Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | CÂNDIDA MARTINHO | ||
Descritores: | RECURSO DA DECISÃO QUE APLICOU AS MEDIDAS DE COACÇÃO NOVA DECISÃO SOBRE AS MEDIDAS DE COACÇÃO POSTERIOR AO RECURSO CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO VALORAÇÃO DE PROVA CONSTANTE DO PROCESSO NÃO INDICADA NA ACUSAÇÃO NEM NO DESPACHO DE PRONÚNCIA GRAVAÇÃO FEITA E/OU JUNTA AOS AUTOS SEM CONHECIMENTO E/OU SEM AUTORIZAÇÃO DO ARGUIDO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO CRIME DE GRAVAÇÕES ILÍCITAS REGIME DE PROVA REGRAS DE CONDUTA | ||
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Data do Acordão: | 07/14/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE PENICHE | ||
Texto Integral: | N | ||
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Meio Processual: | RECURSO DECIDIDO EM CONFERÊNCIA | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 51.º, 52.º, 58.º E 152.º DO CÓDIGO PENAL ARTIGOS 355.º, N.º 1, E 375.º, N.º 4, DO C.P.P. | ||
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Sumário: | I - Não é de conhecer o segmento do recurso interposto da sentença em que o condenado recorre da decisão sobre o seu estatuto coactivo, reapreciado ao abrigo do n.º 4 do artigo 375.º do C.P.P., se ele, posteriormente à decisão, requereu a alteração/revogação do estatuto coactivo ali decidido, provocando, por sua iniciativa, nova decisão sobre a matéria.
II - Não é proibida a junção ao processo, por parte da vítima e sem consentimento do arguido, de gravação áudio feita pelo arguido de uma conversa havida entre ambos, sem o consentimento e conhecimento daquela, destinada a fazer prova de actos de violência doméstica imputados ao arguido, pois a protecção da privacidade invocada pelo arguido acaba quando aquilo que se protege constitui crime. III - Do mesmo modo não é proibida a junção aos autos da tradução de tal gravação. IV - Tendo estes meios de prova sido juntos na fase de inquérito e tendo sido dados a conhecer ao arguido, a circunstância de não constarem expressamente do elenco dos meios probatórios indicados nem na acusação pública, nem da decisão instrutória, não é impeditiva da sua valoração em sede de decisão final, pois tal não configura qualquer comprometimento das garantias de defesa do arguido, designadamente do princípio do contraditório. V - Também não é impeditivo o facto daqueles meios de prova não terem sido objecto de exame no decurso da audiência. VI - Não configura a prática de um crime a gravação vídeo ou áudio feita pela vítima, mesmo sem o consentimento do arguido, destinada a demonstrar factos com relevância criminal, já que a autora da gravação actua ao abrigo de uma causa de exclusão da ilicitude, particularmente quanto a prova dos factos pode ser particularmente difícil. VII - O regime de prova e as regras de conduta que podem condicionar a suspensão da execução da pena de prisão, tendo de respeitar o princípio da razoabilidade, não têm de restringir-se ao que é confortável ao arguido, isto é, àquilo que ele pode cumprir sem sacrifício. | ||
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Decisão Texto Integral: |
Acordam, em conferência, os juízes da 4ª secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.
I.Relatório
Nestes autos de processo comum, …, foi proferida sentença em 18/12/2024, na qual se decidiu, para além do mais, conforme respetivo dipositivo, o seguinte: “A. Absolver o arguido J… da prática de 1 (um) crime Ofensa à Integridade Física Qualificada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 143º, n.º 1, 145º, n.º 1, al. a) e 132º, n.º 2, al. l), todos do C. Penal (na pessoa do Militar da GNR AA); B. Condenar o Arguido J… pela prática, em autoria material e na forma consumada, de 1 (um) crime de Ofensa à Integridade Física (na pessoa da ofendida BB), p. e p. pelos artigos 143.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de 7,00€ (seis euros), o que perfaz a quantia global de € 560,00 (quinhentos e sessenta euros); C. Condenar o Arguido J…, pela prática, em autoria material, na forma consumada, de 1 (um) crime de Violência Doméstica Agravado, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, al. a) do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão; D. Suspender a execução da pena de prisão identificada em C), por igual período [2 (dois) anos e 10 (dez) meses], subordinando tal suspensão a: a) regime de prova, assente num plano de reinserção social a elaborar e acompanhar pela DGRSP, (i) orientado para eventuais dificuldades do Arguido no que concerne à gestão da impulsividade e controlo das emoções activadoras da mesma, e (ii) que contemple de frequência do Programa para Agressores de Violência Doméstica (PAVD); e b) Regra de conduta de sujeição do arguido a avaliação médica para apreciação das referidas problemáticas e da saúde mental, com eventual sujeição do mesmo ao respectivo acompanhamento psicológico ou tratamento psiquiátrico, caso seja indicado como necessário. E. Condenar o Arguido J… na pena acessória de proibição de contacto com a P… (por qualquer meio, físico ou telemático), bem como de permanecer na sua residência e local de trabalho, pelo período de 3 (três) anos; F. Condenar o Arguido J… na pena acessória de proibição de uso e porte de armas, pelo período de 3 (três) anos; G. Arbitrar oficiosamente a indemnização de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) a favor da vítima P… condenando o Arguido J… no respectivo pagamento”.
2. Não se conformando com o decidido, veio o arguido interpor o presente recurso, extraindo da sua motivação as seguintes conclusões (transcrição): 1. OPRESENTE RECURSO É INTERPOSTO DA DOUTA SENTENÇA DO TRIBUNAL A QUO NA PARTE EM QUE CONDENA O ARGUIDO PELA PRÁTICA, EM AUTORIA MATERIAL E NA FORMA CONSUMADA, DE UM CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA AGRAVADA (ART.º 152.º N.º 1 AL. A) CP) E DE UM CRIME DE OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA SIMPLES (ART.º 143.º N.º 1 CP), E QUANTO AO REGIME DE PROVA E REGRAS DE CONDUTA A QUE SE SUBORDINARAM A SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DE PENA DE PRISÃO, ÀS PENAS ACESSÓRIAS, E À INDEMNIZAÇÃO ARBITRADA OFICIOSAMENTE. DA NULIDADE POR DESCONEXÃO ABSOLUTA ENTRE A DECISÃO E OS AUTOS 2. … 3. … 4. IN CASU, A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA, POR PADECER DE NOTÓRIO DESVIO E MANIFESTA FALTA DE CORRESPONDÊNCIA COM OS PRESENTES AUTOS, FALHA ESSA SUA FUNÇÃO E É POR ISSO NULA, NÃO PODENDO PRODUZIR EFEITOS. 5. APÓS A FUNDAMENTAÇÃO, NA PÁG. 43 DA DOUTA SENTENÇA ESCREVE-SE “TUDO SOPESADO, O TRIBUNAL ENTENDE POR ADEQUADO APLICAR AO ARGUIDO R… (…)”,SENDO QUE O ARGUIDO ORA RECORRENTE SE CHAMA J… 6. NA PÁG. 56 DA DOUTA SENTENÇA PODE LER-SE “(E CONSEQUENTE MANUTENÇÃO DA APREENSÃO DAS ARMAS QUE FORAM APREENDIDAS AO MESMO (…)”, PORÉM QUE NOS PRESENTES AUTOS NUNCA FORAM APREENDIDAS QUAISQUER ARMAS, E MUITO MENOS AO ARGUIDO,NUNCA EM MOMENTO ALGUM SE DISCUTIU OU ABORDOU QUALQUER ARMA. 7. NA PÁG. 13 ESCREVE-SE QUE “(…) E EM SEDE DE PRIMEIRO INTERROGATÓRIO DE ARGUIDO DETIDO, TENDO SIDO REPRODUZIDA, EM SEDE DE AUDIÊNCIA DE DISCUSSÃO E JULGAMENTO, A GRAVAÇÃO DESSA MESMA DILIGÊNCIA (…)”, O QUE NA VERDADE E AO LONGO DAS CINCO SESSÕES DA AUDIÊNCIA,NUNCA OCORREU. 8. NA PÁG.48ESCREVE-SE AINDA QUE O ARGUIDO “TENTOU CONTACTAR A ASSISTENTE, INJURIOU-A NA RUA E PERSEGUIU”,O QUE TAMBÉM NÃO TEM MÍNIMA CORRESPONDÊNCIA COM OS PRESENTES AUTOS,ONDE NEM A OFENDIDA É ASSISTENTE NEM ESTIVERAM AQUI ALGUMA VEZ EM CAUSA INJÚRIAS NA RUA OU PERSEGUIÇÕES. 9. COMO SE NÃO BASTASSEM TAIS REFERÊNCIAS FALSAS E ABSOLUTAMENTE DESGARRADAS DOS PRESENTES AUTOS,VEM AINDA A SUJEITAR-SE O ARGUIDO A “REGIME DE PROVA, ASSENTE NUM PLANO DE REINSERÇÃO SOCIAL (…) ORIENTADO PARA EVENTUAIS DIFICULDADES DO ARGUIDO NO QUE CONCERNE À GESTÃO DA IMPULSIVIDADE E CONTROLO DAS EMOÇÕES ACTIVADORAS DA MESMA (…)”,A “AVALIAÇÃO MÉDICA PARA APRECIAÇÃO DAS REFERIDAS PROBLEMÁTICAS E DA SAÚDE MENTAL” E À PENA ACESSÓRIA DE PROIBIÇÃO DE USO E PORTE DE ARMAS,TUDO O QUE SÃO QUESTÕES E“PROBLEMÁTICAS” QUE NUNCA FORAM ABORDADAS NOS PRESENTES AUTOS,ONDE NUNCA ESTIVERAM EM CAUSA E QUE NÃO SE COLOCAM SEQUER. 10. NUNCA ESTEVE AQUI EM CAUSA O USO DE ARMAS,NEM A SAÚDE MENTAL,NEM QUALQUER IMPULSIVIDADE OU DIFICULDADE NA SUA GESTÃO. 11. NO CASO DESTES AUTOS, ESTAS “QUESTÕES” NÃO SÃO APENAS NOVAS E ABORDADAS PELA PRIMEIRA VEZ NA DOUTA SENTENÇA, MAS PROFUNDAMENTE ALIENÍGENAS, DESGARRADAS E ALHEIAS FACE AO CASO SUB JUDICE E AO AQUI ARGUIDO. 12. PESE EMBORA SE DESCONHEÇA QUEM SERÁ O “R…” OU POR QUE RAZÃO TERÁ SIDO CONDENADO, CERTO É QUE O QUE SE DECIDE NA DOUTA SENTENÇA NÃO TEM O MÍNIMO DE CORRESPONDÊNCIA COM OS PRESENTES AUTOS, … 13. … 14. SALVO MELHOR OPINIÃO, POR TUDO O SUPRA A DOUTA SENTENÇA É NULA, NÃO TER QUALQUER CORRESPONDÊNCIA COM OS PRESENTES AUTOS,NÃO CUMPRINDO A SUA FUNÇÃO REALIZADORA DA JUSTIÇA E NÃO SENDO DEFENSÁVEL QUE POSSAM SER APLICADAS AO ARGUIDO PENAS, REGIMES DE PROVA OU REGRAS DE CONDUTA EVIDENTEMENTE RESPEITANTES A OUTRA PESSOA. DA NULIDADE POR VIOLAÇÃO DA GARANTIA DE DEFESA E DIREITO AO RECURSO 15. SEM PRESCINDIR, A DOUTA SENTENÇA É TAMBÉM NULA POR VIOLAÇÃO DAS GARANTIAS DE DEFESA E DIREITOS DO ARGUIDO (ARTS.º 30.º N.º 4, 32.º N.º 1, 47.º N.º 1 E 58.º TODOS DA CRP) E DAS CONDIÇÕES DE APLICAÇÃO E MANUTENÇÃO DE MEDIDAS DE COACÇÃO (ARTS.º 375.º N.º 4, 204.º N.º 1 E 212.º N.ºS 1 E 4TODOS DO CPP). 16. É QUE POR VIA DE UMA ILEGAL, INCOMPREENSÍVEL E INFUNDADA MANUTENÇÃO DA MEDIDA DE COACÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE PERMANÊNCIA EM TERRITÓRIO NACIONAL, O TRIBUNAL A QUO OBSTACULIZA OU LIMITA PELO MENOS O DIREITO DE O ARGUIDO VIR A RECORRER DA SENTENÇA,POIS FAZENDO-O NÃO LHE É DEVOLVIDA A POSSIBILIDADE DE SAIR DE PORTUGAL,O QUE TAMBÉM LHE COARCTA O DIREITO A EXERCER LIVREMENTE A SUA PROFISSÃO POR NATUREZA EXERCIDA FORA DE PORTUGAL,JÁ QUE É SKIPPER E TAMBÉM CONSTRÓI VELEIROS,OFENDENDO ALÉM DA SUA POSSIBILIDADE DE GANHO,ATÉ A SUA SAÚDE, ESTABILIDADE E BEM-ESTAR. 17. NA DOUTA SENTENÇA MANTÉM-SE AQUELA MEDIDA DE COACÇÃO ATÉ AO TRÂNSITO EM JULGADO POR SE ENTENDER QUE ATÉ ENTÃO AINDA SE VERIFICARÁ O PERIGO DE CONTINUIDADE DA ACTIVIDADE CRIMINOSA BEM COMO O DE UMA EVENTUAL RETALIAÇÃO, PESE EMBORA O TRIBUNAL NÃO EXPLIQUE POR QUE RAZÃO ASSIM ENTENDE, O QUE É GRAVE, INADMISSÍVEL E VIOLADOR DO DISPOSTO NO ART.º 194.º N.º 6 AL. D) CPP. 18. MAIS GRAVE É QUE NEM SEQUER SE COMPREENDA DE ONDE SURGE TAL SUPOSTO PERIGO DE CONTINUIDADE DA ACTIVIDADE CRIMINOSA OU EVENTUAL TENTATIVA DE RETALIAÇÃO, 35 POIS O PRÓPRIO TRIBUNAL TAMBÉM CONSIDEROU QUE O ARGUIDO VERBALIZOU EXPRESSAMENTE NÃO MAIS PRETENDER QUALQUER CONTACTO COM A OFENDIDA, INEXISTINDO QUALQUER RAZÃO OBJECTIVA OU INDÍCIO OU PROVA NOS AUTOS QUE POSSA REFUTAR OU DESACREDITAR TAL AFIRMAÇÃO. 19. E PIOR: TENDO O TRIBUNAL TAMBÉM DADO COMO PROVADO QUE O ARGUIDO PRETENDE RETOMAR A ACTIVIDADE PROFISSIONAL DE SKIPPER TENDO UMA OFERTA DE TRABALHO PARA INICIAR FUNÇÕES EM FEVEREIRO DE 2025 – PONTO 55 DOS FACTOS PROVADOS – E QUE A PERMANÊNCIA NA ZONA DE ... É FACTOR PREJUDICIAL À SUA ESTABILIDADE E FAVORECE RECAÍDAS – PONTO 59DOS FACTOS PROVADOS. 20. … 21. TUDO, PORTANTO, RECONDUZÍVEL À MANIFESTA DESNECESSIDADE DE MANTER O ARGUIDO PROIBIDO DE SE AUSENTAR DO PAÍS, POIS JÁ NÃO SE VERIFICA A NECESSIDADE DE ESPECIAL PROTECÇÃO DA OFENDIDA NEM QUALQUER “PERIGO DE CONTINUAÇÃO DA ACTIVIDADE CRIMINOSA”,TENDO FICADO ABSOLUTAMENTE CLARO O DEFINITIVO CORTE NA RELAÇÃO ENTRE AMBOS E A VONTADE DO ARGUIDO DE SE MANTER AFASTADO DA MESMA E DE REFAZER E RETOMAR A SUA VIDA COMO ELA ERA ANTES DE CONHECER A OFENDIDA, TUDO CLARA E REPETIDAMENTE MANIFESTADO PELO ARGUIDO. 22. POR OUTRO LADO, É MANIFESTAMENTE DESPROPORCIONAL E ATÉ PREJUDICIAL AQUELA MEDIDA, A QUAL SE REVELA PREJUDICIAL À ESTABILIDADE FINANCEIRA E EMOCIONAL, SAÚDE, BEM-ESTAR E SOBRIEDADE DOARGUIDOAO“PRENDER”OARGUIDO EM ..., ZONA ONDE ESTÁ MAIS PROPENSO A RECAÍDAS DE CONSUMOS DE ESTUPEFACIENTES, SENDO QUE TAMBÉM SE PROVOU (PONTO 53) QUE O ARGUIDO ESTEVE AUSENTE DE PORTUGAL NOS ÚLTIMOS 15 ANOS, EXERCENDO DIVERSAS ACTIVIDADES NÁUTICAS, PRINCIPALMENTE COMO SKIPPER. 23. TUDO O QUE SIGNIFICA, PORTANTO, QUE NÃO SÓ É NO ESTRANGEIRO QUE O ARGUIDO GANHA A VIDA COMO SKIPPER, MAS TAMBÉM QUE A PERMANÊNCIA EM PORTUGAL CONTRIBUI EM LARGA ESCALA PARA AS SUAS RECAÍDAS DE CONSUMOS DE ESTUPEFACIENTES, SENDO POR ISSO DE TODO ACONSELHÁVEL QUE POSSA SAIR DE PORTUGAL E DE ..., AFASTANDO-SE DE UM MEIO QUE RECONHECIDAMENTE LHE FACILITA A RECAÍDA, PREJUDICA A SOBRIEDADE E DISTÂNCIA DE DROGAS E IMPEDE QUE SE OCUPE NA SUA ACTIVIDADE PROFISSIONAL E O NORMAL E DESEJÁVEL ENQUADRAMENTO NUMA VIDA PRODUTIVA E SÃ. 24. MAIS ASSIM O PROIBINDO ATÉ DE PASSAR O NATAL EM CABO VERDE COM A FAMÍLIA, COMO É TRADIÇÃO,O QUE É MANIFESTAMENTE DESUMANO E INJUSTIFICÁVEL! 25. … 26. ALIÁS, SÓ SE PODERÁ EXPLICAR ESSA MANUTENÇÃO DA MEDIDA CIRCUNSCRITA ÀQUELA JANELA TEMPORAL COM A VONTADE DO TRIBUNAL DE IMPOR DITATORIALMENTE A SENTENÇA QUE PROLATOU, DISSUADINDO O ARGUIDO DE RECORRER, O QUE SIGNIFICA QUE O ARGUIDO, MESMO CONSIDERANDO INJUSTA A SENTENÇA, SE SENTIRIA INIBIDO DE RECORRER, JÁ QUE APENAS CONFORMANDO-SE COM A SENTENÇA PODERIA OBTER O SEU PASSAPORTE EM TEMPO DE ACEITAR AQUELA OFERTA E ASSIM VOLTAR “A SER UMA PESSOA NORMAL, COMO ERA ANTES DESTE PROCESSO”. 27. O QUE É NÃO SÓ REPROVÁVEL, COMO ILEGAL E VIOLADOR DOS MAIS ELEMENTARES E BÁSICOS DIREITOS DE QUALQUER CIDADÃO NUM ESTADO DE DIREITO,DESIGNADAMENTE OS DE TER UMA PROFISSÃO E DE A EXERCER LIVREMENTE,O DE RECORRER DE DECISÕES JUDICIAIS E O DE NÃO SER SUJEITO A PENA QUE ENVOLVA A PERDA DE DIREITOS PROFISSIONAIS,PELO QUE A DOUTA SENTENÇA É NULA POR POR VIOLADORA DOS ARTS.º 30.º N.º 4,32.º N.º 1,47.º N.º 1E 58.º TODOS DA CRP,E DOS ARTS.º 375.º N.º 4,204.º N.º 1 E 212.º N.ºS 1E 4 TODOS DO CPP.
