem , sobretudo , em estados de afecto ligados à angústia, depressão ou revolta , não se tornando exigível que tais estados de afecto sejam compreensíveis .
A saída está no suicídio ou morte do agente, na óptica do agente desesperado –cfr. Amadeu Ferreira , op . cit ., pág. 69 –não se anteolhando à pessoa do agente alternativa de menor alcance , depois de longa reflexão
De consignar que o ciúme não tem merecido da parte deste STJ uma atitude privilegiante , como regra , da responsabilidade penal do agente, porque como se escreveu , lapidarmente , no seu Ac. de 29.4.2009 , P.º n.º 437/07.OPAMAI.S 1, ele é inconciliável com o respeito pela autonomia individual e de livre escolha de projecto pessoal pela pessoa .
Em via de regra, por puro egoísmo, o agente por ciúme não se autodemarca, ultrapassando-o, do sentimento exclusivo de posse da pessoa sua vítima, incapaz como é de sobrepor o seu ressentimento pessoal face ao risco iminente de perda.
Por isso já se tem até configurado como motivo fútil por traduzir uma reacção desproporcionada relativamente à gravidade da acção penal, não podendo razoavelmente explicar, à luz da consciência do homem médio, um ataque tão forte à vida da pessoa, sem ser motivo que o legitime ou esbata segundo as concepções sociais, morais e económicas reinantes, que o condenam, sem o desculpabilizarem -o -cfr. Acs . deste STJ , de 15.12.2005 , P.º 05P2978 e de 26.11.2008 , P.08P3706 e , ainda , Teresa Serra , in Homicídio qualificado , pág. 75.
No crime passional o agente age consciente e voluntariamente dominado como está pela ideia de a morte da vítima ser para ele a contrapartida, pela negativa, de a não poder ter para si; a morte é a consequência mais lógica e razoável da frustração do sentimento de posse que, próximo do definitivo , enraizara . …”.
[31] Maia Gonçalves, in “CP Anot.”, ed. Almedina, 11ª Ed., 1997, a p. 243, afirma mesmo “… que o recurso às penas privativas da liberdade só será legítimo quando, dadas as circunstâncias se não mostrem adequadas as sanções não detentivas …”.
[32] Sobre o tema, cf. também o acórdão da RE de 03/06/2013, relatado por Fernando Monterroso, no processo 39/13.6GBAVV.G1, in www.dgsi.pt, do qual citamos: “…Na economia do nosso Direito Penal a pena de multa não é uma pena “menor” relativamente à pena de prisão. Na “escolha” da pena, quando ao crime for aplicável, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal opta, por uma ou outra, fundamentando-se unicamente em considerações de prevenção geral e especial. Isso decorre inequivocamente da norma do art. 70 do Cod. Penal, que refere as «finalidades da punição». Estas, como é hoje genericamente aceite, são exclusivamente de prevenção, geral e especial – cfr. Prof. Figueiredo Dias, Temas Básicos da Doutrina Penal, pág.. 110. …”.
[33] Robalo Cordeiro, in “Escolha e medida da pena”, Jornadas de Direito Criminal, C.E.J., pág. 238.
[34] Neste sentido, ver Jorge de Figueiredo Dias, ainda in “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Aequitas/Editorial Notícias, 1993, p. 331.
[35] Entendemos que, nesta matéria, tem plena aplicação aos tribunais de 2ª instância a jurisprudência exposta, relativa à intervenção do STJ na determinação concreta das penas, no Ac. do mesmo Tribunal de 27/05/2009, relatado por Raul Borges, Proc. 09P0484, in www.dgsi.pt, que passamos a citar: “… A intervenção do Supremo Tribunal de Justiça em sede de concretização da medida da pena, ou melhor, do controle da proporcionalidade no respeitante à fixação concreta da pena, tem de ser necessariamente parcimoniosa, porque não ilimitada, sendo entendido de forma uniforme e reiterada que “no recurso de revista pode sindicar-se a decisão de determinação da medida da pena, quer quanto