Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | JOSÉ EDUARDO MARTINS | ||
Descritores: | COMPETÊNCIA MATERIAL TRIBUNAL DE EXECUÇÃO DAS PENAS TRIBUNAL DA CONDENAÇÃO MANDADOS DE DETENÇÃO PARA CUMPRIMENTO DE PENA DE PRISÃO | ||
Data do Acordão: | 11/29/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - LEIRIA - JC CRIMINAL - JUIZ 2 | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO CRIMINAL | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Legislação Nacional: | ARTS. 17.º, 97.º, N.º 2, 138.º, N.º 4, ALS. T) E X), DO CÓDIGO DA EXECUÇÃO DAS PENAS E MEDIDAS PRIVATIVAS DA LIBERDADE (CEPMPL), E ART. 337.º, N.º 1, DO CPP | ||
Sumário: | Pertence ao tribunal da condenação, não ao TEP, a emissão de mandados de detenção visando o cumprimento, pelo condenado, de pena de prisão, imposta por sentença transitada em julgado. | ||
Decisão Texto Integral: |
Acordam, em conferência, os Juízes da 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra:
A - Relatório: 1. No âmbito do Processo Comum (Tribunal Coletivo) n.º 536/15.9GCLRA, da Comarca de Leiria, Juízo Central Criminal de Leiria – J2, em 16/6/2017, foi proferido o seguinte Despacho: “O arguido A... encontra-se em liberdade, embora em fuga à medida de coação de obrigação de permanência na habitação mediante vigilância eletrónica que lhe foi imposta. Assim, quanto a este arguido, desde já se declara, nos termos do disposto no artigo 138.º, n.ºs 2 e 4, alínea t), do Código de Execução de Penas e medidas privativas da Liberdade, o Juízo Central Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, e, portanto, os presentes autos, materialmenete incompetente para proceder à emissão dos mandados de detenção do arguido, a fim de o mesmo cumprir a pena em que foi condenado, mais declarando competente para o efeito o Tribunal de Execução de Penas de Coimbra. * Foram emitidos mandados de detenção relativamente ao arguido A... , uma vez que o mesmo se eximiu à medida de coação de obrigação de permanência na habitação mediante vigilância eletrónica que lhe foi imposta. Mostrando-se transitada a decisão condenatória, solicite a devolução de todos os mandados de detenção/captura emitidos contra este arguido respeitantes à medida de coação, aguardando-se que o Tribunal de Execução de Penas de Coimbra emita os competentes mandados de denção/captura para cumprimento da pena que foi imposta a este arguido. * Igualmente solicite ao Tribunal de Execução de Penas de Coimbra que informe se, em cumprimento do disposto no n.º 2, do artigo 97.º, do CEPMPL, vai iniciar os procedimentos para a declaração de contumácia do arguido A... , uma vez que o mesmo se encontra com paradeiro desconhecido, eximindo-se, assim, ao cumprimento da pena de cinco anos e seis meses de prisão efetiva que lhe foi imposta no presente processo.” **** 2. Inconformado com tal Despacho, dele recorreu o Ministério Público, em 4/7/2017, extraindo da motivação as seguintes conclusões: 1ª – Vem o presente recurso interposto pelo Ministério Público do douto despacho de fls. 2023 e 2023v., no qual se declarou materialmente incompetente o Juízo Central Criminal da Comarca de Leiria e competente o Tribunal de Execução das Penas de Coimbra para proceder à emissão dos mandados de detenção do arguido A... a fim de cumprir a pena de prisão em que foi condenado. 2ª -- Do cotejo das dispões legais conjugadas dos artigos 467º, nº 1, 470º, nº 1, 477º, nºs. 2 e 4, todos do Código de Processo Penal e 138º, nº 2, do Código de Execução de Penas e Medidas Privativas da Liberdade, resulta que: a) Se “as decisões penais condenatórias transitada em julgado têm força executiva”; b) Se a “execução da pena corre nos próprios Autos perante o Tribunal de 1ª Instância em que processo”; c) Se a alteração legislativa efectuada ao disposto no artigo 477º, nºs. 2 e 4, do Código de Processo Penal manteve intocáveis as competências do Ministério Público junto do Tribunal da condenação para proceder ao cômputo da pena, o qual deverá ser objecto de homologação pelo Juiz; d) Se compete ao Tribunal de Execução das Penas, para além do mais, “acompanhar a execução das penas”, 3ª -- Impõe-se concluir que tudo pressupõe que o condenado se encontre em efectivo cumprimento de pena, pois sem a detenção e subsequente sujeição a reclusão do condenado, mostrar-se-á impossível proceder ao cômputo da pena em que este foi condenado, nos termos do disposto no artigo 477º, nºs. 2 e 4, do Código de Processo Penal. 4ª -- Ao decidir como doutamente se decidiu no douto despacho a quo nele foi violado o disposto nos artigos 467º, nº 1, 470º, nº 1, 477º, nºs. 2 e 4, todos do Código de Processo Penal e o disposto no artigo 138º, nº 2, do Código de Execução de Penas e Medidas Privativas da Liberdade, razão pela qual deverá ser revogado e mandado substituir por outro no qual se ordene a emissão de mandados de captura do arguido a fim de o mesmo dar início ao cumprimento da pena de prisão em que foi condenado. **** 3. O recurso, em 13/772017, foi admitido. **** 4. O arguido não apresentou resposta ao recurso. **** 5. Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, em 18/10/2017, no sentido de ser concedido provimento ao recurso. **** 6. Cumpriu-se o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, não tendo o arguido usado do direito de resposta. **** 7. Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos, teve lugar conferência, cumprindo apreciar e decidir. **** III. Apreciação do Recurso: São só as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões, da respetiva motivação, que o tribunal ad quem tem de apreciar – artigo 403.º, n.º 1 e 412.º, n.º1 e n.º2, ambos do C.P.P. A questão a conhecer é a seguinte: - Saber se a emissão de mandados de captura para cumprimento de pena é da competência do Tribunal da condenação ou do Tribunal de Execução de Penas. **** Esta questão, como bem refere o Digníssimo Procurador-Geral Adjunto, a fls. 67, “não tem sido pacífica após a publicação do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade”. Isso mesmo resulta da Decisão proferida no dia 29/3/2017, em sede de conflito de competência, pelo Exmo. Presidente desta 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra, no Processo 92/15.8PTLRA-A.C1, in www.dgsi.pt, na qual pode ser lido o seguinte: “(…). Reconhecendo o melindre jurídico da vexata quaestio, tenho como mais conforme à teleologia do CEPMPL a segunda das duas enunciadas posições. O artigo 138.º, n.º 2, do CEPMLP, delimita a competência do TEP, situando-a impressivamente nos domínios do acompanhamento e fiscalização da pena de prisão, e bem assim da modificação, substituição e extinção, da mesma, tudo sem prejuízo do disposto no artigo 371.º-A do CPP, norma esta que, perante a entrada em vigor de lei mais favorável, faculta ao condenado a reabertura da audiência de modo a possibilitar a aplicação do novo regime substantivo penal. Mas as normas já citadas, e outras inclusas no CEPMPL ou na lei adjectiva penal, não definem expressamente o tribunal a quem compete, no concreto caso, a emissão dos mandados de detenção. Afigura-se-me, contudo, que, por determinismo sistemático e racional, os mandados de detenção, captura ou libertação inscritos na esfera de competência do TEP, previstos nos artigos 17.º, als. a) e b) e c), 23.º e 138.º, n.º 4, al. t), do CMPMPL, são decorrência funcional dos actos cuja prática - cfr. artigo 138.º referido, n.ºs 1, 2 e 4 – está legalmente atribuída àquele tribunal. Dito por outras palavras, compete ao TEP emitir mandados de detenção, captura ou libertação, quando os mesmos se destinem a cumprir/executar decisões que lhe caiba proferir. Reproduzindo certa passagem contida na resposta apresentada, no âmbito do presente conflito, pelo Sr.ª Juíza do TEP: «previu o legislador, em consonância quer com o disposto no art. 478.º, quer com o estatuído no art. 138.º, n.º 4, al. t), que a detenção pode ter lugar por competência própria de diversos tribunais, em função da competência material do tribunal que proferiu a decisão». Assim, a título meramente exemplificativo, ao TEP competente emitir mandado de detenção visando a comparência de um libertado condicionalmente a certo acto processual, emitir mandados destinados à captura de recluso que se tenha ausentado ilegitimamente de Estabelecimento Prisional, e também emitir mandados de detenção consequenciais de contumácia declarada ao abrigo do artigo 138.º, n.º 4, alínea x, mas não, por conseguinte, como na situação génese deste conflito, proceder à emissão de mandados de detenção destinados a cumprimento de pena de prisão imposta por sentença transitada em julgado. (…). Em síntese conclusiva, os elementos interpretativos, de ordem literal e sistemática, projectam a teleologia das normas consideradas no sentido de a emissão de mandados de detenção contra condenado em pena de prisão, por sentença com trânsito em julgado, pertencer ao Tribunal da condenação” – no mesmo sentido, ver recente Acórdão desta 5ª Secção Criminal, de 18/10/2017, Processo n.º 3466/11.0TALRA-A.C1, relatado pela Exma. Desembargadora Elisa Sales, in www.dgsi.pt. Acompanhamos a orientação exposta. Entendemos que, estando em causa uma pena privativa da liberdade, compete ao Tribunal de Execução de Penas acompanhar e fiscalizar a sua execução e decidir sobre a sua modificação, substituição e extinção. Todavia, salvo o devido respeito pela posição defendida no despacho recorrido, após o trânsito em julgado da decisão, estando o condenado em liberdade, uma vez que ainda não é possível de falar em execução da pena, compete ao tribunal da condenação ordenar a sua detenção e, consequentemente, homologar o cômputo da pena que o Ministério Público apresentar. **** C - Decisão: Face ao exposto, acordam os juízes da 5ª secção criminal deste Tribunal da Relação conceder provimento ao recurso, revogando-se, em consequência, o despacho recorrido que deverá ser substituído por outro que ordene a emissão de mandados de detenção do arguido A... para cumprimento da pena em que foi condenado. Sem tributação. **** (Texto processado e integralmente revisto pelo relator) Coimbra, 29 de novembro de 2017
(José Eduardo Martins – relator)
(Maria José Nogueira – adjunta)
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