DA NULIDADE DA SENTENÇA POR VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO, DA PUBLICIDADE, DA VINCULAÇÃO TEMÁTICA E DA LEGALIDADE E IMEDIAÇÃO DA PROVA – A VALORAÇÃO DE PROVA PROIBIDA 28. SEM PREJUÍZO DO SUPRA,A DOUTA SENTENÇA É NULA POR VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE DA PROVA (ART.º 125.º A CONTRARIO CPP), DA IMEDIAÇÃO DA PROVA (ART.º 355.º N.º 1 CPP), DO CONTRADITÓRIO (ARTS.º 327.º CPP, 10.º DUDH, 6.º N.º 1 CEDH), DA VINCULAÇÃO TEMÁTICA (ART.º 339.º N.º 4 CPP) E DA PUBLICIDADE (ART.º 86.º E 321.º CPP), POR NELA SE VALORAR PROVA NÃO PRODUZIDA, EXAMINADA OU LIDA EM AUDIÊNCIA. 29. REFERE-SE NA MOTIVAÇÃO DE FACTO QUE SE LEVOU EM CONSIDERAÇÃO “A PROVA DOCUMENTAL EXISTENTE NOS AUTOS, NOMEADAMENTE (…) A TRANSCRIÇÃO E TRADUÇÃO DE GRAVAÇÃO DE FLS. 235 A 241”, SENDO QUE, AO CONTRÁRIO DOS DEMAIS REFERIDOS, AQUELE DOCUMENTO EM CONCRETO NÃO FOI EXAMINADO NEM LIDO EM AUDIÊNCIA. 30. ENÃO FOI SEQUER ARROLADO NA ACUSAÇÃO NEM NA PRONÚNCIA, ESCAPANDO POR ISSO AO OBJECTO DO PROCESSO VINCULADAMENTE DEFINIDO PELA ACUSAÇÃO OU PELO DESPACHO DE PRONÚNCIA, CFR. ART.º 339.º N.º 4 CPP, E, ASSIM, NÃO SE PODERÁ TÊ-LO COMO PROVA ADMISSÍVEL SEM EXAME OU LEITURA EM AUDIÊNCIA. 37 31. CONSIDERANDO TAMBÉM QUE AQUELA GRAVAÇÃO OCORREU SEM O CONSENTIMENTO OU SEQUER CONHECIMENTO DO ARGUIDO, TAMBÉM PORQUE OBTIDO ILEGALMENTE CONFIGURA PROVA PROIBIDA, IMPASSÍVEL DE VALORAÇÃO NOS TERMOS DO ART.º 125.º A CONTRARIO CPP. 32. DISPÕE O ART.º 355.º N.º 1 CPP QUE NÃO VALEM EM JULGAMENTO NOMEADAMENTE PARA O EFEITO DE FORMAÇÃO DA CONVICÇÃO DO TRIBUNAL QUAISQUER PROVAS QUE NÃO TENHAM SIDO PRODUZIDAS OU EXAMINADAS EM AUDIÊNCIA, DECORRENDO ESSA CIRCUNSTÂNCIA DO PRINCÍPIO DA IMEDIAÇÃO DA PROVA E DO RESPEITO PELOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO,DA VINCULAÇÃO TEMÁTICA E DA PUBLICIDADE. 33… 34. LOGO, UMA VEZ QUE AQUELE DOCUMENTO NÃO CONSTAVA DO OBJECTO DO PROCESSO POR AUSENTE DA ACUSAÇÃO E DO DESPACHO DE PRONÚNCIA E NÃO FOI PRODUZIDO,LIDO OU EXAMINADO EM AUDIÊNCIA, NÃO PODIA O TRIBUNAL A QUO TÊ-LO VALORADO NEM TÊ-LO TIDO EM CONSIDERAÇÃO PARA FORMAÇÃO DA SUA CONVICÇÃO, DE TAL SORTE QUE, AO TÊ-LO FEITO,INCORREU NA FRONTAL VIOLAÇÃO DAS NORMAS E PRINCÍPIOS SUPRA REFERIDOS, FERINDO A DOUTA SENTENÇA DE NULIDADE POR VALORAÇÃO DE PROVA PROIBIDA. DO ERRO DE JULGAMENTO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO 35. SEM PRESCINDIR DO ACIMA EXPOSTO, A VERDADE É QUE A DOUTA SENTENÇA ERRA O JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO, PORQUANTO ERRONEAMENTE APRECIA E VALORA A PROVA PRODUZIDA, PRINCIPIANDO DESDE LOGO POR EVIDENCIÁ-LO AO AVALIAR NEGATIVAMENTE QUE O ARGUIDO TENHA PRESTADO DECLARAÇÕES APENAS NO FINAL DA PRODUÇÃO DA PROVA, JÁ QUE DECORRE DOS AUTOS E FICOU PROVADO NO PONTO 61 DOS FACTOS PROVADOS QUE ESTEVE INTERNADO PARA TRATAMENTO DE DEPENDÊNCIA. 36. UMA VEZ QUE O ARGUIDO ESTEVE INTERNADO ENTRE 24 DE SETEMBRO DE 2024 E MEADOS DE NOVEMBRO DE 2024 E O JULGAMENTO INICIOU A 30 DE SETEMBRO DE 2024, ERA-LHE EVIDENTEMENTE IMPOSSÍVEL TER PRESTADO DECLARAÇÕES EM MOMENTO ANTERIOR, PELO QUE O TRIBUNAL ERROU AO VALORAR NEGATIVAMENTE TAL FACTO, IGNORANDO AQUELA IMPOSSIBILIDADE APESAR DE CONSIDERAR PROVADAS AS RAZÕES QUE A ELA CONDUZIRAM. 37. O TRIBUNAL A QUO ERROU AINDA O JULGAMENTO AO DAR COMO PROVADOS OS FACTOS VERTIDOS NOS PONTOS 28, 29, 30, 31, 32, 33 E 34, CUJA PROVA DIZ TER RETIRADO APENAS DO DEPOIMENTO DA OFENDIDA, INADMISSIVELMENTE IGNORANDO O QUE RESULTA DOS DEPOIMENTOS DOS GUARDAS … QUANDO CONJUGADO COM A EXPERIÊNCIA COMUM. … 45. MAIS: PERGUNTADA SOBRE SE OS SUSPEITOS DE SEREM AGRESSORES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA SÃO SEMPRE DETIDOS RESPONDEU QUE NÃO E QUE A DETENÇÃO NÃO FOI DEVIDA À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA (FICHEIRO DILIGENCIA 223-23.4GAPNI 2024-10-14 16-12-48, 00:15:15-00:15:37). 46. RETIRA-SE DESTES DEPOIMENTOS AD NAUSEAM QUE O ARGUIDO NÃO QUIS NEM TENTOU IMPEDIR A SAÍDA DA OFENDIDA, MAS APENAS QUE ELA SAÍSSE COM O COMPUTADOR E O TELEMÓVEL DELE E QUE FOI POR ISSO QUE SALTOU DA VARANDA, QUE NÃO TENTOU DESCER AS ESCADAS NEM SALTOU DA VARANDA “NO ENCALÇO DA OFENDIDA” MAS APENAS PARA IMPEDIR QUE AQUELA LEVASSE O QUE ERA DELE, PELO QUE SE IMPÕE DECISÃO DISTINTA QUANTO AOS FACTOS VERTIDOS NOS PONTOS 32, 33 E 34, OS QUAIS NÃO RESULTARAM PROVADOS E SÃO CONTRARIADOS POR AQUELES DEPOIMENTOS. 47. MAIS ERROU O TRIBUNAL AO NÃO JULGAR PROVADO, COM BASE NESTES DEPOIMENTOS, QUE O QUE O ARGUIDO PRETENDIA ERA EVITAR QUE A OFENDIDA SAÍSSE COM O COMPUTADOR E O TELEMÓVEL, NUNCA TENDO QUERIDO OU TENTADO IMPEDI-LA PURA E SIMPLESMENTE DE SAIR. 48. … 49. NÃO SE COMPREENDE O QUE TERÁ MOTIVADO A DETENÇÃO, POIS SE NÃO FOI A SUPOSTA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NEM POR QUALQUER DESOBEDIÊNCIA – QUE INEXISTIU, COMO DECORRE DOS DEPOIMENTOS DOS GUARDAS - ENTÃO NADA O JUSTIFICA, SENDO MANIFESTAMENTE INSUFICIENTE PARA EXPLICÁ-LA QUE O ARGUINDO TENHA SALTADO DA VARANDA. 50. O TRIBUNAL ERROU AINDA O JULGAMENTO AO DAR COMO PROVADOS OS FACTOS VERTIDOS NOS PONTOS 3, 4, 5, 6, 7, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 18, 19, 20, 21, 23, 26, 27, 35, 36, 37, 38, 42, 43 E 47, ATENDENDO APENAS AO DEPOIMENTO DA OFENDIDA E INCOMPREENSIVELMENTE IGNORANDO AS DECLARAÇÕES DO ARGUIDO, OS DEPOIMENTOS DAS TESTEMUNHAS CC, DD, EE E FF, E O QUE RESULTA DAS MENSAGENS ENTRE A OFENDIDA E O ARGUIDO JUNTAS AOS AUTOS. 51. NESTE EXERCÍCIO, AVANÇA O TRIBUNAL QUE ATENDEU AO DEPOIMENTO DA OFENDIDA PORQUE ESTA “RELATOU MUITAS DAS SITUAÇÕES DESCRITAS NA ACUSAÇÃO DE FORMA ESPONTÂNEA, CIRCUNSTANCIADA, SEM CONTRADIÇÕES DEMONSTRATIVAS DE VONTADE DE FALTAR À VERDADE, NEM ESPECIAL INTENÇÃO DE PREJUDICAR O ARGUIDO ALÉM DA SUA RESPONSABILIZAÇÃO PELOS FACTOS QUE EFECTIVAMENTE CONTRA SI FORAM COMETIDOS, TENDO ESCLARECIDO TODOS ESSES FACTOS DE FORMA CONCATENADA E SÉRIA”, O QUE DENOTA O VIÉS DO TRIBUNAL. 52. POR UM LADO PORQUE DECORRE DO DEPOIMENTO DA OFENDIDA UMA INTENÇÃO CLARA DE DENEGRIR E VILIPENDIAR O ARGUIDO, ACUSANDO-O DE TRAFICAR DROGA, DE LAVAR DINHEIRO, DE FUGIR AO PAGAMENTO DE IMPOSTOS NA LOJA E DE PRETENDER ESTAR COM ELA E COM A EX-COMPANHEIRA AO MESMO TEMPO, O QUE DE RESTO EM NADA SE RELACIONA COM OS FACTOS AQUI EM CAUSA (FICHEIRO DILIGENCIA_223-23.4GAPNI_2024-09-30_10-44-23 00:18:26-00:18:42, 00:25:28-00:25:35, 00:26:05-00:26:10, 00:59:54-01:00:01, 01:00:30-01:00:38; FICHEIRO DILIGENCIA_223-23.4GAPNI_2024-09-30_14-31-28, 01:30:38-01:30:48, 01:31:18-01:31:30). 53. POR OUTRO LADO E RELATIVAMENTE À SUPOSTA ESPONTANEIDADE DO DEPOIMENTO DA OFENDIDA, O TRIBUNAL ESCREVE ADIANTE AINDA QUE “NÃO COLHE A ALEGAÇÃO DA DEFESA DO ARGUIDO EM COMO A OFENDIDA PRESTOU DEPOIMENTO PREPARADO E RECORRENDO A AUXILIARES DE MEMÓRIA, TENDO O TRIBUNAL ESTADO ATENTO A EVIDÊNCIAS DE TAL POSSIBILIDADE, QUE NÃO SE VERIFICARAM (…)”, O QUE É CONTRADITÓRIO E INCOMPREENSÍVEL POIS SUCESSIVAMENTE A MERITÍSSIMA JUIZ CHAMOU À ATENÇÃO DA OFENDIDA, DIZENDO-LHE QUE ESTA NÃO SE PODERIA SOCORRER DE APONTAMENTOS (FICHEIRO DILIGENCIA 223-23.4GAPNI 2024-09-30 10-44-23, 00:54:17-00:54:28) E ATÉ OBRIGANDO-A A MOSTRAR O QUE ESTAVA A FAZER NO COMPUTADOR (FICHEIRO DILIGENCIA 223-23.4GAPNI2024-09-3014-31-28,00:33:31-41 00:36:01). 54. MAIS: PARA JUSTIFICAR O CRÉDITO CONFERIDO AO DEPOIMENTO DA OFENDIDA, O TRIBUNAL DIZ AINDA QUE NÃO COLHE O ARGUMENTO DE QUE A MESMA TENHA PREMEDITADO O SEU RELATO DE FORMA ARDILOSA, FRIA E CALCULISTA APENAS PARA SE VINGAR DO ARGUIDO, ATÉ PORQUE NÃO TINHA COMO PREVER QUE AQUELE SERIA DETIDO, PORQUE NÃO FAZ SENTIDO QUE ALGUÉM SE SUJEITASSE AO ESCRUTÍNIO DE UM PROCESSO JUDICIAL PARA TAIS FINALIDADES E QUE A OFENDIDA, EMBORA PODENDO RECUSAR-SE, PRESTOU “RELATOS DA SUA MEMÓRIA, NÃO FANTASIADOS”. 55. CONTUDO, COMO VIMOS ACIMA, A OFENDIDA PREPAROU O SEU DEPOIMENTO, O QUAL FOI EVIDENTEMENTE ASSISTIDO E, COMO TAMBÉM VIMOS ACIMA, A DETENÇÃO DO ARGUIDO NÃO FOI MOTIVADA POR QUALQUER RAZÃO ATENDÍVEL, ANTES DECORRENDO DA PROVA PRODUZIDA E EM CONCRETO DOS DEPOIMENTOS DOS GUARDAS … QUE NÃO SÓ NÃO É COMUM DETEREM-SE CIDADÃOS NAQUELAS CONDIÇÕES COMO O ARGUIDO NÃO DESOBEDECEU A QUALQUER ORDEM DOS AGENTES, SENDO QUE A ÚNICA RAZÃO QUE SE VISLUMBRA PARA A DETENÇÃO É A CIRCUNSTÂNCIA DE A OFENDIDA SER ESTRANGEIRA E UMA CEGA SUBSERVIÊNCIA A ESSE SINGELO FACTO, FALECENDO ASSIM O ADUZIDO PELO TRIBUNAL. 56. MAIS: DECORRE DAS MENSAGENS JUNTAS AOS AUTOS A FLS. 387 VERSO 34,388 35 E 389 36 QUE, JÁ NO DECURSO DESTES AUTOS, A OFENDIDA ENVIOU AO ARGUIDO MENSAGENS ONDE EVIDENCIA FRIEZA, CALCULISMO E ARDIL E O USO DESTE PROCESSO PARA MANIPULAR, OFENDER E ATINGIR O ARGUIDO. 57. DO TEOR DESTAS MENSAGENS CONJUGADO COM O QUE ACIMA SE DEIXOU DO DEPOIMENTO DA OFENDIDA ONDE ESTA TRAZ ACUSAÇÕES FALSAS E VIS QUANTO AO ARGUIDO, O QUE RESULTA É QUE ELA EFECTIVAMENTE USOU ESTES AUTOS DE MODO ARDILOSO, FRIO E CALCULISTA E COM O INTUITO DE SE VINGAR DO ARGUIDO, POIS, ALÉM DO MAIS, SABENDO QUE ELE ESTAVA PROIBIDO DE A CONTACTAR,NÃO SE COIBIU DE LHE DIZER QUE LHE PEDIRAM QUE ESCREVESSE O QUE ELA QUISESSE, PROVOCANDO-OEOFENDENDO-O E ATÉ DIZENDO-LHE QUE ESTÁ “UM PASSO À FRENTE”. 58. COM ESTAS MENSAGENS E O SEU PRÓPRIO DEPOIMENTO, FICOU ASSIM PROVADO QUE A OFENDIDA RETIROU UM PRAZER SÁDICO DOS PRESENTES AUTOS, OFENDENDO, HUMILHANDO E PROVOCANDO O ARGUIDO DE MODO FRANCAMENTE VIL, FACE AO QUE SE IMPUNHA QUE SE TIVESSE DESCONSIDERADO OU PELO MENOS DESCREDIBILIZADO O DEPOIMENTO DA OFENDIDA, TENDO-O POR ASSISTIDO E PREPARADO, CONSIDERANDO QUE AQUELA SE SOCORREU DE AUXILIARES DE MEMÓRIA OU MENSAGENS RECEBIDAS NO SEU TELEFONE OU COMPUTADOR NO DECORRER DA DILIGÊNCIA E CONSIDERANDO QUE ELA USOU OS PRESENTES AUTOS PARA OFENDER O ARGUIDO DE UM MODO FRIO E MAQUIAVÉLICO. 59. CONCRETAMENTE NO QUE SE REPORTA AO FACTO DADO COMO PROVADO NO PONTO 47, O TRIBUNAL A QUO REFERE QUE FOI EXCLUSIVAMENTE COM BASE NO DEPOIMENTO DA OFENDIDA QUE O CONSIDEROU PROVADO, ALI SE ESCREVENDO QUE “NO SEGUIMENTO DAS SITUAÇÕES EM CAUSA NOS AUTOS, A OFENDIDA … FOI DIAGNOSTICADA COM STRESS PÓS-TRAUMÁTICO E DEPRESSÃO, MANTENDO ACOMPANHAMENTO PSICOLÓGICO”. 60. ORA, INEXISTE NOS AUTOS PROVA DOCUMENTAL OU PERICIAL DE ONDE DECORRAM AQUELES DIAGNÓSTICOS, AS SUAS EVENTUAIS RAZÕES DE SER OU QUER SEQUER O REFERIDO “ACOMPANHAMENTO PSICOLÓGICO” E NENHUMA OUTRA TESTEMUNHA REFERIU O QUE QUER QUE FOSSE RELATIVAMENTE A ESTES DIAGNÓSTICOS E ACOMPANHAMENTO. 61. … 62. … 63. UM DIAGNÓSTICO DESTA ORDEM –DE STRESS PÓS-TRAUMÁTICO E DE DEPRESSÃO –NÃO É PASSÍVEL DE SE FAZER A PARTIR APENAS DE SINAIS DE TRISTEZA OU ANGÚSTIA OU SEQUER STRESS, REQUERENDO EFECTIVO DIAGNÓSTICO MÉDICO, DAÍ QUE APENAS UM MÉDICO POSSA ATESTÁ-LO E JÁ NÃO UM QUALQUER OUTRO CIDADÃO E NEM MESMO UM TRIBUNAL,SOZINHO OU A PARTIR DE MERAS DECLARAÇÕES DO PRÓPRIO. 64. AO TER COMO PROVADO TAL FACTO O TRIBUNAL A QUO FALHOU ROTUNDAMENTE A VALORAÇÃO DA PROVA, UMA VEZ QUE AQUELE NÃO DECORRE DE ELEMENTO NENHUM DOS AUTOS E, POR INCLUIR DIAGNÓSTICO CLÍNICO E SUPOSTO ACOMPANHAMENTO ABSOLUTAMENTE INCOMPROVADOS, NÃO PODIA BASTAR O DEPOIMENTO DA PRÓPRIA OFENDIDA NESSE SENTIDO – E ALIÁS ÚNICO QUE O ABORDOU. 65. ORA, NO QUE CONCERNE AOS FACTOS DOS PONTOS 3,4,5,6,7,11,12,13, 14, 15, 16, 18, 20, 21, 23, 26, 27, 28, 35, 36, 37, 38, 42 E 43, O TRIBUNAL JULGOU-OS PROVADOS, SEGUNDO DIZ, TENDO EM CONSIDERAÇÃO O DEPOIMENTO DA OFENDIDA CONJUGADO COM A TRANSCRIÇÃO E GRAVAÇÃO DE FLS.235-241E COM AS MENSAGENS TROCADAS ENTRE AMBOS JUNTAS AOS AUTOS, PORÉM, FACE À PROVA PRODUZIDA QUANDO CONJUGADA ENTRE SI E COM A EXPERIÊNCIA COMUM, AQUELES FACTOS NÃO PODIAM TER SIDO DADOS COMO ASSENTES. 66. … 67. AINDA QUE ASSIM NÃO FOSSE, ATENDENDO A QUE ARGUIDO E OFENDIDA TROUXERAM VERSÕES CONTRADITÓRIAS, FORÇOSO É TOMAR EM CONSIDERAÇÃO OUTROS ELEMENTOS DE ONDE SE POSSA RETIRAR A MAIOR CREDIBILIDADE DE UMA OU DE OUTRA VERSÃO E, COMO VEREMOS, A DEMAIS PROVA APONTA NO SENTIDO DA MAIOR CREDIBILIDADE DA VERSÃO DO ARGUIDO. 68. NENHUMA DAS TESTEMUNHAS INQUIRIDAS PRESENCIOU QUALQUER DOS FACTOS VERTIDOS NOS PONTOS 3, 4, 5, 6, 7, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 18, 20 E RELATIVAMENTE A ESTES INEXISTE QUALQUER PROVA NOS AUTOS. 69. AOFENDIDA NÃO REALIZOU QUALQUER EXAME NEM PERÍCIA, TENDO FALTADO AO EXAME MÉDICO-LEGAL (CFR. FLS. 230 DOS AUTOS), INEXISTINDO QUALQUER PROVA DE AGRESSÕES FÍSICAS OU CICATRIZES OU “RASTO” DE QUALQUER SUPOSTA VIOLÊNCIA DE QUALQUER TIPO. 70. O TRIBUNAL CONSIDEROU QUE “NÃO SÓ AS DECLARAÇÕES DE … SE MOSTRAM PARTICULARIZADAS QUANTO AOS MOMENTOS DE ACTUAÇÃO E FORMAS DE ACTUAÇÃO DO ARGUIDO,COMO SE MOSTRAM EM CONSONÂNCIA COM OUTROS ELEMENTOS DE PROVA”, SOCORRENDO-SE O TRIBUNAL DA TRANSCRIÇÃO E TRADUÇÃO DA GRAVAÇÃO A FLS.235A 241 DOS AUTOS, DE ONDE ENTENDE SE RETIRA QUE O ARGUIDO MANTEVE COM A OFENDIDA UMA DISCUSSÃO DE FORMA OBSESSIVA, MANIPULADORA, COM SENTIMENTOS DE CIÚME E POSSESSÃO; E DAS MENSAGENS TRANSCRITAS JUNTAS PELO ARGUIDO,DE ONDE CONSIDEROU QUE SE RETIRAM INDÍCIOS DE QUE O ARGUIDO BATIA À OFENDIDA PORQUE HÁ MENSAGENS DELA A QUESTIONÁ-LO SE LHE VAI BATER NOVAMENTE. 71. SEM CONCEDER QUANTO À INADMISSIBILIDADE DE VALORAÇÃO DAQUELA TRANSCRIÇÃO QUE CONFIGURA PROVA PROIBIDA, NA MERA HIPÓTESE ACADÉMICA DE QUE SE PUDESSE ATENDER-LHE, A VERDADE É QUE OBJECTIVAMENTE O QUE DALI SE RETIRA É A PARANÓIA, “MANIA DA PERSEGUIÇÃO” E MANIPULAÇÃO DA OFENDIDA PARA COM O ARGUIDO, ERRANDO O TRIBUNAL A QUO AO NÃO EXTRAIR DAQUELA TRANSCRIÇÃO A PARANÓIA, DESEQUILÍBRIO E MANIPULAÇÃO DA OFENDIDA QUANTO AO ARGUIDO. 72. … 73. … 74. MAIS ERROU O TRIBUNAL AO RETIRAR DO TEOR DAS MENSAGENS JUNTAS QUE O ARGUIDO BATIA À OFENDIDA, POIS NEM ESSA CONCLUSÃO SE PODE RETIRAR DAQUELAS MENSAGENS,NEM DALI SE RETIRA SENÃO A CONSTANTE MANIPULAÇÃO E INSULTOS DELA PARA COM ELE42,DECORRENDO DE RESTO DE MODO EXPLÍCITO DAS MENSAGENS ENVIADAS PELA OFENDIDA AO ARGUIDO APÓS O INÍCIO DESTES AUTOS QUE ESTA O ACHINCALHAVA, OFENDIA E HUMILHAVA E PROVOCAVA, TENTANDO QUE ELE LHE RESPONDESSE, CHAMANDO-LHE DROGADO, E DIZENDO QUE O PAI DELE ESTARIA TRISTE PELO HOMEM QUE O ARGUIDO É (FLS.388 VERSO). 75. EM SENTIDO CONTRÁRIO, PORÉM, O QUE SE DENOTA NAS MENSAGENS DO ARGUIDO PARA ELA É A ABSOLUTA EXAUSTÃO DELE E TUDO O QUE FEZ PARA QUE A RELAÇÃO DESSE CERTO E ELA ESTIVESSE CONTENTE, ALIÁS PEDINDO-LHE QUE PARASSE POR DIVERSAS VEZES, ABANDONANDO A CONVERSA QUANDO ELA O INSULTAVA, TENTANDO QUE PARASSEM DE DISCUTIR. 76. … 77. … 78. … 79. A TESTEMUNHA C… REFERIU QUE MANTEVE RELAÇÃO COM O ARGUIDO COMO SE FOSSEM CASADOS DURANTE 24 (VINTE E QUATRO ANOS), PASSOU MUITO TEMPO COM ELE, QUE ELE SEMPRE FOI “SUPER TRANQUILO” E NUNCA HOUVE QUALQUER PROBLEMA DE AGRESSIVIDADE OU FALTAS DE RESPEITO, DISCUTIRAM VÁRIAS VEZES MAS QUE ELE NUNCA LHE FALTOU AO RESPEITO,O QUE NÃO É DA NATUREZA DELE,E QUE NEM MESMO QUANDO ESTAVA ALCOOLIZADO ALGUMA VEZ FOI VIOLENTO, REITERANDO QUE NUNCA EXPERIENCIOU QUALQUER AGRESSIVIDADE OU VIOLÊNCIA PERPETRADA PELO ARGUIDO (FICHEIRO DILIGENCIA 223-23.4GAPNI 2024-11-08 11-14-51 1:40-2:26, 00:08:00-00:08:10,00:08:32-00:10:18). 