à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, quer quanto à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, ou a desproporção da quantificação efectuada”- cfr. acórdãos de 09-11-2000, processo nº 2693/00-5ª; de 23-11-2000, processo nº 2766/00 - 5ª; de 30-11-2000, processo nº 2808/00 - 5ª; de 28-06-2001, processos nºs 1674/01-5ª, 1169/01-5ª e 1552/01-5ª; de 30-08-2001, processo nº 2806/01 - 5ª; de 15-11-2001, processo nº 2622/01 - 5ª; de 06-12-2001, processo nº 3340/01 - 5ª; de 17-01-2002, processo 2132/01-5ª; de 09-05-2002, processo nº 628/02-5ª, CJSTJ 2002, tomo 2, pág. 193; de 16-05-2002, processo nº 585/02 - 5ª; de 23-05-2002, processo nº 1205/02 - 5ª; de 26-09-2002, processo nº 2360/02 - 5ª; de 14-11-2002, processo nº 3316/02 - 5ª; de 30-10-2003, CJSTJ 2003, tomo 3, pág. 208; de 11-12-2003, processo nº 3399/03 - 5ª; de 04-03-2004, processo nº 456/04 - 5ª, in CJSTJ 2004, tomo1, pág. 220; de 11-11-2004, processo nº 3182/04 - 5ª; de 23-06-2005, processo nº 2047/05 -5ª; de 12-07-2005, processo nº 2521/05 - 5ª; de 03-11-2005, processo nº 2993/05 - 5ª; de 07-12-2005 e de 15-12-2005, CJSTJ 2005, tomo 3, págs. 229 e 235; de 29-03-2006, CJSTJ 2006, tomo 1, pág. 225; de 15-11-2006, processo n.º 2555/06 - 3ª; de 14-02-2007, processo n.º 249/07 - 3ª; de 08-03-2007, processo n.º 4590/06 - 5ª; de 12-04-2007, processo n.º 1228/07 - 5ª; de 19-04-2007, processo n.º 445/07 - 5ª; de 10-05-2007, processo n.º 1500/07 - 5ª; de 04-07-2007, processo n.º 1775/07 - 3ª; de 17-10-2007, processo n.º 3321/07 - 3ª; de 10-01-2008, processo n.º 907/07 - 5ª; de 16-01-2008, processo n.º 4571/07 - 3ª; de 20-02-2008, processos n.ºs 4639/07 - 3ª e 4832/07-3ª; de 05-03-2008, processo n.º 437/08 - 3ª; de 02-04-2008, processo n.º 4730/07 - 3ª; de 03-04-2008, processo n.º 3228/07 - 5ª; de 09-04-2008, processo n.º 1491/07 - 5ª e processo n.º 999/08-3ª; de 17-04-2008, processos n.ºs 677/08 e 1013/08, ambos desta secção; de 30-04-2008, processo n.º 4723/07 - 3ª; de 21-05-2008, processos n.ºs 414/08 e 1224/08, da 5ª secção; de 29-05-2008, processo n.º 1001/08 - 5ª; de 15-07-2008, processo n.º 818/08 - 5.ª; de 03-09-2008 no processo n.º 3982/07-3ª; de 10-09-2008, processo n.º 2506/08 - 3ª; de 08-10-2008, nos processos n.ºs 2878/08, 3068/08 e 3174/08, todos da 3ª secção; de 15-10-2008, processo n.º 1964/08 - 3ª; de 22-10-2008, processo n.º 215/08-3ª … .”.
[36] “... As penas aplicáveis a crimes cometidos com arma são agravadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo, excepto se o porte ou uso de arma for elemento do respectivo tipo de crime ou a lei já previr agravação mais elevada para o crime, em função do uso ou porte de arma.  ...”.

[37] A este respeito, porque sintetiza e expõe de forma exemplar a doutrina e a jurisprudência dominantes quanto à determinação das medidas das penas, citamos o Ac. do STJ de 09/12/1998, relatado por Leonardo Dias, in BMJ 482/77: “Do nosso ponto de vista deve entender-se que, sempre e tanto quanto for possível, sem prejuízo da prevenção especial positiva e, sempre, com o limite imposto pelo princípio da culpa – nulla poena sine culpa – a função primordial da pena consiste na protecção de bens jurídicos, ou seja, consiste na prevenção dos comportamentos danosos dos bens jurídicos.

Quanto à determinação da medida da pena, cf. também o Ac. do STJ de 09/03/2006, relatado por Arménio Sottomayor, in CJSTJ, tomo I, pp. 212 e ss..

Ver ainda o Ac. do STJ de 29/05/2008, processo 08P1145, in www.dgsi.pt, relatado por Souto de Moura, …
[38] A este propósito escreve Jorge de Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Aequitas/Editorial Notícias, 1993, págs. 290 a 292:
[39] E, como se disse no sumário do acórdão do STJ de 27/02/2013, relatado por Henriques Gaspar, no proc. 455/08.5GDPTM, in www.gde.mj.pt,: …