80. ACRESCENTOU AINDA QUE MESMO EM ALTO-MAR E EM SITUAÇÕES DE STRESS ELE SEMPRE SE MOSTROU CALMO E CONSEGUIA SERENAR OS OUTROS, E QUE NÃO ERA MANIPULADOR, CONTROLADOR OU POSSESSIVO (FICHEIRO DILIGENCIA 223-23.4GAPNI 2024-11-08 11-14-51 00:11:02-00:12:29 E 00:13:30-00:15:03, 00:16:02-00:17:34) 81. E MAIS REFERIU QUE NOTOU QUE OS CIÚMES DA OFENDIDA TORNARAM O ARGUIDO UMA PESSOA DIFERENTE, SEM “PIADA”, SUBMISSO E QUE ELE SE QUEIXAVA DOS CIÚMES, POSSESSIVIDADEE CONTROLODAOFENDIDA (FICHEIRODILIGENCIA 223-23.4GAPNI2024-11-08 11-14-51 00:20:37-00:22:25) 82. JÁ AS TESTEMUNHAS I… (FICHEIRO DILIGENCIA 223-23.4GAPNI 2024-11-08 15-21-59, 00:16:19-00:21:15) E J… (FICHEIRO DILIGENCIA 223-23.4GAPNI 2024-11-08 15-21-59, 00:04:27-00:10:00) RELATARAM EPISÓDIO OCORRIDO QUANDO A OFENDIDA REGRESSOU A PORTUGAL DA ÁFRICA DO SUL NO DIA 2 DE DEZEMBRO DE 2022, QUANDO, CHEGANDO A CASA E VENDO O ARGUIDO A FALAR EM PORTUGUÊS COM A IRMÃ (J…) AO TELEFONE, PORQUE A IRMÃ ESTAVA NA INDONÉSIA,A OFENDIDA ENCETOU UMA DISCUSSÃO MOTIVADA POR CIÚMES, IMAGINANDO QUE A C… ESTARIA NAQUELE GRUPO COM A IRMÃ DO ARGUIDO, E EMPURROU O ARGUIDO FAZENDO-O CAIR DA VARANDA DO SEGUNDO ANDAR ONDE VIVIAM. 83. DO DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA J… RESULTA TAMBÉM QUE A OFENDIDA FORÇAVA O ARGUIDO A FALAR EM INGLÊS PARA QUE ELA COMPREENDESSE O QUE ELE DIZIA, TENDO RELATADO UM EPISÓDIO EM QUE TELEFONOU AO IRMÃO POR CAUSA DE UMA QUESTÃO DE TRABALHO,ELE LHE FALOU EM INGLÊS E UMA VEZ QUESTIONADO SOBRE O MOTIVO PELO QUAL O FAZIA LHE CONFESSOU QUE SE ASSIM NÃO FOSSE “ERA UM PROBLEMA” COM A OFENDIDA, ADIANTANDO QUE A PRÓPRIA TESTEMUNHA TERIA DE FALAR EM INGLÊS E ELE IRIA COLOCAR A CHAMADA EM ALTA VOZ PARA A OFENDIDA OUVIR O QUE A TESTEMUNHA DIZIA. NESSA OCASIÃO A OFENDIDA TERÁ DITO QUE O ARGUIDO LHE ESTAVA SEMPRE A MENTIR, TENDO A TESTEMUNHA SUGERIDO QUE TALVEZ FOSSE PORQUE ELA FICARIA EXALTADA, SUGERINDO AINDA QUE A OFENDIDA TIRASSE UMAS FÉRIAS PARA IR TER COM A FAMÍLIA, OFERECENDO-SE PARA A LEVAR AO AEROPORTO (FICHEIRO DILIGENCIA 223-23.4GAPNI 2024-11-08 15-21-59 00:10:43-00:12:43) – O QUE TAMBÉM FOI REFERIDO PELA OFENDIDA, QUE CONFIRMOU QUE AQUELA TESTEMUNHA SE TINHA OFERECIDO PARA A LEVAR AO AEROPORTO (DILIGENCIA 223-23.4GAPNI 2024-09-30 10-44-23 01:13:10-01:13:18, 01:13:41-01:13:49). 84. TAMBÉM A TESTEMUNHA I… RELATOU QUE QUANDO CONHECEU A OFENDIDA NO NATAL DE 2021 TODA A FAMÍLIA FOI FORÇADA A FALAR INGLÊS PARA QUE AQUELA COMPREENDESSE O QUE DIZIAM, POIS ERA DESCONFIADA (FICHEIRO DILIGENCIA 223- 23.4GAPNI 2024-11-08 15-21-59, 00:07:14-00:14:22). 85. POR OUTRO LADO, A TESTEMUNHA J…, EX-COMPANHEIRO DA OFENDIDA, ESCLARECEU QUE TEVE UMA RELAÇÃO COM A OFENDIDA E QUE DURANTE ESSA RELAÇÃO DISCUTIAM MUITO,APELIDANDO-A DE UMA RELAÇÃO TÓXICA,DIZENDO QUE AO INÍCIO TINHA A OFENDIDA COMO A PARCEIRA IDEAL,COM QUEM ELE PODIA FALAR SOBRE TUDO, TENDO ELA DEPOIS UTILIZADO TUDO O QUE ELE LHE CONTOU PARA O PUNIR;QUE ELA É UMA PESSOA FRIA,MANIPULADORA,CONTROLADORA,QUE NÃO O DEIXAVA FALAR COM OS AMIGOS E EM ESPECIAL AMIGAS, QUE O ISOLOU DE TODA A GENTE. CONTINUOU DIZENDO QUE A OFENDIDA ERA AGRESSIVA, QUE COSTUMAVA PUXAR-LHE O CABELO, PARTIR AS COISAS DELE E INSULTÁ-LO (FICHEIRO DILIGENCIA 223-23.4GAPNI 2024-11-0814-10-21,00:07:45-00:08:22,00:10:50-00:11:31,00:12:13-00:14:30). 86. … 87. … 88. … 89. … 90. NA VERDADE, FACE ÀS CONTRADIÇÕES DOS DEPOIMENTOS DO ARGUIDO E DA OFENDIDA E PERANTE TODAS AS CIRCUNSTÂNCIAS RELATADAS COM CREDIBILIDADE POR ESTAS TESTEMUNHAS E DOS INDÍCIOS RESULTANTES DOS DOCUMENTOS, O TRIBUNAL TERIA PELO MENOS DE CONCLUIR PELA DÚVIDA INSANÁVEL E DECIDIR A FAVOR DO ARGUIDO E AO NÃO TÊ-LO FEITO ERROU O JULGAMENTO DA PROVA E VIOLOU O PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. 91. RELATIVAMENTE AOS FACTOS OCORRIDOS A 17E 18DE MAIO,REFERIDOS NOS PONTOS 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26 E 27, TAMBÉM MAL ANDOU O TRIBUNAL A QUO AO TÊ-LOS COMO PROVADOS. 92. … 93. … 94. … 95. … 96. ASSIM,O TRIBUNAL NÃO PODIA TER DADO COMO PROVADOS AQUELES FACTOS, IMPONDO AQUELES DEPOIMENTOS QUE, AO CONTRÁRIO, SE TIVESSE JULGADO PROVADO QUE A 50 DISCUSSÃO SURGIU NA SEQUÊNCIA DE A OFENDIDA TER NUM PRIMEIRO MOMENTO MENTIDO QUANTO AO PROCEDIMENTO QUE ADOPTOU E QUE FEZ DISPARAR O ALARME, QUE O ARGUIDO INSISTIU QUE ELA LHE DISSESSE O QUE TINHA FEITO PARA EVITAR A MULTA DA EMPRESA DE SEGURANÇA, E QUE PEDIU APENAS QUE A MÃE E IRMÃ DA OFENDIDA SAÍSSEM DE PERTO DELES, PERMITINDO QUE FALASSEM APENAS OS DOIS. 97. … 98. … 99. … 100. … 101. … 102.OS DEPOIMENTOS DA OFENDIDA E DA MÃE E DA IRMÃ NÃO SÃO,POR ISSO,MINIMAMENTE CREDÍVEIS QUANTO A ESTES FACTOS, POIS TODAS NEGARAM ESTAR ALCOOLIZADAS E TROUXERAM VERSÃO ONDE AS TRÊS ESTIVERAM COM A POLÍCIA,O QUE NÃO TEM MÍNIMA CORRESPONDÊNCIA COM O RELATADO PELO AGENTE DA PSP QUE ESTEVE NO LOCAL. 103.LOGO E POR FRONTALMENTE CONTRARIADO PELO DEPOIMENTO DO AGENTE E PELO AUTO REFERIDO, IMPUNHA-SE DESACREDITAR AQUELES DEPOIMENTOS DA PRÓPRIA OFENDIDA E DE PESSOAS DA SUA FAMÍLIA, ANTES CONFERINDO MAIOR VALOR AO DEPOIMENTO DO AGENTE DA PSP, ISENTO E, TAMBÉM, POR SER ASSIM, TANTO MAIS CREDÍVEL SE 51 MOSTRA O RELATO DO ARGUIDO QUANTO A ESTES FACTOS EM CONCRETO. 104.… 105.DECORRE ENTÃO DO SUPRA EXPOSTO QUE O TRIBUNAL JULGOU MAL ESTES FACTOS, IMPONDO O DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA A…, QUANDO CONJUGADO COM O AUTO DE FLS.90A 91VERSO,QUE SE DESCONSIDERASSE A VERSÃO DA OFENDIDA E DA SUA MÃE E IRMÃ E, CONSEQUENTEMENTE, POR MAIS CREDÍVEL E CONSONANTE COM O RELATADO PELO AGENTE DA PSP, SE TIVESSE JULGADO PROVADO O RELATADO PELO ARGUIDO. 106.QUANTO AOS FACTOS VERTIDOS NOS PONTOS 23, 24, 25, 26, 27 E 40 TAMBÉM MAL ANDO OU TRIBUNAL, POIS OS DEPOIMENTOS DA OFENDIDA, MÃE E IRMÃ NÃO SÃO COERENTES ENTRE SI NEM A VERSÃO POR SI TRAZIDA É VEROSÍMIL ATENTO O QUE ACIMA SE DEIXOU. 107.… 108.… 109.… 110.… 111. … 112. … 113.… 114.… 115.… 116.… 117.ORA, A OFENDIDA D… NÃO REALIZOU A PERÍCIA MÉDICO-LEGAL (CFR. FLS. 104 DOS AUTOS) INEXISTINDO NOS AUTOS QUALQUER PROVA DE QUALQUER LESÃO OU MARCA MÍNIMA QUE FOSSE NO CORPO DESTA. 118.LOGO, ANTE A FALTA DE PROVA PERICIAL QUE CORROBORE A VERSÃO DA OFENDIDA D…, PERANTE AS CONTRADIÇÕES DOS DEPOIMENTOS DAS TRÊS E FACE AINDA ÀS MANIFESTAMENTE ABERRANTES VERSÕES DAS TESTEMUNHAS, O TRIBUNAL NÃO TINHA QUALQUER ACERVO PROBATÓRIO ONDE PUDESSE TER SUSTENTADO A PROVA DOS FACTOS VERTIDOS NOS PONTOS 24, 25, 39 E 40, IMPONDO O SENSO COMUM, A FALTA DA PERÍCIA E AS VERSÕES CONTRADITÓRIAS E MUITÍSSIMO INVEROSÍMEIS DAS TESTEMUNHAS QUE SE TIVESSEM JULGADOS NÃO PROVADOS AQUELES FACTOS. 119.… 120.… 121.… 122. AQUI CHEGADOS, CABE AINDA E FINALMENTE TRAZER OS “DOIS PESOS E DUAS MEDIDAS” COM QUE O TRIBUNAL ANALISOU AS POSTURAS E DEPOIMENTOS DO ARGUIDO E DA OFENDIDA QUANDO, COMO SE VÊ E DECORRE DA PROVA, A RELAÇÃO DE AMBOS ERA NOTORIAMENTE TÓXICA: O TRIBUNAL CONSIDERA NORMAL QUE A OFENDIDA SE TENHA “ESQUECIDO DE ALGUMAS CIRCUNSTÂNCIAS” POR ENTENDER DA EXPERIÊNCIA COMUM EM SITUAÇÕES PROLONGADAS E NÃO SER EXIGÍVEL UM RELATOCOMPORMENORES ABSOLUTOS; PORÉM E NO SENTIDO OPOSTO, PARA DESCREDIBILIZAR O RELATADO PELO ARGUIDO, DIZ QUE ELE “NÃO CONCRETIZOU” OS EPISÓDIOS DE VIOLÊNCIA A QUE FOI SUJEITO. 123.ORA, NÃO SE COMPREENDE POR QUE RAZÃO SE RELEVA QUANTO À ARGUIDA QUE SE ESQUEÇA DE ALGUMAS CIRCUNSTÂNCIAS, EXIGINDO-SE DO ARGUIDO RELATOS QUASE 54 CRONOLÓGICOS. 124.E, EM RIGOR, O ARGUIDO RELATOU COM UMA PRECISÃO EM TUDO COADUNANTE COM UM RELATO DE MEMÓRIA E DE UMA VÍTIMA OS EPISÓDIOS DE VIOLÊNCIA A QUE FOI SUJEITO. 125.… 126.… 127.… 128.… 129.… 130.COM EFEITO, O QUE FICOU PATENTE FOI O DESEQUILÍBRIO E TOXICIDADE DA RELAÇÃO ENTRE ARGUIDO E OFENDIDA, AS DISCUSSÕES CONSTANTES, OS CIÚMES DA OFENDIDA E TAMBÉM QUE O CONSUMO DE ÁLCOOL POTENCIOU E FEZ ESCALAR A ANIMOSIDADE – O QUE FOI ADMITIDO PELA PRÓPRIA OFENDIDA (FICHEIRO DILIGENCIA 223-23.4GAPNI 2024-09-30 14-31-28, 2:42:22-2:43:25). 131.ACRESCE QUE O TRIBUNAL NO LAMENTÁVEL EPISÓDIO QUE LEVOU À DETENÇÃO DO ARGUIDO (CFR. AUTO DE NOTÍCIA A FLS. 11 DOS AUTOS), O QUE SE IMPUNHA QUE TIVESSE SIDO ATENDIDO, POIS É CONSABIDO QUE AS PESSOAS QUANDO ESTÃO ALCOOLIZADAS INFLAM CONFLITOS, FABULAM E TORNAM-SE POTENCIALMENTE MAIS AGRESSIVAS E ERRÁTICAS E AS MEMÓRIAS QUE TÊM DOS ACONTECIMENTOS SÃO EVIDENTEMENTE MAIS TÉNUES E POUCO FIÁVEIS. 132.TUDO, PORTANTO, O QUE SE TIVESSE SIDO ADEQUADAMENTE PONDERADO TERIA NECESSARIAMENTE CONDUZIDO A DECISÃO MUITO DISTINTA – OPOSTA! – POR PARTE DO TRIBUNAL, NÃO PODENDO TER COMO PROVADOS OS FACTOS ASSIM DESCRITOS,ANTES NECESSARIAMENTE CABENDO A ABSOLVIÇÃO DO ARGUIDO, MAIS QUE NÃO FOSSE PELA INSANÁVEL DÚVIDA RESOLVIDA A SEU FAVOR, JÁ QUE COMO SE VÊ A OFENDIDA TEM “HISTÓRICO” DE SER AGRESSIVA, MANIPULADORA E CIUMENTA E DE LEVAR OS SEUS COMPANHEIROS AO LIMITE – O QUE FOI RELATADO CREDIVELMENTE PELA TESTEMUNHA GG E ENCONTRA UM PARALELISMO ASSUSTADOR COM O CASO DOS PRESENTES AUTOS. 133.… 134. … 135. … 136.… 137.…
DA ERRADA APLICAÇÃO DO DIREITO
138.CONSEQUÊNCIA DIRECTA E NECESSÁRIA DO QUE SE ACABA DE DISSECAR É QUE O TRIBUNAL ERRADAMENTE APLICOU O DISPOSTO NOS ARTS.º 152.º E 143.º CP AO TER POR PREENCHIDOS OS ELEMENTOS DE CADA UM DOS CRIMES EM CAUSA, PORQUANTO NÃO RESULTARAM PROVADOS QUAISQUER COMPORTAMENTOS DO ARGUIDO DIRIGIDOS À OFENDIDA QUE SE ENQUADREM NO CONCEITO DE MAUS-TRATOS,DESIGNADAMENTE PORQUE NÃO SE PROVOU QUE LHE TENHA DIRIGIDO QUAISQUER INSULTOS OU INJÚRIAS OU TENHA AGIDOCOMELADEMOLDEAOFENDERASUAINTEGRIDADEFÍSICA,HONRAOUDIGNIDADE OU QUE A PUDESSEM TER FEITO SENTIR INSEGURA, VILIPENDIADA OU ATINGIDA DE QUALQUER MODO. 139.… 140.… 141.… 142.… 143.… 145.…
DA MEDIDA CONCRETA DAS PENAS 146.SEM CONCEDER QUANTO AO SUPRA, A VERDADE É QUE O TRIBUNAL A QUO VEM AINDA A APLICAR PENAS EXCESSIVAS AO ARGUIDO, ASSIM VIOLANDO O PLASMADO NO ART.º 71.º CP. 147.AFAVOR DO ARGUIDO HAVERÁ A CONSIDERAR A AUSÊNCIA DE ANTECEDENTES CRIMINAIS BEM COMO A CONDUTA EXEMPLAR DO ARGUIDO APÓS OS FACTOS, TENDO ESTE ACTUADO EM TUDO SEGUNDO A LEI E, PESE EMBORA APARTADO DA SUA VIDA NORMAL (PORQUE, COMO TAMBÉM SE DEIXOU ACIMA, ESTÁ IMPEDIDO DE SAIR DO PAÍS, SENDO NO ESTRANGEIRO QUE EXERCE A SUA PROFISSÃO DE SKIPPER),SE DEMONSTROU EMPENHADO NO SEU PRÓPRIO BEM-ESTAR E EQUILÍBRIO, TENDO ESTADO INTERNADO PARA TRATAMENTO DE ADIÇÕES E MANTENDO ACOMPANHAMENTO PSICOLÓGICO. 148.MAIS FICOU ASSENTE QUE O ARGUIDO ESTÁ BEM INTEGRADO NO SEIO FAMILIAR E SOCIAL, NÃO TEM UMA PERSONALIDADE AGRESSIVA,NÃO DEMONSTROU NUNCA QUALQUER TRAÇO OU INDÍCIO DE PERSONALIDADE AVESSA AO DIREITO E NÃO ADOPTA PARA COM AS PESSOAS DA SUA VIDA SENÃO UMA POSTURA DE PROFUNDO RESPEITO, PELO QUE AS NECESSIDADES DE PREVENÇÃO ESPECIAL SÃO MUITÍSSIMO REDUZIDAS SENÃO NULAS, UMAVEZ QUE NADA NA PERSONALIDADE, POSTURA,COMPORTAMENTOOU VIDA DO ARGUIDO LEVA A CRER QUE SEJAM NECESSÁRIAS ESPECIAIS OU SEVERAS “REPRIMENDAS”. 149.… 150.VEJA-SE QUE A SOMAR AOS QUASE VINTE DIAS QUE PASSOU NUM ESTABELECIMENTO PRISIONAL E QUE O LEVARAM À RECAÍDA NO CONSUMO, POR QUASE DOIS ANOS A ESTA DATA SE VÊ PRIVADO DA LIBERDADE QUE SEMPRE CONHECEU E DE EXERCER A SUA PROFISSÃO, DE NAVEGAR COMO SEMPRE FEZ E ATÉ DE PASSAR,COMO SEMPRE,O NATAL58 COM A DEMAIS FAMÍLIA, SENDO EVIDENTE O SOFRIMENTO QUE TUDO ISTO CAUSA A QUALQUER SER HUMANO. 151.ALIÁS, HAVERIA TER-SE ATENDIDO A CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES QUE NÃO FORAM CONSIDERADAS, COMO SEJAM O FACTO DE QUER O ARGUIDO QUER A OFENDIDA ESTAREM EMBRIAGADOS À DATA DOS FACTOS; A CIRCUNSTÂNCIA DE O ARGUIDO TER PROCURADO TRATAMENTO PARA AS SUAS DEPENDÊNCIAS,COMPLETANDO-O COM SUCESSO;O ARDIL E FRIEZA DA OFENDIDA E AS SUCESSIVAS PROVOCAÇÕES JÁ NO DECURSO DOS AUTOS, AS QUAIS O ARGUIDO EVITOU OU PELO MENOS TENTOU FAZER PARAR; AS AGRESSÕES E VIOLÊNCIA DE QUE ELE PRÓPRIO FOI VÍTIMA;E AINDA A DESNECESSIDADE DE,ALÉM DO QUE JÁ SOFREU E DO QUE JÁ O PREJUDICARAM OS PRESENTES AUTOS,PUNIR AINDA MAIS O ARGUIDO. 152.TUDO O QUE IMPUNHA A ATENUAÇÃO ESPECIAL DA PENA NOS TERMOS DO ART.º 72.º CP, REDUZINDO-SE OS LIMITES MÍNIMOS DAS PENAS DE MULTA E DE PRISÃO AO MÍNIMO LEGAL E OS MÁXIMOS DE UM TERÇO, CFR.ART.º 73.º CP. 153.QUANTO AO CRIME DE OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA –QUE A TER OCORRIDO (O QUE NÃO SE ADMITE) SE RECONDUZIRIA NO LIMITE A UMA CONDUÇÃO ATÉ FORA DO APARTAMENTO E A UM EVENTUAL PONTAPÉ COM O ÚNICO INTUITO DE FAZER A OFENDIDA SAIR DE CASA –AS CONSEQUÊNCIAS PARA A OFENDIDA BB NÃO TERÃO SIDO MAIS QUE EVENTUAL E LIGEIRA DOR, MOMENTÂNEA E FACILMENTE ULTRAPASSÁVEL, SEM LESÕES OU SEQUER MÍNIMAS MARCAS OU RASTO. 154.QUANTO AO DOLO TAMBÉM NÃO SE PODERÁ CONSIDERAR COMO DOLO DIRECTO, MAS APENAS EVENTUAL OU, NO LIMITE, NECESSÁRIO, NÃO SENDO A CULPA INTENSA. 155.QUANTO AO GRAU DE ILICITUDE TAMBÉM NÃO SERÁ SENÃO MÍNIMO, POIS, NO CALOR DE UM MOMENTO TRAUMÁTICO COMO FOI AQUELE E NO QUAL O ARGUIDO PRETENDIA APENAS QUE A OFENDIDA SAÍSSE DA CASA DELE, NÃO SERIA GRAVEMENTE CENSURÁVEL AQUELA CONDUTA. 156.ASSIM E PELO EXPOSTO, MOSTRA-SE EVIDENTEMENTE EXCESSIVA A APLICAÇÃO DE UMA MULTA DE OITENTA DIAS, ANTES, SE CONSIDERADO SANCIONÁVEL PELO DIREITO PENAL E NÃO APENAS ACTO GROSSEIRO E DE MÁ EDUCAÇÃO, HAVERIA DE TER-SE DISPENSADO A PENA, CFR.ART.º 74.º CP. 157.AINDA QUE ASSIM NÃO SE ENTENDESSE, O QUE POR MERO DEVER DE PATROCÍNIO SE EQUACIONA, CONSIDERANDO OS LIMITES MÍNIMO E MÁXIMO APLICÁVEIS DE RESPECTIVAMENTE 10E 360DIAS,A APLICAR-SE QUALQUER MULTA,MAIS ADEQUADO SERIA APLICAR-SE UMA MULTA DE DEZ DIAS,AINDA QUE À TAXA DIÁRIA CONSIDERADA PELO TRIBUNAL A QUO. 158.NOUTRO CONSPECTO, QUANTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, UMA VEZ QUE AQUILO QUE RESULTA DOS AUTOS É NO LIMITE UMA RELAÇÃO TÓXICA DE PARTE A PARTE E QUE NENHUMA PROVA SE FEZ QUANTO A ESSAS, SÃO MISTERIOSAS AS CONSEQUÊNCIAS CONCRETAS PARA A OFENDIDA. 59 159.PESE EMBORA ATÉ SE POSSA EQUACIONAR QUE NUM QUADRO COMO ESTE HAJA ALGUMAS CONSEQUÊNCIAS A NÍVEL PSÍQUICO – AS QUAIS, DIZ-NOS A EXPERIÊNCIA COMUM, SEMPRE RESULTAM DE RELAÇÕES TÓXICAS E LEVAM TEMPO A DISSIPAR-SE – FACE AO TEMPO ENTRETANTO DECORRIDO E ATENDENDO ÀS CONDUTAS DA PRÓPRIA OFENDIDA PARA COM O ARGUIDO, A VERDADE É QUE SE TEMPERAM MUITO ESSAS CONSEQUÊNCIAS, SITUANDO-SE NUM NÍVEL MUITÍSSIMO INFERIOR AO DA MAIORIA DOS CASOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, POIS NÃO É COMUM QUE AS VÍTIMAS TAMBÉM SEJAM AGRESSORAS. 160.QUANTO AO DOLO E VISTO QUE ESTÁ QUE O ARGUIDO NUNCA AGIU PRETENDENDO CAUSAR QUALQUER DANO À OFENDIDA OU FAZÊ-LA SENTIR-SE HUMILHADA, RESULTADO ESSE QUE NUNCA QUIS –E QUE,SE SE VERIFICOU,O QUE NÃO SE ADMITE E EM HIPÓTESE MERAMENTE ACADÉMICA SE PONDERA, FOI PELA DINÂMICA POUCO SAUDÁVEL QUE AMBOS IMPRIMIRAM NA RELAÇÃO –NÃO SE PODE CONSIDERAR COMO DOLO DIRECTO,MAS APENAS E NO LIMITE EVENTUAL E PORTANTO A CULPA ACHA-SE SUBSTANCIALMENTE DIMINUÍDA. 161.NUM MESMO PLANO, O GRAU DE ILICITUDE É REDUZIDO ATENTAS AS PARTICULARIDADES E DISFUNCIONALIDADES DESTA CONCRETA RELAÇÃO. 162.ASSIM E DECIDIR-SE PELA PENA DE PRISÃO, SEMPRE HAVERIA ESTA DE FICAR-SE PELO LIMITE MÍNIMO DA MOLDURA PENAL CONCRETAMENTE APLICÁVEL E POR ISSO PELOS DOIS ANOS – O QUE, DE RESTO,SEMPRE SERIA INJUSTO. 163.SENDO DE SUSPENDER A SUA EXECUÇÃO – NESTE PASSO TENDO DECIDIDO BEM O TRIBUNAL - CERTO É QUE ATÉ O REGIME DE PROVA E REGRA DE CONDUTA APLICÁVEIS SE ACHAM EXCESSIVAS E DESADEQUADAS AO CASO CONCRETO, PORQUANTO O ARGUIDO DEMONSTROU UMA VONTADE INEQUÍVOCA E SINCERA DE SEGUIR EM FRENTE COM A SUA VIDA, DE NÃO CONTACTAR COM A OFENDIDA E DE RETOMAR A SUA VIDA PROFISSIONAL COMO SKIPPER, O QUE SÓ PODERÁ FAZER SE LHE FOR PERMITIDO SAIR DO TERRITÓRIO PORTUGUÊS. 164.… 165.AO NÃO TER ASSIM ENTENDIDO, O TRIBUNAL A QUO OSTENSIVAMENTE VIOLOU, PORTANTO, O DISPOSTO NOS ARTS.º 71.º,72.º,73.º E 74.º CP. …
…
3. O Ministério Público veio responder ao recurso, concluindo pela sua total improcedência.
4. O Exmo Procurador Geral Adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer …
5. O arguido veio responder ao parecer, concluindo nos mesmos termos do recurso.
Cumpre decidir
II. Fundamentação
Como é consensual, quer na doutrina quer na jurisprudência, são as conclusões extraídas pelo recorrente da motivação, sintetizando as razões do pedido, que definem e determinam o âmbito do recurso e os seus fundamentos, delimitando para o tribunal superior as questões a decidir e as razões por que devem ser decididas em determinado sentido, sem prejuízo do conhecimento oficioso de certos vícios e nulidades, ainda que não invocados ou arguidas pelos sujeitos processuais. Antes, porém, de enunciarmos as questões a decidir, importa previamente tomar posição sobre a pretendida reação por parte do recorrente, através do presente recurso, ao seu estatuto coativo. Como decorre da sentença recorrida, o tribunal da primeira instância após a prolação da decisão condenatória, veio ao abrigo do disposto no artigo 375º, nº4 do CPP, pronunciar-se sobre o estatuto coativo do arguido. Dispõe o citado artigo 375º, o seguinte: No caso vertente, a Mma Juiz entendeu ser necessário pronunciar-se a respeito do estatuto coativo do arguido, exarando, a tal respeito, o seguinte: “Atendendo ao disposto no artigo 375.º, n.º 4 do Código de Processo Penal, e uma vez que a factualidade que justificou a aplicação das medidas coactivas a que o arguido se encontra sujeito, desde a sua sujeição a primeiro interrogatório de arguido detido (designadamente proibição de contactos e de aproximação à ofendida e proibição de se ausentar do território nacional) se consolidou na prova produzida em audiência de discussão e julgamento e na presente sentença, devem manter-se inalteradas as mesmas medidas de coacção, até ao trânsito em julgado da vertente decisão. Sendo certo que o arguido verbalizou não mais pretender manter qualquer contacto com a ofendida, tendo ficado patente que entre ambos existiu uma relação de acentuada dependência emocional e manipulação, pautada por provocações de parte a parte, não pode ser ignorado nem diminuído o perigo de continuação/repetição da actividade criminosa, designadamente em reacção negativa do arguido ao desfecho dos presentes autos, e consequente retaliação. Consigna-se, ainda, que o Termo de Identidade e Residência prestado pelo arguido manter-se-á até à extinção da pena, extinguindo-se as demais medidas de coacção aplicadas ao arguido com o trânsito em julgado da sentença condenatória - cfr. Artigo 214.º, n.º 1, al. e) do Código Processo Penal”. Compulsados os autos, via eletrónica, evola dos mesmos que logo após a prolação da sentença recorrida, esta ocorrida em 18/12/2024 ,e na sequência do aí decidido a respeito do seu estatuto coativo, o arguido, ora recorrente, através de requerimento apresentado em 22/12/2024, veio requerer a alteração/revogação do seu estatuto coativo, designadamente no que respeita à proibição de se ausentar do território nacional, com a consequente devolução do seu passaporte, considerando que as suas circunstâncias pessoais e a sua conduta durante o julgamento revelam não subsistirem quaisquer razões para temer pela fuga ou sequer por qualquer atividade criminosa. Por sua iniciativa, o arguido provocou, deste modo, nova decisão a respeito do seu estatuto coativo, tendo o tribunal, por despacho proferido em 23/12/2024 (referência 109405994), tomado posição sobre tal requerimento, indeferindo-o, por, no seu entender, inexistirem quaisquer circunstâncias inovadoras, suscetíveis de, ao abrigo do artigo 212, do CPP, alterarem o estatuto coativo do arguido, o qual se manteve nos seus exatos termos. Deste despacho veio o arguido a ser notificado, não tendo, todavia, reagido contra o mesmo, interpondo o respetivo recurso. Ora, reapreciado que foi o estatuto coativo do arguido através do referido despacho proferido no dia 23/12/2024 e tendo este transitado em julgado, carece de qualquer efeito útil reagir-se contra o que, a tal respeito, foi anteriormente decidido. A decisão que passou a vigorar relativamente ao estatuto coativo do arguido - na sequência, aliás, do seu impulso processual, foi a proferida em 23/12/2024 – sem prejuízo de tal estatuto poder ser alterado (revogado ou substituído), a qualquer momento, até ao transito em julgado, nos termos previstos no artigo 212º do CPP, designadamente a requerimento do arguido, cabendo recurso de tais decisões - e esta está transitada em julgado, pois não foi interposto recurso do respetivo despacho. Em suma, proferida nova decisão (após a prolação da sentença) a respeito do estatuto coativo e transitada que se mostra tal decisão que o reapreciou, tal matéria não será objeto de conhecimento, por parte deste tribunal, no recurso ora interposto da sentença condenatória.
Feita esta delimitação, as questões a apreciar são então as seguintes: - Da nulidade por desconexão absoluta entre a decisão e os autos. - Da valoração de prova proibida. - Da Impugnação da matéria de facto com fundamento em erro de julgamento. - Do não preenchimento dos crimes pelos quais foi condenado. - Da excessividade medida concreta das penas parcelares aplicadas. - Da excessividade e desadequação do regime de prova e regras de condutas imposta na suspensão da execução da pena de prisão. “(…) III. Fundamentação de Facto 3.1. Factos provados Apreciada a prova produzida, resultaram como provados os seguintes factos relevantes para a boa decisão da causa: 1. O arguido conheceu P… em Julho de 2019, na Indonésia, e iniciaram uma relação amorosa em Março de 2020. 2. Durante cerca de dois anos, até Novembro de 2021, passaram algumas temporadas juntos na ilha de ..., mas o arguido vivia num iate e a ofendida em sua casa, na localidade/ilha de .... 3. Pouco tempo depois de começarem a namorar, ainda em 2020, o arguido começou a discutir frequentemente com a ofendida, sempre que era contrariado por ela, demonstrando ser muito possessivo, controlador e ciumento. 4. Nessas discussões, que ocorreram pelo menos uma vez por mês entre 2020 e o final de 2021, o arguido gritou com a ofendida e proferiu-lhe expressões como as seguintes: “és uma estúpida!” e “Um dia destes vou incendiar o teu apartamento de Londres!. 5. Muitas vezes, na decorrência dessas discussões, o arguido apertou o pescoço, puxou os cabelos, desferiu socos e arrastou a ofendida pelo chão. 6. Em virtude das descritas agressões, em duas ocasiões a ofendida ficou com os olhos negros, e em virtude de um soco abriu o sobrolho esquerdo, onde mantém uma cicatriz até aos dias de hoje. 7. Noutra das discussões que manteve com a ofendida, o arguido mergulhou o computador da mesma numa piscina, impossibilitando a sua utilização. 8. O arguido bem sabia que o computador era o instrumento essencial para a profissão da ofendida, que é web designer. 9. Em Novembro de 2021 o arguido regressou a Portugal e a ofendida voltou a Londres. 10. Em Junho de 2022 a ofendida veio para Portugal, tendo passado a viver com o arguido, como se fossem casados, na habitação sita na Rua …. 11. A partir do mês de Agosto de 2022 as discussões passaram a ser mais frequentes, e o arguido voltou a atingir a ofendida, com puxões de cabelo e chapadas. 12. Na decorrência dessas contendas, o arguido rasgou várias vezes peças de roupa da ofendida e, pelo menos uma vez, partiu-lhe o telemóvel. 13. Numa dessas agressões, que ocorreu no mês de Agosto de 2022 no interior da habitação comum, o arguido desferiu uma chapada na cara da ofendida, que lhe deixou um olho negro. 14. No mês de Novembro de 2022 o contrato de trabalho da ofendida terminou, e a partir dessa data foi o arguido quem passou a assegurar o pagamento de todas as despesas do agregado familiar. 15. A partir de então, nas discussões que continuaram com frequência pelo menos semanal, o arguido por várias vezes expulsou a ofendida de casa, sendo que esta por diversas vezes teve de pernoitar no interior do seu veículo. 16. Em dia não apurado do mês de Abril de 2023, após discutir com a ofendida, o arguido arrastou-a até ao carro e conduziu-a até um lugar ermo, em localização não concretamente apurada, obrigando-a a sair do carro, dizendo que se ia embora. Contudo, e após insistência por parte da ofendida, acabou por a trazer de volta a casa. 17. No início do mês de Maio de 2023 a ofendida foi passar uns dias em casa de uma amiga. 18. O arguido não deixou que ela levasse o telemóvel nem o computador, alegando ter sido ele a pagá-los. 19. No dia 17 de Maio de 2023, ao final do dia, no interior da habitação e na presença da irmã e mãe da ofendida (que aí estavam alojadas a passar uma semana de férias), o arguido discutiu com P… pelo facto de ela ter accionado o alarme da loja onde ambos trabalham, sem querer. 20. Na decorrência dessa discussão, o arguido gritou com a ofendida e, dirigindo-se às três, disse: “Esta é a minha casa! Podem arrumar as vossas coisas e ir embora as três!” 21. No dia seguinte, ao início da noite, o arguido dirigiu-se à loja de ambos, em ..., local onde estava a ofendida, discutir com ela, acabando por lhe retirar a chave do carro. 22. A ofendida disse ao arguido que queria ir buscar as suas coisas a casa, o que aconteceu. 23. Assim que a ofendida, acompanhada pela sua mãe e irmã, chegaram à habitação de ambos, o arguido continuou a discutir, dizendo-lhe que ela não ia para lado nenhum. 24. Nesse momento a irmã da ofendida, D…, pediu ao arguido que tivesse calma. 25. De imediato o arguido agarrou D…, arrastou-a até à porta de casa, pontapeou-a e colocou-a na rua. 26. Após, o arguido retirou das malas a roupa que a ofendida aí tentava guardar. 27. A ofendida conseguiu agarrar a mala e quando se preparava para descer as escadas interiores da habitação foi empurrada pelo arguido, tendo caído. 28. Devido aos gritos que ouviram, os vizinhos chamaram a GNR, que em poucos minutos chegou ao local. 29. O arguido estava no interior do quarto com a ofendida, que gritava por socorro, impedindo-a de sair. 30. Apesar de interpelado pelos militares para deixar a ofendida sair do quarto, o arguido saiu sozinho e colocou-se à frente da porta, impedindo a passagem. 31. Apesar da oposição do arguido, os militares conseguiram retirar a ofendida do quarto e conduziram-na até ao piso inferior da habitação. 32. Descontrolado e irritado, o arguido tentou seguir no encalço da ofendida, tendo sido impedido pelos militares. 33. Nesse momento, e verificando que o Guarda D… estava no cimo das escadas do apartamento, o arguido empurrou-o, fazendo-o perder o equilíbrio. 34. Verificando que não conseguia aceder às escadas, o arguido decidiu então atirar-se da varanda do andar de cima, em direcção à sala da habitação, o que fez. 35. Devido aos factos acima descritos, P… sofreu dores e sentiu medo e inquietação. 36. A ofendida sentiu-se controlada, pressionada e humilhada. 37. O arguido agiu sempre com o propósito conseguido de agredir física e psicologicamente P…, fazendo-a temer pela sua integridade física, e de lhe causar, como efectivamente causou, dores, humilhação, sofrimento e medo, bem sabendo que as suas condutas eram adequadas a provocar tais resultados. 38. Nunca se coibiu de agir conforme descrito mesmo quando se encontravam no interior da habitação comum, local onde a ofendida se deveria sentir mais segura e protegida, e apesar de saber que a mesma estava em Portugal apenas devido à relação amorosa que mantinha com ele, não contando com qualquer apoio familiar e tendo poucos amigos. 39. Por força da agressão descrita, D… sofreu dores na parte do corpo atingida. 40. Ao atingir, conforme descrito, o corpo de D…, o arguido bem sabia que a molestava fisicamente e que lhe causava, como causou, dores, o que quis. 41. O arguido bem sabia que D… era militar da GNR, que estava devidamente uniformizado e actuava no exercício das suas funções e que, por isso, exercia autoridade pública. 42. O arguido agiu em todos os momentos de modo consciente e voluntariamente, bem sabendo ser a sua conduta proibida por lei e tinha a liberdade necessária para se determinar de acordo com essa avaliação.
Mais foi possível apurar: 43. Uma das situações em que a ofendida ficou com olho negro, conforme descrito em 6., ocorreu devido a uma chapada desferida pelo arguido. 44. Durante a relação mantida entre o arguido e a ofendida P…, esta última também demonstrou ser possessiva, controladora e ciumenta em relação ao arguido. 45. Várias das discussões mantidas entre o arguido e a ofendida foram iniciadas por esta, e motivadas por ciúmes. 46. A ofendida P… proibia o arguido de manter contacto com a ex-companheira, C…. 47. No seguimento das situações em causa nos autos, a ofendida P… foi diagnosticada com stress pós-traumático e depressão, mantendo acompanhamento psicológico.
Das condições socioeconómicas do arguido: 48. Actualmente o arguido reside com a sua mãe, em casa desta. 49. O arguido não tem filhos. 50. O arguido é proprietário de lojas, algumas fora do território nacional, que são geridas pela irmã, recebendo contrapartidas económicas garantidas pela mãe e irmã, num montante mensal de cerca de € 900,00 euros. 51. Enquanto despesas extraordinárias, o arguido despende a quantia mensal de 250,00€ para liquidação da quantia devida pela aquisição de computadores portáteis. 52. Habilitado com o 9º ano de escolaridade e um curso técnico de Programação de informática e gestão de empresas, o arguido abandonou a escola aos 17 anos de idade para criar o seu próprio negócio relacionado com a comercialização de produtos ligados ao surf. 53. Para além da prática deste desporto, também trabalhou como monitor e, exerceu diversas actividades náuticas, principalmente como “skipper” de embarcações à vela (foi proprietário de um veleiro) que implicaram mobilidade por diversos países, tendo estado fora do território nacional nos últimos 15 anos (até 2019) 54. Paralelamente, manteve várias lojas de artigos de praia e surf, algumas delas fora do território nacional. 55. Na actualidade, o arguido pretende retomar a actividade de “skipper”, tendo uma oferta de trabalho para iniciar funções em Fevereiro de 2025. 56. Mantém-se ocupado a receber os turistas no alojamento local propriedade da mãe e a recuperar um imóvel, do qual é comproprietário com um irmão. 57. O arguido admite ter mantido hábitos aditivos no passado, referindo o início de consumos de heroína e cocaína durante a adolescência, com um internamento em comunidade terapêutica, em 2004 durante cerca de 5 meses. 58. Ao longo dos últimos anos, refere consumos pontuais de cocaína, embora não os considere disruptivos. 59. Foi acompanhado por um médico particular que lhe prescreveu “subtex”, substância a que recorre como estratégia de prevenção de recaída, sobretudo quando permanece mais tempo na região de ..., reconhecendo que a pressão do grupo de pares pode favorecer algum descontrolo comportamental. 60. Após a sua libertação do estabelecimento prisional, no âmbito destes autos, o arguido retomou consumos de cocaína. 61. Nesse seguimento, o arguido sujeitou-se a internamento voluntário em comunidade terapêutica para tratamento da sua dependência química e a bebidas alcoólicas, entre 24 de Setembro de 2024 e meados do mês de Novembro de 2024. 62. Na actualidade, o arguido tem tido acompanhamento psiquiátrico para manutenção de estabilidade emocional, estando medicado com Olanzapina e Buprenorfina. 63. O arguido não regista antecedentes criminais no Certificado de Registo Criminal. * 3.2. Factos não provados A. Que o arguido e a ofendida HH iniciaram uma relação amorosa em Janeiro de 2020. B. Que o arguido começou a manter os comportamentos descritos em 3. nos primeiros três meses de 2020. C. Que as discussões entre o arguido e HH, entre 2020 e o final de 2021, ocorreram pelo menos uma vez por semana, bem como que no âmbito das mesmas o arguido tenha proferido à ofendida as expressões “és uma inútil!”, “Se algum dia me deixas eu mato-te! Mato-te a ti e depois mato-me também!” e “Vou dizer a toda a gente que és uma puta!”. D. Que o arguido alguma vez, na decorrência das discussões descritas em 4. e 5., tenha desferido pontapés à ofendida. E. Que o descrito em 5 tenha ocorrido, no período mencionado, com frequência pelo menos mensal. F. Que durante o período compreendido entre 2020 e o final de 2021, a ofendida tenha ficado com os olhos negros num total de três vezes. G. Que em Novembro de 2021 a ofendida tenha voltado Londres exclusivamente com a finalidade de recuperar o seu computador e material de trabalho. H. Que no contexto factual descrito em 11., o arguido atingido a ofendida com pontapés. I. Que nesse mesmo contexto descrito em 11., o arguido tenha atingido a ofendida com puxões de cabelo e chapadas com a frequência semanal. J. Que o arguido tenha partido o telemóvel da ofendida quatro vezes. K. Em dia não apurado do final do mês de Abril de 2023, o arguido discutiu novamente com a ofendida, no interior da habitação comum, e desferiu-lhe cerca de vinte pancadas com a mão na cabeça. L. Devido ao medo que sentiu, e ainda atordoada, a ofendida conseguiu fugir de casa e refugiar-se na habitação de um vizinho. M. Que nas circunstâncias descritas em 17 e 18 o arguido tenha proferido à ofendida expressões como as seguintes: “Tens amantes! Tu andas a trair-me!”. N. Que a discussão descrita em 21. tenha sido motivada pelas mesmas circunstâncias descritas em 20., sendo uma continuação da discussão iniciada no dia anterior. O. Que nas circunstâncias descritas em 24., o arguido tenha escondido o passaporte da ofendida. P. Que os factos ora vertidos em 24. e 25., respeitantes a BB, tenham ocorrido depois da situação descrita em 26 e 27 (respeitante ao empurrão desferido pelo arguido à ofendida). Q. Que no seguimento do descrito em 27., o arguido tenha puxado os cabelos à ofendida. R. Que na sequência do vertido em 33, o militar AA apenas não caiu pelas escadas porque se conseguiu agarrar ao corrimão. S. Que após o descrito em 33, o arguido se tenha aproximado outra vez do Guarda AA e desferiu-lhe vários empurrões, de modo a retirá-lo do caminho para conseguir alcançar a ofendida. T. Que, devido aos factos descritos e provados, HH tenha vivido em constante estado de pânico e temor. U. Que a ofendida tenha sentido medo do arguido que a impede de fazer a sua vida normal, ou se se tenha sentido perseguida pelo mesmo. V. Que o arguido tenha agido sempre com o propósito conseguido de amedrontar e perseguir HH, fazendo-a temer pela sua vida. W. Que o corpo da ofendida BB tenha sido atingido em mais do que uma parte. X. Em resultado dos empurrões descritos, o Guarda AA sentiu dores. Y. Que o arguido empurrou o Guarda AA com a intenção de incumprir as ordens que lhe eram dadas, bem sabendo que as mesmas eram legítimas e emanadas de autoridade competente. Z. Que soubesse o arguido que a sua atitude - ao desferir os mencionados empurrões – era idónea a molestar o corpo e afectar a saúde do militar, tendo agido com esse propósito, o que logrou. * 3.3. Motivação da matéria de facto Vigorando o principio da livre apreciação da prova no ordenamento jurídico processual penal português, salvo quando a lei disponha de forma diversa, a apreciação da prova, quando legalmente produzida, deve ser feita de acordo com as regras de experiência e livre convicção da entidade julgadora (artigo 127.º do Código de Processo Penal), sujeita tal produção ao principio da imediação e contraditório (artigo 355.º do mesmo diploma legal), e que tanto pode assentar em prova directamente colhida como em prova indiciária. No caso em apreço o Tribunal formou a sua convicção tendo por base a análise crítica das provas produzidas em audiência de julgamento, analisadas à luz das regras da experiência comum e segundo juízos lógico-dedutivos, assim considerando as declarações do Arguido, bem como os depoimentos das testemunhas … Ademais, foi também tida em consideração a prova documental existente nos autos, nomeadamente a correspondente a Auto de notícia por detenção de fls. 8 e ss; fotografia de fls. 266; a transcrição e tradução de gravação de fls. 235 a 241; os documentos, mensagens e prints juntos pela defesa do arguido, a fls. 352 a 391; Certificado de Registo Criminal de ref. citius n.º 11432278; como ainda Relatório Social de ref. citius n.º 10786596. O arguido, tendo prestado declarações nos autos, note-se apenas após a produção da demais prova, resumidamente negou categoricamente todos os factos que lhe vêm imputados no libelo acusatório, oferecendo uma versão diversa de alguns deles, e dando a entender ser vítima de violência perpetrada pela ofendida, bem como de um plano de vingança deliberadamente orquestrado pela mesma para o prejudicar. … Contrariamente, P… relatou muitas das situações descritas na acusação, de forma espontânea, circunstanciada, sem contradições demonstrativas de vontade de faltar à verdade, nem especial intenção de prejudicar o arguido além da sua responsabilização pelos factos que efectivamente contra si foram cometidos, tendo esclarecido todos esses factos de forma concatenada e séria, o que levou a que o Tribunal considerasse como provados os factos vertidos em 1 a 23, 26 a 32, 35 a 38 e 43 a 47, bem como não provadas as circunstâncias descritas em A a Q e T a V (estes seja por contradição com o seu depoimento, como por absoluta inexistência de prova contundente). … Ora, não se olvidando que a prova produzida por testemunha na qualidade de vítima não deverá ser a única valorada, não podendo as decisões deixar de ser objectiváveis e alicerçadas nas regras da experiencia comum, e nunca tendo por base uma convicção apriorística ou pura fascinação por uma tese ou versão unilateral dos acontecimentos, certo é que, na presente situação, não só as declarações de P… se mostram particularizadas quanto aos momentos de actuação e formas de actuação do arguido, como se mostram em consonância com outros elementos de prova, como se passará a expor. Ademais, importa referir que, quanto à credibilidade da versão apresentada pela ofendida, não colhe o argumento do arguido de que a mesma tenha premeditado todo o seu relato, de forma ardilosa, fria e calculista, apenas e exclusivamente para se vingar do arguido ou ganhar acesso às contas bancárias do mesmo, bem como ao portátil e telemóvel, na medida em que, antes de mais, a mesma não tinha forma de prever as reacções e comportamentos do arguido na noite de 18 de Maio de 2023, tanto é que o mesmo foi detido pelo seu comportamento errático, especialmente o descrito em 34 (verificando que não conseguia aceder às escadas e aproximar-se da ofendida, o arguido decidiu então atirar-se da varanda do andar de cima, em direcção à sala da habitação, o que fez). … É ainda por essa mesma razão que também não colhe a alegação da defesa do arguido em como a ofendida prestou depoimento preparado e recorrendo a auxiliares de memória, tendo o Tribunal estado atendo a evidências de tal possibilidade, que não se verificaram, antes tendo a vítima prestado relatos sempre espontâneos e serenos. De referir, numa outra senda, que vários factos relatados pela ofendida encontram ainda sustento na demais prova existente nos autos, como a transcrição e tradução da gravação realizada pelo arguido e junta aos autos a fls. 235 a 241, de que se depreende a discussão nesse dia mantida pelo arguido com a ofendida de forma obsessiva, manipuladora, com sentimentos de ciúme e possessão. Mais se denota que, tanto no âmbito dessa discussão gravada e transcrita, como também nas mensagens transcritas e juntas pelo arguido aos autos em sede de inquérito e contestação, existem mensagens da ofendida dirigidas ao arguido a questioná-lo se lhe vai bater novamente, mensagens e conversações essas mantidas entre ambos em data anterior ao início dos presentes autos e que, embora não façam prova directa sobre essas agressões, indiciam que as mesmas existiram, tendo a ofendida confrontado o arguido com as mesmas em data anterior à sua detenção. Também não se pode depreender da postura da ofendida em sede de audiência de julgamento, que a mesma não tenha, conforme foi alegado, postura e evidências de ter sido vítima de violência doméstica. Primeiramente considera-se inadmissível e contrário aos princípios basilares de Direito extrair as pretendidas conclusões meramente através da postura de uma testemunha em sede de julgamento. Por outro lado, tal como é experiência comum e normalidade do acontecer, cada indivíduo, enquanto ser humano, tem formas diferentes de lidar e processar as situações, emoções, sentimentos e traumas vivenciados, bem como díspares mecanismos de enfrentamento, sendo a psicologia uma ciência de profunda complexidade. Num conspecto distinto, se é certo a ofendida realmente fez questão de levar consigo um computador portátil que arroga ser seu porque era por si usado e foi comprado pelo arguido, segundo a mesma entende, para substituição do que o mesmo danificou na Indonésia, essa circunstância não pode ser considerada como suficiente para a sua versão dos factos e teor do seu depoimento e relato sejam invalidados. Por fim, admitiu a arguida que também ela era ciumenta em relação ao arguido, bem como suspeitosa de vários dos seus comportamentos. Efectivamente, das mensagens juntas aos autos pela defesa do arguido denota-se tal característica, bem como alguma possessão e controlo por parte da ofendida, que também argumentava e iniciava discussões com o arguido, com persistência e possíveis faltas de respeito. J…, ex-companheiro da ofendida, relatou que a mesma era profundamente controladora e manipuladora, bem como, por vezes, agressiva e violenta. O arguido também relatou uma situação, em que a mesma lhe atirou um candeeiro e acertou com o mesmo na cabeça, porém não logrou densificar essa contenda, permanecendo em dúvida como é que a mesma aconteceu, em que contexto, e por que razão. A própria ofendida referiu que, não obstante as tentativas do arguido, sempre recusou ser uma mulher submissa e silente, fazendo questão de manifestar as suas opiniões e de debater os desentendimentos entre ambos. No entanto, tais circunstâncias não se podem considerar como reciprocidade de maus tratos, pois não se pode ignorar que o género humano é naturalmente defensivo e comummente reactivo, por isso, no âmbito das discussões várias mantidas entre o ex-casal, são manifestações, pelo menos, humanamente esperadas (embora possivelmente ilícitas se abstractamente apreciadas), as reacções e comportamentos apurados e alegados da ofendida, reacções e comportamentos esses que não têm a virtualidade de desqualificar de forma alguma a conduta errática do arguido. Tais eventuais comportamentos da vítima, repita-se, não concretamente apurados, porque não densificados pelo arguido, nunca poderiam desqualificar ou sequer equiparar-se às que resultam provadas como praticadas por este, uma vez estas extravasaram qualquer limite que se pudesse considerar por característico no âmbito de uma relação disfuncional (vulgo tóxica) de parte a parte e em igual medida, pois ficou como provado, além de tudo o mais, que o arguido em pelo menos três ocasiões distintas desferiu chapadas e socos no rosto da ofendida, que lhe causaram dores e hematomas na zona ocular. Note-se, aliás, que o arguido nunca admitiu sequer existir reciprocidade nos comportamentos agressivos, apenas dizendo que a ex-companheira é que era a única agressora da relação. Pelo contrário, resultam provadas várias condutas do arguido que, são muito graves e motivados por ciúmes, possessão, menosprezo e em função da circunstância de a mesma ser sua companheira à data. Se é certo que todos estes comportamentos conjugados, demonstram personalidades algo obsessivas de ambos, o arguido com facilidade utilizava a agressão física como forma de exercer ascendente sobre a ofendida. De facto, pese embora também se tenha provado que a ofendida chegou a iniciar discussões com o arguido, admitindo-se como possível que tenha humilhado ou injuriado o mesmo, bem como que também tinha uma personalidade ciumenta e possessiva, tal não atinge dimensão suficiente para concluir que os maus tratos eram recíprocos a tal ponto que se anulassem mutuamente. Por todo o exposto, no que concerne ao juízo valorativo acerca da factualidade atinente aos fins com que o arguido agiu, ao conhecimento e vontade com que actuou, bem como à sua consciência quanto à ilicitude das condutas levadas a cabo contra a ofendida P…, foi a mesma factualidade extraída das condutas que objectivamente se apuraram, analisadas à luz das regras da lógica e da experiência comum, em conjugação com aquilo que foi parcialmente admitido pelo arguido e todos os raciocínios supra indicados. Aqui chegados, numa distinta perspectiva, a factualidade que resulta como provada em relação à ofendida D… decorre do depoimento prestado pela própria, que relatou as circunstâncias em que o arguido, na noite de 18 de Maio de 2023, na residência que até àquela data partilhava com P…, a pontapeou quando a mesma estava de costas e a ser empurrada para fora da casa, tendo sido atingida na perna direita. Também a sua mãe, W…, relatou que, quando estava, nessa ocasião, no andar de cima a fazer as malas, ouviu um berro da sua filha BB vindo do andar de baixo, bem como um barulho de fechar de uma porta com muita força. … Ademais, no que concerne ao juízo valorativo acerca da factualidade atinente aos fins com que o arguido agiu contra a ofendida D…, bem como ao conhecimento e vontade com que actuou, e à sua consciência da ilicitude dessa conduta, foi a mesma factualidade extraída das condutas que objectivamente verificadas, também aqui analisadas à luz das regras da lógica e da experiência comum, em conjugação com aquilo que foi parcialmente admitido pelo arguido. De outro prisma, no que importa à factualidade imputada ao arguido em relação ao Militar da GNR D…, relatou o mesmo que o primeiro empurrão foi pelas costas, tendo ficado com a percepção que o arguido tentava passar para se aproximar da vítima. Nesse seguimento, o depoente, que prestou um testemunho em tudo credível e circunstanciado, virou-se para falar o arguido, empurrou o mesmo para que este recuasse, tendo este continuado a tentar passar e descer as escadas, assim tocando no seu corpo, de forma que se pode classificar como um empurrão, mas nunca denotou que o arguido o queria agredir, mas antes passar e argumentar que a ofendida não podia levar um computador e um telemóvel, sendo esse o seu mote. Assim sendo, fica patente a dúvida se algum dos empurrões no corpo do militar foram impetrados pelo arguido com intensão, mesmo que eventual, de atingir e ofender o corpo do mesmo, dúvida essa inultrapassável e que implica a aplicação do princípio in dubio pro reu e, consequentemente, a conclusão de que tais factos não devem resultar como provados tal como descritos na acusação pública. Por fim, o facto dado como provado atinente à inexistência de antecedentes criminais do Arguido (63) resulta do teor do Certificado de Registo Criminal que lhe respeita, enquanto as suas condições pessoais, socais e económicas (factos 48 a 62) decorrem das declarações prestadas pelo mesmo em sede de audiência de discussão e julgamento, prestadas de forma serena e espontânea, merecendo credibilidade, em conjugação com o teor do relatório social elaborado pela DGRSP e remetido aos autos. ** IV. Fundamentação de Direito …
4.1. Do crime de Violência Doméstica … * ii) Subsunção dos factos ao tipo incriminador de Violência Doméstica Agravada Resultou provado nos presentes autos que o arguido e a ofendida P… mantiveram uma relação amorosa, primeiramente de namoro, e posteriormente análoga à dos cônjuges, entre Março de 2020 e 18 de Maio de 2023 (embora com alguns períodos de separação). Durante a subsistência da relação com a ofendida, o Arguido impetrou comportamentos dirigidos à mesma que são abstracta e concretamente enquadráveis no conceito de maus tratos, nomeadamente tendo-lhe dirigido, em mais do que uma ocasião, expressões injuriosas, actos que ofenderam a sua integridade física, honra, e dignidade, actos contra a propriedade da ofendida, e ainda actos que a atormentaram e fizeram recear pela sua segurança, sendo que algumas de tais situações ocorreram no interior da habitação comum. No que respeita às condutas mantidas pelo arguido, importa começar por afirmar que, não se ignorando o princípio da subsidiariedade, importa salientar, uma vez mais, que não foi possível concluir, no presente caso concreto, que todas, ou sequer algumas das situações imputadas ao aqui arguido se tratassem de discussões mútuas e provocações e agressões de parte a parte. Ainda que assim se entendesse, sempre se diria que os comportamentos impetrados pelo arguido extravasaram essa eventual e abstracta subsunção, tendo este exercido verdadeiros maus tratos psicológicos sobre a ofendida, de forma reiterada, com intensão de a agredir, humilhar e menosprezar, bem como de a dominar e exercer ascendente sobre a mesma. … Assim, não só não existiu reciprocidade, como a exclusividade do ambiente de violência doméstica é da autoria do arguido, que reagia com violência às problemáticas que a ofendida suscitava. Embora se haja apurado que a ofendida (admitido pela mesma) iniciou várias discussões com o arguido por motivos de ciúmes e receio de infidelidade, contudo, nos autos, não resultou qualquer elemento que permitisse sustentar a mesma como exclusiva, principal ou sequer agressora em igual medida. Antes pelo contrário, resulta da prova produzida que, como já se referiu, o ambiente de intimidação e violência física era exclusivamente provocado pelo arguido, embora por vezes em reacção às discussões iniciadas pela ofendida. Se é certo que todos estes comportamentos conjugados demonstram personalidades algo obsessivas de ambos, o arguido com facilidade utilizava a agressão física como forma de exercer ascendente sobre a ofendida. De facto, pese embora também se tenha provado que a ofendida chegou a insultar o arguido e que também tinha uma personalidade ciumenta e possessiva, tal não atinge dimensão suficiente para concluir que os maus tratos eram recíprocos a tal ponto que se anulassem mutuamente. Nesta conjuntura, o Arguido atingiu a ofendida na sua integridade psíquica, liberdade de autodeterminação e sentido de segurança, assim como na sua honra e consideração, dirigindo-lhe condutas e expressões humilhantes e atemorizadoras, causando-lhe sofrimento, limitando-a na sua liberdade pessoal e colocando em causa a sua paz e sossego. Assim, as condutas impetradas pelo Arguido assumiram gravidade do ponto de vista das ofensas da integridade psíquica e emocional da ofendida, bem como a sua integridade física, o que se traduz num tratamento degradante da sua pessoa, integrando o conceito de maus tratos físicos e psíquicos. Nesta medida, entende o Tribunal que se têm por preenchidos os elementos objectivos do crime de violência doméstica, ao que acresce que, uma vez que o Arguido agiu com dolo directo, se encontra igualmente preenchido o elemento subjectivo do tipo, devendo, portanto, concluir-se que o Arguido praticou, em autoria material e na forma consumada o aludido ilícito criminal. Ao exposto acresce que várias das situações subsumidas ao conceito de maus-tratos foram praticadas pelo arguido no interior e na reserva da residência comum, razão pela qual se verifica preenchida a circunstância agravante do crime, prevista no n.º 2, alínea a) do mesmo normativo legal. * 4.2. Dos Crimes de Ofensa à Integridade Física (Simples e Qualificada) i) Enquadramento jurídico-penal Ao ora arguido é ainda imputada a prática, em autoria material e na forma consumada, de 1 (um) crime de Ofensa à Integridade Física Simples, o. e p. pelo artigo 143.º do Código de Penal, na pessoa da ofendida D…, bem como de 1 (um) crime de Ofensa à Integridade Física na sua forma Qualificada, previsto e punido pelos artigos 143.º, n.º 1 145.º, n.ºs 1, al. a), e 2, ambos do Código Penal, na pessoa do Militar da GNR D…. … * … * ii) Subsunção dos factos ao tipo de Ofensa à Integridade Física Simples (ofendida D…): Resultou como provado nos autos que, efectivamente, no dia 18 de de Maio de 2023, durante a noite, e no interior da residência sita na Rua …, o arguido arrastou D…, até à porta de casa, pontapeou-a e colocou-a na rua. Ademais, ficou ainda apurado que, por força da referida agressão, a ofendida sofreu dores na parte do corpo atingida. Uma vez que, ao atingir, conforme descrito, o corpo de D…, o arguido bem sabia que o molestava fisicamente e que lhe causava, como causou, dores, o que quis e conseguiu, sempre consciente e voluntariamente, bem sabendo ser a sua conduta proibida por lei e tinha a liberdade necessária para se determinar de acordo com essa avaliação, actuou o Arguido a título de dolo directo, tal como resulta conceptualizado no artigo 14.º, n.º 1, do Código Penal, não se verificando causas de exclusão da culpa e/ou da ilicitude. Importa assim concluir pela comissão, pelo arguido, de um crime de ofensa à integridade física contra a aludida ofendida D…, previsto e punido pelo artigo 143.º n.º 1 do Código Penal, impondo-se a sua punição em conformidade, uma vez que se encontram preenchidos todos os elementos objectivos e subjectivo do tipo. * iii) Subsunção dos factos ao tipo de Ofensa à Integridade Física Qualificada (ofendido Militar da GNR …): Resultou como provado nos autos que, efectivamente, no dia 18 de Maio de 2023, durante a noite, e no interior da residência sita na Rua …, o arguido desferiu um empurrão no coro do Guarda D…, fazendo-o perder o equilíbrio. Não obstante, e pelas razões já expostas em sede de motivação da matéria de facto, não resultou provado que o arguido X empurrou o Guarda D… com a intenção de incumprir as ordens que lhe eram dadas, bem sabendo que as mesmas eram legítimas e emanadas de autoridade competente, ou sequer que o mesmo tenha agido com o propósito, mesmo que eventual, de molestar o corpo e afectar a saúde do militar, tendo agido com esse propósito. Mais não ficou apurado que o em resultado dos empurrões descritos, o Guarda D… sentiu dores. Assim sendo, não se encontrando provados todos os elementos essenciais ao preenchimento do crime de ofensa à Integridade Física contra o Guarda D…, seja na forma qualificada, sena na sua forma simples, deve o arguido ser absolvido da prática de tal crime, o que se decide. * 4.3. Das consequências jurídico-penais … * 4.3.1. Da escolha das penas Em primeiro lugar, importa recordar que a medida abstracta da pena aplicável ao crime de Violência Doméstica Agravada é de 2 (dois) a 5 (cinco) anos de prisão, não se encontrando assim estabelecida uma alternatividade de pena a nível principal, quanto a este crime importa passar-se à imediata determinação da medida concreta da pena de prisão, de acordo com a operação supra referida. Diferentemente, quanto ao crime de Ofensa à Integridade Física, é o mesmo punível com pena de prisão, entre 1 (um) mês e 3 (três) anos, ou multa, entre 10 (dez) e 360 (trezentos e sessenta) dias, nos termos do disposto nas disposições conjugadas dos artigos 41.º, n.º 1, 47.º, n.º 1, e 143.º, n.º 1, todos do Código Penal). … Neste âmbito, e tendo em conta o exposto, julga-se que, no caso concreto dos presentes autos, a pena de multa revela-se suficiente e adequada para a salvaguarda das exigências de prevenção evidenciadas pelo Arguido, tendo especialmente em consideração o grau de ilicitude dos factos e as circunstâncias em que os mesmos ocorreram, ao que acresce a inserção social e laboral do arguido, que revelam diminutas necessidades de prevenção especial, possíveis de ser salvaguardadas com a sua punição com pena não privativa da liberdade, mais havendo que ponderar a circunstância de o arguido não ter antecedentes. … * 4.3.2. Da medida concreta das penas … Tudo sopesado, o Tribunal entende por adequado e proporcional a aplicação ao Arguido J… as seguintes penas concretas: - pena de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão pela prática de 1 (um) crime de Violência Doméstica Agravado, … - 80 (oitenta) dias de multa relativamente ao crime de ofensa à integridade física – … -, à taxa diária de € 7,00 (sete euros) – tendo em consideração os rendimentos do Arguido e a inexistência de despesas fixas e regulares -, o que perfaz a quantia de € 560,00 (quinhentos e sessenta euros). * 4.3.2. Da Substituição da pena de prisão … Sopesando as circunstâncias supra expostas no contexto da determinação da medida concreta da pena de prisão, entre as quais se salienta que o Arguido se tem esforçado por manter uma boa integração social, em conjugação com as finalidades das penas e o dever de ponderação de penas não privativas da liberdade, entende este Tribunal que, no presente caso concreto, a suspensão da execução da pena se considera ainda suficiente e adequada, afigurando-se provável que a ameaça de prisão efectiva dissuadirá o Arguido de praticar novos factos (reforçada pela circunstância de o arguido já ter sido sujeito a prisão preventiva no âmbito destes autos), sendo assim possível fazer um juízo de prognose favorável de que as necessidades de prevenção geral e especial poderão ainda ser garantidas com o cumprimento da pena de prisão no seio da comunidade, mediante a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao Arguido, desde que de uma forma activa e mediante adopção de medidas dirigidas às problemáticas identificadas. Quanto à duração do período da suspensão, dispõe actualmente o artigo 50.º do Código Penal, no seu n.º 5 que “O período de suspensão é fixado entre um e cinco anos.”. Tendo em conta o normativo transcrito, entende-se que, em virtude de todo o exposto, se mostra adequado e proporcional suspender a pena de prisão aplicada ao Arguido por igual período de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses, que corresponde a uma medida acima do limite mínimo legalmente fixado, sendo tal ponderação resultante das concretas necessidades de ressocialização do Arguido, conjugadas com as razões supra elencadas para decisão de suspensão da pena de prisão, na medida em que, embora se tenha feito um juízo de prognose favorável quanto a tal medida, impõe-se assegurar as necessidades de prevenção da reincidência do Arguido, sendo que tais exigências deverão ser realizada de uma forma activa e mediante uma abordagem dirigida ao tipo de crime e bem jurídico em causa nos autos. Mais se considera que inexistem circunstâncias extraordinárias favoráveis ao arguido em tal medida que implique a fixação da duração da suspensão da pena em medida inferior à da pena concreta. Assim, tendo em conta que a presente condenação respeita a um crime de violência doméstica, importa ainda notar o que dispõe o n.º 1 do artigo 34.º-B, da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro, que “a suspensão da execução da pena de prisão de condenado pela prática de crime de violência doméstica previsto no artigo 152.º do Código Penal é sempre subordinada ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou ao acompanhamento de regime de prova, em qualquer caso se incluindo regras de conduta que protejam a vítima, designadamente, o afastamento do condenado da vítima, da sua residência ou local de trabalho e a proibição de contactos, por qualquer meio.” (sublinhados nossos). Também o artigo 52.º, n.º 1, al. c), do Código Penal preceitua que o Tribunal pode impor ao condenado o cumprimento de determinadas obrigações. Dado o exposto, entende-se que a suspensão da pena de prisão aplicada ao ora Arguido deve ser subordinada, nos termos do disposto no sobredito normativo, em conjugação com o preceituado nos artigos 50.º, n.ºs 2 e 3; 52.º, n.º 3; 53.º, n.ºs 1 e 2; e 54.º do Código Penal, e 34.º-B, n.º 1, da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro a: a) - regime de prova, assente num plano de reinserção social a elaborar e acompanhar pela DGRSP, (i) orientado para eventuais dificuldades do Arguido no que concerne à gestão da impulsividade e controlo das emoções activadoras da mesma, e que (ii) deverá contemplar Programa para Agressores de Violência Doméstica (PAVD), que «visa promover a consciência e assunção da responsabilidade do comportamento violento e a utilização de estratégias alternativas ao mesmo, objectivando a diminuição da reincidência», justificando-se a opção por tal programa pela impulsividade que o Arguido revelou na prática dos factos, bem como a intensidade dos mesmos; b) regra de conduta de sujeição do arguido a avaliação médica para apreciação das referidas problemáticas e da saúde mental, com eventual sujeição do mesmo ao respectivo acompanhamento psicológico ou tratamento psiquiátrico, caso seja indicado como necessário (tendo o Arguido prestado o seu consentimento em sede de Audiência de Discussão e Julgamento). * 4.3.3. Das Penas Acessórias Veio o Digno Ministério Público, em sede de acusação pública, pugnar pela aplicação ao Arguido das penas acessórias previstas nos n.ºs 4 e 5 do Artigo 152.º do Código Penal, … … Tendo em conta o exposto, e considerando o grau de ilicitude dos factos praticados pelo Arguido e a sua culpa intensa, ao que acresce a circunstância de existir notícia nos autos de que o mesmo tentou contactar a assistente, julga-se adequado e necessário aplicar a pena acessória de proibição de contactos com a vítima (por qualquer meio, físico ou telemático) e afastamento da sua residência e do seu local de trabalho. Não obstante, em face do apurado nos autos, entende-se não ser indispensável o recurso à fiscalização do cumprimento da medida por meios técnicos de controlo à distância. Mais se entende ser necessário e adequado, aplicar ao ora Arguido, a pena acessória de proibição de uso e porte de armas, em face das condutas impetradas pelo arguido e eventuais vontades de exercer retaliação contra a ofendida no seguimento dos presentes autos. Por fim, uma vez que a duração das presentes penas acessórias tem uma moldura de mínimo de 6 (seis) meses e máximo de 5 (cinco) anos, entende-se por proporcional a fixação da sua extensão temporal por um período de 3 (três) anos, em função de todas as circunstâncias já supra expostas em sede de determinação da pena, em especial as necessidades de prevenção especial e geral do arguido, conjugadas com as necessidades de protecção da ofendida, sobre quem o arguido tentou exercer ascendente, que importa ser forçosamente evitado, de maneira que permita à vítima prosseguir com a sua vida. ** 4.4. Do Arbitramento de Indemnização … Nesta senda, no caso sub judice devem assim ser consideradas as circunstâncias dadas como provadas nos autos, de onde resulta que a vítima, como consequência directa da conduta do Arguido, foi atingida na sua integridade física e psíquica, assim como na sua honra e consideração, tendo o Arguido impetrado condutas e expressões humilhantes e atemorizadoras à mesma, causando-lhe dor, sofrimento, limitando-a na sua liberdade pessoal e colocando em causa a sua paz e sossego, tudo resultando em concretas ofensas aos seus direitos de personalidade, nomeadamente integridade física, dignidade, honra e liberdade. Face ao que se deixa exposto, conclui-se pela responsabilidade do arguido por factos ilícitos, por violação do direito à liberdade e dignidade pessoal da vítima, por banda do arguido. Tais direitos são juridicamente tutelados como direitos de personalidade e absolutos, impondo-se, por isso, a todos um dever geral de respeito e de abstenção da prática de actos lesivos dos mesmos – cfr. artigos 25.º, 26.º, n.º 1, e 27.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa e 70.º, n.º 1, do Código Civil. Assim sendo, importa agora quantificar a indemnização a arbitrar. … Em face do exposto, socorrendo-se o Tribunal em juízos de equidade, decide-se arbitrar oficiosamente à vítima uma indemnização correspondente ao montante de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros). (…)”.
C)Apreciação do Recurso
- Da nulidade por desconexão absoluta entre a decisão e os autos
Insurge-se o recorrente com algumas desconformidades que detetou na sentença recorrida e que de forma expressa assinalou, as quais comina, mas mal, com o vício da nulidade da sentença. E mal, porquanto, constituindo causas de nulidade da sentença as elencadas nas três alíneas do nº1 do artigo 379º, do CPP, nelas não se incluem as desconformidades que assinalou. Tais desconformidades, efetivamente detetáveis no texto da decisão recorrida, na medida em que evidenciavam manifestos lapsos de escrita e ambiguidades decorrentes da utilização dos recursos informáticos e não importavam uma modificação essencial da decisão, foram já objeto de apreciação e correção por parte da julgadora ao abrigo do preceituado no artigo 380º do CPP, sob a epígrafe “Correção da sentença”, após a interposição do presente recurso, como decorre do despacho proferido em 27/01/2025 (referência 109685154). A este propósito, encontra-se vertido neste despacho, o seguinte: “(…) Apreciado o requerimento recursório no que a esta matéria diz respeito, bem como a decisão recorrida, verifica-se que, efectivamente, e por manifestos lapsos de escrita e ambiguidade decorrente de gestão dos recursos informáticos, pelos quais a signatária muito se penitencia, a sentença proferida nos autos contém algumas incorrecções e imperfeições na sua redacção, que cumpre celeremente reparar. Sucede, no entanto, que os lapsos de escrita e ambiguidades identificadas não importam modificação essencial da decisão recorrida, razão pela qual se determinam, ao abrigo do disposto no artigo 380.º, n.º 1, al. b) do Código de Processo Penal, as seguintes correcções da sentença: … Em face do supra exposto, determina-se que sejam tomadas as necessárias diligências de modo a corrigir os lapsos supra elencados [i), ii), iii), e iv)] nos lugares próprios. Notifique”. Por conseguinte e, em suma, reconhecidas e corrigidas as desconformidades invocadas pelo recorrente antes da subida do presente recurso a este Tribunal da Relação, mostra-se prejudicado o conhecimento da primeira questão levantada no presente recurso. Antes, porém, de entrar na análise das questões seguintes e porquanto trouxemos à liça o despacho proferido em 27/1/2025, convirá salientar que, com exceção da correção a que nele se procedeu, os demais considerandos ai tecidos pelo tribunal recorrido a respeito de outras alegadas nulidades por parte do recorrente, exorbitam o seu poder decisório, porquanto do conhecimento deste tribunal de recurso, nos termos do artigo 379º,nº2, do CPP. Ademais, a possibilidade legal de sustentar-se uma decisão objeto de recurso apenas está prevista nas situações em que o recurso não for interposto de decisão que conheça a final do objeto do processo. Dito isto, passemos então à apreciação da segunda questão supra enunciada.
- Da valoração de prova proibida.
Sustenta o recorrente que a sentença é nula por violação dos princípios da legalidade da prova, da imediação da prova, do contraditório, da vinculação temática, por nela se valorar prova não produzida, examinada ou lida em audiência. Segundo o recorrente, refere-se na motivação da decisão de facto que o tribunal levou em consideração “a prova documental existente nos autos, nomeadamente (…)a transcrição e tradução de gravação de fls. 235 a 241”, a qual não foi examinada nem lida em audiência, nem sequer arrolada na acusação pública ou na pronúncia, para além de que a respetiva gravação ocorreu sem o consentimento do arguido, que nem sequer sabia que tinha sido gravado. Sintetiza o recorrente que tal elemento probatório não poderia ter sido valorado pelo tribunal, o que a ter ocorrido fere a sentença de nulidade por valoração de prova produzida. Ora, compulsada a sentença recorrida na parte atinente à fundamentação da matéria de facto, evola com clareza da mesma que o tribunal recorrido, na ponderação a que procedeu das declarações da ofendida, atendeu, de facto, à transcrição e tradução de uma gravação áudio junta aos autos pela ofendida, elemento documental junto aos autos a fls. 235 a 241, a qual, no seu entender, permitiu sustentar alguns dos factos relatados por aquela. Como resulta dos autos (fls. 224 a 226), a ora ofendida, em sede de inquérito, através de um email remetido em 16 de junho de 2023, veio juntar aos autos alguns elementos de prova, entre os quais se conta uma gravação áudio de um diálogo entre ambos, que referiu ter sido feita pelo arguido com o telemóvel dela. Tal gravação, por determinação do Ministério Público, veio a ser objeto da respetiva transcrição e tradução (esta em virtude de o diálogo mantido ente o arguido e a ofendida ter sido em língua inglesa) (cf.fls.228 e 232), a qual se encontra a fls. 235 a 241 dos autos. Resulta igualmente dos autos que tais elementos probatórios foram dados a conhecer ao arguido, tendo, para o efeito, sido determinado à GNR que procedesse a interrogatório complementar do arguido para que tomasse conhecimento de todos os factos e documentos juntos aos autos pela ofendida (despacho do MP de fls. 242), interrogatório que veio a ocorrer, como resulta de fls. 273. Em momento algum o arguido fez menção a que não tivesse tido conhecimento de tais elementos probatórios, incluindo a respetiva transcrição e tradução áudio. De acordo com o artigo 355º, 1 do C.P.P., sob a epígrafe “Proibição de valoração de provas” a valoração de provas proibidas tem como consequência “não valerem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência”. Consagra expressamente este dispositivo legal afloramentos dos princípios da imediação e do contraditório, enformadores do nosso processo penal e que se traduzem, fundamentalmente, no facto de (em regra) toda a prova que serve para formar a convicção do julgador dever ser produzida ou examinada oralmente em audiência e ser objeto de apreciação, em contraditório, pelos sujeitos processuais. No caso vertente, é verdade que o elemento probatório em causa não se encontra expressamente elencado entre os meios de prova arrolados na acusação, ainda que já junto aos autos. Ademais, não se colhe das respetivas atas que tenha sido objeto de exame no decurso da audiência. Será, porém, que tal é impeditivo, à luz do citado preceito legal, de o tribunal o valorar na formação da sua convicção, uma vez junto aos autos desde a fase do inquérito? Claramente que não. Com efeito, todos os elementos documentais constantes dos autos podem ser valorados pelo tribunal para formação da convicção quanto à matéria de facto provada ainda que não debatidos e formalmente examinados em sede de audiência de julgamento, uma vez que a sua força probatória pode ser questionada e apreciada pelos sujeitos processuais a quem se encontra acessível e a quem fica assegurado o exercício do princípio do contraditório (cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Processo Penal, 2.ª edição, p.891). Aliás, vem o Supremo Tribunal de Justiça entendendo que «A exigência do art. 355.º, n.º 1 prende-se apenas com a necessidade de evitar que concorram para a formação daquela convicção provas que não tenham sido apresentadas e feitas juntar ao processo pelos intervenientes, com respeito pelo princípio do contraditório, e não que tenham de ser reproduzidas na audiência, isto é, lidas ou apresentadas formalmente aos sujeitos processuais todas as provas documentais dele constantes. Basta que existam no processo com pleno conhecimento dos sujeitos processuais, que puderam inteirar-se da sua natureza, da sua importância e do seu conteúdo, bem como do seu valor probatório, para que qualquer desses sujeitos possa, em audiência, requerer o que se lhe afigurar sobre elas, examiná-las, contraditá-las e realçar o que, do seu ponto de vista, valem em termos probatórios» (neste sentido, acórdão do STJ de 17/9/2009, in www.dgsi.pt). Também o Tribunal Constitucional se pronunciou no Acórdão n.º 87/99, de 10-2-99, sobre a interpretação da norma do artigo 355º do Código Processo Penal, que considerou não inconstitucional, no sentido de que os documentos juntos aos autos não são de leitura obrigatória na audiência de julgamento, considerando-se nesta produzidos e examinados, desde que se trate de caso em que a leitura não seja proibida, reportando-se aos documentos que foram juntos com a acusação. Aí se consignou que «(…) não é indispensável à satisfação da exigência de que processo assegure todas as garantias de defesa a leitura de toda a prova documental pré-constituída e junta ao processo. Quanto a este tipo de prova, o princípio do contraditório há-de traduzir-se em ter necessariamente de facultar-se à parte não apresenãotante a impugnação, quer da respetiva admissão, quer da sua força probatória». No caso vertente, como já se referiu, o elemento probatório em apreço embora se encontrasse junto aos autos desde a fase do inquérito, não consta expressamente do elenco dos meios probatórios indicados na acusação pública. Porém, tal omissão, por si só, não é impeditiva da sua valoração. Com efeito, pese embora a estrutura acusatória do processo penal, cabendo ao tribunal diligenciar pela obtenção dos meios de prova que julgue necessários e importantes para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa – atente-se que a discussão da causa tem por objeto os factos alegados pela acusação e pela defesa e os que resultarem da discussão da causa, bem como todas as soluções jurídicas pertinentes - não está também o mesmo impedido de atender aos elementos de prova já constantes do processo – desde que não atingidos pelas proibições de valoração – mesmo que não indicados expressamente como meio de prova na acusação, o que não configura qualquer comprometimento das garantias de defesa do arguido. É certo que o meio probatório em apreço não foi também formalmente objeto de exame em audiência de julgamento. Contudo, apesar da coexistência destas duas circunstâncias, cremos que a sua valoração por parte do Mmo Juiz não configura qualquer comprometimento das garantias de defesa do arguido, designadamente do princípio do contraditório. Na verdade, como já referimos, estamos perante um meio de prova que está junto ao processo desde o inquérito, que é do conhecimento do arguido desde aí, encontrando-se acessível a todos os sujeitos processuais. Em suma, tais circunstâncias não constituem impedimento à valoração de tal meio de prova. Como também se salientou no acórdão da Relação de Lisboa de 25/5/2011, in CJ, TIII, pág.151 “Com a notificação do despacho acusatório, os arguidos têm integral acesso aos autos e, nessa medida, podem exercer plenamente o seu direito de defesa, pelo que a lei não impõe, ao contrário do processo civil, a notificação dos documentos que neste estão incorporados”. Em suma, não violou o tribunal recorrido, como alega o recorrente, a norma do artigo 355º do CPP. Ainda em defesa da impossibilidade de valoração do meio probatório em causa, aduziu o recorrente que a gravação em causa ocorreu sem o seu consentimento, não sabendo sequer que tinha sido gravado. Também por aqui não assiste razão ao recorrente. Desde logo, resulta dos autos que a gravação junta aos autos pela ofendida como meio de prova da conduta que imputa ao arguido foi efetuada pelo próprio arguido com o telemóvel da ofendida (a dado passo do diálogo, a ofendida dirige-se ao arguido dizendo “não sei para quem é essa gravação, mas tu não estás bem. És completamente louco, completamente”), o que, aliás, nunca foi posto em causa por aquele até ao momento da interposição do presente recurso. E dai que o tribunal recorrido, uma vez junta aos autos pela ofendida, a tenha utilizado e valorado à luz das regras insertas no artigo 127º do CPP, em conjugação com os demais meios probatórios que assinalou na sua motivação. Coartar à ofendida num crime de violência doméstica a possibilidade de juntar uma gravação feita pelo próprio arguido, mas que este não autorizou a que dela fosse dado conhecimento a terceiros, porquanto contende com direitos fundamentais à privacidade, à palavra ou à imagem deste último, quando a mesma se destina a fazer prova da conduta criminosa que se imputa ao arguido, mais não é do que desproteger a vítima e por em causa a eficiência da justiça penal – a proteção acaba quando aquilo que se protege constitui crime. Ademais, importa não esquecer que o crime de violência doméstica, pela sua natureza de intromissão em relações familiares de grande proximidade contende, ele próprio, com a vida familiar íntima de todos os intervenientes. Mas, ainda que por mera hipótese de raciocínio se admitisse que a gravação junta havia sido feita pela ofendida, sem o consentimento do arguido, sempre se dirá que vem sendo entendimento jurisprudencial dominante, no qual nos revemos, que a elaboração de gravação áudio ou vídeo destinada a demonstrar factos com relevância criminal não configura a prática de um crime, já que o autor da gravação atua ao abrigo de uma causa de exclusão da ilicitude, particularmente quanto a condutas que decorrem por regra no domicílio conjugal, em contexto intrafamiliar e fora da espera de observação alheia, caso em que a prova dos factos pode ser particularmente difícil e, regra geral, só o arguido e vítima têm conhecimento daqueles, ocorridos no recato de uma impunidade não presenciada - neste sentido, vide Acórdãos da Relação de Coimbra de 24/02/2016, processo no 2638/12.4TALRA.C1; da Relação de Lisboa de 23/5/2023, processo 924/20.9PBCSC.L1, de 6/2/2024, processo 1280/19.3PBBRR.L1, da Relação do Porto, de 23/10/2013, processo no 585/11.6TABGC.P1; de 27/01/2016, processo no 1548/12.0TDPRT.P1 e de 06/11/2019, processo no 457/17.0PAVFR.P1, todos disponíveis in www.dgsi.pt, da Relação de Guimarães de 29/04/2014, processo no 102/09.8GEBRG.G2 e da Relação de Évora de 29/03/2016, processo no 558/13.4GBLLE.E1. Como se sintetizou no Ac. da Relação do Porto de 23/5/2023: “As gravações e fotografias obtidas por particulares, sem qualquer tipo de incumbência legal ao nível da investigação, podem assumir-se como provas especialmente relevantes em processo penal, podendo, no entanto, conflituar com os direitos fundamentais à privacidade, à palavra ou à imagem dos visados. (…) No contexto de um crime de violência doméstica marcado, além do mais, por agressões, ameaças, injúrias, humilhações, gritos, críticas e comentários destrutivos, achincalhantes ou vexatórios, tudo realizado fora do alcance da observação de terceiros, a gravação da “palavra falada” do arguido, ainda que por este não consentida, constituiu o único meio que a ofendida teve ao seu dispor para se proteger e demonstrar, em termos probatórios, a violência a que era sujeita. Seja por via do argumento de sentido vítimodogmático, excludente da tipicidade, seja porque a situação pode ser enquadrada nas causas de justificação previstas no artigo 31.º do Código Penal, pois trata-se de um caso em que, num juízo de necessidade, proporcionalidade e adequação, o interesse público de realização da justiça se deve sobrepor ao direito à palavra do arguido, no âmbito do direito de necessidade, o resultado será o mesmo: a não responsabilidade penal de quem, nas referidas situações, procedeu à gravação”. Em suma, sem necessidade de mais considerações, não estando em causa a valoração de prova proibida, improcede neste segmento o recurso interposto.
- Impugnação da matéria de facto
Nos termos do art. 428º do Código de Processo Penal, os tribunais da relação conhecem não só de direito, mas também de facto, assim se concretizando a garantia do duplo grau de jurisdição na matéria de facto. No que tange à matéria de facto esta pode ser impugnada por duas vias distintas: através da invocação dos vícios previstos no artigo 410º, n.º 2 do Código de Processo Penal, no que se convencionou chamar de “revista alargada” (de conhecimento oficioso)ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que respeita o artigo 412.º, n.ºs 3, 4 e 6, do mesmo diploma. Como se intui da motivação do recurso e das respetivas conclusões, o propósito do recorrente foi lançar mão da impugnação da matéria de facto nos termos do artigo 412.º, n.º 3 do Código de Processo Penal, ainda que nunca tivesse feito menção a tal preceito legal. Para de forma correta se impugnar a decisão com fundamento em erro de julgamento é pois necessário que se indiquem os elementos de prova que não tenham sido tomados em conta pelo tribunal quando deveriam tê-lo sido; ou assinalar que não deveriam ter sido considerados certos meios de prova por haver alguma proibição a esse respeito; ou ainda que se ponha em causa a avaliação da prova feita pelo tribunal, mas assinalando as deficiências de raciocínio que levaram a determinadas conclusões ou a insuficiência – pela qualidade, sobretudo – dos elementos considerados para as conclusões tiradas. … O recorrente terá de demonstrar que a convicção a que o tribunal chegou sobre a veracidade de determinado facto é implausível face às provas, ou então existem outras hipóteses de verdade também plausíveis que desmentem o facto provado ou o tornam duvidoso. E isto, porque, como vem afirmando a jurisprudência, de forma constante, o recurso sobre a matéria de facto não visa a realização de um segundo julgamento, com base na audição da gravação e na apreciação de todos os elementos de prova de que se serviu o tribunal da primeira instância e que estiveram na base da prolação da decisão recorrida, como se esta não existisse, antes se destinando a obviar e corrigir eventuais erros ou incorreções da mesma, na forma como a prova foi apreciada quanto aos concretos pontos de facto identificados pelo recorrente. De modo algum o recurso da matéria de facto pode assim destinar-se a postergar o princípio da livre apreciação da prova. E dai que o recorrente, no recurso amplo da matéria de facto, tenha de especificar, sob pena de rejeição: - os concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados; - as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; e - as provas que devem ser renovadas (artigo 412º, nº 3, do Código de Processo Penal). E quando as provas tenham sido gravadas, a referida especificação deve efetuar-se por referência ao consignado em ata (quanto ao meio de prova registado, seu início e termo), devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação (artigo 412º, nº4, do Código de Processo Penal). Em suma, estando em causa uma sindicância da matéria de facto por via da impugnação ampla, o recorrente, para além de indicar concretamente os factos que considera incorretamente julgados, tem de concretizar o que é que nos meios de prova por si especificados não sustenta, no seu entender, o facto por si impugnado, de forma a relacionar o seu conteúdo específico que impõe a alteração da decisão com o facto individualizado que se considera incorretamente julgado. Em relação a cada um têm de ser indicadas as provas concretas que impõem a decisão diversa e em que sentido devia ter sido a decisão, pois há casos em que face às provas produzidas, as regras da experiência permitem ou não colidem com mais do que uma solução. Exige-se ao recorrente um dever de fundamentação que torne evidente que as provas indicadas impõem decisão diferente, com o mesmo grau de argumentação e convencimento que é exigível ao julgador para fundamentar os factos provados e não provados, só assim se percebendo o raciocínio seguido para se poder afirmar que o mesmo impõe, a final, decisão diversa da recorrida (neste sentido, Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, 2ª edição, fls. 1131, notas 7 a 9, em anotação ao artigo 412º, do Código de Processo Penal). Como se assinalou no Acórdão do STJ de 17/02/2005, proferido no âmbito do processo 04P4324: - “1 - O recurso em matéria de facto para a Relação não constitui um novo julgamento em que toda a prova documentada é reapreciada pelo Tribunal Superior que, como se não tivesse havido o julgamento em 1.ª Instância, estabeleceria os factos provados e não provados e assim indirectamente validaria ou a factualidade anteriormente assente, mas é antes um remédio jurídico que se destina a despistar e corrigir erros in judicando ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente, com referência expressa e específica aos meios de prova que impõem decisão diferente, quanto aos pontos de facto concretamente indicados, ou com referência à regra de direito respeitante à prova que teria sido violada, com indicação do sentido em que foi aplicada e qual o sentido com que devia ter sido aplicada. 2 - Se o recorrente aceita que o teor expresso dos depoimentos prestados permite que a 1.ª Instância tenha estabelecido a factualidade apurada da forma como o fez e questiona tão só a credibilidade que, no seu entender, (não) deveria ter-lhes sido concedida, sem indicar elementos objectivos que imponham a sua posição, a sua pretensão fracassa pois a credibilidade dos depoimentos, quando estribadas elementos subjectivos e não objectivos é um sector especialmente dependente da imediação do Tribunal, dado que só o contacto directo com os depoentes situados na audiência de julgamento, perante os outros intervenientes é que permite formar uma convicção que não pode ser reproduzidas na documentação da prova e logo reexaminada em recurso. 3 - Se apesar de se esforçar, a 1.ª Instância não consegue estabelecer o motivo que levou o arguido a agir, mas estão presentes todos os elementos do respectivo tipo legal de crime, nenhuma dúvida se pode levantar sobre a culpabilidade do agente. …”. E como também se sintetizou no Acórdão do STJ de 12/6/2008, proferido no âmbito do proc.4375/07, esta possibilidade de sindicância da matéria de facto, sofre quatro tipos de limitações: «- desde logo, uma limitação decorrente da necessidade de observância, por parte do recorrente, de requisitos formais da motivação de recurso face à imposta delimitação precisa e concretizada dos pontos da matéria de facto controvertidos, que o recorrente considera incorrectamente julgados, com especificação das provas e referência ao conteúdo concreto dos depoimentos que o levam a concluir que o tribunal julgou incorrectamente e que impõem decisão diversa da recorrida, com o que se opera a delimitação do âmbito do recurso; - já ao nível do poder cognitivo do tribunal de recurso, temos a limitação decorrente da natural falta de oralidade e de imediação com as provas produzidas em audiência, circunscrevendo-se o “contacto” com as provas ao que consta das gravações e/ou, ainda, das transcrições; - por outro lado, há limites à pretendida reponderação de facto, já que a Relação não fará um segundo/novo julgamento, pois o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento em 2.ª instância; a actividade da Relação cingir-se-á a uma intervenção cirúrgica, no sentido de restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação; - a juzante impor-se-á um último limite, que tem a ver com o facto de a reapreciação só poder determinar alteração à matéria de facto se se concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitem uma outra decisão». Posto isto, vejamos então se assiste razão ao recorrente na sindicância da matéria de facto a que procedeu. Começa o recorrente por se insurgir quanto aos pontos 28,29,30, 31, 32,33 e 34 da matéria de facto dada como provada. Consta dos mesmos o seguinte: … Sustenta o recorrente que o tribunal recorrido errou ao dar tais factos como provados, na medida em que assentou a sua convicção apenas no depoimento da ofendida, ignorando a tal respeito os depoimentos dos militares II e AA, os quais, conjugados com as regras da experiência comum, impunham uma decisão distinta quanto aos factos vertidos nos pontos 29º a 34. Trazendo à liça algumas passagens de tais depoimentos, ainda que situando por referência à respetiva gravação os segmentos que, no seu entender, impõem decisão diversa, defende o recorrente que o tribunal errou ao não julgar como não provado “que o arguido impedisse a ofendida de sair do quarto antes ou após a chegada dos militares ou que se tivesse oposto a que estes a retirassem do quarto” e ao não julgar como provado que “ o arguido pretendia era evitar que a ofendida saísse com um computador e o telemóvel, nunca tendo querido ou tentado impedi-la pura e simplesmente de sair”. Atento o teor da factualidade descrita nos mencionados pontos da factualidade e a alegação do recorrente, podemos concluir que o mesmo, em bom rigor, apenas pretende impugnar os pontos 29º e 30º, nos segmentos em que neles se refere, respetivamente, que “impediu-a de sair” e “impediu a passagem”. Tendo-se procedido à audição, na íntegra, de tais depoimentos, a verdade é que, de modo algum, afastam a conclusão a que o tribunal recorrido chegou a respeito do referido propósito do arguido, mal se percebendo até, à luz das regras da experiência comum, como é que em face deles o recorrente pretende sustentar a imposição de decisão diversa daquela a que chegou o tribunal. A factualidade impugnada não só tem sustento nas declarações da ofendida, meio probatório com base no qual o tribunal recorrido fundou a sua convicção, como é corroborada pelos depoimentos dos militares. Como resulta do depoimento daquela, tendo comunicado ao arguido, na sequência da discussão que antes haviam tido, a sua intenção de terminar a relação, dirigiu-se ao quarto para fazer a mala com as suas coisas e depois abandonar a residência, tendo o arguido ido atrás dela aos gritos e entrado no quarto, onde assim continuou por não querer que se fosse embora. Por sua vez, retira-se dos depoimentos dos militares S… e D… que após dirigirem-se ao quarto onde se encontrava o casal e baterem à porta, o arguido abriu a mesma, perguntando-lhes, exaltado e indignado, o que estavam ali a fazer e quem lhes tinha dado autorização para entrar, encontrando-se a vítima atrás dele chorosa e enervada. Tendo o arguido recusado ceder passagem aos agentes de forma a alcançarem a vítima, a militar S… estendeu a mão e puxou-a para fora, encaminhando-a depois para o andar de baixo. Não vislumbramos pois como pode o recorrente sustentar que do facto de ter aberto a porta e de não ter sido feita referência por aqueles a que tivesse impedido a ofendida de sair – o que não é verdade pois a testemunha II referiu que o arguido colocou-se numa posição que impedia a saída da ofendida - se impõe decisão diversa daquela a que chegou o tribunal. Concluir-se em sentido diferente daquele em que concluiu o tribunal recorrido, mais não é do que atentar contra as mais elementares regras da experiência comum. De facto, a ser verdade, como quer sustentar o recorrente, que não impediu a saída da vítima do quarto, porque razão se colocou em posição que impedia a saída da vítima – colocando-se entre ela e os militares – e porque razão também a militar da GNR teria tido necessidade de puxar a vítima de modo a conseguir alcançá-la? As regras da experiência comum e da normalidade da vida só consentem uma explicação: o arguido queria impedir a vítima de sair do quarto e, consequentemente, impedi-la de abandonar a residência que partilhavam. E tal era o seu propósito que foi no encalço da ofendida, sendo que, tendo nisso sido impedido por aqueles, ainda empurrou o militar D…, procurando desse modo aproximar-se da vítima, acabando depois por decidir atirar-se da varanda do andar de cima para baixo, para mais rapidamente aceder aquela. É verdade que resulta também dos depoimentos dos militares D… e S… que o arguido após saltar da varanda e ter sido algemado e detido dizia que não queria que a ofendida levasse coisas que não lhe pertenciam, designadamente um computador, um telemóvel e a televisão. Porém, fazendo apelo às regras da experiência comum, tal postura do arguido mais não foi, como salientou o Ministério Público na sua resposta, do que tentar justificar perante os militares todo o seu comportamento anterior, designadamente o empurrão no militar D…, a coberto de uma defesa dos seus bens materiais, não sendo crível, à luz das mencionadas regras, que alguém que esteja a passar pela vivência da ofendida pudesse naquele momento querer levar uma televisão. O circunstancialismo que envolveu a atuação do arguido é mais do que evidenciador que o seu objetivo era impedir que a vítima abandonasse a residência e o deixasse. Inexiste assim o invocado erro de julgamento. Prosseguido, sustenta o recorrente que o tribunal recorrido errou ao dar como provados os factos vertidos nos pontos 3 a 7, 11 a 16, 18, 19,20,21,23,26, 27,35 a 38, 42, 43 e 47, os quais, no seu entender, devem ser dados como não provados. Consta dos referidos pontos o seguinte: … Vejamos em que é que o recorrente fez assentar a verificação do erro de julgamento relativamente a estes pontos da factualidade provada. Desde logo, mais uma vez, no facto de o tribunal ter atendido apenas ao depoimento da ofendida, ignorando as suas declarações, os depoimentos das testemunhas … e, ainda, o que resulta das mensagens trocadas entre a ofendida e o arguido. Concretamente, trazendo à liça as considerações tecidas pelo tribunal recorrido a respeito da credibilidade que lhe mereceram as declarações da ofendida e com base nas quais sustentou a sua convicção no sentido apontado, insurge-se o recorrente com a valoração de tal meio probatório, porquanto, das declarações daquela conjugadas com a mensagens juntas aos autos evidencia-se que a ofendida usou estes autos de modo ardiloso, frio e calculista e com o intuito de se vingar do arguido. … O ora recorrente embora referenciando-se em concreto aos meios probatórios que trouxe à liça – declarações do arguido e depoimentos testemunhais, situados por referência à respetiva gravação) - e elementos documentais – limitou-se a manifestar a sua discordância relativamente ao modo como o tribunal em primeira instância valorou a prova produzida, designadamente as declarações prestada pela ofendida P…, contrapondo a sua análise valorativa, verificando-se, porém, inequivocamente, que o tribunal recorrido explica de forma coerente e esclarecedora porque motivo concluiu que o arguido adotou os comportamentos descritos na decisão recorrida e a intencionalidade com que os fez. O tribunal decide, salvo existência de prova vinculada, de acordo com as regras da experiência e a livre convicção (o que, com frequência, é ignorado pelos recorrentes), e por isso, não é suficiente para a pretendida modificação da decisão de facto que as provas especificadas pelo recorrente permitam uma decisão diferente da proferida pelo tribunal, sendo imprescindível, para tal efeito, que as provas especificadas não comportem/consintam aquilo que o tribunal deles retirou. O nosso regime jurídico processual-penal consagra no artigo 127.º o princípio da livre apreciação da prova, o qual estabelece que “Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.” A livre apreciação da prova pressupõe que esta seja considerada segundo critérios objetivos que permitam estabelecer o substrato racional da fundamentação da convicção. Este princípio assume particular relevo na fase de julgamento. Com efeito, se é certo que a convicção do juiz não pode ser puramente subjetiva, imotivável e por isso, o art.374.º n.º2 do Código de Processo Penal exige que a sentença contenha “uma exposição tanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito, que fundamentaram a decisão, com a indicação do exame crítico das provas que serviram para fundamentar a decisão do tribunal”, também não se pode esquecer que a decisão do juiz é sempre uma convicção pessoal, «até porque nela desempenham um papel de relevo não só a atividade cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v.g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais» in Jorge de Figueiredo Dias, “Direito Processual Penal”, Coimbra Editora, edição 1974, pág.204. Ao princípio da livre apreciação da prova, estão intimamente associados os princípios da imediação e da oralidade. Na verdade, o juiz, mercê do contacto direto com a testemunha, ao valorar o seu depoimento tem de atender a vários aspetos que têm a ver, designadamente, com a razão de ciência, a imparcialidade, a espontaneidade do depoimento, as hesitações, as contradições, os gestos, etc. Estando assim em causa um ataque ao princípio da livre apreciação da prova, a impugnação tem necessariamente de se basear, como se salienta no Acórdão do TC n.º 198/2004 – DR II série, de 2/6/2004, “na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objetivos que se apontam na convicção ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objetivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma, seria uma inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão”. Ao tribunal de recurso compete sindicar a aplicação ao caso concreto do princípio da livre apreciação da prova consagrado no artigo 127º do CPP. Para tanto, deverá socorrer-se da motivação em sede de matéria de facto da sentença, por forma a constatar o caminho percorrido pelo tribunal de primeira instância ao abrigo do disposto no artigo 374º, nº 2 do CPP. De modo algum o recurso da matéria de facto pode destinar-se a postergar o princípio da livre apreciação da prova e embora este Tribunal da Relação tenha poderes de intromissão em aspetos fácticos (artigos 428º e 431º/b) do CPP), não pode sindicar a valoração das provas feitas pelo tribunal em termos de o criticar por ter dado prevalência a uma em detrimento de outra, salvo se houver erros de julgamento e as provas produzidas impuserem outras conclusões de facto As observações feitas pelo recorrente quanto à prova com base na qual o tribunal recorrido formou a sua convicção, não têm o efeito de impor decisão diversa da decisão recorrida. No caso vertente, não estão em causa provas ilegais ou proibidas (a gravação junta aos autos e que se encontra transcrita e traduzida a fls. 235 a 241, conforme já decidimos não constitui um meio de prova ilegal), nem a força probatória plena de certos meios de prova. E confrontada a motivação aduzida na sentença recorrida com a audição a que procedemos, na íntegra, dos meios probatórios trazidos à liça pelo recorrente, não podemos deixar de concluir que a apreciação da prova plasmada na fundamentação da sentença, efetuada pelo tribunal recorrido, que beneficiou da imediação e da oralidade e com a qual não pode contar este tribunal de recurso, é perfeitamente possível segundo as regras da experiência comum. Começando pelos factos que envolvem a ofendida P…, é verdade que o arguido os negou e que nenhuma das testemunhas os confirmou (pois não os presenciaram), com exceção da própria ofendida. É igualmente verdade que inexiste qualquer prova pericial ou documental a sustentar as agressões relatadas pela própria e, bem assim, o diagnóstico e acompanhamento médico a que se reporta o ponto 47 da factualidade. Todavia, o tribunal recorrido, pese embora as versões contraditórias do arguido e da ofendida, privilegiando as declarações prestadas por esta, sujeitas à sua livre apreciação, deu como provada tal factualidade, não obstante a invocada falta de corroboração documental e pericial. E lida a fundamentação aduzida pelo tribunal recorrido, facilmente se retira porque razão, no confronto com a versão trazida pelo arguido, optou por dar credibilidade às declarações prestadas por aquela, não obstante o seu natural interesse no desfecho do processo, opção que explicou de forma clara e convincente. Como nela se fez constar: “…”. Explicou ainda a julgadora por razão a invocada falta de credibilidade de tais declarações (por parte do arguido) carecia de qualquer sentido “…”. Tendo este tribunal de recurso, como já referimos, procedido à audição do depoimento da ofendida, não podemos deixar de referir que este, para além de consentir o que foi apreendido pelo tribunal recorrido, não evidencia por parte da ofendida, qualquer postura de empolar os factos, antes o seu depoimento mostrou-se objetivo e convincente, tendo sido prestado de forma consentânea com a lógica das coisas, assim se percebendo porque razão o tribunal lhes conferiu credibilidade à luz das regras da experiência comum (art.127 do CPP). Deste modo, nada impedia que o tribunal sustentasse a sua convicção, como sustentou, com base em tal depoimento, no que tange aos factos vertidos nos pontos 1 a 23,26 a 32, 35 a 38 e 43 a 47, nos quais se incluem também os relativos ao episódio ocorrido no dia 27 de maio de 2023. Como se referiu no Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 2/7/2018, proc.145/13.7GAPTL.G1, e tem sido defendido repetidamente na jurisprudência dos tribunais superiores, “Nada obsta a que existindo versões contraditórias, como sucede na maioria dos julgamentos, a convicção do juiz, no sentido de valorar uma delas, em detrimento de outra, se alicerce com base no depoimento de uma única testemunha, mesmo que se trate do ofendido, ou nas declarações do assistente e/ou demandante, desde que devidamente explicitadas pelo julgador na motivação da decisão de facto, as razões do seu convencimento (...)”. Nada obstando, como acabámos de salientar, que a factualidade que suporta uma acusação seja dada como provada apenas com base num único depoimento, tudo dependendo da credibilidade que o respetivo depoimento possa merecer ao julgador, tendo em conta, entre outros fatores, a forma como foi prestado, a sua consistência - e, no caso, as declarações da ofendida foram merecedoras da credibilidade do tribunal - a verdade é que, na situação em apreço, o tribunal recorrido em abono de tais declarações serviu-se ainda de outros meios probatórios. Como se aduziu na sentença recorrida “(…) vários factos relatados pela ofendida encontram ainda sustento na demais prova existente nos autos, como a transcrição e tradução da gravação realizada pelo arguido e junta aos autos a fls. 235 a 241, de que se depreende a discussão nesse dia mantida pelo arguido com a ofendida de forma obsessiva, manipuladora, com sentimentos de ciúme e possessão. Mais se denota que, tanto no âmbito dessa discussão gravada e transcrita, como também nas mensagens transcritas e juntas pelo arguido aos autos em sede de inquérito e contestação, existem mensagens da ofendida dirigidas ao arguido a questioná-lo se lhe vai bater novamente, mensagens e conversações essas mantidas entre ambos em data anterior ao início dos presentes autos e que, embora não façam prova directa sobre essas agressões, indiciam que as mesmas existiram, tendo a ofendida confrontado o arguido com as mesmas em data anterior à sua detenção”. Também não se pode depreender da postura da ofendida em sede de audiência de julgamento, que a mesma não tenha, conforme foi alegado, postura e evidências de ter sido vítima de violência doméstica. Primeiramente considera-se inadmissível e contrário aos princípios basilares de Direito extrair as pretendidas conclusões meramente através da postura de uma testemunha em sede de julgamento. Por outro lado, tal como é experiência comum e normalidade do acontecer, cada indivíduo, enquanto ser humano, tem formas diferentes de lidar e processar as situações, emoções, sentimentos e traumas vivenciados, bem como díspares mecanismos de enfrentamento, sendo a psicologia uma ciência de profunda complexidade. Num conspecto distinto, se é certo a ofendida realmente fez questão de levar consigo um computador portátil que arroga ser seu porque era por si usado e foi comprado pelo arguido, segundo a mesma entende, para substituição do que o mesmo danificou na Indonésia, essa circunstância não pode ser considerada como suficiente para a sua versão dos factos e teor do seu depoimento e relato sejam invalidados”. Sendo indiscutível que tais meios probatórios não provam diretamente a ocorrência dos factos descritos, permitem, porém, conferir consistência às declarações prestadas pela ofendida, a respeito do relatado comportamento impulsivo, possessivo e agressivo do arguido para com a ofendida noutras ocasiões. Podendo, é certo, os depoimentos das testemunhas …, trazidos à liça pelo recorrente, na medida em que versaram sobre a personalidade do arguido e postura do mesmo para com a ofendida, consentir uma outra leitura a respeito dos traços da personalidade daquele, pois dos factos em discussão não tinham conhecimento direto, não impõem, porém, decisão diversa daquela a que chegou o tribunal com base nas declarações da ofendida, em conjugação com os referidos elementos documentais. Sendo verdade que das mensagens juntas aos autos, como adiantou o tribunal recorrido, descortina-se também um comportamento possessivo e ciumento por banda da ofendida relativamente ao arguido, aliás também assumido pela própria nas declarações que prestou, tal não foi de molde a por em causa a credibilidade das suas declarações, como, de forma clara, bem explicou o tribunal. Como se exarou na motivação “Efetivamente, das mensagens juntas aos autos pela defesa do arguido denota-se tal característica, bem como alguma possessão e controlo por parte da ofendida, que também argumentava e iniciava discussões com o arguido, com persistência e possíveis faltas de respeito. J…, ex-companheiro da ofendida, relatou que a mesma era profundamente controladora e manipuladora, bem como, por vezes, agressiva e violenta. O arguido também relatou uma situação, em que a mesma lhe atirou um candeeiro e acertou com o mesmo na cabeça, porém não logrou densificar essa contenda, permanecendo em dúvida como é que a mesma aconteceu, em que contexto, e por que razão. A própria ofendida referiu que, não obstante as tentativas do arguido, sempre recusou ser uma mulher submissa e silente, fazendo questão de manifestar as suas opiniões e de debater os desentendimentos entre ambos. No entanto, tais circunstâncias não se podem considerar como reciprocidade de maus tratos, pois não se pode ignorar que o género humano é naturalmente defensivo e comummente reactivo, por isso, no âmbito das discussões várias mantidas entre o ex-casal, são manifestações, pelo menos, humanamente esperadas (embora possivelmente ilícitas se abstractamente apreciadas), as reacções e comportamentos apurados e alegados da ofendida, reacções e comportamentos esses que não têm a virtualidade de desqualificar de forma alguma a conduta errática do arguido. Tais eventuais comportamentos da vítima, repita-se, não concretamente apurados, porque não densificados pelo arguido, nunca poderiam desqualificar ou sequer equiparar-se às que resultam provadas como praticadas por este, uma vez estas extravasaram qualquer limite que se pudesse considerar por característico no âmbito de uma relação disfuncional (vulgo tóxica) de parte a parte e em igual medida, pois ficou como provado, além de tudo o mais, que o arguido em pelo menos três ocasiões distintas desferiu chapadas e socos no rosto da ofendida, que lhe causaram dores e hematomas na zona ocular. Note-se, aliás, que o arguido nunca admitiu sequer existir reciprocidade nos comportamentos agressivos, apenas dizendo que a ex-companheira é que era a única agressora da relação. Pelo contrário, resultam provadas várias condutas do arguido que, são muito graves e motivados por ciúmes, possessão, menosprezo e em função da circunstância de a mesma ser sua companheira à data. Se é certo que todos estes comportamentos conjugados, demonstram personalidades algo obsessivas de ambos, o arguido com facilidade utilizava a agressão física como forma de exercer ascendente sobre a ofendida. De facto, pese embora também se tenha provado que a ofendida chegou a iniciar discussões com o arguido, admitindo-se como possível que tenha humilhado ou injuriado o mesmo, bem como que também tinha uma personalidade ciumenta e possessiva, tal não atinge dimensão suficiente para concluir que os maus tratos eram recíprocos a tal ponto que se anulassem mutuamente. Por todo o exposto, no que concerne ao juízo valorativo acerca da factualidade atinente aos fins com que o arguido agiu, ao conhecimento e vontade com que actuou, bem como à sua consciência quanto à ilicitude das condutas levadas a cabo contra a ofendida P…, foi a mesma factualidade extraída das condutas que objectivamente se apuraram, analisadas à luz das regras da lógica e da experiência comum, em conjugação com aquilo que foi parcialmente admitido pelo arguido e todos os raciocínios supra indicados. Em suma, apenas importando a convicção formada pelo tribunal recorrido, sendo a mesma, como referimos, possível à luz das regras da experiência comum e não tendo a argumentação aduzida pelo recorrente e os meios probatórios que trouxe à liça, a virtualidade de imporem decisão diversa, nem podendo concluir-se que em face de tais meios probatórios deveria ter-se criado no espirito do julgador uma dúvida - razoável e fundada - que lhe impunha resolver em sentido favorável ao arguido, impõe-se acolher a posição do julgador. A Mma Juiz, beneficiando da imediação e da oralidade e não ignorando a versão do arguido, privilegiou as declarações da ofendida, as quais, no confronto com a demais prova produzida lhe mereceram credibilidade à luz das regras da experiência comum. Volvendo-nos agora na materialidade fática atinente à ofendida D…, deflui da motivação aduzida que o tribunal recorrido fundou a sua convicção numa análise conjugada dos depoimentos daquela, da mencionada P… e da mãe destas, W…, privilegiando, porém, no que à concreta agressão diz respeito, as declarações da ofendida D… . Como se exarou na motivação “ a factualidade que resulta como provada em relação à ofendida D… decorre do depoimento prestado pela própria, que relatou as circunstâncias em que o arguido, na noite de 18 de Maio de 2023, na residência que até àquela data partilhava com P…, a pontapeou quando a mesma estava de costas e a ser empurrada para fora da casa, tendo sido atingida na perna direita. Também a sua mãe, W…, relatou que, quando estava, nessa ocasião, no andar de cima a fazer as malas, ouviu um berro da sua filha BB vindo do andar de baixo, bem como um barulho de fechar de uma porta com muita força. …”. Também neste particular da decisão recorrida mostram-se claramente explicitados, sendo por isso perfeitamente percetíveis, os motivos da convicção alcançada pelo tribunal recorrido. Os aspetos evidenciados pelo recorrente não têm sequer a virtualidade de impor decisão diversa da proferida, não se verificando, pois, erro de julgamento da matéria de facto. E tendo este tribunal procedido à audição do depoimento da testemunha BB, o mesmo consente de facto, à luz das regras da experiência comum, o que dele apreendeu o tribunal recorrido e veio a consignar na materialidade fáctica. De referir, a propósito das invocadas contradições entre os depoimentos das testemunhas P… e W… (mãe daquelas), que ao contrário do que parece defender o recorrente, a circunstância de existirem algumas imprecisões ou discrepâncias entre tais depoimentos, não justifica, à luz das regras da experiência comum que se ponha em causa a sua credibilidade, pois mostra a experiência que será antes a concertação de versões enganadoras que mais facilmente dará lugar a descrição de factos perfeitamente análogos e coincidentes entre si, assim não sucedendo nos depoimentos mais espontâneos e verdadeiros. Sendo os testemunhos uma narração de factos percebidos através dos sentidos é normal que contenham imprecisões decorrentes de deficiências dos próprios sentidos, mas os testemunhos prestados de modo não coincidente não serão forçosamente falsos. … Um dos campos por excelência da livre convicção do julgador é apreender a prova com imediação e oralidade. E não se demonstrando que a conclusão a que o julgador chegou, face à prova produzida colide com as regras da experiência comum, deve manter-se inalterada a matéria de facto. A circunstância de somente a vítima D… ter presenciado a agressão e inexistir nos autos qualquer elemento documental ou pericial comprovativo de qualquer lesão - lembrando-se ao recorrente que de uma agressão corporal não tem que necessariamente resultar uma lesão/marca visível - não é de molde a sustentar qualquer erro de julgamento ou dúvida, razoável e fundada e, consequentemente, a impor decisão diversa daquela a que chegou o tribunal recorrido. Ademais, também não deflui da mesma que na opção fáctica a que procedeu, o tribunal recorrido, neste particular, se tenha deparado com qualquer hesitação. Por tudo o exposto, sem necessidade de outras considerações, inexistindo razões para pôr em causa a convicção alcançada pelo tribunal “a quo”, nos termos em que concluiu, julga-se improcedente o invocado erro de julgamento, mantendo-se nos exatos termos a matéria de facto enunciada na sentença recorrida. Improcede, neste segmento, o recurso interposto.
- Do não preenchimento dos crimes pelos quais foi condenado.
Sustenta o recorrente que o tribunal recorrido errou na aplicação do disposto nos artigos 152º e 143º, ambos do Código Penal, pondo assim em causa o respetivo enquadramento jurídico-penal dos factos. Todavia, tal questão é levantada como decorrência da alteração a que almejava da matéria de facto provada com fundamento em erro de julgamento, a qual, como acabámos de referir, permanece intocada. Deste modo, imodificada que se mostra a matéria de facto elencada pelo tribunal recorrido e nenhum reparo merecendo, em face das considerações tecidas a tal respeito, o enquadramento jurídico-penal a que procedeu, porquanto se mostram preenchidos os elementos objetivos e subjetivos dos ilícitos em apreço, improcede também neste segmento o recurso interposto.
- Da medida concreta das penas parcelares aplicadas.
Como decorre da sentença recorrida, o arguido foi condenado na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de 7,00€ (seis euros), o que perfaz a quantia global de € 560,00 (quinhentos e sessenta euros) pela prática do crime de ofensa à integridade física (na pessoa da ofendida D…), p. e p. pelos artigos 143.º, n.º 1 do Código Penal e na pena de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão pela prática do crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, al. a) e 2, al. a), do Código Penal. Sustenta o recorrente que as penas parcelares que lhe foram aplicadas são excessivas. Com vista a almejada redução das penas de multa e prisão que lhe foram aplicadas, reclama pela aplicação do instituto da atenuação especial da pena, caso em que o limite máximo das respetivas molduras penais abstratas previstas para cada um dos ilícitos é reduzido de um terço (art.73ºnº1, als, a) c)). No crime de ofensa à integridade física, o limite mínimo da pena de multa é ainda reduzido ao mínimo legal (10 dias). A respeito do instituto da atenuação especial da pena, dispõe o artigo 72º do Código Penal que: … Trata-se de uma norma destinada a evitar que, para além dos casos expressamente previstos na lei, não seja determinada uma pena superior à que é permitida pela culpa e imposta pelas exigências de prevenção. Como ensina Figueiredo Dias Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, pág.192 §246 - “Ao legislador compete, desde logo, estatuir as molduras penais cabidas a cada tipo de factos que descreve na PE do CP e em legislação extravagante, valorando para o efeito a gravidade máxima e mínima que o ilícito de cada um daqueles tipos de factos pode presumivelmente assumir. Mas porque o sistema não poderia funcionar de forma justa e eficaz se não fosse dotado, a este propósito de válvulas de segurança, o legislador prevê ainda aquelas circunstâncias que, em casos especiais, podem agravar ou atenuar os limites máximo e (ou) mínimo das molduras penais, cabidas como regra a um certo tipo de factos (circunstâncias modificativas).” Só que para que esta válvula de escape funcione é necessário que se verifique: - diminuição acentuada da ilicitude do facto e da culpa do agente; Mas, como ensina Figueiredo Dias, in obra citada, páginas 306 e 307, “ a diminuição da culpa ou das exigências da prevenção só poderá, por seu lado, considerar-se acentuada quando a imagem global do facto, resultante da(s) circunstância(s) atenuante(s) , se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo. Por isso, tem plena razão a nossa jurisprudência – e a doutrina que a segue – quando insiste em que a atenuação especial só em casos extraordinários ou excecionais pode ter lugar: para a generalidade dos casos, para os « casos normais», lá estão as molduras penais normais, com os seus limites máximo e mínimo próprios.” A este propósito, escreve-se no Ac. do STJ, de 08/03/07: “I - Em nome de valores irrenunciáveis de justiça, adequação e proporcionalidade, surgiu a necessidade de dotar o sistema de uma válvula de segurança que permita, em hipóteses especiais, quando existam circunstâncias que diminuam de forma acentuada as exigências de punição do facto, deixando aparecer uma imagem global especialmente atenuada, relativamente ao complexo «normal» de casos que o legislador terá tido ante os olhos quando fixou os limites da moldura penal respectiva, a possibilidade, se não mesmo a necessidade, de especial determinação da pena, conducente à substituição da moldura penal prevista prevista para o facto, por outra menos severa: são as hipóteses de atenuação especial da pena – Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime. II - O funcionamento desta válvula de segurança obedece a dois pressupostos essenciais, a saber, a diminuição acentuada da ilicitude e da culpa, da necessidade da pena e, em geral, das exigências de prevenção. III - Não deve esquecer-se que esta solução de consagrar legislativamente a referida “cláusula geral de atenuação especial” como válvula de segurança, dificilmente se pode ter como apropriada para um Código como o nosso, “moderno e impregnado pelo princípio da humanização e dotado de molduras penais suficientemente amplas”; ou seja, é uma solução antiquada – ibidem, § 454 e 465. IV - Daí o bem fundado da nossa jurisprudência, quando pressupõe que tal sistema só se torna político-criminalmente suportável se a atenuação especial, decorrente da cláusula geral apontada, entrar em consideração apenas em casos relativamente extraordinários ou mesmo excepcionais”. A jurisprudência tem sido assim exigente na aplicação deste preceito penal, limitando a atenuação especial da pena a casos extraordinários ou excecionais de acentuada diminuição da ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena (cfr. entre outros, os acórdãos do STJ de 12 de Julho de 2006 ( 06P796) e de 25 de Outubro de 2006 ( proc. n.º 06P1286), que se podem consultar em www.dgsi.pt/jstj). Para que opere a atenuação especial da pena mostra-se assim necessário que se esteja perante circunstâncias anteriores, contemporâneas ou posteriores ao crime que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena. Exige-se, por conseguinte, que a imagem global do facto revele que a moldura da pena prevista para o tipo de crime não poderá realizar adequadamente a justiça reclamada pelo caso concreto, quer pela menor dimensão e expressão da ilicitude ou pela diminuição da culpa, com a consequente atenuação da necessidade da pena. Volvendo-nos no caso concreto, convoca o recorrente para efeitos de aplicação do instituto em causa, as seguintes circunstâncias: o arguido e a ofendida estarem embriagados à data da prática dos factos; ter o arguido procurado tratamento para as suas dependências, completando-o com sucesso; o ardil e frieza da ofendida e as suas sucessivas provocações já no decurso dos autos, as quais o arguido evitou ou pelo menos tentou fazer parar; as agressões e violência de que ele próprio foi vítima. Com exceção do tratamento a que se sujeitou, nenhuma das razões pelas quais entende que se justificava a opção pela atenuação especial da pena encontra acolhimento na matéria de facto dada como provada. Não obstante, não se vislumbra, de modo algum, com suporte nos autos, maxime nos factos provados, uma “imagem global especialmente atenuada do facto” que nos permita lançar mão da pretendida atenuação especial da pena, para além de que, como se sublinhou na sentença recorrida são muito elevadas as necessidades de prevenção geral que se fazem sentir relativamente aos ilícitos cometidos pelo arguido. Ademais, não obstante a ausência de antecedentes criminais do arguido e a sua integração profissional e familiar, as exigências de prevenção especial fazem-se sentir, atenta a personalidade do arguido evidenciada nos factos e a ausência de interiorização por parte do mesmo da desconformidade e gravidade da sua atuação, o qual optou por negar categoricamente os factos imputados, consubstanciadores dos crimes em causa, escudando-se, no que tange ao crime de violência doméstica, numa posição de vítima de violência doméstica por parte da ofendida e de um plano de vingança deliberadamente orquestrado pela mesma para o prejudicar. Em suma, não se mostrando preenchidos os respetivos requisitos, está, pois, afastada a pretendida aplicação do instituto em apreço Ainda no que tange ao crime de ofensa à integridade física, veio o recorrente reclamar pela aplicação do instituto da dispensa de pena, previsto no artº74º do C.Penal. De acordo com este dispositivo legal quando o crime for punível com pena de prisão não superior a 6 meses ou só com multa não superior a 120 dias, pode o tribunal declarar o arguido culpado, mas não aplicar qualquer pena se: - a ilicitude do facto e culpa do agente forem diminutas; - o dano tiver sido reparado; - à dispensa da pena se não opuserem razões de prevenção. Destina-se este a resolver casos de bagatelas penais, cfr. Figueiredo Dias, in obra citada, §467, pág.314 e Maia Gonçalves - Código Penal Português - Anotado e Comentado – 15ª Ed., pág.259, “em que se verificam todos os pressupostos da punibilidade mas em que se não justificaria a aplicação de qualquer sanção penal, já que tanto não seria exigido pelos fins das penas.” Maia Gonçalves, obra e página citadas. Estes pressupostos têm que “verificar-se sempre que outra norma, da Parte Especial do Código ou da legislação extravagante, admitir com carácter facultativo a dispensa de pena” -autor, obra e página citada. Assim, para que, no caso, se pudesse dispensar o arguido de pena, nos termos do nº3 do artº143º do C.Penal, mostrava-se necessário, para além de qualquer um dos requisitos por ele imposto, a verificação dos pressupostos do nº1 do artº74º do Código Penal. Ora, como facilmente se depreenderá, a pretensão do recorrente, está votada ao fracasso. Não só não se verifica qualquer um dos pressupostos enunciados no citado nº3 do artigo 143º (tiver havido lesões recíprocas e se não tiver provado qual dos contendores agrediu primeiro ou o agente tiver unicamente exercido retorsão sobre o agressor), como a tal aplicação sempre se opunha o grau de ilicitude (mediano, e não diminuto) e de culpa (elevado), bem como, as exigências de prevenção que se fazem sentir. Afastado que se mostra também o instituto em apreço, vejamos agora se as penas aplicadas carecem de intervenção corretiva deste tribunal. Considerando os limites mínimo e máximo abstratamente aplicáveis – 10 a 360 dias, no caso da pena de multa aplicável ao crime de ofensa à integridade física e 2 a 5 anos no caso da pena de prisão aplicável ao crime de violência doméstica, pugna o recorrente no sentido das penas serem fixadas no mínimo legal – 10 dias de multa e 2 anos de prisão. Esgrimiu, para o efeito, no que tange à pretendida pena de 10 dias de multa: - a ofensa reconduziu-se, no limite, a uma condução até fora do apartamento e a um eventual pontapé com o único intuito de fazer a ofendida sair de casa – as consequências para a ofendida BB não terão sido mais que eventual e ligeira dor, momentânea e facilmente ultrapassável, sem lesões ou sequer mínimas marcas ou rasto; - o dolo também não se poderá considerar como dolo direto, mas apenas eventual ou, no limite, necessário, não sendo a culpa intensa; - quanto ao grau de ilicitude também não será senão mínimo, pois, no calor de um momento traumático como foi aquele e no qual o arguido pretendia apenas que a ofendida BB saísse da casa dele, não seria gravemente censurável aquela conduta. Já no que tange à pretendida redução da pena aplicada ao crime de violência doméstica para 2 anos, aduziu o seguinte: - o que resulta dos autos é, no limite, uma relação tóxica de parte a parte; - ainda que possa equacionar-se que num quadro como este haja algumas consequências a nível psíquico – as quais sempre resultam de relações tóxicas e levam tempo a dissipar-se – face ao tempo entretanto decorrido e atendendo às condutas da própria ofendida para com o arguido, as consequências situam-se num nível muitíssimo inferior ao da maioria dos casos de violência doméstica, pois não é comum as vítimas também sejam agressoras; - não se pode considerar o dolo direto, mas apenas e no limite eventual e portanto a culpa acha-se substancialmente diminuída; - o grau de ilicitude é reduzido atentas as particularidades e disfuncionalidades da relação. Vejamos. Estabelece o artigo 71º, nº 1 do C. Penal que, a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção. O facto punível não se esgota na desconformidade com o ordenamento jurídico-penal , com a ação ilícita-típica, necessário se tornando sempre que a conduta seja culposa, “ isto é que o facto possa ser pessoalmente censurado ao agente , por aquele se revelar expressão de uma atitude interna pessoal juridicamente desaprovada e pela qual ele tem por isso de responder perante as exigências do dever-ser sócio-comunitário.”( Prof. Fig. Dias , in “Temas básicos da doutrina penal”, Coimbra Ed., pág. 230). Já quanto ao requisito de que sejam levadas em conta, na determinação da medida concreta da pena, as exigências de prevenção, remete-nos para a realização in casu das finalidades da pena. De acordo com o art.41º, nº1 do Código Penal, a aplicação de penas (e de medidas de segurança) visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. No que tange à proteção dos bens jurídicos, esta implica a utilização da pena como instrumento de prevenção geral, servindo quer para dissuadir a prática de crimes, através da intimidação das outras pessoas face ao sofrimento que com a pena se inflige ao delinquente (prevenção geral negativa ou de intimidação), quer para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força de vigência das normas do Estado na tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal (prevenção geral positiva ou de integração). Por sua vez, a reintegração do agente na sociedade está associada à prevenção especial ou individual, ou seja, à ideia de que a pena é um instrumento de atuação preventiva sobre a pessoa do agente, com o fim de evitar que no futuro, ele cometa novos crimes, que reincida. As circunstâncias gerais enunciadas exemplificativamente no nº2 do art.71.º do Código Penal, são, no ensinamento do Prof. Figueiredo Dias, elementos relevantes para a culpa e para a prevenção e, “por isso, devem ser consideradas uno actu para efeitos do art.72.º-1; são numa palavra, fatores relevantes para a medida da pena por força do critério geral aplicável.”. Para o mesmo autor, esses fatores podem dividir-se em “Fatores relativos à execução do facto”, “Fatores relativos à personalidade do agente” e “Fatores relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto”. Relativamente aos “Fatores relativos à execução do facto”, salienta o Ilustre Professor que “Toma-se aqui a “execução do facto” num sentido global e complexo, capaz de abranger “o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente”, “a intensidade do dolo ou da negligência” e ainda “os sentimentos manifestados na preparação do crime e os fins e os motivos que o determinaram”...Assim, ao nível do tipo-de-ilícito releva logo a totalidade das circunstâncias que caracterizam a gravidade de violação jurídica cometida pelo agente, o dano material ou moral, produzido pela conduta – com todas as consequências típicas que dele advenham - o grau de perigo criado nos casos de tentativa e de crimes de perigo, a espécie e o modo de execução do facto...o grau de conhecimento e a intensidade da vontade no dolo (…). Nos factores relativos à execução do facto...entram, por outro lado, todas as circunstâncias que respeitam à reparação do dano pelo agente, ou mesmo só os esforços por ele desenvolvidos nesse sentido ou no de uma composição com o lesado; como ainda o comportamento da vítima...os sentimentos, os motivos e os fins do agente manifestados no facto.” Já nos “Fatores relativos à personalidade do agente” incluem-se: a) Condições pessoais e económicas do agente; b) Sensibilidade à pena e suscetibilidade de ser por ela influenciado; c) Qualidades da personalidade manifestadas no facto. Por fim, os “Fatores relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto” incluem a conduta anterior ao facto – haverá que ponderar se o ilícito surge como um episódio ocasional e isolado no contexto de uma vida de resto fiel ao direito, que poderão atenuar a pena. Como contrapartida haverá igualmente que ponderar a existência de condenações anteriores, que, como contraponto, poderão servir para agravar a medida da pena – e a conduta posterior ao facto – haverá que ponderar se o arguido procedeu ou envidou esforços no sentido de reparar as consequências do crime, e qual o seu comportamento processual (in “Direito Penal Português, as consequências jurídicas do crime”, Editorial Notícias, pág. 210 e 245 e seguintes). Assim, uma vez respeitados estes critérios de dosimetria concreta da pena, há uma margem de atuação do julgador que é difícil, se não mesmo impossível, de se sindicar, embora, claro está, o cumprimento do dever de fundamentação vise precisamente tornar possível o controlo da decisão sobre a determinação da pena. Vejamos a ponderação a que procedeu o tribunal recorrido em ordem à fixação das penas parcelares que decidiu aplicar ao arguido. “- o dolo, sendo directo e, por isso, a culpa intensa, relativamente a todas as condutas impetradas ao arguido, isto é, tanto nas subsumíveis ao crime de Ofensa à integridade física dirigida a BB, como as que preenchem o tipo de Violência Doméstica, praticado contra HH; - o grau da ilicitude dos factos, que se encontra acima do limiar mediano, atenta a impulsividade e intensidade com que o Arguido praticou os factos (seja de agressão a BB, como de violência doméstica contra HH, à data sua companheira) bem como a disparidade de condutas atentatórias da integridade física e psíquica de HH, isto é, na medida em que o Arguido ofendeu o corpo, a honra e consideração, a liberdade e a autodeterminação da ofendida, em distintas condutas intensas movidas pela impulsividade, ciúme e/ou possessividade; - a inexistência de antecedentes criminais; - as consequências resultantes da actuação do Arguido, que implicou uma afectação grave da dignidade e bem-estar psicológico da ofendida HH, bem como as dores sofridas pela mesma, como ainda as dores causadas à ofendida BB; - a conduta anterior e posterior aos factos, salientando-se que inexiste notícia de qualquer outro comportamento ilícito impetrado pelo arguido contra as ofendidas; - as necessidades de prevenção geral, que se revelam num patamar muito elevado em ambos os crimes em apreciação, impondo-se referir que a violência doméstica corresponde a um fenómeno que tem gerado uma forte perturbação e preocupação na sociedade, ao que acresce a circunstância de a afectação do bem jurídico tutelado ser frequente, com absoluto desrespeito pelo bem-estar físico e mental das vítimas, bem como a sua liberdade e dignidade, conjugada ainda com o comum sentimento da comunidade de impunidade dos seus agentes; - as necessidades de prevenção especial, que se aferem por medianas, atendendo às suas necessidades de ressocialização a nível do controlo dos impulsos do arguido e de prevenção da reincidência, mas tendo, em contrapartida, que valorar-se a sua inserção familiar, económica e social, que é positiva”. Na senda da ponderação feita pelo Tribunal recorrido, cremos que carece de fundamento a pretendida redução das penas parcelares, sustentada, aliás, numa argumentação que não tem sustento na factualidade provada, mas apenas na pretendida, mas não conseguida, alteração da matéria de facto. O grau de culpa foi, de facto, elevado, pois o arguido agiu com dolo direto, forma mais grave da culpa, em relação a ambos os ilícitos. Já o grau de ilicitude situou-se num patamar médio em relação ao crime de ofensa à integridade física e médio/alto em relação a ao crime de violência doméstica, evidenciando o modo de atuação do arguido uma personalidade agressiva e impulsiva. No que tange à sua atuação na pessoa da ofendida D…, não só a arrastou até à rua, como também a pontapeou. Já relativamente à sua atuação na pessoa da ofendida P…, para além do período temporal em que perdurou, importa ter presente a diversidade de condutas levadas a cabo pelo arguido, as quais, para além de atingirem a sua integridade física, honra e consideração (apertou-lhe o pescoço, desferiu socos, puxou os cabelos, arrastou-a pelo chão, deu-lhe chapadas, apelidou-a de estupida), geraram na mesma um ambiente de intimidação e medo, nocivo à sua estabilidade emocional. Com efeito, através de vários comportamento, dirigidos direta ou indiretamente à ofendida, o arguido atingiu e prejudicou o bem estar psicológico da sua companheira - destruiu objetos do seu uso pessoal e profissional e impediu-a, outras vezes de os utilizar, ameaçou, humilhou (expulsou-a de casa, o que a levou a dormir no interior do veículo) e atemorizou (atente-se que numa das discussões que teve com a ofendida, arrastou-a até ao carro e conduziu-a até um lugar ermo, só ai não a tendo deixado porque esta insistiu que não o fizesse). De ponderar, no entanto, a ausência de consequências gravosas. Não se ignorando, como deflui da factualidade provada, que durante a relação mantida entre o arguido e a ofendida P… esta também demonstrou ser possessiva e ciumenta em relação ao arguido, tendo muitas das discussões mantidas com aquele sido por ela iniciadas e motivadas por ciúmes relativamente à ex companheira do arguido, com a qual o proibiu de contatar, tal, porém, não é de molde a atenuar o grau de ilicitude e de culpa do arguido, tanto mais que não resultou provado que as concretas e descritas atuações do arguido tivessem sido decorrentes de qualquer comportamento por banda da ofendida. Volvendo-nos agora nas exigências de prevenção geral, como também se salientou na decisão recorrida, as mesmas situam-se num patamar muito elevado atentos os bens jurídicos protegidos pelos respetivos tipos legais de crime, com particular relevo no caso do crime de violência doméstica, ante a frequência com que se vem assistindo, cada vez mais, nos nossos dias, a maus tratos infligidos ao cônjuge, ex-cônjuge, a quem viva em condições análogas ao cônjuge ou mantenha uma relação de namoro, culminando muitas vezes com a morte da vítima. Estes casos provocam na comunidade um crescente sentimento de repulsa e indignação, do que nos dá conta, com uma frequência quase diária, os meios de comunicação social, sendo, por conseguinte, absolutamente essencial, que a sociedade sinta que determinados comportamentos sofrem uma adequada punição, mantendo-se assim a confiança geral no ordenamento jurídico. Reconhecendo, sem dúvida, o nosso direito penal, consequências jurídicas não apenas ao comportamento do arguido no decurso do iter criminis, mas, também, ao seu comportamento anterior e posterior ao crime por si cometido, no caso vertente, como se constata, o tribunal recorrido também não desconsiderou tal comportamento, pois, como evola da decisão recorrida, ponderou a ausência de antecedentes criminais por parte do arguido, a inexistência de noticia de qualquer comportamento ilícito posterior contra as ofendidas e as suas condições pessoais de vida, na medida em que se encontra social e profissionalmente integrado, circunstância que, aliás, já existente à data dos factos, não o impediu de os levar a cabo. Porém, todo esse circunstancialismo, ainda que valorizável, como foi, não pode neutralizar, de todo, as exigências de prevenção especial que se fazem sentir, pois não podemos ignorar a personalidade deformada do arguido que se evidencia nos factos, bem como a circunstância de não ter interiorizado a desconformidade e gravidade da sua atuação, nem ter evidenciado qualquer arrependimento. Deste modo, ponderada a ilicitude dos factos, a culpa do arguido e as prementes exigências de retenção, de defesa do ordenamento jurídico e da paz social e sem olvidar que as penas têm de representar uma censura suficiente do facto e, simultaneamente, uma garantia para a comunidade da validade e vigência das normas violadas, não vemos fundamento para alterar as penas fixadas pelo tribunal recorrido, as quais mostram-se adequadas e necessárias às elevadas exigências de prevenção que se fazem sentir e que o caso reclama, sendo igualmente consentidas pelo grau de culpa do arguido. Convirá lembrar que o Tribunal da Relação não decide da pena como se o fizesse ex novo, como se inexistisse uma decisão de primeira instância. Como tem sido entendimento pacífico na doutrina e na jurisprudência, também quanto à medida da pena o tribunal a quo usufruiu da imediação e da oralidade, pelo que só perante um manifesto desequilíbrio ou desproporcionalidade – que não se verifica – a medida da pena deveria ser alterada em recurso. A sindicância da pena por via do recurso situa-se, pois, na deteção de desvios no iter aplicativo da pena, legalmente vinculado, e dai que não inclua, insiste-se, a determinação/fiscalização de um quantum exato que, decorrendo duma correta aplicação das normas e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionado, como é o caso vertente. Como se sintetizou no acórdão do STJ de 6/11/2020, disponível in https:// jurisprudência.csm.org.pt, “em sede de escolha e medida da pena, o recurso não deixa de reter o paradigma de remédio jurídico (na expressão de Cunha Rodrigues), no sentido de que a intervenção do tribunal de recurso (também) neste particular, deve cingir-se à reparação de qualquer desrespeito pelo tribunal recorrido, dos princípios e normação que definem e demarcam as operações de concretização da pena na moldura abstrata determinada na lei (…)”. Por conseguinte, não merecendo o processo aplicativo desenvolvido pelo tribunal recorrido e evidenciado na sentença objeto de recurso, qualquer reparo, nada se impõe alterar neste segmento. Resta-nos concluir pela não excessividade das penas aplicadas, improcedendo também por aqui o recurso interposto.
- Da excessividade e desadequação do regime de prova e regras de condutas imposta na suspensão da execução da pena de prisão.
Defende o recorrente que o regime de prova e regras de condutas aplicadas são excessivas e desadequadas ao caso concreto, porquanto demonstrou uma vontade inequívoca e sincera de seguir em frente com a sua vida, de não contactar com a ofendida e de retomar a sua vida profissional , o que só poderá fazer se lhe for permitido sair do território português. Ora, a suspensão da execução da pena de prisão pode assumir uma de três modalidades: simples suspensão da execução da pena, suspensão sujeita a condições ou suspensão sujeita a regime de prova. Por sua vez, decorre do artº 34º-B, nº 1, da Lei nº 112/2009, de 16/09, que estabelece o regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica e à proteção e assistência das suas vítimas, que a suspensão da execução da pena de prisão de condenado pela prática de crime de violência doméstica previsto no artigo 152.º do Código Penal é sempre subordinada ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou ao acompanhamento de regime de prova, em qualquer caso se incluindo regras de conduta que protejam a vítima, designadamente, o afastamento do condenado da vítima, da sua residência ou local de trabalho e a proibição de contactos, por qualquer meio. Constitui verdadeiro pressuposto material do regime de prova “a consideração pelo juiz de que se mostra conveniente e adequado a facilitar a reintegração do condenado, ou seja, sempre que se reconheça utilidade para reinserção social do delinquente, desempenhando a maior relevância como peça essencial de todo o processo a elaboração de um plano individual de readaptação social nos termos do n.º 2 do artigo 53.º do Código Penal” (Ac. deste Tribunal da Relação de 29/10/2014, proferido no proc. 452/13.9PBTMR.C1). O plano individual de readaptação é, no dizer do Prof. Figueiredo Dias, “a peça indispensável deste mecanismo de socialização”, o “testemunho da estratégia (e da táctica) que o tribunal entende dever seguir …”, “… a articulação do cumprimento dos deveres e regras de conduta impostas com as tarefas de vigilância a cargo do trabalhador especializado ou técnico de reinserção social” (…), que não deve ceder à tentação de tornar a sua tarefa em “missionarismo paternalista e predicante”, mas ater-se aos limites de “legalidade externa” impostos na sentença, o que vale particularmente para tudo quanto respeite à vida íntima e familiar do condenado (Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime§§630,640 e 646). No caso vertente, entendeu o tribunal recorrido que “ a suspensão da pena de prisão aplicada ao ora Arguido deve ser subordinada, nos termos do disposto no sobredito normativo, em conjugação com o preceituado nos artigos 50.º, n.ºs 2 e 3; 52.º, n.º 3; 53.º, n.ºs 1 e 2; e 54.º do Código Penal, e 34.º-B, n.º 1, da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro a: a) - regime de prova, assente num plano de reinserção social a elaborar e acompanhar pela DGRSP, (i) orientado para eventuais dificuldades do Arguido no que concerne à gestão da impulsividade e controlo das emoções activadoras da mesma, e que (ii) deverá contemplar Programa para Agressores de Violência Doméstica (PAVD), que «visa promover a consciência e assunção da responsabilidade do comportamento violento e a utilização de estratégias alternativas ao mesmo, objectivando a diminuição da reincidência», justificando-se a opção por tal programa pela impulsividade que o Arguido revelou na prática dos factos, bem como a intensidade dos mesmos; b) regra de conduta de sujeição do arguido a avaliação médica para apreciação das referidas problemáticas e da saúde mental, com eventual sujeição do mesmo ao respectivo acompanhamento psicológico ou tratamento psiquiátrico, caso seja indicado como necessário (tendo o Arguido prestado o seu consentimento em sede de Audiência de Discussão e Julgamento)”. E cremos que bem andou o tribunal recorrido ao assim entender, bastando, para tal, atentar na personalidade do arguido evidenciada nos factos, com traços de agressividade e impulsividade. Os requisitos de adequação e proporcionalidade, no que tange à sujeição ao regime de prova e á regra de conduta imposta, mostram-se amplamente demonstrados, importando confrontar o arguido com as suas ações e fazer com que o mesmo tome consciência da sua desconformidade e gravidade e assuma a sua responsabilização. O regime de prova e a regra de conduta a que ficou subordinada a suspensão da execução não são excessivos, nem desadequados ao caso concreto, sendo certo que não constitui fundamento de tal excessividade e desadequação, a invocada vontade por parte do arguido em seguir em frente com a sua vida, não contactar com a ofendida e retomar a sua vida profissional logo que possa sair de Portugal. Sendo verdade que o plano a elaborar pela DGRSP tem de respeitar o princípio da razoabilidade, consagrado no artigo 51º,nº2, do Código Penal, mas extensivo ao regime de prova, não é menos verdade, que tal plano não tem de restringir-se ao que é confortável ao arguido, isto é, àquilo que ele pode cumprir sem sacrifício, sob pena de não se poder impor como condição de suspensão da execução da pena qualquer limitação. A sujeição ao regime de prova durante o período de dois anos e dez meses e a possibilidade da regra de conduta imposta poder passar por acompanhamento psicológico ou tratamento psiquiátrico (consentido pelo arguido), não só se mostram adequadas a potenciar os objetivos da suspensão da execução da pena de prisão (ressocialização do arguido e proteção dos bens jurídicos violados), porquanto importa fazer com que o arguido interiorize a gravidade e desconformidade da sua atuação, afastando-o da prática de novos crimes - como não se mostram desproporcionadas ou irrazoáveis, porquanto nada se evidencia no sentido de que o arguido as não possa cumprir, sendo certo que a sua vontade em sair de Portugal e retomar a sua vida de SKIPPER não constitui, de modo algum, fundamento válido para a invocada desadequação, circunstância que a verificar-se poderá sempre ser compatibilizada com o Regime de Prova imposto, carecendo, porém, de ser articulada com os serviços da DGRSP. Ademais, a verificar-se alguma alteração superveniente nas condições de vida do arguido que contenda com a possibilidade de dar cumprimento ao regime de prova ou com a condição imposta, tal poderá ser objeto de apreciação por parte do Tribunal, conforme estatuído no citado artigo 51, no seu nº3. Em suma, não padecendo de qualquer excessividade, desadequação e desproporcionalidade o regime de prova e regra de conduta aplicadas, improcede também neste segmento o recurso interposto.
III. Dispositivo
Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes da 4ªsecção penal do Tribunal da Relação de Coimbra em julgar improcedente o recurso interposto, confirmando-se a sentença recorrida.
Condena-se o recorrente no pagamento das custas, fixando-se a taxa de justiça em quantia correspondente a quatro unidades de conta (arts. 513º,nº1 do C.P.P. e 8º,nº9, do Regulamento das Custas Processuais, e Tabela III anexa a este último diploma).
(Texto elaborado pela relatora e revisto pelos signatários – art.94º,nº2, do C.P.P.)
Coimbra 14 de julho de 2025 Cândida Martinho (Juiz Desembargadora Relatora) Teresa Coimbra (Juiz Desembargadora 1ºAdjunta) Maria Fátima Calvo (Juiz Desembargadora 2ªAdjunta)
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